CONTRAMÃO A S S O C I AÇ ÃO PROPOSTA DE ESTRUTURA PARA UMA ESTRATÉGIA PARA A EDUCAÇÃO
CONTRAMÃO-ASSOCIAÇÃO PROPOSTA DE ESTRUTURA PARA UMA ESTRATÉGIA PARA A EDUCAÇÃO EIXO I – Políticas de Educação Inclusiva Necessidade de dimensão nacional e de definição de desenho universal O acesso universal à educação é um direito humano internacionalmente reconhecido. A Contramão defende que a promoção de uma educação inclusiva terá que assentar nos seguintes princípios fundamentais:
• Educação equitativa. A Escola não pode segregar, discriminar ou colocar em desvantagem qualquer aluno, ou grupo de alunos, com base no género, raça, cultura, religião ou deficiência.
• Educação como processo flexível e dinâmico, capaz de valorizar e promover o desenvolvimento de crianças e jovens com diferentes competências e aptidões, dos pontos de vista físico, sensorial, cognitivo e neurológico, e com conhecimentos e experiências diversificadas, dos pontos de vista académico, cultural e social.
• Existência de recursos humanos, serviços, ambiente físico e tecnologias disponíveis e acessíveis, que respondam à diversidade dos alunos e respetivas preferências e necessidades individuais. Quaisquer necessidades adicionais detetadas, devem ser rapidamente supridas de forma a não pôr em causa a aprendizagem, o sucesso e a progressão de nenhum aluno.
• Currículo universal, de acesso generalizado, que promova a cooperação e contemple margem para evoluções e desenvolvimentos individuais específicos. Este enquadramento tem que estar explícito em todas as componentes do currículo: objetivos, métodos, materiais e avaliação.
• Conteúdos propostos de forma direta e objetiva, evitando barreiras e ruídos na comunicação. É indispensável o recurso a suportes de comunicação variados, tais como esquemas, pictogramas, suportes táteis, entre outros.
• Processo de aprendizagem intuitivo, com flexibilidade para incorporar interesses e valores pessoais, explorar e promover a cidadania e a inclusão, incentivar a descoberta e a experimentação e tolerar o erro, como passo intermédio para a desconstrução de equívocos, rumo ao conhecimento.
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A Contramão assume a sua posição: Alteração à lei de bases do sistema educativo1 • Nenhuma política educativa inclusiva pode assentar numa Lei de Bases que não espelhe os princípios emanados pela Declaração de Salamanca, nem o compromisso assumido por Portugal com a ratificação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (adiante designada Convenção), transposta para a ordem jurídica interna em 2009. Nesse sentido, a Contramão defende a revisão da Lei de Bases do Sistema Educativo, com caráter de urgência. Apesar das alterações introduzidas nos últimos 30 anos, persiste no normativo uma conceção de deficiência desatualizada, que ignora por completo os pressupostos dos modelos social e de direitos humanos da deficiência. Refira-se a este propósito as conclusões oficiais do Comité de Peritos dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU), sobre o relatório inicial de Portugal relativo à implementação da Convenção, nomeadamente no que respeita ao Artigo 24 “Educação”: “45. The Committee recommends that the State party, in close consultation with organizations representing persons with disabilities, review its legislation on education to bring it into line with the Convention and take measures to provide additional resources and materials to facilitate access to and enjoyment of inclusive education of high quality for all students with disabilities, providing public schools with the resources they need to ensure the inclusion of all students with disabilities in ordinary classrooms.” 2
• Artigo 19 da Lei de Bases “Modalidades” Face ao supracitado, a Contramão objeta a que a denominada “educação especial” seja considerada uma “modalidade especial de educação”. É entendimento da Contramão que a “educação especial” deverá pôr em prática a filosofia de inclusão, de forma transversal a todo o sistema de ensino, sendo para tal essencial que esteja presente na Secção I – “Educação pré-escolar” e Secção II – “Educação escolar” (Subsecção I – Ensino Básico, Subsecção II – Ensino Secundário e Subsecção III – Ensino Superior), do Capítulo II “Organização do Sistema educativo” da Lei de Bases, em vez de ser remetida para Subsecção IV – “Modalidades especiais de educação escolar”, como acontece atualmente. A “educação especial” deve contemplar, ao longo de toda a escolaridade, meios e práticas para que os alunos com necessidades educativas especiais possam atingir o máximo de competências e o maior desenvolvimento global possível, providenciadas as devidas acomodações e recursos. Remeter a educação destes alunos para uma categoria distinta que segrega todos aqueles que não se enquadram na ilusão do aluno “normal”, institui práticas discriminatórias.
• Artigo 20 da Lei de Bases “Âmbito e objectivos da educação especial”
1 Bases do Sistema Educativo Lei n.º 46/86, de 14 de outubro - Diário da República n.º 237, Série I, de 14.10.1986 Alterada por Lei n.º 115/97, de 19 de setembro - Diário da República n.º 217, Série I-A, de 19.09.1997 Alterada por Lei n.º 49/2005, de 30 de agosto - Diário da República n.º 166, Série I-A, de 30.08.2005 Alterada por Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto - Diário da República n.º 166, Série I, de 27.08.2009 2 http://tbinternet.ohchr.org/_layouts/treatybodyexternal/Download.aspx?symbolno=CRPD%2FC%2FPRT%2FCO%2F1&Lang=en
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O Artigo 20 perpétua um modelo assistencialista e médico da deficiência, focado em défices e dificuldades, sem qualquer referência à eliminação de barreiras, físicas e atitudinais, que representam os principais constrangimentos à educação destes alunos. O artigo é completamente omisso no que respeita à inclusão, autoestima e dignidade desta população, que tanto tem sido prejudicada por más práticas frequentes no nosso sistema de ensino. A comparação entre os pressupostos do Artigo 24º da Convenção (igualdade de oportunidades) e o Artigo 20 da Lei de Bases (recuperação e integração), evidencia uma disparidade gritante que urge ser corrigida.
• Artigo 21 da Lei de Bases “Organização da educação especial” • A Contramão manifesta veemente oposição ao n.º 2 do Artigo 21 que possibilita a “educação especial” de alunos em “instituições específicas”. Esta prática contraria todos os desígnios de inclusão preconizados no normativo internacional.
• Também o n.º 4 do Artigo 21 suscita as maiores preocupações à Contramão. Ao invés de adaptar o currículo “às características de cada tipo e grau de deficiência”, esta Associação preconiza a adoção do desenho universal da aprendizagem, de forma a que todos os alunos possam aceder ao currículo, através do recurso a múltiplos meios de representação, múltiplos meios de ação e expressão e múltiplos meios de envolvimento.
• As posições supracitadas encontram respaldo no Comentário Geral n.º 4 (2016) do Comité de Peritos dos Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU, a saber: “18. Paragraph 2 (a) prohibits the exclusion of persons with disabilities from the general education system, including any legislative or regulatory provisions that limit their inclusion on the basis of their impairment or its “degree”, such as by conditioning their inclusion “to the extent of the potential of the individual”, or by alleging a disproportionate and undue burden to evade the obligation to provide reasonable accommodation. General education means all regular learning environments and the education department.” 3 SUBSTITUIÇÃO DA TERMINOLOGIA “ESPECIAL” POR OUTRA DE ÂMBITO MEDIADOR QUE CONTRIBUA PARA A PROMOÇÃO DE UMA VERDADEIRA CULTURA DE INCLUSÃO
• A cultura em torno das “pessoas especiais”, da “educação especial” e dos “recursos especiais” tornou-se, nos últimos anos, fator de exclusão, com contornos assistencialistas e caritativos. O aluno com necessidades especiais que vai para uma sala especial, com vista a adquirir competências especiais, em conjunto com outros alunos especiais e onde está um professor de “educação especial”, tornou-se um estereótipo que urge desconstruir e eliminar. “I believe that ‘special’ has become a euphemism for ‘separate,’” Dunlap says. “When we create a separate, special place for children where their ‘special needs’ can be met, we are teaching them that their place is over there, with people like them and not in the full community.” 4
• Neste sentido, numa educação que se exige efetivamente inclusiva, a Contramão propõe que se adote simplesmente a terminologia “necessidades educacionais”. Todo
3 http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx 4 https://tedxinnovations.ted.com/2015/04/02/spotlight-tedx-talk-why-separating-kids-with-disabilities-from-their-peershurts-instead-of-helps/
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e qualquer aluno terá as suas particularidades e especificidades, pelo que, a nível global, é irrelevante particularizar. O foco deverá estar nas respostas que o sistema de ensino providenciará para que o sucesso educativo esteja ao alcance de todos, salvaguardadas questões como individualidade, capacidade, personalidade e identidade. REDISTRIBUIÇÃO DOS DOCENTES ESPECIALIZADOS PELOS VÁRIOS DEPARTAMENTOS DA ESCOLA
• É entendimento desta Associação que os docentes mais especializados e que poderão ser o garante da educação inclusiva não devem estar aquartelados numa estrutura específica da escola - leia-se “departamento de educação especial” - mas sim incluídos e repartidos pelos diversos órgãos, departamentos e ciclos de escolaridade dos respetivos agrupamentos. Importa salientar que um grande número dos referidos docentes pertence ao pré-escolar e ao 1º ciclo do ensino básico e que isso deve ser uma preocupação a ter em conta pela tutela.
• Ainda em termos de estrutura, a organização escolar tem que refletir princípios de inclusão. Esta deve ser uma prática vigente em toda a hierarquia dos estabelecimentos de ensino e representar um compromisso inequívoco assumido pelas lideranças.
• As práticas de intervenção mais especializadas – promotoras da inclusão - têm também que ser transversais aos projetos pedagógicos e aos planos de turma. Em suma, todas as atividades, letivas e não letivas, todo o espaço escolar e organização do tempo, devem ser planeados, organizados e colocados em prática tendo em conta todos os alunos. 5 CURRÍCULO NACIONAL REVISTO E DE APLICAÇÃO UNIVERSAL, I.E., EXTINÇÃO DA MEDIDA EDUCATIVA CURRÍCULO ESPECÍFICO INDIVIDUAL
• Os programas e metas curriculares atualmente em vigor são incompatíveis com o desenvolvimento global harmonioso das crianças e jovens em idade escolar. Esta carga irrealista de conteúdos e objetivos tem efeitos particularmente nocivos no caso de crianças com deficiência, que mais facilmente são excluídas do currículo nacional e afastadas para atividades ocupacionais e supostamente funcionais, de interesse questionável.
• No sentido inverso, a Contramão apela aos conceitos de Desenho Universal da Aprendizagem e à Teoria das Inteligências Múltiplas, para reforçar o direito de acesso de todos os alunos ao currículo. De salientar que é fundamental que as várias componentes do mesmo - objetivos, métodos, materiais e avaliação – se norteiem por princípios de inclusão.6
• Em suma, esta Associação defende a extinção da medida educativa “currículo específico individual”, prevista no Artigo 21 do Decreto-Lei nº 3/2008.
• Se o argumentário exposto não for considerado suficiente, é sugerida a leitura do
5 https://www.noodle.com/articles/why-special-education-isnt-working?utm_content=buffer45869&utm_medium= social&utm_source=facebook.com&utm_campaign=buffer 6 http://www.thinkinclusive.us/why-bother-giving-access-to-curriculum-for-students-with-significant-disabilities/?utm_ content=bufferab7e4&utm_medium=social&utm_source=facebook.com&utm_campaign=buffer
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Comentário Geral n.º4 (2016) da ONU que ilustra bem as dificuldades sentidas em Portugal, relativamente à educação de crianças e jovens com deficiência: “16. According to article 24, paragraph 1(b) education should be directed to the development of the personality, talents and creativity of persons with disabilities as well as their mental, physical and communicational abilities to the fullest potential. The education of persons with disabilities too often focuses on a deficit approach, on their actual or perceived impairment and limiting opportunities to pre-defined and negative assumptions of their potential. States parties must support the creation of opportunities to build on the unique strengths and talents of each individual with a disability.” ENCERRAMENTO DE UNIDADES DE ENSINO ESTRUTURADO E DE MULTIDEFICIÊNCIA
• Será necessário estabelecer disposições transitórias, com tempos definidos, para as escolas elaborarem planos que permitam a acomodação de todos os alunos, incluindo a criação de novos espaços comuns, devidamente equipados e inovadores do ponto de vista das novas tecnologias de informação. Existe uma tendência para que ‘a escola’ seja extremamente protetora com as crianças, nomeadamente quando essas crianças têm alguma deficiência ou aparentemente revelam menor robustez física, assim como menor capacidade de autonomia no espaço escolar. Porém, esse excesso de proteção limita os alunos na fruição de determinadas experiências e restringe a interação com os pares. Entre crianças, com ou sem deficiências físicas, cognitivas, sensoriais ou neurológicas, não existe diferença no que respeita a desejos ou aspirações, por isso, não caberá à Escola, nem à comunidade, contribuir para a segregação em atividades e experiências individuais ou em pequeno grupo. Em experiências livres, nas quais as crianças e jovens são desafiados a ultrapassar obstáculos e a explorar o seu potencial físico, cognitivo, sensorial e neurológico, há naturalmente uma maior exposição ao risco, mas são eliminadas barreiras que por si só a deficiência transporta. Brincar, aprender, sentir e explorar livremente, estimulam e potenciam as necessidades de desenvolvimento individual e promovem a aquisição de competências não formais. Os alunos com deficiência têm sido privados de partilhar grande parte do seu tempo escolar em interação – espontânea e criativa - com os pares. De facto, são frequentemente impostas a estes alunos atividades estruturadas, isoladas e rígidas que os afastam do desenvolvimento de competências sociais e os privam da possibilidade de desenvolver relações interpessoais genuínas e sinceras. ESCOLAS DE REFERÊNCIA
A “educação especial” continua a ser, apesar de algumas evoluções, uma realidade paralela e à parte dos processos escolares e da vida dentro das escolas. Embora muitos fatores contribuam para este facto, sabemos que a existência de escolas de referência valida e contribui para um distanciamento claro face à resposta que cada escola deverá ter para todo e qualquer aluno. A este propósito, a Contramão recorda uma das recomendações do Comité da ONU dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência7
7 http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/outras-publicacoes/item/276-recomenda%C3%A7%C3%B5es-da-onu-a-portugal-sobre-direitos-das-pessoas-com-defici%C3%AAncia
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“A Comissão regista que, apesar de a grande maioria dos estudantes com deficiência frequentarem as escolas regulares no Estado parte, há falta de apoio e que, devido às medidas de austeridade, houve cortes em recursos humanos e materiais que comprometem o direito e a oportunidade a uma educação inclusiva e de qualidade. A Comissão observa também que o Estado parte tenha estabelecido “escolas de referência” para estudantes surdos, surdocegos, cegos e com deficiência visual, e para estudantes com autismo, o que constitui uma forma de segregação e discriminação. É NA ESCOLA E À ESCOLA QUE DEVEM PERTENCER OS RECURSOS NECESSÁRIOS PARA UMA EDUCAÇÃO PARA TODOS
• A Contramão defende que é fundamental devolver a pedagogia à escola, exigindo que esta invista, de forma contínua e melhorada, na prossecução de uma política de qualidade nas escolas.
• O compromisso assumido na Estratégia Nacional para a Deficiência (ENDEF), no sentido de garantir a desinstitucionalização de todas as crianças e jovens em idade escolar, até ao final de 2013, não pode ser, de forma alguma, argumento para transformar as escolas em centros terapêuticos, nem para substituir horários académicos por horários terapêuticos.
• A escola, enquanto instituição segregadora, não tem lugar numa verdadeira política de escola para todos, nem tão pouco a instituição, enquanto prestador de serviços, poderá assumir um papel de liderança na promoção de práticas - as inclusivas - que lhe são de todo estranhas.
• Inclusão é muito mais do que deslocalização de serviços. Transferir modelos e práticas das instituições para a escola não transforma as instituições em organizações inclusivas, pelo contrário, apenas promove práticas segregadoras dentro das escolas. A inclusão tem que passar por uma mudança de paradigma que exige um novo olhar sobre a sociedade e sobre a deficiência.
• Neste sentido, a Contramão defende que o atual modelo dos Centros de Recursos para a Inclusão terá que ser extinto. Recorde-se que o surgimento do mesmo só terá tido alguma lógica num quadro de disposições transitórias e de negociação com as escolas de educação especial existentes até à saída do Decreto-lei 3/2008. O facto de, desde 2013, não ter sido implementada nenhuma Estratégia Nacional para a Deficiência8 tem permitido que este pseudomodelo prevaleça. “A Comissão recomenda que o Estado parte adopte uma nova estratégia para a aplicação da Convenção no Estado parte, em cuja elaboração, monitorização e avaliação participem as organizações de pessoas com deficiência, com alocação de verbas, um calendário de aplicação definido e um mecanismo de acompanhamento específico. A Comissão recomenda também o uso dos Fundos Estruturais da União Europeia alocados ao Estado parte até 2020, para o desenvolvimento de políticas que contribuam para a aplicação da Convenção no Estado parte.”
8 http://oddh.iscsp.utl.pt/index.php/pt/2013-04-24-18-50-23/outras-publicacoes/item/276-recomenda%C3%A7%C3%B5es-da-onu-a-portugal-sobre-direitos-das-pessoas-com-defici%C3%AAncia
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LEGISLAÇÃO BLINDADA E MONITORIZAÇÃO EFICAZ
Por fim, mas talvez no topo das medidas fundamentais para que este processo possa ocorrer em sentido ascendente, a Contramão considera fundamental a revisão do papel e ação da Inspeção Geral de Educação e Ciência9, para que esta se possa vir a assumir como um verdadeiro instrumento preventivo, e não apenas corretivo perante incumprimentos, práticas discriminatórias ou ações contrárias à escola e à educação inclusiva. O estatuto adquirido de soberania dos órgãos da escola face à interpretação de normativos nacionais e internacionais tem que ser necessariamente revisto. O ónus do regular funcionamento deste mecanismo tem que ser retirado dos chamados “utentes” do sistema educativo, i.e., a maioria das vezes, os pais e/ou encarregados de educação, que o assumem, na presença de atropelos aos direitos dos seus filhos, pelo acesso a uma educação inclusiva. A Contramão defende um quadro legislativo suficientemente blindado a equívocos e à reinvenção de conceitos devidamente clarificados em documentos internacionais, como o recente comentário geral ao artigo 24 da CDPD10. É parecer desta Associação que, no processo de revisão legislativa em curso - que conforme supracitado no presente documento não se deverá limitar à alteração ao Decreto-lei 3/2008 -, será crucial que a tutela tenha presente este recente e importante documento da ONU. “States parties must have regard for the underlying general principles of the Convention in all measures undertaken to implement inclusive education and must ensure that both the process and outcomes of developing an inclusive education system comply with article 3. (…) The right to inclusive education encompasses a transformation in culture, policy and practice in all formal and informal educational environments to accommodate the differing requirements and identities of individual students, together with a commitment to remove the barriers that impede that possibility. It involves strengthening the capacity of the education system to reach out to all learners. It focuses on the full and effective participation, accessibility, attendance and achievement of all students, especially those who, for different reasons, are excluded or at risk of being marginalized. Inclusion involves access to and progress in high-quality formal and informal education without discrimination. It seeks to enable communities, systems and structures to combat discrimination, including harmful stereotypes, recognize diversity, promote participation and overcome barriers to learning and participation for all by focusing on well-being and success of students with disabilities. It requires an in-depth transformation of education systems in legislation, policy, and the mechanisms for financing, administration, design, delivery and monitoring of education.(…)” Committee on the Rights of Persons with Disabilities, General comment No. 4 (2016), Article 24: Right to inclusive education, NORMATIVE CONTENT OF ARTICLE 24
9 http://www.ige.min-edu.pt/content_01.asp?BtreeID=03/01&treeID=03/01/04 10 http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx
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EIXO II – Escola Inclusiva: O Projeto Educativo construído por todos e para todos PROJETO EDUCATIVO
• Do atual estado da arte de construção dos Projetos Educativos existem três grandes áreas de atuação que culminam em eixos estratégicos: o sucesso escolar - traduzido em aumento ou redução de taxas, de absentismo e abandono escolar, a intervenção numa área comportamental (que pressupõe a redução de comportamentos disruptivos) e a área da educação para a cidadania, uma área abrangente e diversificada o suficiente para intervir em quase tudo ou em nada. No presente, a maioria, senão todos os projetos educativos e a respetiva definição de objetivos de intervenção, são construídos a partir de análises swot. Elencar pontos fortes e fracos, constrangimentos e oportunidades numa Escola, remete quase sempre para eixos de intervenção cujo foco central é o sucesso escolar traduzido em resultados dos exames, provas de aferição e retenções. O Projeto Educativo, apesar de em alguns exemplos o conceito inclusão se verificar, é tão abrangente, que dificilmente quem o lê forma uma relação direta entre a definição de objetivos e identificação de estratégias que fomentem uma cultura ou uma organização de inclusão dirigida ou preconizada no âmbito do trabalho com alunos com necessidades específicas. A “educação especial” é considerada, na maioria, como apoios especializados aos alunos com NEE, um recurso que, na prática, não é espelhado neste documento orientador de acordo com as práticas do dia-a-dia. Ou seja, em teoria, o “recurso” da Escola, é na prática um (não) documento. Em Portugal já se faz diferente e com “sucesso”, palavra que usamos com cautela e preferencialmente substituímos por mais-valia, valor acrescentado ou enriquecimento pessoal pela via das aprendizagens formais e não formais. O exemplo da Escola da Ponte permite-nos dar corpo a este princípio11
• Será por demais importante desafiar as Escolas para a construção de projetos educativos inclusivos e esta espinha dorsal ser considerada critério de avaliação em sede de avaliação externa de Escola. Aqueles devem:
• Recuperar a implementação da metodologia de trabalho de projeto, participada por todos os atores que constituem a comunidade educativa (pessoal docente, não docente, encarregados de educação, alunos dos vários níveis de ensino, as entidades que com as Escolas articulam no dia a dia), podem ajudar a enriquecer um documento que não se circunstancie ao papel e que concorra para a identificação de propostas viáveis de resolução de problemas sentidos por todos.
·· Promover um guia de boas práticas de organização e construção de um Projeto Educativo que tenha, como documentos orientadores, entre outros, a Convenção.
11 http://www.escoladaponte.pt/site/ficheiros/doc/orienta/PE.pdf
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·· Os critérios de inclusão devem estar evidenciados em todas os capítulos do P.E. (estrutura organizacional da Escola, funcionamento da Escola, constituição das turmas, diagnóstico, plano estratégico, atividades e projetos extracurriculares e avaliação). Entenda-se que o projeto para a escola pode identificar e atuar em diferentes campos. Se há uma orientação para que os projetos sigam estratégias definidas pelas estruturas que determinam e regulam o ensino, os projetos devem simultaneamente romper com as práticas tradicionais de tomadas de decisão unicamente assentes em estruturas horizontais. Por isso, defendemos que, no Projeto Educativo, deve haver um confronto entre os interesses reiterados pelo poder e pela retórica, com a expressão e implicação social dos utilizadores, numa perspetiva de democratização do ensino. Este é um cruzamento que se constrói de uma mediação entre as estruturas horizontais e verticais das comunidades educativas, transformando o desgaste provocado pela burocracia numa estratégia para o rompimento e para a inovação. PLANO DE ATIVIDADES
• Ao refletir sobre os Planos de Atividades, falamos de recuperar a identidade coletiva de turma. “Ao obtermos uma visão mais alargada dos conceitos de diferença e educação de qualidade, compreendemos que a verdadeira inclusão só pode ser concretizada na sala de aula. Não é retirando o(s) aluno(s) desse espaço, como se de um ser-problema-indesejado se tratasse, mas retirando, sim, o professor do centro da aula. Tal mudança será viabilizada através da implementação de metodologias ativas que permitam a cada aluno, com ou sem NEE, construir o seu percurso em interação permanente com as pessoas que pertencem ao seu grupo e com ele vivenciam situações de aprendizagem, delas retirando conhecimento e experiência para a vida.” 12
Se:
• o Projeto Educativo da Escola é o documento de base da autonomia escolar pois nele deverão constar os objetivos, a visão de futuro e aquilo que torna única cada escola,
e
• todo o projeto carece de concretização,
Então, o Plano Anual de Atividades da escola é o instrumento dessa concretização. Ou seja, o Plano de Atividades é considerado como um dos documentos de planeamento, que define, em função do Projeto Educativo, os objetivos, as formas de organização e de programação das atividades e procede à identificação dos recursos necessários à sua execução. Como é que este é articulado com o Projeto Educativo, e que papel é atribuído ao Projeto Educativo quando se definem as atividades do Plano de Atividades, são questões que se nos colocam quando refletimos sobre a educação e inclusão. Quando um Plano de Atividades é composto por atividades circunscritas a datas comemorativas e a propostas de atividades dos vários departamentos e unidades, entre os quais a “educação especial”, não estamos a falar de um documento global e globalizador da vida de uma Escola, ou identitário.
12 Gerir a diversidade: contributos da aprendizagem cooperativa para a construção de salas de aula inclusivas, Cláudia Tavares e Isabel Sanches, maio, 2013
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Assim, a Contramão defende que, neste âmbito, se verifique uma maior atenção sobre os documentos concretizadores do Projeto Educativo de escola, como um documento com uma visão global, integradora e de articulação, tendo em linha de conta com os objetivos e resolução de problemas identificados no Projeto Educativo. DIFERENCIAÇÃO PEDAGÓGICA
“Uma construção social dos saberes em circuitos dialógicos de comunicação. Todo o saber tem um valor social e é socialmente construído. Por isso mesmo a interajuda é uma força integrante do trabalho de aprendizagem e os conhecimentos pesquisados e apropriados, individualmente ou em grupo, têm de ser difundidos por todos, através de circuitos de comunicação dos saberes e de apresentação dos produtos culturais, de forma presencial ou virtual: o conhecimento e as obras de cada um devem ser partilhados socialmente para que possam cumprir o sentido social e ético do trabalho cultural em democracia.” 13
• A Contramão encontra algumas referências a modelos de Diferenciação Pedagógica que importa distinguir de diferenciação curricular, aliás assistimos frequentemente a práticas discriminatórias quanto ao acesso ao mesmo currículo (vide posição Contramão na página 1 do presente documento). Sérgio Niza refere 14: (…) É útil, por isso, contrastar esta designação tão em moda da Diferenciação Pedagógica com a gramática tradicional da escola oitocentista e com diversificação curricular que seguem finalidades semelhantes na velha convicção elitista de selecionar precocemente os alunos quer pela exclusão quer pela discriminação das vias de ensino para que os empurram. O que frequentemente se designa por gramática da escola refere-se à estrutura e organização tradicionais de formalização da escolaridade e do trabalho na sala de aula, centrado no professor e dirigido aos alunos, fundamentalmente de modo simultâneo. A outra designação que igualmente se opõe à Diferenciação Pedagógica é a da diversificação curricular que não trata senão das variantes e alternativas compensatórias, mas sempre socialmente desvalorizadas em relação ao currículo regular oficial (…)
Diferenciar passa, então, por conceder a cada aluno, de acordo com as suas potencialidades, a oportunidade de ter um lugar que é o seu, bem desenhado no espaço do aprender, uma voz que é audível por todos e uma participação que se vê com nitidez e contribui para o crescimento cognitivo e social, próprio e dos seus pares. Diferenciar, incluindo, passa por uma estratégia de organização de grupos ou pares de níveis de aprendizagem diversos, a trabalharem numa tarefa organizada para rendibilizar essa diversidade (Roldão, 2003); passa por tirar partido das diversidades (experiências, culturas ou outras) para aprendizagens destinadas a toda a turma; passa, ainda, por potenciar e desenvolver o que cada um pode pôr ao serviço do outro, para atingir um objetivo coletivo.15
13 http://centrorecursos.movimentoescolamoderna.pt/exposicoes/ExpDidaticaMEM/exp_mem.pdf 14 http://centrorecursos.movimentoescolamoderna.pt/espaco_entrevistas/sergionizajl4fev2015.pdf 15 Gerir a diversidade: contributos da aprendizagem cooperativa para a construção de salas de aula inclusivas, Cláudia Tavares e Isabel Sanches, maio, 2013
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ORGANIZAÇÃO DOS ESPAÇOS E DOS RECURSOS
• As escolas devem ser desafiadas à construção de espaços participados. A participação providencia o espaço social para o qual todos devem ser chamados a contribuir – do aprender, do viver e também de ensinar. Estes fatores influenciam o sucesso escolar individual e representam, sobretudo, o êxito dessa comunidade. Neste sentido, entendemos que a escola poderá representar um dos elementos fundamentais para a aprendizagem social e, através da interação, um contributo para a prevenção e resolução de conflitualidades. O projeto de arquitetura e design deverá garantir que as crianças e jovens com deficiência sejam incluídos numa participação ativa na sala de aula. O ambiente não se poderá constituir como um elemento segregador para pessoas que apresentem necessidades específicas ou diferentes – protegendo as crianças do estigma e do rótulo de ‘especial’.
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Eixo III – O Aluno A motivação é o motor das aprendizagens e por isso é fundamental ter uma escola centrada no aluno. A segurança e confiança encontradas no contexto escolar são as bases sem as quais não há desenvolvimento global. Mais, a afetividade e o envolvimento emocional não podem ser excluídos do processo de aprendizagem. É na relação e em relação que acontecem os mais importantes progressos na construção da personalidade, sentido de dignidade e autoestima. Uma educação global, para a diversidade e para a cidadania, não se pode circunscrever a aprendizagens formais e conteúdos académicos. A dimensão social e humana vai muito para além de objetivos quantitativos e mensuráveis. Se tal é verdade para toda a qualquer criança ou jovem, também o é, com toda a certeza, para aqueles em que a deficiência se manifesta. “ Inclusive education is to be understood as: (…) A principle that values the well-being of all students, respects their inherent dignity and autonomy, acknowledges individual requirements and ability to effectively be included in and contribute to society (…)” 16
De salientar que, há mais de 20 anos, aquando da assinatura de Salamanca 17, a urgência era unânime, tal como se pode ler no preâmbulo da referida Declaração: “A educação de crianças e jovens com necessidades educativas especiais (…) não pode progredir de forma isolada e deve antes fazer parte de uma estratégia global de educação e, sem dúvida, de uma nova política social e económica o que implica uma profunda reforma da escola regular.”
A Contramão gostaria de aproveitar esta oportunidade para salientar a importância extrema e decisiva que a educação assume para o cumprimento de todos os outros direitos de cidadania. A educação pode viabilizar, ou não, a autonomia, um futuro emprego ou uma vida adulta independente. Se para o sistema de ensino, o compromisso com a educação termina no momento em que o aluno conclui a sua escolaridade, para os jovens com deficiência, as oportunidades ou barreiras que enfrentaram durante o seu percurso escolar, os progressos alcançados ou as competências inibidas, acompanhá-los-ão por toda a vida e serão decisivas na construção do seu futuro, cujo grau de incerteza e imprevisibilidade é muito maior do que para os jovens sem deficiência. PARTICIPAÇÃO DOS ALUNOS
“47 Articles 9 and 24 are closely interconnected. Accessibility is a precondition for the full and equal participation of persons with disabilities in society. Persons with disabilities cannot effectively enjoy their right to inclusive education without accessibly built environment, including schools and all other places of education, without accessible public transport, services, information and communication. Modes and means of teaching should be accessible and should be conducted in accessible environments. The whole environment of students with
16 http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx 17 http://www.madeira-edu.pt/LinkClick.aspx?fileticket=7fr0EPRPiY4%3D&tabid=304&mid=1656
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disabilities must be designed in a way that fosters inclusion. Inclusive education itself, on the other hand, is a powerful tool for the promotion of accessibility and universal design18 “
Embora sejam considerados atualmente alguns mecanismos de representatividade dos alunos em alguns órgãos, não conhecemos até à presente data qualquer tipo de mecanismo ou experiência que resulte na participação e auscultação dos alunos com deficiência na vida escolar (conselhos de turmas, eleição de delegado e sub-delegado, reuniões gerais de alunos, associações de estudantes). “46. Article 8 calls for measures to raise awareness and challenge stereotypes, prejudices and harmful practices regarding persons with disabilities, particularly targeting those affecting women and girls with disabilities and persons with intellectual disabilities and intensive support requirements. These barriers impede both access to, and effective learning within the education system. The Committee notes the practice of some parents of children without disabilities removing their children from inclusive schools, based on lack of awareness and understanding of the nature of disability. States parties must adopt measures to build a culture of diversity, participation and involvement into community life and to highlight inclusive education as a means to achieve a quality education for all students, with and without disabilities, parents, teachers and school administrations, as well as the community and society. States parties must ensure that mechanisms are in place to foster, at all levels of the education system, and among parents and the wider public, an attitude of respect for the rights of persons with disabilities. Civil society, in particular OPDs, should be involved in all awareness raising activities.” AVALIAÇÃO, CERTIFICAÇÃO, PROGRESSÃO
• “O desafio com que se confronta esta escola inclusiva é o de ser capaz de desenvolver uma pedagogia centrada nas crianças, susceptível de as educar a todas com sucesso (…)” – declaração de Salamanca.
• A operacionalização das mudanças de paradigma, atitude e práticas que ao longo deste documento foram sendo indicadas, conduz-nos para a dimensão individual.
• A Contramão defende que, a par da revisão e alteração legislativa proposta, deverá existir uma regulamentação clara da lei, do tipo Enquadramento de Ação, como já a supracitada declaração propunha. É também posição da Contramão que todos os alunos devam ser submetidos a processos de avaliação das suas aprendizagens na Escola. Como é sabido, são consideradas nos documentos normativos, várias formas de avaliação, quer de processo, como a formativa e contínua, quer de resultado, como a sumativa. Um instrumento como o que sugerimos permitiria garantir, na presença de momentos como as provas de aferição e/ou provas de monitorização, ou como as provas de avaliação, a participação ajustada em equidade de todos os alunos.
18 http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx
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Os momentos de avaliação sem a presença inquestionável do princípio do desenho Universal, 19 impedem que sejam realizadas efetivas avaliações de forma ajustada, relativamente àquilo que a escola tem promovido em termos de aprendizagens a todos os seus alunos. Parece-nos também importante que os alunos tenham Projetos Educativos onde todos os intervenientes, por via das equipas multidisciplinares alargadas e em sentido abrangente, devam participar. Entendemos que os alunos com deficiência, devem ter considerados no seu projeto educativo, a definição, para além da identificação das medidas de avaliação, os respetivos critérios e descritores. E cremos que isso permitirá uma certificação de competências académicas, mais equitativa, seja por via das aprendizagens formais ou não formais, desde que sejam preconizados por todos os alunos. A avaliação terá que ser considerada como um momento importante do seu percurso educativo, indicadora de como estão a decorrer os processos de ensino e de aprendizagem.
• Chegados a esta dimensão, importa ter presente, mais do que nunca e com firme convicção, todos os princípios fundamentais que norteiam este documento e que elencámos no início.
• O comentário geral nº 4 ao artigo 24º da CDPD realça e destaca o direito à progressão de estudos e sendo assim não podemos considerar os desfasamentos legais, marginais pedagogicamente falando e de não valorização pessoal e de percursos educativos realizados, entre regulamentos e outros documentos de apoio que gravitam em torno da pessoa com deficiência. “8. According to article 24, paragraph 1, States parties must ensure the realization of the right of persons with disabilities to education through an inclusive education system at all levels, including pre-schools, primary, secondary and tertiary education, vocational training and lifelong learning, extracurricular and social activities, and for all students, including persons with disabilities, without discrimination and on equal terms with others.“ SEGURANÇA, CONFORTO, BEM-ESTAR
A Contramão defende uma aferição séria e consequente optimização da afetação dos meios e recursos necessários à prossecução da inclusão de todos na certeza de que, na falha da razoável e adequada atribuição dos mesmos, será falacioso esperar um resultado globalmente positivo das medidas.
• Um aluno tem que se sentir bem no espaço em que se movimenta para que possa fazer as aprendizagens. Respeito pelo ritmo de aprendizagem; forma de comunicação/expressão; capacidade de movimentação; capacidade de relacionamento. O ambiente arquitetónico, o espaço e os objetos, têm implicações diretas nos comportamentos nas crianças podendo-lhes causar uma ação direta no seu desempenho escolar (Darmody et al, 2010). Através de uma sensação de bem estar, proporcionada por um espaço desenhado
19 DESENHO UNIVERSAL: Designa o desenho dos produtos, ambientes, programas e serviços a serem utilizados por todas as pessoas, na sua máxima extensão, sem a necessidade de adaptação ou desenho especializado. Sendo que desenho universal não deverá excluir os dispositivos de assistência a grupos particulares de pessoas com deficiência sempre que seja necessário.
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para receber todos os perfis de utilizadores, as crianças podem aumentar o seu grau de satisfação e desempenho escolar. A acessibilidade, não se resume unicamente à condição física dos mesmos, essa categoria é talvez a mais visível e a mais fácil de resolver desde que haja o cumprimento dos regulamentos e normas técnicas. Igualmente importantes, são o controle da luz (natural e artificial), os materiais, a cor e os sistemas de orientação espacial e sinalética que possam facilitar a compreensão do utilizador em relação ao espaço onde se insere – o compromisso da escola com estes fatores podem ajudar a reduzir o estigma e isolamento dos utilizadores com deficiência (Steinfeld & Maisel, 2012). FAMÍLIA COMO PARCEIRO FUNDAMENTAL
A escolha informada de um percurso formativo de acordo com os interesses, em conformidade com um projeto de vida, não pode ser vedada aos alunos com necessidades educativas especiais. A família, como promotor desse projeto e desempenhando a maioria das vezes, por substituição compulsiva ao Estado - seja no suporte pedagógico, seja no assegurar de que do ponto de vista terapêutico são acautelados programas adequados -, e conhecedora do aluno, tem que ter um papel fundamental no percurso educativo. Acreditamos mesmo que o conceito de equipas multidisciplinares deveria ser revisto no sentido da evolução dessa multidisciplinaridade para além dos “muros” da escola. A esta associação parece fundamental o envolvimento dos pais, num pressuposto sério mas também ele capaz de acomodar todas as famílias e não apenas as mais “capazes”. No entanto e uma vez mais recorrendo ao texto do comentário geral nº4 ao artigo 24º da CDPD, permitam-nos que reforcemos: “Inclusive education is to be understood as a fundamental human right of all learners. Notably, education is the right of the individual learner, and not, in the case of children, the right of a parent or caregiver. Parental responsibilities in this regard are subordinate to the rights of the child”. 20
20 http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/CRPD/Pages/GC.aspx
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NOTA FINAL A conquista dos Direitos Humanos está associada à ampliação da igualdade para todas as pessoas. Em 1994, uma conferência realizada pela UNESCO produzia um documento que viria a chamar-se Declaração de Salamanca e que visava a inclusão de todos os alunos no ensino regular. O novo paradigma incluía todas as crianças numa educação inclusiva, para todas. A qualidade do ensino assumia o compromisso de que ninguém ficaria para trás. A pedagogia passaria a centrar-se na criança e na capacidade de encontro com as necessidades desta. E as necessidades educativas especiais deixariam de estar à margem, mas passariam a fazer parte integrante do espaço educativo, das escolas. A dignidade roubada era assim restituída. E muitas pessoas, muitas famílias, aumentariam as suas oportunidades de felicidade. E assim foi. Só que a inclusão não beneficia apenas os mais frágeis. O acesso ao ensino regular foi uma conquista que beneficiou toda a sociedade, todas e todos saímos a ganhar. E é por isso urgente que o caminho feito não abrande. Se uma criança ficar para trás, toda a sociedade ficará com ela. A sua derrota, será a nossa derrota. A sua humilhação, será a nossa humilhação. E por isso, o exemplo a dar, sobretudo aos mais novos, é o de que todos valemos muito - sem exceção. Então, que esse valor, irrevogável, seja reconhecido na lei, seja um efetivo compromisso da sociedade em geral, de cada um de nós em particular!
11 de novembro de 2016 Contramão – Associação
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CONTRAMÃO ASSOCIAÇÃO | associacao.contramao@gmail.com | 11 novembro 2016 19