ano 10 • nº 6 1 • abril/2009
eDUCaÇÃo Na WeB O ambiente virtual como extensão da sala de aula > trAnsforMAÇÕes o que é ser criança hoje?
> Aprender BeM isabel Parolin comenta sobre a importância da real aprendizagem
infância cidadã:
50 Anos da declaração dos direitos da criança
o que mudou e o que precisa avançar no brasil
carta ao leitor
Caro(a) leitor(a), A revista Atividades e Experiências chega ao seu décimo ano. Ao longo de uma década, a publicação trouxe várias matérias, artigos e entrevistas relevantes ao universo educacional e mostrou toda a criatividade e o comprometimento das Escolas Conveniadas ao Sistema Positivo de Ensino que, por meio dos projetos divulgados pela A&E, fazem da educação um instrumento para o desenvolvimento da sociedade. Além de mais quatro projetos pedagógicos, esta primeira edição da revista, em 2009, comemora o cinquentenário da Declaração dos Direitos da Criança e uma traz entrevista com o procurador geral de Justiça do Paraná, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, que explica a diferença entre a Declaração dos Direitos da Criança e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Nesta edição, há ainda, uma matéria sobre web e educação. Veja como o ambiente virtual pode potencializar a aprendizagem de sala de aula. A psicopedagoga Isabel Parolin fala sobre a importância da aprendizagem na seção Caixa de Ideias. Por fim, dicas importantes para professores no relacionamento com os alunos em sala de aula. Uma ótima leitura!
Emerson Walter dos Santos Diretor-geral da Editora Positivo
Atividades e experiências Ano 1º, nº 6, abril / 2009 Periodicidade: bimestral Conselho Editorial Emerson W. dos Santos, Fabrício Almada, Hélcio Simões, Márcio Santos, Naira Passoni Coordenação Editorial Naira Passoni Edição Diocsianne Moura, Fernanda Zattar e Naira Passoni Reportagem Diocsianne Moura, Fernanda Zattar, Naira Passoni e Melissa Castellano Revisão Adriana A. L. Scrok Projeto Gráfico Estúdio Sem Dublê Diagramação Estúdio Sem Dublê Ilustrações Adriana Komura, Amélie, Garga, Thais Beltrame e Thiago Santana Fotos Camila Souza, Evandro Fiúza, João Bittar, Juliana Leitão, Júlio Cesar Paes, Liz Wood, Mila Maluhy, Raquel Santana, Regina Scomparim e Silvio Aurichio Fotolitos e Impressão Posigraf fale conosco e-mail: atividades@positivo.com.br Departamento Pedagógico: 0800 725 3536 Rua Major Heitor Guimarães, 174, Curitiba (PR) Tel.: (41) 3218-1000 www.editorapositivo.com.br
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índice
Ano 10 • edição 6 • abril 2009
08 matéria Especial
em 2009 comemorase os 50 anos da Declaração universal dos Direitos da criança. muito já foi feito, mas será que é o suficiente? o descaso e a violência contra as crianças e adolescentes deve ser combatido em qualquer lugar do mundo. como proceder, então, para garantir que os direitos colocados nos documentos aconteçam na prática?
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4 Carta ao leitor 6 Entrevista: Dr. Olympio
procurador-geral de Justiça do Paraná
12 Sua Escola 16 Caravana Digital 18 Sala de aula 22 Painel Cultural 26 Caixa de Ideias 28 Com a Palavra 29 Ponto de vista
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Sua escola
com a Palavra
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Painel cultural
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entrevista
yDr. Olympio No ano em que a Declaração Universal dos Direitos da Criança completa 50 anos, o mundo ainda assiste a espetáculos como maus-tratos, negligência, abandono e exploração do trabalho infantil, entre muitos outros exemplos de descaso com crianças e adolescentes. Mas felizmente há várias iniciativas no sentindo de reverter esse quadro, como a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que ajustou e ampliou os direitos previstos nos documentos internacionais e ratificou os direitos fundamentais previstos na Constituição Brasileira. Sobre esse assunto, a A&E conversou com o procurador-geral de Justiça do Paraná, presidente do Grupo Nacional de Direitos Humanos e um dos criadores do Estatuto da Criança e do Adolescente, Olympio de Sá Sotto Maior Neto. por ‹fernanda zattar›
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A Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959), assim como a Convenção Internacional dos Direitos da Criança (1990), são diplomas internacionais advindos da Organização das Nações Unidas (ONU) e elaborados tendo como base a doutrina da proteção integral. Tal doutrina reconhece a situação de vulnerabilidade social experimentada por crianças e adolescentes e propõe a existência na legislação de regras destinadas à proteção especial dos mesmos. A tese fundamental da doutrina da proteção integral incumbe à lei assegurar à população infantojuvenil a possibilidade do exercício de seus direitos fundamentais (que se constituem nos direitos fundamentais de todo cidadão, acrescidos de direitos específicos, necessários e decorrentes da condição peculiar de pessoas em desenvolvimento). O Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) foi formulado com a absorção dos ditames da doutrina da proteção integral, já levando em conta os princípios da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, assim como da Declaração Universal. Considerando a realidade brasileira, o ECA ajustou e ampliou os direitos enunciados nos documentos internacionais (inclusive as normas de Beijing para a Administração da Justiça de Menores e as regras de Riade em relação a adolescentes privados de liberdade). A proposta do legislador é a da universalização dos direitos, ou seja, possibilitar que todas as crianças e os adolescentes venham a exercitar direitos que,
hoje, somente parcela dessa população exercita. A Constituição Brasileira de 1988, no seu artigo 227, enuncia os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, assegurando que a garantia da efetivação dos mesmos é dever da família, da sociedade e do Estado. Em linhas gerais, o Senhor acredita que os direitos das crianças são respeitados?
Infelizmente, o grande desrespeito, por omissão, dá-se por parte do Poder Público. Se, efetivamente, as políticas públicas estivessem a priorizar programas e ações para atendimento dos direitos da criança e do adolescente, certamente estaríamos a caminhar para a construção de uma sociedade progressivamente melhor e mais justa. Sem dúvida, tal qual se dá no discurso cotidiano, é necessário ampliar o investimento público na área da infância e da juventude. Aliás, sobre isso, temos dito que lugar de criança é sim na família (espaço de afeto e principal agência de socialização do ser humano), na escola (espaço adequado para o desenvolvimento pessoal e de preparo para o exercício da cidadania), mas também é nos orçamentos públicos, porquanto a insuficiência de investimentos na infância e juventude faz com que todas as regras dos documentos internacionais, da Constituição Federal e do ECA, se transformem em letras mortas, tratadas como singelas exortações morais e, por isso mesmo, quase sempre postergadas na sua efetivação ou relegadas ao abandono.
© Liz wood
Qual a diferença entre a Declaração Universal dos Direitos da Criança, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança e o Estatuto da Criança e do Adolescente?
Do ponto de vista legal, quando a criança passa a ser vista como cidadã, com direitos e deveres? Na sua opinião, na prática, a criança é considerada cidadã perante a lei?
Na esteira da doutrina da proteção integral e da própria Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, já em seu livro primeiro, declara os direitos fundamentais da população infanto-juvenil, indicando em relação a cada um deles, inclusive, as obrigações da família e do Estado como forma de garantia do exercício dos mesmos. Na sua essência, o ECA passa a reconhecer as crianças e os adolescentes como sujeitos de direitos e não mais como meros objetos de intervenção da família e do Estado. Prevê regras de proteção desde o nascimento, mas também se refere a direitos da gestante e da parturiente. O ECA é, sem dúvida, o diploma legal da cidadania das crianças e dos adolescentes, lembrando que a legislação anterior, o Código de Menores, era criticada exatamente por não ter previsto os direitos dessa população. O objetivo fundamental é garantir proteção especial para o adequado desenvolvimento físico, mental e social das crianças e dos adolescentes.
Pela sua experiência, qual efeito o estatuto tem na prática, no dia a dia?
Para além da incorporação pelo poder público do princípio da prioridade absoluta em favor da infância e da juventude, o ECA, ao traçar uma nova política de atendimento à infância e à juventude, determina a criação em cada nível estatal (municípios, Estados e União) dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente. Esses órgãos têm a incumbência de, após adequado diagnóstico, formular consequente política de atendimento à infância e juventude em cada localidade. Quando os administradores não cumprem o princípio da prioridade absoluta ou quando as deliberações dos Conselhos de Direitos não são por eles acatadas, os promotores de justiça são partes legítimas para a propositura de ações civis públicas, fazendo então da Justiça da Infância e da Juventude espaço para a efetiva implementação das promessas de cidadania contempladas no ordenamento jurídico.
Quais são as penalidades que podem ser aplicadas nos casos de desrespeito aos direitos da criança?
O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a responsabilização dos agentes políticos quando ocorre a falta ou a oferta irregular dos direitos enunciados (artigo 208), assim como estabelece figuras típicas penais (crimes previstos nos artigos 228 a 244) e um conjunto de infrações administrativas (previstas nos artigos 245 a 258), tudo para a punição nos casos de violação dos direitos da criança e do adolescente.
Quais os casos mais comuns de desrespeito aos direitos das crianças?
A primeira indicação diz respeito à falta de programas oficiais para auxílio, apoio e orientação das famílias. A criança e o adolescente não são seres que pairam isolados na realidade social. No contexto das injustiças decorrentes da exclusão e marginalização de parcela significativa de nossa sociedade, promover socialmente uma criança ou um adolescente implica, na maioria das vezes, também elevar em
dignidade sua própria família. Igualmente, se garantidos direitos elementares como educação, saúde (atendendo-se aos elevados índices de mortalidade infantil e dependência química na adolescência) e profissionalização (garantindo o ingresso adequado do adolescente no mercado formal de trabalho), poderíamos conduzir nossas crianças e nossos adolescentes para a construção de um projeto de vida socialmente importante na perspectiva da cidadania. As medidas socioeducativas previstas no estatuto cumprem sua finalidade social?
O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que nenhum adolescente que tenha cometido um crime pode deixar de ser julgado perante a Justiça da Infância e da Juventude. Nos casos de comprovação da ilicitude do comportamento, serão aplicadas as medidas socioeducativas, que vão desde uma simples advertência até, para os casos mais graves, a privação de liberdade. As medidas socioeducativas devem ser sempre fixadas levando-se em consideração as necessidades pedagógicas do adolescente, destacando-se a inserção no programa de liberdade assistida, que acompanha e orienta o adolescente, bem como de sua família, de modo a resgatá-lo socialmente e, assim, impedir a reincidência. Para o resultado pretendido no ECA, é indispensável a implementação dos programas necessários à execução das medidas socioeducativas, especialmente a existência de unidades de internação com número reduzido de adolescentes e equipe multidisciplinar devidamente capacitada, com condições de conduzir o interno à construção de um projeto de vida longe da criminalidade. Portanto, a finalidade prevista pelo ECA só será atingida quando houver investimento suficiente nos programas socioeducativos.
Como a lei vê o trabalho de organismos como a Pastoral da Criança e o Unicef, por exemplo?
A participação da sociedade civil organizada, assim como de organismos nacionais e internacionais relacionados à infância e à juventude, é fundamental para a implementação das regras do Estatuto da Criança e do Adolescente, seja na colaboração com os Conselhos dos Direitos na formulação de políticas públicas, seja na execução de ações específicas direcionadas à materialização dos direitos infanto-juvenis. Enfim, o momento exige intervenção positiva da família, da sociedade e do Estado no sentido de se alcançar, o quanto antes, aquilo que é indicado como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil: a construção de uma sociedade – a meu ver, a partir das crianças e adolescentes – livre, justa e solidária.
Olympio de Sá Sotto Maior Neto é procurador-geral de Justiça do Paraná e presidente do Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH) do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG). Participou da elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
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criança
© SiLvio Aurichio
5dos décadas direitos
Aprovada pela ONU e fiscalizada pela Unicef, a Declaração Universal dos Direitos das Crianças faz 50 anos, mas a maioridade – e plenitude – ainda está longe de ser alcançada por ‹MELISSA CASTELLANO›
Há 50 anos, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovava, por unanimidade, a Declaração Universal dos Direitos das Crianças. O documento significava que, a partir daquela data, mais precisamente 20 de novembro de 1959, crianças e adolescentes não apenas ganhavam direitos, mas teriam esses direitos preservados e fiscalizados. Desde que foi criada, a Declaração Universal dos Direitos das Crianças dá conta dos principais direitos das crianças, questões básicas como alimentação, moradia, assistência médica, educação e – uma das mais essenciais – o direito ao amor e à compreensão por parte dos pais e da sociedade. No Brasil, o documento ainda não é plenamente respeitado, mas existem ações, ainda que pulverizadas, que tentam fazer valer a declaração. O grande desafio é concentrar essas ações para que, juntas, elas tenham força para tirar o documento da teoria. O coordenador geral da Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED), Djalma Costa, salienta que o principal obstáculo a ser ultrapassado, quando o assunto é garantir o direito das crianças no Brasil, é coordenar efetivamente as políticas nacionais de maneira mais séria e competente. “Os direitos existem. Há avanços para que eles sejam cumpridos, mas há muita falta de vontade e de políticas públicas também”, lamenta Costa. Para ele, é preciso criar uma central de monitoramento para registrar
(e concentrar os registros) o abuso contra crianças e adolescentes. Ele dá um exemplo: “Hoje não existe uma secretaria nacional para tratar do assunto da criança. O órgão está subordinado à Secretaria dos Direitos Humanos, mas a demanda é muito maior”, analisa. Outro desafio, na opinião de Costa, é popularizar a Declaração Universal dos Direitos das Crianças. Apesar de mais novo que o documento aprovado pela ONU, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é mais conhecido, mas, ainda assim, também não encontra respaldo legal na hora de ser cumprido, “seja por falta de políticas públicas ou pela deficiência do judiciário brasileiro”, conforme argumenta o coordenador. A ANCED reúne atualmente 34 centros de defesa espalhados pelo Brasil. Os profissionais que atuam nos centros ajudam a intervir em casos polêmicos envolvendo crianças e adolescentes, mas também fazem atendimento às mães que não sabem o que significa pensão alimentícia, por exemplo. Costa revela que não há como fazer uma estatística dos casos que mais aparecem na ANCED, mas orientações para questões de moradia e exploração sexual são muito comuns. Para tentar organizar essas práticas e fazer valer os direitos que já foram desenhados há cinco décadas, a ANCED elabora um Relatório Alternativo de Monitoramento. O resultado, conta Costa, é interessante. “As crianças têm preocupações variadas, dependendo da sua realidade, mas é um
moniTorAr É PreciSo A ANCED (Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente) finalizou o segundo documento (o primeiro foi em 2004), apresentado a representantes do governo brasileiro em março. Além de levantar questões como números de homicídio, exploração sexual, educação, saúde, convivência familiar e comunitária e justiça juvenil, o relatório também escuta diretamente crianças e adolescentes – por meio de uma proposta pedagógica específica – sobre como elas esperam que seus direitos sejam respeitados e que direitos elas imaginam ter. AnceD www.anced.org.br Rua Barão de Itapetininga, 255 / 1104 São Paulo (SP) CEP: 01042-001
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senso comum elas esperarem terem coisas como casa, família e dinheiro suficiente para não passarem necessidade”, diz.
Direitos iguais? Quando o asssunto é garantir o direito das crianças, na teoria não faltam documentos. Mas, apesar de, basicamente primarem pelo mesmo objetivo, existem diferenças entre a Declaração Universal dos Direitos das Crianças (1959), a Convenção Internacional dos Direitos das Crianças (1990) e o Estatuto da Criança e do Adolescente, que completou 18 anos em 2008. Quem explica é o procurador-geral de Justiça do Paraná e
presidente do Grupo Nacional de Direitos Humanos Olympio de Sá Sotto Maior Neto. Ele esclarece que a Declaração Universal dos Direitos da Criança, assim como a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, são diplomas internacionais oriundos da Organização das Nações Unidas (ONU) e elaborados tendo como base a doutrina da proteção integral. “Tal doutrina reconhece a situação de vulnerabilidade social experimentada pelas crianças e pelos adolescentes e, por isso mesmo, propõe a existência na legislação de regras destinadas à proteção especial dos mesmos”, diz. Ele complementa que a tese fundamental da doutrina da proteção integral é no sentido de que incumbe à lei assegurar à população infanto-juvenil a possibilidade do exercício de seus direitos fundamentais. Já o Estatuto da Criança e do Adolescente foi formulado com a absorção dos ditames da doutrina da proteção integral, levando em conta os princípios da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, assim
“As crianças têm preocupações variadas, dependendo da sua realidade, mas é um senso comum elas esperarem terem coisas como casa, família e dinheiro suficiente para não passarem necessidade”.
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como da Declaração Universal. “O ECA fez então, considerando a realidade brasileira, por ajustar e ampliar os direitos enunciados nos documentos internacionais. A proposta do legislador é a da universalização dos direitos, ou seja, possibilitar que todas as crianças e os adolescentes venham a exercitar direitos que, hoje, somente parcela dessa população exercita”, conclui. Mas, na prática, nem sempre esses direitos são respeitados e o próprio procurador admite. “Infelizmente, o grande desrespeito, por omissão, dá-se por parte do Poder Público. Se, efetivamente, as políticas públicas priorizassem programas e ações para atendimento dos direitos da criança e do adolescente, por certo, estaríamos caminhando para a construção de uma sociedade progressivamente melhor e mais justa”, salienta.
Mais respeito Mas se na teoria os direitos das crianças estão preservados, qual é o caminho para que eles estejam garantidos também na prática? A estrada é longa e árdua, mas possível. Para Maristela Cizeski coordenadora da Pastoral da Criança no Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e no Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente em Santa Catarina (Cedca – SC), essa distância entre teoria e prática acontece porque a sociedade deixa a declaração universal e o estatuto somente como marco histórico, e não como acesso universal ao direito humano, seja ele à saúde, à educação, ao esporte, ao lazer enfim aquilo que seria um direito fundamental torna-se um “cometa”. “Políticas públicas de qualidade são direito de todo cidadão. Imagine de quem é prioridade absoluta?”, questiona. Maristela lamenta que a sociedade e os grupos competentes ainda tenham que abordar o desrespeito após 50 anos da Declaração Universal dos Direitos da Criança; 20 anos da Convenção sobre Direitos da Criança foi adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas; já 18 anos do Estatuto da Criança e Adolescente e 20 anos da Constituição Federal. “Antes de nascer, a criança
Conheça os 10 princípios da Declaração Universal dos Direitos das Crianças I Á igualdade, sem distinção de raça religião ou nacionalidade. II Direito a especial proteção para o seu desenvolvimento físico, mental e social. III Direito a um nome e a uma nacionalidade. IV Direito à alimentação, moradia e assistência médica adequadas para a criança e a mãe. V Direito à educação e a cuidados especiais para a criança física ou mentalmente deficiente. VI Direito ao amor e à compreensão por parte dos pais e da sociedade. VII Direito à educação gratuita e ao lazer infantil. VIII Direito a ser socorrido em primeiro lugar, em caso de catástrofes. IX Direito a ser protegido contra o abandono e a exploração no trabalho. X Direito a crescer dentro de um espírito de solidariedade, compreensão, amizade e justiça entre os povos.
tem seus direitos violados com a falta de um pré-natal de qualidade e com oferta de, no mínimo, seis consultas, exames básicos e pronto atendimento/tratamento, no caso de alguma doença detectada”, exemplifica. Ela não descarta os avanços sociais quando o assunto é garantir alguns direitos, mas defende que ainda falta muito para que o planeta alcance o título de uma sociedade justa quando o assunto é criança e adolescente. “Apesar dos avanços no plano formal em diversas esferas de atividades, teórica e prática, a pobreza, a violência e a desigualdade são fenômenos crescentes no atual contexto mundial. O desafio é colaborar para que o direito se converta em instrumento transformador na vida cotidiana das crianças”, diz. E reforça: “Proteger a infância significa garantir vida segura e dignidade para todos. Um ambiente protetor para a infância é aquele em que todas as pessoas estão conscientes da importância de cuidar adequadamente da criança, no qual existam escolas suficientes e centros de saúde que ofereçam qualidade no atendimento, espaços para a diversão sadia e a convivência com os amigos, leis que reprimam aqueles que pretendem explorar as crianças e onde todos os membros da sociedade colaborem para garantir-lhes o que necessitam em cada etapa de desenvolvimento”.
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sua escola | aprendizagem
Construindo conhecimento com criatividade por ‹diocsianne moura›
Confrontar-se com a crise existencial dos personagens dramáticos de William Shakespeare ou vislumbrar o ser humano em constante luta pela realização de suas aspirações materiais e espirituais, em Miguel de Cervantes, são algumas das possibilidades que o universo inesgotável da criação literária pode proporcionar aos alunos. A literatura, dentro das instituições de ensino, pode ir muito além da simples transmissão de conceitos e regras e ajudar os estudantes a obterem o gosto pela leitura e a construir sua visão de mundo. De acordo com Vera Lúcia Ferronato e Vanessa Fonseca, assessoras de Língua Portuguesa da Editora Positivo, a literatura insere a criança no contato com o que é diferente dela, pela existência de pessoas e de pensamentos diferentes do seu, pelo contato com outros leitores na discussão do texto e nas diferentes compreensões do mesmo texto, numa situação de leituras compartilhadas. “Os efeitos da literatura sobre a formação pessoal, sobre o pensamento e a experiência do estético podem ser percebidos apenas em longo prazo. Os efei-
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tos imediatos, quando existem, refletem-se no modo como os alunos transferem a aprendizagem para outras situações escolares: a ilustração, a reformulação do texto, a transposição para as formas dramatizadas, a criação de materiais escritos e até no entendimento de leitura de outros textos”, explica Vera. Apesar de não existir uma metodologia ideal para o processo de ensino e aprendizagem da literatura, o professor pode aproximar os textos literários do cotidiano de seus alunos. Para isso, ele deve ter, primeiramente, o conhecimento de um acervo literário representativo e o domínio de técnicas e métodos de ensino que estimulem a leitura. “Se o aluno não entende toda a dimensão do texto literário, o professor deve estimular o pensamento do leitor, sem dar a solução para que ele aprenda a indagar, buscar respostas e olhar os textos sempre com um olhar questionador”, afirma Vanessa. “Nesse processo, há papéis diferentes para o autor, o aluno e o professor. Isso porque o autor constrói o texto de imaginação em linguagem criativa, cabendo ao aluno a interpretação da simbologia existente nos textos por
Necessidade vital A aprendizagem da literatura contribui na formação sociocultural dos alunos tornando-os cidadãos mais críticos. De acordo com as assessoras, isso acontece por meio do despertar do aluno para o gosto pela leitura, instigando sua curiosidade para que o aluno-leitor construa o seu próprio repertório de histórias e gostos. “É fundamental que o professor seja visto como um sujeito-leitor, não apenas como aquele que determina leituras, mas como um amante da leitura. Formar cidadãos leitores exige que o professor seja um leitor maduro, capaz de expressar seu ponto de vista em relação às leituras feitas. A ele cabe criar, com sua turma, um ambiente favorável à leitura para que os alunos também selecionem as suas leituras de acordo com os seus interesses e objetivos”, diz Vera Lúcia. Em relação à leitura dos clássicos da literatura universal, as assessoras explicam que eles contribuem para a elaboração do pensamento, da apreciação da beleza da linguagem literária, a ampliação da percepção de mundo e para o sujeito compreender-se e compreender os textos do mundo, para que nele melhor se situe e interaja. “Ao apresentar as obras clássicas, o professor estará dirigindo o olhar dos alunos ao passado para que compreendam o presente”, comenta Vanessa.
© ilustrações: thais beltrame
Literatura em sala de aula
meio da mediação do professor”, explica Vera Lúcia. “O conhecimento crítico e aprofundado do professor subsidiará a prática sem que seja necessariamente mostrada de forma explícita ao aluno”, complementa Vanessa.
sua escola | mentoria
Como ajudar os alunos a encontrar os seus talentos e lidar com as frustrações Embora, na prática, nem todo professor seja um mentor, o desejável é que o seja, diz especialista por ‹diocsianne moura›
Mentoria é “a ação de influenciar pessoas, aconselhar, ouvir, ajudar a clarificar ideias e fazer escolhas, guiar”; Mentor é “aquele que o auxilia a aprender alguma coisa que você, sozinho, não poderia aprender ou, pelo menos, teria dificuldade”. Essas definições estão no livro Gestão de Pessoas, da autora Sylvia Constant Vergara. Voltada para a área administrativa, a obra aborda temas que podem ser ampliados ao universo educacional, como é o caso da mentoria. A autora diferencia os termos mentor e instrutor em seu livro, colocando que esse último é aquele que apenas transmite regras. “O instrutor tenta introduzir as informações na mente do aluno, enquanto o educador tenta tirar de dentro do aluno informações, suas ligações, concatenações que lhe permitam não só reter, como criticar informações”, explica ela, que é graduada em Pedagogia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mestre em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas (RJ) e doutora em Educação pela UFRJ. De acordo com Sylvia, ao transpor essa temática para o
ambiente escolar, várias são as estratégias para que o docente não fique apenas no papel de simples instrutor e utilize a mentoria para melhorar a relação professor-aluno. “O professor precisa ter domínio conceitual do que pretende ensinar e a habilidade de fazê-lo com maestria, despertando nos alunos a curiosidade, a vontade de saber mais. Também precisa ter o domínio de habilidades interpessoais, fundamental para que o processo de comunicação não só aconteça, como aconteça da forma mais atraente possível”, orienta. Para a autora, o professor pode se encaixar no perfil de mentor se assim o desejar. “Embora, na prática, nem todo professor seja um mentor, o desejável é que o seja. Afinal, educação é alimentada por valores fundamentais à vida em sociedade”, explica. “Quanto mais cedo na vida de uma pessoa esses valores forem trabalhados, melhor”, complementa. Mas, como perceber-se mentor em sala e trabalhar com isso? Para Sylvia, a saída está no gostar da tarefa de educar e no saber de sua importância na formação de cidadãos. “Se o professor não consegue perce-
ber os pequenos sinais emitidos pelos alunos em uma comunicação verbal e não verbal, então esse professor está no lugar errado. Deve, antes, formar-se para ocupar esse lugar. A busca do autoconhecimento e do autodesenvolvimento é uma boa estratégia”, explica. Além do professor, outros indivíduos podem ser mentores no ambiente escolar, e isso acontece natural e individualmente. “Se o aluno busca o seu ou outro professor, o coordenador, a merendeira, enfim, qualquer outra pessoa do ambiente escolar para orientá-lo, aí está a presença da mentoria natural”, afirma Sylvia. Mentor-facilitador Ela reforça ainda que, sendo natural ou não, duas situações devem ser levadas em consideração: o interesse do estudante e o desejo do profissional mentor em ser um facilitador do processo de aprendizagem. “Se uma pessoa não tem a disponibilidade para a aprendizagem, quase nada poderá ser feito por ela”, explica em seu livro. “Em se tratando de Ensino Fundamental e Médio, a ação do professor como facilitador da vontade do
aluno em estudar, aprender, é fundamental. Em uma sala de aula, o que existe é uma relação: ensino e aprendizagem. O professor deve cuidar para que essa relação seja a melhor possível”, expõe. No caso de um aluno sentir-se frustrado por algo que não deu certo ou que não conseguiu conquistar – mesmo com a ajuda de um mentor. O professor-mentor pode utilizar o diálogo como uma alternativa para amenizar a situação. “Conversas que argumentem sobre os elos entre certezas e incertezas da vida, acertos e riscos são úteis para que o aluno aprenda a lidar com elas”, comenta.
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sua escola | aprendizagem
Reprovação Escolar Como lidar com alunos repetentes O ano letivo começou e alguns alunos estarão na mesma escola, com os mesmos professores, o mesmo conteúdo e com colegas de outra idade. Conhecido do estudante que sofreu repetência, esse cenário promete dar trabalho a professores, coordenadores e familiares. Todos deverão estar preparados para lidar com a reprovação e tudo que ela agrega: o preconceito dos colegas, a falta de ânimo e as dificuldades de aprendizagem dos alunos repetentes. Para o doutor em Educação e Tecnologia e coordenador regional pedagógico da Editora Positivo, Leonir Lorenzetti, a escola e os pais precisam saber lidar com a reprovação e, nesse cenário, o diálogo deve balizar tanto a educação escolar quanto a educação familiar. É importante conversar abertamente com o aluno e expor a sua situação, bem como as implicações que as suas atitudes, em relação aos estudos, podem afetar a sua vida estudantil. “É fundamental pontuar com o aluno reprovado quais foram os motivos que o levaram à reprovação, conscientizando-o e sinalizando para necessidade de mudança de comportamento”, afirma. “Ele precisa ser conscientizado da necessidade de mudança. Enquanto ele não
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tomar consciência não haverá mudança e a reprovação poderá acontecer”, complementa. Perfil Alunos repetentes, em geral, participam pouco do cotidiano da escola, não prestam atenção em sala de aula, não cumprem com as obrigações escolares, não possuem uma rotina de estudo e, muitas vezes, não tem um acompanhamento sistemático da família, baseado no diálogo e no comprometimento com a escola. Segundo Leonir, a participação dos pais em toda a trajetória da vida escolar dos alunos é fundamental e não deve se resumir a casos de repetência. “À medida que a criança avança na escolarização, os pais deixam de acompanhar os seus filhos e quando percebem perderam o controle sobre a educação deles”, lamenta. É necessário que a escola fique atenta a outra questão: alunos repentes que sofreram a reprovação por conta de alguma dificuldade de aprendizagem. “Temos alunos que possuem dificuldades de aprendizagem, que precisam ser identificadas pela escola e trabalhadas por uma equipe multidisciplinar, requerendo outras demandas da escola em relação ao processo de
ensino e da avaliação”, salienta Leonir. A escola pode identificar quando há a necessidade de buscar apoio em serviços especializados como médicos e psicólogos para auxiliar no diagnóstico dos problemas de aprendizagem. “Muitas vezes escola e família não conseguem, isoladamente, resolver os problemas de aprendizagem dos alunos, requerendo o acompanhamento de equipes multidisciplinares”, diz. Se o aluno repetente demonstra desinteresse, as abordagens são diferenciadas. A escola e os professores devem analisar se a forma como os professores estão ensinando, e se os instrumentos que estão sendo utilizados nas avaliações são os mais condizentes na atualidade. “É necessário trabalhar com o aluno e com a sua família, objetivando identificar quais lacunas não foram contempladas e que contribuíram para o fraco desempenho escolar”, explica Leonir. “Também é importante que a escola oriente os alunos e as famílias a estabelecer uma rotina de estudos que inclua um tempo para o aluno interagir com as diferentes mídias, um período para as atividades físicas e culturais, mas que, essencialmente, tenha um espaço exclusivo e intenso para o estudo”, orienta.
© ilustrações: thais beltrame
por ‹diocsianne moura›
sua escola | relacionamento
A engenhosa arte de criar vínculos de confiança Desenvolver vínculos de confiança é um trabalho que requer constante aperfeiçoamento do ofício de educar na escola por ‹melissa castellano›
“Confiança: segurança íntima de credenciamento. Crédito, fé.” A definição é clara e a sua existência entre professores e alunos, imperativa. Afinal, não há relação que se sustente ou aprendizado efetivo que se desenvolva sem sua presença. O encontro entre professor e aluno depende da qualidade da relação. É um encontro focado no ensino e na aprendizagem e, como toda relação, tem dois polos e depende de ambos. No entanto, cabe ao professor, como mediador dessa relação, a responsabilidade última pela qualidade das aprendizagens e, por conseguinte, pela busca de vínculos com seus alunos. Desenvolver vínculos de confiança em sala de aula – nessa configuração de mundo em que é necessário confrontar novas e diferentes orientações a todo instante – é um trabalho que requer constante aperfeiçoamento do ofício de educar na escola. “Nos dias de hoje, o aluno chega à escola com informações, conhecimentos e orientações das mais variadas fontes: família, escola, televisão, internet, igreja, círculos de amizades, entre outros. Quando
o professor entra em sala de aula omitindo ou negando essa realidade e suas consequências no comportamento do aluno, ele está de olhos fechados para este novo sujeito histórico. Sem valorização, sem identificação e sem diálogo não há possibilidades de construir vínculos de confiança”, alerta Maria Beatriz Sandoval, pedagoga, mestre em educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e assessora pedagógica da Editora Positivo. Para ganhar a confiança dos alunos, destaca Maria Beatriz, é fundamental também que o professor domine os conteúdos da sua área de atuação. Mas isso apenas não basta. É necessário ainda que esse profissional desenvolva novas formas de mediar a aprendizagem do aluno, como as abordagens metodológicas interativas que possibilitam a ele a construção de sentidos desses conteúdos. “Para que os temas de estudos façam sentido para o aluno, precisam estar articulados aos seus interesses e vivências. Essa relação gera entendimento entre ambos; portanto, também possibilita a criação de vínculos de confiança”, explica.
Diferentes tipos de vínculos O professor mediador, aberto ao diálogo e preparado para argumentar com o aluno crítico, inquiridor e reivindicador, dificilmente incorre na permissividade. Ele reconhece e valoriza os saberes dos seus alunos, mas não abdica de sua responsabilidade e autoridade como profissional da área. “O professor, além do intelectual, é um profissinal da relação, sabe escutar e está pronto para ser surpreendido pelo que o aluno diz”, salienta Maria Beatriz, reforçando que vínculos de confiança são construídos quando o aluno percebe e acredita que os educadores da sua escola estão explicitamente envolvidos e comprometidos com a sua formação. Como reconstruir a autoridade sem autoritarismo? A escola e sua equipe docente podem adotar medidas democráticas na construção de regras e tomada de decisões, como: a instituição de conselho de classe participativo, conselhos de sala, conselhos escolares, grêmios e associações. Em sala de aula, os professores negociadores e com vasto repertório metodológico são os que obtêm maior sucesso na disciplina de seus alunos.
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caixa de ideias
Eu nem queria mesmo... Passo a relatar a cena a que assisti e que me provocou as reflexões que pretendo compartilhar com você, leitor. Conceitos de infância, educação, autoridade, papel parental e responsabilidade ficaram dançando em minha cabeça após a observação desse fato. Agucei a minha escuta para o tema e constato que o fato que vou relatar tem um ponto de encontro com muitos outros que se assemelham em alguns equívocos e desencontros. Uma criança, aparentando ter uns nove anos, estava à beiramar com sua mãe, e, perto dela, outras crianças brincavam, entrando e saindo do mar, coisa que chamava a atenção da criança. A mãe, percebendo o interesse da filha, incentivou que ela entrasse no mar: “Vá filha, entre... Você vai gostar, é bom!” A menina vacilou e, confesso, achei que ela sairia
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correndo e mergulharia naquele mar calmo e convidativo. Porém, a menina se balançava inteira, negando... A mãe insistia: “Vai filha, vai! É uma delícia!” A menina se balançava de um lado para o outro, olhando para o mar e para as crianças que brincavam e nada... “Se você não entrar no mar, não aproveitar a praia, vamos embora. Tenho mais o que fazer.” Afirmou a mãe. A menina deu com os ombros e replicou: “Eu nem queria vir aqui mesmo!”. A mãe suspirou, convidou a filha para ir embora e, assim, elas se foram. Assisti a uma cena semelhante no parque onde eu costumo andar: um pai estava ensinando seu filho, de mais ou menos seis anos, a andar de bicicleta sem as rodinhas. Diante da natural dificuldade da aprendizagem, o menino disse que não queria mais
aprender a andar de bicicleta sem rodinhas, e o pai, derrotado, consentiu. Outra criança, em meu consultório, disse-me: “Eu nem ligo de não saber ler... Eu não quero ler mesmo!” Ao observá-la, ficou claro, para mim, que ela estava armada diante da possibilidade do enfrentamento da dificuldade. Ao dizer que ela não queria aprender a ler, por isso ela não lia, defendiase do possível fracasso. Conversando com uma orientadora educacional que trabalha com jovens do Ensino Médio, falávamos dos alunos que não desenvolveram estratégias para bem aprender, que não tinham instrumentos para buscar seus objetivos, perseguir seus sonhos, vencer os obstáculos naturais das conquistas do dia a dia. Uma das causas dessa dificuldade é a falta de limites. Quando
crianças e jovens não recebem as devidas e necessárias regras do bem viver, não aprendem a seguir normas e procedimentos. Acabam acreditando que aprender é fácil e não se acostumam a investir em suas aprendizagens. Não raro encontraremos crianças e jovens que não aprendem por não se submeterem às regras e às etapas da aprendizagem. Pensar sobre a sua aprendizagem é fundamental. Aliás, aprender a pensar sobre o mundo e seus fenômenos é tarefa da escola e dos educadores. Sendo o pensamento o eixo da aprendizagem, é por meio dele que decidiremos como a atividade será executada, quais caminhos seguiremos, a que fatos devemos prestar atenção, enfim... Se nossos jovens e crianças recebessem as garantias de que vale a pena arriscar-se e tentar... se nossas crianças e jovens tivessem adultos que não se intimidassem e exercessem sua autoridade educativa... se os aprendizes recebessem o empenho dos educadores no sentido de investirem em suportes que facilitassem suas aprendizagens... se nossos alunos não tivessem tanto medo de errar, acredito que ouviríamos menos afirmativas como a que nos serviu de título. Ao não percorrerem os caminhos da aprendizagem, nossos filhos e alunos não viverão o prazer de aprender. Cabe a nós, mostrar que a vida não é um jogo de sorte ou azar, mas o resultado de um planejamento, em todas as suas etapas, inclusive a retomada dos procedimentos. Dessa forma, o sucesso e o bem viver são resultados de um conjunto de ações pensadas e de pensamentos praticados.
© iLuSTrAçõeS: ThiAgo SAnTAnA
ISabEl PaROlIN é pedagoga, psicopedagoga clínica e mestre em Psicologia da Educação. Consultora Institucional e palestrante. Mais informações, acesse www.isabelparolin.com.br
qualidade
Carlos Suco Gerente de Planejamento da Editora Positivo csuco@positivo.com.br
Como você comunica os projetos da escola? Toda escola é formada por inúmeras rotinas, processos, ações e, principalmente, pessoas, que a todo momento estão não apenas realizando os seus trabalhos, mas também buscando novas formas de executá-los em menos tempo e com maior qualidade. Muitas vezes, essas atividades são complexas e envolvem vários colaboradores e departamentos da instituição. Como forma de compreendermos melhor e encontrarmos soluções para essas atividades, elaboramos projetos que contemplam o contexto que estamos analisando. Também acreditamos que os pilares que formam os projetos são a mensuração, a análise, a elaboração e a implantação das soluções encontradas, porém não podemos esquecer um fator tão importante quanto os anteriores: a comunicação. Ter uma comunicação clara,
objetiva e simples tende a facilitar a cooperação e o comprometimento, não apenas dos envolvidos no projeto, mas de toda a escola. As pessoas tendem a colaborar em projetos quando elas compreendem os desafios da instituição e quais os caminhos e as ações que estão sendo realizadas para superá-los. Nem todas as informações podem ser repassadas em detalhes para toda a instituição, mas os colaboradores precisam ter conhecimento das ações que a escola desenvolve, visando ao crescimento e bem-estar dos seus profissionais, alunos e comunidade. Quanto mais pessoas são envolvidas direta e indiretamente nas ações da empresa, mais valorizadas elas se sentem, por isso é fundamental que elas não apenas entendam os projetos, mas, principalmente, compreendam o
seu papel e como o seu trabalho soma esforços no alcance dos objetivos propostos. Também se falamos em comunicação, devemos atentar para o detalhe que, muitas vezes, ela não pode ser uniforme em todos os setores da escola, devemos adaptar o conteúdo em questão à linguagem que cada profissional atua na instituição. Isso pode ocorrer de diferentes formas, por exemplo, desde comunicações com termos técnicos específicos de determinada área até simples desenhos que ilustrem todo o processo. Cada escola possui a sua particularidade, formada pelas diferenças de cada uma das pessoas que a compõe. Por isso, a comunicação exerce um papel fundamental no processo de integração entre atividades, departamentos e, principalmente, colaboradores.
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sala de aula
Nós sabemos que no final da novela o mocinho se sairá bem e ficará com a mocinha e viverão felizes para sempre. Sabemos que os filmes, mesmo os de terror, têm finais felizes, alguns deles já não nos surpreendem e, ainda assim, insistimos em assisti-los, acompanhando-os até o último momento. Por quê? Porque somos feitos de sonhos. Quem sonha engrandece a alma. O sonho acorda as vontades e as vontades acordam a inteligência. Os tristes tornam-se alegres ao despertar de um sonho, pois revigoram as esperanças. Os fracos acordam revigorados porque o sonho apontou outros caminhos. Os sonhos, as fantasias, a imaginação, a linguagem poética são importantes para todo ser humano em todas as fases da vida. O bebê sonha com os braços da mamãe. A criança sonha com suas histórias, construídas no e pelo brincar, o adulto sonha com suas memórias. Adélia Prado, poeta, afirma: “o que a memória
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ama fica eterno”. As crianças brincam com os sonhos, as fantasias e as alegorias da infância com os quais constroem o aparato que enriquece seu pensar. As crianças como os adultos sabem o fim das histórias. Sabem que os monstros, os heróis, as fadas e inclusive o papai Noel são criações, símbolos de nossa cultura que não tem valor maior senão investir na saúde do espírito. As histórias têm o poder de nos levar adiante, de olhar com olhos mais abertos. E o mais importante: as histórias salvam vidas. Sherazade, grande contadora de histórias, contou e encantou por 1.001 noites salvando sua vida e a do sultão que aprendeu a amar de novo. Outro exemplo de contador de histórias é o próprio Jesus Cristo com suas parábolas. Ele, ao contar histórias, salvou a vida de muitos. E agora, levada para a sala de aula, qual professor não sentiu que salvou sua aula, seu conteúdo, a relação ensino e
aprendizagem com uma pitada, uma contribuição amorosa vinda das histórias? Paulo Freire diz que para ensinar é preciso que o professor seja apaixonado. Por isso as histórias são tão importantes. Nos apaixonamos por elas e contamos aquelas que nos provocam movimento no pensar e no sentir. Ensinamos por histórias porque somos feitos de histórias, as que vivemos, as que nos contam e aquelas que contamos. “O que seria de nós se não fosse as histórias? O que seria de nós sem o socorro da fantasia?”, pergunta-nos o escritor e poeta da educação, Rubem Alves. A resposta é simples: seríamos no mínimo pessoas com dificuldade de aprendizagem nas áreas afetivas e cognitivas. Porque quem conta um conto, aumenta as possibilidades de aprendizagem!
DEySE CamPOS Assessora de Educação Infantil da Editora Positivo dcampos@positivo.com.br
© iLuSTrAçõeS: ADriAnA komurA
A importância das histórias para a aprendizagem
sala de aula
sala de aula
Não desliguem os aparelhos!
A escola, o ensino e a educação, estão imersos numa crise mundial que os atingem em todos os níveis, parecem estar numa unidade de terapia intensiva por insistir numa prática pedagógica fortemente assentada numa proposta newtoniano-cartesiana, a qual caracteriza-se por um ensino fragmentado e conservador voltado para a reprodução do conhecimento. É possível, em pleno século XXI, a escola, o ensino e a educação, permanecerem pautados numa práxis criada para atender demandas educacionais do século XIX? Por que a educação parece ter dificuldade em acompanhar o ritmo acelerado das mudanças ocorridas nesses últimos séculos? A modernidade exige mudanças, adaptações, atualização e aperfeiçoamento. A concepção moderna de educador exige uma formação continuada, que deve ser reconhecida como um dos alicerces para a qualidade do ensino que pretende-se para todo o país.
Neste sentido, vale destacar a seguinte colocação de Sacristán, “A formação de educadores tem se estabelecido como uma das ‘pedras angulares’ indispensáveis a qualquer intenção de renovação ou melhoria na qualidade do ensino”. Os conhecimentos produzidos na escola, com professores e alunos, são os que iluminam e dirigem as práticas mais significativas da formação do discente, que se quer cidadão. A atividade docente tem sido entendida como prática de disseminar conhecimentos e/ou aplicar técnicas. Á sociedade a qual pertencemos já não interessam apenas profissionais com título de graduação. Ser educador requer uma série de novas posturas e práticas capazes de fazê-lo atuar com competência e profissionalismo. É necessário pesquisar, refletir, processar e construir o conhecimento, como coloca Demo, “Um professor destituído de pesquisa, incapaz de elaboração própria é figura ultrapas-
sada, uma espécie de sobra que reproduz sobras”. Além do mais, para a execução de tarefas repetitivas e ordenadas foram criados os computadores e os robôs. Ao homem, competem a criação, a imaginação e a inovação. Isso implica em pensarmos processos de formação continuada, articulados de saberes, onde os docentes tenham condições de administrar, com suficiente autonomia, o conflito entre o prático e o teórico. Partindo desse pressuposto, o professor enquanto aprendiz dos saberes a ensinar e dos saberes relativos do como ensinar, deve gerenciar de forma dinâmica a sua formação continuada. Formação essa, que deve perpassar por uma reflexão crítica da práxis educativa, tendo em vista que a mudança no comportamento do professor só pode ocorrer a partir da possibilidade dele se perceber enquanto profissional. “É preciso ir além da tão sonhada prática transformadora,
constituída pela teoria e pela ação, formando uma proposta pedagógica que não concebe as pessoas como “destinatárias”, mas como sujeitos da própria atividade política”. (Rausch, apud Marim, 2006) Atenta-se, então, para a necessidade do professor ser um investigador do processo de ensino e aprendizagem, de modo que suas intenções educacionais coerentes passem pela investigação de sua própria ação: - O que faço? - O que penso sobre o que faço? - Qual o significado disso? - Como me tornei esse professor que sou? - Como poderei me transformar num professor diferente e, sobretudo, melhor? Como corrobora Freire, “Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador. A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão da prática”. É inegável a contribuição da formação continuada do professor, uma vez que são os agentes multiplicadores responsáveis pela constituição de sujeitos críticos, reflexivos, sensíveis e preocupados com o futuro da humanidade. O desafio está lançado! A realidade do ensino de nosso país alerta para a necessidade da mudança, uma responsabilidade de todos os educadores. Vem chegando a hora de desligar os “aparelhos da UTI”, afinal, o “tratamento” aplicado à enfermidade do processo de ensino aprendizagem nas escolas, não tem surtido efeito positivo na reversão do grave quadro que se encontra a educação brasileira!
Aldrey Freitas e Raphaela Gubert Coordenadoras Pedagógicas Regionais da Editora Positivo aenzo@positivo.com.br e rgubert@positivo.com
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sala de aula
O livro “História social da infância e da família” de Ariés (1973) e o texto “A evolução da infância” de De Mause (1991) contribuíram, indubitavelmente, para a formulação de um conceito de infância e um melhor entendimento tanto do aparecimento como da organização das instituições escolares, com a função de proteger e formar as gerações futuras. Na modernidade emerge uma concepção de infância, que perdura até os dias de hoje, como sendo a fase em que os indivíduos necessitam de grandes cuidados e de uma disciplina para inseri-los no mundo adulto. Dessa maneira, a escola surge como espaço privilegiado para disciplinar almas e corpos e difundir a cultura existente. Todavia, essa concepção não se tornou comum a todos os grupos e sociedades. Enquanto para alguns a infância passou a ser definida pelo período de escolarização,outros “tornam-se” adultos sem reunirem as condições necessárias para tal, sem conhecer essa fase da vida, que passou a ser concebida como própria dos seres humanos. Como disse Galileu: “eppur si muove”. As mudanças que se operam no mundo do trabalho em ritmo acelerado a partir da Revolução Industrial, com seus efeitos em escala exponencial sobre outras instâncias e esferas da sociedade, também transformam a infância e o que se entendia sobre ela. Por exemplo, se para alguns, até pouco tempo, a infância era aquela fase em
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Infância:
um fenômeno biopsicossocial que a criança precisa do adulto para se apropriar da informação e tornar-se adulto, hoje, frente às tecnologias de comunicação e informação, como TV, rádio e, mais recentemente, o computador e a Internet, a criança pode prescindir do adulto para apropriar-se da informação. Em algumas situações, é o adulto quem necessita da criança para acessar a informação. Veja o caso da criança que, com pouca idade, manuseia com destreza os recursos de um telefone celular, como apresentou certo programa de TV em rede nacional. Levando-se em consideração as mudanças sociais ao longo do tempo, o conceito de criança, infância e adulto que estavam estabelecidos não correspondem ao que é vivido cotidianamente, gerando certo mal-estar, pois as modificações operadas no âmbito social não tem relação direta com o que havia sido pensado. Os estudos no campo da Sociologia da Infância e da Sociologia da Educação demonstram que a elaboração de significações para a fase da existência humana a que denominamos infância emerge para além da
intersecção das determinações naturais e culturais. A infância deve ser vista como um fenômeno biopsiocossocial, visto que no conjunto dos processos de socialização concorrem não apenas as forças de natureza biológica e de origem cultural, como também as práticas do dia a dia da criança, construídas na cotidianidade, nas representações sociais e no imaginário que contribuem na construção de um ideário de infância e, por extensão, de práticas pedagógicas que levem à sua reificação. Não é a infância que está acabando. Na verdade, o que entendemos por infância é o que está em transformação. Segundo Addato (1998), diretor do Programa de Estudos da Criança, desenvolvido na Universidade de Harvard, isso ocorre porque as “fronteiras entre infância e fase adulta estão cada vez mais tênues”. É sob esses novos tempos que os profissionais da educação devem ler seus papéis e as práticas desenvolvidas no espaço escolar, principalmente, no que diz respeito às fases iniciais da educação formal.
Marcos Aurélio Pereira Coordenador da Área de História da Editora Positivo mpereira@positivo.com.br
sala de aula
© ilustrações: adriana komura
A arte na infância A arte para a criança constituise num fazer que envolve três fatores fundamentais: a organização de suas experiências, a autocompreensão (comunicação por meio da expressão partindo da organização de seu mundo) e o relacionamento com os outros por meio de seu trabalho. Desta forma, seu pensamento, sentimento, percepção, suas relações com o ambiente configuramse por meio de seu processo criativo. A criança, por meio do fazer, reordena elementos extraídos da realidade, organizaos, cria situações imaginárias, ou seja, elabora seu conhecimento sobre o mundo físico e social. O fazer artístico passa a ser uma comunicação significativa consigo mesma e com o meio. A arte é importante para seus processos de pensamento, para seu desenvolvimento perceptual e emocional, para sua conscientização social e para seu desenvolvimento criador. Por meio do desenho, da pintura, dos jogos dramáticos, a criança seleciona aspectos de sua experiência articulando-os e integrando-os num todo significativo. Na infância, o percurso, a trajetória do criar se sobrepõe ao produto final. Deve-se então incluir na prática educativa em arte, a documentação dos processos individuais, organizando a produção, datando e retomando de tempos em tempos para que a criança possa progressivamente perceber-se como sujeito de uma ação, com escolhas, gostos, percepções. Desde a infância, é importante o contato com obras de arte, em visitas a museus, ateliês, peças teatrais, apresentações de músicas, etc; pois a criança
começa a estabelecer relações com o que ela faz e a produção do mundo adulto. Porém, devese tomar cuidado para não impor comparações ou mesmo a estética adulta enquanto modelo. O contato com o universo artístico deve visar a ampliação do repertório para que a produção infantil se torne gradativamente mais significativa, autoral e criativa. Quanto mais experimente, ouça, veja, vivencie, aprenda, quanto mais elementos da realidade disponha em sua experiência, tanto mais rica e produtiva será a atividade de imaginação e produção, expressão e comunicação. A apropriação dos elementos da linguagem artística se faz no contato com manifestações artísticas, no fruir, pensar e produzir sentidos pessoais diante das mesmas. Para que as crianças possam exercer sua capacidade de criar é imprescindível que haja riqueza e diversidade nas experiências que lhes são oferecidas. Um espírito curioso, questionador e inventivo, prepara-a para melhor interpretar a realidade e manifestar-se ativamente na sociedade. Ampliar o repertório cultural por meio do conhecimento de novas representações, novos significados ampliam seu olhar e consequentemente seu lugar no mundo. A criança deve ter espaço para vivenciar a arte na escola; ter a oportunidade de fruir, criar, explorar materiais, enfim expressar-se com autonomia e liberdade.
Andréa Bertoletti Assessora de Artes da Editora Positivo abertoletti@positivo.com.br
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painel cultural
Infância em xeque As diferenças entre meninos e meninas do sul do Brasil e crianças do nordeste são analisadas em “A Invenção da Infância”. por ‹Diocsianne Moura›
Refletir o que significa ser uma criança no mundo contemporâneo é a intenção do documentário “A invenção da infância”, produzido em 2000 e dirigido pela jornalista Liliane Sulzbach. Traduzido na frase “ser criança não significa ter infância”, o média-metragem parte da premissa de que não está permitida a cada criança apreciar igualmente a infância. E, de maneira extraordinária, comprova isso aos telespectadores apresentando uma comparação da infância de meninos e meninas do Sul do Brasil e crianças do Nordeste. A invenção da infância começa mostrando como surgiu o conceito de infância, que desde os séculos XVI e XVII é vista como “inocente”, em consequência da propagação de ideias humanistas. Em seguida,
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explora rapidamente o interior do Nordeste do Brasil, onde é possível encontrar algumas crianças trabalhando em plantações de canade-açúcar e pedreiras, ganhando centavos que vão ajudar no complemento da renda familiar – o que não mudou muito desde a produção do documentário, há nove anos. Em paralelo, é mostrada a vida das crianças em áreas urbanas afluentes, onde a infância é marcada por rotinas que causam esgotamento e excessos de responsabilidade, comparando-se à competitiva vida dos adultos. Além de propor uma reflexão sobre a infância, o documentário faz uma abordagem subliminar de assuntos relevantes que vão desde a importância do planejamento familiar, a mortalidade infantil, o trabalho infantil, tão comum na grande maioria das cidades brasileiras, até a perda da infância, de diversas formas. E faz isso de uma maneira extraordinária – inclusive com trechos animados que agradam pela simplicidade – pois consegue
estabelecer o distanciamento necessário para que a conclusão fique com o público, não sendo enunciada explicitamente no filme. Educadores interessados em trabalhar o documentário em sala de aula podem fazer o download gratuito do material e, ainda, ter acesso a pareceres pedagógicos, disponíveis no www.portacurtas. com.br, patrocinado pela Petrobras, através da Lei de Incentivo à Cultura, do Ministério da Cultura. Uma das sugestões de aplicabilidade sugerida no portal é a utilização do média-metragem com alunos do Ensino Médio, dentro da disciplina de História, na Educação Superior e também em cursos de Formação de Educadores.
Ficha técnica Gênero Documentário País Brasil Diretor Liliane Sulzbach Ano 2000 Duração 26 min
Vovô é um cometa Estória de criança e adulto por ‹Diocsianne Moura›
Apesar de ser uma obra de literatura infantil (indicada para leitores a partir de 8 anos), a obra “Vovô é um Cometa” consegue prender a atenção de outras faixas etárias, incluindo adultos nostálgicos. Uma identificação imediata acontece, pois a narrativa histórica traz à tona o tempo e a memória, uma combinação que rende muitas lembranças. A identificação do leitor com a narrativa é inevitável, pois irá se deparar com situações típicas da infância, como a contação de histórias, quando os avós, pais ou tios proporcionavam experiências fantásticas, transmitindo conhecimento e valores e ajudando na formação intelectual das crianças A obra tem como fio condutor a relação de afeto e carinho entre o trisavô Américo, de 102 anos, e sua trineta Laura, uma garota que está cursando o quarto ano e adora jogar futebol. Na escola, ela fica sabendo
da existência do cometa Halley. Para sua surpresa, o trisavô diz que se lembra da penúltima passagem do cometa, em 1910, quando ele era um garotinho de apenas cinco anos. Então, a menina toma conhecimento de diversos aspectos históricos do mundo e de São Paulo do início do século XX, além de ser informada do alvoroço que a aproximação do cometa causou na ocasião, pois muitas pessoas achavam que o mundo iria se acabar. A estória da obra reflete um pouco da própria vida do autor Ricardo Filho. Ao descrever seu currículo, Ricardo, bisneto do escritor Graciliano Ramos, relata seu eterno gosto pela leitura e pela escrita e, claro, sua paixão pelas histórias que ouvia de seu bisavô na infância. “Meu bisavô, um velhinho muito parecido com o vovô Américo da Laura, enchia minha imaginação com as mais variadas aventuras. Mais tarde, minha avó, filha dele, continuou essa tradição. Ela me punha no colo e desfilava príncipes e princesas, monstros, piratas, ilhas e mares distantes, todo tipo de fan-
tasia”, conta. Ele ainda acrescenta que talvez não fosse capaz de contar histórias sem ter ouvido tantas. “É por meio dos livros e da leitura que o escritor se faz. E já que o tema “futebol” está presente no livro, e a noção de que aprimorar a técnica é necessidade básica, eu poderia concluir dizendo que ler é o treino ideal para quem quer escrever.” A obra “Vovô é um Cometa” integra a Coleção Tempo-Rei, do Projeto Zepelim, da Editora Positivo. Essa coleção abrange narrativas históricas que retratam outras épocas e acontecimentos marcantes da humanidade e despertam o interesse e a consciência crítica dos leitores. Uma chance de motivar os alunos para se aventurar no mundo dos livros. Ficha técnica Autor Ricardo Filho Ilustrações Ângelo Abu Formato 18 x 26 cm Número de páginas 40 Coleção Tempo-Rei ISBN 978-85-7472-854-4 Indicação vA partir de 8 anos
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por dentro do positivo
Desenvolvime Escolas Positivo expandem Educação Infantil, com a criação do Maternal, e apresentam novidades em sua estrutura física para esse nível de ensino por ‹JAQUELINE OLIVEIRA›
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Neste ano, as Escolas Positivo ampliaram a oferta de ensino com o início das atividades do Maternal II (destinado a alunos que completam três anos até 31 de dezembro de 2009), que passa a compor a Educação Infantil, seguido dos níveis I e II. Dessa forma, a instituição de Educação Básica do Grupo Positivo, em Curitiba, objetiva possibilitar o desenvolvimento integral dos estudantes, desde os primeiros anos de vida. De acordo com a pedagoga Rosângela Borba, coordenadora de Educação Infantil das Escolas Positivo, é ideal que o aluno comece sua vida letiva por volta dos três anos, uma vez que, com essa idade, a criança consegue expressar seus sentimentos e vontades, por meio da fala, e é também capaz de aceitar, com maior tranquilidade, que ficará longe da família durante um período do dia. “As crianças precisam se preparar para o desenlace e, para que isso aconteça, devem se sentir seguras. É tarefa da escola garantir a tranquilidade delas, proporcionando momentos educativos e lúdicos. Ao perceberem que o filho está feliz e adaptando-se bem à escola, os pais, consequentemente, ficam seguros
em relação à instituição escolhida para compartilharem a responsabilidade da educação de seu filho”, afirma a professora, que é especialista em Psicopedagogia e em Educação Infantil. O desenlace, que auxilia no desenvolvimento da autonomia da criança, é apenas uma das vantagens do início da vida escolar. Outro fator que deve ser considerado é a convivência com outras crianças e com os educadores, que auxilia na sociabilização e nas relações interpessoais, já que, atualmente, a maioria das famílias possui apenas um filho. “Na escola, ocorre a troca, o respeito às diferenças, a contribuição, a partilha e o estímulo de um para com o outro, inclusive no desenvolvimento da fala. O educador propõe ainda regras de convívio, inserindo, desde o começo, os conceitos de partilha e de responsabilidade”, explica. O projeto pedagógico das Escolas Positivo para a Educação Infantil se apoia em três eixos de atividades, permeados pela afetividade, que se alternam e integram o cotidiano dos alunos. A pesquisa proporciona a descoberta do mundo, a interação com a realidade, além da iniciação ao pensa-
mento Integral mento científico e filosófico. As histórias estimulam o exercício e o prazer de ouvir, imaginar, interpretar e contar. Os jogos desenvolvem o raciocínio lógico, a comunicação, as capacidades de trabalhar em equipe, de aceitar e de respeitar as regras e o próximo. No Maternal, o aprendizado está amparado principalmente no lúdico. Aulas de Artes, Música e atividades recreativas são utilizadas para estimular o conhecimento em outras áreas, como o raciocínio lógico e linguístico. Esses estudantes têm aulas de Psicomotricidade (atividades que trabalham com o movimento, com a mente e com a interação física e social, e contribuem para o desenvolvimento global da criança) e, assim como os outros alunos da Educação Infantil, trabalham com a Língua Inglesa, fazem atividades na Horta Pedagógica e têm aulas semanais de Culinária. O projeto de valores das Escolas Positivo permeia todas as disciplinas e faz parte do cotidiano dos alunos. Por meio de textos, filmes, dinâmicas, discussões e jogos, por exemplo, busca-se a sensibilização para a paz e a cooperação, a preservação do meio ambiente e o respeito, entre outras virtudes.
A estrutura física da Educação Infantil foi projetada para o desenvolvimento e a aprendizagem das crianças. Para recebê-las, as Escolas Positivo prepararam ambientes específicos para essa faixa etária, sob o conceito de arquitetura criada para ensinar. Os alunos do Maternal II também utilizam recursos já conhecidos pelos alunos da Educação Infantil, como a miniarena (espaço para debates, no qual se estimula a fala e a expressão corporal), o cineminha (local próprio para vídeos, filmes e projeções de imagens, planejado especialmente para as crianças) e o espaço externo, onde há brinquedos, parques e a areia azul, que desperta o interesse para momentos de diversão, promovendo o relacionamento e a socialização. Em cada sala, há ainda um céu, no qual luzes representam estrelas na disposição em que se encontravam em momentos históricos, como a Proclamação da República e a Emancipação de Curitiba, entre outros. Por meio desse recurso, as crianças discutem fatos históricos e Astronomia, além de explorarem a imaginação e a criatividade em momentos lúdicos.
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caravana digital
Educa ç Tecnologia e aprendizagem juntas na web Computadores portáteis que cabem na bolsa, carros que funcionam por comando de voz, celulares com televisão e internet. Essas são algumas das invenções tecnológicas que mudaram nossos comportamentos nas últimas décadas. Entre todas essas novidades, os especialistas são unânimes em defender que a mais revolucionária foi a internet. A rede, como também é conhecida, ampliou nossos horizontes nos permitindo ter acesso ao mundo sem sair de casa. Nesse contexto, surge a importância de se pensar na aplicação dessas novas tecnologias na educação. Essa demanda foi suprida com a criação de um dos maiores portais educacionais do Brasil, o Portal Positivo, um espaço que proporciona a ampliação do conhecimento, além dos livros. Referência no país em conteúdo educacional, o portal auxilia no trabalho pedagógico desenvolvido pelas Escolas Conveniadas ao Sistema Positivo de Ensino, exclusivamente. Assim, as instituições conseguem ultrapassar os limites do saber e do aprender de seus alunos e professores. “As escolas têm acesso a diversos serviços e ferramentas que incrementam o processo educativo, como, links para os conteúdos dos livros didáticos integrados ao Sistema Positivo de Ensino, Pesquisa Escolar, Encaminhamentos Metodológicos, Enciclopédia, Dicionário Aurélio, entre outros”, explica a gerente de Marketing
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de Ensino Particular da Divisão de Tecnologia Educacional da Positivo Informática, Paola Rocha. Os conteúdos oferecidos no Portal Positivo são inúmeros e voltados para a Educação Infantil, Ensino Fundamental I e II, Ensino Médio e também para educadores. Os alunos podem, por exemplo, aprender sobre as disciplinas de Geografia e História em seções como o Atlas Educacional, tendo à disposição mapas com versões para impressão e publicação em homepages. O professor, por sua vez, pode tornar suas avaliações mais dinâmicas e enriquecidas com o Editor de Provas, que oferece um banco de dados com mais de 30 mil questões dos Ensinos Fundamental e Médio, acompanhados das resoluções, dos gabaritos ou das sugestões de respostas. Com atualizações constantes, realizadas por uma equipe de 200 pedagogos, professores, articulistas, designers, programadores, entre outros, o Portal Positivo garante às Escolas Conveniadas ao SPE que seus conteúdos, ferramentas e serviços sejam adequados e pertinentes a todas as faixas etárias e níveis de ensino e estejam sempre em sintonia com a realidade educacional. Para enriquecer ainda mais o processo educativo das Escolas Conveniadas, por meio de recursos da tecnologia educacional, o Portal Positivo traz, em 2009, diversas novidades e atrações para a sua escola.
© ilustração: garga
por ‹Diocsianne Moura›
a ção 2.00 Segundo Paola, neste ano, a ferramenta traz as novas seções: Atlas Histórico, Atlas do Corpo Humano e Avaliações/Editor de Provas, incrementos na seção de Pesquisa Escolar e iniciativas inéditas, como “A Volta ao Portal em 20 dias”, o concurso de fotografias “Belezas do Brasil que só eu vejo” e o concurso cultural “Portal Premiado” etc. “Para aproveitar todas as ferramentas e os conteúdos atualizados do Portal Positivo, orientamos as Escolas Conveniadas a navegar constantemente no site para conhecê-lo cada vez melhor e usufruir das facilidades oferecidas”, explica Paola.
cUltUrA, conHeciMento e prêMios De março a maio, além do conteúdo disponível no Portal Positivo, alunos e professores das Escolas Conveniadas ao SPE poderão participar do Concurso Cultural Portal Premiado e concorrer a prêmios. O Concurso Portal Premiado vem mostrar que, além de ter acesso ao melhor conteúdo educacional e às ferramentas exclusivas, os alunos e os professores das instituições poderão, ainda, concorrer a notebooks Positivo Mobo. De acordo com Paola Rocha, essa é a primeira ação voltada aos usuário do Portal. Para participar basta fazer o cadastro/recadastro no Portal Positivo (www.portalpositivo.com.br) até
o dia 4 de maio de 2009, informar o código da escola que estuda ou leciona (que está sendo divulgado em cartazes expostos nas escolas) e criar uma frase com as palavras “Portal Positivo” e “Educação”. “Caso sua escola obtenha o mínimo de 90% de alunos cadastrados até esse dia, alunos e professores participantes terão suas frases avaliadas pela comissão de avaliação do Concurso, que elegerá as três melhores frases criadas por alunos e as três melhores frases criadas por professores, dentre todas as escolas participantes”, explica a gerente de Marketing. “Os autores das melhores frases ganharão, cada um, um notebook Positivo Mobo. E melhor: se um dos alunos vencedores for aluno de sua escola, ela será premiada, automaticamente, com equipamentos de última geração para a montagem de uma sala de aula do séc. XXI, como: uma lousa interativa, um projetor, uma max câmera e um computador”, complementa Paola. A novidade pretende incentivar o uso do conhecimento, a cultura dos participantes e a integração aluno-professor-escola. Para participar do concurso, os alunos devem estar regularmente matriculados nas Escolas Conveniadas ao SPE, no ano de 2009. O Concurso Cultural encerra no dia 4 de maio. O regulamento e mais informações podem ser obtidas no endereço: www.portalpositivo/portalpremiado.
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com a palavra
Ensinando
a viver
Para o ator Luis Melo, um professor deve sentir, acima de tudo, prazer em ensinar Um professor inesquecível vai além daquele que leciona a disciplina com que o aluno mais se identifica. Um professor que não se esquece é aquele que te “joga pra frente” e ensina o caminho das descobertas, independente da matéria que está ensinando. A opinião é do ator Luis Melo. Conhecido nacionalmente pelos papéis marcantes na sua carreira no teatro e na televisão, Melo passou a infância e a adolescência em Curitiba. Na capital paranaense estudou sempre em escolas públicas. Sente saudade do tempo em que as escolas estaduais e municipais tinham qualidade e um processo fundamental na educação das crianças e dos adolescentes. Na década de 1960, Melo estudou em escolas ícones do Paraná, como o Grupo Escolar Tiradentes
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e o Colégio Estadual do Paraná. Foi no primeiro que conheceu a professora Isis, uma senhora cujo sobrenome ele perdeu na memória. “Mas nunca me esquecerei da atenção e da alegria com que ela lecionava”, conta o ator. Ele revela que a personalidade da professora que dava aula de Português no Grupo Tiradentes o influenciou tanto que até a letra dele ficou parecida com a dela. “Hoje só escrevo em letra de forma porque minha letra cursiva ficou muito feminina”, brinca. Melo ainda cursaria Edificações, na Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná, antes de decidir-se integralmente pelo teatro. Foi quando passou a estudar no Curso Permanente da Fundação Teatro Guaíra. Apaixonado pelas Artes Cênicas, ele começou a dar aulas de teatro na cidade,
além de atuar em peças importantes do cenário teatral de Curitiba. Em meados da década de 70, Melo fez o caminho quase inevitável para quem queria uma carreira na área naquele tempo: foi para São Paulo. Entre 1975 e 1985 tornouse o primeiro ator do consagrado grupo Macunaíma, dirigido pelo “mestre” Antunes Filho. No momento, o ator está com um projeto inusitado. Ele comprou um terreno em São Luís do Purunã, a 50 quilômetros de Curitiba, e está construindo lá um complexo que vai ter capacidade para ensaios e apresentações de várias áreas artísticas. A meta é mais do que ter um espaço para apresentar os próprios espetáculos ou os de grupos amigos: é envolver a comunidade da região nos projetos e também transformar o local num espaço de estudo. Tanto que o espaço vai ter também uma biblioteca, não apenas com livros de teatro, “mas de todas as artes”. A ideia é começar ali os ensaios para o seu próximo espetáculo, que será dirigido por Marcio Abreu, da Companhia Brasileira de Teatro. A montagem terá como tema a obra de Guimarães Rosa e está, provisoriamente, sendo chamada de “Orientações”. Neste primeiro semestre, Melo está envolvido tanto no projeto dos barracões como no da peça, antes que volte à rotina de gravações da Rede Globo.”Tem uma minissérie da Maria Adelaide (Amaral) e, provavelmente, estarei no elenco”, adianta. O ator já participou de dezenas de novelas, como “Cara e Coroa”, “O Amor Está no Ar”, “Pecado Capital” e “A Padroeira”. Atuou em minisséries como “Hilda Furacão” e “Auto da Compadecida”. No cinema brilhou em filmes como “Terra Estrangeira”. Agora, se prepara para brilhar também como estrela-guia para novos atores e artistas em seu novo espaço. “Quero que seja, acima de tudo, um lugar em que as pessoas se sintam bem”.
ponto de vista
CARLA TOSATTO Assessora de Área ctosatto@positivo.com.br
O que é ser criança hoje?
© Foto: silvio aurichio. ilustração: Thiago santana
“O meu olhar é nítido como um girassol/Tenho o costume de andar pelas estradas/Olhando para a direita e para a esquerda/E de vez em quando para trás.../E o que vejo a cada momento/ É aquilo que nunca antes eu tinha visto.../ Sinto-me nascido a cada momento para a eterna novidade do mundo.” Fernando Pessoa Ser criança é ter na cabeça, fantasias; nos olhos, o brilho da poesia; no corpo, o movimento e a música do mundo. É ter curiosidade, fazer muitas perguntas, investigar! É transformar e ser transformada por meio das brincadeiras e de suas infinitas possibilidades de criação, invenção e aprendizagens. É precisar de amor, atenção, cuidado e segurança. É explorar o mundo e tornar a vida uma aventura continuamente reinvestida de possibilidades! Mas, ainda que haja características comuns às crianças que nos permitem identificá-las em qualquer parte do mundo, ser criança em uma grande cidade, como São Paulo, não é a mesma coisa que ser criança numa cidade pequena do nordeste do Brasil. Isso acontece porque a cultura na qual a criança nasce, cresce e se desenvolve é determinante para a sua formação. É na relação da criança com a cultura que hábitos, crenças e visões de mundo são criadas. É importante, pois, compreender a infância e, consequentemente, a criança não como um ser único e universal, mas sim, como um ser cultural, que vive uma experiência social e pessoal, construída e ressignificada continuamente. As crianças não são e
não existem como seres abstratos e generalizáveis. Ao contrário, crianças em tempos e espaços diferentes vivem sua experiência de infância de modo muito particular e diverso. Desconstruir essa ideia de uma criança universal é essencial para podermos olhar, sentir e conhecer as tantas crianças que vivem suas infâncias nos dias de hoje, pois, com isso, saímos do campo da uniformidade e da homogeneização, e cedemos um lugar precioso para a diversidade e a heterogeneidade. Conceber as crianças como seres humanos concretos e reais, pertencentes a diferentes contextos sociais e culturais constitutivos de suas infâncias é, pois, fundamental. Conhecer e desvelar o que constitui as muitas infâncias possíveis de serem construídas hoje exige, igualmente, levar em conta as próprias crianças, ou seja, concebê-las como atores sociais, protagonistas de seus processos de socialização. Portanto, conhecer o ser criança pressupõe um olhar atento e sensível, tanto para o contexto sociocultural ao qual ela pertence quanto para a própria criança, pois ela não é somente um produto da cultura, mas criadora de culturas; um ser
que possui uma alteridade em relação ao mundo adulto, que constrói teorias próprias e um jeito particular e especial de interagir com o mundo para tentar compreendê-lo, transformá-lo, criá-lo e recriá-lo. Isso se manifesta em muitas ações, criações e comportamentos infantis, como, por exemplo, a brincadeira, na qual a criança revela sua capacidade de ampliar, transformar e ressignificar a realidade em que vive. Isso significa que ela não imita ou copia de forma simples e direta o mundo dos adultos, mas sim, o transforma, modifica, contesta, amplia, confirma, enfim, ela pensa e elabora ideias próprias sobre o mundo, revelando suas necessidades, interesses, conhecimentos e desejos. Paulo Freire escreveu: “inacabado, sei que posso ir mais além. A construção de minha presença no mundo tem muito a ver comigo mesmo. ”É fundamental, portanto, olharmos para as crianças como produtoras e transmissoras de culturas que devem ser identificadas, potencializadas e preservadas, ou seja, precisamos olhar e conhecer as crianças com base no olhar que elas próprias têm sobre si e o mundo; conhecer as infâncias pelas vozes das crianças! Com isso, todos nós, crianças e adultos, contribuiremos para essa “eterna novidade do mundo”. Como escreveu Roseanna Murray, “O mundo é sempre novo/ e a terra dança e acorda/ e acordes de sol./ Faça do seu olhar imensa caravela.” Caravela para olhar, conhecer e dar voz às nossas crianças e às suas tantas infâncias.
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ponto de vista
ACEDRIANA VICENTE SANDI Diretora Pedagógica da Editora Positivo asandi@positivo.com.br
Se existe algo que cabe uma análise cuidadosa, é o consenso advindo de uma verdade, que não deixa espaço para dúvida. A existência de uma escola se ampara na necessidade humana de aprender e, na sua demanda decorrente, o processo de ensino. Um questionamento intrigante que subjaz esse imperativo é: aprender e ensinar são ações independentes entre si? Há um número sem fim de situações que se aprende na escola, sem que haja processo de ensino sistematizado e intencional. Seria impossível imaginar que tudo o que devesse ser aprendido, necessitasse antes ser ensinado. No entanto, o viés paralelo a esse raciocínio expõe uma dúvida muito frequente no
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meio escolar: é possível acontecer ensino e não acontecer aprendizagem? Há outro sentido mais nobre para o ofício docente do que estar a serviço das aprendizagens? Todo o trabalho do professor se concentra na mobilização de saberes que possibilite identificar as aprendizagens e as suas relações, a partir das quais, se potencializa o desenvolvimento de cada aluno, por meio do ensino. Nesse contexto, a avaliação escolar representa a energia que dinamiza esse processo, pois os registros das aprendizagens contidos em cada instrumento são geradores dos fios que permitem tecer novos processos de ensino e de aprendizagem, num mesmo tear, pela mediação que
advém do movimento das mãos de um artesão: o professor. Sendo assim, o significado que se atribui à avaliação configura a prática docente e possibilita questionar aqueles lugares comuns, aonde o professor ensina num momento, o aluno aprende noutro, para, em outro momento, reproduzi-lo, literalmente. A energia do professor e do aluno não pode se dispersar na reprodução de conteúdos prontos e acabados como se existisse um fim neles próprios; a energia de ambos tem de ser direcionada para recriar novas formas de diálogo dos conteúdos escolares com as coisas do mundo, no mundo. Para tanto, uma fração significativa do trabalho docente
é destinada a análise das avaliações, decorrente de observações minuciosas, pois é ela que sinaliza a relevância das informações recolhidas, que qualifica o que se encontra quantificado e, que ilumina, na medida do possível, os saberes e as práticas dos professores e dos alunos. Isso significa reconhecer que o ensino e a aprendizagem são faces de uma mesma moeda, com o seu valor potencializado na qualidade do processo de avaliação – responsável por revelar as performances de professores e alunos. Quando se investe as energias em novas possibilidades de aprender, se constrói novas possibilidades de ensinar!
© ilustração: Thiago santana
A avaliação está para o ensino, assim como o ensino está para a aprendizagem
0,5% é o q Floresta ue resta da c Seria um om Araucária. ó número s timo e fosse imposto.
Most r resp e que s onsa ua e Seja b m um A ilidade presa t ssoc e Com iado ambient m apen al. C o r empr pora as u tivo e e po sa ajud ma doaç da S ã de g a o PVS. a p or a o se anha p r e s n l E o o “Asso r o dir ervar a o, sua e v Impo alor ai ciado C ito de naturez o usar sto a n rpor d a A na d ture e Renda pode se ativo”. r za a . grad Partic deduzi www. do d ece i spvs o a pr pe. .org 41 3 efer ênci .br/ 339a. doa 463
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