A terceira idade nº 19 a terceira idade e o computador interação e transformações significativas

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ANO XI N° 19 ABRIL 2000

A TERCEIRA IDADE EOCOMPUTADOR: INTERAÇÃO ETRANSFORMAÇÕES SIGNIFICATIVAS Vitória Kachar

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APOSENTADORIA ECIDADANIA Denis Antônio de Mendonça Bernardes

ÜFICINAS DE TERAPIA DA MEMÓRIA: CONHECENDO EPRESERVANDO A MEMÓRIA NA TERCEIRA IDADE Maria Auxiliadora Cursino Ferrari

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PLANTAS MEDICINAIS: NOÇÕES BÁSICAS PARA ATERCEIRA IDADE Marcos Roberto Furlan

A ARQUITETURA EOS IDOSOS: CONSIDERAÇÕES PARA A ELABORAÇÃO DE PROJETOS Maria Cristina Schicchi Publicação Técnica editada pelo SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO (SESC), Administração Regional no Estado de São Paulo - Av. Paulista, 119- 9<>andar - CEP 01311-903 - Tel. 3179-3578 São Paulo-SP. Diretor do Departamento Regional do SESC/SP: Danllo Santos de Miranda, Superintendente Técnico-Social: Joel Naimayer Padula, Gerente de Estudos e Programas da Terceira Idade: Marcelo Antonio Salgado. COMISSÃO EDITORIAL: Antonio Arroyo (Organização e Revisão), José Carlos Ferrlgno (Organização e Revisão), Maria Lucla Dei Grande, Regina Ribeiro (Organização e Revisão), Marcelo Antonio Salgado (Coordenação). PROJETO GRÁFICO: Eron Silva. ARTE: Cristina Miras, Cristina Tobias, Eurfpedls Silva, Marllu Donadelli, Lourdes Teixeira. Fotos: Eron Silva e Nllton Silva

Artigos pani publlalção podem ser enviados para apreciação da comissão editorial, no seguinte endereço: Revista Tercelni klllde- Ger6nda de Estudos e Programas da Terceira Idade (GETI) - Av. Paulista, 119- 90 andar CEP01311-903-Fone (011) 3179-3570-Fax (011) 3179-3573 - e-mall: sescsp@sescsp.com.br-sao Paulo-SP



APR

N este final d e milênio são mui-

M esmo uma breve análise nos

tos os desafios qu e povos e governos enfrentam para a co n strução

leva a considerá-la uma boa lei, por sua abrangência e precisão, pois abarca

d e uma sociedade mais humana e

áreas fundamentais como saúde, pre-

igualitária. O fenômeno universal

vidência, educação, família, moradia,

do envelhecimento da s popula ções, decorrência do aumento do

cultura, esporte, lazer. Todavia, o pre ocupante é que, a despeito d e todo o

tempo de vida, tem c olocado na

investimento de tempo e de recu rsos

ordem do dia a questão dos idosos e dos aposentados . Embora a lon-

financeiros na elaboração, sua aplicação tem sido praticamente nula. La-

gevidade constitua uma notável

mentavelmente, parece ser uma trad i-

conquista da ciênci a, todas as p essoas sensatas são unânimes em afir-

ção em nosso país, as leis, quando existem, tornarem-se letras mortas.

mar que mai s importante do que ter a existência pro l ongada, é en -

Claro está que as responsabilidades pela promoção do idoso de-

velhecer com dignidade e qualida -

vem ser comparti lhada s pelo Estado

de de vida . Não é demais lembrar da Lei

e pela socied ad e civi l. Empresários.

8 .842, até porqu e muitos bra sil eiros

setores sociais devem da r sua contri-

a desconhecem. Em 04 de janeiro de 1994, o Congresso Naciona l decre-

buição, a lém de cobrar do Poder Executivo o cum primento da legislação.

tou e o Presidente d a República san-

Segundo Simone d e Beauvoir,

cionou essa lei que dispõe so bre a

o grau de civi lização de uma deter-

políti ca nacional do idoso. Su a regu-

minada sociedade pode ser medido

lamentação em 0 3 de julho de 1996, estabeleceu as competências do s

pela tipo de tratamento dispensado a seus velhos. Se em algumas socie-

órgãos e das entidades públicas para a implantação da lei. É imperioso res-

dades do passado os idoso s foram t ratados de modo até crue l, é bem

saltar que a formulação da Política

verdade, como assegura essa pensa-

Nacional do Idoso, foi resultado de

dora, que em outras e les desfruta -

muitas reuniões de técnicos, especiali stas e instituiçõe s p ú blica s e pri-

ram de ca rinho e respeito. O Bra si l se quiser alcançar a modernidade e o

vadas. Aliás, o SESC esteve presente

de senvolvimento certame nte terá

em tais discussões repassando sua experiência com o traba lho so cia l

que não apenas amparar a infância e

com idosos.

intelectua is, trabalhadores e demais

a juventude, mas avançar muito nas políti cas de assistêncía à velhice.

Abra m Szajman Presidente do Conselho Regional do SESC de Sã o Paulo



A Terceira Idade e o Computador: Interação e Tra nsfarmações Significativas VITÓRIA KACHAR DOUTORANDA NO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: CURRÍCULO DA PUC/ SP. PROFESSORA DA UNIVERSIDADE ABERTA PARA A TERCEIRA IDADE DA PUC/ SP. CONSULTORA E DOCENTE NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM INFORMÁTICA NA EDUCAÇÃO.

"Dominar o computador é um ritual de passagem para a modernidade... Há uma busca muito forte de inserção no movimento do mundo e em estabelecer diálogo com as gerações mais novas, representadas pelos netos que sentam para ensinar a vovó a mexer no computador e pelos filhos que sentem orgulho das mães que avançam no desempenho com a máquina". A fF RCEIRA IDADE


"Gosto de descobrir o verdor

invisíveis (a tutelagem, a recusa do diálogo

num velho e sinais de velhice

e da reciprocidade que forçam o velho a

num adolescente.

comportamentos repetitivos e monótonos,

Aquele que compreender isso

a tolerância de má-fé que, na realidade, é

envelhecerá talvez em seu corpo,

banimento e discriminação), por mecanis-

jamais em seu espírito (Cícero, 1997: 32).

mos técnicos (as próteses e a precariedade existencial daqueles que não podem

O Idoso e os Preconceitos

adquirí-las), por mecanismos científicos (as "pesquisas" que demonstram a incapaci-

A denominação Terceira Idade in-

dade e a incompetência sociais do velho)

dica o grupo etário a part ir de 60 anos.

(Chauí, in Apresentação, Bosi, 1994: 18).

Muitas instituições e universidades abrem

Ao termo idoso associa-se a situa-

vagas para os cursos a partir dos 45 anos,

ção de aposentado, inativo, indicando

o que é o caso do contexto da nossa

improdutividade. A aposentadoria nesta

pesquisa de doutorado e artigo, mas a

perspectiva libera o idoso da produção e

maior concentração da faixa etária I en-

da atividade de trabalho e lhes atribu i o

contra-se entre 61 e 70 anos.

estatuto de pessoa sem ocupação e com

Atualmente, desponta um aumen-

o tempo livre para o lazer e o descanso

to significativo da população idosa, cres-

merecidos. O contexto socia l parece pro-

cendo proporcionalmente quase oito ve-

piciar uma situação cômoda para o ido-

zes mais que os jovens (Caldas, 1997, in

so, mas pode estar reforçando va lores

Veras, org.). Muitos serviços nessa área

depreciativos, ao considerá-lo desocu-

vêm surgindo e sendo oferecidos ao ido-

pado e impossibilitado para o trabalho.

so. Mas a relação com o idoso e sua ima-

O estado da velhice é definido por

gem na sociedade vem se transforman-

fatores culturais e políticos e não apenas

do muito lentamente, ainda revelando

biológicos. Velhice é uma instituição polí-

t raços de preconceito e exclusão. Alguns

tica. ( ... ). O cidadão é velho não apenas

deles emergem no campo social, institu-

porque seu organismo está em processo de

cional e familiar.

declínio biológico, mas sobretudo porque

Oprime-se o velho por intermédio de

assim é decretado (Caldas, 1997: 124).

mecanismos institucionais visíveis (a bu-

Avalia-se a velhice pelas marcas do

rocracia da aposentadoria e dos asilos),

corpo, vinculando a fragilidade do físico à

por mecanismos psicológicos sutis e quase

intelectual e psicológica, inferindo-se por

1

Pesquisa elaborada pela equipe de alunas do Jornal Compuetador, dentro de uma amostragem de 191 questionários respondidos pelos alunos da Universidade Aberta para a Terceira Idade. Publicada no Jornal Compuctador n° 2, São Paulo, maio de 1999: 3 6


meio do corpo o estado da mente. Ojovem

Introdução ao Computador

qu se torna idoso é o mesmo que um dia

para a Terceira Idade

valorizou a juventude e, por isso, pode carregar a mesma representação negativa de

Em setembro de 1997, resolvi de-

velhice. Assim o preconceito é algo gerado

senvolver um trabalho com os alunos

de fora para dentro (social e cultural) e de

(97,4% mulheres e 2,6% homens) 2 da

dentro para fora (individual), pelos que vi-

Universidade Aberta para a Terceira Ida-

vem essa etapa (Brochsztain, 1998).

de da PUC/SP. Propus um projeto de cur-

O idoso é considerado alguém

so de Introdução ao Computador, para

que observa o tempo passar, que fica

gerar a entrada ao mundo tecnológico

de fora do movimento, está inserido na

da informática, por meio da promoção

estabilidade, acomodação e conserva-

do aprender, não reduzido ao desenvol-

ção. Um projeto de vida requer planos,

vimento da habilidade e ao domínio ope-

então o idoso é excluído e, muitas ve-

raciona l.

zes, ele próprio se exclui do projeto por

A Universidade Aberta, através da

acreditar que é algo que demanda um

COGEAE - Coordenadoria Geral de Espe-

longo prazo, uma nova vida. O projeto

cialização, Aperfeiçoamento e Extensão,

é lançado para o futuro, e a velhice é

vinculada à PUC/SP, oferece educação

comparada ao passado. Essas visões

permanente, para pessoas de ambos os

sobre o idoso são estigmas construídos

sexos a partir dos 45 anos. Os cursos re-

em realidades e tempos diferentes,

gulares duram três semestres e têm 90

porém permanecem como filtro nas

horas/aula, com encontros de duas tar-

relações entre as gerações.

des por semana. O programa busca pro-

Para romper com esse estereótipo

porcionar atualização cu ltural, orienta-

e mostrar como o idoso é capaz de pro-

ção em relação aos aspectos físicos e emo-

duzir e se envolver com projetos de vida,

ciona is, além de atividades sócio-cultu-

apresentaremos o processo de apropria-

rais.

ção da tecnologia computacional e o uso

O curso de Introdução ao Computa-

dela para a criação de um jornal para dar

dor é optativo, fora do horário de aulas.

voz e vez aos alunos da Universidade

Assim como o de teatro e coral, dura dois

Aberta da Terceira Idade.

semestres, com uma hora e meia, uma

2

ibidem.

A TERCEIRA IDADE


vez por semana. São se is turmas com 12

interesse ocorre porque as mulheres,

vagas 3 (no máximo) cada uma, sendo três

dessa geração, vivenciam esse momento

turmas para alunos novos/iniciantes -

como uma nova etapa de vida. A outra

módulo 1; duas, para continuação - mó-

questão é o fato de as mulheres viverem

dulo 2, e uma, para a equipe do Jornal

mais que os homens, levando vantagem

Compuetador, formada por alunas que

bio lógica. Por esses dados, no decorrer

mostraram desenvoltura no domínio do

do texto, a referência aos alunos será fei-

computador e se interessaram, compro-

ta usando o pronome no feminino - elas.

metendo-se e assumindo a proposição e editoração de um Jornal que refletisse as

Do início da Proposta com as alunas

idéias e pensamentos dos(as) alunos(as). A idade dos(as) alunos(as) que fre-

No início, o ambiente das aulas era

qüentam o curso de Introdução ao Com-

um pouco caótico; as 14 alunas parecen-

putador varia de 45 a 83 anos. A média

do o dobro de participantes. A inexperi-

das idades é 60 anos, a maior porcenta-

ência especificamente com esse grupo

gem - 11 %, tem 62 anos, segu ida por

etário apareceu nas dificuldades durante

8,9%, igualmente com 60 e de 64 anos.

o desenrolar das aulas. Requisitavam a

Até o momento, só participaram

professora a todo momento, e às vezes,

quatro alunos do sexo masculino no cur-

sobre as mesmas questões. Era preciso

so, a maioria sendo do sexo feminino,

repetir várias vezes. A culpada anunciada

prevalecendo uma distribuição sim ilar à

por vários: a memória.

porcentagem dos alunos da Universida-

A repetição contribui para a me-

de Aberta. A incidência alta de mulheres

morização, pois age na função sináptica.

também ocorre em outros programas.

A partir de dois anos de idade, começa a

No Brasil, esses programas têm mobiliza-

perda de neurônios em escala pequena e

do sobretudo mulheres, sendo que a parti-

gradativa, afetando várias funções. No

cipação masculina raramente ultrapassa

caso da memória, perdem-se informa-

os 10%, afirma Oebert (1994:35), lembran-

ções que vão junto com os neurônios

do que o entusiasmo manifestado pelas

(lzquierdo, 1998).

mulheres na realização das atividades pro-

Mas a memória não era a única

postas contrasta com a atitude de reserva

questão implicada, pois tentava-se des-

e indiferença dos homens (Sant'Anna,

cobrir e construir o caminho de como

1997: 80, in Veras, org.). Para o autor, tal

ensinar essa tecnolog ia para esse públi-

A primeira turma começou com 14 alunos, sendo o nl'.1mero reduzido para 12, pela dificuldade de atender adequadamente ao grupo todo. 3


co. Tudo muito desconhecido: os ícones,

de lutar para que não sejam ultrapassa-

o mouse, a velocidade, a metamorfose do

das e marginalizadas pela imobilidade

cursor (seta, ampulheta - que pede tem-

do corpo e da mente. A apropriação da

po...), a leitura da tela nos diversos senti-

tecnologia do computador pode ser o

dos e disposições, o excesso de informa-

passaporte para a modernidade e a inser-

ções/recursos, o peso dos dedos sobre o

ção no tempo e nos movimento atuais.

teclado etc. A tecnologia desvela dificul-

Aceitaram o primeiro desafio de

dades provenientes da idade, que não é

voltar às carteiras escolares, ao se matri-

só a memória, mas a coordenação

cularem na Universidade Aberta, com

visomotora, a visão frágil para enxergar e

proposições diversas do ensino anterior,

discriminar os ícones pequenos etc.

com opções de disciplinas, como: Contos

Como transformar esse universo

de fadas para adultos, História do Cinema,

desconhecido em familiar e acessível ao

Memórias, Autoconhecimento etc. O se-

idoso? Uma pergunta que persiste du-

gundo desafio foi enfrentar o computa-

rante o meu trajeto como professora e

dor, apesar das situaçõe~ desconcertan-

pesquisadora. Observa-se, neste contex-

tes a que ficam expostas. Têm dificulda-

to, que a tecnologia computacional é o

des para manusear o mouse, apontar o

novo, um estrangeiro, um intruso deseja-

cursor e abrir as janelas e arquivos, que se

do e rejeitado. Sentimentos ambíguos se

avolumam na tela, com os olhos surpre-

instalam na relação com a máquina. Nela

sos e o comportamento paralisado por

se depositam esperanças, angústias e an-

não saber como resolver. Pedem que a

siedades. Mãos suadas, trêmulas, tensas

situação seja resolvida e perguntam o

experimentam, em várias tentativas in-

que fizeram para gerar aquilo. Desejam

sistentes, quase desistentes, o acesso ao

saber como e por quê. No computador

domínio do mundo moderno. Mãos no

diversos caminhos se desdobram em um

teclado e no mouse, sem a leveza e des-

mesmo lugar, esperam uma receita, para

treza que a tecnologia exige.

chegarem lá "ilesas". Não querem errar.

Trata-se de uma geração que nas-

Na expressão verbal aparece a ima-

ceu e foi educada em uma época em que

gem/identidade que vão dando ao com-

o tempo transcorria em outra velocidade

putador na interação com ele: bicho de 7

e as situações tendiam à estabilidade.

cabeças, monstro sagrado, fera. É multifa-

Atualmente, quem não acompanha as

cetado. Querem domá-lo para que as

modificações sociais e tecnológicas fica

obedeça. A máquina se apresenta mais

para trás e de fora, isso aparece sublimi-

como masculina e como jovem. O apare-

narmente nas falas. As alunas parecem

cimento do computador é muito recen-

estar imbuídas da vontade e disposição

te, em torno de 60 anos, mas a entrada

A TERCEIRA IDADE

9


nas casas e o acesso ao PC (personal

tador para cada um ou, eventualmente,

computer) não tem muito mais que 25

dois alunos. São explorados os progra-

anos. Elas repetem:- Meu filho sabe, meu

mas:

marido em um computador, meu bisneto

Windows95 e Word974•

já mexe. E, subliminarmente à fala, entende-se:- Menos eu! Mas vou chegar lá.

Introdução ao Micro,

Paint,

Inicia-se o curso com o Introdução

ao Micro, que é um programa tutorial que

Dominar o computador é um ritu-

leva passo a passo o usuário a conhecer

al de passagem para a modernidade. A

algumas potencialidades do computa-

possibilidade de entrar nesse mundo

dor através do fazer, de forma agradável

está relacionada diretamente a inserir-

e lúdica. A idealização e produção deste

se no atual, a acompanhar as gerações

software foram realizadas pelo SENAC/

novas, a estabelecer um espaço de co-

SP, objetivando amenizar a ansiedade do

municação e aproximação, a falar ames-

primeiro contato e satisfazer o desejo de

ma linguagem. Uma aluna de 83 anos,

manusear a máquina. Tal recurso tem

me disse: - Nunca desisti de nada! Com-

sido importante para o contato inicia l,

preende-se as outras palavras implícitas

principalmente com esse público, pois

na fala: Não permita isso acontecer. E ela

encaminha as atividades e proporciona

não desistiu e atualmente acessa a

segurança ao usuário, pois elas vêm inse-

Internet da sua casa.

guras e temerosas em lidar com esse des-

Professora e alunos assumem a

conhecido. A ansiedade é reduzida, ao se

cumplicidade e a responsabilidade de

retomar com elas o que experimentaram

provar que é possível chegar lá. Difícil

e conheceram sobre o computador e

tarefa! Compromisso estabelecido entre

acrescentam-se informações técnicas no

todos, explicitado verbalmente. Todos

limite das dúvidas.

são de alguma forma co-responsáveis e

Paint é um software para desenhar

precisam avançar, mas respeitando o rit-

e pintar, que possibilita a introdução gra-

mo e tempo de cada um.

dativa no mundo dos menus, teclas e suas funções, de forma simples e acessí-

Programa do Curso de Introdução ao

vel, pela sua plasticidade e ludicidade.

Computador

Desenvolve a coordenação visomotora para lidar com o mouse e conhecer a

O curso de Informática é introdutó-

interface de menus e ferramentas que

rio, com aulas/oficinas com um compu-

caracterizam os programas. Élançado um

A definição da versão dos programas está diretamente relacionada à estrutura do Laboratório de Informática Aplicada à Pesquisa (LIAP), espaço utilizado para o curso de Introdução.

4

10


tema sobre a representação que cada um

pante percebe que não só ele tem dificul-

tem do computador para desenhar e es-

dades, mas os colegas também. Falar e

crever a respeito. Isso permite refletir e

discutir sobre suas próprias dificuldades

tomar consciência dos sentimentos, fan-

permite uma elaboração do significado

tasias, expectativas e medos deposita-

subjetivo, sendo revisto no coletivo com

dos na máquina. A reflexão sobre senti-

a intenção de ressignificá-lo.

mentos possibilita a desconstrução de

O Windows95 é ensinado na me-

alguns, como a mistificação da máquina,

dida em que surge a necessidade de se

e a construção de outros, gerando a mu-

movimentar pelos programas e com-

dança no comportamento de interação

preender a estrutura de funcionamen-

com o computador. E, ao dividir medos e

to do computador. Trabalha-se a metá-

ansiedades com o grupo, cada partici-

fora de janelas e a organização em ar-

ATERCEIRA IDADE

11


quivos, pastas.

verbalizam suas hipóteses sobre o que é

O Word97 é o programa em que

e a função do botão/ ferramenta . A inter-

ficam mais tempo pela possibi lidade de

pretação é feita coletivamente, permi-

produção e criação de textos próprios e

tindo uma leitura compreensiva da lin-

pelo interesse e utilidade no uso cotidia-

guagem do computador em sua inter-

no ou profissional. O primeiro texto que

face de ícones para que não se respal-

produzem no Word é a digitação de al-

dem somente na memória. Alguns

guns versos de uma poesia de Mário

ícones são decodificados com muita di-

Quintana, para não gerar muita ansieda-

ficu ldade, outros apresentam-se como

de no domínio inicial dos recursos e pos-

estrangeiros, apresentando o desconhe-

sibi litar a familiaridade com as teclas.

cido na linguagem de comunicação con-

Posteriormente, propõe-se a leitu-

temporânea .

ra de alguns textos selecionados, que vêm

As mãos começam a adquirir leve-

no material de apoio, e a construção de

za e elas vão se sentindo mais confiantes

reflexões. Na criação dos primeiros tex-

na medida em que vencem algumas eta-

tos, algumas denotam falta de confiança,

pas. O processo é gradativo, avança no

dificuldade e resistência em expressar as

ritmo do grupo, considerando sua diver-

próprias idéias por escrito. Afirmam que

sidade e heterogeneidade.

não sa bem escrever reflexões, e insistem

A idade não é fator definidor das

em copiar algum texto. Mas, no decorrer

possibilidades de acesso ao computador.

do curso, observa-se que gostam dos tex-

Algumas alunas mais velhas apresentam

tos e trazem reflexões interessantes que

condições melhores que outras mais no-

são compartilhadas, propiciando a pre-

vas. Existem diferenças entre alunas da

sença do sujeito singular e o estabeleci-

mesma idade, apontando a não homo-

mento do vínculo coletivo dentro da di-

geneidade desse grupo etário. Às vezes,

versidade de mundos e leituras. No final

perguntam antes de tentar fazer ou des-

do curso, identifica-se o aumento do nú-

cobrir, insiste-se em que experimentem

mero de linhas do texto, a fluência da

sozinhas e/ ou procurem na aposti la. Esta

escrita e o prazer de escrever e ler para as

contém algumas informações básicas

colegas.

para explorar os programas do curso, tex-

Em todos os softwares é feita a lei-

tos escolhidos da literatura (Ru bem Alves

tura e interpretação dos ícones, para que

- Velhice; Leonardo Boff - A águia e a

possam ser decodificados. As alunas ten-

galinha; lçami Tiba - Portas; Mário

tam identificar a representação da ima-

Quintana - poemas) e páginas para faze-

gem/ícone, experimentam a ferramen-

rem suas anotações e observações. Ta l

ta e através do fazer e experimentar,

material se rve de apoio nas dúvidas

12


operacionais que surgem no decorrer das

se vêem atravessadas pela angústia do

aulas, que já foram abordadas e, tam-

que fazer e de qual o caminho correto.

bém, para anotarem aquilo que estão

Propiciar a apropriação do compu-

descobrindo de novo. Isso antes era feito

tador envolve três aspectos articulados

em agendas, folhas soltas, o que dificul-

entre si: o operacional, a linguagem da

tava o entendimento posterior do que

máquina e a abordagem pedagógica.

tinham anotado. A apostila serve de refe-

O aspecto operacional: aprender a

rência ao que estão aprendendo e o exer-

operar o computador-como fim, o domí-

cício da anotação é mais um caminho

nio da tecnologia e do seu funcionamen-

para a compreensão da situação-proble-

to, desenvolver a habilidade e a destreza

ma em que estão envolvidas. Ao fazerem

visomotora com o mouse, as teclas, re-

anotações, estão expressando através da

cursos de hardware (equ ipamento) e

escrita o entendimento que tiveram do

software (programas). Mas o processo não

verbal e vivencial, percorrendo um ou-

se encerra no programa, possibilita-se a

tro caminho cognitivo que gera apren-

apropriação operacional por meio de um

dizagem.

aprender que promova o indivíduo nas diversas características que integram o

O aprender e o computador

seu ser. Aspecto da linguagem: leitura, in-

O ambiente educacional das aulas/

terpretação e compreensão da nova lin-

oficinas é diferente do ambiente que fre-

guagem tecnológica da comunicação -

qüentaram, quando jovens. Educadas em

ícones.Trabalha-se a semântica dos me-

uma época em que o ensino se dava na

nus, a tradução da palavra, o contexto de

autoridade, na disciplina, no seqüencial

origem e o conceito subjacente. Por

e no direcionamento, ainda não tão dife-

exemplo: a palavra Salvar, tradução de

rente do atual. Antes, um mesmo e único

Sove, indica gravar um arquivo, para não

jeito de resolver um problema era apon-

perdê-lo. Com o ícone, o processo é se-

tado e exigido, e o erro era castigado. O

melhante, desde a sua discriminação vi-

processo com o computador permite um

sual, identificação e compreensão da sua

leque de caminhos para lidar com uma

função. São feitas associações com o

mesma situação. Cabe ao indivíduo ades-

mundo concreto para haver melhor en-

coberta e a escolha da forma de resolu-

tendimento do ícone.

ção, através do tentar, errar e acertar. São

A abordagem pedagógica: parte do

tantos os recursos e as possibilidades que

referencial de Papert5 (1994) e Valente

5

Papert foi discípulo de Piaget.

A TCRCCIRA IDADC


(1998) sobre o aprender pormeio do com-

gerador de conflitos cogn itivos e emoci-

putador. Papert propõe a utilização da

onais.Busca-se o entendimento da situa-

6

Linguagem de Programação Logo na

ção-problema e a sua resolução através

promoção da aprendizagem e constru-

da identificaçã o do problema, verifica-

ção do conhecimento pel o aluno, o que

ção dos recursos di sponíveis, estru-

ele denomi na Construcionismo. Va lente

turação da estratégia e experimentaçã o

descreve um ciclo de interação com o

da ação. Se o objetivo foi alcançado ou

computador, levando o aluno a depurar

não, é rápido e evidente para o aluno. O

o seu pensamento sobre a situação pro-

aprender desenrola-se no fazer e experi-

blema: descrição-execução-reflexão-de-

mentar para alcançar o objetivo, fazer e

pu ração. Essas abordagens privilegiam o

refletir sobre o acontecido e fazer para

aprender e indicam a importância do pro-

descobrir. O indivíduo aprende

fessor como mediador do processo de

tornando-se, onde encontra-se num mo-

aprendizagem e não instrutor, "en -

vimento de mudança e de transforma-

sinante" ou informador. Apesar de não se

ção subjetiva, que atravessa, o desenvol-

estar utilizando esse programa, mas o

vi mento intelectual e o social. Ao apren-

Paint e o Word, procura-se envolver as

der por meio da descoberta, há uma cons-

alunas nesse processo de interação refle-

trução e apropriação do aprendido pelo

xiva com o computador. A criação do

aluno que o modifica. Mas esse descobrir

desenho ou digitação, construção e

não é só sobre o descoberto; é também,

formatação do texto são elaboradas e

a descoberta de si próprio, observando-

releeboradas até satisfazere m o usuário/

se ca paz para aquilo, na possibilidade de

autor. O aspecto operacional fica subor-

ter alcançado o objetivo. Então, desco-

dinado ao aspecto pedagógico. Apreen-

brem-se as potencialidades individuais e

dem o computador na m edida em que

singulares.

sendo e

nele criam, produzem e descobrem a própria ca pacidade de produção.

Aprender é descobrir, desvelando-se

O aprender fazendo e refletindo sobre a ação, alternando vivência com

O indivíduo, observa a si mesmo e

reflexão, leva à compreen são do proble-

descobre-se modificado. Experimentan-

ma e, às vezes, do processo vivenciado, o

do, ele se experimenta em novas situa-

pensamento e as estratégias usadas. O

ções; descobrindo a máquina e a si pró-

aprender fazendo, descobrin do os recur-

prio, num ambiente que promove oco-

sos e observando com o funcionam, é

nhecer e o autoconhecimento. O sujeito

6

Logo é uma linguagem de programação adaptada e acessível à criança, criada por Papert, para promover a aprend izagem conforme a teoria piagetiana de construção do conhecimento. 14


interage com o computador, com o gru-

do dominada, cada um no seu ritmo esta-

po e consigo. Sua produção com o com-

belece a interação com o computador.

putador reflete a si próprio. Ele se vê po-

Aos poucos, o foco sobre a máqui-

tente ao fazer > descobrir > compreen-

na e seu poder transfere-se ao indivíduo,

der > perceber-se com potencialidades.

que passa a ver em si o potencial de ação.

A subjetividade move-se de dentro para

Busca-se na abordagem de apreensão e

fora - computador, sala, colegas, profes-

domínio da máquina desmontar a sua

de fora para dentro, não

mistificação e deixar o indivíduo apare-

constituindo um ciclo fechado e linear,

cer, mais pleno e seguro de si. Des-

mas uma rede variável, mutável e aberta.

constrói-se o computador e reconstrói-

A disciplina interna de cada indiví-

se a pessoa mais potente. É o aprender

duo, articula-se com a disciplina externa,

superando-se, por meio de desafios sig-

do coletivo e do ambiente. A disciplina

nificativos, desvelando limites e possibi-

externa se faz necessária para o encami-

lidades, rompendo fronte iras e des-

nhamento do grupo e seu avanço para

construindo idéias equivocadas sobre o

novas questões de aprendizagem. A aula

computador e sobre si próprio.

sora - e

é compartilhada: todos verbalizam dúvi-

O reconhecimento público, dos co-

das, experiências, conhecimentos, con-

legas e da professora assegura sua capa-

quistas e dificuldades. A questão nova é

cidade de aprender, descobrir, produzir

apresentada, experimentada, verbalizada,

e criar, indicando transmutação e potencial

explicada, depurada com todos e, quan-

de vida. A família passa a olha-los por

ATERCEIRA IDADE

15


outra perspectiva. Conseguiram vencer

desconcerta, o que acaba gerando de-

com determinação as dificuldades para

pendência para tomar atitudes e deci-

aprender a manusear a nova tecnologia,

sões. Quando não sabem, preferem per-

e abriram-se para novas experiências.

guntar a arriscar. Mas, quando acertam sozinhas, irradiam muita felicidade.

O Ambiente interdisciplinar das aulas/ oficinas

Vão percebendo que o melhor jeito de aprender é tentar caminhos, mesmo que se descubra que não servem

Um ambiente interdisciplinar de

para o objetivo inicial e podem serdes-

questionamento, troca, cooperação (Fa-

cartados sem conseqüências. Um texto

zenda, 1994) e de desafio (Hernandes,

pode ser perdido, outro pode ser elabo-

1995) é gerado como metodologia para

rado, agora com uma aprendizagem a

o progresso de todos. Aprender por meio

mais. O texto promove o processo de

do socializar e do dividir. Às vezes, ale-

aprender e ser. Desconstrói-se a idéia e

gam o pouco tempo que têm com o com-

o sentimento sobre o erro proveniente

putador e não se disponibilizam faci l-

de uma concepção de ensino velha e

mente para traba lhar juntas no mesmo

obsoleta e se constrói outro espaço para

equipamento. Pertencem a uma geração

a sua instrumentalização na aprendiza-

que talvez teve que ceder muito para os

gem. Outros tempos e modos de ser no

pais, maridos e filhos. Agora é a vez delas,

ambiente de aprendizagem fluem de

o momento de não cederem para mais

acordo com as necessidades e caracte-

ninguém e aproveitarem o máximo. Mas,

rísticas de cada um.

quando as alunas trabalham em duplas7,

As alunas são acompanhadas no

explicitam o enriquecimento individual

processo individual, no superar-se, rom-

da experiência, partilham dúvidas e co-

pendo barreiras e limites. Algumas ali-

nhecimentos. Desfrutam com o outro o

mentam expectativas altas em relação

prazer de ensinar e de aprender, parti-

ao próprio desempenho, exigindo muito

lhando as descobertas.

de si próprias, com pressa de aprender. O

Quando acontece algo de estranho

tempo tem outra dimensão para elas:

com o com putador, dizem que não fize-

desfrutam com intensidade o que fazem.

ram nada, como se a máquina pudesse

Não estão lá porque não têm outro lugar,

funcionar sozinha. Errar não é fácil de

mas por opção e desejo. Não por obriga-

aceitar, causa constrangimento. O erro

ção, mas por disposição e interesse.

carrega conotação negativa, incomoda, 7

Elas são recebidas com alegria e

É muito raro trabalharem em duplas, procuro possibilitar a interação individual com a máquina, pois as vezes, elas não têm paciência com a colega. gerando ansiedade em ambas. 16


afeto pela professora. O ritual de entrada

presentes na rotina de sala de aula, não

e saída é alegre, com abraços e beijos. As

um coletivo amorfo, mas um coletivo com

aulas se desenrolam num clima de

unidades reconhecíveis entre si, conhe-

afetividade e participação. Desejam

cendo-se e reconhecendo-se cada um,

aprender, por isso o tédio passa distante

em cada aula/oficina/encontro.

da sala de trabalho, o clima é de excita-

Tra balha-se na construção de tex-

ção geral. Todas presentes por inteiro,

tos próprios valorizando a autoria. São

intrigadas com as suas ações e conseqüên-

textos que refletem a si próprias através

cias com o computador. Tudo é novo,

de poemas e histórias buscadas na me-

gerando excitação, afugentando o tédio.

mória da vida. Não se estabelecem re-

Visitam as colegas para ajudar, ensinar

gras rígidas, mas insiste-se na importân-

ou espiar o que fazem ou perguntar so-

cia de seu potencial de criação de tex-

bre algum problema. A sala de aula é

tos. São desafiadas continuamente e se

dinâmica e cheia de vida. Impera o huma-

acredita nelas. O indivíduo se percebe

no no mundo das máquinas. Apesa r da

em cada inter-relação do grupo com

disposição clássica dos computadores

uma nova possibilidade de ser, apren-

(uma mesa atrás da outra) superam-se as

der e de conhecer, dando espaço para a

fronteiras físicas do ambiente e, princi-

transformação.

palmente, as estabelecidas nas relações de poder, entre professor/aluno e o co-

O Computador auxi liando na

nhecimento. Nesse ambiente, o ensino

construção da Cidadania

clássico se torna obsoleto e um aprender fazendo e ensinando juntos se instala em

Esse ambiente educacional volta-

um coletivo, integrando as diversidades e

do para a criação e autoria, fundado na

diferenças de cada um.

transformação integral do indivíduo, per-

No processo observam-se conquis-

mitiu a constituição de uma equipe res-

tas e progressos, assim como dificulda-

ponsável por um espaço de comunica-

des pendentes e insistentes. Cada um

ção que desse voz e cidadania aos idosos

tem o seu disquete com os arquivos gra -

- um jornal impresso e on-line na Internet

vados com data, o que perm ite o acom-

no site da PUC/COGEAE8. O jornal impres-

panhamento do próprio processo indivi-

so circula dentro e fora da PUC e tem sido

dual. São impressas todas as produções

motivo de orgulho dos alunos, assim

no computador. Nome, histórias, gostos,

como recebido muitos elogios por ser

habilidades, emoções, inquietações são

útil em diversas situações. O jornal é vol-

8

http://cogeae.pucsp.com.br/jornalcompuctador

ATERCEIRA IDADE

17


tado para o idoso que está em casa e se

tecnológica e o domínio do computador,

sente instigado pelos colegas a rever sua

assim como a constituição do jornal pos-

vida, para os grupos que se reúnem e

sibilitam aos idosos expressarem-se so-

fazem uso de alguns textos para reflexão

bre a vida através da conquista, supera-

e discussão, ou mesmo para pesquisado-

ção de desafios e renascimento contí-

res que identificam no material fonte de

nuo. Escrevem e refletem sobre as

investigação.

vivências, falando e se fazendo ouvir.

O Jornal Compuctador, nome cria-

Apresentam a idade carregada das lem-

do e eleito pelas alunas, é aberto a todos

branças, experiências e amor pelos anos

da Universidade Aberta da Terceira Ida-

vividos. O presente é um caminho rico de

de da PUC/ SP que quiserem publicar suas

esperança, de muito a ser feito, aprendi-

inquietações em textos, crônicas, memó-

do e vivido intensamente.

rias, poemas etc. A equipe se dispõe a vir

O idoso se sente velho mais por

em outros horários para dar conta da

imposição de fora do que de dentro. O

se leção, editoração dos artigos e dia-

computador, neste espaço, é utilizado

gramação do Jornal. Este espaço é uma

como instrumento para refletir as possi-

conquista da Terceira Idade que mostra

bilidades de vida, auxiliando a subverter

sua identidade, quebrando preconceitos

a ordem institucionalizada das idéias

e rompendo limites castradores e depre-

equivocadas e estigmatizadas sobre o

ciativos da sua imagem. Incentiva-se a

idoso, e dando condições para a constru-

prosseguir na reconstrução de uma iden-

ção da cidadania. Apropriam-se do do-

tidade pautada nas possibilidades reais

mínio tecnológico através do exercício

de vida e de juventude instaladas na sub-

de escrever suas considerações sobre o

jetividade de cada um, não apenas atre-

mundo e a vida, partilhando com os cole-

ladas ao tempo cronológico. A heteroge-

gas e pub licando no Jornal para que ou-

neidade que está presente no cotidiano dos idosos parece não ser suficiente para anular um visão homogênea de se pensar a respeito do velho e da velhice. Assim, uma nova concepção, que destaca a noção de subjetividade, se impõe como importante para avaliar a produção de um novo sujeito, que, no presente caso, implica em ser um novo sujeito velho.

tros também possam ousar dizer e escre-

(Mercadante, 1998: 67). A apropriação da nova linguagem 18

ver sobre sentimentos, medos, desejos, incômodos, denunciando a relação que a sociedade estabelece com eles. Nesse escrever, desvelam muitas vezes, uma veia poética adormecida. Há uma busca muito forte de inserção no movimento do mundo e em estabelecer diálogo com as gerações mais novas, representadas pelos netos que sentam para ensinar a vovó a mexer no


computador e pelos filhos que sentem

tos, como o social, físico, psíquico, histó-

orgulho das mães que avançam no de-

rico e cultura l. A identidade do ser velho

sempenho com a máquina. O aprendiza-

pautada na cronologia temporal é repre-

do, a produção e a autoria dos textos

sentação genérica que não abarca a sub-

(crônicas, poesias, etc) elevam a auto-

jetividade singular, com os desejos, pul-

estima e promovem o reconhecimento

sações e dinâmicas internas. Amplia-se a

fam iliar, estendendo-se ao social. Algu -

possibilidade de se entender o velho e a

mas transformações nas relações familia-

velhice, apontando a heterogeneidade

res começam a surgir, onde são rea-

nas inúmeras formas de se viver e de ser

va liados os papéis e funções na família.

um sujeito velho. (Mercadante, 1998: 59)

A cidadania está relacionada ao lu-

No sistema de representação social

gar que ocupam na sociedade, à ação

da nova versão da velhice, os idosos de-

política que exercem no seu meio e aos

sempenham um papel fundamental na

d ireitos a que têm acesso. A consciência

construção de uma outra imagem que sim-

dos próprios direitos é processo indivi-

bolize a liberdade e o lazer, ou mesmo de

dual e subjetivo, partindo de um pensar

ser um jovem em toda idade (Peixoto, 1997:

que pode dar suporte a um agir, impulsio-

44). O idoso pode abarcar no seu cotidia-

nando a prática do direito. Trata-se de um

no um espaço de construção de uma

processo evolutivo de construção dos di-

imagem que lhe possibi lite a sua inclu-

reitos humanos a partir do acesso ao espa-

são, e a de outros, mostrando o potencial

ço público, fundamentado na consciência

de superação de novos desafios, de sabe-

e na liberdade de pensamento conjugadas

doria, experiência, produção, transforma-

à ação. (Moretti, 1998: 43)

ção e vida que carrega em si. Busca-se

Desta forrna, o conceito de velhice

meios e instrumentos para anunciar o

se insere em um quadro complexo de

novo velho e denunciar os preconceitos

relações, não apenas biológico, mas con-

amarrados em estigmas obsoletos.

sidera a determinação de vários aspec-

A TER(l:JRA IDADE

19


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A TERCEIRA IDADE

21



Aposentadoria

X Cidadania

111

DENIS ANTÔNIO DE MENDONÇA BERNARDES DOCENTE DO DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO.

"Penso que é olhando a questão da cidadania, a partir do mundo dos aposentados, de sua precariedade, carência ou ausência, que podemos transformar também o mundo do trabalho. Porque a questão do aposentado pode colocar com toda ênfase o desafio da apropriação pelos indivíduos de sua própria vida". A TERCEIRA IDADF

23


Nos últimos anos, sobretudo a

fundamental, um ponto de partida que

partir do fim do regime militar instaura-

não pode ser ignorado quando se pensa

do em 64, vem ocorrendo uma significa-

sobre nosso tema. Seja qual for a deno-

tiva mudança nas questões que envol-

minação que lhe seja dada, seja qual for a

vem a visão sobre os aposentados na

história e o recorte social destes milhões

sociedade brasileira. São vários os fato-

de homens e mulheres, é impossível não

res que explicam esta mudança e bastan-

reconhecer sua presença, sua visibilida-

te diversificado o significado político e

de no tecido social e nos espaços urbano

social de uma fração da sociedade que já

e rural. Isto não quer dizer que este reco-

foi denominada de "a maior categoria do

nhecimento e esta visibilidade estejam

país" (2).

se dando necessariamente de uma ma-

Em primeiro lugar, a importância

neira positiva. Ao contrário, são muitos

desta parcela de homens e mulheres que

os problemas e os desafios que a catego-

a legislação e as normas administrativas

ria dos aposentados enfrenta para fazer

classificam de aposentados decorre de

valer e ter reconhecidos seus direitos so-

sua presença numérica no conjunto da

ciais e poder exercer sua cidadania.

população. A aposentadoria é, hoje, um

Mas voltaremos a esta questão mais

fenômeno de massa, com profundas im-

adiante. Por ora, quero ainda desenvol-

plicações e conseqüências de ordem

ver algumas considerações sobre a mu-

política, social, cultural e econômica. Ou

dança no perfil do aposentado, ocorrida

seja, é impossível tanto para o governo,

nos últimos anos. Além da sua importân-

em seus diversos níveis, como para aso-

cia numérica, existem razões de ordem

ciedade, ignorar a existência desta cate-

político-institucional que moldaram o

goria social.

novo perfil do aposentado. Uma delas foi

A extensão do assalariamento e as

o processo de redemocratização que,

mudanças na demografia, além de uma

pondo fim aos governos militares, ins-

relativa melhoria no acesso da popula-

taurou a Constituinte e, pouco a pouco,

ção a certos serviços na área da saúde,

recolocou o país dentro da normalidade

modificaram o perfil populacional e etário

democrática com o fim da censura, a anis-

da sociedade brasileira. Para situarmos

tia, a legalização dos partidos e a liberda-

tais mudanças em ordem de grandeza,

de de organização e expressão da socie-

vale lembrar estimativas que projetam,

dade civil. Entre as categorias que se

para o século XXI, 22% da população do

organizaram e atuaram politicamente

planeta na chamada faixa da Terceira Ida-

junto ao Congresso Nacional Consti-

de, e o Brasil como o sexto país do mundo

tuinte para garantir conquistas e am-

em número de idosos. Este é um dado

pliar direitos, estava justamente a dos

24


aposentados.

balhadores, empregadores e emprega-

Neste processo, os aposentados (e

dos. A aposentadoria, dentro da lógica

idosos) deixaram de ser uma "categoria

liberal, é um problema privado do traba-

residual, circunscrita ao domínio das rela-

lhador - que deve poupar para assegurar

ções familiares, para tornarem-se uma es-

sua velhice e enfrentar um eventual pro-

pécie de organização própria" (3).

blema - ou, no máximo, é uma questão

Para termos plena percepção do

que pode ser enfrentada através dos

significado e do desenrolar deste pro-

Montepios e de outras formas de auxílio,

cesso de mudança no perfil dos aposen-

sem que isto impliq ue em qualquer direi-

tados, va le a pena repassar, ainda que

to associado, por exemplo, ao contrato

brevemente, o histórico da categoria do

de trabalho, e sem, por conseqüência,

ponto de vista político e da sua mo-

criar qualquer obrigação das partes con-

bilização por direitos.

tratantes ou do Estado.

Até 1930, o direito à aposentadoria

A proclamação da República trou-

era extremamente restrito. Na tradição

xe algum reconhecimento e ampliação

monárquica portuguesa - que o Brasil

de direitos para os empregados públicos

independente con servou com modi-

e para algumas poucas categorias de tra-

ficações - a aposentadoria era uma mer-

balhadores.

cê, uma concessão real, dada ao súdito/

Depois da Primeira Guerra Mundi-

servidor público, como um reconheci-

al, como conseqüência da mesma e em

mento ou prêm io. Para os trabalhadores

especial como reação dos governos dos

que estavam fora do serviço público, ne-

países capitalistas à instalação de um

nhum direito era reconhecido por lei nes-

governo socialista com a revolução russa

te particular. É claro que para a grande

de 1917, foi criado o Bureau Internacio-

massa de trabalhadores escravos não

nal do Trabalho e uma legislação de pro-

havia q ua lq uer direito. No entanto, é bom

teção social - ao menos formalmente -

advertir que ainda conhecemos mal

adotada em diversos países, entre os

como a sociedade escravista conviveu

quais, o Brasil. Na década de 20, através

com o envelhecimento dostrabalhadores

da chamada Lei Elóy Chaves, o governo

e com sua retirada do processo produti-

criou caixas de auxílios e pensões para as

vo. Houve, é claro, a lei dos sexagenários

categorias mais organizadas dos traba-

(1885) mas esta funcionou mais a favor

lhadores brasileiros: marítimos, ferroviá-

dos senhores que dos ex-escravos.

rios e determinadas categorias de funcio-

Dentro da visão liberal - que é a da

nários públicos.

Primeira República - o Estado não deve

Sem minimizarmos o significado de

intervir nas relações entre patrões e tra-

tais iniciativas, temos de reconhecer que,

A TERCEIRA IDADE

25


somente a partir de 1930, há um explícito

capital e tra balho, promovida soba égide

reconhecimento político da existência da

e o controle do Esta do.

classe trabalhadora. Reconhecimento

Assim, além do salário mínimo, fo-

que não é isento de controle, de temor,

ram sendo criados os diversos Institutos

de suspeição ou, quando necessário, de

de Aposentadorias e Pensões, mas restri-

repressão. Mas o certo é que, a partir de

tos às categorias de trabalhadores urba-

1930, as forças dominantes no aparelho

nos mais organizados - bancários, marí-

de Estado, rompem com o liberalismo da

timos, ferroviários, comerciários, in -

Primeira República e estruturam um novo

dustriários, funcionários públicos - com

Estado tanto do ponto de vista doutriná-

exclusão dos trabalhadores rurais e dos

rio quanto prático. Ba sta lembrar a cria-

traba lhadores domésticos.

ção do Ministério do Trabalho, Indústria

Dentro de nossa cronologia, pode-

e Comércio e a gradativa implementação

mos situar a fase que vai de 1930 a 1964,

da legislação trabalhista até constituir a

como uma fase de segmentação do mo-

"Consolidação das Leis do Trabalho" -

vimento e das reivindicações dos apo-

CLT. Nesse momento, o Estado reconhe-

sentados em categorias profissionais

ce que a cidadania é dada pelo trabalho,

mais organizadas e vinculadas aos diver-

mas não a todos os trabalhadores. É uma

sos Institutos de Aposentadorias e Pen-

cidadania que sofre as limitações do

sões. É claro que nestes 34 anos há mo-

antiliberalismo, então em ascensão, e que

mentos diferenciados, correspondentes

dissocia a democracia das conquistas

a períodos políticos específicos: 30-37,

sociais. Para usar uma imagem compara-

37-45, 45-64.

tiva com tempos recentes, não se dizia

Este último período é caracteriza-

então "é preciso primeiro fazer crescer o

do por aquilo que os cientistas pol íticos

bolo para depois dividi-lo ", mas sim "é

denominaram de repúb lica populista,

preciso fazer crescer o bolo e dividi-lo, mas

na qual uma fração da classe trabalha-

dentro das restritas regras estabelecidas

dora participou da gestão dos Institu-

pelo Estado". Os trabalhadores terão sua

tos, através dos mecanismos de repre-

parte - o salário mínimo é o símbolo

sentação sindical ou por intermédio da

maior desta incorporaçã o dos mesmos

representação político-partidária, nota-

à parte da riqueza nacional -, no entan-

damente do PTB. De qualquer maneira,

to devem evitar qualquer ação política

a segmentaçã o permanece como carac-

autônoma ou que seja suspeita de con-

terística marcante do movimento dos

flito de classe. É, em suma, a doutrina

aposentados, que se dá ba sicamente nos

corporativista de inspiraçã o no fascis-

limites e no interior de cada categoria

mo italiano, de uma conci liação entre

profissional.

26


No entanto, é p reciso recon hecer e

Para o nosso terna, o que nos inte-

afi rrna r, contra urna dei ibe ra da vei -

ressa é assinalar quais as conseqüências

cu lação de uma imagem distorcida do

deste fato para a situação dos traba lha-

período e sem cair em um saudosisrn o

dores em geral e dos aposentados em

acrítico, que apesar de todos os limites

particular. Poli ticamente, o pa ís conhe-

do chamado populi smo, o mesmo sig ni-

ceu uma fase de crescente autoritarismo,

ficava o reconhecimento político da clas-

cu lminando com a decretação do Al-5, e

se trabalhadora, ao menos, como ja vi-

que significou a suspensão dos clássicos

mos, de algumas de suas categorias.

mecanism os da vida democrática e das

Creio mesmo que os trabalhadores

garantia s e d ireitos ind ividuais. Preemi-

brasilei ros não devem e não podem, sob

nência do poder Executivo; centrali smo

pena de empobrecerem sua própria his-

nas decisões; redução ao mínimo e sob

tória, desconhecer ou menosprezar esta

restrito controle da vida partidária; con-

herança. Ela é parte de sua formaçã o e do

trole sobre os sindicatos, reduzidos a en-

reconhecimento de direitos inerentes ao

tidades assistenciai s, etc.

mundo do tra balho. Direitos que te m

Éclaro que algumas das conqui sta s

também seu quinhão de lutas, de sacrifí-

básicas da classe trabalhadora não foram

cios, de organizaçã o. É, aliás, significativo

destruída s, mas esta havia perdido sua

que, no momento em que se procura

voz. As decisões vinham de cima, eram

destruir alguma s das conquist as sociais,

tomada s nos gabinetes pe la tecnocracia

haja uma exaltação tão intensa da figura

que, iluminada, pensava pela sociedade

de Zumbi e, ao mesmo tempo, um desca-

e julgava o que lhe convinha. É o período

so e mesmo uma deliberada ocultaçã o

da hipertrofia do Estado e da menorida-

ou esquecimento de lutas e personagens

de, por assim dizer, da sociedade civil.

mais recentes da classe trabalhadora.

Citando o autor que venho utili-

Mas volt emos à nossa breve cro-

zando largamente neste rápido esboço

nologia do movimento dos apo senta-

histó rico: "até 7964 eram as categorias

dos no Brasil. Em 1964, como todos sa-

profissionais mais organizadas {como ban-

bem, um movimento civi l-mi litar, que

cários, ferroviários, marítimos) que obti-

reu niu diversos interesses e segmentos

nham os melhores benefícios, através da

das classes sociais, tomou o poder e inau-

influência de suas lideranças sindicais jun-

gurou mais um ciclo autoritário em nos-

to aos Institutos de Aposentadorias e Pen-

sa história, sob pretexto de combate ao

sões (IAPAS), que geriam recursos políticos

comunismo e para evitar a suposta im-

e econômicos importantes. A aposentado-

plantação de um a república sindicalista

ria era enião uma 'moeda política' forte

no Brasil.

para líderes sindicais e partidários. Essa fon-

A Tf.PCEIPA IDsllc

27


te de poder político, que os sindicatos deti-

to pelas eleições diretas leva às ruas das

nham graças a sua inserção na estrutura

principais cidades brasileiras milhões de

dos institutos, foi perdida no regime militar

brasileiros e brasileiras e, juntamente

instaurado em 7964, que provocou a unifi-

com o movimento pelas Diretas Já, emer-

cação do sistema previdenciário (a partir

gem as questões sociais até então conti-

de 7966) e a separação dos Ministérios do

das pelo autoritarismo. O país do mila-

Trabalho e da Previdência. Essas medidas

gre revelou -se ser, na verdade, o país

deixaram os aposentados numa situação

dos sem teto, dos sem terra, dos desem-

de orfandade política, basicamente por-

pregados, dos meninos, meninas e ado-

que desvincularam a luta pelos direitos de

lescentes de rua, dos excluídos da saú-

previdência e assistência social da luta sin-

de, da educação, da cidadania. É o mo-

dical mais ampla - esta, cada vez mais

mento do reconhecimento da imen sa

voltada para as questões salariais específi-

dívida socia l e do programa, não realiza-

cas dos trabalhadores da ativa. Estabele-

do, do "tudo pelo social".

ceu-se, então, um período de relativo silên-

Em 1985, foi criada a COBAP, Con-

cio político das questões referentes à apo-

federação Brasileira de Aposentados e

sentadoria" (4).

Pensionistas que, no período 86-88, exer-

Este silêncio, como já foi mencio-

ceu uma ativa ação junto aos constituin-

nado, começa a ser romp ido a partir dos

tes, assegurando a defesa de interesses e

anos 80, como resultado do processo de

direitos da categoria na elaboração da

redemocratização e do esgotamento do

nova Constituição. Para dar uma idéia da

chamado "milagre brasilei ro", que com-

amplitude desse movimento e de sua

binara intenso crescimento econômico,

organização, basta lembrar que "até abril

concentração de renda e autoritarismo

de 7989 havia mais de 600 associações de

político. Mas também foi capaz de propi-

base e nove federações (SP, RJ, RS, PR,

ciar benefícios econômicos a alguns seg-

MG, GO, BA, PE) integrados à COBAP. A

mentos soc iai s, notadamente às cama-

maior federação estadual de aposentados

das médias e que através das grandes

e pensionistas, a de São Paulo (FAPESPJ,

obras de infra-estrutura incorporou ao

reunia em 7990, 179 associações e cerca de

sistema produtivo uma grande massa de

300.000 filiados" (5). Eis aí uma força polí-

trabalhadores não qualificados.

tica que não pode ser ignorada e que, em

se,

A década de 80 assiste, pois, a uma

alguns momentos, como veremos adian-

progressiva reorganização nacional do

te, chegou mesmo a ter mais presença

movimento dos aposentados, juntamen-

política do que os movimentos e repre-

te com o movimento sindical e a plena

sentações dos trabalhadores da ativa.

afirmação da vida partidária. O movimen28

Isto ficou claro durante o desastre-



so e curto (felizmente) governo Collor.

momento mais importante. A partir daí,

Em setembro de 1991, quando o gover-

embora a mobilização não tenha se man-

no Collor já havia conseguido golpear

tido - e não poderia - no mesmo nível de

duramente os movimentos dos trabalha-

intensidade, a categoria dos aposenta-

dores e da sociedade civil em geral, fo-

dos já não foi mais a mesma. Ela ganhou

ram os aposentados a categoria mais

uma dimen são política insuspeitada, ad-

importante e ativa de oposição ao gover-

quirindo um novo perfil.

no. São fatos recentes que todos presen-

Isto não quer dizer que não existam

ciaram, mas que valem ser rapidamente

divisões internas no movimento, diferen-

relembrados. Naquela data, quando o

ças de concepções e de formas de atua-

salário mínimo foi reajustado em 147%,

ção, mas é impossível não reconhecer

os beneficiários da Previdência Social fo-

que, hoje, os aposentados são uma cate-

ram reajustados em apenas 54,6% (6).

goria política. Muitos descobriram ou

Este flagrante desrespeito a precei-

redescobriram, então, que não eram coi-

tos consagrados na legislação e na própria

tadinhos relegados à benevolência fami-

Constituição motivou uma intensa mo-

liar ou à boa vontade mais ou menos

bilização nacional dos aposentados, com

paternalista do governo.

larga repercussão na imprensa, no rádio e

Esta rápida trajetória do movimen-

na lV. O próprio pai do então ministro

to, que era preciso traçar aqui, é o ponto

Rogério Magri - cuja pasta reunia Traba-

de partida para examinarmos mais preci-

lho e Previdência Social - foi à televisão

samente o tema que nos ocupa: Aposen-

juntar seu depoimento às denúncias so-

tadoria x Cidadania.

bre a situação da categoria e expor o des-

A discu ssão sobre aposentadoria e

caso com que era tratado. A morte de um

cidadania põe em relação dois conceitos

aposentado em uma fila do INSS bem

que devem ser explicitados, mesmo que

como a agressão da polícia, em manifesta-

não os esgotemos nos limites deste de-

ção realizada em Santa Catarina, ocupa-

bate. Ambos são termos ou conceitos

ram as manchetes dos principais jornais

histórica e socialmente construídos e não

do país e o noticiário das lVs.

podem ser definidos de uma maneira

Com exceção do movimento pelo

abstrata.

impeachment, foi este o mais importante

Há sociedades ou momentos da his-

movimento de massa de oposiçã o ao

tória humana que não conhecem tais

governo Collor. E foi também o momen-

conceitos nem teórica nem praticamen-

to de maior visibilidade nacional do mo-

te. Ambos, na verdade, estão relaciona-

vimento da categoria dos aposentados.

dos com o desenvolvimento da socieda-

Na história da categoria, foi também seu

de capitalista e, mais precisamente, com

'º


a ampliação da categoria de trabalhado-

eia direitos independentemente da situa-

res assalariados, como forma dominante

ção dos indivíduos em relação à posse de

de relação social.

riquezas ou a sua posição no mundo do

A idéia que atualmente fazemos de

traba lho.

direitos humanos,que supõe não somen-

É necessário a esta altura da nossa

te o acesso às condições materiais indis-

reflexão colocarmos uma relação funda-

pensáveis a uma existência digna, mas

mental: a saída do trabalhador do mun-

também implica uma visão de que todo

do da produção e a idade cronológica.

os homens e mulheres são dotados dos

A aposentadoria é um direito do

mesmos direitos fundamentais, só foi

trabalhador, duramente conquistado e

possível afirmar-se porque esteve, de uma

mantido, mas é um direito pelo qual ele

forma ou de outra, relacionada com o

muitas vezes paga um preço muito alto.

mundo do trabalho e com a luta dos tra-

Uma de suas conseqüências mais dramá-

balhadores, para serem algo mais que

ticas é, ou pode ser, não somente a exclu-

meros criadores de riqueza para o des-

são do indivíduo do mundo da produção

frute das outras categorias sociais (7).

- no qual é reconhecido-, mas também

Essa luta se deu tanto contra os

sua colocação em uma espécie de limbo

antigos privilégios pré-capitalistas da or-

social, onde passa a viver como um fan-

dem aristocrática, quanto contra a idéia

tasma, um ser que está aí mas ninguém

do liberalismo clássico. Este último, em-

enxerga: "Comentar a dimensão sim bóli-

bora exaltasse a liberdade individual, a

ca da Terceira Idade é observar que essa é

aniquilava na prática pela aceitação da

uma construção social, não forçosamente

desigualdade social e pela indiferença

determinada pela idade das artérias ou

ou mesmo oposição diante de qualquer

cronológica, como ress alta Magalhães

medida visando corrigi-la. Como dizia

(1989). Assim sendo, a categoria do ser ido-

uma canção do século XIX: "Se a vida

so se constitui sobre uma base física,

fosse coisa que o dinheiro pudesse com-

biodemográfica, que interage com a socie-

prar, os ricos poderiam viver e os pobres,

dade e o indivíduo em todas as suas di-

se acabar" (8).

mensões (econômica, social, cultural, polí-

Tal lógica, que hoje reaparece com

tica, jurídica, psíquica e ideológica). A

bastante vitalidade no chamado neo-

conceituação de velhice é muito subjetiva,

liberalismo, não foi, contudo, sempre a

há quem se sinta idoso com 40 anos de

lógica dominante na história das socie-

idade e outros não se sentem idosos aos 80

dades humanas. Mesmo sociedades fun-

anos. Salgado (1980) apresenta uma série

dadas sobre a desigualdade social cria-

de critérios para conceituar velhice: parte

ram uma visão do humano que reconhe-

do envelhecimento biológico - decrésci-

A TERCEIRA IDADE

31


mo funcional do organismo humano; pas-

do nosso tempo? E de repente, alcança-

sa pelo envelhecimento psicológico, per-

do este sonho o perdemos, ou pior, ele

passa também pelo envelhecimento soci-

pode revelar-se um pesadelo ou uma ser-

al, resul ante da valorização excessiva da

vidão tão ou mais insuportável do que

força de produção do homem, de seu valor

aquela anterior constituída pelo ~

de ser social na proporção do que ele seja

de ponto e pelas repetitivas tarefas do

capaz de produzir" (9).

cotidiano.

gio

Aqui, justamente, situa-se um dos

Por que isso acontece? Porque,

pontos centrais da nossa questão. Se

ao contrário do que nos é inculcado

nossa cidadania, mesmo quando inserida

desde cedo até o fim de nossa exi stên-

no mundo do trabalho, é limitada, o que

cia, não é o traba lho que dá sentido à

dizer, então, quando o indivíduo se apre-

vida. Ele é uma dimensão necessária e

senta fora do mesmo?

fundamental, contudo insuficiente, em

No começo desta exposição, bus-

especial quando é o trabalho alienado

quei mostrar que, política e socialmente

e alienante da sociedade industrial. Não

a categoria dos aposentados tem adqui-

é outra a razão pela qual suspiramos

rido um novo perfil tornando-se um dos

tanto pelos feriados, pelos fins de se-

mais significativos atores políticos da atu-

mana ou pela aposentadoria e muitas

al sociedade brasileira. Mas isto não bas-

vezes nos feriados, nos fins de semana

ta e, além disso, existe uma série de pro-

e na aposentadoria, nada sabemos fa-

blemas a ser posta em discussão e a ser

zer do nosso tempo.

enfrentada, mesmo no limitado quadro da cidadania hoje existente no Brasil.

Schiller, um autor teatral e poeta alemão do século XVIII, percebeu muito

Penso que é olhando a questão da

bem que as transformações sociais e de

cidadania, a partir do mundo dos apo-

valores trazidas pelo capitalismo estavam

sentados, de sua precariedade, carência

criando uma nova espécie de homem,

ou ausência, que podemos também

mais produtivo, mais eficiente, porém,

transformar o mundo do trabalho. Por-

ao mesmo tempo, incapaz de dominar

que a questão do aposentado - ao estar

sua própria existência e reduzido a ser

fora do reino da necessidade, ou seja, do

uma parte apenas mecanicamente liga-

trabalho - pode colocar com toda ênfase

da à totalidade social: "Sofreram separa-

o desafio da apropriação pelos indivídu-

ção violenta o Estado e a Igreja, as leis e os

os de sua própria vida. No dia a dia da

costumes; o gozo foi separado do traba-

labuta, o nosso sonho não é de livrar-nos

lho, o meio, da felicidade, o esforço, da

da servidão ao trabalho para sermos se-

recompensa. Eternamente acorrentado a

nhores de nossa vida, ou seja, senhores

uma pequena partícula do todo, o homem

32



só pode formar-se enquanto partícula; ou-

reais, mas contornáveis, de financiamen-

vindo eternamente o mesmo ruído monó-

to da Previdência Socia l, para fazer a soci-

tono da roda que ele aciona, o homem não

edade aceitar a destruição de conquistas

desenvolve a harmonia de seu ser, e, em

que ainda são das poucas coisas que o

lugar de desdobrar em sua natureza a hu-

Estado assegura a quem, no final de con -

manidade, tornou-se mera cópia de sua

ta s, construiu e constrói a riqueza do país.

ocupação, de sua ciência" (1O).

Não há cidadania sem política e a política

No caso do aposentado, todavia, a

do Estado brasileiro para os aposentados

situação pode ser ainda mais dramática,

tem sido apena s marcada e orientada

pois destituído da ocu paçã o que dava

por uma estreita visão contábil ou, no

"sentido" à sua vida, talvez não lhe reste

máximo, por uma pontual, ineficaz e hu-

nem ser a cópia da mesma.

milhante "infantilização" do aposentado,

Se não quisermos ser enganados e,

em programas ditos de Terceira Idade.

sobretudo, se quisermos construir uma

No entanto, não somente o fato

outra maneira de viver a aposentadoria,

de que a riqueza social presente é o

para além da necessária mas insuficiente

resultado do trabalho das gerações pre-

garantia das condições de uma vida ma-

cedentes, que mesmo nesta limitada ló-

terialmente decente, não devemos evi-

gica já mereceriam um outro tratamen-

tar essas reflexões.

to, como também, e isto é mais grave, ao

É preciso proclamar claramente: o

excluir os aposentados, o Estado e aso-

tratamento dado pelo Estado e pela socie-

ciedade desperdi çam milhões de pes-

dade a esta questão crucia l, que envolve

soas que, mesm o fora do processo pro-

milhões de brasileiros, direta e indireta-

dutivo, poderiam dar uma inestimável

mente, é degradante, tanto do ponto de

contribuição ao país.

vi sta material, quanto do ponto de vista

O aposentado vive a ameaça - e

político. Para o Estado brasileiro, princi-

por vezes a realidade - de uma dupla

palmente nos últimos anos, os aposenta-

exclusão: por parte da sociedade e por

dos têm sido apresentados não apenas

parte do Estado. Exclusão na qual todos

como um pesado encargo social, do qual

perdem e que, na verdade, expressa a

ele procura livrar-se, mas até mesmo

pobreza e a limitação intelectua l e moral

como uma espécie de parasita da socie-

dos va lores cada vez mais dominantes na

dade, responsável por males e dificulda-

sociedade brasileira.

des da mesma e que confundem direitos com privilégios. O Estado usa problemas

34


Notas e Referências Bibliográficas

(1) Texto apresentado no I Encontro do Programa de Preparo para a Aposentadoria. Recife, d

22 a 24 de novembro de 1995. O referido encontro foi organizado pela

Petrobrás. (2) SIMÕES, Júlio Assis. A maior categoria do país: notas sobre a constituição do

aposentado como ator pol ítico. Campinas: UNICAMP, 1994. Trabalho apresentado no XVIII Encontro Anual da ANPOCS, Caxambú-MG, de 23 a 27 de novembro de 1994. (3) SIMÕES, Júlio Assis. Op. Cit. p. 1. A reconstituição histórica da mudança do perfil

dos aposentados está baseada neste trabalho. (4) SIMÕES, Júlio Assis. Op. Cit. p. 3. (5) SIMÕES, Júlio Assis. Op. Cit. p. 5. (6) SIMÕES, Júlio Assis. Op. Cit. p. 5 (7) HOBSBAWM, Eric. Mundos do Trabalho. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987 - ca p. O

Operariado e os direitos humanos. (8) HOBSBAWM, Eric. Op. Cit. p. 427. (9) VALÉRY, Françoise Dominique e PAIVA, Ana Lúcia Gomes de. Na selva de pedra, o

balanço da rede: uma reflexão sobre as condições de vida, saúde e moradia dos idosos no meio urbano. Anais do IX Encontro de Estudos Populacionais. Caxambú, Minas Gerais, 1994, vol. 1, p. 338-339 (MAGALHÃES, Dirceu Nogueira. A invenção social

da velhice. Rio de Janeiro: Papagaio, 1989. SALGADO, Marcelo Antonio. A questão social do idoso no Brasil. São Paul o: SESC, 1990. (1 O) SCHILLER. Cartas sobre educação estética da humanidade. Introdução e notas de Anatei Rosenfeld. São Paulo: EPU, 1991 (o original alemão foi escrito entre 1794 e 1795).

ATERCEIRA IDADE

35



Oficinas de Terapia da Memória: Conhecendo e Preservando a Memória na Terceira Idade MARIA AUXILIADORA CURSINO FERRARI TERAPEUTA OCUPACIONAL - DOUTORA PELA FACULDADE DE SAÚDE PÚBLICA DA USP E COORDENADORA DO CURSO DE TERAPIA OCUPACIONAL DO CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO.

"Os idosos com problemas de atenção, concentração e esquecimento muito se beneficiam com oficinas ou grupos de terapia da memória, nos quais a metodologia utilizada é aquela que permite conhecer e treinar os processos de memorização".

----ATERCEIRA IDADE

37


O idoso perde a memória à medi-

teriormente aprendida s.

da em que envelhece? Não, o idoso não

Podemos também distinguir a me-

perde a memória pelo envelhecimento.

mória semântica que organiza os concei-

A ciência hoje não mais considera as fa-

tos, o sentido das palavras, os símbolos.

lhas freqüentes de memória como pro-

Por exemplo, se estou ouvindo uma mú-

cesso natural do envelhecimento. Perder

sica e a reconheço como um tango, refe-

a memória é um traço cultural tão mer-

rindo-me ao seu ritmo e que ela é a La

cante na nossa civilização que não

Cumparcita, referindo-me ao seu nome,

apresentá-lo se constitue uma anomalia.

estou colocando em exercício minha

Há mudanças na memória pelo pro-

memória semântica. É a memória do co-

cesso de envelhecimento. Vargas (1944)

nhecimento.

relata que "no idoso as capacidades de

Já, a memória episódica é a que per-

fixação e de evocação podem estar alte-

mite fazer rea parecer lugares, dados, fa-

radas ou não, dependendo das condi-

tos. Este tipo de memória responde pe-

ções individuais. No entanto as modifica-

los conhecimentos ligados a um deter-

ções sentidas com o envelhecimento, até

minado contexto espaço-temporal. Por

certo ponto, podem ser tomadas como

exemplo, posso, no decorrer da audição

parâmetros gerais no processo in-

do mencionado tango, lembrar-me de

volutivo".

fatos que ocorreram em m inha vida: uma

Segundo Lussier, Malenfant, Peretz

viagem à Argentina ou a ida a um restau-

e Beleviile (1991) "a memória representa

rante especial em uma data significativa.

o conjunto das estruturas e dos proces-

O lembrar aqui requer consciência do

sos cognitivos que permitem codificar,

incidente específico e não o acesso ao

armazenar e recuperar diversos tipos de

conhecimento. Grande parte das situa-

informações".

ções da memória têm componentes da

Em relação aos tipos de memória, Baddeley (1992) distingue a memória a

memória se mântica e da memória episódica.

curto prazo, também conhecida como

A importância de se distinguir os

memória primária ou imediata (responsá-

dois sistemas é porque ambos se com-

vel pela manutenção da informações

portam de maneiras diferentes.

necessárias à execução das atividades em

Podemos notar que, em relação aos

curso), a memória a longo prazo, também

tipos de memória, há uma ampla exten-

conhecida como memória secundária ou

são de termos diferentes, muitas vezes

funcional que corresponde ao conjunto

até utilizados para indicar conceitos si-

de componentes que permitem a aquisi-

milares, mostrando que essa área ainda é

ção e a recuperação de informações an-

ba stante controvertida e que há diferen-

38


- - - --- - - - - - - - - - ças teóricas entre os diferentes pesquisa-

plexa de subsistema s. A memória diz o

dores.

autor não corresponde a uma função

Um aspecto importante a destacar

unitária, mas se apóia em um conjunto

é o de que os responsáveis pela transmis-

de unidades relativamente autônomas e

são da s informações para o cérebro são

cada unidade reagrupa um conjunto de

os sistemas sensoriais: principalmente a

componentes que permitem a retenção

visão e audição que no envelhecimento

especializada de informações.

encontram-se desgastados e não funcionam tão bem como antes.

Hoje os estudos e pesquisas vêm procurando caracterizar e determ inar

O uso de óculos e os cuidados com

como as funções cognitivas se relacio-

a audição tem muita importância para

nam com o envelhecimento. Craik (1986)

que os sentidos possam transmitir com

em um estudo realizado com idosos

eficiência as informações para a memó-

mostra que os mesmos apresentam di-

ria.

minuição dos recursos da atenção; e lemIgualmente importante é esclare-

bra que para compreendermos o proces-

cer que a memória não depende só de

so mnésico na pessoa idosa temos que

algumas zona s loca lizadas no córtex ce-

considerar: as interações entre as diver-

rebral, mas de todo o conjunto do cére-

sas va riáveis relativasao indivíduo; as con-

bro. Assim, a memória é um ato do

dições de codificação e as condições de

psiquismo, a expressão integral do indi-

recuperação do material memorizado.

víduo e não uma função isolada e inde-

Condições essas que est ão em estreita

pendente.

relação com as possibilidades sensoriais

A motivação, a afetividade e a emo-

e perceptiva s de cada pessoa; do seu

ção encontram-se em estreita relação

estado físico; da qualidade do seu poder

com a percepção, com a atenção, com a

de atenção; das suas possibilidades inte-

concentração e com a imaginação. Pode-

lectuais de organização e julgamento; e

mos sofrer lapsos de memória tempora-

da integridade do seu sistema nervoso.

riamente face a: stress, depressão, ansie-

Em relação a atenção, gostaríamos de

dade, medicamento (principalmente os

destacar que ela desempenha um papel

antidepressivos e ca lmantes), álcool,

muito importante no processo de grava-

traumatismos, noite ma l dormida, má ali-

ção ou de transmissão das informações

mentação, ca nsaço, etc.

para o cérebro. A atenção também pode

É Baddeley (1992), ainda, que afir-

ser treinada.

ma que, nos últimos 20 anos, ficou mais

Através de treinamento podemos,

evidente que a memória não é um siste-

ainda, reduzir os efeitos da d istração e

ma isolado, e sim uma combinação com-

melhorar a concentração.

A TERCEIRA IDADE

39


Atualmente existe uma preocupa-

seriamente comprometida.

ção muito grande com as conseqüências

Podemos tratar e ou melhorar tais

causadas pela inatividade física, todavia,

problemas? Para que as informações se-

descuida-se das conseqüências causadas

jam preservadas, elas precisam ser solici-

pela inatividade mental. Na verdade, pri-

tadas. O cérebro precisa ser exercitado

vilegia-se muito mais o corpo, já que há

para se manter em forma. Mesmo consi-

uma grande preocupação com a estéti-

derando que diariamente há uma gran-

ca, com a beleza e com o físico. As ativida-

de perda de neurônios, as células sobre-

des físicas, como ginástica, dança, cami-

viventes se adaptam a tais perdas e aca-

nhada e outras, são muito importantes

bam multiplicando suas tarefas.

para o bem estar e saúde do idoso, mas

Para isso, porém, o cérebro precisa

não menos importantes do que as ativi-

ser exercitado. Se não se exercita, atrofia.

dades mentais.

O exercício, contudo, tem seus limites

Ému ito comum ouvirmos dos ido-

que variam de pessoa para outra. Para a

sos, queixas como a de não se lembra-

atividade intelectual, as estimulações sen-

rem de fisionomias, nomes próprios, no-

soriais são essenciais e desempenham

mes de pessoas conhecidas, aniversári-

um papel importante nas sinapses.

os, datas especiais ou algumas passagens da vida.

Que atividades podem estimular o cérebro? Existem hoje muitas aborda-

As pessoas idosas lamentam não

gens sobre como preservar a mente. Para

reter informações transmitidas em con-

a manutenção da memória existem téc-

versas ou leitura e de não recordarem

nicas específicas, os chamados auxiliares

coisas que precisam ser feitas em um

da memória, que são: as estratégias inter-

futuro próximo, por exemplo, compare-

nas, a prática repetitiva, os dispositivos

cer a um encontro ou tomar remédios.

externos, os dispositivos que atuam como

Surgem também dificuldades relaciona-

lembretes e o treinamento através da

das à localização espacial de objetos fa-

formação de grupos de terapia da me-

miliares, como não se lembrarem onde

mória, além de outros.

foram colocadas as chaves, os óculos, o

Os idosos com problemas de aten-

guarda-chuva, os documentos, os car-

ção, concentração e esquecimento mui-

tões magnéticos, a senha do banco, o

to se beneficiam da oficinas e dos grupos

nome da amiga que está na ponta da

de terapia da memória, nos quais a

língua, etc. São problemas que afetam o

metodologia utilizada é aquela que per-

desempenho do idoso interferindo ne-

mite conhecer e treinar os processos de

gativamente em seu cotidiano. Como

memorização. O treinamento é baseado

conseqüência sua auto estima pode ficar

em: exercícios de atenção, de concentra-

40


~ -


ção, de prática repetitiva, de utilização da

advindos do trabalho, em grupo: a socia-

música, etc. e segue um programa pré

lização, a facilitação da expressão e oco-

estabelecido, desenvolvido em grupo e

nhecimento de novas opções para o de-

em um período de 1Osessões, cujos ítens

senvolvimento pessoal.

são os seguintes:

A prática repetitiva é um bom auxiliar da memória mas é preciso muita

Como funciona a minha memória.

cautela em seu uso. Os jogos de memó-

Fazendo o melhor uso de minha me-

ria e as tarefas de laboratório como pa-

mória.

res associados, são comumente empre-

Facilitando a lembrança.

gados em Unidades de Reabilitação.

Concentração.

Uma pesquisa sobre o manejo de distúr-

A prática melhora as coisas.

bios da memória realizada na Grã

Lembrando de fazer as coisas.

Bretanha (Harris e Suderiand 1981) mos-

Lembrando informações.

tra o freqüente uso dessas técnicas e

Ouvindo e expressando um idéia.

chama a atenção para que a prática

Lidando com outros problemas.

repetitiva seja aplicada e uma tarefa ou

Continuando a usar as técnicas de me-

material que a pessoa precisa aprender

mória.

e não ao uso de tarefas artificiais. Em tais treinamento podem ser uti-

Os resultados dos grupos são sem-

lizadas dramatizações, interpretações de

pre positivos. Sempre há melhora, con-

textos, leituras de revistas, jornais, livros,

firmada pelo participantes que atribuem

o cálculo numérico "de cabeça" e a pos-

essa melhora principalmente a causas

terior conferência dos resultados com a

como, maior uso e solicitação da memó-

calculadora, etc. São exercícios que esti-

ria, e melhora da atenção.

mulam o funcionamento do cérebro. O

Éinteressante notar que essa é uma população em que o desuso, a falta ou a

importante é usar a memória para não perdê-la.

diminuição da atenção, além de outros

O cuidado com a memória deve

fatores influem negativamente no de-

incorporar-se aos hábitos, usos e costu-

sempenho do seu cotidiano.

mes, tal como acontece com a cultura

Nos grupos os participantes apren-

do corpo. Corpo cuidado e memória des-

dem entre outras coisas a conhecer a

cuidada, não exercitada, configura uma

memória e a fazer o uso de auxiliares da

situação inaceitável quando as pessoas

mesma. A troca de estratégias pelos par-

maduras têm como meta principal a

ticipantes do grupo é uma constante.

preservação prazeirosa do convívio fa-

Também observa-se outros benefícios

miliar e social.

42


Concluindo, podemos adiantar

que não deve fazer várias coisas ao mes-

que, ao fazer esse treinamento o idoso

mo tempo. Desenvolve, ainda, conheci-

acaba solicitando mais de sua memória,

mentos sobre como funciona sua memó-

apresentJndo como resultado uma me-

ria, fazendo uso muito maior dos chama-

lhora da atenção. Ele percebe também

dos auxiliares da memória.

Bibliografia BADDELEY, A.D. - Memory theory and memory therapy. ln: Wilson, B.; MOFFAT

Clinica! Management of memory problems - California Singular Publishing - 1992. CRAIK, F.I.M. - A functional account of age differences in memory. ln KIL; X.F. et ai

Human memory and cognitive abilities - Am sterda m - 1986. HARRIS, J.E. and SUNDERLAND, A. - A Brief Survey of the Management of Memory

Desorders. ln: Rehabilitation Units in Britain lnternational, Rehabilitation Medicine, n· 03, 1981. LUSSIER, 1. et ai - Caracterisation des troubles de la mémorie dans la demence de

type Alzheimer. ln: Habib, M. Syndromes démentieis: approche clinique et neuropsychologique - Pari s - Masson - 1991 . VARGAS, H. S. - Psicogeriatria Geral. Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Kogan, 1994.

ATERCEIRA IDADE

43



Plantas Medicinais: Noções Básicas para a Terceira Idade MARCOS ROBERTO FURLAN ENGENHEIRO AGRÔNOMO. DOCENTE NA UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ, NA FACULDADE INTEGRAL CANTAREIRA E NA PÓS-GRADUAÇÃO EM PLANTAS MEDICINAIS DAS FACULDADES OSWALDO CRUZ.

"Quando desconsideramos o conhecimento de alguém com vasta experiência no uso tradicional das plantas, podemos perder uma fonte segura e que poderá originar um novo medicamento oficial... Sem dúvida, as pessoas idosas, em decorrência de sua experiência de vida, são responsáveis em grande parte pelo desenvolvimento e pela preservação desse saber". ATERCEIRA IDADE

4S


INTRODUÇÃO

desenvolvimento e pela preservação desse saber. Todavia, como todos estamos

H á 5 mil anos, segundo registros

sujeitos a equívocos, pretendo aqui es-

históricos, as plantas já eram utilizadas

clarecer algumas questões levantadas

com finalidades terapêuticas pelas civili-

pelos próprios idosos em palestras que a

zações chinesa e indiana e ao longo da

eles tive a oportunidade de ministrar.

história elas foram sendo empregadas

Quando desconsideramos o con he-

pelas mais distintas civilizações e cultu-

cimento de alguém com vasta experiên-

ras. O encarecimento dos remédios

cia no uso tradicional de plantas, pode-

alopáticos, as pesquisas confirmando a

mos perder uma fonte segu ra e que po-

eficácia de vários remédios naturais e o

derá originar um novo medicamento ofi-

aparecimento de resistência das doen-

cial. Além da pouca atenção que damos à

ças aos medicamentos, foram alguns dos

biodiversidade brasileira de espécies ve-

fatores que contribuíram para o retorno

getais, a maior do planeta, também não

desta prática milenar.

conseguimos resgatar o rico conheci-

A Organiza ção Mundial de Saúde estima que quase 70% da popula çã o

mento popular, principalmente o conhecimento de origem indígena.

mundial utiliza plantas como medica-

Várias de nossas espécies correm o

mento e o chamado "chazinho da vovó"

risco de desaparecer, mesmo aquelas

fo i transformado em uma ciência, sendo

com alto valor comercial como é o caso

atualmente estudado nas universidades

do jaborandi (Pilocarpus microphylus), da

e recebendo o nome de fitoterápico,

ipecacuanha (Cephaelis ipecacuanha) e

assim como todo remédio originado de

da espinheira-santa (Maytenus ilicifolia).

planta. O primeiro passo para a desco-

Considerando todas as espécies vegetais

berta destes medicamentos é a infor-

do planeta (estima-se que há no mínimo

mação popular e segundo uma pesqui -

250.000), bem menos de 1% foi estuda-

sa realizada em 1984 por FARNSWORTH

do para fina lidades medicinais.

(1997), de 119 princípios ativos avalia-

No final da década de 80, o nosso

dos e originados do reino vegetal, 74%

Ministério da Saúde, através da Central

tinham relação direta com o uso da me-

de Medicamentos (CEME), financiou pro-

dicina tradicional, ou seja, as indicações

jetos que resultaram na comprovação da

da população estavam corretas, em sua

eficiência terapêutica de algumas espé-

maioria.

cies como por exemplo:

Sem dúvida, as pessoas idosas, em

alho: como vermífugo;

decorrência de sua experiência de vida,

caapeba: de propriedade hepática;

são responsáveis em grande parte pelo

espinheira-santa: contra gastrite e úl-


cera gástrica;

to das plantas para toda a população.

guaco: como expectorante; hortelã: paralisa o desenvolvimento de

O QUE É UMA PLANTA MEDICINAL Uma planta é classificada

ovos de lombriga; imbaúba: contra pressão alta;

como medicinal por possuir substâncias

maracujá: efeito calmante;

que tem ação farmacológica, isto é, que

mentrasto: antiinflamatório e analgé-

agem no organismo provocando reações

sico em artroses e reumatismo; e

que resultam na cura ou na prevenção de

quebra-pedra: prevenção de cálculos

doenças. Essas substâncias são denomi-

renais e diurético.

nadas de princípios ativos, embora, não se saiba ainda, na maioria das espécies,

Em várias reg1oes brasileiras, a

quais estão realmente atuando.

fitoterapia já está sendo oferecida para a

No quadro abaixo estão exem-

população através de seus órgãos oficiais.

plificados alguns dos principais grupos

Apesar de valioso, o conhecimento popu-

de princípios ativos, com sua respectivas

lar deve andar com a ciência, pois esta

funções e exemplos de espécies comes-

colabora principalmente com o uso corre-

tas substâncias:

Grupo de Princípio Ativo

Ações

Espécies

1. Mucilagens

Antiinflamatória, laxante, cicatrizante, antiespasmódica

Babosa, tanchagem, borragem

2. Óleos essenciais

Bactericida, vermífuga, anti-séptica, anestésica

Alecrim, tomilho, hortelãs, sálvia, tomilho

3. Alcalóides

Analgésica, sedativa, anestésica, calmante

Beladona, estramônio, café, maracujá, boldo-do-chile

4. Taninos

Adstringente, antidiarréica

Goiabeira, barbatimão, pitangueira, espinheirasanta

5. Bioflavonóides

Antiinflamatória, fortalece os vasos capilares

Calêndula, erva-baleeira, camomila, macela

6. Glicosídios cardiotônicos

Cardiotônica, tratamento de doenças do coração

ATERCEIRA IDADE

Dedaleira, espirradeira

47


A IMPORTANTE DIFERENÇA ENTRE

Há relatos de reações alérgicas quando

HOMEOPATIA E FITOTERAPIA

usada externamente. Mal estar, enjôo e

É comum as pessoas citarem que

até vômitos são associados a doses altas.

gostam muito da homeopatia porque

Erva-cidreira (Melissa officinalis)

usam plantas medicinais. A fitoterapia

· Pode ocorrer diminuição da pulsação e

pode ser considerada como parte da me-

entorpecimento.

dicina alopática, isto é, a usual, pois trata

Erva-de-santa-maria (Chen opodium

dasdoenças através dosopostos enquan-

ambrosioides)

to a homeopatia é a cura através dos

· Dose um pouco além do normal pode

semelhantes. Em muitos casos o médico

causar hemorragia interna.

homeopata utiliza fitoterápicos com o

Erva-doce (Pimpinella anisum)

auxiliar no tratamento.

· Uso em doses muito elevadas causa con-

Será Que Fitoterápicos Não Fazem Mal a Saúde? Há comumente a idéia de que se o

fu sões mentais e sintoma semelhante a embriaguez.

Guaco (Mikania glomerata)

chá não fizer bem, mal não fará. Infeliz-

· Excesso pode causar diarréia, mal estar,

mente é incorreta pois todo medicamen-

vômitos e até hemorragias.

to, tanto natural quanto sintético, pode,

Losna (Artemisia absinthium )

quando usado nas formas e doses erra-

· Tóxica e em doses um pouco acima do

das, trazer mais prejuízo do que benefí-

recomendado podem causar alucina-

cio. Também deve ser citado que, assim

ções, mal estar e hemorragia.

como o remédio convencional, cada or-

Mil-folhas (Achillea millefolium)

ganismo pode ter uma reação e a receita

· Dose elevada pode causar dores de ca-

que uma família utiliza com sucesso du-

beça, vertigem e irritação da pele.

rante anos, pode não trazer o mesmo resultado para outra. Como exemplos de

ALGUMAS CONFUSÕES NA IDENTIFI-

espécies de uso comum e que podem

CAÇÃO DE PLANTAS MEDICINAIS

provocar ri scos a saúde, podemos citar

Um dos erros mais comun s na área

as seguintes:

das plantas medicinais é a confusão na

Arruda (Ruta graveolens)

denominação e ocorre principalmente

· Doses altas podem causa r hemorragia e

porque as pessoas acreditam que um

aborto. O uso externo pode ca u sa r

nome só se refere a uma única espécie.

irritações em pessoa s de pele sensível.

Como exemplos, carqueja no sul étiririca-

Camomila (Matricaria chamomilla)

de-babado no norte, boldo-comum para

· Não se recomenda a utilização da infu-

a maioria das regiões é malva-santa em

são para lavar os olhos e em gestantes.

alguns loca is do norte e nordeste, mastruz

48


do nordeste é diferente de mastruz do

co do capim-limão (Cymbopogon citratus

sul. Cuaça, estomalina, caferana, fel-da-

Stapf). O nome científico deve ser grafado

terra, figatil e árvore-do-pinguço são si-

em itálico (ou negrito). O primeiro nome

nônimo: . Muitas vezes é difícil conven-

(gênero) inicia em maiúscula e o segun-

cer as pessoas de que pode ocorrer vari-

do (espécie) em minúscula. O nome do

ação no nome e que um só nome pode se

autor no final do nome científico serve

referir a várias espécies.

para indicar quem originou o nome. É

Raras são as plantas medicinais que

obrigatório em rótulo de medicamento,

possuem poucos sinônimos como por

colocar o nome científico de todas as

exemplo arruda, picão-preto, orégano,

espécies vegetais que ele contenha. As

babosa, alecrim, alfazema, citronela e

principais confusões que ocorrem são as

eucalipto. Algumas divergências podem

seguintes:

ocorrer até mesmo entre vizinhos e mui-

Os Boldos-0 boldo-do-chile é raro

tos não aceitam o nome que o outro dá à

ao natural no Brasil, ao contrário do que

sua planta. Como exemplo são dados al-

ocorre nas nossas farmácias, pois é im-

guns nomes populares do capim-limão,

portado, já seco, em grande quantidade.

espécie muito utilizada no Brasil: capim-

No país, em função do mesmo uso que o

sa nto, erva-cidreira, chá-de-estrada,

verdadeiro, algumas espécies recebem o

cidrão, capim-cidrão, cidreira, chá -

nome boldo e as principais são: boldo da

brochante, erva-cidreira-de-folha-estrei-

terra ou boldo-comum (boldo de folha

ta, erva-cidreira-de-homem, cidró e ca-

peluda) e o boldo-baiano, que pode ser

pim-cidreira

considerado o mais alto. As folhas do

As confusões com relação a identi-

boldo-do-chile possuem odor muito pró-

ficação de plantas podem trazer proble-

ximo ao da erva-de-santa-maria devido a

mas tais como o uso de forma incorreta e

presença de mesma substância. Também

intoxicação com a espécie errada. Para

há o boldo de folhas miúdas (boldo-por-

tentar resolver o problema dessas varia-

tuguês ou boldo-miúdo entre outros

ções, os pesquisadores colocaram para

nomes), e o boldo-chinês (também co-

cada ser vivo um nome oficial ou científi-

nhecido como arnicão). No quadro há

co. Este nome possui regras e as princi-

informações sobre o uso dos principais

pais são demonstradas no nome científi-

boi dos:

A TERCEIRA IDADE

49


Usos ou propriedades

Boi dos

Toxicidade ou efeitos colaterais

Boldo-do- Chile

Digestiva, coletérica, diurética

Abortivo, causa hemorragia interna

Boldo-baiano

Analgésica, antiúlcera, antimicrobiana, carminativa

Ainda não verificado

Boldo-da-terra

Azia, analgésica, digestiva

Pode causar irritação gástrica quando usado por longo período

Ervas-cidreiras - Cidreira ou me-

tros nomes. As pessoas que conhecem

lissa são nomes associados ao efeito cal-

bem as plantas medicinais ainda usam

mante. No entanto, quando se trata da

estes nomes. Todas as arnicas são usadas

verdadeira melissa, o correto seria a de

contra contusões.

origem européia e da qual derivou o

As Ervas-de-são-joão - Há um erro

nome latino Me/issa officinalis. Em quase

comum e perigoso em relação ao nome

todo o Brasil, quem recebe o nome de

erva-de-são-joão. A de ocorrência espon-

melissa é uma planta nativa com flores

tânea no Brasil, também chamada de ca-

lilases e que cresce com muita facilidade.

tinga-de-bode, mentrasto ou picão-roxo,

No sul é comum chamá -la de erva-

é comum nos quintais, possui flores com

cidreira-brasileira. O seu nome científico

tons azulados a roxos e tem o uso como

é Lippia alba. O capim- limão também

analgésico para reumatismo e artrose. A

recebe o nome de erva-cidreira como já

de origem européia é de rara ocorrência

foi citado. Todas estas três tem o uso

no Brasil e possui fama contra depressão.

principal como digestivo.

O problema é confundi-las com o cipó-

As Arnicas - Inúmeras espécies re-

de-são-joão (trepadeira e de flores

cebem o nome de arnica no Brasil, embo-

alaranjadas), que é tóxico e na medicina

ra a verdadeira seja de rara ocorrência no

popular é usado no tratamento do vitiligo

país, pois seu habitat natural são as mon-

ou como expectorante.

tanhas da Europa. No Brasil são comuns

Funcho x erva-doce - Outro erro é

em quintais ou pastos duas espécies de

confundir o funcho com a erva-doce, já

arnicas. Antigamente uma era também

que esta é de rara ocorrência nas nossas

chamada de sapé macho, erva-lanceta

hortas e quintais. O uso de ambas contra

ou rabo-de-foguete e a outra de cra-

gases e o odor semelhante provoca tais

vorana ou cravo-de-urubu, além de ou-

confusões, embora a verdadeira erva-

50



doce tenha maior teor de óleos essenci-

O Ginseng - O verdadeiro ginseng

ais.Erva-doce pode ser sinônimo de anis,

(Panax ginseng) é encontrado principal-

como consta no próprio nome científico

mente em alguns países asiáticos. Possui

Pimpinella anisum. Suas folhas são seme-

até 90 cm de altura, flores minúsculas e

lhantes à da salsa enquanto que ofuncho

de cor verme! ha. No Brasi 1, em regiões de

é bem mais alto e possui folhas bem re-

clima mais ameno, ocorrem espécies de

cortadas. Há ainda a árvore anis-estrela-

fáfia (Pfaffia), que são denominadas de

do que produz semente com odor muito

ginseng nacional. O asiático demora mais

semel hante e uma espécie de manjeri-

de cinco anos para ser colhido enquanto

cão com folhas que lembram a fragrância

que as fáfias, cerca de dois anos.

de anis.

As confu sões não poupam nem

Mastruço ou mentruz - Conhecida

mesmo escritores como Affonso Arinos

como mastruço (Chenopodium ambro-

ou Guimarães Rosa q ue citam erronea-

sioides) no Nordeste, é chamada erva-de-

mente em suas obras a ocorrência da

santa-maria no sul e sudeste e tem usos

arnica verdadeira em Minas Gerais.

contra vermes e contusões, mas é considerada tóxica. O mentruz ou até mastruço

HÃ NO QUINTAL PLANTAS DE USO

(Coronopus didymus) que ocorre no sul e

MEDICINAL?

sudeste principalmente, não é tão comum

Não só há como muitas já são reco-

no nordeste, pois prefere climas mais ame-

nhecidas pela medicina oficial como as

nos e é comprovado cientificamente como

relacionadas no quadro abaixo:

expectorante e contra contusões, além de ser usado como alimento.

52


Nomes Populares

Nome Científico

Leonotis nepetaefolia

Cordão-de-frade

Usos

Alergias, problemas respiratórios -

Dente-de-leão

Taraxacum officinale

Diurética, comestível, digestiva

Erva-de-bicho

Polygonum persicaria

Hemorróida

--

--

Erva-de-botão

Eclipta a/baAntiofídica,

hepatoprotetora

-

-

Erva-de-santamaria

Chenopodium ambrosioides

Vermífuga, repelente de pulgas e piolhos

Gervão

Stachytarphetta cayenensis

Tônica, laxativa, hepática -

Ageratum conyzoides

Analgésico de reumatismo e artrose, digestiva

Mentruz

Coronopus didymos

Comestível, expectorante, para contusões

Picão preto

Bidens piloso

Hepática

Quebra pedra

Phyllanthus niruri

Cálculo renal, diurética

Rubim

Leonorus sibiricus

Cólica, contusões

Sete-sangria

Cuphea aperta

Colesterol, pressão alta

Mentrasto

-

-

Tanchagem

Plantago lanceolata

Tanchagem maior

A TERCEIRA IDADE

Plantago major

Cicatrizante, infecções da garganta Cicatrizante, infecções da garganta

53


MODO DE USO DAS

nos casos de tosses, dores de garganta e

PLANTAS MEDICINAIS

b ron quite. Fazer inicialmente uma ca l-

O uso, mesmo de chás, deve ser

da com açúcar cristal, na proporção 2:1

acompanhado por médicos. No entanto

(2 xícaras de açúcar para 1 xícara de

cit o algumas formas do uso de

água). A m istura é levada ao fogo até

fitoterápicos, com o objetivo de contri-

obter uma consistência desejada. Adi ci-

buir para o uso correto.

onar as plantas preferencial mente fres-

Infusão: despejar água fervendo

cas e picadas em fogo baixo e mexer por

sobre as partes da planta em um recipi-

três a cinco m inutos. Se desejar a adição

ente, que deverá permanecer tampado

de mel em su b stituição ao açúcar, não

por um tempo variável entre 5 e 1Ominu-

aquecer e adicionar o suco da planta, a

tos. Depois coar e usar no mesmo dia.

decocção ou a infusão frios. A quantida-

Para problemas como gastrite e outros

de de plantas a ser adicionada em cada

digestivos a infusão não deve ser tomada

xarope é variáve l de acordo com a espé-

quente. As doses normais são quase sem-

cie vegetal.

pre 1 colher de sopa de partes frescas por xícara de chá três vezes ao dia. A infusão

FICHAS DE ALGUMAS

é a forma mais comum do uso de plantas

PLANTAS MEDICINAIS

medicinais, principalmente para as aromáticas.

A segurança no uso de plantas medicinais como medicamento tem aumen-

Decocção: aquecer água em uma

tado em função principalmente dos re-

panela. Depois acrescentar partes da

cursos alocados nas pesquisas, facilitan-

planta a ser utilizada, tampar e deixar

do a comprova ção da eficácia de muitas

ferverem fogo baixo por 1Oa 20 minutos.

delas. A seguir uma relação de algumas

Deverá ser utilizado no mesmo dia.

espécies já estudadas.

MACERAÇÃO: colocar parte da planta em um recipiente com água, que

Alumã

deverá permanecer em lugar fresco, pro-

Nomes populares: alumã, boldo-

tegido da luz solar direta, podendo ser agitado periodicamente. Partes tenras como folhas e flores são picadas e ficam

baiano, estomalina, cuaça Nome

cie ntífico:

Vernonia

condensa ta

macerando por 1O a 12 horas e partes

Família: Asteraceae

mais duras por 18 a 24 horas. Não confun-

Arbusto de origem africana e trazi-

dir maceração com amassamento ou tri-

do ao Brasil provavelmente pelos escra-

turação de plantas.

vos, onde aclimatou-se e cresceu com

Xarope: utilizado normalmente S4

grande facilidade, só sofrendo com ven-


tos, pois quebra facilmente. Alguns o

para esse fim desde a época dos antigos

chamam erradamente de boldo-do-chile

egípcios. Ele é um dos condimentos mais

e alcachofra devido a propriedades me-

utilizados na culinária em geral. Não deve

dicinais relacionadas ao fígado, apesar

ser ingerido em doses elevadas, por cau-

de ser menos tóxico que o primeiro. Pos-

sar cefa léia, tontura, diarréia e cólica in-

sui inúmeros nomes que podem variar

testinal.

de acordo com a região, como por exemplo cuaça em Sergipe, fel-da-terra no Rio

Arnica-brasileira

Grande do Sul, estomalina e caferana no

Nomes populares: arnica-brasilei-

Estado de São Paulo e ainda alumã na

ra, sapé-macho, erva-lanceta

Bahia. Suas propriedades terapêuticas

Nome científico: Solidago chilensis

são relacionadas principalmente a diges-

Família: Asteraceae

tão como por exemplo: carminativa,

Originária da América do Sul, esta

coletérica e antiulcerogênica. Também

espécie, apesar de classificada como pia n-

possui recomen dações como analgésica

ta invasora, é considerada medicinal e já

e antimicrobiana.

citada na primeira Farmacopéia Brasileira de 1929. Não deve ser confundida com

Alho

a verdadeira (Arnica montano), de rara

Nomes populares: alho

ocorrência no Brasil. Além desta planta,

Nome científico: Allium sativum

no país há dezenas de espécies que tam-

Família: Liliaceae

bém recebem o nome de arnica. Possui

Espécie que vem auxiliando a saú-

até 1,2 m de altura, é perene e pode re-

de do ser humano há mais de 5.000 anos

produzir por sementes ou através de seus

e é considerada uma das primeiras culti-

rizomas. As folhas possuem forma de lan-

vadas pelo homem. O alho até o século

ça e as flores são de coloração amarela.

XVIII, era usado como moeda de troca.

Ocorre espontaneamente em terrenos

Apesar de polêmica sobre suas recomen-

baldios, beira de estradas e pastagens.

dações, atualmente já é utilizado como

Seu va lor medicinal é principalmente

fitoterápico ou ingrediente em compos-

como antiinflamatório, em hematomas e

tos. Suas indicações são várias como por

contusões. Também é usada na medici-

exem plo: dor de dente em crianças, exci-

na popular como digestiva, mas é suspei-

tante da mucosa do estômago, podero-

ta de ser tóxica. É considerada planta

so anti-séptico das vias respiratórias, e

apícola.

inflamação da garganta. É considerado o remédio à base de planta mais popular

Boldo-comum

para problemas respiratórios, e é usado

Nomes populares: boldo-comum,

A TERCEIRA IDADE

55


boldo, tapete-de-oxalá, malva-santa,

cosméticos (muito utilizada em xampus)

sete-dores

e suas recomendações medicinais são

Nome científico: P/ectranthus

inúmeras

como

por

exemplo:

estomáquica, antiespasmódica, sedativa,

barbatus

Família: Lamiaceae

antiinflamatória, emenagogo, tônica,

De origem africana este é o boldo

analgésico, antialérgico e febrífuga. A

mais comum no Brasil, e muito confundi-

parte utilizada é o capítulo floral que deve

do com o verdadeiro boldo-do-chile, ape-

ser colhido em pleno florescimento. Em

sar de ter aparência muito diferente. Suas

doses elevadas pode causar insônia e

folhas aveludadas e altura de no máximo

vômitos.

2,0 m são características suficientes para diferenciar do verdadeiro e do alumã

Capim-limão

(boldo-baiano). No nordeste é conheci-

Nomes populares: capim-limão, ca-

do como malva-santa ou sete-dores. Ao

pim-santo, erva-cidreira, chá-de-estrada

diminuir a acidez gástrica, auxilia no tra-

Nome científico: Cymbopogon

tamento da gastrite, úlcera gástrica, azia

citratus

e ressaca. Também é recomendado como

Família: Poaceae

analgésico e colagogo. Doses concentra-

Gramínea originária da Ásia. É culti-

das podem trazer danos ao organismo.

vado preferencialmente em regiões de

Pode ser confundido com algumas varie-

clima mais quente mas pode ser encon-

dades ornamentais.

trado em todo o Brasil. Possui utilidades na indústria farmacêutica, cosmética e

Camomila

de bebidas, sendo o citral um dos seus

Nomes populares: camomila,

componentes mais importantes e com

matricária,camomila-comum,camomila-

atividade antiespasmódica. Também é

vulgar

recomendado como antibacteriano,

Nome

científico:

Matricaria

chamomilla

antifúngico e analgésico. Em doses elevadas pode ser abortivo. A sua indicação

Família: Asteraceae

como calmante é motivo de muita polê-

De origem do Sul da Europa e Ásia

mica mas a atividade analgésica é quase

Ocidental, é espécie anual e por isso não

que unânime. Em casa pode-se preparar

tão cultivada nos quintais. Prefere regi-

gostosos sucos com o capim-limão. Na

ões de clima mais ameno. Possui aplica-

agricultura é plantado em curvas de nível

ções nas indústrias de medicamento, sen-

para controlar erosão e é utilizado para

do inclusive testada em dentifrícios e

atrair abelhas.

56


Chapéu-de-couro

planta invasora de jardins e gramados.

Nomes populares: chapéu-de-cou-

Alguns de seus nomes populares (páraquedas, cabeça-de-monje, seu-pai-ficou-

ro Nome científico:

Echinodorus

ca reca), são referências a sua inflorescência (apelidada de pompom), que

grandiflorus

Família: Alismataceae

se desfaz com o vento. As principais reco-

Espontâneo no Brasil, ocorre em

mendações são como digestivo, co-

locais encharcados como brejos, córregos

lagogo, diurético, depurativo e anti-reu-

e lagoas. Apesar de muito procurado,

mático. As partes utilizadas são as folhas

chega a ser classificado como planta da-

e as raízes.

ninha por causar problemas no fluxo de

Erva-cidreira

água dos canais. Pode atingir 1,5 m ou

Nomes populares: erva-cidreira,

mais de altura, as suas folhas são grandes

melissa, melissa verdadeira

chegando a ultrapassar 1,0 m de compri-

Nome científico: Melissa officinalis

mento e as flores são de coloração bran-

Família: Lamiaceae

ca. A maioria de suas propriedades é rela-

De origem européia esta espécie

cionada ao aparelho excretor como por

pode ser considerada a verdadeira

exemplo contra excesso de ácido úrico,

melissa, apesar de ser mais conhecida no

diurética e depurativa. Também é reco-

Brasil como erva-cidreira e a falsa como

mendado contra reumatismo, doenças

melissa. Com aspecto semelhante ao

da pele e hepático.

hortelã comum é fácil de diferenciar da falsa-melissa (Lippia alba). No Brasi l é

Dente-de-leão

muito raro uma região em que floresça.

Nomes populares: dente-de-leão,

Possui no máximo 0,50 m de altura e, se

taraxaco, pára-quedas, amor-de-homem,

produzir flores, elas serão de coloração

seu-pai-ficou-careca, cabeça de monge

branca a branca rosada. É muito utilizada

Nome

científico:

Taraxacum

officinale

para obtenção de óleo medicinal que será utilizado nas indústrias farmacêuticas e

Família: Asteraceae

alimentícias. São atribuídas ações diges-

O dente-de-leão é espécie herbá-

tiva, calmante suave, emenagoga, car-

cea de origem européia e apesar de co-

minativa, sudorífica e contra cólicas in-

mestível (com valor semelhante a al-

testinais. As folhas secas são utilizadas

meirão), medicinal (usada desde a anti-

na forma de infusão.

güidade como diurética) e até para a fabricação de bebida caseira, é pouco con-

Espinheira-santa

siderado no Brasil e até classificado como

Nomes populares: espinheira-san-

ATERCEIRA IDADE

57


ta, cancorosa

tes menores. Possui variedades que são

Nome científico: Maytenus ilicifolia

específicas para produção de bulbos e

Família: Celastraceae

outras somente para produção de se-

Com origem na América do Sul, re-

mentes. Na culinária seu uso é amplo, as

cebe muita atenção de pesquisadores

folhas picadas servem para corrigir o gos-

nacionais e estrangeiros em função de

to oleoso de certos peixes e como condi-

ser promissora para a cura de câncer no

mento para saladas e assados, os talos

aparelho digestivo. No entanto, a dificul-

tenros perfumam sopas, molhos e o grão

dade de identificar as espécies de

vai em pães, feijões, nabos e bolo de

espinheira santa, faz com que ocorra

carne. Na medicina é eficaz como car-

muita falsificação no comércio. As princi-

minativo, digestivo, colagogo e para au-

pais medicinais são Maytenus ilicifolia

mentar a secreção do leite materno.

(mais estudada) e Maytenus aquifollium. Esta última apresenta caule liso enquan-

Goiabeira

to que a primeira possui estrias nesta

Nomes populares: goiabeira, goia-

parte. Possui porte arbustivo ou arbóreo,

ba, araçá-goiaba, goiaba-vermelha

perene, e com crescimento muito lento,

Nome científico: Psidium guajava

às vezes semelhante a uma árvore de

Família: Myrtaceae

citros. É eficaz contra gastrite e úlcera

A goiabeira vegeta em quase todo

gástrica, além de ser indicada como

o território nacional já que é nativa do

diurética, anti-séptica e analgésica.

Brasil e pode chegar até 1O metros de altura. O seu fruto, dependendo da varie-

Funcho

dade, pode fornecer polpa branca, ver-

Nomes populares: funcho, erva-

melha, rósea ou amarela. Utilizada no consumo natural e também na forma de

doce Nome

científico:

Foenicu/um

vulgare

doces, é rica em cálcio, fósforo e ferro, além de ser rica em vitamina C, quando

Família: Apiaceae

verde. As folhas e brotos, principalmente

Herbácea com até 2 m. de altura e

da goiabeira-vermelha, em decocção sã o

de origem européia masque se aclimatou

utilizadas contra diarréia e hemorróidas

no Brasil, onde pode ser considerada

uterinas. Ela também é antibacteriana e

como subespontânea em algumas regi-

analgésica. Dela sã o utilizados na medi-

ões. Apesar de também ser chamada de

cina popular a casca, a raiz e o fruto.

erva-doce, não deve ser confundida com a verdadeira (Pimpinella anisum) que é

Guaco

menor e produz flores brancas e semen-

Nome popular: guaco

58


Nome científico: Mikania glomerata

mendado para depressão. Esta última não

Família: Asteraceae

ocorre espontaneamente no Brasil e pos-

Uma das planta s brasileiras com

sui flore s amarelas enquanto que o

ampla utilização em programas oficiais

mentrasto possui flores com cores bran-

de fitoterapia , como bal sâmica e ex-

cas, lilases ou azuladas. Há ainda o ci pó-

pectorante. Apesar de preferir clima mais

de-sã o-joão, que é tóxico e possui flores

ameno, ocorre em quase todo o Brasil.

laranjas. Sua ação antiinflamatória está

Trepadeira arbustiva, popularmente é

comprovada e não há referência sobre

recomendado contra tosse de qualquer

efeitos tóxicos. As partes utilizadas sã o

natureza, catarro bronquial, asma brôn-

folhas e sementes. Tintura ou infusão são

quica e estados gripais. É também consi-

as formas recomendadas para o uso.

derado anti-séptico das vias respiratórias, febrífugo, sudorífico e até, em algu-

Mentruz

mas literaturas, como anti-reumático e

Nomes

cicatrizante. Uso externo contra micoses.

mastruz, mastruço

Para preparo dos remédios são utilizadas

Nome

as folhas. Em altas doses pode provocar

populares:

científico :

mentruz,

Coronopus

didymus

Família: Brassicaceae

diarréia e vômitos.

Da América do Sul, é outra espécie

Mentrasto

que está ganhando fama nos postos de

Nomes populares: mentrasto, erva-

saúde como expectorante. Não deve ser

de-sã o-joão, picão- roxo, catinga-de-

confundida no norte e nordeste com uma

bode

planta que aqui chamamos de erva-deNome

científico:

Ageratum

conyzoides

santa-maria

(Chen opodium

ambrosioides), e nestas regiões é chama-

Família: Asteraceae

da de mastruz ou mastruço e que é con-

Espécie de origem brasileira, ocor-

siderada tóxica e recomendada como

re em quase todo o país. Planta anual,

vermífugo. É encontrada com mais facili-

aromática considerada invasora e que

dade nas regiões de clima mais ameno

serve como indicativa de solo fértil. Ape-

mas pode ser encontrada em outras regi-

sar de eficaz como analgésico de reuma-

ões. É considerada comestível. Possui re-

tismo e artrose, atualmente ocorre a po-

comendações principalmente relaciona-

lêmica por ser confundido com a planta

das ao aparelho respiratório e contra con-

hipericão ou hipérico (denominado tam-

tusões. Também é indicada contra reu-

bém de erva-de-são-joão), que é reco-

matismo, dores musculares e feridas.

A TERCEIRA IDADE

59


Como partes medicinais são usadas as

· Depurativo: purifica o organismo por

folhas, flores e sementes.

facilitar a eliminação de substâncias indesejáveis.

GLOSSÁRIO DE TERMOS FARMACÊU-

· Diaforético: provoca transpiração.

TICOS E MÉDICOS

· Dispepsia: distúrbios na digestão. · Eczemas: doença na pele com inflama-

Neste g !ossário são encontradas de-

ção.

finições de algumas palavras que não são

· Emenagogo: que provoca menstrua-

comuns no dia-a-dia.

ção. ·Estupefaciente :

que

causa

· Adstringente: que recobre ou contrai

adormecimento de uma parte do corpo.

tecidos do corpo. Diminui a eliminação

· Expectorante: provoca ou facilita a tos-

de substâncias ou protege o tecido.

se.

· Antiespasmódico: acalma as contra-

· Hemostático: contra hemorragias.

ções dos músculos liso.

· Hepático: beneficia o fígado.

· Anti-séptico ou antimicrobiano: im-

· Hepatoprotetor: protege o fígado.

pede o desenvolvimento de bactérias,

· Laxante: facilita a evacuação intestinal.

fungos e outros agentes microbianos.

Atua como purgante suave.

· Balsâmico: freqüentemente tem ação

· Purgativo: limpa os intestinos.

expectorante e anti-séptico.

· Sedativo: calmante ou tranqüilizante.

· Béquico: trata a tosse, antitussígeno.

· Sudorífico: aumenta a transpiração.

· Carminativa: combate os gases intesti-

· Tônico: estimula o organismo em geral.

nais.

· Vasodilatador: causa dilatação dos va-

· Colagogo: remédio que ativa a bílis.

sos sangüíneos.

· Coletérica: estimula a produção de bile

· Vulnerário: próprio para curar feridas.

pelo fígado.

60


BIBLIOGRAFIA BALBACHAS, A. 1956. As plantas curam. 2 ed. São Paulo, Missionária. DI STASI, L. C.; SANTOS, E. M. G.; SANTOS, C. M.; HIRUMA, C. A. 1989. Plantas medicinais na Amazônia. São Paulo, Ed. UNESP. FARNSWORTH, N. R. 1997-Testando plantas para novos remédios. ln: Biodiversidade. Org. WILSON, E.O. São Paulo, Nova Fronteira. FURLAN, M. R. 1999. Cultivo de plantas medicinais. 2 ed. Cuiabá, SEBRAE/ MT. FURLAN, M. R. & SERRICCHIO, R. P. 1998. Plantas medicinais: guia para identificação. São Paulo, edição dos autores. CD-Rom. HOEHNE, F. C.1939/ 1978. Plantas e substâncias vegetais tóxicas e medicinais. São Paulo, Departa mento de Botânica do Estado. MARTINS, E. R.; CASTRO, D. M.; CASTELLANI. D. C.; DIAS, J. E. 1995. Plantas medicinais. Viçosa, UFV. MATOS, F. J. 1994. Farmácias vivas: sistema de utilização de plantas medicinais projetado para pequenas comunidades. 2 ed. Fortaleza, EUFC. PANIZZA, S. 1997. Plantas que curam: cheiro de mato. São Paulo, IBRASA. QUER,P.F. 1988. Plantas medicinales: el dioscórides renovado. Barcelona, Labor. j

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A TERCEIRA IDADE

61



A Arquitetura e os Idosos: Considerações para a Elaboração de Projetos MARIA CRISTINA SCHICCHI DOCENTE DA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO DA PUC DE CAMPINAS E DOUTORANDA PELA FAU - USP. ILUSTRAÇÕES: PAULO ZILBERMAN

uo trabalho de projetar e construir é um processo que responde a uma solicitação da sociedade e só são possíveis avanços na medida em que esta também tiver consciência da importância de se ter em conta o processo de envelhecimento". ATERCEIRA IDADE

63


Introdução:

çam a despontar e as soluções ainda vêm

A Tarefa da Arquitetura.

a reboque de pesquisas e procedimentos realizados em outros países.

Há alguns anos, durante palestras no

curso

de

gerontologia

pó s-gradu açã o do

In st ituto

em

Sede s

Refiro-me particularmente aos países europeus onde esta preocupaçã o com

os idosos têm recebido atenção

Sa pientiae, ao me apresentar aos alunos,

desde o século X1 e, neste século, princi-

alertava-os para o fato de não me consi-

palmente ao período pós segunda guer-

derar exatamente uma especialista no

ra, à ampliação dos programas sociais

tema que iria tratar e justificava. Creio

efetivados pelos municípios socialistas

que aquela justificativa ainda é vál ida

(principalmente dos pa íses escandina-

neste momento pois, do modo como

vos) voltados para atendimento de to-

vejo a questão, a arquitetura não deve

dos os grupos sociais (maternidades, es-

jamais servir apenas a uma classe, a um

colas infantis, assistência aos idosos, etc).

grupo ou a um tipo de usuário específico.

Inclui-se nesta lista o esforço de institui-

Ao contrário, ao pensarmos os espaços,

ções religiosas e comunidades específi-

seja no nível privado da habitação ou na

cas, como a judaica e a cristã, que ao

esca la de um espaço público, é essencial

longo dos anos constituiu uma imensa

que se pense o universo de pessoa s e

rede de instituições, pesquisas e solu-

atividades da forma mais ampla possível,

ções para as mais diversas necessidades

ou seja, a arquitetura e o urbanismo de-

sociais.

vem ser pensados para as necessidades e desígnios humanos.

Ainda que muitas destas proposta s, em termos de projeto, tenham trata-

Tal premissa por si só excl ui a pos-

do de forma isolada a questão do idoso

sibilidade de pensar uma arquitetura es-

na sociedade (os projetos eram, invaria-

pecífica para idosos, o que não significa

velmente, de casas de repouso, convi-

que, para que estes seja m de fato incluí-

vência ou asilo), acabaram por contribuir

dos e usufruam do espaço construído,

para uma maior conscientização sobre a

não devemos con siderar uma série de

necessidade de se pensar a questão de

elementos específicos para o seu dese-

forma mais ampla, na escala da cidade,

nho.

bu scando ampliar a mobilidade e a acesNuma sociedade até bem pouco

sibilidade de segmentos mais restritos

tempo considerada essencialmente jo-

da popula ção como os deficientes, as

vem, alguma s questões só agora come-

crianças e os idosos.

1) House for Elderly People : A Guide for Architects, Interior Designers and Their Client s. 64


Na Grã-Bretanha as novas cidades

No campo de conhecimento das

construídas neste período para atender

disciplinas de arquitetura e de urbanis-

uma população desabrigada e a deman-

mo muito se tem avançado a respeito

da por

ovas habitações para famílias

desta reflexão necessária para pensar o

jovens já apresentavam soluções para

futuro, mas pouco se tem realizado em

habitação de pessoas idosas, pessoas

termos de experiências concretas, não

solteiras, etc, inseridas nas áreas residen-

para solucionar o problema do idoso,

ciais destinadas a famílias -padrão

mas de uma outra sociedade que, essen-

(Stevenage, Milton Keynes). No Canadá e

cialmente, já não pode mais ser repre-

nos EUA2, no final dos anos 50, já haviam

sentada em termos ideais, a partir da

sido construídas habitações para idosos

família nuclear (pai, mãe, filhos).

com este conceito.

Segundo Mike Featherstone4 : "As-

No Brasil, país de tantas carências,

sistimos à reversão daquelas tendências

o problema da inserção do idoso ainda é

(instituição de idades compulsórias para

pendular e somente quando as estatísti-

as diversas fases do curso da vida: traba-

cas acenaram com a mudança de perfil

lhar, casar, votar, etc.) com uma maior di-

de nossa sociedade é que a atenção e os

versidade e embaçamento das grades etá-

cursos especializados nas diversas áreas

rias. Por exemplo, há modelos mais varia-

de conhecimento se constituíram.

dos de empregos com o ingresso dos jo-

A questão passou rapidamente de

vens no mercado e a finalização automáti-

uma abordagem assistencial e isolada

ca da transição entre a escola e o trabalho.

para uma visão mais ampla da questão

Há mais mulheres retornando à força de

onde o idoso, a criança, as pessoas com

trabalho e à educação superior na meia

estaturas excessivamente altas ou bai-

idade e mais homens se aposentando mais

xas, obesas, mulheres em fase avançada

cedo. É também perceptível uma maior

de gravidez e incapacitados físicos pas-

variedade nos modelos de parentesco, de

sam a formar um grupo, que na verdade

educação infantil e de família - com a cele-

em conjunto e somados às pessoas tem-

brada família nuclear sendo apenas uma

porariamente incapacitadas correspon-

entre as várias possibilidades. Aqui pode-

de, segundo Verônica Camisão3, a 80%

mos nos referir a famílias de pais separa-

da população, fato que nos faz questio-

dos, solteiros, mulheres escolhendo ter o

nar o mito do "homem-padrão" para o

primeiro filho depois dos 40 anos, casa-

qual projetamos por sécul os.

mentos de divorciados, etc."

2) Buildings For The Elderly - Musson Noverre - AIA - 1963, N.Y. 3) Anais do 1° Curso de Acessibilidade Ao Meio Físico - 1994 - R. de Janeiro. 4) Antropologia e Velhice - Textos Didáticos - IFCH/ UNICAMP pág. 57. ATERCEIRA IDADE

65


Neste sentido é que retomo a afir-

tacional, seja na unidade isolada ou no

mação inicial: não avançamos muito na

edifício, o que acarreta uma dificuldade

compreensão das mudanças de nossa

de controle mais rigoroso sobre as solu-

sociedade para projetar os novos espaços.

ções espaciais, sobre a escolha dos equi-

Há uma inércia a ser vencida neste senti-

pamentos disponíveis no mercado e dos

do que vai da revisão de valores arraiga-

materiais de acabamento utilizados nas

dos e maneiras de morar ao entrave na

constru ções.

assimilação das novas tecnologias nos

A única forma de controle geral de

projetos arquitetônicos e urbanísticos e

que dispomos é a verificação da aplica-

das novas modalidades de usuários.

ção do Código de Obras e do atendimento dos requisitos mínimos de conforto e

Os Vários Limites de atuação.

segurança através de plantas oficiais e

As Limitações de desenho.

memoriais descritivos (geralmente genéricos) dos projetos pela prefeitura.

Embora a pesquisa tecnológica aplicada à arquitetura tenha feito grandes

As Limitações locacionais.

avanços, estes não são aplicados às construções, sejam elas feitas por grandes

Urbanisticamente, as diferenças re-

construtora s ou empreiteiras, pelo Esta-

gionais e locais também são, às vezes,

do ou diretamente por pequenos cons-

difíceis de solucionar. Por exemplo, a

trutores.

maioria dos terrenos disponívei s para

A aplicação de sistemas industriali-

expansão urbana em São Paulo, locali-

zados, perspectiva vivida no pós-guerra

zam-se na periferia e se caracterizam por

pelos países europeus e nos EUA5, permi-

ter grandes declividades. (Fig.1) Por mais

tindo maior flexibilidade para os espaços

que amenizemos tal fato no âmbito de

e maior diversidade dos padrões, teve

um lote, projetando um edifício perfeita-

entre nós apenas exemplos isolados, ini-

mente adequado às suas condições, o

ciativa de promotores solitários, sem que

ambiente físico do entorno ainda perma-

isto se convertesse em experiência assi-

nece com as dificuldades e desconfortos

milada por amplos setores da con stru ção

de acesso devido às declividades acen-

civil.

tuadas. O próprio Código de Obras, imAté hoje utilizamos processos de

pondo limites indistintamente aos lotes

construção bastante artesanais, princi-

urbanos com o intuito de preservar con-

palmente no que se refere ao setor habi-

dições mínimas de conforto acaba por

5) Paulo Bruna, Arquitetura, Industrialização e Desenvolvimento- Editora Perspectiva - 1976 - São Paulo. 66


Rua

Inclinação de 30% a 40% Inclinação de 30% a 40%

Fig. 1 - Corte típico de implantação na periferia de São Paulo

restringir bastante as soluções mais ade-

minação e ventilação adequadas (Fig.2);

quadas a cada lugar.

escadas internas que não respeitam lar-

Por outro lado, não dispomos de

guras mínimas e cálculo adequado de

programas variados de utilização de ter-

desenvolvimento para uma pessoa com

renos vazios dentro da malha urbana

maior dificuldade de locomoção, a distri-

adensada ou a reutilização de edifícios e

buição funcional da casa de forma a se-

imóveis já construídos para implantação

gregar os usos, fazendo com que, para

de novas habitações e isto afeta direta-

realizar uma tarefa doméstica uma pes-

mente a ampliação das possibilidades de

soa tenha que percorrer várias vezes lon-

resposta às demandas.

gos trajetos entre áreas (da área íntima para a de serviço, por exemplo) (Fig.3).

As Limitações Culturais.

Em resumo, sem retirar a parcela dé culpa que cabe aos arquitetos, muitas ve-

Muitas das soluções espaciais que

zes desatentos a estas questões, caberes-

poderiam antecipar problemas futuros

saltar que o trabalho de projetar e cons-

de adaptação para uma pessoa idosa,

truir é um processo que responde a uma

seja no âmbito de uma habitação, de um

solicitação da sociedade e só são possíveis

edifício ou de um espaço público, esbar-

avanços na medida em que esta também

ram em conceitos pré-estabelecidos, ou

tiver consciência da importância de se ter

seja, sob fórmulas já consagradas muitos

em conta o processo de envelhecimento,

equívocos são perpetuados, tais como:

os diversos cursos da vida 6, ou, ao menos,

desníveis vencidos por pequenas e, às

a preocupação com questões menos ime-

vezes, sucessivas escadas na entrada das

diatas, para não dizer de sobrevivência.

casas ou edifícios; a organização e distri-

Estas questões sempre vão nos remeter

buição dos compartimentos através de

ao plano político, da ação e da participa-

corredores extensos e estreitos sem ilu-

ção nas instâncias de decisão.

ATERCEIRA IDADE

67


Corredores muito longos, solução não desejável

Apto

Apto

Soluções aceitáveis

Apartamento

Apartamento

Hl_

Apto

Apartamento

Fig. 2 - Organização de corredores internos (Baseado em Housing the Aging)

Escada em dois lances

~----------~~~ ~~~t Planta

~ii!~iiêi~~~!j!1___

fil

Planta i 68

Fig. 3 - Relação de espaços necessários para rampas e escadas para o mesmo pé direito. Por esta relação é possível constatar o quanto se torna difícil uma adaptação de rampa num espaço em que o desnível é vencido por escada


A Postura dos arquitetos

A postura mais adequada deveria ser então projetar tendo em mente, sem-

Os arquitetos devem responder às

pre que possível, as diferentes necessi-

solicitaçõ ~s dos usuários e podem, em

dades e características dos usuários, mes-

outro momento, antecipar soluções, des-

mo de minorias, e não projetar para ne-

de de que estejam envolvidos em pes-

cessidades muito específicas. Ninguém

quisas dentro de uma determinada área

gosta de usar produtos especiais que

específica. A ocorrência destes dois mo-

chamem atenção sobre si. No futuro esta

mentos simultaneamente, entretanto, é

postura poderá diminuir a necessidade

mais difícil de se dar. Os projetos especí-

de se reprojetar espaços. Deve-se ter em

ficos para idosos, muitas vezes atrelados

conta a mudança no grau de capacidade

a um pragmatismo para resolver proble-

dos usuários ao longo do tempo.

mas urgentes ou isolados, tende a discri-

Por outro lado, quase todos os re-

minar e subestimar a capacidade dos

quisitos de segurança e acessibilidade

mesmos.

para pessoas idosas criam conforto para

Tudo o que é definido fora dos padrões é levado para a área institucional, o que significa retirar de seu contexto regular.

Cabides

vida

(Fig.4). Neste sentido, o 1° Curso de Aces-

sibilidade do Meio Físico, realizado em

Armário I de - - -:- - - - - - - - - - - - 153,5 cm Cozinha ~ ___________ _ _ 122 cm

Remédios

·c::2::s-

qualquer pessoa em boa parte de sua

( (

- - - - - - - - - - - - - 115,5 cm

Termostato Interruptor Porta

.-Á~~~ ~~ ~~~;~~~ -----§ ------i]- - - - - - [~ J-- 91 ,5 cm

·---------------- ( Armário de Cozinha

--[!]---------68,5 cm Tomada

Álcance dobrando os joelhos - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 28cm

Fig. 4 - Medidas de alcance confortável (Baseado em House for Elderly People, 1988) ATERCEIRAIDADE

69


1994, no Rio de Janeiro, ao tratar da ques-

das com o espaço que geram uma cole-

tão da eliminação das barreiras ar-

ção básica de espaços funcionai s usados

quitetônicas e urbanísticas, propõe a uti-

pelo homem em sua vida diária 8 •

lização do conceito de "desenho univer-

A mudança qualitativa destes es-

sal" que consiste em quatro princípios

paços ou seu desaparecimento pode oca-

básicos: "o primeiro é acomodar uma gran-

sionar mudança total de padrões de vida

de gama antropométrica, e isto significa acomodar pessoas de diferentes dimensões - altos, baixos, em pé, sentados, etc; o segundo princípio é reduzir a quantidade de energia necessária para utilizar os produtos e o meio ambiente; o terceiro ponto é tornar o ambiente e os produtos mais compreensíveis e, finalmente, a idéia do desenho de sistemas, no sentido de pensar em produtos e ambientes como sistemas, que talvez tenham peças intercambiáveis ou a possibilidade de acrescentar características para as pessoas que têm necessidades especiais',,_

de uma família ou comunidade. Assim, por exemplo, a incorporação da cozinha dentro da residência urbana, que só ocorreu

no início deste

século, foi possível devido a mudanças ocorridas com o deslocamento da sociedade da área rural para a urbana, pois a cozinha , no nosso caso, era espaço reservado à senzala, ao trabalho escravo. Sob outro aspecto, a permanência da sala de jantar na mais modesta das casas, tomando, às vezes, uma parcela significativa de sua área construída, é herança de padrões de moradia das classes mais abastada s e atribui um valor

O projeto do habitat

maior à residência. Os lugares arquetípicos são relacio-

O projeto do habitat humano é es-

nados a impulsos tais como criar família,

sencialmente pensado sobre elementos

estabelecer relações ou trocas com ou-

conhecidos. Para efeito de classifica ção

tras pessoas. Enfim, para cada decisão

vou usar o termo "arquetípico" para de-

existe um ambiente físico apropriado que

signar as diversas atividades relaciona-

apóia o comportamento relacionado à

6) Segundo Mike Featherstone, a nomenclatura utilizada para identificar os processos distintos que marcam a vida de uma pessoa varia de disciplina para disciplina: ciclo da vida, curso da vida, desenvolvimento, estágios, etc. O autor recomenda a utilização do termo "cursos da vida", no plural, por não ter uma conotação de padrão nem de tempo limite para cada fase e respeitar a variedade de tipos de vida. Antropologia e Velhice - Textos Didáticos - pág. 46 e 58. 7) Edward Steinfeld - Anais do VI Seminário Ibero-Americano Sobre Acessibilidade Ao Meio Físico - pág. 87. 8) Esta relação é uma das possíveis. Vários autores utilizam uma classificação dos estágios da vida e o s associam com diferentes atividad es com o propósito de estabelecer parãmetros para a defin ição de espaços. Além da relação com as at ividades-tarefa, os ciclos são relacionados com as atividades diárias de cada pessoa, ccom o uso de diversas categorias de espaços públicos e institucionais, etc. 70


tarefa. Se estabelecermos, por exemplo,

1O. Redução na escala de alcance em

como etapas do curso da vida:1 ª infância,

casa, medo de exposição ao ataque.

2ª infância, adolescência, namoro e casa-

11. Necessidade de contato e apoio de

mento, reprodução e cuidado com os

companheiros.

filhos, meia idade, maturidade idosa e,

12. Possível retirada da competição com

como atividades-tarefa: 1. abrigo, 2.dor-

os jovens. Posturas defensivas e evasi-

mir, 3. relacionamento sexual, 4. cuidado

vas.

pessoal, 5. alimentação, 6. excreção, 7.

13. Papéis menos ativos nos antigos con-

armazenamento, 8. território, 9. recrea-

textos. Planejamento da aposentadoria.

ção, 1O. rota/itinerário, 11. encontros, 12.

Para cada uma destas treze ativida-

competição/ defesa entre espécies, 13.

des-tarefa, haveria um comportamento

trabalho, teríamos na relação entre a eta-

diferente em cada etapa da vida, eviden-

pa da maturidade idosa e as atividades-

ciando os diferentes movimentos pelos

tarefa, para os ítens:

quais pode passar uma pessoa, um casal

1. Manter a localização ou ajustar-se à

ou uma família numa mesma residência.

mudança imposta. Adaptar o entorno às

Há movimentos de expansão do habitat

necessidades.

e de inclusão na vida comunitária (da

2. Mais tempo na cama, menos sono,

adolescência à reprodução e cuidado com

possível confinamento, compressão do

os filhos), seguindo-se da "diáspora" dos

mundo à área da cama.

membros (meia-idade) e, finalmente, um

3. Ajuste da sexualidade à mudança na

refluxo e reclusão (maturidade idosa).

libido. Possível doença ou perda do com-

Entretanto, estes movimentos

panheiro.

ocorrem simultaneamente por membros

4. Possível incapacidade de cuidar de si

diferentes dentro da comunidade, o que

próprio.

nos faz refletir sobre o quanto nosso

5. Arranjo de dieta especial, redução do

mundo, nossas relações, nossas habita-

gosto e do espectro de cheiros.

ções, produções, benefícios, equipamen-

6. Possível necessidade de ajuda de equi-

tos estão voltados apenas para alguns

pamentos. A mobilidade diminuída pode

destes períodos da vida. Esta é uma ques-

reduzir confiança funcional.

tão que os arquitetos e, principalmente,

7. Possivelmente requer assistência em

o ensino de arquitetura e urbanismo não

arranjar e preparar comida.

podem ignorar9 (Fig.5).

8. Observação passiva de atividades ar-

Um exemplo flagrante deste pro-

quetípicas feitas por outros

cesso é a maneira como se constituem os

9. Novas atividades de lazer para adap-

edifícios residenciais e diversos condo-

tar-se às capacidades mudadas.

mínios nas grandes cidades. Frequente-

ATERCEIRA IDADE

71


cm

Corrimão Detalhe

Corrimão Elevação

Fig. 5 - Dimensões, desenho e posicionamento adequados dos corrimãos (Baseado em Housing the Aging)

mente não levam em conta os diferentes

ferentes de inserção desta população na

tempos que podem ocorrer no cotidiano

comunidade e não soluções isoladas, dis-

de um mesmo espaço. Os vel hos e as

tantes dos centros de serviços.

donas de casa em seu tempo cíclico,

Este conceito já estava delineado

movidos pelas tarefas domésticas, per-

na Europa, Canadá e EUA desde meados

manecem mais tempo em casa ou no

dos anos 50. Jane Jacobs, conhecida jor-

bairro, no domínio privado portanto, do

nalista americana escreveu um artigo na

que as pessoas que trabalham fora. Essa

revista Architectural Forum, em agosto

é a realidade, por exemplo, das áreas

del 958 com o seguinte título: "Housing

predominantemente residenciais, de

for the lndependent Aged", iniciando

imensas regiões de bairros periféricos

com a frase em destaque: 'The elderly

em São Paulo.

need housing in the normal community far

A preocupação com a adequação

more than peace, quiet, and a beautiful

futura do habitat, de forma que neste se

view" (Trad.: Os idosos precisam de habita-

possa incluir a população idosa, deve in-

ção na comunidade normal muito mais do

cidir sobre como empreender formas di-

que paz, silêncio, e uma linda vista.)

9) No VI SIAMF, foi apresentado o painel: "Formação Universitária: A Arquitetura do Futuro" onde vários expositores de diferentes países, entre universidades brasileiras, espanholas, argentinas e uruguaias, apresentaram o conteúdo de seus cursos voltados para a questão do "desenho universal". Na FAUPUCCAMP, particularmente, não há uma disciplina voltada especificamente para esta questão, mas uma parte dos alunos do último ano da graduação, em seu Trabalho de Graduação Final têm trabalhado este tema por alguns anos consecutivos. 72


A Implantação de unidades

tações no projeto. Tal inserção permite

para idosos e os programas.

que se reciclem imóvei s já existentes, localizados em meio a casas ou edifícios

Como já disse, existem muitas pos-

construídos para famílias-padrão para

sibilidades de inserção de unidades para

que se possa implantar um sistema de

idosos, em diferentes contextos que po-

locação para idosos com menor renda.

dem gerar diferentes programas. Infe-

Deve-se ter em conta ainda, o grau de

lizmente, no Brasil, temos poucas expe-

autonomia física e psíquica destes usuá-

riências neste sentido 10 •

rios.

A seguir descrevo duas alternati-

vas com o intuito de demonstrar as dife-

2. Unidades inseridas num empreendi-

rentes questões de proj eto que envol-

mento habitacional (conjunto):

vem cada uma destas decisões de implantação:

Essa modalidade de implantação, no caso de se adotar a tipologia do edifício em altura, exige uma previsão de

1. Unidades inseridas num contexto

áreas para serviços e áreas de convívio

pré-existente:

coletivos muito maiores e a proximidade

Este tipo dei m pia ntação tem ava n-

destas, preferencialmente, das unidades

tagem de in serir o idoso num ambiente

desti nada s a idosos ou in capacitados. Os

que pode se conhecido previamente e,

andares térreos devem ser preferencial-

às vezes, ter a proximidade dos fam ilia-

mente destinados a estas áreas, bem

res. Isto cria uma diversidade maior de

como às unidades habitacionais para ido-

contextos de relacionamento, principal-

sos, principalmente no caso de edifícios

mente se estas pessoas já desenvolve-

sem elevador. Devem ser previstos, se

ram algum tipo de apoio local.

possível, acessos em nível às habitações

Deve-se ter em conta, principal-

ou à área de elevadores.

mente no caso de residências isoladas no

A área de comércio e serviços que

lote, o tipo de casa que o idoso habitava

servirá o conjunto, seja ela um centro

anteriormente para se proceder às adap-

existente ou a ser implantado, deve con-

1O) Refiro-me, particularmente, a in iciativas de caráter social mais abrangentes. Poderia citar aqui algumas experiências, apenas como referência, ressalvando que não tenho um levantamento de dados neste sentido: a experiência na Cidade de Santos, com a "República do Bem Viver", projeto da Secretaria de Ação Comunitária, iniciada em 1993; o trabalho realizado pela Congregação Maria Imaculada, em Piracicaba, entidade que desenvolve um trabalho no "Lar dos Velhinhos", também conhecido co mo a "1 ª Cidade ·Geriátrica do Brasil" e que mantém uma área localizada no centro da cidade com diferentes tipologias de habitação e atende a diferentes estratos sociais e, a iniciativa da Cohab Paraná que, na definição de alguns conjuntos, incluiu unidades para idosos dependentes e independentes. A íERCEIRAIDADE

73


ter serviços de assistência e atendimento

de viver em ambiente homogêneo e a

de emergência. Neste caso, é preciso ter

concentração de idosos pode encorajar o

em conta que a comunidade também

isolamento. Neste sentido, segue-se abai-

está se formando e o idoso, como todos

xo, algumas condicionantes que devem

os outros moradores, pode levar algum

nortear escolhas, procedimentos e deci-

tempo para se relacionar com a vizinhan-

sões.

ça de forma que não tenha constrangimento para pedir ajuda. A Tipologia Habitacional

Os Elementos Urbanísticos Em termos de vizinhança, a proximidade dos serviços é um fator de quali-

A escolha do ti pode habitação tam-

dade de vida e segurança pois podemos

bém depende de vários fatores e, princi-

ter tanto idosos incapacitados quanto

palmente, do grau de dependência do

independentes, idosos vivendo com suas

idoso. Pode-se construir unidades espe-

famílias ou completamente sozinhos. A

cíficas em edifícios, como já dissemos,

proximidade de ambientes conhecidos é

casas térrea s isoladas, agrupadas em

importante pois o idoso depende muitas

áreas especiais e em pequenas vilas,

vezes da vizinhança e pode ter criado

compondo com outras vilas destinadas a

relações estáveis com esta, permitindo

famílias nucleares.

que haja um relacionamento social.

Entretanto, deve-se ter cuidado na

Entretanto, também é importante

transferência de um idoso para uma uni-

a proximidade de locais para atendimen-

dade autônoma. É importante que o ido-

to de emergência e sistemas de emer-

so passe por uma experiência de habitar

gência pois, como j á disse, dependendo

um espaço com caráter intermediário,

da relação com a vizinhança, os incapaci-

ou seja, se a pessoa sempre viveu com a

tados podem ter resistência a procurar

família e tinha assistência tot al, passe a

ajuda. Os equipamentos de alarme indi-

morar num local onde, embora sozinho,

viduais podem facilitar o controle mas,

continue tendo esta assistência.

por outro lado, podem levar as outras

No caso de se optar por moradias

pessoas a se preocuparem menos em

coletivas, unidades compartilhadas por

fazer visitas frequentes aos idosos, o que

duas ou mais pessoas, etc, deve-se ter em

pode agravar o quadro de isolamento.

conta que, pessoas idosas vivendo na

Na escolha de áreas para inserção

mesma residência podem ter necessida-

de algum programa de moradia para ido-

des diferentes dependendo de sua auto-

sos deve-se tentar encontrarterrenos dis-

nomia. A maioria das pessoas não gosta

poníveis adjacentes a áreas residenciais

74


existentes. Não é recomendável a locali-

deficiente, uma pessoa com cadeira de

zação de moradias em zonas de comér-

rodas ou com muletas, pois este veículo

cio intenso, normalmente congestiona-

provavelmente por suas dimensões mais

das e com níveis de ruídos indesejáveis,

adequadas facilitaria a utilização pelo ido-

ou zonas industriais, geralmente áridas e

so.

segregantes.

A distância máxima de qualquer 2

A densidade (habitantes/m ) deve-

área de lazer do local de moradia deve ser

rá ser definida em função da vivência e

de 700m e o percurso até esta deve ter o

das diferentes tipologias de habitação.

passeio tratado, conforme veremos mais

Entretanto, há vários estudos cujos resul-

adiante. Deve-se ter em conta a possibi-

tados se aproximam de um dado limite:

lidade de implantar uma variedade de

num raio de 800m não deveria haver

equipamentos em espaços públicos de

mais de 300 unidades.

forma a permitir a convivência entre o

Além do transporte público, deve-

lazer ativo (crianças) e passivo (idosos).

se pensar em serviços alternativos ou

Pelas características de nosso clima é im-

exclusivos, dependendo do tipo de pro-

prescindível que seja garantida a presen-

posta de desenho urbano, de forma que

ça de áreas cobertas para proteção de sol

o idoso incapacitado, que tenha alguma

e de chuvas. (Fig.6):

autonomia possa efetuar seus desloca-

Para que os passeios tenham um

mentos sozinho para compras, ir ao mé-

mínimo de segurança é necessário que

dico ou fazer visitas. O ideal seria que os

(Fig.7):

próprios coletivos existentes fossem

a. Haja aparelhos de controle de

adaptados para poder transportar um

t-Rua--t

t Cortei

Implantação

Fig. 6 - Barreiras. No corte 1 o acesso ao edifício é dificultado pela distância e desnível em relação à rua principal. No corte 2 o edifício está implantado no mesmo nível das ruas principais ATERCEIRA IDADE

75


cruzamentos, sem os quais não adianta-

não seja inferior a 1o/o pois, em inclinações

ria ter a proximidade dos serviços;

menores, as águas pluviais ou de lavagem

b. A travessia de ruas esteja bem

podem ficar empoçadas e nem superiores

delineada, seja por faixas ou pisos dife-

a 5%, porque podem provocar dificulda-

renciados;

des de equilíbrio para caminhar.

e. Os ralos e tampões de inspeção

É importante considerar ainda, no

de serviços de infraestrutura,quando pos-

planejamento de uma área, no desenho

sível, não sejam localizados de forma que

dos espaços públicos ou vias de fluxos

atravessem a circulação;

mais frequentes, a soma das inclinações

d. A inclinação lateral do passeio

a serem percorridas (Fig.8).

Calçadas niveladas e com juntas perfeitamente vedadas. Inclinação mín. de 1% """""' Cruzamento pintado '---- ou com mudança de material Rampa revestida com material antiderrapante Fig. 7 - Tratamento dos passeios e travessias (Baseado em Housing for Elderly: The Development and Design Process)

Centro de serviços

E

4% 30m

10% 30m

2% 60m

120m

Fig. 8 - Corte 3 - Exemplo de inclinações acumuladas (Baseado em Housing for Elderly: The Development and Design Process) 76


É necessário que se pense a ilu-

As unidades/ dimensionamentos

minação em várias escalas, desde a do pedestre, a de sinalização de acessos,

Ao pensarmos no dimensionamen-

até as das vias, devendo-se cuidar de

to de espaços das unidades residenciais

suas posições e qualidades para evitar

para idosos não necessitamos qualquer

ofuscamentos. Deve haver sinalização

tipo de dado especializado. As dimen-

e comunicação de localização dos prin-

sões convencionadas para o número de

cipais equipamentos nas proximida-

pessoas que habitam uma unidade po-

des da residência.

dem nos servir de referência.

E, finalmente, três fatores bási-

Entretanto, a organização das di-

cos para garantir a segurança no dia a

versas áreas de uso devem ser repensa-

dia, todos já detalhados anteriormen-

das pois, no caso de pensarmos uma uni-

te, reforçam a idéia de que são as pró-

dade compartilhada, devemos ter em

prias condições de implantação que

mente que, não se tratam de pessoas de

devem ser cuidadas para atingir este

uma mesma família e, portanto, deve-se

objetivo:

permitir a privacidade em seus dormitó-

1. Iluminação adequada

rios e a possibilidade de áreas de conví-

2. Possibilidade de socorro imediato

vio que permitam atividades diferentes,

3. Vizinhança mais ou menos próxima

não necessariamente compartilhadas.

ATERCEIRA IDADE

77


264,5 cm

76cm\

G (g

J -. . (

Sabonetes .._,,, \

/

Barras

1

j\_' ººº Piso plano

Vista

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~J '. Planta

Previsão de espaço de manobra para cadeira de rodas

Fig. 9 - Localização de equipamentos no banheiro, pensado para o idoso incapacitado (Baseado em Housing the Aging)

Nos estudos realizados em vários

banheiros e cozinhas (torneiras, regis-

países, principalmente na Inglaterra e nos

tros, interruptores, armários, etc), bem

Estados Unidos, podemos constatar o

como a análise da própria rotina diária,

aprofundamento e a atenção dada a al-

observando-se o tempo de permanência

gumas questões que podem se tornar

distinto em cada compartimento (o dor-

específicas deste tipo de habitação, tais

mitório é a área de maior permanência),

como: a análise da eficiência do mobiliá-

quando comparado ao ritmo e à rotina

rio, a racionalidade da circulação, a loca-

de uma família-padrão (Fig.9).

lização de equipamentos e a manipula-

Apenas para que se possa ter um

ção dos mesmos, principalmente nos

parâmetro, estes estudos apontam para as seguintes dimensões (com pequenas variações entre eles) 11 : Unidade para uma pessoa: 45 m' Unidade com dois quartos e uma cozinha: de 76 a 84 m' Unidade com três quartos e uma cozinha: de 80 a 96 m'. A incorporação de equipamentos que diminuam o esforço de manipulação e realização de operações, principalmente junto às áreas de serviço, tais como

Fig. 10 - Distribuição e dimensões dos equipamentos (Baseado em Designing for the Disable, RIBA) 78

barras para apoiar movimentos, corrimãos ao longo de corredores, rodas sob


partes interiores dos armários para facili-

É frequente a atitude de desconsi-

tar a manipulação dos objetos armaze-

derar a opinião dos idosos quando reali-

nados, pisos antiderrapantes, são algu-

zam-se programas voltados para estes e

mas das propostas apresentadas nestes

substitui-la por definições e determina-

estudos que reforçam a tese de que, com

ções dos vários especialistas envolvidos,

muito poucas alterações seria possível

inclusive dos arquitetos. Esta atitude

pensar uma habitação que favoreça tam-

tende a criar padrões de uso e consumo

bém um idoso e ainda, acrescente con-

e é pouco atenciosa com os diferentes

forto para os demais membros de uma

cursos da vida existentes num grupo for-

família (Fig.1O).

mado por diferentes estratos sociais e

Finalizando, gostaria de reafirmar que grande parte do estigma que pesa

que têm, portanto, distintas condições de acesso à cidadania.

sobre este estágio da vida e dos precon-

Em outras palavras: "A noção que

ceitos que levam as pessoas a subestima-

temos de velhice decorre mais da luta de

rem os idosos vem do fato de não termos

classes que do conflito de gerações. Épreci-

o hábito, a oportunidade ou ainda, espa-

so mudar a vida, recriar tudo, refazer as

ços adequados para nos relacionarmos

relações humanas doentes para que os

com estes de forma mais plena e regular,

velhos trabalhadores não sejam uma es-

exceto com os nossos próprios familiares.

pécie estrangeira. Para que nenhuma for-

Os profissionais que trabalham em

ma de humanidade seja excluída da Hu-

boas condições com idosos são unâni-

manidade é que as minorias têm lutado,

mes em apontar o equívoco em consi-

que os grupos discriminados têm reagido.

derá-los incapacitados e/ou em infantili-

A mulher, o negro, combatem pelos seus

zar a forma de tratá-los.

direitos, mas o velho não tem armas. Nós é que temos de lutar por ele." 12

11) Na Bibliografia apresentada neste artigo quase todos os guias para arquitetos definem estas dimensões. 12) Bosi, Ecléa - Lembrança de Velhos - Memória e Sociedade - T.A. Queiroz, Editor - São Paulo, 1983, pág.39. ATERCEIRA IDADE

79



CONSELHO REGIONAL DO SESC DE SÃO PAULO 1999-2002 Presidente Abrarn Szujn,..,n Diretor do Departamento Regional Danl lo Santos d,, Miranda.

Efetivos: Antonio f una ri Filho. C1cero Bueno Br.3ndáo Jünior, Dante Ancona MonLc1gnana, Eduardo Vdmpré do Nasci· mcnto.

!:ladio

Arroyo

Martins,

Ivo

Ddll'Acqud Júnior, José MMi,1 de Faria, Luciano Figliolia. Munuel Henrique Farias Ramos,

Or lanc.Jo

Rodr igue,.,

Paulo

Fernandes Lucânia, Pedro Labate. Hobcrto Bacll, Walacc Ganoux Sampaio, V;,lc.lir Moysés Simáo. Suplentes: Amadeu Castanheira, A, naldo José Pier.:ilini, Fcr nando Soranz. Henrique Paulo Marque:,i11, l:,r;,el Gulnsburg. J,1ir

SESC SAO

PAULO

1,,s1ltulçllo d~ caràwr prlvatJo, ,em fio, lucr.,r ivo, ,• dt~ :.unlJlto n,1cinn,1I Cri,"tcJo l:.'ITI 19·16 por h)il:Ídliva

do emp11::sa,i.:,do do comôrcio qlle o mantém e t1c1mlni~tr,,,,. o SESC tem por flnalill,1c.fc p10111ov+...~r o

TolecJo. João Herrera M;:irtins,Jorge S.Jt han

bt~1n-~~'"' 10ci,1I, o de.-.envolvinit"nto cultur,,J e

Salomão, José Mar la Saes Rosa. Jose

melhoria da qu.illd;idc de v ,cla do, trabalh,1<.10,c, do con,crcía e.ared ,le3il"f v cço~.<-i e ~,.,c:1 .. fa1n1ll.t1~ e ti,, coml111ícti,de en, gP.ral

Sann no de Liril Filho. Mariza Medeiros Scaranci, Mauro Zukerrnan, Rafik HL1s~eit1 Saab, Robert.o M.<trio Pero5a Jünio,, Valdir

Ap.:irccldo dos Sa,11os. Representantes do Conselho Regional Junto ao Conselho Nacional. Efetivos: Abram Szcijman, Euclides Ca,li. Raul Coc:ito.

ü

[m S.'lo Paulo. o SLSC conta ~om um,, r.•rle de 27 un,d,1dcs e 2 pólos avançado~. dli1rlbu1c10, na Capit ..,1 ,-, interior cio ES>1dclo. Pl1den1 n1,e1t ric1,lt1r -~e ,,o SFSC 1-·11lp1 .-~gn<Jo, ern

empresJscomerc1c11s reconhec1di1-. Jlelil l'rt_~v,dl'r,ctJ Social. como loju!.. l.Jares;, 1esta\ua,1te!-, l1utt..•i~. eo.;colct!>f-! far.::,.tllfa'Ull:"\fl'\1ti( l,l,,rt•\, t•rTit'\~lfll"I (ip ,.·u fio t.• telev1s1.10. 1or1\,11s. posto~ de g\"l~ol1n,'1, ~lJJ>errnercados, esctitúriu~ lit.~ p1e'!l.1c.1ç.10 (it..• Sl.-f'ViÇO"i., t:•11t f(!

Olltro,.

Suplentes: Aida Minchlllo. Manoel José Vieiril de Moraes, Ul:Jir.:ijara Celso do Amaral

A ll'lrttrÍCUl,1 t~ f>rioriZ...lCJcl .1()\ CCJllll-.r'Ci,tdO'i. ll'\il'!I. O

Guirtl.:trdt:?s.

SESC .>br.J t~spt1<;0 p.,,a ,nc_..cri<;:<.)es d~ u~tJ ..lrJos



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