24. Tuberculose e diabetes mellitus
24. Tuberculose e diabetes mellitus JSX, 30 anos, 25 anos, masculino.
Procurou o clínico para receber orientações em relação a resultados de exames. Refere
ser estudante e que iniciará um curso de pós-graduação nos Estados Unidos em 6 meses e, por isso, foi solicitado um PPD que foi positivo (12 mm).
Não tem sintomas respiratórios, febre ou emagrecimento. Nega qualquer contato com
indivíduos com diagnóstico de tuberculose. Tem diabetes mellitus tipo 1 há 12 anos e diagnóstico de Hipertensão arterial há 8 meses em uso de: insulina NPH 8 UI antes do café, 8 UI antes do almoço e 6 UI ao deitar, insulina regular 7 UI antes do café, almoço e jantar, corrigindo de acordo com a glicemia capilar feita nesses momentos. Controla a PA com Enalapril 10mg/d.
Foram solicitados exames para mapear possíveis complicações do diabetes e para o
diagnóstico de tuberculose (TBC): - Radiografia de tórax: sem alterações. - Hemograma normal. - Sedimento urinário normal, sem albuminúria. - Fundo de olho normal. - Hemoglobina glicada: 7,5%. - Creatinina 0,6mg/dL. - Lipidograma normal. Pergunta: como lidar com o resultado do PPD?
DISCUSSÃO O teste tuberculínico ou intradermo, reação com o uso de um derivado proteico purificado, sigla PPD em inglês (purified protein derivative), é um exame utilizado na investigação de pacientes com suspeita de tuberculose. Descrito pela primeira vez em 1890, o teste tuberculínico é o exame mais antigo utilizado no diagnóstico de tuberculose e ainda é muito utilizado na prática clínica atual.
Este exame consiste na avaliação da resposta imunológica do indivíduo frente ao contato com proteínas retiradas de algumas espécies de micobactérias, especialmente Mycobacterium tuberculosis e Mycobacterium bovis. Para a padronização da execução do teste, doses fixas destas proteínas são injetadas na região dérmica do antebraço direito (terço médio, face anterior) e a leitura do exame é realizada após 72h. O surgimento de uma área endurada, com nodulação, ou até mesmo vesiculação é apenas um marcador de contato prévio do indivíduo com o bacilo da tuberculose e não é suficiente para o diagnóstico de tuberculose. No caso acima, o paciente não apresenta sinais clínicos de infecção pela tuberculose e tem radiografia de tórax normal, o que descarta possibilidade de tuberculose ativa. Neste contexto, um PPD de 12mm indica o contato prévio com o M. tuberculosis. Porém, como não possui doença ativa, configura um caso de tuberculose latente. O diabetes mellitus tipo 1 é considerado uma condição imunossupressora para o desenvolvimento da tuberculose e é o principal fator de risco apresentado neste caso. A infecção latente por M. tuberculosis é o período entre a penetração do bacilo no organismo e o aparecimento da doença tuberculose propriamente dita, oferecendo a oportunidade para a adoção de medidas medicamentosas que impeçam sua evolução, denominadas atualmente de tratamento da tuberculose latente, em substituição ao termo anteriormente utilizado, quimioprofilaxia.
Neste caso, o tratamento da infecção latente deve ser realizado com o uso da isoniazida
na dose de 5-10mg/kg de peso (até 300mg/dia) por 6 meses; o prolongamento para 9 meses traz poucas vantagens em relação à probabilidade de doença futura e não deve ser utilizada rotineiramente. Relação entre tuberculose e diabetes
Historicamente, a incidência de tuberculose (TB) em pacientes com diabetes (DM) tem
sido referida como alta. Em 1934, um tratado sobre a associação entre diabetes e tuberculose, antes da era antimicobacteriana, referia que em portadores de diabetes a tuberculose era mais comum do que o esperado. Mais recentemente, numerosos estudos demonstraram que pessoas portadoras de diabetes têm um risco 3 vezes maior de ter tuberculose ativa, com risco ainda maior entre os
mais jovens e em populações nas quais a incidência de TB é alta. Apresentações radiológicas atípicas também são relatadas, com comprometimento relativamente frequente de lesão em base pulmonar e de formas muitlicavitarias. Além disso, o diabetes mellitus está associado com aumento de falha de tratamento e de morte por tuberculose. Os pacientes com diabetes têm um risco relativo (RR) para o desfecho combinado de fracasso e de morte de 1,69 (95% CI, 1,36-2,12). O risco de recidiva da doença também é aumentado em diabéticos. Embora não haja razão justificada para se esperar resistência às drogas antituberculose em diabéticos, alguns estudos relatam piores resultados terapêuticos, mesmo com adesão adequada ao tratamento. Sabe-se que infecções, de maneira geral, podem agravar o controle do diabetes e a tuberculose não é uma exceção; além disso, as drogas usadas para tratar a tuberculose também podem piorar o controle glicêmico e alguns estudos mostraram que a evolução clínica é pior em pessoas com diabetes e controle inadequado; portanto, na vigência de DM a monitoração glicêmica e o bom controle da glicemia devem ser incentivados. A sobreposição da toxicidade medicamentosa e piora de complicações associadas ao diabetes mellitus deve ser lembrada, como por exemplo, o risco de neuropatia periférica pela isoniazida que pode agravar ou exacerbar a neuropatia diabética pré-existente, razão pela qual a piridoxina sempre deve ser adicionar à isoniazida durante o tratamento da tuberculose em pessoas com diabetes. Já o tratamento com rifampicina pode ser responsável pelo aumento da glicemia por interação com hipoglicemiantes orais, uma vez que a rifampicina é um indutor de enzimas relacionadas ao citocromo P 450, acelerando o metabolismo de algumas drogas inativadas por esta via. A glibenclamida e glipizida têm suas concentrações diminuídas em 39 e 22%, respectivamente, quando usadas com rifampicina, reduzindo o efeito hipoglicemiante. Lesões hepáticas, insuficiência renal e outras complicacões do diabetes podem também ser complicadores do tratamento da tuberculose. Resumindo, em diabéticos uma busca mais ativa de casos e o tratamento da tuberculose latente, assim como o controle glicêmico adequado são recomendados. Leitura recomendada Dooley KE, Chaisson RE. Tuberculosis and diabetes mellitus: convergence of two epidemics. Lancet Infect Dis. 2009 Dec;9(12):737-46.