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PT - Maio/Junho 2009

SHAREMAG LARGE SPACES JOÃO LEAL

FOTOGRAFIA ESTENOPEICA OLÍVIA DA SILVA RUI PINHEIRO ELISA PINHÃO FERREIRA JOÃO LEAL JOSÉ CARLOS MARQUES VIMUS 8 E MEIO MAFALDA MARTINS MESTRADO RESPIGADORES LAB.65 NUVEM VOADORA INES GUEDES MANHÃ MANHÃ JOANA BELEZA MARIANA MARQUES THE PORTUGALS CATARINA SOUSA VARAZIM TEATRO PORTO RUBY RICARDO CAMPOS


#01 SHAREMAG

E-mail: jcgmarques@gmail.com Internet: http://www.sharemag.blogspot.com Responsável: José Carlos Marques - www.josecarlosmarques.com Design e Paginação: José Carlos Marques


Manifesto de Simpatia pixel killed all the other stars Por José Carlos Marques

A realidade é apenas uma, e devemos conciliarnos: o “Pixel” chegou para dominar, e por muito esforço que qualquer um desprenda, nenhum indivíduo pode evoluir sem se render, ou inteligentemente aliar, à existência do mesmo. Habitámos na Era Digital. Vivemos numa

platafor ma de números aritméticas que em vez de hábitos antigos, desenvolvem caminhos mais simples que hábitos dos antigos.

e combinações se renderem aos interfaces e criam tentam alterar os

Na realidade, esses hábitos, as distâncias e a forma que usamos para transmitir, foram simplificados. O ser-humano não luta contra o Pixel, porque o Pixel sabe economizar. E numa altura em que a crise estravasa o campo financeiro para o dos valores morais, o dos caminhos a seguir ou o da informação a seleccionar, qualquer contribuição do que parece vir ajudar, é uma mais valia que deve ser tida em conta. Precisamos mais do “Pixel” do que ele de nós, e dessa necessidade (fabricada) nascem presentemente, de uma forma cada vez mais ligeira, novas ideias que nos per mitem comunicar, mas também imaginar e desenvolver.

É pois desta forma que surge esta nova publicação. Fazendo justiça à relação que se estabeleceu entre o Homem e o “Pixel”, na Forma que assume, e tentando de alguma maneira transmitir essa relação no seu Conteúdo, pela ligação que o mesmo deve ter com mundo moderno, a SHAREMAG recolhese em ninho no Universo Digital e assume o papel de propagar, tornar público ou espalhar aquilo que o “artista” desenvolve, aquilo que motiva o “artista” e as ferramentas que o mesmo utiliza para trabalhar. No fundo, com a SHAREMAG pretende-se criar uma plataforma que acompanhe o mundo (digital) moderno, onde os intervinientes tenham Espaço e Autonomia para mostrarem o trabalho que desembrulham do seu imaginário real. Um espaço que embora finito, seja aberto a todos os que virem despertado o interesse; embora finito, consiga libertarse do limite de tempo; embora finito, saiba alimentar-se daquilo que é efémero, e procure no que é efémero a matéria que o permitirá tornar-se infinito. Com os melhores cumprimentos.

ÍNDICE: Fotografia Estenopeica

pag. 04

Lab.65

pag. 34

Olívia da Silva

pag.06

Nuvem Voadora

pag. 42

O campo das Artes Visuais, que desde sempre se soube posicionar na vanguarda daquilo que é supostamente moderno, foi dos primeiros a perceber a dimensão do “Pixel”, e foram desde muito cedo os “artistas” aqueles que souberam dar utilidade às ferramentas digitais que lhes iam sendo apresentadas.

Rui Pinheiro

pag. 10

Cinema

pag. 44

”Foi Agora”

pag.14

Música

pag. 46

João Leal

pag. 16

Literatura

pag. 48

José Carlos Marques

pag. 20

”Uma Leitura de...

pag. 50

VIMUS

pag. 24

The Portugals

pag. 54

Por outro lado, ao “artista” cabe compreender, interpretar e materializar o tempo em que vive, e nesse seguimento faz todo o sentido que o “artista” de hoje não só utilize o “Pixel”, mas também recorra à teoria que o justifica para sustentar a sua obra.

8 e meio

pag. 28

”Couchsurfing”

pag. 56

“Mulher de Emergência”

pag. 30

Varazim Teatro

pag. 58

Mestrado

pag. 31

Porto Ruby

pag. 60

Respigadores

pag. 32

”Grita”

pag. 61


SHAREMAG

Fotografia Estenopeica a propósito do dia mundial Por António Campos Leal

O dominio exercido pelo mercado da fotografia digital acaba reduzindo o interesse de quantos dedicando o seu tempo e interesse à Fotografia, temos que reconhecer, estarem mal preparados para desenvolverem produção interessante nas diversas àreas deste suporte. Os processos ditos

CÉSAR CORDEIRO - Fotografia Estenopeica. AUGUSTO LEMOS - Workshop Pinhole IMAGERIE/CASA DE IMAGENS - Photography seen through a pinhole; - Spontaneous Exhibition of Pinhole Pictures and Camera.

alternativos nunca foram estimulados pelos mais ligados ao ensino das diversas especialidades e no que à Fotografia Estenopeica uns quantos apaixonados tendem a ser a voz que se quer fazer ouvir no ensurdecedor meio fotográfico. De António Gonçalves a César Cordeiro várias foram as iniciativas ligadas à Fotografia Estenopeica antecedendo o seu Dia Mundial, que acontece sempre no último Domingo de Abril. Um pouco por todo o lado, podemos encontrar várias referências registadas nos eventos que a rede nos propõe:

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ANTÓNIO CAMPOS LEAL - A Magia Da Luz; - Jornadas Estenopeica; - Dia Mundial da Fotografia Pinhole; - A Magia Da Luz. JORGE PEREIRA E RUI CAMBRIA - Large Size Pinhole Photography.

Em localidades que vão de Braga a Lagos passando pelas Caldas da Rainha, Vale de Figueira (Santarém) e Lisboa, acreditando mesmo que algumas outras localidades façam parte deste grupo mas que uma divulgação deficiente obstou ao conhecimento da actividade desenvolvida. Esta actividade que vem sendo desenvolvida já desde alguns anos atrás pelo clube "Buraco de Agulha" no seio da comunidade ligada ao Instituto Português de Fotografia, como actividade extra-curricular e em iniciativa dinamizada por António Campos Leal. Formador no IPF tem estimulado e desafiado os interessados para uma prática mais intensa sendo ele mesmo produtor apaixonado deste tipo de processo alternativo. Processo em antítese ao processo digital, pela sua real aproximação aos velhos processos fotográficos, é pela utilização de suportes; papel fotográfico e película uma porta perfeita para que os que desconhecendo o "Processo Fotográfico" anseiam conhecer uma técnica que tem por base a razão elementar da formação da imagem. Define-se como câmara estenopeica, aquela que não possuindo nenhum elemento óptico, permite que se forme uma imagem num plano colocado no trajecto interceptado por um orifício (estenopo), que substitui dessa forma o sistema óptico a que estamos habituados e que correntemente designamos de objectivas. Pensarse que a objectiva é essencial para a formação da imagem é um erro. Pela técnica da Fotografia estenopeica é possível realizar imagens que correspondem a um regresso aos inícios da fotografia e em que o espírito criativo será propiciador de resultados deveras interessantes Dessa forma torna-se possível um melhor entendimento do processo, pois se a construção da própria câmara é trajecto de aprendizagem, cabe pois aos praticantes percorrer diferentes caminhos na concretização de projectos diversos, onde o próprio sistema digital pode ser incluído. Não deixa contudo de ser desafiador construir, a partir de caixas comuns de utilização variada, latas de bolachas, de chocolates, de tabacos, de... de... de... de qualquer coisa e pela aplicação de uma folha de alumínio sobre a qual se faz um furo de agulha a que a coloração preta transformará em utilizavel "camara obscura" e em que posteriormente e pela colocação de papel


fotográfico, o do tempo da alquímia, permitirá obter imagens de valor único. Muitos séculos passaram sobre as diversas descobertas ligadas ao movimento da luz e da formação da imagem. Do século V a.C. chegaram-nos os primeiros escritos que referem o estenopo e o seus princípios básicos. Dos chineses se pode referir a sua descoberta de que a luz se propaga em linha recta. O filósofo chinês Mo Ti é mesmo o primeiro a constatar que a luz reflectida de um objecto forma uma imagem invertida sobre um plano ao atravessar um orifício. Contudo, a civilização ocidental através de Aristóteles, séc. IV a.C., na obra "Problemas", livro XV, 6, questiona do seguinte modo: " Porquê quando a luz atravessa um orifício quadrado, como por exemplo através de um trabalho de cestaria, não forma imagens quadradas?". Aristóteles levantou mais algumas questões sobre diversos fenómenos da Luz que permaneceriam mais algum tempo sem resposta. Será já no sec. X d.C. que o médico e matemático árabe Ibn Al-Haitam (Albazen), através de experimentações, verificou a formação de imagens, e a linearidade do trajecto da luz. Alguns projectos de autor reflectem o valor da representação estética que à Fotografia E s t e n o p e i c a d eve s e r at r í bu i d o. E , o entendimento de alguns na busca de uma definição tão próxima quanto possível da imagem produzida com o melhor dos sistemas ópticos, não me parece ser o mais importante da Fotografia Estenopeica. Caracteristicamente a imagem resultante da utilização de uma Câmara Estenopeica é o seu aspecto pontilhista e a

existência de uma profundidade de campo que se pode entender como total. A prática da Fotografia Estenopeica como área de acção pedagógica é só por si razão importante para uma divulgação intensa pois associado ao processo outras áreas podem ser parceiras de estímulos vários resultando numa aprendizagem enriquecida com componentes muitas vezes entediosas para os jovens. António Campos Leal Lisboa, Maio de 2009 ESPAÇOS A VISITAR NA REDE: http://pinhole.no.sapo.pt http://pinholeiro.blogspot.com http://www.pinhole.com http://www.pinholeday.org/ Exemplo de Caixas Estenopeicas (na página anterior) Exemplo de Fotografia Estenopeica (em cima)

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PORTFÓLIO OLÍVIA DA SILVA

PRESENTE NA CERIMÓNIA


Maio/Junho 2009 As imagens da série “Presente na Cerimónia” fazem parte do projecto “In&Out” e pertencem à colecção do Hospital de São João - Porto.

“Existe uma diferença evidente entre o retrato dos trabalhadores do hospital e o retrato pintado, sob pano de fundo, do monarca Português, João VI. As pinturas da realeza transmitem a ideia de algo etéreo e apesar da pompa e cerimónia, esta pintura, em particular, é desagradável e inábil. O pintor continua a mostrar-nos a presença física e carnal desagradável do rei. Contudo, ainda existe quem sinta um pouco de admiração pelo fotógrafo em relação ao pintor e à respectiva natureza da imagem da monarquia. Olívia Da Silva reivindica esta pintura para a fotografia. Olívia Da Silva ao dispôr as pessoas ante tal pintura, posiciona, de igual modo, a sua própria arte em relação a esta pintura histórica da realeza. Olívia Da Silva tem como objecto de trabalho a tradição humanista e a sua fotografia foca-se nas pessoas, é íntima e não distante. O retrato insurge-se como uma for ma de demonstrar respeito por todas as pessoas que trabalham no hospital desde as empregadas de limpeza, às cozinheiras e aos médicos. Através da sua fotografia as pessoas possuem uma presença e vivacidade que supera e desafia a figura partiarcal que está por trás delas. As pessoas estão antes da pintura em mais do que um sentido.” Mark Durden, Professor of Photography & European Centre for Photographic Research (eCRP) Newport University



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PORTFÓLIO RUI PINHEIRO

O CERCO


_A cidade – insistes em perguntar. _Vimos cá trabalhar todos os dias – responder-te-ão uns, e outros: _ Voltamos cá para dormir. _ Deve ser para ali – dizem, e uns erguem o braço obliquamente na direcção de uma incrustação de poliedros opacos, enquanto outros indicam para trás das tuas costas o espectro de outras cúspides. In Italo Calvino, “As Cidades Invisíveis” Fosse o nosso outro tempo, mais distante e remoto, coincidente com a origem de civilizações como a Grega ou Romana e a nossa percepção da urbe seria significativamente diferente daquela que as cidades nossas contemporâneas nos transmitem. Nessa, quase infinita, distância cronológica que nos separa, a cidade actual impõe um extenso conjunto de problemáticas que a antiguidade desconheceu. Inicialmente limitadas, contíguas, compactas e monocêntricas e actualmente, extensas, complexas, heterogéneas e policêntricas, as cidades são geradoras de fenómenos tão complexos de ordem social e geográfica. como a denominada suburbanização. Viver no subúrbio é, em muitos casos portugueses, como morar no andar debaixo da casa dos pais, o que por si só acarreta coisas boas e outras menos boas, num misto de encapsulamento e dependência relativamente à cidade âncora. Noutros casos será como viver numa casa pequena com toda a família, numerosa, o grand ensemble. Quando os salpicos da periferia urbana vão mais longe e esta se torna ainda mais difusa, entrando em contacto directo com realidades onde a ruralidade se sobrepõe, o cerco adquire contornos mais evidentes e a osmose converte-se num processo extremamente selectivo e de resposta a necessidades próximas às primárias. Quem vive nessa representação social, estigmatizada pelo pré-conceito, a que damos o nome de subúrbio, confronta-se diariamente com uma distância sociológica das vivências da cidade mãe que o segregou e de quem se desprendeu sem lhe ter conhecido o cheiro ou o sabor do leite; Cresce, em muitos casos, da obsolescência das políticas de planeamento urbano apresentadas ao longo da segunda metade do século XX em resposta às necessidades de habitação que o Estado-Providência quis colmatar. Será o subúrbio um dormitório excluído pela cidade mãe ou um enclave deserdado à nascença? À semelhança de outros organismos vivos, a cidade também possui um ciclo de vida próprio. Os movimentos pendulares efectuados por aqueles que diariamente transitam entre as cidades satélite e a nuclear, em contraponto com os que de lá não chegaram a sair, pela ruptura que defrontam com o meio social, ideológico, escolar, étnico e o mercado de emprego, acontecem desde a fase da vida em que a cidade se estilhaçou. Enquanto a consciência de cidadania existe, as famílias são ignoradas discriminadamente, com numerosos núcleos familiares a partilharem espaços exíguos, subjugando-se, muitas vezes às diferenças. Estariam certamente confundidos os que misturaram igualdade de direitos e deveres com outras igualdades, que afinal eram

diferenças, e que integraram a lista dos que aguardaram durante anos pelo direito à habitação. Morar num estilhaço de cidade centrifugado e habitado por estranhas cúspides será certamente tão complexo como definir os dois lados do cerco que separa, pelo que urge, cada vez mais, a aplicação de um modelo de integração dos homens para que se tornem cidadãos. Raquel da Silva, 2009




SHAREMAG

Foi Agora ensaio sobre a primavera Por Elisa Pinhão Ferreira - Imagem de José Carlos Marques

e mesmo que a noite estivesse de uma quentura nada habitual ainda era dia quinze. Era necessário começar os preparativos, lembrou-se. Afinal, só faltavam seis noites. E ao pensar nisso reparou nas últimas camélias do ano que se exibiam em folhos esquálidos e débeis como que

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tentando escapar ao protocolo natural. O problema, afinal de contas, era precisamente esse: a mariquice determinista que as coisas teimam em seguir. Ou, por outro lado, mais irritante e ainda mais estúpido: a tendência irreverente que certos fenómenos têm para fugir do plano que a razão humana lhes traçou; seja por emoção ou por comparação, seja por limitação ou amplitude desenfreada, ou simplesmente por serem do contra, mas principalmente por ser mos, inevitável e fatalmente idealistas. Absolutamente extenuante ter de apreender estes discursos tão filosoficamente complexos. Por assim dizer, o planeamento racional a que nos sujeitamos, porque quase sempre falacioso, é um monstro de canseiras e frustrações. E dentro deste mesmo novelo de fibra densa, conseguimos vislumbrar, ao longe e indistintamente, o absurdo da sua essência, a ilusão e a inutilidade que o sustentam. O condicional que existe sempre, a par das interjeições de surpresa, as exclamações de espanto, horror ou histeria perante situações

"não programadas" ou "não imaginadas" ou, como gostamos de apelidar no nosso handicap de entes planejadores, "nada normais", são as provas mais clarividentes da asneirada. A 'ideia do normal' é o puto chato que reclama atenção continuamente e que nos obriga a uma responsabilidade idiota sobre uma "nor malidade" fantasmagórica. Não é assustador?! Cuidar de uma coisa inexistente e acredita-la é um privilégio do intelecto. Portanto, o "normal" é "normal" (só) ao homem. E, mesmo assim, cá estava ele a pensa-lo como patético. Mas pensava-o, o que, numa perspectiva subjectiva-idealista, é capaz de bastar. Permitiu-se gargalhar. Somos tão parvos às vezes, por força destas capacidades todas que conseguimos aglutinar no miolo. É indecente que com tantas palavras e maneiras de as conectar que fomos adquirindo, às vezes nos sintamos limitados em explicações ou transmissão detalhada de actividade cognitiva. Deus deve achar um insulto. Afinal, quando é que nos vamos chegar? As estrelas no céu pareciam purpurinas espalhadas distraidamente por uma ninfa cósmica. Fizera desenhos engraçados e em determinadas zonas parecia ter deixado tombar o frasco... E era aí, nesse nublado de brilho confuso, que se conseguia adivinhar o magnífico dia seguinte. Era nessa magnitude visual que se entendia o calor e a luz de um dia promissor. As probabilidades eram generosas ao lado de uma Primavera bonita e doirada. Uma delícia para qualquer apostador temeroso. E enquanto pensava nesta multiplicidade de palermices, esticou-se o máximo que podia, até as omoplatas quase se espalmarem na terra e a folga que ficava usualmente abaixo dos rins cessar de existir. A barriga é hoje um chibo fácil do whisky e a tosse seca dos marlboros. Não há pecados sem rasto, ainda assim. Um homem não pode deslizar sem ser apanhado na teia universal do grande julgamento. Mesmo sendo a pena ir risória como uma bela pança, ou a impossibilidade de jogar ténis sem cuspir meio pulmão. Ai, ai... Viv'ós suspiros! Viva a idade mal tratada! Viva a violência endócrina! Sou um fiel apologista da auto-destruição. Da minha autodestruição, atente-se bem à palavra. Não vou dizer às "pessoas normais" para se embebedarem em fumaradas. A mais, refreio-lhes a vontade de se armarem em pedagogas para com a minha triste pessoa. Se há coisinha que me faz comichão é a maneira como algumas pessoas se sentem à vontade para por as vírgulas, os pontos e os acentos, e muitas vezes usar o back space sem meias medidas, na vida de outrém. Ei!! Você sabe corrigir!! Fantástico!! Sabia que quase todos os árb itros a c tu ais tivera m m edíoc res performances como jogadores? Seja do que for... E se mudarmos de ângulo: já viu algum desportista habilidoso tornar-se um fiscal de regras? Pois claro que não! Já ganhou demasiado


graveto em anúncios televisivos. E a triangulação: e se vier refilar que a vida não é um jogo, eu respondo-lhe que concordo, ( e é o cruzamento:) mas também não é o domingo desportivo em que se aceitam opiniões e palpites de toda a gente. Aliás, debates acesos entre críticos, que na maior parte das vezes não tiveram qualquer participação naqueles jogos em concreto. E é golo!: Pior, sabe quem acaba por ser mais vaiado no término de cada partida? Pois é, a retórica pode ser muito irónica. Ufa, cansa argumentar consigo! Já estou estourado, mas, triunfante, ainda consigo levar a mão ao bolso e mostrar-lhe da beleza de um cartão amarelo. Merda, acabei de ser derrotado em plena compensação! Caramba, você é mesmo bom!! Não não, não se anime tanto, eu é que sou francamente mau. E era sempre assim. Imaginar o que diriam as pessoas, o que iria nas suas cabeças enxutas, o que comentavam de cada vez que partia, fosse de um lado ou do outro. Coisas. Diziam coisas, concerteza! Não é um comportamento muito comum desaparecer no dia 20 e reaparecer no dia 21, passar um meio ano numa metade do mundo e a outra meia parte na metade respectiva. E ninguém entendia. Na verdade, ninguém perguntava. Um poço tão grande de mazelas e cicatrizes não pode ser abanado abruptamente. Mais vale deixa-lo lá. Estagnado. Devia ter alguma coisa que ver com a morte da esposa. Coitadinha, festejava este ano 37 primaveras. Que parvoada tão grande!!! "Queria dedicar esta música à D. Elvira pelas suas 64 primaveras..." . Santíssimo! É a expressão mais hedionda do cosmos! Traduzir aniversários numa estação do ano! E se a pobre celebrar em Janeiro e em Fevereiro pagar ao barqueiro, hem?! Onde é que fica a Primavera no meio desse dramalhete? Afinal são 64 ou 63 primaveras?? Parece-me pertinente levantar a questão. Pertinente e pateta. Era tão linda. Linda mesmo. Um cabelo comprido e ondulado matizado pelo sol, uns olhos verdes e translúcidos como algumas algas que aparecem no mar, uns lábios esculpidos a cinzel, um moreno cigano incorrecto em raça e época, um porte altivo, esbelto e feminino. Todo o mundo me quis longe de ti. A terra conspirou contra nós. Às armas, às armas, vamos sair de Portugal! Não quero, dizias, é o meu país. És muito tradicionalista, tu. Queixavam-se que não era para estarmos juntos, que "não era normal". De que iríamos falar? Que é que possivelmente poderíamos ter para partilhar? Heróis do Mar, tacanho povo, sofredor, habituado... E ela começou a ceder, a menosprezar-se, a achar que era de menos, a achar que não tinha cultura

suficiente, que usava dum sotaque parolo e que não sabia conjugar o verbo estar e o fazer em modo! E não sabes. E sim, é tudo isso que me faz perder o nervo contigo, é tudo isso que me faz teimar no teu amor, no nosso amor, na nossa Primavera. Às armas, às armas, e quando as baionetas de aviso falharam, e as adagas passaram à tangente, marchei contra os canhões deles. Mesmo sentindo a voz dos teus avós, dos meus avós, do peso do esplendor de Portugal... Respeitei-te a vontade mais do que respeito o meu berço e o meu sangue. Queres ficar, achas que a tua super-birra vai dobrar a mentalidade de uma nação? E achavas. E depois sofremos. Os meus pais não foram ver-nos casar e eu chorei, tu choraste a seguir. A minha cidade não quis mais saber de mim e eu chorei, tu choraste a seguir. E eu nem percebia como é que depois de se olhar para ti se conseguia ser mau... E em casa vivíamos. Tu e os teus cavalos, eu e os meus livros "cheios de letras". Às vezes eu tentava os cavalos e tu ensinavas-me. Às vezes tu tentavas ler e eu babava ao teu lado. Mas tu tens razão, não temos que fugir. Hei-de amar-te em português, em português de Portugal. Passar as Primaveras todas a desejar-te nua ao Sol. Oh Pátria deixa-me só! Deixa-me passar o resto da vida a choramingar e a ganir. Deixas-me cão abandonado e esperas que te ame ainda? Sozinho. E entre a bruma da memória ela martiriza-me em socalcos. Ela vive ainda em mim, por muito Vergilista e pouco lúcido que isto deva soar. Se eu sempre fui o maluco, o irresponsável, o chanfrado de todo, agora posso pelo menos comportar-me como tal. Depois disto tudo, não acredito que consigam de mais originalidade em sinónimos. E a morte é um absurdo, e a vida só tem um sentido, e essa catrafada toda de questões existencialistas que nos provocam por serem inevitáveis; e as tuas aparições, e os meus degredos... Os meus degredos semestrais que ninguém compreende... A minha partida antes do equinócio de Março, o meu regresso depois do Verão. Os meus constantes Outonos e Invernos, em Portugal ou abaixo do Equador. Não pode haver Primavera sem ti, muito menos em Portugal. Portugal que te tratou tão mal. Portugal que tu amavas tanto em terra e em alma, e que depois te lixou. Eu até acho, do fundo da minha autoridade académica, que tu me morreste de desgosto prolongado. Não por mim, que eu bem sei o que vai contigo! Por tudo o resto que andava à volta e que nós juramos que não nos ia atingir. E fomos tão fortes! E agora, hem? Tenho de ser forte sozinho??! Não quero. Não vou. Vou chorar à chuva, remoer nas fotografias à lareira, usar uma manta velha como eu estou, queixar-me do casal de jovens vizinho que fala alto e ri-se a torto e a direito. Ter maravilhosos tête-atetes com o teu cavalo, que ainda é vivo e que eu estrago com mimos, jogar xadrez com o nosso caseiro ao cair da noite (quando estou aqui em Portugal). Era uma

pessoa simpática, o caseiro, nunca perguntava nada de muito profundo e ele era-lhe grato por isso. Mas toda a gente via como em cinco anos ele tinha envelhecido, como só em meia década toda a cabeleira se tornou cal, e as vértebras quebraram, e os olhos desceram e as mãos eram trémulas e inseguras. Que foleirice de folhetim. A menina do povo e o fidalgo morgado; quem já não está farto do enredo dicotómico? E lá fomos nós contra a muralha que se construiu descaradamente à nossa frente, (qual novela da globo), desarmados e crentes. Claro que demos logo com os cornos na parede! Mas sempre nos levantamos. Betão, granito, madeira...? Pfff !! Nós aceitamos qualquer coisa!! Daí que fomos ganhando força e confiança, fomos ficando resistentes, somos invictos! E, desgraçadamente,.... Começámos a planear! Planeámos tudo. Planeámos filhos, netos, jardins, quadros, um baloiço no alpendre, planeámos até a minha morte antes da tua, porque eu sou mais velho, e era "normal". E no meio das tuas palmadas e ralhos, havia o teu "livra-te!". Era mel... Eu acho que Deus sempre te prestou mais atenção e lá te fez a vontade. Porra, és mesmo autoritária! E planearam até vir a mulher da fava, planearam até ao céu... E acertamos na mouche, não foi? Percebe agora a tal treta do planeamento racional com base numa "normalidade" (ridícula) de que lhe falava há pouco? Era tudo uma questão de estatística e nós contornámos todas as probabilidades.( Mas quem as faz?! Quem as define?) Como o facto de ser dia 17, com 28º à sombra, arrisca toda a minha credibilidade como mártir do frio e do recolhimento. Talvez devesse sair mais cedo este ano, pensou... E ao fazer este rrw, esta analepse sistemática da sua desafortunada vida, sentiu uma calmia que já não experimentava há cinco anos certos. Sentiuse estranhamente bem. Velho, sim, acabado, cansado, mas bem. E no nano espaço temporal que leva um instante, o jardim pintou-se d'ouro. Fechei os olhos, cruzei os braços debaixo da minha cabeça pesada, senti o sol fazer desenhos pontuais no escuro das minhas pálpebras... Quando foi para os abrir outra vez, ela apareceulhe. Leve, solta e branca, a dançar no meio do Sol. Estavam juntos. É hoje mesmo! Foi agora. De novo Primavera.


PORTFÓLIO JOÃO LEAL

LARGE SPACES


Tudo aqui depende do que não é mostrado. O olhar, inevitavelmente, varre a fotografia e aceitamos que, na sua crueza de imagem fotográfica, tem a força da evidência. A imagem deriva entre as fronteiras da percepção, da figuração e do signo, mas não as omite e, por isso nos apela e nos anima. Mas tem também a sua sombra e a sombra é, ao que se sabe, o indizível, o que não sabemos traduzir nas metáforas de identificação. E o que aqui, nestas imagens de João Leal não se mostra e nos prolonga o olhar no infinito da ausência é o sentido oculto do que vemos. Olhamos esquinas, arestas agudas de um qualquer lugar interior, côncavas e convexas – o dentro e o fora do que contornamos, - irrompendo de um soalho identificável, numa sobriedade de efeitos premonitória. Interrompem-se no alçado

das paredes e ficamos apenas com a agressividade das linhas, o fio da navalha. Quando as olhamos, colocamo-nos estritamente no espelho do local do corte, simetricamente divididos, é essa a intenção do gume, da redução da forma. A forma é o que estas imagens nos repetem e nos impõem. Mostram o referente, mas não o nomeiam, porque sabemos, sentimos, que estão armadilhadas com a incompletude. Como uma estrita cortada a meio da página, há uma intencionalidade de dizer que está para lá do toque do olhar. Porque este modelo evoca a brecha do nosso quotidiano, na sobremodernidade do nosso tempo, onde seguimos de intervalo para intervalo, de um não lugar para outro não lugar, sofrendo o esvaziamento de consciência que nos vai oferecer a nova solidão ainda sem código. É com olhares

segundos e desviados que vemos e olhamos no magma da comunicação: esta temível consciência actual de sermos um olhar. O que nos diz esta sequência de esquinas indecisas no seu progresso, é que pode existir um mundo para lá do que reconhecemos à mera altura dos olhos. O que nos oferecem estas imagens é a reconversão do olhar em olhar primeiro, humanamente inquiridor e humanamente destinado a ensaios e erros. Nestes objectos parciais insinuam-se os critérios do visível que fazem recuperar o valor do espaço – o espaço que não está contaminado pela irrealidade do virtual. E, com isso, a liberdade de ser. Maria do Carmo Serén, Março de 2007


“Space One Down” e “Space One Up” (nas páginas anteriores) “Space Three Up” (ao lado)

“Space Three Down”


“Space Two Up”

“Space Two Down”


PORTFÓLIO JOSÉ CARLOS MARQUES

PATRIOTISMO


Patriotismo: s. m., amor à pátria; qualidade de patriota. Com o assumir das funções de treinador principal na Selecção Nacional, em 2003, Luiz Felipe Scolari trouxe para Portugal o culto largamente enraizado no seu país de origem (o Brasil) pela Bandeira e pela Pátria. Numa campanha que aspirava principalmente à união de todos os portugueses por uma selecção que era afinal a nossa, o técnico conseguiu dar início a um conjunto de operações de marketing pormenorizadamente estudadas, que tiveram o seu ponto mais alto na chamada que fez aos portugueses durante o Campeonato Europeu de 2004, motivando-os a materializarem o seu apreço pelo País com a utilização da imagem portuguesa em todos os bens que posuíam. A resposta não se fez esperar, e o símbolo nacional cobriu janelas e carros, espaços e pessoas. Fruto disto, ou talvez não, a verdade é que a Selecção Nacional conseguiu alcançar a final da competição, e no rescaldo daquilo que havia acontecido, não faltaram os que atribuiram o sucesso à união de um País que parecia ter despertado para adoptar o Patriotismo no futebol. Quatro anos mais tarde, e dois campeonatos depois, os resultados desportivos do conjunto que formavam a nossa equipa pareciam indiciar um novo êxito. E apesar de se apoiar numa equipa relativamente nova, que tinha acabado uma campanha com alguns “tropeções”, nada parecia desmotivar o povo português em relação aos resultados que podíamos contrair. Esta série de imagens acompanha um pouco daquilo que se viveu no nosso País nos dias que demarcaram os jogos da Selecção Portuguesa. M o s t r a m o a fi n c o p e l a Bandeira, e a devoção pela Pátria. A esperança de um povo apoiado na ideia que a manifestação física do apreço pela Selecção, podia transformar a estima no 12º jogador dentro de campo. Porém, aquilo para que muitos olham como um sinal de Patriotismo, converteu-se em 2008 num negócio para outros tantos. E na altura em que Portugal atravessava uma grave crise financeira, o povo revelou que o Futebol era também um lugar de entertenimento que os ajudava a encarar o dia-a-dia com um sorriso na face. Confundindo Futebol com Religião, comprando a Pátria em lojas chinesas, e vendendo a Bandeira em capas de cd's, os portugueses resumiram uma campanha patriótica de quatro anos a uma simples solução para saciar o contentamento.


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SHAREMAG

ViMus um festival único no mundo Por Hilário Amorim e Marco Santos - Imagens de José Carlos Marques

A MATÉRIA O vídeo musical como género criativo e de crescente importância no panorama audiovisual assume hoje um papel singular na cultura contemporânea. É uma forma de expressão que dá outra dimensão à música.

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Promove-a, mas amplia o seu espectro. Reforça o nosso fascínio pela música e tudo o que a rodeia. Liga-nos ao produto musical com uma alta carga de memorização, mas acima de tudo recebemolo com outro prazer. É também uma forma independente de visualização. As suas formas e métodos contêm arte e engenho. São fruto de forte elaboração e têm a capacidade de criar tendências. Leva-nos a perguntar, quem as terá criado?” Podemos dizer que terá sido esta última pergunta que nos insurgiu para um olhar mais atento por este género audiovisual. Constatávamos que estas obras artísticas apresentavam todo um mundo visual engenhoso e fascinante, e em tantos casos com uma criatividade autoral marcada. Contudo, os seus autores permaneciam e permanecem quase sempre ocultos na sua função primordial, ou seja, a divulgação da música e dos seus intérpretes. E, mais ainda, não havia em todo o mundo um evento que os pudesse

distinguir e premiar sem que a lógica musical mainstream tomasse a primazia. Curiosamente, existe um outro género audiovisual como uma característica algo semelhante, isto é, com um sentido promocional, uma função determinada: os filmes publicitários. E, neste caso, é conhecido de todos o seu evento competitivo com os prémios/troféus de referência mundial: os Leões de Ouro do Festival de Cannes. Desde já, convém não confundir com a Palma de Ouro do festival de cinema da mesma cidade francesa, pois essa destina-se às obras cinematográficas. Porém, havia uma diferença em relação aos vídeos musicais, mais particularmente com os de formato curto, os videoclipes. Pois estes contêm uma margem de liberdade para a criação. Não são determinados por uma linha narrativa, uma ideia objectiva como os filmes publicitários, já que estes são realizados tendo por base uma mensagem muito precisa, e na maior parte das vezes em concordância com uma campanha mais larga aplicada a vários media. Inclusive nos casos dos videoclipes perfomativos, onde a imagem do(s) intér prete(s) toma uma determinação acentuadamente promocional, existe sempre uma margem suficiente para exploração e experimentação visual de raiz autoral do próprio realizador. Mesmo assim, com esta possibilidade de expressão e criação artística, era e é um facto a inexistência a nível mundial “do” evento competitivo de referência, credenciado e reputado, caracterizado por independência de julgamento e com base estritamente visual e não musical, que pudesse internacionalmente fazer uma valorização e distinção mediática da criatividade deste género. Embora, em abono da verdade, existam eventos baseados em videoclipes, como é o caso dos “MTV Video Awards”, dos “UK Music Video Awards”, dos “The Independent Music Video Festival” e muitos outros com conceitos mais latos de filme e vídeo. Mas nenhum com as credenciais acima descritas. Por volta do ano de 2005, tivemos então o desplante de pensar que se poderia criar algo em Portugal, no Norte de Portugal, na nossa própria cidade, a Póvoa de Varzim, um evento com um conceito pioneiro mesmo no contexto mundial: A FORMA Um evento que através de competições internacionais (e nacionais) promova e distinga os criadores visuais, permitindo assim estabelecer um espaço convivial e referencial para o conhecimento e desfrute dos conteúdos técnicos e estéticos dos vídeos musicais. Um evento à semelhança de um festival de cinema, mas com uma clara diferença em dois níveis:


Diferença ao nível do conteúdo. Ou seja, trata-se de um festival que pretende premiar a criação visual de obras audiovisuais com uma temática definida: a música. Através de três formatos ou géneros: o Videoclipe, o Videoconcerto, e o Videodocumentário musical, oferece-se todo um universo visualmente criativo sobre a música, de curta ou longa duração, c o n g re g a n d o a s s i m t o d o s o s p ro d u t o s videográficos de temática musical, que além do conhecido “teledisco” engloba os produtos habitualmente em DVD como concertos em vídeo e documentários musicais em vídeo. Diferença ao nível da forma de apresentação. Ou seja, em virtude da característica tecnológica do género, a sua apresentação possibilita uma maior versatilidade do que a habitual sala/ auditório. Pretende-se assim fazer uso dos novos sistemas de apresentação vídeo e dispô-los em locais de fácil acesso público. De modo a tornar mais atractivo, tecnologicamente fascinante e descontraída a envolvência com um público alargado. Sendo que a forma de desfrute tome uma postura de descontracção pelo incremento à disposição de visionamento para o público em modernos e confortáveis assentos de recosto.” Com toda a consciência que a intenção de “evento mundial” é obra hercúlea e até algo pretensiosa, é evidente que isso servia apenas como estímulo, pois sabíamos que para ter a veleidade de atingir essa dimensão só a médio ou longo prazo. Em 2007 foi então levada a ideia à

prática sob a designação e grafia de “ViMus”, porque sintetiza com as letras iniciais os termos chave deste novo festival: o Vídeo Musical. Três competições foram propostas, uma


Internacional, de Videoclipes, e duas Nacionais, de Videoclipes e Videodocumentários. Recebidos perto de 200 inscrições para a comp. Internacional de Videoclipes e mais de 80 para a

Nacional, foram então escolhidos 95 e 36, respectivamente, para se atribuir 6 prémios cada. Para surpresa nossa entre os realizadores dos vídeos enviados para competição de produtoras internacionais, constavam nomes como: Michel Gondry, Tim Burton, Mike Mills, Claude Lelouch, Floria Sigismondi, Edouard Salier, Pleix, Ace Norton, Patrick Daughters, Jonas Odell, Bill Plympton, Chris Milk, entre muitos outros conhecidos do meio. Já nesse ano, uma ideia chave presidiu aos especiais da programação: começar por dar a conhecer a realidade autoral desta área do país vizinho, para depois no ano seguinte, se efectuar algo semelhante referente a França. Assim sendo, fizemos uma retrospectiva dos documentários musicais do mestre Carlos Saura, iniciada na noite de abertura com a apresentação do seu recente “Fados”, mais tarde exibido nas salas em Portugal, mas também foi exibido uma mostra de autores de videoclipes espanhóis intitulada “Eclectia”, da qual um dos seus comissários artísticos veio a estar cá presente para fazer parte do júri das competições. Um outro seria o jornalista Nuno Galopim. Contudo, foi com um carinho especial que, para presidir ao júri mas sobretudo para se efectuar a primeira retrospectiva do pioneiro dos videoclipes em Portugal, foi convidado o realizador Zé Pinheiro, apresentando o seu recente videodocumentário sobre os Heróis do Mar, “Brava Dança”. Em 2008, a novidade seria o início da competição Internacional de Videodocumentários. Dos 30 recebidos para competição, seriam escolhidos 11, dos quais


lembramos alguns títulos: “Heavy Metal in Baghdad”, “Sonic Youth, Sleping Nights Awake”, “The Night James Brown Saved Boston”, “Rockin’ Brooklyn”, “Dub Echos”, etc, etc. Com o natural aumento das inscrições de vídeos para competições, a proveniência das mesmas, embora com predominância para a maioria dos países ocidentais, era já da Bielorrúsia, África do Sul, Brasil, Austrália, México, Colômbia, Polónia, Índia, Irão, etc. Em relação aos Videoconcertos, sendo que o início das suas competições ficou estipulado para 2009, foi no ano passado apresentada uma retrospectiva da mais criativa e aclamada série deste formato a nível mundial chamada “Freedom Now!”. É uma série de origem francesa, tal como francês é o promissor realizador Edouard Salier, do qual lhe dedicamos uma retrospectiva. Assim como foi convidado o destacado realizador Rui de Brito a estar cá presente para apresentar a sua obra videográfica em retrospectiva e para presidir ao júri, sendo para este efeito acompanhado da jornalista Inês Nadais e pelo produtor francês Stéphane Jourdain. Resumindo, no seu conjunto temático e genérico (videoclipes, videoconcertos e videodocumentários) este festival configura um conceito pioneiro, mesmo no contexto mundial, e moldado sob um cariz singular, para lhe imprimir a definição identitária segundo quatro termos chave: a imagem e a música, o design e a tecnologia.

Todas as imagens que acompanham o artigo foram feitas durante a edição de 2008 do festival.


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8 e meio clube de cinema + concurso Por Arnaldo Pedro - Imagens de José Carlos Marques

O Clube de Cinema 8 e Meio nasceu de uma vontade antiga e crescente de alguns professores do Departameento de Educação Artística e Tecnológica da Escola Secundária Eça de Queirós (ESEQ) da Póvoa de Varzim, que passou dos sonhos para a concretização no ano lectivo de 2005/2006. Actualmente, este clube

ENTREGA DE FILMES ATÉ 31 DE AGOSTO DE 2009 REGULAMENTO E FICHA DE INSCRIÇÃO EM WWW.8EMEIO.NET Adolescentes no fio da navalha, corpos presos por um fio no limiar das incomprensões adultas, traficantes que em caves soturnas revêem os seus planos criminais e aspiram dar uso às suas falsas armas de fogo, usando linguarejares exóticos, peles tatudas de irreverência, jogadores de baseball que aspiram fazer os seus home runs no infinito de um céu azul desenhado sobre as sossegadas casas da periferia, relações amorosas feitas e desfeitas de acordo com aspirações individuais, Ophelias trazidas à vida em modernos milagres tecnológicos, tribos urbanas que controem para si próprias novas identidades, velhos burgueses que disputam velhos territórios com sur prendentes antagonistas, clássicos revisitados em pungentes CONTACTOS: Clube de Cinema 8 e Meio Escola Secundária Eça de Queirós Rua Dr. Leonardo Coimbra 4490-621 Póvoa de Varzim Tel. 918904259 (Arnaldo Pedro) Concurso 8 e Meio: www.8emeio.net Blogue 8 e Meio: www.oitoemeio.blogspot.com

garante uma programação estável de exibição de um filme por semana, no auditório da ESEQ , correspondendo a necessidades pedagógicas imanentes aos currículos nacionais. Preenche, ainda, a noite da terceira sexta-feira de cada mês com um filme de culto, numa sessão mais descontraída, aberta, também, ao público exterior à escola. Pontualmente, apresenta ciclos t e m á t i c o s, d e b r u ç a n d o - s e s o b re t e m a s pertinentes, por vezes contextuados com a presença de personalidades convidadas para debate. Promove, ainda, o único concurso de vídeo escolar do país dedicado ao ensino secundário, o Concurso de Vídeo Escolar 8 e Meio, este ano na sua terceira edição.

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3ª EDIÇÃO DO CONCURSO DE VÍDEO ESCOLAR 8 E MEIO ABERTO A TODOS OS ALUNOS DO ENSINO SECUNDÁRIO

ccv.eseq@mail.telepac.pt

fábulas pós-modernas, eis uma pequena amostra do que foi trazido pelos participantes ao 2º Concurso de Video Escolar 8 e Meio. É de um cinema novo (ou renovado) que aqui falamos, um cinema feito à margem de todo e qualquer cânone estabelecido. Um cinema selvagem e delicioso como quase sempre só as primeiras obras o podem ser, porquanto ainda libertas de compromissos de toda a ordem. Câmaras de filmar, mas também muito músculo e sangue, em teses de vida verdadeiramente inconformistas.


A mais de meia centena de filmes concorrentes ao 2º Concurso de Video Escolar 8 e Meio constituiu no seu conjunto um enorme fresco de vitalidade adolescente, um documento a ser visionado por todos os sociológos de serviço. A vida dos jovens oferece efectivamente mais do que a mera possibilidade de realização de uma curta-metragem. É um verdadeiro compêndio do que está acontecer e do que muito provavelmente irá desenrolar-se a seguir. E é com manifesto optimismo que se constata que a generosidade humana (não obstante o clima de instabilidade que vivemos) não tem limites e que enquanto houver jovens com vontade de sonhar, o nosso futuro colectivo estará mais que assegurado. Estão pois de parabéns os participantes, todos eles desde já vencedores. Nesta nova edição - a terceira -, o Clube 8 e Meio andará atentamente à procura de novos protagonistas, de novas histórias, porque a vida será de facto aquilo que os nossos jovens dela fizeram. E o Cinema “iluminará” as opções... Os vídeos da segunda edição do concurso 8 e maio encontram-se disponíveis para visualização em www.vimeo.com/oitoemeio

Todas as imagens que acompanham o artigo foram feitas durante a edição de 2008 do festival.


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Mulher de Emergência ensaio sobre a mulher moderna Por Mafalda Martins - Ilustração de Ricardo Campos

a mulher moderna levanta-se cedo, mas atrasa-se sempre. maquilha-se e rodopia perfeita em sapatilhas o dia inteiro. empenha-se naquele trabalho que faz de si a mulher realizada e independente, que lhe permite conduzir-se em quatro-rodas-autónomas nesse final de tarde às compras… para chegar a casa e cozinhar um delicioso jantar de coisas frescas e verdes. a m u l h e r moderna come fruta e não tem vida para ginásios. arranja as sobrancelhas e depila as pernas e encravam-lhe os pêlos nas virilhas das t a n t a s depilações que faz. a casa da m u l h e r moderna é um palacete onde gasta as mãos porque não ganha o suficiente para pagar a uma mulher-a-dias que lhe lave, limpe, seque e engome a vida. ainda assim, a casa da mulher moderna está limpa, a mobília perfumada e as roupas estendidas nos armários ou noutro sítio qualquer do seu percurso de utilidade para seduzirem o corpo que as há-de vestir de enfiada na manhã seguinte. a mulher moderna é incoerente e acredita no príncipe-do-cavalo-branco. é bonita, desejável, romântica, criativa e chega a casa e monta-o com requinte. há mulheres modernas que confiam nos homens modernos, que continuam a dormir muito depois do seu dia começar, mas que limpam a casa e arrumam a cozinha, põem a roupa a lavar e a secar e adiantam o jantar. quando essa mulher moderna chega a casa, o homem moderno recebe-a com um beijo, depois das mensagens da manhã e da tarde a lembrar que o amor existe. e por muitas horas de trabalho, poucas horas de sono ou violentos desarranjos hormonais, esta mulher moderna é para o seu homem moderno a mais bonita do mundo. a mulher moderna sabe que ser mulher hoje é viver num limbo. é ser mulher educada por outras mulheres: crescer no paradigma cristão da avó-doméstica a preparar o jantar, o banho e o chinelo do avô, e da mãe-independente a multiplicar-se entre o emprego na rua e o

trabalho em casa. a mulher moderna sabe que ser mulher hoje é gerir a luta entre o que herdamos, o que biologicamente somos e o que ambicionamos ser. algures na matemática das horas entram os filhos, que não poderão tardar ou sujeitam-se a vir fora do prazo-de-validade-dos-óvuloscontados. mas antes disso a mulher moderna precisa de renovar o conhecimento, estudar, ler todos os livros de cabeceira e passar os olhos pelas reportagens que se amontoam na casa-debanho em risco sério de desactualização. a mulher moderna tem personalidade e opinião. viu a exposição do oliveira centenário em serralves, assistiu ao blindness no cinema, acompanhou a vitória do obama nos estados unidos. aliás, não só sabe que o obama ganhou as eleições, como já pensou sobre isso e já fez piadas, porque a mulher moderna tem sentido de humor. conhece duas cidades do mundo por ano e visita sempre a família, que a mima muito. … e onde se encaixam aqui as garrafas de vinho que bebe a mulher moderna? a mulher moderna tem peito para mais ou fígado para tanto e cura as ressacas com gurosan e sumo de laranja natural. a mulher moderna tem dias maus. em que é monótona comó o raio, em que pragueja o tempo todo, em que deseja até ter nascido com uma pila. mas vai sempre a jogo. a mulher moderna é uma jogadora agressiva, confundido os adversários: homens, mulheres e animais de estimação. o ser humano complica, a mulher moderna complica ainda mais, mas age apenas de acordo com o seu código genético, que é também cinco mil vezes mais complicado do que o homem moderno. mas pode ser o oposto de tudo isto! a mulher moderna pode marimbar-se para os pêlos e assumir o bigode, cagar prá casa em pantanas e ignorar o que dizem os outros. a mulher moderna pode trocar a cidade pelo campo e acordar muito cedo para regar os narcisos e recolher os ovos frescos do galinheiro, de mp3 nas orelhas e disco externo de 500 gigas em casa, enquanto deixa a canja a cozer para depois encomendar uma camisola da la redoute pela internet. a mulher moderna busca avidamente a vida moderna apenas porque quer e porque lhe apetece. a mulher moderna sabe que primeira definição de modernidade foi publicada em 1500 e que o que é moderno agora, amanhã já deixou de o ser. a mulher moderna admite que o adjectivo aqui pouco ou nada interessa e que o desafio maior da contemporaneidade é, apenas, poder optar e saber escolher. e que o mundo hoje é, de facto, mais certo, ainda que vivamos da esperança de que tudo volte a mudar de novo. Texto realizado a partir dos contributos do post "mulher-de-emergência", em www.diariodesombras.wordpress.com.


Maio/Junho 2009

MESTRADO

“Crime Scene”, de Liliana Nicolau

LILIANA NICOLAU:

“O objectivo deste trabalho é alertar as pessoas e consciencializá-las para a violência contra as mulheres. Não importa se as imagens foram encenadas, montadas ou se foi um crime verdadeiro, mas sim a mensagem que chega até às pessoas, pois essa é aquela que define o realismo fotográfico e a sua significação socialmente crítica.” Projecto desenvolvidos por Liliana Nicolau para o “Mestrado em Comunicação Audiovisual” do Instituto Politécnico do Porto, durante um seminário com o fotógrafo Inglês John Goto. Mais informações sobre o curso em http://www.dfcam.esmae.ipp.pt/


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RESPIGADORES

Les Glaneurs et la Glaneuse (2000) - o filme com que Agnès Varda, apoiada no quadro de Millet sobre o mesmo tema, (re) interpreta o termo glaneur, então condenado ao esquecimento por circunstâncias da sua desadequação, não às transformações dos hábitos sociais decorridos desde o século XIX até então, mas sim às searas propriamente ditas (que, sobretudo em meio urbano, sofreram alterações muito significativas ) - inspira-nos. Le glaneur, el espigador, o respigador; a origem do termo atribuido àquele que recolhe o sobrante de uma colheita, não impediu a sua adaptação à urbe contemporânea pelo que, todos os que se apropriam das sobras doutrém para proveito próprio, ainda hoje e sem que anacronismo algum tenham emergido, respigam. Assente nessa apropriação do inútil e no desafio da sua conversão em objectos utilitários, a nossa actividade, enquanto respigadores, resulta em intervenções sobre áreas distintas como a arquitectura, cenografia ou decoração. Materiais, métodos, técnicas, conceitos, mecanismos, construções, objectos – decrépitos, abandonados ou em desuso – são alvo preferencial do nosso exercício criativo e de profissionais de mérito reconhecido, de intermináveis áreas do conhecimento que o nosso saber desconhece que, pontualmente, convidamos a desafiar o engenho humano em parcerias que se pretende que resultem em produtos exclusivos e de elevado rigor intrinssecamente associado à sua concepção.

A durabilidade dos bens de consumo está cada vez mais ameaçada pela celeridade com que novas e aliciantes propostas são diáriamente apresentadas. Prolongá-la por mais tempo é o propósito de respigadores.

Respigadores. Reciclagem funcional de objectos. Raquel da Silva. Porto. 1984. Frequenta o Mestrado integrado em Arquitectura e Urbanismo. Pedro Vaz da Costa. Valpaços. 1974. Frequenta o Mestrado integrado em Arquitectura e Urbanismo. http://respigadores.wordpress.com


Maio/Junho 2009


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LAB.65

“Untitled #10”, de Juao Coração

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O projecto Lab.65 começou a sua existência numa galeria de fotografia na Rua Mártires da liberdade nº 65, daí o nome, e surgiu de uma vontade de ter um espaço dedicado à fotografia, para mostrar, provocar interesse e incentivar o gosto e o conhecimento acerca da fotografia artística. Entretanto estas aspirações continuaram mas ganharam outra forma, fisicamente menos restrita que o espaço físico galeria originava e abraçando a virtualidade global, substituindo a dita galeria pelo espaço cibernético. Podemos afirmar que este projecto se encontra ligado a prioridades que vão do desenvolver o gosto pessoal sobre a fotografia ao incremento do mercado da fotografia artística. Sendo um estímulo para os fotógrafos no sentido de tornar visível o seu trabalho e o comercializarem, e um estímulo para o público poder aprofundar o conhecimento acerca do que está a ser feito nesta área bem como ter uma maior acessibilidade na aquisição de obras relevantes no panorama fotográfico. Cativar o interesse do público pela fotografia enquanto arte, dando a conhecer e aproximando o contacto entre artistas e gentes animadas por este interesse específico, enquadrase no âmbito da crescente afirmação da Lab.65 desde 2007. Estes propósitos relacionam-se com a própria alteração do modus operandi da Lab.65 relacionado com o aonde e como mostrar e provocar, tendo alterado o seu local de funcionamento, fisicamente limitado a uma

galeria com exposições temporárias, para passar a um espaço cibernético global. A alteração é de facto significativa, pelo sentido da audácia e da inovação, sendo que há projectos similares no estrangeiro mas nenhum em Portugal e mesmo os que se aproximam não são idênticos. E passo a explicar, ser audaz e inovar implica arriscar. Implica, de algum modo, propor novidades, sair fora do modelo usual, do que está pré-estabelecido, do tradicional. Ora os mecanismos habituais de divulgação e visionamento das artes são as exposições, que acontecem sobretudo nos museus e em galerias, que são locais fisicamente concretos e que usam mecanismos de projecção e mostra condicionados a um local, e são também as edições de textos, publicados em livros, catálogos, revistas jornais, tendendo cada vez mais à publicação online. Digamos que o projecto da Lab.65 é audaz e inovador porque junta estes dois mecanismos de projecção e informação. A essência do projecto está na sua participação online. A novidade é o sítio Lab.65 se ter alargado a uma escala global na internet. É lá que se pode visionar, consultar, conhecer mais, acompanhar. Para além disso e como complemento faz parte do projecto a realização de diferentes momentos expositivos temporários de modo a dar a conhecer ao público a m at e r i a l i z a ç ã o c o n c re t a d o s t r a b a l h o s fotográficos que fazem parte da La.65. As exposições acontecem por serem facilitadoras de


Maio/Junho 2009 “Dona de Casa”, de Ana Luandina (ao lado) “Poças #1”, de Alexandre Delmar (em baixo)

um contacto mais pessoal que se pretende que também seja possível. Elas vão acontecendo em locais diversos, pelo país fora e possivelmente também fora de Portugal, tendo começado a sua itinerância através da colaboração da FNAC nos espaços por esta disponibilizados. A aposta da Lab.65 tem a ver com a vontade de querer chegar a um número significativo de pessoas e de modo mais consolidado, mesmo sem ser necessariamente presencial, cada um pode, em sua casa ou qualquer outro lugar que lhe seja apropriado, a qualquer hora que lhe seja conveniente, aceder ao site. Deste modo o envolvimento vai acontecendo, pode-se ver quando se quer e como se quer, todos os dias e em diferentes momentos, isto permite estar sempre a par, tomar decisões mais ponderadas e tranquilas e consolidar os laços. Por tudo isto podemos dizer que a grande finalidade do projecto Lab.65 per mite democratizar mais a fotografia de autor, em termos de chegar ao conhecimento de muita gente, que pode ver e ficar a saber o que se tem feito na fotografia actual em Portugal, através do contacto com os trabalhos de fotografia de alguns relevantes artistas, e em ter mos económicos torná-la mais acessível, surge assim possível a criação de uma colecção de fotografia de autores portugueses contemporâneos. E passo a falar muito brevemente dos artistas. São ao todo 22, neste momento, autores portugueses. Alexandre Delmar, Ana Luandina,


SHAREMAG “Jesus Loves America I”, de Angela Mendes Ferreira (ao lado) “Piece 06”, de João Leal (em baixo)

Ângela Ferreira, Carlos Cézanne, Hugo Olim, Inês D’Orey, João Leal, João Margalha, José Carlos Nascimento, João Coração, Manuel Luís Cochofel, Marcus Garcia Moreira, Margarida Paiva, Miguel Fukotomi, Miguel Meira, Paula Abreu, Paulo Pimenta, Pedro Guimarães, Pedro Magalhães, Rita Castro Neves, Rui Pinheiro e Teresa Sá. Portanto para já o projecto aposta sobretudo em dar a ver e a conhecer o que se faz n o p a í s. E t e m o s a q u i u m a s e l e c ç ã o particularmente interessante, muito heterogénea, contudo para os referenciar de modo mais sintetizado e fluído resolvi agrupá-los. Os grupos em que os pensei, jogando por um lado com conceitos e por outro com elementos

formais visíveis nas imagens são fundamentalmente três: 1 - paisagistas-documentais, cujas imagens podem ser tomadas como documentos, registos de situações, objectos e realidade: Alexandre Delmar; Carlos Cézanne; Hugo Olim; João Margalha; José Carlos Nascimento; Manuel Luís Cochofel; Miguel Fukotomi; Miguel Meira; Paulo Pimenta; Pedro Guimarães; Pedro Magalhães; Rita Castro Neves; Rui Pinheiro. 2 - narrativas-pessoais, algumas de âmbito mais poético e emocional que outras, com relações com o cinema e a literatura, a fábula, as metáforas visuais: Ana Luandina; Inês D’Orey; Ângela Ferreira; Margarida Paiva; Teresa Sá. 3 - experimentalistas, num jogo de possibilidades técnicas da própria fotografia que nos levam por vezes a pensar em que percebe uma forte relação da fotografia com outras áreas artísticas: João Leal; João Coração; Marcus Garcia Moreira; Paula Abreu. Podemos dizer que eles são um núcleo forte, não só porque muitos deles têm já prémios no seu curriculum profissional, mas porque são artistas dinâmicos, que apresentam trabalho com conhecimento de causa sobre o mundo actual e em especial no que se refere às artes do nosso tempo. São rigorosos, têm visão, focam pontos relativos à cultura contemporânea com os quais nos sentimos próximos. Como por exemplo, a sociedade de consumo, os seus clichés, a solidão, os não-lugares e os espaços de vivência urbana, entre tantos outros conceitos caracterizadores do mundo em que vivemos. Todos eles são diferentes, volto a repetir, abrangendo várias temáticas, técnicas, conteúdos teóricos e valendo-


“Untitled”, de Manuel Luís Cochofel

se de elementos formais que os distinguem, tais como no que se refere ao trabalho com a luz, a cor, os focos, as linhas, as perspectivas e os enquadramentos, presentes nas imagens fotográficas que nos apresentam. Uma colecção a não perder de vista. OS PORTFÓLIOS COM IMAGENS DOS ARTISTAS QUE FAZEM PARTE DO PROJECTO LAB.65 PODEM SER APRECIADOS EM WWW.LAB65.COM.

“Ritz”, de Carlos Cezzane


“Made In China #1”, de Rui Pinheiro (ao lado) “Perdidos na Cidade”, de Paulo Pimenta (em baixo)


“Untitled #2 (Night Windows”, de Margarida Paiva (em cima) “Color Film nº 2”, de Paula Abreu (ao lado)


“Fim #15”, de Marcus Garcia Moreira (ao lado) “Untitled #3”, de Teresa Sá (em baixo)


“Bristol”, de Rita Castro Neves (em cima) “Sem Título #1”, de Miguel Fukotomi (ao lado)


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NUVEM VOADORA

Workshop de Circuit Bending dinamizado pela Nuvem Voadora em 2008. Fotografia de Margarida Ribeiro.

UM MOTOR PARA AS ARTES Pretende-se que funcione como um motor artístico. Que motive as pessoas para as artes, tanto como produtoras como espectadoras. É esse o grande objectivo da Nuvem Voadora, uma associação cultural com sede em Vila do Conde, mas com ambições além-fronteiras.

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A Nuvem Voadora – Associação Cultural nasceu a 17 de Abril de 2008, pela vontade de um grupo de nove amigos, com diferentes formações e sensibilidades. Pretende assumir-se como um pólo dinamizador das várias artes, onde os seus colaboradores e associados encontrem um espaço de intervenção, simultaneamente artístico, social e crítico. Ou seja, um motor artístico que motive e apoie a produção e a procura, nas várias artes. A “Queima do Judas 2009” é um dos resultados recentes do trabalho da Nuvem. Trata-se de um espectáculo multidisciplinar, que envolveu uma equipa de cerca de 200 pessoas, e que parte da história de um velho pescador, agora faroleiro, para fazer uma viagem pela sua memória e pela sua terra, as Caxinas, em jeito de homenagem a esta singular comunidade piscatória do Norte do país. O espectáculo envolveu várias associações e instituições do concelho de Vila do Conde e explorou as vertentes do teatro de rua, das artes circenses, da música, da dança, da fotografia, do vídeo ou da poesia. Decorreu a 11 de Abril, em

Vila do Conde, e contou com cerca de 1500 espectadores. De destacar também o plano de actividades que a Nuvem Voadora está a desenvolver no Parque da Lavandeira, em Vila Nova de Gaia. Já em Maio decorre a oficina “Palhaço e tudo à volta”, seguindo-se, em Junho, o atelier “Escrever na paisagem” e, em Julho, a actividade “O lixo também tem coração”. Nota ainda para a “Mostra de Artesanato Contemporâneo”, que decorre também em Julho, e o espectáculo de música e circo “Irmãos esferovite – Banda de Palhaços”, que acontece em Setembro. Como momentos marcantes na história ainda muito recente da associação, há que destacar a intervenção “Nuvem Voadora”, que decorreu em Maio de 2008 e que marcou uma das primeiras actividades desenvolvidas pelo grupo. Esta intervenção/perfomance consistiu na instalação de uma nuvem de balões brancos, presos por um fio ao gradeamento da estação de Metro do Bolhão, difundindo palavras soltas de apoio à manutenção deste histórico mercado da Baixa portuense. Também a participação no festival “E se esta rua fosse minha”, promovido pelo Plano b, na Rua Cândido dos Reis, no Porto, a 4 de Outubro de 2008, constituiu um momento alto. Entre outras participações, a associação apresentou a instalação “Entra em mim”, um projecto fotográfico onde os perfis fotografados são depois recortados, ampliados e instalados num espaço


Maio/Junho 2009 “Entra em mim”, projecto fotográfico de Cesário Alves, apresentado no festival “E se esta rua fosse minha”, Outubro de 2008, Porto. Fotografia de Paulo Pinho (ao lado). “Queima do Judas 2009”, com direcção artística de Pedro Correia e Paulina Almeida. Fotografia de Cesário Alves (em baixo).

público, convidando-se os espectadores a entrar no negativo dos retratos. Nota ainda, no âmbito das oficinas, para o Workshop de Circuit-bending, organizado pela Nuvem em Novembro de 2008 e que permitiu que um conjunto de pessoas pudessem aprender a manipular de forma intuitiva um conjunto de circuitos integrados de brinquedos electrónicos emissores de som, aplicando dispositivos que permitem distorcer/alterar os sons, resultando daí interessantes instrumentos de som. As colaborações com o Parque do Museu de Serralves que decorreram em 2008 repetir-se-ão também em 2009, no âmbito das comemorações dos Dias Mundiais da Criança e do Ambiente, assinalados a 5 de Junho, com um conjunto de actividades de animação de rua. Mas a Nuvem quer voar para longe e tem procurado marcar presença em eventos internacionais, com destaque para o Festival de Artes de Rua “Animasannio”, que decorreu em Benevento, Itália, em Julho de 2008. Em www.nuvemvoadora.com é possível acompanhar em detalhe todas as iniciativas promovidas e participadas pela associação, bem como encontrar os contactos para o envio de propostas ou pedidos de informações.


INÊS GUEDES RECOMENDA

CINEMA THERE WILL BE BLOOD Realizador: Paul Thomas Anderson Ano: 2007 www.therewillbeblood.com

“There Will Be Blood” Realizado em 2007 por Paul Thomas Anderson – já bem conhecido pelas brilhantes obras cinematográficas Magnólia e Punch Dr unk Love – este filme é a convergência de vários elementos que o tornam num filme único e obrigatório. Por um lado, a magnífica fotografia que possui, por outro, a genialidade insuperável da interpretação de Daniel Day-Lewis e depois, a fantástica banda sonora que Jonny Greenwood tão adequadamente criou. A história é de uma fervorosa ambição por petróleo, que leva a que Plainview (DayLewis) e seu filho (Dillon Fresier) partam para uma pequena cidade do Oeste. Aqui começa um enredo de amor-ódio, luta e degradação de princípios morais. Para muitos, o filme é de difícil digestão dada a sua complexidade, negridão e pelos 159 minutos que o constituem. Porém, There Will Be Blood ultrapassa o limite da perfeição, devendo, indubitavelmente, ser considerado um grande clássico do cinema.

“Das Leben der Anderen” Vencedor de um Oscar em 2007 para melhor filme estrangeiro, A vida dos outros retrata uma história real do dramático sistema de espionagem existente na Alemanha Oriental durante o período da Guerra Fria. Nos anos 80, o Ministro da Cultura interessa-se por Christa (Volkmar Kleinert), actriz popular que tem uma relação amorosa com Georg (Sebastian Koch), o mais conhecido dramaturgo do país. Com a suspeita dos dois serem infiéis às ideias comunistas, eles passam a espiados pelo Capitão Gerd (Ulrich Mühe), perito em vigilância no Ministério para a Segurança do Estado, que fica fascinado pelas suas vidas e interacções. No entanto, o filme acaba por ser a história da sua vida. Florian Henckel von Donnersmarck realiza uma obra excelente, onde temas delicados como a traição, a lealdade, o abuso de poder e dilemas morais são uma inevitável regra. Absolutamente merecedor de um Óscar.

“Salò o le 120 giornate di Sodoma” Realizado em 1975 e baseado na obra “Os 120 Dias de Sodoma” do Marquês de Sade, este filme conta a história de quatro homens dos mais altos cargos do poder (político e religioso) que raptam 18 jovens (9 rapazes e 9 raparigas), fazendo deles prisioneiros num palácio perto de Marzabotto. Nesse local, esses homens exploram sexualmente os jovens, violandoos, torturando-os e mutilando-os. Pier Paolo Pasolini usa o livro de Sade mas também a sua própria vida como veículo de denúncia da crueldade do regime fascista. Até hoje Salò é um filme extremamente perturbante e polémico, devido à sua forte violência gráfica. Há quem apelide o filme de pornográfico, no entanto este actua de forma inversa a este género e representa a morte do sexo e a degradação da pessoa, reduzida a corpo para ser “comercializado”. Pasolini foi uma figura tão controversa quanto a sua obra e pouco antes da estreia deste filme acabaria por ser assassinado.


PERSONA Realizador: Ingmar Bergman Ano: 1966 en.wikipedia.org/wiki/Persona_(film)

“Persona” Elisabet (Liv Ullman) é uma actriz de sucesso que deixa de falar durante uma performance da peça Electra. A psiquiatra recomenda que a enfermeira Alma (Bibi Andersson) tome conta da actriz na sua casa de praia, para uma recuperação total. No decorrer do filme observa-se uma crescente interacção constituída por palavras de uma e expressões mudas de outra, levando a uma aproximação por vezes doentia. Ao mesmo tempo, cresce uma tensão (sem abandono de uma sensualidade imensa) que Bergman tão eficazmente consegue captar. Não é um filme fácil de compreender, antes pelo contrário, a interpretação de cada pessoa é a palavra-chave para analisar a obra talvez mais experimental de Ingmar Bergman que não pode passar ao lado dos amantes de cinema.

Stanley Kubrick Nasceu em 1928, e fez este ano uma década que este grande cineasta nos deixou. Porém, Kubrick permanece vivo por entre todos aqueles para quem o cinema é uma arte que deve ser sentida e partilhada de modo intenso. Apesar de ter realizado poucos filmes, facto que o próprio lamentava, quase todos eles são hoje considerados marcos do cinema. O legado do nova-iorquino contém títulos como o anti-belicista “Paths Of Glory”, “Lolita”, a sua primeira obra de grande orçamento para um grande estúdio, sobre um amor pedófilo, e o talvez mais famoso “2001: A Space Odyssey”, um ensaio colossal que nos coloca questões existencialistas disfarçado de ficção científica. Já em Inglaterra, onde viveu o resto da sua vida, o cineasta consolidaria o estatuto de autor, apresentando o muito controverso “A Clockwork Orange”, que ele próprio mandou tirar dos circuitos devido a ameaças de morte a si e á sua família. Seguidamente realizou um filme de época “Barry Lyndon” para o qual mandou construir câmaras com lentes originalmente feitas para a NASA. O próximo desafio do mestre de cinema resultou num filme de terror psicológico vagamente baseado no livro The Shining, de Stephen King. Saltando de género para género como era costume, presenteou-nos com o filme sobre a guerra do Vietname “Full Metal Jacket”, um filme claramente dividido em duas partes, o recrutamento e a missão já no terreno.Kubrick, esteve uma década desaparecido, e voltaria no final dos anos 90 com “Eyes Wide Shut”, um filme com o casal Kidman Cruise, sobre o desejo, atracção e ciume. Muitas vezes conotado como um control-freak, Stanley Kubrick era antes um perfeccionista que queria a sua visão totalmente transposta na tela.

STANLEY KUBRICK “Eyes Wide Shut” (1999); “Full Metal Jacket” (1987); “The Shining” (1980); “A Clockwork Orange” (1971); “2001 - A Space Odissey” (1968) www.kubrickfilms.warnerbros.com


MANHÃ MANHÃ RECOMENDA

MÚSICA WHITEY “Energético” http://www.myspace.com/

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ROBERT PLANT ALISON KRAUSS “Maturidade” http://www.myspace.com/

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JOANA BELEZA RECOMENDA

LITERATURA O PROCESSO Pormenor do manuscrito original de Franz Kafka

“O Passeio e Outras Histórias”, de Robert Walser | Tradução de Fernanda Gil Costa | Granito Editores e Livreiros Pequeno livro de quatro histórias, não se encontra facilmente em qualquer livraria e, encontrando-o, poderá passar despercebido de tão pequeno e modesto que é (talvez como Walser sempre quis que os seus livros fossem). Feito o aviso, o autor observa no último dos textos: «No jardim a luz treme, o sossego sossega, e é sem dúvida admissível que o palerma dum pajem seja palerma na medida em que se encosta à casa sonhador e é uma pequena mulher disfarçada». Abrese assim um passeio por esta obra. “O Estrangeiro”, de Albert Camus | Tradução de António Quadros | Edição «Livros do Brasil» Lisboa Há livros dos quais ninguém esquece as primeiras frases e este é um deles: "Hoje, a mãe morreu. Ou talvez ontem, não sei bem. Recebi um telegrama do asilo: «Sua

mãe falecida. Enterro amanhã. Sentidos pêsames». Isto não quer dizer nada. Talvez tenha sido ontem." Enfim, um romance assombroso de tão estranho e absurdo, por vezes cómico, sempre no limite da sensibilidade humana. “Ofício Cantante - poesia completa” de Herberto Helder | Assírio & Alvim Bastaria talvez dizer que é "apenas" a poesia completa de um dos maiores poetas portugueses, mas parece-me que aqui fica bem o último verso-poema do livro (página 618): «abrupto termo dito último pesado poema do mundo até novembro de 2008.» “O Processo”, de Franz Kafka | Tradução de Álvaro Gonçalves | Assírio & Alvim Não será por acaso que volta e meia se diz de um caso de justiça complexo que é uma

espécie de "processo kafkiano". De facto, este livro abre-se num dia da vida de Josef K., bancário bem sucedido, que acorda e é preso no seu próprio quarto sem saber do que é acusado ou quem o acusa. Entra então num processo misterioso cheio de perguntas e zero respostas. De revoltado o pobre bancário passa a resignado e acaba por desejar a própria execução.

AUTOR Robert Walser ou O elogio do minúsculo Robert Walser (1878 - 1956), escritor suíço de expressão alemã, foi uma referência literária para autores como Musil, Kafka e Walter Benjamin. Permaneceu muitas décadas na sombra da literatura europeia, mas nos últimos anos tem ganho uma dimensão de culto ao mesmo tempo que as suas obras são recuperadas e traduzidas (em Portugal a Relógio d'Água tem vindo a publicar vários livros). Observador por natureza, Walser levou uma vida solitária e dos seus dias errantes nasceu uma estranha


obra, presa às pequenas coisas do quotidiano, sobretudo as mais banais, imperfeitas e falhadas. Walser nada tinha e nada queria e, porventura, só assim se sentia livre para escrever. No final dos anos 20 ingressou voluntariamente num sanatório, numa altura em que já quase só escrevia a lápis, com letras minúsculas (muitas palavras chegam a medir menos de cinco milímetros), e em qualquer bocadinho de papel que encontrasse. Investigadores da sua obra acreditam que muitos dos seus textos se terão perdido irremediavelmente. De resto, Walser deixaria mesmo de escrever pouco tempo depois de ser internado. Passou quase trinta anos nesse estado, até que no dia de Natal de 1956 foi encontrado morto, na neve, quando dava um dos seus habituais passeios solitários. - Relógio d'Água publicou «O ajudante», «Jakob Von Gunten», «O Salteador», «A Rosa» e «Histórias de Amor». - Do alemão para espanhol foram traduzidos três volumes dos textos que Walser escreveu em pequenas folhas soltas. A coleção chama-se «Robert Walser Escrito a lápiz Microgramas I, II e III» Ediciones Siruela

OFÍCIO CANTANTE poesia completa Capa do livro de Herberto Helder, publicado pela “Assírio & Alvim”

ROBERT WALSER (1878 - 1956) en.wikipedia.org/wiki/Robert_Walser_(writer)


SHAREMAG

Uma Leitura de... anyone lived in a pretty how town Por Mariana Marques

“The Vagabond who withdraws himself to any extent from the life of his day, who declines to conform to many of its arbitrary conventions, escapes much of the fret and tear, the heart-aching and the disillusionment that others share in. He retains freshness, simplicity, joyfulness, not vouchsafed to those who stay at home and never wander beyond the prescribed limits. He exhibits an individuality which is more genuinely the legitimate expression of his temperament. It is not warped, crossed, suppressed, as many are”. (Rickett 109)

50

introdução a livrodepoemas (1999) salienta que “se as técnicas de escrita modernistas se afirmam como estratégias de despersonalização e de objectivação do conteúdo poético, o experimentalismo cummingsiano, enquanto expressão da visão orgânica do poeta propõe-se a re-categorização do real e o alcance do seu sentido último. O poeta-profeta recupera, assim, o sentido original das palavras” (Pinheiro 17) E.E. Cummings parodia ainda o mundo literário, condenando tanto a “moda” das vanguardas cosmopolitas, como o tradicionalismo puritano da poesia americana. É neste seguimento que surge a temática do amor, plena de “vitalidade” e em oposição claramente contrastante para com a “esterilidade”e o snobismo dos círculos artísticos e intelectuais da época. O termo “espontaneidade” surge associado a um individualismo que em Cummings assume uma dimensão anti-colectivista, longe das restrições das tábuas de valores estéticos dos seus contemporâneos. Assim, o recurso à ironia e ao cinismo constitui prática recorrente na construção destes poemas. Através da análise de “Anyone lived in a pretty how town”, inserido em 50 Poems (1940), procurarei evidenciar os aspectos acima referidos, quer através de close reading, quer através de diálogos intertextuais.

Influenciado pelo experimentalismo sintáctico dos poemas em prosa cubistas de Gertrude Stein, pela espacialização gráfica mallarmeana e pela precisão e economia verbal dos Imagistes, a poesia de E.E. Cummings resulta num constante estimular da linguagem pela desconstrução de normas sintácticas, possibilitando a prolificação de novos campos semânticos. Através de jogos de linguagem e da experimentação tipográfica, revela-se o lado lúdico e pictórico de E. E. Cummings (ressonâncias da sua actividade como artista plástico), realizado através da exploração espacial da mancha gráfica na folha. Somos confrontados com o uso de advérbios transformados em substantivos, anyone lived in a pretty how town ou com o uso da forma tradicional do (with up so floating many bells down) soneto, que, combinado com a visão spring summer autumn winter deliberadamente simples que o autor tenta he sang his didn't he danced his did mostrar do Mundo, (exaltação daquilo que há de mais espontâneo no indivíduo, rejeitando os colectivismos e o pensamento Women and men(both little and small) racionalista que cared for anyone not at all alicerçam a sociedade tecnocrática) dão à they sowed their isn't they reaped their same sua poesia um lugar na história da sun moon stars rain literatura universal. Paralelamente às técnicas exploradas no children guessed(but only a few Modernismo literário, que vão muitas and down they forgot as up they grew vezes desembocar numa poética da autumn winter spring summer) impessoalidade, a poesia de E. E. that noone loved him more by more Cummings é devedora de uma tradição romântica - a exaltação das capacidades imaginativas do indivíduo e das aptidões when by now and tree by leaf individuais da imaginação. Aliás, em she laughed his joy she cried his grief Cummings, a herança romântica sente-se bird by snow and stir by still ao ponto de o individualismo se diluir, por anyone's any was all to her vezes, (tanto na sua vida, como na sua obra) no eremitismo. Tal eremitismo someones married their everyones emerge em diferentes manifestações de um laughed their cryings and did their dance “eu” poético que se revela frequentemente (sleep wake hope and then)they adverso a comportamentos said their nevers they slept their dream estandardizados (a estagnação conformista de “mostpeople”, por oposição ao stars rain sun moon dinamismo individualista de “you and I”), “falsos heroísmos” e clichés patrióticos e (and only the snow can begin to explain religiosos. how children are apt to forget to remember Em relação às estratégias de construção with up so floating many bells down) textuais, Cecília Rego Pinheiro, na


one day anyone died i guess (and noone stooped to kiss his face) busy folk buried them side by side little by little and was by was all by all and deep by deep and more by more they dream their sleep noone and anyone earth by april wish by spirit and if by yes. Women and men(both dong and ding) summer autumn winter spring reaped their sowing and went their came sun moon stars rain (CP 515)

“anyone lived in a pretty how town” O primeiro verso de “anyone lived in a pretty how town” sugere logo um “travalínguas”. De facto, verificase o uso de uma sintaxe paralelística, da rima, do refrão e de fonemas onomatopeicos. Mas para além das características lúdicas da composição do poema, “anyone lived in a pretty how town”é construído com vocábulos e ritmos que evidenciam complexas impressões sensoriais no discurso voyeurista do sujeito poético. É dada ao leitor uma visão ironicamente estereotipada dos vários ciclos que formam existência humana. Estes mesmos ciclos “rodopiam”ao longo das nove quadras que constituem o poema, formando a narrativa de toda uma vida facilmente resumível – e daí também a ironia do poema. Um dos ângulos possíveis de ler este poema é, precisamente, a sua narratividade A monotonia do quotidiano e a certeza da morte emergem em correlação com as quatro estações do ano – “spring summer autumn winter” – e as respectivas transformações físicas dadas na Natureza nestes quatro períodos. O nascimento, crescimento e declínio do homem são apresentados no movimento dos sinos e na rotatividade cíclica das estações do ano – elementos logo presentes na primeira estrofe. Na segunda estrofe, inicia-se uma exposição mais concreta da comunidade onde o indivíduo, – “anyone" – personagem central do poema, está inserido: “Women and men (both little and small) ”. Aqui, os adjectivos têm uma conotação sarcástica, na medida em que ambos convergem para a “pequenez” da ortodoxia e do conservadorismo das práticas sociais convencionadas por esta mesma comunidade, num regime de repetição e regularidade: “they sowed their isn’t they reaped their same.” Os sinos “ (with up so floating many bells down) ” comummente detêm a função de anunciar os eventos de uma pequena comunidade. Mas, dada a irregularidade rítmica e métrica dos versos, sugerem também, através destes, a libertação destas mesmas práticas: “he sang his didn’t he danced his did”. Deste modo, os sinos são aqui símbolo de ambivalência. Por sua vez, o vocábulo “spring”, que carrega tradicionalmente uma polarização positiva é, ainda na primeira estrofe, tornado

ambivalente. Ao constituir o único monossílabo do terceiro verso, carrega o sema do isolamento, anunciando assim o tema da morte. Na sexta estrofe, este tema surge de forma mais explícita. A “morte” assoma associada ao vocábulo “snow” que, por conseguinte, surge enquanto metáfora da estação do ano associada à mesma, - o Inverno - acarretando consigo o espectro da solidão: “stars rain sun moon (and only the snow can begin to explain how children are apt to forget to remember with up so floating many bells down)” (CP 515)

No verso oitavo, constituído pelos monossílabos “sun moon stars rain”, está acentuado o sentimento de solidão do sujeito poético, pois a sua transição para a “summer season” não interessa de todo à comunidade: “Women and man (both little and small/cared for anyone at all.” Apenas as crianças são capazes de entrever que uma figura feminina (implícita) - “noone”se apaixonara por “anyone”. Aqui, é introduzida a temática blakeana da passagem da Inocência para a Experiência. As crianças, quando crescerem, esquecerse-ão do que entreviram, perdendo os seus dotes e iniciando-se assim o ciclo da decadência presente na terceira estrofe: “children guessed (but only a few and down they forgot as up they grew autumn winter spring summer) that noone loved him more by more” (CP 29)

A repetição constante do ciclo das estações atravessa todo o poema. É dentro deste ciclo que se desenvolve um outro – igualmente demarcado no tempo, previsível, o dos homens. As características formais da terceira estrofe demonstram-no, não só semanticamente, mas também no ritmo. A decadência do amadurecimento (re) inicia-se num verso décimo que, ritmicamente, se desenha num tetrâmetro jâmbico. No verso seguinte, onde são convocadas as quatro estações do ano, dá-se uma mudança para um tetrâmetro trocaico – a mera nomeação das estações pressupõe uma continuidade em cadeia, conduzida pela sua repetição. O verso seguinte, no qual se inicia um novo fôlego, dá-se como que um regresso ao Outono, reiniciando-se um novo ciclo, o do amor. Por um lado, é dado aqui mais um passo para a degradação da Inocência, por outro, desponta o único foco de novidade numa existência previsível que redunda em Experiência (ou a ideia que a comunidade em questão tem desta). Restam a “anyone” menos anos de vida e, do mesmo modo, dá-se no ritmo do verso doze o regresso ao jambo do verso 10, desta feita com menos um pé, numa relação directa e intencional entre o ritmo e a semântica, traço, aliás, recorrente de todo o poema. O verso 23, “how children are apt to forget to remember”, é composto, por sua vez, por três unidades rítmicas: dois dáctilos e um anapesto, o que provoca um

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stars rain sun moon (and only the snow can begin to explain how children are apt to forget to remember with up so floating many bells down)


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movimento descendente seguido de um curto movimento ascendente, evidenciando mais uma vez uma natureza cíclica pontuada pela inevitabilidade do crescimento. A ambivalência preside ao longo de todo o poema, na medida em que, por um lado, o sujeito poético critica o comportamento da comunidade (estrofe 5), por outro, apresenta esse mesmo comportamento como uma fatalidade incontornável (estrofe 6): “someones married their everyones laughed their cryings and did their dance (sleep wake hope and then) they said their nevers they slept their dream” “stars rain sun moon (and only the snow can begin to explain How children are apt to forget to remember With up so floating many bells down” (CP 515)

Acerca disto, o crítico Norman Friedman, no ensaio “Diction, Voice and Tone: The Poetic Language of E. E. Cummings”, comenta: “Each poem controls the meanings of its words to suit its own ends; the poet selects, from among the available alternatives suggested by history, those meanings which he wishes a given word to carry in a poem and subordinates or excludes, by means of the total linguistic structure and dramatic situation informing the poem, the other possibilities as irrelevant or even as damaging to his effect.” (Friedman 1038) No poema “the Cambridge ladies who live in furnished souls”, inserido no volume Tulips & Chimneys (1922), Cummings explora conteúdos (num outro tipo de composição poética) que entram em diálogo com a temática de “anyone lived in a pretty how town”. Em ambos os poemas, é postulada a crítica a uma sociedade assente em moldes puritanos. Na óptica de E. E. Cummings, a tábua de valores ortodoxos praticada pela América puritana leva à repressão de impulsos intrínsecos à natureza humana e, por isso mesmo, vitais. Em “the Cambridge ladies who live in furnished souls”, Cummings faz também uma breve referência ao universo literário de New England, evocando o poeta americano Henry Wadsworth Longfellow, que residiu durante alguns anos em Cambridge, terra natal de E. E. Cummings. Esta figura emblemática do século XIX, embora apreciado no seu tempo, foi posteriormente criticado por imitar o estilo europeu, assim como por construir um tipo de escrita direccionado intencionalmente para as massas. Neste poema, reconhece-se mais uma vez a ironia e o sarcasmo no modo como o autor veicula os seus ataques:

Cummings parodia aqui a passividade da comunidade em questão. Estamos perante um ciclo que é tido em conta pelos habitantes da cidade como orgânico e, por isso mesmo, inevitável (o que os leva à desculpabilização), quando na realidade é mero produto de uma construção social de cariz puritano (fruto do auto-engano e da mentira). Ao contrário da Natureza, o ser humano não respeita os ciclos, sendo impossível a combinação de “stars rain sun moon." É no indivíduo que reside a capacidade de contrariar ou pelo menos atenuar este ciclo de decadência:" The individual is necessarily set against society and against other people as members of society. It is in the the Cambridge ladies who live in furnished souls individual's unique responses that the value of life are unbeautiful and have comfortable minds inheres." (Clark 37). A expressão "Bird by snow" na (also, with the church's protestant blessings quarta estrofe surge enquanto antinomia paradigmática. John B. Lord afirma no seu ensaio: daughters, unscented shapeless spirited) they believe in Christ and Longfellow, both dead, "Bird by snow" may be rewritten as are invariably interested in so many thingsat "animate and inanimate, life and death, the present writing one still finds action and rest, color and whiteness, delighted fingers knitting for the is it Poles? summer and winter, sound and silence", If perhaps. While permanent faces coyly bandy we re-arrange this list as follows, we get scandal of Mrs. N and Professor D complementary sets opposite each .... the Cambridge ladies do not care, above other:"Animate, life, action, color, summer, Cambridge if sometimes in its box of and sound," the bird-opposite" inanimate, sky lavender and cornerless, the death, rest, whiteness, winter, and silence," moon rattles like a fragment of angry candy the snow." (Lord, 71) (CP 115) “Bird by snow” consiste numa combinação desviante do inglês-padrão. A construção do poema é essencialmente regida por dois tipos de deslocação sintáctica. Ambas são construções estruturalmente binárias. A primeira fórmula, O sujeito poético revela a contradição existente entre os formada pela associação nãoortodoxa de duas actos e as palavras das "cambridge ladies". As mesmas expressões recorrentes na norma linguística do inglês- não parecem conseguir (ou querer) combinar o seu padrão, verificase na oitava estrofe, no verso “all by all credo, o protestantismo, com o mundo que as rodeia. A and deep by deep” (a by a and b by b). A segunda, por crítica do sujeito poético direcciona-se para o mundo sua vez tem o mesmo tipo de associação binária, mas "artificial"criado por estas mulheres. As mesmas não construída com locuções onde a norma linguística é, por foram confrontadas com o mundo exterior (ou, pura e assim dizer, deformada. Isto é verificável, por exemplo, na simplesmente, evitam tal conflito) e, por conseguinte, mesma estrofe, no verso: “wish by spirit and if by yes” (c não questionam ou desafiam a sociedade e religião by d and e by f). ortodoxas que as enclausuram e que, ao mesmo tempo (e por isso mesmo), as conforta. "Christ" e "Longfellow"


"Cummings had earlier taken aim at the remnants of the nineteenth century in his disparaging remarks concerning "the cambridge ladies who live in furnished souls" and "who believe in Christ and Longfellow, both dead." However, the later poem attacks not merely fossilized New England Brahminism but the principles governing American Letters in the nineteenth century: the mixture of aesthetics idealism and cultural conservatism that came to be known as the "genteel tradition." (Cox, 212) A título de exemplo, um poema de H. W. Longfellow, “Song” onde o fechamento e a passividade social criticados por Cummings ao longo da sua obra, se evidencia: Stay, stay at home, my heart, and rest; Home-keeping hearts are happiest, For those that wander they know not where Are full of trouble and full of care; To stay at home is best. Weary and homesick and distressed, They wander east, they wander west, And are baffled and beaten and blown about By the winds of the wilderness of doubt; To stay at home is best. Then stay at home, my heart, and rest; The bird is safest in its nest; O'er all that flutter their wings and fly A hawk is hovering in the sky; To stay at home is best. (Longfellow's poetical works 484) William Carlos Williams, em In the American Grain (1925) postula que a Arte deve "nascer" do solo de onde provém o poeta, sendo pois necessário reafirmar o sentido trágico de lugar constantemente negado pelos seus compatriotas. Williams defende a revisitação e reabilitação de algumas das figuras heróicas do passado americano (modelos que poderiam servir de inspiração aos homens do presente). A função social do poeta é restabelecer este contacto e, contrariar a presença do puritanismo na cultura norte-americana. Por último, Williams salienta a necessidade de recuperação do "espírito" indígena na cultura americana, essencial para a religação entre a figura do poeta e a sua "terra". Se, por um lado, o passado da América é alvo de admiração ao ponto do poeta sentir a necessidade de o reabilitar num tempo presente, por outro lado, é alvo de ira e repúdio. Este dualismo advém, porém, da própria herança puritana que, e parafraseando Williams, constituiu uma força de grande importância quer nos primórdios da América, quer no seu tempo: "In presenting the puritans he would appear to assume the role of psychiatrist to a culture, his patient the American mind, its malady a crippling inhibition that affects our sexuality, makes avoid real relationships with others, and

prevents us from opening ourselves to the spirit of American earth. Operating on an assumption parallel to that once made by actual psychoanalysis, namely, that bringing to consciousness the source of mental disorder will result in the purgation of that disorder, Williams speaks of his wish "to drag this thing (Puritanism) out by itself to annihilate it" (p. 114). "I wish todisentangle the obscurities that opress me, to track them down to the root and to uproot them-" (p.116) (Holder, 504-505). Em "anyone lived in a pretty how town" torna-se evidente um mundo povoado de divisões antagónicas, a que se refere William Carlos Williams: o mundo do sonho, por oposição ao mundo do medo e da automatização. Ao recuperar o mundo “primeiro” do ideal americano, que, consequentemente se aplica ao que se pode chamar de uma noção progressiva de uma escrita que se quer tipicamente americana, Cummings engendra na sua obra traços de uma filosofia transcendentalista herdada de autores como Ralph Waldo Emerson, Walt Whitman e Henry David Thoreau, entre outros. Em Civil Disobedience (1849), Thoreau adopta esta concepção de modo provocador, apoiando-se na crítica da ausência de desobediência e, por conseguinte, da ausência de individualismo. Há aqui um claro ataque a uma sociedade crescentemente passiva e tecnocrática: “Action from principle, the perception and the performance of right, changes things and relations; it is essentially revolutionary, and does not consist wholly with anything which was. It not only divides states and churches, it divides families; ay, it divides the individual separating the diabolical in him from the divine”. (Thoreau 31). E. E. Cummings reabilita o pensamento de Thoreau, levando a sua noção progressista de individualismo numa arte que se quer vida pela constante inovação e luta contra seguidismos, sejam de que espécie for. Visto como revolucionário por uns e como reaccionário por outros, Cummings afirma nas suas i: six nonlectures (um título deveras anti-académico) dadas em Harvard nas Conferências Charles Eliot Norton em 1952-53: “…so far as I am concerned, poetry and every other art was and is and forever will be strictly and distinctly a question of individuality… poetry is being, not doing. If you wish to follow, even at a distance, the poet’s calling (and here, as always, I speak from my own totally biased and entirely personal point of view) you’ve got to come out of the measurable doing universe into the immeasurable house of being… Nobody else can be alive for you; nor can you be alive for anybody else. Toms can be Dicks and Dicks can be Harrys, but none of them can ever be you. There’s the artist’s responsibility; and the most awful responsibility on earth. If you can take it, take it-and be. If you can’t, cheer up and go about other’s people business; and do (or undo) till you drop.” (e. e. cummings a selection of poems 3).

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constituem figuras emblemáticas para estas mulheres, pois são figuras icónicas socialmente aceites e moralmente incontestáveis. Aliás, constituem símbolos que colaboram na construção permanência do status quo cultural dominante em New England e, em certa medida, por toda a América:


JOSÉ CARLOS MARQUES ENTREVISTA

THE PORTUGALS José Carlos Marques (JCM): Acho que os “T he Portug als” já podem ser considerados uma banda com algum destaque a nível nacional. O que está exactamente a acontecer? Vocês atribuem isso a que factores? The Portugals (TP): É de facto normal dizerem-nos isso. Por vezes é estranho ouvilo porque temos a sensação que ainda temos muito que crescer e esse crescimento tem muito a ver com uma maior exposição da nossa musica junto do publico seja ele de que natureza for. Apesar disto temos plena consciência do nosso valor e sentimos que a critica nos acolhe muito bem. JCM: Como se formou a banda? Em que sentido e com que condições vocês têm evoluído? TP: Não tem sido fácil, mas isso acho que é comum a todas as bandas que tenham a pretensão de chegar um pouco mais além. A ideia original começou em Coimbra pelas mãos do Né e de antigos elementos. No inicio de 2007, o Né e eu (Paulo) recomeçámos praticamente do zero, a trabalhar composição e produção das musicas. O principal objectivo era tocar ao vivo. Considerávamos que só assim poderíamos ser uma banda. Tinhamos um problema. Eramos dois e precisávamos pelo menos de mais um ou dois músicos para nos acompanhar em palco. Testamos guitarristas e o resultado não foi o melhor. Decidimos então que a formação ao vivo seria eu, ora na guitarra ora no baixo, o Né na voz e sintetizadores e mais um musico para tocar mais algumas melodias e har monias de teclado. Complementamos isso com alguns samples disparados através de um laptop. Apesar do resultado não ser prefeito, foi no mínimo satisfatório. Desde há 3 concertos para cá contamos com a presença de mais um elemento em palco a tocar guitarra. JCM: A que tipo de público se dirige a vossa música e os espectáculos que fazem?

De uma forma geral, podemos falar de um estilo que defina a forma do material que produzem? TP: A nossa musica dirige-se a quem g o s t a r d e l a . I n t e l e c t u a i s, p s e u d o intelectuais, donas de casa, teenagers sonhadores, escritorários… enfim, quem a quiser ouvir. As nossas musicas surgem sempre inspiradas numa melodia ou harmonia que nós consideramos à partida forte. Só depois vem a preocupação estética. E neste campo podemos variar muito. Achamos por ex. que o nosso EP tem uma atmosfera com personalidade e coerência entre todas as

musicas e fizemos questão que assim fosse. Não quer dizer que um próximo trabalho tenha a mesma estética. A ver vamos. JCM: Na forma como se mostram ao público, existe uma imagem que acaba por ser muito característica da vossa banda. A constante referencia ao Futebol, ou a ligação a ícones que marcam a Cultura Popular Portuguesa, como o Galo de Barcelos, são o reflexo de uma estética construída, ou apenas a imagem que surge de uma postura descontraída em relação às coisas que criam? Poderá ser, de alguma forma, a vossa critica à forma como as


JCM: Por último, e um pouco em tom de brincadeira, ficam apenas mais duas perguntas: Porquê o primeiro concerto no Centro Paroquial de uma freguesia Vilacondense? Caso pudessem escolher, qual a personalidade para a qual gostariam de tocar a vossa música, e porquê? TP: Estava para ser no recreio da escola primária da mesma freguesia. Como estava a chover passaram o concerto para o salão da junta. Óptimo! Para quem gostaríamos de tocar a nossa musica? Hum… Para o Fernando Seara (pres. da câmara de Sintra) Porquê? Basta ouvir o homem a falar para se perceber que é uma jóia de pessoa. O EP “Setúbal” pode ser adquirido pela internet no endereço www.myspace.com/theportugals.

bandas se apresentam ao público nos dias de hoje? TP: É possível que inconscientemente seja uma “critica” na medida em que nunca conseguiríamos ter posturas idênticas a essas que falas. No entanto respeitamos todas as formas de estar na musica desde que elas mesmas se dêem ao respeito, claro. Não nos levamos muito a sério a este nível. Não gostamos nada de conceptualizar coisas, isso até nos entedia. Provavelmente nem o saberíamos fazer, se quiséssemos. Esta postura é completamente descontraída e espontânea. No dia-a-dia somos assim. “Tangamos” com tudo e mais alguma coisa… Futebol? Somos portistas dos 7 costados e gostamos muito de bola. Tem vezes que a falar do assunto, somos mais chatos que Freitas Lobo e Carlos Azenha juntos. JCM: Quantos elementos fazem parte da banda, e qual é o papel que cada um assume dentro da mesma? Já agora, sobra tempo para quê entre os espectáculos que têm realizado? TP: Como já deves ter percebido somos dois. Paulo Barreto e Manuel Justo (Né). A nossa principal motivação e função é dar vida às musicas que criamos juntos. Nunca se definiu qual o papel de cada um dentro do projecto. Não fazemos mais nada na vida a não ser trabalhar (compor, carregar material, marcar concertos, enviar emails, etc) para que a nossa vontade de levar os The Portugals o mais longe possível se concretize. Não é fácil como deves imaginar… Neste momento, ao vivo fazemo-nos acompanhar por mais dois músicos. O Nuno Marques no JUNO G e o Tiago Matos a tocar guitarra el. Eu toco baixo el. E o Né canta e toca alguns synths.

JCM: Depois do EP “Setúbal”, que produziram e resolveram distribuir de forma quase caseira, existem planos ou propostas para outros lançamentos? TP: Há coisa no ar. Mas isto é tipo jogador da bola. Isso é o nosso empresário que está a tratar… JCM: Têm descoberto na internet, e nomeadamente no MySpace, a globalização que essas platafor mas anunciam para os novos artistas? Do estrangeiro têm chegado boas criticas ou eventuais contactos? TP: Que tenhamos conhecimento, houve já criticas na imprensa catalã e também numa revista columbiana de seu nome “Magazine69”. Nome interessante.

No mesmo sítio podem encontrar mais informações sobre a banda. As imagens que acompanham a entrevista foram feitas por José Carlos Marques durante a primeira actuação dos “The Portugals”, na freguesia de Junqueira - Vila do Conde.

JCM: Obrigado TP: Obrigado nós!


SHAREMAG

Couchsurfing www.couchsurfing.com Por Catarina Sousa - Imagem de José Carlos Marques

Participação na criação de um mundo melhor, um sofá de cada vez... Poderá parecer um slogan de uma promoção de sofás do IKEA – dentro do conceito da publicidade de crise ou publicrise (um sofá de

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cada vez...) – mas trata-se efectivamente do lema ou missão do projecto Couchsurfing. Em tom maior, trata-se de um projecto pioneiro que transformou as ideias quiméricas e esperanças vãs de outrora em realidade no tempo actual, é um projecto que atesta as vantagens de viver na sociedade em rede – convém referir que sou também consciente das desvantagens desta sociedade em rede, mas como escolhi adoptar neste texto devido ao contexto, um ritmo e musicalidade em tom maior, deixo o tom menor e melancólico para o lado -. Sendo assim, o projecto Couchsurfing fomenta uma consciência de um mundo em aberto que procura ligar pessoas e lugares. Em síntese, trata-se de uma comunidade que abraça a sabedoria que é oferecida em bandeja de prata pela troca

cultural, com o intento de tornar abrangente a visão sobre o espaço terrestre. É um bom projecto-horizonte. Mais de um milhão de pessoas provenientes de 231 países praticam este desporto, o surf de sofás. Surfar em sofás? Quando ouvi isto pela primeira vez, hesitei , o surf não é um desporto que me fascine, ou deixou de me fascinar quando o experimentei, - as ondas bravas do Atlântico em conjunto com a minha pouca habilidade deramme a conhecer a sensação que tem a roupa suja dentro de uma máquina de lavar, ela sai limpa, eu saí branca. - Enfim, comecei pelo projecto-primo Hospitalityclub, tem a mesma filosofia, mas menos praticantes e donativos, porém é um projecto com raça (não há amor como o primeiro!). Deram-me a conhecer o significado, imaginei o significante, quis imediatamente experimentar o conceito. Então a minha primeira experiência... Com receio por ser virgem, fui bem acompanhada. Em p ro p o r ç ã o, g e o g r a fi c a m e n t e falando, posso dizer que se tratava de uma diáspora ibérica. Duas portuguesas na dianteira e três espanhóis na traseira de um automóvel FIAT, alugado em Itália, país de origem da marca automóvel e ponto de partida desta viagem. “Vai que é para aprenderes!” era a mensagem do programa de mobilidade de estudantes – ERASMUS – de que todos dentro do FIAT fazíamos parte, tentámos ser fiéis ao lema do programa... Contrariando o dolce fare niente da terra onde escolhemos ex p e r i e n c i a r e s t e p ro g r a m a europeu, tentamos pôr o pé na estrada, traduzo e digo em português, porque “On the Road” só utilizarei quando desmistificar a obra prima de Kerouac e atravessar os Estados Unidos de costa a costa. -Um sonho que como praticante do desporto de surfar nos sofás torna-se possível e acessível . A rota estava pseudo-traçada (das poucas coisas que dá gosto que seja pseudo), os poucos pontos assinalados no nosso mapa eram as cidades onde viviam os hospitaleiros que não se importavam de receber cinco boémios hedonistas, ainda por cima latinos, com afabilidade nas suas casas ou jardins. Tivemos sorte porque ficamos sempre dentro de casas, era um Inverno chuvoso e frio. Após catorze horas de viagem, que se pensa que percorremos muitos kilómetros, atravessamos


alguns países,não... recorde-se que se trata de uma diápora ibérica, ou seja, saímos de Parma, norte de Itália – o ponto de partida; Lausanne, Suiça – o primeiro destino, segundo o cálculo do guia Michelin demora-se 6/7 horas, nos-otros fizemos em 14 horas. Porquê? Que magia terá sido esta? Fácil: Nós ao volante, los otros com o mapa, uma estrada cortada, intuição desorientada de los otros com mapa, imagine-se sem... entramos na Suiça pelo lado direiro do lago Maior, em italiano Maggiore, um dos principais lagos alpinos e segundo maior lago italiano. Precioso! dizíamos em uníssono porque coincidia a língua! O sol já iluminava o outro lado do mundo, mas o lago era o nosso companheiro, de noite e de dia, sempre do nosso lado esquerdo, o do coração. Estavamos a delineá-lo, fizemos a conta e tinha 170km de perímetro, todos em uníssono: que precioso! No meio das contas, iluminados por uma lua quase cheia e céu limpo, tive um momento ao volante que percebi o quão maravilhoso deverá ser viver a reforma na Suiça, aquela paz e tranquilidade, as casinhas nos vales iluminadas pela lua, que me recordava a Heidi... Estava a viajar no tempo...a viagem foi interrompida quando vejo “bambis” (cervos) a fugirem da única luz na estrada, que era a dos faróis do nosso FIAT. Uma delícia. Estavamos na Suiça! “Parole, Parole...” de Mina, diva italiana, tocava em uma qualquer rádio italiana, e s t ava m o s a ch e g a r n ova m e n t e a Itália...”Parole,Parole...” Atravessamos três fronteiras, Itália – Suiça; Suiça –Itália; Itália – Suiça; O que nos valeu é que estavamos com um espírito epicurista e claro, tínhamos uma boa banda sonora, entre o Dylan que nos dizia “Ho-oow does it fe-e-eel, be without a ho-o-ome, like a complete unknown...like a rolling stone!” ou o Cohen que com a sua voz de barítono nos hipnotizava com “Hallelujah”. Hallelujah!!Chegamos finalmente ao nosso primeiro destino! Lausanne – na Suiça , parte francesa. O nosso primeiro hospitaleiro, Pascal, já pensava que tínhamos desistido da ideia de conhecer a sua cidade. Conforme nos tinha dito, quando o contactamos através do site para solicitar a sua hospitalidade, ele tinha que ir a França em trabalho e saía muito cedo para voltar somente para jantar. Não o conseguimos encontrar, mas falamos com ele por telefone, e sem nos conhecer, Pascal deixou a sua chave de casa debaixo do tapete, para nós...os cinco desconhecidos, entrarmos e pousarmos as tralhas e sobretudo, descansarmos. Foi uma sensação estranha, entrar em casa de alguém que não conhecíamos, mas que já só o admiravamos pela sua confiança e d e d i c a ç ã o. . . c a m a s f e i t a s, c o l ch õ e s alinhados, cobertas coloridas no único quarto da casa. Imagine-se, receber cinco desorientados no seu próprio quarto, estavamos todos muito curiosos e

entusiasmados para conhecer a per sonagem. Decidimos de pois de descansar fazer uma surpresa ao Pascal, um jantar ibérico. EMENTA: Entrada - tortilla de patatas espanhola e sopa “à portuguesa” ( nome criado quando os italianos experimentaram o vulgar creme rico em legumes – e encantados exclamaram: “bella sopa fatta per le portoghese!”) . Prato principal - o famoso bacalhau “à Nelo”, uma receita do nosso humorista português Herman José, que é infalível. Sobremesa – gelado e chocolates de marca suiça. Bebida – Vinho do Porto para aperitivo e Lambrousco italiano para o jantar. O jantar estava pronto, mesa posta, só faltava o convidado especial, que era o dono da casa. Ouvimos uma chave na porta e nervosos como se fôssemos intrusos, ficamos quietos e imóveis na cozinha à espera que chegasse o hospitaleiro. Pascal entrou na cozinha e timido pela inversão de papéis, disse em Inglês, com um sorriso e um trato lhano quando viu a mesa colorida e sentiu o cheiro do pitéu ibérico: “You have made this for me?” “For sure Pascal!”, quebrou-se o gelo e a partir daí disfrutamos todos daquele pitéu e naturalmente iniciamos um intercâmbio e entendimento cultural. Todos estavamos com vontade de trocar experiências e abrir as nossas portas. Conselhos do hospitaleiro para vermos o que está para além dos guias turísticos, mais uma das vantagens de viajar e praticar este desporto, é que conhecemos o sítio na sua essência e não como um turista. Claro que é preciso ter sorte na escolha do bom hospitaleiro. Mas alguém que monta um acampamento no seu próprio quarto para albergar cinco convidados, por duas noites, tem que ser um bom hospitaleiro. E foi. A primeira experiência foi muito positiva e a partir daí claro que não hesitei e fiquei adicta a este desporto, que é extremamente saudável. Sozinha ou acompanhada percorri onze países como convidada e de cada experiência tenho histórias inesquecíveis que dão para vários capítulos de um livro – o da minha vida, claro. Desde ter ficado em casa de um ciclista holândes, em Amesterdão, cuidando dos seus gatos e plantas enquanto o senhor, já com quase 60 anos dava à volta a Alemanha em bicicleta, porque o vento soprava a favor...Na casa

dele fui pela primeira vez hospitaleira de um casal que chegava à boleia de Moscovo, para ficarem eles a cuidarem da “Tareca” e do “Gaspar” (os nomes dos gatos que tívemos baptizar , porque esquecemo-nos dos nomes no original), e das plantinhas que um holandês preserva tranquilamente no seu terraço. Ou conhecer em Viena de Áustria um sociólogo que fazia de Pai Natal nas ruas durante o Natal, e me ensinou a fazer churrasco com um carrinho de compras...levou-me a uma festa de inauguração de uma casa em pleno centro de Viena, uma casa recém habitada por um indiano, um japonês e um austríaco, que como regra para a entrada, tínhamos que contribuir para o monte de sapatos, uma instalação logo à entrada da casa...descalçamo-nos e deixamos os sapatos à entrada. Uma tradição e um glamour austríaco que nunca conheceria se tivesse ido para Áustria como turista. Na Grécia uma actriz de teatro alojou-me mesmo no centro de Atenas e

“CouchSurfing is a worldwide network for making connections between travelers and the local communities they visit.” Mais informações no endereço Couchsurfing da internet.

proporcionou-me a visão deste país como o berço de nascimento do teatro ocidental, conheci este berço de perto. Enfim, como convidada neste surf de emoções e partilha de cultura, as experiências aumentaram a minha bagagem, e fizeram o bichinho da gana de conhecer mundo que tenho dentro de mim, crescer. Só desde que vivo em Barcelona é que pratico este desporto como hospitaleira. É muito enriquecedor, porque não preciso sair de Barcelona para conhecer mundo. Já recebi um americano, que me ensinou a jogar Xadrez, uma finlandesa que me deu vontade de conhecer esse país sem sol, e um coreano que me deixou um postal do seu país, um bom modo de publicitar e espalhar as belezas do próprio país. Os meus convidados não são hospitalados por uma natural da Catalunha, mas também Barcelona é uma cidade do mundo. Agora preparo-me para uma viagem que pretendo desmistificar, percorrer alguns kilómetros da mítica route 66, e claro que é um conforto saber que no outro lado do oceano, vou encontrar pessoas que participam na criação de um mundo melhor, e de sofá a sofá vou realizando alguns dos meus sonhos.


CONTACTOS: Espaço d’Mente Rua da Fortaleza, nº20 4490-511 Póvoa de Varzim www.varazimteatro.org http://blog.varazimteatro.org vt@varazimteatro.org

Varazim Teatro

252622192 ou 916439009

Por Joana Soares - Imagens de José Carlos Marques

Sentamo-nos nas cadeiras, do lado de cá do palco, deste tempo que contamos, espelham-se os dias nos rostos que estão nas poltronas sentados. Teatro que se desenha ao longo dos anos, sonho que se procura, vida que se pesquisa, a cada momento que acontece, deste lado, no do palco, no das luzes, no tempo em que outros mundos amanhecem, a pensar os nossos, a espelhar a vida. Há quase 12 anos que a aventura começou, umas quantas pessoas sonharam esta realidade que hoje é concreta, fizeram-se ao caminho sem mapas, sem bússolas apenas um roteiro nos olhos que brilhavam, e a crença de que aquele era o seu caminho, fosse qual fosse a meta. Fazer acontecer o teatro numa cidade que é a nossa, mostrar mundos, criar vida com vidas, contar histórias, realidades outras que nos tocassem e que ao serem contadas fossem ponte que liga o lado de cá, ao de lá, onde o outro existe. Depois de alguns espectáculos criados e de a boca em desabafo sentir que ainda

carecia de teatro a cidade, foi-nos lançado o desafio com um: façam-no que nós apoiamos. Recebemos de coração aberto e de mangas arregaçadas a tarefa de trazer à cidade cada vez mais teatro. Quem quer sabe, que é ao primeiro sábado que o palco se ilumina, primeiro o do saudoso CineTeatro Garrett e hoje o do Auditório Municipal, onde cada vez mais cadeiras se ocupam, vêm de vários lados, acolhendo-os a cidade e as histórias que no palco se vivem e se contam. Com orgulho as cenas montam-se e desmontam-se, constroem-se palácios, guetos, salas, ruas e o suor no nosso rosto não esconde a alegria com que acolhemos cada companhia que nos visita. Com este desafio tornamo-nos um pouco maiores do que as nossas primeiras ambições tornamo-nos aquilo que se chama uma companhia mista, produzindo os nossos espectáculos e programando espectáculos mensalmente em forma de temporada. De lado de cá, foi sempre nossa preocupação dar a conhecer, textos, autores, novas formas de ver o teatro e a

vida. Mais do que entreter, fazer pensar, fazer sentir, fazer com que o teatro perdurasse como ideia para lá do momento em que se apresenta. Convidamos encenadores, procuramos autores, tornamo-nos autores, acreditamos que temos algo a fazer, a dizer, a propor. As horas fazem-se dias, os dias fazem-se noites, as noites tantas madrugadas, em que o pano se fecha e atrás do pano a labuta continua. Ao longo do tempo tornamo-nos mais exigentes, procuramos formação e informação, pesquisamos o teatro e a vida, sempre a vida, mote para todas as histórias. Os rostos foram mudando, o grupo tomou novas formas, a vida, também ela, leva alguns para outros projectos, outros momentos, outras histórias. Do lado de cá do palco há rostos e há pessoas, gente com carne, com ideias, gente que se dobra e desdobra e voluntaria-se neste querer fazer, neste querer acontecer no palco e nos dias de outra gente. Do lado de cá, vão-se construindo momentos, realidades efémeras para ideias que se desejam eternas.


Maio/Junho 2009 Joana Soares, em “Sede”, 2008 (na página anterior) Eduardo Faria, em “O Rei Imaginario ou a Ausência de Deus”, 2005 (ao lado) Eduardo Faria e Neusa Fangueiro durante a apresentação do número 1 da publicação “Sub-Texto”, 2008 (em baixo)

As nossas mais recentes conquistas, foram um novo espaço onde o Teatro já acontece, um Espaço d’Mente, o É-Aqui-in-Ócio, Festival Internacional de Teatro na Póvoa de Varzim que contou com 2 edições - a primeira em 2007, e uma Publicação de Reflexão Cultural de nome Sub-Texto que contou também duas edições, uma numerada com Zero comemorando os 10 anos do Varazim Teatro. Projectos que não sabemos se têm hipóteses de continuar, mas para os quais dedicamos cada dia do nosso trabalho. Persistimos nos dias, tantas vezes difíceis, na dor que provocam os comentários de quem é alheio de que é de pessoas que se trata, apenas isso, somos um ‘nós’ que procura chegar a um ‘vós’ algo vago e indefinido, que nos ocupa o pensamento, um ‘vós’ imenso, de ideias várias a quem o teatro se destina, e este chegar aí toma forma e é o sentido de cada uma das tarefas que nos ocupa. Cada um de nós é tantas coisas, nesse desdobramento de que falo, sabe estar no palco, e atrás dele, com a cortina aberta ou fechada, sobre as tábuas, sobre o tempo e sobre a memória. Sonhando e trabalhando para um tempo em que todas as horas do dia possam ser dedicadas a esta arte que tantas artes faz encontrar. Acreditamos e por isso persistimos, neste voluntário trabalho, amamos sobre tudo o Teatro, essa arte, que acontece e que é feita de alma, de força e de vida. Acreditamos que o teatro é o nosso caminho para chegar até aí! Em 12 anos, realizamos 35 produções, trouxemos à nossa cidade em torno de 150 espectáculos, conquistamos espectadores, levamos ao palco pela primeira vez tantos actores...

Hoje colaboram com o Varazim Teatro esta mão cheia de gente: Eduardo Faria (Director, Programador, Actor, Encenador); Maria Maio (Tesoureira, Actriz); Joana Soares (Produção, Design/Cenografia, Actriz); Maria Antónia (Actriz); Guilherme Novo (Técnica); Joana de Sousa (Produção, Actriz); Walter Martins (Músico, Actor); Zita Corrêa (Secretariado, Actriz) Rui Alves Leitão (Produção, Músico) Neusa Fangueiro (Actriz)

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Para ouvir algumas músicas dos “Porto Ruby” e estar a par das novidades e das datas dos concertos pode visitá-los em www.myspace.com/portoruby.

Porto Ruby Por Bruno Neiva - Imagem de José Carlos Marques

Pedro Zappa, contrabaixista, tem um gato preto que, dadas as circunstâncias, chamase preto. Carlos Semedo, guitarrista e menino do coro, não se importa que lhe reboquem a viatura durante as actuações – são peripécias como estas que possibilitam a construção de um mito, o dos Porto Ruby. Sara Macedo, chanteuse, tem um vizinho que deixa o lixo à porta de casa, todos os dias, às 3 da tarde (facto, vá lá, caricato, mas que pouco contribui para a sua dimensão icónica de pin-up do litoral norte). Porto Ruby. Porto Ruby. Porto Ruby. Bom, adiante. Os 3 elementos da Porto Ruby apreciam os álcoois de Apollinaire, mas não convém que os papás e as mamãs tomem conhecimento deste facto que, afinal, à luz de algumas teorias pós-modernas, não passa de um mero revivalismo tóxico. Dia 14 de Fevereiro de 2009. Porto Ruby ao vivo no Maxim’s. Sem playback, só para os namorados. Estreia absoluta deste promissor trio indo-europeu. Que dizer desta inesquecível performance da banda

seminal Porto Ruby? Bons, as trocas de fluidos falam por si. Porto Ruby. Porto Ruby. Porto Ruby. Mas porquê “Porto Ruby”? Aliás, porque raio Porto Ruby? Bom, certo dia, o trio, sob influência do sempre terno cálix de vinho do Porto, decide homenagear este pequeno objecto delirante. Não se sabe bem ao certo quem foi o primeiro dos 3 elementos a sacar do nome – por isso, e porque nestas matérias convém que sejamos politicamente correctos, afirmámos que o nome foi pensado simultaneamente pelos 3, bem como gritado para o ar em uníssono numa das mesas do Ritz (sim, uma daquelas com sofá à volta em quarto crescente ou minguante). Após a actuação órgica no Maxim’s, Porto Ruby deslocou-se à Cooperativa de Cultura A Filantrópica (a uns 100m do mesmo Maxim’s), ao Lótus (em Esposende) e ao Fusão (em Vila do Conde), estes dois últimos sem Pedro Zappa, gripado, em noites de champagne e bicos de pato. Após a consagração segue-se a presença regular

nas noites do Grande Hotel e um ou outro pezinho de dança no Dali Daki. Porto Ruby. Porto Ruby. Porto Ruby. Uma b a n d a q u e n ã o ro u b a , q u e p e d e emprestado educadamente canções que para todo o sempre irão ser trauteadas pela Via Láctea fora. Do charme gangster de Frank Sinatra à diva do playback Britney Spears, da suavidade – pomada de Caetano Veloso ao desafinar de Bob Dylan, da anca de Nina Simone aos aranhiços de David Bowie, das quebras de tensão dos Jefferson Airplane aos desamores de bar de hotel de Leonard Cohen, dos blues cubistas de Tom Waits às negras distâncias de uns Depeche Mode. Porto Ruby, uma banda de couverttes para o bem e para o mal, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na praia e no campo, com ou sem talheres, feito na hora ou aquecido, pago a pronto ou em leves prestações, com abas ou com asas…


Sara Macedo, Carlos Semedo e Pedro Zappa (à direita) As imagens foram feitas durante a actuação dos “Porto Ruby” no “Dali Daki” - Póvoa de Varzim

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SHAREMAG

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Grita!! desenho de edvard munch Por Ricardo Campos


AGRADECIMENTOS FOTOGRAFIA ESTENOPEICA OLÍVIA DA SILVA RUI PINHEIRO ELISA PINHÃO FERREIRA JOÃO LEAL JOSÉ CARLOS MARQUES VIMUS 8 E MEIO MAFALDA MARTINS MESTRADO RESPIGADORES LAB.65 NUVEM VOADORA INES GUEDES MANHÃ MANHÃ JOANA BELEZA MARIANA MARQUES THE PORTUGALS CATARINA SOUSA VARAZIM TEATRO PORTO RUBY RICARDO CAMPOS ANTÓNIO CAMPOS LEAL MARK DURDEN RAQUEL DA SILVA MARIA DO CARMO SERÉN HILÁRIO AMORIM MARCO SANTOS ARNALDO PEDRO PEDRO VAZ DA COSTA EMA RIBEIRO JOAQUIM MAIA GIL PAULO BARRETO MANUEL JUSTO JOANA SOARES SARA MACEDO CARLOS SEMEDO PEDRO ZAPPA BRUNO NEIVA

FAÇA PARTE DA SHAREMAG A SHAREMAG ESTÁ ABERTA A COLABORAÇÕES. ENVIE-NOS AS SUAS PROPOSTAS DE CONTEÚDOS COM IMAGENS EM JPG, TEXTOS E DADOS PESSOAIS PARA JCGMARQUES@GMAIL.COM. A SUBSCRIÇÃO DA SHAREMAG É GRATUÍTA E SERVE UNICAMENTE PARA NOTIFICAR OS SUBSCRITORES DE CADA PUBLICAÇÃO DA SHAREMAG. A DIVULGAÇÃO DA SHAREMAG É FEITA ON-LINE ATRAVÉS DE MAILING LIST E POSTS NOS SITES DOS COLABORADORES E SIMPATIZANTES DO PROJECTO.


#01

Maio/Junho

2009


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