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Pose

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Lady Gaga

Lady Gaga

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por ADAN (@euadan)

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Vida. Glamour. Realidade. Marginalidade. Beleza. Medo. Cultura. Os anos 80 é uma década que se firmou no imaginário popular como uma época de intermédio, de criação, mudanças e surgimento da cultura mais emergente que vemos hoje da forma que temos hoje. Vários movimentos culturais nasceram ou se firmaram nessa década e são vividos até os dias atuais com toda intensidade de forma religiosa.

O mundo estava de ressaca, vinha se reerguendo da cultura do amor livre dos anos 60, dos rombos do fim da Guerra do Vietnã e o auge da Guerra Fria, John Lennon era assassinado nos Estados Unidos e o mundo entrava em choque. No Brasil, os anos 80 serviu para nos livrarmos de uma ditadura que durou 21 anos e junto com o resto do mundo, estávamos nos reunindo e tentando crescer.

Encabeçado por Lou Eyrich, com colaboração de Analucia McGorty, o figurino eclético de Pose é inspirado no documentário Paris Is Burning, sendo feito no melhor estilo Faça Você Mesmo, para ser crível que as peças teriam sido, de fato, garimpadas pelos brechós e mercados de pulga da vida e produzidas pelos personagens

Indya Moore como Angel

Nessa ambientação oitentista, o showrunner Ryan Murphy em conjunto com Brad Falchuk e Steven Canals nos brinda com uma das melhores séries de 2018 até agora: Pose . Criação para o canal norte-americano FX, o drama teve sua estreia em 3 de junho e conta com apenas oito episódios, cuja segunda temporada já está anunciada oficialmente para 2019.

Pose já chama atenção desde que foi anunciada: o programa traz o maior elenco de atores que se identificam como transgêneros em uma mídia, que não seja reality show. Ainda, os atores são, na maioria, negros e latinos. Com tamanha representatividade incluída em uma linha televisiva, já é possível ter uma noção que o seriado tem muito motivo para incomodar os mais conservadores, trazendo vários temas que não são discutidos com frequência em tópicos ocasionais.

A série é uma verdadeira homenagem a cultura queer dos anos 80, sendo também uma ovação a comunidade transexual, nicho que vivia renegado aos guetos raciais, sejam eles negros ou hispânicos. O preconceito rasgado na luta em busca de aceitação da sexualidade, as dores da epidemia da AIDS, drogas e a condenação de morte ao se tratar do tão assustador positivo.

DOMINIQUE JACKSON COMO ELEKTRA, A RAINHA-MÃE DA CASA ABUNDANCE

O embrião da produção foi implantada em Ryan Murphy a mais de uma década atrás. Após assistir ao documentário Paris is Burning, de 1990, o produtor quis trazer um projeto onde tratasse da cultura, mostrando a cena social e abrangendo o movimento que é mostrado no documentário. Paris is Burning é voltado ao que muitos chamam da época de ouro de Nova York para os transexuais.

No ano de 2014, um então aspirante a roteirista Steven Canals apareceu com a proposta de uma história de um jovem de família porto-riquenha que era protegido pela família do crack e da AIDS. A ideia era uma mistura que envolve influências de longas como Fama (1980) e A Cor Púrpura (1985) na sua identidade visual, inspirado na vida do próprio roteirista. Murphy comprou a ideia e trouxe Pose em um projeto grandioso e magistral. Para ajudar a dar vida ao programa, Janet Mock, criadora do movimento de empoderamento de mulheres trans #GirlsLikeUs, ingressou na equipe de produtores e roteiristas, dando voz a uma personalidade da comunidade, mostrando que estava comprometido em sua inclusão.

DA ESQUERDA PARA A DIREITA, AS MULHERES DE POSE: HAILIE SAHAR (LULU), DOMINIQUE JACKSON (ELEKTRA), INDYA MOORE (ANGEL), ANGELICA ROSS (CANDY) E MJ RODRIGUEZ (BLANCA). NA SESSÃO FOTOGRÁFICA, ELAS TRAJAM O FIGURINO DA PRIMEIRA CATEGORIA MOSTRADA NA SÉRIE: REALEZA.

Os personagens de Pose são singulares em seus mais diversos meios, mostrando uma realidade que os permeiam até os dias atuais. Já no primeiro episódio somos apresentados a todas as figuras que irão nos fazer amar e torcer durante os episódios que virão.

Ambientada em 1986, a série vai do gueto, em um primeiro vislumbre da casa Abundance, liderada pela Rainha-Mãe Elektra (Dominique Jackson), com seus “filhos” Blanca (Mj Rodriguez), Angel (Indya Moore), Lulu (Hailie Sahar), Candy (Angelica Ross), Lemar (Jason A. Rodriguez) e Cubby (Jeremy McClain), para o cenário social emergente do universo onde Donald Trump era idolatrado por muitos, que almejavam viver no mesmo luxo e sucesso que o então empresário esbanjava.

DA ESQUERDA PARA A DIREITA, AS MULHERES DE POSE: HAILIE SAHAR (LULU), DOMINIQUE JACKSON (ELEKTRA), INDYA MOORE (ANGEL), ANGELICA ROSS (CANDY) E MJ RODRIGUEZ (BLANCA). NA SESSÃO FOTOGRÁFICA, ELAS TRAJAM O FIGURINO DA PRIMEIRA CATEGORIA MOSTRADA NA SÉRIE: REALEZA.

Aqui, os bailes de Vogue, evento presente já nos primeiros minutos da série, são os cenários principais de vários dos melhores momentos do show, onde personagens e Casas irão se enfrentar em busca de prêmios e reconhecimento. A ideia do showroom é promover um espaço onde eles podem ascender e mostrar suas personalidades, individualidades e talentos, em uma competição que mescla desfile, passos de dança, carões e figurinos deslumbrantes, nas mais variadas categorias. Realidade esta já bem familiar para os que já assistiram Paris is Burning ou o reality show RuPaul’s Drag Race.

A mudança de cenário ocorre quando Blanca descobre que é portadora do vírus da AIDS e, em um momento de aceitação, decide sair da Casa Abundance para ser a mãe da Casa Evangelista, homenagem a supermodelo canadense e apoiadora das pesquisas sobre AIDS, Linda Evangelista. Ainda, neste núcleo, além de Angel, que eventualmente segue a amiga para o novo lar, somos apresentados a Damon (Ryan Jamaal Swain), aspirante a dançarino profissional e o primeiro que Blanca acolhe dentro de sua Casa; Ricky (Dyllon Burnside), um garoto conquistador que está de olho em Damon; Lil Papi (Angel Bismark Curiel), um cara divertido que vende drogas; e Pray Tell (Billy Porter), o apresentador dos bailes e melhor amigo de Blanca.

MJ RODRIGUEZ É BLANCA, FILHA DA CASA ABUNDANCE QUE PASSA A SER MÃE DA CASA EVANGELISTA

A disputa entre mãe e filha, em busca de maior relevância para as Casas Abundance e Evangelista, é um dos motes condutores da narrativa de Pose. Mas se engana que a série é apenas bailes e a busca pelo glamour: vale lembrar a proliferção e surto do vírus do HIV tem seu auge nos anos 1980, assim como o uso desenfreado das drogas e da emersão de uma nova classe rica nos Estados Unidos, que de alguma forma são vivenciados pelos personagens, seja entre si ou em seus companheiros.

No núcleo branco, vivendo a outra realidade, somos apresentados a Stan (Evan Peters), um emergente funcionário das empresas Trump. Ele é casado com Patty (Kate Mara), uma dona de casa que inicialmente se vê encantada com sua nova realidade; no trabalho, ele responde à Matt Bromley (James Van Der Beek), um cara que não tem nada a perder e goza de um vida de pura luxúria, drogas e prazer. Por sentir que não se encaixa em nenhum grupo social, Stan eventualmente cria uma relação com Angel, em busca de um conforto e aceitação.

CANDY, LEMAR, CUBBY E LULU ENSAIAM UMA APRESENTAÇÃO PARA O BALLROOM

São entre esses bailes, disputas por coroas, romance, corações quebrados e várias lições de humanidade e luta por sobrevivência, que a série mostra a cada episódio a arte de emocionar o telespectador com histórias profundas. Aclamado pela crítica, Pose vem arrancando elogios de diversos veículos de comunicação, como a revista norte-americana Vanity Fair, que chama a produção televisiva de “ousada e necessária”.

ELEKTRA E BLANCA VÃO A PROCURA DE EMPREGO

A produção faz parte de uma nova leva de produtos audiovisuais protagonizados por minorias, como são os casos das séries Raio Negro, do canal estadunidense The CW, e Cara Gente Branca, do serviço de streaming Netflix. Ter a ousadia de apresentar a junção de várias minorias em uma era atual dominada por tamanha bagagem de racismo e preconceitos, é um verdadeiro tapa na cara, que está sendo sentida e, aos poucos, absorvida para encontrar o caminho da aceitação.

AS CASAS EVANGELISTA E ABUNDANCE COMEMORAM JUNTOS UMA TRÉGUA

Pose chega ao Brasil no segundo semestre de 2018 pelo canal pago Fox Premium. A segunda temporada, que chega em 2019, terá um breve pulo temporal de um ano, com sua season finale concluindo no lançamento da música Vogue, da cantora norte-americana Madonna. A faixa, que é um dos maiores hinos da comunidade queer, celebra a arte dos ballrooms e terá grande influência na cultura dos bailes de vogue. //

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