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TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO Rebeca Boltes Cecatto

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tr aum atismo cr anioencefálico

L

esão cerebral de causa traumática externa de diferentes etiologias que resulta em sequelas físicas, cognitivas e psicocomportamentais, em diversos graus”.

GRAVIDADE DO TCE

A gravidade do TCE depende de inúmeros fatores relacionados ao trauma, ao mecanismo de trauma e a suscetibilidade do paciente. A gravidade inicial do trauma irá determinar a profundidade e duração do coma, bem como a duração da APT (amnésia pós traumática). A profundidade do Coma pode ser avaliada pela Escala de Coma de Glasgow (ECGl) - vide tabela 1- e quando a ECGl é menor que 8, é considerado estado de COMA. O nível da ECGl realizado na admissão do paciente caracteriza: • TCE Grave - 3 a 9 pontos na ECGl após 6 horas do TCE. • TCE Moderado - 9 a 12 pontos na ECGl após 6 horas do TCE. • TCE Leve - ECGl > 12.

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TABELA 1 ESCALA DE COMA DE GLASGOW Abertura Ocular Espontânea 4 Comando Verbal 3 Estímulo Doloroso 2 Nenhuma 1 Melhor Reposta Motora Obedece Comando 6 Localiza Estímulo Doloroso 5 Retira membro à dor 4 Flexão anormal (decorticação) 3 Extensão anormal (decerebração) 2 Nenhuma 1 Resposta Verbal Orientado 5 Confuso 4 Palavras inapropriadas 3 Sons 2 Nenhuma 1

A incidência de TCE é: • Leve - 80 a 90% • Moderado - 3 a 5% • Grave - 5 a 10%

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FISIOPATOLOGIA E MECANISMO DE TRAUMA DO TCE

A Lesão Difusa é a principal diferença entre o TCE e as lesões vasculares localizadas, como o AVE. O mecanismo de trauma craniano mais comum é a Contusão. Ambas as lesões, focal ou difusa, na maioria das vezes, coexistem e contribuem para a mortalidade. A Contusão é uma lesão local ocasionada pelo mecanismo de golpe (direta) e pelo contra golpe (indireta). Há uma lesão tecidual local (na região do trauma) seguido de lesão na região contralateral, através do mecanismo de contra golpe (latero/lateral e rotacional). Pode levar apenas a leve contusão local até à morte com a lesão tecidual local e contra lateral, ou com hemorragias e hematomas consequentes ao trauma que ocasionam lesão local ou um efeito de massa (à distância - indireta), ou ainda uma herniação, brain swelling local e difuso e microlesão vascular substância cinzenta e branca. O mecanismo Golpe/Contra Golpe está presente em 90% dos casos seguidos de morte imediata. Os mais comuns são : bifrontal (occipital) e temporal (bitemporal), hematomas (Hematoma Extra Dural, Hematoma Subdural, Hematoma Subaracnóide, Hematoma Intraparenquimatoso ). É a principal causa de morte pacientes com TCE seguido de intervalo lúcido. Em crianças, pode não estar acompanhado de fraturas ósseas. Fisiopatologia da Lesão Focal Primária: • Contusão focal. • Hemorragias e/ou hematomas. • Fraturas.

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Focal Secundária: • Brain Swelling. • Lesão bioquímica. • Injúria microvascular e hipoxêmica (a maioria de substância cinzenta). • Hipertensão Intra Craniana (HIC) (hipóxia e herniação). • Lesão Axonal Difusa (LAD). • Herniação cerebral. Difusa Primária ou Secundária: • LAD (edema axonal e/ou cisalhamento). • Brain Swelling. • Petéquias hemorrágicas da substância branca (secundária). • Lesão bioquímica. • Injúria microvascular e hipoxêmica substância cinzenta e branca. • HIC (hipóxia e herniação). • Anóxia. Lesão Vascular Localizada ou Difusa • É uma lesão que independente do mecanismo de trauma pode ou não ocorrer. Brain Swelling • É uma resposta monótona do cérebro. Toda lesão (difusa ou localizada) leva ao inchaço cerebral em maior ou menos grau (brain swelling). • Pode ser associado ou não à Lesão Axonal Difusa, à isquemia global e outras lesões localizadas. • É um acúmulo de líquido no interstício cerebral (liquído inflamatório).

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Edema vasogênico e citotóxico • Acontece quando há quebra da barreira hematoencefálica, aumento do fluxo cerebral sanguíneo e retenção de líquido inflamatório que levam a uma alteração da integridade vascular, acúmulo de água no interstício e o mal funcionamento das bombas iônicas das membranas celulares. • Ocorre 24 a 48 horas pós TCE e seu pico 4 a 8 dias pós TCE. Alterações metabólicas: • Podem ser: Focais ou Difusas. • Ocasionadas pela neuroexcitação, pela energia mecânica do trauma, pela degradação integridade celular e da bainha de mielina e pela morte celular. • São mediadas pelas alterações do equilíbrio iônico, glutamato, interleucinas, metabolismo da glicose, ácido aracdônico, opióides endógenos, acetilcolina, lactato, creatinina, aspartato, radicais livres, Na, Ca, K, Mg, alterações mitocondriais e genéticas. • É uma opção terapêutica futura com terapias gênicas, bioquímica e neuroplasticidade. Lesão Axonal Difusa • É a“marca registrada” do TCE. É o achado mais comum, de influência prognóstica a longo prazo. • Acontece em 50 a 60% dos TCEs agudos graves. • Embora difusa e disseminada é microscópica e muitas vezes de difícil visualização aos exames de imagem. Mais do que difusa é multifocal. • É muito comum acontecer em esportes (futebol, futebol americano, hockey, rugby) e shaken-baby syndrome. • As crianças são mais suscetíveis devido ao tamanho relativo do crânio (diâmetro crânio/tronco maior), à fraqueza da musculatura cervical e pouca mielinização dos neurônios.

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• A força mecânica do trauma (que é a força de inércia e não de impacto) leva a uma rotação em velocidade (aceleração rotatória) e uma torção dependente de tensão e da velocidade. Isto leva a uma deformação da substância branca, que gera estiramento, alongamento e contração da mesma e da sua interface com a substância e cinzenta. • É um fenômeno biomecânico, dependente da propagação da energia mecânica e vibratória. • É uma lesão multifocal axonal sobretudo de substância branca profunda (substância branca parasagital frontal), áreas de substância branca de associação periventriculares, corpo caloso, diencéfalo, hipocampo e fibras de associação tálamocorticais, fibras comissurais e tronco (que é o centro geométrico do encéfalo). • Apresenta edema microscópico axonal cisalhamento das fibras mielínicas e desconexão. Pode ser classificada como: LAD Leve Grau I : Macroscopia e exames de imagens pouco alterados ou até mesmo normais. Microscopia: lesões multifocais com axônios edemaciados (axoniotomia primária - rara). Clínica: TCE com períodos de perda de consciência e sequelas leves (30 a 60% dos TCEs leves com síndrome pós concussão e TCEs moderados ). LAD Moderada e Grave Grau II e III: ruptura da matriz e do esqueleto do tecido neural da substância branca (cisalhamento) podendo levar a hemorragias, hematomas e isquemias (lesão difusa levando a outras lesões localizadas de substância branca). São associadas à desconexão como a axoniotomia primária (também rara) e secundária (muito comum) . Pode levar à morte imediata, estados de coma prolongados ou irreversíveis, além de sequelas vistas no TCE grave. Acometimento sobretudo de substância branca profunda (substância branca parasagital frontal), áreas de substância branca de associação periventriculares, corpo caloso, diencéfalo, hipocampo, fibras de associação

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tálamocorticais, fibras comissurais e tronco (áreas de associação gnósicas, relacionadas a linguagem, ao esquema corporal, à memória e à emoção). Resumindo: • Grau I apenas de substância branca cortical. • Grau II e III de corpo caloso e/ou tronco. QUADRO CLÍNICO DO TCE TCE LEVE Perda da consciência <30 min APT <24 hs ECG -13 -15 A maioria destes pacientes não procura o hospital.Pode ocorrer a Síndrome Pós Concussional(SPC) com náuseas, cefaléia, intolerância a luzes e ruídos, embaçamento de visão, insônia, velocidade de pensamento diminuída, dificuldade de atenção e concentração, transtorno de memória, fadiga, irritabilidade, ansiedade e depressão após o TCE leve. Geralmente, a SPC tem regressão dos seus sintomas após 3 meses do trauma, mas em 5% dos casos, persistem. Nestes casos presistentes, diminui a produção labora e 1/3 perdem o emprego. COMA É a principal manifestação da Lesão Axonal Difusa moderada e grave, a qual acomete o tronco e a substância branca de todo o córtex difusamente, mas pode surgir também devido à lesões localizadas com efeito de massa, compressão e herniação de tronco (hemorragias, hematomas ou brain swelling). Imagens do Coma: edema difuso de substância branca, petéquias hemorrágicas difusas, lesões (contusões e hemorragias) de substância branca princi-

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palmente no limite córticosubcortical, transição mesencéfalopontina, corpo caloso e no pedúnculo cerebelar superior, hemorragias intraventriculares e subaracnóideas pequenas. AMNÉSIA PÓS TRAUMÁTICA -APT A Amnésia Pós Traumática é o déficit de memória com desorientação e amnésia para eventos rotineiros dede o trauma até a retomada da memória. Avaliada com o Teste de Galveston (“Galveston Orientation and Amnesia Test ou GOAT Test”) APT < 2 SEMANAS

APT > 4 SEMANAS

APT > 12 SEMANAS

80% de boa recuperação

27% de boa recuperação

déficits cognitivos severos e prognóstico funcional muito pobre em 1 de lesão

Evolução do TCE: Tanto no AVE como no TCE o maior ganho na recuperação acontece em até 3 meses da lesão. Entretanto, o TCE evolui por mais tempo e possui influência de outros fatores prognósticos. Na fase crônica da Lesão Axonal Difusa o axônio pode retrair ou degenerar resultando na morte do seu corpo celular (degeneração retrógrada) ou degenerar em direção distal ao corpo celular (degeneração anterógrada), formando neuromas dolorosos, posterior morte celular (degeneração pós sináptica) e atrofia cerebral difusa. A longo prazo a influência da resposta celular e proteica da lesão cerebral traumática é similar à Doença de Alzheimer (caracterizada pela deposição amilóide, alterações do citoesqueleto neural,

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disfunção colinérgica e inflamação crônica). Será que a Lesão Axonal Difusa predispõe a quadros demenciais? Diversos fatores interferem na evolução do TCE. Os mais importantes são: • Etiologia. • Idade. • Mecanismo de trauma. • Local e gravidade da lesão cerebral. • Fisiopatologia da lesão. • Complicações clínicas associadas pós – trauma. • Complicações neurológicas e ortopédicas secundárias. • Uso de medicações ou outros depressores do SNC. • Antecedentes sócio – culturais. • Antecedentes pré – mórbidos. • Nível funcional, educacional e de independência prévios à lesão. • Atendimento na fase aguda. • Início da reabilitação . • Gravidade, localização e atendimento ao trauma. Prognóstico do TCE Avaliação do prognóstico: • A Escala de Coma de Glasgow é a escala mais amplamente usada de gravidade do trauma . O escore total de Coma em até 7 dias após trauma pode ser utilizado como previsível em relação às consequências em 6 meses. Nas crianças, um escore inicial de 3 relaciona-se à alta mortalidade, e maior que 5 à boa recuperação funcional. No adulto, espera-se uma maior recuperação neurológica com escore acima de 6. • Duração da amnésia pós – traumática. • Tempo de coma . • Reações pupilares à luz na fase aguda.

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• Respostas oculovestibulares não patológicas na fase aguda. • Respostas motoras anormais como decorticação e descerebração remetem a um mau prognóstico.

COMA > pós APT

TCE > coma

Período de APT APT (Amnésia pós traumática) - Período após o trauma seguido de coma, em que há confusão mental, com alt. comportamental e de memória, esquecimento sobre o evento traumático. A duração da APT é variável (a depender da gravidade do trauma e da LAD) e prognóstica. Classificação não é universalmente aceita. Período de alt. memória em estudo). O final da APT é marcada pela aquisição da memória sequencial do dia a dia e sobre o trauma (memória recente).

PADRÕES DE RECUPERAÇÃO DO COMA PÓS TCE: Alguns pacientes sobreviventes de um TCE seguido de coma (TCE grave), conseguem readquirir uma boa parte de suas funções. Na maioria dos casos, os pacientes apresentam uma combinação de déficits físicos, cognitivos e comportamentais que irão variar muito de um paciente para outro. Os déficits cognitivos são comuns nos portadores de TCE. Ao contrário dos AVEs, os portadores de TCE tem maior prejuízo cognitivo que motor. Entende-se por cognição as habilidades do pensamento, como organização, planejamento, atenção, raciocínio, linguagem, práxis (processo pelo qual

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uma teoria, lição ou habilidade é executada ou praticada, se convertendo em parte da experiência vivida), gnosia (reconhecimento dos objetos por intermédio de um dos sentidos: gnosia visual, auditiva, tátil, olfativa, etc.), abstração (processo de generalização por redução do conteúdo da informação de um conceito ou fenômeno observável, normalmente para reter apenas a informação que é relevante para um propósito particular), resolução de problemas, memória, capacidade de julgamento, percepção, noções de perigo e limites, entre outras. Várias escalas diferentes são usadas para a quantificação dos déficits físicos e cognitivos. Vale a pena citarmos a Escala Rancho Los Amigos e a Escala de Evolução de Glasgow . • Nível I - Não responsivo = coma G < 8 • Nível II - Resposta generalizada 9 < G < 12 • Nível III - Resposta localizada G > 12 • Nível IV - Confuso e agitado • Nível V - Confuso e inapropriado • Nível VI - Confuso e apropriado • Nível VII - Automático e apropriado • Nível VIII - Intencional e apropriado • Nível IX - Intencional e apropriado - mínima assistência • Nível X - Intencional e apropriado-independência modificada

Escala Rancho Los Amigos (Original Scale co-authored by Chris Hagen, Ph.D., Danese Malkmus, M.A., Patricia Durham, M.A. Communication Disorders Service, Rancho Los Amigos Hospital, 1972. Revised 11/15/74 by Danese Malkmus, M.A., and Kathryn Stenderup, O.T.R. ): Desenvolvida em 1972 e posteriormente aperfeiçoada em 1986 no Rancho Los Amigos Medical Center na Califórnia para os pacientes portadores de traumatismo encefálico fechado. Essa escala não é prognóstica, é um instrumento de avaliação utilizado

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por toda a Equipe de Reabilitação, para entender melhor o comportamento cognitivo do paciente durante o primeiro ano após o TCE fechado. Também é utilizado como um bom instrumento de programação da estratégia terapêutica a ser usada em cada uma das fases do primeiro ano pós -trauma, período no qual o paciente evolui e muda a cada dia, tanto na questão física quanto na cognitivo-comportamental. A evolução de cada paciente pelos dez níveis da escala irá depender da gravidade, do tempo e do local da lesão. Muitos passarão por todos os níveis, já outros evoluirão até um certo estágio e nele permanecerão. A escala ainda não se encontra validada na língua portuguesa. Na prática, até o oitavo nível ela já é totalmente utilizada. Os dois últimos níveis ainda estão em discussão na literatura. ESCALA DE EVOLUÇÃO DE GLASGOW: Utilizada 6 meses após o trauma para avaliar a evolução e o status funcional do paciente. Classifica o indivíduo em cinco categorias globais. Apresenta alto grau de confiabilidade em estudos multicêntricos internacionais, mas apresenta categorias muito amplas que não são sensíveis e não indicam as reais habilidades funcionais de cada caso, nem as suas sequelas cognitivas ou comportamentais. As cinco categorias compreendem : 1. Morte, por consequência do trauma ou de suas sequelas. 2. Estado vegetativo, para o indivíduo que não reage ao ambiente. 3. Incapacidade grave, para o indivíduo que é dependente nas AVDs. 4. Incapacidade moderada, para o indivíduo que é independente nas AVDs e marcha, porém tem limitações profissionais. 5. Boa recuperação, para o indivíduo que se reintegra à sociedade e que apresenta déficits leves que não impedem sua independência.

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PRINCIPAIS SEQUELAS FÍSICAS DO TCE : A grande variedade das sequelas físicas motoras observadas no portador de TCE inclui desde quadros gravíssimos até a quase normalidade. É muito comum a presença de uma aparência física totalmente normal concomitante a graves déficits cognitivos. Em média, cerca de 70% do indivíduos com lesões graves voltam a deambular, característica que diferencia o TCE do AVE. O TCE evolui muito melhor do ponto de vista físico que cognitivo. Não podemos deixar de lembrar que mesmo com os movimentos mais simples, grosseiros ou rotineiros realizados de maneira normal, pode haver comprometimento dos movimentos mais finos que requerem maior coordenação e velocidade. O controle da motricidade ocorre por ação do sistema piramidal (que se origina no córtex motor primário, com suas fibras descendo pelo tracto piramidal até a medula) e das vias não piramidais. O primeiro é principalmente responsável pela motricidade voluntária tendo como característica de lesão a plegia, as paresias e a hipertonia tipo espasticidade. O último é principalmente responsável pela movimentação involuntária, pelo controle da postura, equilíbrio e coordenação; e a sua lesão pode gerar inúmeros padrões de movimentos involuntários, bem como as ataxias. As sequelas físicas mais comuns são : • Hipotonias. • Paresias. • Plegias. • Movimentação involuntária. • Tremores. • Hipertonia elástica ou espasticidade : alteração motora por lesão da via piramidal (cortico-espinal e de cápsula interna), com hiperatividade do sistema do neurônio motor gama, nos fusos musculares (reflexo miotático), que é di-

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retamente proporcional à velocidade do movimento. Leva a posturas viciosas, sendo as mais comuns a flexão do membro superior e a extensão do membro inferior. O encurtamento músculo tendíneo que se origina destas posturas viciosas, bem como a própria espasticidade, podem ser de difícil controle. Além das alterações posturais, a espasticidade pode dificultar a seletividade do movimento contribuindo para maior dificuldade na função. Hipertonia plástica ou rigidez : A rigidez, ao contrário da espasticidade, não é velocidade dependente e se apresenta por todo o arco de movimento, como o ‘sinal da roda denteada’. Surge pela atividade do neurônio motor alfa e também pode levar a posturas viciosas e contraturas. Dificulta a seletividade e a rapidez do movimento. Como principais recursos terapêuticos, além da cinesioterapia, encontramos as medicações anti-parkinsonianas. Atetose. Distonias. Alterações no controle da movimentação seletiva, do tronco e coordenação. Alterações na fala e articulação oral e na deglutição (chamada de disfagia). Contraturas, posturas viciosas e reflexas. Alterações de sensibilidade e sensoriais, como alterações no campo visual, na capacidade olfatória, distúrbios auditivos e vestibulares. Os distúrbios da sensibilidade são extremamente incapacitantes e variam desde simples hipoestesia (táctil, térmica, ou dolorosa), até a perda de propriocepção, alteração de sensibilidade vibratória, hiperestesias (na maioria das vezes de origem talâmica devido à existência de um foco irritativo talâmico que produz potenciais de ação anormais e a sensação dolorosa), que dificultam a manipulação do paciente pelo terapeuta. Lesões de pares cranianos. Dor de origem central (talâmica) , periférica (neuropática), ou por nocicepção ( de origem miofascial, artropática, etc.). Sequelas ortopédicas. Acredita-se que cerca de 38% dos pacientes com TCE grave apresentam fraturas concomitantes, as mais comuns de fêmur, clavícula,

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antebraço, punho e tíbia. Grande parte dos pacientes que chega ao Centro de Reabilitação na fase crônica apresenta fraturas não diagnosticadas anteriormente. O tratamento destas fraturas deve ser instituído na fase aguda respeitando a instabilidade clínica. Muitas vezes, as alterações de consciência, agitação e espasticidade impedem o uso de fixações externas ou trações, o que dificulta o manuseio. Assim, o acompanhamento deve ser feito por uma equipe especializada e familiarizada com esse tipo de paciente. O encurtamento de membros e a dismetria muitas vezes consequentes das fraturas ou da hipotrofia assimétrica da sequela, devem sempre ser diagnosticados e corrigidos adequadamente. • A ossificação heterotópica, que pode ser decorrente do TCE ou da consolidação viciosa das fraturas da fase aguda, acomete em geral quadril, cotovelo, e joelhos. Durante todo o processo de Reabilitação devemos ficar atentos para a evolução de todas as deformidades periféricas (sejam lesões nervosas, fraturas, encurtamentos, lesões tendíneas, presença de escoliose pela assimetria do tônus e posturas, etc. ) e prontos para tratá-las quando estas lesões interferirem negativamente na função e no potencial neurológico motor existente. PRINCIPAIS SEQUELAS COGNITIVAS As alterações cognitivas são muito frequentes após o TCE. Logo após o coma, o padrão de recuperação para o TCE fechado (não usado para o ferimento por arma de fogo ou outras patologias como o AVE), segue o descrito na escala do Rancho Los Amigos. Nessa fase, a classificação dos distúrbios específicos da cognição que serão permanentes é muito imprecisa. Após 1 ano de lesão, essa identificação se tornará mais sólida e poderá ser dividida didaticamente em grandes grupos:

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ALTERAÇÕES DE COMUNICAÇÃO: a. Distúrbio Linguístico Cognitivo. São alterações da linguagem decorrentes de outras alterações cognitivas como prosódia (ritmo e entonação da fala), memória e pragmática (capacidade de construir frases). b. Afasias. São alterações da comunicação, linguagem falada, com a presença do ato articulatório preservado. O grau da afasia depende de uma série de fatores. Alguns pacientes perdem também a capacidade de expressão gestual e da mímica. Muitas vezes, as alterações se referem ainda à pragmática. Pode ser didaticamente dividida em três grupos: Afasia de Expressão ou de Broca; de Compreensão ou de Wernicke; Mista ou Global. As afasias podem se manifestar pela presença de parafasias, jargões, neologismos, logorréia, entre outras carcterísticas. As afasias são mais comuns nos quadros de AVE e pouco comuns nos quadros pos TCE. • Apraxias: É uma desordem na execução do gesto e do planejamento motor. Vários tipos de apraxias são descritas como a apraxia ideomotora (dificuldade de utilizar objetos), gestual, construtiva (inaptidão de copiar), do vestir, visual, da marcha, magnética (comportamento de agarramento manual bilateral), oral, etc. Os movimentos automáticos que não dependem do planejamento não são perdidos nas apraxias, já as atividades que requerem sequências motoras com elaboração e planejamento estão muito prejudicadas. Geralmente são encontradas em lesões de hemisfério esquerdo (hemisfério dominante). • Agnosias e alterações de Percepção: Ocorre em lesões de hemisfério direito (hemisfério não dominante) . São dificuldades de reconhecimento. Existem vários tipos como as agnosias visuais, auditivas, táteis , prosopagnosias (face), simultagnosia (incapacidade de perceber visualmente mais de um ou dois estímulos simultaneamente), espaciais (localizar a distânciae profundidade de objetos), etc. Hoje são chamadas de apractoagnosias, já que têm grande influência na execução motora. Nas agnosias visuais (lesão da encruzilhada tem-

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poro-parieto-occipital) é bem típica a chamada “Síndrome do arqueólogo”, onde há dificuldade de decifrar as partes para se chegar ao todo. Todas as alterações de percepção possuem prognóstico reservado, pois dificultam a localização pelo próprio indivíduo da relação espacial de seu corpo e das partes entre si. • Alterações de memória: Possuem também de prognóstico reservado e se manifestam de diversas maneiras: memória recente, de fixação, de nomeação, para cores, espacial, para cálculos, etc.. • Distúrbios de Atenção, Iniciativa e Concentração . • Alterações comportamentais: variam desde labilidade emocional e depressão até hipersexualização, agressividade ou delírios persecutórios.

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BIBLIOGRAFIA Comparison of indices of traumatic brain injury severity: Glasgow Coma Scale, length of coma and post-traumatic amnesia. Sherer M, Struchen MA, Yablon SA, Wang Y, Nick TG. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2008 Jun;79(6):678-85. Epub 2007 Oct 10. Current concepts: diffuse axonal injury-associated traumatic brain injury. Meythaler JM, Peduzzi JD, Eleftheriou E, Novack TA. Arch Phys Med Rehabil. 2001 Oct;82(10):1461-71. Review. Brain Injury Medicine: principles and practice. Zasler ND, Katz DI, Zafonte RD. Demos New York 2007 1 edição. Diretriz: Traumatismo Cranioencefálico Grave da Soc Bras de Neurocirurgia. Andrade AF, Marino R Jr, Miura FK, Rodrigues JC. Jr 2002. Rehabilitation of adult and child with Traumatic Brain Injury. Rosenthal M, Griffith ER, Kreutzer JS, Pentland B. 3 edição. F.A. Davis 1999. Consensus conference. Rehabilitation of persons with traumatic brain injury. NIH Consensus Development Panel on Rehabilitation of Persons With Traumatic Brain Injury. [No authors listed] JAMA. 1999 Sep 8;282(10):974-83. Review.

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