DSM V - parte 4

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Abstinência de Sedativos, Hipnóticos ou Ansiolíticos 557 ser mais bem explicados por outro transtorno mental (Critério D). A intoxicação pode ocorrer em indivíduos cujo uso se dá por meio de prescrição, que estão tomando medicamentos emprestados de amigos ou parentes ou que consomem a substância deliberadamente com a finalidade de intoxicação.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico As características associadas incluem a administração de medicamentos em doses superiores às prescritas, administração de múltiplos medicamentos diferentes ou mistura de agentes sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos com álcool, o que pode aumentar acentuadamente os efeitos desses agentes.

Prevalência A prevalência da intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos na população em geral não está clara. Contudo, é provável que a maioria dos usuários de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos sem fins medicinais em algum momento apresente sinais ou sintomas que satisfaçam os critérios para intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos; nesse caso, então, a prevalência do uso de tais agentes sem fins medicinais na população em geral pode ser semelhante à prevalência da intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. Por exemplo, tranquilizantes são utilizados sem fins medicinais por 2,2% dos norte-americanos com idade superior aos 12 anos.

Diagnóstico Diferencial Transtornos por uso de álcool. Como as apresentações clínicas podem ser idênticas, distinguir a intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos dos transtornos por uso de álcool requer evidências da ingestão recente de medicamentos sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos por meio de autorrelato, relato de outras pessoas, ou exames toxicológicos. Muitos indivíduos que fazem mau uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos podem também fazer mau uso de álcool e de outras substâncias, e, portanto, é possível o diagnóstico de intoxicação por múltiplas substâncias. Intoxicação por álcool. A intoxicação por álcool pode ser distinguida da intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos pelo odor de álcool no hálito. Caso contrário, as características dos dois transtornos podem ser semelhantes. Outros transtornos induzidos por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. A intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos distingue-se de outros transtornos induzidos por tais agentes (p. ex., transtorno de ansiedade induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos com início durante a abstinência) porque os sintomas desses transtornos predominam na apresentação clínica e são suficientemente graves para justificar atenção clínica. Transtornos neurocognitivos. Em situações em que há comprometimento cognitivo, lesão cerebral traumática e delirium decorrentes de outras causas, sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos podem causar intoxicação em doses bastante baixas. O diagnóstico diferencial nesses contextos complexos baseia-se na síndrome predominante. Um diagnóstico adicional de intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos pode ser adequado mesmo se a substância tiver sido ingerida em baixa dosagem no caso dessas condições concomitantes (ou condições semelhantes).

Abstinência de Sedativos, Hipnóticos ou Ansiolíticos Critérios Diagnósticos A. Cessação (ou redução) do uso prolongado de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. B. Dois (ou mais) dos seguintes sintomas, desenvolvidos no prazo de várias horas a alguns dias após a cessação (ou redução) do uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos descrita no Critério A: 1. Hiperatividade autonômica (p. ex., sudorese ou frequência cardíaca superior a 100 bpm).


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

2. Tremor nas mãos. 3. Insônia. 4. Náusea ou vômito. 5. Alucinações ou ilusões visuais, táteis ou auditivas transitórias. 6. Agitação psicomotora. 7. Ansiedade. 8. Convulsões do tipo grande mal. C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância. Especificar se: Com perturbações da percepção: Este especificador pode ser indicado quando ocorrem alucinações com teste de realidade intacto ou ilusões auditivas, visuais ou táteis na ausência de delirium. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.0. O código da CID-10-MC para abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos depende da existência de transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos moderado ou grave comórbido e de haver ou não perturbações da percepção. Para abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos sem perturbações da percepção, o código da CID-10-MC é F13.239. Para abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos com perturbações da percepção, o código da CID-10-MC é F13.232. Observe que os códigos da CID-10MC indicam a presença comórbida de um transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos moderado ou grave, refletindo o fato de que a abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos pode ocorrer apenas na presença de um transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos moderado ou grave. Não é permitido codificar um transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos leve comórbido com abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos.

Nota: Para informações sobre Desenvolvimento e Curso; Fatores de Risco e Prognóstico; Questões Diagnósticas Relativas à Cultura; Consequências Funcionais da Abstinência de Sedativos, Hipnóticos ou Ansiolíticos; e Comorbidade, consultar as seções correspondentes em transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos.

Características Diagnósticas A característica essencial da abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos é a presença de uma síndrome típica que se desenvolve em resposta a uma diminuição acentuada ou cessação do consumo após várias semanas ou mais de uso regular (Critérios A e B). Essa síndrome de abstinência é caracterizada por dois ou mais sintomas (similar à abstinência de álcool) que incluem hiperatividade autonômica (p. ex., aumentos na frequência cardíaca, frequência respiratória, pressão arterial ou temperatura corporal, juntamente com sudorese); tremor das mãos; insônia; náusea, acompanhada ocasionalmente por vômito; ansiedade; e agitação psicomotora. Uma convulsão do tipo grande mal pode ocorrer em até 20 a 30% dos indivíduos que passam por uma abstinência não tratada dessas substâncias. Na abstinência grave, alucinações ou ilusões visuais, táteis ou auditivas podem ocorrer, mas estão geralmente inseridas no contexto de delirium. Se o teste de realidade da pessoa estiver intacto (i.e., ela sabe que a substância está causando as alucinações), e as ilusões ocorrerem em um sensório claro, o especificador “com perturbações da percepção” pode ser incluído. Quando as alucinações ocorrem na ausência de teste de realidade intacto, deve-se considerar o diagnóstico de transtorno psicótico induzido por substância/ medicamento. Os sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério C). Os sintomas não podem ser atribuíveis a outra condição médica nem ser mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., abstinência de álcool ou transtorno de ansiedade generalizada) (Critério D). O alívio dos sintomas de abstinência com a administração de qualquer agente sedativo-hipnótico apoia um diagnóstico de abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos.


Abstinência de Sedativos, Hipnóticos ou Ansiolíticos 559

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O momento e a gravidade da síndrome de abstinência serão diferentes conforme a substância específica e sua farmacocinética e farmacodinâmica. Por exemplo, a abstinência de substâncias de ação mais curta que são rapidamente absorvidas e que não têm metabólitos ativos (p. ex., triazolam) pode se iniciar no prazo de horas após a interrupção de uso da substância; a abstinência de substâncias com metabólitos de ação prolongada (p. ex., diazepam) pode começar somente após 1 a 2 dias, ou seu início demorar ainda mais. A síndrome de abstinência produzida por substâncias nessa classe pode ser caracterizada pelo desenvolvimento de delirium possivelmente letal. Há evidências de tolerância e abstinência na ausência de um diagnóstico de transtorno por uso de substância quando da descontinuação abrupta de benzodiazepínicos administrados durante períodos prolongados em doses terapêuticas com prescrição médica. Contudo, os códigos da CID-10-MC permitem o diagnóstico de abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos apenas na presença comórbida de um transtorno por uso de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos de moderado a grave. O curso temporal da síndrome de abstinência em geral é previsto pela meia-vida da substância. Os medicamentos cujos efeitos geralmente duram cerca de 10 horas ou menos (p. ex., lorazepam, oxazepam, temazepam) produzem sintomas de abstinência no prazo de 6 a 8 horas após a diminuição dos níveis sanguíneos, atingindo um pico de intensidade no segundo dia e melhorando acentuadamente por volta do quarto ou quinto dia. No caso de substâncias com meia-vida mais longa (p. ex., diazepam), os sintomas podem não se desenvolver antes de haver decorrido uma semana, alcançando uma intensidade máxima durante a segunda semana, e diminuindo acentuadamente por volta da terceira ou quarta semana. Pode haver sintomas adicionais mais duradouros em um nível de intensidade muito menor, os quais persistem durante vários meses. Quanto mais tempo a substância tiver sido consumida e quanto maiores as doses utilizadas, maior a probabilidade de haver abstinência grave. Contudo, há relatos de abstinência com apenas 15 mg de diazepam (ou seu equivalente de outros benzodiazepínicos) com uso diário por vários meses. Doses diárias de aproximadamente 40 mg de diazepam (ou seu equivalente) têm mais probabilidade de produzir sintomas de abstinência clinicamente significativos, e doses ainda maiores (p. ex., 100 mg de diazepam) apresentam maior propensão a serem seguidas por convulsões ou delirium por abstinência. O delirium por abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos caracteriza-se por perturbações na consciência e na cognição, com alucinações visuais, táteis ou auditivas. Quando presente, o delirium por abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos deve ser diagnosticado em vez de abstinência.

Prevalência A prevalência da abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos não está clara.

Marcadores Diagnósticos Convulsões e instabilidade autonômica no caso de história de exposição prolongada a medicamentos sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos sugerem grande probabilidade de abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos.

Diagnóstico Diferencial Outras condições médicas. Os sintomas de abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos podem ser mimetizados por outras condições médicas (p. ex., hipoglicemia, cetoacidose diabética). Se convulsões forem uma característica da abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos, o diagnóstico diferencial inclui as diversas causas de convulsões (p. ex., infecções, traumatismo craniano, envenenamentos). Tremor essencial. Tremor essencial, um transtorno geralmente familiar, pode sugerir equivocadamente o tremor associado à abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Abstinência de álcool. A abstinência de álcool produz uma síndrome muito semelhante à da abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. Outros transtornos induzidos por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. A abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos distingue-se dos outros transtornos induzidos por esses agentes (p. ex., transtorno de ansiedade induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos com início durante a abstinência) porque os sintomas desses transtornos predominam na apresentação clínica e são suficientemente graves para justificar atenção clínica. Transtornos de ansiedade. A recorrência ou o agravamento de um transtorno de ansiedade subjacente produz uma síndrome semelhante à abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos. Suspeita-se de abstinência com uma redução abrupta da dosagem de um medicamento sedativo, hipnótico ou ansiolítico. Quando a dose está sendo reduzida gradualmente, distinguir a síndrome de abstinência do transtorno de ansiedade subjacente pode ser difícil. Como ocorre com o álcool, sintomas residuais de abstinência (p. ex., ansiedade, flutuação do humor e dificuldades no sono) podem ser confundidos com ansiedade não induzida por medicamento/substância ou transtornos depressivos (p. ex., transtorno de ansiedade generalizada).

Outros Transtornos Induzidos por Sedativos, Hipnóticos ou Ansiolíticos Os seguintes transtornos induzidos por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos são descritos em outros capítulos do Manual, juntamente aos transtornos com os quais compartilham fenomenologia (consultar transtornos mentais induzidos por substância/medicamento nestes capítulos): transtorno psicótico induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Espectro da Esquizofrenia e Outros Transtornos Psicóticos”); transtorno bipolar induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Transtorno Bipolar e Transtornos Relacionados”); transtorno depressivo induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Transtornos Depressivos”); transtorno de ansiedade induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Transtornos de Ansiedade”); transtorno do sono induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Transtornos do Sono-Vigília”); disfunção sexual induzida por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Disfunções Sexuais”); e transtorno neurocognitivo maior ou leve induzido por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos (“Transtornos Neurocognitivos”). Para delirium por intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos e delirium por abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos, ver os critérios e a abordagem de delirium no capítulo “Transtornos Neurocognitivos”. Esses transtornos induzidos por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos são diagnosticados em lugar de intoxicação por sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos ou abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos apenas quando os sintomas são suficientemente graves para justificar atenção clínica independente.

Transtorno Relacionado a Sedativos, Hipnóticos ou Ansiolíticos Não Especificado 292.9 (F13.99) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno relacionado a sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno relacionado a sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos específico nem para outro transtorno na classe diagnóstica de transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos.


Transtorno por Uso de Estimulantes 561

Transtornos Relacionados a Estimulantes Transtorno por Uso de Estimulantes Intoxicação por Estimulantes Abstinência de Estimulantes Outros Transtornos Induzidos por Estimulantes Transtorno Relacionado a Estimulantes Não Especificado

Transtorno por Uso de Estimulantes Critérios Diagnósticos A. Um padrão de uso de substância tipo anfetamina, cocaína ou outro estimulante levando a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por pelo menos dois dos seguintes critérios, ocorrendo durante um período de 12 meses: 1. O estimulante é frequentemente consumido em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido. 2. Existe um desejo persistente ou esforços malsucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso de estimulantes. 3. Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção do estimulante, em utilização, ou na recuperação de seus efeitos. 4. Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar o estimulante. 5. Uso recorrente de estimulantes resultando em fracasso em cumprir obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa. 6. Uso continuado de estimulantes apesar de problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados pelos efeitos do estimulante. 7. Importantes atividades sociais, profissionais ou recreacionais são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso de estimulantes. 8. Uso recorrente de estimulantes em situações nas quais isso representa perigo para a integridade física. 9. O uso de estimulantes é mantido apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pelo estimulante. 10. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos: a. Necessidade de quantidades progressivamente maiores do estimulante para atingir a intoxicação ou o efeito desejado. b. Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade do estimulante. Nota: Este critério não é considerado em indivíduos cujo uso de medicamentos estimulantes se dá unicamente sob supervisão médica adequada, como no caso de medicação para transtorno de déficit de atenção/hiperatividade ou narcolepsia. 11. Abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos: a. Síndrome de abstinência característica para o estimulante (consultar os Critérios A e B do conjunto de critérios para abstinência de estimulantes, p. 569). b. O estimulante (ou uma substância estreitamente relacionada) é consumido para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência. Nota: Este critério é desconsiderado em indivíduos cujo uso de medicamentos estimulantes se dá unicamente sob supervisão médica adequada, como no caso de medicação para transtorno de déficit de atenção/hiperatividade ou narcolepsia.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Especificar se: Em remissão inicial: Após todos os critérios para transtorno por uso de estimulantes terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de estimulantes foi preenchido durante um período mínimo de três meses, porém inferior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar o estimulante”, ainda pode ocorrer). Em remissão sustentada: Após todos os critérios para transtorno por uso de estimulantes terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de estimulantes foi preenchido em nenhum momento durante um período igual ou superior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar o estimulante”, ainda pode ocorrer). Especificar se: Em ambiente protegido: Este especificador adicional é usado se o indivíduo encontra-se em um ambiente no qual o acesso a estimulantes é restrito. Código baseado na gravidade atual: Nota para os códigos da CID-10-MC: Se também houver intoxicação por anfetamina, abstinência de anfetamina ou outro transtorno mental induzido por anfetamina, não utilizar os códigos abaixo para transtorno por uso de anfetamina. No caso, o transtorno por uso de anfetamina comórbido é indicado pelo 4o caractere do código de transtorno induzido por anfetamina (ver a nota para codificação para intoxicação por anfetamina, abstinência de anfetamina ou um transtorno mental induzido por anfetamina específico). Por exemplo, se houver comorbidade de transtorno depressivo induzido por substância tipo anfetamina ou outros estimulantes com transtorno por uso de substância tipo anfetamina ou outros estimulantes, apenas o código para transtorno depressivo induzido por substância tipo anfetamina ou outros estimulantes é fornecido, sendo que o 4o caractere indica se o transtorno por uso de substância tipo anfetamina ou outros estimulantes comórbido é leve, moderado ou grave: F15.14 para transtorno por uso de substância tipo anfetamina ou outros estimulantes leve com transtorno depressivo induzido por substância tipo anfetamina ou outros estimulantes ou F15.24 para transtorno por uso de substância tipo anfetamina ou outros estimulantes moderado ou grave com transtorno depressivo induzido por substância tipo anfetamina ou outros estimulantes. De modo semelhante, se houver transtorno depressivo induzido por cocaína comórbido com transtorno por uso de cocaína, apenas o código para transtorno depressivo induzido por cocaína deve ser fornecido, sendo que o 4o caractere indica se o transtorno por uso de cocaína comórbido é leve, moderado ou grave: F14.14 para transtorno por uso de cocaína leve com transtorno depressivo induzido por cocaína ou F14.24 para transtorno por uso de cocaína moderado ou grave com transtorno depressivo induzido por cocaína. Especificar a gravidade atual: Leve: Presença de 2 ou 3 sintomas. 305.70 (F15.10):Substância tipo anfetamina 305.60 (F14.10):Cocaína 305.70 (F15.10):Outro estimulante ou estimulante não especificado Moderada: Presença de 4 ou 5 sintomas. 304.40 (F15.20):Substância tipo anfetamina 304.20 (F14.20):Cocaína 304.40 (F15.20):Outro estimulante ou estimulante não especificado Grave: Presença de 6 ou mais sintomas. 304.40 (F15.20):Substância tipo anfetamina 304.20 (F14.20):Cocaína 304.40 (F15.20):Outro estimulante ou estimulante não especificado

Especificadores “Em ambiente protegido” aplica-se como um especificador a mais de remissão se o indivíduo estiver tanto em remissão como em um ambiente protegido (i.e., em remissão inicial em ambiente protegido ou em remissão sustentada em ambiente protegido). Exemplos desses ambientes incluem prisões rigorosamente vigiadas e livres de substâncias, comunidades terapêuticas ou unidades hospitalares fechadas.


Transtorno por Uso de Estimulantes 563

Características Diagnósticas A anfetamina e os estimulantes tipo anfetamina incluem substâncias com uma estrutura de feniletilamina substituída, tais como anfetamina, dextroanfetamina e metanfetamina. Também se incluem substâncias estruturalmente diferentes, mas que apresentam efeitos semelhantes, como metilfenidato. Essas substâncias em geral são consumidas via oral ou intravenosa, embora a metanfetamina também seja consumida por via nasal. Além dos compostos sintéticos do tipo anfetamina, existem estimulantes naturais, extraídos de plantas, como o khât. Anfetaminas e outros estimulantes podem ser obtidos por meio de receita médica para o tratamento de obesidade, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e narcolepsia. Consequentemente, estimulantes com prescrição podem ser desviados para o mercado negro. Os efeitos de anfetaminas e substâncias do tipo anfetamina são semelhantes aos efeitos da cocaína, de forma que os critérios para transtorno por uso de estimulantes são apresentados aqui como um único transtorno com a capacidade de especificar o estimulante em questão usado pelo indivíduo. A cocaína pode ser consumida por meio de diversas preparações (p. ex., folhas de coca, pasta de coca, cloridrato de cocaína e alcaloides de cocaína, tais como cocaína freebase e crack) que diferem em potência devido a variados níveis de pureza e de rapidez de início dos efeitos. Contudo, em todas as formas da substância, a cocaína é o ingrediente ativo. O pó de cloridrato de cocaína geralmente é “cheirado” através das narinas ou dissolvido em água e injetado via intravenosa. Indivíduos expostos a estimulantes tipo anfetamina ou cocaína podem desenvolver transtorno por uso de estimulantes em apenas uma semana, embora o início nem sempre seja tão rápido. Independentemente da via de administração, ocorre tolerância com o uso repetido. Sintomas de abstinência, em particular hipersonia, aumento do apetite e disforia, podem ocorrer e intensificar a fissura pela droga. A maioria dos indivíduos com transtorno por uso de estimulantes experimentou tolerância ou abstinência. Os padrões de uso e o curso são semelhantes entre transtornos envolvendo estimulantes tipo anfetamina e cocaína, já que ambas as substâncias são potentes estimulantes do sistema nervoso central com efeitos psicoativos e simpatomiméticos semelhantes. Estimulantes tipo anfetamina têm ação mais prolongada que cocaína e, portanto, são usados menos vezes por dia. O uso pode ser crônico ou episódico, com momentos de consumo compulsivo intercalados por períodos breves sem uso. Comportamento agressivo ou violento é comum quando doses altas são fumadas, ingeridas ou administradas via intravenosa. Ansiedade temporária intensa que lembra transtorno de pânico ou transtorno de ansiedade generalizada, bem como ideação paranoide e episódios psicóticos que lembram esquizofrenia, são observados com o uso de dosagens elevadas. Os estados de abstinência estão associados a sintomas depressivos temporários, porém intensos, que podem se assemelhar a episódio depressivo maior; os sintomas depressivos geralmente se resolvem em uma semana. A tolerância a estimulantes tipo anfetamina se desenvolve e leva a doses progressivamente maiores. No entanto, alguns usuários de estimulantes tipo anfetamina desenvolvem sensibilização, caracterizada por intensificação dos efeitos.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Quando injetados ou fumados, os estimulantes geralmente produzem uma sensação imediata de bem-estar, autoconfiança e euforia. Alterações comportamentais drásticas podem se desenvolver rapidamente com o transtorno por uso de estimulantes. Comportamento caótico, isolamento social, comportamento agressivo e disfunção sexual podem resultar do transtorno por uso de estimulantes de longo prazo. Indivíduos com intoxicação aguda podem apresentar fuga de ideias, cefaleia, ideias de referência transitórias e zumbido. Pode haver ideação paranoide, alucinações auditivas com sensório claro e alucinações táteis, as quais o indivíduo normalmente reconhece como os efeitos da droga. Ameaças e manifestação de comportamento agressivo podem ocorrer. Depressão, ideação suicida, irritabilidade, anedonia, instabilidade emocional ou perturbações na atenção e na concentração ocorrem com frequência durante a abstinência. Perturbações mentais associadas ao uso da cocaína geralmente se resolvem em um prazo de horas a dias após a interrupção do uso, mas podem per-


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

sistir durante um mês. Alterações fisiológicas durante a abstinência de estimulantes são opostas às da fase de intoxicação e às vezes incluem bradicardia. Sintomas depressivos temporários podem satisfazer os critérios de sintomas e de duração para um episódio depressivo maior. História consistente com ataques de pânico repetidos, comportamento semelhante a transtorno de ansiedade social (fobia social) e síndromes semelhantes à ansiedade generalizada são comuns, bem como transtornos alimentares. Um exemplo extremo da toxicidade de estimulantes é o transtorno psicótico induzido por estimulantes, um transtorno que se assemelha à esquizofrenia, com delírios e alucinações. Indivíduos com transtorno por uso de estimulantes costumam desenvolver respostas condicionadas a estímulos relacionados a drogas (p. ex., fissura pela droga ao ver uma substância em forma de pó branco). Essas respostas contribuem para a recaída, são difíceis de eliminar e persistem após a desintoxicação. Sintomas depressivos com ideação ou comportamento suicida podem ocorrer e geralmente constituem os problemas mais graves durante a abstinência de estimulantes.

Prevalência Transtorno por uso de estimulantes: estimulantes tipo anfetamina. Estima-se que a prevalência de 12 meses do transtorno por uso de estimulantes tipo anfetamina nos Estados Unidos seja de 0,2% na faixa etária dos 12 aos 17 anos e de 0,2% entre indivíduos a partir dos 18 anos. As taxas são similares entre homens e mulheres adultos (0,2%), mas, dos 12 aos 17 anos, a taxa para meninas (0,3%) é superior à taxa para meninos (0,1%). O uso de estimulantes via intravenosa apresenta uma proporção entre os sexos masculino e feminino de 3:1 ou de 4:1, mas as taxas são mais equilibradas entre usuários que não injetam a substância, sendo que indivíduos do sexo masculino constituem 54% das internações primárias para tratamento. A prevalência de 12 meses é maior dos 18 aos 29 anos (0,4%) em comparação com a faixa dos 45 aos 64 anos (0,1%). No caso de indivíduos dos 12 aos 17 anos, as taxas mais altas são de brancos e afro-americanos (0,3%) em comparação a hispânicos (0,1%) e asiático-americanos e nativos das ilhas do Pacífico (0,01%), sendo que o transtorno por uso de estimulantes tipo anfetamina é praticamente nulo entre índios norte-americanos. Entre adultos, as taxas mais altas são de índios norte-americanos e nativos do Alasca (0,6%) em comparação com brancos (0,2%) e hispânicos (0,2%), sendo que o transtorno por uso de estimulantes tipo anfetamina é praticamente nulo entre afro-americanos e asiático-americanos e nativos das ilhas do Pacífico. O uso de estimulantes de prescrição sem receita médica no ano anterior ocorreu entre 5 e 9% das crianças até o ensino médio, sendo que 5 a 35% das pessoas em idade universitária relataram uso no ano anterior. Transtorno por uso de estimulantes: cocaína. Estima-se que a prevalência de 12 meses do transtorno por uso de cocaína nos Estados Unidos seja de 0,2% na faixa etária dos 12 aos 17 anos e de 0,3% entre indivíduos a partir dos 18 anos. As taxas são mais elevadas entre o sexo masculino (0,4%) do que o feminino (0,1%). As taxas mais altas estão entre os 18 e os 29 anos (0,6%), e as mais baixas, dos 45 aos 64 anos (0,1%). Em adultos, os índices são maiores entre índios norte-americanos (0,8%) em comparação com afro-americanos (0,4%), hispânicos (0,3%), brancos (0,2%) e asiático-americanos e nativos das ilhas do Pacífico (0,1%). Em contrapartida, dos 12 aos 17 anos, as taxas são semelhantes entre hispânicos (0,2%), brancos (0,2%) e asiático-americanos e nativos das ilhas do Pacífico (0,2%) e mais baixas entre afro-americanos (0,02%), sendo que o transtorno por uso de cocaína é praticamente inexistente entre índios norte-americanos e nativos do Alasca.

Desenvolvimento e Curso Os transtornos por uso de estimulantes ocorrem em todos os níveis da sociedade, e são mais comuns entre indivíduos dos 12 aos 25 anos em comparação àqueles a partir dos 26 anos de idade. O primeiro uso regular entre pessoas sob tratamento ocorre, em média, por volta dos 23 anos. No caso da primeira internação para tratamento primário do uso de metanfetamina, a média de idade é de 31 anos. Alguns indivíduos começam a usar estimulantes para controlar o peso ou para melhorar o desempenho na escola, no trabalho ou nos esportes, o que inclui obter medicamentos como metilfenidato ou sais de anfetamina prescritos para outras pessoas para o tratamento do transtorno


Transtorno por Uso de Estimulantes 565 de déficit de atenção/hiperatividade. O transtorno por uso de estimulantes pode se desenvolver rapidamente com a administração via intravenosa ou fumada; entre as internações primárias decorrentes do uso de estimulantes tipo anfetamina, 66% relataram fumar, 18% relataram injetar, e 10% relataram inalar. Os padrões de administração de estimulantes incluem uso episódico ou diário (ou quase diário). O uso episódico tende a ser intercalado com dois ou mais dias sem uso (p. ex., uso intenso durante um fim de semana ou em um ou mais dias da semana). “Compulsões” (binges) envolvem o uso contínuo de altas doses durante horas ou dias e frequentemente estão associadas à dependência física. As compulsões geralmente são interrompidas apenas quando acaba o estoque de estimulantes ou quando o indivíduo fica exausto. O uso diário crônico pode envolver doses altas ou baixas, frequentemente com aumento da dose ao longo do tempo. O fumar estimulantes e seu uso intravenoso estão associados a uma rápida progressão para transtorno por uso de estimulantes grave, geralmente com ocorrência ao longo de semanas a meses. O uso intranasal de cocaína e o uso oral de estimulantes tipo anfetamina resultam em uma progressão mais gradual, que leva meses a anos. Com o uso contínuo, há redução dos efeitos prazerosos, devido à tolerância, e aumento dos efeitos disfóricos.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. Comorbidade com transtorno bipolar, esquizofrenia, transtorno da personalidade antissocial e com outros transtornos por uso de substância é fator de risco para o desenvolvimento de transtorno por uso de estimulantes e para recaída do uso de cocaína em amostras de indivíduos sob tratamento. Impulsividade e traços semelhantes de personalidade também podem afetar os resultados do tratamento. Transtorno da conduta na infância e transtorno da personalidade antissocial na idade adulta estão associados ao desenvolvimento posterior de transtornos relacionados a estimulantes. Ambientais. Indicadores do uso de cocaína entre adolescentes incluem exposição pré-natal a cocaína, uso de cocaína pelos pais no período pós-natal e exposição à violência na comunidade durante a infância. No caso de jovens, especialmente do sexo feminino, os fatores de risco incluem viver em um ambiente doméstico instável, apresentar uma condição psiquiátrica e associar-se a usuários e fornecedores.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Transtornos derivados do uso de estimulantes afetam todos os grupos raciais/étnicos, socioeconômicos, etários e de gênero. As questões diagnósticas podem estar relacionadas a consequências sociais (p. ex., detenção, suspensões escolares ou do trabalho). Apesar de pequenas variações, os critérios diagnósticos do transtorno por uso de cocaína e outros estimulantes têm o mesmo desempenho em diferentes grupos raciais/étnicos e entre gêneros. O uso crônico de cocaína causa deficiência no funcionamento ventricular esquerdo do coração em afro-americanos. Aproximadamente 66% dos indivíduos com internação decorrente primariamente de transtornos relacionados a metanfetaminas/anfetaminas são brancos não hispânicos, seguidos por 21% de indivíduos de origem hispânica, 3% de asiáticos e nativos das ilhas do Pacífico e 3% de negros não hispânicos.

Marcadores Diagnósticos A benzoilecognina, um metabólito da cocaína, normalmente permanece na urina durante 1 a 3 dias depois de uma dose única e pode ficar presente durante 7 a 12 dias em indivíduos que usam altas doses repetidamente. Exames de função hepática levemente elevados podem estar presentes em usuários de cocaína injetável ou naqueles que fazem uso concomitante de álcool. Não há marcadores neurobiológicos de utilidade diagnóstica. A descontinuação do uso crônico de cocaína pode estar associada a alterações eletrencefalográficas, o que sugere anormalidade persistente; alterações nos padrões de secreção de prolactina; e downregulation dos receptores dopaminérgicos.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Estimulantes tipo anfetamina de meia-vida curta (MDMA [3,4-metilenodioximetanfetamina], metanfetamina) podem ser detectados durante 1 a 3 dias e possivelmente até 4 dias, dependendo da dosagem e do metabolismo. Amostras de cabelo podem ser usadas para detectar a presença de estimulantes tipo anfetamina por até 90 dias. Outros achados laboratoriais, bem como achados físicos e outras condições médicas (p. ex., perda de peso, desnutrição; má higiene), são semelhantes tanto para transtorno por uso de cocaína como por uso de estimulantes tipo anfetamina.

Consequências Funcionais do Transtorno por Uso de Estimulantes Diversas condições médicas podem ocorrer dependendo da via de administração. As pessoas que usam estimulantes por via intranasal frequentemente desenvolvem sinusite, irritação e sangramento da mucosa nasal e perfuração do septo nasal. Aquelas que fumam as substâncias apresentam maior risco de problemas respiratórios (p. ex., tosse, bronquite e pneumonite). As pessoas que injetam cocaína têm marcas e evidências de picadas em geral nos antebraços. O risco de infecção por HIV aumenta com injeções intravenosas frequentes e atividade sexual sem proteção. Observam-se também outras doenças sexualmente transmissíveis, hepatite, tuberculose e outras infecções pulmonares. Perda de peso e desnutrição são comuns. Dor torácica pode ser um sintoma comum durante a intoxicação por estimulantes. Infarto do miocárdio, palpitações e arritmias, morte súbita decorrente de parada respiratória ou cardíaca e acidentes vasculares cerebrais foram associados ao uso de estimulantes entre jovens e indivíduos que, a não ser pelo uso de drogas, eram saudáveis. Convulsões podem ocorrer com o uso de estimulantes. Pneumotórax pode resultar de manobras do tipo Valsalva, realizadas para melhor absorver a fumaça inalada. Traumatismos decorrentes de comportamento violento são comuns entre traficantes da droga. O uso de cocaína está associado a irregularidades no fluxo sanguíneo placentário, descolamento de placenta, contrações e parto prematuro e maior prevalência de bebês com baixo peso ao nascer. Indivíduos com transtorno por uso de estimulantes podem envolver-se em roubo, prostituição ou tráfico de drogas com a finalidade de adquirir drogas ou dinheiro para comprá-las. Comprometimento neurocognitivo é comum entre usuários de metanfetamina. Problemas de saúde bucal incluem meth mouth (boca de metanfetamina) com doença gengival, cáries e aftas relacionadas com os efeitos tóxicos de fumar a droga e com o bruxismo durante a intoxicação. Efeitos pulmonares adversos parecem ser menos comuns com estimulantes tipo anfetamina porque são fumados menos vezes por dia. Visitas à emergência são comuns em virtude de sintomas de transtornos mentais, ferimentos, infecções cutâneas e patologia dentária relacionados a estimulantes.

Diagnóstico Diferencial Transtornos mentais primários. Transtornos induzidos por estimulantes podem se assemelhar a transtornos mentais primários (p. ex., transtorno depressivo maior) (para abordagem desse diagnóstico diferencial, consultar “Abstinência de Estimulantes”). As perturbações mentais resultantes dos efeitos de estimulantes devem ser distinguidas dos sintomas de esquizofrenia; transtornos bipolares e depressivos; transtorno de ansiedade generalizada; e transtorno de pânico. Intoxicação por fenciclidina. A intoxicação por fenciclidina (“PCP”, ou “pó de anjo”) ou por drogas sintéticas como mefedrona (conhecida por nomes diferentes, incluindo “Miau Miau”) pode causar um quadro clínico semelhante e pode ser distinguida da intoxicação por estimulantes unicamente pela presença de metabólitos de cocaína ou de substância tipo anfetamina em uma amostra de urina ou plasma. Intoxicação por e abstinência de estimulantes. A intoxicação por e a abstinência de estimulantes distinguem-se dos outros transtornos induzidos por estimulantes (p. ex., transtorno de ansiedade com início durante a intoxicação) porque os sintomas desses transtornos predominam na apresentação clínica e são suficientemente graves para justificar atenção clínica independente.


Intoxicação por Estimulantes 567

Comorbidade Transtornos relacionados a estimulantes costumam ocorrer concomitantemente a outros transtornos por uso de substâncias, em especial os que envolvem substâncias com propriedades sedativas, as quais são consumidas para reduzir a insônia, o nervosismo e outros efeitos colaterais desagradáveis. Usuários de cocaína normalmente usam álcool, enquanto usuários de estimulantes tipo anfetamina costumam usar Cannabis. O transtorno por uso de estimulantes pode estar associado a transtorno de estresse pós-traumático, transtorno da personalidade antissocial, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e transtorno do jogo. Problemas cardiopulmonares costumam estar presentes em indivíduos que buscam tratamento para problemas relacionados à cocaína, sendo dor torácica o mais comum. Problemas médicos ocorrem em resposta a adulterantes usados como agentes de “mistura”. Usuários de cocaína que a ingerem misturada com levamisol, um medicamento antimicrobiano de uso veterinário, podem sofrer agranulocitose e neutropenia febril.

Intoxicação por Estimulantes Critérios Diagnósticos A. Uso recente de uma substância tipo anfetamina, cocaína ou outro estimulante. B. Alterações comportamentais ou psicológicas clinicamente significativas e problemáticas (p. ex., euforia ou embotamento afetivo; alterações na sociabilidade; hipervigilância; sensibilidade interpessoal; ansiedade, tensão ou raiva; comportamentos estereotipados; julgamento prejudicado) desenvolvidas durante ou logo após o uso de um estimulante. C. Dois (ou mais) dos seguintes sinais ou sintomas, desenvolvidos durante ou logo após o uso de estimulantes. 1. Taquicardia ou bradicardia. 2. Dilatação pupilar. 3. Pressão arterial elevada ou diminuída. 4. Transpiração ou calafrios. 5. Náusea ou vômito. 6. Evidências de perda de peso. 7. Agitação ou retardo psicomotor. 8. Fraqueza muscular, depressão respiratória, dor torácica ou arritmias cardíacas. 9. Confusão, convulsões, discinesias, distonias ou coma. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por outra substância. Especificar o intoxicante em questão (i.e., substância tipo anfetamina, cocaína ou outro estimulante). Especificar se: Com perturbações da percepção: Este especificador pode ser indicado quando alucinações ocorrem com teste de realidade intacto ou quando ilusões auditivas, visuais ou táteis ocorrem na ausência de delirium. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.89. O código da CID-10-MC depende de o estimulante ser uma anfetamina, cocaína ou outro estimulante; de haver comorbidade com transtorno por uso de anfetamina, cocaína ou outro estimulante; e da ocorrência de perturbações da percepção. Para intoxicação por anfetamina, cocaína ou outro estimulante, sem perturbações da percepção: Se houver transtorno por uso de anfetamina ou outro estimulante leve comórbido, o código da CID-10-MC é F15.129, e se houver transtorno por uso de anfetamina ou outro estimulante moderado ou grave comórbido, o código da CID-10-MC é F15.229. Caso não haja comorbidade com transtorno por uso de anfetamina ou outro estimulante, então o código da CID-10-MC é F15.929. De modo semelhante, se houver transtorno por uso de cocaína leve comórbido, o código da CID-10-MC é F14.129, e se houver transtorno por uso de cocaína moderado ou grave comórbido, o código da CID-10-MC é F14.229. Caso não haja comorbidade com transtorno por uso de cocaína, então o código da CID-10-MC é F14.929.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos Para intoxicação por anfetamina, cocaína ou outro estimulante, com perturbações da percepção: Se houver transtorno por uso de anfetamina ou outro estimulante leve comórbido, o código da CID-10-MC é F15.122, e se houver transtorno por uso de anfetamina ou outro estimulante moderado ou grave comórbido, o código da CID-10-MC é F15.222. Caso não haja comorbidade com transtorno por uso de anfetamina ou outro estimulante, então o código da CID-10-MC é F15.922. De modo semelhante, se houver transtorno por uso de cocaína leve comórbido, o código da CID-10-MC é F14.122, e se houver transtorno por uso de cocaína moderado ou grave comórbido, o código da CID-10-MC é F14.222. Caso não haja comorbidade com transtorno por uso de cocaína, então o código da CID-10-MC é F14.922.

Características Diagnósticas A característica essencial da intoxicação por estimulantes relacionada a estimulantes tipo anfetamina e cocaína é a presença de alterações comportamentais ou psicológicas clinicamente significativas que se desenvolvem durante ou logo após o uso de estimulantes (Critérios A e B). Alucinações auditivas podem ser proeminentes, assim como ideação paranoide, e esses sintomas devem ser distinguidos de um transtorno psicótico independente, como esquizofrenia. A intoxicação por estimulantes geralmente começa com uma sensação de “barato” e inclui um ou mais dos seguintes sintomas: euforia com aumento do vigor, sociabilidade, hiperatividade, inquietação, hipervigilância, sensibilidade interpessoal, loquacidade, ansiedade, tensão, alerta, grandiosidade, comportamento estereotipado e repetitivo, raiva, julgamento prejudicado e, no caso de intoxicação crônica, embotamento afetivo com fadiga ou tristeza e retraimento social. Essas alterações comportamentais e psicológicas são acompanhadas por dois ou mais dos seguintes sinais e sintomas, que se desenvolvem durante ou logo após o uso da cocaína: taquicardia ou bradicardia; dilatação pupilar; pressão arterial elevada ou diminuída; transpiração ou calafrios; náusea ou vômito; evidências de perda de peso; agitação ou retardo psicomotor; fraqueza muscular; depressão respiratória; dor torácica ou arritmias cardíacas; confusão, convulsões, discinesias, distonias ou coma (Critério C). A intoxicação, aguda ou crônica, frequentemente está associada com comprometimento no funcionamento social ou profissional. A intoxicação grave pode levar a convulsões, arritmias cardíacas, hiperpirexia e morte. Para fazer um diagnóstico de intoxicação por estimulantes, os sintomas não podem ser atribuíveis a outra condição médica nem ser mais bem explicados por outro transtorno mental (Critério D). Embora a intoxicação por estimulantes ocorra em indivíduos com transtorno por uso de estimulantes, ela não é um critério para o transtorno por uso de estimulantes, o qual é confirmado pela presença de dois dos 11 critérios diagnósticos para transtorno por uso.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A magnitude e a direção das alterações comportamentais e fisiológicas dependem de muitas variáveis, incluindo a dose usada e as características do indivíduo que faz uso da substância ou o contexto (p. ex., tolerância, taxa de absorção, cronicidade de uso, contexto no qual a droga é consumida). Efeitos estimulantes como euforia, aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca e atividade psicomotora são os observados com maior frequência. Efeitos depressores, como tristeza, bradicardia, pressão arterial diminuída e redução da atividade psicomotora, são menos comuns e geralmente surgem apenas com o uso crônico de doses elevadas.

Diagnóstico Diferencial Transtornos induzidos por estimulantes. A intoxicação por estimulantes distingue-se dos outros transtornos induzidos por estimulantes (p. ex., transtorno depressivo, transtorno bipolar, transtorno psicótico, transtorno de ansiedade induzidos por estimulantes) porque a gravidade


Abstinência de Estimulantes 569 dos sintomas de intoxicação ultrapassa a associada aos transtornos induzidos por estimulantes, e os sintomas justificam atenção clínica independente. Delirium por intoxicação por estimulantes distingue-se por uma perturbação no nível de consciência e alteração na cognição. Outros transtornos mentais. Perturbações mentais salientes associadas com a intoxicação por estimulantes devem ser distinguidas dos sintomas de esquizofrenia tipo paranoide; transtornos bipolar e depressivo; transtorno de ansiedade generalizada; e transtorno de pânico conforme descrição no DSM-5.

Abstinência de Estimulantes Critérios Diagnósticos A. Cessação (ou redução) do uso prolongado de substância tipo anfetamina, cocaína ou outro estimulante. B. Humor disfórico e duas (ou mais) das seguintes alterações fisiológicas, desenvolvidos no prazo de algumas horas a vários dias após o Critério A: 1. Fadiga. 2. Sonhos vívidos e desagradáveis. 3. Insônia ou hipersonia. 4. Aumento do apetite. 5. Retardo ou agitação psicomotora. C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.0. O código da CID-10-MC depende de o estimulante ser uma anfetamina, cocaína ou outro estimulante. O código da CID-10-MC para abstinência de anfetamina ou outro estimulante é F15.23, e o código da CID-10-MC para abstinência de cocaína é F14.23. Observe que o código da CID-10-MC indica a presença comórbida de um transtorno por uso de anfetamina, cocaína ou outro estimulante moderado ou grave, refletindo o fato de que a abstinência de anfetamina, cocaína ou outro estimulante pode ocorrer apenas na presença de um transtorno por uso de anfetamina, cocaína ou outro estimulante moderado ou grave. Não é permitido codificar um transtorno por uso de anfetamina, cocaína ou outro estimulante leve comórbido com abstinência de anfetamina, cocaína ou outro estimulante.

Características Diagnósticas A característica essencial da abstinência de estimulantes é a presença de uma síndrome de abstinência típica que se desenvolve no prazo de algumas horas a vários dias após a interrupção (ou redução acentuada) do uso de estimulantes (geralmente de altas doses) prolongado (Critério A). A síndrome de abstinência caracteriza-se pelo desenvolvimento de humor disfórico acompanhado por duas ou mais das seguintes alterações fisiológicas: fadiga, sonhos vívidos e desagradáveis, insônia ou hipersonia, aumento do apetite e retardo ou agitação psicomotora (Critério B). Bradicardia costuma estar presente e é uma medida confiável de abstinência de estimulantes. Anedonia e fissura pela droga também podem estar presentes, mas não fazem parte dos critérios diagnósticos. Esses sintomas causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério C). Os sintomas não podem ser atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental (Critério D).


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Sintomas agudos de abstinência (“repé”) costumam ser observados após períodos de uso repetitivo de altas doses e caracterizam-se por sensações intensas e desagradáveis de lassidão e depressão e de aumento do apetite, geralmente exigindo vários dias de repouso e recuperação. Podem ocorrer sintomas depressivos com ideação ou comportamento suicida, que costumam ser os problemas mais graves observados durante o “repé” ou outras formas de abstinência de estimulantes. A maioria dos indivíduos com transtorno por uso de estimulantes passa por uma síndrome de abstinência em algum momento, e praticamente todos com o transtorno relatam tolerância.

Diagnóstico Diferencial Transtorno por uso de estimulantes e outros transtornos induzidos por estimulantes. A abstinência de estimulantes distingue-se do transtorno por uso de estimulantes e de outros transtornos induzidos por estimulantes (p. ex., delirium, transtorno depressivo, transtorno bipolar, transtorno psicóticos, transtorno de ansiedade, disfunção sexual, transtorno do sono induzido por estimulantes) porque os sintomas de abstinência predominam na apresentação clínica e são suficientemente graves para justificar atenção clínica independente.

Outros Transtornos Induzidos por Estimulantes Os seguintes transtornos induzidos por estimulantes (que incluem transtornos induzidos por anfetaminas, cocaína e outros estimulantes) são descritos em outros capítulos do Manual, juntamente aos transtornos com os quais compartilham fenomenologia (consultar transtornos mentais induzidos por substância/medicamento nestes capítulos): transtorno psicótico induzido por estimulantes (“Espectro da Esquizofrenia e Outros Transtornos Psicóticos”); transtorno bipolar induzido por estimulantes (“Transtorno Bipolar e Transtornos Relacionados”); transtorno depressivo induzido por estimulantes (“Transtornos Depressivos”); transtorno de ansiedade induzido por estimulantes (“Transtornos de Ansiedade”); transtorno obsessivo-compulsivo induzido por estimulantes (Transtorno Obsessivo-compulsivo e Transtornos Relacionados”); transtorno do sono induzido por estimulantes (“Transtornos do Sono-Vigília”); e disfunção sexual induzida por estimulantes (“Disfunções Sexuais”). Para delirium por intoxicação por estimulantes, ver os critérios e a abordagem de delirium no capítulo “Transtornos Neurocognitivos”. Esses transtornos induzidos por estimulantes são diagnosticados em lugar de intoxicação por estimulantes ou abstinência de estimulantes apenas quando os sintomas são suficientemente graves para justificar atenção clínica independente.

Transtorno Relacionado a Estimulantes Não Especificado Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno relacionado a estimulantes que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno relacionado a estimulantes específico nem para outro transtorno na classe diagnóstica de transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.9. O código da CID-10-MC depende de o estimulante ser uma anfetamina, cocaína ou outro estimulante. O código da CID-10-MC para transtorno relacionado a anfetamina ou outro estimulante não especificado é F15.99. O código da CID-10-MC para um transtorno relacionado a cocaína não especificado é F14.99.


Transtorno por Uso de Tabaco 571

Transtornos Relacionados ao Tabaco Transtorno por Uso de Tabaco Abstinência de Tabaco Outros Transtornos Induzidos por Tabaco Transtorno Relacionado ao Tabaco Não Especificado

Transtorno por Uso de Tabaco Critérios Diagnósticos A. Um padrão problemático de uso de tabaco, levando a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por pelo menos dois dos seguintes critérios, ocorrendo durante um período de 12 meses: 1. Tabaco é frequentemente consumido em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido. 2. Existe um desejo persistente ou esforços malsucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso de tabaco. 3. Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção ou uso de tabaco. 4. Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar tabaco. 5. Uso recorrente de tabaco resultando em fracasso em cumprir obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa (p. ex., interferência no trabalho). 6. Uso continuado de tabaco apesar de problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados pelos seus efeitos (p. ex., discussões com os outros sobre o uso de tabaco). 7. Importantes atividades sociais, profissional ou recreacionais são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso de tabaco. 8. Uso recorrente de tabaco em situações nas quais isso representa perigo para a integridade física (p. ex., fumar na cama). 9. O uso de tabaco é mantido apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado por ele. 10. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos: a. Necessidade de quantidades progressivamente maiores de tabaco para atingir o efeito desejado. b. Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade de tabaco. 11. Abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos: a. Síndrome de abstinência característica de tabaco (consultar os Critérios A e B do conjunto de critérios para abstinência de tabaco). b. Tabaco (ou uma substância estreitamente relacionada, como nicotina) é consumido para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência. Especificar se: Em remissão inicial: Após todos os critérios para transtorno por uso de tabaco terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de tabaco foi preenchido durante um período mínimo de três meses, porém inferior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar tabaco”, ainda pode ocorrer). Em remissão sustentada: Após todos os critérios para transtorno por uso de tabaco terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de tabaco foi preenchido em nenhum momento durante um período igual ou superior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar tabaco”, ainda pode ocorrer).


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Especificar se: Em terapia de manutenção: O indivíduo vem em uso de medicamentos de manutenção de longo prazo, como medicamentos de reposição de nicotina, e nenhum dos critérios para transtorno por uso de tabaco foi satisfeito para essa classe de medicamento (exceto tolerância ou abstinência do medicamento de reposição de nicotina). Em ambiente protegido: Este especificador adicional é usado se o indivíduo encontra-se em um ambiente no qual o acesso ao tabaco é restrito. Código baseado na gravidade atual: Nota para os códigos da CID-10-MC: Se também houver abstinência de tabaco ou outro transtorno do sono induzido por tabaco, não utilizar os códigos abaixo para transtorno por uso de tabaco. No caso, o transtorno por uso de tabaco comórbido é indicado pelo 4o caractere do código de transtorno induzido por tabaco (ver a nota para codificação para abstinência de tabaco ou um transtorno do sono induzido por tabaco). Por exemplo, se houver comorbidade de transtorno do sono induzido por tabaco e transtorno por uso de tabaco, apenas o código para transtorno do sono induzido por tabaco é fornecido, sendo que o 4o caractere indica se o transtorno por uso de tabaco comórbido é moderado ou grave: F17.208 para transtorno por uso de tabaco moderado ou grave com transtorno do sono induzido por tabaco. Não é permitido codificar um transtorno por uso de tabaco leve comórbido com transtorno do sono induzido por tabaco. Especificar a gravidade atual: 305.1 (Z72.0) Leve: Presença de 2 ou 3 sintomas. 305.1 (F17.200) Moderada: Presença de 4 ou 5 sintomas. 305.1 (F17.200) Grave: Presença de 6 ou mais sintomas.

Especificadores “Em terapia de manutenção” aplica-se como um especificador a mais para indivíduos sob manutenção com outro medicamento para interrupção do uso de tabaco (p. ex., bupropiona, vareniclina) e como um especificador a mais de remissão se o indivíduo estiver tanto em remissão como em terapia de manutenção. “Em ambiente protegido” aplica-se como um especificador a mais de remissão se o indivíduo estiver tanto em remissão como em um ambiente protegido (i.e., em remissão inicial em ambiente protegido ou em remissão sustentada em ambiente protegido). Exemplos desses ambientes incluem prisões rigorosamente vigiadas e livres de substâncias, comunidades terapêuticas ou unidades hospitalares fechadas.

Características Diagnósticas O transtorno por uso de tabaco é comum entre indivíduos que fazem uso de cigarros e outras formas de tabaco diariamente e incomum entre os que não fazem uso diário ou que usam medicamentos com nicotina. A tolerância ao tabaco é exemplificada pelo desaparecimento da náusea e da tontura após o consumo repetido e com um efeito mais intenso do tabaco na primeira utilização do dia. A interrupção do uso de tabaco pode produzir uma síndrome de abstinência bem definida. Muitos indivíduos com transtorno por uso de tabaco utilizam-no para aliviar ou para evitar os sintomas de abstinência (p. ex., ao saírem de uma situação na qual o uso é restrito). Muitos que usam tabaco apresentam doenças ou sintomas físicos relacionados à substância e continuam a fumá-la. A grande maioria relata fissura pela substância quando deixam de fumar por várias horas. Gastar uma grande quantidade de tempo usando o tabaco pode ser exemplificado por fumar um cigarro atrás do outro, sem intervalos. Como as fontes de tabaco são de fácil acesso e lícitas, e como a intoxicação por nicotina é muito rara, gastar muito tempo na tentativa de obter tabaco ou de recuperar-se de seus efeitos é incomum. A desistência de atividades sociais, profissionais ou recreacionais importantes pode ocorrer quando o indivíduo evita uma atividade porque esta ocorre em áreas onde o fumo é restrito. O uso de tabaco raramente resulta em fracasso em cumprir obrigações importantes (p. ex., interferência no trabalho ou nos afazeres domésticos), porém problemas sociais e interpessoais persistentes (p. ex., discutir com os outros sobre o uso de tabaco, evitar situações sociais devido à desaprovação do uso de tabaco pelos outros) ou uso que representa perigo à integridade física (p. ex., fumar na cama, fumar próximo a substâncias químicas inflamáveis) ocorrem


Transtorno por Uso de Tabaco 573 em prevalência intermediária. Embora esses critérios sejam preenchidos com menor frequência por usuários de tabaco, caso comprovados, podem indicar um transtorno mais grave.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Fumar nos primeiros 30 minutos após o despertar, fumar diariamente, fumar mais cigarros por dia e acordar à noite para fumar são características que estão associadas ao transtorno por uso de tabaco. Ocorrências ambientais podem despertar fissura e abstinência. Condições médicas graves, como câncer de pulmão e outros tipos de câncer, doenças cardíacas e pulmonares, problemas perinatais, tosse, falta de ar e envelhecimento acelerado da pele, ocorrem com frequência.

Prevalência O cigarro é o produto de tabaco de uso mais comum e representa mais de 90% do consumo de tabaco/nicotina. Nos Estados Unidos, 57% dos adultos nunca fumaram, 22% são ex-fumantes, e 21% são fumantes. Aproximadamente 20% dos fumantes norte-americanos atuais não fumam diariamente. A prevalência de uso de tabaco não fumável é inferior a 5%, e a prevalência de tabaco usado em cachimbos e charutos é inferior a 1%. Os critérios de dependência de nicotina do DSM-IV podem ser usados para estimar a prevalência do transtorno por uso de tabaco, mas, como constituem um subgrupo dos critérios para transtorno por uso de tabaco, a prevalência do transtorno por uso de tabaco deve ser um pouco maior. A prevalência de 12 meses da dependência de nicotina do DSM-IV nos Estados Unidos é de 13% entre adultos a partir dos 18 anos. As taxas são semelhantes entre homens adultos (14%) e mulheres adultas (12%) e declinam com a idade em índices que vão de 17% na faixa etária dos 18 aos 29 anos para 4% entre indivíduos a partir dos 65 anos. A prevalência de dependência de nicotina atual é maior entre índios norte-americanos e nativos do Alasca (23%) do que entre brancos (14%), mas é menor entre afro-americanos (10%), asiático-americanos e nativos das ilhas do Pacífico (6%) e hispânicos (6%). A prevalência entre fumantes diários na atualidade é de aproximadamente 50%. Em muitos países em desenvolvimento, a prevalência do tabagismo é muito maior em indivíduos do sexo masculino do que nos do sexo feminino, o que não é o caso dos países desenvolvidos. Contudo, costuma haver atraso na transição demográfica, de modo que o tabagismo aumenta no sexo feminino mais tarde.

Desenvolvimento e Curso A maioria dos adolescentes norte-americanos experimenta tabaco, e, até os 18 anos, cerca de 20% fumam pelo menos mensalmente. A maioria desses indivíduos evolui para o uso diário de tabaco. A iniciação no fumo após os 21 anos é rara. De modo geral, alguns sintomas dos critérios para transtorno por uso de tabaco ocorrem logo após o início do hábito, e o padrão de uso de muitos indivíduos satisfaz os critérios para transtorno por uso de tabaco atual até o fim da adolescência. Mais de 80% dos indivíduos que usam tabaco tentam abandonar o hábito após algum tempo, mas 60% sofrem recaída no prazo de uma semana, e menos de 5% permanecem abstinentes até o fim da vida. Contudo, a maioria das pessoas que usa tabaco faz múltiplas tentativas, de modo que metade dos usuários de tabaco atinge abstinência. Indivíduos que usam tabaco e que abandonam o hábito normalmente não conseguem fazê-lo antes dos 30 anos. Embora o tabagismo não diário nos Estados Unidos fosse raro anteriormente, tornou-se mais prevalente na última década, sobretudo entre indivíduos mais jovens que usam tabaco.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. Indivíduos com traços de personalidade externalizantes estão mais propensos a iniciar o uso de tabaco. Crianças com transtorno de déficit de atenção/hiperatividade ou transtorno da conduta e adultos com transtornos depressivo, bipolar, de ansiedade, da personalidade, psicótico ou por uso de outras substâncias correm maior risco de iniciar e continuar o uso de tabaco e de desenvolver transtorno por uso da substância.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Ambientais. Indivíduos de baixa renda e baixo nível educacional estão mais propensos a iniciar o uso de tabaco e têm menos probabilidade de interrompê-lo. Genéticos e fisiológicos. Fatores genéticos contribuem para o início do uso de tabaco, para a continuidade do uso e para o desenvolvimento do transtorno por uso de tabaco, com um grau de herdabilidade equivalente ao observado em outros transtornos por uso de substância (i.e., cerca de 50%). Parte desse risco é específico para tabaco e parte é comum com a vulnerabilidade para desenvolver qualquer transtorno por uso de substância.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Culturas e subculturas apresentam ampla variação quanto à aceitação do uso de tabaco. A prevalência do uso da substância entrou em declínio nos Estados Unidos dos anos de 1960 aos anos de 1990, mas tal queda foi menos evidente nas populações afro-americana e hispânica. O tabagismo em países em desenvolvimento também é mais prevalente do que em países desenvolvidos. Ainda não é claro o grau em que essas diferenças culturais se devem à renda, à educação e a programas de controle do tabagismo em determinados países. Fumantes brancos não hispânicos parecem estar mais propensos a desenvolver transtorno por uso de tabaco do que outros fumantes. Algumas diferenças étnicas podem ter base biológica. Homens afro-americanos tendem a apresentar níveis mais elevados de nicotina no sangue com uma determinada quantidade de cigarros, o que pode contribuir para maior dificuldade do abandono do hábito. A rapidez do metabolismo da nicotina é significativamente diferente no caso de brancos em comparação com afro-americanos e pode variar conforme os genótipos associados às etnias.

Marcadores Diagnósticos Monóxido de carbono no ar expirado, nicotina e seu metabólito cotinina no sangue, na saliva ou na urina, podem medir a extensão do uso atual de tabaco ou nicotina; entretanto, estão apenas fracamente relacionados ao transtorno por uso de tabaco.

Consequências Funcionais do Transtorno por Uso de Tabaco As consequências médicas do uso de tabaco frequentemente se iniciam quando os usuários chegam à faixa dos 40 anos e costumam tornar-se progressivamente mais debilitantes ao longo do tempo. Metade dos fumantes que não interrompem o uso de tabaco morre de forma precoce devido a doenças relacionadas à substância, e morbidade relacionada ao tabagismo ocorre em mais da metade dos usuários de tabaco. A maioria das condições médicas resulta da exposição ao monóxido de carbono, ao alcatrão e a outros componentes não nicotínicos do tabaco. O principal indicador de reversibilidade é a duração do hábito. Fumantes passivos correm risco 30% maior de doença cardíaca e câncer. O uso prolongado de medicamentos com nicotina não parece causar nenhum dano médico.

Comorbidade As doenças médicas mais comuns decorrentes do tabagismo são doenças cardiovasculares, doença pulmonar obstrutiva crônica e câncer. O tabagismo também intensifica problemas perinatais, como baixo peso ao nascer e aborto espontâneo. As comorbidades psiquiátricas mais comuns são transtornos por uso de álcool/substância, depressivo, bipolar, de ansiedade, da personalidade e de déficit de atenção/hiperatividade. Em indivíduos com transtorno por uso de tabaco atual, a prevalência de transtornos atuais por uso de álcool, de drogas, de ansiedade, depressivo, bipolar e da personalidade varia de 22 a 32%. Fumantes dependentes de nicotina apresentam probabilidade 2,7 a 8,1 vezes maior de apresentar esses transtornos do que fumantes não dependentes, pessoas que nunca fumaram ou ex-fumantes.


Abstinência de Tabaco 575

Abstinência de Tabaco Critérios Diagnósticos

292.0 (F17.203)

A. Uso diário de tabaco durante um período mínimo de várias semanas. B. Cessação abrupta do uso de tabaco, ou redução da quantidade de tabaco utilizada, seguida, no prazo de 24 horas, por quatro (ou mais) dos seguintes sinais ou sintomas: 1. Irritabilidade, frustração ou raiva. 2. Ansiedade. 3. Dificuldade de concentração. 4. Aumento do apetite. 5. Inquietação. 6. Humor deprimido. 7. Insônia. C. Os sinais ou sintomas do Critério B causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por ou abstinência de outra substância. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.0. O código da CID-10-MC para abstinência de tabaco é F17.203. Observar que o código da CID-10-MC indica a presença comórbida de um transtorno por uso de tabaco moderado ou grave, refletindo o fato de que a abstinência de tabaco pode ocorrer apenas na presença de um transtorno por uso de tabaco moderado ou grave. Não é permitido codificar um transtorno por uso de tabaco leve comórbido com abstinência de tabaco.

Características Diagnósticas Os sintomas de abstinência prejudicam a capacidade de interromper o uso de tabaco. Os sintomas após a abstinência de tabaco devem-se, em grande parte, à privação de nicotina. Os sintomas são muito mais intensos entre indivíduos que fumam cigarros ou formas não fumáveis de tabaco do que entre aqueles que usam medicamentos com nicotina. A diferença na intensidade dos sintomas provavelmente se deve ao início mais rápido e aos níveis mais altos de nicotina com o fumo de cigarros. A abstinência de tabaco é comum entre usuários diários da substância que interrompem ou reduzem o hábito, mas também pode ocorrer entre usuários não diários. Em geral, a frequência cardíaca se reduz em 5 a 12 batimentos por minuto nos primeiros dias após a interrupção do tabagismo, e o peso aumenta em média 2 a 3 quilos ao longo do primeiro ano após a interrupção do tabagismo. A abstinência de tabaco pode produzir alterações no humor e prejuízo do funcionamento clinicamente significativos.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A fissura por consumir alimentos doces ou açucarados e o comprometimento do desempenho em tarefas que exigem alerta estão associados à abstinência de tabaco. A abstinência pode aumentar constipação, tosse, tontura, sonhos/pesadelos, náusea e dor de garganta. O tabagismo aumenta o metabolismo de vários medicamentos usados para tratar transtornos mentais; portanto, sua interrupção pode aumentar os níveis sanguíneos desses medicamentos, o que pode produzir resultados clinicamente significativos. Esse efeito parece ser devido não à nicotina, e sim a outros compostos presentes no tabaco.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Prevalência Aproximadamente 50% dos usuários de tabaco que abandonaram o hábito durante dois dias ou mais apresentam sintomas que satisfazem os critérios para abstinência de tabaco. Os sinais e sintomas referidos com mais frequência são ansiedade, irritabilidade e dificuldade de concentração. Os sintomas menos referidos são depressão e insônia.

Desenvolvimento e Curso A abstinência de tabaco normalmente se inicia no prazo de 24 horas após a interrupção ou redução do uso, chega a um pico 2 a 3 dias após a abstinência e dura 2 a 3 semanas. Os sintomas da abstinência podem ocorrer entre usuários adolescentes de tabaco, mesmo antes do uso diário. Sintomas que duram mais de um mês são raros.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. Fumantes com transtornos depressivos, transtornos bipolares, transtornos de ansiedade, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade e outros transtornos por uso de substância apresentam abstinência mais grave. Genéticos e fisiológicos. O genótipo pode influenciar a probabilidade de abstinência a partir da cessação.

Marcadores Diagnósticos Monóxido de carbono no ar expirado e nicotina e seu metabólito cotinina no sangue, na saliva, ou na urina podem medir a extensão do uso de tabaco ou nicotina, mas estão apenas fracamente relacionados à abstinência de tabaco.

Consequências Funcionais da Abstinência de Tabaco A abstinência de cigarros pode causar sofrimento clinicamente significativo e prejudica a capacidade de interromper ou controlar o uso de tabaco. A possibilidade de que a abstinência de tabaco precipite um novo transtorno mental ou recorrência de um transtorno mental é discutível, mas, caso isso ocorra, apenas uma pequena minoria de usuários de tabaco seria atingida.

Diagnóstico Diferencial Os sintomas de abstinência de tabaco sobrepõem-se aos sintomas da síndrome de abstinência de outras substâncias (p. ex., abstinência de álcool, abstinência de sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos; abstinência de estimulantes; abstinência de cafeína; abstinência de opioides); intoxicação por cafeína; transtornos de ansiedade, depressivo, bipolar e do sono; e acatisia induzida por medicamento. Internação em unidades não fumantes ou interrupção voluntária do hábito de fumar podem induzir sintomas de abstinência que se assemelham, intensificam ou mascaram outros transtornos ou efeitos adversos de medicamentos usados para tratar transtornos mentais (p. ex., irritabilidade atribuída à abstinência de álcool pode ser decorrente de abstinência de tabaco). Redução dos sintomas com o uso de medicamentos com nicotina confirma o diagnóstico.

Outros Transtornos Induzidos por Tabaco O transtorno do sono induzido por tabaco é abordado no capítulo “Transtornos do Sono-Vigília” (consultar “Transtorno do Sono Induzido por Substância/Medicamento”).


Transtorno Relacionado ao Tabaco Não Especificado 577

Transtorno Relacionado ao Tabaco Não Especificado 292.9 (F17.209) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno relacionado ao tabaco que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno relacionado ao tabaco específico nem para outro transtorno na classe diagnóstica de transtornos relacionados a substâncias e transtornos aditivos.

Transtornos Relacionados a Outras Substâncias (ou Substâncias Desconhecidas) Transtorno por Uso de Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Intoxicação por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Abstinência de Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Transtornos Induzidos por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Transtorno Relacionado a Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Não Especificado

Transtorno por Uso de Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Critérios Diagnósticos A. Um padrão problemático de uso de uma substância intoxicante, a qual não pode ser classificada dentro das categorias de álcool; cafeína; Cannabis; alucinógenos (fenciclidina e outros); inalantes; opioides; sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos; estimulantes; ou tabaco, levando a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativo, manifestado por pelo menos dois dos seguintes critérios, ocorrendo durante um período de 12 meses: 1. A substância é frequentemente consumida em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido. 2. Existe um desejo persistente ou esforços malsucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso da substância. 3. Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção da substância, em sua utilização ou na recuperação de seus efeitos. 4. Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar a substância. 5. Uso recorrente da substância resultando em fracasso em cumprir obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa. 6. Uso continuado da substância apesar de problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados pelos efeitos de seu uso. 7. Importantes atividades sociais, profissionais ou recreacionais são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso da substância. 8. Uso recorrente da substância em situações nas quais isso representa perigo para a integridade física.


578

Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

9. O uso da substância é mantido apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado por ela. 10. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos: a. Necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância para atingir a intoxicação ou o efeito desejado. b. Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade da substância. 11. Abstinência, manifestada por qualquer um dos seguintes aspectos: a. Síndrome de abstinência característica de outra substância (ou substância desconhecida) (consultar os Critérios A e B do conjunto de critérios para abstinência de outra substância [ou substância desconhecida], p. 583). b. A substância (ou uma substância estreitamente relacionada) é consumida para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência. Especificar se: Em remissão inicial: Após todos os critérios para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) foi preenchido durante um período mínimo de três meses, porém inferior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar a substância”, ainda pode ocorrer). Em remissão sustentada: Após todos os critérios para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) foi preenchido em nenhum momento durante um período igual ou superior a 12 meses (com exceção de que o Critério A4, “Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar a substância”, ainda pode ocorrer). Especificar se: Em ambiente protegido: Este especificador adicional é usado se o indivíduo encontra-se em um ambiente no qual o acesso à substância é restrito. Código baseado na gravidade atual: Nota para os códigos da CID-10-MC: Se também houver intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida), abstinência de outra substância (ou substância desconhecida) ou outro transtorno mental induzido por outra substância (ou substância desconhecida), não utilizar os códigos abaixo para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida). No caso, o transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) comórbido é indicado pelo 4o caractere do código de transtorno induzido por outra substância (ou substância desconhecida) (ver a nota para codificação para intoxicação por outra substância [ou substância desconhecida], abstinência de outra substância [ou substância desconhecida] ou um transtorno mental induzido por outra substância [ou substância desconhecida] específica). Por exemplo, se houver comorbidade de transtorno depressivo induzido por outra substância (ou substância desconhecida) e transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida), apenas o código para transtorno depressivo induzido por outra substância (ou substância desconhecida) é fornecido, sendo que o 4o caractere indica se o transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) comórbido é leve, moderado ou grave: F19.14 para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) leve com transtorno depressivo induzido por outra substância (ou substância desconhecida) ou F19.24 para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) moderado ou grave com transtorno depressivo induzido por outra substância (ou substância desconhecida). Especificar a gravidade atual: 305.90 (F19.10) Leve: Presença de 2 ou 3 sintomas. 304.90 (F19.20) Moderada: Presença de 4 ou 5 sintomas. 304.90 (F19.20) Grave: Presença de 6 ou mais sintomas.

Especificadores “Em ambiente protegido” aplica-se como um especificador a mais de remissão se o indivíduo estiver tanto em remissão como em um ambiente protegido (i.e., em remissão inicial em ambiente protegido ou em remissão sustentada em ambiente protegido). Exemplos desses ambientes in-


Transtorno por Uso de Outra Substância (ou Substância Desconhecida) 579 cluem prisões rigorosamente vigiadas e livres de substâncias, comunidades terapêuticas ou unidades hospitalares fechadas.

Características Diagnósticas A categoria diagnóstica de uso de outra substância (ou substância desconhecida) e transtornos relacionados engloba transtornos relacionados a substâncias que não estão associadas a álcool; cafeína; Cannabis; alucinógenos (fenciclidina e outros); inalantes; opioides; sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos; estimulantes (incluindo anfetaminas e cocaína); ou tabaco. Essas substâncias incluem esteroides anabolizantes, fármacos anti-inflamatórios não esteroides; cortisol; medicamentos antiparkinsonianos; anti-histamínicos; óxido nitroso; nitritos de amila, butila e isobutila; noz-de-areca, que é mascada em muitas culturas para produzir euforia leve e sensação de flutuar; kava (extraída de uma pimenteira no Pacífico Sul), que produz sedação, incoordenação, perda de peso, formas leves de hepatite e anormalidades pulmonares; ou catinonas (incluindo agentes da planta khât e derivados químicos sintéticos), que produzem efeitos estimulantes. Transtornos relacionados a substâncias desconhecidas estão associados a substâncias não identificadas, como intoxicações nas quais o indivíduo não consegue identificar a droga ingerida, ou transtornos por uso de substância envolvendo drogas novas, ou do mercado negro, ainda não identificadas, ou drogas e fármacos conhecidos vendidos ilegalmente com nomes falsos. O transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) é um transtorno mental no qual o uso repetido de outra substância (ou substância desconhecida) geralmente é mantido, apesar da consciência do indivíduo de que a substância lhe causa problemas graves. Esses problemas encontram-se nos critérios diagnósticos. Quando a substância é conhecida, ela deve ser indicada no nome do transtorno no momento da codificação (p. ex., transtorno por uso de óxido nitroso).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Um diagnóstico de transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) é apoiado pela declaração do indivíduo de que a substância em questão não se encontra nas nove categorias listadas neste capítulo; por episódios recorrentes de intoxicação com resultados negativos em exames toxicológicos de rotina (os quais podem não detectar substâncias novas ou raramente usadas); ou pela presença de sintomas característicos de uma substância não identificada que surgiu recentemente na comunidade do indivíduo. Devido ao aumento do acesso ao óxido nitroso (“gás hilariante”), o fato de pertencer a uma determinada população está associado ao diagnóstico do transtorno por uso de óxido nitroso. A função desse gás como agente anestésico leva a seu mau uso entre alguns profissionais das áreas médica e odontológica. Sua utilização como propelente em produtos comerciais (p. ex., latas de creme chantili) contribui para seu mau uso por trabalhadores da área de alimentação. Com a recente disponibilização em massa da substância na forma de cilindros de refil para garrafa sifão de chantili de uso doméstico, o mau uso de óxido nitroso por adolescentes e jovens adultos é significativo, particularmente entre pessoas que também inalam hidrocarbonetos voláteis. Alguns indivíduos que fazem uso contínuo, os quais chegam a inalar 240 cilindros por dia, podem apresentar complicações médicas e condições mentais graves, incluindo mieloneuropatia, degeneração combinada subaguda da medula espinal, neuropatia periférica e psicose. Essas condições também estão associadas a um diagnóstico de transtorno por uso de óxido nitroso. O uso de gases de nitrito de amila, butila e isobutila vem sendo observado em homens homossexuais e alguns adolescentes, especialmente entre portadores de transtorno da conduta. O fato de pertencer a essas populações pode estar associado a um diagnóstico de transtorno por uso de nitrito de amila, butila ou isobutila. Contudo, ainda não se determinou se essas substâncias produzem transtorno por uso de substância. Apesar da tolerância, esses gases podem não alterar o comportamento por meio de efeitos centrais e podem ser usados apenas por seus efeitos periféricos. Transtornos por uso de substância geralmente estão associados a risco mais elevado de suicídio, mas não há evidências de fatores de risco de suicídio exclusivos do transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida).


580

Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Prevalência Com base em dados extremamente limitados, a prevalência do transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) é provavelmente mais baixa do que a de transtornos por uso envolvendo as nove categorias de substâncias deste capítulo.

Desenvolvimento e Curso Não há um padrão único de desenvolvimento ou curso que caracterize os farmacologicamente variados transtornos por uso de outra substância (ou substância desconhecida). Com frequência, os transtornos por uso de substância desconhecida são reclassificados quando a substância finalmente é identificada.

Fatores de Risco e Prognóstico Acredita-se que os fatores de risco e prognóstico dos transtornos por uso de outra substância (ou substância desconhecida) sejam semelhantes aos da maioria dos transtornos por uso de substância e que incluam a presença de quaisquer outros transtornos por uso de substância, transtorno da conduta ou transtorno da personalidade antissocial no indivíduo ou em sua família; início precoce de problemas com substâncias; fácil disponibilidade da substância no ambiente do indivíduo; maus-tratos na infância ou trauma e evidências de autocontrole inicial limitado e desinibição comportamental.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Determinadas culturas podem estar associadas a transtornos por uso de outra substância (ou substância desconhecida) envolvendo substâncias nativas específicas inseridas na área cultural, como a noz-de-areca.

Marcadores Diagnósticos Exames de urina, do ar expirado ou saliva podem identificar corretamente uma substância de uso comum vendida de forma enganosa como um produto novo. Contudo, exames clínicos de rotina normalmente não conseguem identificar substâncias realmente incomuns ou novas, o que pode exigir exames em laboratórios especializados.

Diagnóstico Diferencial Uso de outras substâncias ou substâncias desconhecidas sem satisfazer os critérios para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida). O uso de substâncias desconhecidas não é raro entre adolescentes, mas, na maioria dos casos, o consumo não satisfaz o padrão de dois ou mais critérios para transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) no ano anterior. Transtornos por uso de substância. O transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) pode ocorrer concomitantemente a vários outros transtornos por uso de substância, e os sintomas dos transtornos podem ser semelhantes ou se sobrepor. Para esclarecer padrões de sintomas, é útil indagar sobre quais sintomas persistiram durante períodos em que algumas das substâncias não estavam sendo usadas. Transtorno induzido por outra substância/medicamento (ou substância/medicamento desconhecido). Este diagnóstico deve ser diferenciado das ocasiões em que os sintomas do indivíduo satisfazem todos os critérios para um dos seguintes transtornos, e este é causado por outra substância ou por substância desconhecida: delirium, transtorno neurocognitivo maior ou leve, transtorno psicótico, transtorno depressivo, transtorno de ansiedade, disfunção sexual ou transtorno do sono. Outras condições médicas. Indivíduos com transtornos por uso de substâncias, incluindo transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida), podem apresentar sintomas de vários transtornos médicos. Esses transtornos também podem ocorrer na ausência de transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) como origem desses problemas.


Intoxicação por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) 581

Comorbidade Transtornos por uso de substância, incluindo transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida), habitualmente são comórbidos uns com os outros, com transtorno da conduta na adolescência e transtorno da personalidade antissocial na idade adulta e com ideação suicida e tentativas de suicídio.

Intoxicação por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Critérios Diagnósticos A. Desenvolvimento de uma síndrome reversível específica atribuível à ingestão (ou exposição) recente de uma substância não listada em outra parte do Manual ou desconhecida. B. Alterações comportamentais ou psicológicas clinicamente significativas e problemáticas que são atribuíveis ao efeito da substância sobre o sistema nervoso central (p. ex., comprometimento da coordenação motora, agitação ou retardo psicomotor, euforia, ansiedade, beligerância, instabilidade do humor, comprometimento cognitivo, julgamento prejudicado, retraimento social) desenvolvidas durante ou logo após o uso da substância. C. Os sinais ou sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo intoxicação por outra substância. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.89. O código da CID-10-MC depende da existência de comorbidade com transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) envolvendo a mesma substância. Se houver transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) leve comórbido, o código da CID-10-MC é F19.129, e se houver transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) moderado ou grave comórbido, o código da CID-10-MC é F19.229. Caso não haja comorbidade com transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida), envolvendo a mesma substância, então o código da CID-10-MC é F19.929.

Nota: Para informações sobre Fatores de Risco e Prognóstico, Questões Diagnósticas Relativas à Cultura e Marcadores Diagnósticos, consultar as seções correspondentes em transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida).

Características Diagnósticas A intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida) é um transtorno mental clinicamente significativo que se desenvolve durante, ou imediatamente após, o uso de um dos seguintes: a) uma substância não abordada em outra parte deste capítulo (i.e., álcool; cafeína; Cannabis; fenciclidina e outros alucinógenos; inalantes; opioides; sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos; estimulantes; ou tabaco) ou b) uma substância desconhecida. Caso a substância seja conhecida, sua indicação deve constar no nome do transtorno no momento da codificação. A aplicação dos critérios diagnósticos de intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida) é muito difícil. O critério A requer o desenvolvimento de uma “síndrome específica da substância” reversível, mas se a substância for desconhecida, a síndrome normalmente será desconhecida. Para solucionar esse conflito, os clínicos podem pedir informações ao indivíduo ou obter história adicional para saber se ele sofreu um episódio semelhante após usar substâncias com o mesmo “nome de rua” ou com origem na mesma fonte. De modo semelhante, departamentos de emergência em hospitais por vezes distinguem, ao longo de alguns dias, várias apresentações de uma síndrome de intoxicação desconhecida e grave de uma substância recentemente disponível antes desconhecida. Devido à grande variedade de substâncias intoxicantes, o Critério B pode fornecer apenas exemplos gerais de sinais e sintomas de algumas intoxicações, sem limite para a quantidade de sintomas necessários para um diagnóstico; o discernimento clínico norteia essas decisões. O Critério C requer que outras condições médicas, transtornos mentais ou intoxicações sejam excluídos.


582

Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Prevalência Desconhece-se a prevalência de intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida).

Desenvolvimento e Curso Intoxicações habitualmente surgem e então atingem seu pico em períodos que variam de minutos a horas após o uso da substância, mas o início e o curso variam conforme a substância e a via de administração. De modo geral, substâncias usadas por meio de inalação pulmonar e injeção intravenosa apresentam o início de ação mais rápido, enquanto as ingeridas por via oral e que requerem metabolização em um produto ativo são muito mais lentas (p. ex., após a ingestão de determinados tipos de cogumelos, os primeiros sinais de uma intoxicação letal podem surgir apenas após alguns dias). Os efeitos da intoxicação normalmente se resolvem no período de horas até alguns poucos dias. Contudo, o corpo pode eliminar um gás anestésico como óxido nitroso minutos depois do fim da utilização. No outro extremo, algumas substâncias intoxicantes de efeito imediato envenenam sistemas, deixando deficiências permanentes. Por exemplo, MPTP (1-metil-4-fenil-1,2,3,6-tetraidropiridina), um subproduto contaminante da síntese de um determinado opioide, mata as células dopaminérgicas e induz parkinsonismo permanente em usuários que buscaram intoxicação por opioides.

Consequências Funcionais da Intoxicação por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Prejuízos decorrentes da intoxicação por qualquer tipo de substância têm consequências graves, incluindo disfunção no trabalho, indiscrições sociais, problemas nos relacionamentos interpessoais, fracasso em cumprir obrigações, acidentes de trânsito, brigas, comportamentos de alto risco (i.e., sexo sem proteção) e overdose de substância ou medicamento. O padrão de consequências varia conforme a substância em questão.

Diagnóstico Diferencial Uso de outra substância (ou substância desconhecida) sem satisfazer os critérios para intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida). O indivíduo usou outra(s) substância(s) ou substância(s) desconhecida(s), mas a dose foi insuficiente para produzir os sintomas que satisfazem os critérios diagnósticos exigidos para o diagnóstico. Intoxicação por substância ou outros transtornos induzidos por substância/medicamento. Substâncias conhecidas podem ser vendidas no mercado negro como produtos novos, e indivíduos podem sofrer intoxicação por essas substâncias. História, screening toxicológico ou exames químicos da própria substância podem ajudar a identificá-la. Tipos diferentes de transtornos relacionados a outras substâncias (ou substâncias desconhecidas). Episódios de intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida) podem ocorrer durante o transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida), transtorno relacionado a outras substâncias (ou substâncias desconhecida) não especificado e transtornos induzidos por outra substância (ou substância desconhecida) não especificados, mas guardam diferenças desses transtornos. Outros distúrbios tóxicos, metabólicos, traumáticos, neoplásicos, vasculares ou infecciosos que comprometem o funcionamento cerebral e a cognição. Diversas condições neurológicas e outras condições médicas podem produzir o início rápido de sinais e sintomas que se assemelham aos sintomas de intoxicações, incluindo os exemplos do Critério B. Paradoxalmente, abstinência de drogas ou fármacos também deve ser descartada, porque, por exemplo, letargia pode indicar abstinência de uma droga ou intoxicação por outra.


Abstinência de Outra Substância (ou Substância Desconhecida)

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Comorbidade Como ocorre com todos os transtornos relacionados a substâncias, transtorno da conduta na adolescência, transtorno da personalidade antissocial na idade adulta e outros transtornos por uso de substância tendem a ocorrer simultaneamente à intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida).

Abstinência de Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Critérios Diagnósticos

292.0 (F19.239)

A. Cessação (ou redução) do uso intenso e prolongado de uma substância. B. Desenvolvimento de uma síndrome específica da substância logo após a cessação (ou redução) do uso da substância. C. A síndrome específica da substância causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. Os sintomas não são atribuíveis a outra condição médica nem são mais bem explicados por outro transtorno mental, incluindo abstinência de outra substância. E. A substância envolvida não pode ser classificada em nenhuma das outras classes de substâncias (álcool; cafeína; Cannabis; opioides; sedativos, hipnóticos ou ansiolíticos; estimulantes; ou tabaco) ou é desconhecida. Nota para codificação: O código da CID-9-MC é 292.0. O código da CID-10-MC para abstinência de outra substância (ou substância desconhecida) é F19.239. Observe que o código da CID-10-MC indica a presença comórbida de um transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) moderado ou grave. Não é permitido codificar um transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida) leve comórbido com abstinência de outra substância (ou substância desconhecida).

Nota: Para informações sobre Fatores de Risco e Prognóstico e Marcadores Diagnósticos, consultar as seções correspondentes em transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida).

Características Diagnósticas A abstinência de outra substância (ou substância desconhecida) é um transtorno mental significativo que se desenvolve durante ou no prazo de poucas horas ou dias após a redução da dosagem ou a interrupção do uso de uma substância (Critérios A e B). Embora a redução de dose ou a interrupção do uso recente normalmente seja evidente na história, outros procedimentos diagnósticos são muito difíceis caso a droga seja desconhecida. O Critério B requer o desenvolvimento de uma “síndrome específica da substância” (i.e., os sinais e sintomas do indivíduo devem corresponder à síndrome de abstinência conhecida para a droga ou fármaco cujo uso foi interrompido recentemente) – uma exigência que raramente pode ser satisfeita com uma substância desconhecida. Consequentemente, o discernimento clínico deve nortear essas decisões quando as informações são limitadas. O Critério D exige descartar outras condições médicas, transtornos mentais ou abstinência de substâncias conhecidas. Quando a substância é conhecida, ela deve ser indicada no nome do transtorno no momento da codificação (p. ex., abstinência de noz-de-areca).

Prevalência Desconhece-se a prevalência de abstinência de outra substância (ou substância desconhecida).


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Desenvolvimento e Curso Sinais de abstinência habitualmente surgem algumas horas depois que o uso da substância é interrompido, mas o início e o curso variam enormemente, dependendo da dose comumente usada pela pessoa e da taxa de eliminação da substância específica do corpo. No pico da gravidade, sintomas de abstinência de algumas substâncias envolvem níveis de desconforto apenas moderados, enquanto a abstinência de outras substâncias pode ser fatal. Disforia associada à abstinência frequentemente motiva recaída ao uso da substância. Sintomas de abstinência diminuem lentamente ao longo de dias, semanas ou meses, dependendo da droga ou fármaco em questão e da dosagem à qual o indivíduo desenvolveu tolerância.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Questões relacionadas à cultura no diagnóstico variam de acordo com a substância em questão.

Consequências Funcionais da Abstinência de Outra Substância (ou Substância Desconhecida) A abstinência de qualquer tipo de substância pode ter consequências graves, incluindo sinais e sintomas físicos (p. ex., mal-estar, alterações nos sinais vitais, desconforto abdominal, cefaleia), fissura intensa por drogas, ansiedade, depressão, agitação, sintomas psicóticos ou comprometimento cognitivo. Essas consequências podem levar a problemas como disfunção no trabalho, problemas nos relacionamentos interpessoais, fracasso em cumprir obrigações, acidentes de trânsito, brigas, comportamento de alto risco (p. ex., sexo sem proteção), tentativas de suicídio e overdose de substância ou medicamento. O padrão de consequências varia conforme a substância em questão.

Diagnóstico Diferencial Redução da dose após uso prolongado sem satisfazer os critérios para abstinência de outra substância (ou substância desconhecida). O indivíduo usou outras substâncias ou substâncias desconhecidas, mas a dose foi insuficiente para produzir os sintomas que satisfazem os critérios diagnósticos exigidos. Abstinência de substância ou outros transtornos induzidos por substância/medicamento. Substâncias conhecidas podem ser vendidas no mercado negro como produtos novos, e indivíduos podem sofrer abstinência ao descontinuar essas substâncias. História, screening toxicológico ou exames químicos da própria substância podem ajudar a identificá-la. Tipos diferentes de transtornos relacionados a outra substância (ou substância desconhecida). Episódios de abstinência de outra substância (ou substância desconhecida) podem ocorrer durante o transtorno por uso de outra substância (ou substância desconhecida), transtorno relacionado a outra substância (ou substância desconhecida) não especificado e transtornos induzidos por outra substância (ou substância desconhecida) não especificados, mas guardam diferenças desses transtornos. Outros distúrbios tóxicos, metabólicos, traumáticos, neoplásicos, vasculares ou infecciosos que comprometem o funcionamento cerebral e a cognição. Diversas condições neurológicas e outras condições médicas podem produzir o início rápido de sinais e sintomas que mimetizam os sintomas de abstinências. Paradoxalmente, intoxicações por drogas ou fármacos também devem ser excluídas, porque, por exemplo, letargia pode indicar abstinência de uma droga ou intoxicação por outra.

Comorbidade Como ocorre com todos os transtornos relacionados a substâncias, transtorno da conduta na adolescência, transtorno da personalidade antissocial na idade adulta e outros transtornos por uso de substância tendem a ocorrer simultaneamente com a abstinência de outra substância (ou substância desconhecida).


Transtornos Induzidos por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) 585

Transtornos Induzidos por Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Devido à falta de delimitação inerente à categoria de outra substância (ou substância desconhecida), a extensão e o alcance dos transtornos induzidos são incertos. Ainda assim, transtornos induzidos por outra substância (ou substância desconhecida) são possíveis e estão descritos em outros capítulos do Manual junto a transtornos com os quais compartilham fenomenologia (consultar transtornos mentais induzidos por substância/medicamento nestes capítulos): transtorno psicótico induzido por outra substância (ou substância desconhecida) (“Espectro da Esquizofrenia e Outros Transtornos Psicóticos”); transtorno bipolar induzido por outra substância (ou substância desconhecida) (“Transtorno Bipolar e Transtornos Relacionados”); transtorno depressivo induzido por outra substância (ou substância desconhecida) (“Transtornos Depressivos”); transtorno obsessivo-compulsivo induzido por outra substância (ou substância desconhecida) (“Transtorno Obsessivo-compulsivo e Transtornos Relacionados”); transtorno do sono induzido por outra substância (ou substância desconhecida) (“Transtornos do Sono-Vigília”); disfunção sexual induzida por outra substância (ou substância desconhecida) (“Disfunções Sexuais”); e transtorno neurocognitivo maior ou leve induzido por outra substância/medicamento (ou substância/medicamento desconhecido) (“Transtornos Neurocognitivos”). Para delirium por intoxicação induzida por outra substância (ou substância desconhecida) e delirium por abstinência induzida por outra substância (ou substância desconhecida), ver os critérios e a abordagem de delirium no capítulo “Transtornos Neurocognitivos”. Esses transtornos induzidos por outra substância (ou substância desconhecida) são diagnosticados em lugar de intoxicação por outra substância (ou substância desconhecida) ou de abstinência de outra substância (ou substância desconhecida) apenas quando os sintomas são suficientemente graves para justificar atenção clínica independente.

Transtorno Relacionado a Outra Substância (ou Substância Desconhecida) Não Especificado 292.9 (F19.99) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno relacionado a outra substância (ou substância desconhecida) que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno relacionado a outra substância (ou substância desconhecida) específico nem para outro transtorno na classe diagnóstica de transtornos relacionados a substâncias.

Transtornos Não Relacionados a Substância Transtorno do Jogo Critérios Diagnósticos

312.31 (F63.0)

A. Comportamento de jogo problemático persistente e recorrente levando a sofrimento ou comprometimento clinicamente significativo, conforme indicado pela apresentação de quatro (ou mais) dos seguintes em um período de 12 meses:


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

1. Necessidade de apostar quantias de dinheiro cada vez maiores a fim de atingir a excitação desejada. 2. Inquietude ou irritabilidade quando tenta reduzir ou interromper o hábito de jogar. 3. Fez esforços repetidos e malsucedidos no sentido de controlar, reduzir ou interromper o hábito de jogar. 4. Preocupação frequente com o jogo (p. ex., apresenta pensamentos persistentes sobre experiências de jogo passadas, avalia possibilidades ou planeja a próxima quantia a ser apostada, pensa em modos de obter dinheiro para jogar). 5. Frequentemente joga quando se sente angustiado (p. ex., sentimentos de impotência, culpa, ansiedade, depressão). 6. Após perder dinheiro no jogo, frequentemente volta outro dia para ficar quite (“recuperar o prejuízo”). 7. Mente para esconder a extensão de seu envolvimento com o jogo. 8. Prejudicou ou perdeu um relacionamento significativo, o emprego ou uma oportunidade educacional ou profissional em razão do jogo. 9. Depende de outras pessoas para obter dinheiro a fim de saldar situações financeiras desesperadoras causadas pelo jogo. B. O comportamento de jogo não é mais bem explicado por um episódio maníaco. Especificar se: Episódico: Satisfaz os critérios diagnósticos mais de uma única vez, sendo que os sintomas cedem entre períodos de transtorno do jogo durante um período mínimo de vários meses. Persistente: Experiencia sintomas contínuos, satisfazendo os critérios diagnósticos por vários anos. Especificar se: Em remissão inicial: Após todos os critérios para transtorno do jogo terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno do jogo foi preenchido durante um período mínimo de três meses, porém inferior a 12 meses. Em remissão sustentada: Após todos os critérios para transtorno do jogo terem sido preenchidos anteriormente, nenhum dos critérios para transtorno do jogo foi preenchido em nenhum momento durante um período igual ou superior a 12 meses. Especificar a gravidade atual: Leve: Preenche 4 ou 5 critérios. Moderada: Preenche 6 ou 7 critérios. Grave: Preenche 8 ou 9 critérios.

Nota: Embora algumas condições comportamentais que não envolvem a ingestão de substâncias apresentem semelhanças com transtornos relacionados a substâncias, apenas um transtorno – transtorno do jogo – conta com dados suficientes para ser incluído nesta seção.

Especificadores A gravidade baseia-se na quantidade de critérios preenchidos. Indivíduos com transtorno do jogo leve podem exibir apenas 4 ou 5 critérios, sendo que os critérios preenchidos com maior frequência normalmente estão relacionados à preocupação com o jogo e a “recuperar” as perdas. Indivíduos com transtorno do jogo moderadamente grave exibem mais critérios (i.e., 6 ou 7); os com a forma mais grave irão exibir todos ou a maioria dos nove critérios (i.e., 8 ou 9). Colocar em risco relacionamentos ou oportunidades profissionais devido ao jogo e depender de outras pessoas para obter fundos a fim de cobrir as perdas no jogo costumam ser os critérios menos frequentes e ocorrem mais entre pessoas com a forma do transtorno mais grave. Além disso, indivíduos que se apresentam para tratamento do transtorno do jogo geralmente mostram formas de moderadas a graves.

Características Diagnósticas Jogar envolve arriscar algo valioso na esperança de obter algo ainda mais valioso. Em diversas culturas, indivíduos apostam em jogos e eventos, e a maioria o faz sem experimentar problemas.


Transtorno do Jogo 587 Contudo, algumas pessoas desenvolvem um comprometimento considerável com relação ao seu comportamento de jogo. A característica essencial do transtorno do jogo é o comportamento de jogo desadaptativo persistente e recorrente que perturba os objetivos pessoais, familiares e/ou profissionais (Critério A). O transtorno do jogo é definido como um grupo de quatro ou mais sintomas listados no Critério A, com ocorrência no mesmo período de 12 meses. Um padrão de “recuperar as perdas” pode se desenvolver, acompanhado de uma necessidade urgente de continuar jogando (frequentemente com apostas ou riscos maiores) a fim de desfazer uma perda ou uma série de perdas. O indivíduo pode abandonar sua estratégia de jogo e tentar recuperar todas as perdas ao mesmo tempo. Embora muitos jogadores possam apresentar essa característica durante períodos breves, essa atitude frequente e em geral prolongada é típica do transtorno do jogo (Critério A6). As pessoas podem mentir para familiares, terapeutas, ou outras pessoas para esconder a extensão de seu envolvimento com o jogo e ocultar, entre outros, comportamentos ilícitos como falsificação, fraude, roubo ou estelionato para a obtenção de dinheiro para o jogo (Critério A7). Também podem apelar para comportamento de “resgate financeiro”, voltando-se para a família ou outras pessoas ao solicitar ajuda com uma situação financeira desesperadora causada pelo jogo (Critério A9).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Distorções do pensamento (p. ex., negação, superstições, sentimentos de poder e controle sobre o resultado de eventos regulados pelo acaso, excesso de confiança) podem estar presentes em indivíduos com transtorno do jogo. Muitos com o transtorno acreditam que o dinheiro é tanto a causa quanto a solução para seus problemas. Algumas pessoas com esse transtorno são impulsivas, competitivas, cheias de energia, inquietas e entediam-se facilmente; podem mostrar-se demasiadamente preocupadas com a aprovação dos outros e ser generosas a ponto da extravagância quando ganham. Outros indivíduos com o transtorno são deprimidos e solitários e podem jogar quando se sentem impotentes, culpados ou deprimidos. Até metade dos indivíduos sob tratamento para transtorno do jogo tem ideação suicida, e cerca de 17% tentaram suicídio.

Prevalência A taxa de prevalência no ano anterior de transtorno do jogo é de 0,2 a 0,3% na população em geral, e a taxa de prevalência ao longo da vida é de 0,4 a 1%. No caso do sexo feminino, a taxa de prevalência ao longo da vida de transtorno do jogo é de 0,2%, e, para o sexo masculino, é de 0,6%. A prevalência ao longo da vida do jogo patológico entre afro-americanos é de 0,9%, entre brancos, de 0,4%, e, entre hispânicos, de 0,3%.

Desenvolvimento e Curso O início do transtorno do jogo pode ocorrer durante a adolescência ou no início da idade adulta, mas, em outros indivíduos, manifesta-se na meia-idade ou até mesmo na idade adulta avançada. De modo geral, o transtorno do jogo desenvolve-se ao longo de anos, mas a progressão parece ser mais rápida em pessoas do sexo feminino do que nas do sexo masculino. A maioria dos indivíduos que desenvolvem um transtorno do jogo demonstra um padrão de jogo com aumento gradual tanto da frequência quanto do valor das apostas. Certamente, formas mais leves podem progredir para casos mais graves. A maioria dos indivíduos com transtorno do jogo relata que um ou dois tipos de jogos são os mais problemáticos para eles, embora alguns participem de várias formas de jogo. Os indivíduos tendem a se envolver com tipos determinados de jogos (p. ex., comprar raspadinhas diariamente) com mais frequência do que com outros (p. ex., máquinas caça-níquel ou jogar blackjack em cassinos todas as semanas). A frequência do jogo pode estar relacionada mais ao tipo de jogo do que à gravidade do transtorno do jogo geral. Por exemplo, adquirir uma única raspadinha por dia pode não ser problemático, enquanto apostas menos frequentes em cassinos, esportes ou jogos de cartas podem fazer parte de um transtorno do jogo. De modo semelhante, as quantias gastas em apostas não são em si indicativas de transtorno do


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

jogo. Algumas pessoas podem apostar milhares de dólares por mês sem apresentar um problema com o jogo, enquanto outras podem apostar quantias muito menores, mas sofrer dificuldades consideráveis relacionadas ao jogo. Os padrões de jogo podem ser regulares ou episódicos, e o transtorno pode ser persistente ou estar em remissão. O hábito de jogar pode ficar mais intenso durante períodos de estresse ou depressão e durante períodos de uso de ou abstinência de substâncias. Pode haver períodos de jogo pesado e problemas graves, épocas de abstinência total e períodos de jogo não problemático. O transtorno do jogo às vezes está associado a remissões espontâneas e duradouras. Ainda assim, alguns indivíduos subestimam sua vulnerabilidade para o desenvolvimento do transtorno do jogo ou sofrem recaída do transtorno após a remissão. Durante um período de remissão, as pessoas podem presumir erroneamente que não terão problemas em regular o jogo e que podem jogar outros tipos de jogos de forma não problemática, mas acabam voltando a apresentar o transtorno. A manifestação precoce do transtorno do jogo é mais comum no sexo masculino do que no sexo feminino. Indivíduos que começam a jogar na juventude costumam fazê-lo com familiares ou amigos. O desenvolvimento precoce do transtorno do jogo parece estar associado à impulsividade e ao abuso de substâncias. Muitos estudantes do ensino médio e universitários que desenvolvem o transtorno amadurecem e deixam de apresentar o transtorno com o tempo, embora ele permaneça sendo um problema para toda a vida em alguns deles. O início do transtorno na meia-idade ou em idade mais avançada é mais comum em pessoas do sexo feminino do que naquelas do sexo masculino. Há variações de idade e gênero no tipo das atividades de jogo e nas taxas de prevalência do transtorno. Ele é mais comum entre pessoas mais jovens e na meia-idade do que entre adultos mais velhos. Entre adolescentes e jovens adultos, o transtorno é mais prevalente no sexo masculino do que no sexo feminino. Indivíduos mais jovens preferem tipos diferentes de jogo (p. ex., apostas em esportes), enquanto adultos mais velhos desenvolvem problemas com caça-níqueis e bingos com maior frequência. Embora a proporção de indivíduos que buscam tratamento para o transtorno do jogo seja baixa em todas as faixas etárias, pessoas mais jovens, em particular, são menos propensas a se apresentar para tratamento. Indivíduos do sexo masculino são mais propensos a começar a jogar mais cedo na vida e a ser mais jovens no momento do início do transtorno do que os do sexo feminino, que têm maior probabilidade de começar a jogar mais tarde na vida e a desenvolver o transtorno do jogo em um período de tempo mais curto. Em comparação com os homens que apresentam o transtorno, as mulheres têm maior chance de apresentar transtornos depressivo, bipolar e de ansiedade. Elas também são mais velhas no início do transtorno e buscam tratamento mais cedo, embora as taxas de busca de tratamento sejam baixas (inferiores a 10%) entre indivíduos com transtorno do jogo, independentemente do gênero.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. O início do hábito de jogar na infância ou no início da adolescência está associado a taxas mais elevadas de transtorno do jogo. Aparentemente, o transtorno do jogo também se agrega ao transtorno da personalidade antissocial, aos transtornos depressivo e bipolar e a outros transtornos por uso de substâncias, especialmente aos transtornos relacionados ao álcool. Genéticos e fisiológicos. O transtorno do jogo pode ter um padrão de ocorrência famíliar, e esse efeito parece estar relacionado a fatores tanto ambientais quanto genéticos. Problemas com jogo são mais frequentes em gêmeos monozigóticos do que em gêmeos dizigóticos. O transtorno do jogo também é mais prevalente em parentes de primeiro grau de indivíduos com transtorno por uso de álcool de moderado a grave do que na população em geral. Modificadores do curso. Muitos indivíduos, incluindo adolescentes e adultos jovens, provavelmente melhoram de seus problemas relacionados ao transtorno do jogo com o passar do tempo, embora um forte preditor de futuros problemas com jogo sejam problemas anteriores com ele.


Transtorno do Jogo 589

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Indivíduos de culturas e raças/etnias específicas são mais propensos a participar de determinadas atividades de jogo do que de outras (p. ex., pai gow [dominós chineses], rinhas de galo, blackjack, corridas de cavalo). As taxas de prevalência do transtorno do jogo são mais altas entre afro-americanos do que entre americanos de descendência europeia, sendo que as taxas para hispano-americanos são semelhantes às de americanos de origem europeia. Populações indígenas têm altas taxas de prevalência de transtorno do jogo.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Indivíduos do sexo masculino desenvolvem transtorno do jogo em taxas mais elevadas do que os do sexo feminino, mas essa disparidade pode estar ficando menor. Em relação às mulheres, homens tendem a apostar em formas diferentes de jogo, sendo que jogos envolvendo cartas, esportes e corrida de cavalos são mais prevalentes no sexo masculino, e jogos como caça-níqueis e bingo são mais comuns no sexo feminino.

Consequências Funcionais do Transtorno do Jogo Áreas do funcionamento psicossocial, da saúde e da saúde mental podem ser afetadas de forma adversa pelo transtorno do jogo. Especificamente, indivíduos com o transtorno podem, devido a seu envolvimento com jogo, colocar em risco ou perder relacionamentos importantes com familiares ou amigos. Tais problemas podem ocorrer em decorrência de mentiras constantes aos outros para encobrir a extensão do jogo ou devido a empréstimos usados para jogar ou para saldar dívidas de jogo. O emprego ou atividades educacionais podem sofrer um impacto adverso da mesma forma pelo transtorno do jogo; absenteísmo ou baixo desempenho no trabalho ou na escola podem ocorrer com o transtorno, já que os indivíduos podem jogar durante o expediente ou durante o turno escolar ou estar preocupados com o jogo ou com suas consequências adversas quando deveriam estar trabalhando ou estudando. Indivíduos com transtorno do jogo têm saúde geral debilitada e utilizam serviços médicos em taxas elevadas.

Diagnóstico Diferencial Jogo sem transtorno. O transtorno do jogo deve ser distinguido do jogo profissional e do jogo social. No jogo profissional, os riscos são limitados, e a disciplina é fundamental. O jogo social ocorre geralmente com amigos ou colegas e dura um período limitado de tempo, com perdas aceitáveis. Alguns indivíduos podem apresentar problemas associados ao jogo (p. ex., comportamento breve de recuperação do prejuízo e perda de controle) que não satisfazem todos os critérios para transtorno do jogo. Episódio maníaco. A perda de julgamento e o jogo em excesso podem ocorrer durante um episódio maníaco. Um diagnóstico adicional de transtorno do jogo deve ser dado apenas se o comportamento de jogo não é mais bem explicado por episódios maníacos (p. ex., história de comportamento de jogo desadaptativo em momentos fora do período do episódio maníaco). Em contrapartida, um indivíduo com o transtorno pode, durante um período de jogo, exibir comportamento que se assemelha a um episódio maníaco, mas, assim que ele se distancia do jogo, essas características maníacas desaparecem. Transtornos da personalidade. Problemas com jogo podem ocorrer em indivíduos com transtorno da personalidade antissocial e com outros transtornos da personalidade. Caso os critérios sejam satisfeitos para os dois transtornos, ambos podem ser diagnosticados. Outras condições médicas. Alguns pacientes em uso de medicamento dopaminérgico (p. ex., para doença de Parkinson) podem sentir ânsia por jogar. Caso esses sintomas desapareçam com a redução da dosagem ou interrupção dos medicamentos dopaminérgicos, então não se indica o diagnóstico de transtorno do jogo.


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Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos

Comorbidade O transtorno do jogo está associado a um quadro de saúde geral debilitada. Além disso, alguns diagnósticos médicos específicos, como taquicardia e angina, são mais comuns entre indivíduos com transtorno do jogo do que na população em geral, mesmo quando há controle de outros transtornos por uso de substância, incluindo transtorno por uso de tabaco. Indivíduos com transtorno do jogo têm taxas elevadas de comorbidade com outros transtornos mentais, como transtornos por uso de substâncias, transtornos depressivos, transtornos de ansiedade e transtornos da personalidade. Em alguns indivíduos, outros transtornos mentais podem preceder o transtorno do jogo e estar ou ausentes ou presentes durante a manifestação do transtorno. O transtorno do jogo também pode ocorrer antes do início de outros transtornos mentais, especialmente no caso de transtornos de ansiedade e transtornos por uso de substâncias.


Transtornos Neurocognitivos Os transtornos neurocognitivos (TNCs) (referidos no DSM-IV como “Demência, Delirium, Transtorno Amnéstico e Outros Transtornos Cognitivos”) são delirium, seguido por síndromes de TNC maior, TNC leve e seus subtipos etiológicos. Os subtipos maiores ou leves de TNC incluem TNC devido à doença de Alzheimer; TNC vascular; TNC com corpos de Lewy; TNC devido à doença de Parkinson; TNC frontotemporal; TNC devido a lesão cerebral traumática; TNC devido a infecção por HIV; TNC induzido por substância/medicamento; TNC devido à doença de Huntington; TNC devido à doença do príon; TNC devido a outra condição médica; TNC devido a múltiplas etiologias; e TNC não especificado. A categoria TNC abrange o grupo de transtornos em que o déficit clínico primário está na função cognitiva, sendo transtornos adquiridos em vez de transtornos do desenvolvimento. Apesar de os déficits cognitivos estarem presentes em muitos transtornos mentais, se não em todos (p. ex., esquizofrenia, transtornos bipolares), apenas aqueles transtornos cujas características centrais são cognitivas é que fazem parte da categoria TNC. Os TNCs são aqueles em que a cognição prejudicada não estava presente ao nascimento ou muito no início da vida, representando, assim, um declínio a partir de um nível de funcionamento alcançado anteriormente. Os TNCs são únicos entre as categorias do DSM-5, na medida em que são síndromes para as quais a patologia subjacente, e com frequência também a etiologia, pode potencialmente ser determinada. As várias entidades da doença subjacente foram alvos de extensa pesquisa, experiência clínica e consenso de especialistas sobre os critérios diagnósticos. Os critérios do DSM-5 para esses transtornos foram desenvolvidos por meio de consulta rigorosa a grupos de especialistas para cada uma das doenças, sendo alinhados o máximo possível com os critérios de consensos atuais para cada uma delas. A utilidade potencial dos biomarcadores também é discutida em relação ao diagnóstico. A demência está incorporada à entidade recém-nomeada transtorno neurocognitivo maior, embora não esteja excluído o uso do termo demência em subtipos etiológicos nos quais é um termo-padrão. Além disso, o DSM-5 reconhece um nível menos grave de prejuízo cognitivo, o transtorno neurocognitivo leve, que pode também ser foco de cuidado, e que, no DSM-IV, era parte de “Transtorno Cognitivo Sem Outra Especificação”. Há critérios diagnósticos para ambas as entidades sindrômicas, seguidos de critérios diagnósticos para os diferentes subtipos etiológicos. Vários TNCs costumam coexistir, e suas relações podem ser ainda mais bem caracterizadas sob diferentes subtítulos deste capítulo, incluindo “Diagnóstico Diferencial” (p. ex., TNC devido à doença de Alzheimer versus TNC vascular), “Fatores de Risco e Prognóstico” (p. ex., patologia vascular que aumenta a expressão clínica da doença de Alzheimer) e/ou “Comorbidade” (p. ex., patologia mista de doença de Alzheimer-vascular). O termo demência é mantido no DSM-5 para continuidade, podendo ser usado em contextos em que médicos e pacientes estejam acostumados a ele. Embora demência seja o termo habitual para transtornos como as demências degenerativas, que costumam afetar adultos com mais idade, o termo transtorno neurocognitivo é amplamente empregado, sendo, em geral, o termo preferido para condições que afetam pessoas mais jovens, como o prejuízo secundário a lesão cerebral traumática ou a infecção pelo HIV. A definição de TNC maior, além disso, é mais ampla que o termo demência, no sentido de que pessoas com declínio substancial em um só domínio podem receber esse diagnóstico, mais notadamente a categoria do DSM-IV “Transtorno Amnéstico”, agora diagnosticado como TNC maior devido a outra condição médica e para o qual o termo demência não será utilizado.


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Transtornos Neurocognitivos

Domínios Neurocognitivos Os critérios para os vários TNCs baseiam-se em domínios cognitivos definidos. A Tabela 1 traz uma definição de trabalho para cada um dos domínios principais, exemplos de sintomas ou observações relativas aos prejuízos em atividades cotidianas e exemplos de avaliações. Os domínios assim definidos, junto a diretrizes para limiares clínicos, compõem a base sobre a qual os TNCs, seus níveis e seus subtipos podem ser diagnosticados.


Exemplos de sintomas ou observações

Exemplos de avaliações

Função executiva Maior: Abandono de projetos complexos. Necessidade de (planejamento, toconcentrar-se em uma tarefa de cada vez. Necessidade mada de decisão, de confiar em outros para planejar atividades importanmemória de trates da vida diária ou tomar decisões. balho, resposta a Leve: Esforço maior é necessário para concluir projetos que feedback/correção tenham várias etapas. Maior dificuldade em multitarede erros, substifas ou dificuldade de retomar uma tarefa interrompida tuir hábitos/inibipor visita ou telefonema. Pode queixar-se de aumento ção, flexibilidade da fadiga decorrente de esforço extra, necessário para mental) organizar, planejar e tomar decisões. Pode relatar que grandes reuniões sociais são mais exaustivas e menos agradáveis devido ao aumento do esforço necessário para acompanhamento de conversas triviais.

(continua)

Planejamento: Habilidade para encontrar a saída em um labirinto; interpreta uma combinação de figuras ou objetos em sequência. Tomada de decisão: Desempenho de tarefas que avaliam o processo de decisão diante de alternativas (p. ex., simulação de aposta). Memória de trabalho: Capacidade de manter informações por período curto e de manipulá-las (p. ex., aumento de uma lista de números ou repetição de uma série de números ou palavras, de trás para a frente). Resposta a feedback/utilização de erros: Capacidade de beneficiar-se de feedback ou crítica para inferir as regras para resolver um problema. Substituição de hábitos/inibição: Capacidade de escolher uma solução mais complexa e exigente para ser correto (p. ex., olhar além do rumo indicado por uma flecha; dar nome à cor da fonte de uma palavra e não nomear a palavra). Flexibilidade mental/cognitiva: Capacidade de mudar entre dois conceitos, tarefas ou regras de resposta (p. ex., de número para letra, de resposta verbal para pressionamento de tecla, de soma de números para ordenamento de números, de ordenamento de objetos por tamanho para ordenamento por cor).

Atenção complexa Maior: Passou a ter uma dificuldade maior em ambientes Atenção sustentada: Manutenção da atenção ao longo do tempo (p. ex., pressio(atenção sustencom múltiplos estímulos (TV, rádio, conversas); é distraínar um botão sempre que escuta um tom e durante certo tempo). tada, atenção do com facilidade por eventos concomitantes no meio Atenção seletiva: Manutenção da atenção apesar de estímulos concorrentes e/ dividida, atenção ambiente. Não consegue participar a menos que a quanou distratores: escutar a leitura de letras e números e repetir apenas as leseletiva, velocitidade de estímulos seja limitada e simplificada. Tem ditras. dade de processaficuldade de manter novas informações, como relembrar Atenção dividida: Participar de duas tarefas no mesmo período de tempo: bater mento) números de telefone ou endereços recém-fornecidos, rapidamente enquanto aprende uma história que está sendo lida. A veloou relatar o que acabou de ser dito. Não consegue fazer cidade de processamento pode ser quantificada em qualquer tarefa cronocálculos mentais. Todo pensamento leva mais tempo do metrando-a (p. ex., tempo para unir blocos em determinada forma; tempo que o normal, e os componentes a serem processados para combinar símbolos com números; velocidade para responder, como a têm de ser simplificados para um ou poucos. velocidade de contagem ou a velocidade de séries de 3). Leve: Tarefas normais levam mais tempo do que anteriormente. Passa a cometer erros em tarefas rotineiras; acha que o trabalho necessita ser conferido de novo mais vezes do que anteriormente. Pensar é mais fácil quando não é concomitante com outras coisas (rádio, TV, outras conversas, telefone celular, dirigir).

Domínio cognitivo

TABELA 1 Domínios neurocognitivos

Transtornos Neurocognitivos 593


Maior: Tem dificuldades significativas com a linguagem Linguagem expressiva: Citação confrontativa (identificação de objetos ou figuexpressiva ou receptiva. Costuma usar expressões de ras); fluência (p. ex., nomear tantos itens quanto possível em uma categoria uso comum, como “aquela coisa” e “você sabe o que semântica [p. ex., animais] ou fonêmica [p. ex., palavras que começam com quero dizer”, e prefere pronomes genéricos a nomes. “f”] em um minuto). Com prejuízo grave, pode até não lembrar nomes de Gramática e sintaxe (p. ex., omissão ou uso incorreto de artigos, preposições, amigos mais próximos e familiares. Ocorrem uso de paverbos auxiliares): Erros observados durante testes de nomeação e fluência lavras idiossincráticas, erros gramaticais e espontaneisão comparados aos padrões normais para avaliar a frequência de erros e dade produtiva, bem como economia de comentários. comparados com pequenos erros normais da língua. Estereótipos no discurso ocorrem; ecolalia e discurso Linguagem receptiva: Compreensão (tarefas de definição de palavras e identifiautomático costumam anteceder o mutismo. cação de objetos envolvendo estímulos animados e inanimados): realização Leve: Apresenta dificuldade visível para encontrar as palade ações/atividades conforme comando verbal. vras. Pode substituir termos genéricos por específicos. Pode evitar uso de nomes específicos de pessoas conhecidas. Os erros gramaticais envolvem omissão sutil ou uso incorreto de artigos, preposições, verbos auxiliares, etc.

Linguagem (linguagem expressiva [inclui nomeação, encontrar palavras, fluência, gramática e sintaxe] e linguagem receptiva)

(continua)

Maior: Repete-se na conversação, frequentemente em uma Alcance da memória imediata: Capacidade de repetir uma lista de palavras ou mesma conversa. Não consegue se ater a uma lista curta algarismos. de itens ao fazer compras ou lista de planos para o dia. Nota: A memória imediata às vezes é considerada “memória de trabalho” Precisa de lembretes frequentes para orientar uma tarefa (ver “Função Executiva”). à mão. Memória recente: Avalia o processo de codificar novas informações (p. ex., listas Leve: Tem dificuldades de recordar eventos recentes e cada de palavras, contos ou diagramas). Os aspectos da memória recente que povez conta mais com elaboração de listas ou calendário. dem ser testados incluem 1) evocação livre (pede-se à pessoa que relembre o Precisa de lembretes ocasionais ou de releitura para máximo de palavras, diagramas ou elementos de uma história); 2) evocação acompanhar os personagens em um filme ou romance. com pistas (o examinador ajuda a recordar, dando pistas semânticas, como Ocasionalmente, pode repetir-se por várias semanas “Listar todos os itens alimentares em uma lista” ou “Citar todas as crianças para uma mesma pessoa. Não sabe dizer se contas já da história”); e 3) memória de reconhecimento (o examinador solicita itens foram pagas. específicos – p. ex., “‘Maçã’ estava na lista?” ou “Você viu este diagrama ou Nota: A não ser em formas graves de transtorno neurocogfigura?”). Outros aspectos da memória que podem ser avaliados incluem nitivo maior, as memórias semântica, autobiográfica e memória semântica (memória de fatos), memória autobiográfica (memória implícita ficam relativamente preservadas na comparade eventos pessoais ou pessoas) e aprendizagem (aprendizagem inconscienção com a memória recente. te de habilidades) implícita (de procedimentos).

Aprendizagem e memória (memória imediata, memória recente [incluindo recordação livre, recordação por pistas e memória de reconhecimento]; memória de muito longo prazo [semântica, autobiográfica], aprendizagem implícita)

Exemplos de avaliações

Exemplos de sintomas ou observações

Domínio cognitivo

TABELA 1 Domínios neurocognitivos (continuação)

594 Transtornos Neurocognitivos


Maior: Apresenta grandes dificuldades com atividades an- Percepção visual: Tarefas lineares com duas seções podem ser usadas para a detes familiares (uso de instrumentos, direção de veículo tecção de defeito visual básico ou deficiência da atenção. Tarefas perceptivas automotivo), navegação em ambientes conhecidos; sem uso da motricidade (incluindo reconhecimento facial) necessitam de costuma ficar confuso ao anoitecer, quando sombras e identificação e/ou combinação de figuras – melhor quando as tarefas não níveis reduzidos de luz mudam as percepções. podem ser mediadas verbalmente (p. ex., figuras não são objetos); algumas exigem a decisão de se uma figura pode ser “real” ou não baseada na diLeve: Pode depender mais de mapas ou de outras pessoas mensionalidade. para orientar-se. Usa anotações e acompanha os demais para chegar a outro local. Pode se achar perdido ou Visuoconstrutiva: Reunir itens com necessidade de coordenação dos olhosdando voltas quando não concentrado na tarefa. É me-mãos, como desenhar, copiar e montar blocos. nos preciso ao estacionar. Precisa de muito esforço para Perceptomotora: Integrar a percepção com movimentos que têm um propósito tarefas espaciais, como carpintaria, montagem, costura (p. ex., inserção de blocos em uma placa sem pistas visuais; inserir, rapidaou tricô. mente, pinos em estrutura com orifícios). Práxis: Integridade de movimentos aprendidos, como habilidade de imitar gestos (abanar ao dar adeus), ou uso de pantomima do uso de objetos (“Mostre-me como você usaria um martelo”). Gnosia: Integridade perceptiva da conscientização e do reconhecimento, como o reconhecimento de faces e cores.

Maior: Comportamento claramente fora das variações so- Reconhecimento de emoções: Identificação de emoções em imagens de rostos que ciais aceitáveis; mostra insensibilidade a padrões sociais representam uma variedade de emoções positivas e negativas. de pudor no vestir-se ou em tópicos políticos, religiosos Teoria da mente: Capacidade de considerar o estado mental de outra pessoa ou sexuais nas conversas. Concentra-se excessivamente (pensamentos, desejos, intenções) ou sua experiência – cartões que contam em um tópico apesar do desinteresse ou retorno direto uma história, com perguntas para provocar informações sobre o estado do grupo. Objetivo comportamental sem considerar mental dos indivíduos retratados, tal como “Onde a garota procurará a bolfamília ou amigos. Toma decisões sem considerar a sa perdida?” ou “Por que o garoto está triste?”. segurança (p. ex., roupas inadequadas ao clima ou ao contexto social). Comumente, tem pouco entendimento dessas mudanças. Leve: Apresenta mudanças sutis no comportamento ou nas atitudes, comumente descritas como uma mudança de personalidade, tais como menos capacidade de reconhecer sinais sociais ou ler expressões faciais, menor empatia, aumento da extroversão ou da introversão, menos inibição, ou apatia ou inquietação episódica ou sutil.

Perceptomotor (inclui habilidades abrangidas por termos como percepção visual, visuoconstrutiva, perceptomotora, práxis e gnosia)

Cognição social (reconhecimento de emoções, teoria da mente)

Exemplos de avaliações

Exemplos de sintomas ou observações

Domínio cognitivo

TABELA 1 Domínios neurocognitivos (continuação)

Transtornos Neurocognitivos 595


596

Transtornos Neurocognitivos

Delirium Critérios Diagnósticos A. Perturbação da atenção (i.e., capacidade reduzida para direcionar, focalizar, manter e mudar a atenção) e da consciência (menor orientação para o ambiente). B. A perturbação se desenvolve em um período breve de tempo (normalmente de horas a poucos dias), representa uma mudança da atenção e da consciência basais e tende a oscilar quanto à gravidade ao longo de um dia. C. Perturbação adicional na cognição (p. ex., déficit de memória, desorientação, linguagem, capacidade visuoespacial ou percepção). D. As perturbações dos Critérios A e C não são mais bem explicadas por outro transtorno neurocognitivo preexistente, estabelecido ou em desenvolvimento e não ocorrem no contexto de um nível gravemente diminuído de estimulação, como no coma. E. Há evidências a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais de que a perturbação é uma consequência fisiológica direta de outra condição médica, intoxicação ou abstinência de substância (i.e., devido a uma droga de abuso ou a um medicamento), de exposição a uma toxina ou de que ela se deva a múltiplas etiologias. Determinar o subtipo: Delirium por intoxicação por substância: Este diagnóstico deve ser feito em vez de intoxicação por substância quando predominarem os sintomas dos Critérios A e C no quadro clínico e quando forem suficientemente graves para justificar atenção clínica. Nota para codificação: Os códigos da CID-9-MC e da CID-10-MC para delirium por intoxicação por [substância específica] são indicados na tabela a seguir. Observar que o código da CID-10-MC depende de haver ou não transtorno comórbido por uso de substância presente para a mesma classe de substância. Se um transtorno leve por uso de substância é comórbido com o delirium por intoxicação por substância, o número da 4a posição é “1”, e o clínico deve registrar “transtorno leve por uso de [substância]” antes de delirium por intoxicação por substância (p. ex., “transtorno leve por uso de cocaína com delirium por intoxicação por cocaína”). Se um transtorno moderado a grave por uso de substância for comórbido com delirium por intoxicação por uso de substância, o número da 4a posição é “2”, e o clínico deve registrar “transtorno moderado por uso de [substância]”, ou “transtorno grave por uso de [substância]”, dependendo da gravidade do transtorno comórbido por uso de substância. Não existindo transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., após uso único e exagerado da substância), o número da 4a posição é “9”, e o clínico deve registrar somente o delirium por intoxicação por substância. CID-10-MC Com Com transtorno transtorno por Sem por uso, uso, moderado transtorno CID-9-MC leve a grave por uso Álcool

291.0

F10.121

F10.221

F10.921

Cannabis

292.81

F12.121

F12.221

F12.921

Fenciclidina

292.81

F16.121

F16.221

F16.921

Outro alucinógeno

292.81

F16.121

F16.221

F16.921

Inalante

292.81

F18.121

F18.221

F18.921

Opioide

292.81

F11.121

F11.221

F11.921

Sedativo, hipnótico ou ansiolítico

292.81

F13.121

F13.221

F13.921

Anfetamina (ou outro estimulante)

292.81

F15.121

F15.221

F15.921


Delirium

597

CID-10-MC Com Com transtorno transtorno por Sem por uso, uso, moderado transtorno CID-9-MC leve a grave por uso Cocaína

292.81

F14.121

F14.221

F14.921

Outra substância (ou substância desconhecida)

292.81

F19.121

F19.221

F19.921

Delirium por abstinência de substância: Este diagnóstico deve ser feito em vez de abstinência de substância quando os sintomas dos Critérios A e C predominarem no quadro clínico e quando forem suficientemente graves para justificar atenção clínica. Código delirium por abstinência de [substância específica]: 291.0 (F10.231) álcool; 292.0 (F11.23) opioide; 292.0 (F13.231) sedativo, hipnótico ou ansiolítico; 292.0 (F19.231) outra substância/medicamento (ou substância/medicamento desconhecida). Delirium induzido por medicamento: Este diagnóstico é aplicável quando os sintomas dos Critérios A e C aparecem como efeito colateral de um medicamento tomado conforme prescrição. Nota para codificação: O código da CID-9-MC para delirium induzido por [medicamento específico] é 292.81. O código da CID-10-MC depende do tipo de medicamento. Se for um opioide tomado conforme prescrição, o código é F11.921. Se o medicamento for sedativo, hipnótico ou ansiolítico tomado conforme prescrito, o código é F13.921. Se o medicamento for do tipo anfetamina ou outro estimulante tomado conforme prescrito, o código é F15.921. No caso de medicamentos que não se enquadram em nenhuma classe (p. ex., dexametasona) e nos casos em que se acredita que uma substância seja o fator etiológico, embora seja desconhecida sua classe específica, o código é F19.921. 293.0 (F05) Delirium devido a outra condição médica: Há evidências a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais de que a perturbação é atribuível às consequências fisiológicas de outra condição médica. Nota para codificação: Incluir o nome da outra condição médica no nome do delirium (p. ex., 293.0 [F05] delirium devido a encefalopatia hepática). A outra condição médica também deve ser codificada e listada em separado, imediatamente antes do delirium devido a outra condição médica (p. ex., 572.2 [K72.90] encefalopatia hepática; 293.0 [F05] delirium devido a encefalopatia hepática). 293.0 (F05) Delirium devido a múltiplas etiologias: Há evidências da história, do exame físico ou de achados laboratoriais de que o delirium tem mais de uma etiologia (p. ex., mais de uma condição médica etiológica; outra condição médica mais intoxicação por substância ou efeito colateral de medicamento). Nota para codificação: Usar múltiplos códigos separados que reflitam etiologias específicas de delirium (p. ex., 572.2 [K72.90] encefalopatia hepática; 293.0 [F05] delirium devido a insuficiência hepática; 291.0 [F10.231]) delirium devido a abstinência de álcool. Observar que a condição médica etiológica aparece como um código separado que antecede o código do delirium e é substituído por delirium devido a condição médica de outra rubrica. Especificar se: Agudo: Duração de poucas horas a dias. Persistente: Duração de semanas ou meses. Especificar se: Hiperativo: O indivíduo tem um nível hiperativo de atividade psicomotora que pode ser acompanhado de oscilação de humor, agitação e/ou recusa a cooperar com os cuidados médicos. Hipoativo: O indivíduo tem um nível hipoativo de atividade psicomotora que pode estar acompanhado de lentidão e letargia que se aproxima do estupor. Nível misto de atividade: O indivíduo tem um nível normal de atividade psicomotora mesmo com perturbação da atenção e da percepção. Inclui ainda pessoas cujo nível de atividade oscila rapidamente.


598

Transtornos Neurocognitivos

Procedimentos para Registro Delirium por intoxicação por substância CID-9-MC. O nome do delirium por intoxicação por substância/medicamento termina com a substância específica (p. ex., cocaína, dexametasona) supostamente causadora do delirium. O código diagnóstico é escolhido na tabela incluída no conjunto de critérios diagnósticos, com base na classe da substância. No caso de substâncias que não se enquadram em nenhuma classe (p. ex., dexametasona), o código para “outra substância” deve ser usado; e, nos casos em que se acredita que uma substância seja o fator etiológico, embora sua classe seja desconhecida, deve ser usada a categoria “substância desconhecida”. O nome do transtorno é seguido do curso (i.e., agudo, persistente), seguido do especificador indicativo do nível de atividade psicomotora (i.e., hiperativo, hipoativo, misto). Diferentemente do registro de procedimentos para a CID-10-MC, que combina delirium por intoxicação por substância/medicamento e transtorno por uso de substância em um só código, para a CID-9-MC é feito um diagnóstico separado para o transtorno por uso de substância. Por exemplo, no caso de delirium por intoxicação agudo e hiperativo que ocorre em um homem com um transtorno grave por uso de cocaína, o diagnóstico é 292.81 delirium por intoxicação por cocaína, agudo, hiperativo. É feito, ainda, um diagnóstico adicional de 304.20 transtorno grave por uso de cocaína. Se o delirium por intoxicação ocorre sem transtorno por uso de substância comórbido (p. ex., após uso pesado e único da substância), não é registrado transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., 292.81 delirium por intoxicação por fenciclidina, agudo e hipoativo). CID-10-MC. O nome do delirium por intoxicação por substância/medicamento termina com a substância específica (p. ex., cocaína, dexametasona) supostamente causadora do delirium. O código diagnóstico é escolhido na tabela incluída no conjunto de critérios diagnósticos, com base na classe da substância e na presença ou ausência de um transtorno comórbido por uso de substância. No caso de substâncias que não se enquadram em nenhuma classe (p. ex., dexametasona), o código para “outra substância” deve ser usado; e, nos casos em que se acredita que uma substância seja o fator etiológico, embora sua classe específica seja desconhecida, deve ser usada a categoria “substância desconhecida”. Ao registrar o nome do transtorno, o transtorno comórbido por uso de substância (se houver) é listado primeiro, seguido da palavra “com”, seguida do nome do delirium por intoxicação por substância, seguido do curso (i.e., agudo, persistente), seguido do especificador indicando o nível de atividade psicomotora (i.e., hiperativo, hipoativo, misto). Por exemplo, no caso de delirium por intoxicação agudo e hiperativo, que ocorre em um homem com transtorno grave por uso de cocaína, o diagnóstico é F14.221 transtorno grave por uso de cocaína, com delirium por intoxicação por cocaína, agudo e hiperativo. Não é feito um diagnóstico separado de transtorno comórbido e grave por intoxicação por cocaína. Se ocorre delirium por intoxicação sem transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., após uso pesado e único da substância), não é registrado transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., F16.921 delirium por intoxicação por fenciclidina, agudo e hipoativo).

Delirium devido a abstinência de substância CID-9-MC. O nome do delirium devido a abstinência de substância/medicamento termina com a substância específica (p. ex., álcool) supostamente causadora do delirium devido a abstinência. O código diagnóstico é escolhido entre os códigos específicos para substâncias, incluídos na nota para codificação, que é parte do conjunto de critérios. O nome do transtorno é seguido do curso (i.e., agudo, persistente), seguido do especificador indicativo do nível de atividade psicomotora (i.e., hiperativo, hipoativo, misto). Diferentemente dos procedimentos para registro para a CID-10-MC, que combinam delirium devido a abstinência de substância/medicamento e transtorno por uso de substância em um único código, no caso da CID-9-MC é feito um diagnóstico separado para o transtorno devido a uso de substância. Por exemplo, no caso de delirium devido a abstinência agudo e hiperativo que ocorre em um homem com transtorno grave devido a uso de álcool, o diagnóstico é 291.0 delirium devido a abstinência de álcool, agudo e hiperativo. É feito também diagnóstico adicional de 303.90 transtorno grave por uso de álcool.


Delirium

599

CID-10-MC. O nome do delirium devido a abstinência de substância/medicamento termina com a substância específica (p. ex., álcool) supostamente causadora do delirium devido a abstinência. O código diagnóstico é escolhido entre os códigos específicos para substâncias incluídos na nota para codificação, que é parte do conjunto de critérios. Ao registrar o nome do transtorno, é listado primeiro o transtorno comórbido moderado ou grave devido a uso de substância (se houver), seguido da palavra “com”, seguida de delirium devido a abstinência de substância, seguido do curso (i.e., agudo, persistente), seguido do especificador indicativo do nível de atividade psicomotora (i.e., hiperativo, hipoativo, misto). Por exemplo, no caso de delirium devido a abstinência agudo e hiperativo que ocorre em um homem com um transtorno grave devido a uso de álcool, o diagnóstico é F10.231 transtorno grave devido a uso de álcool, com delirium devido a abstinência de álcool, agudo e hiperativo. Não é feito um diagnóstico separado de transtorno comórbido e grave devido a uso de álcool. Delirium induzido por medicamento. O nome do delirium induzido por medicamento termina com a substância específica (p. ex., dexametasona) supostamente causadora do delirium. O nome do transtorno é seguido do curso (i.e., agudo, persistente), seguido do especificador indicativo do nível de atividade psicomotora (i.e., hiperativo, hipoativo, misto). Por exemplo, no caso de delirium induzido por medicamento agudo e hiperativo que ocorre em um homem que usa dexametasona conforme prescrição, o diagnóstico é 292.81 (F19.921) delirium induzido por dexametasona, agudo e hiperativo.

Especificadores Em relação ao curso, em hospitais, o delirium costuma durar cerca de uma semana, embora alguns sintomas normalmente persistam mesmo depois que as pessoas recebem alta. Indivíduos com delirium podem rapidamente mudar entre os estados hiperativo e hipoativo. O estado hiperativo pode ser mais comum ou mais frequentemente reconhecido, em geral associado a efeitos colaterais de medicamentos e a abstinência de substância. O estado hipoativo pode ser mais frequente em adultos mais velhos.

Características Diagnósticas A característica essencial do delirium é uma perturbação da atenção ou da consciência, acompanhada de uma mudança na cognição basal, que não pode ser mais bem explicada por algum transtorno neurocognitivo preexistente ou em desenvolvimento. A perturbação da atenção (Critério A) é manifestada por capacidade reduzida de direcionar, focalizar, manter e mudar a atenção. Perguntas têm de ser repetidas, uma vez que a atenção do indivíduo é vaga, ou a pessoa pode perseverar em uma resposta a uma pergunta anterior e não mudar a atenção de forma adequada. O indivíduo é facilmente distraído por estímulos irrelevantes. A perturbação na consciência é manifestada por uma orientação reduzida ao ambiente ou, por vezes, até para si mesmo. A perturbação aparece durante curto período de tempo, em geral de horas a alguns dias, com tendência a oscilar ao longo do dia, com piora ao entardecer e à noite, quando diminuem os estímulos externos de orientação (Critério B). Há evidências a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais de que a perturbação é uma consequência fisiológica de alguma condição médica subjacente, intoxicação ou abstinência de substância, uso de medicamento ou exposição a toxina ou de que é uma combinação desses fatores (Critério E). A etiologia deve ser codificada conforme o subtipo etiologicamente apropriado (i.e., intoxicação devido a substância ou medicamento, abstinência de substância, outra condição médica ou múltiplas etiologias). Costuma ocorrer delirium no contexto de um TNC subjacente. A função cerebral prejudicada de pessoas com TNC leve e maior torna-as vulneráveis a delirium. Há uma mudança adicional em, no mínimo, outra área que pode incluir memória e aprendizagem (em especial memória recente), desorientação (em especial para tempo e lugar), alteração na linguagem, distorção da percepção ou uma perturbação perceptomotora (Critério C). As perturbações perceptivas que acompanham o delirium incluem interpretações errôneas, ilusões ou alucinações; são perturbações comumente visuais, embora possam também ocorrer em outras modalidades, variando de simples e uniformes a altamente complexas. Atenção/excitação normais, delirium


600

Transtornos Neurocognitivos

e coma situam-se em um continuum, com o coma definido como ausência de qualquer resposta a estímulos verbais. A capacidade de avaliar a cognição para o diagnóstico de delirium depende de existir um nível de excitação suficiente para a resposta à estimulação verbal; assim, o delirium não deve ser diagnosticado no contexto de coma (Critério D). Muitos pacientes não comatosos têm nível de excitação diminuído. Os que mostram apenas reações mínimas a estímulos verbais são incapazes de colaborar em tentativas em testes padronizados ou mesmo em entrevistas. Essa incapacidade de colaboração deve ser classificada como desatenção grave. Estados de baixo nível de excitação (de início agudo) devem ser reconhecidos como indicadores de desatenção grave e mudança cognitiva e, consequentemente, delirium. São clinicamente indistinguíveis de delirium diagnosticado com base em desatenção ou alteração cognitiva provocada por meio de testes cognitivos e entrevista.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O delirium costuma estar associado a perturbação no sono-vigília. Essa perturbação pode incluir sonolência diurna, agitação noturna, dificuldade para adormecer, sono excessivo durante o dia ou vigília durante a noite. Em alguns casos, pode ocorrer inversão total do sono-vigília noite-dia. Perturbações no sono-vigília são muito comuns no delirium, tendo sido propostas como um critério central para o diagnóstico. O indivíduo com delirium pode mostrar perturbações emocionais, como ansiedade, medo, depressão, irritabilidade, raiva, euforia e apatia. Pode haver mudanças rápidas e imprevisíveis de um estado emocional a outro. O estado emocional perturbado pode, ainda, ficar evidente ao chamar, gritar, amaldiçoar, murmurar, queixar-se ou produzir outros sons. Esses comportamentos são especialmente prevalentes à noite e sob condições em que faltam estímulos ambientais.

Prevalência A prevalência de delirium é muito alta entre idosos, variando conforme as características individuais, o local de atendimento e a sensibilidade do método de detecção. Sua prevalência na comunidade como um todo é baixa (1 a 2%), mas aumenta com a idade, chegando a 14% entre pessoas com mais de 85 anos. Atinge entre 10 e 30% das pessoas idosas que vão a setores de emergência, onde o delirium costuma indicar uma doença médica. A prevalência de delirium quando as pessoas são admitidas em hospitais varia de 14 a 24%, com estimativas da incidência de aparecimento dessa condição durante a hospitalização variando de 6 a 56% em populações hospitalares em geral. Ocorre delirium em 15 a 53% dos idosos no pós-operatório e em 70 a 87% daqueles em unidades intensivas; em até 60% das pessoas em instituições para idosos ou em locais de atendimento pós-agudo; e em até 83% de todas as pessoas no fim da vida.

Desenvolvimento e Curso Ao mesmo tempo que a maioria dos indivíduos com delirium tem recuperação completa com ou sem tratamento, o reconhecimento e a intervenção precoces costumam reduzir sua duração. A condição pode progredir até estupor, coma, convulsões ou morte, em especial quando a causa subjacente continua sem tratamento. A mortalidade entre pessoas hospitalizadas com delirium é alta, e até 40% dos indivíduos com essa condição, sobretudo os com malignidades e outras doenças médicas subjacentes e significativas, morrem dentro de um ano após o diagnóstico.

Fatores de Risco e Prognóstico Ambientais. O delirium pode aumentar em contexto de prejuízo funcional, imobilidade, história de quedas, baixos níveis de atividade e uso de drogas e medicamentos com propriedades psicoativas (especialmente álcool e anticolinérgicos). Genéticos e fisiológicos. Transtornos neurocognitivos maiores e leves podem aumentar o risco de delirium e complicar o curso. Idosos são particularmente suscetíveis a essa condição na


Outro Delirium Especificado 601 comparação com pessoas mais jovens. A suscetibilidade ao delirium na infância pode ser maior do que no começo e na fase intermediária da vida adulta. Na infância, pode ter relação com doenças febris e alguns medicamentos (p. ex., anticolinérgicos).

Marcadores Diagnósticos Além de achados laboratoriais característicos de condições médicas subjacentes (ou estados de intoxicação ou abstinência), costuma haver lentificação generalizada no eletrencefalograma, sendo ocasionalmente encontrada atividade rápida (p. ex., em alguns casos de delirium devido a abstinência de álcool). No entanto, eletrencefalogramas são insuficientemente sensíveis e específicos para uso diagnóstico.

Consequências Funcionais do Delirium O delirium por si só está associado a declínio funcional aumentado e a risco de institucionalização. Indivíduos com 65 anos ou mais hospitalizados com delirium correm três vezes mais risco de serem colocados em instituições especiais e cerca de três vezes mais risco de declínio funcional do que pacintes hospitalizados sem delirium, tanto por ocasião da alta como três meses depois.

Diagnóstico Diferencial Transtornos psicóticos e transtornos bipolar e depressivo com características psicóticas. O delirium caracterizado por alucinações vívidas, delírios, perturbações da linguagem e agitação precisa ser diferenciado de transtorno psicótico breve, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme e outros transtornos psicóticos, bem como de transtornos bipolares e depressivos, com características psicóticas. Transtorno de estresse agudo. O delirium associado a medo, ansiedade e sintomas dissociativos, como despersonalização, deve ser distinguido de transtorno de estresse agudo, precipitado por exposição a evento gravemente traumático. Transtorno factício e simulação. O delirium pode ser distinguido desses transtornos com base na apresentação comumente atípica no transtorno factício e na simulação e na ausência de outra condição médica ou substância que tenha relação etiológica com a perturbação cognitiva aparente. Outros transtornos neurocognitivos. A questão diagnóstica diferencial mais comum ao ser avaliada confusão em idosos inclui a distinção entre sintomas de delirium e demência. Cabe ao clínico determinar se um indivíduo tem delirium; delirium adicional a um TNC preexistente, como o que ocorre na doença de Alzheimer; ou um TNC sem delirium. A distinção tradicional entre delirium e demência em razão do surgimento agudo e do curso temporal é especialmente difícil nos idosos com um TNC anterior que pode não ter sido reconhecido ou naqueles que desenvolvem prejuízo cognitivo persistente após um episódio de delirium.

Outro Delirium Especificado 780.09 (R41.0) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de delirium que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem a todos os critérios para delirium ou qualquer transtorno na classe diagnóstica de transtornos neurocognitivos. A categoria outro delirium especificado é usada nas situações em que o clínico opta por comunicar a razão específica pela qual a apresentação não satisfaz os critérios de delirium ou qualquer outro transtorno neurocognitivo específico. Isso é feito por meio do registro de “outro delirium especificado”, seguido pela razão específica (p. ex., “síndrome de delirium atenuado”).


602

Transtornos Neurocognitivos

Um exemplo de apresentação que pode ser especificada com a designação “outro delirium especificado” é: Síndrome de delirium atenuado: Esta síndrome aplica-se aos casos de delirium em que a gravidade do prejuízo cognitivo é inferior à necessária para o diagnóstico ou em que são atendidos alguns critérios diagnósticos para delirium, embora não todos.

Delirium Não Especificado 780.09 (R41.0) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de delirium que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para delirium ou outro transtorno na classe diagnóstica de transtornos neurocognitivos. A categoria delirium não especificado é usada nas situações em que o clínico opta por não especificar a razão pela qual os critérios para delirium não são satisfeitos e inclui apresentações para as quais não há informações suficientes para que seja feito um diagnóstico mais específico (p. ex., em salas de emergência).

Transtornos Neurocognitivos Maiores e Leves Transtorno Neurocognitivo Maior Critérios Diagnósticos A. Evidências de declínio cognitivo importante a partir de nível anterior de desempenho em um ou mais domínios cognitivos (atenção complexa, função executiva, aprendizagem e memória, linguagem, perceptomotor ou cognição social), com base em: 1. Preocupação do indivíduo, de um informante com conhecimento ou do clínico de que há declínio significativo na função cognitiva; e 2. Prejuízo substancial no desempenho cognitivo, de preferência documentado por teste neuropsicológico padronizado ou, em sua falta, por outra investigação clínica quantificada. B. Os déficits cognitivos interferem na independência em atividades da vida diária (i.e., no mínimo, necessita de assistência em atividades instrumentais complexas da vida diária, tais como pagamento de contas ou controle medicamentoso). C. Os déficits cognitivos não ocorrem exclusivamente no contexto de delirium. D. Os déficits cognitivos não são mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., transtorno depressivo maior, esquizofrenia). Determinar o subtipo devido a: Doença de Alzheimer (p. 611-614) Degeneração lobar frontotemporal (p. 614-618) Doença com corpos de Lewy (p. 618-621) Doença vascular (p. 621-624) Lesão cerebral traumática (p. 624-627) Uso de substância/medicamento (p. 627-632) Infecção por HIV (p. 632-634) Doença do príon (p. 634-636) Doença de Parkinson (p. 636-638) Doença de Huntington (p. 638-641)


Transtornos Neurocognitivos Maiores e Leves 603 Outra condição médica (p. 641-642) Múltiplas etiologias (p. 642-643) Não especificado (p. 643) Nota para codificação: Código baseado na etiologia médica ou causado pelo uso de substância. Em alguns casos, necessita-se de código adicional para a condição médica etiológica, que deve preceder imediatamente o código diagnóstico quanto ao transtorno neurocognitivo maior, do seguinte modo:

Subtipo etiológico

Código médico Código para etiológico associado Código para transtorno transtorno para transtorno neurocognitivo maiora neurocognitivo maiorb neurocognitivo levec

Doença de Alzheimer

Provável: 331.0 (G30.9) Possível: sem código médico adicional

Provável: 294.1x (F02.8x) 331.83 (G31.84) Possível: 331.9 (G31.9)c (Não usar código adicional para doença de Alzheimer.)

Degeneração lobar frontotemporal

Provável: 331.19 (G31.09) Possível: sem código médico adicional

Provável: 294.1x (F02.8x) 331.83 (G31.84) c (Não usar código adiPossível: 331.9 (G31.9) cional para doença frontotemporal.)

Doença com corpos de Lewy

Provável: 331.82 (G31.83) Possível: sem código médico adicional

Provável: 294.1x (F02.8x) 331.83 (G31.84) Possível: 331.9 (G31.9)c (Não usar código adicional para doença com corpos de Lewy.)

Doença vascular

Sem código médico adicional

Provável: 290.40 (F01.5x) 331.83 (G31.84) c (Não usar código adiPossível: 331.9 (G31.9) cional para a doença vascular.)

Lesão cerebral traumática

907.0 (S06.2X9S)

294.1x (F02.8x)

331.83 (G31.84) (Não usar código adicional para a lesão cerebral traumática.)

Induzido por substância/ Sem código médico medicamento adicional

Código baseado no tipo de substância causadora do transtorno neurocogc,d nitivo maior

Código baseado no tipo de substância causadora do transtorno neurocognitivo leved

Infecção por HIV

042 (B20)

294.1x (F02.8x)

331.83 (G31.84) (Não usar código adicional para infecção por HIV.)

Doença do príon

046.79 (A81.9)

294.1x (F02.8x)

331.83 (G31.84) (Não usar código adicional para doença do príon.)

Doença de Parkinson

Provável: 332.0 (G20) Possível: sem código médico adicional

Provável: 294.1x (F02.8x) 331.83 (G31.84) c (Não usar código adiPossível: 331.9 (G31.9) cional para doença de Parkinson.)


604

Transtornos Neurocognitivos

Subtipo etiológico

Código médico Código para etiológico associado Código para transtorno transtorno para transtorno neurocognitivo maiora neurocognitivo maiorb neurocognitivo levec

Doença de Huntington

333.4 (G10)

Devido a outra condição médica

Codificar primeiro a outra 294.1x (F02.8x) condição médica (p. ex., esclerose múltipla 340 [G35])

331.83 (G31.84) (Não usar códigos adicionais para as supostas condições médicas etiológicas.)

Devido a múltiplas etiologias

Codificar primeiro todas as condições médicas etiológicas (exceto em doença vascular)

294.1x (F02.8x) (Mais o código para os transtornos neurocognitivos maiores relevantes, induzidos por substância/medicamento, quando substâncias ou medicamentos têm algum papel na etiologia.)

331.83 (G31.84) (Mais o código para transtornos neurocognitivos leves e relevantes, induzidos por substância/medicamento, quando as substâncias ou os medicamentos têm algum papel na etiologia. Não usar códigos adicionais para as supostas condições médicas etiológicas.)

Transtorno neurocognitivo não especificado

Sem código médico adicional

799.59 (R41.9)

799.59 (R41.9)

294.1x (F02.8x)

331.83 (G31.84) (Não usar código adicional para doença de Huntington.)

a

Primeiro código, antes do código para transtorno neurocognitivo maior. Codificar o quinto caráter com base no especificador de sintomas; .x0 sem perturbação comportamental; .x1 com perturbação comportamental (p. ex., sintomas psicóticos, perturbação do humor, agitação, apatia ou outros sintomas comportamentais). c Nota: O especificador da perturbação comportamental não pode ser codificado, mas deve ainda ser indicado por escrito. d Ver “Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Induzido por Substância/Medicamento”. b

Especificar: Sem perturbação comportamental: Se a perturbação cognitiva não está acompanhada por qualquer perturbação comportamental clinicamente significativa. Com perturbação comportamental (especificar a perturbação): Se a perturbação cognitiva está acompanhada por uma perturbação comportamental clinicamente significativa (p. ex., sintomas psicóticos, alteração do humor, agitação, apatia ou outros sintomas comportamentais). Especificar a gravidade atual: Leve: Dificuldades com as atividades instrumentais da vida diária (p. ex., trabalho doméstico, controle do dinheiro). Moderada: Dificuldades com as atividades básicas da vida diária (p. ex., alimentar-se, vestir-se). Grave: Totalmente dependente.


Transtornos Neurocognitivos Maiores e Leves 605

Transtorno Neurocognitivo Leve Critérios Diagnósticos A. Evidências de declínio cognitivo pequeno a partir de nível anterior de desempenho em um ou mais domínios cognitivos (atenção complexa, função executiva, aprendizagem e memória, linguagem, perceptomotor ou cognição social) com base em: 1. Preocupação do indivíduo, de um informante com conhecimento ou do clínico de que ocorreu declínio na função cognitiva; e 2. Prejuízo pequeno no desempenho cognitivo, de preferência documentado por teste neuropsicológico padronizado ou, em sua falta, outra avaliação quantificada. B. Os déficits cognitivos não interferem na capacidade de ser independente nas atividades cotidianas (i.e., estão preservadas atividades instrumentais complexas da vida diária, como pagar contas ou controlar medicamentos, mas pode haver necessidade de mais esforço, estratégias compensatórias ou acomodação). C. Os déficits cognitivos não ocorrem exclusivamente no contexto de delirium. D. Os déficits cognitivos não são mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., transtorno depressivo maior, esquizofrenia). Determinar o subtipo devido a: Doença de Alzheimer (p. 611-614) Degeneração lobar frontotemporal (p. 614-618) Doença com corpos de Lewy (p. 618-621) Doença vascular (p. 621-624) Lesão cerebral traumática (p. 624-627) Uso de substância/medicamento (p. 627-632) Infecção por HIV (p. 632-634) Doença do príon (p. 634-636) Doença de Parkinson (p. 636-638) Doença de Huntington (p. 638-641) Outra condição médica (p. 641-642) Múltiplas etiologias (p. 642-643) Não especificado (p. 643) Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo leve devido a qualquer uma das etiologias médicas listadas anteriormente, o código é 331.83 (G31.84). Não usar códigos adicionais para as supostas condições médicas etiológicas. Para transtorno neurocognitivo leve induzido por substância/ medicamento, codificar com base no tipo de substância; ver “Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Induzido por Substância/Medicamento”. Para transtorno neurocognitivo leve não especificado, codificar como 799.59 (R41.9). Especificar: Sem perturbação comportamental: Se a perturbação cognitiva não está acompanhada por alguma perturbação comportamental clinicamente significativa. Com perturbação comportamental (especificar a perturbação): Se a perturbação cognitiva está acompanhada por alguma perturbação comportamental clinicamente significativa (p. ex., sintomas psicóticos, alteração do humor, agitação, apatia ou outros sintomas comportamentais).

Subtipos Transtornos neurocognitivos maiores e leves são organizados em subtipos basicamente conforme a entidade ou as entidades etiológicas/patológicas conhecidas ou supostas subjacentes ao declínio cognitivo. Esses subtipos são diferenciados com base em uma combinação de curso tem-


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Transtornos Neurocognitivos

poral, domínios característicos afetados e sintomas associados. Para alguns subtipos etiológicos, o diagnóstico depende muito da presença de uma entidade potencialmente causadora, como a doença de Parkinson ou de Huntington, ou uma lesão cerebral traumática ou um acidente vascular cerebral no período de tempo apropriado. Para outros subtipos etiológicos (em geral, as doenças degenerativas, como a de Alzheimer, a degeneração lobar frontotemporal e a com corpos de Lewy), o diagnóstico baseia-se principalmente nos sintomas cognitivos, comportamentais e funcionais. Em geral, diferenciar essas síndromes que carecem de uma entidade etiológica reconhecida de forma independente é mais fácil no contexto de um TNC maior do que em um TNC leve; algumas vezes, porém, sintomas característicos e aspectos associados estão presentes também no nível leve. Os TNCs costumam ser controlados por clínicos de diversas áreas. No caso de vários subtipos, grupos multidisciplinares internacionais de especialistas têm desenvolvido critérios consensuais especializados, com base na correlação clinicopatológica com a patologia cerebral subjacente. Os critérios de subtipos aqui relatados foram harmonizados com os critérios desses especialistas.

Especificadores Evidências de características comportamentais distintas nos TNCs foram reconhecidas especialmente nas áreas de sintomas psicóticos e depressão. As características psicóticas são comuns em muitos TNCs, em especial no estágio de leve a moderado de TNCs maiores devidos à doença de Alzheimer, à doença com corpos de Lewy e à degeneração lobar frontotemporal. Paranoia e outros delírios são características comuns, e com frequência um tema persecutório pode ser um aspecto proeminente da ideação delirante. Diferentemente dos transtornos psicóticos com início mais precoce na vida (p. ex., esquizofrenia), fala e comportamento desorganizados não são características de psicose nos TNCs. Podem ocorrer alucinações de qualquer tipo, embora as visuais sejam mais comuns nos TNCs do que nos transtornos depressivo, bipolar ou psicótico. Perturbações do humor, incluindo depressão, ansiedade e euforia, podem ocorrer. A depressão é mais comum bem cedo no curso (incluindo em um TNC leve) do TNC devido à doença de Alzheimer e à de Parkinson, ao passo que a euforia pode ser mais comum na degeneração lobar frontotemporal. Quando uma síndrome afetiva completa atendendo critérios para um transtorno depressivo ou bipolar está presente, esse diagnóstico também deve ser codificado. Sintomas de humor são cada vez mais reconhecidos como uma característica significativa nos estágios iniciais de TNCs leves, de maneira que o reconhecimento clínico e a intervenção podem ser importantes. Agitação é comum em uma ampla gama de TNCs, em especial no TNC maior com intensidade moderada a grave, frequentemente ocorrendo no contexto de confusão ou frustração. Pode surgir como comportamentos agressivos, sobretudo no contexto de resistência aos deveres do cuidador, como o banho e o vestir. A agitação é caracterizada como atividade motora e vocal disruptiva, com tendência a ocorrer em estágios avançados de prejuízo cognitivo em todos os TNCs. Indivíduos com TNC podem se apresentar com uma variedade de sintomas comportamentais que constituem o foco do tratamento. Sono perturbado é um sintoma comum capaz de criar necessidade de atenção clínica, podendo incluir sintomas de insônia, hipersonia e perturbações no ritmo circadiano. Apatia é comum em TNCs leves e maiores. É encontrada especialmente no TNC devido à doença de Alzheimer, podendo ser uma característica proeminente do transtorno devido à degeneração lobar frontotemporal. A apatia costuma ser caracterizada por motivação diminuída e comportamento voltado a metas reduzido, acompanhado de responsividade emocional menor. Os sintomas de apatia podem se manifestar cedo no curso dos TNCs, quando pode ser observada perda de motivação para a realização das atividades cotidianas ou de passatempos. Outros sintomas comportamentais importantes incluem perambulação, desinibição, hiperfagia e acumulação. Alguns são característicos de transtornos específicos, conforme discutido nas respectivas seções. Quando observada mais de uma perturbação comportamental, cada tipo deve ser registrado por escrito, com o especificador “com sintomas comportamentais”.


Transtornos Neurocognitivos Maiores e Leves 607

Características Diagnósticas Há TNCs maiores e leves em um espectro de prejuízo cognitivo e funcional. Transtorno neurocognitivo maior corresponde à condição referida no DSM-IV como demência, mantida nesta edição como uma alternativa. A característica principal dos TNCs é um declínio cognitivo adquirido em um ou mais domínios (Critério A), com base em 1) preocupação com a cognição por parte do indivíduo, um informante conhecedor ou o clínico e 2) desempenho em alguma avaliação objetiva que fica aquém do nível esperado ou com declínio observado ao longo do tempo. Tanto a preocupação como a evidência objetiva são necessárias, pois são complementares. Quando há foco exclusivo em testes objetivos, pode não ser diagnosticado um transtorno em pessoas com bom funcionamento, cujo desempenho atualmente “normal” na verdade representa um declínio substancial em suas capacidades, ou pode uma doença ser diagnosticada de forma incorreta em indivíduos cujo desempenho atualmente “baixo” não representa uma mudança na comparação com seus dados iniciais ou resulta de fatores externos, como condições do teste ou doença passageira. Alternativamente, foco excessivo em sintomas subjetivos pode prejudicar o diagnóstico de doença em pessoas com insight pobre ou cujos informantes negam ou não conseguem perceber os sintomas ou, ainda, ser explicitamente sensível nas que se dizem preocupadas. Uma preocupação cognitiva difere de uma queixa no sentido de poder ou não ser expressa de forma espontânea. Pode, diferentemente, ter de ser provocada por meio de questionamento criterioso sobre sintomas específicos, que costumam ocorrer em indivíduos com déficits cognitivos (Tabela 1, no início deste capítulo). Por exemplo, preocupações com a memória incluem dificuldade de recordar pequenas listas de compras ou de acompanhar o desenrolar de um programa na TV; preocupações executivas incluem dificuldade de retomar uma tarefa quando interrompida, organizar registros de impostos ou planejar uma refeição em um feriado. No contexto de TNCs leves, é possível que a pessoa descreva essas tarefas como mais difíceis ou demandando mais tempo, esforço ou estratégias compensatórias. No contexto de TNCs maiores, esse tipo de tarefa pode ser concluída somente com assistência ou então ser completamente abandonada. No contexto de TNCs leves, os indivíduos e suas famílias podem não notar esses sintomas ou percebê-los como normais, em especial em idosos; assim, assume enorme importância o conhecimento da história. As dificuldades devem representar mudanças mais do que padrões de toda uma vida: o indivíduo ou o informante pode esclarecer essa questão, ou o clínico pode inferir mudanças em relação a experiências anteriores com o paciente ou a partir do trabalho ou de outras pistas. É também fundamental determinar que as dificuldades tenham relação mais com perda cognitiva do que com limitações motoras ou sensoriais. Testes neuropsicológicos, com o desempenho comparado com padrões normais apropriados a idade, nível educacional e antecedentes culturais do paciente, são parte da avaliação-padrão de transtornos neurocognitivos, sendo essenciais na avaliação de TNC leve. No caso de TNC maior, o desempenho costuma evidenciar 2 ou mais desvios-padrão aquém dos padrões normais adequados (terceiro percentil ou abaixo). Em TNC leve, o desempenho costuma ficar em uma variação de 1 a 2 desvios-padrão (entre o percentil 3 e o 16). Não há disponibilidade, entretanto, de testes neuropsicológicos em todos os contextos, e os limiares neuropsicológicos são sensíveis ao(s) teste(s) específico(s) e aos padrões normais empregados, bem como às condições do teste, às limitações sensoriais e à doença intercorrente. Existe uma variedade de avaliações a serem feitas em consultório ou “à beira do leito”, conforme descrito na Tabela 1, capazes de fornecer dados objetivos em contextos nos quais esses testes não estão disponíveis ou não podem ser feitos. Seja qual for a situação, da mesma forma que com as preocupações cognitivas, o desempenho objetivo deve ser interpretado à luz do desempenho anterior do indivíduo. O ideal seria que essa informação estivesse disponível a partir de uma administração anterior do mesmo teste, mas frequentemente isso deve ser inferido com base em padrões normais apropriados, em conjunto com a história educacional, profissional e outros fatores individuais. Os padrões normais constituem um desafio de interpretação em pessoas com níveis educacionais muito altos ou muito baixos e em pessoas testadas fora do próprio idioma ou antecedentes culturais. O Critério B tem a ver com o nível de independência individual no funcionamento diário. Pessoas com TNC maior terão prejuízo com gravidade suficiente para interferir na independência, a ponto de outros terem de assumir tarefas que antes elas conseguiam realizar por conta própria.


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Transtornos Neurocognitivos

Indivíduos com TNC leve terão a independência preservada, embora possa haver interferência sutil no funcionamento ou relato de que as tarefas exigem mais esforço ou mais tempo que antes. A distinção entre TNC maior ou leve é inerentemente arbitrária, e os transtornos existem ao longo de um continuum. Assim, é difícil determinar limiares precisos. Há necessidade de muito cuidado na obtenção da história, na observação e na integração com outros achados, tendo de ser levadas em conta implicações diagnósticas quando as manifestações clínicas individuais se situam em zona limítrofe.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Normalmente, as características associadas que dão apoio a um diagnóstico de TNC maior ou leve serão específicas do subtipo etiológico (p. ex., sensibilidade neuroléptica e alucinações visuais em TNC devido à doença com corpos de Lewy). Tais características diagnósticas de cada subtipo são encontradas nas seções específicas.

Prevalência A prevalência de TNC varia conforme a idade e o subtipo etiológico. As estimativas gerais de prevalência costumam estar disponíveis apenas para populações com mais idade. Entre indivíduos com mais de 60 anos, a prevalência aumenta gradativamente com a idade; as estimativas, assim, são mais exatas para faixas etárias mais estreitas do que para categorias amplas, como “com mais de 65 anos” (situação em que a média de idade pode variar muito de acordo com a expectativa de vida da população). Para os subtipos etiológicos que ocorrem ao longo do ciclo de vida, estimativas de prevalência para TNC podem estar disponíveis, se for o caso, apenas como uma fração dos indivíduos que desenvolvem TNC entre aqueles com a condição relevante (p. ex., lesão cerebral traumática, infecção por HIV). As estimativas gerais de prevalência para demência (amplamente congruentes com TNC maior) são de cerca de 1 a 2% aos 65 anos de idade, chegando até 30% aos 85 anos. A prevalência de TNC leve é bastante sensível à definição do transtorno, em especial nas comunidades, onde as avaliações são menos detalhadas. Além disso, diferentemente das clínicas, onde a preocupação cognitiva provavelmente é alta na busca e localização de atendimento, pode haver um declínio menos claro na comparação com o funcionamento inicial. As estimativas de prevalência de prejuízo cognitivo leve (substancialmente congruente com TNC leve) entre indivíduos mais velhos são bastante variáveis, indo de 2 a 10% aos 65 anos de idade e de 5 a 25% aos 85 anos.

Desenvolvimento e Curso O curso do TNC varia ao longo de subtipos etiológicos, e essa variação pode ser útil no diagnóstico diferencial. Alguns subtipos (p. ex., os relacionados a lesão cerebral traumática ou acidente vascular cerebral) costumam ter início em um momento específico e (pelo menos após o desaparecimento dos primeiros sintomas relativos a inflamação ou edema) permanecem estáticos. Outros podem oscilar com o tempo (ainda que, ocorrendo isso, deva ser levada em conta a possibilidade de delirium sobreposto ao TNC). Os TNCs devidos a doenças degenerativas, como a de Alzheimer ou a degeneração lobar frontotemporal, costumam ser marcados por aparecimento insidioso e progressão gradativa, e o padrão de surgimento de déficits cognitivos e características associadas ajuda a diferenciá-los. Transtornos neurocognitivos com surgimento na infância e adolescência podem ter repercussões amplas no desenvolvimento social e intelectual; nesse contexto, a incapacidade intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) e/ou outros transtornos do neurodesenvolvimento podem ser também diagnosticados para que se tenha todo o quadro diagnóstico e se assegure o oferecimento de uma ampla gama de serviços. Nos idosos, os transtornos neurocognitivos costumam ocorrer em situações de doenças médicas, fragilidade e perda sensorial, que complicam o quadro clínico quanto ao diagnóstico e tratamento. Quando a perda cognitiva ocorre entre a juventude e a vida adulta intermediária, é possível que os indivíduos e suas famílias busquem atendimento. Os transtornos neurocognitivos


Transtornos Neurocognitivos Maiores e Leves 609 costumam ser de fácil identificação na juventude, embora, em alguns contextos, simulação e transtornos factícios possam preocupar. Bem mais tarde na vida, os sintomas cognitivos podem não preocupar ou não ser percebidos. É ainda nesse período que o TNC leve deve também ser diferenciado dos déficits mais simples associados ao “envelhecimento normal”, ainda que uma parte substancial do que é atribuído ao envelhecimento normal possa representar fases prodrômicas de vários TNCs. Além disso, fica cada vez mais difícil o reconhecimento de um TNC leve com o envelhecimento devido à crescente prevalência de doenças médicas e deficiências sensoriais. Há dificuldade também na distinção entre subtipos com o envelhecimento, uma vez que há múltiplas fontes potenciais de declínio neurocognitivo.

Fatores de Risco e Prognóstico Os fatores de risco variam não apenas por subtipo etiológico como também pela idade de início entre os subtipos. Alguns se distribuem durante o ciclo de vida; outros ocorrem, exclusiva e basicamente, no período de vida mais tardio. Mesmo nos TNCs do envelhecimento, a prevalência relativa varia com a idade; a doença de Alzheimer não é comum antes dos 60 anos, e sua prevalência aumenta gradativamente daí em diante, ao passo que a degeneração lobar frontotemporal, em geral menos comum, surge mais cedo e representa uma fração cada vez menor de TNCs com o envelhecimento. Genéticos e fisiológicos. O fator de risco mais forte para TNCs maiores e leves é a idade, basicamente porque com o envelhecimento aumenta o risco de doença neurodegenerativa e cerebrovascular. O sexo feminino está associado a maior prevalência de demência em geral, em especial a doença de Alzheimer; essa diferença, no entanto, é amplamente atribuível, se não totalmente, à maior longevidade das mulheres.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura O nível de percepção e preocupação de indivíduos e famílias quanto a sintomas neurocognitivos pode variar de acordo com grupos étnicos e profissionais. Os sintomas neurocognitivos podem ser mais percebidos, especialmente no nível leve, em indivíduos envolvidos em atividades profissionais, domésticas ou recreativas complexas. Além disso, as normas de testes neuropsicológicos tendem a estar disponíveis apenas para populações maiores, podendo tornar-se de difícil aplicação em indivíduos com formação aquém do ensino médio ou naqueles que são avaliados fora de sua cultura ou em outro idioma que não o seu primário.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Assim como a idade, a cultura e a profissão, as questões relacionadas ao gênero podem influenciar o nível de preocupação e percepção de sintomas cognitivos. Além disso, no caso dos transtornos neurocognitivos em período de vida mais tardio, as mulheres são provavelmente mais velhas, têm mais comorbidade médica e moram sozinhas, o que pode complicar a avaliação e o tratamento. Ademais, há diferenças de gênero na frequência de alguns subtipos etiológicos.

Marcadores Diagnósticos Além da obtenção de uma história médica criteriosa, as avaliações neuropsicológicas são as principais medidas de diagnóstico de transtornos neurocognitivos, particularmente no nível leve, no qual as mudanças funcionais são mínimas, e os sintomas, mais sutis. O ideal seria que as pessoas fossem encaminhadas para teste formal neuropsicológico, que proporcionaria uma avaliação quantitativa de todos os domínios relevantes, auxiliando, então, no diagnóstico. Decorreriam orientações à família em relação a áreas em que a pessoa necessitaria de mais apoio, funcionando também como marco para declínio posterior ou resposta às terapias. Quando esse tipo de teste não está disponível ou não é factível, as avaliações breves da Tabela 1 podem oferecer entendimento em cada domínio. Testes do estado mental breves mais globais podem ser úteis, embora


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Transtornos Neurocognitivos

possam ser insensíveis, em especial em relação a mudanças menores em um único domínio ou nos indivíduos com elevadas capacidades pré-mórbidas, e podem ser excessivamente sensíveis em indivíduos com baixas capacidades pré-mórbidas. Nas distinções entre subtipos etiológicos, outros marcadores diagnósticos podem desempenhar um papel, particularmente estudos de imagem neurológica, como imagem por ressonância magnética e tomografia por emissão de pósitrons. Além disso, marcadores específicos podem ser envolvidos na avaliação de subtipos específicos, podendo adquirir mais importância à medida que se acumulam mais resultados de pesquisas, conforme discutido nas seções específicas.

Consequências Funcionais de Transtornos Neurocognitivos Maiores e Leves Por definição, transtornos neurocognitivos maiores e leves influenciam o funcionamento, considerando-se o papel central da cognição na vida das pessoas. Assim, os critérios para os transtornos e o limiar de distinção entre transtorno neurocognitivo maior e menor baseiam-se, em parte, em avaliações funcionais. No TNC maior, há ampla variação de prejuízos funcionais, conforme descrito nos especificadores de gravidade. Além disso, as funções específicas comprometidas podem ajudar a identificar os domínios cognitivos afetados, em especial quando não há testes neuropsicológicos disponíveis ou quando sua interpretação é difícil.

Diagnóstico Diferencial Cognição normal. O diagnóstico diferencial entre cognição normal e TNC leve, da mesma forma que entre TNC leve e maior, é um desafio, porque as fronteiras são inerentemente arbitrárias. São fundamentais a essas distinções a obtenção da história e a avaliação objetiva. Pode ser essencial à detecção de TNC leve uma avaliação longitudinal que utilize investigações quantificadas. Delirium. Transtornos neurocognitivos leve e maior podem ser difíceis de diferenciar de delirium persistente, capaz de ocorrer ao mesmo tempo. Uma investigação criteriosa da atenção e de excitação pode ajudar nessa diferenciação. Transtorno depressivo maior. A distinção entre TNC leve e transtorno depressivo maior, que pode ser concomitante a TNC, também pode ser um desafio. Podem ser úteis padrões específicos de cognição. Por exemplo, déficits consistentes de memória e função executiva são típicos da doença de Alzheimer, ao passo que comprometimento não específico ou mais variável do desempenho é encontrado na depressão maior. Alternativamente, o tratamento do transtorno depressivo, com observação repetida ao longo do tempo, pode ser necessário para que seja feito o diagnóstico. Transtorno específico da aprendizagem e outros transtornos do neurodesenvolvimento. É útil, para fazer a distinção entre transtorno neurocognitivo e transtorno específico da aprendizagem ou outros transtornos do neurodesenvolvimento, um esclarecimento criterioso da condição basal do indivíduo. Outras questões podem participar da diferença quanto a subtipos etiológicos específicos, conforme descrito nas seções específicas.

Comorbidade Os TNCs são comuns em idosos; assim, são concomitantes a uma grande variedade de doenças relacionadas ao envelhecimento, o que pode complicar o diagnóstico e o tratamento. A que mais se destaca é o delirium, para o qual o TNC aumenta o risco. Em pessoas idosas, delirium durante a hospitalização é, em muitos casos, a primeira vez em que é percebido um TNC, ainda que a história atenta revele, com frequência, evidências de declínio anterior. Transtornos neurocognitivos mistos também são comuns em idosos, uma vez que a prevalência de muitas entidades etiológicas aumenta com o envelhecimento. Em pessoas mais jovens, TNC costuma ocorrer com transtornos do neurodesenvolvimento; por exemplo, lesão cerebral em criança na pré-escola pode também levar a questões desenvolvimentais e de aprendizagem significativas. Comorbidade adicional de TNCs é frequentemente relacionada ao subtipo etiológico, conforme discutido nas seções específicas.


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Alzheimer 611

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Alzheimer Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há surgimento insidioso e progressão gradual de prejuízo em um ou mais domínios cognitivos (no caso de transtorno neurocognitivo maior, pelo menos dois domínios devem estar prejudicados). C. Os critérios são atendidos para doença de Alzheimer provável ou possível, do seguinte modo: Para transtorno neurocognitivo maior: Provável doença de Alzheimer é diagnosticada se qualquer um dos seguintes está presente; caso contrário, deve ser diagnosticada possível doença de Alzheimer. 1. Evidência de uma mutação genética causadora de doença de Alzheimer a partir de história familiar ou teste genético. 2. Todos os três a seguir estão presentes: a. Evidências claras de declínio na memória e na aprendizagem e em pelo menos outro domínio cognitivo (com base em história detalhada ou testes neuropsicológicos em série). b. Declínio constantemente progressivo e gradual na cognição, sem platôs prolongados. c. Ausência de evidências de etiologia mista (i.e., ausência de outra doença neurodegenerativa ou cerebrovascular ou de outra doença ou condição neurológica, mental ou sistêmica provavelmente contribuindo para o declínio cognitivo). Para transtorno neurocognitivo leve: Provável doença de Alzheimer é diagnosticada se há evidência de alguma mutação genética causadora de doença de Alzheimer, constatada em teste genético ou história familiar. Possível doença de Alzheimer é diagnosticada se não há evidência de mutação genética causadora de doença de Alzheimer, de acordo com teste genético ou história familiar, com presença de todos os três a seguir: 1. Evidências claras de declínio na memória e na aprendizagem. 2. Declínio constantemente progressivo e gradual na cognição, sem platôs prolongados. 3. Ausência de evidências de etiologia mista (i.e., ausência de outra doença neurodegenerativa ou cerebrovascular ou de outra doença ou condição neurológica ou sistêmica provavelmente contribuindo para o declínio cognitivo). D. A perturbação não é mais bem explicada por doença cerebrovascular, outra doença neurodegenerativa, efeitos de uma substância ou outro transtorno mental, neurológico ou sistêmico. Nota para codificação: Em provável transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Alzheimer, com perturbação comportamental, codificar primeiro 331.0 (G30.9) doença de Alzheimer, seguida de 294.11 (F02.81) transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Alzheimer. Em provável transtorno neurocognitivo devido à doença de Alzheimer, sem perturbação comportamental, codificar primeiro 331.0 (G30.9) doença de Alzheimer, seguida de 294.10 (F02.80) transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Alzheimer, sem perturbação comportamental. Para possível transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Alzheimer, codificar 331.9 (G31.9) possível transtorno neurocognitivo maior. (Nota: Não usar o código adicional para doença de Alzheimer. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.) Para transtorno neurocognitivo leve devido à doença de Alzheimer, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para doença de Alzheimer. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas Além da síndrome de transtorno neurocognitivo (Critério A), as características centrais de TNC maior ou leve devido à doença de Alzheimer incluem início insidioso e progressão gradual dos


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Transtornos Neurocognitivos

sintomas cognitivos e comportamentais (Critério B). A apresentação característica é amnéstica (i.e., com prejuízo da memória e da aprendizagem). Também existem apresentações não amnésticas incomuns, em especial variantes visuoespaciais e afásicas logopênicas. Na fase leve do TNC, a doença de Alzheimer costuma se manifestar com prejuízo na memória e na aprendizagem, por vezes acompanhado de deficiências na função executiva. Na fase maior do TNC, estão também prejudicadas a capacidade visuoconstrutiva/perceptomotora e a linguagem, particularmente quando o TNC é moderado a grave. A cognição social tende a ficar preservada até mais tarde no curso da doença. Precisa ser especificado um nível de certeza diagnóstica que denote doença de Alzheimer como etiologia “provável” ou “possível” (Critério C). É diagnosticada doença de Alzheimer provável em TNC maior e leve diante de evidência de um gene causador da doença de Alzheimer, seja por meio de teste genético, seja por história familiar dominante autossômica, junto de confirmação por necropsia ou teste genético em membro da família afetado. Para TNC maior, um quadro clínico típico, sem platôs prolongados ou evidências de etiologia mista, pode também ser diagnosticado devido a uma provável doença de Alzheimer. Para TNC leve, considerando-se o grau menor de certeza de que as deficiências irão evoluir, essas características são apenas suficientes para uma etiologia de Alzheimer possível. Se a etiologia parecer mista, TNC leve devido a múltiplas etiologias deve ser diagnosticado. Independentemente do caso, seja para TNC leve ou maior devido à doença de Alzheimer, as características clínicas não devem sugerir outra etiologia primária para o TNC (Critério D).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Em clínicas especializadas, cerca de 80% dos indivíduos com transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Alzheimer apresentam manifestações comportamentais e psicológicas; essas características são também frequentes no estágio leve de prejuízo do transtorno neurocognitivo. Esses sintomas causam tanto sofrimento ou mais que as manifestações cognitivas, sendo, com frequência, a razão para a busca de cuidados de saúde. No estágio leve do transtorno neurocognitivo, ou no nível mais leve de transtorno neurocognitivo maior, costuma ser encontrada depressão e/ou apatia. Com transtorno neurocognitivo maior moderadamente grave, características psicóticas, irritabilidade, agitação, agressividade e perambulação são comuns. Mais tarde na doença, distúrbios na marcha, disfagia, incontinência, mioclonia e convulsões são observados.

Prevalência A prevalência de demência generalizada (TNC maior) aumenta rapidamente com o envelhecimento. Em países com renda mais elevada, varia de 5 a 10% na sétima década até, pelo menos, 25% daí em diante. Dados estatísticos norte-americanos sugerem que cerca de 7% das pessoas diagnosticadas com doença de Alzheimer têm entre 65 e 74 anos de idade, 53% entre 75 e 84 anos, e 40% têm 85 anos ou mais. O percentual de demências atribuíveis à doença de Alzheimer varia de cerca de 60% a mais de 90%, dependendo do contexto e dos critérios diagnósticos. TNC leve devido à doença de Alzheimer possivelmente representa também uma fração substancial de prejuízo cognitivo leve (mild cognitive impairment – MCI).

Desenvolvimento e Curso Transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Alzheimer progride gradualmente, por vezes com platôs de curta duração, indo da demência grave à morte. A duração média da sobrevida após o diagnóstico situa-se por volta de 10 anos, refletindo mais a idade avançada da maioria dos indivíduos do que o curso da doença; há pessoas que conseguem viver com ela por até 20 anos. Indivíduos no estágio avançado acabam mudos e confinados ao leito. A morte costuma ser consequência de aspiração nos que sobrevivem ao longo do curso completo. No TNC leve devido à doença de Alzheimer, os prejuízos aumentam com o tempo, com o estado funcional, pouco a pouco, declinando, até que os sintomas cheguem ao limiar para o diagnóstico de TNC maior. O surgimento de sintomas costuma ocorrer na oitava ou nona década devida; formas de início precoce encontradas na quinta e sexta décadas têm, frequentemente, relação com mutações


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Alzheimer 613 causadoras conhecidas. Os sintomas e a patologia não apresentam grandes diferenças em idades distintas de aparecimento. Pessoas mais jovens, porém, têm mais probabilidade de sobreviver ao curso completo da doença, ao passo que pessoas com mais idade têm mais probabilidade de apresentar várias comorbidades médicas, que afetam o curso e o controle da doença. A complexidade diagnóstica é mais alta nos idosos devido à maior possibilidade de doença médica comórbida e patologia mista.

Fatores de Risco e Prognóstico Ambientais. Lesão cerebral traumática aumenta o risco de TNC maior ou leve devido à doença de Alzheimer. Genéticos e fisiológicos. A idade é o fator de risco mais poderoso para a doença de Alzheimer. A suscetibilidade genética ao polimorfismo da apolipoproteína E4 aumenta o risco e reduz a idade do início, especialmente em indivíduos homozigóticos. Também existem genes extremamente raros causadores da doença de Alzheimer. Indivíduos com a síndrome de Down (trissomia do 21) desenvolvem a doença de Alzheimer se chegam até a vida adulta intermediária. Múltiplos fatores de risco vasculares influenciam o risco da doença e podem agir aumentando a patologia cerebrovascular ou, ainda, provocando efeitos diretos na patologia da doença de Alzheimer.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura A detecção de um TNC pode ser mais difícil em contextos culturais e socioeconômicos em que a perda da memória é considerada normal com o envelhecimento, onde os idosos veem-se diante de menos demandas cognitivas na vida diária ou em que níveis educacionais muito baixos acarretam desafios maiores a avaliações cognitivas objetivas.

Marcadores Diagnósticos Atrofia cortical, placas neuríticas com predomínio amiloide e emaranhados neurofibrilares com predominância de proteínas tau são marcos do diagnóstico patológico da doença de Alzheimer, podendo ser confirmados via exame histopatológico após a morte. Em casos com início precoce, com herança autossômica dominante, uma mutação em um dos genes conhecidos causadores da doença de Alzheimer – proteína precursora do amiloide (APP), presenilina 1 (PSEN1) ou presenilina 2 (PSEN2) – pode estar envolvida, e testes genéticos para tais mutações estão disponíveis no comércio, pelo menos para PSEN1. A apoliproteína 4 não serve como marcador diagnóstico, porque é somente um fator de risco, não sendo nem necessária, nem suficiente para a ocorrência da doença. Uma vez que os depósitos de amiloides beta 42 no cérebro ocorrem cedo na cascata fisiopatológica, testes diagnósticos com base amiloide, como imagens amiloides na tomografia cerebral por emissão de pósitrons (PET) e níveis reduzidos de amiloide beta 42 no líquido cerebrospinal (LCS), podem ter valor diagnóstico. Sinais de lesão neuronal, como atrofia cortical no hipocampo, e temporoparietal, em imagens por ressonância magnética, hipometabolismo temporoparietal em PET com fluorodeoxiglicose e evidências de níveis elevados da tau total e da tau fosfato no LCS, oferecem evidências de dano neuronal, embora sejam menos específicos para a doença de Alzheimer. Até agora, esses biomarcadores não estão totalmente validados, e muitos estão disponíveis apenas em locais de atendimento terciário. Entretanto, alguns deles, em conjunto com biomarcadores recentes, provavelmente farão parte da prática clínica mais ampla nos próximos anos.

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Alzheimer A proeminência de perda de memória pode causar dificuldades significativas relativamente cedo no curso. A cognição social (e, assim, o funcionamento social) e a memória de procedimentos (p. ex., dançar, tocar instrumentos musicais) podem ser relativamente preservadas por longos períodos.


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Transtornos Neurocognitivos

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos neurocognitivos. Transtornos neurocognitivos maiores e leves devido a outros processos neurodegenerativos (p. ex., doença com corpos de Lewy, degeneração lobar frontotemporal) partilham o surgimento insidioso e o declínio gradativo causados pela doença de Alzheimer, embora tenham características distintas. No TNC vascular maior ou leve, costuma haver história de acidente vascular cerebral temporariamente relacionada ao surgimento de prejuízo cognitivo, com infartos ou aumento de intensidades da substância branca considerados suficientes para responder pelo quadro clínico. No entanto, sobretudo quando não existe história clara de declínio gradual, o TNC maior ou leve pode partilhar muitas características clínicas da doença de Alzheimer. Outra doença neurológica ou sistêmica ativa e comórbida. Outras doenças neurológicas ou sistêmicas devem ser consideradas quando há uma relação temporal apropriada e gravidade que respondam pelo quadro clínico. No nível leve do TNC, pode ser difícil diferenciar a etiologia da doença de Alzheimer daquela de outra condição médica (p. ex., distúrbios da tireoide, deficiência de vitamina B12). Transtorno depressivo maior. Particularmente no nível leve de um TNC, o diagnóstico diferencial inclui ainda depressão maior. A presença de depressão pode estar associada a funcionamento diário reduzido e concentração insatisfatória capazes de assemelhar-se a um TNC. A melhora com tratamento da depressão pode ser útil para a distinção.

Comorbidade A maior parte das pessoas com a doença de Alzheimer é composta de idosos, com múltiplas condições médicas capazes de complicar o diagnóstico e influenciar o curso clínico. Transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Alzheimer costuma ocorrer com doença cerebrovascular, contribuindo para o quadro clínico. Quando uma condição comórbida colabora com o TNC em um indivíduo com doença de Alzheimer, TNC devido a múltiplas etiologias deve ser diagnosticado.

Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal Maior ou Leve Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. A perturbação tem surgimento insidioso e progressão gradual. C. Qualquer um entre (1) e (2): 1. Variante comportamental: a. Três ou mais dos sintomas comportamentais a seguir: i. Desinibição comportamental. ii. Apatia ou inércia. iii. Perda de simpatia ou empatia. iv. Comportamento perseverante, estereotipado ou compulsivo/ritualístico. v. Hiperoralidade e mudanças na dieta. b. Declínio proeminente na cognição social e/ou nas capacidades executivas. 2. Variante linguística: a. Declínio proeminente na capacidade linguística, na forma de produção da fala, no encontro de palavras, na nomeação de objetos, na gramática ou na compreensão de palavras. D. Preservação relativa da aprendizagem e da memória e da função perceptomotora. E. A perturbação não é mais bem explicada por doença cerebrovascular, outra doença neurodegenerativa, efeitos de uma substância ou outro transtorno mental, neurológico ou sistêmico.


Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal Maior ou Leve 615 Provável transtorno neurocognitivo frontotemporal é diagnosticado se algum dos seguintes está presente; caso contrário, deve ser diagnosticado possível transtorno neurocognitivo frontotemporal: 1. Evidências de uma mutação genética causadora de transtorno neurocognitivo frontotemporal, a partir da história familiar ou de testes genéticos. 2. Evidências de envolvimento desproporcional do lobo frontal e/ou lobo temporal, com base em neuroimagem. Possível transtorno neurocognitivo frontotemporal é diagnosticado se não houver evidências de uma mutação genética e o exame de neuroimagem não tiver sido realizado. Nota para codificação: Para provável transtorno neurocognitivo maior devido a degeneração lobar frontotemporal, com perturbação comportamental, codificar primeiro 331.19 (G31.09) doença frontotemporal, seguida de 294.11 (F02.81) provável transtorno neurocognitivo maior devido a degeneração lobar frontotemporal com perturbação comportamental. Para provável transtorno neurocognitivo maior devido a degeneração lobar frontotemporal, sem perturbação comportamental, codificar primeiro 331.19 (G31.09) doença frontotemporal, seguida de 294.10 (F02.80) provável transtorno neurocognitivo maior devido a degeneração lobar frontotemporal, sem perturbação comportamental. Para possível transtorno neurocognitivo maior devido a degeneração frontotemporal, codificar 331.9 (G31.9) possível transtorno neurocognitivo maior devido a degeneração lobar frontotemporal. (Nota: Não usar o código adicional para doença frontotemporal. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.) Para transtorno neurocognitivo leve devido a degeneração lobar frontotemporal, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para doença frontotemporal. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas Transtorno neurocognitivo frontotemporal maior ou leve compreende uma série de variantes sindrômicas, caracterizadas pelo desenvolvimento progressivo de mudança comportamental e de personalidade e/ou prejuízo na linguagem. A variante comportamental e três variantes linguísticas (semântica, agramatical/não fluente e logopênica) mostram padrões distintos de atrofia cerebral e alguma neuropatologia distintiva. Devem ser atendidos os critérios para a variante comportamental ou linguística para que seja feito o diagnóstico, mas muitas pessoas apresentam características de ambas. Indivíduos com a variante comportamental do TNC frontotemporal maior ou leve apresentam graus variados de apatia ou desinibição. Podem perder interesse na socialização, no autocuidado e nas responsabilidades pessoais ou evidenciar comportamentos socialmente inadequados. O insight está, em geral, prejudicado, o que costuma retardar a consulta médica. O primeiro encaminhamento costuma ser a um psiquiatra. Os indivíduos podem desenvolver mudanças no estilo social e nas crenças religiosas e políticas, com movimentos repetitivos, acumulação, mudanças no comportamento alimentar e hiperoralidade. Nos estágios posteriores, pode ocorrer perda de controle dos esfincteres. Declínio cognitivo é menos destacado, e testes formais podem mostrar relativamente poucas deficiências nos estágios iniciais. Os sintomas neurocognitivos comuns incluem falta de planejamento e organização, distratibilidade e julgamento insatisfatório. Deficiências na função executiva, como desempenho ruim em testes de flexibilidade mental, raciocínio abstrato e inibição de resposta estão presentes, embora aprendizagem e memória estejam relativamente poupadas, com as capacidades perceptomotoras quase sempre preservadas nos estágios iniciais. Indivíduos com a variante linguística do TNC frontotemporal maior ou leve apresentam afasia progressiva primária, com surgimento gradual, com três subtipos comumente descritos: variante semântica, variante agramatical/não fluente e variante logopênica, sendo que cada uma reúne características distintivas e neuropatologia correspondente. “Provável” é diferenciado de “possível” TNC frontotemporal pela presença de fatores genéticos etiológicos (p. ex., mutações na codificação genética para a proteína tau associada aos


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Transtornos Neurocognitivos

microtúbulos) ou pela presença de atrofia distintiva ou atividade reduzida nas regiões frontotemporais, em imagens estruturais ou funcionais.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Características extrapiramidais podem ser proeminentes em alguns casos, com uma sobreposição com síndromes, como a paralisia supranuclear progressiva e a degeneração corticobasal. Características de doença neuronal motora podem estar presentes em alguns casos (p. ex., atrofia muscular, fraqueza). Um subconjunto de indivíduos desenvolve alucinações visuais.

Prevalência Transtorno neurocognitivo frontotemporal maior ou leve é causa comum de TNC de surgimento precoce em pessoas com menos de 65 anos. As estimativas de prevalência populacional variam de 2 a 10 para cada 100.000. Por volta de 20 a 25% dos casos de TNC frontotemporal ocorrem em indivíduos com mais de 65 anos. O transtorno responde por cerca de 5% de todos os casos de demência em séries não selecionadas de autópsias. Estimativas de prevalência da variante comportamental e da variante linguística semântica são mais elevadas em indivíduos do sexo masculino, e estimativas de prevalência da variante linguística não fluente no sexo feminino.

Desenvolvimento e Curso Indivíduos com TNC frontotemporal maior ou leve costumam estar na sexta década de vida, ainda que a idade do surgimento varie da terceira à nona década. A doença progride lentamente, com sobrevida média de 6 a 11 anos após o aparecimento dos sintomas e de 3 a 4 anos após o diagnóstico. A sobrevida é mais curta, e o declínio mais rápido, no TNC frontotemporal do que na doença de Alzheimer típica.

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. Por volta de 40% dos indivíduos com TNC maior ou leve têm história familiar de TNC com surgimento precoce, e cerca de 10% mostram um padrão autossômico dominante herdado. Foram identificados vários fatores genéticos, como mutações no gene codificador da proteína tau associada aos microtúbulos (microtubule associated protein tau – MAPT), o gene granulina (granulin gene – GRN) e o gene C9ORF72. Uma variedade de famílias com mutações causadoras foi identificada (ver a seção “Marcadores Diagnósticos” a seguir), mas muitos indivíduos com transmissão familiar conhecida não têm a mutação conhecida. A presença de doença neuronal motora está associada a deterioração mais rápida.

Marcadores Diagnósticos Imagem por tomografia computadorizada (TC) ou por ressonância magnética estrutural (RMe) pode mostrar padrões distintos de atrofia. Na variante comportamental do TNC frontotemporal maior ou leve, os dois lobos (em especial os médio-frontais) e os lobos temporais anteriores estão atróficos. Na variante linguística semântica do TNC maior ou leve, o lobo intermediário, o inferior e o anterior estão bilateralmente atróficos, embora de forma assimétrica, com o lado esquerdo normalmente mais afetado. A variante linguística não fluente do TNC frontotemporal maior ou leve está associada a atrofia predominantemente insular-frontal posterior esquerda. A variante logopênica do TNC frontotemporal maior ou leve está associada a atrofia predominantemente parietal ou perisilviana posterior esquerda. Imagens funcionais demonstram hipoperfusão e/ou hipometabolismo cortical nas regiões cerebrais correspondentes, que podem estar presentes nos primeiros estágios na ausência de anormalidade estrutural. Biomarcadores de surgimento mais recente para a doença de Alzheimer (p. ex., níveis de tau e beta-amiloide do líquido cerebrospinal e imagem amiloide) podem ajudar no diagnóstico diferencial, mas a distinção da doença de


Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal Maior ou Leve 617 Alzheimer pode continuar difícil (a variante logopênica costuma, na verdade, ser uma manifestação dessa doença). Nos casos familiares de TNC frontotemporal, a identificação de mutações genéticas pode ajudar a confirmar o diagnóstico. Mutações associadas ao TNC frontotemporal incluem os genes codificadores da proteína tau associada aos microtúbulos (MAPT) e à granulina (GRN), o gene C9ORF72, a proteína de resposta transativa de ligação ao DNA de 43 kDa (TDP-43 ou TARDBP), a proteína que contém valosina (valosin-containing protein – VCP), a proteína 2B modificadora da cromatina (CHMP2B) e a proteína fusionada no sarcoma (FUS).

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Frontotemporal Maior ou Leve Devido à idade relativamente precoce do início do transtorno, este costuma afetar o local de trabalho e a vida familiar. Considerando-se o envolvimento da linguagem e/ou do comportamento, o funcionamento costuma ficar prejudicado de forma mais grave relativamente cedo no curso. Para indivíduos com a variante comportamental, antes do esclarecimento diagnóstico, pode ter ocorrido ruptura familiar significativa, envolvimento legal e problemas no local de trabalho devido a comportamentos socialmente inadequados. O prejuízo funcional devido à mudança comportamental e à disfunção linguística, que pode incluir hiperoralidade, perambulação impulsiva e outros comportamentos desinibidos, pode ir muito além do resultante da perturbação cognitiva, ocasionando, por vezes, internação em casa de repouso ou institucionalização. Esses comportamentos podem ser gravemente disruptivos, mesmo em locais com estrutura de atendimento, sobretudo quando os indivíduos são de outro modo saudáveis, não fragilizados e estão livres de outras comorbidades médicas.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos neurocognitivos. Outras doenças neurodegenerativas podem ser diferenciadas de TNC frontotemporal maior ou leve pelos aspectos característicos. No TNC maior ou leve devido à doença de Alzheimer, o declínio na aprendizagem e na memória é um aspecto precoce. Todavia, 10 a 30% dos pacientes que se apresentam com uma síndrome sugestiva de TNC frontotemporal maior ou leve mostram, via necropsia, ser portadores de patologia da doença de Alzheimer. Isso ocorre com mais frequência em indivíduos que apresentam síndromes com alterações progressivas nas funções executivas na ausência de mudanças comportamentais ou de transtorno do movimento ou nos que apresentam a variante logopênica. No TNC maior ou leve com corpos de Lewy, aspectos centrais e sugestivos dos corpos de Lewy podem estar presentes. No TNC maior ou leve devido à doença de Parkinson, surge parkinsonismo espontâneo bem antes do declínio cognitivo. No TNC vascular maior ou leve, dependendo das regiões cerebrais afetadas, pode também haver perda da capacidade executiva e mudanças comportamentais, como apatia, e esse transtorno deve ser levado em conta no diagnóstico diferencial. Uma história de evento cerebrovascular, no entanto, está temporalmente relacionada ao aparecimento de prejuízo cognitivo no TNC vascular maior ou leve, e a neuroimagem revela infartos ou lesões na substância branca, em quantidade suficiente para responder pelo quadro clínico. Outras condições neurológicas. Transtorno cognitivo frontotemporal maior ou leve se sobrepõe clínica e patologicamente a paralisia supranuclear progressiva, degeneração corticobasal e doença neuronal motora. A paralisia supranuclear progressiva caracteriza-se por paralisias supranucleares de olhar fixo e parkinsonismo predominantemente axial. Sinais pseudobulbares podem estar presentes, e retropropulsão costuma ser proeminente. Uma avaliação neurocognitiva mostra lentidão psicomotora, memória de trabalho com funcionamento ruim e disfunção executiva. A degeneração corticobasal apresenta-se com rigidez assimétrica, apraxia dos membros, instabilidade postural, mioclonia, fenômeno do membro alienígena e perda sensorial cortical. Muitos indivíduos com a variante comportamental do TNC frontotemporal maior ou leve apresentam características de doença do neurônio motor, que tende a ser doença mista do neurônio superior e predominantemente do neurônio motor inferior.


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Transtornos Neurocognitivos

Outros transtornos mentais e condições médicas. A variante comportamental do TNC frontotemporal pode ser confundida com transtorno mental primário, como depressão maior, transtornos bipolares ou esquizofrenia, e indivíduos com essa variante costumam apresentar-se, inicialmente, ao psiquiatra. Com o tempo, o desenvolvimento de dificuldades neurocognitivas progressivas ajudará a fazer a distinção. É útil uma avaliação médica criteriosa para que sejam excluídas causas tratáveis de TNCs, como distúrbios metabólicos, deficiências nutricionais e infecções.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve com Corpos de Lewy Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. O transtorno tem surgimento insidioso e progressão gradual. C. O transtorno atende a uma combinação de características diagnósticas centrais e sugestivas para provável ou possível transtorno neurocognitivo com corpos de Lewy. Para provável transtorno neurocognitivo maior ou leve com corpos de Lewy, o indivíduo tem duas características centrais ou uma sugestiva com um ou mais aspectos principais. Para possível transtorno neurocognitivo maior ou leve com corpos de Lewy, o indivíduo tem apenas uma característica central ou um ou mais aspectos sugestivos. 1. Características diagnósticas centrais: a. Cognição oscilante, com variações acentuadas na atenção e no estado de alerta. b. Alucinações visuais recorrentes, bem formadas e detalhadas. c. Características espontâneas de parkinsonismo, com aparecimento subsequente ao desenvolvimento do declínio cognitivo. 2. Características diagnósticas sugestivas: a. Atende a critérios de transtorno comportamental do sono do movimento rápido dos olhos (ou sono REM – rapid eye movement). b. Sensibilidade neuroléptica grave. D. A perturbação não é mais bem explicada por doença vascular cerebral, outra doença neurodegenerativa, efeitos de uma substância ou outro transtorno mental, neurológico ou sistêmico. Nota para codificação: Para provável transtorno neurocognitivo maior com corpos de Lewy, com perturbação comportamental, codificar primeiro 331.82 (G31.83) doença com corpos de Lewy, seguida de 294.11 (F02.81) provável transtorno neurocognitivo maior com corpos de Lewy, com perturbação comportamental. Para provável transtorno neurocognitivo maior com corpos de Lewy, sem perturbação comportamental, codificar primeiro 331.82 (G31.83) doença com corpos de Lewy, seguida de 294.10 (F02.80) provável transtorno neurocognitivo maior com corpos de Lewy, sem perturbação comportamental. Para possível transtorno neurocognitivo maior com corpos de Lewy, codificar 331.9 (G31.9) possível transtorno neurocognitivo maior com corpos de Lewy, . (Nota: Não usar o código adicional para doença com corpos de Lewy. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.) Para transtorno neurocognitivo leve com corpos de Lewy, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para doença com corpos de Lewy. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas Transtorno neurocognitivo maior ou leve com corpos de Lewy (TNCCL), no caso de TNC maior, corresponde à condição conhecida como demência com corpos de Lewy (DCL). O transtorno in-


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve com Corpos de Lewy 619 clui não somente prejuízo cognitivo progressivo (com as primeiras mudanças ocorrendo mais na atenção complexa e na função executiva do que na aprendizagem e na memória) como também alucinações visuais complexas recorrentes e sintomas concorrentes de transtorno comportamental do sono com movimento rápido dos olhos (REM) (que pode ser uma manifestação muito precoce), além de alucinações de outras modalidades sensoriais, depressão e delírios. Os sintomas oscilam em um padrão que pode se assemelhar a delirium, embora não possa ser encontrada uma causa subjacente. A apresentação variável dos sintomas de TNCCL reduz a probabilidade de todos os sintomas serem observados em uma consulta clínica breve, havendo necessidade de uma investigação completa das observações do cuidador. O uso de escalas de avaliação especificamente criadas para avaliar oscilações pode ajudar no diagnóstico. Outro aspecto central é o parkinsonismo espontâneo, que deve começar após o surgimento do declínio cognitivo; por convenção, são observados déficits cognitivos maiores, no mínimo, um ano antes dos sintomas motores. O parkinsonismo também deve ser diferenciado de sinais extrapiramidais induzidos por neurolépticos. É fundamental o diagnóstico preciso para um planejamento seguro do tratamento, uma vez que até 50% dos indivíduos com TNCCL têm sensibilidade grave a fármacos neurolépticos, e esses medicamentos devem ser usados com muita cautela no controle das manifestações psicóticas. O diagnóstico de TNCCL leve é apropriado para indivíduos que apresentam aspectos centrais ou sugestivos, em um estágio em que prejuízos cognitivos ou funcionais não têm gravidade suficiente para atenderem aos critérios de TNC maior. Da mesma forma que para todos os TNCs leves, porém, com frequência haverá evidências insuficientes que justifiquem qualquer etiologia isolada, sendo mais apropriado o uso de um diagnóstico não especificado.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com TNCCL têm quedas repetidas e síncope, além de episódios passageiros de perda de consciência sem explicação. Disfunção autonômica, como hipotensão ortostática e incontinência urinária, pode ser observada. São comuns alucinações auditivas e não visuais, da mesma forma que delírios sistematizados, identificação errônea delirante e depressão.

Prevalência As poucas estatísticas disponíveis de prevalência baseadas na população para TNCCL variam de 0,1 a 5% da população idosa em geral e de 1,7 a 30,5% de todos os casos de demência. Nas séries de bancos de cérebros (necropsia), as lesões patológicas conhecidas como corpos de Lewy estão presentes em 20 a 35% dos casos de demência. A proporção entre os sexos masculino e feminino é de cerca de 1,5:1.

Desenvolvimento e Curso O TNCCL é um doença gradualmente progressiva, com surgimento insidioso. Há, porém, com frequência, uma história prodrômica de episódios de confusão (delirium) de surgimento agudo, comumente precipitados por doença ou cirurgia. A distinção entre TNCCL, em que os corpos de Lewy são basicamente de localização cortical, e TNC maior ou leve devido à doença de Parkinson, em que a patologia é basicamente nos gânglios da base, é a ordem em que aparecem os sintomas cognitivos e motores. No TNCCL, o declínio é manifestado cedo no curso da doença, pelo menos um ano antes do surgimento dos sintomas motores (ver a seção “Diagnóstico Diferencial” para este transtorno). O curso da doença pode ser caracterizado por platôs ocasionais, mas eventualmente há progressão, que vai da demência grave à morte. A duração média da sobrevida é de 5 a 7 anos nas séries clínicas. O aparecimento de sintomas costuma ser observado a partir da sexta até a nona década de vida, com a maior parte dos casos tendo o surgimento quando as pessoas afetadas estão na metade da sétima década de vida.


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Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. Pode ocorrer agregação familiar, tendo sido identificados vários genes de risco, embora na maior parte dos casos de TNCCL não haja história familiar.

Marcadores Diagnósticos A doença neurodegenerativa subjacente é essencialmente uma sinucleinopatia em razão de duplicações errôneas e agregação da alfa-sinucleína. Testes cognitivos que vão além do uso de instrumentos breves para rastreio podem ser necessários para definir os déficits com clareza. Escalas avaliativas, criadas para medir oscilações, podem ser úteis. A condição associada de transtorno comportamental do sono REM pode ser diagnosticada por meio de um estudo formal do sono ou identificada por perguntas ao paciente ou a um informante sobre sintomas relevantes. Sensibilidade neuroléptica (desafio) não é indicada como marcador diagnóstico, mas, se ocorre, faz surgir a suspeita de TNCCL. Uma característica diagnóstica sugestiva é a baixa captação do transportador de dopamina estriatal em tomografia computadorizada por emissão de fóton único (SPECT), ou tomografia por emissão de pósitrons (PET). Outros marcadores clínicos potencialmente úteis incluem a conservação relativa de estruturas temporais médias em imagens por tomografia computadorizada/ressonância magnética do cérebro; a captação reduzida do transportador de dopamina estriatal nos exames de SPECT/PET; a baixa captação generalizada em SPECT/PET de perfusão, com atividade occipital reduzida; e a cintilografia do miocárdio MIBG anormal, sugerindo denervação simpática: atividade destacada com ondas lentas no eletrencefalograma, com ondas transientes no lobo temporal.

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve com Corpos de Lewy Pessoas com TNCCL estão mais prejudicas funcionalmente do que o esperado para seus déficits cognitivos quando comparadas a indivíduos com outras doenças degenerativas, como a doença de Alzheimer. Em grande parte, isso é consequência de prejuízos autonômicos e motores, causadores de problemas de higiene íntima, movimentação e ato alimentar. Distúrbios do sono e sintomas psiquiátricos proeminentes podem também ser parte das dificuldades funcionais. Assim, a qualidade de vida de indivíduos com esse transtorno costuma ser significativamente pior do que a daqueles com doença de Alzheimer.

Diagnóstico Diferencial Transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Parkinson. Um aspecto distintivo essencial no diagnóstico clínico é a sequência temporal em que aparecem o parkinsonismo e o TNC. No caso de TNC devido à doença de Parkinson, o indivíduo deve desenvolver declínio cognitivo no contexto da doença de Parkinson estabelecida; por convenção, o declínio só atinge o estágio de TNC maior pelo menos um ano após o diagnóstico da doença de Parkinson. Se decorreu menos de um ano desde o surgimento de sintomas motores, o diagnóstico é TNCCL. Essa distinção fica mais clara no nível do TNC maior do que no do leve. O momento certo e a sequência do parkinsonismo e do TNC leve podem ser de difícil determinação, porque o surgimento e a apresentação clínica podem ser ambíguos, e TNC leve não especificado deve ser diagnosticado diante da ausência de outras características principais e sugestivas.

Comorbidade A patologia com corpos de Lewy costuma coexistir com a doença de Alzheimer e com a patologia da doença cerebrovascular, em especial em idosos. Na doença de Alzheimer, há patologia da sinucleína concomitante em 60% dos casos (se incluídos casos limitados à amígdala). Geralmente,


Transtorno Neurocognitivo Vascular Maior ou Leve 621 há proporção mais alta da patologia com corpos de Lewy em indivíduos com demência do que em indivíduos idosos sem demência.

Transtorno Neurocognitivo Vascular Maior ou Leve Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Os aspectos clínicos são consistentes com uma etiologia vascular, conforme sugerido por um dos seguintes: 1. O surgimento de déficits cognitivos está temporariamente relacionado com um ou mais de um evento cerebrovascular. 2. Evidências de declínio são destacadas na atenção complexa (incluindo velocidade de processamento) e na função executiva frontal. C. Há evidências da presença de doença cerebrovascular a partir da história, do exame físico e/ou de neuroimagem consideradas suficientes para responder pelos déficits cognitivos. D. Os sintomas não são mais bem explicados por outra doença cerebral ou transtorno sistêmico. Provável transtorno neurocognitivo vascular é diagnosticado quando um dos seguintes está presente; caso contrário, deve ser diagnosticado possível transtorno neurocognitivo vascular: 1. Os critérios clínicos têm apoio de evidências de neuroimagem de lesão parenquimal significativa, atribuída a doença cerebrovascular (com apoio de neuroimagem). 2. A síndrome neurocognitiva é temporalmente relacionada com um ou mais eventos cerebrovasculares documentados. 3. Evidências clínicas e genéticas (p. ex., arteriopatia cerebral autossômica dominante, com infartos subcorticais e leucoencefalopatia) de doença cerebrovascular estão presentes. Possível transtorno neurocognitivo vascular é diagnosticado quando os critérios clínicos são atendidos, mas não está disponível neuroimagem, e a relação temporal da síndrome neurocognitiva com um ou mais de um evento cerebrovascular não está estabelecida. Nota para codificação: Para provável transtorno neurocognitivo vascular maior, com perturbação comportamental, codificar 290.40 (F01.51). Para provável transtorno neurocognitivo vascular maior, sem perturbação comportamental, codificar 290.40 (F01.50). Para possível transtorno neurocognitivo vascular maior, com ou sem perturbação comportamental, codificar 331.9 (G31.9). Não é necessário um código adicional para a doença cerebrovascular. Para transtorno neurocognitivo vascular leve, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar um código adicional para a doença vascular. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas O diagnóstico de transtorno neurocognitivo vascular maior ou leve exige o estabelecimento de um TNC (Critério A) e a determinação de que a doença cerebrovascular é a patologia dominante, quando não exclusiva, que responde pelos déficits cognitivos (Critérios B e C). A etiologia vascular pode variar de acidente vascular cerebral em grande vaso a doença microvascular; a apresentação é, assim, bastante heterogênea, derivada dos tipos de lesões vasculares e de sua extensão e localização. As lesões podem ser focais, multifocais ou difusas e ocorrer em várias combinações. Muitos indivíduos com TNC vascular maior ou leve apresentam infartos múltiplos, com um declínio agudo gradual ou flutuante na cognição, bem como períodos intervenientes de estabilidade e até mesmo alguma melhora. Outros podem ter surgimento gradual, com progressão lenta, rápido desenvolvimento de déficits, seguido de relativa estabilidade, ou outra apresentação complexa. Transtorno neurocognitivo vascular maior ou leve, com surgimento gradativo e progressão lenta, costuma ser decorrente de alguma doença dos pequenos vasos ou de lesões na substância branca, nos gânglios da base e/ou no tálamo. A progressão gradativa, nesses casos, costuma ser


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Transtornos Neurocognitivos

pontuada por eventos agudos, que deixam déficits neurológicos sutis. Os déficits cognitivos podem ser atribuídos a uma ruptura dos circuitos córtico-subcorticais, com possível influência na atenção complexa, em especial na velocidade do processamento de informações e na capacidade executiva. Investigar de forma suficiente a presença de uma doença cerebrovascular depende da história, do exame físico e de neuroimagem (Critério C). Certeza etiológica exige a demonstração de anormalidades na neuroimagem. A falta dessas neuroimagens pode resultar em imprecisão diagnóstica significativa pela omissão de infarto cerebral “silencioso” e lesões na substância branca. Se, entretanto, o prejuízo cognitivo está temporariamente associado a um ou mais acidentes vasculares cerebrais bem documentados, pode ser feito um diagnóstico provável na falta de neuroimagem. Evidências clínicas de doença cerebrovascular incluem a história documentada de acidente vascular cerebral, com declínio cognitivo temporariamente associado ao evento, ou sinais físicos consistentes com um acidente vascular cerebral (p. ex., hemiparesia, síndrome pseudobulbar, falha no campo visual). Evidências de neuroimagem (evidências de doença cerebrovascular em ressonância magnética ou tomografia computadorizada) englobam um ou mais dos seguintes: um ou mais grandes vasos infartados ou hemorrágicos, um único infarto ou hemorragia estrategicamente situada (p. ex., no giro angular, no tálamo, na porção anterior e basal do cérebro), dois ou mais infartos lacunares fora do tronco cerebral ou lesões extensas e confluentes da substância branca. Esta última, com frequência, é chamada de doença do vaso menor, ou mudanças isquêmicas subcorticais, em avaliações clínicas com neuroimagem. No TNC vascular leve, costuma ser suficiente a história de um só acidente vascular cerebral ou de doença extensa da substância branca. No TNC vascular maior, costumam ser necessários dois ou mais acidentes vasculares cerebrais, um acidente vascular cerebral estrategicamente situado ou uma combinação de doença da substância branca e uma ou mais lacunas. O transtorno não deve ser mais bem explicado por outro transtorno. Por exemplo, déficit proeminente de memória bem cedo no curso pode sugerir doença de Alzheimer; características parkinsonianas destacadas e precoces sugerem doença de Parkinson; e uma associação próxima entre o início e a depressão sugere depressão.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A avaliação neurológica costuma revelar história de acidente vascular cerebral e/ou episódios isquêmicos transitórios, além de sinais indicativos de infartos cerebrais. Encontram-se também normalmente associadas mudanças de personalidade e humor, abulia, depressão e oscilação emocional. Desenvolvimento de sintomas depressivos de aparecimento tardio, acompanhados de desaceleração psicomotora e disfunção executiva, é uma apresentação comum entre idosos com doença isquêmica progressiva em pequenos vasos (“depressão vascular”).

Prevalência Transtorno neurocognitivo maior ou leve é a segunda causa mais comum de TNC depois da doença de Alzheimer. Nos Estados Unidos, estatísticas de prevalência na população referentes a demência vascular variam de 0,2% na faixa dos 65 a 70 anos até 16% em pessoas com 80 anos ou mais. Nos três meses após um acidente vascular cerebral, 20 a 30% dos indivíduos são diagnosticados com demência. Em séries neuropatológicas, a prevalência de demência vascular aumenta de 13% aos 70 anos de idade para 44,6% aos 90 anos ou mais na comparação com a doença de Alzheimer (23,6 a 51%) e com a combinação de demência vascular e doença de Alzheimer (2 a 46,4%). Uma prevalência mais elevada tem sido relatada nos afro-americanos, comparados a brancos, e em países do leste asiático (p. ex., Japão, China). A prevalência é maior em indivíduos do sexo masculino do que nos do sexo feminino.

Desenvolvimento e Curso Pode ocorrer TNC maior ou leve em qualquer idade, ainda que a prevalência aumente exponencialmente após os 65 anos. Em pessoas idosas, patologias adicionais podem, em parte, ser as


Transtorno Neurocognitivo Vascular Maior ou Leve 623 responsáveis pelos déficits neurocognitivos. O curso pode variar de início agudo com melhora parcial para declínio gradual a progressivo, com flutuações e platôs de duração variável. O TNC vascular subcortical puro maior ou leve pode ter um curso progressivo lento, que simula TNC maior ou leve devido à doença de Alzheimer.

Fatores de Risco e Prognóstico Ambientais. As consequências neurocognitivas de uma lesão encefálica vascular são influenciadas por fatores de neuroplasticidade, como educação, exercício físico e atividade mental. Genéticos e fisiológicos. Os principais fatores de risco de TNC vascular maior ou leve são os mesmos que os da doença cerebrovascular, incluindo hipertensão, diabetes, tabagismo, obesidade, níveis elevados de colesterol, níveis elevados de homocisteína, outros fatores de risco de aterosclerose e arteriolosclerose, fibrilação atrial e outras condições que aumentam o risco de embolia cerebral. Angiopatia amiloide cerebral é um fator de risco importante, em que ocorrem depósitos amiloides em vasos arteriais. Outro fator de risco significativo é a condição hereditária de arteriopatia cerebral autossômica dominante com infartos subcorticais e leucoencefalopatia, ou CADASIL (cerebral autosomal dominant arteriopathy with subcortical infarcts and leukoencephalopathy).

Marcadores Diagnósticos Neuroimagens estruturais, usando ressonância magnética ou TC, têm papel importante no processo diagnóstico. Não existem outros biomarcadores estabelecidos de TNC vascular maior ou leve.

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Vascular Maior ou Leve Transtorno neurocognitivo vascular maior ou leve costuma estar associado a déficits físicos, causadores de mais incapacidade.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos neurocognitivos. Considerando que infartos cerebrais incidentais e lesões na substância branca são comuns em indivíduos idosos, é importante levar em conta outras etiologias possíveis na presença de um transtorno neurocognitivo. História de déficit de memória no começo do curso, com piora progressiva da memória, da linguagem, da função executiva e das capacidades perceptomotoras, na ausência de lesões focais correspondentes em imagens do cérebro, sugere a doença de Alzheimer como diagnóstico primário. Biomarcadores potenciais sendo atualmente validados para a doença de Alzheimer, como níveis de beta-amiloide e de tau fosforilada no líquido cerebrospinal, bem como imagem amiloide, podem ser úteis no diagnóstico diferencial. O TNC com corpos de Lewy difere do TNC vascular maior ou leve em suas características principais de cognição oscilante, alucinações visuais e parkinsonismo espontâneo. No TNC vascular maior ou leve, ocorrem déficits na função executiva e na linguagem, ao passo que o surgimento insidioso e a progressão gradual de prejuízos dos aspectos comportamentais ou da linguagem são características de TNC frontotemporal, não sendo típicos da etiologia vascular. Outras condições médicas. Não é feito um diagnóstico de TNC vascular maior ou leve se outras doenças (p. ex., tumor cerebral, esclerose múltipla, encefalite, distúrbios tóxicos ou metabólicos) estão presentes e tenham gravidade suficiente para responder pelo prejuízo cognitivo. Outros transtornos mentais. É inadequado um diagnóstico de TNC vascular maior ou leve quando os sintomas podem ser completamente atribuídos a delirium, embora este possa, por vezes, estar sobreposto a um TNC vascular maior ou leve preexistente, situação em que podem ser feitos os dois diagnósticos. Se atendidos os critérios para transtorno depressivo maior, e o


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Transtornos Neurocognitivos

prejuízo cognitivo está temporariamente relacionado ao possível surgimento da depressão, não deve ser diagnosticado TNC vascular maior ou leve. Quando, porém, o TNC antecedeu o desenvolvimento da depressão, ou a gravidade do prejuízo cognitivo está fora de proporção em relação à gravidade da depressão, ambos devem ser diagnosticados.

Comorbidade Transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Alzheimer costuma ocorrer concomitantemente com TNC vascular maior ou leve, caso em que os dois diagnósticos devem ser feitos. Há concomitância frequente de TNC vascular maior ou leve e depressão.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Lesão Cerebral Traumática Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há evidências de uma lesão cerebral traumática – isto é, um impacto na cabeça ou outros mecanismos de movimento rápido ou deslocamento do cérebro dentro do crânio, com um ou mais dos seguintes: 1. Perda de consciência. 2. Amnésia pós-traumática. 3. Desorientação e confusão. 4. Sinais neurológicos (p. ex., neuroimagem que mostra lesão; um novo início de convulsões; piora marcante de um transtorno convulsivo preexistente; cortes no campo visual; anosmia, hemiparesia). C. O transtorno neurocognitivo apresenta-se imediatamente após a ocorrência da lesão cerebral traumática ou imediatamente após a recuperação da consciência, persistindo após o período agudo pós-lesão. Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior devido a lesão cerebral traumática, com perturbação comportamental: para a CID-9-MC, codificar primeiro 907.0 efeito tardio de lesão intracraniana sem fratura do crânio, seguido de 294.11 transtorno neurocognitivo maior devido a lesão cerebral traumática, com perturbação comportamental. Para a CID-10-MC, codificar primeiro S06.2X9S lesão cerebral traumática difusa, com perda de consciência de duração não especificada, seguida de F02.81 transtorno neurocognitivo maior devido a lesão cerebral traumática, com perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo maior devido a lesão cerebral traumática, sem perturbação comportamental: para a CID-9-MC, codificar primeiro 907.0 lesão intracraniana de efeito tardio, sem fratura de crânio, seguida de 294.10 transtorno neurocognitivo maior devido a lesão cerebral traumática, sem perturbação comportamental. Para a CID-10-MC, codificar primeiro S06.2X9S lesão cerebral traumática difusa, com perda de consciência de duração não especificada, sequelas, seguida de F02.80 transtorno neurocognitivo maior devido a lesão cerebral traumática, sem perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo leve devido a lesão cerebral traumática, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para lesão cerebral traumática. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Especificadores Classificar a gravidade do transtorno neurocognitivo, e não a lesão cerebral traumática subjacente (ver a seção “Desenvolvimento e Curso” para este transtorno).


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido... 625

Características Diagnósticas Transtorno neurocognivo maior ou leve devido a lesão cerebral traumática (LCT) é causado por um impacto na cabeça ou por outros mecanismos de movimento rápido ou deslocamento do cérebro na caixa craniana, como pode ocorrer em lesões por explosão. Uma lesão cerebral traumática é definida como trauma cerebral, com características específicas que incluem, pelo menos, um dos seguintes: perda de consciência, amnésia pós-traumática, desorientação e confusão ou, em casos mais graves, sinais neurológicos (p. ex., neuroimagem positiva, um novo surgimento de convulsões ou piora marcante de um transtorno convulsivo preexistente, cortes no campo visual, anosmia, hemiparesia) (Critério B). Para ser passível de atribuição a uma LCT, o transtorno neurocognitivo deve apresentar-se imediatamente após a ocorrência da lesão cerebral ou imediatamente após a pessoa recuperar a consciência pós-lesão, persistindo além do período agudo pós-lesão (Critério C). A apresentação cognitiva é variável. Dificuldades nos domínios de atenção complexa, habilidade executiva, aprendizagem e memória são comuns, bem como desaceleração na velocidade do processamento de informações e perturbações na cognição social. Na LCT mais grave, em que há contusão cerebral, hemorragia intracraniana ou lesão penetrante, pode haver déficits neurocognitivos adicionais, como afasia, negligência e dispraxia construtiva.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Transtorno neurocognivo maior ou leve devido a uma LCT pode vir acompanhado de perturbações na função emocional (p. ex., irritabilidade, frustração fácil, tensão e ansiedade, oscilação afetiva), mudanças na personalidade (p. ex., desinibição, apatia, desconfiança, agressão), perturbações físicas (p. ex., cefaleia, fadiga, distúrbios do sono, vertigem ou tontura, tinido ou hiperacusia, sensibilidade à luz, anosmia, tolerância reduzida a medicamentos psicotrópicos) e, em especial na LCT mais grave, sintomas e sinais neurológicos (p. ex., convulsões, hemiparesia, perturbações visuais, déficits em nervos cranianos) e evidências de lesões ortopédicas.

Prevalência Nos Estados Unidos, ocorre anualmente 1,7 milhão de LCTs, resultando em 1,4 milhão de visitas a setores de emergência, 275 mil hospitalizações e 52 mil mortes. Cerca de 2% da população vive com incapacidade associada a LCT. Indivíduos do sexo masculino têm 59% das LCTs nos Estados Unidos. As etiologias mais comuns de LCT, nesse país, são quedas, acidentes automotivos e golpes na cabeça. Colisões e pancadas na cabeça que ocorrem em esportes de contato são cada vez mais reconhecidas como fontes de LCT leve, com a preocupação de que repetidas LCTs leves podem acarretar persistência cumulativa de sequelas.

Desenvolvimento e Curso A gravidade de uma LCT é classificada no momento da lesão/primeira avaliação como leve, moderada ou grave, conforme os limiares apresentados na Tabela 2. A classificação da gravidade da LCT por si só não corresponde, necessariamente, à gravidade do TNC resultante. O curso de recuperação de uma LCT é variável, dependendo não apenas das especificidades da lesão como também de cofatores, como idade, história anterior de dano cerebral ou abuso de substância, que podem favorecer a recuperação ou impedi-la. TABELA 2 Classificações da gravidade de lesão cerebral traumática (LCT) Característica da lesão

LCT leve

LCT moderada

LCT grave

Perda de consciência

< 30 min

30 min-24 horas

> 24 horas

Amnésia pós-traumática

< 24 horas

24 horas-7 dias

> 7 dias

Desorientação e confusão na primeira avaliação (na Escala de Coma de Glasgow)

13-15 (não abaixo de 9-12 13 a 30 minutos)

3-8


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Transtornos Neurocognitivos

Sintomas neurocomportamentais tendem a ser mais graves no período após a lesão cerebral traumática. A não ser no caso de lesão grave, o curso normal é o de melhora completa ou substancial dos sintomas e sinais neurocognitivos, neurológicos e psiquiátricos associados. Os sintomas neurocognitivos associados a uma LCT leve tendem a resolver-se em dias a semanas após a lesão, com uma resolução completa normalmente ocorrendo em três meses. Outros sintomas que podem, potencialmente, ser concomitantes aos sintomas neurológicos (p. ex., depressão, irritabilidade, fadiga, cefaleia, sensibilidade à luz, perturbação do sono) tendem também a ter solução nas semanas após a LCT. Uma deterioração substancial subsequente nessas áreas tende a levar à consideração de diagnósticos adicionais. Lesão cerebral traumática leve repetida, entretanto, pode estar associada a perturbação neurocognitiva persistente. Com LCT moderada e grave, além da persistência de déficits neurocognitivos, pode haver complicações neurofisiológicas, emocionais e comportamentais associadas. Entre elas, incluem-se convulsões (particularmente no primeiro ano), sensibilidade à luz, hiperacusia, irritabilidade, agressividade, depressão, perturbação do sono, fadiga, apatia, incapacidade para retomar a função profissional e social no nível pré-lesão e deterioração nas relações interpessoais. Lesão cerebral traumática moderada a grave é associada a risco maior de depressão, agressividade e possíveis doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer. As características de transtorno neurocognitivo maior ou leve devido a uma LCT irão variar de acordo com idade, especificidades da lesão e cofatores. Prejuízo persistente relacionado à LCT, em bebê ou criança, pode se refletir em atrasos no alcance dos marcos do desenvolvimento (p. ex., aquisição da linguagem), piora do desempenho acadêmico e possível prejuízo do desenvolvimento social. Entre adolescentes com mais idade e adultos, os sintomas persistentes podem incluir vários déficits neurocognitivos, irritabilidade, hipersensibilidade a luz e som, fadiga fácil e mudanças do humor, incluindo depressão, ansiedade, hostilidade ou apatia. Em pessoas com mais idade, com reservas cognitivas esgotadas, a LCT leve tem mais possibilidade de resultar em recuperações incompletas.

Fatores de Risco e Prognóstico Fatores de risco para lesão cerebral traumática. As taxas de lesão cerebral traumática variam com a idade, com a maior prevalência entre indivíduos com menos de 4 anos de idade, adolescentes mais velhos e pessoas com mais de 65 anos. As quedas são a causa mais comum de LCT, acidentes com veículos automotivos vindo em segundo lugar. Concussões nos esportes são causas frequentes de LCT em crianças mais velhas, adolescentes e adultos jovens. Fatores de risco para transtorno neurocognitivo após lesão cerebral traumática. Concussões repetidas podem levar a TNC persistente e evidências neuropatológicas de encefalopatia traumática. Intoxicação concomitante, por alguma substância, pode aumentar a gravidade de uma LCT resultante de acidente com veículo automotivo, embora ainda não se conheça se intoxicação à época da lesão piora ou não as consequências neurocognitivas. Modificadores do curso. A LCT leve costuma ter solução em poucas semanas a meses, embora a cura possa ser retardada ou ficar incompleta no contexto de LCTs repetidas. Uma consequência pior da LCT moderada a grave está associada ao envelhecimento (mais de 40 anos) e a parâmetros clínicos iniciais, como baixo escore na Escala de Coma de Glasgow, piora da função motora, não reatividade pupilar e evidências de lesão cerebral (p. ex., hemorragias com petéquias, hemorragia subaracnoide, mudança na meia-vida, obliteração do terceiro ventrículo) por meio de tomografia computadorizada.

Marcadores Diagnósticos Além de testes neuropsicológicos, rastreamento por TC pode revelar hemorragias com petéquias, hemorragia subaracnoide ou evidências de contusão. A ressonância magnética pode também revelar hiperintensidades sugestivas de micro-hemorragias.


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Induzido... 627

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Lesão Cerebral Traumática Com TNC leve devido a uma LCT, as pessoas podem relatar menor eficiência cognitiva, dificuldade de concentração e capacidade reduzida de realizar as atividades comuns. Com TNC maior devido a LCT, a pessoa pode ter dificuldades para viver com independência e com autocuidado. Características neuromotoras destacadas, como falta grave de coordenação, ataxia e lentificação motora, podem estar presentes no TNC maior devido a LCT, podendo aumentar as dificuldades funcionais. Pessoas com histórias de LCT informam mais sintomas depressivos, com estes podendo amplificar as queixas cognitivas e piorar as consequências funcionais. Além disso, perda de controle emocional, inclusive afeto agressivo ou inadequado e apatia, pode estar presente após uma LCT mais grave, com prejuízo neurocognitivo maior. Essas características podem aumentar as dificuldades para uma vida independente e para o autocuidado.

Diagnóstico Diferencial Em alguns casos, a gravidade dos sintomas neurocognitivos pode parecer inconsistente com a da LCT. Após a exclusão de complicações neurológicas não detectadas anteriormente (p. ex., hematoma crônico), a possibilidade de diagnósticos como transtorno de sintomas somáticos ou transtorno factício precisa ser considerada. Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) pode ocorrer com o TNC e ter sintomas que se sobrepõem (p. ex., dificuldade de concentração, humor depressivo, desinibição comportamental agressiva).

Comorbidade Entre indivíduos com transtornos por uso de substância, os efeitos neurocognitivos da substância contribuem para mudanças neurocognitivas associadas à LCT, ou dela participam. Alguns sintomas associados à LCT podem se sobrepor aos encontrados em casos de TEPT, ocorrendo comorbidade entre os dois transtornos, em especial entre os militares.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Induzido por Substância/Medicamento Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Os prejuízos neurocognitivos não ocorrem exclusivamente durante o curso de delirium e persistem além da duração habitual da intoxicação e da abstinência aguda. C. A substância ou medicamento envolvido, bem como a duração e o alcance do uso, é capaz de produzir o prejuízo neurocognitivo. D. O curso temporal dos déficits neurocognitivos é consistente com o período em que ocorreu o uso e a abstinência de uma substância ou medicamento (p. ex., os déficits continuam estáveis ou diminuem após um período de abstinência). E. O transtorno neurocognitivo não é passível de atribuição a outra condição médica ou não é mais bem explicado por outro transtorno mental. Nota para codificação: Os códigos da CID-9-MC e da CID-10-MC para os transtornos neurocognitivos induzidos por [substância/medicamento específico] estão indicados na tabela a seguir. Observar que o código da CID-10-MC depende da presença ou não de um transtorno comórbido por uso de substância para a mesma classe de substância. Quando um transtorno leve por uso de substância é comórbido com o transtorno neurocognitivo induzido por substância, o número da 4a posição é “1”, e o clínico deve registrar “transtorno leve por uso de [substância]” antes de transtorno neurocognitivo


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Transtornos Neurocognitivos

induzido por substância (p. ex., “transtorno leve por uso de inalante, com transtorno neurocognitivo maior induzido por inalante”). Quando um transtorno moderado a grave por uso de substância é comórbido com o transtorno neurocognitivo induzido por substância, o número da 4a posição é “2”, e o clínico deve registrar “transtorno moderado por uso de [substância]”, ou “transtorno grave por uso de [substância]”, dependendo da gravidade do transtorno comórbido por uso de substância. Não existindo transtorno comórbido por uso de substância, o número da 4a posição é “9”, e o clínico deve registrar somente o transtorno neurocognitivo induzido por substância. Para algumas classes de substâncias (i.e., álcool, sedativos, hipnóticos, ansiolíticos), não é permitido codificar um transtorno comórbido por uso leve de substância com um transtorno neurocognitivo induzido por substância; pode ser diagnosticado apenas um transtorno comórbido por uso moderado a grave de substância ou nenhum transtorno por uso de substância. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito. CID-10-MC

CID-9-MC

Com Com transtorno por Sem transtorno uso, moderado transtorno por uso, leve a grave por uso

Álcool (transtorno neurocognitivo maior), tipo não amnéstico confabulatório

291.2

NA

F10.27

F10.97

Álcool (transtorno neurocognitivo maior), tipo amnéstico confabulatório

291.1

NA

F10.26

F10.96

Álcool (transtorno neurocognitivo leve)

291.89

NA

F10.288

F10.988

Inalante (transtorno neurocognitivo maior)

292.82

F18.17

F18.27

F18.97

Inalante (transtorno neurocognitivo leve)

292.89

F18.188

F18.288

F18.988

Sedativo, hipnótico ou ansiolítico (transtorno neurocognitivo maior)

292.82

NA

F13.27

F13.97

Sedativo, hipnótico ou ansiolítico (transtorno neurocognitivo leve)

292.89

NA

F13.288

F13.988

Outra substância (ou substância desconhe- 292.82 cida) (transtorno neurocognitivo maior)

F19.17

F19.27

F19.97

Outra substância (ou substância desconhe- 292.89 cida) (transtorno neurocognitivo leve)

F19.188

F19.288

F19.988

Especificar se: Persistente: O prejuízo neurocognitivo continua a ser significativo após longo período de abstinência.

Procedimentos para Registro CID-9-MC. O nome do transtorno neurocognitivo induzido por substância/medicamento termina com o nome da substância específica (p. ex., álcool) supostamente causadora dos sintomas neurocognitivos. O código diagnóstico é escolhido na tabela incluída no conjunto de critérios, com base na classe da substância. No caso de substâncias que não se enquadram em nenhuma classe, o código para “outra substância” deve ser usado; e nos casos em que se acredita que uma substância seja um fator etiológico, mas sua classe seja desconhecida, deve ser usada a categoria “substância desconhecida”. O nome do transtorno (i.e., transtorno neurocognitivo maior induzido por [substância específica] ou transtorno neurocognitivo leve induzido por [substância específica]) é seguido do


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Induzido... 629 tipo, no caso do álcool (i.e., tipo não amnéstico confabulatório, tipo amnéstico confabulatório), seguido da especificação da duração (i.e., persistente). Diferentemente dos procedimentos para registro da CID-10-MC, que combinam o transtorno induzido por substância/medicamento com o transtorno por uso de substância em um só código, para a CID-9-MC é atribuído um código separado para o transtorno por uso de substância. Por exemplo, no caso de sintomas amnésticos/ confabulatórios persistentes em homem com transtorno grave por uso de álcool, o diagnóstico é 291.1 transtorno neurocognitivo maior induzido por álcool, tipo amnéstico/confabulatório e persistente. Também é feito um diagnóstico adicional de 303.90 transtorno grave por uso de álcool. Se ocorrer transtorno neurocognitivo induzido por substância/medicamento, sem transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., após uso esporádico e pesado de inalantes), não é registrado transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., 292.82 transtorno neurocognitivo leve induzido por inalante). CID-10-MC. O nome do transtorno neurocognitivo induzido por substância/medicamento termina com a substância específica (p. ex., álcool) supostamente causadora dos sintomas cognitivos. O código diagnóstico é escolhido na tabela incluída no conjunto de critérios, com base na classe da substância e na presença ou ausência de um transtorno comórbido por uso de substância. No caso de substâncias que não se enquadram em nenhuma classe, o código para “outra substância” deve ser usado; e nos casos em que se acredita que uma substância seja um fator etiológico, mas sua classe seja desconhecida, deve ser usada a categoria “substância desconhecida”. Ao registrar o nome do transtorno, primeiro é listado o transtorno comórbido por uso de substância, seguido da palavra “com”, seguida do nome do transtorno (i.e., transtorno neurocognitivo maior induzido por [substância específica], ou transtorno neurocognitivo leve induzido por [substância específica]), seguido do tipo, no caso do álcool (i.e., tipo não amnéstico/confabulatório, tipo amnéstico/confabulatório), seguido da especificação da duração (i.e., persistente). Por exemplo, no caso de sintomas amnésticos/confabulatórios persistentes em homem com transtorno grave por uso de álcool, o diagnóstico é F10.26 transtorno grave por uso de álcool, com transtorno neurocognitivo maior induzido por álcool, tipo amnéstico/confabulatório, persistente. Não é feito um diagnóstico separado de transtorno grave por uso de álcool. Se ocorre o transtorno neurocognitivo induzido por substância sem um transtorno comórbido por uso de substância (p. ex., após uso esporádico e pesado de inalantes), não é anotado transtorno adicional por uso de substância (p. ex., F18.988 transtorno neurocognitivo leve induzido por inalante).

Características Diagnósticas Transtorno neurocognitivo maior ou leve induzido por substância/medicamento é caracterizado por prejuízos neurocognitivos que persistem além da duração habitual de uma intoxicação e de abstinência aguda (Critério B). Inicialmente, essas manifestações podem refletir uma recuperação lenta das funções cerebrais de um período de uso prolongado de substância, podendo ser observadas melhoras nos indicadores neurocognitivos e de imagens cerebrais durante vários meses. Se o transtorno continuar por período prolongado, deve ser especificado “persistente”. A substância em questão e seu uso devem ser sabidamente capazes de causar os prejuízos observados (Critério C). Enquanto pode ocorrer decréscimo não específico em uma gama de habilidades cognitivas com quase todas as substância de abuso e uma variedade de medicamentos, em determinadas classes de substâncias ocorrem alguns padrões com maior frequência. Por exemplo, TNC devido a substâncias sedativas, hipnóticas ou ansiolíticas (p. ex., benzodiazepínicos, barbitúricos) pode apresentar mais perturbações na memória do que em outras funções cognitivas; TNC induzido por álcool costuma se manifestar com uma combinação de prejuízos na função executiva e no domínio da memória e da aprendizagem. O curso temporal do TNC induzido por substância deve ser consistente com o de uso da referida substância (Critério D). No TNC amnéstico confabulatório, induzido por álcool (de Korsakoff), as características incluem amnésia proeminente (dificuldade grave de aprendizagem de novas informações, com esquecimento rápido) e tendência a confabulação. Essas manifestações podem ser concomitantes com sinais de encefalopatia por tiamina (encefalopatia de Wernicke) com características associadas, tais como nistagmo e ataxia. A oftalmoplegia da encefalopatia de Wernicke costuma caracterizar-se por paralisia lateral do olhar.


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Transtornos Neurocognitivos

Além dos sintomas neurocognitivos mais comuns, e independentemente deles, relacionados a uso da substância (p. ex., dificuldades para aprender e memorizar, função executiva), o uso de metanfetamina pode ser também associado a evidências de lesão vascular (p. ex., fraqueza focal, falta de coordenação unilateral, reflexos assimétricos). O perfil neurocognitivo mais comum aproxima-se daquele encontrado no TNC vascular.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O TNC de duração intermediária induzido por substância com efeitos depressivos do sistema nervoso central pode se manifestar com mais sintomas de aumento da irritabilidade, ansiedade, perturbação do sono e disforia. O TNC de duração intermediária induzido por fármacos estimulantes pode se manifestar com depressão de rebote, hipersonia e apatia. Nas formas graves de TNC maior induzido por substância/medicamento (p. ex., associado a uso prolongado de álcool), pode haver características neuromotoras destacadas, como falta de coordenação, ataxia e desaceleração motora. Pode, ainda, ocorrer perda de controle emocional, inclusive afeto agressivo ou inapropriado, ou apatia.

Prevalência A prevalência dessas condições não é conhecida. Existem dados relativos a abuso de substância, sendo que TNCs maiores ou leves induzidos por substância/medicamento são mais prováveis em indivíduos mais velhos, com mais tempo de uso e outros fatores de risco, como déficits nutricionais. No abuso de álcool, a taxa de TNC leve, com duração intermediária, é de cerca de 30 a 40% nos dois primeiros meses de abstinência. O TNC leve pode persistir, em especial naqueles indivíduos que não atingem abstinência estável depois dos 50 anos de idade. O TNC maior é raro e pode ser consequência de déficits nutricionais concomitantes, como no TNC amnéstico confabulatório, induzido por álcool. O TNC leve induzido por substância/medicamento, com duração intermediária, pode ocorrer em um terço ou mais dos indivíduos que abandonam a cocaína, a metanfetamina, os opioides, a fenciclidina, os sedativos, os hipnóticos ou os ansiolíticos, existindo algumas evidências de que essas substâncias podem ainda estar associadas a TNC leve persistente. O TNC maior associado a essas substâncias é raro, se é que ocorre. No caso da metanfetamina, pode também ocorrer doença cerebrovascular, resultando em lesão cerebral difusa ou focal, que pode alcançar níveis neurocognitivos leves ou maiores. Exposição a solventes está associada a TNC maior ou leve, de duração intermediária e persistente. A presença de TNC induzido por Cannabis e vários alucinógenos é controversa. Com a Cannabis, a intoxicação vem com várias perturbações neurocognitivas, mas elas tendem a desaparecer com a abstinência.

Desenvolvimento e Curso Os transtornos por uso de substância tendem a começar durante a adolescência, com pico entre os 20 e os 30 anos. Embora uma história mais longa de transtorno grave por uso de substância esteja associada a maior probabilidade de TNC, as relações não são diretas, com recuperação substancial e até completa das funções neurocognitivas sendo comum entre pessoas que conseguem uma abstinência estável antes dos 50 anos de idade. O TNC maior ou leve induzido por substância/ medicamento tem maior probabilidade de ser persistente em indivíduos que continuam a abusar de substâncias após os 50 anos, possivelmente devido a uma combinação de plasticidade neuronal diminuída e início de outras mudanças cerebrais relativas ao envelhecimento. Um início precoce de abuso, especialmente de álcool, pode levar a defeitos no desenvolvimento neuronal posterior (p. ex., estágios posteriores de maturação dos circuitos frontais), que podem causar efeitos na cognição social e em outras capacidades neurocognitivas. No TNC induzido por álcool, pode ocorrer um efeito aditivo do envelhecimento e lesão cerebral induzida por álcool.


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Fatores de Risco e Prognóstico Os fatores de risco de TNCs induzidos por substância/medicamento incluem idade, uso prolongado e persistente além dos 50 anos. Além disso, no caso do transtorno induzido por álcool, deficiências nutricionais prolongadas, doença hepática, fatores de risco vascular e doença cardiovascular e cerebrovascular podem contribuir para o risco.

Marcadores Diagnósticos Imagem por ressonância magnética de indivíduos com abuso crônico do álcool costuma revelar afinamento cortical, perda de substância branca e aumento de sulcos e ventrículos. Ao mesmo tempo que anormalidades em imagens neurológicas são mais comuns naqueles com TNCs, é possível observar esses transtornos sem essas anormalidades, e vice-versa. Técnicas especializadas (p. ex., imagem com tensor de difusão) podem revelar dano a tratos específicos de substância branca. A espectroscopia por ressonância magnética pode revelar redução no N-acetilaspartato e aumento nos marcadores de inflamação (p. ex., mioinositol) ou lesão na substância branca (p. ex., colina). Muitas dessas mudanças nas imagens do cérebro e manifestações neurocognitivas têm reversão após abstinência exitosa. Em pessoas com transtorno por uso de metanfetamina, a ressonância magnética pode também revelar hiperintensidades sugestivas de micro-hemorragias ou áreas maiores infartadas.

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Induzido por Substância/Medicamento As consequências funcionais de TNC leve induzido por substância/medicamento ficam, por vezes, aumentadas devido à eficiência cognitiva reduzida e à dificuldade de concentrar-se além daquela que se dá em muitos outros TNCs. Além disso, nos níveis maior e leve, esses transtornos induzidos por substância/medicamento podem estar associados a síndromes motoras, que aumentam o nível de prejuízo funcional.

Diagnóstico Diferencial Indivíduos com transtornos por uso de substância, intoxicação por substância e abstinência de substância correm risco maior de outras condições que podem, independentemente ou por efeito cumulativo, resultar em perturbação neurocognitiva. Estas incluem história de lesão cerebral traumática e infecções capazes de acompanhar transtorno por uso de substância (p. ex., HIV, hepatite C, sífilis). Assim, a presença de TNC maior ou leve induzido por substância/medicamento deve ser diferenciada dos TNCs que surgem no contexto de uso de substância, intoxicação e abstinência, bem como das condições que os acompanham (p. ex., lesão cerebral traumática).

Comorbidade Transtornos por uso de substância, intoxicação por substância e abstinência de substância são altamente comórbidos com outros transtornos mentais. Transtorno comórbido de estresse pós-traumático, transtornos psicóticos, transtornos depressivo e bipolar e transtornos do neurodesenvolvimento podem contribuir para prejuízo neurocognitivo em usuários de substância. Lesão cerebral traumática ocorre com mais frequência com uso de substância, complicando as tentativas de determinar a etiologia de um TNC nesses casos. Transtorno grave por uso prolongado de álcool pode estar associado a alguma doença de um sistema orgânico principal, inclusive doença cerebrovascular e cirrose. O TNC induzido por anfetamina pode estar acompanhado de TNC vascular maior ou leve, também secundário a uso de anfetamina.


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Transtornos Neurocognitivos

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Infecção por HIV Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios diagnósticos para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há infecção documentada pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). C. O transtorno neurocognitivo não é mais bem explicado por condições não HIV, incluindo doenças cerebrais secundárias, como leucoencefalopatia multifocal progressiva ou meningite criptocócica. D. O transtorno neurocognitivo não é passível de atribuição a outra condição médica e não é mais bem explicado por um transtorno mental. Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior devido a infecção por HIV, com perturbação comportamental, codificar primeiro 042 (B20) infecção por HIV, seguida de 294.11 (F02.81) transtorno neurocognitivo maior devido a infecção por HIV, com perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo maior devido a infecção por HIV, sem perturbação comportamental, codificar primeiro 042 (B20) infecção por HIV, seguida de 294.10 (F02.80) transtorno neurocognitivo maior devido a infecção por HIV, sem perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo leve devido a infecção por HIV, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional de infecção por HIV. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas A doença do HIV é causada por infecção pelo vírus da imunodeficiência humana tipo 1 (HIV-1), adquirido por meio de exposição a fluidos corporais de uma pessoa infectada, por meio de uso de droga injetada, contato sexual sem proteção ou exposição acidental ou iatrogênica (p. ex., transfusão de sangue contaminado, lesão por punção com agulha em profissionais médicos). O HIV infecta vários tipos de células, mais especificamente, células imunológicas. Com o tempo, a infecção pode causar depleção grave de linfócitos de T-helper (CD4), resultando em imunossupressão grave, frequentemente levando a infecções oportunistas e neoplasias. Essa forma avançada de HIV é denominada síndrome da imunodeficiência adquirida (aids). O diagnóstico de HIV é confirmado por métodos laboratoriais estabelecidos, como o ensaio imunoadsorvente ligado à enzima para anticorpo HIV, com confirmação pelo Western blot e/ou por ensaios de reação em cadeia da polimerase para HIV. Alguns indivíduos com infecção pelo HIV desenvolvem um TNC que costuma evidenciar um “padrão subcortical” com função executiva destacadamente prejudicada, desaceleração da velocidade de processamento, tarefas de atenção mais exigentes e dificuldade de aprender novas informações, mas com menos problemas para recordar informações aprendidas. No TNC maior, a desaceleração pode ser proeminente. Dificuldades linguísticas, como a afasia, são incomuns, embora reduções na fluência possam ser observadas. Processos patogênicos do HIV podem afetar qualquer parte do cérebro; assim, outros padrões são possíveis.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O TNC maior ou leve devido a infecção por HIV costuma ser mais prevalente em indivíduos com episódios anteriores de imunossupressão grave, altas cargas virais no líquido cerebrospinal e indicadores de doença do HIV avançada, como anemia e hipoalbuminemia. Indivíduos com TNC avançado podem ter características neuromotoras destacadas, como falta grave de coordenação, ataxia e desaceleração motora. Pode, ainda, haver perda de controle emocional, incluindo afeto agressivo ou inadequado ou apatia.


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Prevalência Dependendo do estágio da doença por HIV, por volta de um terço a mais da metade dos indivíduos por ele afetados apresentam, pelo menos, perturbação neurocognitiva leve, embora algumas dessas perturbações possam não atender à totalidade de critérios para um TNC leve. Estima-se que cerca de 25% dos indivíduos com HIV terão sinais e sintomas que atendem aos critérios para TNC leve, e menos de 5% atenderão os critérios para TNC maior.

Desenvolvimento e Curso Um TNC devido a infecção por HIV pode ser resolvido, melhorado, ter piora lenta ou um curso oscilante. A progressão rápida para prejuízo neurocognitivo profundo é rara no contexto do tratamento antiviral combinado disponível em nossos dias; assim, uma mudança repentina no estado mental de um indivíduo com HIV pode levar a uma avaliação de outras causas médicas para a mudança cognitiva, inclusive infecções secundárias. Uma vez que infecções por HIV acometem principalmente as regiões subcorticais ao longo do curso da doença, incluindo a substância branca profunda, a progressão do transtorno segue um padrão “subcortical”. Considerando que o HIV pode afetar uma variedade de regiões cerebrais, e a doença é capaz de percorrer muitas trajetórias diferentes, dependendo das comorbidades associadas e das consequências do HIV, o curso geral de um TNC por infecção por HIV apresenta heterogeneidade considerável. Um perfil neurocognitivo subcortical pode interagir com o envelhecimento durante o curso da vida, quando lentificação psicomotora e prejuízos motores, como marcha mais lenta, podem surgir em consequência de outras condições ligadas ao envelhecimento, de modo que a progressão geral pode parecer mais acentuada no período posterior de vida. Em países desenvolvidos, a doença do HIV é, basicamente, uma condição de adultos, com aquisição via comportamentos de risco (p. ex., sexo sem proteção, uso de drogas injetáveis). Em países em desenvolvimento, especialmente na África subsaariana, onde testes de HIV e tratamentos antirretrovirais para gestantes não existem com facilidade, é comum a transmissão perinatal. O TNC nesses bebês e crianças pode se apresentar, essencialmente, como um atraso no neurodesenvolvimento. Indivíduos tratados para o HIV conseguem sobreviver até idades mais avançadas, portanto, os efeitos aditivos e interativos neurocognitivos do HIV e do envelhecimento, incluindo outros TNCs (p. ex., devido à doença de Alzheimer, devido à doença de Parkinson), são uma possibilidade.

Fatores de Risco e Prognóstico Fatores de risco e prognóstico de infecção por HIV. Fatores de risco de infecção por HIV incluem uso de drogas injetáveis, sexo sem proteção e suprimento de sangue sem proteção, além de outros fatores iatrogênicos. Fatores de risco e prognóstico de transtorno neurocognitivo maior ou leve devido a infecção por HIV. Paradoxalmente, TNC devido a infecção por HIV não apresentou declínio significativo com a chegada da terapia antirretroviral combinada, embora as formas mais graves (consistentes com o diagnóstico de TNC maior) tenham diminuído bastante. Os fatores contribuintes podem incluir controle inadequado do HIV no sistema nervoso central (SNC), evolução de cepas virais resistentes a fármacos, efeitos de inflamação sistêmica e cerebral crônica de longo tempo e efeitos de fatores comórbidos, tais como envelhecimento, abuso de drogas, história anterior de trauma ao SNC e infecções concomitantes, como a do vírus da hepatite C. Exposição crônica a fármacos antirretrovirais também envolve a possibilidade de neurotoxicidade, embora isso ainda não tenha sido definitivamente estabelecido.

Marcadores Diagnósticos Exames séricos do HIV são exigência para o diagnóstico. Além disso, a caracterização do HIV do líquido cerebrospinal pode ajudar se revelar uma carga viral desproporcionalmente elevada no


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Transtornos Neurocognitivos

líquido cerebrospinal em relação ao plasma. Imagem neurológica (i.e., por ressonância magnética [IRM]) pode revelar redução do volume cerebral total, afinamento cortical, redução no volume de substância branca e áreas manchadas de substância branca anormal (hiperintensidades), e IRM ou perfuração lombar podem ajudar a excluir uma condição médica específica, como infecção por criptococo ou encefalite por herpes, que pode contribuir para mudanças no sistema nervoso central no contexto da aids. Técnicas especializadas, como imagem com tensor de difusão, podem revelar dano a tratos de substância branca específica.

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Infecção por HIV As consequências funcionais de TNC maior ou leve devido a infecção por HIV variam entre os indivíduos. Assim, capacidades executivas prejudicadas e processamento de informações desacelerado podem interferir de forma substancial nas decisões complexas sobre o controle da doença, necessárias à adesão ao regime terapêutico antirretroviral combinado. A probabilidade de doença comórbida pode criar mais desafios funcionais.

Diagnóstico Diferencial Na presença de comorbidades, como outras infecções (p. ex., vírus da hepatite C, sífilis), abuso de drogas (p. ex., abuso de metanfetamina), lesão anterior na cabeça ou condições neurodesenvolvimentais, pode ser diagnosticado TNC maior ou leve devido a infecção por HIV, desde que existam evidências de que essa infecção tenha piorado quaisquer TNCs devidos a essas condições preexistentes ou comórbidas. Entre idosos, o aparecimento de declínio neurocognitivo relacionado a doença cerebrovascular ou neurodegeneração (p. ex., TNC maior ou leve devido à doença de Alzheimer) pode ter de ser diferenciado. Geralmente, estado neurocognitivo estável, oscilante (sem progressão) ou em melhora favoreceria uma etiologia do HIV, ao passo que deterioração consistente ou gradual sugeriria etiologia neurodegenerativa ou vascular. Uma vez que a imunodeficiência mais grave pode resultar em infecções oportunistas do cérebro (p. ex., toxoplasmose, criptococose) e neoplasia (p. ex., linfoma do SNC), o surgimento repentino de um TNC ou sua piora repentina exige uma investigação ativa de etiologias não HIV.

Comorbidade Doença por HIV é acompanhada por neuroinflamação ou inflamação sistêmica crônica, que pode estar associada a doença cerebrovascular e síndrome metabólica. Essas complicações podem ser parte da patogênese de TNC maior ou leve devido a infecção por HIV. O HIV frequentemente é comórbido com condições como transtorno relacionado ao uso de substâncias, quando a substância é injetável, e outras doenças sexualmente transmissíveis.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença do Príon Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há surgimento insidioso, sendo comum a progressão rápida de prejuízos. C. Há aspectos motores de doença do príon, como mioclonia ou ataxia, ou evidência de biomarcadores. D. O transtorno neurocognitivo não é atribuível a outra condição médica, não sendo mais bem explicado por outro transtorno mental.


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença do Príon 635 Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior devido à doença do príon, com perturbação comportamental, codificar primeiro 046.79 (A81.9) doença do príon, seguida de 294.11 (F02.81) transtorno neurocognitivo maior devido à doença do príon, com perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo maior devido à doença do príon, sem perturbação comportamental, codificar primeiro 046.79 (A81.9) doença do príon, seguida de 294.10 (F02.80) transtorno neurocognitivo maior devido à doença do príon, sem perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo leve devido à doença do príon, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para a doença do príon. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas A classificação de transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença do príon inclui TNCs devidos a um grupo de encefalopatias espongiformes subagudas (incluindo doença de Creutzfeldt-Jakob, a variante da doença de Creutzfeldt-Jakob, kuru, síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker e insônia fatal), causadas por agentes transmissíveis conhecidos como príons. O tipo mais comum é a doença esporádica de Creutzfeldt-Jakob, normalmente chamada de doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ). A variante da DCJ é muito mais rara, associada à transmissão da encefalopatia espongiforme bovina, também conhecida como “doença da vaca louca”. Normalmente, pessoas com DCJ apresentam déficits neurocognitivos e movimentos anormais, como mioclonia, coreia ou distonia; reflexo do sobressalto (startle reflex) também é comum. A história costuma revelar progressão rápida para TNC maior em pelo menos seis meses; assim, o transtorno é normalmente encontrado apenas no nível maior. Porém, muitos indivíduos com a variante DCJ podem apresentar maior preponderância de sintomas psiquiátricos, caracterizados por humor baixo, retraimento e ansiedade. A doença do príon não costuma ser diagnosticada sem, no mínimo, um biomarcador característico: lesões reconhecidas em imagem por ressonância magnética com DWI (diffusion-weighted imaging), ou FLAIR (fluid-attenuated inversion recovery), tau ou proteína 14-3-3 no líquido cerebrospinal, ondas trifásicas características no encefalograma ou, nas formas familiares raras, história familiar ou teste genético.

Prevalência A incidência anual de DCJ esporádica é de cerca de 1 ou 2 casos por milhão de pessoas. A prevalência é desconhecida, mas muito reduzida, considerada a curta sobrevida.

Desenvolvimento e Curso A doença do príon pode se desenvolver em qualquer idade nos adultos – a idade pico para DCJ esporádica fica por volta de 67 anos – embora tenha ocorrência relatada em adolescentes ou em pessoas no período final de vida. Sintomas prodrômicos da doença do príon podem incluir fadiga, ansiedade, problemas com apetite ou sono ou dificuldades de concentração. Após várias semanas, esses sintomas podem ser seguidos de falta de coordenação, visão alterada ou marcha ou outros movimentos anormais, que podem ser mioclônicos, coreoatetoides ou balísticos, além de demência de rápida progressão. A doença normalmente progride com muita rapidez até o nível maior de prejuízo, ao longo de vários meses. Mais raramente, pode evoluir durante dois anos e parecer similar, no curso, a outros TNCs.

Fatores de Risco e Prognóstico Ambientais. Foi demonstrada transmissão cruzada entre espécies de infecções pelo príon, com agentes intimamente relacionados à forma humana (p. ex., o surto de encefalopatia espongiforme bovina induzindo a variante da DCJ no Reino Unido durante a metade da década de 1990). Transmissão por transplante de córnea e por injeção do fator do crescimento humano está documentada, com casos relatados de transmissão a profissionais da saúde.


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Transtornos Neurocognitivos

Genéticos e fisiológicos. Existe um componente genético em até 15% dos casos, associado a uma mutação autossômica dominante.

Marcadores Diagnósticos A doença do príon pode ser definitivamente confirmada somente por biópsia ou necropsia. Embora não existam achados distintivos em análise do líquido cerebrospinal nas doenças do príon, biomarcadores confiáveis estão sendo desenvolvidos e incluem a proteína 14-3-3 (especialmente para DCJ esporádica) e a proteína tau. Imagem do cérebro por ressonância magnética está, atualmente, sendo considerado o teste diagnóstico mais sensível, quando realizada com DWI, com o achado mais comum sendo hiperintensidades de substância cinzenta focal em regiões subcorticais e corticais. Em certos indivíduos, o eletrencefalograma revela descargas rápidas periódicas, normalmente trifásicas e sincrônicas, a uma velocidade de 0,5 a 2 Hz, em algum momento durante o curso da doença.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos neurocognitivos maiores. Transtorno neurocognitivo maior devido à doença do príon pode parecer similar, no curso, a outros TNCs; as doenças do príon, porém, costumam ser diferenciadas pela progressão rápida e por sintomas cerebelares e motores destacados.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Parkinson Critérios Diagnósticos A. B. C. D.

São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. A perturbação ocorre no cenário da doença de Parkinson estabelecida. Há surgimento insidioso e progressão gradual do prejuízo. O transtorno neurocognitivo não é atribuível a outra condição médica, não sendo mais bem explicado por outro transtorno mental. Transtorno neurocognitivo maior ou leve provavelmente devido à doença de Parkinson deve ser diagnosticado se tanto 1 quanto 2 forem atendidos. Transtorno neurocognitivo maior ou leve possivelmente devido à doença de Parkinson deve ser diagnosticado se 1 ou 2 é encontrado: 1. Não há evidências de etiologia mista (i.e., ausência de outra doença neurodegenerativa ou cerebrovascular ou de outra doença ou condição neurológica, mental ou sistêmica possivelmente contribuindo para o declínio cognitivo). 2. A doença de Parkinson claramente antecede o aparecimento do transtorno neurocognitivo. Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior provavelmente devido à doença de Parkinson, com perturbação comportamental, codificar primeiro 332.0 (G20) doença de Parkinson, seguida de 294.11 (F02.81) transtorno neurocognitivo maior provavelmente devido à doença de Parkinson, com perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo maior provavelmente devido à doença de Parkinson, sem perturbação comportamental, codificar primeiro 332.0 (G20) doença de Parkinson, seguida de 294.10 (F02.80) transtorno neurocognitivo maior provavelmente devido à doença de Parkinson, sem perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo maior possivelmente devido à doença de Parkinson, codificar 331.9 (G31.9) transtorno neurocognitivo maior possivelmente devido à doença de Parkinson. (Nota: Não usar o código adicional para doença de Parkinson. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora ainda deva ser indicada por escrito.) Para transtorno neurocognitivo leve devido à doença de Parkinson, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para doença de Parkinson. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)


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Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Parkinson é um declínio cognitivo que segue o aparecimento da doença de Parkinson. A perturbação deve ocorrer no contexto da doença de Parkinson estabelecida (Critério B), com os déficits tendo desenvolvimento gradual (Critério C). O transtorno é entendido como provavelmente devido à doença de Parkinson quando não há evidências de outro transtorno que pode estar contribuindo para o TNC e quando a doença de Parkinson claramente precede o aparecimento do TNC. O TNC é considerado possivelmente devido à doença de Parkinson tanto se não há evidências de outro transtorno que possa estar contribuindo para o declínio cognitivo como quando a doença de Parkinson antecede o surgimento do TNC, mas não ambas as situações.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Características frequentemente presentes incluem apatia, humor deprimido, humor ansioso, alucinações, delírios, mudanças da personalidade, transtorno comportamental do sono com movimento rápido dos olhos e sonolência excessiva durante o dia.

Prevalência A prevalência da doença de Parkinson nos Estados Unidos aumenta consistentemente com o envelhecimento, de cerca de 0,5% entre 65 e 69 anos até 3% aos 85 anos ou mais. A doença de Parkinson é mais comum em indivíduos do sexo masculino do que nos do feminino. Entre as pessoas que apresentam a doença, até 75% desenvolvem um TNC maior em algum momento durante o curso. A prevalência de TNC leve na doença de Parkinson tem sido estimada em 27%.

Desenvolvimento e Curso O aparecimento da doença de Parkinson costuma ocorrer entre a sexta e a nona década de vida, com expressão maior no começo da década dos 60 anos. O TNC leve costuma desenvolver-se relativamente cedo no curso da doença de Parkinson, ao passo que prejuízos maiores normalmente ocorrem apenas mais tarde.

Fatores de Risco e Prognóstico Ambientais. Os fatores de risco para a doença de Parkinson incluem exposição a herbicidas e pesticidas. Genéticos e fisiológicos. Fatores de risco potenciais para TNC entre pessoas com a doença de Parkinson incluem idade mais velha no surgimento e duração aumentada da doença.

Marcadores Diagnósticos Testes neuropsicológicos, com foco naqueles que não dependem da função motora, são fundamentais na detecção dos déficits cognitivos centrais, em especial na fase leve do TNC. Neuroimagem estrutural e do transportador de dopamina, como DaT scans, pode diferenciar as demências relacionadas aos corpos de Lewy (Parkinson e demência com corpos de Lewy) daquelas não relacionadas (p. ex., doença de Alzheimer), podendo, por vezes, ser útil na avaliação de TNC maior ou leve devido à doença de Parkinson.

Diagnóstico Diferencial Transtorno neurocognitivo maior ou leve com corpos de Lewy. Essa distinção baseia-se muito no momento certo e na sequência dos sintomas cognitivos e motores. Para o TNC ser atribuído à


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doença de Parkinson, os sintomas motores e outros sintomas dessa doença devem estar presentes bem antes (por convenção, no mínimo um ano antes) de o declínio cognitivo ter alcançado o nível de TNC maior, ao passo que no TNC maior ou leve com corpos de Lewy os sintomas cognitivos começam logo antes ou são concomitantes aos sintomas motores. Para TNC leve, o momento certo é de difícil estabelecimento, porque o próprio diagnóstico é menos claro e os dois transtornos existem em um continuum. A não ser que a doença de Parkinson tenha sido estabelecida algum tempo antes do surgimento do declínio cognitivo ou as características típicas do TNC maior ou leve com corpos de Lewy estejam presentes, é preferível diagnosticar TNC leve não especificado. Transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Alzheimer. As características motoras são essenciais para a distinção entre TNC maior ou leve devido à doença de Parkinson e TNC maior ou leve devido à doença de Alzheimer. Os dois transtornos podem, porém, ser concomitantes. Transtorno neurocognitivo vascular maior ou leve. O TNC vascular maior ou leve pode se apresentar com aspectos parkinsonianos, como lentificação psicomotora, que pode ocorrer como consequência de doença em pequeno vaso subcortical. As características parkinsonianas, no entanto, não costumam ser suficientes para um diagnóstico de doença de Parkinson, e o curso do TNC normalmente tem clara associação com mudanças cerebrovasculares. Transtorno neurocognitivo devido a outra condição médica (p. ex., distúrbios neurodegenerativos). Quando considerado um diagnóstico de transtorno neurocognitivo maior ou leve devido à doença de Parkinson, deve também ser feita uma distinção de outros distúrbios cerebrais, como paralisia supranuclear progressiva, degeneração corticobasal, atrofia sistêmica múltipla, tumores e hidrocefalia. Parkinsonismo induzido por neurolépticos. Pode ocorrer parkinsonismo induzido por neurolépticos em indivíduos com outros TNCs, particularmente quando fármacos bloqueadores da dopamina são prescritos para manifestações comportamentais desses transtornos. Outras condições médicas. Delirium e TNCs devidos a efeitos secundários de fármacos bloqueadores da dopamina e outras condições médicas (p. ex., sedação ou cognição prejudicada, hipotireoidismo grave, deficiência de vitamina B12) devem ser também descartados.

Comorbidade A doença de Parkinson pode coexistir com doença de Alzheimer e doença cerebrovascular, especialmente em idosos. O conjunto de características patológicas múltiplas pode diminuir as capacidades funcionais de pessoas com Parkinson. Sintomas motores e comorbidade frequente com depressão ou apatia podem piorar o prejuízo funcional.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Huntington Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há surgimento insidioso e progressão gradual. C. Há a doença de Huntington clinicamente estabelecida ou o risco dessa doença com base na história familiar ou em teste genético. D. O transtorno neurocognitivo não pode ser atribuído a outra condição médica e não é mais bem explicado por outro transtorno mental. Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Huntington, com perturbação comportamental, codificar primeiro 333.4 (G10) doença de Huntington, seguida de 294.11 (F02.81) transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Huntington, com perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Huntington, sem perturbação com-


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Huntington 639 portamental, codificar primeiro 333.4 (G10) doença de Huntington, seguida de 294.10 (F02.80) transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Huntington, sem perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo leve devido à doença de Huntington, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para doença de Huntington. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas Prejuízo cognitivo progressivo é uma característica central da doença de Huntington, com mudanças precoces na função executiva (i.e., velocidade de processamento, organização e planejamento) em vez de na memória e aprendizagem. Mudanças cognitivas e comportamentais associadas costumam anteceder o aparecimento das anormalidades motoras típicas de bradicinesia (i.e., lentificação dos movimentos voluntários) e coreia (i.e., movimentos involuntários desorganizados). Um diagnóstico definitivo de doença de Huntington é feito na presença de anormalidades motoras extrapiramidais inequívocas em um indivíduo com história familiar de doença de Huntington ou testagem molecular que demonstre expansão de repetição do trinucleotídeo CAG, no gene HTT, localizado no cromossoma 4.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Depressão, irritabilidade, ansiedade, sintomas obsessivo-compulsivos e apatia estão, com frequência, associados à doença de Huntington, sendo que essa associação é mais rara em se tratando de psicose; tais sintomas costumam anteceder o aparecimento dos sintomas motores.

Prevalência Déficits neurocognitivos são uma consequência eventual da doença de Huntington; a prevalência mundial é calculada em 2,7 a cada 100.000. Na América do Norte, na Europa e na Austrália, é de 5,7 a cada 100.000, com uma prevalência muito menor, de 0,40 a cada 100.000, na Ásia.

Desenvolvimento e Curso A média de idade ao ser diagnosticada a doença de Huntington situa-se por volta dos 40 anos, ainda que haja grandes variações. A idade no aparecimento tem correlação inversa com o comprimento de expansão CAG. Doença de Huntington juvenil (início antes dos 20 anos) pode se apresentar mais comumente com bradicinesia, distonia e rigidez do que com movimentos coreicos, característicos do transtorno de surgimento na vida adulta. A doença é gradativamente progressiva, com sobrevida média de cerca de 15 anos após o diagnóstico de sintomas motores. A expressão fenotípica da doença de Huntington varia devido à presença de sintomas motores, cognitivos e psiquiátricos. As anormalidades psiquiátricas e cognitivas podem anteceder a anormalidade motora em, no mínimo, 15 anos. Os primeiros sintomas que demandam cuidados costumam incluir irritabilidade, ansiedade ou humor deprimido. Outras perturbações comportamentais podem incluir apatia pronunciada, desinibição, impulsividade e percepção prejudicada, com a apatia comumente progredindo com o tempo. Sintomas precoces de movimento podem envolver o aparecimento de inquietação das extremidades, além de apraxia leve (i.e., dificuldade com movimentos com um propósito), especialmente com tarefas de motricidade fina. Com a progressão do transtorno, outros problemas motores incluem marcha prejudicada (ataxia) e instabilidade postural. O prejuízo motor acaba por afetar a produção da fala (disartria), a tal ponto que ela fica de difícil compreensão, o que pode resultar em sofrimento significativo, em consequência da barreira na comunicação no contexto de uma cognição comparativamente intacta. A doença motora avançada afeta muito a marcha, com ataxia progressiva. Por fim, os indivíduos não conseguem deambular. A doença motora no estágio terminal prejudica o controle motor para comer e deglutir, em geral um elemento que pode colaborar de forma importante para a morte do indivíduo, decorrente de pneumonia por aspiração.


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Transtornos Neurocognitivos

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. A base genética da doença de Huntington é uma expansão autossômica dominante com penetrância completa do trinucleotídeo CAG, comumente chamada de repetições CAG no gene da huntingtina. Uma repetição de 36 ou mais CAGs está, invariavelmente, associada à doença de Huntington, com repetições mais longas associadas a idades de início dos sintomas mais precoces.*

Marcadores Diagnósticos A testagem genética é o exame laboratorial primário para a determinação da doença de Huntington, que é um transtorno autossômico dominante com penetrância completa. É observado que o trinucleotídeo CAG tem uma expansão da repetição no gene que codifica a proteína huntingtina no cromossoma 4. Não é feito um diagnóstico da doença de Huntington na presença apenas da expansão do gene; o diagnóstico é feito somente após a manifestação dos sintomas. Alguns indivíduos com história familiar positiva necessitam de testes genéticos em um estágio pré-sintomático. As características associadas podem, ainda, incluir mudanças em neuroimagens; perda volumétrica nos gânglios basais, especialmente no núcleo caudal e no putame, é de ocorrência bastante conhecida, com progressão durante o curso da doença. Outras mudanças estruturais e funcionais foram observadas em imagens do cérebro, embora permaneçam medidas de pesquisas.

Consequências Funcionais do Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido à Doença de Huntington Na fase prodrômica da doença, e logo após o diagnóstico, o declínio profissional é mais comum, com a maior parte dos indivíduos relatando certa perda da capacidade de envolvimento no trabalho. Os aspectos emocional, comportamental e cognitivo da doença de Huntington, como desinibição e mudanças de personalidade, estão altamente associados ao declínio funcional. Déficits cognitivos, que contribuem eminentemente para declínio funcional, podem incluir velocidade de processamento, iniciação e atenção em vez de prejuízo da memória. Considerando que o surgimento da doença de Huntington ocorre nos anos produtivos da vida, pode haver um efeito bastante disruptivo no desempenho profissional, bem como na vida social e familiar. A progressão da doença, a incapacidade em decorrência de problemas como marcha prejudicada, a disartria e os comportamentos impulsivos ou irritáveis podem aumentar substancialmente o nível do prejuízo e das necessidades diárias de cuidado para além das demandas atribuíveis ao declínio cognitivo. Movimentos coreicos graves podem interferir sobremaneira no autocuidado, como tomar banho, vestir-se e ir ao banheiro.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos mentais. Os primeiros sintomas da doença de Huntington podem incluir humor instável, irritabilidade ou comportamentos compulsivos, que podem sugerir outro transtorno mental. Exames genéticos ou o aparecimento de sintomas motores, no entanto, diferenciarão a presença da doença de Huntington. Outros transtornos neurocognitivos. Os sintomas iniciais da doença de Huntington, especialmente sintomas de disfunção executiva e velocidade psicomotora prejudicada, podem assemelhar-se a outros transtornos neurocognitivos, como TNC vascular maior ou leve. Outros transtornos do movimento. A doença de Huntington deve, ainda, ser diferenciada de outros transtornos ou condições associadas a coreia, como a doença de Wilson, a discinesia tardia * N. de T.: Alelos entre 36 e 39 repetições CAGs no gene HTT apresentam penetrância incompleta, sendo a penetrância completa apenas para alelos com 40 ou mais repetições.


Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Outra Condição Médica 641 induzida por substância, a coreia de Sydenham, o lúpus eritematoso sistêmico ou a coreia senil. Raramente, os indivíduos podem apresentar um curso similar ao da doença de Huntington, mas sem testes genéticos positivos; isso é considerado uma fenocópia da doença de Huntington que resulta de uma variedade de fatores genéticos potenciais.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Outra Condição Médica Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há evidências a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais de que o transtorno neurocognitivo é a consequência fisiopatológica de outra condição médica. C. Os déficits cognitivos não são mais bem explicados por outro transtorno mental ou outro transtorno neurocognitivo específico (p. ex., doença de Alzheimer, infecção por HIV). Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior devido a outra condição médica, com perturbação comportamental, codificar primeiro a outra condição médica, seguida do transtorno neurocognitivo maior devido a outra condição médica, com perturbação comportamental (p. ex., 340 [G35] esclerose múltipla, 294.11 [F02.81] transtorno neurocognitivo maior devido a esclerose múltipla, com perturbação comportamental). Para transtorno neurocognitivo maior devido a outra condição médica, sem perturbação comportamental, codificar primeiro a outra condição médica, seguida do transtorno neurocognitivo maior devido a outra condição médica, sem perturbação comportamental (p. ex., 340 [G35] esclerose múltipla, 294.10 [F02.80] transtorno neurocognitivo maior devido a esclerose múltipla, sem perturbação comportamental). Para transtorno neurocognitivo leve devido a outra condição médica, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar o código adicional para outra condição médica. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)

Características Diagnósticas Muitas outras condições médicas podem causar transtornos neurocognitivos. Incluem-se lesões estruturais (p. ex., tumores cerebrais primários ou secundários, hematoma subdural, hidrocefalia de pressão lentamente progressiva ou normal), hipoxia relacionada a hipoperfusão decorrente de insuficiência cardíaca, condições endócrinas (p. ex., hipotireoidismo, hipercalcemia, hipoglicemia), condições nutricionais (p. ex., deficiências de tiamina ou niacina), outras condições infecciosas (p. ex., neurossífilis, criptococose), distúrbios imunológicos (p. ex., arterite temporal, lúpus eritematoso sistêmico), insuficiência renal ou hepática, condições metabólicas (p. ex., doença de Kufs, adrenoleucodistrofia, leucodistrofia metacromática, outras doenças de armazenamento da vida adulta e infantil) e outras condições neurológicas (p. ex., epilepsia, esclerose múltipla). Causas incomuns de lesão no sistema nervoso central, como choque elétrico ou radiação intracraniana, costumam ficar evidentes a partir da história. A associação temporal entre o aparecimento ou a exacerbação da condição médica e o desenvolvimento do déficit cognitivo constitui a maior evidência no sentido de que o TNC é induzido pela condição médica. A certeza diagnóstica quanto a essa relação pode aumentar se os déficits neurocognitivos apresentarem melhora parcial ou estabilização no contexto do tratamento da condição médica.

Desenvolvimento e Curso Em geral, o curso de um TNC evolui de maneira compatível à progressão da doença médica subjacente. Nas circunstâncias em que o problema médico é tratável (p. ex., hipotireoidismo), o déficit neurocognitivo pode melhorar ou, no mínimo, não evoluir. Quando a condição médica


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Transtornos Neurocognitivos

tem um curso deteriorante (p. ex., esclerose múltipla progressiva secundária), os déficits neurocognitivos evoluirão em conjunto com o curso temporal da doença.

Marcadores Diagnósticos Exame físico, achados laboratoriais e outras características clínicas dependem da natureza e da gravidade da condição médica.

Diagnóstico Diferencial Outro transtorno neurocognitivo maior ou leve. A presença de uma condição médica à qual podem ser imputados os sintomas não exclui completamente a possibilidade de outro TNC maior ou leve. Se os déficits cognitivos persistirem após tratamento exitoso de uma condição médica associada, outra etiologia pode, então, ser responsável pelo declínio cognitivo.

Transtorno Neurocognitivo Maior ou Leve Devido a Múltiplas Etiologias Critérios Diagnósticos A. São atendidos os critérios para transtorno neurocognitivo maior ou leve. B. Há evidências a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais de que o transtorno neurocognitivo é a consequência fisiopatológica de mais de um processo etiológico, excluindo-se substâncias (p. ex., transtorno neurocognitivo devido à doença de Alzheimer, com desenvolvimento subsequente de transtorno neurocognitivo vascular). Nota: Consultar os critérios diagnósticos para os vários transtornos neurocognitivos devidos a condições médicas específicas em busca de orientação quanto ao estabelecimento dessas etiologias. C. Os déficits cognitivos não são mais bem explicados por outro transtorno mental e não ocorrem exclusivamente durante o curso de delirium. Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior devido a múltiplas etiologias, com perturbação comportamental, codificar 294.11 (F02.81); para transtorno neurocognitivo maior devido a múltiplas etiologias, sem perturbação comportamental, codificar 294.10 (F02.80). Todas as condições médicas etiológicas (exceto doença vascular) devem ser codificadas e listadas em separado imediatamente antes do transtorno neurocognitivo maior devido a múltiplas etiologias (p. ex., 331.0 [G30.9] doença de Alzheimer; 331.82 [G31.83] doença com corpos de Lewy, 294.11[F02.81] transtorno neurocognitivo maior devido a múltiplas etiologias, com perturbação comportamental). Quando uma etiologia cerebrovascular está contribuindo para o transtorno neurocognitivo, o diagnóstico de transtorno neurocognitivo vascular deve ser listado, além de transtorno neurocognitivo maior devido a múltiplas etiologias. Por exemplo, para uma apresentação de transtorno neurocognitivo maior devido à doença de Alzheimer e doença vascular, com perturbação comportamental, codificar 331.0 (G30.9) doença de Alzheimer; 294.11 (F02.81) transtorno neurocognitivo maior devido a múltiplas etiologias, com perturbação comportamental; 290.40 (F01.51) transtorno neurocognitivo vascular maior, com perturbação comportamental. Para transtorno neurocognitivo leve devido a múltiplas etiologias, codificar 331.83 (G31.84). (Nota: Não usar os códigos adicionais para as etiologias. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)


Transtorno Neurocognitivo Não Especificado 643 Esta categoria está inclusa na apresentação clínica de um transtorno neurocognitivo para a qual há evidências de provável participação de múltiplas condições médicas no desenvolvimento do TNC. Além de evidências indicativas da presença de múltiplas condições médicas reconhecidamente causadoras de TNC (i.e., achados a partir da história, do exame físico e laboratoriais), pode ajudar uma consulta aos critérios diagnósticos e a textos para as várias etiologias médicas (p. ex., transtorno neurocognitivo devido à doença de Parkinson), em busca de mais informações para o estabelecimento de uma conexão etiológica para aquela condição médica em especial.

Transtorno Neurocognitivo Não Especificado 799.59 (R41.9) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno neurocognitivo que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno na classe diagnóstica de transtornos neurocognitivos. A categoria transtorno neurocognitivo não especificado é usada nas situações em que não pode ser determinada com certeza suficiente a etiologia exata para que seja feita uma atribuição etiológica. Nota para codificação: Para transtorno neurocognitivo maior ou leve não especificado, codificar 799.59 (R41.9). (Nota: Não usar códigos adicionais para quaisquer condições médicas etiológicas presumidas. Perturbação comportamental não pode ser codificada, embora deva ainda ser indicada por escrito.)


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?????????????? Transtornos da ????????????????? Personalidade Este capítulo inicia-se com uma definição geral de transtorno da personalidade que se aplica a cada um dos 10 transtornos da personalidade específicos. Um transtorno da personalidade é um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo, é difuso e inflexível, começa na adolescência ou no início da fase adulta, é estável ao longo do tempo e leva a sofrimento ou prejuízo. Em qualquer processo de revisão em curso, especialmente em um processo de tal complexidade, surgem diferentes pontos de vista, e fez-se um esforço para combinar todos. Assim, transtornos da personalidade são inclusos tanto na Seção II quanto na Seção III deste Manual. O material na Seção II representa uma atualização do texto associado aos mesmos critérios encontrados no DSM-IV-TR, ao passo que a Seção III inclui o modelo de pesquisa proposto para o diagnóstico e a conceitualização de transtorno da personalidade desenvolvido pelo Grupo de Trabalho da Personalidade e Transtornos da Personalidade do DSM-5. Visto que se trata de um campo que evolui, espera-se que as duas versões sirvam à prática clínica e às iniciativas de pesquisa, respectivamente. Os seguintes transtornos da personalidade estão inclusos neste capítulo: • Transtorno da personalidade paranoide é um padrão de desconfiança e de suspeita tamanhas que as motivações dos outros são interpretadas como malévolas. • Transtorno da personalidade esquizoide é um padrão de distanciamento das relações sociais e uma faixa restrita de expressão emocional. • Transtorno da personalidade esquizotípica é um padrão de desconforto agudo nas relações íntimas, distorções cognitivas ou perceptivas e excentricidades do comportamento. • Transtorno da personalidade antissocial é um padrão de desrespeito e violação dos direitos dos outros. • Transtorno da personalidade borderline é um padrão de instabilidade nas relações interpessoais, na autoimagem e nos afetos, com impulsividade acentuada. • Transtorno da personalidade histriônica é um padrão de emocionalidade e busca de atenção em excesso. • Transtorno da personalidade narcisista é um padrão de grandiosidade, necessidade de admiração e falta de empatia. • Transtorno da personalidade evitativa é um padrão de inibição social, sentimentos de inadequação e hipersensibilidade a avaliação negativa. • Transtorno da personalidade dependente é um padrão de comportamento submisso e apegado relacionado a uma necessidade excessiva de ser cuidado. • Transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva é um padrão de preocupação com ordem, perfeccionismo e controle. • Mudança de personalidade devido a outra condição médica é uma perturbação persistente da personalidade entendida como decorrente dos efeitos fisiológicos diretos de uma condição médica (p. ex., lesão no lobo frontal). • Outro transtorno da personalidade especificado e transtorno da personalidade não especificado são categorias utilizadas para duas situações: 1) o padrão da personalidade do indivíduo atende aos critérios gerais para um transtorno da personalidade, estando presentes traços de vários transtornos da personalidade distintos, mas os critérios para qualquer um desses transtornos específicos não são preenchidos; ou 2) o padrão da personalidade do indivíduo atende aos critérios gerais para um transtorno da personalidade, mas considera-se que ele tenha um transtorno da personalidade que não faz parte da classificação do DSM-5 (p. ex., transtorno da personalidade passivo-agressiva).


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Transtornos da Personalidade

Os transtornos da personalidade estão reunidos em três grupos, com base em semelhanças descritivas. O Grupo A inclui os transtornos da personalidade paranoide, esquizoide e esquizotípica. Indivíduos com esses transtornos frequentemente parecem esquisitos ou excêntricos. O Grupo B inclui os transtornos da personalidade antissocial, borderline, histriônica e narcisista. Indivíduos com esses transtornos costumam parecem dramáticos, emotivos ou erráticos. O Grupo C inclui os transtornos da personalidade evitativa, dependente e obsessivo-compulsiva. Indivíduos com esses transtornos com frequência parecem ansiosos ou medrosos. Deve-se observar que esse sistema de agrupamento, embora útil em algumas pesquisas e situações educacionais, apresenta sérias limitações e não foi consistentemente validado. Além disso, é frequente as pessoas apresentarem transtornos da personalidade de grupos diferentes concomitantemente. Estimativas de prevalência para os diferentes grupos sugerem 5,7% para os transtornos do Grupo A, 1,5% para os do Grupo B e 6% para os do Grupo C, com 9,1% para qualquer transtorno da personalidade, indicando concomitância frequente de transtornos de grupos diferentes. Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions de 2001-2002 sugerem que cerca de 15% dos adultos dos Estados Unidos apresentam pelo menos um transtorno da personalidade.

Modelos Dimensionais para os Transtornos da Personalidade A abordagem diagnóstica empregada neste Manual representa a perspectiva categórica de que os transtornos da personalidade são síndromes clínicas qualitativamente distintas. Uma alternativa a essa abordagem categórica é a perspectiva dimensional de que os transtornos da personalidade representam variantes mal-adaptativas de traços de personalidade que se fundem imperceptivelmente com a normalidade e entre si. Ver a Seção III para uma descrição completa de um modelo dimensional para transtornos da personalidade. Os grupos de transtornos da personalidade do DSM-IV (i.e., esquisito-excêntrica, dramático-emotivo e ansioso-medroso) podem também ser entendidos como dimensões que representam um espectro de disfunção da personalidade dentro de um continuum com outros transtornos mentais. Os modelos dimensionais alternativos têm muito em comum e, juntos, parecem cobrir as áreas importantes de disfunção da personalidade. Sua integração, sua utilidade clínica e sua relação com as categorias diagnósticas de transtornos da personalidade e com vários aspectos de disfunção da personalidade estão sob investigação ativa.

Transtorno da Personalidade Critérios A. Um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo. Esse padrão manifesta-se em duas (ou mais) das seguintes áreas: 1. 2. 3. 4.

Cognição (i.e., formas de perceber e interpretar a si mesmo, outras pessoas e eventos). Afetividade (i.e., variação, intensidade, labilidade e adequação da resposta emocional). Funcionamento interpessoal. Controle de impulsos.

B. O padrão persistente é inflexível e abrange uma faixa ampla de situações pessoais e sociais. C. O padrão persistente provoca sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. D. O padrão é estável e de longa duração, e seu surgimento ocorre pelo menos a partir da adolescência ou do início da fase adulta.


Transtorno da Personalidade 647 E. O padrão persistente não é mais bem explicado como uma manifestação ou consequência de outro transtorno mental. F. O padrão persistente não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento) ou a outra condição médica (p. ex., traumatismo craniencefálico).

Características Diagnósticas Traços de personalidade são padrões persistentes de percepção, de relacionamento com e de pensamento sobre o ambiente e si mesmo que são exibidos em uma ampla gama de contextos sociais e pessoais. Os traços de personalidade constituem transtornos da personalidade somente quando são inflexíveis e mal-adaptativos e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. O aspecto essencial de um transtorno da personalidade é um padrão persistente de experiência interna e comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo e que se manifesta em pelo menos duas das seguintes áreas: cognição, afetividade, funcionamento interpessoal ou controle de impulsos (Critério A). Esse padrão persistente é inflexível e abrange uma ampla faixa de situações pessoais e sociais (Critério B), provocando sofrimento clinicamente significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério C). O padrão é estável e de longa duração, e seu surgimento ocorre pelo menos a partir da adolescência ou do início da fase adulta (Critério D). O padrão não é mais bem explicado como uma manifestação ou consequência de outro transtorno mental (Critério E) e não é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma substância (p. ex., droga de abuso, medicamento, exposição a uma toxina) ou a outra condição médica (p. ex., traumatismo craniencefálico) (Critério F). São descritos também critérios diagnósticos específicos para cada um dos transtornos da personalidade inclusos neste capítulo. O diagnóstico de transtornos da personalidade exige avaliação dos padrões de funcionamento de longo prazo do indivíduo, e as características particulares da personalidade devem estar evidentes no começo da fase adulta. Os traços de personalidade que definem esses transtornos devem também ser diferenciados das características que surgem em resposta a estressores situacionais específicos ou estados mentais mais transitórios (p. ex., transtornos bipolar, depressivo ou de ansiedade; intoxicação por substância). O clínico deve avaliar a estabilidade dos traços de personalidade ao longo do tempo e em diversas situações. Embora uma única entrevista com o indivíduo seja algumas vezes suficiente para fazer o diagnóstico, é frequentemente necessário realizar mais de uma entrevista e espaçá-las ao longo do tempo. A avaliação pode ainda ser complicada pelo fato de que as características que definem um transtorno da personalidade podem não ser consideradas problemáticas pelo indivíduo (i.e., os traços são com frequência egossintônicos). Para ajudar a superar essa dificuldade, informações suplementares oferecidas por outros informantes podem ser úteis.

Desenvolvimento e Curso As características de um transtorno da personalidade costumam se tornar reconhecíveis durante a adolescência ou no começo da vida adulta. Por definição, um transtorno da personalidade é um padrão persistente de pensamento, sentimento e comportamento que é relativamente estável ao longo do tempo. Alguns tipos de transtorno da personalidade (notadamente os transtornos da personalidade antissocial e borderline) tendem a ficar menos evidentes ou a desaparecer com o envelhecimento, o que parece não valer para alguns outros tipos (p. ex., transtornos da personalidade obsessivo-compulsiva e esquizotípica). As categorias dos transtornos da personalidade podem ser aplicadas em crianças ou adolescentes naqueles casos relativamente raros em que os traços mal-adaptativos e particulares da personalidade do indivíduo parecem ser difusos, persistentes e pouco prováveis de serem limitados a um determinado estágio do desenvolvimento ou a outro transtorno mental específico. Deve-se reconhecer que os traços de um transtorno da personalidade que aparecem na infância com frequência não persistem sem mudanças na vida adulta. Para que um transtorno da personalidade seja diagnosticado em um indivíduo com menos de 18 anos de idade, as características precisam ter estado presentes por pelo menos um ano. A única exceção é o transtorno da personalidade


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Transtornos da Personalidade

antissocial, que não pode ser diagnosticado em indivíduos com menos de 18 anos. Embora, por definição, um transtorno da personalidade exija um surgimento até o começo da vida adulta, as pessoas podem não buscar atendimento clínico até um período relativamente tardio na vida. Um transtorno da personalidade pode ser exacerbado após a perda de pessoas significativas (p. ex., cônjuge) ou de situações sociais previamente estabilizantes (p. ex., um emprego). Entretanto, o desenvolvimento de uma mudança na personalidade no meio da vida adulta ou mais tarde requer uma avaliação completa para determinar a possível presença de uma mudança de personalidade devido a outra condição médica ou a um transtorno por uso de substância não reconhecido.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Juízos acerca do funcionamento da personalidade devem levar em conta os antecedentes étnicos, culturais e sociais do indivíduo. Os transtornos da personalidade não devem ser confundidos com problemas associados à aculturação após imigração ou à expressão de hábitos, costumes ou valores religiosos e políticos professados pela cultura de origem do indivíduo. É útil para o clínico, especialmente ao avaliar alguém com origem diferente da sua, obter mais informações com pessoas que conheçam os antecedentes culturais do indivíduo.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Alguns transtornos da personalidade (p. ex., transtorno da personalidade antissocial) são diagnosticados com maior frequência em indivíduos do sexo masculino. Outros (p. ex., transtornos da personalidade borderline, histriônica e dependente) são diagnosticados mais frequentemente em indivíduos do sexo feminino. Embora essas diferenças na prevalência provavelmente reflitam diferenças reais de gênero quanto à presença de tais padrões, os clínicos devem ter cautela para não superdiagnosticar ou subdiagnosticar alguns transtornos da personalidade em mulheres ou homens devido a estereótipos sociais acerca de papéis e comportamentos típicos de gênero.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos mentais e traços de personalidade. Muitos dos critérios específicos para transtornos da personalidade descrevem aspectos (p. ex., desconfiança, dependência, insensibilidade) que também caracterizam episódios de outros transtornos mentais. Um transtorno da personalidade deve ser diagnosticado apenas quando as características definidoras tenham surgido antes do começo da vida adulta, sejam típicas do funcionamento de longo prazo do indivíduo e não ocorram exclusivamente durante um episódio de outro transtorno mental. Pode ser particularmente difícil (e não particularmente útil) distinguir transtornos da personalidade de transtornos mentais persistentes, como um transtorno depressivo persistente com início precoce e curso duradouro e relativamente estável. Alguns transtornos da personalidade podem ter uma relação de “espectro” com outros transtornos mentais (p. ex., transtorno da personalidade esquizotípica com esquizofrenia; transtorno da personalidade evitativa com transtorno de ansiedade social [fobia social]) com base em semelhanças fenomenológicas ou biológicas ou agregação familiar. Transtornos da personalidade devem ser distinguidos de traços de personalidade que não atingem o limiar para um transtorno da personalidade. Traços de personalidade são diagnosticados como um transtorno da personalidade apenas quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. Transtornos psicóticos. Para os três transtornos da personalidade que podem ter relação com os transtornos psicóticos (i.e., paranoide, esquizoide e esquizotípica), existe um critério de exclusão que diz que o padrão comportamental não deve ter ocorrido exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos ou outro transtorno psicótico. Quando um indivíduo tem um transtorno mental persistente (p. ex., esquizofrenia) que foi precedido por um transtorno da personalidade preexistente, o transtorno da personalidade deve ser também registrado, seguido de “pré-mórbido” entre parênteses.


Transtorno da Personalidade Paranoide 649 Transtornos de ansiedade e depressivo. O clínico deve ter cautela ao diagnosticar transtornos da personalidade durante um episódio de transtorno depressivo ou de ansiedade, visto que essas condições podem apresentar sintomas cruzados que imitam traços de personalidade e podem dificultar a avaliação retrospectiva dos padrões de funcionamento de longo prazo do indivíduo. Transtorno de estresse pós-traumático. Quando mudanças de personalidade emergem e persistem após um indivíduo ser exposto a estresse extremo, um diagnóstico de transtorno de estresse pós-traumático deve ser considerado. Transtornos por uso de substância. Quando um indivíduo tem um transtorno por uso de substância, é importante não fazer um diagnóstico de transtorno da personalidade unicamente com base em comportamentos que sejam consequências de intoxicação ou abstinência da substância ou que estejam associados a atividades a serviço do uso continuado da substância (p. ex., comportamento antissocial). Mudança de personalidade devido a outra condição médica. Quando surgem mudanças persistentes de personalidade em consequência dos efeitos fisiológicos de outra condição médica (p. ex., tumor cerebral), um diagnóstico de mudança de personalidade em razão de outra condição médica deve ser considerado.

Transtornos da Personalidade do Grupo A Transtorno da Personalidade Paranoide Critérios Diagnósticos

301.0 (F60.0)

A. Um padrão de desconfiança e suspeita difusa dos outros, de modo que suas motivações são interpretadas como malévolas, que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por quatro (ou mais) dos seguintes: 1. Suspeita, sem embasamento suficiente, de estar sendo explorado, maltratado ou enganado por outros. 2. Preocupa-se com dúvidas injustificadas acerca da lealdade ou da confiabilidade de amigos e sócios. 3. Reluta em confiar nos outros devido a medo infundado de que as informações serão usadas maldosamente contra si. 4. Percebe significados ocultos humilhantes ou ameaçadores em comentários ou eventos benignos. 5. Guarda rancores de forma persistente (i.e., não perdoa insultos, injúrias ou desprezo). 6. Percebe ataques a seu caráter ou reputação que não são percebidos pelos outros e reage com raiva ou contra-ataca rapidamente. 7. Tem suspeitas recorrentes e injustificadas acerca da fidelidade do cônjuge ou parceiro sexual. B. Não ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos ou outro transtorno psicótico e não é atribuível aos efeitos fisiológicos de outra condição médica. Nota: Se os critérios são atendidos antes do surgimento de esquizofrenia, acrescentar “pré-mórbido”, isto é, “transtorno da personalidade paranoide (pré-mórbido)”.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade paranoide é um padrão de desconfiança e suspeita difusa dos outros a ponto de suas motivações serem interpretadas como malévolas. Esse padrão começa no início da vida adulta e está presente em contextos variados.


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Transtornos da Personalidade

Indivíduos com esse transtorno creem que outras pessoas irão explorá-los, causar-lhes dano ou enganá-los, mesmo sem evidências que apoiem essa expectativa (Critério A1). Suspeitam, com base em pouca ou nenhuma evidência, de que outros estão tramando contra eles e podem atacá-los de repente, a qualquer momento e sem razão. Costumam achar que foram profunda e irreversivelmente maltratados por outra pessoa ou pessoas, mesmo na ausência de evidências objetivas para tal. São preocupados com dúvidas injustificadas acerca da lealdade ou confiança de seus amigos e sócios, cujas ações são examinadas minuciosamente em busca de evidências de intenções hostis (Critério A2). Qualquer desvio percebido da confiança ou lealdade serve de apoio a seus pressupostos subjacentes. Ficam tão surpresos quando um amigo ou sócio demonstra lealdade que não conseguem confiar ou crer nisso. Quando envolvidos em problemas, esperam que amigos e sócios os ataquem ou ignorem. Indivíduos com transtorno da personalidade paranoide relutam em confiar ou tornar-se íntimos de outros, pois temem que as informações que compartilham venham a ser usadas contra eles (Critério A3). Podem recusar responder a perguntas pessoais dizendo que tais informações “não são da conta de ninguém”. Percebem significados ocultos desabonadores e ameaçadores em comentários ou eventos benignos (Critério A4). Por exemplo, um indivíduo com esse transtorno pode interpretar mal um erro honesto de um funcionário de uma loja como uma tentativa deliberada de dar troco a menos ou entender um comentário bem-humorado casual de um colega de trabalho como um ataque sério ao seu caráter. Elogios costumam ser mal interpretados (p. ex., um elogio por uma nova aquisição é mal interpretado como uma crítica de egoísmo; um elogio relativo a um feito é mal interpretado como uma tentativa de coerção a desempenho melhor). Podem entender uma oferta de ajuda como uma crítica por não estarem tendo desempenho suficientemente bom por conta própria. Indivíduos com esse transtorno guardam rancores persistentemente e não se dispõem a perdoar insultos, injúrias ou menosprezo dos quais pensam ter sido alvo (Critério A5). Um leve desrespeito desperta grande hostilidade, sendo que os sentimentos hostis persistem por um bom tempo. Como são constantemente hipervigilantes em relação às intenções prejudiciais de outros, sentem, com frequência, que seu caráter ou reputação foram atacados e que foram de alguma forma desrespeitados. São rápidos no contra-ataque e reagem com raiva aos insultos percebidos (Critério A6). Indivíduos com esse transtorno podem ser patologicamente ciumentos, muitas vezes suspeitando de que o cônjuge ou parceiro sexual é infiel sem qualquer justificativa adequada (Critério A7). Podem reunir “evidências” triviais e circunstanciais que apoiem suas crenças de ciúme. Desejam manter controle total das relações íntimas para evitar serem traídos e podem constantemente questionar e desafiar o paradeiro, as ações, as intenções e a fidelidade do cônjuge ou parceiro. O transtorno da personalidade paranoide não deve ser diagnosticado se o padrão de comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos ou outro transtorno psicótico ou se é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma condição neurológica (p. ex., epilepsia do lobo temporal) ou a outra condição médica (Critério B).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade paranoide são geralmente de difícil convivência e apresentam frequentes problemas nos relacionamentos íntimos. Sua desconfiança e hostilidade excessivas podem se expressar sob a forma de argumentações ostensivas, queixas recorrentes ou, ainda, indiferença calma e aparentemente hostil. Como são hipervigilantes em relação a ameaças potenciais, podem agir de maneira discreta, secreta ou indireta e parecer “frios” e sem sentimentos afetivos. Ainda que possam parecer objetivos, racionais e não emotivos, frequentemente demonstram labilidade afetiva, com predomínio de expressões hostis, inflexíveis e sarcásticas. Sua natureza combativa e desconfiada pode provocar uma resposta hostil em outras pessoas, a qual, então, serve para confirmar suas expectativas originais. Visto que indivíduos com o transtorno carecem de confiança nos outros, apresentam necessidade excessiva de autossuficiência e forte senso de autonomia. Precisam, ainda, de elevado grau de controle sobre as pessoas ao seu redor. Frequentemente são rígidos, críticos em relação aos outros e


Transtorno da Personalidade Paranoide 651 incapazes de trabalhar em conjunto, embora eles mesmos tenham grande dificuldade de aceitar críticas. Podem culpar os outros por suas próprias deficiências. Devido à rapidez no contra-ataque em resposta às ameaças que percebem ao seu redor, podem ser beligerantes e frequentemente se envolver em disputas judiciais. Indivíduos com esse transtorno buscam confirmar suas ideias negativas preconcebidas em relação às pessoas e às situações com as quais se deparam, atribuindo motivações malévolas aos outros, as quais são projeções dos próprios medos. Podem apresentar fantasias irreais e pouco disfarçadas de grandeza, estão frequentemente ligados a questões de poder e posição e tendem a desenvolver estereótipos negativos dos outros, em especial aqueles de grupos populacionais diferentes do seu. Atraídos por formulações simplistas do mundo, costumam se precaver de situações ambíguas. Podem ser vistos como “fanáticos” e formar “cultos” ou grupos muito unidos com outros indivíduos que compartilham seus sistemas paranoides de crença. Especialmente em resposta ao estresse, indivíduos com esse transtorno podem apresentar episódios psicóticos breves (durando de minutos a horas). Em certos casos, o transtorno da personalidade paranoide pode surgir como o antecedente pré-mórbido de transtorno delirante ou esquizofrenia. Indivíduos com transtorno da personalidade paranoide podem desenvolver transtorno depressivo maior e podem estar sob risco aumentado de agorafobia e transtorno obsessivo-compulsivo. Transtornos por uso de álcool e outras substâncias ocorrem com frequência. Os transtornos da personalidade concomitantes mais comuns parecem ser: esquizotípica, esquizoide, narcisista, evitativa e borderline.

Prevalência Uma estimativa de prevalência para personalidade paranoide baseada em uma subamostra de probabilidade da Parte II do National Comorbidity Survey Replication sugere prevalência de 2,3%, enquanto dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions sugerem prevalência do transtorno de 4,4%.

Desenvolvimento e Curso O transtorno da personalidade paranoide pode aparecer pela primeira vez na infância e adolescência por meio de solidão, relacionamento ruim com os colegas, ansiedade social, baixo rendimento escolar, hipersensibilidade, pensamentos e linguagem peculiares e fantasias idiossincrásicas. Essas crianças podem parecer “estranhas” ou “excêntricas” e atrair provocações. Em amostras clínicas, esse transtorno parece ser mais comumente diagnosticado no sexo masculino.

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. Existem algumas evidências de prevalência aumentada de transtorno da personalidade paranoide em parentes de probandos com esquizofrenia, além de evidências de uma relação familiar mais específica com transtorno delirante do tipo persecutório.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Alguns comportamentos que são influenciados por contextos socioculturais ou por circunstâncias específicas de vida podem ser erroneamente rotulados como paranoides e podem até ser intensificados pelo processo de avaliação clínica. Membros de grupos minoritários, imigrantes, refugiados políticos e econômicos ou indivíduos de origens étnicas diferentes podem apresentar comportamentos defensivos devido à falta de familiaridade (p. ex., barreiras linguísticas ou falta de conhecimento de regras e regulamentos) ou em resposta à negligência ou à indiferença percebida da sociedade majoritária. Esses comportamentos podem, em contrapartida, gerar raiva e frustração naqueles que lidam com esses indivíduos, iniciando, assim, um círculo vicioso de desconfiança mútua, o qual não deve ser confundido com transtorno da personalidade paranoide. Alguns grupos étnicos também demonstram comportamentos ligados à cultura que podem ser mal interpretados como paranoides.


652

Transtornos da Personalidade

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos mentais com sintomas psicóticos. O transtorno da personalidade paranoide pode ser distinguido de transtorno delirante do tipo persecutório, da esquizofrenia e do transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos pelo fato de esses transtornos serem todos caracterizados por um período de sintomas psicóticos persistentes (p. ex., delírios e alucinações). Para que um diagnóstico adicional de transtorno da personalidade paranoide seja dado, o transtorno da personalidade deve ter estado presente antes do aparecimento dos sintomas psicóticos e deve também persistir após a remissão dos sintomas psicóticos. Quando um indivíduo tem outro transtorno mental persistente (p. ex., esquizofrenia) que foi precedido por um transtorno da personalidade paranoide, o transtorno da personalidade deve ser também registrado, seguido de “pré-mórbido” entre parênteses. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade paranoide deve ser distinguido de mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos diretos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade paranoide deve ser distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância. Traços paranoides associados a deficiências físicas. O transtorno deve também ser distinguido de traços paranoides associados ao desenvolvimento de deficiências físicas (p. ex., deficiência auditiva). Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com transtorno da personalidade paranoide, visto que têm algumas características comuns. Assim, é importante distinguir esses transtornos tendo como base suas diferenças quanto aos aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo tem aspectos de personalidade que atendem aos critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade paranoide, todos os demais transtornos podem ser diagnosticados. O transtorno da personalidade paranoide e o transtorno da personalidade esquizotípica compartilham os traços de desconfiança, distanciamento interpessoal e ideação paranoide, mas o transtorno da personalidade esquizotípica também inclui sintomas como pensamento mágico, experiências perceptivas incomuns e pensamento e discurso estranhos. Indivíduos com comportamentos que atendem aos critérios para transtorno da personalidade esquizoide costumam ser vistos como estranhos, excêntricos, frios e distantes, mas em geral não apresentam ideação paranoide acentuada. A tendência de indivíduos com transtorno da personalidade paranoide de reagir aos menores estímulos com raiva é também encontrada nos transtornos da personalidade borderline e histriônica. Esses transtornos, todavia, não estão necessariamente associados com desconfiança difusa. Pessoas com transtorno da personalidade evitativa podem também relutar em confiar nos outros, mas isso ocorre mais por medo de sentir vergonha ou inadequação do que por medo de intenções maldosas. Embora o comportamento antissocial possa estar presente em alguns indivíduos com transtorno da personalidade paranoide, isso não costuma ser motivado por um desejo de ganho pessoal ou de explorar os outros como no transtorno da personalidade antissocial, sendo a motivação mais frequente um desejo de vingança. Indivíduos com transtorno da personalidade narcisista podem ocasionalmente apresentar desconfiança, retraimento social ou alienação que se originam primariamente de medos de ter suas imperfeições ou falhas reveladas. Traços paranoides podem ser adaptativos, particularmente em ambientes ameaçadores. O transtorno da personalidade paranoide deve ser diagnosticado apenas quando tais traços são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes, além de causarem prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos.

Transtorno da Personalidade Esquizoide Critérios Diagnósticos

301.20 (F60.1)

A. Um padrão difuso de distanciamento das relações sociais e uma faixa restrita de expressão de emoções em contextos interpessoais que surgem no início da vida adulta e estão presentes em vários contextos, conforme indicado por quatro (ou mais) dos seguintes:


Transtorno da Personalidade Esquizoide 653 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

Não deseja nem desfruta de relações íntimas, inclusive ser parte de uma família. Quase sempre opta por atividades solitárias. Manifesta pouco ou nenhum interesse em ter experiências sexuais com outra pessoa. Tem prazer em poucas atividades, por vezes em nenhuma. Não tem amigos próximos ou confidentes que não sejam os familiares de primeiro grau. Mostra-se indiferente ao elogio ou à crítica de outros. Demonstra frieza emocional, distanciamento ou embotamento afetivo.

B. Não ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos, outro transtorno psicótico ou transtorno do espectro autista e não é atribuível aos efeitos psicológicos de outra condição médica. Nota: Se os critérios são atendidos antes do surgimento de esquizofrenia, acrescentar “pré-mórbido”, isto é, “transtorno da personalidade esquizoide (pré-mórbido)”.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade esquizoide é um padrão difuso de distanciamento das relações sociais e uma faixa restrita de expressão de emoções em contextos interpessoais. Esse padrão surge no começo da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide demonstram não ter desejo de intimidade, parecem indiferentes a oportunidades de desenvolver relações próximas e não parecem encontrar muita satisfação em fazer parte de uma família ou de outro grupo social (Critério A1). Preferem ficar sozinhos em vez de com outras pessoas. Com frequência parecem ser socialmente isolados ou “solitários” e quase sempre optam por atividades ou passatempos solitários que não incluem interação com outros (Critério A2). Preferem tarefas mecânicas ou abstratas, como jogos matemáticos ou de computador. Podem ter muito pouco interesse em ter experiências sexuais com outra pessoa (Critério A3) e têm prazer em poucas atividades, quando não em nenhuma (Critério A4). Há geralmente uma sensação reduzida de prazer decorrente de experiências sensoriais, corporais ou interpessoais, como caminhar na praia ao fim do dia ou fazer sexo. Esses indivíduos não têm amigos próximos ou confidentes, exceto um possível parente de primeiro grau (Critério A5). Indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide costumam ser indiferentes à aprovação ou à crítica dos outros e não parecem se incomodar com o que os demais podem pensar deles (Critério A6). Podem passar ao largo das sutilezas normais das interações sociais e frequentemente não reagem de forma adequada a gentilezas sociais, de modo que parecem socialmente inaptos ou superficiais e absorvidos em si mesmos. Habitualmente, mostram um exterior “insípido”, sem reatividade emocional visível, e apenas raramente respondem de forma recíproca a gestos ou expressões faciais, como sorrisos ou acenos (Critério A7). Alegam que raramente vivenciam emoções fortes, como raiva e alegria. Costumam mostrar um afeto constrito e parecem frios e distantes. No entanto, naquelas circunstâncias particularmente incomuns em que esses indivíduos ficam pelo menos temporariamente confortáveis em revelar a si mesmos, podem admitir ter sentimentos de dor, sobretudo relacionados às interações sociais. O transtorno da personalidade esquizoide não deve ser diagnosticado se o padrão de comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos, outro transtorno psicótico ou transtorno do espectro autista ou se é atribuível aos efeitos fisiológicos de uma condição médica neurológica (p. ex., epilepsia do lobo temporal) ou a outra condição médica.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide podem ter uma dificuldade particular para expressar raiva, mesmo em resposta a provocação direta, o que contribui para a impressão de que carecem de emoção. Suas vidas parecem por vezes sem rumo, e eles podem aparentar estar “à deriva” em relação a seus objetivos. Tais indivíduos frequentemente reagem de forma passiva a circunstâncias adversas e apresentam dificuldade em reagir adequadamente a acontecimentos


654

Transtornos da Personalidade

importantes da vida. Devido à falta de habilidades sociais e à ausência de desejo de experiências sexuais, indivíduos com esse transtorno têm poucos amigos, raramente namoram e costumam não casar. O funcionamento profissional pode estar prejudicado, em especial quando há necessidade de envolvimento interpessoal; podem, entretanto, ser bem-sucedidos quando trabalham em condições de isolamento social. Particularmente em resposta a estresse, indivíduos com esse transtorno podem ter vários episódios psicóticos muito breves (com duração de minutos a horas). Em alguns casos, o transtorno da personalidade esquizoide pode surgir como o antecedente pré-mórbido de transtorno delirante ou esquizofrenia. Indivíduos com esse transtorno podem, às vezes, desenvolver transtorno depressivo maior. O transtorno da personalidade esquizoide com frequência ocorre concomitantemente com os transtornos da personalidade esquizotípica, paranoide e evitativa.

Prevalência O transtorno da personalidade esquizoide é incomum em contextos clínicos. Uma estimativa de prevalência com base em uma subamostra de probabilidade da Parte II do National Comorbidity Survey Replication sugere uma prevalência de 4,9%. Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions de 2001-2002 sugerem uma prevalência de 3,1%.

Desenvolvimento e Curso O transtorno da personalidade esquizoide pode ficar aparente pela primeira vez na infância e adolescência por meio de solidão, relacionamento ruim com os colegas e baixo rendimento escolar, o que marca essas crianças ou adolescentes como diferentes e os torna sujeitos a provocações.

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. O transtorno da personalidade esquizoide pode ter prevalência aumentada entre familiares de indivíduos com esquizofrenia ou transtorno da personalidade esquizotípica.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Indivíduos de várias origens culturais podem por vezes mostrar comportamentos e estilos interpessoais defensivos que podem ser erroneamente rotulados como “esquizoides”. Por exemplo, pessoas que saem de zonas rurais e vão para centros urbanos podem reagir com uma espécie de “paralisia emocional” que pode durar vários meses e que se manifesta por meio de atividades solitárias, afeto constrito e outros déficits de comunicação. Imigrantes de outros países são, às vezes, incorretamente vistos como frios, hostis ou indiferentes.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno da personalidade esquizoide é diagnosticado um pouco mais frequentemente em indivíduos do sexo masculino e pode causar-lhes mais incapacidade.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos mentais com sintomas psicóticos. O transtorno da personalidade esquizoide pode ser distinguido de transtorno delirante, esquizofrenia e transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos pelo fato de esses transtornos serem todos caracterizados por um período de sintomas psicóticos persistentes (p. ex., delírios e alucinações). Para que seja dado um diagnóstico adicional de transtorno da personalidade esquizoide, o transtorno da personalidade deve ter estado presente antes do aparecimento dos sintomas psicóticos e deve persistir quando tais sintomas estão em remissão. Quando um indivíduo tem um transtorno psicótico persistente


Transtorno da Personalidade Esquizotípica 655 (p. ex., esquizofrenia) que foi precedido por um transtorno da personalidade esquizoide, o transtorno da personalidade deve ser também registrado, seguido de “pré-mórbido” entre parênteses. Transtorno do espectro autista. Pode haver grande dificuldade em distinguir indivíduos com transtorno da personalidade esquizoide daqueles com formas mais leves de transtorno do espectro autista, os quais podem ser diferenciados por apresentarem interação social comprometida de forma mais grave e comportamentos e interesses estereotipados. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade esquizoide deve ser distinguido de mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade esquizoide deve também ser distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância. Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com o transtorno da personalidade esquizoide, visto que apresentam algumas características em comum. Assim, é importante distinguir tais transtornos com base em diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta aspectos de personalidade que atendem a critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além de transtorno da personalidade esquizoide, todos podem ser diagnosticados. Ainda que características de isolamento social e afetividade restrita sejam comuns a transtornos da personalidade esquizoide, esquizotípica e paranoide, o transtorno da personalidade esquizoide pode ser distinguido do da esquizotípica pela ausência de distorções cognitivas e perceptivas e do transtorno da personalidade paranoide pela ausência de desconfiança e ideação paranoide. O isolamento social do transtorno da personalidade esquizoide pode ser distinguido daquele da personalidade evitativa, o qual é atribuível ao medo de sentir-se envergonhado ou inadequado e à excessiva antecipação de rejeição. Pessoas com transtorno da personalidade esquizoide, por sua vez, apresentam distanciamento mais difuso e desejo limitado de intimidade social. Indivíduos com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva também podem demonstrar um aparente distanciamento social que se origina da devoção ao trabalho e um desconforto com as emoções, mas eles de fato têm uma capacidade subjacente de intimidade. Indivíduos que são “solitários” podem apresentar traços de personalidade capazes de serem considerados esquizoides. Esses traços somente constituem o transtorno da personalidade esquizoide quando são inflexíveis e mal-adaptativos e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos.

Transtorno da Personalidade Esquizotípica Critérios Diagnósticos

301.22 (F21)

A. Um padrão difuso de déficits sociais e interpessoais marcado por desconforto agudo e capacidade reduzida para relacionamentos íntimos, além de distorções cognitivas ou perceptivas e comportamento excêntrico, que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por cinco (ou mais) dos seguintes: 1. Ideias de referência (excluindo delírios de referência). 2. Crenças estranhas ou pensamento mágico que influenciam o comportamento e são inconsistentes com as normas subculturais (p. ex., superstições, crença em clarividência, telepatia ou “sexto sentido”; em crianças e adolescentes, fantasias ou preocupações bizarras). 3. Experiências perceptivas incomuns, incluindo ilusões corporais. 4. Pensamento e discurso estranhos (p. ex., vago, circunstancial, metafórico, excessivamente elaborado ou estereotipado). 5. Desconfiança ou ideação paranoide.


656

Transtornos da Personalidade 6. 7. 8. 9.

Afeto inadequado ou constrito. Comportamento ou aparência estranha, excêntrica ou peculiar. Ausência de amigos próximos ou confidentes que não sejam parentes de primeiro grau. Ansiedade social excessiva que não diminui com o convívio e que tende a estar associada mais a temores paranoides do que a julgamentos negativos sobre si mesmo.

B. Não ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos, outro transtorno psicótico ou transtorno do espectro autista. Nota: Se os critérios são atendidos antes do surgimento de esquizofrenia, acrescentar “pré-mórbido”, isto é, “transtorno da personalidade esquizotípica (pré-morbido)”.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade esquizotípica é um padrão difuso de déficits sociais e interpessoais marcado por desconforto agudo e capacidade reduzida para relacionamentos íntimos, bem como por distorções cognitivas ou perceptivas e comportamento excêntrico. Esse padrão surge no começo da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica com frequência apresentam ideias de referência (i.e., interpretações incorretas de incidentes casuais e eventos externos como tendo um sentido particular e incomum especificamente para a pessoa) (Critério A1). Estas devem ser distinguidas de delírios de referência, nos quais as crenças são mantidas com convicção delirante. Esses indivíduos podem ser supersticiosos ou preocupados com fenômenos paranormais que fogem das normas de sua subcultura (Critério A2). Podem achar que têm poderes especiais para sentir os eventos antes que ocorram ou para ler os pensamentos alheios. Podem acreditar que exercem controle mágico sobre os outros, o qual pode ser implementado diretamente (p. ex., a crença de que o fato de o cônjuge estar levando o cachorro para passear é consequência direta de, uma hora antes, ter pensado que isso devia ser feito) ou indiretamente, por meio de obediência a rituais mágicos (p. ex., passar três vezes por determinado objeto para evitar uma consequência danosa). Alterações perceptivas podem estar presentes (p. ex., sentir que outra pessoa está presente ou ouvir uma voz murmurando seu nome) (Critério A3). Seu discurso pode incluir fraseados e construções incomuns ou idiossincrásicas e costuma ser desconexo, digressivo ou vago, embora sem apresentar um real descarrilhamento ou incoerência (Critério A4). Respostas podem ser excessivamente concretas ou abstratas, e palavras e conceitos são, por vezes, aplicados de maneiras pouco habituais (p. ex., o indivíduo pode afirmar que não estava “conversável” no trabalho). Indivíduos com esse transtorno são frequentemente desconfiados e podem apresentar ideias paranoides (p. ex., crer que os colegas de trabalho estão planejando minar sua reputação com o chefe) (Critério A5). Em geral, são incapazes de lidar com os afetos e as minúcias interpessoais que são necessários para relacionamentos bem-sucedidos; assim, com frequência parecem interagir com os outros de forma inadequada, formal ou constrita (Critério A6). Esses indivíduos são geralmente considerados esquisitos ou excêntricos em virtude de maneirismos incomuns, isto é, sua forma desleixada de vestir-se que não “combina” bem e sua falta de atenção às convenções sociais habituais (p. ex., o indivíduo pode evitar contato visual, usar roupas manchadas ou que não servem bem e ser incapaz de participar das provocações e brincadeiras que ocorrem entre colegas de trabalho) (Critério A7). Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica vivenciam os relacionamentos interpessoais como problemáticos e sentem desconforto em se relacionar com outras pessoas. Embora possam manifestar infelicidade acerca da falta de relacionamentos, seu comportamento sugere um desejo reduzido de contatos íntimos. Assim, costumam ter poucos ou nenhum amigo próximo ou confidente que não seja parente de primeiro grau (Critério A8). São ansiosos em situações sociais, especialmente aquelas que envolvem pessoas desconhecidas (Critério A9). Irão interagir com outras pessoas quando tiverem de fazer isso, mas preferem não estabelecer interações, pois sentem que são diferentes e que não se enturmam. Sua ansiedade social não diminui facilmente, mesmo quando passam mais tempo no local ou conhecem melhor as outras pessoas, visto que a ansiedade tende a estar associada à desconfiança quanto às motivações dos outros.


Transtorno da Personalidade Esquizotípica 657 Por exemplo, em um jantar, a pessoa com o transtorno da personalidade esquizotípica não ficará mais relaxada com o passar das horas; pelo contrário: ficará mais tensa e desconfiada. Transtorno da personalidade esquizotípica não deve ser diagnosticado se o padrão de comportamento ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia, transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos, outro transtorno psicótico ou transtorno do espectro autista (Critério B).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica costumam buscar tratamento mais para os sintomas associados de ansiedade ou depressão do que para as características do transtorno da personalidade em si. Particularmente em resposta a estresse, indivíduos com o transtorno podem apresentar episódios psicóticos transitórios (com duração de minutos a horas), embora eles geralmente tenham duração insuficiente para indicar um diagnóstico adicional, como transtorno psicótico breve ou transtorno esquizofreniforme. Em alguns casos, podem surgir sintomas psicóticos clinicamente significativos que atendam aos critérios de transtorno psicótico breve, transtorno esquizofreniforme, transtorno delirante ou esquizofrenia. Mais de metade dos indivíduos com o transtorno da personalidade esquizotípica pode ter história de pelo menos um episódio depressivo maior. De 30 a 50% dos indivíduos diagnosticados com esse transtorno têm um diagnóstico simultâneo de transtorno depressivo maior quando avaliados em um contexto clínico. Existe considerável concomitância de transtornos da personalidade esquizoide, paranoide, evitativa e borderline.

Prevalência Em estudos de comunidades do transtorno da personalidade esquizotípica, as taxas informadas variam de 0,6% em amostras norueguesas a 4,6% em uma amostra norte-americana. A prevalência do transtorno em populações clínicas parece ser baixa (0 a 1,9%), com uma prevalência estimada mais alta na população em geral (3,9%) encontrada no National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions.

Desenvolvimento e Curso O transtorno da personalidade esquizotípica apresenta curso relativamente estável, com apenas uma pequena parte dos indivíduos vindo a desenvolver esquizofrenia ou outro transtorno psicótico. O transtorno pode se manifestar primeiramente na infância e adolescência por meio de solidão, relacionamento ruim com os colegas, ansiedade social, baixo rendimento escolar, hipersensibilidade, pensamentos e linguagem peculiares e fantasias bizarras. Essas crianças podem parecer “estranhas” ou “excêntricas” e atrair provocação.

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. O transtorno da personalidade esquizotípica parece ser familiarmente agregado, sendo mais prevalente entre familiares biológicos de primeiro grau de indivíduos com esquizofrenia em comparação com a população em geral. Pode haver também um aumento pequeno de esquizofrenia e de outros transtornos psicóticos em familiares de probandos com transtorno da personalidade esquizotípica.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Distorções cognitivas e perceptivas devem ser avaliadas no contexto do meio cultural do indivíduo. Características culturalmente determinadas disseminadas, sobretudo aquelas relativas a crenças e rituais religiosos, podem parecer esquizotípicas ao observador externo desinformado (p. ex., vodu, glossolalia, vida após a morte, xamanismo, leitura da mente, sexto sentido, crenças mágicas relativas a saúde e doença).


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Transtornos da Personalidade

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno da personalidade esquizotípica pode ser um pouco mais comum no sexo masculino.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos mentais com sintomas psicóticos. O transtorno da personalidade esquizotípica pode ser distinguido de transtorno delirante, esquizofrenia e transtorno bipolar ou depressivo com sintomas psicóticos pelo fato de todos esses transtornos serem caracterizados por um período de sintomas psicóticos persistentes (p. ex., delírios e alucinações). Para que seja dado um diagnóstico adicional de transtorno da personalidade esquizotípica, o transtorno deve ter estado presente antes do aparecimento dos sintomas psicóticos e deve persistir quando tais sintomas estão em remissão. Quando um indivíduo tem um transtorno psicótico persistente (p. ex., esquizofrenia), antecedido de transtorno da personalidade esquizotípica, o transtorno da personalidade deve ser também registrado, seguido de “pré-mórbido” entre parênteses. Transtornos do neurodesenvolvimento. Pode ser bastante difícil diferenciar crianças com transtorno da personalidade esquizotípica do grupo heterogêneo de crianças solitárias e estranhas cujo comportamento é caracterizado por isolamento social pronunciado, excentricidade ou peculiaridades linguísticas e cujos diagnósticos provavelmente incluam formas mais leves de transtorno do espectro autista ou transtornos da comunicação e linguagem. Os transtornos da comunicação podem ser diferenciados pela primazia e gravidade do transtorno na linguagem e pelos aspectos característicos de linguagem prejudicada encontrados em uma avaliação especializada desta. Formas mais leves do transtorno do espectro autista são diferenciadas por sua falta de percepção social ainda maior e de reciprocidade emocional e por seus comportamentos e interesses estereotipados. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade esquizotípica deve ser distinguido de mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade esquizotípica deve ser também distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância. Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com transtorno da personalidade esquizotípica por terem alguns aspectos em comum. Assim, é importante distinguir entre esses transtornos com base em diferenças nos seus aspectos característicos. Entretanto, quando um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem a critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade esquizotípica, todos podem ser diagnosticados. Ainda que os transtornos da personalidade paranoide e esquizoide possam também ser caracterizados por distanciamento social e afeto restrito, o transtorno da personalidade esquizotípica pode ser distinguido desses dois diagnósticos pela presença de distorções cognitivas ou perceptivas e excentricidade ou esquisitice acentuada. Relacionamentos próximos são limitados tanto no transtorno da personalidade esquizotípica como no transtorno da personalidade evitativa; neste último, porém, um desejo ativo de relacionamentos é inibido por medo de rejeição, ao passo que no transtorno da personalidade esquizotípica há falta de desejo de relacionamentos e distanciamento persistente. Indivíduos com transtorno da personalidade narcisista podem também demonstrar desconfiança, retraimento social ou alienação; no transtorno da personalidade narcisista, porém, essas características derivam basicamente de medos de ter reveladas imperfeições ou falhas. Indivíduos com transtorno da personalidade borderline podem também apresentar sintomas transitórios que parecem psicóticos, mas eles costumam estar mais intimamente ligados a mudanças afetivas em resposta a estresse (p. ex., raiva intensa, ansiedade, desapontamento) e são geralmente mais dissociativos (p. ex., desrealização, despersonalização). Indivíduos com transtorno da personalidade esquizotípica, por sua vez, têm maior tendência a apresentar sintomas duradouros que


Transtorno da Personalidade Antissocial 659 parecem psicóticos, os quais podem piorar sob estresse, e têm menor probabilidade de apresentarem durante todo o tempo sintomas afetivos intensos. Embora possa ocorrer isolamento social no transtorno da personalidade borderline, ele costuma ser mais comumente secundário a fracassos interpessoais repetidos devido a ataques de raiva e mudanças frequentes de humor do que resultado de falta persistente de contatos sociais e de desejo de intimidade. Além disso, pessoas com transtorno da personalidade esquizotípica geralmente não demonstram os comportamentos impulsivos ou manipuladores do indivíduo com transtorno da personalidade borderline. Há, todavia, alta taxa de ocorrência concomitante dos dois transtornos, de modo que fazer tais distinções nem sempre é possível. Características esquizotípicas durante a adolescência costumam ser mais reflexo de turbulência emocional passageira do que um transtorno persistente da personalidade.

Transtornos da Personalidade do Grupo B Transtorno da Personalidade Antissocial Critérios Diagnósticos

301.7 (F60.2)

A. Um padrão difuso de desconsideração e violação dos direitos das outras pessoas que ocorre desde os 15 anos de idade, conforme indicado por três (ou mais) dos seguintes: 1. Fracasso em ajustar-se às normas sociais relativas a comportamentos legais, conforme indicado pela repetição de atos que constituem motivos de detenção. 2. Tendência à falsidade, conforme indicado por mentiras repetidas, uso de nomes falsos ou de trapaça para ganho ou prazer pessoal. 3. Impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro. 4. Irritabilidade e agressividade, conforme indicado por repetidas lutas corporais ou agressões físicas. 5. Descaso pela segurança de si ou de outros. 6. Irresponsabilidade reiterada, conforme indicado por falha repetida em manter uma conduta consistente no trabalho ou honrar obrigações financeiras. 7. Ausência de remorso, conforme indicado pela indiferença ou racionalização em relação a ter ferido, maltratado ou roubado outras pessoas. B. O indivíduo tem no mínimo 18 anos de idade. C. Há evidências de transtorno da conduta com surgimento anterior aos 15 anos de idade. D. A ocorrência de comportamento antissocial não se dá exclusivamente durante o curso de esquizofrenia ou transtorno bipolar.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade antissocial é um padrão difuso de indiferença e violação dos direitos dos outros, o qual surge na infância ou no início da adolescência e continua na vida adulta. Esse padrão também já foi referido como psicopatia, sociopatia ou transtorno da personalidade dissocial. Visto que falsidade e manipulação são aspectos centrais do transtorno da personalidade antissocial, pode ser especialmente útil integrar informações adquiridas por meio de avaliações clínicas sistemáticas e informações coletadas de outras fontes colaterais. Para que esse diagnóstico seja firmado, o indivíduo deve ter no mínimo 18 anos de idade (Critério B) e deve ter apresentado alguns sintomas de transtorno da conduta antes dos 15 anos (Critério C). O transtorno da conduta envolve um padrão repetitivo e persistente de comportamento no qual os direitos básicos dos outros ou as principais normas ou regras sociais apropriadas à idade são violados. Os comportamentos específicos característicos do transtorno da conduta encaixam-se em uma de quatro categorias: agressão a pessoas e animais, destruição de propriedade, fraude ou roubo ou grave violação a regras.


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Transtornos da Personalidade

O padrão de comportamento antissocial continua até a vida adulta. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial não têm êxito em ajustar-se às normas sociais referentes a comportamento legal (Critério A1). Podem repetidas vezes realizar atos que são motivos de detenção (estando já presos ou não), como destruir propriedade alheia, assediar outras pessoas, roubar ou ter ocupações ilegais. Pessoas com esse transtorno desrespeitam os desejos, direitos ou sentimentos dos outros. Com frequência, enganam e manipulam para obter ganho ou prazer pessoal (p. ex., conseguir dinheiro, sexo ou poder) (Critério A2). Podem mentir reiteradamente, usar nomes falsos, trapacear ou fazer maldades. Um padrão de impulsividade pode ser manifestado por fracasso em fazer planos para o futuro (Critério A3). As decisões são tomadas no calor do momento, sem análise e sem consideração em relação às consequências a si ou aos outros; isso pode levar a mudanças repentinas de emprego, moradia ou relacionamentos. Indivíduos com o transtorno tendem a ser irritáveis e agressivos e podem envolver-se repetidamente em lutas corporais ou cometer atos de agressão física (inclusive espancamento de cônjuge ou filho) (Critério A4). (Atos agressivos necessários para defesa própria ou de outra pessoa não são considerados evidência para esse item.) Essas pessoas ainda demonstram descaso pela própria segurança ou pela de outros (Critério A5). Isso pode ser visto no comportamento na direção (i.e., velocidade excessiva recorrente, direção sob intoxicação, múltiplos acidentes). Podem se envolver em comportamento sexual ou uso de substância com alto risco de consequências nocivas. Podem negligenciar ou falhar em cuidar de uma criança a ponto de colocá-la em perigo. Indivíduos com o transtorno da personalidade antissocial também tendem a ser reiterada e extremamente irresponsáveis (Critério A6). Comportamento laboral irresponsável pode ser indicado por períodos significativos de desemprego, a despeito de haver oportunidades de trabalho disponíveis, ou por abandono de vários empregos sem um plano realista de obtenção de outro. Pode também haver um padrão de repetidas ausências ao trabalho que não são explicadas por doença própria ou de familiar. Irresponsabilidade financeira é indicada por atos como inadimplência, fracasso em sustentar regularmente os filhos ou outros dependentes. Indivíduos com o transtorno demonstram pouco remorso pelas consequências de seus atos (Critério A7). Podem ser indiferentes a ter ferido, maltratado ou roubado alguém, racionalizando de modo superficial essas situações (p. ex., “a vida é injusta”, “perdedores merecem perder”). Esses indivíduos podem culpar as vítimas por serem tolas, desamparadas ou merecedoras de seu destino (p. ex., “ele já esperava por isso de qualquer forma”); podem minimizar as consequências danosas de seus atos ou ainda simplesmente demonstrar total indiferença. Em geral, fracassam em compensar ou fazer reparações em razão do seu comportamento. Podem achar que todo mundo deve “ajudar o número um” e que se deve fazer qualquer coisa para evitar ser incomodado. O comportamento antissocial não deve ocorrer exclusivamente durante o curso de esquizofrenia ou transtorno bipolar (Critério D).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial frequentemente carecem de empatia e tendem a ser insensíveis, cínicos e desdenhosos em relação aos sentimentos, direitos e sofrimentos dos outros. Podem ter autoconceito inflado e arrogante (p. ex., sentem que o trabalho comum cotidiano está abaixo deles ou carecem de uma preocupação real a respeito dos seus problemas do momento ou a respeito de seu futuro) e podem ser excessivamente opiniáticos, autoconfiantes ou convencidos. Podem exibir um charme desinibido e superficial e podem ser muito volúveis e verbalmente fluentes (p. ex., usar termos técnicos ou jargão que podem impressionar uma pessoa que desconhece o assunto). Falta de empatia, autoapreciação inflada e charme superficial são aspectos que têm sido comumente incluídos em concepções tradicionais da psicopatia e que podem ser particularmente característicos do transtorno e mais preditivos de recidiva em prisões ou ambientes forenses, onde atos criminosos, delinquentes ou agressivos tendem a ser inespecíficos. Esses indivíduos podem, ainda, ser irresponsáveis e exploradores nos seus relacionamentos sexuais. Podem ter história de vários parceiros sexuais e jamais ter mantido um relacionamento monogâmico. Como pais, podem ser irresponsáveis, conforme evidenciado por desnutrição de um filho, doença de um filho resultante de falta de higiene mínima, dependência de vizinhos


Transtorno da Personalidade Antissocial 661 ou outros familiares para abrigo ou alimento de um filho, fracasso em encontrar um cuidador para um filho pequeno quando está fora de casa ou, ainda, desperdício recorrente do dinheiro necessário para a manutenção doméstica. Esses indivíduos podem ser dispensados do exército de forma desonrosa, fracassar em prover o próprio sustento, empobrecer ou até ficar sem teto ou, ainda, passar muitos anos em institutos penais. São mais propensos a morrer prematuramente de formas violentas (p. ex., suicídio, acidentes, homicídios) do que a população em geral. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial podem também apresentar disforia, incluindo queixas de tensão, incapacidade de tolerar a monotonia e humor deprimido. Podem ter transtornos de ansiedade, transtornos depressivos, transtornos por uso de substância, transtorno de sintomas somáticos, transtorno do jogo e outros transtornos do controle de impulsos associados. Também apresentam com frequência aspectos de personalidade que atendem a critérios de outros transtornos da personalidade, em particular borderline, histriônica e narcisista. A probabilidade de desenvolvimento de transtorno da personalidade antissocial na idade adulta aumenta se o transtorno da conduta do indivíduo teve início na infância (antes dos 10 anos) e se houve também déficit de atenção/hiperatividade associado. Abuso ou negligência infantil, paternidade/maternidade instável ou errática ou disciplina parental inconsistente podem aumentar a probabilidade de o transtorno da conduta evoluir para transtorno da personalidade antissocial.

Prevalência Taxas de prevalência de 12 meses de transtorno da personalidade antissocial, utilizando critérios de DSMs anteriores, situam-se entre 0,2 e 3,3%. A mais alta (maior do que 70%) está entre as amostras mais graves de indivíduos do sexo masculino com transtorno por uso de álcool em clínicas especializadas em abuso de substância, prisões ou outros ambientes forenses. A prevalência é maior em amostras afetadas por fatores socioeconômicos (i.e., pobreza) ou socioculturais (migração) adversos.

Desenvolvimento e Curso O transtorno da personalidade antissocial tem um curso crônico, mas pode se tornar menos evidente ou apresentar remissão conforme o indivíduo envelhece, em particular por volta da quarta década de vida. Embora essa remissão tenda a ser especialmente evidente quanto a envolvimento em comportamento criminoso, é possível que haja diminuição no espectro total de comportamentos antissociais e uso de substância. Por definição, a personalidade antissocial não pode ser diagnosticada antes dos 18 anos de idade.

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. Transtorno da personalidade antissocial é mais comum entre familiares biológicos de primeiro grau daqueles que têm o transtorno em comparação com a população em geral. O risco para familiares biológicos de mulheres com o transtorno tende a ser maior do que aquele para familiares biológicos de homens com o transtorno. Familiares biológicos de indivíduos com a doença têm ainda risco aumentado de transtorno de sintomas somáticos e por uso de substância. Dentro de uma família na qual um membro apresenta transtorno da personalidade antissocial, os indivíduos do sexo masculino têm mais frequentemente transtorno da personalidade antissocial e por uso de substância, ao passo que os do feminino apresentam com mais frequência transtorno de sintomas somáticos. Nessas famílias, no entanto, há prevalência aumentada de todos esses transtornos em ambos os sexos em comparação com a população em geral. Estudos sobre adoção indicam que fatores genéticos e ambientais contribuem para o risco de desenvolvimento do transtorno da personalidade antissocial. Tanto filhos adotivos quanto biológicos de pais com o transtorno têm risco aumentado de desenvolver transtorno da personalidade antissocial, transtorno de sintomas somáticos e transtornos por uso de substância. Crianças que conviveram algum tempo com os pais biológicos e depois foram encaminhadas


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Transtornos da Personalidade

para adoção assemelham-se mais aos pais biológicos do que aos adotivos, embora o ambiente da família adotiva influencie o risco de desenvolvimento de um transtorno da personalidade e psicopatologia relacionada.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura O transtorno da personalidade antissocial parece ter ligação com condição socioeconômica baixa e contextos urbanos. Surgiram preocupações de que o diagnóstico possa, algumas vezes, ser mal aplicado a indivíduos em contextos em que comportamentos aparentemente antissociais possam ser parte de uma estratégia protetora de sobrevivência. Na avaliação de traços antissociais, é útil para o clínico levar em conta o contexto social e econômico em que ocorrem os comportamentos.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno da personalidade antissocial é muito mais comum no sexo masculino do que no feminino. Têm havido algumas preocupações acerca da possibilidade de esse transtorno ser subdiagnosticado em indivíduos do sexo feminino, especialmente pela ênfase em itens de agressividade na definição do transtorno da conduta.

Diagnóstico Diferencial O diagnóstico de transtorno da personalidade antissocial não é dado a indivíduos com menos de 18 anos e somente é atribuído quando há história de alguns sintomas de transtorno da conduta antes dos 15 anos de idade. Para indivíduos com mais de 18 anos, um diagnóstico de transtorno da conduta somente é dado quando não são atendidos os critérios para transtorno da personalidade antissocial. Transtornos por uso de substância. Quando o comportamento antissocial em um adulto está associado a um transtorno por uso de substância, o diagnóstico de transtorno da personalidade antissocial não é feito a não ser que os sinais desse transtorno também tenham estado presentes na infância e continuado até a vida adulta. Quando tanto o uso de substância quanto o comportamento antissocial começaram na infância e se mantiveram na vida adulta, ambos devem ser diagnosticados caso sejam satisfeitos os critérios para os dois, mesmo que alguns atos antissociais possam ser consequência do transtorno por uso de substância (p. ex., venda ilegal de drogas, roubos para obter dinheiro para drogas). Esquizofrenia e transtorno bipolar. Comportamento antissocial que ocorre exclusivamente durante o curso de esquizofrenia ou transtorno bipolar não deve ser diagnosticado como transtorno da personalidade antissocial. Outros transtornos da personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com transtorno da personalidade antissocial pelo fato de apresentarem alguns aspectos em comum. Assim, é importante, então, distinguir entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem a critérios para um ou mais transtornos da personalidade além do transtorno da personalidade antissocial, todos podem ser diagnosticados. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial e transtorno da personalidade narcisista compartilham uma tendência a determinação exagerada, desembaraço, superficialidade, exploração e falta de empatia. O transtorno da personalidade narcisista, porém, não inclui características de impulsividade, agressão e falsidade. Além disso, indivíduos com transtorno da personalidade antissocial podem não ser tão necessitados de admiração e inveja dos outros, e pessoas com o transtorno da personalidade narcisista costumam carecer de uma história de transtorno da conduta na infância ou comportamento criminoso na vida adulta. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial e transtorno da personalidade histriônica compartilham uma tendência a serem impulsivos, superficiais, incansáveis, sedutores, manipuladores e a buscarem emoções, mas aqueles com transtorno da personalidade histriônica tendem a ser mais exagerados nas emoções e não costumam se envolver em comportamentos antissociais. Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica e borderline


Transtorno da Personalidade Borderline 663 manipulam para obter atenção, ao passo que aqueles com transtorno da personalidade antissocial manipulam para obter lucro, poder ou outra gratificação material. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial tendem a ser menos instáveis emocionalmente e mais agressivos do que aqueles com transtorno da personalidade borderline. Embora comportamento antissocial possa estar presente em alguns indivíduos com transtorno da personalidade paranoide, ele não costuma ser motivado por desejo de ganho pessoal ou exploração dos outros como no transtorno da personalidade antissocial; o que os move é mais frequentemente um desejo de vingança. Comportamento criminoso não associado a um transtorno da personalidade. O transtorno da personalidade antissocial deve ser distinguido do comportamento criminoso realizado para obter algum ganho e que não é acompanhado pelas características de personalidade que são parte desse transtorno. Apenas quando os traços da personalidade antissocial forem inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causarem prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos é que constituirão transtorno da personalidade antissocial.

Transtorno da Personalidade Borderline Critérios Diagnósticos

301.83 (F60.3)

Um padrão difuso de instabilidade das relações interpessoais, da autoimagem e dos afetos e de impulsividade acentuada que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por cinco (ou mais) dos seguintes: 1. Esforços desesperados para evitar abandono real ou imaginado. (Nota: Não incluir comportamento suicida ou de automutilação coberto pelo Critério 5.) 2. Um padrão de relacionamentos interpessoais instáveis e intensos caracterizado pela alternância entre extremos de idealização e desvalorização. 3. Perturbação da identidade: instabilidade acentuada e persistente da autoimagem ou da percepção de si mesmo. 4. Impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente autodestrutivas (p. ex., gastos, sexo, abuso de substância, direção irresponsável, compulsão alimentar). (Nota: Não incluir comportamento suicida ou de automutilação coberto pelo Critério 5.) 5. Recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento automutilante. 6. Instabilidade afetiva devida a uma acentuada reatividade de humor (p. ex., disforia episódica, irritabilidade ou ansiedade intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas raramente de mais de alguns dias). 7. Sentimentos crônicos de vazio. 8. Raiva intensa e inapropriada ou dificuldade em controlá-la (p. ex., mostras frequentes de irritação, raiva constante, brigas físicas recorrentes). 9. Ideação paranoide transitória associada a estresse ou sintomas dissociativos intensos.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade borderline é um padrão difuso de instabilidade das relações interpessoais, da autoimagem e de afetos e de impulsividade acentuada que surge no começo da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com o transtorno da personalidade borderline tentam de tudo para evitar abandono real ou imaginado (Critério 1). A percepção de uma separação ou rejeição iminente ou a perda de estrutura externa podem levar a mudanças profundas na autoimagem, no afeto, na cognição e no comportamento. Esses indivíduos são muito sensíveis às circunstâncias ambientais. Vivenciam medos intensos de abandono e experimentam raiva inadequada mesmo diante de uma separação de curto prazo realística ou quando ocorrem mudanças inevitáveis de planos (p. ex., desespero repentino em reação ao aviso do clínico de que a consulta acabou; pânico ou fúria quando alguém importante para eles se atrasa alguns minutos ou precisa cancelar um compro-


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Transtornos da Personalidade

misso). Esses indivíduos podem achar que esse “abandono” implica que eles são “maus”. Tais medos de abandono têm relação com intolerância a ficar só e necessidade de ter outras pessoas ao redor. Os esforços desesperados para evitar o abandono podem incluir ações impulsivas como automutilação ou comportamentos suicidas, os quais são descritos separadamente no Critério 5. As pessoas com transtorno da personalidade borderline apresentam um padrão de relacionamentos instável e intenso (Critério 2). Podem idealizar cuidadores ou companheiros potenciais em um primeiro ou segundo encontro, exigir ficar muito tempo juntos e partilhar os detalhes pessoais mais íntimos logo no início de um relacionamento. Entretanto, podem mudar rapidamente da idealização à desvalorização, sentindo que a outra pessoa não se importa o suficiente, não dá o suficiente e não está “presente” o suficiente. Esses indivíduos podem empatizar e cuidar de outros, mas somente com a expectativa de que o outro estará presente quando chamado, em uma espécie de troca para atender às suas próprias necessidades. Estão propensos a mudanças dramáticas e repentinas na sua forma de enxergar os outros, que podem ser vistos alternadamente como apoiadores benevolentes ou como punidores cruéis. Tais mudanças, em geral, refletem desilusão com um cuidador cujas qualidades de dedicação haviam sido idealizadas ou cuja rejeição ou abandono era esperado. Pode ocorrer uma perturbação da identidade, caracterizada por instabilidade acentuada e persistente da imagem ou da percepção de si mesmo (Critério 3). Há mudanças súbitas e dramáticas na autoimagem, caracterizadas por metas, valores e aspirações vocacionais inconstantes. Podem ocorrer mudanças súbitas em opiniões e planos sobre carreira profissional, identidade sexual, valores e tipos de amigos. Esses indivíduos podem repentinamente mudar de um papel de suplicantes necessitados de ajuda para o papel de vingadores justos de maus-tratos passados. Embora costumem ter uma autoimagem baseada em serem maus, indivíduos com esse transtorno podem por vezes apresentar sentimentos de que eles mesmos não existem. Tais experiências ocorrem geralmente em situações nas quais o indivíduo sente falta de relações significativas, de cuidado e de apoio. Podem demonstrar um desempenho pior em situações não estruturadas de trabalho ou estudo. Indivíduos com transtorno da personalidade borderline mostram impulsividade em pelo menos duas áreas potencialmente autodestrutivas (Critério 4). Podem apostar, gastar dinheiro de forma irresponsável, comer compulsivamente, abusar de substâncias, envolver-se em sexo desprotegido ou dirigir de forma imprudente. Apresentam recorrência de comportamento, gestos ou ameaças suicidas ou de comportamento de automutilação (Critério 5). Suicídio ocorre em 8 a 10% de tais indivíduos, sendo que atos de automutilação (p. ex., cortes ou queimaduras) e ameaças e tentativas de suicídio são muito comuns. A ideação suicida recorrente é com frequência a razão pela qual essas pessoas buscam ajuda. Esses atos autodestrutivos são geralmente precipitados por ameaças de separação ou rejeição ou por expectativas de que o indivíduo assuma maiores responsabilidades. A automutilação pode ocorrer durante experiências dissociativas e com frequência traz alívio por reafirmar a capacidade do indivíduo de sentir ou por expiar a sensação de ser uma má pessoa. Indivíduos com o transtorno podem demonstrar instabilidade afetiva devido a acentuada reatividade do humor (p. ex., disforia episódica, irritabilidade ou ansiedade intensa com duração geralmente de poucas horas e apenas raramente com duração de mais do que alguns dias) (Critério 6). O humor disfórico basal dos que têm esse transtorno é amiúde interrompido por períodos de raiva, pânico ou desespero e é raramente aliviado por períodos de bem-estar ou satisfação. Esses episódios podem refletir a extrema reatividade do indivíduo a estresses interpessoais. Indivíduos com o transtorno podem ser perturbados por sentimentos crônicos de vazio (Critério 7). Facilmente entediados, podem estar constantemente buscando algo para fazer. Com frequência expressam raiva inadequada e intensa ou têm dificuldades em controlá-la (Critério 8). Podem demonstrar sarcasmo extremo, amargura persistente ou ter explosões verbais. A raiva é geralmente provocada quando um cuidador ou companheiro é visto como negligente, contido, despreocupado ou como alguém que abandona. Tais expressões de raiva costumam ser seguidas de vergonha e culpa, contribuindo para o sentimento de ter sido mau. Durante períodos de estresse extremo, podem ocorrer ideação paranoide ou sintomas dissociativos transitórios (p. ex., despersonalização) (Critério 9), embora sejam, em geral, de gravidade ou duração insuficiente para levar a um diagnóstico adicional. Esses episódios ocorrem mais frequentemente em resposta a um aban-


Transtorno da Personalidade Borderline 665 dono real ou imaginado. Os sintomas tendem a ser passageiros, durando de minutos a horas. O retorno real ou percebido da dedicação do cuidador pode resultar em remissão dos sintomas.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade borderline podem ter um padrão de sabotagem pessoal no momento em que uma meta está para ser atingida (p. ex., abandono da escola logo antes da formatura; regressão grave após conversa sobre os bons rumos da terapia; destruição de um relacionamento bom exatamente quando está claro que ele pode durar). Alguns indivíduos desenvolvem sintomas semelhantes à psicose (p. ex., alucinações, distorções da imagem corporal, ideias de referência, fenômenos hipnagógicos) em momentos de estresse. Indivíduos com esse transtorno podem se sentir mais protegidos junto a objetos transicionais (i.e., animal de estimação ou objeto inanimado) do que em relacionamentos interpessoais. Pode ocorrer morte prematura por suicídio em indivíduos com o transtorno, especialmente naqueles em que há ocorrência simultânea de transtornos depressivos ou transtornos por uso de substância. Deficiências físicas podem resultar de comportamentos de abuso autoinfligidos ou de tentativas fracassadas de suicídio. Perdas de emprego recorrentes, interrupção da educação e separação ou divórcio são comuns. Abuso físico e sexual, negligência, conflito hostil e perda parental prematura são mais comuns em histórias de infância daqueles com o transtorno da personalidade borderline. Transtornos comuns de se observar concomitantemente incluem transtornos depressivo e bipolar, transtornos por uso de substância, transtornos alimentares (sobretudo bulimia nervosa), transtorno de estresse pós-traumático e transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. O transtorno da personalidade borderline também ocorre frequentemente com outros transtornos da personalidade.

Prevalência A prevalência média do transtorno da personalidade borderline na população é estimada em 1,6%, embora possa chegar a 5,9%. Essa prevalência é de aproximadamente 6% em contextos de atenção primária, de cerca de 10% entre pacientes de ambulatórios de saúde mental e de por volta de 20% entre pacientes psiquiátricos internados. A prevalência do transtorno pode diminuir nas faixas etárias mais altas.

Desenvolvimento e Curso Há considerável variação no curso do transtorno da personalidade borderline. O padrão mais comum é o de instabilidade crônica no início da vida adulta, com episódios graves de descontrole afetivo e impulsivo e níveis altos de uso dos recursos de saúde e saúde mental. O prejuízo decorrente do transtorno e o risco de suicídio são maiores entre os adultos jovens e desaparecem gradualmente com o avançar da idade. Embora a tendência para emoções intensas, impulsividade e intensidade nos relacionamentos costume perdurar a vida toda, indivíduos que se engajam em intervenções terapêuticas frequentemente demonstram melhoras que iniciam em algum momento durante o primeiro ano. Dos 30 aos 50 anos, a maioria dos indivíduos com o transtorno alcança estabilidade maior nos seus relacionamentos e no seu funcionamento profissional. Estudos de seguimento de indivíduos identificados por meio de ambulatórios de saúde mental indicam que, após cerca de 10 anos, até metade deles não mais apresenta um padrão de comportamento que atenda aos critérios para o transtorno da personalidade borderline.

Fatores de Risco e Prognóstico Genéticos e fisiológicos. O transtorno da personalidade borderline é cerca de cinco vezes mais comum em parentes biológicos de primeiro grau de pessoas com o transtorno do que na população em geral. Também há aumento do risco familiar para transtornos por uso de substância, transtorno da personalidade antissocial e transtorno depressivo ou bipolar.


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Transtornos da Personalidade

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura O padrão de comportamento encontrado no transtorno da personalidade borderline tem sido identificado em muitos contextos mundo afora. Adolescentes e adultos jovens com problemas de identidade (especialmente quando acompanhados de uso de substância) podem apresentar de forma transitória comportamentos que enganosamente dão a impressão de transtorno da personalidade borderline. Tais situações são caracterizadas por instabilidade emocional, dilemas “existenciais”, incertezas, escolhas causadoras de ansiedade, conflitos sobre orientação sexual e pressões sociais para decisão sobre a carreira profissional.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno da personalidade borderline é diagnosticado predominantemente (cerca de 75%) em indivíduos do sexo feminino.

Diagnóstico Diferencial Transtornos depressivo e bipolar. O transtorno da personalidade borderline frequentemente ocorre de forma concomitante com transtornos depressivos ou bipolares, e, quando atendidos critérios para ambos, os dois podem ser diagnosticados. Visto que a apresentação momentânea do transtorno da personalidade borderline pode ser mimetizada por um episódio de transtorno depressivo ou bipolar, o clínico deve evitar firmar um diagnóstico adicional de transtorno da personalidade borderline com base apenas na apresentação momentânea, sem ter documentado que o padrão teve começo precoce e curso prolongado. Outros transtornos da personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com o transtorno da personalidade borderline pelo fato de apresentarem alguns aspectos em comum. Assim, é importante fazer a distinção entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem aos critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade borderline, todos podem ser diagnosticados. Ainda que o transtorno da personalidade histriônica possa ser também caracterizado por busca de atenção, comportamento manipulativo e por mudanças rápidas nas emoções, o transtorno da personalidade borderline distingue-se por autodestrutividade, ataques de raiva nos relacionamentos íntimos e sentimentos crônicos de vazio profundo e solidão. Ideias ou ilusões paranoides podem estar presentes nos transtornos da personalidade borderline e esquizotípica, mas esses sintomas, no transtorno da personalidade borderline, são mais transitórios, reativos a problemas interpessoais e responsivos à estruturação externa. Embora os transtornos da personalidade paranoide e narcisista possam ser também caracterizados por reação de raiva a estímulos mínimos, a relativa estabilidade da autoimagem, assim como a relativa falta de autodestrutividade, impulsividade e preocupações acerca de abandono, distinguem esses transtornos do transtorno da personalidade borderline. Mesmo que os transtornos da personalidade antissocial e borderline sejam caracterizados por comportamento manipulativo, indivíduos com o primeiro manipulam para obter lucro, poder ou alguma outra gratificação material, ao passo que o alvo, no transtorno da personalidade borderline, é a obtenção de atenção dos cuidadores. Tanto o transtorno da personalidade dependente quanto o transtorno da personalidade borderline são caracterizados por medo de abandono; entretanto, o indivíduo com este último reage ao abandono com sentimentos de vazio emocional, fúria e exigências, ao passo que aquele com transtorno da personalidade dependente reage com calma e submissão e busca urgentemente uma relação substituta que dê atenção e apoio. O transtorno da personalidade borderline pode ser também distinguido do transtorno da personalidade dependente por seu padrão típico de relações instáveis e intensas. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade borderline deve ser distinguido de mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central.


Transtorno da Personalidade Histriônica 667 Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade borderline deve ainda ser distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância. Problemas de identidade. O transtorno da personalidade borderline deve ser distinguido de um problema de identidade, o qual é reservado para preocupações quanto à identidade relativas a uma fase de desenvolvimento (p. ex., adolescência) e não se qualifica como um transtorno mental.

Transtorno da Personalidade Histriônica Critérios Diagnósticos

301.50 (F60.4)

Um padrão difuso de emocionalidade e busca de atenção em excesso que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por cinco (ou mais) dos seguintes: 1. Desconforto em situações em que não é o centro das atenções. 2. A interação com os outros é frequentemente caracterizada por comportamento sexualmente sedutor inadequado ou provocativo. 3. Exibe mudanças rápidas e expressão superficial das emoções. 4. Usa reiteradamente a aparência física para atrair a atenção para si. 5. Tem um estilo de discurso que é excessivamente impressionista e carente de detalhes. 6. Mostra autodramatização, teatralidade e expressão exagerada das emoções. 7. É sugestionável (i.e., facilmente influenciado pelos outros ou pelas circunstâncias). 8. Considera as relações pessoais mais íntimas do que na realidade são.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade histriônica é a emocionalidade excessiva e difusa e o comportamento de busca de atenção. Esse padrão surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com o transtorno da personalidade histriônica sentem-se desconfortáveis ou não valorizados quando não estão no centro das atenções (Critério 1). Normalmente cheios de vida e dramáticos, tendem a atrair atenção para si mesmos e podem inicialmente fazer novas amizades por seu entusiasmo, abertura aparente ou sedução. Essas qualidades se extinguem, todavia, à medida que esses indivíduos demandam continuadamente ser o centro das atenções. Eles comandam o papel de “vida da festa”. Caso não sejam o centro das atenções, podem fazer algo dramático (p. ex., inventar histórias, criar uma cena) para atrair o foco da atenção para si. Tal necessidade é com frequência aparente em seu comportamento com um clínico (p. ex., elogiar, levar presentes, dar descrições dramáticas de sintomas físicos e psicológicos que são substituídos por novos sintomas a cada consulta). A aparência e o comportamento de indivíduos com esse transtorno são, em geral, sexualmente provocativos ou sedutores de forma inadequada (Critério 2). Esse comportamento é voltado não somente às pessoas por quem o indivíduo tem interesse romântico ou sexual, mas ocorre também em uma grande variedade de relacionamentos sociais, ocupacionais e profissionais, além do que seria apropriado ao contexto social. A expressão emocional pode ser superficial e rapidamente cambiante (Critério 3). Os indivíduos com o transtorno usam reiteradamente a aparência física para atrair as atenções para si (Critério 4). São excessivamente preocupados em impressionar os outros por meio de sua aparência e dedicam muito tempo, energia e dinheiro a roupas e embelezamento. Podem buscar elogios acerca da aparência e também ficar chateados de forma fácil e excessiva em virtude de algum comentário crítico sobre como estão ou por uma fotografia que porventura considerem não lisonjeira. Esses indivíduos têm um estilo de discurso excessivamente impressionista e carente de detalhes (Critério 5). Opiniões fortes são expressas de forma dramática, mas as razões subjacentes costumam ser vagas e difusas, sem fatos e detalhes de apoio. Por exemplo, um indivíduo com transtorno da personalidade histriônica pode comentar que determinada pessoa é um ser huma-


668

Transtornos da Personalidade

no maravilhoso, ainda que não consiga oferecer qualquer exemplo específico de boas qualidades que apoiem sua opinião. Indivíduos com esse transtorno são caracterizados pela autodramatização, pela teatralidade e pela expressão exagerada das emoções (Critério 6). Podem envergonhar amigos e conhecidos pela exibição pública excessiva de emoções (p. ex., abraçar conhecidos casuais com entusiasmo demasiado, chorar de forma inconsolável em ocasiões sentimentais de importância menor, ter ataques de raiva repentinos). Suas emoções, no entanto, frequentemente parecem ser ligadas ou desligadas com muita rapidez para serem sentidas em profundidade, o que pode levar os outros a acusá-los de dissimular esses sentimentos. Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica são altamente sugestionáveis (Critério 7). Suas opiniões e sentimentos são facilmente influenciados pelos outros ou por modismos presentes. Podem confiar em demasia, em especial em figuras fortes de autoridade que veem como capazes de solucionar de forma mágica seus problemas. Têm tendência a dar palpites e a adotar convicções rapidamente. Costumam considerar as relações pessoais como mais íntimas do que realmente são, descrevendo quase todos os conhecidos como “meu queridíssimo amigo” ou fazendo referência a médicos que encontraram uma ou duas vezes em circunstâncias profissionais por seus primeiros nomes (Critério 8).

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica podem ter dificuldades em alcançar intimidade emocional em relacionamentos românticos ou sexuais. Sem se dar conta disso, costumam desempenhar um papel (p. ex., “vítima” ou “princesa”) em suas relações com os outros. Podem buscar controlar seu parceiro por meio de manipulação emocional ou sedução em um nível, ao mesmo tempo que mostram dependência acentuada deles em outro nível. Indivíduos com esse transtorno geralmente têm relacionamentos difíceis com amigos do mesmo sexo, pois seu estilo interpessoal sexualmente provocativo pode parecer uma ameaça aos relacionamentos afetivos destes. Esses indivíduos podem também afastar os amigos com exigências de atenção constante. Com frequência ficam deprimidos e aborrecidos quando não são o centro das atenções. Podem buscar obstinadamente novidades, estímulos e excitação e ter tendência a entediar-se com a rotina. Não costumam tolerar ou se sentem frustrados por situações envolvendo atraso de gratificação, sendo suas ações costumeiramente voltadas à obtenção de satisfação imediata. Embora com frequência comecem um trabalho ou projeto com muito entusiasmo, seu interesse pode se dissipar rapidamente. Relacionamentos de longa data podem ser negligenciados para dar espaço à excitação de novos relacionamentos. O risco real de suicídio não é conhecido, mas a experiência clínica sugere que esses indivíduos estão sob risco aumentado de gestos e ameaças suicidas que realizam com o intuito de obter atenção e coagir os demais a oferecer melhores cuidados. O transtorno da personalidade histriônica tem sido associado a taxas mais altas de transtorno de sintomas somáticos, transtorno conversivo (transtorno de sintomas neurológicos funcionais) e transtorno depressivo maior. Com frequência, os transtornos da personalidade borderline, narcisista, antissocial e dependente ocorrem de forma concomitante.

Prevalência Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions de 2001-2002 sugerem uma prevalência de personalidade histriônica de 1,84%.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Normas de comportamento interpessoal, aparência pessoal e expressão emocional variam amplamente entre culturas, gêneros e faixas etárias. Antes de considerar os vários traços (p. ex., emocionalidade, sedução, estilo interpessoal dramático, busca por novidades, sociabilidade, charme, impressionabilidade, tendência à somatização) como evidência de transtorno da personalidade histriônica, é importante avaliar se causam prejuízo ou sofrimento clinicamente significativos.


Transtorno da Personalidade Narcisista 669

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Em contextos clínicos, esse transtorno foi diagnosticado com mais frequência no sexo feminino; contudo, a proporção entre os sexos não é significativamente diferente da proporção sexual feminina encontrada no contexto clínico respectivo. De forma contrastante, alguns estudos usando avaliações estruturadas informam taxas de prevalência similares entre ambos os sexos.

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com o transtorno da personalidade histriônica pelo fato de apresentarem alguns aspectos em comum. Assim, é importante distinguir entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem aos critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade histriônica, todos podem ser diagnosticados. Embora o transtorno da personalidade borderline possa também ser caracterizado por busca de atenção, comportamento manipulativo e mudanças rápidas de emoções, ele é distinguido pela autodestrutividade, pelos rompantes de raiva nos relacionamentos íntimos e pelos sentimentos crônicos de vazio profundo e perturbação da identidade. Indivíduos com os transtornos da personalidade antissocial e histriônica compartilham uma tendência a impulsividade, superficialidade, busca de excitação, descuido, sedução e manipulação, mas pessoas com o transtorno da personalidade histriônica tendem a ser mais exageradas nas suas emoções e não costumam envolver-se em comportamentos antissociais. Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica manipulam para obter cuidados, ao passo que aqueles com transtorno da personalidade antissocial manipulam para obter lucro, poder ou alguma outra gratificação material. Embora indivíduos com transtorno da personalidade narcisista também busquem obstinadamente a atenção dos outros, eles geralmente querem elogios por sua “superioridade”, enquanto pessoas com transtorno da personalidade histriônica desejam ser vistas como frágeis ou dependentes caso isso sirva para a obtenção de atenção. Indivíduos com transtorno da personalidade narcisista podem exagerar a intimidade dos seus relacionamentos com outras pessoas, mas estão mais aptos a reforçar a condição “VIP” ou a riqueza dos amigos. No transtorno da personalidade dependente, o indivíduo é excessivamente dependente dos outros quanto a elogios e orientação, mas não apresenta as características exibicionistas, exageradas e emocionais daqueles com o transtorno da personalidade histriônica. Muitos indivíduos podem exibir traços da personalidade histriônica. Esses traços somente constituem o transtorno quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade histriônica deve ser distinguido da mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno deve também ser diferenciado de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância.

Transtorno da Personalidade Narcisista Critérios Diagnósticos

301.81 (F60.81)

Um padrão difuso de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), necessidade de admiração e falta de empatia que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por cinco (ou mais) dos seguintes: 1. Tem uma sensação grandiosa da própria importância (p. ex., exagera conquistas e talentos, espera ser reconhecido como superior sem que tenha as conquistas correspondentes). 2. É preocupado com fantasias de sucesso ilimitado, poder, brilho, beleza ou amor ideal.


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Transtornos da Personalidade 3. Acredita ser “especial” e único e que pode ser somente compreendido por, ou associado a, outras pessoas (ou instituições) especiais ou com condição elevada. 4. Demanda admiração excessiva. 5. Apresenta um sentimento de possuir direitos (i.e., expectativas irracionais de tratamento especialmente favorável ou que estejam automaticamente de acordo com as próprias expectativas). 6. É explorador em relações interpessoais (i.e., tira vantagem de outros para atingir os próprios fins). 7. Carece de empatia: reluta em reconhecer ou identificar-se com os sentimentos e as necessidades dos outros. 8. É frequentemente invejoso em relação aos outros ou acredita que os outros o invejam. 9. Demonstra comportamentos ou atitudes arrogantes e insolentes.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade narcisista é um padrão difuso de grandiosidade, necessidade de admiração e falta de empatia que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com o transtorno têm um sentimento grandioso da própria importância (Critério 1). Superestimam de forma rotineira suas capacidades e exageram suas conquistas, com frequência parecendo pretensiosos e arrogantes. Podem tranquilamente partir do pressuposto de que os outros atribuem o mesmo valor aos seus esforços e podem surpreender-se quando o elogio que esperam e o sentimento que sentem merecer não ocorrem. Comumente implícita nos juízos inflados das próprias conquistas está uma subestimação (desvalorização) das contribuições dos outros. Indivíduos com transtorno da personalidade narcisista estão frequentemente preocupados com fantasias de sucesso ilimitado, poder, brilho, beleza ou amor ideal (Critério 2). Podem ruminar acerca de admiração e privilégios “há muito devidos” e comparar-se favoravelmente a pessoas famosas ou privilegiadas. As pessoas com esse transtorno creem ser superiores, especiais ou únicas e esperam que os outros as reconheçam como tal (Critério 3). Podem sentir que são somente compreendidas por outras pessoas especiais ou de condição elevada, e apenas com elas devem se associar, podendo atribuir qualidades como “únicas”, “perfeitas” e “dotadas” àquelas com quem se associam. Indivíduos com esse transtorno acreditam que suas necessidades são especiais e estão além do conhecimento das pessoas comuns. Sua própria autoestima é realçada (i.e., “espelhada”) pelo valor idealizado que conferem àqueles com quem se associam. Tendem a insistir em ser atendidos apenas por pessoas “top” (médico, advogado, cabeleireiro, instrutor) ou em ser afiliados às “melhores” instituições, embora possam desvalorizar as credenciais daqueles que os desapontam. Indivíduos com esse transtorno geralmente exigem admiração excessiva (Critério 4). Sua autoestima é quase invariavelmente muito frágil. Podem estar preocupados com o quão bem estão se saindo e o quão favoravelmente os outros os consideram. Isso costuma assumir a forma de uma necessidade constante de atenção e admiração. Podem esperar que sua chegada seja saudada com grandes comemorações e ficam atônitos quando os outros não cobiçam seus pertences. Podem constantemente buscar elogios, em geral com muita sedução. Fica evidente nesses indivíduos uma sensação de possuir direitos por meio das expectativas irracionais de tratamento especialmente favorável que apresentam (Critério 5). Esperam ser servidos e ficam atônitos ou furiosos quando isso não acontece. Por exemplo, podem supor que não precisam aguardar em filas e que suas prioridades são tão importantes que os outros farão uma deferência a eles, irritando-se depois quando estes não os auxiliam “em seu trabalho tão importante”. Essa sensação de possuir direitos, combinada com falta de sensibilidade aos desejos e necessidades dos outros, pode resultar na exploração consciente ou involuntária de outras pessoas (Critério 6). Esperam receber qualquer coisa que desejarem ou sintam necessitar, independentemente do que isso possa significar para os outros. Por exemplo, esses indivíduos podem esperar uma grande dedicação dos outros e podem explorá-los abusivamente sem dar importância ao impacto que esse fato pode ter em suas vidas. Tendem a formar relações de amizade ou romance somente se a outra pessoa parece possibilitar o avanço de seus propósitos ou, então, incrementar sua autoestima. Costumam usurpar privilégios especiais e recursos extraordinários que creem merecer por serem tão especiais. Indivíduos com o transtorno geralmente apresentam falta de empatia e dificuldade de reconhecer os desejos, as experiências subjetivas e os sentimentos das outras pessoas (Critério 7).


Transtorno da Personalidade Narcisista 671 Podem pressupor que os outros estão totalmente preocupados com seu bem-estar. Tendem a discutir suas próprias preocupações de forma detalhada e prolongada, ao mesmo tempo que falham em reconhecer que os demais também têm sentimentos e necessidades. Com frequência são desdenhosos e impacientes com outros que falam sobre seus próprios problemas e preocupações. Podem não enxergar o quanto ferem os demais com seus comentários (p. ex., dizer exageradamente a um ex-companheiro “Agora estou em um relacionamento para toda a vida!”; alardear a saúde diante de alguém doente). Quando reconhecidos, as necessidades, os desejos ou os sentimentos das outras pessoas são provavelmente encarados de forma depreciativa como sinais de fraqueza ou vulnerabilidade. Aqueles que se relacionam com indivíduos com transtorno da personalidade narcisista costumam encontrar frieza emocional e falta de interesse recíproco. Esses indivíduos tendem a invejar os outros ou a acreditar que estes os invejam (Critério 8). Podem ver com má vontade o sucesso ou os pertences das outras pessoas, sentindo que eles é que são os reais merecedores de tais conquistas, admiração ou privilégios. Podem desvalorizar grosseiramente as contribuições dos outros, sobretudo quando essas pessoas receberam reconhecimento ou elogio pelo que realizaram. Comportamentos arrogantes e insolentes caracterizam esses indivíduos; com frequência exibem esnobismo, desdém ou atitudes condescendentes (Critério 9). Por exemplo, um indivíduo com esse transtorno pode se queixar da “grosseria” ou “estupidez” de um garçom desajeitado ou concluir uma avaliação médica com uma apreciação condescendente do médico.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico A vulnerabilidade na autoestima torna os indivíduos com transtorno da personalidade narcisista muito sensíveis a “feridas” resultantes de crítica ou derrota. Embora possam não evidenciar isso de forma direta, a crítica pode assustá-los, deixando neles sentimentos de humilhação, degradação, vácuo e vazio. Podem reagir com desdém, fúria ou contra-ataque desafiador. Tais vivências geralmente levam a retraimento social ou a uma aparência de humildade que pode mascarar e proteger a grandiosidade. Relações interpessoais costumam ser afetadas devido a problemas resultantes da crença no merecimento de privilégios, da necessidade de admiração e da relativa desconsideração das sensibilidades dos outros. Embora ambição e confiança desmedidas possam levar a grandes conquistas, o desempenho pode ser comprometido pela intolerância a críticas ou derrotas. O desempenho no trabalho às vezes pode ser muito baixo, refletindo falta de disposição de se arriscar em situações competitivas ou em outras em que há possibilidade de derrota. Sentimentos persistentes de vergonha ou humilhação e a autocrítica acompanhante podem estar associados a retraimento social, humor deprimido e transtorno depressivo persistente (distimia) ou transtorno depressivo maior. Por sua vez, períodos sustentados de grandiosidade podem estar associados a humor hipomaníaco. O transtorno da personalidade narcisista está ainda associado a anorexia nervosa e transtornos por uso de substância (especialmente relacionados a cocaína). Transtornos da personalidade histriônica, borderline, antissocial e paranoide podem estar associados ao transtorno da personalidade narcisista.

Prevalência As estimativas de prevalência do transtorno da personalidade narcisista, com base nas definições do DSM-IV, variam de 0 a 6,2% em amostras de comunidades.

Desenvolvimento e Curso Traços narcisistas podem ser particularmente comuns em adolescentes e não necessariamente indicam que a pessoa vai desenvolver o transtorno da personalidade narcisista. Indivíduos com esse transtorno podem ter dificuldades especiais de adaptação ao surgimento de limitações físicas e profissionais inerentes ao processo de envelhecimento.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Entre aqueles diagnosticados com transtorno da personalidade narcisista, 50 a 75% são do sexo masculino.


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Transtornos da Personalidade

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com o da personalidade narcisista pelo fato de apresentarem alguns aspectos em comum. Assim, é importante distinguir entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem aos critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade narcisista, todos podem ser diagnosticados. A característica mais útil à discriminação do transtorno da personalidade narcisista dos transtornos da personalidade histriônica, antissocial e borderline, nos quais os estilos de interação são respectivamente a sedução, a insensibilidade e a carência, é a grandiosidade. A relativa estabilidade da autoimagem, assim como a ausência relativa de autodestrutividade, impulsividade e preocupações com abandono, também ajuda a distinguir o transtorno da personalidade narcisista do transtorno da personalidade borderline. Orgulho excessivo com as conquistas, falta relativa de demonstração das emoções e desdém pelas sensibilidades dos outros ajudam a distinguir o transtorno da personalidade narcisista do transtorno da personalidade histriônica. Ainda que indivíduos com transtornos da personalidade borderline, histriônica e narcisista possam exigir muita atenção, aqueles com transtorno da personalidade narcisista precisam especificamente dessa atenção para serem admirados. Indivíduos com transtorno da personalidade antissocial e personalidade narcisista compartilham uma tendência a ser determinados, desembaraçados, superficiais, exploradores e carentes de empatia. O transtorno da personalidade narcisista, entretanto, não necessariamente inclui características de impulsividade, agressão e dissimulação. Além disso, indivíduos com o transtorno da personalidade antissocial podem não ser tão carentes da admiração e da inveja dos outros, e pessoas com o transtorno da personalidade narcisista costumam não ter a história de transtorno da conduta na infância ou comportamento criminoso na vida adulta. Tanto no transtorno da personalidade narcisista quanto no transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, o indivíduo pode professar um compromisso com o perfeccionismo e acreditar que os outros não são capazes de fazer as coisas tão bem. Em contraste com a autocrítica que acompanha aqueles com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, indivíduos com transtorno da personalidade narcisista são mais propensos a achar que atingiram a perfeição. Desconfiança e retraimento social normalmente diferenciam aqueles com transtorno da personalidade esquizotípica ou paranoide daqueles com transtorno da personalidade narcisista. Quando essas características estão presentes em indivíduos com transtorno da personalidade narcisista, elas se originam primariamente de medos de ter imperfeições ou falhas reveladas. Muitos indivíduos altamente bem-sucedidos exibem traços de personalidade que podem ser considerados narcisistas. Esses traços somente constituem o transtorno da personalidade narcisista quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. Mania ou hipomania. Grandiosidade pode emergir como parte de episódios maníacos ou hipomaníacos, mas a associação com mudanças de humor ou prejuízos funcionais ajuda a distinguir esses episódios do transtorno da personalidade narcisista. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade narcisista deve também ser distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância.

Transtornos da Personalidade do Grupo C Transtorno da Personalidade Evitativa Critérios Diagnósticos

301.82 (F60.6)

Um padrão difuso de inibição social, sentimentos de inadequação e hipersensibilidade a avaliação negativa que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por quatro (ou mais) dos seguintes:


Transtorno da Personalidade Evitativa 673 1. Evita atividades profissionais que envolvam contato interpessoal significativo por medo de crítica, desaprovação ou rejeição. 2. Não se dispõe a envolver-se com pessoas, a menos que tenha certeza de que será recebido de forma positiva. 3. Mostra-se reservado em relacionamentos íntimos devido a medo de passar vergonha ou de ser ridicularizado. 4. Preocupa-se com críticas ou rejeição em situações sociais. 5. Inibe-se em situações interpessoais novas em razão de sentimentos de inadequação. 6. Vê a si mesmo como socialmente incapaz, sem atrativos pessoais ou inferior aos outros. 7. Reluta de forma incomum em assumir riscos pessoais ou se envolver em quaisquer novas atividades, pois estas podem ser constrangedoras.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade evitativa é um padrão difuso de inibição social, sentimentos de inadequação e hipersensibilidade a avaliação negativa que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com transtorno da personalidade evitativa esquivam-se de atividades no trabalho que envolvam contato interpessoal significativo devido a medo de crítica, desaprovação ou rejeição (Critério 1). Ofertas de promoções na vida profissional podem não ser aceitas pelo fato de novas responsabilidades poderem resultar em críticas de colegas. Esses indivíduos evitam fazer novos amigos, a menos que tenham certeza de que serão recebidos de forma positiva e aceitos sem críticas (Critério 2). Até que passem em testes rígidos que provem o contrário, às outras pessoas é atribuída uma natureza crítica e desaprovadora. Indivíduos com esse transtorno não participam de atividades em grupo, a não ser que tenham ofertas repetidas e generosas de apoio e atenção. A intimidade interpessoal costuma ser difícil para eles, embora consigam estabelecer relacionamentos íntimos quando há certeza de aceitação sem críticas. Podem agir de forma reservada, ter dificuldades de conversar sobre si mesmos e conter os sentimentos íntimos por medo de exposição, do ridículo ou de sentirem vergonha (Critério 3). Visto que indivíduos com esse transtorno estão preocupados com serem criticados ou rejeitados em situações sociais, podem apresentar um limiar bastante baixo para a detecção de tais reações (Critério 4). Ao menor sinal de desaprovação ou crítica, podem se sentir extremamente magoados. Tendem a ser tímidos, quietos, inibidos e “invisíveis” pelo medo de que toda a atenção seja degradante ou rejeitadora. Acreditam que, independentemente do que digam, os outros entenderão como algo “errado”; assim, podem não dizer absolutamente nada. Reagem enfaticamente a sinais sutis que sejam sugestivos de zombaria ou deboche. Apesar de seu forte desejo de participação na vida social, receiam colocar seu bem-estar nas mãos de outros. Indivíduos com o transtorno da personalidade evitativa ficam inibidos em situações interpessoais novas, pois se sentem inadequados e têm baixa autoestima (Critério 5). Dúvidas a respeito da competência social e do apelo pessoal ficam especialmente claras em contextos envolvendo interações com estranhos. Esses indivíduos veem-se como socialmente incapazes, sem qualquer atrativo pessoal ou inferiores aos outros (Critério 6). Costumam relutar de forma incomum em assumir riscos pessoais ou se envolver em quaisquer novas atividades, pois elas podem causar constrangimento (Critério 7). Tendem a exagerar os perigos potenciais de situações comuns, e um estilo de vida restrito pode resultar de sua necessidade de certeza e segurança. Alguém com esse transtorno pode cancelar uma entrevista de emprego temendo passar vergonha por não estar trajado apropriadamente. Sintomas somáticos ou outros problemas de menor importância podem se tornar a razão da evitação de novas atividades.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade evitativa costumam avaliar vigilantemente os movimentos e as expressões daqueles com quem têm contato. Sua conduta temerosa e tensa pode provocar o ridículo e o deboche dos outros, o que, em contrapartida, confirma suas dúvidas pessoais. Esses indivíduos se sentem muito ansiosos diante da possibilidade de reagirem à crítica


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Transtornos da Personalidade

com rubor ou choro. São descritos pelas outras pessoas como “envergonhados”, “tímidos”, “solitários” e “isolados”. Os maiores problemas associados a esse transtorno ocorrem no funcionamento social e profissional. A baixa autoestima e a hipersensibilidade à rejeição estão associadas a contatos interpessoais restritos. Esses indivíduos podem ficar relativamente isolados e em geral não apresentam uma rede grande de apoio social capaz de auxiliá-los a espantar crises. Desejam afeição e aceitação e podem fantasiar relacionamentos idealizados com os outros. Os comportamentos de evitação podem também afetar adversamente o funcionamento profissional, pois esses indivíduos tentam evitar os tipos de situações sociais que podem ser importantes para o atendimento das demandas básicas do trabalho ou para avanços na profissão. Outros transtornos comumente diagnosticados com o transtorno da personalidade evitativa incluem transtornos depressivo, bipolar e de ansiedade, em especial o transtorno de ansiedade social (fobia social). O transtorno da personalidade evitativa é frequentemente diagnosticado junto ao transtorno da personalidade dependente, visto que as pessoas com o transtorno da personalidade evitativa ficam muito apegadas e dependentes em relação àquelas poucas pessoas de quem são amigas. O transtorno da personalidade evitativa também tende a ser diagnosticado com o transtorno da personalidade borderline e com os transtornos da personalidade do Grupo A (i.e., paranoide, esquizoide ou esquizotípica).

Prevalência Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions de 2001-2002 sugerem prevalência de 2,4% para o transtorno da personalidade evitativa.

Desenvolvimento e Curso O comportamento evitativo costuma iniciar na infância pré-verbal ou verbal por meio de timidez, isolamento e medo de estranhos e de novas situações. Embora a timidez em crianças seja um precursor comum do transtorno da personalidade evitativa, na maior parte dos indivíduos ela tende a desaparecer lentamente com o passar dos anos. De forma contrastante, indivíduos que desenvolvem o transtorno da personalidade evitativa podem ficar cada vez mais tímidos e evitativos na adolescência e no início da vida adulta, quando os relacionamentos sociais com novas pessoas se tornam especialmente importantes. Existem algumas evidências de que, nos adultos, o transtorno tende a ficar menos evidente ou a sofrer remissão com o envelhecimento. Esse diagnóstico deve ser usado com muita cautela em crianças e adolescentes, para os quais timidez e evitação podem ser adequadas do ponto de vista do desenvolvimento.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Pode haver variação no grau com que grupos culturais e étnicos diferentes encaram o retraimento e a evitação como apropriados. Além disso, comportamento de evitação pode ser consequência de problemas na aculturação após a imigração.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno da personalidade evitativa parece ser igualmente frequente em ambos os sexos.

Diagnóstico Diferencial Transtornos de ansiedade. Parece existir grande sobreposição entre transtorno da personalidade evitativa e transtorno de ansiedade social (fobia social), tanto que eles podem representar conceitos alternativos das mesmas condições ou de condições similares. A evitação também caracteriza tanto o transtorno da personalidade evitativa quanto a agorafobia, sendo que eles são frequentemente concomitantes. Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com transtorno da personalidade evitativa pelo fato de


Transtorno da Personalidade Dependente 675 apresentarem alguns aspectos em comum. Assim, é importante distinguir entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem aos critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade evitativa, todos podem ser diagnosticados. O transtorno da personalidade evitativa e o transtorno da personalidade dependente são caracterizados por sentimentos de inadequação, hipersensibilidade à crítica e necessidade de garantias. Embora o foco principal de preocupação no transtorno da personalidade evitativa seja evitar humilhação e rejeição, no transtorno da personalidade dependente o foco é ser cuidado. Entretanto, os transtornos da personalidade evitativa e dependente são particularmente propensos a ocorrer de forma simultânea. Tal como o transtorno da personalidade evitativa, os transtornos da personalidade esquizoide e esquizotípica caracterizam-se por isolamento social. Contudo, os indivíduos com transtorno da personalidade evitativa desejam ter relacionamentos com outras pessoas e sentem sua solidão de forma profunda, ao passo que aqueles com os transtornos da personalidade esquizoide ou esquizotípica podem ficar satisfeitos e até preferir o isolamento social. Os transtornos da personalidade paranoide e evitativa são caracterizados pela relutância em confiar nos outros. No entanto, no transtorno da personalidade evitativa, essa relutância é atribuível mais ao medo de sentir vergonha ou de ser considerado inadequado do que ao medo de intenções maldosas de outras pessoas. Muitos indivíduos demonstram traços da personalidade evitativa. Esses traços somente constituem o transtorno da personalidade evitativa quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade evitativa deve ser distinguido da mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade evitativa também deve ser distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância.

Transtorno da Personalidade Dependente Critérios Diagnósticos

301.6 (F60.7)

Uma necessidade difusa e excessiva de ser cuidado que leva a comportamento de submissão e apego que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por cinco (ou mais) dos seguintes: 1. Tem dificuldades em tomar decisões cotidianas sem uma quantidade excessiva de conselhos e reasseguramento de outros. 2. Precisa que outros assumam responsabilidade pela maior parte das principais áreas de sua vida. 3. Tem dificuldades em manifestar desacordo com outros devido a medo de perder apoio ou aprovação. (Nota: Não incluir os medos reais de retaliação.) 4. Apresenta dificuldade em iniciar projetos ou fazer coisas por conta própria (devido mais a falta de autoconfiança em seu julgamento ou em suas capacidades do que a falta de motivação ou energia). 5. Vai a extremos para obter carinho e apoio de outros, a ponto de voluntariar-se para fazer coisas desagradáveis. 6. Sente-se desconfortável ou desamparado quando sozinho devido a temores exagerados de ser incapaz de cuidar de si mesmo. 7. Busca com urgência outro relacionamento como fonte de cuidado e amparo logo após o término de um relacionamento íntimo. 8. Tem preocupações irreais com medos de ser abandonado à própria sorte.


676

Transtornos da Personalidade

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade dependente é uma necessidade difusa e excessiva de ser cuidado que leva a comportamento de submissão e apego e a temores de separação. Esse padrão surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Os comportamentos de dependência e submissão formam-se com o intuito de conseguir cuidado e derivam de uma autopercepção de não ser capaz de funcionar adequadamente sem a ajuda de outros. Indivíduos com o transtorno da personalidade dependente apresentam grande dificuldade em tomar decisões cotidianas (p. ex., a cor de camisa a vestir ou levar ou não o guarda-chuva) sem uma quantidade excessiva de conselhos e reasseguramentos oferecidos por outros (Critério 1). Esses indivíduos tendem a ser passivos e a permitir que outros (frequentemente apenas uma pessoa) tomem a iniciativa e assumam a responsabilidade pela maior parte das principais áreas de suas vidas (Critério 2). Adultos com o transtorno costumam depender de pai ou mãe ou cônjuge para decidir onde morar, o tipo de trabalho a realizar e os vizinhos com quem fazer amizade. Adolescentes com o transtorno podem permitir que seus pais decidam o que devem vestir, com quem fazer amizade, como usar o tempo livre e a escola ou universidade para onde ir. Essa necessidade de que outras pessoas assumam a responsabilidade vai além das solicitações de auxílio adequadas à idade ou à situação (p. ex., as necessidades específicas de crianças, idosos e pessoas deficientes). O transtorno da personalidade dependente pode ocorrer em um indivíduo que tenha uma condição ou incapacidade médica grave, mas nesses casos a dificuldade em assumir responsabilidade precisa ir além daquilo que estaria normalmente associado a essa condição ou incapacidade. Como existe o receio de perder apoio ou aprovação, indivíduos com o transtorno da personalidade dependente frequentemente apresentam dificuldade em expressar discordância de outras pessoas, em especial daquelas de quem são dependentes (Critério 3). Eles se sentem tão incapazes de funcionar por conta própria que podem vir a concordar com coisas que consideram erradas apenas para não arriscar perder a ajuda daqueles que procuram para orientação. Não se enfurecem justificadamente com outros de cujo apoio e cuidados necessitam, por medo de se afastar deles. Se as preocupações do indivíduo relativas às consequências de expressar discordância forem realistas (p. ex., medos reais de punição de um cônjuge abusivo), o comportamento não deve ser considerado evidência de transtorno da personalidade dependente. Indivíduos com esse transtorno apresentam dificuldades para iniciar projetos ou fazer coisas de forma independente (Critério 4). Carecem de autoconfiança e acham que precisam de ajuda para iniciar e finalizar tarefas. Podem vir a aguardar os outros para começar algo, pois pensam que, em regra, os outros podem fazer esse algo melhor. Esses indivíduos têm convicção de serem incapazes de funcionar independentemente e apresentam-se como incapazes e como se necessitassem de assistência constante. Entretanto, é provável que funcionem adequadamente caso tenham certeza de que outra pessoa estará supervisionando e aprovando seu trabalho. Pode haver receio de se tornar ou parecer mais competente, pois podem acreditar que isso levará ao abandono. Visto que contam com os outros para lidar com seus problemas, com frequência não aprendem as habilidades para uma vida independente, perpetuando, assim, a dependência. Indivíduos com transtorno da personalidade dependente podem ir a extremos para conseguir cuidado e apoio de outros, a ponto até de voluntariar-se para tarefas desagradáveis caso esse comportamento possa proporcionar a atenção de que precisam (Critério 5). Estão dispostos a se submeter ao que os outros desejam, mesmo que as demandas não sejam razoáveis. Sua necessidade de manter um vínculo importante resultará frequentemente em relacionamentos desequilibrados ou distorcidos. Essas pessoas podem fazer sacrifícios extraordinários ou tolerar abuso verbal, físico ou sexual. (Deve-se observar que esse comportamento deve ser considerado evidência de transtorno da personalidade dependente apenas quando puder ser claramente estabelecido que existem outras opções para o indivíduo.) Pessoas com esse transtorno sentem-se desconfortáveis ou desamparadas quando sós devido aos temores exagerados de não serem capazes de cuidar de si mesmas (Critério 6). Vão se “grudar” a outros apenas para evitar a solidão, mesmo sem ter interesse ou envolvimento com o que está acontecendo. Ao término de um relacionamento íntimo (p. ex., rompimento com companheiro afetivo, morte de cuidador), indivíduos com transtorno da personalidade dependente podem buscar urgente-


Transtorno da Personalidade Dependente 677 mente outro relacionamento para obter os cuidados e o apoio de que necessitam (Critério 7). Sua crença de que são incapazes de funcionar na ausência de um relacionamento íntimo motiva-os a tornarem-se rápida e indiscriminadamente apegados a outra pessoa. Com frequência preocupam-se com medos de serem abandonados à própria sorte (Critério 8). Veem-se como tão completamente dependentes dos conselhos e da ajuda de uma outra pessoa significativa que se preocupam com a possibilidade de serem abandonados por essa pessoa mesmo quando não há justificativa para esses temores. Para que sejam considerados evidência desse critério, os medos devem ser excessivos e irreais. Por exemplo, um idoso com câncer que se muda para a casa do filho para ser cuidado está demonstrando comportamento dependente adequado, consideradas suas circunstâncias de vida.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Indivíduos com transtorno da personalidade dependente com frequência são caracterizados por pessimismo e autoquestionamentos, tendem a subestimar suas capacidades e seus aspectos positivos e podem constantemente referir a si mesmos como “estúpidos”. Encaram críticas e desaprovação como prova de sua desvalia e perdem a fé em si mesmos. Podem buscar superproteção e dominação por parte dos outros. O funcionamento profissional pode ser prejudicado diante da necessidade de iniciativas independentes. Podem evitar cargos de responsabilidade e ficar ansiosos diante de decisões. As relações sociais tendem a ser limitadas àquelas poucas pessoas de quem o indivíduo é dependente. Pode haver risco aumentado de transtornos depressivos, de ansiedade e de adaptação. O transtorno da personalidade dependente costuma ser concomitante com outros transtornos da personalidade, especialmente borderline, evitativa e histriônica. Doença física crônica ou transtorno de ansiedade de separação na infância ou adolescência podem predispor o indivíduo ao desenvolvimento desse transtorno.

Prevalência Dados do National Epidemiologic Survey on Alcohol and Related Conditions de 2001-2002 produziram uma estimativa da prevalência de transtorno da personalidade dependente de 0,49%. Com base em uma subamostra de probabilidades da Parte II do National Comorbidity Survey Replication, a prevalência da personalidade dependente foi estimada em 0,6%.

Desenvolvimento e Curso Esse diagnóstico deve ser usado com muita cautela, ou até não ser usado, em crianças e adolescentes, para os quais um comportamento dependente pode ser apropriado do ponto de vista do desenvolvimento.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura O grau até o qual comportamentos dependentes são considerados apropriados varia substancialmente entre diferentes faixas etárias e grupos socioculturais. Idade e fatores culturais devem ser considerados na avaliação do limiar diagnóstico de cada critério. O comportamento dependente deve ser considerado característico do transtorno somente quando for claramente excessivo em relação às normas da cultura do indivíduo ou refletir preocupações não realistas. Ênfase na passividade, na educação e na deferência é característica de algumas sociedades e pode ser mal interpretada como traço do transtorno da personalidade dependente. De forma semelhante, as sociedades podem, de maneiras diferenciadas, fomentar e desencorajar comportamento dependente em indivíduos do sexo masculino e do sexo feminino.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Em contextos clínicos, o transtorno da personalidade dependente tem sido diagnosticado mais frequentemente no sexo feminino, embora alguns estudos relatem taxas similares de prevalência entre ambos os sexos .


678

Transtornos da Personalidade

Diagnóstico Diferencial Outros transtornos mentais e condições médicas. O transtorno da personalidade dependente deve ser distinguido da dependência decorrente de outros transtornos mentais (p. ex., transtornos depressivos, transtorno de pânico, agorafobia) e de outras condições médicas. Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com o transtorno da personalidade dependente pelo fato de apresentarem alguns aspectos em comum. Assim, é importante distinguir entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que atendem a critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade dependente, todos podem ser diagnosticados. Embora muitos transtornos da personalidade sejam caracterizados por aspectos dependentes, o transtorno da personalidade dependente pode ser distinguido por seu comportamento predominantemente reativo, submisso e de apego. Tanto o transtorno da personalidade dependente quanto o da personalidade borderline caracterizam-se pelo medo do abandono; contudo, o indivíduo com transtorno da personalidade borderline reage ao abandono com sentimentos de vazio emocional, fúria e exigências, ao passo que aquele com transtorno da personalidade dependente reage com calma e submissão crescentes e busca urgentemente um relacionamento substituto que dê atenção e apoio. O transtorno da personalidade borderline pode ser ainda diferenciado do transtorno da personalidade dependente por um padrão típico de relacionamentos instáveis e intensos. Indivíduos com transtorno da personalidade histriônica, assim como aqueles com transtorno da personalidade dependente, apresentam grande necessidade de reasseguramento e aprovação e podem parecer infantis e “grudentos”. Diferentemente do transtorno da personalidade dependente, no entanto, o qual se caracteriza pelo retraimento e pelo comportamento dócil, o transtorno da personalidade histriônica se caracteriza pelo exibicionismo sociável com exigências ativas de atenção. Tanto o transtorno da personalidade dependente quanto o da personalidade evitativa caracterizam-se por sentimentos de inadequação, hipersensibilidade à crítica e necessidade de reasseguramento; indivíduos com transtorno da personalidade evitativa, todavia, sentem tanto medo de humilhação e rejeição que se retraem até ter certeza da aceitação. Indivíduos com o transtorno da personalidade dependente, pelo contrário, apresentam um padrão de busca e manutenção dos laços com pessoas significativas, e não de evitação e de retirada dos relacionamentos. Muitos indivíduos exibem traços da personalidade dependente. Esses traços somente constituem o transtorno da personalidade dependente quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional ou sofrimento subjetivo significativos. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade dependente deve ser diferenciado da mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade dependente deve também ser distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância.

Transtorno da Personalidade Obsessivo-compulsiva Critérios Diagnósticos

301.4 (F60.5)

Um padrão difuso de preocupação com ordem, perfeccionismo e controle mental e interpessoal à custa de flexibilidade, abertura e eficiência que surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos, conforme indicado por quatro (ou mais) dos seguintes: 1. É tão preocupado com detalhes, regras, listas, ordem, organização ou horários a ponto de o objetivo principal da atividade ser perdido. 2. Demonstra perfeccionismo que interfere na conclusão de tarefas (p. ex., não consegue completar um projeto porque seus padrões próprios demasiadamente rígidos não são atingidos).


Transtorno da Personalidade Obsessivo-compulsiva 679 3. É excessivamente dedicado ao trabalho e à produtividade em detrimento de atividades de lazer e amizades (não explicado por uma óbvia necessidade financeira). 4. É excessivamente consciencioso, escrupuloso e inflexível quanto a assuntos de moralidade, ética ou valores (não explicado por identificação cultural ou religiosa). 5. É incapaz de descartar objetos usados ou sem valor mesmo quando não têm valor sentimental. 6. Reluta em delegar tarefas ou trabalhar com outras pessoas a menos que elas se submetam à sua forma exata de fazer as coisas. 7. Adota um estilo miserável de gastos em relação a si e a outros; o dinheiro é visto como algo a ser acumulado para futuras catástrofes. 8. Exibe rigidez e teimosia.

Características Diagnósticas A característica essencial do transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva é uma preocupação com ordem, perfeccionismo e controle mental e interpessoal à custa de flexibilidade, abertura e eficiência. Esse padrão surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos. Indivíduos com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva tentam manter uma sensação de controle por meio de atenção cuidadosa a regras, pequenos detalhes, procedimentos, listas, cronogramas ou forma a ponto de o objetivo principal da atividade ser perdido (Critério 1). São excessivamente cuidadosos e propensos à repetição, prestando extraordinária atenção aos detalhes e conferindo repetidas vezes na busca por possíveis erros. Esquecem o fato de que outras pessoas podem se incomodar muito com os atrasos e as inconveniências que resultam desse comportamento. Por exemplo, quando esses indivíduos esquecem onde colocaram uma lista de coisas a fazer, gastam tempo demais procurando a lista em vez de gastar alguns instantes refazendo-a de memória e passando à execução das tarefas. O tempo é mal alocado, e as tarefas mais importantes são deixadas por último. O perfeccionismo e os padrões elevados de desempenho autoimpostos causam disfunção e sofrimento significativo a esses indivíduos. Podem ficar de tal forma envolvidos em tornar cada detalhe de um projeto absolutamente perfeito que este jamais é concluído (Critério 2). Por exemplo, a conclusão de um relatório escrito é retardada por várias reescritas que tomam tempo, para tudo ficar aquém da “perfeição”. Prazos não são atendidos, e aspectos da vida do indivíduo que não são o foco atual da atividade podem desorganizar-se. Indivíduos com esse transtorno demonstram dedicação excessiva ao trabalho e à produtividade, a ponto de excluir atividades de lazer e amizades (Critério 3). Esse comportamento não é explicado por necessidade financeira. Com frequência sentem que não têm tempo para tirar uma tarde ou um fim de semana de folga para viajar ou apenas relaxar. Podem ficar postergando atividades agradáveis, como as férias, de modo que elas podem jamais ocorrer. Quando realmente dedicam algum tempo para lazer ou férias, sentem-se bastante desconfortáveis, a não ser que tenham consigo algum tipo de trabalho de modo a não “desperdiçarem tempo”. Pode haver muita concentração em tarefas domiciliares (p. ex., limpeza excessiva e repetida a ponto de “poder comer direto do chão”). Quando ficam algum tempo com os amigos, é provável que seja em algum tipo de atividade formalmente organizada (p. ex., esportes). Passatempos e atividades de recreação são levadas como tarefas sérias que exigem organização criteriosa e trabalho duro para serem dominadas. A ênfase recai sobre o desempenho perfeito. Esses indivíduos transformam o jogo e brincadeiras em tarefas estruturadas (p. ex., corrigindo um bebê que não põe os círculos em um cilindro de madeira na ordem correta; dizendo a uma criança para andar de triciclo em linha reta; transformando um esporte qualquer em uma “lição” severa). Indivíduos com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva podem ser excessivamente conscienciosos, escrupulosos e inflexíveis acerca de assuntos de moralidade, ética ou valores (Critério 4). Podem obrigar-se e obrigar os outros a seguir princípios morais rígidos e padrões muito austeros de desempenho. Podem, ainda, ser críticos impiedosos em relação aos próprios erros. Indivíduos com esse transtorno respeitam autoridade e regras com extrema consideração e insistem em obedecer às regras de forma bastante literal e inflexível. Por exemplo, o indivíduo não irá emprestar uma moeda a um amigo que precisa dela para um telefonema porque ele mesmo


680

Transtornos da Personalidade

não é “do tipo que pede emprestado ou empresta” ou porque seria ruim para o caráter da pessoa. Essas características não devem ser explicadas por identificação cultural ou religiosa do indivíduo. Indivíduos com esse transtorno podem ser incapazes de descartar objetos usados ou sem valor, mesmo na ausência de valor sentimental (Critério 5). Frequentemente admitem ser acumuladores. Consideram o descarte de objetos um desperdício, pois “nunca se sabe quando poderá precisar de alguma coisa” e ficam incomodados se alguém tenta se livrar de coisas que eles guardaram. Seus cônjuges ou parceiros podem se queixar da quantidade de espaço ocupado por peças e revistas antigas, aparelhos estragados e assim por diante. Essas pessoas relutam em delegar tarefas ou em trabalhar em conjunto (Critério 6). De maneira teimosa e injustificada, insistem que tudo precisa ser feito a seu modo e que as pessoas têm de se conformar com sua maneira de fazer as coisas. Com frequência dão instruções bastante detalhadas sobre como tudo deve ser feito (p. ex., só há uma forma de cortar a grama, lavar os pratos, construir uma casa para o cachorro) e ficam surpresos e irritados quando outros sugerem alternativas criativas. Em outras ocasiões, podem rejeitar ofertas de ajuda mesmo quando atrasados no cronograma, pois consideram que ninguém pode fazer as coisas tão bem quanto eles mesmos. Indivíduos com esse transtorno podem ser miseráveis e mesquinhos e manter um padrão de vida bastante inferior ao que podem sustentar, acreditando que os gastos devem ser rigidamente controlados para garantir sustento em catástrofes futuras (Critério 7). O transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva caracteriza-se por rigidez e teimosia (Critério 8). Indivíduos com o transtorno estão tão preocupados em realizar as tarefas da única maneira “certa” que enfrentam dificuldades para concordar com as ideias de qualquer outra pessoa. Planejam o futuro nos mínimos detalhes e não se dispõem a avaliar possíveis mudanças. Completamente envolvidos pela própria perspectiva, têm dificuldade de reconhecer os pontos de vista dos outros. Amigos e colegas podem se frustrar por essa rigidez constante. Mesmo quando reconhecem que ceder pode ser interessante para eles mesmos, podem de forma teimosa recusar-se a isso alegando ser este “o princípio da coisa”.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Quando regras e procedimentos estabelecidos não ditam a resposta correta, tomar uma decisão pode se tornar um processo demorado e desgastante. Indivíduos com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva podem ter tanta dificuldade para decidir as tarefas às quais dar prioridade ou qual a melhor maneira de fazer alguma tarefa específica que podem jamais começar o que quer que seja. Têm propensão ao aborrecimento ou à raiva em situações nas quais não conseguem manter controle do seu ambiente físico ou interpessoal, embora a raiva não costume ser manifestada de forma direta. Por exemplo, o indivíduo pode ficar irritado diante de um serviço insatisfatório em um restaurante, mas, em vez de queixar-se ao gerente, fica ruminando sobre quanto dar de gorjeta. Em outras ocasiões, a raiva pode ser expressa por meio de indignação em relação a um assunto aparentemente insignificante. Indivíduos com esse transtorno podem dar atenção especial a seu estado relativo nas relações de domínio-submissão e podem exibir deferência excessiva a uma autoridade que respeitam e resistência excessiva a uma que não respeitam. Indivíduos com esse transtorno geralmente manifestam afeto de forma altamente controlada ou artificial e podem sentir grande desconforto na presença de outros que se expressam com emoção. As relações cotidianas são sérias e formais, e eles podem parecer sisudos em situações em que outros sorririam e ficariam alegres (p. ex., saudar um namorado no aeroporto). Eles se contêm cuidadosamente até estarem certos de que o que dirão será perfeito. Podem se preocupar com a lógica e com o intelecto e ser intolerantes ao comportamento afetivo dos outros. Com frequência apresentam dificuldades de expressar sentimentos amorosos e raramente fazem elogios. Indivíduos com esse transtorno podem ter dificuldades e sofrimento no trabalho, sobretudo quando confrontados com novas situações que exijam flexibilidade e transigência. Indivíduos com transtornos de ansiedade, inclusive transtorno de ansiedade generalizada, transtorno de ansiedade social (fobia social) e fobias específicas, bem como transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), têm probabilidade aumentada de apresentar uma perturbação da persona-


Transtorno da Personalidade Obsessivo-compulsiva 681 lidade que atenda aos critérios do transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva. Mesmo assim, parece que a maioria das pessoas com TOC não apresenta um padrão de comportamento que atenda aos critérios para esse transtorno da personalidade. Muitas das características do transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva sobrepõem-se às características de personalidade “tipo A” (p. ex., preocupação com o trabalho, competitividade, urgência temporal), e estas podem estar presentes em pessoas com risco de infarto do miocárdio. Pode haver associação entre transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva e transtornos bipolar e depressivo e transtornos alimentares.

Prevalência O transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva é um dos transtornos da personalidade mais prevalentes na população em geral, com prevalência estimada entre 2,1 e 7,9%.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura Ao avaliar uma pessoa em relação a transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, o clínico não deve incluir aqueles comportamentos que refletem hábitos, costumes ou estilos interpessoais que são culturalmente aceitos pelo grupo de referência do indivíduo. Algumas culturas dão muita ênfase ao trabalho e à produtividade; os comportamentos resultantes nos membros dessas sociedades não devem ser considerados indicadores de transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Em estudos sistemáticos, o transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva parece ser diagnosticado cerca de duas vezes mais em indivíduos do sexo masculino.

Diagnóstico Diferencial Transtorno obsessivo-compulsivo. Apesar dos nomes semelhantes, o transtorno obsessivo-compulsivo costuma ser distinguido do transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva pela presença, no primeiro, de obsessões e compulsões verdadeiras. Quando atendidos os critérios para transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, ambos devem ser registrados. Transtorno de acumulação. Um diagnóstico de transtorno de acumulação deve ser especialmente cogitado quando a acumulação é extrema (p. ex., pilhas de objetos sem valor acumulados representam perigo de incêndio e dificultam que outras pessoas transitem pela casa). Quando atendidos os critérios para transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva e transtorno de acumulação, ambos devem ser registrados. Outros transtornos da personalidade e traços de personalidade. Outros transtornos da personalidade podem ser confundidos com o transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva pelo fato de apresentarem aspectos em comum. Assim, é importante fazer a distinção entre esses transtornos com base nas diferenças em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo apresenta características de personalidade que satisfazem critérios para um ou mais de um transtorno da personalidade além do transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva, todos podem ser diagnosticados. Indivíduos com transtorno da personalidade narcisista podem também professar compromisso com o perfeccionismo e acreditar que os outros não fazem bem as coisas, mas estão mais propensos a achar que atingiram a perfeição, ao passo que aqueles com o transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva costumam ser autocríticos. Indivíduos com o transtorno da personalidade narcisista ou antissocial carecem de generosidade, mas pouparão a si mesmos desse padrão, enquanto aqueles com transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva adotam um estilo miserável de gastos para si e para os outros. Tanto o transtorno da perso-


682

Transtornos da Personalidade

nalidade esquizoide quanto o da personalidade obsessivo-compulsiva podem ser caracterizados por formalidade e distanciamento social aparentes. Neste último, isso se origina do desconforto com as emoções e da dedicação excessiva ao trabalho; já no transtorno da personalidade esquizoide, existe ausência fundamental de capacidade para a intimidade. Quando moderados, traços da personalidade obsessivo-compulsiva podem ser especialmente adaptativos, sobretudo em situações que recompensam alto desempenho. Esses traços somente constituem o transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional e sofrimento subjetivo significativos. Mudança de personalidade devido a outra condição médica. O transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva deve ser distinguido da mudança de personalidade devido a outra condição médica, na qual os traços que emergem são atribuíveis aos efeitos de outra condição médica no sistema nervoso central. Transtornos por uso de substância. O transtorno da personalidade obsessivo-compulsiva deve ser também distinguido de sintomas que podem se desenvolver em associação com o uso persistente de substância.

Outros Transtornos da Personalidade Mudança de Personalidade Devido a Outra Condição Médica Critérios Diagnósticos

310.1 (F07.0)

A. Uma perturbação persistente da personalidade que representa uma mudança do padrão característico prévio da personalidade do indivíduo. Nota: Em crianças, a perturbação envolve um desvio acentuado do desenvolvimento normal ou uma mudança significativa nos padrões habituais de comportamento da criança, com duração de pelo menos um ano. B. Há evidência, a partir da história, do exame físico ou de achados laboratoriais, de que a perturbação é a consequência fisiopatológica direta de outra condição médica. C. A perturbação não é mais bem explicada por outro transtorno mental (incluindo outro transtorno mental devido a outra condição médica). D. A perturbação não ocorre exclusivamente durante o curso de delirium. E. A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Determinar o subtipo: Tipo lábil: Quando o aspecto predominante é labilidade afetiva. Tipo desinibido: Quando o aspecto predominante é controle deficiente dos impulsos conforme evidenciado por indiscrições sexuais, etc. Tipo agressivo: Quando o aspecto predominante é comportamento agressivo. Tipo apático: Quando o aspecto predominante é apatia e indiferença marcantes. Tipo paranoide: Quando o aspecto predominante é desconfiança ou ideação paranoide. Outro tipo: Quando a apresentação não se caracteriza por nenhum dos subtipos anteriores. Tipo combinado: Quando mais de um aspecto predomina no quadro clínico. Tipo não especificado Nota para codificação: Incluir o nome da outra condição médica (p. ex., 310.1 [F07.0] mudança de personalidade devido a epilepsia do lobo temporal). A outra condição médica deve ser codificada e listada em separado imediatamente antes do transtorno da personalidade devido a outra condição médica (p. ex., 345.40 [G40.209] epilepsia do lobo temporal; 310.1 [F07.0] mudança de personalidade devido a epilepsia do lobo temporal).


Mudança de Personalidade Devido a Outra Condição Médica 683

Subtipos A mudança de personalidade em questão pode ser especificada por meio da indicação da apresentação sintomática que predomina na apresentação clínica.

Características Diagnósticas A característica essencial de mudança de personalidade devido a outra condição médica é uma perturbação persistente da personalidade que é considerada decorrente dos efeitos fisiopatológicos diretos de uma condição médica. Essa perturbação da personalidade representa uma mudança em relação ao padrão de personalidade característico prévio do indivíduo. Em crianças, essa condição pode se manifestar mais como um desvio acentuado do desenvolvimento normal do que como uma mudança no padrão estável de personalidade (Critério A). Pode haver evidência, a partir da história, do exame físico e dos achados laboratoriais, de que a mudança de personalidade é a consequência fisiológica direta de outra condição médica (Critério B). O diagnóstico não é feito quando a perturbação é mais bem explicada por outro transtorno mental (Critério C). Não é feito também o diagnóstico se a perturbação ocorre exclusivamente durante o curso de delirium (Critério D). A perturbação deve, ainda, causar sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo (Critério E). Manifestações comuns da mudança de personalidade incluem instabilidade afetiva, controle deficiente de impulsos, explosões de agressão ou fúria grosseiramente desproporcionais em relação a qualquer estressor psicossocial desencadeante, apatia acentuada, desconfiança ou ideias paranoides. A fenomenologia da mudança é indicada usando-se os subtipos listados no conjunto de critérios. Um indivíduo com o transtorno costuma ser caracterizado pelos outros como “não sendo ele”. Ainda que partilhe o termo “personalidade” com os demais transtornos da personalidade, esse diagnóstico é distinto em razão de sua etiologia específica, fenomenologia diferente e surgimento e curso mais variáveis. A apresentação clínica em determinado indivíduo pode depender da natureza e da localização do processo patológico. Por exemplo, lesão de lobos frontais pode desencadear sintomas como falta de julgamento ou previsão, jocosidade, desinibição e euforia. Acidentes vasculares cerebrais no hemisfério direito já demonstraram evocar mudanças de personalidade associadas a negligência espacial unilateral, anosognosia (i.e., incapacidade do indivíduo de reconhecer um déficit corporal ou funcional, como a existência de hemiparesia), impersistência motora e outros déficits neurológicos.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico Várias condições neurológicas e outras condições médicas podem causar mudanças de personalidade, inclusive neoplasias do sistema nervoso central, traumatismo craniencefálico, doença cerebrovascular, doença de Huntington, epilepsia, doenças infecciosas com envolvimento do sistema nervoso central (p. ex., HIV), doenças endócrinas (p. ex., hipotireoidismo, hipo e hiperadrenocorticismo) e doenças autoimunes com envolvimento do sistema nervoso central (p. ex., lúpus eritematoso sistêmico). Os achados associados do exame físico, dos exames laboratoriais e os padrões de prevalência e início refletem aqueles da condição neurológica ou da outra condição médica envolvida.

Diagnóstico Diferencial Condições médicas crônicas associadas a dor e incapacidade. Condições médicas crônicas associadas a dor e incapacidade podem estar também associadas a mudanças na personalidade. O diagnóstico de mudança de personalidade devido a outra condição médica é feito apenas quando pode ser estabelecido um mecanismo fisiopatológico direto. O diagnóstico não é feito quando a mudança é decorrente de uma adaptação comportamental ou psicológica ou de uma resposta a outra condição médica (p. ex., comportamentos dependentes que resultam da necessidade da assistência de outros após traumatismo craniencefálico grave, doença cardiovascular ou demência). Delirium ou transtorno neurocognitivo maior. Mudança de personalidade é uma característica frequentemente associada a delirium ou transtorno neurocognitivo maior. Um diagnóstico


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Transtornos da Personalidade

separado de mudança de personalidade devido a outra condição médica não é feito quando a mudança ocorre exclusivamente durante o curso de delirium. Pode ser feito, entretanto, em acréscimo ao diagnóstico de transtorno neurocognitivo maior quando a mudança de personalidade é parte destacada da apresentação clínica. Outro transtorno mental em razão de outra condição médica. O diagnóstico de mudança de personalidade devido a outra condição médica não é feito quando a perturbação é mais bem explicada por outro transtorno mental devido a outra condição médica (p. ex., transtorno depressivo devido a tumor cerebral). Transtornos por uso de substância. Mudanças de personalidade também podem ocorrer no contexto de transtornos por uso de substância, em especial quando de longa duração. O clínico deve questionar cuidadosamente a natureza e a duração do uso de substância. Quando o clínico deseja indicar uma relação etiológica entre a mudança de personalidade e o uso de substância, pode ser usada a categoria não especificada para o uso de substância (p. ex., transtorno relacionado a estimulantes não especificado). Outros transtornos mentais. Mudanças acentuadas de personalidade também podem ser uma característica associada de outros transtornos mentais (p. ex., esquizofrenia, transtorno delirante, transtornos depressivo e bipolar, outro comportamento disruptivo especificado ou não especificado, transtorno do controle de impulsos e da conduta, transtorno de pânico). Nesses transtornos, porém, nenhum fator fisiológico específico é considerado como tendo relação etiológica com a mudança de personalidade. Outros transtornos da personalidade. Mudança de personalidade devido a outra condição médica pode ser distinguida de um transtorno da personalidade pela exigência de uma mudança clinicamente significativa a partir do funcionamento de base da personalidade e da presença de uma condição médica etiológica específica.

Outro Transtorno da Personalidade Especificado 301.89 (F60.89) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno da personalidade que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satifazem todos os critérios para qualquer transtorno na classe diagnóstica dos transtornos da personalidade. A categoria outro transtorno da personalidade especificado é usada nas situações em que o clínico opta por comunicar a razão específica pela qual a apresentação não satisfaz os critérios para qualquer transtorno da personalidade específico. Isso é feito por meio do registro de “outro transtorno da personalidade especificado”, seguido pela razão específica (p. ex., “características mistas de personalidade”).

Transtorno da Personalidade Não Especificado 301.9 (F60.9) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno da personalidade que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno na classe diagnóstica dos transtornos da personalidade. A categoria transtorno da personalidade não especificado é usada nas situações em que o clínico opta por não especificar a razão pela qual os critérios para um transtorno da personalidade específico não são satisfeitos e inclui apresentações para as quais não há informações suficientes para que seja feito um diagnóstico mais específico.


Transtornos Parafílicos Os transtornos parafílicos

inclusos neste Manual são: transtorno voyeurista (espiar outras pessoas em atividades privadas), transtorno exibicionista (expor os genitais), transtorno frotteurista (tocar ou esfregar-se em indivíduo que não consentiu), transtorno do masoquismo sexual (passar por humilhação, submissão ou sofrimento), transtorno do sadismo sexual (infligir humilhação, submissão ou sofrimento), transtorno pedofílico (foco sexual em crianças), transtorno fetichista (usar objetos inanimados ou ter um foco altamente específico em partes não genitais do corpo) e transtorno transvéstico (vestir roupas do sexo oposto visando excitação sexual). Esses transtornos têm sido tradicionalmente selecionados para serem listados e terem seus critérios diagnósticos explícitos apontados no DSM por duas razões principais: são relativamente comuns em comparação com outros transtornos parafílicos e alguns deles implicam ações para sua satisfação que, devido à característica nociva e ao dano potencial a outros, são classificadas como delitos criminais. Os oito transtornos listados não esgotam a lista de possíveis transtornos parafílicos. Muitas parafilias distintas foram identificadas e nomeadas, e quase todas poderiam, em virtude de suas consequências negativas para o indivíduo e para outras pessoas, chegar ao nível de um transtorno parafílico. Os diagnósticos outro transtorno parafílico especificado e transtorno parafílico não especificado são, portanto, indispensáveis e necessários em vários casos. Neste capítulo, a ordem de apresentação dos transtornos parafílicos listados corresponde, em geral, a esquemas comuns de classificação para essas condições. O primeiro grupo de transtornos baseia-se em preferências por atividades anormais. Esses transtornos são subdivididos em transtornos do namoro, os quais se assemelham a componentes distorcidos do comportamento de namoro (transtornos voyeurista, exibicionista e frotteurista), e transtornos da algolagnia, os quais envolvem dor e sofrimento (transtornos do masoquismo sexual e do sadismo sexual). O segundo grupo de transtornos baseia-se em preferências por alvo anômalo. Esses transtornos incluem um que tem como alvo outros seres humanos (transtorno pedofílico) e dois que têm outros alvos (transtornos fetichista e transvéstico). O termo parafilia representa qualquer interesse sexual intenso e persistente que não aquele voltado para a estimulação genital ou para carícias preliminares com parceiros humanos que consentem e apresentam fenótipo normal e maturidade física. Em certas circunstâncias, o critério “intenso e persistente” pode ser de difícil aplicação, como na avaliação de pessoas muito idosas ou clinicamente doentes e que podem não ter interesses sexuais “intensos” de qualquer espécie. Nesses casos, o termo parafilia pode ser definido como qualquer interesse sexual maior ou igual a interesses sexuais normofílicos. Existem, ainda, parafilias específicas que são geralmente mais bem descritas como interesses sexuais preferenciais do que como interesses sexuais intensos. Algumas parafilias envolvem principalmente as atividades eróticas do indivíduo; outras têm a ver sobretudo com seus alvos eróticos. Exemplos das primeiras incluem interesses intensos e persistentes em espancar, chicotear, cortar, amarrar ou estrangular outra pessoa, ou um interesse por essas atividades que seja igual ou maior do que o interesse do indivíduo em copular ou em interagir de forma equivalente com outra pessoa. Exemplos das demais incluem interesse sexual intenso ou preferencial por crianças, cadáveres ou amputados (como classe), bem como interesse intenso ou preferencial por animais, como cavalos ou cães, ou por objetos inanimados, como sapatos ou artigos de borracha. Um transtorno parafílico é uma parafilia que está causando sofrimento ou prejuízo ao indivíduo ou uma parafilia cuja satisfação implica dano ou risco de dano pessoal a outros. Uma parafilia é condição necessária, mas não suficiente, para que se tenha um transtorno parafílico, e uma parafilia por si só não necessariamente justifica ou requer intervenção clínica.


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Transtornos Parafílicos

No conjunto de critérios diagnósticos para cada transtorno parafílico listado, o Critério A especifica a natureza qualitativa da parafilia (p. ex., foco erótico em crianças ou em expor a genitália a estranhos), e o Critério B especifica suas consequências negativas (i.e., sofrimento, prejuízo ou dano a outros). Para manter a distinção entre parafilias e transtornos parafílicos, o termo diagnóstico deve ser reservado a indivíduos que atendam aos Critérios A e B (i.e., indivíduos que têm um transtorno parafílico). Se um indivíduo atende ao Critério A mas não ao Critério B para determinada parafilia – circunstância esta que pode surgir quando uma parafilia benigna é descoberta durante a investigação clínica de alguma outra condição –, pode-se dizer, então, que ele tem aquela parafilia, mas não um transtorno parafílico. Não é raro um indivíduo manifestar duas ou mais parafilias. Em alguns casos, os focos parafílicos têm relação próxima, e a conexão entre eles é intuitivamente compreensível (p. ex., fetichismo com os pés e com sapatos). Em outros casos, a conexão entre as parafilias não é óbvia, e a presença de múltiplas parafilias pode ser coincidência ou ter relação com alguma vulnerabilidade generalizada a anomalias do desenvolvimento psicossexual. Seja qual for a condição, diagnósticos comórbidos de transtornos parafílicos distintos podem ser feitos quando mais de uma parafilia causa sofrimento ao indivíduo ou dano a outros. Em decorrência da natureza bipartida do diagnóstico de transtornos parafílicos, escalas aplicadas pelo clínico ou autoaplicadas e avaliações da gravidade podem abordar tanto a intensidade da parafilia em si quanto a gravidade de suas consequências. Embora o sofrimento e o prejuízo estipulados no Critério B sejam específicos por representar a consequência imediata ou final da parafilia, e não a consequência de algum outro fator, os fenômenos de depressão reativa, ansiedade, culpa, história profissional insatisfatória, relações sociais perturbadas e assim por diante podem ter outras origens e ser quantificados com medidas polivalentes de funcionamento psicossocial ou qualidade de vida. O sistema mais amplamente aplicável para avaliar a intensidade de uma parafilia é aquele em que as fantasias, instintos ou comportamentos sexuais parafílicos dos indivíduos examinados são avaliados em comparação com seus interesses e comportamentos sexuais normofílicos. Em uma entrevista clínica ou em questionários autoaplicados, pode-se perguntar aos indivíduos examinados se suas fantasias, seus instintos ou seus comportamentos sexuais parafílicos são mais fracos, iguais ou mais fortes do que seus interesses e comportamentos sexuais normofílicos. Esse mesmo tipo de comparação pode ser, e geralmente é, empregado em medidas psicofisiológicas do interesse sexual, como a pletismografia peniana no sexo masculino ou o tempo de visualização em ambos os sexos.

Transtorno Voyeurista Critérios Diagnósticos

302.82 (F65.3)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa ao observar uma pessoa que ignora estar sendo observada e que está nua, despindo-se ou em meio a atividade sexual, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. B. O indivíduo colocou em prática esses impulsos sexuais com uma pessoa que não consentiu, ou os impulsos ou as fantasias sexuais causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. C. O indivíduo que se excita e/ou coloca em prática os impulsos tem, no mínimo, 18 anos de idade. Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de envolvimento em comportamento voyeurístico são limitadas. Em remissão completa: O indivíduo não colocou em prática os impulsos com pessoa que não consentiu, e não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo por pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.


Transtorno Voyeurista 687

Especificadores O especificador “em remissão completa” não trata da presença ou ausência continuada do voyeurismo por si só, o qual pode ainda estar presente após a remissão dos comportamentos e do sofrimento.

Características Diagnósticas Os critérios diagnósticos para o transtorno voyeurista podem ser aplicados tanto a indivíduos que revelam de forma mais ou menos aberta esse interesse parafílico quanto àqueles que categoricamente negam qualquer excitação sexual decorrente da observação de pessoa que ignora estar sendo observada e que está nua, despindo-se ou em meio a atividade sexual, apesar de evidências objetivas substanciais do contrário. Se indivíduos que revelam o interesse também relatam sofrimento ou problemas psicossociais devido a suas preferências sexuais voyeuristas, eles podem ser diagnosticados com transtorno voyeurista. No entanto, se eles não relatam sofrimento, o que fica provado pela ausência de ansiedade, obsessões, culpa ou vergonha acerca desses impulsos parafílicos, e não apresentam prejuízo em outras áreas importantes do funcionamento devido a esse interesse sexual, além de suas histórias psiquiátricas ou legais indicarem que não colocam tal interesse em prática, pode-se dizer que esses indivíduos têm interesse sexual voyeurista, mas não se deve diagnosticá-los com o transtorno. Indivíduos não confessos incluem, por exemplo, aqueles que sabidamente espionam repetidas vezes pessoas que ignoram estar sendo observadas e que estão nuas ou envolvidas em atividade sexual, mas que negam quaisquer impulsos ou fantasias referentes a tal comportamento sexual e que podem relatar que esses episódios conhecidos de observação de pessoas nuas ou em atividade sexual foram todos acidentais e não sexuais. Outros podem revelar episódios passados de observação de pessoas nuas ou em atividade sexual que ignoram estar sendo observadas, mas contestar qualquer interesse sexual significativo ou contínuo nesse comportamento. Visto que esses indivíduos negam ter fantasias ou impulsos de observar outras pessoas nuas ou em atividade sexual, eles também rejeitam sentir sofrimento subjetivo ou prejuízo social por tais impulsos. Apesar de sua atitude de não revelação, tais indivíduos podem ser diagnosticados com transtorno voyeurista. Comportamento voyeurista recorrente constitui respaldo suficiente para voyeurismo (por atender ao Critério A) e, simultaneamente, demonstra que esse comportamento de motivação parafílica está causando dano a outros indivíduos (por atender ao Critério B). Espionar de forma “recorrente” pessoas que ignoram estar sendo observadas e que estão nuas ou envolvidas em atividade sexual (i.e., múltiplas vítimas, cada uma delas em uma ocasião distinta) pode, via de regra, ser interpretado como a presença de três ou mais vítimas em ocasiões distintas. A existência de menos vítimas pode ser interpretada como atendendo a esse critério caso tenha havido múltiplas ocasiões de observação da mesma vítima ou caso existam evidências que corroborem um interesse distinto ou preferencial na observação secreta de pessoas nuas ou em atividade sexual que ignoram estar sendo observadas. Deve-se ressaltar que vítimas múltiplas, conforme sugerido, representam condição suficiente, embora não necessária, para o diagnóstico; os critérios podem ser também atendidos se o indivíduo admite interesse sexual voyeurista intenso. O período de tempo do Critério A, que indica que os sinais ou sintomas de voyeurismo devem ter persistido pelo menos por seis meses, deve também ser entendido como uma orientação genérica, e não um limite rígido, de modo a assegurar que o interesse sexual na observação secreta de pessoas que ignoram estar sendo observadas e que estejam nuas ou em atividade sexual não seja meramente transitório. A adolescência e a puberdade costumam aumentar a curiosidade e a atividade sexuais. Para reduzir o risco de patologização do interesse e comportamento sexuais normais durante a adolescência puberal, a idade mínima para o diagnóstico do transtorno voyeurista é 18 anos (Critério C).

Prevalência Atos voyeuristas são os mais comuns entre os comportamentos sexuais com potencial de desrespeito às leis. A prevalência do transtorno na população é desconhecida. No entanto, com base em


688

Transtornos Parafílicos

atos sexuais de voyeurismo em amostras não clínicas, a prevalência mais alta possível durante a vida para o transtorno é de aproximadamente 12% no sexo feminino e 4% no feminino.

Desenvolvimento e Curso Em geral é durante a adolescência que indivíduos do sexo masculino com transtorno voyeurista costumam se dar conta, pela primeira vez, de seu interesse sexual por observar secretamente pessoas que ignoram estar sendo observadas. A idade mínima, entretanto, para um diagnóstico de transtorno voyeurista é 18 anos, pois existe grande dificuldade em diferenciar esse transtorno da curiosidade e de atividade sexuais relacionadas à puberdade e adequadas à idade. A persistência do voyeurismo com o passar do tempo não está clara. O transtorno, no entanto, por definição exige um ou mais de um fator contribuinte que pode mudar com o tempo, com ou sem tratamento: sofrimento subjetivo (p. ex., culpa, vergonha, frustração sexual intensa, solidão), doença psiquiátrica, hipersexualidade e impulsividade sexual, prejuízo psicossocial e/ou a propensão para agir sexualmente, espionando pessoas nuas ou em atividade sexual que ignoram estar sendo observadas. Assim, o curso do transtorno voyeurista pode variar com a idade.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. O voyeurismo é precondição necessária para o transtorno voyeurista; assim, os fatores de risco para voyeurismo devem também aumentar a taxa do transtorno voyeurista. Ambientais. Abuso sexual na infância, abuso de substâncias e preocupação sexual/hipersexualidade foram sugeridos como fatores de risco, embora a relação causal para voyeurismo seja incerta, e a especificidade, indefinida.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno voyeurista é bastante raro em indivíduos do sexo feminino em contextos clínicos, ao passo que a proporção entre os sexos masculino e feminino para atos isolados de voyeurismo sexualmente excitantes pode ser de 3:1.

Diagnóstico Diferencial Transtorno da conduta e transtorno da personalidade antissocial. O transtorno da conduta em adolescentes e o transtorno da personalidade antissocial são caracterizados por comportamentos adicionais antissociais e contra as normas, e o interesse sexual específico de observar secretamente pessoas que ignoram estar sendo observadas e que estão nuas ou envolvidas em atividade sexual deve estar ausente. Transtornos por uso de substância. Os transtornos por uso de substância podem envolver episódios voyeuristas isolados por indivíduos intoxicados, mas não devem envolver o interesse sexual típico em observar secretamente pessoas nuas ou envolvidas em atividade sexual que ignoram estar sendo observadas. Assim, fantasias, impulsos e comportamentos sexuais voyeuristas recorrentes que ocorrem também quando o indivíduo não está intoxicado sugerem possível presença de transtorno voyeurista.

Comorbidade Comorbidades conhecidas no transtorno voyeurista baseiam-se amplamente em pesquisas com homens suspeitos de ou condenados por atos envolvendo a observação secreta de pessoas nuas ou em atividade sexual que ignoram estar sendo observadas. Assim, essas comorbidades podem não se aplicar a todos os indivíduos com o transtorno. As condições que ocorrem como comórbidas com o transtorno incluem hipersexualidade e outros transtornos parafílicos, particularmente o transtorno exibicionista. Os transtornos depressivo, bipolar, de ansiedade, por uso de substância, de déficit de atenção/hiperatividade, da conduta e da personalidade antissocial são também condições comórbidas frequentes.


Transtorno Exibicionista 689

Transtorno Exibicionista Critérios Diagnósticos

302.4 (F65.2)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa decorrente da exposição dos próprios genitais a uma pessoa que não espera o fato, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. B. O indivíduo colocou em prática esses impulsos sexuais com uma pessoa que não consentiu, ou os impulsos ou as fantasias sexuais causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Determinar o subtipo: Excitado sexualmente pela exposição dos genitais a crianças pré-púberes Excitado sexualmente pela exposição dos genitais a indivíduos fisicamente maduros Excitado sexualmente pela exposição dos genitais a crianças pré-púberes e a indivíduos fisicamente maduros Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de exposição da própria genitália são limitadas. Em remissão completa: O indivíduo não colocou em prática os impulsos com pessoa que não consentiu, e não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo por pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.

Subtipos Os subtipos do transtorno exibicionista baseiam-se na idade e na maturidade física dos indivíduos que não consentem a quem o indivíduo prefere expor a genitália. Os que não consentem podem ser crianças pré-púberes, adultos ou ambos. Esse especificador deve ajudar a focar atenção adequada em características de vítimas de indivíduos com o transtorno exibicionista para evitar que um transtorno pedofílico concomitante passe despercebido. No entanto, indicações de que o indivíduo com transtorno exibicionista excita-se sexualmente ao expor sua genitália a crianças não devem excluir um diagnóstico de transtorno pedofílico.

Especificadores O especificador “em remissão completa” não se refere à presença ou à ausência continuada de exibicionismo por si só, o qual pode ainda estar presente após a remissão de comportamentos e sofrimento.

Características Diagnósticas Os critérios diagnósticos para transtorno exibicionista podem ser aplicados tanto a indivíduos que mais ou menos abertamente revelam essa parafilia quanto àqueles que negam categoricamente qualquer atrativo sexual em expor os genitais a pessoas que não esperam o fato, apesar de evidências objetivas substanciais do contrário. Se indivíduos que revelam seus interesses também relatam dificuldades psicossociais em razão de suas atrações ou preferências sexuais por expor, eles podem ser diagnosticados com transtorno exibicionista. Diferentemente, se declaram ausência de sofrimento (exemplificada por ausência de ansiedade, obsessões e culpa ou vergonha acerca desses impulsos parafílicos), não apresentam prejuízos em outras áreas importantes do funcionamento, e se suas histórias psiquiátricas ou legais indicam que não colocam em prática esses interesses sexuais, tais indivíduos podem ser caracterizados como tendo interesse sexual exibicionista, mas não podem ser diagnosticados com o transtorno. Exemplos de indivíduos que não relevam seus interesses incluem aqueles que se expõem repetidas vezes a pessoas que não esperam o fato em ocasiões distintas, mas que negam impulsos


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Transtornos Parafílicos

ou fantasias sobre tal comportamento sexual e informam que os episódios conhecidos de exposição foram todos acidentais e não sexuais. Outros podem revelar episódios passados de comportamento sexual envolvendo exposição genital, mas refutar qualquer interesse sexual significativo ou contínuo em comportamentos do tipo. Como esses indivíduos negam ter impulsos ou fantasias que envolvem a exposição da genitália, acabam também negando sentimentos de sofrimento subjetivo ou prejuízo social em decorrência de tais impulsos. Essas pessoas podem ser diagnosticadas com o transtorno exibicionista apesar do autorrelato negativo. Comportamento exibicionista recorrente constitui respaldo suficiente para exibicionismo (Critério A) e simultaneamente representa que esse comportamento com motivação parafílica está causando dano a outros (Critério B). Exposição genital “recorrente” a outros que não esperam o fato (i.e., múltiplas vítimas, cada uma em uma ocasião distinta) pode, via de regra, ser interpretada como a presença de três vítimas ou mais em ocasiões distintas. Menos vítimas é um dado que pode ser interpretado como atendendo a esse critério caso tenha havido múltiplas ocasiões de exposição à mesma vítima ou caso haja evidências corroborativas de um interesse forte ou preferencial em expor os genitais a pessoas que não esperam o fato. Deve-se ressaltar que vítimas múltiplas, conforme sugerido anteriormente, constituem condição suficiente, mas não necessária, para o diagnóstico, já que os critérios podem ser atendidos pelo reconhecimento do indivíduo de um interesse sexual exibicionista intenso com sofrimento e/ou prejuízo. O período de tempo do Critério A, que indica que os sinais e sintomas exibicionistas devem ter persistido por pelo menos seis meses, deve também ser entendido como uma orientação geral, e não um limite rígido, de modo a assegurar que o interesse sexual em expor os próprios genitais a outros que não esperam o fato não é meramente transitório. Isso pode ser expresso por evidências claras de comportamentos ou sofrimento repetidos por um período não transitório inferior a seis meses.

Prevalência É desconhecida a prevalência do transtorno exibicionista. Entretanto, com base em atos sexuais exibicionistas na população em geral ou em amostras não clínicas, a prevalência mais alta possível do transtorno em indivíduos do sexo masculino é de 2 a 4%. A prevalência do transtorno no sexo feminino é ainda mais incerta, mas se acredita que seja muito mais baixa do que no masculino.

Desenvolvimento e Curso Homens adultos com o transtorno exibicionista frequentemente relatam que se tornaram conscientes pela primeira vez do interesse sexual em expor a genitália a pessoas que não esperam o fato durante a adolescência ou mais tarde em comparação com o período típico do desenvolvimento do interesse sexual normal em mulheres ou homens. Embora não exista idade mínima exigida para o diagnóstico de transtorno exibicionista, pode ser difícil diferenciar comportamentos exibicionistas de curiosidade sexual adequada à idade em adolescentes. Impulsos exibicionistas parecem surgir na adolescência ou no início da vida adulta, mas se sabe muito pouco sobre sua persistência ao longo do tempo. Por definição, o transtorno exibicionista exige um ou mais de um fator contribuinte, o qual pode mudar com o tempo, com ou sem tratamento: sofrimento subjetivo (p. ex., culpa, vergonha, frustração sexual intensa, solidão), doença psiquiátrica, hipersexualidade e impulsividade sexual, prejuízo psicossocial e/ou a propensão a atos sexuais de exposição da genitália a pessoas que não esperam o fato. Assim, o curso de um transtorno exibicionista pode variar com a idade. Da mesma forma que outras preferências sexuais, o avanço da idade pode estar associado à redução das preferências e do comportamento sexual exibicionista.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. Visto que o exibicionismo é uma precondição necessária para o transtorno exibicionista, os fatores de risco para exibicionismo devem também aumentar a taxa de transtorno exibicionista. História antissocial, transtorno da personalidade antissocial, abuso de álcool e preferência sexual pedofílica podem aumentar o risco de recidiva sexual nos indivíduos exibicio-


Transtorno Frotteurista 691 nistas. Assim, transtorno da personalidade antissocial, transtorno por uso de álcool e interesse pedofílico podem ser considerados fatores de risco para transtorno exibicionista em indivíduos do sexo masculino com preferências sexuais exibicionistas. Ambientais. Abuso sexual e emocional e preocupação sexual e hipersexualidade na infância foram sugeridos como fatores de risco para o exibicionismo, embora a relação causal entre eles seja incerta, e a especificidade, ainda não esclarecida.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero O transtorno exibicionista é bastante incomum no sexo feminino, ao passo que atos exibicionistas sexualmente excitantes isolados podem ocorrer em mulheres com uma frequência equivalente à metade da encontrada em homens.

Consequências Funcionais do Transtorno Exibicionista As consequências funcionais do transtorno exibicionista não foram pesquisadas em indivíduos que expuseram seus genitais a estranhos que não esperavam o fato e que atendiam ao Critério B pelo fato de vivenciarem sofrimento emocional intenso devido a tais preferências.

Diagnóstico Diferencial Os diagnósticos diferenciais potenciais para transtorno exibicionista ocorrem por vezes como transtornos comórbidos. Assim, é necessário avaliar separadamente as evidências para o transtorno exibicionista e outras condições possíveis. Transtorno da conduta e transtorno da personalidade antissocial. Transtorno da conduta em adolescentes e transtorno da personalidade antissocial são caracterizados por comportamentos adicionais de descumprimento de normas e comportamentos antissociais, sem estar presente o interesse sexual específico na exposição dos genitais. Transtornos por uso de substância. Transtornos por uso de álcool e substância podem envolver episódios exibicionistas isolados por parte de indivíduos intoxicados, mas não devem envolver o interesse sexual típico de expor os genitais a pessoas que não esperam o fato. Assim, fantasias, impulsos ou comportamentos sexuais exibicionistas recorrentes que ocorrem também quando o indivíduo não está intoxicado sugerem possível presença do transtorno exibicionista.

Comorbidade Comorbidades conhecidas do transtorno exibicionista baseiam-se amplamente em pesquisas com indivíduos (quase todos do sexo masculino) condenados por atos criminosos envolvendo exposição da genitália a indivíduos que não consentiram com isso. Assim, essas comorbidades podem não se aplicar a todos os indivíduos que atendem aos critérios para um diagnóstico de transtorno exibicionista. As condições que ocorrem em comorbidade com o transtorno em taxas elevadas incluem transtornos depressivo, bipolar, de ansiedade e por uso de substância; hipersexualidade, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, outros transtornos parafílicos e transtorno da personalidade antissocial.

Transtorno Frotteurista Critérios Diagnósticos

302.89 (F65.81)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa resultante de tocar ou esfregar-se em pessoa que não consentiu, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos.


692

Transtornos Parafílicos

B. O indivíduo colocou em prática esses impulsos sexuais com pessoa que não consentiu, ou os impulsos ou as fantasias sexuais causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de tocar outra pessoa ou esfregar-se nela são limitadas. Em remissão completa: O indivíduo colocou em prática seus impulsos com pessoa que não consentiu, e não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo durante pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.

Especificadores O especificador “em remissão” não trata da presença ou da ausência continuada de frotteurismo por si só, que pode ainda estar presente após a remissão dos comportamentos e do sofrimento.

Características Diagnósticas Os critérios diagnósticos para transtorno frotteurista podem se aplicar tanto a indivíduos que, de forma relativa, revelam livremente essa parafilia quanto àqueles que negam de forma categórica qualquer atrativo sexual em tocar ou esfregar-se em indivíduo que não consente, independentemente de evidências objetivas consideráveis do contrário. Se indivíduos que revelam a condição também relatam prejuízo psicossocial devido a suas preferências sexuais por tocar e esfregar-se em pessoa que não consente, eles podem ser diagnosticados com o transtorno frotteurista. Diferentemente, se declaram ausência de sofrimento (demonstrada por ausência de ansiedade, obsessão, culpa ou vergonha) acerca desses impulsos parafílicos e não apresentam prejuízo em outras áreas importantes do funcionamento devido a seu interesse sexual, e se suas histórias psiquiátricas ou legais indicam que não colocam em prática esse interesse, podem ser caracterizados como tendo interesse sexual frotteurista, mas não devem receber o diagnóstico de transtorno frotteurista. Indivíduos que não revelam seu interesse incluem, por exemplo, aqueles que sabidamente apresentaram comportamento de tocar ou esfregar-se em pessoa que não consentiu em ocasiões distintas, mas que contestam quaisquer impulsos ou fantasias relativas a esse comportamento. Tais indivíduos podem relatar que os episódios identificados de tocar e esfregar-se em pessoa que não consente foram todos sem intenção e não sexuais. Outros podem revelar episódios passados de tocar e esfregar-se em indivíduos que não consentem, mas contestar qualquer interesse sexual maior ou persistente nisso. Uma vez que essas pessoas negam ter fantasias ou impulsos de tocar e esfregar-se em outras, consequentemente rejeitam sentir-se em sofrimento ou psicologicamente prejudicadas por esses impulsos. Apesar da posição não reveladora, esses indivíduos podem ser diagnosticados com transtorno frotteurista. Comportamento frotteurista recorrente constitui respaldo satisfatório para frotteurismo (por atender ao Critério A) e demonstra também que esse comportamento motivado por parafilia está causando dano a outros (por atender ao Critério B). O tocar e esfregar-se de forma “recorrente” em pessoa que não consente (i.e., múltiplas vítimas, cada uma em uma ocasião distinta) pode, via de regra, ser interpretado como a presença de três vítimas ou mais em ocasiões distintas. Menos vítimas é um dado que pode ser interpretado como atendendo a esse critério caso tenha havido múltiplas ocasiões de tocar e esfregar-se no mesmo indivíduo que não consente ou caso haja evidências que corroboram um interesse forte ou preferencial por tocar ou esfregar-se em indivíduos que não consentem. Deve-se ressaltar que vítimas múltiplas constituem condição suficiente, mas não necessária, para o diagnóstico, já que os critérios podem ser atendidos pelo reconhecimento do indivíduo de um interesse sexual frotteurista intenso, com sofrimento e/ou prejuízo clinicamente significativos. O período de tempo do Critério A, que indica que os sinais e sintomas frotteuristas devem ter persistido por pelo menos seis meses, deve também ser entendido como uma orientação geral, e não um limite rígido, de modo a assegurar que o interesse sexual em tocar ou esfregar-se em pessoa que não consente não é transitório. Assim, a parte da duração do Critério A pode tam-


Transtorno Frotteurista 693 bém ser satisfeita caso existam evidências claras de comportamentos recorrentes ou sofrimento por um período mais curto, mas não transitório.

Prevalência Atos frotteuristas, incluindo tocar ou esfregar-se em outro indivíduo sem ser convidado para tal, podem ocorrer em até 30% dos homens adultos na população em geral. Cerca de 10 a 14% dos adultos do sexo masculino atendidos em contextos ambulatoriais para transtornos parafílicos e hipersexualidade têm uma apresentação que atende aos critérios diagnósticos para o transtorno. Assim, ainda que a prevalência de transtorno frotteurista na população seja desconhecida, é improvável que ela exceda a taxa encontrada em contextos clínicos selecionados.

Desenvolvimento e Curso Adultos do sexo masculino com transtorno frotteurista frequentemente relatam que durante a fase final da adolescência ou no início da vida adulta é que tiveram consciência, pela primeira vez, de seu interesse sexual em tocar furtivamente pessoas que não consentiam. Crianças e adolescentes, no entanto, podem também tocar ou esfregar-se em outras pessoas que não o desejam na ausência de um diagnóstico de transtorno frotteurista. Ainda que não exista idade mínima para o diagnóstico, o transtorno pode ser de difícil diferenciação do comportamento do transtorno da conduta sem motivação sexual em indivíduos mais jovens. A persistência do frotteurismo com o passar do tempo não está clara. O transtorno, contudo, por definição, requer um ou mais de um fator contribuinte capaz de mudar com o tempo, com ou sem tratamento: sofrimento subjetivo (p. ex., culpa, vergonha, frustração sexual intensa, solidão), doença psiquiátrica, hipersexualidade e impulsividade sexual, prejuízo psicossocial e/ou a propensão a colocar em prática a sexualidade por meio do tocar ou esfregar-se em pessoas que não dão consentimento. Assim, o curso do transtorno frotteurista pode variar com a idade. Tal como outras preferências sexuais, o avanço da idade pode estar associado à redução de preferências e comportamentos sexuais frotteuristas.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. Comportamento antissocial não sexual e preocupação sexual/hipersexualidade podem ser fatores de risco não específicos, embora a relação causal com frotteurismo seja incerta, e a especificidade, não esclarecida. O frotteurismo, entretanto, é precondição necessária para transtorno frotteurista; assim, os fatores de risco para frotteurismo devem também aumentar a taxa do transtorno.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Parece haver substancialmente menos indivíduos do sexo feminino com preferência sexual frotteurista em comparação com os do masculino.

Diagnóstico Diferencial Transtorno da conduta e transtorno da personalidade antissocial. Transtorno da conduta em adolescentes e transtorno da personalidade antissocial são caracterizados por comportamentos adicionais de desrespeito às normas e antissociais, e o interesse sexual específico em tocar ou esfregar-se em indivíduo que não consente deve estar ausente. Transtornos por uso de substância. Transtornos por uso de substância, particularmente aqueles associados a estimulantes como cocaína e anfetaminas, podem envolver episódios frotteuristas isolados por parte de indivíduos intoxicados, mas não devem envolver o interesse sexual contínuo típico em tocar ou esfregar-se em pessoas que não esperam tal fato. Assim, fantasias, impulsos ou comportamentos sexuais frotteuristas recorrentes que ocorrem quando o indivíduo não está intoxicado sugerem possível presença de transtorno frotteurista.


694

Transtornos Parafílicos

Comorbidade Comorbidades conhecidas no transtorno frotteurista baseiam-se amplamente em pesquisas com indivíduos do sexo masculino suspeitos de ou condenados por atos criminais envolvendo o tocar ou esfregar-se com motivações sexuais em indivíduo que não consentiu. Assim, essas comorbidades podem não se aplicar a outros indivíduos com diagnóstico de transtorno frotteurista baseado em sofrimento subjetivo relativo a seu interesse sexual. Condições que ocorrem de forma comórbida com o transtorno frotteurista incluem hipersexualidade e outros transtornos parafílicos, especialmente transtorno exibicionista e transtorno voyeurista. Transtorno da conduta, transtorno da personalidade antissocial, transtornos depressivos, transtornos bipolares, transtornos de ansiedade e transtornos por uso de substância também ocorrem de forma concomitante. Diagnósticos diferenciais potenciais para transtorno frotteurista ocorrem por vezes como transtornos comórbidos. Portanto, é geralmente necessário avaliar as evidências para transtorno frotteurista e possíveis condições comórbidas como questões separadas.

Transtorno do Masoquismo Sexual Critérios Diagnósticos

302.83 (F65.51)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa resultante do ato de ser humilhado, espancado, amarrado ou vítima de qualquer outro tipo de sofrimento, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. B. As fantasias, os impulsos sexuais ou os comportamentos causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Especificar se: Com asfixiofilia: Quando o indivíduo se envolve na prática de conseguir excitação sexual por meio da restrição da respiração. Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de envolvimento em comportamentos sexuais masoquistas são limitadas. Em remissão completa: Não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo por pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.

Características Diagnósticas Os critérios diagnósticos para transtorno do masoquismo sexual existem com o intuito de serem aplicados a indivíduos que admitem livremente ter tais interesses parafílicos. Esses indivíduos admitem abertamente excitação sexual intensa resultante do ato de serem humilhados, espancados, amarrados ou vítimas de qualquer outro tipo de sofrimento, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. Se também relatam dificuldades psicossociais devido a suas atrações ou preferências sexuais de serem humilhados, espancados, amarrados ou vítimas de qualquer outro tipo de sofrimento, podem ser diagnosticados com transtorno do masoquismo sexual. Diferentemente, se declaram ausência de sofrimento, exemplificado por ansiedade, obsessões, culpa ou vergonha em relação a esses impulsos parafílicos, e não são impedidos por eles de buscar outras metas pessoais, podem ser caracterizados como tendo interesse sexual masoquista, mas não devem ser diagnosticados com transtorno do masoquismo sexual. O período de tempo do Critério A, que indica que os sinais e sintomas de masoquismo sexual devem ter persistido por um período mínimo de seis meses, deve ser entendido como uma orientação geral, e não um limite rígido, para assegurar que o interesse sexual em ser humilhado, espancado, amarrado ou vítima de qualquer outro tipo de sofrimento não é meramente transitó-


Transtorno do Masoquismo Sexual 695 rio. O transtorno pode, no entanto, ser diagnosticado no caso da manutenção do interesse sexual masoquista por um tempo claramente continuado, ainda que mais curto.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O uso intenso de pornografia envolvendo o ato de ser humilhado, espancado, amarrado ou vítima de qualquer outro tipo de sofrimento é por vezes uma característica associada ao transtorno do masoquismo sexual.

Prevalência A prevalência na população do transtorno do masoquismo sexual é desconhecida. Na Austrália, foi estimado que 2,2% dos indivíduos do sexo masculino e 1,3% dos do sexo feminino estiveram envolvidos em práticas sexuais sadomasoquistas nos últimos 12 meses.

Desenvolvimento e Curso Indivíduos com parafilias relataram idade média do surgimento do masoquismo de 19,3 anos, embora antes, inclusive na puberdade e na infância, existam também relatos de aparecimento de fantasias sadomasoquistas. Muito pouco é conhecido sobre a persistência ao longo do tempo. O transtorno do masoquismo sexual, por definição, requer um ou mais de um fator contribuinte que pode mudar com o tempo, com ou sem tratamento. Estes incluem sofrimento subjetivo (p. ex., culpa, vergonha, frustração sexual intensa, solidão), doença psiquiátrica, hipersexualidade e impulsividade sexual e prejuízo psicossocial. Assim, o curso do transtorno possivelmente varia com o passar do tempo. É provável que o avanço da idade cause o mesmo efeito redutor sobre a preferência sexual envolvendo masoquismo sexual encontrado em outros comportamentos sexuais parafílicos ou normofílicos.

Consequências Funcionais do Transtorno do Masoquismo Sexual As consequências funcionais do transtorno do masoquismo sexual são desconhecidas. Os masoquistas, porém, correm risco de morte acidental enquanto praticam a asfixiofilia ou outros procedimentos autoeróticos.

Diagnóstico Diferencial Muitas das condições que podem ser diagnósticos diferenciais para transtorno do masoquismo sexual (p. ex., fetichismo transvéstico, transtorno do sadismo sexual, hipersexualidade, transtornos por uso de álcool e substância) ocorrem, por vezes, também como diagnósticos comórbidos. Assim, é necessário avaliar cuidadosamente as evidências de transtorno do masoquismo sexual, mantendo a possibilidade de outras parafilias ou outros transtornos mentais como parte do diagnóstico diferencial. Masoquismo sexual na ausência de sofrimento (i.e., transtorno ausente) também é incluso no diagnóstico diferencial, visto que as pessoas que apresentam os comportamentos podem estar satisfeitas com sua orientação masoquista.

Comorbidade Comorbidades conhecidas com transtorno do masoquismo sexual baseiam-se amplamente em indivíduos em tratamento. Transtornos que ocorrem de forma comórbida com transtorno do masoquismo sexual tipicamente incluem outros transtornos parafílicos, como o fetichismo transvéstico.


696

Transtornos Parafílicos

Transtorno do Sadismo Sexual Critérios Diagnósticos

302.84 (F65.52)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa resultante de sofrimento físico ou psicológico de outra pessoa, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. B. O indivíduo coloca em prática esses impulsos com pessoa que não consentiu, ou os impulsos ou as fantasias sexuais causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de envolvimento em comportamentos sexuais sádicos são limitadas. Em remissão completa: O indivíduo não colocou em prática os impulsos com pessoa que não consentiu, e não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo por pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.

Características Diagnósticas Os critérios diagnósticos para transtorno do sadismo sexual existem com o intuito de serem aplicados tanto aos indivíduos que admitem livremente ter tais interesses parafílicos quanto àqueles que negam qualquer interesse sexual no sofrimento físico ou psicológico de outra pessoa, apesar de evidências objetivas substanciais do contrário. Indivíduos que abertamente admitem interesse sexual intenso no sofrimento físico ou psicológico de outras pessoas são chamados de “indivíduos confessos”. Se relatam também dificuldades psicossociais devido a atração ou preferências sexuais no sofrimento físico ou psicológico de outro indivíduo, podem ser diagnosticados com o transtorno do sadismo sexual. Diferentemente, se declaram ausência de sofrimento, exemplificado por ansiedade, obsessões, culpa ou vergonha em relação a esses impulsos parafílicos, não são impedidos por eles de buscar outras metas e se suas histórias psiquiátricas ou legais indicam que não os colocam em prática, podem ser caracterizados como tendo interesse sexual sádico, mas não atendem aos critérios para transtorno do sadismo sexual. Exemplos de indivíduos que negam qualquer interesse no sofrimento físico ou psicológico de outra pessoa incluem aqueles que sabidamente infligiram dor ou sofrimento a múltiplas vítimas em ocasiões distintas, mas negam impulsos ou fantasias acerca de tal comportamento sexual e podem alegar que os episódios conhecidos de agressão sexual tenham sido sem intenção ou não sexuais. Outros podem admitir episódios passados de comportamento sexual que tenham envolvido infligir dor ou sofrimento em um indivíduo que não consentiu, mas sem relatar qualquer interesse sexual significativo ou continuado no sofrimento físico ou psicológico de outra pessoa. Visto que esses indivíduos negam ter impulsos ou fantasias envolvendo excitação sexual por meio da dor e do sofrimento, consequentemente também negariam sentimentos de sofrimento subjetivo ou prejuízo social causados por tais impulsos. Essas pessoas podem ser diagnosticadas com o transtorno do sadismo sexual apesar de seu autorrelato negativo. Seu comportamento recorrente constitui respaldo clínico para a presença da parafilia do sadismo sexual (por atender ao Critério A) e, ao mesmo tempo, demonstra que seu comportamento de motivação parafílica está causando sofrimento clinicamente significativo, dano ou risco a outras pessoas (por atender ao Critério B). Sadismo sexual recorrente envolvendo outros que não consentem (i.e., múltiplas vítimas, cada uma em uma ocasião distinta) pode ser interpretado, via de regra, como a presença de três ou mais vítimas em ocasiões distintas. Menos vítimas é um dado que pode ser interpretado como atendendo a esse critério caso haja múltiplas ocasiões em que tenham sido infligidos dor e sofrimento à mesma vítima ou caso haja evidências que corroborem interesse forte ou preferencial na dor e no sofrimento envolvendo múltiplas vítimas. Deve-se observar que múltiplas vítimas, conforme su-


Transtorno do Sadismo Sexual 697 gerido anteriormente, representam condição suficiente, mas não necessária, para o diagnóstico, já que os critérios podem ser atendidos se o indivíduo admite interesse sexual sádico intenso. O período de tempo do Critério A, que indica que os sinais e sintomas de sadismo sexual devem ter persistido por um período mínimo de seis meses, deve, ainda, ser entendido como uma orientação geral, e não um limite rígido, para assegurar que o interesse sexual de infligir dor e sofrimento a vítimas que não consentem não é meramente transitório. O diagnóstico, no entanto, pode ser feito quando há um período claramente continuado, embora mais curto, de comportamentos sádicos.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O uso intenso de pornografia envolvendo o ato de infligir dor e sofrimento é, por vezes, uma característica associada ao transtorno do sadismo sexual.

Prevalência A prevalência do transtorno do sadismo sexual na população é desconhecida e amplamente baseada em indivíduos em contextos forenses. Dependendo dos critérios para sadismo sexual, a prevalência varia muito, desde 2 até 30%. Entre condenados por atos sexuais nos Estados Unidos, menos de 10% apresentam sadismo sexual. Entre indivíduos que cometeram homicídios por motivação sexual, as taxas de transtorno do sadismo sexual variam de 37 a 75%.

Desenvolvimento e Curso Indivíduos com sadismo sexual em amostras forenses são quase exclusivamente do sexo masculino, embora uma amostra representativa da população australiana tenha informado que 2,2% dos homens e 1,3% das mulheres disseram ter-se envolvido em atividades sadomasoquistas no ano anterior. As informações sobre o desenvolvimento e o curso do transtorno do sadismo sexual são muito limitadas. Um estudo informou que as mulheres se davam conta da orientação sadomasoquista no início da vida adulta; já outro estudo informou que a idade média do surgimento do sadismo em um grupo de homens ficou em 19,4 anos. Enquanto o sadismo sexual por si só é provavelmente uma característica para toda a vida, o transtorno do sadismo sexual pode oscilar de acordo com o sofrimento subjetivo do indivíduo ou a sua propensão de causar dano a outras pessoas que não o consentem. O avanço da idade pode ter o mesmo efeito redutor sobre esse transtorno que tem em outros comportamentos sexuais parafílicos ou normofílicos.

Diagnóstico Diferencial Muitas das condições que podem ser diagnósticos diferenciais para o transtorno do sadismo sexual (p. ex., transtorno da personalidade antissocial, transtorno do masoquismo sexual, hipersexualidade, transtornos por uso de substância) ocorrem, por vezes, também como diagnósticos comórbidos. Assim, é necessário avaliar cuidadosamente as evidências de transtorno do sadismo sexual, mantendo a possibilidade de outras parafilias ou transtornos mentais como parte do diagnóstico diferencial. A maior parte dos indivíduos ativos em redes comunitárias que praticam comportamentos sádicos e masoquistas não expressa qualquer insatisfação com seus interesses sexuais, e seu comportamento não atende aos critérios do DSM-5 para transtorno do sadismo sexual. Interesse sádico, mas não o transtorno do sadismo, pode ser considerado no diagnóstico diferencial.

Comorbidade Comorbidades conhecidas com transtorno do sadismo sexual baseiam-se amplamente em indivíduos (quase todos do sexo masculino) condenados por atos criminosos envolvendo atos de sadismo contra vítimas que não o consentiram. Assim, essas comorbidades podem não se aplicar a todos aqueles indivíduos que jamais se envolveram em atividade sádica com vítima que não


698

Transtornos Parafílicos

consentiu mas que atendem aos critérios para um diagnóstico de transtorno do sadismo sexual com base em sofrimento subjetivo relativo a seu interesse sexual. Transtornos que são comumente comórbidos com o transtorno do sadismo sexual incluem outros transtornos parafílicos.

Transtorno Pedofílico Critérios Diagnósticos

302.2 (F65.4)

A. Por um período de pelo menos seis meses, fantasias sexualmente excitantes, impulsos sexuais ou comportamentos intensos e recorrentes envolvendo atividade sexual com criança ou crianças pré-púberes (em geral, 13 anos ou menos). B. O indivíduo coloca em prática esses impulsos sexuais, ou os impulsos ou as fantasias sexuais causam sofrimento intenso ou dificuldades interpessoais. C. O indivíduo tem, no mínimo, 16 anos de idade e é pelo menos cinco anos mais velho que a criança ou as crianças do Critério A. Nota: Não incluir um indivíduo no fim da adolescência envolvido em relacionamento sexual contínuo com pessoa de 12 ou 13 anos de idade. Determinar o subtipo: Tipo exclusivo (com atração apenas por crianças) Tipo não exclusivo Especificar se: Sexualmente atraído por indivíduos do sexo masculino Sexualmente atraído por indivíduos do sexo feminino Sexualmente atraído por ambos Especificar se: Limitado a incesto

Características Diagnósticas Os critérios diagnósticos para transtorno pedofílico existem com o intuito de serem aplicados tanto a indivíduos que revelam abertamente essa parafilia quanto àqueles que negam qualquer atração sexual por crianças pré-púberes (em geral, 13 anos ou menos), apesar de evidências objetivas substanciais do contrário. Exemplos de revelação dessa parafilia incluem reconhecer abertamente interesse sexual intenso por crianças e a indicação de que o interesse sexual por crianças é maior ou igual ao interesse sexual por indivíduos fisicamente maduros. Se essas pessoas também se queixam de que suas atrações e preferências sexuais por crianças lhes estão causando dificuldades psicossociais, podem ser diagnosticadas com transtorno pedofílico. No entanto, se relatam ausência de sentimentos de culpa, vergonha ou ansiedade em relação a esses impulsos, não apresentam limitação funcional por seus impulsos parafílicos (conforme autorrelato, avaliação objetiva ou ambos), e seu autorrelato e sua história legal registrada indicam que jamais colocaram em prática esses impulsos, essas pessoas, então, apresentam orientação sexual pedofílica, mas não transtorno pedofílico. Exemplos de indivíduos que negam atração por crianças incluem aqueles que sabidamente abordaram sexualmente múltiplas crianças em ocasiões distintas, mas negam quaisquer impulsos ou fantasias sobre comportamento sexual envolvendo crianças, podendo alegar, ainda, que os episódios conhecidos de contato físico foram todos sem intenção e não sexuais. Outros podem admitir episódios anteriores de comportamento sexual envolvendo crianças, embora neguem qualquer interesse sexual significativo ou continuado por elas. Visto que essas pessoas podem negar experiências, impulsos e fantasias envolvendo crianças, também podem negar sentir sofrimento subjetivo. Tais indivíduos podem, ainda, ser diagnosticados com transtorno pedofílico apesar da ausência de sofrimento autorrelatado, desde que haja evidências de comportamentos recorrentes persistindo por seis meses (Critério A) e de que colocaram em prática os impulsos sexuais ou tiveram dificuldades interpessoais em consequência do transtorno (Critério B).


Transtorno Pedofílico 699 A presença de múltiplas vítimas, conforme discutido anteriormente, é suficiente, mas não necessária, para o diagnóstico; isto é, o indivíduo pode ainda atender ao Critério A apenas por admitir interesse sexual intenso ou preferencial por crianças. O Critério A, que indica que os sinais e sintomas de pedofilia devem ter persistido por seis meses ou mais, pretende assegurar que a atração sexual por crianças não é meramente transitória. O diagnóstico, porém, pode ser feito caso haja evidência clínica de persistência continuada da atração sexual por crianças mesmo quando a duração de seis meses não pode ser determinada com precisão.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O uso intenso de pornografia que mostra crianças pré-púberes é um indicador diagnóstico útil do transtorno pedofílico. Trata-se de uma situação específica do caso geral de que os indivíduos podem optar pelo tipo de pornografia que corresponde a seus interesses sexuais.

Prevalência A prevalência na população do transtorno pedofílico é desconhecida. A prevalência mais alta possível para o transtorno entre os indivíduos do sexo masculino é de cerca de 3 a 5%. Nos do sexo feminino, a prevalência é ainda mais incerta, embora possivelmente seja uma fração pequena daquela observada no sexo masculino.

Desenvolvimento e Curso Homens adultos com transtorno pedofílico podem relatar que perceberam o interesse sexual forte ou preferencial por crianças por volta do período da puberdade – o mesmo período de tempo em que aqueles que mais tarde preferem parceiros fisicamente maduros percebem o interesse sexual por mulheres ou homens. Tentar diagnosticar transtorno pedofílico na idade em que ocorre a primeira manifestação é problemático, devido à dificuldade, durante o desenvolvimento da adolescência, de diferenciá-lo do interesse sexual adequado à idade por colegas ou da curiosidade sexual. Assim, o Critério C exige, para o diagnóstico, idade mínima de 16 anos e pelo menos cinco anos mais que a criança ou crianças do Critério A. A pedofilia em si parece ser uma condição para toda a vida. O transtorno pedofílico, porém, inclui necessariamente outros elementos que podem mudar com o tempo, com ou sem tratamento: sofrimento subjetivo (p. ex., culpa, vergonha, frustração sexual intensa ou sentimentos de isolamento) ou prejuízo psicossocial ou a propensão a agir sexualmente com crianças, ou ambos. O curso do transtorno, portanto, pode oscilar, aumentar ou diminuir com a idade. Adultos com o transtorno pedofílico podem relatar percepção do interesse sexual por crianças que antecedeu o início do comportamento sexual envolvendo crianças ou a autoidentificação como pedófilo. A idade avançada possivelmente diminui a frequência de comportamento sexual envolvendo crianças, da mesma forma que diminui aquele com motivação parafílica ou normofílica.

Fatores de Risco e Prognóstico Temperamentais. Parece existir interação entre pedofilia e comportamento antissocial, de modo que indivíduos do sexo masculino com ambos os traços apresentam maior propensão a agir sexualmente com crianças. Assim, o transtorno da personalidade antissocial pode ser considerado um fator de risco para transtorno pedofílico em homens com pedofilia. Ambientais. Homens adultos com pedofilia frequentemente relatam terem sido sexualmente abusados quando crianças. Ainda não está claro, porém, se essa correlação reflete uma influência causal do abuso sexual na infância sobre a pedofilia na vida adulta. Genéticos e fisiológicos. Visto que a pedofilia é condição necessária para transtorno pedofílico, todo fator que aumenta a probabilidade de pedofilia também aumenta o risco de transtorno


700

Transtornos Parafílicos

pedofílico. Há algumas evidências de que perturbação do neurodesenvolvimento na vida intrauterina aumenta a probabilidade de desenvolvimento de orientação pedofílica.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Medidas laboratoriais psicofisiológicas do interesse sexual, que algumas vezes são úteis para o diagnóstico do transtorno pedofílico no sexo masculino, não são necessariamente úteis para o diagnóstico do transtorno no feminino, mesmo diante da disponibilidade de um procedimento idêntico (p. ex., tempo de visualização) ou de procedimentos análogos (p. ex., pletismografia peniana e fotopletismografia vaginal).

Marcadores Diagnósticos Medidas psicofisiológicas do interesse sexual podem, algumas vezes, ser úteis quando a história do indivíduo sugere a possível presença de transtorno pedofílico, mas ele nega atração forte ou preferencial por crianças. Entre essas medidas, a mais pesquisada e usada há mais tempo é a pletismografia peniana, embora a especificidade e a sensibilidade do diagnóstico possam variar de um local para outro. O tempo de visualização, com uso de fotografias de pessoas nuas ou minimamente vestidas como estímulo visual, é também empregado para o diagnóstico do transtorno pedofílico, especialmente em combinação com medidas autorrelatadas. Profissionais da saúde mental dos Estados Unidos, no entanto, devem estar conscientes de que a posse de tais estímulos visuais, mesmo para fins diagnósticos, pode violar a legislação do país no que se refere à posse de pornografia infantil, deixando esse profissional suscetível a processo criminal.

Diagnóstico Diferencial Muitas das condições que podem ser diagnósticos diferenciais para transtorno pedofílico podem também, por vezes, ocorrer como diagnósticos comórbidos. É, portanto, necessário avaliar as evidências para transtorno pedofílico e outras condições possíveis como questões separadas. Transtorno da personalidade antissocial. Esse transtorno aumenta a probabilidade de que uma pessoa que tenha atração principalmente pelo corpo humano maduro venha a aproximar-se de uma criança, em uma ou algumas ocasiões, com base na disponibilidade relativa. O indivíduo frequentemente demonstra outros sinais desse transtorno da personalidade, como o desrespeito recorrente às leis. Transtornos por uso de álcool e substância. Os efeitos desinibidores da intoxicação podem também aumentar a probabilidade de que uma pessoa principalmente atraída pelo corpo humano maduro se aproxime sexualmente de uma criança. Transtorno obsessivo-compulsivo. Há alguns indivíduos que se queixam de pensamentos e preocupações egodistônicas acerca de possível atração por crianças. A entrevista clínica, em geral, revela ausência de pensamentos sexuais sobre crianças durante estados elevados de excitação sexual (p. ex., próximo do orgasmo durante masturbação) e, por vezes, outras ideias sexuais intrusivas egodistônicas (p. ex., preocupações com homossexualidade).

Comorbidade Comorbidades psiquiátricas do transtorno pedofílico incluem transtornos por uso de substância, transtornos depressivo e bipolar, transtorno de ansiedade, transtorno da personalidade antissocial e outros transtornos parafílicos. Os dados relativos a transtornos comórbidos, no entanto, são oriundos principalmente de indivíduos condenados por crimes sexuais envolvendo crianças (quase todos homens), podendo não ser passíveis de generalização a outros indivíduos com transtorno pedofílico (p. ex., indivíduos que jamais se aproximaram sexualmente de uma criança, mas que atendem aos critérios para o diagnóstico de transtorno pedofílico com base em sofrimento subjetivo).


Transtorno Fetichista 701

Transtorno Fetichista Critérios Diagnósticos

302.81 (F65.0)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa resultante do uso de objetos inanimados ou de um foco altamente específico em uma ou mais de uma parte não genital do corpo, conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. B. As fantasias, os impulsos sexuais ou os comportamentos causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. C. Os objetos de fetiche não se limitam a artigos do vestuário usados em travestismo/cross-dressing (como no transtorno transvéstico) ou a dispositivos especificamente criados para estimulação genital tátil (p. ex., vibrador). Especificar: Parte(s) do corpo Objeto(s) inanimado(s) Outro Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de envolvimento em comportamentos fetichistas são limitadas. Em remissão completa: Não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo durante pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.

Especificadores Embora indivíduos com transtorno fetichista possam relatar excitação sexual intensa e recorrente provocada por objetos inanimados ou por uma parte específica do corpo, não é incomum a ocorrência de combinações não mutuamente exclusivas de fetiches. Assim, um indivíduo pode ter transtorno fetichista associado a um objeto inanimado (p. ex., roupas íntimas femininas) ou a um foco exclusivo em uma parte do corpo intensamente erotizada (p. ex., pés, cabelos), ou seu interesse fetichista pode atender a critérios para várias combinações desses especificadores (p. ex., sapatos, meias e pés).

Características Diagnósticas O foco parafílico do transtorno fetichista envolve o uso persistente e repetido ou a dependência de objetos inanimados ou um foco altamente específico em uma parte do corpo (geralmente não genital) como os elementos principais associados à excitação sexual (Critério A). Um diagnóstico de transtorno fetichista deve incluir sofrimento pessoal clinicamente significativo ou prejuízo na função psicossocial (Critério B). Objetos de fetiche comuns incluem roupa íntima feminina, calçados masculinos ou femininos, artigos de borracha, roupas de couro ou outras peças de vestuário. Partes do corpo altamente erotizadas associadas ao transtorno fetichista incluem os pés, os dedos dos pés e os cabelos. Não é incomum que os fetiches sexualizados incluam tanto objetos inanimados quanto partes do corpo (p. ex., meias e pés sujos). Em virtude disso, a definição de transtorno fetichista agora reincorpora o parcialismo (i.e., foco exclusivo em uma parte do corpo) em seus limites. O parcialismo, antes considerado um transtorno parafílico sem outra especificação, havia sido historicamente incorporado ao fetichismo antes do DSM-III. Muitos indivíduos que se autoidentificam como praticantes do fetichismo não necessariamente relatam prejuízo clínico associado a seus comportamentos fetichistas. Essas pessoas podem ser caracterizadas como tendo um fetiche, mas não um transtorno fetichista. Um diagnóstico de transtorno fetichista exige atendimento simultâneo tanto ao comportamento do Critério A quanto ao sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento que constam no Critério B.


702

Transtornos Parafílicos

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O transtorno fetichista pode ser uma experiência multissensorial, incluindo segurar, sentir o gosto, esfregar, inserir ou cheirar o objeto de fetiche durante a masturbação, ou ainda preferir que o parceiro sexual vista ou utilize o objeto de fetiche durante os encontros sexuais. Há, ainda, alguns indivíduos que podem adquirir grandes coleções de objetos fetichistas altamente desejados.

Desenvolvimento e Curso As parafilias geralmente começam na puberdade, mas os fetiches podem se desenvolver antes da adolescência. Uma vez estabelecido, o transtorno fetichista tende a apresentar um curso continuado que oscila em intensidade e em frequência dos impulsos ou do comportamento.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura O conhecimento e a avaliação adequada dos aspectos normais do comportamento sexual são fatores importantes a serem investigados para o estabelecimento de um diagnóstico clínico de transtorno fetichista e para distinguir um diagnóstico clínico de um comportamento sexual socialmente aceitável.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero Não há relatos sistemáticos da ocorrência de transtorno fetichista no sexo feminino. Em amostras clínicas, esse transtorno é relatado quase exclusivamente em indivíduos do sexo masculino.

Consequências Funcionais do Transtorno Fetichista Prejuízos típicos associados ao transtorno fetichista incluem disfunção sexual durante relacionamentos amorosos recíprocos, quando o objeto de fetiche ou a parte do corpo preferida não está disponível durante as preliminares ou o coito. Alguns indivíduos com o transtorno podem preferir atividade sexual solitária associada à(s) sua(s) preferência(s) fetichista(s) mesmo durante envolvimento em relacionamento amoroso e recíproco importante. Embora o transtorno fetichista seja relativamente incomum entre criminosos sexuais presos com parafilias, homens com o transtorno podem roubar e colecionar seus objetos de desejo fetichistas particulares. Tais indivíduos foram presos e acusados de comportamentos antissociais não sexuais (p. ex., invasão, roubo, assalto) que são principalmente motivados pelo transtorno fetichista.

Diagnóstico Diferencial Transtorno transvéstico. O diagnóstico mais próximo do transtorno fetichista é o transtorno transvéstico. Conforme observado nos critérios diagnósticos, o transtorno fetichista não é diagnosticado caso os objetos de fetiche se limitem a artigos de vestuário usados exclusivamente durante o ato de vestir-se como o outro sexo (como no transtorno transvéstico) ou caso o objeto de estimulação genital tenha sido feito para esse fim (p. ex., um vibrador). Transtorno do masoquismo sexual ou outros transtornos parafílicos. Fetiches podem ocorrer concomitantemente com outros transtornos parafílicos, sobretudo “sadomasoquismo” e transtorno transvéstico. Quando um indivíduo tem fantasias sobre “ser obrigado a vestir-se como o outro sexo” ou se envolve em tais atividades ou, ainda, atinge excitação sexual principalmente por meio da dominação ou da humilhação associadas a tal fantasia ou atividade repetida, o diagnóstico de transtorno do masoquismo sexual deve ser feito. Comportamento fetichista sem transtorno fetichista. O uso de um objeto de fetiche para excitação sexual na ausência de qualquer sofrimento ou prejuízo da função psicossocial ou de outra consequência adversa associada não atende aos critérios para transtorno fetichista, visto que o limite exigido pelo Critério B não é atendido. Por exemplo, um indivíduo cujo parceiro sexual compar-


Transtorno Transvéstico 703 tilha ou é bem-sucedido em incorporar seu interesse em acariciar, cheirar ou lamber pés ou dedos dos pés como elemento importante de preliminares não é diagnosticado com transtorno fetichista. Da mesma forma, não seria diagnosticado um indivíduo que prefere, não tendo sofrimento ou prejuízo, comportamento sexual solitário associado a uso de roupas de borracha ou botas de couro.

Comorbidade O transtorno fetichista pode ocorrer simultaneamente com outros transtornos parafílicos, bem como com hipersexualidade. Raramente, o transtorno por estar associado a condições neurológicas.

Transtorno Transvéstico Critérios Diagnósticos

302.3 (F65.1)

A. Por um período de pelo menos seis meses, excitação sexual recorrente e intensa resultante de vestir-se como o sexo oposto (cross-dressing), conforme manifestado por fantasias, impulsos ou comportamentos. B. As fantasias, os impulsos sexuais ou os comportamentos causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Especificar se: Com fetichismo: Se excitado sexualmente por tecidos, materiais ou peças de vestuário. Com autoginefilia: Se excitado sexualmente por pensamentos ou imagens de si mesmo como mulher. Especificar se: Em ambiente protegido: Esse especificador é aplicável principalmente a indivíduos institucionalizados ou moradores de outros locais onde as oportunidades de vestir-se como o sexo oposto são limitadas. Em remissão completa: Não houve sofrimento ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas da vida do indivíduo por pelo menos cinco anos enquanto em um ambiente não protegido.

Especificadores A presença de fetichismo reduz a possibilidade de disforia de gênero em homens com o transtorno transvéstico, e a de autoginefilia aumenta a probabilidade de disforia de gênero em homens com o transtorno.

Características Diagnósticas O diagnóstico de transtorno transvéstico não se aplica a todos os indivíduos que se vestem como o sexo oposto, mesmo àqueles que o fazem de forma habitual. Ele se aplica a indivíduos cuja troca no modo de vestir-se ou cujos pensamentos sobre o uso de roupas do outro sexo estão sempre ou frequentemente acompanhados de excitação sexual (Critério A) e que estão emocionalmente perturbados por esse padrão ou sentem que ele prejudica o funcionamento social ou interpessoal (Critério B). O vestir-se como o sexo oposto (cross-dressing) pode envolver apenas um ou dois artigos do vestuário (p. ex., para homens, pode incluir somente o uso de roupas íntimas femininas) ou se vestir completamente com roupa do outro sexo; em homens, pode incluir o uso de peruca e maquiagem feminina. O transtorno transvéstico é quase exclusivamente relatado em indivíduos do sexo masculino. A excitação sexual, em sua apresentação mais óbvia de ereção peniana, pode ocorrer simultaneamente com o uso de roupas do outro sexo de várias formas. Em homens mais jovens, vestir-se como o sexo oposto frequentemente leva à masturbação, após o que toda peça de roupa feminina é retirada. Homens mais velhos com frequência aprendem a evitar a masturba-


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Transtornos Parafílicos

ção ou fazer qualquer coisa que estimule o pênis, de modo que evitar a ejaculação possibilita-lhes prolongar a sessão de uso de roupas do outro sexo. Homens com parceiras do sexo feminino, por vezes, completam a sessão de uso de roupas do outro sexo tendo relação sexual com as parceiras, sendo que alguns apresentam dificuldade de manter uma ereção suficiente para a relação sexual sem o uso das roupas do sexo oposto (ou sem fantasias particulares de uso dessas roupas). A avaliação clínica de sofrimento ou prejuízo, tal como a avaliação clínica da excitação sexual transvéstica, costuma depender do autorrelato do indivíduo. O padrão de comportamento “purgar e adquirir” frequentemente representa a presença de sofrimento em indivíduos com o transtorno transvéstico. Durante esse padrão comportamental, um indivíduo (normalmente um homem) que gastou muito dinheiro em roupas femininas e outros itens (p. ex., sapatos, perucas) descarta-os (i.e., purga-os) na tentativa de vencer os ímpetos de vestir-se como o outro sexo, para depois começar a adquirir peças do vestuário feminino novamente.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico O transtorno transvéstico em homens com frequência é acompanhado de autoginefilia (i.e., tendência parafílica no homem a excitar-se sexualmente pela ideia ou imagem de si mesmo como mulher). Fantasias e comportamentos de autoginefilia podem ter como ponto central a ideia de exibir funções fisiológicas femininas (p. ex., lactação, menstruação), envolver-se em comportamento estereotipicamente feminino (p. ex., tricotar) ou ter a anatomia da mulher (p. ex., seios).

Prevalência A prevalência do transtorno transvéstico é desconhecida. Ele é raro no sexo masculino e extremamente raro no feminino. Menos de 3% dos homens relatam alguma vez ter tido excitação sexual vestindo-se como mulher. O percentual de indivíduos que usaram roupas do outro sexo com excitação sexual mais de uma vez ou poucas vezes em suas vidas seria ainda menor. A maior parte dos indivíduos do sexo masculino com transtorno transvéstico identifica-se como heterossexual, embora existam alguns que tenham interação sexual ocasional com outros homens, especialmente quando estão vestidos com roupas do outro sexo.

Desenvolvimento e Curso No sexo masculino, os primeiros sinais de transtorno transvéstico podem surgir na infância sob a forma de grande fascinação por um item particular do vestuário feminino. Antes da puberdade, vestir-se como o outro sexo produz sensações generalizadas de excitação prazerosa. Com a chegada da puberdade, usar roupas femininas começa a provocar ereção peniana e, em certos casos, leva diretamente à primeira ejaculação. Em muitos casos, vestir-se como o outro sexo provoca cada vez menos excitação sexual conforme o indivíduo vai envelhecendo; finalmente, pode deixar de produzir qualquer resposta peniana discernível. O desejo de vestir-se como o sexo oposto, ao mesmo tempo, permanece igual ou ainda mais forte. Indivíduos que relatam tal diminuição da resposta sexual costumam mencionar que a excitação sexual resultante de uso de roupas do outro sexo foi substituída por sensações de conforto ou bem-estar. Em alguns casos, o curso do transtorno transvéstico é contínuo; em outros, episódico. Não é raro que homens com o transtorno percam o interesse por vestir-se com roupas femininas quando se apaixonam pela primeira vez por uma mulher e começam um relacionamento; essa redução, no entanto, mostra-se temporária. Quando retorna o desejo de vestir-se como mulher, também retorna o sofrimento associado. Alguns casos de transtorno transvéstico evoluem para disforia de gênero. Os indivíduos, que podem não se diferenciar de outros com o transtorno transvéstico na adolescência ou no início da infância, desenvolvem gradualmente desejos de manter o papel feminino por períodos mais longos e feminilizar sua anatomia. O desenvolvimento de disforia de gênero costuma ser acompanhado por redução ou eliminação (autorrelatada) da excitação sexual associada ao uso de roupas do outro sexo.


Outro Transtorno Parafílico Especificado 705 A manifestação do travestismo na ereção e na estimulação penianas, assim como a manifestação de outros interesses parafílicos e normofílicos, é mais intensa na adolescência e no início da vida adulta. A gravidade do transtorno transvéstico é mais alta na vida adulta, quando os impulsos transvésticos têm mais possibilidade de entrar em conflito com o desempenho na relação sexual heterossexual e com desejos de casar-se e ter uma família. Homens na meia-idade e mais velhos com história de travestismo têm menor probabilidade de apresentar-se com transtorno transvéstico do que com disforia de gênero.

Consequências Funcionais do Transtorno Transvéstico O envolvimento em comportamentos transvésticos pode interferir nas relações heterossexuais ou levar à evitação dessas relações. Isso pode ocasionar sofrimento em homens que desejam manter casamentos convencionais ou envolvimentos amorosos com mulheres.

Diagnóstico Diferencial Transtorno fetichista. Este transtorno pode assemelhar-se ao transtorno transvéstico, particularmente nos homens com fetichismo que vestem roupas íntimas femininas enquanto se masturbam com elas. Distinguir o transtorno transvéstico depende dos pensamentos específicos do indivíduo durante tal atividade (p. ex., há ideias de ser mulher, agir como mulher ou vestir-se como mulher?) e da presença de outros fetiches (p. ex., tecidos macios e de seda, seja usados como peças do vestuário, seja de outra forma). Disforia de gênero. Indivíduos com o transtorno transvéstico não relatam incongruência entre seu gênero sentido e seu gênero designado nem desejo de ser do outro gênero. Eles, em geral, não têm história de comportamentos infantis transgêneros, os quais estão presentes naqueles com disforia de gênero. Indivíduos com uma apresentação que atende a todos os critérios para transtorno transvéstico, assim como para disforia de gênero, devem receber os dois diagnósticos.

Comorbidade O travestismo (e, por conseguinte, também o transtorno transvéstico) é com frequência encontrado associado a outras parafilias. As que ocorrem simultaneamente com maior frequência são o fetichismo e o masoquismo. Uma forma particularmente perigosa de masoquismo, a asfixia autoerótica, está associada ao travestismo em uma proporção substancial de casos fatais.

Outro Transtorno Parafílico Especificado 302.89 (F65.89) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno parafílico que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno na classe diagnóstica de transtornos parafílicos. A categoria outro transtorno parafílico especificado é usada nas situações em que o clínico opta por comunicar a razão específica pela qual a apresentação não satisfaz os critérios para qualquer transtorno parafílico específico. Isso é feito por meio do registro de “outro transtorno parafílico especificado”, seguido pela razão específica (p. ex., “zoofilia”). Exemplos de apresentações que podem ser especificadas mediante uso do termo “outro transtorno parafílico especificado” incluem, embora não se limitem a, excitação sexual recorrente e intensa envolvendo escatologia telefônica (telefonemas obscenos), necrofilia (cadáveres), zoofilia (animais) coprofilia (fezes), clismafilia (enemas) ou urofilia (urina) que tenham estado presentes durante pelo menos seis meses causando sofrimento intenso ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou


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Transtornos Parafílicos

em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Outro transtorno parafílico especificado pode ser especificado como em remissão e/ou ocorrendo em um ambiente protegido.

Transtorno Parafílico Não Especificado 302.9 (F65.9) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno parafílico que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno na classe diagnóstica dos transtornos parafílicos. A categoria transtorno parafílico não especificado é usada nas situações em que o clínico opta por não especificar a razão pela qual os critérios para um transtorno parafílico específico não são satisfeitos e inclui apresentações para as quais não há informações suficientes para que seja feito um diagnóstico mais específico.


Outros Transtornos Mentais Quatro transtornos fazem parte deste capítulo: outro transtorno mental especificado devido a outra condição médica, transtorno mental não especificado devido a outra condição médica, outro transtorno mental especificado e transtorno mental não especificado. Essa categoria residual aplica-se a apresentações em que predominam sintomas característicos de um transtorno mental, causadores de sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo, embora não atendam à totalidade dos critérios para nenhum outro transtorno mental no DSM-5. Para outro transtorno mental especificado ou transtorno mental não especificado devidos a outra condição médica, deve ficar estabelecido que a perturbação é causada pelos efeitos fisiológicos de outra condição médica. Quando outro transtorno mental especificado e transtorno mental não especificado são devidos a outra condição médica, há necessidade de codificar e listar a condição médica do primeiro (p. ex., doença do HIV 042 [B20]), seguida do outro transtorno mental especificado ou do transtorno mental não especificado (usar o código apropriado).

Outro Transtorno Mental Especificado Devido a Outra Condição Médica 294.8 (F06.8) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno mental devido a outra condição médica que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno mental devido a outra condição médica específico. A categoria outro transtorno mental especificado devido a outra condição médica é usada nas situações em que o clínico opta por comunicar a razão específica pela qual a apresentação não satisfaz os critérios para qualquer transtorno mental devido a outra condição médica específico. Isso é feito por meio do registro do nome do transtorno, com a condição médica etiológica específica inserida no lugar de “outra condição médica”, seguida da manifestação sintomática específica que não satisfaz os critérios para qualquer outro transtorno mental devido a outra condição médica específico. Além disso, o código diagnóstico para a condição médica específica deve ser listado imediatamente antes do código para outro transtorno mental especificado devido a outra condição médica. Por exemplo, sintomas dissociativos devidos a convulsões parciais complexas seriam codificados e registrados como convulsões parciais complexas 345.40 (G40.209), outro transtorno mental especificado 294.8 (F06.8) devido a convulsões parciais complexas, sintomas dissociativos. Um exemplo de uma apresentação que pode ser especificada usando a designação “outro transtorno mental especificado” é o seguinte: Sintomas dissociativos: Inclui sintomas que ocorrem, por exemplo, no contexto das convulsões parciais complexas.


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Outros Transtornos Mentais

Transtorno Mental Não Especificado Devido a Outra Condição Médica 294.9 (F09) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno mental devido a outra condição médica que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem a todos os critérios para qualquer transtorno mental devido a outra condição médica espefífico. A categoria transtorno mental não especificado devido a outra condição médica é usada nas situações em que o clínico opta por não especificar a razão pela qual os critérios para um transtorno mental devido a outra condição médica específico não são satisfeitos e inclui apresentações para as quais não há informações suficientes para que seja feito um diagnóstico mais específico (p. ex., em salas de emergência). Isso é feito por meio do registro do nome do transtorno, com a condição médica etiológica específica inserida no lugar de “outra condição médica”. Além disso, o código diagnóstico para a condição médica específica deve ser listado imediatamente antes daquele para o transtorno mental não especificado devido a outra condição médica. Por exemplo, sintomas dissociativos devidos a convulsões parciais complexas seriam codificados e registrados como convulsões parciais complexas 345.40 (G40.209), transtorno mental não especificado devido a convulsões parciais complexas 294.9 (F06.9).

Outro Transtorno Mental Especificado 300.9 (F99) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno mental que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno mental específico. A categoria outro transtorno mental especificado é usada nas situações em que o clínico opta por comunicar a razão específica pela qual a apresentação não satisfaz os critérios para qualquer transtorno mental específico. Isso é feito por meio do registro de “outro transtorno mental especificado”, seguido da razão específica.

Transtorno Mental Não Especificado 300.9 (F99) Esta categoria aplica-se a apresentações em que sintomas característicos de um transtorno mental que causam sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo predominam, mas não satisfazem todos os critérios para qualquer transtorno mental. A categoria transtorno mental não especificado é usada nas situações em que o clínico opta por não especificar a razão pela qual os critérios para um transtorno mental específico não são satisfeitos e inclui apresentações para as quais não há informações suficientes para que seja feito um diagnóstico mais específico (p. ex., em salas de emergência).


Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos e Outros Efeitos Adversos de Medicamentos Transtornos do movimento induzidos por medicamentos estão na Seção II devido à importância frequente 1) no manejo com medicamentos dos transtornos mentais ou outras condições médicas e 2) no diagnóstico diferencial dos transtornos mentais (p. ex., transtorno de ansiedade versus acatisia induzida por neurolépticos; catatonia maligna versus síndrome neuroléptica maligna). Embora esses transtornos do movimento sejam rotulados de “induzidos por medicamentos”, costuma ser difícil estabelecer a relação causal entre a exposição ao medicamento e o desenvolvimento do transtorno do movimento, em especial porque alguns desses transtornos do movimento também ocorrem na ausência de exposição a medicamentos. As condições e os problemas listados neste capítulo não são transtornos mentais. O termo neuroléptico está ficando desatualizado, uma vez que dá destaque à propensão de medicamentos antipsicóticos de causar movimentos anormais, estando, em vários contextos, em processo de substituição pelo termo antipsicótico. Ainda assim, neuroléptico continua apropriado ao contexto. Embora novos medicamentos neurolépticos possam ter menos probabilidade de causar transtornos do movimento induzidos por medicamentos, tais transtornos ainda ocorrem. Os medicamentos neurolépticos incluem os chamados agentes antipsicóticos convencionais, “típicos”, ou de primeira geração (p. ex., clorpromazina, haloperidol, flufenazina); “atípicos”, ou de segunda geração (p. ex., clozapina, risperidona, olanzapina, quetiapina); alguns fármacos bloqueadores do receptor de dopamina, usados no tratamento de sintomas como náusea e gastroparesia (p. ex., proclorperazina, prometazina, trimetobenzamida, tietilperazina, metoclopramida); e amoxapina, comercializada como antidepressivo.

Parkinsonismo Induzido por Neuroléptico Parkinsonismo Induzido por Outro Medicamento 332.1 (G21.11) Parkinsonismo Induzido por Neuroléptico 332.1 (G21.19) Parkinsonismo Induzido por Outro Medicamento Tremor de Parkinson, rigidez muscular, acinesia (i.e., perda de movimentos ou dificuldade de iniciar os movimentos) ou bradicinesia (i.e., movimentos lentos) que se desenvolvem em poucas semanas do início ou aumento da dosagem de um medicamento (p. ex., um neuroléptico) ou após redução da dose de um medicamento usado para tratar sintomas extrapiramidais.

Síndrome Neuroléptica Maligna 333.92 (G21.0) Síndrome Neuroléptica Maligna Embora a síndrome neuroléptica maligna seja facilmente reconhecida em sua forma clássica, costuma ser heterogênea no surgimento, na apresentação, na progressão e na evolução. As ca-


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Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos...

racterísticas clínicas descritas a seguir são as consideradas mais importantes, com base em recomendações de consensos, para que seja feito o diagnóstico de síndrome neuroléptica maligna.

Características Diagnósticas Os pacientes, em geral, foram expostos a um antagonista da dopamina 72 horas antes do desenvolvimento dos sintomas. Hipertermia (> 38oC em, pelo menos, duas ocasiões, com medição oral) associada a diaforese profusa é uma característica distintiva da síndrome neuroléptica maligna, diferenciando-a de outros efeitos secundários neurológicos de medicamentos antipsicóticos. Elevações extremas de temperatura, reflexos de um colapso na termorregulação central, têm mais possibilidade de apoiar o diagnóstico de síndrome neuroléptica maligna. Rigidez generalizada, descrita como “cano de chumbo” em sua forma mais grave e comumente sem resposta a agentes antiparkinsonianos, é uma característica central do transtorno, podendo ser associada a outros sintomas neurológicos (p. ex., tremor, sialorreia, acinesia, distonia, trismo, mioclono, disartria, disfagia, rabdomiólise). Elevação da creatina quinase de pelo menos quatro vezes o limite superior do normal costuma ser um dado. Mudanças no estado mental, caracterizadas por delirium ou alteração de consciência, variando do estupor ao coma, normalmente são um primeiro sinal. Os indivíduos afetados podem parecer em estado de alerta, embora atordoados e não reagentes, situação consistente com estupor catatônico. Ativação e instabilidade autonômica – manifestadas por taquicardia (taxa > 25% acima dos níveis basais), diaforese, elevação da pressão arterial (sistólica ou diastólica > 25% acima dos níveis basais) ou flutuação (mudança da pressão diastólica > 20 mmHg ou mudança da pressão sistólica > 25 mmHg em 24 horas), incontinência urinária e palidez – podem ser constatadas a qualquer momento, embora ofereçam um indicador precoce para o diagnóstico. Taquipneia (taxa > 50% acima dos níveis basais) é comum, e sofrimento respiratório – consequência de acidose metabólica, hipermetabolismo, restrição da parede do tórax, pneumonia aspirativa ou embolia pulmonar – pode ocorrer e levar a parada respiratória repentina. Medidas diagnósticas ou terapêuticas, incluindo investigação laboratorial, para excluir outras etiologias ou complicações infecciosas, tóxicas, metabólicas e neuropsiquiátricas, são essenciais (ver a seção “Diagnóstico Diferencial” mais adiante no capítulo). Embora várias anormalidades laboratoriais estejam associadas à síndrome neuroléptica maligna, nenhuma é específica para o diagnóstico. Indivíduos com a síndrome podem ter leucocitose, acidose metabólica, hipoxia, concentrações séricas de ferro reduzidas e elevações nas enzimas musculares séricas e catecolaminas. Os achados da análise do líquido cerebrospinal e estudos de neuroimagem costumam ser normais, ao passo que o eletrencefalograma mostra desaceleração generalizada. Achados de necropsia, em casos fatais, não têm sido específicos, além de mostrar variação, dependendo das complicações.

Desenvolvimento e Curso Evidências de estudos de bases de dados sugerem taxas de incidência para síndrome neuroléptica maligna de 0,01 a 0,02% entre pessoas tratadas com antipsicóticos. A progressão temporal dos sinais e sintomas oferece indicadores importantes para o diagnóstico e o prognóstico da síndrome. Alteração no estado mental e outros sinais neurológicos costumam anteceder os sinais sistêmicos. O surgimento dos sintomas varia de horas a dias após o início do fármaco. Alguns casos se desenvolvem em 24 horas após o início do fármaco, a maior parte, em uma semana, e praticamente todos os casos em 30 dias. Uma vez diagnosticada a síndrome e interrompidos os fármacos antipsicóticos orais, a síndrome neuroléptica maligna é autolimitada na maior parte dos casos. O tempo médio de recuperação após a interrupção do fármaco é de 7 a 10 dias, com a maioria das pessoas recuperando-se em uma semana, e quase todas em 30 dias. A duração pode ser prolongada quando antipsicóticos de ação prolongada estão sendo usados. Há relatos de


Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos... 711 indivíduos em que houve persistência de sinais neurológicos residuais durante semanas após a resolução dos sintomas hipermetabólicos agudos. O desaparecimento total dos sintomas pode ser obtido na maioria dos casos de síndrome neuroléptica maligna; foram relatadas, entretanto, taxas de fatalidade de 10 a 20% quando o problema não é reconhecido. Embora muitos indivíduos não tenham recorrência da síndrome, quando novamente ingerem medicamento antipsicótico, alguns a experimentam logo que os antipsicóticos voltam a ser usados após um episódio.

Fatores de Risco e Prognóstico A síndrome neuroléptica maligna é um risco potencial, em qualquer indivíduo, após administração de antipsicóticos. Não é específica de nenhum diagnóstico neuropsiquiátrico, podendo ocorrer em indivíduos sem um transtorno mental diagnosticável que receberam antagonistas dopaminérgicos. Fatores clínicos, sistêmicos e metabólicos associados a risco aumentado de síndrome neuroléptica maligna incluem agitação, exaustão, desidratação e deficiência de ferro. Um episódio anterior associado a antipsicóticos é descrito em 15 a 20% dos casos, sugerindo vulnerabilidade subjacente em alguns pacientes; porém, achados genéticos baseados em polimorfismos dos receptores de neurotransmissores não foram replicados de forma consistente. Quase todos os antagonistas dopaminérgicos estão associados a síndrome neuroléptica maligna, embora os antipsicóticos de alta potência apresentem um risco maior comparados aos agentes de baixa potência e aos antipsicóticos atípicos mais novos. Formas parciais ou mais leves podem ser associadas a antipsicóticos mais recentes, embora a síndrome varie quanto à gravidade, mesmo com os fármacos mais antigos. Os antagonistas dopaminérgicos usados em contextos médicos (p. ex., metoclopramida, proclorperazina) também têm sido implicados. Vias parenterais de administração, taxas de titulação rápidas e dosagens totais mais altas dos fármacos estão associadas a aumento do risco; a síndrome neuroléptica maligna, no entanto, costuma ocorrer em uma variação terapêutica da dose de antipsicóticos.

Diagnóstico Diferencial A síndrome neuroléptica maligna deve ser diferenciada de outras condições neurológicas ou médicas graves, inclusive de infecções do sistema nervoso central, condições inflamatórias ou autoimunes, estado de mal epilético, lesões estruturais subcorticais e condições sistêmicas (p. ex., feocromocitoma, tireotoxicose, tétano, insolação). Deve ser diferenciada, ainda, de síndromes similares, resultantes do uso de outras substâncias ou medicamentos, como a síndrome serotonérgica; da síndrome da hipertermia parkinsoniana após interrupção repentina de agonistas dopaminérgicos; da abstinência de álcool ou sedativos; da hipertermia maligna que ocorre durante anestesia; da hipertermia associada a abuso de estimulantes e alucinógenos; da intoxicação atropínica resultante de anticolinérgicos. Em raras ocasiões, indivíduos com esquizofrenia ou algum transtorno do humor podem apresentar catatonia maligna, que pode ser indistinguível da síndrome neuroléptica maligna. Alguns pesquisadores consideram a síndrome neuroléptica maligna uma forma de catatonia maligna induzida por fármacos.

Distonia Aguda Induzida por Medicamento 333.72 (G24.02) Distonia Aguda Induzida por Medicamento Contração anormal e prolongada dos músculos oculares (crise oculogírica), cabeça e pescoço (torcicolo ou retrocolo), membros ou tronco que surge em poucos dias a partir do início ou elevação da dose de um medicamento (como um neuroléptico) ou após redução da dose de um medicamento usado para o tratamento de sintomas extrapiramidais.


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Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos...

Acatisia Aguda Induzida por Medicamento 333.99 (G25.71) Acatisia Aguda Induzida por Medicamento Queixas subjetivas de inquietação, frequentemente acompanhada de observação de movimentos excessivos (p. ex., movimentos inquieto das pernas, apoiando-se alternadamente em um pé ou no outro, passadas de um lado a outro, incapacidade de sentar ou permanecer parado), com desenvolvimento em poucas semanas a partir do início ou aumento da dose de algum medicamento (como um neuroléptico) ou após redução da dose de um medicamento usado para tratar sintomas extrapiramidais.

Discinesia Tardia 333.85 (G24.01) Discinesia Tardia Movimentos atetoides ou coreiformes involuntários (com duração de, no mínimo, de algumas semanas), geralmente da língua, porção inferior da face e mandíbula, extremidades (embora, algumas vezes, haja envolvimento dos músculos da faringe, do diafragma ou do tronco), surgidos em associação com o uso de um medicamento neuroléptico durante pelo menos poucos meses. Os sintomas podem surgir após período mais curto de uso de medicamento em idosos. Em alguns pacientes, os movimentos desse tipo podem aparecer após interrupção, mudança ou redução na dosagem dos neurolépticos, caso em que a condição é chamada de discinesia emergente pela retirada de neuroléptico. Pelo fato de a discinesia emergente por retirada ser geralmente limitada, durando menos de 4 a 8 semanas, a discinesia que persiste além desse período é considerada discinesia tardia.

Distonia Tardia Acatisia Tardia 333.72 (G24.09) Distonia Tardia 333.99 (G25.71) Acatisia Tardia Síndrome tardia envolvendo outros tipos de problemas nos movimentos, como a distonia ou a acatisia, que são diferenciadas por seu surgimento posterior no curso do tratamento e por sua potencial persistência por meses até anos, mesmo diante de interrupção ou redução na dose do neuroléptico.

Tremor Postural Induzido por Medicamento 333.1 (G25.1) Tremor Postural Induzido por Medicamento Tremor fino (geralmente no intervalo de 8 a 12 Hz) ocorrendo durante tentativas para manter uma postura e desenvolvido em associação com o uso de medicamento (p. ex., lítio, antidepressivos, valproato). Esse tremor é muito similar àquele visto na ansiedade e no uso de cafeína e outros estimulantes.

Outro Transtorno do Movimento Induzido por Medicamento 333.99 (G25.79) Outro Transtorno do Movimento Induzido por Medicamento Esta categoria é para transtornos do movimento induzidos por medicamento não abrangidos por nenhum dos transtornos específicos listados anteriormente. Os exemplos incluem 1) apresenta-


Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos... 713 ções que se assemelham à síndrome neuroléptica maligna associada a outros medicamentos que não os neurolépticos e 2) outras condições tardias induzidas por medicamentos.

Síndrome da Descontinuação de Antidepressivos 995.29 (T43.205A)

Consulta inicial

995.29 (T43.205D) Consulta de seguimento 995.29 (T43.205S) Sequelas A síndrome da descontinuação de antidepressivos é um conjunto de sintomas que podem ocorrer após cessação repentina (ou redução acentuada na dose) de um medicamento antidepressivo tomado de forma contínua durante pelo menos um mês. Os sintomas em geral começam em 2 a 4 dias e normalmente incluem manifestações sensoriais, somáticas e cognitivo-emocionais específicas. Sintomas sensoriais e somáticos frequentemente relatados incluem flashes de luz, sensações de “choque elétrico”, náusea e hiper-responsividade a ruídos ou luzes. Ansiedade e sentimentos não específicos de temor também podem ser relatados. Os sintomas são aliviados pelo reinício do mesmo medicamento ou início de outro com mecanismo de ação similar – por exemplo, sintomas de descontinuação depois de retirada de um inibidor da recaptação de serotonina-noradrenalina podem ser diminuídos iniciando-se um antidepressivo tricíclico. Para serem qualificados como síndrome da descontinuação de antidepressivo, os sintomas não devem ter estado presentes antes da redução da dose do antidepressivo, não sendo mais bem explicados por outro transtorno mental (p. ex., episódio maníaco ou hipomaníaco, intoxicação por substância, abstinência de substância, transtorno de sintomas somáticos).

Características Diagnósticas Os sintomas de descontinuação podem ocorrer após tratamento com antidepressivos tricíclicos (p. ex., imipramina, amitriptilina, desipramina), inibidores da recaptação da serotonina (p. ex., fluoxetina, paroxetina, sertralina) e inibidores da monoaminoxidase (p. ex., fenelazina, selegilina, pargilina). A incidência dessa síndrome depende da dosagem e da meia-vida dos medicamentos que estão sendo tomados, bem como da velocidade da descontinuação. Medicamentos de curta ação que são interrompidos abruptamente em vez de reduzidos de forma lenta podem acarretar risco maior. A paroxetina, um inibidor seletivo da recaptação da serotonina (ISRS) de ação curta, é o agente de uso mais comumente associado a sintomas de descontinuação, embora esses sintomas ocorram para todos os tipos de antidepressivos. Diferentemente das síndromes de retirada associadas a opioides, álcool e outras substâncias de abuso, a síndrome da descontinuação de antidepressivos não tem sintomas patognomônicos. Os sintomas, em vez disso, tendem a ser vagos e variáveis, normalmente iniciando 2 a 4 dias após a última dose do antidepressivo. Para os ISRSs (p. ex., paroxetina), são descritos sintomas como tontura, zumbido nos ouvidos, “choques elétricos na cabeça”, incapacidade para dormir e ansiedade aguda. O uso de antidepressivo antes da descontinuação não deve ter sido acompanhado de hipomania ou euforia (i.e., deve haver certeza de que a síndrome da descontinuação não resulta de oscilações na estabilidade do humor associadas a tratamento anterior). A síndrome da descontinuação do antidepressivo baseia-se, unicamente, em fatores farmacológicos, não sendo relacionada com os efeitos de reforço de um antidepressivo. Além disso, no caso de potencialização de um antidepressivo com um estimulante, a cessação repentina pode resultar em sintomas de abstinência de estimulantes (ver “Abstinência de Estimulantes” no capítulo “Transtornos Relacionados a Substâncias e Transtornos Aditivos”), mais do que na síndrome da descontinuação de antidepressivos aqui descrita.


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Transtornos do Movimento Induzidos por Medicamentos...

Prevalência A prevalência da síndrome da descontinuação de antidepressivos é desconhecida; acredita-se, no entanto, que varie conforme a dose anterior à descontinuação, a meia-vida, a afinidade de ligação ao receptor que tem o medicamento e, provavelmente, a taxa de metabolismo do indivíduo para esse medicamento, que é influenciada geneticamente.

Curso e Desenvolvimento Como faltam estudos longitudinais, pouco se sabe sobre o curso clínico da síndrome da descontinuação de antidepressivos. Os sintomas parecem diminuir com o tempo, com reduções bastante gradativas da dosagem. Após um episódio, alguns indivíduos preferem retomar indefinidamente a medicação, quando tolerada.

Diagnóstico Diferencial O diagnóstico diferencial da síndrome da descontinuação de antidepressivos inclui transtornos de ansiedade e depressivo, transtornos por uso de substância e tolerância a medicamentos. Transtorno de ansiedade e transtorno depressivo. Os sintomas de descontinuação costumam assemelhar-se aos de um transtorno persistente de ansiedade ou a um retorno dos sintomas somáticos de depressão para os quais o medicamento foi dado no início. Transtornos por uso de substância. A síndrome da descontinuação de antidepressivos difere da abstinência de substâncias pelo fato de os antidepressivos por si só não terem efeitos de reforço ou euforia. A dose do medicamento não costuma ser aumentada sem permissão do médico, e o indivíduo, em geral, não se envolve em comportamento de busca da droga para obter medicamento adicional. Os critérios para transtorno por uso de substância não são atendidos. Tolerância a medicamentos. Sintomas de tolerância e descontinuação podem ocorrer como resposta fisiológica normal à interrupção do medicamento, após uso prolongado. A maioria dos casos de tolerância a medicamento pode ser controlada por meio de uma diminuição cuidadosamente controlada.

Comorbidade Em geral, o indivíduo iniciou o medicamento para um transtorno depressivo maior; os sintomas originais podem retornar durante a síndrome da descontinuação.

Outros Efeitos Adversos dos Medicamentos 995.20 (T50.905A) Consulta inicial 995.20 (T50.905D) Consulta de seguimento 995.20 (T50.905S) Sequelas Esta categoria está disponível para uso opcional pelos clínicos para codificar os efeitos colaterais dos medicamentos (diferentes de sintomas do movimento) quando esses efeitos adversos se tornam o foco principal da atenção clínica. Os exemplos incluem hipotensão grave, arritmias cardíacas e priapismo.


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica Esta discussão abrange outras condições e problemas que podem ser foco de atenção clínica ou que de outra forma afetem o diagnóstico, o curso, o prognóstico ou o tratamento do transtorno mental de um paciente. Essas condições são apresentadas com os códigos correspondentes da CID-9-MC (normalmente, códigos V) e da CID-10-MC (normalmente, códigos Z). Uma condição ou problema neste capítulo pode ser codificada quando se trata de uma razão para a consulta atual ou ajuda a explicar a necessidade de um exame, procedimento ou tratamento. As condições e os problemas neste capítulo podem também ser incluídos no prontuário médico como informações úteis sobre as circunstâncias capazes de afetar o atendimento ao paciente, independentemente de sua relevância para a consulta do momento. As condições e os problemas listados neste capítulo não são transtornos mentais. Sua inclusão no DSM-5 pretende atrair atenção para a abrangência das questões adicionais que podem ser encontradas na prática clínica de rotina, além de constituir uma lista sistemática que pode ser útil aos clínicos na documentação dessas questões.

Problemas de Relacionamento Relacionamentos essenciais, em especial os com parceiros adultos íntimos e os pais/cuidadores, têm forte impacto na saúde dos indivíduos envolvidos. Em relação à saúde, esses relacionamentos podem ser promotores e protetores, neutros ou prejudiciais. Em um extremo, esses relacionamentos íntimos podem ser associados a maus-tratos ou negligência, com consequências médicas e psicológicas significativas para a pessoa afetada. Um problema de relacionamento pode ser objeto da atenção clínica tanto pela razão pela qual o indivíduo procura o atendimento quanto pelo fato de ser um problema que afeta o curso, o prognóstico ou o tratamento do transtorno mental ou de outro problema médico do indivíduo.

Problemas Relacionados à Educação Familiar V61.20 (Z62.820) Problema de Relacionamento entre Pais e Filhos Para esta categoria, o termo pais é usado em referência a um dos principais cuidadores da criança, que pode ser pai biológico, adotivo ou institucional, ou, ainda, ser outro familiar (como um dos avós) que desempenha um papel de pai para a criança. Esta categoria deve ser usada quando o foco principal da atenção clínica é tratar a qualidade da relação entre pais e filhos, ou quando a qualidade dessa relação está afetando o curso, o prognóstico ou o tratamento de um transtorno mental ou outro problema médico. Comumente, o problema de relacionamento entre pais e filhos está associado a prejuízo no funcionamento nos domínios comportamental, cognitivo ou afetivo. Exemplos de problemas comportamentais incluem controle parental inadequado, supervisão e envolvimento com a criança; excesso de proteção parental; excesso de pressão parental; discussões que se tornam ameaças de violência física; esquiva sem solução dos problemas. Os problemas cognitivos podem incluir atribuições negativas das intenções dos outros, hostilidade contra ou culpabilização do outro e sentimentos injustificados de estranhamento. Os problemas afetivos podem incluir sentimentos de tristeza, apatia ou raiva relativa ao outro indivíduo na relação. Os clínicos devem levar em conta as necessidades desenvolvimentais infantis, bem como o contexto cultural.


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Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica

V61.8 (Z62.891) Problema de Relacionamento com Irmão Esta categoria deve ser usada quando o foco da atenção clínica é um padrão de interação entre irmãos associado a prejuízo significativo no funcionamento individual ou familiar, a desenvolvimento de sintomas em um ou mais de um dos irmãos, ou quando um problema de relacionamento com irmãos está afetando o curso, o prognóstico ou o tratamento de um transtorno mental ou outro problema médico de um irmão. Esta categoria pode ser usada para crianças ou adultos quando o foco está na relação com um irmão. Nesse contexto, inclui-se irmão, meio-irmão, irmão adotivo ou adotado. V61.8 (Z62.29) Educação Longe dos Pais Esta categoria deve ser usada quando o foco central da atenção clínica pertence a questões relativas ao fato de a criança ser educada longe dos pais, ou quando essa criação separada afeta o curso, o prognóstico ou o tratamento de um transtorno mental ou outro problema médico. A criança pode estar sob custódia do Estado, colocada em instituição especial. Ela pode também morar na casa de um familiar que não o pai ou a mãe, ou com amigos, cuja colocação afastada da casa dos pais, no entanto, não é obrigatória ou sancionada pelo judiciário. Os problemas relativos a uma criança que mora em uma casa coletiva ou em um orfanato também estão inclusos. Esta categoria exclui questões relacionadas a V60.6 (Z59.3) crianças em internatos. V61.29 (Z62.898) Criança Afetada por Sofrimento na Relação dos Pais Esta categoria deve ser usada quando o foco da atenção clínica inclui os efeitos negativos de discórdia na relação dos pais (p. ex., altos níveis de conflito, sofrimento ou menosprezo) em um filho da família, inclusive os efeitos no transtorno mental ou em outra condição médica da criança.

Outros Problemas Relacionados a Grupo de Apoio Primário V61.10 (Z63.0) Sofrimento na Relação com o Cônjuge ou Parceiro Íntimo Esta categoria deve ser usada quando o foco principal do contato clínico volta-se para a qualidade da relação de intimidade (cônjuge ou parceiro), ou quando a qualidade desse relacionamento está afetando o curso, o prognóstico ou o tratamento de um transtorno mental ou outro problema médico. Os parceiros podem ser do mesmo gênero ou de gêneros diferentes. Comumente, o sofrimento no relacionamento está associado a funcionamento prejudicado nos domínios comportamental, cognitivo ou afetivo. Exemplos de problemas comportamentais incluem dificuldade para resolver conflitos, afastamento e envolvimento excessivo. Problemas cognitivos podem se manifestar como atribuições negativas crônicas das intenções ou indeferimentos de comportamentos positivos do parceiro. Problemas afetivos incluem tristeza crônica, apatia e/ou raiva do parceiro. Nota: Esta categoria exclui consultas clínicas para serviços de saúde mental para o cônjuge ou problemas de abuso do parceiro V61.1x (Z69.1x) e aconselhamento sexual V65.49 (Z70.9).

V61.03 (Z63.5) Ruptura da Família por Separação ou Divórcio Esta categoria deve ser usada quando parceiros que compõem um casal adulto com intimidade estão separados devido a problemas de relacionamento ou quando estão em processo de divórcio. V61.8 (Z63.8) Nível de Expressão Emocional Alto na Família Emoção expressa é um construto usado como uma medida qualitativa da “quantidade” de emoção – em especial hostilidade, excesso de envolvimento emocional e crítica voltados a um membro da família que é paciente identificado – exibida no ambiente familiar. Esta categoria deve ser usada quando o alto nível de expressão emocional da família é o foco da atenção clínica ou está afetando o curso, o prognóstico e o tratamento do transtorno mental ou condição médica de um membro da família. V62.82 (Z63.4) Luto Sem Complicações Esta categoria pode ser usada quando o foco da atenção clínica é uma reação normal à morte de um ente querido. Como parte de sua reação a essa perda, alguns indivíduos em sofrimento


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica 717 se apresentam com sintomas característicos de um episódio depressivo maior – por exemplo, sentimentos de tristeza e sintomas associados, como insônia, apetite reduzido e perda de peso. A pessoa enlutada costuma considerar o humor depressivo como “normal”, embora possa procurar ajuda profissional para alívio dos sintomas associados, como insônia ou anorexia. A duração e a expressão do luto “normal” variam muito entre diferentes grupos culturais. Mais orientações para que se diferencie luto de um episódio depressivo maior são parte dos critérios para episódio depressivo maior.

Abuso e Negligência Maus-tratos por membro da família (p. ex., cuidador, parceiro adulto íntimo), ou por pessoa que não é familiar, podem ser a área do foco clínico atual, ou esses maus-tratos podem ser um fator importante na investigação e no tratamento de pacientes com transtorno mental ou outra condição médica. Devido às implicações legais de abuso e negligência, deve-se ter cautela ao avaliar essas condições e designar esses códigos. Uma história anterior de abuso ou negligência pode influenciar o diagnóstico e a resposta ao tratamento em muitos transtornos mentais, podendo ainda ser registrada com o diagnóstico. Para as categorias a seguir, além de listas dos eventos confirmados ou suspeitas de abuso ou negligência, outros códigos são oferecidos para uso quando a consulta clínica atual buscar o oferecimento de serviços de saúde mental à vítima ou ao perpetrador do abuso ou negligência. Há, ainda, um código separado para a designação da história anterior de abuso ou negligência. Nota para codificação para a CID-10-MC Condições de Abuso e Negligência Para os códigos T apenas, o sétimo caractere deve ser codificado assim: A (consulta inicial) – Usar enquanto o paciente estiver recebendo tratamento para a condição (p. ex., tratamento cirúrgico, consulta no setor de emergência, avaliação e tratamento por um novo clínico); ou D (consulta de seguimento) – Usar para consultas depois que o paciente recebeu tratamento para a condição e quando ele estiver recebendo atendimento de rotina para a condição durante a cura ou fase de recuperação (p. ex., troca ou remoção de imobilização, remoção de dispositivo de fixação externa ou interna, ajuste medicamentoso, outras consultas pós-atendimento e de acompanhamento).

Problemas de Maus-tratos e Negligência Infantil Abuso Físico Infantil Abuso físico infantil é uma lesão física não acidental a uma criança – com variações desde contusões de menor importância a fraturas graves ou morte – ocorrendo em consequência de beliscões, espancamento, chutes, mordidas, sacudidas, arremesso de objeto, facada, sufocação, batidas (com a mão, uma vara, uma cinta ou outro objeto), queimadura ou outro método infligido por um dos pais, cuidador ou outro indivíduo responsável pela criança. Esse tipo de lesão é considerado abuso, independentemente de o cuidador ter tido ou não intenção de machucar a criança. Disciplina física, como usar as palmadas ou palmatória, não é considerada abuso, desde que dentro do razoável, sem causar lesão no corpo da criança. Abuso Físico Infantil Confirmado 995.54 (T74.12XA) Consulta inicial 995.54 (T74.12XD) Consulta de seguimento Abuso Físico Infantil Suspeitado 995.54 (T76.12XA) Consulta inicial 995.54 (T76.12XD) Consulta de seguimento


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Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica

Outras Circunstâncias Relacionadas a Abuso Físico Infantil V61.21 (Z69.010)

Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso infantil por um dos pais

V61.21 (Z69.020) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso infantil não parental V15.41 (Z62.810) História pessoal (história anterior) de abuso físico na infância V61.22 (Z69.011) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso infantil parental V62.83 (Z69.021)

Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso infantil não parental

Abuso Sexual Infantil O abuso sexual infantil abrange qualquer ato sexual envolvendo uma criança, com intenção de propiciar gratificação sexual a um dos pais, cuidador ou outro indivíduo responsável pela criança. Inclui atividades como carícias nos genitais da criança, penetração, incesto, estupro, sodomia e exposição indecente. Inclui, ainda, exploração sem contato de uma criança, por um dos pais ou cuidador – por exemplo, obrigar, enganar, seduzir, ameaçar ou pressionar uma criança a participar de atos para a gratificação sexual de outros, sem contato físico direto entre a criança e o abusador. Abuso Sexual Infantil Confirmado 995.53 (T74.22XA) Consulta inicial 995.53 (T74.22XD) Consulta de seguimento Abuso Sexual Infantil Suspeitado 995.53 (T76.22XA) Consulta inicial 995.53 (T76.22XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Abuso Sexual Infantil V61.21 (Z69.010) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso sexual infantil por um dos pais V61.21 (Z69.020)

Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso sexual infantil não parental

V15.41 (Z62.810) História pessoal (história anterior) de abuso sexual na infância V61.22 (Z69.011) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso sexual infantil parental V62.83 (Z69.021) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso sexual infantil não parental

Negligência Infantil A negligência infantil é definida como qualquer ato ou omissão notáveis, confirmados ou suspeitados por um dos pais ou outro cuidador da criança, que a privam das necessidades básicas adequadas à idade e, assim, resultam, ou têm razoável potencial de resultar, em dano físico ou psicológico à criança. A negligência infantil abrange abandono, falta de supervisão apropriada, fracasso em satisfazer às necessidades emocionais ou psicológicas e fracasso em dar educação, atendimento médico, alimentação, moradia/ou vestimentas necessárias.


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica 719 Negligência Infantil Confirmada 995.52 (T74.02XA) Consulta inicial 995.52 (T74.02XD) Consulta de seguimento Negligência Infantil Suspeitada 995.52 (T76.02XA) Consulta inicial 995.52 (T76.02XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Negligência Infantil V61.21 (Z69.010) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de negligência infantil por um dos pais V61.21 (Z69.020) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de negligência infantil não parental V15.42 (Z62.812) História pessoal (história anterior) de negligência na infância V61.22 (Z69.011) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de negligência infantil parental V62.83 (Z69.021) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de negligência infantil não parental

Abuso Psicológico Infantil Abuso psicológico infantil inclui atos verbais ou simbólicos não acidentais cometidos por um dos pais ou cuidador da criança que resultam, ou têm potencial razoável para resultar, em dano psicológico significativo à criança. (Atos abusivos físicos e sexuais não fazem parte desta categoria.) Exemplos de abuso psicológico de uma criança incluem repreender, depreciar ou humilhar a criança; ameaçar a criança; prejudicar/abandonar – ou indicar que o suposto ofensor irá prejudicar/abandonar – pessoas ou coisas de que a criança gosta; confinar a criança (atos de amarrar braços ou pernas ou prender em peça do mobiliário ou outro objeto, ou confinar em área fechada pequena [p. ex., armário]); culpar vulgarmente a criança; coagir a criança a causar dor em si mesma; disciplinar excessivamente a criança (i.e., com frequência ou duração extremamente altas, mesmo que não configure abuso físico) por meio de recursos físicos ou não físicos. Abuso Psicológico Infantil Confirmado 995.51 (T74.32XA) Consulta inicial 995.51 (T74.32XD) Consulta de seguimento Abuso Psicológico Infantil Suspeitado 995.51 (T76.32XA) Consulta inicial 995.51 (T76.32XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Abuso Psicológico Infantil V61.21 (Z69.010) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso psicológico infantil por um dos pais V61.21 (Z69.020) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso psicológico infantil não parental V15.42 (Z62.811) História pessoal (história anterior) de abuso psicológico na infância V61.22 (Z69.011) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso psicológico infantil parental V62.83 (Z69.021) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso psicológico infantil não parental


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Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica

Problemas de Maus-tratos e Negligência de Adultos Violência Física de Cônjuge ou Parceiro Esta categoria deve ser usada quando atos não acidentais de força física que resultam, ou têm potencial razoável de resultar, em dano físico a parceiro íntimo ou evocam medo significativo no parceiro ocorreram durante o ano anterior. Atos não acidentais de força física incluem empurrar, esbofetear, puxar os cabelos, beliscar, imobilizar, sacudir, jogar, morder, chutar, atingir com punho ou objeto, queimar, envenenar, aplicar força à garganta, cortar o fornecimento de ar, segurar a cabeça sob a água e usar uma arma. Atos para proteger-se fisicamente ou proteger o próprio parceiro ficam excluídos. Violência Física de Cônjuge ou Parceiro Confirmada 995.81 (T74.11XA) Consulta inicial 995.81 (T74.11XD) Consulta de seguimento Violência Física de Cônjuge ou Parceiro Suspeitada 995.81 (T76.11XA) Consulta inicial 995.81 (T76.11XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Violência Física de Cônjuge ou Parceiro V61.11 (Z69.11) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de violência física de cônjuge ou parceiro V15.41 (Z91.410) História pessoal (história anterior) de violência física de cônjuge ou parceiro 61.12 (Z69.12)

Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de violência física de cônjuge ou parceiro

Violência Sexual de Cônjuge ou Parceiro Esta categoria deve ser usada quando atos sexuais forçados ou sob coação com parceiro íntimo ocorreram durante o ano anterior. A violência sexual pode envolver o uso de força física ou coerção psicológica para compelir o parceiro a envolver-se em ato sexual contra sua vontade, seja esse ato realizado ou não. Também fazem parte desta categoria atos sexuais com parceiro íntimo que não consegue consentir. Violência Sexual de Cônjuge ou Parceiro Confirmada 995.83 (T74.21XA) Consulta inicial 995.83 (T74.21XD) Consulta de seguimento Violência Sexual de Cônjuge ou Parceiro Suspeitada 995.83 (T76.21XA) Consulta inicial 995.83 (T76.21XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Violência Sexual de Cônjuge ou Parceiro V61.11 (Z69.81) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de violência sexual de cônjuge ou parceiro V15.41 (Z91.410) História pessoal (história anterior) de violência sexual de cônjuge ou parceiro V61.12 (Z69.12)

Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de violência sexual de cônjuge ou parceiro


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica 721

Negligência de Cônjuge ou Parceiro A negligência de cônjuge ou parceiro é todo ato ou omissão notórios no ano anterior cometidos por um parceiro que priva o parceiro dependente das necessidades básicas, resultando, ou com potencial razoável de resultar, em dano físico ou psicológico para essa pessoa. Esta categoria é usada no contexto dos relacionamentos em que um dos parceiros é extremamente dependente do outro para cuidados e assistência na realização das atividades cotidianas – por exemplo, parceiro incapacitado para o autocuidado devido a limitações físicas, psicológicas/intelectuais ou culturais substanciais (p. ex., incapacidade de comunicar-se com os outros e de controlar as atividades cotidianas em razão de morar em país de cultura estrangeira). Negligência de Cônjuge ou Parceiro Confirmada 995.85 (T74.01XA) Consulta inicial 995.85 (T74.01XD) Consulta de seguimento Negligência de Cônjuge ou Parceiro Suspeitada 995.85 (T76.01XA) Consulta inicial 995.85 (T76.01XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Negligência de Cônjuge ou Parceiro V61.11 (Z69.11) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de negligência de cônjuge ou parceiro V15.42 (Z91.412) História pessoal (história anterior) de negligência de cônjuge ou parceiro V61.12 (Z69.12)

Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de negligência de cônjuge ou parceiro

Abuso Psicológico de Cônjuge ou Parceiro O abuso psicológico de cônjuge ou parceiro engloba atos verbais ou simbólicos não acidentais cometidos por um dos parceiros que resultam, ou têm razoável potencial para resultar, em dano significativo ao outro. Esta categoria deve ser usada quando esse abuso psicológico ocorreu durante o ano anterior. Atos de abuso psicológico incluem repreender ou humilhar a vítima; interrogar a vítima; limitar a capacidade da vítima de ir e vir livremente; obstruir o acesso da vítima a assistência (p. ex., obrigação legal, recursos legais, de proteção, médicos); ameaçar a vítima com dano físico ou agressão sexual; causar dano ou ameaçar causar dano a pessoas ou coisas importantes para a vítima; restringir injustificadamente o acesso ou o uso de recursos econômicos pela vítima; isolar a vítima da família, de amigos ou de recursos de apoio social; perseguir a vítima; tentar fazê-la acreditar que está louca. Abuso Psicológico de Cônjuge ou Parceiro Confirmado 995.82 (T74.31XA) Consulta inicial 995.82 (T74.31XD) Consulta de seguimento Abuso Psicológico de Cônjuge ou Parceiro Suspeitado 995.82 (T76.31XA) Consulta inicial 995.82 (T76.31XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Abuso Psicológico de Cônjuge ou Parceiro V61.11 (Z69.11) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso psicológico de cônjuge ou parceiro


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Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica

V15.42 (Z91.411) História pessoal (história anterior) de abuso psicológico de cônjuge ou parceiro V61.12 (Z69.12)

Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso psicológico de cônjuge ou parceiro

Abuso de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Estas categorias devem ser usadas quando um adulto sofreu abuso de outro adulto que não o parceiro íntimo. Esse tipo de maus-tratos pode envolver atos de abuso físico, sexual ou emocional. Exemplos de abuso de adulto incluem atos não acidentais de força física (p. ex., empurrar, arranhar, estapear, atirar algo capaz de ferir, beliscar, morder) que resultam – ou têm razoável potencial de resultar – em dano físico ou causam muito medo, atos sexuais forçados ou coagidos e atos verbais ou simbólicos, com potencial de causar dano psicológico (p. ex., repreender ou humilhar a pessoa; interrogar a pessoa; limitar a capacidade da pessoa de ir e vir em liberdade; obstruir o acesso da pessoa a assistência; ameaçar a pessoa; ferir ou ameaçar a pessoa de causar dano a outras pessoas ou coisas importantes para ela; restringir o acesso ou o uso dos recursos econômicos pela pessoa; isolar a pessoa da família, de amigos ou de recursos de apoio social; perseguir a pessoa; tentar fazê-la acreditar que está louca). Os atos que buscam proteção a si mesmo ou a outra pessoa estão excluídos. Abuso Físico de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Confirmado 995.81 (T74.11XA) Consulta inicial 995.81 (T74.11XD) Consulta de seguimento Abuso Físico de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Suspeitado 995.81 (T76.11XA) Consulta inicial 995.81 (T76.11XD) Consulta de seguimento Abuso Sexual de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Confirmado 995.83 (T74.21XA) Consulta inicial 995.83 (T74.21XD) Consulta de seguimento Abuso Sexual de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Suspeitado 995.83 (T76.21XA) Consulta inicial 995.83 (T76.21XD) Consulta de seguimento Abuso Psicológico de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Confirmado 995.82 (T74.31XA) Consulta inicial 995.82 (T74.31XD) Consulta de seguimento Abuso Psicológico de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro Suspeitado 995.82 (T76.31XA) Consulta inicial 995.82 (T76.31XD) Consulta de seguimento Outras Circunstâncias Relacionadas a Abuso de Adulto por Não Cônjuge ou Não Parceiro V65.49 (Z69.81) Consulta em serviços de saúde mental de vítima de abuso de adulto não cônjuge ou não parceiro V62.83 (Z69.82) Consulta em serviços de saúde mental de perpetrador de abuso de adulto não cônjuge ou não parceiro


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica 723

Problemas Educacionais ou Profissionais Problemas Educacionais V62.3 (Z55.9) Problema Acadêmico ou Educacional Esta categoria deve ser usada quando um problema acadêmico ou educacional é o foco da atenção clínica ou causa impacto no diagnóstico, no tratamento ou no prognóstico do indivíduo. Os problemas a serem considerados incluem analfabetismo ou baixo nível de instrução; falta de acesso à escola em razão de indisponibilidade ou impossibilidade; problemas com o desempenho acadêmico (p. ex., fracasso nos exames escolares, recebimento de sinais ou graus de fracasso) ou baixo rendimento (abaixo do esperado, considerada a capacidade intelectual do indivíduo); desentendimento com professores, funcionários da escola ou outros estudantes; e quaisquer problemas relacionados a educação e/ou instrução.

Problemas Profissionais V62.21 (Z56.82) Problema Relacionado a Condição Atual de Preparação Militar Esta categoria deve ser usada quando um problema profissional diretamente relacionado à condição de preparação militar de um indivíduo é o foco da atenção clínica ou causa impacto no diagnóstico, no tratamento ou no prognóstico individual. As reações psicológicas à preparação não estão nesta categoria; elas são mais bem entendidas como um transtorno de adaptação ou outro transtorno mental. V62.29 (Z56.9) Outro Problema Relacionado a Emprego Esta categoria deve ser usada quando um problema profissional é o foco da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou prognóstico individual. As áreas a serem consideradas incluem problemas com o emprego ou no ambiente de trabalho, incluindo desemprego; mudança recente de trabalho; ameaça de perda de emprego; insatisfação com o trabalho; agenda de trabalho estressante; incerteza quanto às escolhas profissionais; assédio sexual no local de trabalho; outras discordâncias com o patrão, supervisor, colegas ou outros no ambiente de trabalho; ambientes de trabalho hostis ou desagradáveis; outros estressores psicossociais relacionados ao trabalho e quaisquer outros problemas relacionados ao emprego e/ou profissão.

Problemas de Moradia e Econômicos Problemas de Moradia V60.0 (Z59.0) Os Sem-teto Esta categoria deve ser usada quando a falta de uma moradia ou endereço regular causa impacto importante no tratamento ou prognóstico do indivíduo. Considera-se que uma pessoa não tem moradia quando sua residência primária à noite é um abrigo para pessoas sem-teto, um abrigo para dias frios, um abrigo contra violência doméstica, um espaço público (p. ex., túnel, estação rodoviária ou de trem, um centro de compras), um prédio de uso não residencial (p. ex., estrutura abandonada, fábrica sem uso), uma caixa de papelão ou caverna ou quando está em alguma outra situação habitacional ad hoc. V60.1 (Z59.1) Moradia Inadequada Esta categoria deve ser usada quando a falta de moradia adequada causa impacto no tratamento ou prognóstico individual. Exemplos de moradia inadequada incluem falta de aquecimento (nas baixas temperaturas) ou eletricidade, infestação de insetos ou roedores, encanamento e instalações sanitárias inadequadas, superpopulação, falta de espaço adequado para dormir e ruído excessivo. É importante considerar normas culturais antes de designar esta categoria.


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Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica

V60.89 (Z59.2) Desentendimento com Vizinho, Locatário ou Locador Esta categoria deve ser usada quando desentendimento com vizinhos, locatário ou locador é um dos focos da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou prognóstico do indivíduo. V60.6 (Z59.3) Problema Relacionado a Moradia em Instituição Especial Esta categoria deve ser usada quando um problema (ou problemas) relacionado à moradia em instituição especial é o foco da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou prognóstico da pessoa. Reações psicológicas a uma mudança na situação de vida não são parte desta categoria; essas reações são mais bem entendidas como um transtorno de adaptação.

Problemas Econômicos V60.2 (Z59.4) Falta de Alimento Adequado ou de Água Potável para Consumo V60.2 (Z59.5) Pobreza Extrema V60.2 (Z59.6) Baixa Renda V60.2 (Z59.7) Seguro Social ou Previdência Social Insuficientes Esta categoria deve ser usada para indivíduos que atendem a critérios de elegibilidade para apoio social ou previdenciário que não o estão recebendo, ou que o recebem, mas este é insuficiente para atender às suas necessidades, ou para aqueles que não têm acesso a programas de seguridade ou de apoio necessário. Os exemplos incluem incapacidade de qualificar-se para auxílio governamental por falta de documentação adequada ou comprovante de residência, incapacidade de conseguir plano de saúde adequado em razão da idade ou de uma condição preexistente e negação de apoio devido a rendimentos excessivamente reduzidos ou a outras exigências. V60.9 (Z59.9) Moradia ou Problema Econômico Não Especificado Esta categoria deve ser usada quando há algum problema relacionado à moradia ou a circunstâncias econômicas que não as especificadas anteriormente.

Outros Problemas Relacionados ao Ambiente Social V62.89 (Z60.0) Problema Relacionado à Fase da Vida Esta categoria deve ser usada quando um problema de adaptação a uma transição no ciclo de vida (determinada fase do desenvolvimento) é o foco da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou prognóstico da pessoa. Exemplos dessas transições incluem ingresso ou formatura escolar, término do controle dos pais, casamento, início de nova carreira, paternidade/maternidade, adaptação a um “ninho vazio” após saída dos filhos de casa ou aposentadoria. V60.3 (Z60.2) Problema Relacionado a Morar Sozinho Esta categoria deve ser usada quando um problema associado a morar sozinho é o foco da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou no prognóstico individual. Exemplos desse tipo de problema incluem sentimentos crônicos de solidão, isolamento e falta de estrutura para a realização das atividades da vida diária (p. ex., horários irregulares para as refeições e o sono, desempenho inconsistente das tarefas de manutenção da casa). V62.4 (Z60.3) Dificuldade de Aculturação Esta categoria deve ser usada quando uma dificuldade de adaptação a uma nova cultura (p. ex., após migração) é o foco da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou no prognóstico individual. V62.4 (Z60.4) Exclusão ou Rejeição Social Esta categoria deve ser usada quando há um desequilíbrio no poder social de tal ordem que há exclusão ou rejeição social recorrente por parte dos outros. Exemplos de rejeição social incluem bullying, intimidação e provocações por outros; ser alvo de abuso verbal e humilhação por outros e ser excluído, de propósito, das atividades com os colegas de aula, companheiros de trabalho ou outros no ambiente social.


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica 725 V62.4 (Z60.5) Alvo de Discriminação ou Perseguição Adversa (Percebida) Esta categoria deve ser usada quando há discriminação ou perseguição percebida ou vivida contra o indivíduo em razão de ele ser um dos membros (ou percebido como tal) de uma categoria específica. Comumente, tais categorias incluem gênero ou identidade de gênero, raça, etnia, religião, orientação sexual, país de origem, crenças políticas, invalidez, grupo social, condição social, peso e aparência física. V62.9 (Z60.9) Problema Não Especificado Relacionado ao Ambiente Social Esta categoria deve ser usada quando há algum problema relacionado ao ambiente social do indivíduo diferente dos anteriormente especificados.

Problemas Relacionados a Crimes ou Interação com o Sistema Legal V62.89 (Z65.4) Vítima de Crime V62.5 (Z65.0)

Condenação em Processo Cível ou Criminal Sem Prisão

V62.5 (Z65.1)

Prisão ou Outro Encarceramento

V62.5 (Z65.2)

Problemas Relacionados à Liberação da Prisão

V62.5 (Z65.3)

Problemas Relacionados a Outras Circunstâncias Legais

Outras Consultas de Serviços de Saúde para Aconselhamento e Opinião Médica V65.49 (Z70.9) Aconselhamento Sexual Esta categoria deve ser usada quando o indivíduo procura aconselhamento relativo a educação sexual, comportamento sexual, orientação sexual, atitudes sexuais (vergonha, timidez), outro comportamento ou orientação sexual (p. ex., cônjuge, parceiro, filho), prazer sexual ou outra questão relacionada ao sexo. V65.40 (Z71.9) Outro Aconselhamento ou Consulta Esta categoria deve ser usada quando aconselhamento é oferecido ou quando conselho/consulta é procurado para algum problema não especificado anteriormente ou em outro local neste capítulo. Os exemplos incluem aconselhamento espiritual ou religioso, aconselhamento nutricional e aconselhamento sobre uso da nicotina.

Problemas Relacionados a Outras Circunstâncias Psicossociais, Pessoais e Ambientais V62.89 (Z65.8) Problema Religioso ou Espiritual Esta categoria pode ser usada quando o foco da atenção clínica é um problema religioso ou espiritual. Os exemplos incluem experiências de sofrimento que envolvam perda ou questionamento da fé, problemas associados a conversão a nova fé religiosa ou questionamento de valores espirituais que pode, não necessariamente, ter relação com alguma igreja ou instituição religiosa organizada. V61.7 (Z64.0) Problemas Relacionados a Gravidez Indesejada V61.5 (Z64.1) Problemas Relacionados a Múltiplas Gestações V62.89 (Z64.4) Desentendimento com Provedor de Assistência Social, Inclusive Oficial de Condicional, Gerente de Caso ou Assistente Social


726

Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica

V62.89 (Z65.4) Vítima de Terrorismo ou Tortura V62.22 (Z65.5) Exposição a Desastre, Guerra ou Outras Hostilidades V62.89 (Z65.8) Outro Problema Relacionado a Circunstâncias Psicossociais V62.9 (Z65.9)

Problema Não Especificado Relacionado a Circunstâncias Psicossociais Não Especificadas

Outras Circunstâncias da História Pessoal V15.49 (Z91.49) Outra História Pessoal de Trauma Psicológico V15.59 (Z91.5)

História Pessoal de Autolesão

V62.22 (Z91.82) História Pessoal de Preparação Militar V15.89 (Z91.89) Outros Fatores de Risco Pessoais V69.9 (Z72.9) Problema Relacionado ao Estilo de Vida Esta categoria deve ser usada quando um problema no estilo de vida é foco específico do tratamento ou afeta diretamente o curso, o prognóstico ou o tratamento de algum transtorno mental ou outro problema médico. Os exemplos de problemas no estilo de vida incluem falta de exercício físico, dieta inadequada, comportamento sexual de alto risco e higiene do sono insatisfatória. Um problema passível de atribuição a um sintoma de um transtorno mental só deve ser codificado se esse problema for um foco específico de tratamento ou afetar diretamente o curso, o prognóstico ou o tratamento da pessoa. Nesses casos, tanto o transtorno mental quanto o problema de estilo de vida devem ser codificados. V71.01 (Z72.811) Comportamento Antissocial Adulto Esta categoria pode ser usada quando o foco da atenção clínica é um comportamento antissocial adulto que não é devido a algum transtorno mental (p. ex., transtorno da conduta, transtorno da personalidade antissocial). Os exemplos incluem o comportamento de alguns ladrões profissionais, falsificadores ou traficantes de substâncias ilegais. V71.02 (Z72.810) Comportamento Antissocial de Criança ou Adolescente Esta categoria pode ser usada quando o foco da atenção clínica é um comportamento antissocial, em criança ou adolescente, que não é devido a algum transtorno mental (p. ex., transtorno explosivo intermitente, transtorno da conduta). Os exemplos incluem atos antissociais isolados praticados por crianças ou adolescentes (não é um padrão de comportamento antissocial).

Problemas Relacionados a Acesso a Atendimento Médico ou Outro Atendimento de Saúde V63.9 (Z75.3)

Indisponibilidade ou Inacessibilidade de Instalações de Atendimento de Saúde

V63.8 (Z75.4) Indisponibilidade ou Inacessibilidade de Outras Instituições de Ajuda

Não Adesão a Tratamento Médico V15.81 (Z91.19) Não Adesão a Tratamento Médico Esta categoria pode ser usada quando o foco da atenção clínica é a não adesão a um aspecto importante do tratamento para um transtorno mental ou outra condição médica. As razões para essa não adesão podem incluir desconforto resultante do tratamento (p. ex., efeitos colaterais do medicamento), despesas do tratamento, julgamentos de valor, crenças culturais ou religiosas pessoais acerca do tratamento proposto, debilidade associada à idade e presença de algum transtorno mental (p. ex., esquizofrenia, transtorno da personalidade). Esta categoria deve ser usada


Outras Condições que Podem ser Foco da Atenção Clínica 727 somente quando o problema for suficientemente grave a ponto de indicar atenção clínica independente e quando não atender aos critérios diagnósticos para fatores psicológicos que afetam outras condições médicas. 278.00 (E66.9) Sobrepeso ou Obesidade Esta categoria pode ser usada quando o foco da atenção clínica for sobrepeso ou obesidade. V65.2 (Z76.5) Simulação A característica essencial da simulação é a produção intencional de sintomas físicos ou psicológicos falsos ou grosseiramente exagerados motivada por incentivos externos, como evitar o serviço militar, evitar o trabalho, obter compensação financeira, fugir de processo criminal ou conseguir drogas. Sob determinadas circunstâncias, a simulação pode representar comportamento de adaptação – por exemplo, fingir doença enquanto em cativeiro inimigo em tempos de guerra. A simulação deve ser fortemente suspeitada quando notada qualquer combinação dos elementos a seguir: 1. Contexto médico-legal de apresentação (p. ex., o indivíduo é encaminhado ao clínico por um advogado para exame ou o indivíduo se autoencaminha enquanto estão pendentes litígio ou acusações). 2. Discrepância acentuada entre o alegado estresse ou incapacidade do indivíduo e os achados e as observações objetivas. 3. Falta de cooperação durante avaliação diagnóstica e de obediência ao regime de tratamento prescrito. 4. Presença de transtorno da personalidade antissocial. A simulação difere do transtorno factício no sentido de que a motivação para a produção de sintomas, na simulação, é um incentivo externo, ao passo que no transtorno factício esse incentivo está ausente. A simulação difere do transtorno conversivo e de transtornos mentais relacionados a sintomas somáticos no que se refere à produção intencional de sintomas e aos incentivos externos óbvios associados. As evidências definitivas de fingimento (como evidências claras de que a perda de função está presente durante o exame, mas não em casa) sugerem um diagnóstico de transtorno factício, se a meta aparente da pessoa é assumir o papel de doente, ou simulação, se a intenção for conseguir um incentivo, como dinheiro. V40.31 (Z91.83) Perambulação Associada a Algum Transtorno Mental Esta categoria é usada para indivíduos com algum transtorno mental cujo desejo de vaguear leva a preocupações de controle clínico ou de segurança significativas. Por exemplo, pessoas com transtornos neurocognitivos maiores ou transtornos do neurodesenvolvimento podem ter uma tendência de perambular sem rumo que as coloca em risco de quedas, e a abandonar locais supervisionados sem o acompanhamento necessário. Esta categoria exclui indivíduos cuja intenção é fugir de alguma situação de abrigo indesejada (p. ex., crianças que fogem de casa, pacientes que não desejam mais permanecer no hospital) ou aqueles que caminham ou andam de um lado a outro em consequência de acatisia induzida por medicamento. Nota para codificação: Codificar primeiro o transtorno mental associado (p. ex., transtorno neurocognitivo maior, transtorno do espectro autista) para, então, codificar V40.31 (Z91.83) perambulação associada a [transtorno mental específico].

V62.89 (R41.83) Funcionamento Intelectual Borderline Esta categoria pode ser usada quando o funcionamento intelectual borderline de um indivíduo é o foco da atenção clínica ou causa impacto no tratamento ou no prognóstico individual. Diferenciar funcionamento intelectual borderline de incapacidade intelectual leve (transtorno do desenvolvimento intelectual) exige avaliação criteriosa da função intelectual e adaptativa e suas discrepâncias, em especial na presença de transtornos mentais simultâneos capazes de afetar a obediência do paciente a procedimentos padronizados dos testes (p. ex., esquizofrenia ou transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, com impulsividade grave).


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SEÇÃO III Instrumentos de Avaliação e Modelos Emergentes Instrumentos de Avaliação ....................................................................................... 733 Escalas Transversais de Sintomas ....................................................................... 734 Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 Autoaplicável do DSM-5 – Adulto ................................................................. 738 Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 do DSM-5 – Crianças de 6-17 Anos Pontuada pelos Pais ou Responsável ..................... 741 Gravidade das Dimensões de Sintomas de Psicose Avaliada pelo Clínico ......... 742 Escala de Avaliação de Incapacidade da Organização Mundial da Saúde 2.0.... 745 Formulação Cultural ................................................................................................. 749 Entrevista de Formulação Cultural (EFC).............................................................. 750 Entrevista de Formulação Cultural (EFC) – Versão do Informante ....................... 755 Modelo Alternativo do DSM-5 para os Transtornos da Personalidade .................... 761 Condições para Estudos Posteriores ....................................................................... 783 Episódios Depressivos com Hipomania de Curta Duração ................................. 786 Transtorno do Luto Complexo Persistente........................................................... 789 Transtorno por Uso de Cafeína ............................................................................ 792 Transtorno do Jogo pela Internet ......................................................................... 795 Transtorno Neurocomportamental Associado a Exposição Pré-natal ao Álcool .......................................................................... 798 Transtorno do Comportamento Suicida ............................................................... 801 Autolesão Não Suicida ......................................................................................... 803


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Esta seção contém ferramentas e técnicas para aprimorar o processo de tomada de decisão clínica, compreender o contexto cultural dos transtornos mentais e reconhecer os diagnósticos emergentes para estudos posteriores. Ela apresenta estratégias para aperfeiçoar a prática clínica e novos critérios para estimular futuras pesquisas, representando um DSM-5 dinâmico que se desenvolverá com os avanços no campo. Entre as ferramentas da Seção III encontra-se uma escala transversal de Nível 1 autoaplicável ou aplicada pelo informante que serve como uma revisão dos sistemas entre os transtornos mentais. É apresentada uma escala de gravidade classificada pelo clínico para esquizofrenia e outros transtornos psicóticos, bem como a Escala de Avaliação de Incapacidade da Organização Mundial da Saúde, Versão 2 (WHODAS 2.0). As escalas de gravidade de Nível 2 estão disponíveis on-line (www.psychiatry.org/ dsm5) e podem ser usadas para explorar respostas significativas ao rastreamento de Nível 1. São apresentadas uma revisão abrangente do contexto cultural dos transtornos mentais e a Entrevista para Formulação Cultural (EFC) para uso clínico. Esta seção também traz transtornos propostos para estudos posteriores, que incluem um novo modelo para diagnóstico dos transtornos da personalidade como alternativa aos critérios diagnósticos estabelecidos; que incorpora deficiências no funcionamento da personalidade, além de traços de personalidade patológicos. Também são abordadas novas condições que são foco de pesquisa, como a síndrome de psicose atenuada e a autolesão não suicida.


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Instrumentos de Avaliação Um corpo cada

vez maior de evidências científicas favorece conceitos dimensionais no diagnóstico dos transtornos mentais. As limitações de uma abordagem categórica do diagnóstico incluem a falha em encontrar zonas de distinção entre os diagnósticos (i.e., delimitação dos transtornos mentais por fronteiras naturais), a necessidade de categorias intermediárias, como o transtorno esquizoafetivo, altas taxas de comorbidade, diagnósticos frequentes “sem outra especificação” (SOE), relativa falta de utilidade em aprofundar a identificação de antecedentes que sejam realmente válidos e específicos para a maioria dos transtornos mentais e falta de especificidade no tratamento para as várias categorias diagnósticas. A partir das perspectivas clínica e de pesquisa, existe a necessidade de uma abordagem mais dimensional que possa ser combinada com o conjunto de diagnósticos em categorias do DSM. Tal abordagem incorpora variações de características em um indivíduo (p. ex., gravidade diferencial dos sintomas individuais tanto dentro quanto fora dos critérios diagnósticos de um transtorno, avaliados conforme a intensidade, a duração ou o número de sintomas, em conjunto com outras características, como o tipo e a gravidade das incapacidades) em vez de se basear em uma abordagem simples do tipo sim ou não. No caso de transtornos para os quais é necessária a presença de todos os sintomas para que seja feito o diagnóstico (um conjunto de critérios monotéticos), podem ser observados diferentes graus de gravidade dos sintomas. Se for necessária a presença de um número mínimo de sintomas múltiplos, como pelo menos cinco de nove sintomas para um transtorno depressivo maior (um conjunto de critérios politéticos), os níveis de gravidade e as diferentes combinações dos critérios podem identificar grupos diagnósticos mais homogêneos. Uma abordagem dimensional dependendo primariamente do relato subjetivo de um indivíduo com relação à experiência dos sintomas em conjunto com a interpretação do clínico é consistente com a prática diagnóstica atual. Espera-se que, à medida que aumente a nossa compreensão dos mecanismos básicos das doenças com base na fisiopatologia, nos neurocircuitos, nas interações gene-ambiente e nos testes laboratoriais, sejam desenvolvidas abordagens que integrem os dados objetivos e subjetivos do paciente a fim de complementar e aumentar a precisão do processo diagnóstico. As escalas transversais para avaliação de sintomas, construídas com base no modelo de revisão de sistemas da medicina, podem ser uma abordagem para examinar domínios psicopatológicos que são de importância decisiva. A revisão de sistemas é crucial para detectar mudanças sutis nos diferentes sistemas orgânicos que podem facilitar o diagnóstico e o tratamento. Um exame similar das várias funções mentais pode auxiliar em uma avaliação mais abrangente do estado mental ao chamar a atenção para os sintomas que podem não se enquadrar completamente nos critérios diagnósticos sugeridos pelos sintomas apresentados pelo indivíduo, mas que podem, no entanto, ser importantes para seu atendimento. As escalas transversais apresentam dois níveis: as questões de Nível 1 são um breve levantamento de 13 domínios de sintomas para pacientes adultos e 12 domínios para crianças e adolescentes. As questões de Nível 2 proporcionam uma avaliação em maior profundidade de determinados domínios. Os instrumentos foram desenvolvidos para serem administrados na entrevista inicial e ao longo do tempo a fim de acompanhar o status dos sintomas do paciente e a resposta ao tratamento. As escalas de gravidade são específicas para cada transtorno, correspondendo aos critérios que constituem a definição de um transtorno. Elas podem ser administradas aos indivíduos que receberam um diagnóstico ou que têm uma síndrome clinicamente significativa que não chega a preencher todos os critérios para um diagnóstico. Alguns dos instrumentos são preenchidos pelo indivíduo, enquanto outros requerem que um clínico os preencha. Assim como ocorre com


734

Instrumentos de Avaliação

as escalas transversais, esses instrumentos foram desenvolvidos para ser administrados na entrevista inicial e ao longo do tempo para acompanhar a gravidade do transtorno do indivíduo e a resposta ao tratamento. A Escala de Avaliação de Incapacidade da Organização Mundial da Saúde, Versão 2.0 (WHODAS 2.0), foi desenvolvida para avaliar a capacidade de um paciente de realizar atividades em seis áreas: compreensão e comunicação; locomoção; autocuidado; relação com as pessoas; atividades da vida diária (p. ex., tarefas domésticas, trabalho/escola); e participação na sociedade. A escala é autoaplicável e foi desenvolvida para ser usada em pacientes com qualquer transtorno médico. Ela corresponde a conceitos contidos na Classificação Internacional de Funcionamento, Deficiência e Saúde da OMS. Essa avaliação também pode ser usada ao longo do tempo para acompanhar as alterações nas deficiências de um paciente. Este capítulo foca na Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 do DSM-5 (versão autoaplicável para adultos e versão pais/responsável); na Escala Dimensões da Gravidade dos Sintomas de Psicose Avaliada pelo Clínico; e na WHODAS 2.0. São apresentadas para cada uma as instruções para o clínico, informações sobre a pontuação e diretrizes para interpretação. Esses instrumentos e as avaliações dimensionais adicionais, em inglês, incluindo aquelas para diagnosticar a gravidade, podem ser encontradas on-line em www.psychiatry.org/dsm5.

Escalas Transversais de Sintomas Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 A Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 do DSM-5 é um instrumento pontuado pelo paciente ou informante que avalia domínios de saúde mental que são importantes entre os diagnósticos psiquiátricos. Sua intenção é ajudar os clínicos a identificar áreas adicionais de investigação que podem ter um impacto significativo no tratamento e prognóstico do indivíduo. Além disso, o instrumento pode ser usado para acompanhar as mudanças na apresentação dos sintomas ao longo do tempo. A versão para adultos da escala consiste em 23 perguntas que avaliam 13 domínios psiquiátricos, incluindo depressão, raiva, mania, ansiedade, sintomas somáticos, ideação suicida, psicose, distúrbio do sono, memória, pensamentos e comportamentos repetitivos, dissociação, funcionamento da personalidade e uso de substância (Tabela 1). Cada domínio consiste de 1 a 3 perguntas. Cada item investiga o quanto (ou com que frequência) o indivíduo tem sido perturbado pelo sintoma específico durante as duas últimas semanas. Se o indivíduo tem capacidade limitada ou é incapaz de preencher o formulário (p. ex., uma pessoa com demência), um informante adulto pode preencher a escala. A escala revelou-se clinicamente útil e com boa confiabilidade nos ensaios de campo (field trials) do DSM-5 que foram conduzidos em amostras clínicas adultas nos Estados Unidos e no Canadá. A versão preenchida pelos pais/responsável (para crianças de 6-17 anos) consiste de 25 perguntas que avaliam 12 domínios psiquiátricos, incluindo depressão, raiva, irritabilidade, mania, ansiedade, sintomas somáticos, desatenção, ideação suicida/tentativa de suicídio, psicose, distúrbio do sono, pensamentos e comportamentos repetitivos e uso de substância (Tabela 2). Cada item requer que o genitor ou responsável classifique o quanto (ou com que frequência) seu filho tem sido perturbado pelo sintoma psiquiátrico específico durante as duas últimas semanas. O instrumento também se revelou clinicamente útil e tem boa confiabilidade nos ensaios de campo (field trials) do DSM-5 que foram conduzidos em amostras clínicas pediátricas nos Estados Unidos. Para crianças de 11 a 17 anos, em conjunto com a pontuação dos sintomas pelos pais ou responsável, o clínico pode considerar o preenchimento pela própria criança da versão autoaplicável. A versão da escala pontuada pela própria criança pode ser encontrada on-line, em inglês, em www.psychiatry.org/dsm5. Pontuação e interpretação. Na versão para adultos do instrumento autoaplicável, cada item é classificado em uma escala de 5 pontos (0 = nada ou de modo algum; 1 = muito leve ou raramente; 2 = leve ou vários dias; 3 = moderado ou mais da metade dos dias; e 4 = grave ou quase todos os dias). O escore em cada item dentro de um domínio deve ser revisado. Entretanto, um


Instrumentos de Avaliação 735

TABELA 1 Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 Autoaplicável do DSM-5 Adulto: 13 domínios, limiares para investigação mais aprofundada e escalas associadas de Nível 2 do DSM-5

Domínio Nome do domínio

Limiar para orientar uma investigação mais aprofundada

Escala Transversal de Sintomas de Nível 2 do DSM-5a

I.

Depressão

Leve ou maior

Nível 2 – Depressão – Adulto (Sofrimento Emocional PROMIS – Forma Curta)

II.

Raiva

Leve ou maior

Nível 2 – Raiva – Adulto (Sofrimento Emocional PROMIS – Raiva – Forma Curta)

III.

Mania

Leve ou maior

Nível 2 – Mania – Adulto (Escala Autoaplicável de Mania de Altman [ASRM])

IV.

Ansiedade

Leve ou maior

Nível 2 – Ansiedade – Adulto (Sofrimento Emocional PROMIS – Ansiedade – Forma Curta)

V.

Sintomas somáticos Leve ou maior

VI.

Ideação suicida

Nível 2 – Sintoma Somático – Adulto (Questionário sobre a Saúde do Paciente – 15 [PHQ-15] Escala de Gravidade do Sintoma Somático)

Muito leve ou maior Nenhuma

VII.

Psicose

Muito leve ou maior Nenhuma

VIII.

Distúrbio do sono

Leve ou maior

Nível 2 – Distúrbio do Sono – Adulto (Distúrbio do Sono PROMIS – Forma Curta)

IX.

Memória

Leve ou maior

Nenhuma

X.

Pensamentos e comportamentos repetitivos

Leve ou maior

Nível 2 – Pensamentos e Comportamentos Repetitivos – Adulto (Inventário Obsessivo-compulsivo da Flórida [FOCI] Escala de Gravidade)

XI.

Dissociação

Leve ou maior

Nenhuma

XII.

Funcionamento da personalidade

Leve ou maior

Nenhuma

XIII.

Uso de substância

Muito leve ou maior Nível 2 – Uso de Substância – Adulto (adaptado de NIDA – ASSIST Modificado)

Nota. NIDA = National Institute on Drug Abuse. a Disponível, em inglês, em www.psychiatry.org/dsm5.

escore leve (i.e., 2) ou maior em algum item dentro de um domínio, exceto para uso de substância, ideação suicida e psicose, pode servir como um guia para investigação adicional e acompanhamento para determinar se é necessária uma avaliação mais detalhada, o que pode incluir a avaliação transversal de sintomas de Nível 2 para o domínio (ver a Tabela 2). Para uso de substância, ideação suicida e psicose, um escore muito leve (i.e., 1) ou maior em algum item dentro do domínio pode servir como um guia para investigação adicional e acompanhamento para determinar se é necessária uma avaliação mais detalhada. Para tal, indique a maior pontuação dentro de um domínio na coluna “Maior pontuação no domínio”. A Tabela 1 descreve os limiares das pontuações que podem orientar uma investigação mais aprofundada dos demais domínios. Na versão do instrumento para pais ou responsável (para crianças de 6-17 anos), 19 dos 25 itens são classificados em uma escala de 5 pontos (0 = nada ou de modo algum; 1 = muito leve ou raramente, menos de um ou dois dias; 2 = leve ou vários dias; 3 = moderado ou mais da metade


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Instrumentos de Avaliação

TABELA 2 Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 do DSM-5 versão pais/ responsável para crianças de 6-17 anos; 12 domínios, limiares para investigação mais aprofundada e escalas associadas de Nível 2

Nome do Domínio domínio

Limiar para orientar uma investigação mais aprofundada

Escala Transversal de Sintomas de Nível 2 do DSM-5a

I.

Sintomas somáticos

Leve ou maior

Nível 2 – Sintomas Somáticos – Pai/Responsável pela Criança 6-17 Anos (Questionário sobre a Saúde do Paciente – Escala de Gravidade do Sintoma Somático 15 [PHQ-15])

II.

Distúrbio do sono

Leve ou maior

Nível 2 – Distúrbio do Sono – Pai/Responsável pela Criança 6-17 Anos (Distúrbio do Sono PROMIS – Forma Curta)

III.

Desatenção

Muito leve ou maior Nível 2 – Desatenção – Pai/Responsável pela Criança 6-17 Anos (Swanson, Nolan e Pelham, Versão IV [SNAP-IV])

IV.

Depressão

Leve ou maior

Nível 2 – Depressão – Pais/Responsável pela Criança 6-17 Anos (Sofrimento Emocional PROMIS – Depressão – Banco de Itens dos Pais)

V.

Raiva

Leve ou maior

Nível 2 – Raiva – Pais/Responsável pela Criança (Escala Calibrada de Raiva PROMIS – Pais)

VI.

Irritabilidade

Leve ou maior

Nível 2 – Irritabilidade – Pais/Responsável pela Criança (Índice de Reatividade Afetiva [ARI])

VII.

Mania

Leve ou maior

Nível 2 – Mania – Pais/Responsável pela Criança 6-17 Anos (Escala Autoaplicável de Mania de Altman [ASRM])

VIII.

Ansiedade

Leve ou maior

Nível 2 – Ansiedade – Pais/Responsável pela Criança 6-17 Anos (PROMIS Sofrimento Emocional – Ansiedade – Banco de Itens dos Pais)

IX.

Psicose

Muito leve ou maior Nenhuma

X.

Pensamentos e Leve ou maior comportamentos repetitivos

Nenhuma

XI.

Uso de substância

Nível 2 – Uso de Substância – Pais/Responsável pela Criança (adaptado do NIDA – ASSIST modificado) ASSIST modificado pelo NIDA (adaptado) – Classificado pela Criança (11-17 anos)

Sim Não sei

XII.

Ideação suicida/ tentativas de suicídio

Sim Não sei

Nenhuma Nenhuma

Nota. NIDA = National Institute on Drug Abuse. a Disponível, em inglês, em www.psychiatry.org/dsm5.

dos dias; e 4 = grave ou quase todos os dias). Os itens de ideação suicida, tentativa de suicídio e uso de substância são classificados em uma escala de “Sim, Não ou Não sei”. A classificação em cada item dentro de um domínio deve ser examinada. No entanto, com exceção de desatenção e psicose, uma classificação como leve (i.e., 2) ou maior em qualquer item dentro de um domínio


Instrumentos de Avaliação 737 que é classificado na escala de 5 pontos pode servir como guia para investigação adicional e acompanhamento para determinar se é necessária uma avaliação mais detalhada, o que pode incluir a avaliação transversal de sintomas de Nível 2 para o domínio (ver a Tabela 2). Para desatenção ou psicose, uma classificação como muito leve ou maior (i.e., 1 ou mais) pode ser usada como um indicador para investigação adicional. Uma classificação de um pai ou responsável como “Não sei” em ideação suicida, tentativa de suicídio e algum dos itens sobre uso de substância, especialmente para crianças de 11 a 17 anos, pode resultar em uma sondagem adicional das questões com a criança, incluindo o uso da Escala Transversal de Sintomas de Nível 2 classificada pela criança para o domínio relevante. Como a investigação adicional é feita com base na maior pontuação em algum item dentro de um domínio, os clínicos devem indicar essa pontuação na coluna “Maior pontuação no domínio”. A Tabela 2 descreve os limiares das pontuações que podem orientar uma investigação mais aprofundada dos domínios restantes.

Escalas Transversais de Sintomas de Nível 2 Todos os limiares de pontuação na Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 (conforme observado nas Tabelas 1 e 2 e descrito em “Pontuação e Interpretação”) indicam uma possível necessidade de investigação clínica mais detalhada. As Escalas Transversais de Sintomas de Nível 2 fornecem um método de obtenção de informações em maior profundidade sobre sintomas potencialmente significativos para informar o diagnóstico, o plano de tratamento e o acompanhamento. Elas estão disponíveis, em inglês, em www.psychiatry.org/dsm5. As Tabelas 1 e 2 descrevem cada domínio do Nível 1 e identificam os domínios para os quais as Escalas Transversais de Sintomas de Nível 2 do DSM-5 estão disponíveis para avaliações mais detalhadas. As versões adulto e pediátrica (pais e filhos) estão disponíveis, em inglês, on-line para a maioria dos domínios dos sintomas de Nível 1 em www.psychiatry.org/dsm5.

Frequência de Uso das Escalas Transversais de Sintomas Para acompanhar a apresentação do sintoma do indivíduo ao longo do tempo, as escalas transversais de sintomas de Nível 1 e Nível 2 relevantes podem ser preenchidas em intervalos regulares quando indicado clinicamente, dependendo da estabilidade dos sintomas e do status do tratamento. Para indivíduos com capacidade comprometida e para crianças de 6 a 17 anos, é preferível que as escalas sejam preenchidas nas consultas de acompanhamento pelo mesmo informante e pelo mesmo pai ou responsável. Pontuações consistentemente altas em um domínio particular podem indicar sintomas significativos e problemáticos para o indivíduo que podem justificar avaliação, tratamento e acompanhamento mais aprofundados. O julgamento clínico deve guiar a tomada de decisão.


Idade: _________

Sexo: [ ] Masculino [ ] Feminino

Data: __________

VI.

V.

11. Pensamentos de ferir a si mesmo?

0

0

10. Sentimento de que suas doenças não estão sendo levadas suficientemente a sério?

0

8. Evitou situações que o deixam ansioso? 0

0

7. Sentiu pânico ou se sentiu amedrontado?

9. Dores e sofrimentos sem explicação (p. ex., cabeça, costas, articulações, abdome, pernas)?

0

6. Sentiu-se nervoso, ansioso, assustado, preocupado ou tenso?

0

5. Iniciou muito mais projetos do que o usual ou fez coisas mais arriscadas do que o habitual?

IV.

0

4. Dormiu menos do que o usual, mas ainda tem muita energia?

III.

0

2. Sentiu-se desanimado, deprimido ou sem esperança?

3. Sentiu-se mais irritado, mal-humorado ou zangado do que o usual?

0 0

1. Pouco interesse ou prazer em fazer as coisas?

1

1

1

1

1

1

1

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1

1

1

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2

2

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4

4

4

Muito leve Maior Nada Raramente, Leve Moderado Grave Pontuação De modo menos de um Vários Mais da metade Quase todos no Domínio algum ou dois dias dias dos dias os dias (clínico)

II.

I.

Durante as últimas DUAS (2) SEMANAS, o quanto (ou com que frequência) você foi perturbado pelos seguintes problemas?

Instruções: As questões abaixo perguntam sobre coisas que podem tê-lo perturbado. Para cada pergunta, circule o número que melhor descreve o quanto (ou com que frequência) você foi perturbado pelos problemas descritos a seguir durante as DUAS (2) ÚLTIMAS SEMANAS.

Em uma semana típica, aproximadamente quanto tempo você passa com o indivíduo? ________________________________ horas/semana

Se a escala está sendo preenchida por um informante, qual é a sua relação com o indivíduo? _________________________________________

Nome: _____________________________________________________________

Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 Autoaplicável do DSM-5 – Adulto

738 Instrumentos de Avaliação


0 0

16. Pensamentos, impulsos ou imagens desagradáveis que entram repetidamente na sua cabeça?

17. Sentiu-se compelido a realizar certos comportamentos ou atos mentais repetidamente?

X.

0 0 0

21. Bebeu no mínimo 4 drinques de qualquer tipo de bebida alcoólica em um único dia?

22. Fumou cigarros, charuto ou cachimbo ou usou rapé ou tabaco de mascar?

23. Usou algum dos seguintes medicamentos POR CONTA PRÓPRIA, isto é, sem prescrição médica, em quantidades maiores ou por mais tempo do que o prescrito (p. ex., analgésicos [como paracetamol, codeína], estimulantes [como metilfenidato ou anfetaminas], sedativos ou tranquilizantes [como comprimidos para dormir ou diazepam] ou drogas, como maconha, cocaína ou crack, drogas sintéticas [como ecstasy], alucinógenos [como LSD], heroína, inalantes ou solventes [como cola] ou metanfetamina [ou outros estimulantes])?

0

20. Não se sentiu próximo a outras pessoas ou desfrutou das suas relações com elas?

XIII.

0

19. Sem saber quem você realmente é ou o que você quer da vida?

XII.

0

18. Sentiu-se desligado ou distante de si mesmo, do seu corpo, do ambiente físico ao seu redor ou de suas lembranças?

XI.

0

15. Problemas com a memória (p. ex., aprender informações novas) ou com localização (p. ex., encontrar o caminho para casa)?

IX.

0

0

13. Sentiu que alguém podia ouvir seus pensamentos ou que você podia ouvir o que outra pessoa estava pensando?

14. Problemas com o sono que afetaram a qualidade do seu sono em geral?

0

12. Ouviu coisas que outras pessoas não ouviam, como vozes, mesmo quando não havia ninguém por perto?

VIII.

VII.

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

2

2

2

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2

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3

3

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

Instrumentos de Avaliação 739


Sexo: [ ] Masculino [ ] Feminino

Data: __________

0

6. Pareceu triste ou deprimido(a) por várias horas?

VIII.

VII.

V. e VI.

0

5. Divertiu-se menos fazendo as coisas do que quando costumava fazer?

IV.

0 0 0

11. Disse que se sentia nervoso(a), ansioso(a) ou assustado(a)?

13. Disse que não conseguia fazer as coisas que queria ou deveria ter feito porque elas o(a) faziam se sentir nervoso(a)?

0

10. Dormiu menos do que o habitual, e mesmo assim ainda permaneceu com muita energia?

12. Não conseguiu parar de se preocupar?

0

0

8. Pareceu zangado(a) ou perdeu a paciência?

9. Iniciou muito mais projetos do que o usual ou fez coisas mais arriscadas do que o habitual?

0

7. Pareceu mais irritado(a) ou perturbado(a) mais facilmente do que o usual?

0

4. Teve problemas em prestar atenção quando estava em aula ou fazendo a lição de casa, lendo um livro ou jogando?

III.

0

0

2. Disse que estava preocupado(a) com sua saúde ou quanto a ficar doente?

3. Teve problemas para dormir – isto é, problema para adormecer, permanecer dormindo ou acordar muito cedo?

0

1. Queixou-se de dores de estômago, dores de cabeça ou outras dores?

II.

I.

Durante as últimas DUAS (2) SEMANAS, o quanto (ou com que frequência) o seu filho...

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

1

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

2

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3

3

3

3

3

3

3

3

3

3

3

3

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

4

Muito leve Moderado Grave Maior Nada Raramente, Leve Mais da Quase Pontuação De modo menos de um Vários metade dos todos os no Domínio algum ou dois dias dias dias dias (clínico)

Instruções (para os pais ou responsável pela criança): As questões abaixo perguntam sobre coisas que podem ter perturbado o seu filho. Para cada pergunta, circule o número que melhor descreve o quanto (ou com que frequência) seu filho foi perturbado pelos problemas descritos a seguir durante as DUAS (2) ÚLTIMAS SEMANAS.

Relação com a Criança: _________________________________________________

Nome da Criança:_______________________________________________________ Idade: _________

Escala Transversal de Sintomas de Nível 1 do DSM-5 – Crianças de 6-17 Anos Pontuada pelos Pais ou Responsável

740 Instrumentos de Avaliação


XII.

XI.

X.

IX.

0

0 0

17. Disse que sentia necessidade de verificar certas coisas repetidamente, como, por exemplo, se a porta estava trancada ou se o fogão estava desligado?

18. Pareceu se preocupar muito sobre as coisas que ele/ela tocava estarem sujas ou terem germes ou estarem envenenadas?

19. Disse que tinha que fazer as coisas de uma determinada maneira, como contar ou dizer coisas especiais em voz alta, para evitar que algo ruim acontecesse? Não Não Não

Não

Não Não

Sim Sim Sim

Sim

Sim Sim

20. Bebeu alguma bebida alcoólica (cerveja, vinho, licor, etc.)?

22. Usou drogas como maconha, cocaína ou crack, drogas sintéticas (como ecstasy), alucinógenos (como LSD), heroína, inalantes ou solventes (como cola) ou metanfetamina (ou outros estimulantes)?

23. Usou algum medicamento sem prescrição médica (p. ex., analgésicos [como paracetamol, codeína], estimulantes [como metilfenidato ou outras anfetaminas], sedativos ou tranquilizantes [como comprimidos para dormir ou diazepam] ou esteroides)?

24. Nas últimas DUAS (2) SEMANAS, ele/ela falou em querer se matar ou em querer cometer suicídio?

25. ALGUMA VEZ ele/ela tentou se matar?

1

1

1

1

1

1

21. Fumou um cigarro, charuto ou cachimbo ou usou rapé ou tabaco de mascar?

Nas últimas DUAS (2) SEMANAS, seu filho...

0

0

15. Disse ter tido uma visão quando estava completamente acordado(a) – isto é, viu alguma coisa ou alguém que mais ninguém conseguia ver?

16. Disse que lhe vinham pensamentos à cabeça de que ele/ela faria algo ruim ou de que alguma coisa ruim iria acontecer a ele/ela ou a outra pessoa?

0

14. Disse que ouviu vozes – quando não havia ninguém por perto – falando sobre ele/ela ou lhe dizendo o que fazer ou lhe dizendo coisas ruins?

2

2

2

2

2

2

3

3

3

3

3

3

Não sei

Não sei

Não sei

Não sei

Não sei

Não sei

4

4

4

4

4

4

Instrumentos de Avaliação 741


742

Instrumentos de Avaliação

Gravidade das Dimensões de Sintomas de Psicose Avaliada pelo Clínico Conforme descrito no capítulo “Espectro da Esquizofrenia e Outros Transtornos Psicóticos”, os transtornos psicóticos são heterogêneos, e a gravidade dos sintomas pode predizer aspectos importantes da doença, como os graus dos déficits cognitivos e/ou neurobiológicos. As avaliações dimensionais capturam variações significativas na gravidade dos sintomas, o que pode auxiliar no plano de tratamento, na tomada de decisão quanto ao prognóstico e na pesquisa dos mecanismos fisiopatológicos. A Gravidade das Dimensões de Sintomas de Psicose Avaliada pelo Clínico é constituída de escalas para a avaliação dimensional dos sintomas primários de psicose, incluindo alucinações, delírios, discurso desorganizado, comportamento psicomotor anormal e sintomas negativos. Também está inclusa uma escala para a avaliação dimensional do prejuízo cognitivo. Muitos indivíduos com transtorno psicótico têm prejuízos em uma variedade de domínios cognitivos, os quais predizem habilidades funcionais. Além disso, são fornecidas escalas para avaliação dimensional de depressão e mania, o que pode alertar os clínicos para patologia do humor. A gravidade dos sintomas de humor na psicose tem valor prognóstico e orienta o tratamento. A Gravidade das Dimensões de Sintomas de Psicose Avaliada pelo Clínico é uma escala com oito itens que pode ser preenchida pelo clínico no momento da avaliação clínica. Cada item solicita que o clínico classifique a gravidade de cada sintoma conforme vivenciada pelo indivíduo durante os últimos sete dias.

Pontuação e Interpretação Cada item é pontuado em uma escala de 5 pontos (0 = não presente; 1 = incerto; 2 = presente, mas leve; 3 = presente e moderado; e 4 = presente e grave) com uma definição específica de cada nível de pontuação. O clínico pode examinar todas as informações disponíveis sobre o indivíduo e, com base no julgamento clínico, selecionar (circulando) o nível que descreve com mais precisão a gravidade da condição do paciente. O clínico, então, indica a pontuação para cada item na coluna “Pontuação”.

Frequência de Uso Para acompanhar as mudanças na gravidade dos sintomas do indivíduo ao longo do tempo, a escala pode ser preenchida em intervalos regulares conforme indicado clinicamente, dependendo da estabilidade dos sintomas e do status do tratamento. Escores consistentemente altos em um domínio particular podem indicar áreas significativas e problemáticas para o indivíduo que justificam avaliação, tratamento e acompanhamento mais aprofundados. O julgamento clínico deve orientar a tomada de decisão.


Idade: __________

Sexo: [ ] Masculino [ ] Feminino

Data: __________

Presente e moderado Presente e grave (comportamento (comportamento motor anormal ou motor anormal ou bizarro ou catatonia bizarro ou catatonia frequente) quase constante)

Incerto (gravidade ou Presente, mas leve duração não suficien(comportamento te para ser considemotor anormal ou rado comportamento bizarro ou catatonia psicomotor anormal) ocasional)

Não presente

V. Sintomas negativos (ex Não pressão emocional limitapresentes da ou avolição)

Diminuição indefini- Presentes, mas leve Presentes e mode Presentes e grave da na expressividade decréscimo na exrado decréscimo na decréscimo na exfacial, na prosódia, pressividade facial, expressividade facial, pressividade facial, nos gestos ou no na prosódia, nos na prosódia, nos na prosódia, nos comportamento que gestos ou no comporgestos ou no comporgestos ou no comporenvolva iniciativa tamento que envolva tamento que envolva tamento que envolva própria iniciativa própria iniciativa própria iniciativa própria

Presente e moderado Presente e grave (dis(discurso frequencurso quase impossítemente difícil de vel de acompanhar) acompanhar)

Incerto (gravidade ou Presente, mas leve duração não suficien(alguma dificuldade te para ser consideraem acompanhar o do desorganização) discurso)

III. Discurso desorganizado Não presente

IV. Comportamento psicomotor anormal

Presentes e modera- Presentes e graves dos (alguma pressão (pressão intensa para agir segundo as para agir segundo as crenças, ou é perturcrenças, ou é muito bado um pouco pelas perturbado pelas crenças) crenças)

Incertos (gravidade Presentes, mas leves ou duração não su(pouca pressão para ficiente para serem agir de acordo com considerados psicose) as crenças delirantes, não muito perturbado pelas crenças)

4

Não presentes

3

II. Delírios

2

Presentes e modera- Presentes e graves Incertas (gravidade Presentes, mas leves (pouca pressão para das (alguma pressão (pressão intensa para ou duração não suagir segundo as vozes, para responder às responder às vozes, ficiente para serem não muito perturbado vozes, ou é um pouco ou é muito perturbaconsideradas psicose) pelas vozes) perturbado pelas do pelas vozes) vozes)

1

Não presentes

0

I. Alucinações

Domínio

Pontuação

Instruções: Com base em todas as informações que você tem sobre o indivíduo e utilizando o seu julgamento clínico, classifique (com um sinal) a presença e a gravidade dos seguintes sintomas, conforme experimentados pelo indivíduo nos últimos sete (7) dias.

Nome: _____________________________________________________________

Gravidade das Dimensões de Sintomas de Psicose Avaliada pelo Clínico

Instrumentos de Avaliação 743


Nota. DP = desvio-padrão; NSE = nível socioeconômico.

Presente e moderada Presente e grave (períodos frequentes (diariamente humor de humor bastante bastante elevado, exelevado, expansivo pansivo ou irritável ou irritável ou inou inquietude) quietude)

Incerta (humor elevado ocasionalmente, expansivo ou irritável ou alguma inquietude)

Não presente

VIII. Mania

Presente, mas leve (períodos frequentes de humor um pouco elevado, expansivo ou irritável ou inquietude)

Presente, mas leve Presente e moderada Presente e grave (períodos frequentes (períodos frequentes (profundamente sentindo-se muito de profunda depresdeprimido ou sem triste, desanimado, são ou desesperança; esperança diariamenmoderadamente depreocupação com te; culpa delirante ou primido ou sem esculpa por ter feito autocensura irracioperança; apreensivo algo errado) nal desproporcional quanto a ter falhado às circunstâncias) com alguém ou com alguma coisa, com alguma preocupação)

Incerta (ocasionalmente se sente triste, desanimado, deprimido ou sem esperança; apreensivo quanto a ter falhado com alguém ou alguma coisa, mas não preocupado)

4

Não presente

3

VII. Depressão

2

Incerta (função cog- Presente, mas leve Presente e moderada Presente e grave nitiva não claramente (alguma redução na (clara redução na (grave redução na fora da variação esfunção cognitiva; função cognitiva; função cognitiva; perada para a idade abaixo do esperado abaixo do esperado abaixo do esperado ou o NSE; i.e., dentro para a idade e o NSE, para a idade e o NSE, para a idade e o NSE, de 0,5 DP da média) 0,5-1 DP da média) 1-2 DP da média) >2 DP da média)

1

Não presente

0

VI. Cognição prejudicada

Domínio

Pontuação

744 Instrumentos de Avaliação


Instrumentos de Avaliação 745

Escala de Avaliação de Incapacidade da Organização Mundial da Saúde 2.0 A versão para adultos autoaplicável da Escala de Avaliação de Incapacidade da Organização Mundial da Saúde 2.0 (WHODAS 2.0) é uma escala de 36 itens que avalia incapacidades em adultos a partir de 18 anos. Ela avalia incapacidade em seis domínios, incluindo compreensão e comunicação, mobilidade, cuidado pessoal, relação com as pessoas, atividades da vida diária (i.e., tarefas domésticas, trabalho e/ou atividades escolares) e participação na sociedade. Se o indivíduo adulto tem capacidade prejudicada e não é capaz de preencher o formulário (p. ex., um paciente com demência), um informante pode preencher a versão da escala administrada por procuração, que está disponível, em inglês, em www.psychiatry.org/dsm5. Cada item da versão autoaplicável da WHODAS solicita que o indivíduo classifique quanta dificuldade ele teve em áreas específicas de funcionamento durante os últimos 30 dias.

Instruções para Pontuação da WHODAS Fornecidas pela OMS Escore resumido da WHODAS. Existem duas opções básicas para computar os escores resumidos da versão completa de 36 itens da WHODAS. Simples: Os pontos atribuídos a cada um dos itens – “nenhuma” (1), “leve” (2), “moderada” (3), “grave” (4) e “extrema” (5) – são somados. Este método é referido como pontuação simples porque os pontos de cada um dos itens são simplesmente somados sem recodificação ou quebrando as categorias de resposta; assim, não existe atribuição de um peso para os itens individuais. Esta abordagem é prática de se usar como abordagem de pontuação manual e pode ser o método de escolha em contextos clínicos atarefados ou em situações de entrevista manuscrita. Em consequência, a simples soma dos pontos dos itens de todos os domínios é suficiente para descrever o grau das limitações funcionais. Complexo: O método mais complexo de pontuação é denominado pontuação baseada na “teoria de resposta ao item” (TRI). Ele leva em conta múltiplos níveis de dificuldade para cada item da WHODAS 2.0. Toma separadamente a codificação da resposta a cada item como “nenhuma”, “leve”, “moderada”, “grave” e “extrema” e então usa um computador para determinar um escore resumo, atribuindo um peso distinto para cada um dos itens e os níveis de gravidade. O programa de computador está disponível no website da OMS. A pontuação se dá em três passos: • Passo 1 – Soma dos escores dos itens recodificados dentro de cada domínio. • Passo 2 – Soma dos escores de todos os seis domínios. • Passo 3 – Conversão do escore resumo em uma variação métrica de 0 a 100 (em que 0 = sem incapacidade; 100 = incapacidade total). Escores dos domínios da WHODAS 2.0. A WHODAS 2.0 produz escores de domínios específicos para seis diferentes domínios de funcionamento: cognição, mobilidade, cuidado pessoal, relacionamento, atividades da vida diária (tarefas domésticas e trabalho/escola) e participação. Valores populacionais normais da WHODAS 2.0. Para os valores populacionais normais para a pontuação baseada na TRI da WHODAS 2.0 e para a distribuição dos valores da pontuação baseada na TRI para a WHODAS 2.0 na população, consulte www.who.int/classifications/ icf/Pop_norms_distrib_IRT_scores.pdf.

Escore Adicional e Orientação para Interpretação para Usuários do DSM-5 O clínico deve examinar a resposta do indivíduo em cada item da escala durante a entrevista clínica e indicar o escore autoaplicável para cada item na seção reservada para “Uso Exclusivo do Clínico”. No entanto, se o clínico determina que o escore em um item deve ser diferente com base


746

Instrumentos de Avaliação

na entrevista clínica e em outras informações disponíveis, ele pode indicar um escore corrigido no espaço para a pontuação do item bruto. Com base nos achados dos ensaios de campo (field trials) do DSM-5 em amostras de pacientes adultos em seis locais nos Estados Unidos e um no Canadá, o DSM-5 recomenda o cálculo e uso de escores médios para cada domínio e para incapacidade geral. Os escores médios são comparáveis à escala de 5 pontos da WHODAS, que permite que o clínico pense na incapacidade do indivíduo em termos de nenhuma (1), leve (2), moderada (3), grave (4) ou extrema (5). Os escores de domínio médio e incapacidade geral revelaram-se confiáveis, fáceis de usar e clinicamente úteis para os clínicos nos ensaios de campo (field trials) do DSM-5. O escore médio do domínio é calculado dividindo-se o escore bruto do domínio pelo seu número de itens (p. ex., se todos os itens dentro do domínio “compreensão e comunicação” são classificados como moderados, então o escore médio do domínio seria 18/6 = 3, indicando incapacidade moderada). O escore médio de incapacidade geral é calculado dividindo-se o escore geral bruto pelo número de itens na escala (i.e., 36). O indivíduo deve ser estimulado a preencher todos os itens da WHODAS 2.0. Se não é dada resposta em 10 ou mais itens da escala (i.e., mais de 25% do total de 36 itens), o cálculo dos escores simples e da média da incapacidade geral poderá não ser útil. Se estiverem faltando 10 ou mais do total dos itens da escala, mas os itens para algum dos domínios estiverem de 75 a 100% preenchidos, os escores simples ou médios do domínio podem ser usados para aquele domínio. Frequência de uso. Para acompanhar as mudanças no nível de incapacidade do indivíduo ao longo do tempo, a escala pode ser preenchida em intervalos regulares conforme clinicamente indicado, dependendo da estabilidade dos sintomas e do status do tratamento. Escores consistentemente altos em um domínio particular podem indicar áreas significativas e problemáticas para o indivíduo que podem justificar avaliação e intervenção mais aprofundadas.


Instrumentos de Avaliação 747 WHODAS 2.0 Escala de Avaliação de Incapacidade da Organização Mundial da Saúde 2.0 Versão de 36 itens, autoaplicável Nome do Paciente: __________________________

Idade: __________

Sexo: [ ] Masculino [ ] Feminino

Data: __________

Este questionário pergunta acerca de dificuldades devidas a condições de saúde/saúde mental. As condições de saúde incluem enfermidades ou doenças, outros problemas de saúde que podem ser de curta ou longa duração, lesões, problemas mentais ou emocionais e problemas com álcool e drogas. Relembre os últimos 30 dias e responda às perguntas pensando no grau de dificuldade que você teve para realizar as seguintes atividades. Para cada pergunta, circule apenas uma resposta.

2

3

4

5

D1.1 Concentrar-se ou fazer alguma coisa por dez minutos?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D1.2 Lembrar-se de fazer coisas importantes?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D1.3 Analisar e encontrar soluções para problemas na vida diária?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D1.4 Aprender uma tarefa nova, por exemplo, aprender a ir até um novo lugar?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D1.5 Entender em geral o que as pessoas dizem?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D1.6 Iniciar e manter uma conversa?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D2.1 Ficar de pé por longos períodos, como 30 minutos?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D2.2 Levantar-se depois de sentado?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D2.3 Movimentar-se dentro da sua casa?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D2.4 Sair da sua casa?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D2.5 Caminhar uma longa distância, como 1 quilômetro (ou equivalente)?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D3.1 Lavar todo o seu corpo?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D3.2 Vestir-se?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D3.3 Alimentar-se?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D3.4 Ficar sozinho por alguns dias?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D4.1 Lidar com pessoas que você não conhece?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D4.2 Manter uma amizade?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D4.3 Ter bom relacionamento com as pessoas que estão próximas a você?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D4.4 Fazer novos amigos?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D4.5 Atividades sexuais?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

Compreensão e comunicação

Escore Médio do Domínio

1

Nos últimos 30 dias, quanta dificuldade você teve em:

Escore Bruto do Domínio

Escores numéricos atribuídos a cada um dos itens:

Escore Bruto do Item

Uso Exclusivo do Clínico

30

5

25

5

20

5

25

5

Mobilidade

Cuidado pessoal

Relacionamento com as pessoas


748

Instrumentos de Avaliação

2

3

4

5

D5.1 Cuidar das suas responsabilidades nas tarefas domésticas?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D5.2 Fazer bem as tarefas domésticas mais importantes?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D5.3 Realizar todas as tarefas domésticas que você precisava fazer?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D5.4 Realizar suas tarefas domésticas com a rapidez necessária?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

Nos últimos 30 dias, quanta dificuldade você teve em: Atividades da vida diária – Tarefas domésticas

Escore Médio do Domínio

1

Escore Bruto do Domínio

Escores numéricos atribuídos a cada um dos itens:

Escore Bruto do Item

Uso Exclusivo do Clínico

20

5

20

5

40

5

180

5

Atividades da vida diária – Escola/trabalho Se você trabalha (remunerado, não remunerado, por conta própria) ou vai à escola, preencha as questões D5.5-D5.8 abaixo. Devido à sua condição de saúde, nos últimos 30 dias, quanta dificuldade você teve (em): D5.5 No seu trabalho/escola no dia a dia?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D5.6 Fazer bem suas tarefas mais importantes do trabalho/escola?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D5.7 Realizar todo o trabalho que você precisava fazer?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D5.8 Realizar seu trabalho com a rapidez necessária?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.1 O quanto foi um problema para você participar de atividades na comunidade (p. ex., festividades religiosas ou outras atividades) da mesma forma que qualquer outra pessoa?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.2 Quanto problema você teve devido a barreiras ou obstáculos?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.3 Quanto problema você teve em viver com dignidade devido às atitudes ou ações de outras pessoas?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.4 Quanto tempo você gastou com a sua condição de saúde ou suas consequências?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.5 O quanto você esteve emocionalmente afetado pela sua condição de saúde?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.6 O quanto sua saúde consumiu seus recursos financeiros ou os da sua família?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.7 Quanto problema sua família teve devido aos seus problemas de saúde?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

D6.8 Quanto problema você teve em fazer coisas sozinho para relaxamento ou prazer?

Nenhuma

Leve

Moderada

Grave

Extrema ou não consegui fazer

Participação na sociedade Nos últimos 30 dias:

Escore de Incapacidade Geral (Total):

© Organização Mundial da Saúde, 2012. Todos os direitos reservados. Medindo a saúde e a incapacidade: manual para a Escala de Avaliação de Incapacidade da OMS (WHODAS 2.0), Organização Mundial da Saúde, Genebra. A Organização Mundial da Saúde concedeu ao Editor a permissão para reprodução deste instrumento. Este material pode ser reproduzido sem permissão pelos clínicos para uso com seus pacientes. Qualquer outro uso, incluindo o uso eletrônico, requer permissão por escrito da OMS.


Formulação Cultural A compreensão do contexto cultural da vivência da doença é essencial para a avaliação diagnóstica e o manejo clínico efetivo. Cultura refere-se a sistemas de conhecimento, conceitos, regras e práticas que são aprendidos e transmitidos de geração a geração. Cultura inclui linguagem, religião e espiritualidade, estruturas familiares, estágios do ciclo da vida, rituais cerimoniais e costumes, bem como os sistemas morais e legais. Culturas são sistemas abertos e dinâmicos que passam por mudanças contínuas ao longo do tempo; no mundo contemporâneo, a maioria dos indivíduos e grupos está exposta a múltiplas culturas, as quais são usadas por eles para moldar suas próprias identidades e dar um sentido àquilo que é vivido. Essas características da cultura tornam essencial não supergeneralizar a informação cultural ou estereótipos de grupos em termos de traços culturais fixos. Raça é uma categoria de identidade culturalmente construída que divide a humanidade em grupos com base em diversos traços físicos superficiais atribuídos a algumas características biológicas intrínsecas hipotéticas. As categorias e os construtos raciais variaram amplamente ao longo da história e entre as sociedades. O construto de raça não apresenta definição biológica consistente, mas é socialmente importante porque dá respaldo às ideologias raciais, ao racismo, à discriminação e à exclusão social, os quais podem ter fortes efeitos negativos sobre a saúde mental. Existem evidências de que o racismo pode exacerbar muitos transtornos psiquiátricos, contribuindo para maus resultados, e que o preconceito racial pode afetar a avaliação diagnóstica. Etnia é uma identidade de grupo culturalmente construída usada para definir pessoas e comunidades. Pode estar enraizada em uma história, uma geografia, uma linguagem ou uma religião em comum ou, ainda, em outras características compartilhadas por um grupo, o que distingue esse grupo dos demais. A etnia pode ser autoatribuída ou atribuída por pessoas externas. A crescente mobilidade, miscigenação e mistura de culturas definiu novas identidades étnicas mistas, múltiplas ou híbridas. Cultura, raça e etnia estão relacionadas a desigualdades econômicas, racismo e discriminação, que resultam em disparidades de saúde. Identidades cultural, étnica e racial podem ser fontes de força e apoio grupal que melhoram a resiliência, mas também podem levar a conflitos psicológicos, interpessoais e intergeracionais ou a dificuldades na adaptação que requerem avaliação diagnóstica.

Esboço de Formulação Cultural O Esboço de Formulação Cultural apresentado no DSM-IV forneceu um quadro de referência para avaliar as informações sobre as características culturais de um problema de saúde mental de um indivíduo e como elas se relacionam com um contexto e uma história social e cultural. O DSM-5 não somente inclui uma versão atualizada do Esboço como também apresenta uma abordagem para avaliação, usando a Entrevista de Formulação Cultural (EFC), a qual foi submetida a testes de campo quanto à sua utilidade diagnóstica entre os clínicos e quanto à sua aceitação entre os pacientes. O Esboço de Formulação Cultural requer a avaliação sistemática das seguintes categorias: • Identidade cultural do indivíduo: Descreve os grupos de referência racial, étnica ou cultural do indivíduo que podem influenciar suas relações com os outros, seu acesso a recursos e


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Formulação Cultural seus desafios, conflitos ou situações ao longo do desenvolvimento e atuais. Para imigrantes e minorias raciais ou étnicas, deve-se observar em separado o grau e os tipos de envolvimento tanto com a cultura de origem quanto com a cultura na qual o indivíduo está inserido ou a cultura da maioria. Habilidades, preferências e padrões de uso da linguagem são relevantes para identificar dificuldades no acesso a atendimento, integração social e a necessidade de um intérprete. Outros aspectos clinicamente relevantes da identidade podem incluir afiliação religiosa, origem socioeconômica, local de nascimento e crescimento do indivíduo e da família, status de migrante e orientação sexual. Conceituações culturais de sofrimento: Descreve os construtos culturais que influenciam como o indivíduo vivencia, compreende e comunica seus sintomas ou problemas aos outros. Esses construtos podem incluir síndromes culturais, formas de expressar sofrimento e modelos explanatórios ou causas percebidas. O nível de gravidade e o significado das experiências de sofrimento devem ser avaliados em relação às normas dos grupos de referência cultural do indivíduo. A avaliação dos padrões de enfrentamento e de busca de ajuda deve considerar o uso de atendimento profissional, bem como fontes tradicionais, alternativas ou complementares de atendimento. Estressores psicossociais e características culturais de vulnerabilidade e resiliência: Identifica os principais estressores e apoios no ambiente social do indivíduo (os quais podem incluir tanto acontecimentos locais quanto distantes) e o papel da religião, da família e de outras redes sociais (p. ex., amigos, vizinhos, colegas de trabalho) na oferta de apoio emocional, instrumental e informacional. Os estressores sociais e os apoios sociais variam de acordo com as interpretações culturais dos acontecimentos, a estrutura familiar, as tarefas desenvolvimentais e o contexto social. Os níveis de funcionamento, a incapacidade e a resiliência devem ser avaliados à luz dos grupos de referência cultural do indivíduo. Aspectos culturais do relacionamento entre o indivíduo e o clínico: Identifica diferenças na situação cultural, de linguagem e social entre um indivíduo e um clínico que podem causar dificuldades na comunicação e influenciar o diagnóstico e o tratamento. Vivências de racismo e discriminação na sociedade podem impedir o estabelecimento de confiança e segurança no encontro diagnóstico clínico. Os efeitos podem incluir problemas no levantamento dos sintomas, entendimento errado do significado cultural e clínico de sintomas e comportamentos e dificuldade no estabelecimento ou na manutenção do vínculo necessário para uma aliança clínica efetiva. Avaliação cultural geral: Resume as implicações dos componentes da formulação cultural identificados em seções anteriores do Esboço para o diagnóstico e outras questões ou problemas clinicamente relevantes, bem como para o manejo apropriado e para a intervenção terapêutica.

Entrevista de Formulação Cultural (EFC) A Entrevista de Formulação Cultural (EFC) é um conjunto de 16 perguntas que os clínicos podem usar para obter informações durante uma avaliação de saúde mental sobre o impacto da cultura nos aspectos principais da apresentação clínica e do atendimento de um indivíduo. Na EFC, cultura refere-se a: • Valores, orientações, conhecimentos e práticas que os indivíduos obtêm da afiliação a grupos sociais diversos (p. ex., grupos étnicos, comunidades religiosas, grupos profissionais, grupos de veteranos de guerra). • Aspectos dos antecedentes do indivíduo, experiências desenvolvimentais e contextos sociais atuais que podem afetar sua perspectiva, tais como origem geográfica, migração, língua, religião, orientação sexual ou raça/etnia. • Influência da família, amigos e outros membros da comunidade (a rede social do indivíduo) na experiência de doença do indivíduo.


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A EFC é uma entrevista semiestruturada breve para avaliação sistemática dos fatores culturais no encontro clínico que pode ser usada com qualquer indivíduo. A EFC foca a vivência do indivíduo e os contextos sociais do problema clínico; segue uma abordagem de avaliação cultural centrada na pessoa ao buscar informações do indivíduo acerca das suas próprias visões e das visões dos outros em sua rede social. Essa abordagem é concebida para evitar os estereótipos, na medida em que o conhecimento cultural de cada indivíduo afeta como ele interpreta a experiência da doença e orienta como deve buscar ajuda. Como a EFC se preocupa com as visões pessoais do indivíduo, não existem respostas certas ou erradas às perguntas. Apresentamos a entrevista a seguir, e ela está disponível (em inglês) em www.psychiatry.org/dsm5. A EFC é formatada como duas colunas de texto. A coluna da esquerda contém as instruções para sua aplicação e descreve os objetivos de cada domínio da entrevista. As perguntas na coluna da direita ilustram como explorar esses domínios, mas elas não têm a intenção de ser exaustivas. Perguntas adicionais podem ser necessárias para esclarecer as respostas com o indivíduo. As perguntas podem ser reformuladas quando necessário. A EFC pretende servir como um guia para a avaliação cultural e deve ser usada com flexibilidade para manter um fluxo natural na entrevista e o vínculo com o indivíduo. A EFC é mais bem usada em conjunto com informações demográficas obtidas antes da entrevista para adequar suas perguntas à abordagem da origem e situação atual do indivíduo. Domínios demográficos específicos a serem explorados com a EFC irão variar entre os indivíduos e contextos. Uma avaliação abrangente pode incluir local de nascimento, idade, gênero, origem racial/étnica, estado civil, composição familiar, educação, fluência na língua, orientação sexual, afiliação religiosa ou espiritual, profissão, emprego, renda e história de migração. A EFC pode ser usada na avaliação inicial de indivíduos em todos os contextos clínicos, independentemente da origem cultural do indivíduo ou do clínico. Indivíduos e clínicos que aparentemente compartilham a mesma origem cultural podem, no entanto, diferir em aspectos que são relevantes para os cuidados. A EFC pode ser usada de forma integral, ou, ainda, alguns componentes podem ser incorporados à avaliação clínica quando necessário. A EFC pode ser especialmente útil quando existe: • Dificuldade na avaliação diagnóstica devido a diferenças significativas na origem cultural, religiosa ou socioeconômica do clínico e do indivíduo. • Incerteza quanto à adequação entre sintomas culturalmente peculiares e critérios diagnósticos. • Dificuldade em julgar a gravidade ou o prejuízo da doença. • Discordância entre o indivíduo e o clínico quanto ao curso do atendimento. • Adesão e comprometimento limitados do indivíduo ao tratamento. A EFC enfatiza quatro domínios de avaliação: Definição Cultural do Problema (perguntas 1-3); Percepções Culturais de Causa, Contexto e Apoio (perguntas 4-10); Fatores Culturais que Afetam o Autoenfrentamento e a Busca de Ajuda no Passado (perguntas 11-13); e Fatores Culturais que Afetam a Busca de Ajuda Atual (perguntas 14-16). Tanto o processo de condução da EFC centrado na pessoa quanto as informações que obtém têm o objetivo de melhorar a validade cultural da avaliação diagnóstica, facilitar o planejamento do tratamento e promover a adesão e a satisfação do indivíduo. Para atingir esses objetivos, as informações obtidas com a EFC devem ser integradas com todos os demais materiais clínicos disponíveis em uma avaliação clínica abrangente e contextual. Uma versão do Informante da EFC pode ser usada para coletar informações colaterais sobre os domínios da entrevista com membros da família ou cuidadores. Foram desenvolvidos módulos suplementares que expandem cada domínio da EFC e orientam os clínicos que desejam explorar esses domínios com mais profundidade. Módulos suplementares também foram desenvolvidos para populações específicas, como crianças e adolescentes, idosos, imigrantes e refugiados. Esses módulos suplementares são mencionados na EFC abaixo dos subtítulos pertinentes e estão disponíveis (em inglês) em www.psychiatry.org/dsm5.


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Formulação Cultural

Entrevista de Formulação Cultural (EFC) Os módulos suplementares usados para expandir cada subtópico da EFC estão entre parênteses. AS INSTRUÇÕES PARA O ENTREVISTADOR ESTÃO EM ITÁLICO.

ORIENTAÇÃO PARA O ENTREVISTADOR

As perguntas seguintes objetivam esclarecer aspectos cen- INTRODUÇÃO PARA O INDIVÍDUO: trais do problema clínico apresentado segundo o ponto Eu gostaria de compreender os problemas que trouxede vista do indivíduo e de outros membros de sua rede ram você aqui para que eu possa ajudá-lo mais efetisocial (i.e., família, amigos ou outras pessoas envolvamente. Quero saber sobre suas vivências e ideias. vidas no problema atual). Isso inclui o significado do Vou fazer algumas perguntas sobre o que está aconproblema, fontes potenciais de ajuda e expectativas de tecendo e como você está lidando com isso. Por favor, serviços. lembre-se de que não há respostas certas ou erradas. DEFINIÇÃO CULTURAL DO PROBLEMA

DEFINIÇÃO CULTURAL DO PROBLEMA (Modelo Explicativo, Nível de Funcionamento) Obtenha a visão do indivíduo sobre os problemas centrais e as preocupações principais. Foque na maneira própria do indivíduo de entender o problema. Use o termo, expressão ou breve descrição obtida na pergunta 1 para identificar o problema nas perguntas posteriores (p. ex., “seu conflito com seu filho”). Pergunte como o indivíduo expõe o problema para membros da rede social.

Foque nos aspectos do problema que mais importam para o indivíduo.

1. O que traz você aqui hoje? SE O INDIVÍDUO DÁ POUCOS DETALHES OU APENAS MENCIONA OS SINTOMAS OU UM DIAGNÓSTICO MÉDICO, INVESTIGUE: As pessoas frequentemente entendem seus problemas da sua própria maneira, que pode ser semelhante ou diferente de como os médicos os descrevem. Como você descreveria o seu problema? 2. Às vezes, as pessoas têm formas diferentes de descrever seu problema para sua família, amigos ou outras pessoas na sua comunidade. Como você descreveria o seu problema para eles? 3. O que mais o incomoda em relação ao seu problema?

PERCEPÇÕES CULTURAIS DE CAUSA, CONTEXTO E APOIO

CAUSAS (Modelo Explicativo, Rede Social, Adultos Mais Velhos) Esta pergunta indica o significado da condição para o indivíduo, que pode ser relevante para o atendimento clínico. Observe que os indivíduos podem identificar múltiplas causas, dependendo do aspecto do problema que eles estão considerando.

4. Por que você acha que isso está acontecendo com você? O que você acha que são as causas do seu [PROBLEMA]? INVESTIGUE MAIS, SE NECESSÁRIO: Algumas pessoas podem explicar os seus problemas como resultado de coisas ruins que acontecem na sua vida, problemas com os outros, uma doença física, uma razão espiritual ou muitas outras causas.

Foque nas visões dos membros da rede social do indivíduo. Elas podem ser diferentes e variar em relação à visão do indivíduo.

5. O que outras pessoas na sua família, seus amigos ou outras pessoas na sua comunidade acham que está causando o seu [PROBLEMA]?


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Entrevista de Formulação Cultural (EFC)

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(Continuação)

Os módulos suplementares usados para expandir cada subtópico da EFC estão entre parênteses. ORIENTAÇÃO PARA O ENTREVISTADOR

AS INSTRUÇÕES PARA O ENTREVISTADOR ESTÃO EM ITÁLICO.

ESTRESSORES E APOIOS (Rede Social, Cuidadores, Estressores Psicossociais, Religião e Espiritualidade, Imigrantes e Refugiados, Identidade Cultural, Adultos Mais Velhos, Capacidade de Lidar com Situações Difíceis (Coping) e Busca de Ajuda) Obtenha informações sobre o contexto de vida do indivíduo, focando nos recursos, apoios sociais e resiliência. Também podem ser investigados outros apoios (p. ex., de colegas de trabalho, da participação na religião ou espiritualidade).

6. Existe algum tipo de apoio que melhora o seu [PROBLEMA], como o apoio da família, amigos ou outros?

Foque nos aspectos estressantes do ambiente do indivíduo. Também podem ser investigados, p. ex., problemas de relacionamento, dificuldades no trabalho ou na escola ou discriminação.

7. Existe algum tipo de estresse que piora o seu [PROBLEMA], como dificuldades financeiras ou problemas familiares?

PAPEL DA IDENTIDADE CULTURAL (Identidade Cultural, Estressores Psicossociais, Religião e Espiritualidade, Imigrantes e Refugiados, Adultos Mais Velhos, Crianças e Adolescentes) Às vezes, aspectos da origem ou da identidade das pessoas podem melhorar ou piorar seu [PROBLEMA]. Por origem ou identidade, eu quero dizer, por exemplo, as comunidades às quais você pertence, as línguas que você fala, de onde você ou sua família são, seu gênero ou orientação sexual ou sua fé ou religião. Peça ao indivíduo que reflita sobre os elementos mais marcantes de sua identidade cultural. Use essas informações para adequar as perguntas 9-10, quando necessário.

8. Para você, quais são os aspectos mais importantes da sua origem ou identidade?

Investigue aspectos da identidade que melhoram ou pioram o problema. Investigue quando necessário (p. ex., piora clínica em consequência de discriminação devido à condição de migração, raça/etnia ou orientação sexual).

9. Existem aspectos da sua origem ou identidade que fazem diferença para o seu [PROBLEMA]?

Investigue quando necessário (p. ex., problemas relacionados a migração; conflito entre gerações ou devido a papéis de gênero).

10. Existem aspectos da sua origem ou identidade que estão causando outras preocupações ou dificuldades para você?

FATORES CULTURAIS QUE AFETAM A CAPACIDADE DE LIDAR COM SITUAÇÕES DIFÍCEIS (SELF-COPING) E A BUSCA DE AJUDA NO PASSADO CAPACIDADE DE LIDAR COM SITUAÇÕES DIFÍCEIS (SELF-COPING)

(Capacidade de Lidar com Situações Difíceis (Self-coping) e Busca de Ajuda, Religião e Espiritualidade, Adultos Mais Velhos, Cuidadores, Estressores Psicossociais) Esclareça o capacidade de lidar com situações difíceis (self-coping) do problema.

11. Às vezes, as pessoas têm formas variadas de lidar com problemas como [PROBLEMA]. O que você fez por sua conta para enfrentar o seu [PROBLEMA]?

BUSCA DE AJUDA NO PASSADO


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Formulação Cultural

Entrevista de Formulação Cultural (EFC)

(Continuação)

Os módulos suplementares usados para expandir cada subtópico da EFC estão entre parênteses. AS INSTRUÇÕES PARA O ENTREVISTADOR ESTÃO EM ITÁLICO.

ORIENTAÇÃO PARA O ENTREVISTADOR

(Capacidade de Lidar com Situações Difíceis (Coping) e Busca de Ajuda, Religião e Espiritualidade, Adultos Mais Velhos, Cuidadores, Estressores Psicossociais, Imigrantes e Refugiados, Rede Social, Relacionamento Clínico-Paciente) Investigue fontes variadas de ajuda (p. ex., atendimento médico, tratamento de saúde mental, grupos de apoio, aconselhamento no trabalho, curandeirismo, aconselhamento religioso ou espiritual, outras formas de cura tradicional ou alternativa). Investigue quando necessário (p. ex., “Que outras fontes de ajuda você usou?”). Esclareça a vivência e apreciação do indivíduo em relação à ajuda anterior.

12. Frequentemente, as pessoas procuram ajuda em muitas fontes distintas, incluindo diferentes tipos de médicos, pessoas que ajudam ou curandeiros. No passado, que tipos de tratamento, ajuda, aconselhamento ou meio de cura você procurou para o seu [PROBLEMA]? INVESTIGUE CASO ELE NÃO DESCREVA A UTILIDADE DA AJUDA RECEBIDA: Que tipos de ajuda ou tratamento foram mais úteis? E não úteis?

BARREIRAS (Capacidade de Lidar com Situações Difíceis (Coping) e Busca de Ajuda, Religião e Espiritualidade, Adultos Mais Velhos, Estressores Psicossociais, Imigrantes e Refugiados, Rede Social, Relacionamento ClínicoPaciente) Esclareça o papel das barreiras sociais à busca de ajuda e ao acesso a atendimento e problemas de adesão em tratamento anterior. Investigue detalhes quando necessário (p. ex., “O que atrapalhou?”).

13. Alguma coisa o impediu de obter a ajuda de que você precisava? INVESTIGUE QUANDO NECESSÁRIO: Por exemplo, dinheiro, compromissos profissionais ou familiares, estigma ou discriminação ou ausência de serviços que entendam sua língua ou origem?

FATORES CULTURAIS QUE AFETAM A BUSCA DE AJUDA ATUAL

PREFERÊNCIAS (Rede Social, Cuidadores, Religião e Espiritualidade, Adultos Mais Velhos, Capacidade de Lidar com Situações Difíceis (Coping) e Busca de Ajuda) Esclareça as necessidades detectadas e as expectativas atuais de ajuda do indivíduo. Investigue se o indivíduo lista apenas uma fonte de ajuda (p. ex., “Que outros tipos de ajuda seriam úteis para você neste momento?”). Foque nas visões da rede social em relação à busca de ajuda.

Agora, vamos falar mais um pouco sobre a ajuda de que você precisa. 14. Que tipos de ajuda você acha que seriam mais úteis para você neste momento para o seu [PROBLEMA]? 15. Existem outros tipos de ajuda que sua família, amigos ou outras pessoas sugeriram que seriam úteis para você agora?

RELACIONAMENTO CLÍNICO-PACIENTE (Relacionamento Clínico-Paciente, Adultos Mais Velhos) Investigue possíveis preocupações a respeito do clínico ou do relacionamento clínico-paciente, incluindo a percepção de racismo, barreiras de língua ou diferenças culturais que possam minar a boa vontade, a comunicação ou a prestação do atendimento. Investigue detalhes quando necessário (p. ex., “De que maneira?”). Aborde as possíveis barreiras ao atendimento ou as preocupações sobre o clínico e o relacionamento clínico-paciente levantadas anteriormente.

Às vezes, médicos e pacientes entendem-se mal porque provêm de origens diferentes ou têm expectativas diferentes. 16. Você se preocupou com isso e existe alguma coisa que possamos fazer para lhe prestar o atendimento de que você precisa?


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Entrevista de Formulação Cultural (EFC) – Versão do Informante A EFC – Versão do Informante coleta informações colaterais de um informante que é conhecedor dos problemas clínicos e das circunstâncias de vida do indivíduo identificado. Essa versão pode ser usada para suplementar as informações obtidas da EFC principal ou pode ser usada em vez da EFC principal quando o indivíduo é incapaz de fornecer informações – como pode ocorrer, por exemplo, com crianças ou adolescentes, indivíduos completamente psicóticos ou pessoas com prejuízo cognitivo.

Entrevista de Formulação Cultural (EFC) – Versão do Informante ORIENTAÇÃO PARA O ENTREVISTADOR

AS INSTRUÇÕES PARA O ENTREVISTADOR ESTÃO EM ITÁLICO.

As perguntas seguintes objetivam esclarecer aspectos cen- INTRODUÇÃO PARA O INFORMANTE: trais do problema clínico apresentado segundo o ponto de Eu gostaria de compreender os problemas que trouvista do informante. Isso inclui o significado do problema, xeram seu familiar/amigo aqui para que eu possa fontes potenciais de ajuda e expectativas de serviços. ajudá-lo mais efetivamente. Quero saber sobre as suas vivências e ideias. Vou lhe fazer algumas perguntas sobre o que está acontecendo e sobre como você e seu familiar/amigo estão lidando com isso. Não há respostas certas ou erradas. RELACIONAMENTO COM O PACIENTE Esclareça o relacionamento do informante com o indivíduo e/ ou família do indivíduo.

1. Como você descreveria seu relacionamento com [INDIVÍDUO OU COM A FAMÍLIA]? INVESTIGUE SE NÃO ESTIVER CLARO: Com que frequência você vê [INDIVÍDUO]?

DEFINIÇÃO CULTURAL DO PROBLEMA Obtenha a visão do informante sobre os problemas centrais e as preocupações principais. Foque na maneira própria do informante de entender o problema do indivíduo. Use o termo, expressão ou breve descrição obtida na pergunta 1 para identificar o problema nas perguntas posteriores (p. ex., “o conflito dele com seu filho”).

2. O que traz seu familiar/amigo aqui hoje? SE O INFORMANTE DÁ POUCOS DETALHES OU APENAS MENCIONA OS SINTOMAS OU UM DIAGNÓSTICO MÉDICO, INVESTIGUE: As pessoas frequentemente entendem os problemas da sua própria maneira, que pode ser semelhante ou diferente de como os médicos os descrevem. Como você descreveria o problema [DO INDIVÍDUO]?

Pergunte como o informante expõe o problema para membros da rede social.

3. Às vezes, as pessoas têm formas diferentes de descrever o problema para a família, amigos ou outras pessoas na sua comunidade. Como você descreveria o problema [DO INDIVÍDUO] para eles?

Foque nos aspectos do problema que mais importam para o informante.

4. O que mais o incomoda em relação ao problema [DO INDIVÍDUO]?


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Formulação Cultural

Entrevista de Formulação Cultural (EFC) – Versão do Informante

(Continuação)

AS INSTRUÇÕES PARA O ENTREVISTADOR ESTÃO EM ITÁLICO.

ORIENTAÇÃO PARA O ENTREVISTADOR

PERCEPÇÕES CULTURAIS DE CAUSA, CONTEXTO E APOIO

CAUSAS Esta pergunta indica o significado da condição para o informante, o qual pode ser relevante para o atendimento clínico. Observe que os informantes podem identificar múltiplas causas, dependendo do aspecto do problema que eles estão considerando.

5. Por que você acha que isso está acontecendo com [O INDIVÍDUO]? O que você acha que são as causas do seu [PROBLEMA]? INVESTIGUE MAIS, SE NECESSÁRIO: Algumas pessoas podem explicar o problema como resultado de coisas ruins que acontecem na sua vida, problemas com os outros, uma doença física, uma razão espiritual ou muitas outras causas.

Foque nas visões dos membros da rede social do indivíduo. Elas podem ser diferentes e variar em relação à visão do informante.

6. O que outros familiares [DO INDIVÍDUO], seus amigos ou outras pessoas na comunidade acham que está causando o [PROBLEMA] [DO INDIVÍDUO]?

ESTRESSORES E APOIOS Obtenha informações sobre o contexto de vida do indivíduo, focando nos recursos, apoios sociais e resiliência. Também podem ser investigados outros apoios (p. ex., de colegas de trabalho, da participação na religião ou espiritualidade).

7. Existe algum tipo de apoio que melhora seu [PROBLEMA], como o apoio da família, amigos ou outros?

Foque nos aspectos estressantes do ambiente do indivíduo. Também podem ser investigados, p. ex., problemas de relacionamento, dificuldades no trabalho ou escola ou discriminação.

8. Existe algum tipo de estresse que piora seu [PROBLEMA], como dificuldades com dinheiro ou problemas familiares?

PAPEL DA IDENTIDADE CULTURAL Às vezes, aspectos da origem ou identidade da pessoa podem melhorar ou piorar o [PROBLEMA]. Por origem ou identidade, quero dizer, por exemplo, as comunidades às quais você pertence, as línguas que você fala, de onde você ou sua família são, seu gênero ou orientação sexual e sua fé ou religião. Peça ao informante que reflita sobre os elementos mais proeminentes da identidade cultural do indivíduo. Use essas informações para adequar as perguntas 9-10, quando necessário.

9. Para você, quais são os aspectos mais importantes da origem ou identidade [DO INDIVÍDUO]?

Investigue aspectos da identidade que melhoram ou pioram o problema. Investigue quando necessário (p. ex., piora clínica em consequência de discriminação devido à condição de migração, raça/etnia ou orientação sexual).

10. Existem aspectos da origem ou identidade [DO INDIVÍDUO] que fazem diferença para seu [PROBLEMA]?

Investigue quando necessário (p. ex., problemas relacionados a migração; conflito entre gerações ou devido a papéis de gênero).

11. Existem aspectos da origem ou identidade [DO INDIVÍDUO] que estão causando outras preocupações ou dificuldades para ele?


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