Revista Direção (Junho-Julho 2017)

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www.pe.sebrae.com.br ano 43 • nº 2 • JUNHO/JULHO 2017

ano 43 • nº 2 • JUNHO/JULHO

Negócios do futuro Como será o amanhã Desenvolvimento

Potencial econômico da Mata Norte

Tendências

Consumo com causa




EDITORIAL Conselho Deliberativo | Pernambuco 2015-2018 Associação Nordestina da Agricultura e Pecuária  – Anap Banco do Brasil S/A  – BB Banco do Nordeste do Brasil  – BNB Caixa Econômica Federal  – Caixa Federação da Agricultura do Estado de Pernambuco – Faepe Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Estado de Pernambuco – Facep Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de Pernambuco – Fecomércio/PE Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco – Fiepe Instituto Euvaldo Lodi – Núcleo Regional de Pernambuco – IEL/PE Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae Secretaria da Micro e Pequena Empresa, Trabalho e Qualificação de Pernambuco – SEMPETQ Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial do Estado de Pernambuco – Senac/PE Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial do Estado de Pernambuco – Senai/PE Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – Administração Regional do Estado de Pernambuco – Senar – AR/PE Fundação Universidade de Pernambuco – UPE Presidente do Conselho Deliberativo Estadual Josias Silva de Albuquerque Diretor-superintendente José Oswaldo de Barros Lima Ramos Diretora técnica Ana Cláudia Dias Diretora administrativo-financeira Adriana Tavares Côrte Real Kruppa Comitê de Editoração Sebrae Pernambuco Eduardo Jorge de Carvalho Maciel Janete Evangelista Lopes Fábio Lucas Pimentel de Oliveira Ângela Miki Saito Carla Andréa Almeida Jussara Siqueira Leite Roberta de Melo Aguiar Correia Jornalista responsável Janete Lopes | DRT – 2232 Texto e edição Dupla Comunicação Revisão Betânia Jerônimo Ilustração da capa Stock Photos Concepção da capa Unidade de Marketing e Comunicação Projeto gráfico original Felipe Gabriele | Z.diZain Comunicação Diagramação Edson Figueiredo | Z.diZain Comunicação Tiragem 2.000 exemplares Periodicidade Trimestral Impressão CCS Gráfica

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Carta ao Leitor

A

evolução da tecnologia vem tornando os processos de mudanças cada vez mais acelerados, e a realidade que conhecemos hoje será muito diferente do que vivenciaremos daqui a algumas décadas. A cada dia, surgem novos comportamentos e formas de consumo, fazendo surgir também, num futuro breve, novos modelos de negócios. O empreendedorismo e a inovação são inerentes aos pernambucanos, e muitos desses “negócios de futuro” já começaram a ser fomentados aqui. É o que você vai conferir na reportagem de capa desta edição da revista Direção. Outro sinal de evolução da sociedade é o debate cada vez mais frequente em busca da mudança de conceitos e preconceitos a respeito de questões relacionadas à identidade de gênero, feminismo, questões raciais, defesa dos animais. Principalmente por meio das redes sociais, a população vem se engajando em prol de uma causa e isto reverbera no consumo, pois o produto e o serviço passam a ter mais valor quando o contexto em que estão situados diz respeito a uma ideologia. Este também será tema de reportagem desta edição. Outros assuntos aqui explorados são o potencial econômico da Zona da Mata Norte de Pernambuco, o uso das Plantas Alimentícias Não Convencionais (Pancs) da caatinga na gastronomia, o mercado de brechós e os pequenos negócios que têm pessoas da mesma família como sócias ou colaboradoras. A entrevista desta edição é com o escritor, poeta, empreendedor social e palestrante Bráulio Bessa. Já os artigos trazem como temas a reforma trabalhista, os cuidados em transformar um hobby em negócio e os municípios do g100. Boa leitura! Até a próxima edição. Josias Albuquerque Presidente do Conselho Deliberativo Estadual do Sebrae


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Capa

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O que vem por aí?

Tendências

Gastronomia

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Pancs encontradas na Caatinga compõem menus da alta cozinha

Desenvolvimento

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Produtos e serviços baseados na defesa de uma causa têm ampla abrangência no mercado

Mercado

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Preços mais baixos e consumo consciente alavancam a procura por brechós

Empreendedorismo Entrevista

O potencial econômico da Zona da Mata Norte de Pernambuco vai além da instalação de indústrias de grande porte

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No Brasil, mais da metade dos pequenos negócios tem parentes como sócios, empregados ou colaboradores

Artigo

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Flávio Costa

Flávio Costa

Fabiano Barros

Tecnologias e mudanças no consumo fazem surgir modelos de negócios que estarão em alta nas próximas décadas

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Bráulio Bessa e seu “jeito arretado” de empreender

Inspiração

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Conheça a história de duas vencedoras do Prêmio Mulher de Negócios do Sebrae

Artigo

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A reforma trabalhista

Artigo Se você sonha em transformar um hobby apaixonante em um negócio, tome cuidado com algumas armadilhas...

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Municípios do g100 demandam tratamento diferenciado e favorecido: dinamização econômica e e modernização da administração tributária

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CAPA

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Como será o amanhã? Especialistas fazem previsão de negócios e profissões que devem estar em alta nos próximos anos por

MAÍRA PASSOS JUNHO/JULHO 2017

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CAPA

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ão é preciso ter bola de cristal para perceber que a tecnologia vai cada vez mais influenciar as relações humanas, de consumo e os negócios, consequentemente. Mas o que o futuro nos reserva? De fato, só saberemos quando chegarmos lá, porém estudos e especialistas apontam quais profissões e setores de mercado deverão estar em alta nos próximos anos, com base nos avanços da inteligência artificial e na mudança de comportamento da sociedade, cada vez mais conectada. De acordo com uma análise feita pela consultoria Ernst & Young, até 2025 um em cada três postos de trabalho deve ser substituído por tecnologia inteligente. O mercado começa a apostar em profissionais com facilidade de se relacionar com várias culturas e perfis diferentes ao mesmo tempo. Assim, o grande ponto para o sucesso não seria o conhecimento do profissional, mas sua capacidade de analisar e interligar os dados disponíveis. Para o futurólogo Jacques Barcia, consultor de tendências tecnológicas do Porto Digital, mais da metade dos negócios que serão relevantes na próxima década ainda sequer foi inventada. “A previsão é que atividades relacionadas com tecnologia e bem-estar prevaleçam. E daí vão surgir várias outras especialidades que ainda não conhecemos. Entre as pistas, aposto na área de biologia sintética. Já a inteligência artificial deve estar presente em todas as áreas”, analisa. Num futuro mais próximo, o consultor explica que a realidade virtual aumentada estará cada vez mais em alta. “A partir disso, começam a surgir profissões para atender a essa demanda, tais como designer e produção de conteúdo específico para este tipo de tecnologia. Quem sabe, mais na frente, possam até surgir serviços de turismo para o cliente conhecer e ter a experiência do local

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antes da viagem, ou mesmo gastronômicos, para sentir como será o cardápio em realidade virtual”, comenta Jacques. O futurólogo acredita ainda que todo tipo de atividade que poderá ser automatizada assim será, inclusive na área criativa, e bastante presente na Medicina, por exemplo. Para acompanhar essas mudanças e o processo de informatização em todos os mercados e não permitir que determinado negócio fique ultrapassado, o analista do Sebrae em Pernambuco Péricles Negromonte sugere que o primeiro passo seja o profissional observar a mudança de comportamento das pessoas, já que todo movimento econômico vem em função da cultura da sociedade. “Uma das mudanças da atual geração que vale a pena observar é a não apropriação de bens materiais. Por exemplo, há quem esteja vendendo o carro para se locomover em carros autônomos, visando não só a economizar, mas melhorar a mobilidade local e o meio ambiente. O empreendedor vai precisar, assim, estar atento aos novos perfis de consumidores que surgem e procurar vender ‘experiências’, ao invés de produtos ou serviços”, explica o analista. Entre as dicas de Péricles, o empreendedor deve identificar a necessidade e o nicho de cada mercado, perceber quais são os problemas e oferecer soluções para melhorar a vida das pessoas, de acordo com os novos valores culturais. “Além disso, é importante lembrar que a globalização estará cada vez mais forte, porém não esquecendo do valor de cada cultura e como esse negócio vai impactar localmente”. Segundo o analista, a tendência é que o coletivo esteja cada vez mais forte e a inovação continue sendo uma característica fundamental para o sucesso de um negócio. “Empresas que ofereçam soluções criativas e que usem a inteligência humana para resolver problemas, indo além, devem se destacar ainda mais nos próximos anos”, comenta o analista do Sebrae em Pernambuco.


Flávio Costa

Eduardo Rocha é gerente de produto e um dos fundadores da In Loco Media, startup pernambucana e a maior rede de anúncios mobile do Brasil

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STARTUPS VEEM ALÉM

Flávio Costa

Uma das empresas que viram além do seu tempo foi a In Loco Media, startup pernambucana e a maior rede de anúncios mobile do Brasil. Lá em 2011, um grupo de alunos do Centro de Informática (CIn), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), desenvolveu uma tecnologia de localização indoor para uma disciplina. Mas foi em 2014 que o projeto ganhou outro rumo, nascendo a In Loco Media, a partir da percepção de que a tecnologia de localização indoor poderia ajudar os mercados online e off-line. “As empresas do mercado com lojas físicas representam mais de 95% das compras no país, mas não têm nenhuma forma de quantificar o

seu investimento em mídias online. Por isso, criamos uma solução capaz de mensurar quantos consumidores visitaram o ponto de venda do anunciante após clicarem no anúncio, validando o ROI da campanha mobile”, conta o gerente de produto e um dos fundadores do negócio, Eduardo Rocha. Assim, a empresa foi conquistando espaço no país inteiro, não só pela inovação tecnológica, mas por oferecer uma solução para o mercado. Falando em futuro, a projeção da In Loco Media é transformar sua tecnologia em uma plataforma de dados de geolocalização para que outras empresas possam utilizar. “Ou seja, qualquer desenvolvedor vai poder utilizar nossa plataforma para potencializar seu produto. Nós também estamos trabalhando

Flávio Almeida é diretor executivo do Prodeaf, plataforma de comunicação digital que conecta surdos e ouvintes através da tradução de texto e voz

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na expansão internacional. No segundo semestre, vamos focar na internacionalização da empresa”, prevê o cofundador. Hoje a rede de anúncios atua com 100 colaboradores, tendo registro de 50 milhões de usuários com 600 aplicativos parceiros. Já o Prodeaf, plataforma de comunicação digital que conecta surdos e ouvintes através da tradução de texto e voz, trabalha com um time de 11 pessoas, mas impactando pessoas numa escala bem além. Só no Brasil, o aplicativo, que é gratuito, registrou para lá de um milhão de downloads e já foram realizadas mais de 100 milhões de traduções. “Ao longo do tempo, conseguimos montar uma equipe muito boa e de alta performance. Hoje temos uma eficiência quatro ou cinco vezes maior em tudo que fazemos, em relação ao nosso começo”, esclarece o diretor executivo do Prodeaf, Flávio Almeida. Para Flávio, o que interessa é uma empresa com foco bem definido e colaboradores comprometidos com seus resultados. Tal visão possibilitou à startup voos bem altos, desde o início de sua trajetória, que começou em 2010. Também da área de tecnologia, a primeira ideia do Prodeaf nasceu de um grupo de alunos da UFPE que deveria criar um projeto junto. Mas o grande problema a ser resolvido era como eles iriam se comunicar, pois havia ouvintes e surdos na equipe. Mesmo com a possibilidade de escrever, eles não conseguiam se entender bem, porque a sintaxe da Língua Brasileira de Sinais (Libras) é diferente do português. Naquele momento, como nenhum dos que escutavam tinha fluência em Libras, realidade da maior parte da população brasileira, eles resolveram criar um aplicativo que fizesse essa tradução instantânea. A partir de então, a inovação também virou oportunidade de negócio, percebendo a grande lacuna no mercado. Além da tradução para o português, o Prodeaf lançou recentemente uma versão para traduzir o inglês para a American Sign

O processo de entender um problema, mapear o mercado e seguir propondo hipóteses de soluções que se autoalimentam será sempre desafiador. Temos que sempre pensar à frente

Language (ASL), tendo 100 mil usuários nos Estados Unidos, de forma orgânica. Sobre a necessidade da constante criação e reinvenção, “o processo de entender um problema, mapear o mercado e seguir propondo hipóteses de soluções que se autoalimentam será sempre desafiador”, segundo o diretor executivo do Prodeaf. E isto faz parte do empreendedorismo em qualquer área de atuação. Porém, como sua formação técnica é em Computação, a inovação acaba se mostrando muito mais evidente pela velocidade de êxito em um projeto. “Ou seja, temos que sempre pensar à frente”, pontua Flávio. INTERPRETAÇÃO HUMANA EM ALTA Se de um lado estudos e especialistas apontam um universo cada vez mais tecnológico no futuro, em contrapartida analisam que carreiras pautadas na interpretação humana estarão sempre em alta e tenderão a ser mais valorizadas. Segundo pesquisas, um dos negócios que serão tendência na próxima década JUNHO/JULHO 2017 11


Em meio à busca por qualidade de vida, empresas focadas em saúde integrada estão em alta. Percebendo esta tendência, as fisioterapeutas Carol Florêncio e Flávia Veras abriram a Vanity Saúde & Estética

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Flávio Costa

Flávio Costa

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Wilton Marcelino

são as consultorias. Para o consultor Francisco Cunha, sócio da TGI Consultoria em Gestão Empresarial, um dos motivos da área estar em alta nos próximos anos são as empresas de consultoria funcionarem como organizacional trainers. “Em analogia ao personal trainer, trabalhamos com recursos técnicos, metodologia e capacidade relacional para organizações que queiram se desenvolver. Sozinho ou contando somente com recursos internos, geralmente, é mais difícil fazer mudanças. O consultor, justamente por ser externo, pode, quando o faz adequadamente, ajudar muito a ação no rumo desejado. Isto nenhuma máquina pode fazer, por mais inteligente que seja”, explica. Para ele, o diferencial de uma consultoria no meio dos avanços da tecnologia é a relação humana como característica fundamental do negócio. “Por definição, não pode ser feita por não humanos, ainda que artificialmente inteligentes. Sempre vão ser indispensáveis a interação humana e a facilitação através do homem”. E, para não ficar para trás, o consultor orienta estar sempre antenado às mudanças que estão ocorrendo no ambiente concorrencial. Outra área que não dispensa o contato humanizado é a de saúde. Com uma sociedade cada vez mais em busca de qualidade de vida, surgem profissionais para auxiliar no gerenciamento do estresse e promover uma rotina mais saudável como o coach em bem-estar e empresas focadas em saúde integrada. Já percebendo esta tendência, as fisioterapeutas Carol Florêncio e Flávia Veras abriram a Vanity Saúde & Estética, há quatro anos, no bairro das Graças, no Recife. “Antes da Vanity, possuímos consultórios independentes e especializados, mas sentíamos a necessidade de oferecer resultados mais efetivos aos nossos pacientes, que buscavam, por exemplo, melhora em sua alimentação. Por isto,

As consultorias como a TGI, da qual Francisco Cunha é sócio e consultor, também são negócios que estarão em alta na próxima década

buscamos a multidisciplinaridade, visando sempre a resultados mais eficientes e que pudessem atender às expectativas reais daqueles que nos procuravam”, lembra Flávia. Para continuar atualizada com as mudanças, a empresa busca se adequar às necessidades dos seus clientes. “Procuramos isto capacitando nossa equipe e participando de cursos, feiras, congressos e eventos do segmento de saúde e bem-estar. A ideia é sempre trazer novidades da área e técnicas cada vez mais modernas e qualificadas, além de lançar serviços que otimizem o tempo e resultados dos nossos clientes”, explica Carol. JUNHO/JULHO 2017 13


GASTRONOMIA

Tem Pancs na Caatinga Saborosas e nutritivas, as Plantas Alimentícias Não Convencionais ganham mais espaço na mesa dos sertanejos

por

FABIANO BARROS

E

las estão por toda parte, na beira da estrada, nos canteiros, nos quintais. Na maioria das vezes ignoradas, utilizadas apenas como fonte de alimento para os animais, ou com seu potencial nutricional subestimado. As Plantas Alimentícias Não Convencionais (Pancs) têm conquistado cada vez mais os grandes chefes de cozinha e começam a marcar presença nos pratos dos brasileiros. Essas plantas ganharam destaque no mês de abril, junto com um típico fruto do Semiárido nordestino - o umbu, durante a primeira edição do Festival Gastronômico Umbu Pancs, em Petrolina, no Sertão do São Francisco. Com a participação de renomados chefes de cozinha e uma programação que contou com feira de gastronomia e artesanato, aulas-show e seminário gastronômico, o festival teve o apoio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e

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Pequenas Empresas (Sebrae) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac). “No Sertão do São Francisco, nossos principais produtos são alimentos e bebidas. Nossas frutas, vinhos, sucos, peixes, carnes de caprino e ovino, tudo isso produz mais de 50% do PIB da economia regional. É preciso que essa cadeia de valor que envolve bares e restaurantes procure se destacar em busca de inovação e utilizando as Pancs para ter contato com outras experiências. O festival permite aos empresários conhecer novas técnicas, diversificando seus cardápios e fortalecendo a gastronomia regional”, afirma o analista do Sebrae no Sertão do São Francisco, Domingos Sávio Guimarães.


Fabiano Barros

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GASTRONOMIA

especialistas e observando as riquezas da mata branca, passou a utilizar sementes, caules, flores, folhas e frutos para criar e incrementar bebidas, pratos saborosos e com forte identidade cultural, que são servidos em seu restaurante - o Flor de Mandacaru, que existe há 11 anos em Petrolina. “Quando morava na roça, minha avó já usava coroa-de-frade, facheiro. Sempre comi algaroba. Comecei a inserir essas plantas nos pratos servidos no restaurante, depois apareceu o debate sobre as Pancs. Elas são muito ricas em nutrientes. Os cactos, por exemplo, são muito ricos em cálcio e têm propriedades medicinais, são diuréticos. A palma é termogênica. Eu tenho muito orgulho de ser sertaneja, do que temos no Sertão e que ainda é pouco explorado”, ressalta a chefe. As Pancs são alternativas para criar pratos mais diversificados, ampliar as fontes naturais de nutrientes na alimentação. Sua utilização também resgata saberes tradicionais, fortalecendo a cultura local.

Fabiano Barros

Único bioma exclusivamente brasileiro, a caatinga, ou mata branca, destaca-se pela grande variedade de Pancs. Facheiro, palma, maracujá do mato, coroa-de-frade são algumas dessas espécies. Juntam-se a elas outras variedades invasoras que se adaptaram bem ao bioma como a algaroba. As cactáceas como a palma e o facheiro dominam a lista de plantas da caatinga que podem ser utilizadas em diversas receitas. Seus caules suculentos já são utilizados em pratos variados, da entrada à sobremesa, além de incrementarem bebidas. Antes mesmo das Pancs fazerem a cabeça dos chefes, essas plantas que brotam com facilidade em qualquer canteiro do Sertão já eram um hábito para a chefe Jucilene Melo, uma das coordenadoras do festival. Natural de Campo Santo, na época zona rural de Petrolina e hoje distrito do município de Santa Filomena, ela cresceu provando os pratos preparados por sua avó, que sempre incluíam as Pancs. Anos depois, realizando pesquisas, conversando com

Tarte de algaroba, recheada com creme de coco verde e praliné de ouricuri. Decorada com folhas de umbu e doce de caramelo

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Carlos Laerte

Comecei a inserir essas plantas nos pratos servidos no restaurante, depois apareceu o debate sobre as Pancs. Elas são muito ricas em nutrientes

A chef Jucilene Melo passou a utilizar Pancs para criar e incrementar pratos em seu restaurante

São espécies de plantas pouco exploradas, que podem ser produzidas em maior escala a partir do interesse do consumidor, que precisa descobrir novos sabores. A variedade de iguarias que podem ser preparadas com as Pancs é ilimitada. Durante o festival, os chefes apresentaram, em aulas-show, bons e deliciosos exemplos dessa variedade. O chefe Clodomiro Tavares surpreendeu ao apresentar o surubim defumado com Pancs, sucos de palma, salada de Pancs e Pancs com ovos mexidos e queijo de cabra. Já o chefe Cumpade João apresentou no festival duas receitas: o leite ferrado, preparado com pedra e mastruz, e o “bobode”, um bobó de bode. As chefes Jucilene Melo e Geórgia Romero prepararam a “matulinha de palma”, um creme com palma e queijo de cabra servido em cambraia de tapioca e decorado com flores comestíveis da caatinga. Uma linguiça de Maracaju com Pancs foi o prato apresentado pelo chefe Paulo Machado. Para a sobremesa, o chefe Moacir Sobral ensinou a preparar

ganache de chocolate com leite de ouricuri, geleia de umbu e crumble de ouricuri e cumaru. Ainda na sobremesa, foi servido pelo chefe Robson Trindade uma tarte de algaroba recheada com creme de coco verde e pralinée de ouricuri. Com os temas “Valorização da comida brasileira” e “A cozinha nordestina revisitada”, as palestras do seminário gastronômico foram ministradas, respectivamente, pelos renomados chefes Paulo Machado e Moacir Sobral. O sulmato-grossense Paulo Machado e Moacir Sobral, que é professor do curso de Gastronomia da Universidade Fluminense do Rio de Janeiro (UFRJ), defenderam que é importante para as regiões se sustentarem a partir dos alimentos do seu bioma, criando uma identidade. Os profissionais de gastronomia têm um papel importante na divulgação desses alimentos. Para os interessados em saber mais sobre as Pancs, uma boa fonte de informação é o livro “Plantas Alimentícias Não Convencionais no Brasil (Pancs)”, de Valdely Ferreira Kinupp e Harri Lorenzi, publicado pela editora Plantarum. JUNHO/JULHO 2017 17


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TENDÊNCIAS

Consumo com

causa

Além de serem temas cada vez mais recorrentes na sociedade, ideologias relacionadas à raça, gênero, sexualidade ou defesa dos animais geram um nicho de mercado por

ULYSSES GADÊLHA

O

engajamento em causas geralmente referentes a questões de gênero, raça, sexualidade ou defesa dos animais está cada vez mais presente, principalmente nas redes sociais, e este movimento vem sendo enxergado também como um nicho de mercado. De acordo com uma pesquisa recente da consultoria Ana Couto Branding, 68% dos consumidores brasileiros entre 18 e 24 anos optam por produtos e serviços que tenham uma causa agregada. Esse público engajado passa a ser o horizonte de empreendedores que visam a desenvolver um relacionamento duradouro com o cliente. Segundo a analista do Sebrae em Pernambuco Conceição Moraes, não se vende mais um produto ou serviço, e sim uma proposta de valor baseada na confiança. A Ana Couto Branding classifica as empresas

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em três tipos: um grupo mais convencional é assentado na relação meramente comercial e ganha o cliente pelo preço; outra categoria de marcas estabelece relacionamento com o consumidor, oferecendo benefícios e criando campanhas; o terceiro tipo é formado por marcas que se preocupam com um propósito, se engajam em movimentos e oferecem um produto cuja procedência pode ser observada pelo consumidor. Nesse terceiro caso, encaixam-se, por exemplo, salões de beleza e marcas de cosméticos voltados para o público afro, que acredita no cabelo crespo ou cacheado como um reconhecimento da raça, com importância de afirmação de cultura e identidade. Criado em 1992, por Aldiceia Nascimento, de 63 anos, no bairro de Setúbal, o salão Afro Baloguns – palavra do dialeto iorubá que significa “chefe de guerra” – hoje é referência para o público do movimento negro no Recife. “Nosso


Flรกvio Costa

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salão cresceu dentro do movimento negro. Para nós, é gratificante fazer parte dessa resistência. Nossa maior procura é pelas tranças e penteados black power”, relata Celi Nascimento, 32, filha de Aldiceia. Junto com o irmão Moisés Eduardo, 35, Celi toca a empresa familiar, atendendo cerca de quatro clientes por dia. “As pessoas têm nos procurado mais devido a essa mudança na visão da sociedade sobre o cabelo crespo e cacheado. Muita gente chega aqui sem saber nada sobre as ideias atreladas ao cabelo afro. Nós conversamos com os clientes e muitos saem literalmente com a cabeça feita, o que nos dá mais confiança no nosso trabalho”, esclarece a cabeleireira. Mas não é só a defesa da identidade racial que vem inspirando os empreendedores. A discussão de identidade de gênero também está influenciando segmentos como o de vestuário, por exemplo. A maneira como alguém se sente e se apresenta, como masculino ou feminino, independente da sexualidade, e o direito de se expressar dessa forma fazem aumentar a demanda por roupas unissex. Marcel Pereira, 24 anos; Bruna Aureliano, de 22; e Mateus Melo, de 21, viram nessa discussão uma oportunidade de negócio e submeteram recentemente um projeto ao Marco Pernambucano da Moda, um centro de referência em profissionalização para novas empresas. O trio de sócios com formação em Design e Publicidade é responsável pela criação das peças sem gênero. A produção será terceirizada em comunidades de costureiras de Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste pernambucano. “Nós acreditamos que não existe sentido em impor um gênero na peça de roupa. A pessoa que usa deve decidir e construir seu próprio estilo”, explica Marcel. Ainda na fase de formatação do modelo de negócio, eles pretendem criar a identidade visual da marca e expor algumas peças já no mês de maio. 20

Flávio Costa

TENDÊNCIAS

Celi Nascimento destaca que a procura pelo salão de sua família tem aumentado devido à mudança na visão sobre cabelos crespos e cacheados

CAUSA ANIMAL Não são apenas questões ligadas a direitos e liberdades do ser humano que acaloram discussões e movimentam o mercado. A preocupação com o sofrimento dos animais fez surgir o veganismo e, com ele, várias oportunidades de negócios. Os adeptos desta forma de viver buscam evitar todas as formas de exploração e crueldade contra animais. Assim, aumenta-se a variedade de empreendimentos que não vendem ou fabricam produtos com ingredientes de origem animal. Há também os que não testam seus produtos nos bichos. Apesar de não ser vegano, Humberto Cavalcanti, 25 anos, se lançou nesse mercado, mais especificamente no segmento de alimentos. “Em 2016, um amigo me deu sugestões dessa


Além de fornecer os produtos, a ideia é conscientizar sobre o que de fato é veganismo e conseguir alcançar e demonstrar essa cultura para o máximo possível de pessoas

Flávio Costa

culinária e foi amor à primeira garfada. Daí eu percebi que o tema, embora estivesse em alta, ainda não contava com boas opções no Recife”, conta Cavalcanti. Seu primeiro espaço de trabalho foi um quiosque, depois passando a atuar em um food park e, recentemente, inaugurou a primeira loja fixa, sob a marca “VeganU”, que fica no bairro da Madalena. “Entre as opções do nosso cardápio estão quibe de soja, pães recheados, esfirras de jaca, risoles. Nosso conceito é traduzir todo o formato junkie food tradicional para a vibe vegan. Além de fornecer os produtos, a ideia é conscientizar sobre o que de fato é veganismo e conseguir alcançar e demonstrar essa cultura para o máximo possível de pessoas”, explica o empreendedor.

Inaugurada recentemente no bairro da Madalena, a VeganU tem como conceito traduzir o formato junkie food tradicional para a vibe vegan

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ENTREVISTA

“Quem se esquece de onde veio, não sabe pra onde vai” Poeta desde os 14 anos, Bráulio Bessa usou a internet para promover um verdadeiro resgate da literatura de cordel através das redes sociais. Seus vídeos com declamações já ultrapassaram a marca de 40 milhões de visualizações. Sua poesia também é propagada através do programa Encontro com Fátima Bernardes, da TV Globo, onde integra o elenco fixo com o quadro Poesia com Rapadura. Criou o projeto Nação Nordestina com mais de um milhão de fãs/seguidores e um alcance médio de dez milhões de pessoas por mês. Considerado hoje o maior ativista da cultura nordestina na internet, Bráulio viaja pelo Brasil com uma palestra repleta de “causos” da sabedoria popular e humor, tudo isso interligado à motivação e ao empreendedorismo. Por

LIDIANNE BARROS

fotos

RODRIGO MOREIRA

Como um “matuto sonhador”, conforme você se intitula, transformou-se em um dos mais importantes empreendedores sociais do país? Eu descobri que era um empreendedor social por acidente, nem eu sabia. Não tinha noção de que esse meu trabalho tinha um impacto social e cultural tão forte. Certo dia, um amigo de Maceió me ligou me convidando para fazer uma palestra, e eu nunca havia feito palestras. Ele disse que eu tinha um case de sucesso e que eu era um tal de “grande empreendedor social”. Então fui tentar entender o que era aquilo, foi quando realmente vi que o trabalho que eu 22

desenvolvia, e ainda desenvolvo, tem um cunho social muito forte e desencadeia o resgate da autoestima e da cultura do povo nordestino. As aparições na TV também foram algo decisivo para que eu me transformasse em um dos maiores empreendedores sociais do país. Foi decisivo este sentimento de representatividade, das pessoas se enxergarem naquele “caba” ali que está na televisão, na maior emissora do Brasil, e perceberem que ele não perde a identidade, pelo contrário, ainda reforça. Eu acho que este sentimento de representatividade vem mais forte do que o encantamento pela minha poesia.


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ENTREVISTA

Qual a razão do regionalismo ter ficado em alta novamente? O que provocou esse resgate das raízes nordestinas? Isso vem de um processo de resgate da autoestima do povo nordestino, e a tecnologia - mais especificamente as redes sociais tem um papel essencial. Em 2011, criei um movimento para reunir um milhão de pessoas para defender a cultura do Nordeste e, de certa forma, apresentar essa cultura para o próprio nordestino, que, por vezes, a desconhece. E deu certo! Isto tocou as pessoas de maneira muito forte e muitas já entendem que, para se comunicar com as outras, precisam falar sua língua. Então, quando alguém quer falar para o nordestino, deve falar na língua do nordestino. Mas, quando me refiro à língua, não estou me referindo ao sotaque nem a dialetos, estou falando de sentimento, de verdade, estou me referindo à identidade cultural. Com esse entendimento, o nordestino passa a não se enxergar mais como inferior. O “caba” hoje bate no peito e diz: “Tenho orgulho de ser nordestino”! Como consequência desse resgate da autoestima, há o processo da chegada do regionalismo, a princípio na internet, depois muito forte também na televisão e na publicidade. É como eu digo em um poema meu: “Quem se esquece de onde veio, não sabe pra onde vai”. Significa que você precisa estagnar, mas é importante olhar para trás para ter referências para não perder suas raízes. De que forma a sua trajetória de resgate à cultura popular nordestina influencia empreendedores de todo o Brasil? Hoje eu tenho oportunidade de falar para empreendedores, principalmente nas palestras, e acredito muito que quem está ali no palco tem o dever e a missão de ser verdadeiro, honesto, real. Eu não estou ali para ser um personagem, para ser abstrato, eu estou ali para ser humano, para ser tocado e ser sentido. E 24

acho que as pessoas gostam de se ver nisso, o que resulta em uma influência, uma admiração, que acaba gerando também um sentimento de representatividade. Percebo que as pessoas olham para mim e se sentem como eu, humanas. E a minha mensagem é esta, então eu acredito realmente que as pessoas se sentem influenciadas pelas palavras desse “matuto véi” aqui. Em que consiste o “jeito arretado de empreender”? Muita gente está acostumada a associar empreendedorismo a ganhar dinheiro e eu acho que não é isso. Tento quebrar este paradigma. Acredito que dinheiro é uma consequência de uma atitude empreendedora, por isso falo mais da questão dos valores, do que você deve priorizar na sua vida, sem querer dar fórmulas de sucesso. Eu conto a minha história e falo dos meus valores, da minha missão, e aí cada um absorve isto da melhor forma e, talvez, esse “jeito arretado de empreender” acaba por se multiplicar. O que a poesia e o empreendedorismo têm em comum? O empreendedor tem que ser muito criativo, tem que enfrentar desafios, precisa criar alternativas, ele tem que pensar. Então o poeta, antes de qualquer coisa, é um pensador, é um formador de opinião, ele é uma fábrica de ideias e isto sempre é usado com muito sentimento. Acredito muito que a gente pode fazer uma alusão aos cantadores de viola que têm a arte do improviso. Todo empreendedor também tem que ter essa arte do improviso, de solucionar problemas, vencer desafios e, no final das contas, ambas as coisas devem ser feitas com muita verdade e com muito carinho e cuidado, para que exista um resultado final satisfatório, seja uma bela poesia ou um negócio de sucesso. Eu acredito que isto tem muito a ver realmente.


A palestra/espetáculo ministrada por Bráulio Bessa fala de motivação e empreendedorismo de forma descotraída

Qual a importância da internet no resgate dessas raízes da cultura nordestina? Por que Nação Nordestina e Bode Gaiato arrastaram tantos seguidores? A gente tem que encarar a internet como aliada e não como vilã. Porque estamos acostumados a ver pessoas que acusam a tecnologia, as redes sociais, de ser vilã no processo de esquecimento das raízes, e eu não concordo. Acho que qualquer manifestação cultural de raiz deve usar a tecnologia (internet, televisão ou qualquer outra mídia) para fazer com que essa cultura chegue mais longe e encante mais pessoas. Então eu acho que realmente esse é o grande poder da internet neste aspecto. A sua presença em rede nacional, enaltecendo a cultura e o povo nordestino, mexe com a autoestima da região? Você percebe essa mudança de postura?

Em relação à minha presença na Rede Globo, a oportunidade de estar chegando em milhões de pessoas toda semana mexeu com a autoestima dos nordestinos, de um povo que se vê naquele momento. Eles olham para aquele “caba” que veio do Alto Santo, no Sertão do Ceará, que chegou ali e não se dobrou, não se moldou, e foi de verdade e é de verdade, e age com toda naturalidade e honestidade possível. Isto encanta realmente. Daí vem um sentimento de representatividade que mexe com a autoestima do “caba”, que vê um cearense, do Sertão, do interior, de uma cidade pequena, ali no meio de grandes atores, apresentadores e cantores consagrados, sem perder a essência. Então eu acho que isto mexeu realmente com a autoestima das pessoas - e ainda mexe. Se fosse eu, me colocando no lugar do público, ficaria muito feliz de ver alguém assim, carregando e levantando essa bandeira da “nordestinidade”, da cultura de raiz, para milhões de pessoas. JUNHO/JULHO 2017 25


MERCADO

BRECHÓ desapego que vale dinheiro Lojas do segmento são oportunidades para comercializar produtos usados de qualidade com preço acessível por

LUIZA ALENCAR

P

fotos

FLÁVIO COSTA

eças e acessórios que ficam em seu guarda-roupa sem uso por muito tempo podem ser uma boa oportunidade para ganhar dinheiro. É que, com o orçamento reduzido, os consumidores buscam produtos mais em conta, sem perder a qualidade. E é neste momento que os brechós ganham força e começam a se consolidar. Derrubando o preconceito e valorizando questões como a sustentabilidade, foi-se o tempo em que este segmento de mercado significava antiguidade. Brechó, hoje, é sinônimo de excelente opção de compra de roupas, bijuterias, bolsas, calçados e acessórios pessoais. “Se tenho algo que há dois anos não uso, não tem por que estar no meu guarda-roupa. Posso desapegar, vender por um preço mais em conta e dar usabilidade ao produto”,

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grifa Verônica Ribeiro, analista do Sebrae/ PE. Ela ressalta ainda que as compras nas lojas do gênero, que podem ter ponto físico ou virtual, possibilitam uma economia de até 80% em relação às lojas tradicionais. E foi pensando em desapego que a estudante Alexia Melo firmou sociedade com uma amiga e deu início ao brechó virtual Oxe! Garimpo, no Instagram. As sócias, que atuam no segmento há cerca de nove meses, encontraram neste nicho de mercado a chance de ganhar dinheiro. “De um modo geral, foi questão de desapegar de algumas coisas e enxergar a possibilidade de ter alguma renda por isso. Conversando, tivemos a ideia de juntas montarmos um brechó com um preço para lá de acessível, associado aos conceitos de sustentabilidade”, explica. “Antes nós enxergávamos certo preconceito em comprar roupas e


Para Lara Vilarim, gerente do Cabine Brechรณ, a busca tem aumentado devido ao preรงo e ao consumo consciente

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MERCADO

Confira algumas dicas do Sebrae para empreender na รกrea

Mantenha sua loja de brechรณ bem organizada, iluminada e limpa

Divulgue seu negรณcio por meio de redes sociais, via e-mail e na vizinhanรงa Capriche na qualidade dos produtos vendidos em sua loja Participe de eventos coletivos Pratique preรงos justos 28


acessórios usados. As pessoas tinham receio, afinal não temos essa cultura tão forte de comprar em brechó aqui. Depois de um tempo - acredito que pela qualidade das peças e pelo atendimento diferenciado que damos às clientes, a procura foi aumentando”, complementa Alexia. No mercado há 13 anos, o Cabine Brechó também vem percebendo um aumento na procura por produtos usados. “Cada vez mais as pessoas estão procurando esse novo mercado sustentável. Primeiro pelo preço e segundo por um consumo mais consciente”, ressalta Lara Vilarim, gerente do brechó. Aliás, o negócio surgiu a partir da ideia de manter

o guarda-roupa sempre renovado, além da possibilidade de dar circulação aos produtos e estar sempre em contato com novas pessoas. No entanto, abrir um brechó não significa juntar roupas e produtos velhos, e colocálos à venda. Assim como todo negócio, é preciso planejar. “É uma loja. Você precisa ter cuidados como realizar a curadoria das peças, higienizar os produtos, conhecer o seu cliente e o seu nicho de mercado, apresentar bem o produto e possuir canais de comercialização”, ressalta Verônica Ribeiro. “Primeiramente é preciso não ter preconceito. Acredito que este é o passo inicial para você ter um ambiente livre e positivo”, complementa Lara.

No mercado há 13 anos, o Cabine Brechó vem percebendo um aumento na procura por produtos usados

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INSPIRAÇÃO

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Stock Photos

Trajetórias premiadas Talento, coragem e persistência são comuns às histórias de duas empreendedoras pernambucanas ganhadoras do Prêmio Mulher de Negócios do Sebrae

por

CLOVES TEODORICO NETO

N

atural do Rio de Janeiro (RJ), Cinthia dos Santos Almeida, 39 anos, mora desde os 14 anos no Recife e sempre teve vocação empreendedora. Durante o período em que morou no Rio, acompanhou seu pai na experiência comercial de vendas em barracas de camelô. Seu avô também era comerciante, dono de uma barbearia que não alcançou voos mais altos. “Eu via tudo dando muito certo no começo, mas ao mesmo tempo dando errado. As coisas se perdiam. Faltava planejamento. Eles eram comerciantes, mas não administradores”, conta Cinthia. Ela trabalhou em vários negócios – sempre voltados para a área de vendas. Em 2001, foi para uma empresa de segurança, onde exerceu funções das mais variadas: telefonista, vendedora, supervisora, coordenadora, até chegar ao cargo de gerente comercial. “Quando ocupei a função de gestora, tive a oportunidade de entender detalhadamente o

que era, de fato, um negócio. Minha carreira estava em ascensão, até que tive que escolher entre o trabalho e minha família, com a qual passava cada vez menos tempo”, comenta. Teve, então, coragem de desistir da carreira na empresa e dedicar-se à família. Foram 10 meses desempregada, pensando num novo rumo para a vida profissional. Esse período serviu para recordar experiências vividas e traçar metas para abrir seu próprio negócio. “Voltei a estudar. Fui buscar o Sebrae. Por meio deles, fiz inúmeros cursos, até que fiz meu Plano de Negócio na área de beleza”, enfatiza a empresária. Em 2010, Cinthia abriu a Deep, empresa instalada no bairro da Madalena, que iniciou oferecendo serviços de depilação. Em 2011, passou a contar com serviços de unhas. Numa ampliação constante, em 2012 contava com serviços para cabelos, em um novo endereço. Hoje a Deep se transformou em Depp Espaço de Beleza e Bem-Estar. De um, o número de funcionários saltou para 22. Além da Deep, JUNHO/JULHO 2017 31


INSPIRAÇÃO

vendinha. Ali eu já dava dicas, observava o funcionamento do simples e pequeno negócio. O sonho da minha mãe era ter algo maior e este sonho se tornou meu também”, conta. Ana Maria trabalhou como balconista em uma farmácia e também foi, durante muito tempo, cozinheira. Num restaurante conceituado de Arcoverde, fazia de tudo um pouco. Era a responsável administrativa, cuidava do financeiro, efetivava pagamentos, além de comandar a cozinha do estabelecimento. “Eu percebi que conseguia dar conta de muitas coisas ao mesmo tempo. Me entregava ao trabalho para realizar um serviço de qualidade e vi que faria com ainda mais amor algo que fosse meu e da minha família. Então montei um planejamento para abrir um restaurante”, detalha. Em seguida, Ana Maria pesquisou a realidade socioeconômica do bairro onde morava e

Rodrigo Moreira

a empreendedora está à frente da barbearia Seu Jorge, negócio que abriu para homenagear seu pai e seu avô. “O que aprendi na minha vida eu aplico com minha equipe todos os dias. Sou casada, tenho três filhos e não quero deixar de crescer. Temos muitos planos para o futuro e, com cautela e planejamento, espero colocá-los em prática”, finaliza. No ano de 2015, Cinthia foi premiada na categoria Empresa de Médio Porte do Prêmio Mulher de Negócios, realizado anualmente pelo Sebrae. Outro exemplo de empreendedora, que também conquistou o Prêmio Sebrae Mulher de Negócios, vem da cidade de Arcoverde, no Sertão de Pernambuco. Ana Maria Bezerra Cleophas, 41 anos, ainda na infância ajudava seu pai a comercializar banana na feira livre e, sua mãe, na venda de doces em uma pequena bomboniére da família. “Eu dividia meu tempo com os estudos e ajudando nessa

Com a história do Mercadinho Santa Catarina,Ana Maria Bezerra venceu, em 2015, o Prêmio Sebrae Mulher de Negócios

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Rodrigo Moreira

À frente do Depp Espaço de Beleza e Bem-Estar, Cinthia Almeida foi premiada na categoria Empresa de Médio Porte do Prêmio Mulher de Negócios, realizado anualmente pelo Sebrae

percebeu que a carência do local não para um restaurante, mas para mercadinhos. Para investir, Ana vendeu seu carro, quitou dívidas e, com o restante do dinheiro, comprou itens que estavam em promoção num supermercado, passando a revendêlos na sua residência. “No começo, eu levava na porta do cliente a mercadoria. Quando não tinha estoque do produto que eles queriam, eu comprava. O mercadinho foi crescendo na base da confiança dos moradores e no dia a dia do trato com meus clientes, que viraram amigos”. Com a história do Mercadinho Santa Catarina, existente há seis anos, Ana Maria venceu, em 2015, o Prêmio Sebrae Mulher de Negócios e, hoje, planeja continuar expandindo.

Sobre o Prêmio Mulher de Negócios Para reconhecer o talento e a trajetória de histórias de sucesso que tenham como personagens principais as mulheres, o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) realiza, anualmente, o Prêmio Mulher de Negócios. A iniciativa conta com a parceria da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) e a Federação das Associações de Mulheres de Negócios e Profissionais do Brasil (BPW), com apoio técnico da Fundação Nacional da Qualidade (FNQ).

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DESENVOLVIMENTO

Um canavial de oportunidades Famosa pela economia açucareira, Zona da Mata Norte pernambucana cresce diante da chegada de empreendimentos. Ambiente é cada vez mais favorável ao pequeno negócio Por

ERICKA FARIAS

A

paisagem que era tomada tradicionalmente pelos intermináveis canaviais vai aos poucos mudando. A chegada das grandes indústrias e a falência de algumas usinas que moíam cana-de-açúcar foram os principais responsáveis por mudar não só o horizonte, mas também a economia da região. As grandes fábricas apenas abriram a porta para gerar um ambiente favorável ao empreendedorismo.

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A Zona da Mata Norte pernambucana ocupa uma área de 8.404,5 km² e é formada por 19 cidades, sendo as mais populosas Goiana e Carpina. “A economia canavieira ainda é importante, mas perdeu peso na região”, destaca a economista, sócia e diretora da Consultoria Econômica e Planejamento (Ceplan), Tânia Bacelar. O surgimento de grandes indústrias ocupou a lacuna existente e ainda oportunizou o advento de novos negócios. “É comum que grandes empreendimentos não cheguem


aquém das necessidades e exigências da demanda regional foram alguns dos principais obstáculos apontados por eles durante estudo realizado pelo Sebrae, em parceria com a Fecomércio/PE. “Tanto os projetos de atendimento, quanto os de articulação institucional priorizam ações de estímulo à formalização e promoção da capacitação em gestão dos pequenos negócios, atentando para a adequação da habilidade de gestores e funcionários às tendências de mercado, e o apoio à qualificação de empresas locais para se tornarem fornecedoras das grandes empresas”, enumera Leonardo Carolino. HISTÓRIA, PRAIA E DIVERSÃO Tanto a economista Tânia Bacelar quanto o gerente da Unidade do Sebrae/PE, Leonardo Carolino elegem o turismo como uma das grandes potencialidades ainda pouco exploradas na Mata Norte pernambucana. “A região tem um litoral belíssimo e carrega uma vasta herança cultural do nosso povo. Já foram realizados alguns projetos para fomentar a visitação da área, mas ela ainda pode ser mais explorada. O aumento do fluxo de pessoas torna o ambiente

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Edson Figueiredo (com ilustrações Stock Photos)

sozinhos. Vários outros se instalam nas proximidades para atender às demandas daquela fábrica”, explica a economista. Além da Fiat, localizada na cidade de Goiana, a região possui um polo vidraceiro e uma fábrica da Hemobrás. “Quando uma indústria chega a uma região, ela vai gerar muitos empregos durante a construção e também na fase de funcionamento. São criadas ocupações sistêmicas em todo o entorno, uma vez que a renda média da população local cresce. Isto potencializa o surgimento de pequenos e médios negócios”, ressalta Tânia Bacelar. Na zona urbana das cidades, é visível o crescimento do comércio varejista e de serviços. “Lojas de vestuários e acessórios, mercadinhos, bebidas, autopeças, oficinas, salões de beleza, bares, restaurantes, obras e construção civil são exemplos de empreendimentos mais encontrados”, afirma Leonardo Carolino, gerente da Unidade da Mata Norte do Sebrae em Pernambuco. Apesar do ambiente favorável, alguns entraves ainda são enfrentados pelos empreendedores locais. Informalidade, baixa cultura empreendedora, limitações na oferta de mão de obra qualificada e qualidade da oferta de bens e serviços


DESENVOLVIMENTO

mais favorável para o desenvolvimento do comércio”, ressalta Tânia Bacelar. Leonardo Carolino enxerga ainda mais potencialidades para a região. “Áreas como os segmentos de transporte e turismo, serviços de saúde e educacionais, recreação, cultura e esportes, bem como um rol de atividades ligadas aos profissionais liberais, possuem oportunidades de negócios para se empreender”, esclarece. PROGRAMA LÍDER AJUDA NO DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO

Flávio Costa

Com o objetivo de mobilizar lideranças locais para a criação, formulação e implantação de ações que contribuam para o desenvolvimento regional, o Programa

Líder (Formação de Liderança para o Desenvolvimento Regional) chegou à Mata Norte para integrar os setores público e privado e o terceiro setor, em prol do crescimento e fortalecimento de uma cultura empreendedora. O lançamento aconteceu no dia 14 de março, na cidade de Carpina, e contou com o apoio de empresários e líderes locais. A metodologia Líder foi implantada inicialmente no Sul do país e apresentou resultados promissores. “Esse programa é estratégico. O projeto é consolidado no Rio Grande do Sul. Tem sido usada essa plataforma para se discutir não somente as ações do Sebrae, mas também as do governo, sendo possível, desta forma, priorizar os projetos combinados, levando à melhoria do ambiente de negócios para as micro e

A Zona da Mata Norte conta com uma vasta herança cultural, que pode ser ainda mais explorada por meio de projetos que fomentem a visitação

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Rodrigo Moreira

Empresários e líderes locais estiveram presentes no lançamento do Programa Líder (Formação de Liderança para o Desenvolvimento Regional), em Carpina

pequenas empresas”, ratifica o superintendente do Sebrae em Pernambuco, Oswaldo Ramos. A partir desse lançamento até maio, a Unidade Mata Norte do Sebrae/PE atua na sensibilização e formação de um grupo de trabalho. A expectativa é reunir, no mínimo, 45 lideranças de toda a região para dar início aos encontros do programa. Em oito reuniões mensais, de 12 horas de duração, os participantes definirão uma agenda que relacione as principais dificuldades da Mata Norte e ofereça soluções integradas. Desta maneira, entidades de incentivo, instituições financeiras e o próprio Governo do Estado poderão atuar com maior efetividade. “O Líder trabalha com convergências. Nunca tivemos nenhuma divergência séria nos grupos. A atuação é coesa e integrada para a construção de um processo de articulação e desenvolvimento da capacidade de pensar em longo prazo”, ressalta Augusto Portugal, consultor do Sebrae responsável pela apresentação do programa em Carpina.

Sebrae na Mata Norte O Sebrae atua na Mata Norte desde abril de 2016. A unidade funcionou durante um ano em sede provisória e ganhou sede própria em abril de 2017, localizada na Rua Luiz Gomes, 125-A, no Centro, em Goiana/PE.

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EMPREENDEDORISMO

Negócios em família Mais da metade das micro e pequenas empresas brasileiras reúne parentes nos papéis de sócios ou colaboradores, segundo recente pesquisa do Sebrae Por

MAÍRA PASSOS

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fotos

FLÁVIO COSTA

á quem diga que “santo de casa não faz milagre”, mas a maioria dos micro e pequenos empresários brasileiros acaba optando por trabalhar com a família. É o que revela recente estudo realizado pelo Sebrae Nacional, mostrando que 68% dos pequenos negócios reúnem parentes nos papéis de sócios, empregados ou colaboradores. Mas trabalhar com pessoas tão próximas, onde o relacionamento vai além do ambiente da empresa, pode trazer vantagens e desvantagens. Para que haja sucesso nessa relação, de acordo com Vítor Abreu, analista do Sebrae em Pernambuco, a orientação principal é entender o conceito de empresa familiar sem abrir mão, porém, das premissas de uma boa organização empresarial. “Entre os passos fundamentais

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a seguir, determine os papéis e obrigações de cada um, enumere as expectativas em relação ao negócio, defina a distribuição de lucros, pontue direitos e deveres, e realize avaliação constante de desempenho da equipe”, explica. Segundo o analista, atuar com um familiar é bastante desafiador, pois envolve relações pessoais que vieram antes do negócio. “O principal risco é o da não correspondência de um dos envolvidos em relação ao desempenho. Neste caso, é preciso agir com profissionalismo, inclusive com possibilidade de desligamento da empresa. Os erros e falhas não podem ser acobertados por serem de um familiar”, orienta. Já entre as vantagens, que também são muitas e agradam à maioria dos pequenos empreendedores brasileiros, como foi mostrado na pesquisa inédita do Sebrae, a lealdade dos colaboradores é um dos pontos fortes. “Por serem da mesma família, os membros


O casal Danielle Leal e Rodrigo Gonçalves são sócios do Café Zoco. Silvana Sena, mãe de Danielle, também atua no empreendimento

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EMPREENDEDORISMO

Por serem da mesma família, os membros tendem a ter maior confiança uns nos outros. Isto facilita o relacionamento e o envolvimento no negócio, podendo resultar em um maior engajamento

tendem a ter maior confiança uns nos outros. Isto facilita o relacionamento e o envolvimento no negócio, podendo resultar em um maior engajamento por parte dos membros”, avalia Vítor. Sobre a sucessão familiar, deve ser observado se o sucessor terá realmente interesse em seguir com a empresa. “Ressalto ainda que, em alguns casos, os sucessores ou membros da família não reúnem competência, conhecimento ou interesse para seguir com o negócio. Neste caso, recomenda-se que não façam parte da gestão necessariamente, mas possam atuar em um ‘Conselho’, que acompanhará a empresa de forma mais estratégica, sem intervir na gestão do dia a dia”, sugere o analista. Quem optou por trabalhar com familiares foi o casal de empreendedores Danielle Leal e Rodrigo Gonçalves, sócios do Café Zoco, que funciona há um ano 40

Sócios do Instituto de Desenvolvimento Educacional (IDE), Nathália Melo e Fernando Fernandes são parceiros nos négócios e na vida

em Casa Caiada, Olinda. “Não restringimos que teria que ser alguém da família. Porém, sabíamos de pessoas próximas disponíveis e que já conhecíamos as características, o que acabou resultando na contratação de parentes”, lembra a empresária Danielle. Atualmente atuam na Zoco a mãe, o pai e o irmão de Danielle, além da irmã e do primo de Rodrigo. A empresária conta que parte da equipe trabalha diariamente e outros dão suportes pontuais. “O mais legal é que todos torcem de verdade pelo


sucesso do negócio, vestem a camisa, dão ideias e vão além das suas atividades”. Os empresários Fernando Fernandes e Nathália Melo são outro casal parceiro nos negócios e na vida, sendo sócios do Instituto de Desenvolvimento Educacional (IDE), instituição com 10 anos de atuação e expertise em cursos de extensão e pósgraduação na área de saúde, com sede no Pina, Recife. Segundo a empresária, que comanda a Diretoria de Marketing da organização, a relação profissional

e pessoal dos dois funcionou por estarem juntos desde o início do IDE. “Na época, eu tinha 20 e Fernando 24 anos. Estávamos no começo e precisávamos trabalhar triplicado para compensar o menor investimento e a equipe reduzida, naquele tempo. Foram muitas noites viradas e, caso não estivéssemos trabalhando juntos, talvez até não entenderíamos a ‘ausência’ do outro”, recorda. Para ela, apesar dos desafios diários, trabalhar em família compensa por poder viver o mesmo sonho com alguém tão próximo. JUNHO/JULHO 2017 41


ARTIGO

A reforma trabalhista por

JOSÉ DE ALMEIDA QUEIROZ*

O tema vem dividindo opiniões entre especialistas em Direito do Trabalho, economistas e dirigentes sindicais. Questionase que seria a oportunidade de rever a nossa organização sindical, embora a Consolidação das Leis do Trabalho, com 74 anos da sua existência, tenha ficado desatualizada, considerando os avanços sociais, econômicos e tecnológicos. Praticamente a legislação celetista sobrevive de súmulas editadas pelo Tribunal Superior do Trabalho e suas jurisprudências. Entendemos que a proposta enviada ao Congresso Nacional pelo Poder Executivo e aprovada pela Câmara dos Deputados, no dia 26 de abril, foi adequada, pois estabeleceu livre negociação entre as entidades sindicais patronais e laborais, sem precarizar as relações do trabalho, permitindo maior celeridade, redução de custos sociais e possibilidade de geração de emprego, destacando-se: • prevalência do negociado entre as partes sobre o legislado; • alternativa de contratação de empregado na forma de 12 horas seguidas e descanso de 36 horas; • maior flexibilidade na modalidade de remuneração (por comissão, produção, tempo parcial e terceirização na atividadefim);

• concessão de férias em até três períodos,

mediante negociação das partes; contrato de trabalho ser extinto de comum acordo, inclusive na liberação da parcela e multa do FGTS; • plano de carreiras ser estabelecido entre empregados e empresas, sem necessidade de registro no Ministério do Trabalho. Quanto à extinção da contribuição sindical, não deveria ser objeto da reforma trabalhista, considerando a sua finalidade, que é a manutenção das entidades sindicais. No âmbito administrativo, é importante destacar a criação do Conselho Nacional do Trabalho, órgão colegiado de natureza consultiva, composto de forma tripartite e paritária, e formado por representantes do governo, dos empregadores e trabalhadores, visando a promover e fomentar a negociação coletiva e o diálogo social como mecanismos de solução de conflitos, relativos às relações de trabalho. Seria uma forma de permitir maior celeridade nas soluções de processos trabalhistas, já que a Justiça do Trabalho vem recebendo em torno de 4.000 processos anuais, cujas demandas são postergadas, algumas vezes por décadas. A matéria deverá ser apreciada ainda pelo Senado Federal.

*Assessor jurídico – Conselho Deliberativo Estadual do Sebrae.

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Stock Photos

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ARTIGO

Se você sonha em transformar um hobby apaixonante em um negócio, tome cuidado com algumas armadilhas... por

JOSÉ EDSON MONTEIRO*

Hobbies, na maioria das vezes, são uma parte essencial da vida das pessoas. A ciência comprova que melhora a produtividade e que o exercício de atividades desvinculadas da nossa profissão traz saúde e bem-estar. É possível que por isso muita gente alimente o sonho de transformar esta atividade ocasional em trabalho remunerado. O hobby, ao contrário do emprego, é escolhido porque traz prazer, é aquilo que você gosta de fazer. E, teoricamente, se você conseguir transformar essa atividade prazerosa em uma ocupação lucrativa, terá boas chances de ser feliz. Por outro lado, existe um grande risco de se frustrar, desperdiçar tempo e perder dinheiro, caso você aposte em algo inviável, pois, como qualquer outro processo de mudança, o caminho é repleto de armadilhas. É preciso entender que, ao escolher o hobby como negócio, não quer dizer que vai fazer somente aquilo que gosta, como algumas pessoas pensam. Pois, em organizações, existem atividades e processos que não são muito agradáveis, mas que precisam ser feitos. A experiência nos diz que a primeira grande armadilha é que, na ansiedade e no deslumbre, esquecemo-nos de colocar a razão no lugar da emoção e não planejamos adequadamente esta mudança. 44

Se você está pensando em converter o seu hobby em empresa, veja a seguir algumas coisas que devem ser levadas em consideração. Quanto realmente eu recebo do meu emprego atual? Normalmente não fazemos conta dos salários recebidos indiretamente, tais como plano de saúde, auxílioalimentação, transporte etc. Não lembramos que, como empresários, não vamos ter mais 13º salário, férias remuneradas mais um terço, participação nos lucros etc.


Ilustrações: Stock Photos

E vale uma reflexão: minha futura empresa será capaz de me remunerar de maneira igual ou parecida com o que ganho hoje? Para saber disso, tenho que elaborar um bom Plano de Negócios, baseado em pesquisa de mercado, fornecedores, perfil de cliente, valor do investimento, previsão de custos fixos (incluindo aí o pró-labore) e variáveis, previsão de faturamento, formação do preço de venda, lucratividade, rentabilidade e ponto de equilíbrio. Será que a diversão não poderá virar chatice quando tiver que encarar de maneira profissional? Hobbies costumam ser atividades de relaxamento. Se você os insere em um cenário de prazos, cobranças e preocupações, o que era só prazer pode ficar muito chato, ou seja, quando a recompensa pela atividade deixa de ser só o prazer e entra na equação a variável renda que você precisará obter, o hobby pode perder o encanto. Experimente fazer um ensaio de segunda a sexta-feira, talvez nas suas férias. Uma espécie de “test-drive”. Pode ser que sua atividade não tenha viabilidade financeira Por isso a importância do planejamento que falamos acima, da elaboração do Plano de Negócios antes de se lançar no mercado, para colocar no papel os sonhos, porque é mais fácil reformular ou até mesmo desistir enquanto se está no planejamento do que se lançar em uma aventura que pode ter consequências traumáticas, notadamente no aspecto financeiro. É preciso lembrar que até profissionais muito competentes e, às vezes geniais, não obtêm reconhecimento ou mesmo uma remuneração mínima para viver, por falta de reconhecimento do mercado.

É muito importante analisar de que maneira você pode ganhar dinheiro com o seu hobby antes de transformá-lo em profissão, isto é, será que sua atividade tem possibilidade de oferecer renda suficiente para suprir seu modo de vida? Será que você está pronto para ser empresário? Ao contrário dos negócios tradicionais, um hobby convertido em empreendimento exige capacidade de reinvenção e ousadia. Em muitos casos, a mudança significa novos hábitos, abandonar o amadorismo e encarar a vida de gestor profissional. Nem todo artista está pronto para gerir um negócio. É preciso ter perfil para vendas, ser ousado, confiante, capaz de ir atrás. Sem isso, você terá dificuldade para vencer nessa nova fase da vida. Por último, mas não menos importante, é bom lembrar que o retorno do investimento pode levar algum tempo e é sempre bom ter uma boa reserva financeira para esperar o tempo de maturação e a consequente volta do capital investido. Para obter assessoria na elaboração do seu Plano de Negócios, conte com o Sebrae. *Analista de Atendimento Individual do Sebrae/PE JUNHO/JULHO 2017 45


ARTIGO

Municípios do g100 demandam tratamento diferenciado e favorecido: dinamização econômica e modernização da administração tributária por

FERNANDO CLÍMACO*

A melhoria do ambiente de negócios, na perspectiva do que preconiza a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, configura, na última década, um dos eixos norteadores da atuação do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) junto aos municípios, em todas as regiões do país. É reconhecida a relevância das micro e pequenas empresas para a economia. Ao longo dos últimos 30 anos, foi crescente a participação dessas empresas na composição do PIB nacional, atingindo, em 2011, o percentual de 27%, conforme estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas1. Também é expressiva a contribuição das MPE na criação de postos de trabalho: no período 2000-2008, elas foram responsáveis por aproximadamente 54% dos empregos formais do país (SEBRAE, 2010a)2. Em 2008, os pequenos negócios respondiam por 51% da força de trabalho urbana empregada no setor privado, o equivalente a 13,2 milhões de empregos com carteira assinada e 38% da massa salarial (BRASIL, 2009)3. 46

A partir dessa compreensão e desde que a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa4 entrou em vigor, há dez anos, o Sebrae vem desenvolvendo uma estratégia de atuação para o ambiente de negócios com foco nos fatores que compõem a dimensão sistêmica de competitividade, tais como a desoneração e simplificação da política tributária, a redução da burocracia para o licenciamento empresarial, a política de crédito e a abertura de novos mercados através do uso do poder de compra das prefeituras. O desafio, todavia, tem esbarrado em óbices estruturais, especialmente nos municípios populosos (acima de 80 mil habitantes), com baixa receita corrente per capita e baixos níveis de renda da população. Esse grupo compõe o g100, um índice criado pela Frente Nacional dos Prefeitos5 para caracterizar cidades que possuem em comum indicadores sociais e financeiros muito abaixo dos alcançados pelos demais municípios e, consequentemente, uma limitadíssima capacidade de investimentos


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para tentar romper o ciclo de estagnação econômica em que se encontram. Pernambuco é o estado brasileiro com maior número de municípios no g100. São 16 municípios nos quais se encontram 35% da população, 43% das micro e pequenas empresas e quase 30% do PIB estadual. Estão distribuídos em todas as regiões, mas com prevalência na Região Metropolitana do Recife, com sete cidades. Por sua relevância, o grupo passou a ser prioritário para o Sebrae Pernambuco, que se associou ao esforço da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP) para garantir tratamento favorecido e diferenciado para os municípios do g100

através do Programa Fortalecer Municípios, realizado em parceria com a União Europeia. O programa mira dois gargalos estruturais: a baixa capacidade de arrecadação e a má qualidade dos gastos públicos. Por meio de consultoria especializada, gratuita, propõese a atuar na elaboração de projetos para o Programa de Modernização da Administração Tributária e da Gestão dos Setores Sociais Básicos (PMAT), que é do BNDES, “destinado a financiar projetos voltados à melhoria da eficiência, qualidade e transparência da gestão pública, visando à modernização da administração tributária e qualificação do gasto público nos municípios”6. O PMAT JUNHO/JULHO 2017 47


ARTIGO

proporciona, segundo dados do próprio BNDES7, um rápido aumento das receitas municipais (em média 30%) em até dois anos e melhoria do gasto público, reduzindo custos e tornando a gestão mais eficiente. O acordo de cooperação técnica entre o Sebrae Pernambuco e a FNP, formalizado em novembro de 2016, durante a 70ª reunião geral da FNP, em Campinas (SP), amplia

Mordenização da gestão

a atuação junto aos municípios do g100, lastreando essa atuação em dois eixos: 1) dinamização da economia municipal por meio da melhoria do ambiente para os pequenos negócios; 2) modernização da gestão com recursos financiados pelo PMAT. O que se espera, em médio prazo, é gerar sinergia entre os dois eixos. À medida que as melhorias geradas pela execução

Dinamização econômica

• Consolidação das redes de Prefeitos e Secretários • Maior eficiência na gestão com redução de custos e aumentos de receitas • Novo marco legal indutor do desenvolvimento local, da cultura empreendedora e da atração de investimentos • Implantação de políticas para dinamização econômica com foco nos pequenos negócios e na agricultura familiar • Ampliação do acesso ao crédito às empresas • Consolidação de redes Empresariais e ampliação do acesso a novos mercados

Melhoria dos índices g100 nos municípios

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Melhoria do ambiente de negócios


do PMAT reposicionam o município com soluções como revisão do marco legal, rede de fibra ótica, georreferenciamento, gestão do cadastro multifinalitário e Central de Atendimento ao Contribuinte, criam-se condições favoráveis ao investimento em políticas públicas focadas na melhoria do ambiente de negócios, tais como a plena implantação da Redesim e do registro empresarial 100% digital, a modernização do cadastro empresarial, a instalação da Sala do Empreendedor, a implantação de políticas para o Microempreendedor Individual (MEI), bem como na ampliação do acesso a novos mercados pela inclusão das MPE nas compras da prefeitura e pelas estratégias de integração produtiva local.

As políticas de desenvolvimento municipal, cumprindo seu papel, proporcionarão o ambiente propício, em médio e longo prazos, para o surgimento de uma nova dinâmica empresarial econômica nas cidades através do fortalecimento da rede local de pequenos negócios e parceiros institucionais, de maneira a fomentar uma cultura de empreendedorismo, inovação e autonomia produtiva e financeira do município. Cria-se, assim, um ciclo virtuoso, que contribuirá para a quebra do ciclo de estagnação econômica.

*Gerente da Unidade de Políticas Públicas do Sebrae/PE

Saiba mais sobre o assunto 1

Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae. Participação das Micro e Pequenas Empresas na Economia Brasileira. 2014. Disponível em: https://www.sebrae.com.br/Sebrae/ Portal%20Sebrae/Estudos%20e%20 Pesquisas/Participacao%20das%20 micro%20e%20pequenas%20empresas. pdf .

2

Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – Sebrae (Org.). Anuário do trabalho na micro e pequena empresa 2009. Elaboração do Dieese. São Paulo, 2010a. Disponível em: < http://www. sebrae.com.br/customizado/estudos-epesquisas/anuario_trabalho2008.pdf > .

3

BRASIL. Crédito para micro e pequenas empresas. 10 dez. 2009. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/agencia/images/ stories/PDFs/livros/livros/livro_micro_ pequenasempresas.pdf .

4

Lei Complementar 123/2006. http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp123. htm .

5

Anuário g100 2015. http://aequus.com.br/ cartilhas/g100_2015.pdf .

6

Disponível em: http://www.caixa.gov.br/ poder-publico/apoio-poder-publico/PMAT/ Paginas/default.aspx .

7

Disponível em: http://www.bndes.gov.br/ wps/portal/site/home/financiamento/ produto/bndes-finem-pmat/!ut/p/z1/04_ iUlDgAgL9CCADyIQSuGj9qLzEssz0xJLM_ LzEHP0I_cgos3gvCx9nD0sTA x93o2AzA8eAQENjj6BQI4tQU 30vsEaEfpAJ-HVEQHVAlcMp_

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DICAS

Cuide bem do seu salão de beleza Ao prestar serviços no segmento de beleza, estética e bem-estar, algumas normas técnicas exigidas pela Vigilância Sanitária precisam ser atendidas. Nesta edição do quadro “Dicas”, confira alguns passos que você deve seguir ao administrar um salão de beleza e ter sucesso em seu negócio.

3

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AMBIENTE SEMPRE LIMPO Todos os equipamentos e mobília do estabelecimento precisam ser higienizados com frequência. Cadeiras, macas, travesseiros e colchões merecem atenção especial, bem como o piso, as paredes e o teto. Evite o acúmulo de poeira, não deixe cabelos cortados no chão, mantenha o banheiro sempre limpo, separe o lixo comum do lixo proveniente de objetos perfurantes e tenha atenção com o controle de pragas.

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1

USE PRODUTOS REGULAMENTADOS Cosméticos e produtos químicos exigem cuidados e atenção. Certifique-se que está usando marcas regulamentadas pela Anvisa e dentro do prazo de validade.

INFRAESTRUTURA DE QUALIDADE Para prestar bons serviços, o ambiente precisa disponibilizar uma infraestrutura de qualidade e boas condições de trabalho. Acessibilidade, boas instalações, higiene, mobiliários que estejam em condições ergonômicas adequadas, boa iluminação, ventilação, proteção contra incêndios e espaço que forneça conforto.

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PROFISSIONAIS CAPACITADOS A capacitação dos funcionários permite uma prestação de serviços de qualidade. Para a Vigilância Sanitária, faz-se necessária a presença de um “responsável capacitado”, que seria um profissional comprovadamente qualificado, com curso cuja carga horária mínima seja de 40 horas. Já os profissionais que usam materiais e instrumentos perfurocortantes devem receber treinamento permanente, com carga horária mínima de 30 horas. O estabelecimento deve possuir cópias de todo os certificados.

ATENÇÃO AOS EPIS Escolha equipamentos e mobiliários que prezem pela ergonomia das atividades, facilitando o trabalho dos seus funcionários. Além disso, certifique-se que o seu salão faz uso de todos os Equipamentos de Proteção Individuais (EPIs) exigidos pelo Ministério do Trabalho (luvas, toucas, jalecos, máscaras, óculos de proteção, sapatos etc). Eles variam de acordo com cada função.

OLHO NA ESTERILIZAÇÃO Alicates, espátulas e outros materiais perfurocortantes ou de metal precisam ser limpos com solução de detergente enzimático e depois lavados em água corrente abundante ou lavadora ultrassônica. Após este processo, eles precisam ser esterilizados com uso de autoclave.



www.pe.sebrae.com.br ano 43 • nº 2 • JUNHO/JULHO 2017

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