Revista E | junho/2021

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LONGE DO MEDO Carlos Ernesto Duran Llanos (Peru)

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ou refugiado no Brasil faz 29 anos. Eu nasci em Pomabamba, no Vale de Pomabamba, nos Andes Peruanos. Quando eu tinha 12 anos, eu e minha família fazíamos viagens a Yungay. Naquela época não tinha estradas asfaltadas e nós tínhamos que viajar a cavalo. Quando chegávamos ao Parque Huascarán, patrimônio mundial pela Unesco, nós passávamos a noite à beira do lago Llanganuco, de água azul turquesa, rodeado com montanhas de neve permanente e uma lua cheia. Quando eu cheguei no Brasil, tivemos que chegar à zona da Estação da Luz e da Cracolândia e, para mim, aquele lugar era um paraíso, porque na minha terra, quando apareceram, os terroristas [Sendero Luminoso, grupo de guerrilha criado na década de 1960, responsável pela morte de milhares de pessoas] provocaram medo de morte. E eu fui testemunha da morte de um inocente na minha frente, que foi morto por não participar da luta armada. Olha, éramos muitas pessoas com a claridade da lua cheia, mataram uma pessoa e eu não fiz nada. Por quê? Por medo. Porque eles colocavam todos os mortos na estrada para que as pessoas vissem, colocados como carcaças de animais para que as pessoas tivessem medo. Eu vivi isso. Me obrigaram a colocar nesse morto inocente um cartaz cujo título era: ‘Assim morrem os dedos-duros’. É a mesma coisa do domínio com o medo. Então, tivemos que fugir, eu e minha família, para o Brasil. Obrigado, Brasil, pela oportunidade de conhecer esse país maravilhoso, reconstruir minha vida e a vida das minhas filhas, que hoje já são profissionais.”

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