Análise de cores - ambiente hospitalar

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Análise de cores: ambiente hospitalar Jéssica Cristina Teixeira1, Robert Soares de Lima2 Curso de Arquitetura e Urbanismo – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design Universidade Federal de Uberlândia (UFU) – Uberlândia, MG – Brasil jessicacristina@outlook.com, robertsoares@outlook.com

Resumo. Este trabalho visa fazer a análise das cores utilizadas na sede do laboratório de análise clínicas IPAC em Uberlândia, Minas Gerais. Longe de ser a “palavra final” no que se refere ao significado das cores utilizadas no edifício, o texto que se segue contém, além de embasamento teórico, percepções individuais que podem diferir de pessoa a pessoa. Como veremos adiante, as cores em ambientes hospitalares são de fundamental importância, pois podem interferir diretamente no estado emocional do paciente. Sendo assim, se faz necessário um estudo teórico e empírico para se entender quais as sensações provocadas por determinadas cores. Palavras-chave. análise de cores, ambiente hospitalar, psicodinâmica das cores Abstract. This paper aims to make the analysis of the colors used in the headquarters of clinical laboratory analysis IPAC in Uberlândia, Minas Gerais. Far from being the "final word" in relation to the meaning of the colors used in the building, the following text contains, in addition to theoretical knowledge, individual perceptions that may differ from person to person. As we shall see, the colors in hospital environments are of fundamental importance because they can directly affect the patient's emotional state. Therefore, it is necessary a theoretical and empirical study to understand what the sensations caused by certain colors. Keywords. color analysis, hospital enviroment, psychodynamics of colors ______________________________________________________________________ 1

Graduanda em Arquitetura e Urbanismo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design Universidade Federal de Uberlândia E-mail: jessicacristina@outlook.com 2

Graduando em Arquitetura e Urbanismo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo e Design Universidade Federal de Uberlândia E-mail: robertsoares@outlook.com about.me/robertsoares


1. Introdução Hospitais e clínicas acolhem pacientes e seus acompanhantes, além de seus funcionários, é claro, em diversos estados emocionais. Farina e Tornquist afirmam que a cor afeta significativamente o estado psíquico das pessoas. Sendo assim, as cores utilizadas no ambiente hospitalar devem ser pensadas de modo a amenizar ou, em alguns casos, intensificar determinadas emoções ou até mesmo ações geradas por estas. Este trabalho visa fazer uma análise das cores utilizadas em ambientes hospitalares e seus efeitos, tomando como estudo de caso o laboratório de análises clínicas IPAC (matriz) em Uberlândia, Minas Gerais. Esta análise é guiada por textos referenciais de pesquisadores no campo da psicodinâmica das cores e dos efeitos destas quando utilizadas em hospitais, além da visita ao laboratório, o que possibilitou uma vivência e, consequentemente, a comprovação da veracidade e aplicabilidade ou não das informações teóricas que foram consultadas.

2. Referencial teórico e conceitual De acordo com Luiz Cláudio Rezende Cunha, “O espaço físico absorve luz emitida por uma fonte e a transmite aos usuários, permitindo sua interpretação emocional.” (CUNHA, 2004) A luz, quando refletida pelos elementos constituintes do espaço construído, adquire significado que pode ser traduzido emocionalmente. A interpretação deste significado se dá de forma individual e varia de inúmeras formas. O posicionamento do observador no espaço pode influir na recepção de diferentes quantidades de luz. A intensidade com que esta chega a cada um, em somatória com as cores utilizadas no espaço construído e a cor da própria luz, alteram as percepções deste observador. Sendo assim, é fácil perceber como as reações provocadas pela luz são específicas a cada indivíduo. Cunha traduz a questão das diferentes percepções experimentadas por cada pessoa no seguinte trecho: “A sensação provocada pela ação da luz sobre a visão, quando se varia a qualidade, quantidade, forma e o posicionamento das áreas coloridas, provoca respostas com diferentes intensidades.” (CUNHA, 2004) Jorrit Tornquist afirma que o corpo humano reage à luz colorida de forma independente da visão e que isso não está relacionado à cultura. Para ele, “a leitura da luz tem uma importância maior que a própria cor, bem como seu efeito fisiológico, o qual atua por via direta.” (TORNQUIST, 2008) É necessário entender que cor é luz para compreender essa afirmação. Mais importante que os significados culturais que as cores podem adquirir de região para região, está a leitura que o organismo faz delas. “A cor, em qualquer caso, simula sempre a iluminação.” (TORNQUIST, 2008) Modesto Farina, em seu livro “Psicodinâmica das Cores em Comunicação”, afirma que tentar explicar os efeitos que as cores podem causar no organismo é uma tarefa complexa, pois as possibilidades de combinação entre elas são muitas e, além disso, o ambiente e todas suas variáveis podem interferir de muitas maneiras na forma como estas são recebidas. “As cores, por meio de nossos olhos e do cérebro, fazem penetrar no corpo físico uma variedade de ondas com diferentes potências que atuam sobre os centros nervosos e suas ramificações e que modificam, não somente o curso das funções orgânicas, mas também nossas atividades sensoriais, emocionais e afetivas.” (FARINA, 2006)

Como foi visto, as cores e, consequentemente, a luz, conseguem estimular nosso organismo das mais diversas formas. Os estímulos, efeitos e significados provocados e adquiridos pela luz e cor serão analisados no estudo de caso referido, segundo as


referências conceituais, dentro dos ambientes do laboratório. Será verificado também como os usuários destes ambientes são afetados, se positiva ou negativamente.

3. Materiais e Métodos Para realizar tais análises, foi feita uma visita ao laboratório, onde se obteve uma vivência necessária para levantar discussões entre o que era puramente teórico e o que é, de fato, de possível aplicação. Nessa visita foram realizadas fotografias para análises posteriores. Durante o desenvolvimento do trabalho foram elaboradas paletas contendo as cores mais usadas em cada ambiente. A partir dessas paletas cada cor foi analisada de acordo com as possíveis interpretações enunciadas pelos autores já citados e, é claro, de acordo com nossa interpretação pessoal, pois como já foi visto, a percepção da luz e da cor e as emoções produzidas por elas são particulares de cada indivíduo.

Figura 01: IPAC – Medicina Diagnóstica. Situado na Avenida Cipriano Del Favero, 515 – Centro – Uberlândia/MG

Logo na recepção pôde-se perceber que houve uma preocupação quanto à correta utilização das cores. É importante salientar que o partido arquitetônico desse ambiente intensifica a ação esperada com a utilização das cores escolhidas. O pé-direito elevado em conjunto com a parede de vidro possibilita que o ambiente pareça maior. Isto, somado à vegetação com forte presença no exterior, produz uma sensação de abertura de ambiente interno para externo. Tais observações levaram a crer que as escolhas arquitetônicas, paisagísticas e das cores para este ambiente, transmitem uma sensação de calmaria e o torna um amenizador para quaisquer emoções conturbadas.


Figura 02: Parede de vidro da recepção (térreo) do edifício.

Figura 03: Balcão da recepção (térreo).

Figura 04: Área da caixa de elevadores (térreo).


Figura 05: Caixa de elevadores (térreo).

As cores utilizadas, como podem ser observadas na paleta da figura 06, são predominantemente frias. Os comentários em cada cor dessa paleta são baseados, como dito anteriormente, na bibliografia consultada, com exceção do comentário escrito em azul que é uma observação pessoal. Os comentários colocados na paleta foram todos confirmados. O branco é utilizado na recepção para intensificar a ideia de ambiente amplo e arejado. As cadeiras possuem cores claras que, apesar de dar um pouco de dinamismo e vida ao local, não têm uma característica destoante do todo que é predominantemente frio. As cores verdes da vegetação externa tem um papel tranquilizador para os funcionários que passam horas sentados atrás do balcão. Por outro lado, o quadro atrás desses funcionários desempenha o mesmo papel, porém com menor intensidade, para os clientes que chegam no balcão. A área da caixa de elevadores é marcada por tonalidades de roxo que, em combinação com as cores do quadro presente nesta parte do ambiente e o pé-direito que é reduzido pela metade quando comparado com o da recepção, transmitem uma sensação de estar adentrando o edifício, como se a luz do exterior, tão presente na recepção, fosse ficando cada vez mais escassa. A cor utilizada na caixa de elevadores é a mesma em todos os pisos por uma questão de orientação e demarcação desta.


Figura 06: Paleta de cores resultante da análise da recepção (térreo) do edifício.

Quando acessado, o primeiro piso revela a identidade visual que existe no espaço de atendimento ao cliente. As cores utilizadas nesse piso são praticamente as mesmas do inferior (recepção); as tonalidades e disposição delas no espaço é que mudam um pouco. A começar pelo mobiliário, nota-se que nesse ambiente as cadeiras destinadas aos clientes em espera para serem atendidos possuem cores predominantemente claras (tons de creme). A opção pelo mobiliário de cores claras repete a intenção buscada no piso inferior de “acalmar os ânimos” dos clientes. Além disso, nesse piso também existem grandes aberturas com vista para uma vegetação de bambus. Esta vegetação, combinada à grande quantidade de luz que penetra no ambiente através das aberturas, reforça ainda mais a intenção buscada com o mobiliário. Somente em alguns pontos são colocadas cadeiras com cores um pouco mais “vivas” (amarelo, verde e roxo, todas pouco saturadas). Um provável motivo para essa escolha seria o fato de que ambientes excessivamente brancos tendem a ser monótonos. Essas cadeiras se colocam como pontos de cores que mantém os clientes despertos. “Os ambientes monocromáticos deveriam conter pequenos campos de cores complementares, bem como campos de duas cores que faltam para formar o acordo de três cores, a fim de evitar o fenômeno da adaptação. São suficientes campos mínimos para que o olho os busque, lendo-os como sinais.” (TORNQUIST, 2008)


Figura 07: Mobiliários da área de espera para clientes (primeiro piso).

Figura 08: Grandes aberturas para entrada de luz combinada com vista para vegetação.

Nas salas de espera do primeiro piso, estas destinadas a uma permanência mais prolongada, tanto de clientes quanto de funcionários, as cores continuam basicamente as mesmas, porém bem mais saturadas. O mobiliário, que agora conta com poltronas reclináveis bastante confortáveis, traduz a intenção de oferecer ao cliente em repouso um ambiente mais acolhedor e quente do que os espaços anteriores. Ainda assim, a identidade visual observada até agora é mantida.


Figura 09: Sala de espera de permanĂŞncia prolongada para clientes (primeiro piso).

Figura 10: Sala de espera de permanĂŞncia prolongada para funcionĂĄrios (primeiro piso).


Figura 11: Paleta de cores resultante da análise do primeiro piso do edifício.

É somente no segundo piso que a cor laranja aparece. Ela está se faz presente somente no quadro atrás do balcão dos funcionários e em algumas poucas cadeiras diluídas entre as demais. Exames mais complexos como os cardiológicos são feitos neste piso. Portanto, a utilização desta cor pode indicar uma preocupação em distrair o paciente, ou acompanhante, do conteúdo destes exames. Tornquist também afirma que “as cores deveriam distrair os pacientes de suas dores e de si mesmos”. (TORNQUIST, 2008)

Figura 11: Quadros atrás do balcão dos funcionários no segundo piso apresentam tons fortes de laranjas.


Figura 12: Algumas poucas cadeiras na cor laranja bem saturada, o que pode sugerir uma quebra no padrão encontrado até agora.

Figura 14: Paleta de cores resultante da análise do segundo piso do edifício.

As cores utilizadas nos laboratórios demonstram uma falta de preocupação com o bem-estar do funcionário. O branco é utilizado por uma questão funcional de que se precisa de determinado nível de iluminação para o trabalho desempenhado neste ambiente. Porém, ainda é possível encontrar vários espaços mal iluminados neste ambiente. Os vidros das janelas são pintados para que a luz interna seja controlada. Isso se deve ao fato de que algumas substâncias, na presença de luz solar, podem sofrer alguma reação indesejada. Porém, isto produz um ambiente frio e monótono que, ao longo da jornada de trabalho dos funcionários, pode se tornar extremamente cansativo.


Além disso, neste ambiente também percebemos a presença da cor bege, típica de equipamentos eletrônicos mais antigos, que traz ainda mais monotonia para o local. Segundo Tornquist, “ambientes monocromáticos deveriam conter pequenos campos de cores complementares a fim de evitar o fenômeno da adaptação”. (TORNQUIST, 2008) Neste ambiente podemos ver uma total ausência de artefatos como esse.

Figura 15: Cores como branco e bege são predominantes nos laboratórios, produzindo um ambiente monótono.

Figura 16: As janelas são pintadas para evitar a entrada da luz solar e possibilitar o controle da iluminação interna.


Figura 17: Paleta de cores resultante da análise dos laboratórios.

3. Discussões e análises dos resultados As cores são fundamentais para compreendermos o universo onde vivemos e quando percebemos que luz é cor, este fato fica ainda mais evidenciado. De acordo com Tornquist, a luz pode nos afetar não somente pela visão, mas por todo nosso organismo. Sendo assim os ambientes em que vivemos e convivemos devem ser bem pensados quanto às cores, e quando se trata de um ambiente hospitalar, essa questão se torna ainda mais crucial. Pacientes, quando vão a um hospital, vão por motivos de doença, fazer exames ou mesmo para checar se seu organismo está saudável. Mas seja por qual motivo for, adentrar um ambiente hospitalar é sempre motivo de tensão. No projeto da nova sede do IPAC, construída há poucos anos, o profissional responsável pelas escolhas das cores dos ambientes, parece ter se atentado à essas questões. Essa preocupação com as cores, não somente em ambientes hospitalares, é bastante recente. É fácil perceber isso analisando outros tantos hospitais e edifícios dos mais diversos usos onde as cores, muitas vezes, são escolhidas de acordo com o logotipo do estabelecimento. O edifício do IPAC possui uma recepção agradável, com bastante luz e vegetação que, para um acompanhante, pode significar alguns momentos de calma e distração dos motivos pelos quais está ali, os quais poderiam ser geradores de mal-estar. No primeiro piso as cores seguem a identidade construída na recepção, porém é possível notar que ali a saturação é mais explorada, afim de transmitir um ambiente mais vivo e enérgico, mais uma vez, sugerindo a intenção de distrair os pacientes enquanto aguardam por exames ou enquanto repousam. No segundo piso, a intenção de distrair se torna ainda mais forte. É neste espaço que a cor laranja bastante saturada aparece pela primeira vez acompanhada de bastante luz que entra por grandes aberturas nas paredes. Infelizmente os laboratórios se mostram completamente despreparados para acolher com qualidade os seus funcionários, denotando uma provável falta de preocupação com seu bem-estar durante a jornada de trabalho. Porém, como já vimos, uma atenção maior, também neste ambiente, poderia resultar em um melhor desempenho dos funcionários.


4. Considerações Finais Com exceção dos laboratórios, onde o mesmo trabalho com as cores não existe, o edifício se mostra bem preparado para receber com qualidade seus pacientes, sem transmitir a tensão que ambientes hospitalares geralmente causam. De acordo com Tornquist, “Os ambientes deveriam suscitar bom-humor, espírito ativo e bem-estar por meio das cores que simulam sensações de luz agradáveis, ao invés da excitante combinação de cores estridentes.” (TORNQUIST, 2008) No projeto do IPAC, as cores quando são muito saturadas se encontram diluídas entre outras de baixa saturação, desempenhando um papel de coadjuvante que complementa as outras cores. “Portanto, ambientes humanizados e coloridos são essenciais em estabelecimentos de sáude. [...] A cor não deve ser um fim em si mesma, mas um meio estético para proporcionar conforto e tranquilidade aos pacientes e àqueles que trabalham em hospitais.” (CUNHA, 2004)

5. Referências bibliográficas 1

ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 5413 - Iluminância de interiores. Rio de Janeiro, ABNT, 1992. 2

BECK, C. L. C.; FILHO, F. F. L.; LISBOA, M. G. P.; LISBOA, R. L. A linguagem sígnica das Cores na Resignificação (Humanização) de Ambientes Hospitalares. XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Santos, 2007. 3

CUNHA, L. C. R. A cor no ambiente hospitalar. Anais do I Congresso Nacional da ABDEH - IV Seminário de Engenharia Clínica. 2004. 4

FARINA, M. Psicodinâmica das cores em comunicação. 4ed. São Paulo: Edgard Blücher Ltda, 1990, 231p. 5

TORNQUIST, J. Color y luz, teoria y práctica. Ed. Rústica, 2008.


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