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Correio da Feira 12.JAN.2015

Joaquim Ribeiro - Quim da Rampinha Bernardes, recordando um casal que perdeu a casa num incêndio. Mantém-se a “proximidade” mas sempre de olho aberto. “Há pessoas que se vê que não precisam e a quem deixei de dar” – afirma. Mas há outros que fazem tudo valer a pena. “Havia um senhor que andava sempre bêbedo. Quando começou a vir cá, disse-lhe duas coisas: primeiro, venha limpo, e depois, o primeiro dia que o vir alcoolizado na rua deixo de dar comida. A verdade é que ele deixou de beber, agora anda sempre arranjado, ficou motivado para mudar de vida” – revela Miguel Bernardes. O empresário acredita que a rede “resolve um problema de proximidade” e obriga os restaurantes a serem mais solidários. “Não recebemos dinheiro, ninguém nos dá um euro. Quem dá as refeições somos nós” – afirma. Uma missão que tem muito de humanitária. “Amanhã posso ser eu. São pessoas como nós, pessoas de trabalho, num momento de fraqueza” – termina.

“Não querem comer na sala”

Já Teresa Silva, da Churrasqueira do Castelo, na Feira, aderiu à rede porque esta lhe disse muito. “Achei importante, também eu já passei por algumas dificuldades” – conta. Diz que as pessoas que vão ao seu restaurante, beneficiárias deste apoio, comem como qualquer cliente, “comem como eu”, mas muitas vezes preferem levar para casa a refeição. “Não querem comer na sala, pri nc ipalm ent e a s mu lheres. Resguardam-se muito, escolhem a hora para vir buscar refeição” – diz. Começaram por

ser famílias numerosas, tas outras pessoas num mas ultimamente têm sido momento frágil da vida. mais pessoas sozinhas Nesta altura, ajuda uma que, quando deixam de senhora de Canedo, mas fazer parte da rede, são os beneficiários vão “enencaminhadas para ou- trando e saindo consoantras respostas, se assim te a necessidade”. Teresa p r e c i s a r e m . U m a a j u - Silva diz que este é um da temporária mas que “projecto em que vale a lhes traz grande conforto. pena apostar” até porque “ A g r a d e c e m - m e . U m a “às vezes sobra comida vez, ajudei um casal de e não a vamos desperditoxicodependentes. Hoje, çar”. “Mas é uma questão saíram dessa situação, de ajudar” – reforça. Fica estão a trabalhar e já vie- sempre com a sensação ram cá jantar e pagaram de que “valeu a pena” e com o seu dinheirinho” – até já teve um caso bem lembra Teresa Silva, de seu conhecido. “Cheguei sorriso no rosto. a dar de comer a Sente que “a tauma pessoa refa foi cumque tinha “Almoçam prida”, mas sido minha não deixa empregacá ou levam, de se preda, nouenquanto não es- t r o r e s ocupar. “Agora tabilizam a vida” taurante. pelo NaMexeu tal, penm u i t o sava: onde comigo, é que esta parece que pessoa vai nos tiram o consoar? Mas tapete debaixo eu fiz a minha parte, dos pés” – refere, saalguém há-de dar a mão lientando: “Hoje são eles, no dia seguinte” – afirma. amanhã somos nós”. No seu restaurante já serviu um “prato quente” “Não gosto de ver a v í t i m a s d e v i o l ê n c i a comida a estragardoméstica, órfãos, toxi- se” codependentes, e mui- No Quim da Rampinha,

Teresa Silva - Churrasqueira do Castelo

em Canedo, sempre se ajudou a comunidade desfavorecida. “Desde o tempo da minha avó, do meu pai, estamos sempre disponíveis” – salienta Joaquim Ribeiro. Dá oito litros de sopa a uma família de Gião e sempre que sobra comida já sabe quem contactar. “Não gosto de ver comida a estragar-se. Quando sobra, colocamos numa embalagem e contactamos pessoas que estão a passar necessidades. Por exemplo, se sobrou um bocado de leitão, ligo e digo para vir buscar” – conta. Em 2011, integrou a Rede de Restaurantes Solidários. “Também é um reconhecimento do nosso trabalho. Não passamos pela crise porque gostamos de ajudar” – afirma, realçando, contudo que nem todos merecem a ajuda. “Sei a quem devo dar, muitos não dou” – declara. A maior parte dos clientes “leva a comida para casa”. “Muitos com vergonha não comem cá, não querem estar expostos, mas todos sabem que são carenciados, muitos estão desempregados” – refere. São pessoas que, ainda que reservadas, sabem apreciar a atitude. “Agradecem pelo gesto” – afirma. Mas, salienta Joaquim Ribeiro, isto de dar “não é fácil”. “Não é qualquer casa. Uma casa que vende 20 refeições não consegue dar” – salienta. Mas, ainda bem, o Quim da Rampinha consegue e, pela rede, ajuda, por ora, uma pessoa de Guizande, apesar de serem mais as famílias que o procuram. Para Joaquim Ribeiro, este é um projecto “muito importante”. “Temos de nos ajudar uns aos outros” – salienta, exibindo, com orgulho, o selo “empresa solidária”.

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