Revista Ação - Esporte Sem Limites

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Editorial

FOTO: BANCO DE IMAGENS

GOLPE NO PRECONCEITO

É fato: muita gente acha que os skatistas são pessoas à margem da sociedade. É uma concepção formada na mente dos que não entendem esta tribo. Seja por causa das roupas, músicas que essa galera ouve ou as manobras radicais e arriscadas que realizam. Assim também acontece com o jiu-jitsu e o MMA. Afinal, era comum, no início dos anos 2000, confundir os atletas que praticam essas artes marciais com trogloditas que causavam confusão nas baladas. E esta lista segue. Um exemplo é chamar os jogadores de rúgbi de brutos, por praticarem um esporte com extremo contato físico. Já disseram, também, que o rúgbi é um esporte de selvagens praticado por cavalheiros. A capoeira, que foi proibida no Brasil no período imperial, também já escutou algo do tipo. Na contramão dessa onda de críticas, esta publicação pretende mostrar o que se passa nas ruas, quadras e campos da região de Ribeirão Preto, descrevendo as dificuldades que atletas desses e de outros esportes enfrentam, como falta de patrocínio ou de um espaço decente para a prática da atividade. Além das modalidades mal vistas, a primeira edição da Revista Ação conta histórias daquelas que não têm espaço na mídia tradicional – e não é diferente na imprensa regional, dominada pelo futebol de campo masculino. Exemplos são o basquete sobre cadeira de rodas, vôlei para a terceira idade, ginástica olímpica, esta última com destaque apenas em épocas de grandes eventos. Mesmo o Brasil tendo um atual campeão olímpico, anda sumida das telas, jornais, revistas e rádios. Os estudantes de jornalismo que produziram esse material desejam uma grande leitura.

EXPEDIENTE REVISTA AÇÃO Edição 01 – Dezembro de 2012 Produção Experimental dos alunos do 1º ano do Curso de Comunicação Social com habilitação em Jornalismo do Centro Universitário Barão de Mauá – Ribeirão Preto/SP Coordenação do curso: Nahara Cristine Makovics Fusco Coordenação do projeto: Igor José Siquieri Savenhago Reportagens e Fotos: Fausto Daniel, Daniel Zanetti, Vinícius Alves, Marcela Garrido, Fernanda Laurenti, Leonardo Santos, Susana Santos e Pamela Mendes. Editoração Eletrônica: Jefferson Ricardo Orlandi (Jefin)


Lembranças de um tempo de glórias. Entrevista com Wilson Bombarda

sum á r i o

pág 6 Skate: A onda dura Hóquei in line: Charme sobre patins

pág 10

pág 16 Capoeira regional: O legado de Bimba

pág 24 Rúgbi: As aparências enganam

pág 28 Basquete sobre rodas: Sonhando alto

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FALA AÍ!

Ginástica Artística: Em busca de equilíbrio

pág 20

Raul Bianchi: Esporte amador e música independente o fator “amigo do amigo” pág

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Wolfgang Pistori: Há muito o que fazer pág

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Leonardo Santos: Jornalismo esportivo não é palhaçada pág

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Charge – Marcos Antônio Silva dos Santos: No país das Olimpíadas

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Outro olhar: Ensaio fotográfico Fábio Melo

pág 31

Jiu-Jitsu: O oponente é forte

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FOTO: ARQUIVO PESSOAL

FALA AÍ! Esporte amador e música independente: o fator “amigo do amigo”

Q Raul Bianchi, músico paulistano

uando os editores desta publicação me pediram para fazer uma analogia entre música independente e esportes amadores, me senti como se minha mente voltasse mais de 30 anos no tempo! Entre 1979 e 1981, joguei nas divisões de base da Portuguesa, aqui de São Paulo. Fui campeão dois anos seguidos, goleiro menos vazado dos campeonatos e cogitado a ser convocado para a Seleção Brasileira de base, que, naquele tempo, praticamente inexistia. Quando existia, só os cariocas eram chamados, num bairrismo irritante da época na CBF. Em 1981, abandonei a carreira por causa de uma contusão na mão e, também, da burocracia e favorecimento que existiam – e ainda existem – nos clubes de futebol. Isso não vem mais ao caso, já que abrir alguns arquivos “mortos” da minha mente não é uma boa ideia, até porque a terapia ainda não me fez aceitar tudo aquilo. Enfim, que eles fiquem por lá. Em 1983, comecei a tocar bateria e encontrei minha paixão, mais até que jogar no gol, que é a música. E isso nos leva ao nosso texto, que trata exatamente das dificuldades que esportes amadores (sim, o futebol de base ainda é amador) e a música independente enfrentam nesse país. Com os diversos incentivos culturais e esportivos que os governos dos últimos anos se gabaram de oficializar, a coisa parecia que ia melhorar e se democratizar. Ledo engano! Só grandes empresas, no caso do esporte, e famosos e globais, no caso da cultura, conseguiram lastro para tocar seus projetos. Desde a criação da tal Lei Rouanet, nos anos 90, eu tento emplacar um projeto e nada acontece. Incompetência de minha parte? Talvez. Mas já vi vários projetos muito piores que os meus serem aprovados, principalmente quando vêm acompanhados com as pessoas certas... Oras, se isso só funciona na base do amigo indicador, então não há motivos para me estressar gastando tempo e neurônios para criar algo que jamais será aprovado, se não vier com uma recomendação!

Mas há um alento: a música independente nunca esteve tão em alta, pasmem os senhores! Sim, porque, com o advento das mídias sociais, tudo melhorou para a divulgação do trabalho, além do que, com a tecnologia, qualquer um grava e faz um vídeo para colocar no Youtube. E o melhor, a ditadura das rádios e gravadoras praticamente acabou! Só que outro problema apareceu: muito material e muita informação geram menos interesse por parte das pessoas! Sim, isso mesmo! Com tanta coisa acontecendo, o público simplesmente não consegue mais absorver tanta novidade e isso gera uma demanda maior que a procura, Você, caro leitor, que está lendo estas mal traçadas linhas, deve estar pensando: “Esse cara é maluco! Fala uma coisa boa e na sequência detona tudo!”. Sim, pode parecer isso, mas a verdade para quem vive de música é essa. Chegamos a um ponto em que tudo está saturado e há a necessidade urgente de criar novas opções de divulgação para não cair no ostracismo. O mesmo vale para esportes amadores. As empresas gastam tubos de dinheiro em determinados projetos que, simplesmente, não vingam, porque têm a sua frente pessoas incompetentes. Clubes aparecem com empresas dizendo que são o novo eldorado do esporte amador e, dali há um ano, já estão devendo para os atletas e desistindo do projeto. E isso com o apoio do governo e das leis. Daí, você percebe que tudo isso foi só para descontarem o Imposto de Renda, que, convenhamos, é um abuso neste país, de seus faturamentos anuais. Uma pena que ainda não exista no Brasil um mecanismo justo, honesto e inteligente de incentivar realmente a cultura e os esportes. Porque, enquanto dependermos de ter pessoas famosas, ou então alguém que conhece alguém que trabalha lá no Ministério da Cultura ou dos Esportes, estaremos presos a este círculo vicioso e triste da roda que gira, gira e para sempre no mesmo lugar: dos “amiguinhos dos amigos!”

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FOTO: FAUSTO DANIEL

Entrevista

Lembranças de um tempo de glórias Destaque nas décadas de 50 e 60 com a camisa da Seleção Brasileira de Basquete, o professor de Educação Física e produtor de café Wilson Bombarba recorda as disputas em quadra, as conquistas e os motivos que o levaram a Altinópolis

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FAUSTO DANIEL

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ouca gente sabe, mas o professor de Educação Física Wilson Bombarda, de 82 anos e morando em Altinópolis, a 60 quilômetros de Ribeirão Preto, foi um dos maiores vencedores atuando pela Seleção Brasileira de Basquete. As lembranças de um passado de glórias o fazem ver com tristeza a falta de estímulo à prática esportiva hoje. Para ele, é fundamental incentivar o esporte nas escolas, não só para a formação de atletas, mas de cidadãos. A reportagem da Revista Ação foi até a casa dele. Acompanhe os principais momentos da conversa, que teve como cenário uma plantação de café, atual investimento de Bombarba e um dos símbolos de Altinópolis. Revista Ação: Para começar, professor, conte sobre os clubes que defendeu. Bombarda: Eu joguei em Marília, pela cidade, na Central de Esportes. De lá, fui para São José dos Campos, joguei pelo Tênis Clube, graças à indicação do Alberto Marson e a orientação do professor Moacir Dayuto, que, por sinal, é altinopolense. Hoje, é falecido e muito querido... Foi, com certeza, um pai profissional que tive. Nós tínhamos um grupo que, para onde fosse o Moacir Dayuto, íamos juntos. E, de lá, fomos para o Pinheiros. Há uma curiosidade em São José dos Campos, porque a cidade respirava basquete. Havia o Tênis Clube e, também, um esforço no Centro Técnico Aeroespacial. Nós trabalhávamos lá. Marson também era jogador de Seleção Brasileira, medalha de bronze em Londres-1948. Nós jogávamos no Tênis Clube, mas o Alberto era uma pessoa de personalidade forte e de opinião forte também, sabia o que queria. E ele se desentendeu com os diretores do Tênis. Como ele trabalhava lá no ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica], achou que poderiam fazer uma equipe. Como eu trabalhava lá também, ele falou: “Olha, Bombarda, eu vou fazer uma equipe aqui, se você quiser jogar”. E eu falei: “Vou sim, Marson. Como não? Eu trabalho aí. Deixa só eu terminar o campeonato aqui pelo Tênis para não ficar ruim”. Aí, formou-se uma equipe forte lá. Na ocasião, a Secretaria de Esportes fazia um torneio chamado Troféu Ban-

deirantes, que era um campeonato além dos Jogos Abertos do Interior, e esse troféu era a força de cada cidade, com nomes de clubes, mas era cada cidade. Em São José dos Campos, tinha duas equipes e uma delas tinha que representar a cidade. Era o jogo mais importante do ano: o Centro Técnico Aeroespacial, CTA, contra o Tênis Clube. Qualquer um que ganhasse iria representar muito bem a cidade, porque eram muito fortes. Temos uma recordação muito grata desses jogos porque, durante alguns anos, fizemos essa disputa. Quando a partida era no Tênis Clube, era cobrado ingresso e lotava. No CTA, não tinha como você cercar para cobrar ingresso, a quadra era no meio dos eucaliptos, na praça esportiva do ITA. Então, ficava uma mesa com o vendedor de bilhetes e um porteiro ali no meio dos eucaliptos com tudo aberto. E o pessoal passava e comprava o ingresso. Tinha os meninos que vazavam, conseguiam entrar sem pagar, mas isso aí ninguém segura (risos). Mas o pessoal mais dado à intenção de ajudar passava e comprava o ingresso. Revista Ação: Somente depois de tudo isso o senhor veio para Altinópolis? Bombarda: Altinópolis aconteceu graças a minha esposa, a Dirce, que está aqui conosco, porque, através do esporte, nos conhecemos, surgiu um sentimento mais forte e o casamento em consequência. Após o casamento, a Dirce foi comigo, porque eu trabalhava lá em São José dos Campos. Terminado meu tempo de trabalho, veio a aposentadoria e eu vim para cá, porque já tinha interesses aqui. Eu tinha uma sociedade com o Fayez Felippe, que é meu concunhado, um amigo muito querido. Começamos com um pedacinho de terra plantando café, que até hoje temos graças a essa sociedade. Revista Ação: O senhor tem no currículo duas medalhas em Pan-americanos (Cidade do México-1955 e Chicago-1959), um vice-campeonato Mundial (1954 no Brasil) e um sexto lugar nos Jogos Olímpicos de 1956, em Melbourne na Austrália, onde foi porta-bandeira da delegação brasileira. Como é o reconhecimento de um atleta do seu nível? Bombarda: Eu recebi do Comitê

Olímpico Brasileiro esse ano uma carta e veio junto uma foto, que saiu no Jornal do Comércio, com a relação de todos os porta-bandeiras através dos tempos. O Galvão Bueno também disse na abertura dos jogos de Londres, ano passado. Ele anunciou todos os porta-bandeiras e nessa relação surgiu: “1956, Wilson Bombarda”. É uma honra muito grande que pouca gente sabe, mas é uma honra que pertence à gente. Se alguém souber, bem! Se não souber, não tem importância... A gente carrega isso. Revista Ação: E aqui em Altinópolis? Bombarda: Pelas pessoas que gostam de esporte, os amigos mais próximos, sim. Uma vez, houve uma exposição na Casa da Cultura sobre esportes. Pediram que levássemos fotografias, mas o pessoal passa, olha e isso passa esquecido. Mas tem sim, especialmente depois dessa Olimpíada, em que foi muito anunciado que o Brasil seria sede em 2016. Isso despertou um interesse maior, digamos, pelo esporte, pela Olimpíada. Então, o pessoal que viu e que ouviu começou a telefonar aqui para minha casa... Foi um pouquinho mais, mas pouca gente sabe desse fato e eu não vou ficar na rua dizendo. (Dona Dirce interrompe com os olhos marejados e diz: “sou eu que conto”). Revista Ação: Como professor de Educação Física, que importância o senhor acha que teve a prática de esportes na época da escola para ter se tornado um atleta depois? Bombarda: Você fez uma pergunta que acho de extrema importância pela situação da Educação Física aqui no Brasil. Professor de Educação Física era muito respeitado, tinha muita importância e havia esse interesse. Na medida em que o tempo passou, as escolas foram se ampliando e ocupando áreas destinadas ao lazer, a recreação e à prática desportiva. Há um conceito que ainda persiste especialmente nos meios políticos, onde surgem os recursos para qualquer atividade, de que o esporte deve ser feito para formar campeões. Formar campeões é um aspecto da Educação Física. Eu penso que ela deve ser levada a toda criança, todo jovem. Se de lá surgir um talento com características e biotipo para alguma modalidade, ele pode fazer carreira e

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até ser um profissional. Naquele tempo, não havia essa possibilidade, mas havia uma seleção. Tinha campeonato colegial que era muito bem organizado, havia uma porção de coisas. Eu vejo aqui, por exemplo, que Altinópolis teve a sua melhor época de desporto. Existe uma diferença entre esporte e desporto. O desporto é competitivo, o esporte é feito por todo mundo, sem a responsabilidade de vitória. Em Altinópolis, a melhor época do desporto foi quando não tinha ginásio, havia uma quadra cimentada lá embaixo e a equipe foi campeã dos Jogos Abertos femininos. A Dirce fez parte dessa equipe jogando vôlei. O masculino também era muito bom, futebol de salão era muito bom, futebol de campo disputou a final do amador e perdeu para Elvira de Jacareí, isso em 1949, se não me engano. Fazer esporte era uma moda por aqui. Eu vejo hoje com muita tristeza. Altinópolis tem cinco ginásios cobertos e não tem praticamente nada. Tem um esforço do professor Huelder, um professor com letra maiúscula, muito dedicado, mas sem o necessário apoio nem interesse da comunidade daqui. Revista Ação: Até pouco tempo atrás, tinha a Miniolimpíada da escola Barreiros, inclusive. Bombarda: Você tocou num assunto que me diz muito respeito. A Miniolimpíada surgiu e eu fui convidado para ajudar a orientar. Então, fizemos um regulamento segundo o qual o principal era realmente a competição, mas com mesma importância havia uma cláusula que falava em formação de lideranças. Eu pensei muito e disse: “Eu vou ensinar a fazer, não vou levar o peixe para ninguém”. Era muito bom por causa disso. A Miniolimpíada fazia com que o ginásio ficasse lotado e gente do lado de fora, havia interesse. Nós tínhamos que ensinar a fazer súmula, a apitar jogos, varrer a quadra, limpar o banheiro, arranjar recursos para fazer camisetas. No auge da Miniolimpíada, a diretora era a professora Vilaiba e até hoje, quando encontro com ela, eu digo: “Minha querida diretora!”. Foi uma lástima ter acabado. E isso aconteceu justamente pela falta de interesse e apoio político também. De lá, surgiram realmente grandes lideranças, em outras áreas, não só no esporte. Inúmeros vereadores passaram por isso

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aí, alunos que se formaram e hoje ocupam cargos. Revista Ação: Depois daquele vice em casa no Mundial de 1954, em que o senhor esteve, a seleção conseguiu um bicampeonato: em 59, no Chile, e 63, quando o torneio voltou ao Brasil. Mas o senhor não fez parte daquelas conquistas. Como foi ficar de fora? Bombarda: Tínhamos um campeonato brasileiro que era disputado pelos estados. Vinham os cariocas, os mineiros, paulistas, gaúchos, enfim, todo Brasil. E foi no Rio Grande do Sul esse campeonato. De lá, saiu a seleção que iria disputar no Chile o Mundial que o Brasil foi campeão. Nessa ocasião, o Augusto [filho de Bombarda] estava próximo do nascimento e a gente preocupado com isso, porque a comunicação era mais difícil naquele tempo. Nós, paulistas, ganhamos aquele campeonato e estava tudo pronto, meu passaporte, minha inscrição, meu uniforme, terno para desfile, tudo isso estava pronto pra ir. Eu estava num dilema muito grande: ou ia para o Mundial no Chile ou vinha embora dar uma assistência aqui. Eu optei por vir e foi no meu lugar o Jathyr Schall, que também era muito amigo e que o uniforme servia (risos). Ele tinha condição técnica também, não era nem muito baixo ou alto, era um pouco mais forte até, mas o uniforme servia. Eu não fui. O Brasil ganhou e eu me considero campeão Mundial também. Porque eu teria ido, né? Revista Ação: Taticamente, quais foram as mudanças que o basquete de hoje teve em relação a sua época? Bombarda: Antigamente, o jogo era mais tático, digamos, não havia necessidade de você tentar a cesta dentro dos 24 segundos. Já havia na NBA, isso foi copiado de lá. Então, o jogo era um pouco mais pausado, havia contra-ataque rápido, mas as contagens eram mais baixas. Com o advento da obrigação de você tentar a cesta, o jogo passou a ser muito mais dinâmico, porque, quanto mais depressa, você fica livre dos 24 segundos, que não deixam de ser um fantasma em cima de você. Hoje, além de ser profissionalizado, como o futebol e outros esportes, como o voleibol, se treina todos os dias. Naquele tempo não era,

você treinava todos os dias nas concentrações e, fora disso, nos clubes, a gente treinava duas, três vezes por semana e jogava. Agora é muito mais rápido, muito mais vigoroso, muito mais preparação física e treino técnico também, porque hoje se treina até duas vezes por dia e, naquela época, cada um tinha que defender sua vida. Revista Ação: O senhor ainda acompanha as competições pela TV e vai a ginásios para ver jogos? Bombarda: Acompanho, mas estou achando que você sabe mais que eu de basquete depois disso (risos), mas eu acompanho sim, porque gosto, e gosto de assistir o feminino também. Eu tive a felicidade de assistir aos jogos da Seleção Brasileira quando jogavam Hortência e Paula e, especialmente a Hortência, eu costumo dizer que nesses próximos cem anos não vai aparecer outra no Brasil. Ela era uma jogadora especial por ter 1,74m e fazer o que ela fazia. A Hortência, se fosse para o atletismo, seria uma campeã. Se fosse para o vôlei, seria uma campeã. Porque ela é superdotada, um talento inato. Revista Ação: Depois de parar de jogar, o senhor continuou ligado ao esporte de alguma forma? Bombarda: Trabalhando, sempre trabalhei. Exerci minha profissão, trabalhei para o estado trinta e seis anos e meio, o que corresponde a um ano e meio de lambuja para o governo. Não precisava ter trabalhado, mas como eu gostava tanto... Comecei dando aula e terminei como dirigente esportivo da secretaria. Fui delegado regional da Secretaria de Esportes no Vale do Paraíba durante 30 anos. Lá, aprendi como lidar com direção de jogos, formação de sistemas, construção de instalações e essa coisa toda. Revista Ação: Os investimentos em infraestrutura para os jogos de 2016 têm sido bastante grandes. Não seria preciso ter investido mais na formação de atletas para representar o país? Bombarda: Vou aqui usar uma expressão caipira que se coaduna muito com a sua pergunta: “embornal grande, milho pouco” (risos). Estou dando


te, apesar de ter apresentado uma bela equipe, foi formado só para disputar a Olimpíada. Tomara que o Brasil consiga para justificar essa despesa toda. Revista Ação: Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, disse que o Brasil estará entre os dez melhores no quadro de medalhas do Rio. O senhor acha possível? Bombarda: Aqui veio mais uma reportagem outro dia e perguntou se eu achava que o Brasil iria se sair bem na Olimpíada. Também demorei um pouquinho porque não sabia o que responder e disse: “olha, nós temos muita esperança”. O Nuzman pensou assim, com esperança e com uma maneira de se expressar em que trazia um fortalecimento para a causa da Olimpíada. Acho muito difícil o Brasil ficar entre

os dez. O Brasil teve tempo de iniciar o trabalho de formação de atletas de nível olímpico e demorou muito. Não se faz um atleta em quatro anos, precisa muito mais. Se nós começarmos a pensar em China, Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, França, Austrália... Esse pessoal tem várias modalidades que carregam muitos pontos. Ginástica olímpica ganha muitas medalhas... Alias, acho que o regulamento que rege a contagem de pontos deveria merecer certa modificação. Por exemplo: o futebol se joga com onze jogadores e ganha uma medalha. Talvez fosse o caso de premiar modalidades como o basquete, o vôlei e outras modalidades esportivas que envolvem vários participantes com mais medalhas. Não posso dizer quantas. Com uma boa ginástica olímpica e uma boa natação, se vai lá pra cima na classificação.

FOTO: ARQUIVO PESSOAL

risada porque acho este termo caipira extraordinário. O Brasil é o embornal grande, milho pouco. Está fazendo muito, muitas instalações, gastando muito dinheiro. E outra coisa: Mundial e Olimpíada próximos um do outro é uma despesa que o Brasil não tem esse dinheiro para gastar. Olimpíada é muito caro. Já gastou mais que o dobro do orçamento previsto para o Pan-americano em 2007. Eu acho difícil, não porque o Brasil não vai trabalhar em cima. Está trabalhando, mandando verba. Eu vejo as verbas todas aumentarem. A Inglaterra, por exemplo, foi oitava na Olimpíada passada e o governo aumentou a verba para melhorar a participação. Aumentou a verba e abandonou outros esportes que achou que não devia, inclusive o basquete. Investiu no que sentiu a aptidão do inglês: atletismo, natação... Uma porção de esportes próprios. O basque-

Bombarda (primeiro em pé, da esquerda para a direita) com equipe de basquete da década de 60

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FOTO: DANIEL ZANETTI

Skate

A onda dura

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Influenciados por ídolos mundiais, ribeirãopretanos dizem ser adeptos do skate por amor ao esporte e reclamam da falta de estrutura para a prática; enquanto a pista não vem, eles treinam em cidades vizinhas ou improvisam caixotes


DANIEL ZANETTI

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A onda no Brasil O esporte se espalhou no Brasil a partir de 1985, com o surgimento de revistas especializadas. Estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul ganharam pistas. Campeonatos passaram a ser realizados com maior frequência. A maioria dos skatistas vinha da influência punk e praticava a categoria Street, na qual os esportistas interagiam com diversos elementos da arquitetura urbana, como escadas, corrimões e paredes, o que passou a incomodar as pessoas que não conheciam o esporte. Os skatistas foram chamados de vândalos, drogados e baderneiros.

“Skate não é crime” Em 1988, o prefeito de São Paulo, Jânio Quadros, decidiu proibir a prática do esporte na cidade, o que gerou passeatas e protestos, realizados por jovens que consideravam o ato do político como repressor, conservador e que impedia o direito de ir e vir. A mídia publicava o abuso de autoridades contra os skatistas e a repressão a esta prática esportiva. Cartazes com a inscrição “Skate não é crime” eram espalhados pela capital paulista. Na contramão desta medida, Luiza Erundina, sucessora de Quadros, prometeu legalizar novamente a atividade. Ela chegou a posar para fotos em cima de um skate. Apesar da liberação, a política municipal pouco mudou em relação ao antecessor. Não foram construídos espaços para o esporte. Exposição, crise, reestruturação e os ídolos Nos anos 90, com o surgimento de um grande número de marcas, revistas, produtos e campeonatos fixos, o skate atingiu seu ápice. Mas o início desta década não foi nada fácil para o esporte no

FOTO: DANIEL ZANETTI

les não estão preocupados em aparecer mais que qualquer outro esporte. Não buscam exposição exagerada. Querem apenas reconhecimento. Que tenham, ao menos, um espaço para treinar e divulgar sua ideologia. Jovens de Ribeirão Preto, adeptos do skate, reclamam da falta de estrutura para a modalidade. A prática foi criada no início da década de 60 na Califórnia, onde já predominava a curtição sobre uma prancha, a de surf. Na época, surfistas frustrados com ondas pequenas e maré baixa resolveram tomar uma atitude quando o mar estava calmo demais. Foi aí que surgiu o surf no asfalto. Os jovens montaram uma madeira com rodas de patins e chamaram de skate, que, em inglês, significa “patinar”. Uma legião começou a praticar o novo esporte. As empresas passaram a investir na fabricação industrial do skate. Não demorou para que várias competições fossem organizadas. A década de 80 foi importante para este esporte no mundo. Foi nesse período que surgiram dois dos maiores nomes

da modalidade: Hodney Mullen, considerado um revolucionário, que criou a maioria das manobras, e Tony Hawks, que ganhou o título de maior skatista de todos os tempos, pelo grau de dificuldade demonstrado em suas exibições. Os dois são, até hoje, influências aos skatistas também no Brasil, onde as capitais paulista e carioca são pioneiras em território nacional. Tony, inclusive, é quem dá nome a uma série de jogos de videogame sobre esse esporte.

Amigos se reúnem no fundo de quintal para a prática do skate

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FOTO: DANIEL ZANETTI

Brasil, pelo fato de o então “Plano Collor” afetar o mercado e os fabricantes. Revistas e patrocinadores que pagavam os atletas para disputar campeonatos faliram. Muitos dos skatistas deixaram o esporte e foram sobreviver de outra forma. Alguns, porém, não abandonaram o sonho. Com o tempo, o mercado se reorganizou e surgiu, então, a Abesk (Associação Brasileira dos Empresários de Skate). A chegada de TVs a cabo, com canais de esporte, e a qualidade dos skatistas fizeram com que o esporte voltasse à cena. Com campeonatos mais frequentes sendo transmitidos ao vivo pela televisão, os skatistas profissionais passaram a ser mais vistos e admirados pelos fãs brasileiros, o que consagrou internacionalmente nomes como Bob Burnquist, Lincoln Ueda e Sandro Dias, o “Mineirinho”. Ídolos que inspiraram a nova geração, nos anos 2000. Hoje, segundo o Datafolha, cerca de quatro milhões de brasileiros praticam skate. Manobrando para o interior Em Ribeirão Preto, interior paulista, existem muitos jovens que começaram a praticar o esporte depois de terem visto esses atletas aparecendo na TV. A maioria deles não ganha a vida no skate como os ídolos. Praticam apenas por amor ao esporte.

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Um deles é Daniel Massa, skatista há 10 anos. Por influência de vizinhos, que já andavam de skate, e por assistir aos campeonatos na TV, aos domingos, pegou gosto e foi se superando nas manobras. Ao invés de escolher o futebol, esporte mais praticado no Brasil, Daniel sempre preferiu o skate, por ser mais voltado para a rua. “Cada um se veste como quer,

uns no estilo hip hop, outros no estilo roqueiro, ou seja, cada um faz seu estilo. Não é como no futebol, que todos têm um uniforme”. Liberdade também na escolha da música, que sempre andou junto com o skate. Segundo os praticantes, ela ajuda na hora de fazer a manobra ou na concentração para realizá-la. Massa, por exemplo, gosta de ouvir um pouco de

Poder público não dá esperanças A reportagem da Revista Ação tentou falar sobre o assunto com o secretário de esportes de Ribeirão Preto, Marcelo Palinkas, e com o da Cultura, Alessandro Maraca, por várias vezes. Funcionárias de ambos sempre informavam que eles estavam em reunião. Carlos Guerra, chefe da divisão do desporto de Ribeirão Preto, afirmou que a cidade tem pista localizada no Parque Maurilio Biagi. Mas o local, segundo os skatistas, não é apropriado, devido ao tamanho da pista e à forma como ela foi construída. Guerra desconhece projetos de pistas para o futuro. O secretário de esportes que ocupou o cargo antes de Palinkas, Edmilson Desordo, não soube falar sobre o assunto e pediu para que a reportagem entrasse em contato com Centro Social Urbano (CSU) da Vila Tibério, que também desconhece qualquer projeto e nada informou sobre o tema.


hip hop, rock e hardcore enquanto anda de skate, mas, na turma dele, cada um coloca seu fone de ouvido e ouve o que quer.

com vários políticos, mas, infelizmente, eles sempre têm uma desculpa para dar”. Pouco apoio e muitos skatistas talentosos, acostumados com desafios e

Sem espaço Fabricio Vieira, mais conhecido como Cebola, também morador de Ribeirão Preto e adepto da modalidade há 13 anos, conta que existem muitos skatistas na cidade. O que falta mesmo é uma pista para a prática do esporte. Segundo ele, os skatistas da cidade costumam praticar o esporte nas ruas, praças ou casa de amigos. Em cidades vizinhas, como Barrinha, com um número bem menor de habitantes, existe uma pista adequada, segundo os praticantes. Por falta de espaço em Ribeirão, os skatistas se deslocar ou, então, improvisar caixotes e obstáculos na rua para treinar. Sem apoio dos órgãos públicos, os próprios skatistas vão atrás de montar as pistas e organizar campeonatos. “Nós tiramos dinheiro do próprio bolso para poder fazer um evento, sendo que isso deveria ser uma função do poder público. Do mesmo jeito que investem dinheiro em campeonatos de futebol, por exemplo, deveriam também investir no skate”, completa Cebola. Assim como Daniel e Cebola, David Daniel, o Deivão, skatista há 20 anos, também reclama da falta de pista em Ribeirão e de apoio da prefeitura. Ele diz que “todo ano de eleição, existe promessa que vão construir parques na cidade e que terá pista, mas sempre arrumam desculpas quando não dá certo”. Para Deivão, deveria haver uma grande mobilização dos skatistas da cidade para protestar e cobrar as promessas feitas. “Eu já perdi vários dias de serviço, pra falar com o secretário de esportes,

preconceitos. Essa é a realidade de Ribeirão Preto. Obstáculos que, segundo os praticantes, não serão capazes de fazê-los parar de amar o esporte.

Mineirinho fala com a Revista Ação Um dos grandes nomes do skate nacional esteve recentemente em Sertãozinho, 20 km de Ribeirão Preto, para fazer uma tarde de autógrafos e “rolês” de skate com os fãs da cidade. A equipe de reportagem da Revista Ação marcou presença e registrou uma breve entrevista com Sandro Dias, o Mineirinho. O skatista é hexacampeão mundial na modalidade e medalha de ouro nos X Games de Los Angeles, em 2006. É conhecido no mundo do esporte como o “rei dos 540°”, por executar com perfeição a manobra, que dá uma volta e meia no ar. Como se não bastasse essas características, Sandro Dias foi o primeiro skatista do mundo a executar o 900° em uma competição. A manobra consiste em dar duas voltas e meias no ar, antes das rodinhas tocarem a rampa de volta. Confira a conversa em que Mineirinho fala de alguns títulos, dificuldades do esporte no interior de São Paulo e a relação do skate com a música.

FOTO: VINÍCIUS ALVES

Ação: Você é hexacampeão mundial de skate. Enquanto isso, no país do futebol, a seleção está estacionada no penta. Como você enxerga essa situação? Sandro Dias: Bom, eu me sinto bem menos valorizado do que os jogadores de futebol (risos). Eu sou feliz por aquilo que conquistei sozinho. São 27 anos no skate e 18 como profissional. Estou realizado por tudo que fiz até hoje, mesmo não sendo valorizado como eles [jogadores]. Vou continuar fazendo o que gosto, porque realmente amo skate. Vou fazer o melhor possível para animar essa nova geração do esporte e que eles motivem outras pessoas também. Os resultados estão surgindo. Ação: Como você vê a situação do skate no interior de São Paulo? Sandro Dias: O skate tem crescido hoje. Ele é o segundo esporte mais praticado do país. Em todo lugar, tem skate. O que falta é um pouco mais de estrutura pra galera poder praticar. Às vezes, até tem pistas, mas construídas de qualquer maneira, o que atrapalha o desenvolvimento da nova geração. Vejo muito isso no interior de São Paulo. Se vier um apoio extra dos governantes, a estrutura pode melhorar e o nível dos atletas também. Ação: Dá pra perceber uma relação entre o skate e a música. Quando você anda, o que costuma ouvir? Sandro Dias: O skate é totalmente ligado com música. Dificilmente, você vê um cara andando sem estar escutando um som. Aí, são gêneros variados, desde o hip hop ao heavy metal. Eu, particularmente, curto algo mais pesado. Vou de hardcore, rock e heavy metal.

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FOTO: VINÍCIUS ALVES

Mineirinho faz apresentações pelas ruas de Sertãozinho

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FOTO: ARQUIVO PESSOAL

Wolfgang Pistori, jornalista

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s campos de várzea já foram, em algum momento, o que de mais charmoso havia em uma cidade. Ainda são, mas pouca gente sabe disso. O bétis, que une a técnica do basebol com uma noção de boliche, ainda sobrevive em uma ou outra rua. E ainda há gente colocando um banco a alguns metros da linha do aro, nas quadras que alguma prefeitura algum dia ousou colocar na cidade, para tentar uma enterrada. O futebol jogado no asfalto, com traves feitas de chinelo, é cada dia mais raro. As ruas esburacadas são um desafio para quem anda de skate, patins ou o velho carrinho de rolimã. Tudo isso caminha para o fim. Culpem os políticos por isso. Tudo bem. Mas nós somos os principais culpados pela mudança no conceito da vida, para não falar de sentido. É verdade que se as ruas não têm condições para receber os verdadeiros atletas da nossa sociedade. Ao menos uma lista de locais adequados para a prática de uma dezena de esportes deveria estar facilmente na cabeça. Não está. As ruas deveriam estar seguras, lisas, calmas. Os espaços esportivos teriam que existir em grande escala, bem cuidados, igualmente seguros. A culpa é nossa também. Alguns podem falar de Cuba, China ou Estados Unidos, onde a cartela de esportes praticados com excelência é gigan-

FALA AÍ! Há muito o que fazer

te. Onde há quadras esportivas públicas com mais qualidade do que nosso principal complexo esportivo. Mas podemos nos questionar: onde foi parar o prazer? Adultos não podem mais ter prazer. É a conclusão que chego. Esqueço-me da minoria – seria mesmo minoria? – que encontra no limite o principal inimigo. E isso significa prazer. Derrotar o inimigo. Sejam os números no cronômetro enquanto se acelera as passadas no sentido de uma linha traçada com giz, provavelmente em local dito inadequado para a prática de tal esporte, seja no sopro de superação após o toque da mão na borda da piscina. Tudo isso é prazer. Não só de prazer é feita a vida – ou deveria ser? Precisamos viver. E para viver, investimento. Quando se fala de China, Cuba, Estados Unidos ou excelência, fala-se de resultado, de vitória, de consequência. De investimentos. Contamos nos dedos as empresas que apostam em esportes amadores. E onde está a culpa? Volto a dizer, na maioria. Não damos o devido valor para os valores que insistem em viver de prazer. Esses sim são vitoriosos, mesmo que não fiquem com o ouro no fim. Quando foi que você viu pela última vez uma competição de atletismo? Quando você foi prestigiar um jogo de futebol do time da cidade, com entrada franca? Quando você perdeu uma tarde para ver uma competição de judô ou de handebol? A falta de investimento em esportes amadores no Brasil é uma roda com vários compartimentos, que juntos formam o que há de mais bonito e mais sujo quando falamos de esporte. Seriam necessárias algumas dúzias de edições desta revista para entrar a fundo no problema. Superação ao lado de indiferença. Até preconceito está engrenado na realidade que se diz olímpica. Em Ribeirão Preto, os muitos praticantes do skate resumem o que é ser ou tentar praticar esporte com qualidade por

aqui: um exercício de criatividade. É romântico e, não há como dizer outra coisa, inspirador. O caixote vira obstáculo, a parede vira adversário, o pacote de arroz vira peso para treinar os músculos para o que vier amanhã. Viver de esporte por essas terras não é lá tarefa muito grata. Ninguém quer ver, muito menos investir, no que chamamos de esportes amadores. E por isso é louvável a iniciativa a que se propõe essa revista. Para que o resultado chegue, alguém precisa dar o primeiro toque na bola e a ideia dessa publicação é certamente aquele passe que visa o gol, a cesta, o Field gol, o try. Mas é ali, onde está o maior encanto da coisa. Experimente a atmosfera de um torneio de futebol amador de fim de semana em algum bairro de periferia e você vai saber. Vale arriscar o espetinho do lado do alambrado ou prestar atenção nos apelidos dos jogadores. É uma terapia para o dia a dia de estresse, tecnologia exacerbada e compromissos inadiáveis. Escondidos atrás do futebol profissional, temos times uma infinidade de opções para se mexer, se divertir. Experimente reunir uma turma e vá praticar seu esporte preferido em uma das escolas estaduais abertas aos finais de semana. A estrutura é precária, eu sei, mas é um começo. Sem a ocupação dos locais públicos destinados à prática esportiva, não há necessidade de traves novas, tabela decente ou rede de vôlei. Há algumas poucas ciclovias por aí. E se precisar de alguém para completar o time, pode contar comigo. Esqueça as academias, onde o prazer se limita as curvas do corpo. Prazer não pode ser isso ou apenas isso. Aos que sonham e vivem da superação, do prazer, da angústia, da vitória, fica uma adaptação de uma frase do escritor argelino Albert Camus: “O que finalmente eu mais sei sobre a moral e as obrigações do homem devo ao esporte...”

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HÓQUEI IN LINE

Charme sobre patins

FOTO: LAURA DINAMARCO

Terra da cana e do hóquei tradicional busca o seu espaço no in line, modalidade em que catorze meninas se destacam nos cenários estadual e nacional. Mas o começo foi difícil: faltavam equipamentos e reconhecimento

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VINÍCIUS ALVES

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ertãozinho, interior de São Paulo, 20 quilômetros de Ribeirão Preto. Conhecida pelo forte aparato industrial no setor sucroenergético. Ganhou o apelido de “capital mundial da cana-de-açúcar e do etanol” devido ao fornecimento desses produtos para o Brasil e exterior. São 111 mil habitantes, com a maioria vivendo na classe média. Mesmo com a crise que, em 2008, afetou a base de sua economia, o ritmo é de correria e muito trabalho. Não só nas ruas, praças e avenidas. Também nas quadras esportivas. Foi nesse cenário que um grupo de quatro meninas resolveu inovar e criar um time de um esporte ainda pouco conhecido e divulgado no país: o hóquei in line. Inspiradas no sucesso de Sertãozinho nos anos 80 no hóquei sobre patins e num Campeonato Internacional de hóquei in line masculino realizado na cidade em 2011, elas se juntaram e foram ao patinódramo municipal fazer girar as primeiras rodinhas das Lady’s Spiders, a única equipe feminina federada no Brasil. O nome surgiu em alusão ao time masculino já existente na cidade, os Spiders. Para dar charme e requinte, acrescentaram Lady – título dado às senhoras da nobreza na Inglaterra. Dificuldades Mas não foi fácil para as meninas do “sertão”. A falta de equipamentos e conhecimento da população sobre o esporte atrapalhou o início da modalidade. “No Brasil, ainda não tem nenhuma mulher que faz do hóquei in line a sua profissão. Os recursos e investimentos são muito pequenos, não compensa. A maioria estuda ou trabalha e faz do hóquei um comprometimento em segundo plano”, conta Tamiris Dinamarco, 23 anos, jornalista e fundadora da equipe. Hoje, ela não joga mais, por motivos profissionais e pessoais, mas procura incentivar as colegas. Segundo Tamiris, o fato de o hóquei ser um esporte de contato forte entre os atletas faz com que as mulheres que não praticam se refiram às jogadoras de forma preconceituosa. “Os homens nem tanto. Os que jogam sempre estão nos apoiando”. Conquistas Apesar de todas essas dificuldades, os resultados estão aparecendo para o time

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PERFIL DAS ATLETAS Tá no sangue A atacante Patrícia Sponchiado, 16 anos, está treinando com as Lady’s desde 2011 e disse que começou com muito medo de subir nos patins. Hoje, já tem o hóquei correndo nas veias. Em contato com a reportagem da Revista Ação, a atleta mostra uma grande marca roxa no antebraço direito. Sinal da força e disputa do esporte. “Isso já é normal pra mim. Antes, achava que não ia conseguir e hoje jogo como se sempre tivesse jogado. Não sofri preconceito e meus pais sempre me apoiaram”. A jogadora ainda conta que, no início dos treinos, as companheiras de time tinham que ajudá-la no equilíbrio. “Era engraçado”. Bode expiatório Sim, esse é o termo usado por Lavínia Alves de Freitas, 13 anos, para definir qual a sensação de ser a atleta mais nova da equipe. “Elas pegam muito no meu pé. Tudo que precisa ser feito, elas vêm falar comigo”, reclama, em tom descontraído, a atacante. “Mas é gostoso. Me sinto em família com o time. Meus amigos me acham louca, mas meus pais sempre me apoiam. Estou feliz e isso é o que importa”. Mamãe da defesa Com 28 anos de idade e sendo uma das fundadoras das Lady’s Spiders, Adriana Mara é a mais velha das atletas do time de hóquei feminino de Sertãozinho. Ou melhor, a mais experiente, como a própria Adriana sugere, em tom de brincadeira, para a reportagem. Além de treinar três dias por semana, ela tem dois empregos e uma casa pra cuidar, já que também é casada. “Meu

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Hóquei tradicional trouxe reconhecimento mundial a Sertãozinho Sertãozinho já tem uma fama no hóquei tradicional. Pelo grande sucesso na década de 1980, a terra da cana-de-açúcar também passou a ser chamada de “Capital Nacional do Hóquei”. O esporte começou a ser praticado na cidade graças à insistência de Haroldo Pérsio Requena, um apaixonado pelo hóquei tradicional. Com essa novidade na cidade, surgiu o ginásio de esportes Pedro Ferreira dos Reis, o Docão. Atualmente, a equipe do Sertãozinho Hóquei Clube conta com 20 conquistas nacionais, 21 estaduais, três sul-americanos e um mundialito de clubes. É o quarto time mais vitorioso do mundo e o primeiro das Américas. Diferenças com o in line O hóquei tradicional utiliza os patins com dois pares de rodinhas paralelas, luvas e joelheiras. Já no in line, são quatro rodinhas em linha, além de caneleira e joelheira, “fraldão”, cotoveleira, peitoral, luvas e capacete. Enquanto o tradicional é jogado com um stick e uma bolinha, o in line usa um stick maior e um disco, conhecido por puck. Confira todas as conquistas do Sertãozinho Hóquei Clube: Mundial Interclubes: 1985 Campeonato Sul-Americano: 3 vezes (1982, 1985 e 1991) Campeonato Brasileiro: 20 vezes (1985, 1986, 1987, 1989, 1990, 1991, 1992, 1995, 1996, 1999, 2001, 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2009 e 2012) Campeonato Paulista: 21 vezes (1980, 1984, 1985, 1986, 1987, 1989, 1990, 1991, 1992, 1993, 1997, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2007, 2008, 2010 e 2011) Taça São Paulo: 12 vezes (1982, 1983, 1985, 1986, 1988, 1989, 1990, 1991, 1992, 1993, 1995 e 2001) Outros Torneios: Torneio Rio-São Paulo: 1996 Torneio Início: 4 vezes (1980, 1983, 1984 e 1994) Torneio de Catanduva: 1981 Torneio de Recife: 2 vezes (1982 e 1989) Torneio de Santos: 5 vezes (1982, 1985, 2000, 2006 e 2007) Troféu Nilson Costa: 1985 Torneio em Portugal: 1985 O jogador Torneio na Suíça: 1985 Emmenrich Troféu Imprensa: 1987 Souza, que Troféu Nilson Costa: 1992 também é Torneio da Portuguesa: 2002 treinador Torneio de São Paulo: 2008 da equipe feminina de in line

FOTO: VINICIUS ALVES

sertanezino. Em 2012, as Lady’s, com um ano de formação, foram campeãs da Copa São Paulo, vice-campeãs da Copa e do Campeonato Paulistas e conquistaram a terceira colocação na Copa do Brasil da modalidade, esta realizada em Sertãozinho. E não foram só em títulos coletivos que as Spiders conseguiram se destacar. Em julho de 2012, as jogadoras de Sertãozinho estiveram representadas no Campeonato Mundial de hóquei in line realizado na Colômbia. A atleta Marcela Maria foi convocada e vestiu a camisa da Seleção Brasileira nessa competição.


FOTO: LAURA DINAMARCO

Em quadra, as charmosas mulheres se transformam em atletas. A vaidade, nesse momento, fica fora das quatro linhas

marido me apoia. Aos sábados, eu treino e ele vai jogar bola, sem crise. Sempre que dá, ele viaja para acompanhar os campeonatos comigo. Isso me dá muita força pra continuar. Amo o hóquei e esse amor não me deixa cansar”. Adriana lembra que ganhou um apelido das outras jogadoras: mãe. “Mãe?”, questiono. “Sim, mãe”, sorri com brilho nos olhos. A defensora fica emocionada com esse carinho das atletas. “Sou mãe mesmo. Cobro, converso, reclamo e brinco com elas. Convivo bastante com minhas ‘filhinhas’. Muitas vezes, já conversei com as mães das atletas para saber como elas estavam na escola e em casa. É um ambiente agradável, que reflete em quadra. Ensino e aprendo muito com elas”. Fala aí, professor! E se imagine agora, caro leitor, um homem para cuidar de catorze garotas com média de idade de 20 anos. Imaginou? Cada uma com seus problemas pessoais, amorosos, sentimentais, profissionais e, ainda se não bastasse, tem-

peramentos diferentes. Isso sem contar que as meninas ainda sofrem da temida e odiada TPM (tensão pré-menstrual). Colocá-las para jogar, então, é uma missão e tanto. Não é? O técnico das Lady’s Spiders sentiu isso na pele desde o começo do time. “Nos primeiros meses, foi difícil. Hoje, já conheço todas e, pelo olhar, sei como está o dia de cada uma”, diz o sertanezino Emmenrich Souza. O treinador é jogador, capitão e técnico dos Spiders, o time masculino de Sertãozinho. Também atua na Seleção Brasileira. Segundo ele, foi uma experiência nova assumir a equipe feminina. “O hóquei é um esporte diferente. Ele é dinâmico e exige um pensamento rápido, além do forte contato entre os atletas. As meninas me surpreendem cada dia. Deixam o sentimento de lado e em quadra jogam com a razão”. Vaidade E como a reportagem aborda as mulheres, não poderia ficar de lado o assun-

to vaidade. Algumas chegam meia hora antes dos treinos para começar a arrumação. Prendem o cabelo, passam maquiagem, olham no espelho. Desprendem o cabelo, repassam a maquiagem e voltam a olhar no espelho. “Era muito vaidosa quando jogava. Fazia a unha antes dos jogos e prendia o cabelo com tranças”, revela Tamiris Dinamarco. “Não jogo sem passar uma maquiagem básica”, afirma Adriana Mara, a mãe da turma. Mas Emmenrich, às vezes, dá umas broncas por isso. “Sempre falo pra elas que, fora das quadras, antes de serem atletas, elas são mulheres e não podem perder isso. Mas, na quadra, precisam ser só atletas. A maquiagem escorre com o suor, pode entrar no olho e comprometer o resultado. Hoje, elas entendem mais isso”. É dessa maneira, às vezes mulheres, às vezes atletas, que as Lady’s vão superando as dificuldades, como falta de patrocínio e reconhecimento. Mostram que na terra da cana e do outro hóquei, o sobre patins, também há lugar para o charme do in line.

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Ginástica Olímpica

Em busca de equilíbrio

FOTO: MARCELA GARRIDO

O Centro Esportivo da Cava do Bosque, que já formou atletas olímpicos, como Laís Souza, perdeu o foco e, devido às condições do local, terá que fazer muita ginástica para conseguir montar novamente equipes competitivas

Em quadra, as charmosas mulheres se transformam em atletas. A vaidade, nesse momento, fica fora das quatro linhas

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FOTOS: MARCELA GARRIDO

MARCELA GARRIDO

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Cava do Bosque de Ribeirão Preto existe desde 1952. O poliesportivo foi construído no mandato do prefeito Alfredo Condeixa Filho, com o objetivo de sediar a 17ª edição dos Jogos Abertos do Interior, que, naquele ano, foi realizada na cidade. Em 1988, passou por reformas e ampliações e recebeu o nome do jornalista esportivo Gavinos Virdes, falecido em 1965. Depois dessas obras, o conjunto poliesportivo e suas instalações passaram a ser utilizadas para a iniciação profissional de atletas, vindos de escolinhas e de equipes de treinamento de alto nível. Hoje em dia, no entanto, não é mais um centro de formação. A Cava ganhou cara de área de lazer. A população utiliza o espaço para diversão, o que contribui para o desgaste e quebra de equipamentos, deixando os atletas com cada vez menos condições de treino. Nicéia Regina Fernandes da Silva, professora de Ginástica Olímpica, que treina as meninas da Cava, afirma compreender os motivos que levaram o ginásio a acolher quem busca apenas lazer, já que a prefeitura não consegue investir para profissionalizar todas as modalidades praticadas no local. Ela acredita que, se a busca de apoio financeiro fosse feita pela Secretaria de Esportes e não pelos professores, como ocorre atualmente, as empresas se interessariam mais em patrocinar. Além de correr atrás de recursos, os professores precisam se desdobrar para dar conta das aulas e dos problemas de estrutura. Observando o espaço físico dedicado à Ginástica Olímpica, percebe-se que tem potencial, mas que precisa de uma reforma com urgência. As meninas treinam num solo inadequado, o mesmo utilizado pelos atletas do judô e que não auxilia no impulso, prejudicando os saltos e acabando com as chances de caprichar nos treinos. Na preparação para as competições, as séries de exercícios precisam ser separadas em duas: primeiro, coreografia no solo; depois, saltos no colchão. Isso compromete o resultado. Como nunca treinaram a sequência completa e têm pouco tempo, durante os campeonatos, para reconhecer os aparelhos, as ginastas ficam inseguras e, em alguns casos, chegam a esquecer a série. A cama elástica também oferece ris-

Com ajuda de professora, aluna aprende técnicas de equilíbrio

Alunas treinam nas passarelas orientadas pela professora Nicéia (à esq.)

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FOTO: MARCELA GARRIDO

Vista panorâmica mostra problemas na estrutura da Cava do Bosque, como no solo do ginásio

cos. Não possui o fosso, um buraco revestido de carpete e cheio de espuma, o que daria segurança em caso de queda e permitiria às atletas fazerem saltos mais altos, com um nível de dificuldade maior. O ginásio carece, também, de aumentar o número de trampolins e manter a qualidade dos aparelhos. Muitos são até novos, mas com aparência de velhos e

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inferiores aos antigos. Conversar com as atletas é ouvir uma repetição de queixas. Nem bem começam o treino e reclamam de dores, devido às condições estruturais. E confessam que só estão na Cava por amor ao esporte e falta de outras opções. Talentos A professora Nicéia deseja que o es-

paço retome seu foco e passe a ser, de fato, um centro de formação, capaz de acolher e treinar com excelência futuros atletas olímpicos. Ela sugere a criação de polos esportivos nos bairros, onde os que se destaquem sejam encaminhados à Cava, para que possam aperfeiçoar suas habilidades. A iniciativa estimularia crianças e jovens a se tornarem atletas


FOTO: DIVULGAÇÃO

profissionais, como Laís Sousa, a jovem ribeirãopretana que começou no esporte aos quatro anos e chegou à equipe brasileira que disputou os Jogos Olímpicos de 2004, em Atenas, na Grécia, e os de 2008, em Pequim, na China. Uma promessa da Ginástica Olímpica de Ribeirão Preto é, segundo Nicéia, Thaís Fidélis dos Santos, hoje com 15 anos e que está sendo preparada para se destacar nos Jogos Olímpicos de 2020. A adolescente foi revelada na Cava e levada por Roger Medina, ex-treinador da Seleção Brasileira Infantil, para treinar na equipe do Grêmio, em Barueri, Grande São Paulo. O talento da menina foi descoberto e desenvolvido pela própria Nicéia, que, por reconhecer os problemas em Ribeirão Preto, indicou a jovem ao ex-treinador da seleção. A professora e as ginastas têm esperança de que, com a saída do judô e de outras lutas para um novo centro esportivo próprio, o Centro de Excelência de Judô, que está em obras, o espaço da Cava seja direcionado à Ginástica Olímpica. A reportagem da Revista Ação procurou o secretário municipal de esportes, Marcelo Palinkas, que, em entrevista por telefone, não descartou as reformas. Ele disse que está buscando em Brasília apoio para a instalação de Centro de Iniciação Esportiva (CIE), que atenderia as modalidades olímpicas e paraolímpicas na cidade. Afirmou, também, que solicitou uma lista com pedidos de melhorias para as modalidades disponíveis na Cava, pois existe uma verba destinada a isso. Segundo ele, faz parte dos planos criar polos nos bairros, conforme solicitado pela professora Nicéia, para que as crianças que despontem sejam encaminhadas à Cava. Quanto aos patrocínios, entende que não é obrigação do secretário, nem da Secretaria de Esportes, buscá-los. Para ele, as empresas estão abertas para apoiar, mas é necessário que os professores de cada modalidade façam um projeto esportivo e protocolem no Ministério dos Esportes, para que os empresários avaliem a possibilidade de investimento. Sobre a situação estrutural da Cava do Bosque, ele disse ter notado que o local realmente virou área de lazer, mas que as providências tomadas irão transformá-la novamente em centro de iniciação esportiva.

Laís Souza participou de duas Olímpiadas com a Seleção Brasileira

Laís começou em Ribeirão Foi no ginásio da Cava do Bosque que Laís Souza, hoje com 24 anos, começou sua carreira, no início da década de 90. Quando completou 16 anos, passou a treinar em Curitiba, no mais moderno centro de treinamento olímpico de ginástica do país. Chegou à Seleção Brasileira e integrou os grupos que participaram das Olimpíadas de 2004 e 2008. Só ficou fora dos Jogos de Londres-2012 por causa de uma fratura sofrida numa das mãos, durante um treino. Em toda a carreira, foram várias lesões, que resultaram em dez cirurgias. Laís é uma inspiração para as meninas da nova geração de ginastas de Ribeirão Preto, que sonham se tornar atletas de alto nível técnico. Para que isso seja possível, esperam que as melhorias prometidas para a Cava do Bosque sejam cumpridas logo.

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Capoeira Regional

O legado FOTO: FERNANDA LAURENTI

de Bimba

Núcleo cultural fundado pelo filho do criador da capoeira regional, e que tem uma unidade em Ribeirão Preto, busca acolher jovens da periferia e preservar uma prática que mistura esporte tradicional com raízes baianas

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uem chega ao Núcleo Filhos de Bimba, no bairro Dom Mielle, Zona Norte de Ribeirão Preto, buscando a prática da capoeira, talvez não imagine que a instituição nasceu de uma história que atravessou o século XX. Bimba é o nome de um mestre do folclore brasileiro que deixou uma herança rica. A começar pelo filho dele, Nenel, fundador do núcleo, que tem unidades espalhadas por várias cidades brasileiras e no exterior e que busca manter viva a memória do pai. Para essa missão, ele conta, em Ribeirão, com a ajuda de dois professores, um especializado e um estagiário, além de uma coordenadora. Por tradição, todos os participantes do grupo recebem apelidos. Nenel é um exemplo. Já o professor especializado é conhecido como Mascote. O estagiário é Testa. E a coordenadora, mulher de Testa, é carinhosamente chamada de Preta. Até isso foi legado de Mestre Bimba, cujo nome era Manoel dos Reis Machado. Mas foi o apelido que deu a esse respeitado personagem o poder de mudar valores culturais e criar um novo estilo de luta, baseada em movimentos de ataque e defesa e com acompanhamento musical. A criatividade e o talento dele, que até hoje é visto como um exímio lutador e educador, fez com a capoeira deixasse de ser encarada apenas como uma prática marginal. Não que a capoeira não existisse antes. Mas, pelas mãos de Bimba, que nasceu em 23 de novembro de 1900 em Salvador, Bahia, e morreu em Goiânia, em 5 de fevereiro de 1974, foi reinventada. O Mestre uniu a versão tradicional com golpes de artes marciais, como o batuque, uma antiga luta praticada por seu pai. Essa mistura resultou na capoeira regional – ou Luta Regional Baiana, em referência ao estado em que nasceu –, o legado deixado aos frequentadores dos Filhos de Bimba. O esporte praticado no núcleo é um processo dinâmico coreográfico, desenvolvido com a participação de dois parceiros. Caracteriza-se pela associação de movimentos rituais, executados em sintonia com um ritmo denominado de ijexá, regido pelo toque do berimbau. Simula intenções de ataque, defesa e esquiva, ao mesmo tempo em que os

participantes exibem habilidade, força e autoconfiança. Fábio Zanon, o professor estagiário Testa, é supervisionado por Mascote, que, por sua vez, responde ao fundador, Nenel. Testa é responsável pelo núcleo há cinco anos e diz que o importante é desenvolver caráter, cidadania, disciplina dos alunos, buscando “formar cidadãos de bem. A intenção é fazer da capoeira uma ferramenta de educação”. Ele afirma, ainda, que o esforço da esposa, Ronilda, a Preta, é fundamental para que as atividades ocorram. “Sem a ajuda dela, nada disso seria possível”. Explica, ainda, que outro objetivo da

instituição é voltado para o resgate, a manutenção e a perpetuação do legado de Mestre Bimba. O grupo não participa de campeonatos, nos quais, segundo seus responsáveis, existe um sistema controlador de pontuação que não está de acordo com os fundamentos do núcleo. No entanto, existem avaliações internas do desenvolvimento de cada aluno. Para se inscrever nas aulas, é cobrada uma taxa de contribuição, no valor mensal de R$ 25,00. Os interessados aprendem desde os princípios da capoeira, passando pelas origens africanas, significados religiosos e possíveis benefícios do esporte para a saúde.

FOTO: FERNANDA LAURENTI

FERNANDA LAURENTI

O professor estagiário Testa (Fábio Zanon) com a esposa Preta (Ronilda), que é a coordenadora do núcleo

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Participação é frequente O núcleo faz parte do IMEC (Instituição Mascote de Educação e Cultura), que visa à preservação de manifestações culturais de raízes africanas e brasileiras. Preta afirma que os alunos que frequentam as atividades são assíduos. “Tem 20 pessoas participando das aulas. A grande maioria é de classe média baixa. Por isso, o núcleo oferece bolsas para integrantes que não têm condição de colaborar com a taxa mensal”. Ela reforça a ideia de que a instituição tem como prioridade a integração social de jovens da periferia, tirando-os da rua para aprender com o esporte. Marcos, capoeirista há 15 anos, conta que participou de vários projetos de capoeira, mas se sentiu acolhido nos Filhos de Bimba. “O fato de não disputar campeonatos fora não é um problema. As crianças se sentem motivadas a participar das aulas pelo bem-estar, energia envolvida, saúde que a prática oferece, exercício mental e educacional”.

FOTO: DIVULGAÇÃO

Mestre Bimba, o criador da capoeira regional, que mistura o esporte tradicional com outras modalidades

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FOTO: ARQUIVO PESSOAL

FALA AÍ! Jornalismo esportivo não é palhaçada

Leonardo Santos, estudante de jornalismo

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s emissora de televisão da nossa região, EPTV, TV Clube, Record... desrespeitam o povo, principalmente os amantes do futebol, quando tratam esse esporte como entretenimento, quando falam apenas o resultado das partidas. Futebol é expressão cultural, não é briga, não é qualquer brincadeira. Copiar o estilo de apresentação do Globo Esporte SP, feita por Tiago Leifert, é um tapa no rosto de botafoguenses, comercialinos, sertanezinos, jaboticabalenses... Tal apresentador teve sua visão de jornalismo moldada nos Estados Unidos, onde tudo é motivo para show e ganhar dinheiro. Quem conhece nossas praças esportivas sabe que nossa realidade é diferente. Então, vão falar: “Ah, mas no resto do mundo é igual!”. Não, não é igual. Na argentina, o Boca Juniors representa os habitantes de um bairro portuário de Buenos Aires. Tanto que suas cores são amarelo e azul, pois seus fundadores falaram que iam adotar as cores da bandeira do primeiro navio que atracasse no cais, no caso uma embarcação sueca. Seus torcedores são conhecidos como “Los Bosteros”, porque seu estádio, La Bombonera, foi construído sobre um

lugar onde era costume jogar os excrementos dos animais. O maior rival do Boca, o River Plate, é conhecido como “Millionarios”, porque, na época de sua fundação, representava a elite da capital argentina. Um dos mais acirrados clássicos do planeta, Celtic contra Rangers, ambos escoceses, não representa apenas dois times, mas duas ideologias. Quem torce pelo Celtic é católico e defende a independência de seu país ante o Reino Unido. Já torcedores do Rangers são protestantes anglicanos e preferem permanecer na Commonwealth. Na Espanha, é de praxe dizer que o Barcelona é a cara da Catalunha. Isso porque durante o período da ditadura de Franco, entre as décadas de 1930 a 1970, o clube traduziu no esporte a sua oposição ao regime, ao contrário do Espanyol, que, durante o período, chamava-se Espanhol, em apoio ao ditador. Essa época foi a mesma em que o Real Madrid cresceu, pois era a equipe preferida do general. Ainda na Península Ibérica, há o Athletic Bilbao, o clube identidade do País Basco, onde fica a cidade de Guernica, destruída pela ditadura franquista e que depois foi retratada por Pablo Picasso em uma de suas obras mais célebres. A instituição só aceita atletas bascos, pois acredita representar a região. Pode parecer xenofobia, mas não é. É expressão cultural. No Brasil, temos também um exemplo grandioso, Grêmio e Internacional. O colorado foi fundado por italianos, que não eram aceitos no Tricolor, pelo fato de

o Grêmio, na época, só aceitar alemães. Não é à toa que o mascote do Inter é o saci, esse personagem tão brasileiro, pra mostrar que qualquer um poderia ser aceito. O escritor Luís Fernando Veríssimo é colorado porque cresceu durante a Segunda Guerra Mundial. E, como o Grêmio era o clube dos alemães, preferiu o Inter. Quem assistiu ao filme “Boleiros”, de Ugo Giorgetti, sentiu o gostinho do que o futebol significa para os paulistanos. Aliás, um dos motivos de eu querer ser jornalista é a cena da repórter no hall do hotel em que o Palmeiras estaria hospedado, na manhã do clássico como o Corinthians, para conseguir entrevistas com os atletas. É emocionante descer do Ônibus na rua Clélia, com o tráfego parado, e ir caminhando até a Rua Turiassu. Isso parando antes em uma barraca de pernil, entrar no Palestra Itália e passear por suas alamedas antes dos jogos. Imagino que um corintiano sente o mesmo se reunindo com outros torcedores na Praça Charles Muller, um santista saindo da praia e indo pra Vila Belmiro e um são -paulino na Avenida Giovane Gronchi, pertinho do Palácio dos Bandeirantes, sede do Governo do Estado de São Paulo. Quantas histórias não têm aí? Futebol entretenimento foi algo inventado pelos europeus para vender a marca de seus clubes na Ásia, principalmente na China, Coreia do Sul e Japão, onde seus adolescentes reverenciam hologramas como artistas.

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Rúgbi

FOTO: LEONARDO SANTOS

Artur Reis, o Tuti (à esq.), aquecendo para o treino

O rúgbi é considerado irmão do futebol, mas, bem diferente do esporte das multidões, sofre com falta de apoio e só sobrevive graças a alguns apaixonados pela modalidade, como um grupo de Sertãozinho

As aparências enganam 28


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mbora o rúgbi seja um dos esportes mais difundidos no planeta, ainda é pouco praticado no Brasil. Mas tenta se desenvolver. A seleção nacional, chamada de Tupis, integra o sul-americano “Consur A”, que acolhe os principais times da região, entre eles argentinos, chilenos e uruguaios. Quem vence essa competição tem direito de disputar a vaga do continente americano na Copa do Mundo, que terá sua próxima edição em 2015, na Inglaterra. A Argentina, conhecida como Pumas, já está classificada pelo desempenho no último torneio, em 2011, quando chegou às quartas-de-final, perdendo apenas para a Nova Zelândia, a equipe mais forte do mundo na modalidade. Em Sertãozinho, interior de São Paulo, um grupo de 25 pessoas se reúne, nas tardes de domingo, para treinar na Escola Municipal Aparecida Ortolan Bellini. São os Gargula’s Rugby Union. O presidente, que também é técnico e jogador, é Fernando Pugliesi, conhecido como Macaco. Ele começou a jogar rúgbi por influência de um irmão, que conheceu o esporte quando estudava na Universidade Estadual Paulista (Unesp), em Bauru. No começo, em Ribeirão Preto, Macaco treinava com a equipe da Faculdade de Medicina da USP (FMRP). A disputa de competições, porém, era restrita aos estudantes e ele não podia participar. Depois, quando iniciou o curso de Educação Física numa faculdade privada, formou uma equipe com alguns colegas de curso, que não durou muito tempo. Foram proibidos de treinar no campo da instituição, com a justificativa de que estragavam o gramado. Foi então que, em 2007, chegou a Sertãozinho o neozelandês Joseph Harris, o Joey, que veio por meio de intercâmbio estudantil e reuniu alguns adolescentes para apresentar o esporte. “Originalmente, eu apitava as partidas para meus amigos. Depois, quando vi que já conheciam bem as regras, comecei a jogar com eles”, afirma Harris. Entre os garotos que ele treinava estava Artur Reis, o Tuti, que já acompanhava o esporte pela televisão, mas não entendia muito as regras. Só foi compreender quando Harris o chamou para jogar e aprender os fundamentos básicos. Por meio desses amigos para o qual

FOTO: LEONARDO SANTOS

LEONARDO SANTOS

De pé, o presidente, Fernando Pugliesi, conhecido como Macaco

apitava as partidas, Harris também foi apresentado a Pugliesi, que vivia comentando com as pessoas sobre qual era seu esporte favorito. Neste momento e a partir desse encontro, surgiram os Gárgula’s, pois Macaco se ofereceu para ajudar a treinar a equipe. Mas para conseguir um campo foi muito difícil. E ainda é: “Até hoje, treinamos às 14 horas, um horário ruim, já que durante o dia tem vários jogos de futebol amador. Só sobra este horário para nós”, diz Pugliesi. De início, tiveram apoio da

prefeitura, que acabou quando mudou a gestão. Foram treinar em terrenos baldios e no Parque Ecológico Gustavo Simioni, antes de chegarem ao local atual. Os pais de Fernando e de Tuti cobrem os gastos da equipe, comprando uniformes, fornecendo alimentação e transporte para os campeonatos, já que alguns atletas não têm condições financeiras para adquirir equipamentos e pagar a inscrição nas competições. O pai de Artur, Sheldon Reis, comerciante na cidade, se define como patrocina-

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FOTO: LEONARDO SANTOS

Os Gargula’s se aquecem para o treino puxado do domingo

dor do time e do filho: “’Paitrocínio’, como dizem. Ajudo no que posso. Você sabe como são os esportes amadores no Brasil? Se não ajudarmos, a coisa não anda”. Três modalidades se destacam O rúgbi é considerado um esporte irmão do futebol, afinal, até 1863, não havia separação entre os dois e as partidas eram jogadas com regras escolhidas antes de cada disputa. Hoje, o rúgbi é o segundo esporte mais praticado no planeta, perdendo justamente para o irmão. E seu Mundial é o terceiro evento mais acompanhado pela televisão, atrás dos Jogos Olímpicos de Verão e da Copa do Mundo Fifa. O rúgbi tem três modalidades principais. O Union, a mais antiga, necessita de 15 atletas em cada equipe e se manteve amador até 1995. O Mundial mais famo-

so do esporte é dessa modalidade. Em 2011, a audiência da final da competição foi de mais de quatro bilhões de espectadores. Seu atual campeão é a Nova Zelândia, equipe conhecida por All Blacks, que venceu a França por 8 a 7 na decisão. O League é outra modalidade, a mais praticada na Austrália. Para jogar, cada equipe deve ter 13 atletas. Originou-se em 1895, com o rompimento com a International Rugby Board. Foi quem primeiro adotou o profissionalismo, no ano de fundação. E, por fim, o Rugby Seven, que tem sete participantes por time e estará presente nas Olimpíadas de 2016. Será a volta do esporte aos jogos, que está fora desde 1924, ano em que a equipe dos Estados Unidos foi campeã. A disputa olímpica será nesta modalidade por ser uma prática que permite aos atletas uma recuperação física mais rápida, já que as

competições têm de acontecer em um período curto, de apenas duas semanas. O Gargula’s é um time da modalidade Union, com 15 jogadores por time, mas que tem jogado o Rugby Sevens. Macaco prefere o tradicional, o Union, que, pelo fato de ter sido amador por muito tempo, preservou a essência e seus valores. Mas ele diz gostar muito também do formato compacto. Acredita que, com a volta do esporte às Olimpíadas, as coisas já começaram a mudar para melhor, mas, para o esporte crescer no Brasil, necessita, também, de uma maior conscientização das pessoas e dos professores de Educação Física, para que não sejam ensinados nas escolas somente os tradicionais futsal e vôlei. Apesar dos obstáculos, ele planeja iniciar, em breve, um projeto social para crianças e adolescentes, entre nove e 16 anos.

FOTO: VINÍCIUS ALVES

Um gárgula aguarda a execução do hino nacional antes de um jogo

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Outro FOTO: ARQUIVO PESSOAL

Olhar

Ensaio fotográfico Fábio Melo

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om a proximidade da Copa do Mundo no Brasil, o futebol, esporte que domina as coberturas esportivas no país, ganha ainda mais força. Existe, no entanto, uma faceta do mundo da bola que é pouco explorada, apesar de espalhada pelos campos: o futebol das peladas de periferia. Aquelas em que a bola é quase oval, desgastada pelos chutes e pelo tempo, em que as traves são de bambus, a rede, rasgada, só recobre uma parte do fundo do gol, e praticamente não há público. Quando ele aparece, é composto pela vizinhança. Gente que compartilha dos sonhos de muitos desses meninos que, ao correr atrás da bola, correm tam-

bém atrás do sonho de uma vida melhor para a família. Foi esse universo esquecido pela grande mídia que chamou a atenção do fotógrafo Fábio Melo, de Ribeirão Preto. Desde 1999 trabalhando em jornais, ele decidiu tocar, como projeto paralelo, algo que não vinha para as páginas dos periódicos: o futebol dos campinhos surrados da periferia. Percorreu vários bairros da cidade onde mora para registrar a simplicidade do jogo em meio ao barro, praticado por jovens descalços. O trabalho de pesquisa e campo, que você nessas páginas, durou três meses.

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FOTO: SUSANA SANTOS

Jiu-Jitsu

O oponente Mas, na maioria das vezes, a luta mais difícil não está no tatame. A expansão do jiu-jitsu como sinônimo de disciplina, respeito e autoconhecimento bate de frente com a falta de divulgação, incentivo e oportunidade.

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é forte


SUSANA SANTOS

em longe do berço do jiu-jitsu, Ribeirão Preto abriga 20 escolas que ensinam artes marciais. A cidade recebe, todo mês, vários campeonatos pequenos. Sem cobertura da mídia tradicional, as competições são realizadas, normalmente, nos próprios locais de treinamento, financiadas pelos próprios alunos e academias. Quando há algum evento de maior expressão, um ginásio do poliesportivo Cava do Bosque é liberado pela prefeitura. A divulgação é feita apenas entre os praticantes, por meio de panfletos ou pela internet. O único patrocínio de iniciativa privada que chega a Ribeirão é da empresa de artigos esportivos Kamikaze Sports, promotora de campeonatos que têm revelado grandes talentos em todo o país. Em junho de 2012, Ribeirão sediou a Copa Enaf Kamikaze Sports de Jiu-Jitsu, realizada no Centro de Eventos Pereira Alvim e que contou com a participação de atletas de todo o Brasil. Em outras artes marciais, eventos importantes têm sido realizados em Ribeirão. A falta de apoio ainda é, como na maioria dos esportes, um entrave para a expansão. Atualmente, apenas escolas particulares incluem modalidades do tipo em seu currículo. Para a maioria dos interessados, é preciso se matricular em academias especializadas. Essa dificuldade de acesso impede o desenvolvimento de habilidades. Grandes mestres do jiu-jitsu, como Helio Gracie e

Jiu-Jitsu e Brasil, inseparáveis A história do surgimento do jiu-jit-

su, ou “arte suave”, é rodeada por mitos. A versão mais aceita é que a arte marcial tenha surgido na Índia por volta do século IV a.C., nos mosteiros budistas. Os monges afastados da civilização precisavam aprender técnicas de autodefesa. Movidos pela necessidade, criaram essa arte marcial que utiliza a força e o peso do adversário contra ele mesmo. Golpes e palavras ofensivas não são permitidos. É uma luta muito técnica. Os competidores ficam em contato constante com o tatame, o que elimina a vantagem da altura. Daí a razão de o esporte ter se popularizado no Japão e, de lá, para o mundo. Devido à eficácia da luta, pessoas do mundo todo se interessaram em aprendê-la. O governo japonês, temendo que o segredo do jiu-jitsu fosse espalhado, ordenou a criação de uma versão falsa da modalidade, que chamamos hoje de judô, para ser ensinado aos estrangeiros. O Brasil tem importância fundamental na existência e renovação do jiu-jitsu. Não fosse pelo encontro, no ano de 1917, em Belém do Pará, do professor e campeão mundial de jiu-jitsu, Konsei Maeda, com o jovem Carlos Gracie, essa arte marcial estaria, provavelmente, extinta. Maeda passou a ensinar o verdadeiro jiu-jitsu naquela cidade, enquanto Gracie não apenas aprendeu a luta, mas aperfeiçoou, renovou e ensinou a seus irmãos. Assim, surgiu o respeitado jiu-jitsu brasileiro, que atrai admiradores de várias partes do mundo.

Os alunos fazem pausas durante o treinamento... ...Mas a luta não para. Revezar o adversário é testar a si mesmo. FOTOS: SUSANA SANTOS

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Flavio Behring, afirmam que a prática do esporte não se limita ao aprendizado de defesa pessoal. Proporciona, também, autoconfiança para enfrentar as adversidades do cotidiano. A disciplina e o respeito aprendidos são capazes de transformar consciências, atitudes e, portanto, a realidade. Eder Calixto pratica jiu-jitsu há seis anos e, há dois, virou professor. Segundo ele, o esporte é indicado para todas as idades, pois faz bem, não só para o corpo, mas também para a mente. “Pratiquei outras lutas antes, mas foi no jiu-jitsu que me encontrei”. O calor tropical da cidade não impede o treinamento. A determinação, tipicamente oriental, é um dos fundamentos que os alunos de jiu-jitsu precisam aprender. Além dela, calma, honestidade e respeito ao adversário são requisitos básicos quando se está lutando. Mas, segundo os alunos do professor Calixto, é impossível não levar isso para a vida. Todos concordam que não há como agir diferente dentro e fora do tatame. O aluno Cícero Alves conta o que mais surpreendeu nas aulas: “O professor pediu que eu tentasse imobilizá-lo enquanto ele usava apenas uma das mãos. Achei que seria fácil, mas me enganei. Com apenas uma mão, ele conseguiu me vencer, porque no jiu-jitsu o que conta não é a força, mas a inteligência e a habilidade. Você tem que usar a força do seu adversário contra ele.”

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BASQUETE SOBRE RODAS

FOTO: PAMELA MENDES

Prática começou como lazer em associação de Ribeirão Preto, mas os resultados estimularam os atletas a montar uma equipe, que disputa o Campeonato Paulista, e levar os benefícios do esporte para hospitais e instituições de ensino

Sonhando alto

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FOTO: PAMELA MENDES

PÂMELA MENDES

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arta Neves Dias tem 25 anos. Participa da Associação de Amigos Deficientes de Ribeirão Preto (ADAD) há quatro meses. Cadeirante desde bebê, devido a uma paralisia infantil, trabalhava em casa e não praticava esportes. Estava entrando em depressão quando duas clientes a aconselharam a procurar na internet alguma atividade para cadeirantes. Foi quando Marta descobriu a associação e uma modalidade diferente, que permite a inclusão: o basquete sobre cadeira de rodas. “Me sinto muito bem fazendo parte desse projeto. A gente começa a gostar tanto do esporte quanto dos amigos que conhece.” O basquete sobre rodas da ADAD começou em 2010, a partir de portadores de necessidades especiais que praticavam o esporte apenas como lazer. Aos poucos, ganhou força a ideia de formar uma equipe, que representa Ribeirão Preto em várias competições. Atualmente, participa da Segunda Divisão do Campeonato Paulista, da qual é vice-campeã da Série Bronze 2012. Além de participar de torneios, o time também realiza visitas e apresentações em escolas, hospitais e universidades, para conscientizar a população das dificuldades de viver como cadeirante, ensiná-la s a lidar com pessoas deficientes, falar sobre a história de cada um dos atletas e fazer demonstrações da habilidade adquirida com o esporte adaptado. A equipe coleciona diversas conquistas, mas não só de troféus e medalhas. Cada obstáculo ultrapassado no dia a dia, como o preconceito, é contabilizado como uma vitória. Ricardo dos Santos Custodio, de 37 anos, é um exemplo. Está na cadeira de rodas há 13 anos. Conheceu o basquete por meio de amigos. “A associação e o basquete me ajudaram muito, porque eu não tinha objetivos. Hoje, penso diferente e tenho como meta melhorar nosso basquete e poder dar mais apoio aos deficientes.” O coordenador técnico da equipe, desde o início das atividades, é Jonathan Fernandes Carvalho. “Eu tenho muita alegria de fazer parte deste projeto. Estou apoiando uma causa que poucas pessoas desempenham. Por isso, sou voluntário de algo que precisa ter muito compromisso”.

Prática pode significar benefícios motores aos jogadores

Benefícios A prática de atividades físicas, tanto para competições quanto para diversão, pode trazer benefícios motores para os portadores de necessidades especiais, como agilidade, equilíbrio, força muscular, coordenação motora, resistência física, além de contribuir com os aparelhos circulatório, respiratório, digestor, reprodutor e excretor. Também desenvolve,

segundo Carvalho, velocidade e ritmo, ajudando na reabilitação e nas atividades da vida diária. Ele destaca, também, que ocorre uma melhora da autoestima, aumento da integração social e redução da agressividade, além de estimular a autonomia e a capacidade de resolução de problemas e superar limitações e situações de frustração.

Os basquetes são parecidos As regras do basquete em cadeira de rodas são muito parecidas com as do jogo tradicional. Existem pequenas alterações por causa da adaptação do atleta às cadeiras, da mecânica de locomoção e da necessidade de se jogar sentado. Violações de percurso: As violações de percurso acontecem quando o atleta excede a regra que permite impulsionar a cadeira duas vezes antes de driblar ou se livrar da bola, para passá-la ou arremessá-la. É similar ao “andar” no basquete tradicional. Pé no chão: Se o jogador apoiar-se com os pés no chão, o ato é considerado infração. Extensão do corpo: A cadeira de rodas é uma extensão do corpo do atleta. Se ela tocar a linha ou algum objeto que esteja fora da quadra, considerase que o jogador saiu com a bola. Cavar posse de bola: Ao contrário do basquete tradicional, é proibido atirar a bola num oponente para que ela saia da quadra. Caso isso ocorra, o lateral será cobrado pela equipe adversária. Faltas: O contato não acidental entre duas cadeiras de rodas caracteriza falta pessoal. E a falta técnica é marcada quando o jogador eleva-se do assento, quando remove os pés do descanso ou quando usa qualquer outra parte do corpo que não seja as mãos para obter alguma vantagem.

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NO PAÍS DAS OLIMPÍADAS...



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