A hora da travessia

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SENADO FEDERAL

SENADORA SIMONE TEBET

Sei que o momento é grave, mas sei também que todos os povos e países enfrentaram, enfrentam e enfrentarão momentos como este ao longo de sua história. Os que não conseguem superá-los, sucumbem. Aqueles que conseguem extrair de dentro de si mesmos, de sua história, de suas tradições, de suas instituições, a força necessária para enfrentar e vencer esses momentos, esses são os povos e países que desempenham um papel relevante na história universal.

A HORA DA

TRAVESSIA Brasília – DF


Senado Federal Senadora SIMONE TEBET

A hora da travessia

Brasília – 2017



Ofereço estas reflexões aos homens e mulheres que fundaram e conduziram meu Partido – o partido da redemocratização – durante um dos períodos mais dolorosos da história brasileira. Ao longo da noite mais densa, no difícil caminho rumo ao amanhecer, eles mantiveram acesa a chama que não se pode apagar. Hoje, quando a política se encontra, mais uma vez, acuada e desafiada a promover uma nova travessia histórica, cabe a nós conduzir e proteger essa chama. Que saibamos responder ao chamado da História, como eles o souberam, em seu tempo. Foram suas vidas que me inspiraram a ingressar na vida pública, e é a eles que agradeço, neste momento, ao invocar dois nomes em que, espero, se reconheçam todos os lutadores da Democracia, de ontem e de hoje. Obrigada, Ulysses Guimarães – guia de todos nós. Obrigada, Ramez Tebet – guia do meu coração.



A Nação quer mudar, a Nação deve mudar, a Nação vai mudar. A sociedade sempre acaba vencendo, mesmo ante a inércia ou antagonismo do Estado. A História nos desafia para grandes serviços, nos consagrará se os fizermos, nos repudiará se desertarmos. Ulysses Guimarães



Preâmbulo Esta publicação reproduz, em forma revista e, de certa forma, ampliada, discurso que pronunciei no Senado Federal em 07.11.2017. Naquele dia, falei sobre o que considero o cerne da grave crise que acomete o Brasil neste momento histórico tão tenso, denso e difícil. Falei seguindo mais o ritmo do meu coração do que obedecendo a qualquer esquema prévio de pensamento. Sempre que falo da Tribuna do Senado – esse pedacinho de chão sagrado da democracia, onde se pronunciaram grandes figuras da política brasileira – prefiro fazê-lo assim. Num discurso, o orador não está presente somente com seus pensamentos, mas com todo o seu corpo e sua alma, que se manifestam em gestos e tons de voz que contribuem para constituir o sentido e a verdade do que é dito. Ao decidir transpor este discurso vivo para o papel – e o faço por estar cada vez mais convencida da importância do que nele se discute –, não posso contar com o apoio dos gestos e da voz para me fazer entender. Preciso, portanto, retomar e explicitar os fios lógicos e argumentativos que fundamentam tudo o que foi dito. 7


O que aqui se reproduz, portanto, ao mesmo tempo é e não é o discurso pronunciado em 07.11.2017. Não é, porque o texto apresentado não corresponde estritamente, na forma, ao que foi dito. Mas – o que para mim é mais importante – este é, sim, o mesmo discurso, pois o seu conteúdo está plenamente preservado, e exposto da maneira que me pareceu mais apropriada para o seu pleno entendimento. É um discurso. É uma meditação. É um apelo. Minha intenção, ao publicá-lo, não é simplesmente a de divulgar a minha própria voz. Meu propósito – e minha esperança – é provocar a manifestação de outras vozes, que venham se juntar a esse esforço para entender e superar os desafios que a História nos apresenta. Porque, na História, as vozes e os caminhos solitários não contam. Senadora SIMONE TEBET

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A HORA DA TRAVESSIA Já algumas vezes tenho usado, na Tribuna do Senado, o termo anomia social para me referir à atual situação do Brasil, que alguns definem como crise. Eu prefiro utilizar o termo anomia, porque tem a capacidade de englobar e explicar esta crise, que tem múltiplas facetas, que é uma e muitas ao mesmo tempo. Se perguntarmos para um desempregado, ele vai dizer que a crise é econômica; para os menos favorecidos, que estamos diante de uma crise social; se perguntarem para nós, diremos que a crise é política; perguntem a um cientista político, e ele dirá que a crise é institucional. Mas a crise, como unidade, é mais difícil de ser visualizada. E ela só pode ser explicada por sua causa. A causa maior é a anomia que grassa no seio da sociedade brasileira. Para a Sociologia, o estado de anomia representa uma situação em que as normas e leis simplesmente não mais importam, perderam a sua capacidade de organizar a sociedade e orientar a vida dos cidadãos, que não veem mais sua vontade refletida nessas normas e leis. Não é que as normas sejam desrespeitadas ou infringidas – isso se chama delito ou crime – elas são, simplesmente, ignoradas.

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O estado de anomia representa uma situação em que as normas e leis simplesmente não mais importam, perderam a sua capacidade de organizar a sociedade e orientar a vida dos cidadãos, que não veem mais sua vontade refletida nessas normas e leis.

A anomia afeta a totalidade social. Num estado de anomia, é a sociedade como um todo que perde sua coesão, o respeito às normas e leis e às instituições, levando à falência dos freios sociais. Nesse estágio, a sociedade já não sabe o que é justo ou injusto, legítimo ou ilegítimo, certo ou errado. Essa fragilidade da ordem leva à incapacidade do Estado de cuidar da segurança dos cidadãos, e mesmo de garantirlhes as condições mínimas para a sua vida e o seu trabalho, comprometendo as suas próprias bases existenciais e levando insegurança e temor ao seio das famílias. Dessa forma, Estado e sociedade perdem o sentido do seu presente e, por conseguinte, perdem a capacidade de projetar seu futuro. Perdem, em suma, a sua alma. Para a Filosofia, a alma é a forma do corpo, é aquilo que transforma a matéria inerte, por exemplo, em um ser vivo. No caso do ser humano, vivo, gregário e racional. Quando uma sociedade perde a sua alma, ela perde a sua forma, aquilo que lhe permite se desenvolver. Num estado de anomia social, não cabe perguntar quem perdeu a sua alma, pois todos a perderam: o Estado, as instituições, e cada um de nós. 10


Na vida social, cotidiana, esse estado de anomia tem se mostrado com clareza até excessiva nos conflitos políticos e ideológicos que dividem hoje a sociedade brasileira com uma virulência inédita, erguendo muros que parecem intransponíveis, afastando amigos, dividindo famílias, disseminando um discurso de ódio que não abre espaço para qualquer tipo de diálogo. Ninguém ouve a voz e as razões do outro, e, quando ouve, ouve apenas aquilo que lhe interessa, não aceita o contraditório, não aceita a diferença.

Num estado de anomia social, não cabe perguntar quem perdeu a sua alma, pois todos a perderam: o Estado, as instituições, e cada um de nós.

Na vida política e institucional, a sociedade assim fragmentada não acredita mais nos poderes constituídos, e isso é extremamente perigoso. Esse estado de anomia leva a que os vários segmentos sociais busquem fazer suas próprias regras, escolham suas lideranças – muitas vezes, falsos profetas, mercadores de ilusões, fabricantes de desastres. Tudo isso já seria suficientemente grave. Mas o que eu quero dizer, com profunda tristeza, é que, hoje, o Brasil já se encontra um passo além dessa anomia social. Para definir a nossa verdadeira situação, ouso utilizar um termo, e afirmar, com a licença dos sociólogos e cientistas políticos, que vivemos hoje uma anomia institucional. Com isso, quero me referir a uma perda de alma que está desfazendo, por 11


dentro, as instituições brasileiras, os Poderes constituídos – constituídos, sempre é bom lembrar, pelo constituinte originário, o povo brasileiro, que consubstanciou, no texto constitucional, um desenho de País e um projeto de Nação, que hoje, como nunca antes desde a promulgação da Constituição Cidadã, encontramse ameaçados. Em estado de anomia institucional, os Três Poderes da República mergulham em situação de perda de identidade. Ou de identidade embaralhada, quando um Poder ocupa os vazios deixados pelos demais, fruto, muitas vezes, da inoperância a que se reduziu, em anos recentes, a atividade política e a atuação pública como um todo, em especial naqueles segmentos que se sustentam no voto popular, casos dos poderes Executivo e Legislativo. Analisemos cada um dos Poderes Constitucionais. E, por questão de delicadeza, comecemos pelo nosso, o Poder Legislativo.

Em estado de anomia institucional, os Três Poderes da República mergulham em situação de perda de identidade. Quando se pode dizer que o Poder Legislativo perdeu sua alma, seu norte, seu rumo? A alma do Legislativo é ser a representação da vontade popular em suas múltiplas facetas e manifestações. Aqui estão – ou deveriam estar – representados todos os segmentos da sociedade, todos os projetos que, numa democracia, devem encontrar o seu lugar de debate, de disputa e, quando possível, de consenso. Ao final das eleições para o Legislativo, se cumpre o ideal da 12


democracia: o governo da maioria, com pleno respeito ao direito das minorias. O Legislativo, então, perde a sua alma quando se deixa levar pela fúria legiferante dos demais poderes, como nas edições desenfreadas de Medidas Provisórias pelo Executivo, nem sempre arquitetadas sob os preceitos constitucionais de relevância e urgência; perde ainda mais sua alma quando nós mesmos transformamos essas Medidas Provisórias em verdadeiras colchas de retalhos, incluindo emendas que pouco ou nada têm a ver com a matéria principal, muitas vezes para atender interesses nada republicanos; perdemos a alma quando deixamos Medidas Provisórias trancarem as pautas, paralisando a discussão de outros assuntos de relevância para o País: segurança, saúde, educação, políticas sociais, etc. O Legislativo perde a sua alma quando deixa de representar anseios coletivos legítimos e passa a representar interesses individuais ou de grupos de pressão que defendem apenas seus objetivos específicos. Ou, por outro lado, quando perde a capacidade de atender às demandas sociais, e passa a legislar de forma alheia ou mesmo contrária a elas. Ou, simplesmente, quando deixa de atuar, e ingressa no vazio – o que já chamei, um dia, de "limbo". O Legislativo perde a sua alma quando deixa de respeitar os seus próprios códigos de conduta. Quando seus regimentos internos, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Congresso Nacional, tornam-se letras mortas. Ou quando são 13


interpretados ao sabor dos interesses individuais e imediatos. Ou, ainda, quando se desrespeitam hierarquias e atribuições legais e legitimamente definidas. Cito três episódios recentes que refletem a confusão atual: um Deputado Federal assume a Presidência da Câmara e, sem legitimidade para isso, afirma para todo o Brasil, com os microfones abertos, que, por sua exclusiva vontade, não mais haveria sessão já convocada do Congresso Nacional – que, como se sabe, é presidido pelo Presidente do Senado; um Senador, ocasionalmente dirigindo os trabalhos da Mesa Diretora, faculta a palavra a um não-Senador, como se Senador fosse; Senadoras da República ocupam as cadeiras da Presidência e da Mesa Diretora, e impedem, durante quase toda uma tarde, que mais de setenta Senadores pudessem exercer o seu direito e o seu dever de votar projetos que a maioria considerava relevantes para o interesse nacional. Ao não respeitar as regras de procedimento que nós mesmos criamos, perdemos a capacidade de discernir entre o que é certo e o que é errado. Perdemos, pior ainda, a legitimidade para exigir da sociedade o cumprimento das leis que concebemos em seu nome. São sementes de anomia que semeamos na terra fértil da democracia. O Parlamento perde a sua alma quando limita as atribuições que lhe confere a Constituição Federal, tonando menor o que se convencionou chamar, não por acaso, “Carta Maior”. É o caso, por exemplo, da demora da Câmara dos Deputados em pautar projetos de iniciativa do Senado Federal, numa interpretação, ainda que velada, de que cabe ao Senado, tão somente, o papel 14


de casa revisora. Sendo assim, os senadores veem cassado, por seus próprios pares de Parlamento, o direito constitucional da iniciativa de legislar. E a “Casa Maior” também se torna menor. Em qualquer dos casos, o Parlamento perde a confiança do cidadão e da sociedade, potencializando a anomia que já grassa no seio da cidadania. Ao perder essa confiança, entretanto, o Legislativo também, como instituição, perde função, e ingressa ele mesmo no estado que estou chamando de anomia institucional. Nesse caso, não são só os cidadãos que não confiam em nós. Nós mesmos estamos demonstrando que não confiamos.

Ao não respeitar as regras de procedimento que nós mesmos criamos, perdemos a legitimidade para exigir da sociedade o cumprimento das leis que concebemos em seu nome. São sementes de anomia que semeamos na terra fértil da democracia. O Executivo, por seu lado, perde a sua alma quando, ao invés de representar um projeto coletivo, passa a atuar também segundo interesses privados de dirigentes de partidos políticos ou de grupos. Neste caso, vale lembrar: a coalizão entre partidos e projetos é legítima, desde que os partidos e projetos coligados tenham objetivos legítimos, vale dizer, tenham fins públicos, jamais privados, no seu propósito de união. Se esses partidos, entretanto, se transformam em puros grupos de interesses pessoais, e se os projetos deixam de ser coletivos para atender a interesses outros, o que hoje se chama “presidencialismo de coalizão” deixa de ser uma forma legítima de governar e se torna uma perversão da democracia, onde a barganha, o balcão de negócios e as negociatas tomam o lugar de um projeto comum de nação. 15


Quanto ao Poder Judiciário, que hoje assume um papel de protagonismo jamais visto em nossa história, quando podemos dizer que ele perde a sua alma? Não cabe ao Judiciário nem a feitura das leis, que deverão ser seguidas por todos, nem a execução de políticas públicas, que afetarão a vida de todos. Cabe ao Judiciário, que não se sustenta no voto popular, atuar, justamente, como Juiz. Por isso, o seu símbolo é a balança. No que diz respeito às leis e às políticas públicas, deve o Judiciário, unicamente, fazer cumprir as leis – definidas pelo Legislativo – e julgar a sua execução pelo Poder competente – o Executivo. Nesse papel de juiz, de fiel da balança, o Judiciário não pode, por definição, se deixar levar por paixões ideológicas, políticas ou partidárias. As virtudes do Judiciário, portanto, são o equilíbrio, a moderação, a equidistância em relação às posições em disputa, além, claro, do irrestrito respeito à Lei. O Poder Judiciário perde a sua alma quando, como visto nos últimos tempos, inúmeras vezes, ele inova em matéria legal – competência do Poder Legislativo – ou determina o rumo de políticas públicas – competência do Poder Executivo (isso serve também para o Ministério Público). Se antes me inspirei na Sociologia e na Filosofia, busco agora a Política, para resumir: se o Legislativo e o Executivo perdem a sua alma, e ingressam em estado de anomia institucional, ao deixarem de cumprir suas funções, o Judiciário perde a sua ao chamar para si, indevidamente, as funções alheias, e ao assumir, no âmbito das instituições democráticas, um protagonismo que não lhe cabe, pois o verdadeiro protagonista, numa democracia, é o voto popular. 16


Se o Legislativo e o Executivo, hoje, pecam por não representarem devidamente os seus eleitores, o Judiciário peca por pretender representá-los sem os votos para tanto; peca por pretender exercer poderes que constitucionalmente não lhe cabem. Não se constrói um País, não se definem caminhos legais, não se executa qualquer projeto de Nação pelo excesso penalista e punitivista, fazendo inserir no corpo do Código Penal normas estranhas ao nosso ordenamento jurídico e promovendo interpretações que não encontram nenhuma base histórica no Direito pátrio. Repito: quando os Poderes perdem sua identidade, ou quando suas identidades se encontram embaralhadas, e a luta por espaços de poder se torna uma luta de todos contra todos, estamos num verdadeiro estado de anomia institucional. Lembro que Durkheim consolidou a sua teorização sobre a anomia social no âmbito dos seus estudos sobre o suicídio, que, segundo ele, além de constituir um evento individual, é sintoma de graves fraturas no tecido social. Não considero temerário dizer que, no caso da anomia institucional, poderemos assistir em breve – caso ela não seja combatida – ao suicídio das nossas instituições. Vou além: ao assassinato da nossa jovem democracia.

A recuperação das instituições, e, com elas, da própria democracia brasileira, exigirá um trabalho político de amplo espectro e de largo fôlego, onde cada um de nós, sem abdicar de suas convicções políticas e ideológicas, precisará, mais do que nunca, guiar sua atuação tendo em vista o bem maior do nosso país e do nosso povo. 17


Já me referi à Filosofia, à Sociologia, à Política. Quero, agora, invocar o simples Bom Senso para dizer que ainda há tempo de evitar esse crime múltiplo. Para isso, precisamos compreender, novamente, que todos fazemos parte de uma mesma Nação. Que nossas semelhanças são muito maiores do que nossas diferenças, porque o que nos une (o Brasil, o povo brasileiro, a vontade de servir e fazer o bem) é maior do que o que nos separa (nossas crenças, ideologias, nossos modos distintos de ver o mundo). Que, ao invés de continuarmos a reforçar os muros que nos dividem, possamos reconstruir as pontes que nos unam, mais uma vez, num projeto de pacificação, de desenvolvimento e de combate às desigualdades. Não suplantaremos essas desigualdades se não formos capazes, antes, de construir um verdadeiro pacto nacional que nos possibilite devolver, às instituições hoje anômicas, a sua capacidade de harmonizar e sintetizar, em um projeto nacional coerente, os vários projetos em disputa, como é próprio de uma sociedade democrática.

A tarefa é política. Portanto, nossa. E aqui eu preciso voltar a esta Casa, não apenas ao Senado, mas ao Congresso Nacional. A recuperação das instituições, e, com elas, da própria democracia brasileira, exigirá um trabalho político de amplo espectro e de largo fôlego, onde cada um de nós, sem abdicar de suas convicções políticas e ideológicas, 18


precisará, mais do que nunca, guiar sua atuação tendo em vista o bem maior do nosso país e do nosso povo. A tarefa é política. Portanto, nossa. E o primeiro passo para levá-la a cabo é reconhecer, não só a existência da crise, mas o desequilíbrio e a anomia das instituições. Precisamos reconhecer que, até agora, as instituições têm falhado no cumprimento dos seus deveres – inclusive a nossa instituição, o Congresso Nacional, e, mais amplamente, a representação política de modo geral.

Só não estão abertas para nós, neste momento, as portas da omissão e da covardia. Sei que o momento é grave. Mas sei também que todos os povos e países enfrentaram, enfrentam e enfrentarão momentos como este ao longo de sua história. Os que não conseguem superá-los, sucumbem. Aqueles que conseguem extrair de dentro de si mesmos, de sua história, de suas tradições, de suas instituições, a força necessária para enfrentar e vencer esses momentos, esses são os povos e países que desempenham um papel relevante na história universal. Sei que temos essa força e essa capacidade. Só não estão abertas para nós, neste momento, as portas da omissão e da covardia. Precisaremos de coragem, sim, para rever caminhos, e derrubar os muros ideológicos que hoje nos dividem além de qualquer medida razoável. Precisamos reconstruir as pontes do diálogo e da tolerância, e construir quantas novas pontes se façam necessárias. 19


Isso tudo só será alcançado se formos capazes de retomar a prática da boa política, a que constrói ao invés de destruir, a que promove a cooperação ao invés do isolamento e da predação. E a boa política exige amor à democracia e respeito à Constituição. Só assim poderemos promover o resgate da credibilidade das instituições perante a população e, principalmente, perante a nossa juventude, hoje tão descrente nos rumos do País. Se não formos capazes de conquistar essa juventude para atuar, como protagonista, nessa jornada pela reconquista do Brasil, qualquer trabalho que fizermos terá sido em vão. Termino, não com descrença, mas com renovada esperança, repetindo uma das frases prediletas do Dr. Ulysses Guimarães: Navegar é preciso. Que cada um de nós assuma as suas responsabilidades nessa travessia. Não sei o exato caminho que iremos tomar. Mas sei que não teremos caminho nenhum se não formos capazes de trocar a desavença pela solidariedade, a guerra de todos contra todos pela cooperação, e se não assumirmos o Brasil como Pátria comum, chão compartilhado, mesa de comunhão, para além de todas as nossas diferenças.

Se não formos capazes de conquistar essa juventude para atuar, como protagonista, nessa jornada pela reconquista do Brasil, qualquer trabalho que fizermos terá sido em vão.

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