MULHERES QUE HABITAM
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A série Mulheres que Habitam foi produzida em 2018 no surgimento das ocupações em prédios vazios no centro de Vitória. Estima-se que nessa região existam mais de 200 imóveis devolutos, a maioria abandonados por décadas, passiveis do desgaste, atraindo e proliferando flagelos. A cidade é dinâmica, seus espaços devem oferecer múltiplas vivências e usos, é insustentável o centro histórico e cultural de Vitória ter um número tão alto de propriedades sem nenhuma serventia, um desperdício. A lei de usucapião brasileira prevê que a pose de imóveis urbanos pode ser requerida substituindo o titular da propriedade, caso comprovado que o imóvel esteja parado no mínimo cincos anos. “Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.” No mesmo ano a prefeitura da capital identificou mais de 10.500 famílias que moram nas ruas ou em moradias precárias, a demanda por habitações de qualidade é alta existe espaços de sobra. Visitando algumas ocupações entre julho e agosto de 2018 pude perceber o poder feminino nos movimentos por moradias. Fortes, repletas de histórias e afetos, são elas as mulheres, mães, donas da casa, provedoras do sustento, trabalhadoras e cabeças das ocupações, administram a vida comunitária em edifícios com mais de 100 famílias, em alguns casos. Entre julho e agosto desse ano passei a conhecer três dessas mulheres, suas famílias e lares, ouvi suas histórias. Seus caminhos eram diferentes, cada qual um passo, apesar disso os rumos de suas vidas se cruzaram ali nas ocupações nos altos índices do déficit habitacional brasileiro, que no ano de 2020 deve ultrapassar 8 milhões de moradias. Nessas visitas conheci Beatriz, Ivonete e Lu, que carregam no sorriso e o doce olhar as marcas da vida. Ivonete a primeira mulher da série é mineira de Nanuque, como a maioria dos brasileiros que migraram do interior para as metrópoles Ivonete veio a Vitória para conseguir um emprego e estabilidade. Mãe de dois filhos, Rodrigo o mais velho e Débora a caçula, Ivonete morou um bom tempo no bairro São Benedito. Ela e sua filha passaram a morar no último andar da ocupação 955 um edifício comercial na Av. Jerônimo Monteiro, antes funcionava a loja “Casa dos Brinquedos” que fechou em 2008 com os proprietários presos acusados de sonegação fiscal. Tinham poucos meses que ela morava em seu novo lar, aos poucos iam fazendo adaptações no edifício, parte elétrica, hidráulica, vedações. Era previsto pro edifico um ateliê comunitário no térreo e nos outros últimos andares habitações.
Lu a segunda mulher retratada demonstrava em gestos e palavras o amor pelo seu primeiro neto, Miguel. Da região de Montanha, noroeste do estado, passou a morar com sua filha, neto e genro no terceiro andar de uma ocupação, um prédio eclético na Rua Ex-Combatentes do Brasil, próximo a Escola Estadual Gomes Cardim. Assoalho de madeira, o prédio antigo necessitava de melhorias, porém um lar que garantia um conforto e segurança. Nesse edifício moravam aproximadamente seis famílias, cada andar tinha a área compartilhada de sanitários e chuveiros. Nessa ocupação faziam quase todas as atividades em comunidade, desde o lavar as roupas, limpar as dependências do prédio ao churrasco e almoço de domingo. No segundo andar do mesmo prédio morava a terceira retrata, Dona Beatriz, chamada pelos moradores de Neguinha. Matriarca da família e moradora de Vitória Beatriz vivia ali com seus filhos e netos mais novos. Trabalhadora esperava se aposentar, visto as aos problemas de saúde. A mais reservada, entre conversas Beatriz me revelou que apesar das dificuldades ela é feliz por sua família estar bem, e que não há aprendizado sem as batalhas. Meses depois houve a reintegração de posse dos dois edifícios, hoje Ivonete mora com a sua filha em Santa Catarina, devido à crise ela se viu acuada e decidiu buscar oportunidades em outro lugar, mais uma vez. Com muito esforço Lu conseguiu uma casa em Cariacica, onde vive com sua família e Beatriz conseguiu morar com sua filha em uma casa na região de São Torquato. A desigualdade social no Brasil proporciona o desequilíbrio do parcelamento de terras urbanas e rurais, assim como no consumo de bens e serviços. Enquanto esse quadro colonialista continuar não iremos progredir, o país precisa passar por mudanças profundas no sistema, construir uma sociedade universal que respeita a vida na pratica. O verdadeiro progresso não marginaliza pessoas, enquanto a desigualdade for presente haverão famílias desamparadas, sem moradias e perspectivas. A massa no Brasil sobrevive, sinônimo de batalhas, coragem e quando resta a alegria, me inspiro nessas pessoas e suas histórias contribuem como exemplos em minha jornada. Salve o povo Brasileiro e que sua força, fé e coragem nunca se esgotem, lutaremos pela liberdade e que as próximas gerações sejam agraciadas com um presente justo. - Ramon Oliveira
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