cafe urbano

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CAFÉ URBANO Intervindo no centro


UFSC - CTC Dept. de Arquitetura e Urbanismo Projeto Arquitetônico VII. Professor: Rodrigo Gonçalves. Estudante: Julia Ceccon Ortolan. Florianópolis, 23 de maio de 2018.

INTERVENÇÃO, AÇÃO NO CENTRO

café da tarde no centro da cidade centro de mesa café no café caseiro da cidade rua com café de casa no centro e na rua casa rua com jeito de café

O QUE É ISSO?

é um registro

é uma crítica

PARA QUE? de uma intervenção urbana realizada no centro de uma das nossas cidades

sobre como temos vivido nossas cidades e como elas se colocam pra gente

para lançar e experimentar alternativas de aproximação: entre nós e com as nossas cidades ainda estranhas.


contexto:

ANTES

APRESENTAÇÃO DO CONTEXTO Na disciplina discutimos (a turma e o professor) criticamente sobre a prática arquitetônica mercadológica e a produção do espaço urbano atuais. Estudamos conceitos contemporâneos que vem sendo levantados no meio acadêmico, impulsionados principalmente por visões e conceitos defendidos pela arquiteta Paola Berenstein Jacques e por Fabiana Dultra Britto - corpografias urbanas, cartografias sensíveis, micropráticas de resistência… Muitos de nós motivaram-se, com isso, a propor e realizar intervenções no espaço público da nossa cidade. As intervenções urbanas como práticas dentro das disciplinas de projeto tentam trazer para o centro do nosso tema de estudo as pessoas e as suas vivências. Isso contrapõe a atual reprodução da arquitetura no mercado como imagem, produto sem corpo e sem organicidade, “glamouriza-

ferramentas de investigação e percepção das dinâmicas e tensões sociais de cada lugar práticas de resistencia às normas de uso e comportamento preestabelecidas nos espaços potências de transformação crítica, pois produzem inquietação, estranhamento e/ou questionamento, indicando outras maneiras possíveis de uso do lugar.

LOCAL DA INTERVENÇÃO Os mapas ao lado indicam o percurso que a turma realizou em uma deriva urbana conjunta pelo centro da cidade de Florianópolis. Dos lugares por que passamos nessa deriva, ficaram as primeiras impressões e sensações que foram dando corpo as proposições posteriores. Na esquina da Rua Felipe Schmidt com a Rua Trajano foi onde ocorreu a intervenção que segue aqui registrada.

ESQUINA DA INTERVENÇÃO


a intervenção: O QUE INCOMODOU? - Percepções e sensações do percurso no centro As beiradas incomodaram. A aspereza das ruas de carros, a aridez do sol e a falta de acolhimento. Os poucos lugares de estar parece que nem foram feitos pra se estar. Além de áspero, barulhento, perigoso e cheio de cheiros, confuso, obscuro, com rupturas e black outs. Todo o sentimento de aspereza e hostilidade que se percebe ao percorrer o centro está previsto no seu relógio, é estrutural. Pois o lugar é lugar de comércio, é marcação de ponto, é hora de chegada, hora de partida. É desenhado pelo fluxo acelerado e concentrado dos volumes de gente por suas esquinas, calçadões e estreitezas de passeio. Vamos ao centro pra trabalhar, pra pagar e prestar contas, pra resolver pequenas pendências burocráticas, pra comprar o tatareco que só tem lá. Aos fins de semana até vamos mais a passeio, alguns de nós, aproveitamos pra comprar o peixe do almoço e dar uma passada nos novos ou velhos bares e feiras que tem surgido. Mas quando falo de estrutural, digo mesmo sobre a falta de gente que more no centro. Como mora pouca gente lá, o centro não tem cheiro e nem movimento de casa. Não se vê pessoas indo e vindo de suas casas para fazeres leves e cotidianos, como passar no mercado, dar uma caminhada ou corrida pelo bairro, ir até a padaria e voltar. Ou mesmo botar, por instantes que seja, a cara na janela e sentir a temperatura, o vento, ver se vai chover ou não. Não há vida no centro depois que o comércio se desliga - todos os dias depois das sete e do sábado à tarde em diante. São marasmos de vivência urbana. O espaço renegado e deixado de lado, para sua deterioração temporal, com a falta de uso reconhecido e visível. Os moradores de rua, apesar disso, continuam a estar lá, com toda a sua invisibilidade social, a compor uma vida urbana não reconhecida. Apesar da questão parecer muito estrutural para ser modificada com sutilezas e provocações, como intervenções urbanas, a questão precisa ser colocada em pauta: assimilada, visualizada e debatida pelas pessoas que ocupam o espaço.

ANTES Neste sentido, as intervenções são capazes de estimular esse processo, pois funcionam como ações artísticas: têm poder de transformar não somente o espaço físico, ainda que de modo efêmero, mas também de despertar a imaginação das pessoas com relação às possibilidades de uso no espaço.

O QUE QUEREMOS? - Anseios e intenções Amaciar o centro, suavizar seus desconfortos A ideia seria então amaciar a hostilidade desse centro que descrevemos, trazer pitadas de aconchego que tentassem interagir com a vivência das pessoas no lugar. Experiências que fomentassem o intimismo e pertencimento, no combate ao extremo anonimato e heteronomia que hoje prospera nos espaços públicos em geral. Somente com a inversão desses valores é que seria possível construir atmosferas suficientemente convidativas à “subversão” do uso existente. A proposta de intervenção agarrou-se na ação do “encontro” e de “estar”, pois são práticas que propiciam a interação, a coletividade e a empatia. Estão atreladas ao caráter de pausa, relaxamento, descontração e acolhimento e contrapõem-se, por isso, ao “funcionar” do centro; aproximam-se dos sentimento de lar. Definida a ação: de que forma ela iria se coloca r no espaço, no centro? Qual seu corpo, sua intenção cênica, seu contexto cenográfico?

DE QUE JEITO? - Planejando a ação 1 FORMATO: Partiu-se da ideia de uma mesa de café, ou melhor, do ritual de encontro e pausa que costuma ocorrer em função dessa mesa. O cheiro de café e de bolo seriam o convite gustativo, somado ao valor simbólico que representam, acalorados pelo plano de fundo de uma toalha xadrez, junto com outros acessórios oportunos que poderiam remetar à ambiência de lar.


a intervençao:

ANTES O QUE ESPERAR?

2 LUGAR: Escolheu-se um lugar no centro que já usufruísse de certo aconchego, um ponto no meio do calçadão, protegido da agressividade dos carros e protegida de vento e de sol pelas paredes das antigas edificações, num simulacro ainda que distante de casa e suas salas abrigadas. Para que a coisa toda ficasse mais orgânica e aderida ao espaço, menos cênica e mais incorporada, aproveitou-se o conjunto de mesas de concreto preexistente na esquina da Felipe Schmidit com a Rua Trajano. O conjunto permitiria que mais gente se reunisse em volta das mesas e propiciaria, com isso, uma experiência de acontecimento coletivo - mesmo que cada pessoa estivesse mais introspectivamente usufruindo do café oferecido. 3 DIA E HORA: O horário da ação ficou pra hora do café, no meio do turno da manhã. Uma manhã de quarta-feira, que também é dia de feira no largo da Alfândega.

- Interaçoes previstas desejadas O que se esperava era que as pessoas parassem para sentar em volta de uma das mesas existentes, permitindo-se conversas, pausas, desvios de rota. Para tanto, foram escolhidos os elementos adequados para compor um cenário convidativo a isso, que atraísse às pessoas. E para que a açao por si só pudesse se tornar o foco do acontecimento, era necessário poupá-la de longas explicaçoes. Necessário despí-la um cenário muito cenográfico e escultório. Era necessário parecer e ser coisa simples, para ser menos uma peça de teatro, e mais uma vivencia urbana. Neste sentido, arquitetou-se a açao com: elementos físicos a compor a cena, um esquema de organizacao temporal e falas previstas para utiizar como explicaçao para as prováveis perguntas que poderiam surgir:

FALAS DE EXPLICAÇÃO: discurso Estou fazendo um café no centro porque não tem muita coisa assim na cidade, sinto falta. Porque gosto muito de café e queria ver como seria fazer um junto com as pessoas na rua. Porque acho que não tem muito lugar de café no centro, nada ao ar livre pelo menos. Quis montar um café no centro e pensei que seria legal se mais gente que as vezes tá sozinha quisesse se juntar. Porque acharia legal parar na rua pra tomar um café, as vezes as pessoas só caminham, tem pressa e nem olham direito o que tá em volta, as pessoas…

DADOS ESPECÍFICOS Data e duração: 16/05 - quarta-feira de manhã, das 9:30 - 11h, na hora do lanche matutino. Montagem: transportar elementos - com ajuda de mais um amigo: 3 sacolas: 1 -duas térmicas, cestinhas, plásticos, guardanapos, decoração; 2 - frutas, açúcar; 3- broas na cestinha, bolo com pote, bacia(1-2) para frutas...


a intervenção:

ELEMENTOS COMPONDO A CENA:

BOLO DE CENOURA FRUTAS

TÉRMICAS DE CAFÉ e lEITE

AÇUCAREIRO BROA DE MILHO BISCOITINHO DE POLVILHO TOALHA DE MESA XADREZ

TALHERES E COPINHOS GUARDANAPO JORNAL FOLHA DE SAO PAULO

DURANTE


a intervenção: COMO FOI? - Registro geral e relatos específicos de cada personagem A intervenção pode ser dividida me três momentos: Inicial, combinando a montagem da mesa e o mais fresco clima da manhã. Foi aí que ocorreram as trocas mais intensas; Segundo momento, quando a turma de conhecidos se juntou as poucos em volta e acabou inibindo aproximações de estranhos; Final, quando as movimentações em volta da mesa voltaram a ficar mais rarefeitas e novos transeuntes decidiram passar, num fim de manhã já decretado, pra matar a pré-fome do almoço ou trocar algumas palavras.

DURANTE CARMEN E AFRÂNIO

Não sei se Carmen e Afrânio se conheciam, mas acabaram interagindo entre si enquanto eu continuava a montar a mesa. Carmen queria muito tirar uma foto e Afrânio estava ajudando ela. Até que ele propôs uma foto de todos e tirou um “selfie” de nós três: “Aê, uma foto pro café da Julia!”. Foi uma boa dupla dinâmica para o início.

Um casal apareceu, pareciam mais simples. Ele pediu sério: “me vê um café com leite e um pedaço de bolo”. Falei “claro? E você, aceita um pedaço?”. A moça recusou timidamente. Ao final da refeição o moço perguntou “quanto que deu?”. Expliquei que era de graça, que eu nao estava vendendo, estava dando. Os dois ficaram meio boquiabertos e felizes. Perguntei de novo. A moça sorriu e aceitou.

VENDEDOR DE TATARECOS DA ESQUINA

AFRÂNIO

Afrânio foi o primeiro dos passantes a frear o passo e parar ali do meu lado pra saber o que estava acontecendo. Eu tinha acabado de começar a me instalar e nem imaginava alguém já se aproximando. Mas a toalha xadrez, já posta, e uma sacola de piquenique talvez tenham me denunciado antes do tempo. Afrânio nem tinha fome, demorou a pegar meio pedacinho de bolo. Falei que tinha café também, café preto mesmo. Ele ficou surpreso e aceitou. Estava bem curioso, perguntou meu nome e o que eu estava buscando. Foi super amigável e eu me animei em dizer que estava com a manhã livre, e por isso quis montar essa mesa ali, por onde passava várias vezes e sentia falta de coisas assim, mais coletivas e convidativas (lembrando que essa era parte da performance). Me elogiou muito e agradeceu pela gentileza do café.

HOMEM E MULHER.

Veio pegar bolo, agradeceu, depois conversou comigo e pediu explicações sobre o que era aquilo. Falei que faltavam lugares pra descansar no centro, pra parar e comer alguma coisa nossa, que não fosse comprada nos cafés de lá. Ele falou que faltava mesmo, que não tinha muito sombra. Eu comentei sobre a praça XV, que lá tem sombra, mas que é um pouco fora dos caminhos que fazemos no centro, “não vamos lá só pra descansar um pouco e voltar”, falei. Ele concordou! Parecia que fazia muito sentido o que eu estava falando e ele pareceu satisfeito em ter chegado a essa conclusão junto. Depois disse pro seu amigo ir lá e pegar um pedaço de bolo também.

CARMEN

Carmen chegou em seguida, quando Afrânio ainda estava ali. Foi tão otimista quanto ele, ou mais. Ficou muito feliz com o que encontrou. Me perguntou também sobre a iniciativa e ficou encantada. Senti seu carinho. Me agradeceu: “Julia, mas que coisa mais linda! Faltam coisas assim, que benção ter encontrado esse seu café hoje! Ganhei meu dia!”. E disse: “Mas vamos tirar uma foto, isso precisa ser divulgado…. como fazemos pra divulgar?”.

VENDEDOR DE FIGURINHAS O moço vendia figurinhas do álbum da copa e estava instalado na mesa redonda de concreta menor, que fica encostada na mesa redonda maior em que eu me instalava. Perguntei pra ele se tudo bem eu colocar a mesa ali naquela mesa ao seu lado. Ele pareceu meio desconfiado e não muito contente, mas aceitou. Tentei mais de uma vez oferecer pra ele um café, um bolo… Mas não teve jeito, esse não amaciou. Nem uma pergunta sobre o que eu estava fazendo, nem parou pra sentar durante toda a manhã.

AMIGO DO VENDEDOR

O amigo do vendedor da esquina se aproximou e também aceitou bolo.

TURMA TODA

Vou colocar a turma de conhecidos num só personagem porque acredito que o seu saber sobre a intervenção tenha impedido afetos e estranhezas semelhantes aos dos outros passantes, e tenha causado no grupo um efeito comun. Usufruíram do café e trocaram boas conversas comigo e entre si. Sentaram em volta das mesas. Estavam todos naquele mesmo dia realizando suas intervenções e por isso o ponto de encontro acabou sendo a mesa de café que eu montei. Mais uma vez, a mesa de café, o conhecido ritual de pausa e encontro, mostrando sua força. Aconteceu que com a chegada do pessoal da turma, a intervenção mudou um poucos de ares e as pessoas deixaram de se aproximar como no início.


a intervenção: PAULO, MORADOR DE RUA E PROFESSOR DE HISTÓRIA

Paulo apareceu pra pegar um bolo. Mas até esqueceu do bolo e levou um de meus amigos pra dar uma volta na praça e na catedral. Foi contar suas histórias de cidade, dar sua aula-tour. Quando voltou, quis continuar a aula pra todos da turma que estavam por ali. Ao final pediu dinheiro para ajudar no seu transporte e alimentação. Disse que tinha uma entrevista de emprego em Paulo Lopes. Muitos ajudaram. No final tive que lembrar ele de pegar o bolo, que ele já ia esquecendo. Quando Paulo saiu, o vendedor de figurinhas falou dele pra mim, de uma forma que considerei preconceituosa e pejorativa. Senti as tensões do espaço. Até então estavam todos só tranquilos e iguais perante o café.

DURANTE PESSOAL DA BANDA DE PORTO ALEGRE

Chegou esse pessoal quando achei que já nada mais iria acontecer em volta da mesa. Estavam procurando um lugar pra iniciar a tocar no calçadão, carregados de instrumentos. Um a um, alternadamente, se aproximaram aceitando café. Aceitaram uma rasa explicação sobre o motivo do café e se deixaram pra conversas leves de cotidiano ali comigo. Um deles gravou um vídeo no celular e dizia: “chegamos aqui em Floripa e encontramos já de cara um café solidário aqui no centro…”

TIO DA NANDA

Conhecido também da turma, já situado do que se tratava a intervenção, aproximou-se pra prestigiar a ação, tomar um café preto e trocar assuntos sobre a vida profissional.

SENHOR DA CONVERSA HOMEM MORADOR DE RUA

Aceitou café e bolo, desejou um bom dia e a benção depois.

MOÇA LOIRA

Moça loira, que catou comida no lixo e depois veio até a mesa, moradora de rua. “Que deus te abençõe!”, disse ao sair.

Por fim, a última aparição no café. Esse cara mais velhinho e com fala já mais arrastada que interessou-se mais pelo jornal. Não quis comer e não quis café. Contou histórias antigas de sua vida no campo, numa parte antes rural da cidade , que hoje já está tomada por grandes edifícios. Lamentou-se pelo tempo que passou. Leu alguma manchete do jornal e disse que o Brasil não está tão mal quanto países como a Síria.


a intervenção: CONCLUSÕES SOBRE A INTERVENÇÃO ANÁLISE DAS ESCOLHAS - O que faria diferente? -

O movimento de atração das pessoas acredito que poderia ter sido maior se a intervenção tivesse iniciado mais cedo, junto com o início do comércio, abrangendo também o primeiro horário de café da manhã no centro. Da maneira que foi, acabou servindo de café de meio de manhã e no instante seguinte já nos aproximávamos do horário do almoço, quando muitas pessoas já não estão mais interessadas em café. Outro fator relevante foi a presença de um grande grupo de pessoas conhecidas. Para maior interação com pessoas de fora é melhor apresentar-se de maneira mais aberta e mesmo mais vulnerável. Quando sente-se a existência de um grupo ao redor da intervenção, o acontecimento acaba adquirindo um caráter mais privativo que inibe os demais. Um fator bem positivo, pensando na ação como promotora de empatia e troca, foi a posição favorável que eu pude ocupar: eu não estava tentando vender nada, não estava pedindo nenhum dinheiro ou doação. Estava ali, pelo contrário, oferecendo quitutes de café, calmaria e tempo que muitas rotinas não encontram, e uma possível troca de ideias. Ou seja, de muitas formas meu papel performático foi ser convidativa sem exigir nada em troca dos passante. Este papel me permitiu agir em paralelo a certas tensões sociais presentes no meio. De forma quase que fictícia, pude interagir com diversos polos sem expor-me para além da capa performática que foi minha ferramenta e também minha proteção psicológica. Não foi necessário confrontar, convencer, defender um lado ou outro. No geral, não se aproximaram pessoas incomodadas com o feito, somente as mais receptivas do co café mostrado.

DEPOIS ANÁLISE DOS EFEITOS De modo geral, o maior ganho que obtive com a realização foi individual. A troca que estabeleci com os que se aproximaram para interagir foi um exercício de diálogo e de aproximação de realidades que só conheço de longe ou em papel. Que efeito percebo sobre as pessoas afetadas pela ação? O questionamento que ficou em aberto, em muitos dos que passaram ali é o que pode haver de mais frutífero dos resultados coletivos da ação. A estranheza e o não entendimento do que viram e vivenciaram pode ter mexido um pouco com o imaginário que têm sobre aquele lugar da cidade. Por outro lado, acredito que o efeito mais imediato e que deve ter ficado para a maioria das pessoas, ao menos num primeiro plano, foi a ideia daquele conhecido lema: “gentileza gera gentileza”. Pela gratidão que senti de muitos, percebi que o café caiu-lhes como um agrado, um gesto de solidariedade e ternura. Neste sentido, questiono se a mais profunda motivação para a intervenção - ideia de mostrar ausência das atmosfera de lar no centro - não se perdeu entre as tentativas de convite. Lembrando dos incomodos iniciais registrados no percurso de deriva, percebo que quase sem querer acabei tentando responder toda a aridez e hostilidade do espaço com o que pra mim sempre foi o centro das emoções da acolhimento: uma xícara quente, numa mesa redonda vestida de toalha e comidas gostosas, cercada por pessoas que compartilham da mesma apreciação.


a intervenção: DE QUE SERVE AGORA? Entendendo a intervenção como ferramenta de investigação, entendi que as pessoas do centro custam a sentar-se. Não acredito que seja só porque faltem bancos, mas sim por uma conjuntura de afetos que inibem a prática. Entendi que o centro tem mesmo muitas cores e muitas classes sociais, concentrando classes de renda mais humildes e médias e que a troca entre elas é meramente comercial. Para onde nos lança então essa análise? Pensando nesta intervenção como uma etapa de um processo maior, identifico algumas possíveis continuidades: na disciplina da graduação atual: Continuar o as intervenções ou proposições espaciais buscando aproximação dos diferentes em espaço público; pensar em fomentos a espaços de debate no centro sobre a questão de moradias no centro ou, ainda, propor espaços ou projetos que tragam para o lugar proximidades funcionais às de uma casa. na formação da arquiteta e urbanista: Considerar intervenções e ações em pequena escala como maneiras de apropriar-se com mais consciência e coerência as questões chaves com as quais se busque trabalhar, sendo isso parte constituinte ou não de um sequencia propositiva maior. na experiencia da cidade: Praticar cafés como este em outras cidades de visita, ou em outros cantos da nossa cidade, ou em outros dias da semana. Usar do café ou de outros gatilhos de encontro como ferramenta de aproximação dos mundos e realidades que as vezes não nos são confortáveis e conhecidos. Usar dessa ferramenta para sentir-se em casa no ambiente da rua e inspirar mais pessoas a sentirem o mesmo.

DEPOIS



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