“O PESE não é exclusivo da Aeronáutica” a sua edição nº 136, Tecnologia & Defesa, seguindo a sua linha de oferecer sempre que possível aos seus leitores reportagens com temas exclusivos, abordou, pela primeira vez na imprensa, o Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE), lançado em 2012 sob as égides da Comissão de Coordenação e Implantação de Sistemas Espaciais (CCISE). Constituída pelo Comando da Aeronáutica em fevereiro de 2012, a Comissão atua na linha de frente para concretizar os projetos do PESE. Para saber mais sobre os propósitos do Programa, seu momento atual e perspectivas, T&D entrevistou para este suplemento especial o presidente da CCISE, major-brigadeiro Carlos Vuyk de Aquino. Piloto com mais de três mil horas de voo em diferentes modelos, o major-brigadeiro Aquino tem MBA em administração de empresas e gerenciamento de projetos e, além de presidir a Comissão, desde abril de 2007 é também presidente da Comissão de Implantação do Sistema de Controle do Espaço Aéreo (CISCEA). Tecnologia & Defesa - Inicialmente, o senhor poderia discorrer brevemente sobre a origem e os principais objetivos da Comissão de Coordenação e Implantação de Sistemas Espaciais (CCISE) e do Programa Estratégico de Sistemas Espaciais (PESE)? Major-Brigadeiro Carlos Vuyk de Aquino - A CCISE foi criada pelo comandante da Aeronáutica em 29 de fevereiro de 2012 para coordenar os trabalhos à luz das diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa (END), incluindo seus elementos orbitais e a relativa infraestrutura de apoio, tanto dos componentes de uso exclusivo do Ministério da Defesa quanto públicos e/ou privados. Os trabalhos ocorrem sob
da Armada (EMA) e do Exército (EME).
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com o Ministério da Defesa, a Marinha, o Exército
referentes ao setor espacial. sistemas espaciais, incluindo sua infraestrutura de
Armadas e complementando as capacidades que Base Industrial Brasileira (BID), as entidades de dade em geral mediante uma demanda sustentável e frequente. programa exclusivo da Aeronáutica e vai atender às de toda a sociedade civil brasileira. O controle e o
T&D - O ano de 2014 começou com grande expectativa para a o PESE, que contava com a expectativa acabou frustrada em razão do são as expectativas para 2015 e para os próximos anos, inclusive em termos de contratação da indústria? Maj Brig Aquino - Atendendo a processualística Comando da Aeronáutica e ao Ministério da Defesa, sos disponíveis para o Ministério da Defesa frente mentos para os sistemas de sensoriamento remoto
o longo intervalo entre os contratos com a indústria
integradora brasileira, capaz de organizar e incluir a cadeia de fornecedores locais, e adquirir a tecT&D - O projeto mais conhecido do PESE envolve o desenvolvimento de uma constelação de satélites para diferentes aplicações, detalhar as características deste sistema? Mj Brig Aquino -
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de satélites brasileiros, para todos os sistemas operados pelos Comandos Militares e para o Sistema de
dos sistemas de monitoramento de ilícitos, por Os contratos com a indústria nacional produzi-
tentam promover e expandir os mercados de suas -
O estabelecimento de uma parceria internacional mitirá dividir os custos e riscos do desenvolvimento fato de que os satélites proporcionam uma cobertura global que pode ser aproveitada por parceiros fora da área de interesse do Brasil. Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), contratado pela e como este se insere no PESE? Mj Brig Aquino – Formalmente, a CCISE particiassinado em 2014, onde a CCISE apoia a Telebras em possuir três satélites geoestacionários de comu-
16 anos, esse intervalo de tempo entre os satélites satélite. O processo interministerial para a aprova-
micro-ondas. O incremento da disponibilidade de imagens de
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tanto, Defesa e Telebras uniram-se para construir o centro principal e o seu reserva em áreas militares da Aeronáutica e da Marinha, respectivamente. Além desses dois, a Telebras também conta com o apoio da Aeronáutica e do Exército para hospedar
impactos de desastres naturais, por meio do aumen-
interesse por parte da Telebras nesses outros dois a eles também.
ência no monitoramento ambiental, possibilitando
T&D - É sabido que a CCISE tem mantido contato com potenciais parceiros internacionais para a implantação do PESE, como a O senhor poderia falar um pouco a respeito? Mj Brig Aquino países. No caso dos mais desenvolvidos, há um grande interesse desses em participar das iniciativas brasileiras, mas o estabelecimento de uma parceria em andamento com características distintas das os representantes militares de nossos parceiros
T&D - Sobre o SGDC, aliás, há certa expectativa quanto à formalização de contrapartidas tecnológicas, os chamados offsets, no âmbito da contratação da construção do satélite, em CCISE tem participado dessas discussões? Mj Brig Aquino do contrato, a CCISE contribuiu diretamente ao colocar suas necessidades tecnológicas voltadas para os satélites de sensoriamento remoto óptico e mais efetiva das indústrias espaciais locais nos T&D - Na Europa e nos Estados Unidos, não é incomum a estruturação de parcerias público-privadas (PPP) nos setores espacial e de defesa para diferir e mesmo reduzir os investimentos necessários para o desenvolTECNOLOGIA & DEFESA 7
Imagens: INPE
Programa
CBERS
passado, presente e futuro André M. Mileski
o início de dezembro de 2014, foi dado mais um passo daquele que já foi considerado tecnológica entre dois países do Hemisfério Sul, o sucedido do primeiro satélite de segunda panorama sobre o programa, abordando o seu histórico, aplicações, participação da indústria nacional, distribuição de imagens e perspectivas futuras.
HISTÓRICO
um acordo de cooperação tecnológica visando ao desenvolvimento de dois avançados satélites de sensoriamento remoto, no então denominado China-Brazil Earth Resources Satellite a cargo, pelo lado brasileiro, do Instituto mento de satélites, e pelo lado
Para os dois países, o projeto era bastante ambicioso, e cada qual tinha as suas próprias deravam o setor espacial
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como estratégico, sendo que a China construção de satélites e veículos lançadores, o que interessava muito esforçava em avançar com a Missão com o objetivo de alcançar autonomia na fabricação, lançamento e opera ção de satélites de coleta de dados e de observação terrestre, o que lhe proporcionava familiaridade com alta tecnologia e também um parque in dustrial, na época, considerado mais moderno que o chinês. bém uma motivação de natureza fatos de que as duas nações têm porte continental, com grandes di despovoadas e elevada quantidade de recursos naturais, com claros minerais e ambientais. Para o me lhor aproveitamento de todas essas riquezas, era necessário constante
Testes dos painéis solares do CBERS
A SEGUNDA GERAÇÃO e a construção de dois satélites idênticos equipados não apenas com sensores óticos, mas também com um transponder os satélites dedicados da série SCD, integrantes da dades não foram divididas igualitariamente: à China, caberia o desenvolvimento, fabricação e custeio de
um novo acordo para a construção de duas novas divisão dos investimentos, agora igualitária, cada um respondendo por 50%. anos sem um satélite operacional da série e de atrasos causados por uma série de fatores, como
100% o tempo de sua vida útil estimada, de dois anos. O segundo, por sua vez, subiu ao espaço em
primeiro satélite da segunda geração, acordada em
Satélites de Taiyuan, na China, quanto ao voo do satélite no espaço, com a informação dos chineses de que teria havido algum problema no lançador. “Deu zebra?”, perguntou o então ministro de Ciên
novo artefato, idêntico aos de primeira geração, o segundo relatado em reportagem de Tânia Caliari,
ponentes e subsistemas construídos para o de senvolvimento e fabricação de seus antecessores, fabricação. Permaneceu operacional até 10 de maio de 2010.
Os dados iniciais de telemetria revelaram que os subsistemas atuaram normalmente após a inje ção do artefato no espaço. No entanto, a falha no terceiro estágio do foguete lançador, que teve sua queima prematuramente interrompida, impossibi litou que o satélite atingisse sua órbita prevista, reentrando na atmosfera.
Versão revista e atualizada do artigo original publicado em edição especial de Tecnologia & Defesa, intitulada “O que o Brasil busca no espaço”, em fevereiro de 2010. 1
TECNOLOGIA & DEFESA 11
Por que uma nova governança
espacial
global?
“Mais do que nunca, o futuro deste mundo depende do advento de uma ordem democrática global ainda incerta em suas formas e modalidades.” Sacha Goldman¹
José Monserrat Filho
DECLARAÇÃO DE MONTREAL debate dessa questão considerada crucial foi lançado pela 2ª Conferência Internacional sobre Governança Espacial Global, realizada em Montreal, Canadá, de 29 a 31 de maio de 2014, pelo Instituto de Direito Aeronáutico e Espacial da Universidade McGill, e presidida por Ram Jakhu, renomado professor de Direito Espacial, com a participação de 120 cientistas de 22 países. ração de Montreal, reconhecendo que: 1) “O atual sistema de governança global do espaço, criado durante os anos 1960 e 1970, não foi exaustivamente examinado pela comunidade internacional desde a sua criação”. Quer dizer, o sistema criado nas primeiras décadas da Era Espacial ainda não passou por uma crítica e avaliação, como deveria. Logo, é preciso repensá-lo e, em especial, atualizá-lo, 16 TECNOLOGIA & DEFESA
isto é, capacitá-lo para enfrentar as questões do século 21, influindo decididamente na definição e nos destinos das atividades espaciais do nosso tempo. 2) “O conceito de governança global hoje é abrangente e inclui ampla gama de códigos de conde segurança, instituições internacionais, tratados internacionais e outros acordos, regulamentos, procedimentos e normas”. Creio que a governança global compreende não só as fontes institucionais e jurídicas, com regras obrigatórias ou recomendatórias e cumprimento voluntário. Ela inclui também o conjunto de forças, políticas, sociais e culturais, exercidas de modo formal ou informal, que buscam liderar e nortear a comunidade mundial de países, povos, organizações governamentais e não governamentais, em prol de interesses públicos ou privados.
Divulgação
Como estrutura, a governança global, em qualquer setor, é um sistema complexo, com múltiplos fatores interconectados e interdependentes. Por isso mesmo, precisa guardar o mais alto grau de coerência para alcançar um desempenho convin3) “Intenso desenvolvimento ocorreu no mundo em geral e no setor espacial em particular, com sérias implicações para as atividades espaciais atuais e seja, o interesse público global no espaço exterior)”. De fato, houve considerável desenvolvimento em favor da paz e do progresso no mundo em gedo espaço e da sustentabilidade das atividades espaciais, em benefício do interesse público global. Mas, para pensadores como Sacha Goldman, “o que atualmente passa por governança mundial é gravepelos poderosos, para os poderosos – sejam eles estados dominantes ou grande multinacionais”.² Haveria motivos para deixar o setor espacial fora desse juízo? 4) do atual regime de governança espaço global e propor um sistema apropriado de governança global do espaço que aborde questões atuais e emergentes”. Aqui, a Declaração deixa claro o seu objetivo. Além de frisar a necessidade de avaliação do atual regime, ela, ao mesmo tempo, já faz sua própria avaliação, propondo “um sistema apropriado de governança espacial global que aborde questões atuais e emergentes”.
POR NOVA GOVERNANÇA ESPACIAL GLOBAL Baseada nessas premissas, a Declaração conclama “a sociedade civil, acadêmicos, governos, setor privado e outros interessados a considerar a preparar e convocar uma conferência internacional para deliberar e acordar recomendações aos governos e organizações internacionais relevantes para o estabelecimento de um regime de governança uso e exploração do espaço em benefício de toda a humanidade”. A Declaração também conclama “o Instituto de Direito Aeronáutico e Espacial da Universidade McGill a assumir a liderança na tarefa de iniciar, completar e difundir (...) um estudo interdisciplinar internacional que examine as forças condutoras de regulamentos e normas espaciais antes da, e em apoio à, conferência internacional proposta, tendo como alvo um público global”. A futura conferência internacional, que visa a um “público global”, já foi convocada para 2016, e terá como ponto de partida “um estudo interdisciplinar” sobre “as forças condutoras de regulamentos e normas espaciais”. Esse estudo poderá exercer jurídicas e culturais que conduzirão o processo jurídico necessário à criação de novo sistema de
governança espacial global. Essa visão será ampla mais poderosas da atualidade?
CINCO PONTOS A SEREM ESTUDADOS Bom sinal é a ênfase dada pela Declaração à necessidade de que o estudo trate, entre outros, de cinco pontos: “1) as mudanças nas condições econômicas, políticas e sociais globais e a dependência da infraestrutura espacial; aças espaciais conhecidas; 3) as oportunidades espaciais e a necessidade do espaço para toda a humanidade; 4) as lacunas de segurança, de técnica e operacionais a serem preenchidas; e 5) as normas, regulamentos, entendimentos, acordos e instituições apropriados relevantes à governança espacial das questões correntes e emergentes das atividades espaciais.” O ponto 1 implica conhecer bem o quadro de transformações globais em que vivemos do ponto de pois esse é o pano de fundo da nova governança global em geral e da nova governança espacial global em particular, que buscamos criar de comum acordo. A propósito, o Apelo por uma Governança Mundial Solidária e Responsável começa dizendo: “Defrontamo-nos com uma conjuntura de crises de alcance mundial que não tem precedente na história: esgotamento dos recursos naturais, destruição irreversível da biodiversidade, perturbações pandemias virais, desagregações políticas... Ora,
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Para um controle ainda mais efetivo O papel dos satélites de sensoriamento por radar
André M. Mileski
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Synthetic Aperture Radar
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MONITORAMENTO E VIGILÂNCIA MARÍTIMA
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offshore -
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A constelação italiana COSMO-SkyMed, formada por quatro satélites, permite uma
Telespazio
rápida aquisição de imagens
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Divulgação
A tecnologia e o domínio da
Informação Marcos Arend
a década de 1990, o então general norte-americano Joseph William Ashy, comandante da Divisão Espacial da Força Aérea, anunciou: “Batalhas (e defesa) dependem de tecnologias espaciais para prover comunicações de comando e controle, para empregar sensores e sistemas de armamento de alta tecnologia e acessar uma vasta gama de dados de inteligência e informações em tempo real que trazem vantagens decisivas para o sucesso da missão.” A tecnologia tem permitido, em vasta escala atualmente, a criação de novas soluções e ao mesmo tempo novas ameaças. Estamos presenciando a “quinta geração” em soluções de defesa
que requerem capacidades de Comando, Controle, Comunicações e Computadores (C4) e Inteligência, Sensoriamento, Aquisição e Reconhecimento (ISTAR) para as quatro funções básicas da Consciência Situacional: detectar, coletar, processar e disseminar. Em oposição aos obsoletos e frágeis sistemas centrados as soluções de quinta geração, esses sistemas possuem múltiplos sensores, múltiplos canais e com múltiplos caminhos, permitindo robustez (redundância), prontidão, múltiplas opções e velocidade. No segmento espacial de defesa as soluções
que controlam e gerenciam a infraestrutura de
tecnológico das novas plataformas espaciais. São novas tecnologias espaciais em computadores de bordo, sensores, suprimento de energia, motores e subsistemas de comunicação.
rede (NCW).
cognitivos, algoritmos genéticos, sistemas adapta-
sinais eletromagnéticos (EW) ou das redes de
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tivos, networking, fusão de dados e etc, são termos que agora predominam nas tecnologias de quinta geração. A base da indústria de defesa nunca foi tão dependente de novas tecnologias. É muito interessante percebermos que a questão da guerra de informações parece ser uma adaptação evolucionária básica resultante da competição no jogo da sobrevivência (Teoria dos Jogos). No cenário de quinta geração de tecnolosuperior à capacidade de ação e/ou de recursos toricamente e mesmo em teoria (“Hypergames”). A partir dos dados captados podemos ter a ação efetiva, manipular e persuadir. Sem a informação podemos desperdiçar recursos e até fazer ações que prejudiquem a nossa posição. O controle da informação é uma questão polêmica no Brasil. Muito se fala sobre as soluções espaporém, normalmente, as soluções espaciais não possuem caráter “dual”. Existem grandes diferenças operacionais e funcionais (sem entrar no mérito dos problemas de segurança da informação ou mesmo grande vulnerabilidade a “jamming” (interferência pode facilmente ter suas funções de comunicação do largo “footprint” (área de cobertura) do laço de subida (“uplink”) satelital. Satélites de comunicação militares são projetados para apresentar uma alta diretividade (pequeno “footprint”) e dinamismo de a ação “jammining”, critérios que permitem a sua Em termos tecnológicos vivemos um momento de transição, onde as pequenas plataformas espaciais estão recebendo grande interesse. São diversos os programas de pequenas plataformas para ciais Conjuntas (ORS) possui programas e missões designadas a prover rápida colocação em operação, baixo custo e criação de rápidas capacidades para os emergentes requerimentos espaciais. As possibilidades tecnológicas resultantes de operações conjuntas de satélites (especialmente no caso de micro e nano satélites) vão além dos avanços tecnológicos na plataforma. As formações de satélites (“Clustering”) são um novo paradigma para soluções de comunicação em ultra banda-larga, sensoriamento remoto, geo-referenciamento, redução de custos, redundância operacional, modularidade e expansão operacional sob demanda. As capacidades individuais de cada plataforma aumentam a capacidade de processamento e de comunicações do sistema; a fusão dos seus sensores permite melhorias em imageamento ótico ou por radar. Cada vez mais as unidades são menores, mais leves e mais simples de serem fabricadas. Em escala, uma formação é mais econômica que um satélite (solução falha de algum de seus elementos; satélites com
otimizar-se em cada diferente missão. Não necessitamos analisar muito aprofundadamente o cenário mundial, seja em uma visão econômica ou de desenvolvimento ou de segurança nuar com os investimentos em tecnologia espacial. Não devemos e, principalmente, não podemos apenas integrar sistemas. Casos recentes de espionagem em sistemas espaciais de tecnologia estrangeira são apenas um exemplo do caminho que devemos seguir. As ações das Forças Armadas, do Ministério da estão levando a um fortalecimento do segmento de defesa. Estamos presenciando uma estruturação da Base Industrial de Defesa, na ciência de que um Brasil soberano e independente demanda o Sistemas, fundada em 1983, pela designação do então Ministério da Aeronáutica, com o propósito equipamentos aeroespaciais embarcados. Em seus 32 anos de atividades foram milhares de equipamentos fabricados para o segmento aeronáutico e dezenas para o segmento espacial. Atualmente, a empresa vem se estruturando e capacitando-se para o desenvolvimento de soluções espaciais espeindustrial, experiência em subsistemas e parcerias estratégicas são os preceitos para o atendimento das demandas brasileiras. Segundo as diretivas do “roadmap” do Departamento Americano de Defesa (DoD) de 2003: “Nós devemos ”lutar contra a rede”. O DoD está construindo uma força baseada na informação. As redes estão aumentando o centro de gravidade operacional, e o Departamento deve estar preparado para “lutar contra a rede” ’” ...seguido de trechos censurados. N. da R.: Marcos Arend é diretor de Tecnologia da AEL Sistemas S.A
Programa Net Tracker, do DARPA. Otimização e fusão de sensores em rede TECNOLOGIA & DEFESA 27
Lançadores:
a meta mais urgente Ivan Plavetz*
m país que aspira altos patamares de desenvolvimento e soberania deve voar com
Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE), subordinado ao Conselho
robusta indústria aeronáutica que busque o mais
Força Aérea Brasileira (FAB) era marcante. Em 1961, ainda sob o impacto da primeira viagem do homem pelo espaço e a visita do astronauta russo Yuri Gagarin ao Brasil, o presidente Jânio Quadros assinou o Decreto n.º 51.133, que instituiu o GOCNAE. Os principais participantes do programa no seu início foram o Centro Técnico da Aeronáutica (CTA), Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IPD), todos de São José dos Campos (SP). Nos anos seguintes, entre 1962 e 1964, houve uma divisão de
meta de acessar o espaço autonomamente. Antes da Segunda Guerra Mundial já havia no Brasil incipientes atividades envolvendo a construção e o lançamento de artefatos primitivos. mundial, ao longo do qual surgiram novas armas, especialmente foguetes de tecnologia aprimorada, reascendeu o interesse por esse tipo de veículo. De início, na Escola Técnica do Exército (ETE), atual Instituto Militar de Engenharia (IME), alunos que frequentavam o curso de autopropulsão empreenderam como trabalho de formatura a construção de des, foi lançado com sucesso em 1949. Entre 1949 e 1972, 36 projetos de foguetes impulsionados por propelente sólido foram desenvolvidos, sendo 33 deles produzidos e testados na prática. Alguns alcançaram relevância, entre esses o lançador M108R, de 1952, que foi fabricado pela Avibras Aeroespacial e esteve em serviço nas décadas de 1970 e 1980; outro, de dois estágios, de foguete ainda maior, o Sonda I (apelidado de Gato Félix), capaz de alcançar apogeu de 120 km com 30 kg de carga útil, e que teve seus componentes testados estaticamente, mas não foi lançado. por conta da Marinha que, na década de 1960, desenvolveu pequenos foguetes da série SOMMA (SOndagem Meteorológica da MArinha). Ainda dessa época, o Ministério da Aeronáutica lançou um programa independente em 1955, que resultou no foguete SOMFA (SOndagem Meteorológica para a Força Aérea). Nenhum apresentava tecnologia como aqueles desenvolvidos pela ETE, pois se destinavam a pequenas cargas úteis, de cerca de 5 kg, de partículas metalizadas liberadas no ar para medir a velocidade dos ventos com uso de radares. Apesar do grande potencial dos projetos do ETE, a partir de 1961 optou-se por concentrar a pesquisa espacial no 28 TECNOLOGIA & DEFESA
Comissão Nacional de Atividades Espaciais (CNAE), que mais tarde tornou-se o Instituto de Pesquisas Espaciais e, posteriormente, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e no campo militar, dentro do Grupo Executivo e de Trabalho e Estudos de Projetos Espaciais (GTEPE), criado em 1964, mais tarde Instituto de Atividades Espaciais (IAE). A prioridade era capacitar recursos humanos, e ainda em 1964, técnicos do GTEPE estiveram na Argentina para treinamento no campo de lançamento da Força Aérea, em Chamical, onde tiveram contato com lançamentos de foguetes Belier Centaure franceses e Nike Cajun, dos Estados Unidos. Em outubro daquele mesmo ano foi iniciada a construção do Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), em Parnamirim (RN). O ano de 1965 marcou nova etapa do Programa Espacial Brasileiro (PEB). Em fevereiro, técnicos do GTEPE e da CNAE participaram, a título de treinamento, do lançamento de um foguete Nike Apache, nos Estados Unidos, sob supervisão da Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço (NASA). O projeto SAFO (Sondagem Aeronômica com Foguetes), o qual previa o lançamento do mesmo tipo de foguete a partir do CLBI. Em 24 de agosto de 1965, a equipe brasileira, orientada por técnicos da NASA, efetuou o primeiro lançamento. A continuação da missão SAFO teve como complemento a SAFO-IONO, ocasião em que dois foguetes Nike
a sua aposentadoria, em 1977. A participação brasileira no programa South Atlantic Anomaly Probe, da NASA, em 1968, rendeu acesso à tecnologia dos motores de propelente sólido de última geração. Em 1969, subiu ao espaço o Sonda II, lançado do CLBI, e considerado o “foguete-escola” da moderna indústria brasileira do segmento. O veículo não foi uma evolução do Sonda I, e sim projetado com base nos conhecimentos adquiridos com o foguete canadense Black Brant III. Impulsionado por um motor S20, o Sonda II foi lançado pela primeira vez no CLBI em julho de 1969. Os principais ganhos em termos de salto tecnológico foram o emprego de aços da classe cromo,
EM BUSCA DA MATURIDADE Em 1979, o Governo Federal aprovou a proposta da Comissão Brasileira de Atividades Espaciais (COBAE) para a realização da Missão Espacial Completa Brasileira (MECB), visando estabelecer um programa espacial completo. As metas mostraram-se ambiciosas, envolvendo uma nova base de lançamento, o Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), um novo lançador, o Veiculo Lançador de Satélites (VLS), e duas famílias de satélites, uma para coleta de dados (SCD) e outra para sensoriamento remoto (SSR).
O VLS-1 foi concebido no âmbito da MECB, de 1979 IAE-DCTA
Apache foram lançados, inaugurando o CLBI, nos dias 15 e 18 de dezembro. Após reformulações no Programa Espacial, em 1967 foi lançado o protótipo do Sonda I, com um único motor de propelente sólido S10-2 a partir do CLBI, sendo posteriormente dotado de um segundo estágio acelerador S-10-1. O Sonda I teve certa importância em termos tecnológicos, pois serviu como escola nas áreas de construção, lançamento e rastreamento, em tecnologias como tubos de alumínio sem costura. A Avibras Aeroespacial foi o principal braço industrial do Sonda I, e segundo
estruturas de propulsores, sistemas de separação de estágios com parafusos explosivos, instrumentação básica embarcada de telemetria e telecomando, proteções térmicas rígidas, e propelentes. Dos vários modelos derivados, o último tinha massa de decolagem de aproximadamente 370 kg e apogeu entre 50 e 100 km, junto a uma capacidade para transportar de 20 a 70 kg de carga útil. No total, 61 Sonda II foram lançados. No começo da década de 1970, e no início da cooperação com a Alemanha na área nuclear, o Brasil estabeleceu com a França acordos para treinamento de engenheiros no desenvolvimento de lançadores e satélites. Como resultado, aconteceu em fevereiro de 1976, no CLBI, o voo do Sonda III. Este foguete representou também um importante avanço em desenvolvimentos. Bem maior que seu antecessor e dotado de dois estágios, sendo o primeiro equipado com o motor S20 do Sonda II e, o segundo, com um propulsor S30. Foi dimensionado para apogeu da ordem de 500 km e cargas úteis de até 150 kg. Incorporou avanços como rede elétrica mais elaborada e carga útil instrumentada completa composta por sistemas de separação de estágios e de ignição para o segundo estágio, carga útil tecnológica para aquisição de dados durante todo o voo, sistemas de autodestruição telecomandado, útil e de recuperação da carga útil no mar e muitos outros dispositivos eletrônicos. O projeto teve sua parte gerencial mais estruturada e documentada e permitiu que pessoal do CTA se familiarizasse com metodologias de trabalho e de engenharia como elemento aglutinador de pesquisadores para a constituição de um sólido grupo de especialistas. Foi desenvolvida uma segunda variante dotada de motor S23 no segundo estágio, cerca de um metro mais curto. Além dessa, uma versão com segundo estágio em material compósito também foi projetada, o Sonda IIIA. TECNOLOGIA & DEFESA 29
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Indústria Espacial Brasileira
Um panorama André M. Mileski
mais recente versão do Programa Nacional de Atividades Espaciais (PNAE 2012 - 2021), editada há três anos, é farta nas citações e disposições sobre a importância do setor industrial para o Programa Espacial. Cita como prioridade maior “impulsionar o avanço industrial”, e lista como uma de suas diretrizes estratégicas a consolidação da “indústria espacial brasileira, aumentando sua competitividade e elevando sua capacidade de inovação, inclusive por meio do uso do poder de compra do Estado, e de parcerias com outros países.” Mesmo em pouco tempo, algumas de suas diretrizes foram inseminadas de forma relativamente bem sucedida. Foi o caso, por exemplo, do surgimento de uma integradora nacional (prime-contractor) para o segmento de satélites, lacuna ocupada pela Visiona Tecnologia Espacial, joint-venture da Embraer com a Telebras, viabilizada com a concretização do projeto do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC). Uma iniciativa similar no segmento de lançadores também chegou a ser discutida nos gabinetes de Brasília, embora ainda não concretizada, depois de certo burburinho e uma sequência de movimentações nos bastidores, com o grupo Odebrecht sendo desenhado como principal player industrial. Mas, apesar desses primeiros passos, positivos, o cenário atual é considerado grave, diante das incertezas quanto a novas encomendas do governo após uma série de contratos entre 2009 e 2011 para o CBERS e as missões Amazônia-1 e Lattes, ambas baseadas na Plataforma Multimissão (PMM), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que ameaçam a existência de uma capacidade industrial desenvolvida ao longo de décadas. Algo característico do mercado espacial em qualquer lugar do mundo, o papel do Estado, pondo encomendas com regularidade, e assim propiciando condições para a manutenção de toda uma cadeia produtiva, com os benefícios a ela atrelados, é inquestionável. A seguir, um breve panorama sobre as principais empresas que integram a base industrial espacial brasileira.
A AEL Sistemas, sinônimo no País de aviônica e veículos aéreos não tripulados, possui mais de 20 anos de experiência em tecnologia espacial, tendo desenvolvido e produzido diversos equipamentos eletrônicos para satélites brasileiros, em particular, sistemas de suprimento de energia - 11 diferentes dispositivos. É o caso, por exemplo, dos satélites do programa CBERS, de observação terrestre. A empresa também participa do Projeto SIA - Sistemas Inerciais para Aplicação Aeroespacial, iniciativa liderada pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA), de São José dos Campos (SP), através do desenvolvimento, produção e testes do computador de bordo (OBC). O OBC possibilita a capacidade de processamento e interfaces para executar as atividades de supervisão de bordo e controle de atitude e órbita de lançadores e satélites. A AEL Sistemas conta com uma sala limpa de classe 100.000, além de câmaras climáticas e um shaker para ensaios ambientais e mecânicos. Sua normas da Agência Espacial Europeia, para a montagem de componentes SMD (surface mount technology / tecnologia de montagem em superfície). Em 2013, a AEL trabalhou ativamente junto com outros parceiros do Rio Grande do Sul na elaboração de uma proposta de desenvolvimento de um microssatélite multimissão para aplicações militares (MMM), no âmbito do Inova Aerodefesa, sendo também uma das empresas âncora para a criação do polo espacial do Estado. TECNOLOGIA & DEFESA 35