Fantasma da estrada
Numa noite ventosa, em que a brisa suavizava o intenso calor do dia, iam de carroça quatro pessoas pela estrada de terra. Já se fazia tarde, era quase meia-noite. O grupo tinha comparecido a um batizado, que se estendera além da hora prevista. Conduzindo a carroça, Antônio, ao seu lado a esposa, Celeste, com a filha pequena adormecida em seu colo. Completava o grupo a vizinha, madrinha do batizado, que compartilhava o transporte. Iam todos em silêncio, embalados pelo trotar ritmado do cavalo e pelo barulho das rodas da carroça. Não vinha mais ninguém na estrada, nem carro ou bicicleta. A lua crescente deixava entrever as árvores e as casas que pontuavam na paisagem.
De repente, o cavalo deu um refugo e o condutor teve que ser ágil e segurar com força a rédea, se não o animal disparava em velocidade. O chapéu que Antônio levava na cabeça, por pouco não tombou. Nesse momento surgiu, saído de debaixo da carroça, um vulto branco, que logo desapareceu.
O cavalo apontou as orelhas para cima, como se estivesse em estado de alerta, e do nada, deu um segundo relinchar. Celeste sentiu a pele do braço arrepiar e a vizinha, que estava gestante, abafou um gritinho. A criança seguia dormindo, graças ao bom
Deus. Nenhum dos três adultos soube precisar ao certo o que sentiu, mas coisa boa não foi. Podia ser um pano arrastado pelo vento. Ou quem sabe um coelho ou uma coruja, que são animais de hábitos noturnos. O medo era coisa sem explicação.
Não quiseram olhar para trás, nem trocar impressões, melhor nada dizer. O marido deu uma chicotada no ar, apressando o passo do cavalo. Era vontade de sair depressa daquele lugar.
Um ano depois, esquecidos do acontecido, estavam novamente o esposo, a mulher e a filha na mesma carroça, puxada pelo mesmo cavalo, na mesma estrada. Celeste, como de costume, ia de lenço. Tinha cabelo bem comprido, na cintura, e amarrava o pano para não tomar sol ou poeira. Era chegar na cidade e soltá-lo, para fazer bonito. Tinham ido comprar açúcar, fumo, macarrão e alguns legumes, que não cultivavam na horta de casa. Levavam queijo, requeijão e doce de mamão para vender. O tempo estava para chover, dava para ouvir os galhos das árvores se movimentando com o vento. A
mulher comentou que logo começaria a estação das águas. Nessa hora, o cavalo refugou, soprou com autoridade e se o marido não tem presença de espírito e segura com firmeza o tranco, era capaz mesmo de a carroça ter tombado. O animal queria desembestar estrada afora. Dessa vez, Celeste e Antônio tiveram foi coragem e buscaram descobrir o que tanto assustava o bicho. Mas tem horas que nem tudo se conta. Viram foi uma coisa brilhante que balançava no ar. Não era certeza, mas devia de ser assombração! “Valha-me Nossa Senhora”, rezou Celeste. Nessa noite estavam tão assustados que nem voltaram para casa, tudo para não precisar pegar o caminho e passar pelo sítio mal-assombrado. Pousaram na casa de parentes.
No dia seguinte, Antônio falou que assim não podia ficar. A luz do sol dá coragem aos homens. A esposa só queria estar longe daquele ponto da estrada, mas o marido teimoso estava decidido. “Meu Deus do Céu, esse homem vai buscar assombração para perto de nós”, inquietava a Celeste. No local sabido, Antônio desceu da carroça. Celeste não se moveu e pôs-se a rezar Pai Nossos e Aves Maria. Foi então que Antônio viu uma enorme teia de aranha, com um monte de vagalumes pendurados! De certo uns tantos já haviam sido devorados.
Ao fim e ao cabo, não era coisa de botar medo em mulher e homem. Eram os vagalumes que deveriam ter temido a assombração.