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Texto Ideal

PARTICIPAÇÃO ESPECIAL

Josias A. de Andrade

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Sucesso à sombra de um talento oculto

Oofício de revisor – levando em conta anos de prática e as muitas incursões por textos alheios, aparando rebarbas aqui, sugerindo acréscimos ali, melhorando conteúdos e formas acolá – de certa forma dá ao profissional imbuído neste mister elementos mais do que suficientes para também desbravar este universo do faz de conta da literatura. Em face da qualidade dos textos que chegavam a mim para serem revisados e preparados, percebi que havia um nicho que poderia ser mais bem explorado. Muitas pessoas têm o desejo de se tornar escritoras, publicar uma história da família, da empresa, escrever um diário ou mesmo alimentar o ego de ter o nome em uma publicação, independentemente do gênero. Observando esta necessidade, vi que poderia explorar esse campo e assim “ajudar” muitos entre os que nutrem esse desejo.

Atuar na condição de ghost writer 1 é, grosso modo, vender o próprio talento por alguns trocados. Sei que ainda hoje muitos ficam pasmados com a ideia, mas que é algo factível, disso não tenho dúvida. E quantos não vendem o talento que têm de outras formas? Mas fato é que resolveram pegar o escritor-fantasma para ser o “judas” da vez. E este trabalho, ainda que alguns não vejam com bons olhos, é uma atividade recorrente nos dias de hoje. E o mais interessante é que o beneficiário do serviço age em total “cumplicidade” com o escritor. Se é um acordo tácito entre as partes – o que escreve e o que leva a fama –, que mal há nessa prática? Não importa que foi “encomendado”, a meu ver interessa ao leitor a obra de fato e não quem teve a ideia, quem escreveu, organizou ou pariu o texto finalizado. Enquanto muitos se ocupam de “balelas” para justificar o que não se justifica, os

anônimos escribas agem no silêncio, longe daquilo que menos interessa, a opinião dos incomodados.

Tomemos como exemplo José Costa, um nome de bastidores, um homem por trás de outros nomes. Costa, um gênio das letras, está fadado ao anonimato, e aceita esta condição resignadamente. Ele é um escritor-fantasma e o protagonista de Budapeste (2003), romance de Chico Buarque de Hollanda, que conta a história de um escriba altamente competente e que vive um profundo conflito existencial ao confrontar-se com o tormento de condenar-se a permanecer à margem do sucesso. Conflitos à parte, ser um fantasma das letras é uma condição voluntária. Dito isso, chego à conclusão de que se um “fantasma” se sente inseguro ao atender seu cliente, respeitadas as particularidades do “negócio”, ele deve imediatamente mudar de atividade.

O ofício de escritor-fantasma – é bom que fique claro – é muito antigo, mas ainda hoje sofre o incômodo preconceito de toda sorte de tabu. Aos olhos de muitos, ser o autor intelectual, mas não de direito, de um livro, canção ou de uma apresentação, não é algo tão facilmente aceitável.Mas apesar de muitos questionarem a ética na relação dos que comercializam o trabalho intelectual, a paternidade de obras escritas por ghost writers é resolvida entre as partes, por meio de contrato assinado entre os envolvidos no “negócio”. Se se trata de uma relação comercial,

quer mais civilidade do que essa?

A questão do direito autoral fica claríssima para o cliente no momento da contratação do serviço. Os direitos são cedidos integralmente, mediante documento registrado em cartório, tenho dito aos meus clientes quando sentamos à mesa para negociar. Já o advogado Rodrigo Moraes, que escreveu sobre esta prática o livro Os direitos morais do autor, esclarece que o ghost writer não é um plagiador. Ao contrário, diz: “ele cria e, em busca do dinheiro, abre mão da paternidade (que é direito inalienável e irrenunciável), prometendo tacitamente um silêncio tumular. Contrai, assim, uma obrigação de confidencialidade”.

Segundo o advogado, “no Brasil, o Código Civil de 1916, que tratou do direito autoral até 1973, dizia, de maneira absurda, em seu artigo 667, que era permitida a cessão de autoria. Em outras palavras, naquela época, a venda da paternidade de uma obra era lícita. Atualmente, todavia, o direito à paternidade é inalienável e irrenunciável. A lei proíbe a cessão de autoria exatamente para proteger a parte hipossuficiente –o autor”. Resta saber como é que se faz obedecer esta lei, pois se houver algum litígio entre o contratante e o contratado significa que uma das partes não cumpriu o que foi acordado.

No que concerne a discurso político, Rodrigo comenta um caso de ghost writer muito comum, o dos assessores de imprensa, que costumam escrever discursos para políticos ou artigos para serem publicados em jornais. “Não vejo algo pernicioso nisso”, pontua. É uma coisa normal, desde que o cliente dê as notas do discurso.

Como revisor de textos, em centenas de obras praticamente reescrevo o texto. E ninguém fala da “arte e talento do copidesque”. Por que também a lei não vem em defesa do copidesque? Muitos autores, após terem seus textos copidescados pelo revisor, não os reconhecem e se espantam com a qualidade anos-luz à frente daquilo que apresentaram originalmente. Assim, o revisor que fez o copidesque deveria também ser valorizado por ter “emprestado” ou “vendido” seu talento. Não se fala nem em coautoria.Ora, se querem tratar da questão, que o façam de forma abrangente, e que a lei discipline todo o trabalho de edição e produção editorial e literária, incluindo as atividades do revisor de textos em suas diversas etapas na cadeia produtiva do livro!

Para o advogado, o caso grave de ghost writer “é quando a obra é literária, como um romance ou uma obra musical”. Ainda assim, é cada vez mais usual celebridades e anônimos demandarem os serviços de um escritor-fantasma para escrever o livro que desejam publicar.

Já foi dito por meio da imprensa que O caminho das borboletas (1994), livro no qual Adriane Galisteu conta como foram seus 405 dias com o piloto Ayrton Senna – um su

cesso editorial com mais de 270 mil exemplares vendidos – foi escrito por um ghost writer. Assim como O doce veneno do escorpião (2005), assinado por Bruna Surfistinha.A diferença é que a ex garota de programa nunca escondeu que a tarefa coube a um jornalista – Jorge Tarquini.

No mercado literário é mais comum do que se pensa encontrar trabalhos de escritores fantasmas. Muitas vezes, são livros que nunca chegarão ao mercado editorial. O jornalista e escritor Armando Alexandre dos Santos, que incorporou também este ofício em sua rotina, conta o caso de uma publicação encomendada por uma família, para ter como leitores apenas seus membros e os das suas próximas gerações.

“Foi o serviço mais fora do comum que peguei”, conta Santos. “Uma família que tinha um segredo conhecido apenas dos mais velhos e que, por uma série de razões, os mais novos queriam que ficasse documentado e fosse conhecido pelas gerações mais novas da família. Com o consentimento de todos, fizemos uma reunião conjunta, e a pessoa mais velha da família contou com pormenores todo o episódio doloroso e traumático que, durante décadas, nunca tinham visto de frente, com toda a clareza. Fizemos, como resultado, um livro que se destinava exclusivamente a ficar guardado nos arquivos da família. Nunca foi nem será publicado. Acabamos ficando amigos.”

Afirmo que não tenho apego às obras que escrevo, ainda que sejam distribuídas no mercado editorial com o nome de meu cliente. Não há conflito com relação ao fato de emprestar meu talento aos que não o possuem ou não dispõem de tempo para escrever: encaro esta

questão com naturalidade. Afinal, tenho ciência de que quando “aquela” obra que escrevi for lançada, não estarei na sessão de autógrafos. A relação entre o ghost writer e seu cliente não pode ser uma disputa, tampouco uma submissão de um em relação ao outro, já que se trata de um trabalho feito a quatro mãos. Resumindo: o cliente entra com as ideias e a verba e o ghost, com o talento. Isto me lembra os trabalhos de grupo, feitos na escola: apenas um fazia a pesquisa, redigia o texto e colocava o nome dos demais. Na avaliação pelo professor, todos se beneficiavam da nota à sombra do talento e esforço de apenas um autor. Se esse aluno que fazia o trabalho e colocava o nome dos demais cobrasse por isso, não estaria agindo como um fantasma? Comigo acontecia isso, só que eu nada recebia em troca. E todos ficavam bem na foto. E tenho certeza que até nos dias de hoje funciona assim.

A clientela que apela para o escritor-fantasma é bem variada: desde políticos, que às vezes pedem que escreva sobre assuntos escandalosos em que se meteram, passando ao público sua versão dos fatos, a empresários querendo contar a história da organização e sua trajetória de sucesso.

Apesar da aura de mistério, os ghost writers não costumam se esconder.Para eles, está claro que o ofício é regido por três mandamentos: preservar sua identidade nas obras que escrevem; manter no anonimato a relação com os clientes e jamais falar sobre os trabalhos realizados. Para esse profissional – barriga de aluguel da obra intelectual – o segredo é a alma do negócio.

Interessados em serviços de revisão de textos, preparação de originais, copidesque, cotejo com tradução de obras originais, biografias pessoais e empresariais, apresentações e resenhas, entrem em contato com a Texto Ideal – Serviços Editoriais, há 18 anos agregando valor às ideias.

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