Preia-Mar 3 Revista da Escola Secundária de Estarreja

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Os alunos da ESE e os instrumentos musicais em que se têm aperfeiçoado – notas para uma harmonia quotidiana.

TRESMALHO

As atividades extracurriculares deixam, nestes textos, um rasto luminoso, para que o muito que se aprende possa ser partilhado por todos.

TRIPULAÇÃO

Alunos, ex-alunos e professores partilham as suas reflexões, opiniões e alguns projetos da escola, convidando-nos a repensar temas atuais e a conhecer dinâmicas formativas.

Preia-Mar

ESPELHO DA PROA

Revista da Escola Secundária de Estarreja | 2011/2012 | número 3 | PVP €3,00



Apoio à edição

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ficha técnica

Preia-Mar. Revista da Escola Secundária de Estarreja. n.º 3 Edição e propriedade: Escola Secundária de Estarreja Rua Dr. Jaime Ferreira da Silva | 3860-256 Estarreja Tel.: 234 841 704 | Fax: 234 849 625 e-mail: admin@esestarreja.net ou preia.mar.ese@gmail.com www.esestarreja.net Coordenação: Teresa Bagão Corpo Editorial: Teresa Bagão, Rosa Mendonça, Rosa Domingues Conceção Gráfica e Paginação: Mário Xavier Rocha Colaboradores: Textos Professores: Anabela Amorim, Anabela Viegas, António Neto, Carlos Oliveira, Cláudia Carvalho, Elsa Machado, Emília Batista, Etelvina Bronze, Etelvina Soares, Emídio Ferro, Eulália Gomes, Fátima Borralho, Glória Silva, Goretti Capela, Graciete Oliveira, João Fidalgo, Joaquim Matos, José Corceiro, Luísa Garraio, Manuela Azevedo, Margarida Teixeira, Maria de Jesus Oliveira e Silva, Marília Teixeira, Orlando Carvalho, Paulo Neves, Paulo Pacheco, Rosa Domingues, Rosa Mendonça, Rosário Bastos, Rosário Rito, Rosário Santos, Rui Rufino, Rui Vidal, Teresa Amaral, Teresa Bagão; docentes do Clube de Inglês/Alemão; docentes da Equipa de Educação para a Saúde. Alunos: Alunos do 11.º D, alunos do 12.º D, alunos do 12.º E, alunos do 12.º L, alunos do 12.º M; Alejandra Silva, Ana Cristina Silva, Ana Isabel Pinto, Ana Madalena Miranda, Ana Margarida Silva, Ana Raquel Figueiredo, Ana Raquel Marques, André Pereira, Bárbara Alves, Bárbara Silva, Beatriz Moutela Fonseca, Cátia Martins, Cátia Rodrigues, César Filipe Garrido Lopes, Cláudia Ramos, Daniela Costeira, Fábio Freitas, Fábio Rafael Valente Aleixo, Fabrícia Teixeira, Inês Macedo, Inês Pinto, Jessica Ferreira, Jéssica Marques, João Abreu, João Eduardo Valente, João Pedro Silveira Vieira, João Rodrigues, José António Matos, Karina Costa, Margarida Gonçalves, Marta Amaral, Nuno Almeida, Pedro Fidalgo, Rafael Marques, Rafaela Marques, Sancha Silva, Sara Raquel Bastos, Sofia Barbosa. Outros profissionais: Fátima Alçada (SPO) Outros colaboradores: Alberto Marques Paulo, António Manuel Vidal, António Nunes Ferreira Girão, Christian Neves, Flávia Alves, Joana Venâncio, João Luís Marques, João Pedro Mortágua, José Garcia, Maria Georgina Landeiro, Maria Goreti Figueiredo, Marciana Ximenes, Pedro Miguel Silva, Sara Pinto. Imagens Professores: Ana Almeida, Anabela Viegas, Emídio Ferro, Eulália Gomes, Etelvina Bronze, Lucinda Leal, Paulo Corceiro, Paulo Pacheco, Rosa Domingues, Rosário Santos, Sérgio Santos, Teresa Bagão, Xavier Rocha. Alunos: Ana Brandão, Beatriz Moutela Fonseca, Bruno Cêpa, Diogo Silva, Jessica Ferreira, Karina Costa, Nuno Almeida, Pedro Joel Pinho da Silva, Sofia Barbosa; alunos premiados no concurso de fotografia da ESE. Outros: Alberto Joaquim Garrido, José Garcia, Fátima Alçada, Flávia Alves, Joana Venâncio, João Luís Marques, João Pedro Mortágua. Fotografia da capa: Xavier Rocha Tiragem: 200 exemplares ISSN: 1647-7952 Impressão e acabamentos: Officina Digital - Impressão e Artes Gráficas – Aveiro Periodicidade: anual As opiniões expressas nesta publicação são da responsabilidade dos autores dos artigos ou das pessoas entrevistadas. Reservados todos os direitos. Qualquer utilização dos textos ou das imagens aqui publicadas obriga ao pedido de autorização prévia da equipa editorial e da direção da Escola Secundária de Estarreja.

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RODA-DE-PROA

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ALA-ARRIBA!

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ESPELHO DA PROA A música que preenche os nossos dias

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OBRAS-VIVAS Entre Liceu e Escola Secundária Álbum de memórias Associação dos Antigos Alunos do Colégio D. Egas Moniz e da ESE: um novo parceiro da escola

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ANCORADOUROS e Zzzás… Momento poético por Abril Vamos ilustrar a Ilha Desconhecida! Aprender fazendo… Jovens cientistas alteram bactérias Técnicas de procriação medicamente assistida – que limites à sua utilização? Cor e inquietação O currículo do ensino secundário geral em TimorLeste

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CANDEIO Arduino explicado aos mais jovens Um reino vivo na poesia de Reinaldo Matos O Pecado de João Agonia de Bernardo Santareno, uma atualização da tragédia clássica A construção de uma estratégia de salvação – gnoseologia, estética e metafísica em José Régio

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MARESIA Minimamente máximas Poesia Também eu, Cesário Esta palavra Ser um anjo Os três andares Algures em Londres Concurso de fotografia da ESE

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DUAS ÁGUAS Aprender, cooperar e partilhar

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LOTA Espaço Vivo! ESE em contexto europeu

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DERIVA LITORAL ESE - Talento em Movimento Isso é talento Começar a empreender

índice

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Empreendedorismo em ação – 3.º Concurso de Ideias de Negócios Inovadores Desenvolver e avaliar competências sociais – a ESE e o projeto Comenius Saúde todos os dias! ESE na Feira da Rede Social (2011) 116

PEGADAS NA AREIA Diário de campanha 1916 A vida através de uma pedra de calçada Vocabulário da ria

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TRIPULAÇÃO “Aqui aprendi a arte” Ler para ser O que me faz feliz Deambulando com Cesário Verde Psicologia, hipótese ou rejeição? Sair tarde da escola, suar e saltar, para belo(a) ficar! “Mind the gap” – a ESE ouviu, em fins de março Histórias da minha história The topic of Genetic Modified Food in English lessons Genetic modified food: savior or nemesis? “The only way to do great work is to love what you do” Ao som do meu violino Imagens que se fixam na retina Percursos de sucesso

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TRESMALHO O “bota-abaixo” da revista da ESE Semana Aberta de Ciência e Tecnologia na Universidade de Aveiro 2011: Ano Internacional da Química O futuro nas nossas mãos Rever obras-primas nas letras e nas artes F. C. Porto (Fascínio Cultural no Porto) O encanto dos livros A trip to London English/ Deutch Club is back… Teatro em Inglês Sessão-piloto do projeto Comenius Estarreja vence e convence Património: preservar e divulgar Dia da Floresta Autóctone Temos quadros e temos carros E o Parlamento aqui tão perto… À descoberta de Almeida, Trancoso e do Palácio do Gelo Viaje a Salamanca

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peça reforçada de madeira maciça ou aço, conforme a estrutura e construção do navio, apoiada na extremidade da quilha, fechando a ossada e dando forma à proa; dispõe-se no sentido aproximadamente vertical, mais projetada na altura do convés principal, para proteger a proa das vagas

roda-de-proa


A terceira edição da revista Preia-Mar traduz a materialização de uma ideia, de uma intenção e, posteriormente, de um projeto consistente, cuja regularidade editorial consubstancia um comprometimento responsável da equipa editorial. Quero agradecer a todos quantos têm contribuído para as sucessivas edições, reconhecendo que o vocabulário de que disponho se revela por vezes desprovido de palavras suficientemente capazes de traduzir os sentimentos que experimento. A limitação evocada decorre naturalmente da constatação da superior capacidade e universalidade da linguagem artística, designadamente da música - tema aglutinador da presente edição -, quando comparada com iguais parâmetros da linguagem verbal a que consigo recorrer neste breve texto. Não obstante, obrigado, muito obrigado, muitíssimo obrigado. Na escola, procuramos diariamente desenvolver capacidades, promover aprendizagens, garantir a apropriação de instrumentos de comunicação e adaptação à realidade, cada dia mais exigente, simultaneamente mais estimulante, porquanto mais interativa, dinâmica, universal. A arte, enquanto expressão universal de sentimentos e de linguagens, de vivências e de fruição, de ilusão, que a todos interpela, constitui um extraordinário exemplo da força do sonho, do riso, do choro, do crescimento, do desenvolvimento, do que fomos e do que somos. Parabéns. Jorge Ventura Diretor

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expressão poveira que se pronuncia à uma, quando os pescadores empregam o melhor das suas forças para fazer deslizar o barco sobre os paus até à praia, na manobra de pôr a embarcação em terra

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Pensemos que “a música é, sem dúvida, a mais perfeita e a mais resistente das linguagens. Canções não criam ferrugem.” É este o tema em destaque neste número da Preia-Mar. Foi-nos contagiando, ao longo do ano letivo, à medida que íamos conhecendo melhor os alunos da ESE que se dedicam à aprendizagem de um instrumento musical ou que pensávamos nos antigos alunos que têm seguido carreiras profissionais de mérito na área da música. Se se entender a “música das esferas” como eco da harmonia existente no universo, proporção fundamental da arquitetura cósmica, então a música criada pelo ser humano terá a capacidade de o transformar, porque lhe faculta o acesso a uma harmonia interna em sintonia com o espaço sideral – e é através dessa linguagem que se exprimem muitos alunos (e ex-alunos), mas também professores, da Escola Secundária de Estarreja. Ficamos gratos pela sua colaboração e pelo seu testemunho. Outras palavras em harmonia preenchem as páginas da Preia-Mar, em atentas reflexões, opiniões, dissertações e memórias, em poemas e narrativas, bem como em versos intemporais de poetas portugueses vertidos em peça de teatro. Também pela imagem continuamos a preservar a memória desta instituição. Atrevemo-nos, neste número, a dar mais um passo arrojado… A escola é, por excelência, o espaço em que os alunos aprendem outros idiomas. As línguas estrangeiras acompanham-nos durante a escolaridade obrigatória, não só na sala de aula, como também em múltiplas atividades de enriquecimento curricular e cada vez mais em contexto de formação profissional. Daí que as páginas da revista da ESE acolham e partilhem com os leitores artigos de opinião e textos informativos reveladores do domínio do Inglês, do Espanhol e do Francês. Aqui fica mais um desafio de leitura, sempre bem-vindo. À medida que a Preia-Mar vai sendo mais abundante, melhor tem de se pensar a sua arquitetura. Não queremos que crie ferrugem, mas que continue a resistir, bem articulada, de modo a refletir alguma harmonia, acreditando que tal é viável na permanente circunstância conturbada a que se tem sujeitado a escola pública. A equipa editorial, Teresa Bagão, Rosa Mendonça, Rosa Domingues, Xavier Rocha

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superfície delimitada por arestas, que arremata a proa das embarcações; a coberta da casa da proa na barca (a qual corresponde ao espaço entre o primeiro banco da proa e a proa)


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Diogo Lopes | Bruno Silva | Paulo Almeida | Joel Fidalgo | Beatriz Fonseca | Daniela Marquez | Margarida Amador | Fabrício Sousa | Rodrigo Rodrigues | Carlos Rebimbas | Domingos Henriquez | Renato Vinha | Leandra Pinho | João Martins | Bruno Pereira | Rita Coelho | Sara Sá | José Vitor Vieira | Susana Rodrigues | João Abreu

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A MÚSICA QUE PREENCHE OS NOSSOS DIAS “ou de como a música é, sem dúvida, a mais perfeita e a mais resistente das linguagens. Canções não criam ferrugem.” José Eduardo Agualusa (2010). Milagrário Pessoal.

Os planos curriculares e a oferta formativa da ESE não incluem música. Embora ausente como disciplina, ela não deixa de invadir o quotidiano extra-escolar dos nossos alunos, que se dedicam à sua aprendizagem com mais ou menos afinco, conciliando a escola com os estudos musicais e atuando em bandas ou orquestras de diversas associações e instituições de implantação abrangente, do local ao distrital. Quisemos conhecer um pouco melhor estes jovens que dedicam tanto do seu tempo ao aperfeiçoamento de um instrumento, em que proporção se integram em coletivos musicais e com quantos anos conta esse trabalho. Quisemos, igualmente, fotografá-los, mas apenas uma vintena acedeu ao nosso convite, pelo que os consideramos como representativos dos mais de cem alunos que preenchem os seus dias com a música. Os dados que se seguem são referentes às respostas de 114 alunos que se disponibilizaram para responder a um miniquestionário anónimo sobre a sua relação com a música, mais concretamente, sobre a execução de instrumentos musicais, a que chamámos “A música que preenche os nossos dias”, com questões direcionadas para as práticas musicais dos inquiridos. Na elaboração do questionário, a equipa editorial da revista contou com a orientação da professora Rosário Grilo, cuja atenção agradecemos. O tratamento de dados que agora se dá a conhecer foi da responsabilidade das suas alunas Ana Raquel Marques e Fabrícia Teixeira, do 12.º D, que efetuaram essa análise no âmbito da disciplina de Geografia C. No que diz respeito à interpretação dos dados, queremos agradecer a colaboração do professor Paulo Neves, que partilha connosco a sua perceção e os seus conhecimentos na área do ensino e aprendizagem de música. A equipa editorial.

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NOTA: É possível que alguns tópicos possuam respostas superiores ao número de inquiridos, uma vez que houve mais que uma resposta a algumas questões. Por outro lado, o oposto também acontece, devido à ausência de resposta.

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UMA LEITURA DOS RESULTADOS Paulo Neves

Docente de Economia/Contabilidade e de Educação Musical

É hoje a música uma arte sem conotação de género. guitarra, o instrumento talvez mais “autónomo” Longe vão os tempos das bandas filarmónicas, das porque tantas vezes não integrado em qualquer orquestras sinfónicas, das próprias bandas pop, coletivo, mas porventura o maior promotor de um rock ... serem um mundo masculino. certo “status”, e muito versátil. A popularidade deste Quanto à variável idade, a grande concentração instrumento também advém das tentativas dos no intervalo 14-17 anos prende-se mais com a aprendizes em imitar os seus ídolos da música pop, exteriorização da prática do que com a realidade. rock, metal, funk, reggae e tantos outros pseudoTalvez haja muitas crianças na escola que praticam estilos (ou sem pseudo). De notar que a designação música e que, eventualmente, terão optado por não “viola” corresponde, certamente, ao instrumento o preencher. Deve ter-se em conta que se pretendeu “guitarra clássica”. que a amostra correspondesse ao universo total, visto que o questionário foi distribuído em todas as turmas A leitura destes dados permite ressaltar uma da escola. Porém, digo-o em tese, as crianças (de perspetiva holística da prática musical. A meu ver, 11, 12 anos) têm uma visão da prática musical muito estes jovens melómanos são movidos, porventura, ainda na linha de uma atividade individual, quase por fatores genéticos, influências familiares, fortes “caseira”. determinações sociais e, claro está, por um prazer As bandas regionais mobilizam os jovens, facultam individual, um deleite psíquico com que o e orientam a iniciação musical, promovem a sua aperfeiçoamento da prática musical vai brindando o continuidade. De acordo com as respostas dos executante. Lendo o questionário e as respostas inquiridos, as instituições a que estão ligados são obtidas, talvez, de tudo isto, ressalte a música como muito diversificadas, como se pode ler na tabela. um instrumento de inserção social. O início da aprendizagem ocorreu em distintos locais (49 alunos), para além daqueles que coincidem com a instituição de que fazem parte (65 alunos). No miniquestionário, um número significativo de alunos não identifica a escola; a designação “em casa” também poderá incluir o processo de aprendizagem “sozinho” ou “pela internet” (nestes casos, ao todo, 14 inquiridos). No que respeita aos instrumentos, a variedade dos naipos apresentada é muito facilmente contextualizada: é nítida a fortíssima influência das bandas filarmónicas da região, que “resgatam” os aprendizes da música para as suas necessidades. A verdade é que nenhum adolescente, de mote próprio, elegeria o bombardino ou a tuba. Os instrumentos “classicamente mais nobres”, como o violino e o piano, surgem pela proximidade do conservatório de Aveiro, certamente. A meu ver, estes jovens melómanos Curiosa é a presença na lista da concertina e da gaita de foles, explicada pelo fulgor são movidos (…) por um prazer que a “world music” tem hoje numa franja da individual, um deleite psíquico com juventude. Vide a popularidade dos festivais como “Andanças”, em Carvalhais, e “Músicas que o aperfeiçoamento da prática do Mundo”, espalhadas pelo país (Sines, por musical vai brindando o executante. exemplo). Ainda, o pandeiro, cavaquinho e percussões vêm certamente da forte tradição carnavalesca de Estarreja. Por último, a

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ENTRE LICEU E ESCOLA SECUNDÁRIA Teresa Bagão

Docente de Português 1973, ante-véspera da Revolução dos Cravos. As páginas d’ O Jornal de Estarreja continuam a dar destaque a questões relacionadas com a Escola Técnica, agora designada por Escola Secundária. No final desse ano, entre outras notícias, evidencia-se uma reflexão sobre “O Ensino em Estarreja” com o sugestivo título “Na Batalha da Educação”, metáfora expressiva do sucessivo alargamento do número de estabelecimentos escolares públicos “no sentido da cobertura geral do Pais em todos os sectores do Ensino” (10/10/1973, n.º 3388, p. 1). Começavam a tomar forma o Ensino Básico Geral, os oito anos de

escolaridade obrigatória e a implantação de uma universidade no distrito de Aveiro. Em breve, o “antigo 7.º ano” do liceu passaria a ter diferente designação, na múltipla sucessão de nomenclaturas que iria seguir-se (até ao atualíssimo Ensino Básico – dividido em três ciclos – e Ensino Secundário). Em Estarreja, interessava reiterar a necessidade da implementação de um Liceu, constante reivindicação inscrita nas páginas deste jornal. Em outubro desse ano, os estarrejenses puderam, finalmente, celebrar o início do funcionamento do Ensino Liceal na sua vila, a funcionar na recém-designada “Escola Secundária de Estarreja”. As

infraestruturas continuavam, no entanto, a obrigar à dispersão de professores e de centenas de alunos por dois edifícios, consoante integrassem a “Secção do Ensino Liceal e a Secção do Ensino Técnico, a primeira funcionando com 330 alunos, nas instalações do externato [mais concretamente, “nas instalações do antigo externato, adquiridas pelo Estado”], e também o Curso Geral de Administração e Comércio, e a segunda, com os vários cursos e uma frequência superior a 500 alunos, no edifício e pavilhões onde tem funcionado a Escola Industrial e Comercial”. Confuso quotidiano de uma escola? Sem dúvida. Um novo diretor assumia funções, o

Fig. 1 -O Jornal de Estarreja, 10 de junho de 1974, p. 01

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“professor efectivo do 10.º grupo sr. Dr. José Valente de Matos” (10/10/1973, n.º 3390, p. 1). Entretanto, os leitores terão de aguardar 8 meses até à próxima notícia sobre questões relacionadas com a nossa escola. Assim, é em junho e em outubro de 1974 que algumas ocorrências merecem a atenção dos articulistas deste periódico. Cerca de dois meses depois da Revolução de 25 de Abril, o meio estudantil de Estarreja refletia, naturalmente, convulsões sociais e políticas inerentes à deposição do regime e ao Processo Revolucionário em Curso. É um período que, seguramente, faz parte da memória de muitos alunos, professores, funcionários e auxiliares, testemunhas diretas que nos entusiasmam com acalorados relatos desses meses de transição, sendo, por conseguinte, as notícias d’ O Jornal de Estarreja (figura 1) uma pálida e lacónica imagem que a memória de muitos leitores rapidamente preencherá e tornará mais vívida, ao relembrar essa “agitação estudantil, manifestada em sucessivas reuniões e ainda na rua”, o afastamento do diretor, o saneamento de professores, as reivindicações de alunas e de alunos, as eleições do órgão de gestão provisório. A breve cobertura dos acontecimentos, com data de 10 de junho de 1974, evidencia também três núcleos de vozes de descontentamento e de ação: na escola, a comunidade escolar; na Câmara, concorridas e participadas sessões públicas; no salão nobre dos Bombeiros, os intervenientes concentram as discussões no setor da “lavoura”. Em novembro de 1974, o jornal anuncia a realização de um evento diretamente relacionado com a escola pública, o “seminário sobre a democratização do Ensino”, organizado em Coimbra pela Comissão PróUnep (União Nacional dos Estudantes Portugueses). O arranque do ano letivo parece ser atribulado, sobretudo devido aos problemas decorrentes da constante “dispersão das instalações, distribuídas

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por três edifícios, com precariedade de acomodação para os alunos e de normal vigilância nos tempos em falta, pela redução de pessoal auxiliar”, acrescentando-se, ainda, a falta de colocação de professores. Estas circunstâncias “levaram a assembleia de docentes, ouvido o Sr. Governador Civil do Distrito, a suspender as aulas” até à nomeação dos docentes em falta, decisão esta anulada em reunião posterior, de 6 de dezembro, onde se delibera pelo recomeço das aulas a 9 de dezembro (10/12/1974, n.º 3418, p. 1). Quinze dias depois, na primeira página d’O Jornal de Estarreja, denuncia-se e repudia-se a intromissão em assuntos escolares e as coações externas a que teriam sido sujeitos os elementos da Comissão de Gestão da ESE (25/12/1974, n.º 3419). Os meses seguintes continuam atribulados, pelo que conduzem, em fevereiro, à demissão dessa mesma comissão que, embora tendo sido eleita, recusa manterse em funções; e é neste contexto que assume a gestão da escola o próprio diretor do jornal, Eduardo Alberto Costa (25/02/1975, n.º 3423). De viva voz, na primeira pessoa, nenhum destes protagonistas, docentes ou alunos, transforma o jornal local em tribuna. Mesmo em período de férias escolares, a ESE continua a ser notícia, havendo quem não desista de relembrar – e de reivindicar – melhores condições para o ensino público em Estarreja, a fim de que a população escolar se fixe na vila, não se vendo obrigada a deslocar-se para outras localidades à procura de um curso adequado ou para prosseguir estudos. Não se esquece, ainda, o contexto industrial local, que obrigaria a repensar a oferta educativa ao nível de cursos na área da Química. A persistência de quem escreve para este jornal justificase por estar em causa “uma obra de valorização do Ensino em Estarreja cuja importância não será necessário perder tempo a evidenciar” (figura 2). Com o fim da censura do Estado Novo, autores malditos podem, enfim, ser lidos e

representados, chegando aos palcos do teatro académico na ESE “por um grupo de alunos do Curso Complementar, sob orientação do Prof. José Ilídio Pires, com a peça de Bertold Brecht, «A Excepção e a Regra» (figura 2). À semelhança do que pudemos ler em notícias publicadas em edições anteriores, também o ano letivo de 1974-75 encerraria, nas páginas deste periódico, com a reiterada denúncia das deficitárias infraestruturas, incapazes de dar resposta a uma população estudantil em constante crescimento, a precisar de mais diversificada oferta educativa no concelho, logo, de instalações mais capazes de corresponder às necessidades inerentes à abertura de mais cursos. Para o ano letivo de 1975-76 (figura 3), com a reabertura das aulas a 27 de outubro, de novo se dispersariam alunos e professores por três edifícios, para as aulas dos cursos diurnos e noturnos, incluindo os cursos gerais e complementar do liceu. Depois do início das aulas, ainda faltava ao Ministério da Educação e Investigação Científica colocar mais de vinte professores, de modo a suprir as necessidades das “turmas dos cursos nocturnos e as dos cursos diurnos: gerais do Liceu, Formação Feminina, Mecânica, Electricidade e Administração e Comércio e Complementar do Liceu” (25/10/1975, n.º 3439, p. 3). Na transição para o regime democrático, a situação de “Crise Escolar” é analisada pelo professor Jaime Vilar, sobretudo ao nível da colocação de professores e do caos legislativo (25/11/1975, n.º 3441, p. 1 e 3), que também se debruça sobre a necessidade de preparar as pessoas para as mudanças, que terão de ser graduais (10/05/1976, n.º 3452, p. 1). É ainda no decurso deste ano letivo que, com a reconversão ao nível do Ensino Secundário, se introduz o 8.º ano de escolaridade. Entretanto, sabemos que os meses passam sem se resolver a premente questão do número suficiente de


Fig. 1 - O Jornal de Estarreja, 10 de junho de 1974, p. 03

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obras-vivas Fig. 2 - O Jornal de Estarreja, 10 de julho de 1975, p. 01

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professores, cujo quadro continua deficitário, forçando ao eventual adiamento do início do ano letivo seguinte. Aliás, como não houve professores a várias disciplinas durante todo esse ano, em várias turmas, prepara-se o funcionamento de cursos intensivos (de frequência facultativa) para estes alunos, abrangendo as disciplinas de Português, Francês, Matemática e Físico-Química, tendo em vista a necessária preparação para os exames de setembro (25/07/1976, n.º 3457, p. 1). N’ O Jornal de Estarreja, o ano letivo de 1976-77 é mencionado unicamente em dois momentos, precisamente na abertura e no final das atividades escolares. Ficam os leitores a saber a data do início das aulas, o número de docentes (60, dos quais 26 efetivos), a proximidade de eleições para o Conselho Diretivo e os novos cursos (25/10/1976, n.º 3463, e 25/06/1977, n.º 3479). Durante 1978, 1979 e 1980, as páginas do jornal não voltarão a debruçar-se sobre a nossa escola, nem sobre a reorganização do ministério e do ensino público. Quebra-se o silêncio em 1981, para dar conta da triste ocorrência de um assalto às oficinas de serralharia, ainda a funcionar na Fontinha (10/02/1981, n.º 3561, p.1), edifício que pouco tempo depois seria consumido pelas chamas. E de novo o silêncio. Um ano e oito meses volvidos, anunciava-se a longamente reivindicada e ansiosamente desejada construção de uma nova escola (10/10/1982, n.º 3597), que viria pôr termo à dispersão da comunidade escolar por instalações precárias e mal apetrechadas. Foi também com esta notícia que encerrei o artigo “E a escola que quisemos cresceu”, no n.º 2 da Preia-Mar, pela coincidência da reconstrução, em 2009, desse velho edifício dos anos 80. E aqui se completa este tríptico, que rememora o trajeto da nossa escola nas palavras que a ela dedicou, ao longo de 17 anos, O Jornal de Estarreja, lido enquanto fonte histórica.

Para os próximos números, esperamos poder contar com o testemunho oral ou escrito daqueles que, querendo partilhar a sua experiência, connosco desejem continuar a fundamentar a construção e preservação da memória desta instituição.

Fig. 3 - O Jornal de Estarreja, 10 de outubro de 1975, p. 3

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Álbum de memórias

No ano letivo 2011-2012, três antigos alunos da Escola Industrial de Estarreja, que frequentaram cursos de formação nas décadas de 60 e de 70, regressam às salas da escola, abraçando com afinco e terminando com sucesso o processo RVCC de nível Secundário no CNO-Antuã. Quarenta anos depois, registamos os seus testemunhos…

Quando fiz sete anos, entrei para a Escola Primária da Bandeira, em Avanca. Ficava um pouco distante da minha casa e eu tinha de percorrer essa distância a pé todos os dias, sozinha, e, quando chovia, levava um saco de linhagem enfiado na cabeça para me abrigar da chuva. Também não havia calçado, e a roupa era pouca e quase sempre remendada. Andei na escola primária durante quatro anos, onde aprendíamos à base de reguada e estalos. Mais tarde, passei para o Ciclo Preparatório de Estarreja, mas como não havia meios de transporte, eu e as minhas colegas fazíamos esse trajeto a pé todos os dias, o qual era muito perigoso porque entre Avanca a Estarreja havia uma zona muito grande de pinhal que nós tínhamos de atravessar, e por isso tínhamos muito medo. Quando passei para a Escola Secundária de Estarreja, em 1973, começou a haver autocarro, por isso tudo se tornou mais fácil e, a partir daí, os estudantes começaram a ter acesso à escola e também às universidades que existiam pelo país. Em 1973, as regras escolares eram muito rigorosas, tais como não podermos andar de calças, os recreios serem separados e por isso os rapazes não se poderem juntar às raparigas, as saídas da escola serem proibidas, e todos os alunos terem de usar bata. A Revolução dos Cravos deu-se em 25 de Abril de 1974, foi uma data muito importante para a população portuguesa porque, a partir daí, as pessoas tiveram liberdade de se exprimir e dizer tudo o que sentiam. Assim, os alunos, como andavam revoltados com as regras da escola, que para eles eram injustas, por se sentirem oprimidos e, além disso, como as salas de aula no Inverno eram muito frias e as raparigas sentiam frio, resolveram fazer greve. Por isso, durante um dia não frequentaram as aulas e saíram para as ruas de Estarreja, fazendo uma manifestação, exigindo que o diretor mudasse as regras existentes. Mais tarde, o diretor escolar foi demitido da escola e foi nomeado outro. No final, conseguimos as nossas reivindicações, que eram andar de calças compridas, unir os recreios, haver turmas mistas, poder sair do recinto da escola. Na altura frequentava o curso de Formação Feminina, que incluía as disciplinas de Português, Francês, Inglês, Matemática, Geografia, Biologia, Desenho, Trabalhos Manuais, Datilografia, Culinária, Religião e Moral. Concluí o curso em 1975, com 16 anos. Os meus pais queriam que eu continuasse a estudar porque esse curso dava acesso à universidade, mas, como os recursos financeiros da minha família não eram muitos, desisti. Mais tarde, arrependi-me porque o meu futuro podia ter sido diferente, no sentido em que podia ter arranjado um emprego com outras condições e mais bem remunerado. Maria Goreti Figueiredo junho de 2012

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Chamo-me Alberto Marques Paulo, tenho 57 anos, e sou o filho mais velho de uma família de quatro irmãos. Aos 7 anos entrei para a escola primária, que concluí em 1961. Sendo eu filho de pais pobres, iria aí concluir os estudos. Nesse ano, a minha mãe, que era a minha encarregada de educação, foi chamada à escola, onde a professora a elucidou e lhe sugeriu que eu fizesse a admissão ao ensino preparatório. Para isso, era obrigatório, após a conclusão do ensino básico, fazer um exame. Perante a minha mãe e professora, eu acedi a fazer esse exame de admissão, estávamos em 1966. Como a professora verificou que eu tinha qualidades para tirar um curso secundário, foi a própria que incentivou a minha mãe para que eu continuasse. Um dia à noite, estando eu na presença dos meus pais, estes perguntaram-me se efetivamente queria ir estudar, fiquei contente porque tinha gosto em tirar um curso, mas o que eu ouvi dos meus pais foi o seguinte: “Alberto, nós vamos fazer um esforço para que tu consigas tirar um curso, agora vê lá se aproveitas bem, porque nós não temos posses.” Fiz a matrícula na Secção de Estarreja da Escola Industrial de Ovar e comecei o meu ciclo de estudos no ano de 1966. Frequentei os dois primeiros anos do ciclo preparatório com aproveitamento bom, continuei os estudos mais três anos para concluir o curso de Formação Electromecânico, que era o único curso que esta escola dava no setor masculino, conseguindo passar ano após ano, reprovando só no 5.º ano a uma disciplina, que era Oficina de Serralharia, mas que era vital na conclusão do curso. Esta disciplina obrigou-me a frequentar mais um ano, tendo concluído em 1972. Na época em que estudei havia bastante dificuldade para tirar um curso por não haver transportes adequados, o único meio de transporte era o comboio, e para isso eu tinha que me levantar todos os dias às 5 horas e 45 minutos da manhã para me deslocar de casa até à estação do caminho-de-ferro, fazendo um percurso a pé de aproximadamente 3 quilómetros, para às 6 horas e 50 minutos embarcar no comboio até Estarreja para ter aulas que começavam às 8 horas da manhã. Este transporte era o mais adequado, uma vez que sincronizava com os horários de início e fim de aulas, porque a maior parte dos dias da semana estas terminavam às 18 horas, e ao sábado havia aulas até ao meio dia. (…) Neste ano de 2012, regresso à escola para frequentar o processo de RVCC, no CNO-Antuã. Este novo percurso foi importante para mim, uma vez que adquiri conhecimentos de Cultura, Língua e Comunicação, e Sociedade, Tecnologia e Ciência, para além dos conhecimentos profissionais que adquiri ao longo do meu percurso profissional. Os temas tratados no Referencial obrigaram-me a uma reflexão sobre mim próprio e sobre toda a minha vida, dando importância a certos pormenores que até aqui quase sempre me passaram despercebidos. No entanto, ao iniciar este projeto, o meu objetivo foi sempre o de chegar ao fim e com sucesso. Pensando, desde o início, que não iria ser uma tarefa nada fácil, ao longo de todo este processo algumas vezes cheguei a pensar em desistir. Aprendi, através deste processo, que nunca é tarde para aprender e assim continuar a aumentar o meu nível cultural. Apercebi-me, acima de tudo, do quanto não sei e do quanto tenho ainda para aprender. Foram alguns meses de intenso trabalho, esforço e muita dedicação não apenas da minha parte, mas de todos aqueles que me rodeiam (família, amigos, formadores, etc.). Indiretamente, todos estiveram envolvidos neste meu percurso de aprendizagem, através das conversas e debates partilhados sobre os mais diversos temas, pelas dicas, pelo estímulo e incentivo nos momentos menos fáceis. Por tudo isto, não posso deixar de agradecer a todos os formadores que me ajudaram e apoiaram ao longo de todo este processo. Alberto Marques Paulo junho de 2012

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obras-vivas junho de 2012 - Inesperadamente juntos: Maria Goreti Fernandes, Alberto Marques Paulo e Alberto Joaquim Garrido

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Trabalhos realizados pela D. Goreti, no Curso de Formação Feminina (pormenores)

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ASSOCIAÇÃO DOS ANTIGOS ALUNOS DO COLÉGIO D. E UM NOVO PARCEIRO DA ESCOLA

José Garcia

Secretário da atual Direção da Associação. Antigo aluno do Colégio D. Egas Moniz (1946-1954) Como nasceu a Associação A Associação dos Antigos Alunos do Colégio D. Egas Moniz e da Escola Secundária de Estarreja está constituída desde o dia 14 de Maio de 1991. Vejamos como surgiu a ideia da sua criação, citando a reportagem inserida no primeiro Boletim da Associação, publicado em Setembro de 1993: “Um dia um grupo de antigos alunos do Colégio D. Egas Moniz crispou-se de entusiasmo. Era necessário lançar na posteridade o nome da grande mestra que foi a Profª Maria Arnaldina Guiomar. Organizou-se o programa, aprazou-se a data. Fizeram-se contactos. Amontoaram-se entusiasmos... E no dia 15 de Setembro de 1990 lá nos juntámos na Escola Secundária. Connosco quase três centenas de saudosos abraços, beijinhos, paleio... alegria a rodos. A homenagem foi linda, a Arnaldina bem a merecia. Sessão solene com várias intervenções. A intervenção de fundo coube ao Casimiro Tavares. O Carlos Tavares fez a leitura e entrega de um Despacho do Ministério da Educação com um louvor à professora licenciada Maria Arnaldina, prestando-lhe assim pública homenagem pela sua dedicação exemplar em prol do ensino e da educação. A Assembleia Municipal de Estarreja aprovou um voto de congratulação no mesmo sentido. Procedeu-se em seguida ao descerramento de uma placa alusiva na biblioteca da Escola. Depois partimos para a Reunião Geral onde foram tomadas as seguintes deliberações: - Criar o prémio Dra. Maria Arnaldina Guiomar a atribuir ao aluno melhor qualificado em Matemática no 11.º ano (último ano do ensino secundário nessa data); - Promover a criação de uma Associação de Antigos Estudantes do Ensino Secundário de Estarreja com o objectivo de criar Amizade, divulgar a Cultura e prestar Solidariedade; - Conceder poderes à Comissão Organizadora para dar cumprimento às deliberações tomadas. Assim germinou a nossa Associação. Logo em 14 de Maio de 1991, a Associação era uma realidade jurídica por legalmente constituída. No Convívio seguinte, em 14 de Setembro, procedeu-se à eleição dos primeiros Corpos Sociais.” Desde essa altura, as várias Direcções que têm passado pela gestão da Associação têm organizado diversas actividades, além dos sempre aguardados Encontros-Convívio. Informações mais completas dessas iniciativas poderão ser vistas na Página que a Associação tem na net, nomeadamente alguns colóquios, palestras e exposições e com especial referência às homenagens que, oportunamente, foram prestadas ao Padre Donaciano de Abreu Freire, ao Dr. Augusto Ramos e ao Dr. Jaime Vilar, personagens marcantes, quer no desenvolvimento do Ensino no Concelho, quer na memória de muitos dos antigos alunos que com eles conviveram. Os novos Estatutos e Regulamentos A Associação regeu-se, desde a sua fundação até à data de realização do último Encontro, pelos Estatutos aprovados por Escritura de 14/05/1991, cuja versão pode ser vista na sua página na Net. No Encontro realizado em 12/11/2011 foi aprovada nova versão, bem como o Regulamento dos prémios que anualmente são atribuídos aos melhores alunos da Escola Secundária. Nestes novos Estatutos, além de uma pequena alteração no nome da Associação, foram retiradas algumas regras que, por necessidade de alterações frequentes, exigiriam novos estatutos, passando então essas situações para regulamentos. No entanto, consideramos que a alteração mais saliente foi a da criação da designação de Sócios Honorários para todos os antigos Professores, quer do Colégio quer da Escola Secundária, que aceitem pertencer à Associação, satisfazendo assim o desejo, manifestado frequentemente nos Convívios, de terem os antigos alunos o prazer de lá se encontrarem com eles e vice-versa. Os meios de comunicação da Associação Foi sempre difícil o contacto com os antigos alunos, nomeadamente para receberem os convites para os EncontrosConvívio. A Associação tem uma base de dados com as referências de perto de 300 alunos mas sem os contactos actualizados, do que tem resultado a devolução da maior parte das cartas que lhes são enviadas.

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EGAS MONIZ E DA ESCOLA SECUNDÁRIA DE ESTARREJA:

No sentido de alterar esta situação, e ainda na gestão da anterior Direcção, deu-se início à criação de um sistema integrado de comunicação que consta de:

E no dia 15 de Setembro de 1990 lá nos juntámos na Escola Secundária. Connosco quase três centenas de saudosos abraços, beijinhos, paleio... alegria a rodos.

1. Uma caixa de recepção postal no endereço da Escola Secundária: Associação dos Antigos Alunos do Colégio D. Egas Moniz e da Escola Secundária de Estarreja Rua Dr. Jaime Ferreira da Silva 3860-256 Estarreja 2. Um e-mail com a ref.ª aaacemese@gmail.com 3. Uma Página na Net com a ref.ª aaacemese.webnote.pt 4. Um Link para esta página, na página da Escola Secundária 5. Contactos dos elementos da actual Direcção (ver na página na Net)

No momento em que estes textos eram redigidos para edição da Revista (Abril 2012), a página na Net estava em construção. Os objectivos de curto prazo Com a criação dos meios de comunicação atrás referidos, a facilidade no preenchimento e entrega das fichas individuais, a manutenção duma quota anual pouco mais que simbólica de 5 Euros, a abertura da instituição aos nossos professores e a colaboração e empenhamento de todos, pretende a actual Direcção regularizar e aumentar o número de associados, criar condições para incrementar a sua componente de solidariedade e, por outro lado, estabelecer com a Escola Secundária uma parceria de colaboração nas áreas de interesse comum. É também nosso objectivo começar a preparar o próximo Encontro, já previsto para o segundo Sábado de Novembro de 2013. Notícias do último Encontro-Convívio O nosso último Encontro ocorreu no dia 12 de Novembro de 2011. Dois factos se salientavam nesse ano, a comemoração do 20.º aniversário da criação da Associação e a passagem do 1º aniversário do falecimento da Prof.ª Maria Arnaldina. O programa do Encontro foi enviado com o convite a todos os antigos alunos que constavam na nossa base de dados. Infelizmente, como se previa, muitos endereços estão desactualizados e, por consequência, muitas cartas foram devolvidas. Foi o momento certo para se dar início à organização de um sistema de comunicação mais eficiente, recorrendo às novas redes sociais. Conseguimos que estivessem presentes cerca de oitenta pessoas. O programa incluiu uma missa na Murtosa, em memória dos colegas e professores falecidos e a aposição de uma lápide e um ramo de flores na campa da Prof.ª Maria Arnaldina.

Seguiu-se a realização da Assembleia-Geral, já nas novas instalações da Escola Secundária, local onde também se realizou o almoço e o convívio de confraternização, que se prolongou por toda a tarde. A Associação agradeceu a disponibilidade do espaço à Direcção da Escola, na pessoa do seu Director, Dr. Jorge Ventura, que também nos deu o prazer de estar presente. Entre os diversos momentos do convívio salientamos a intervenção do presidente da Direcção cessante que fez uma referência à comemoração do 20.º aniversário da Associação, lembrando alguns factos relacionados com a sua criação, nomeadamente à figura do Dr. Casimiro Tavares, seu primeiro impulsionador, às homenagens prestadas a figuras relevantes no passado, à criação dos prémios Dra. Maria Arnaldina e Dr. Casimiro Tavares e à iniciativa da organização do já referido sistema integrado de comunicação que, continuado pela Direcção que agora foi eleita, irá facilitar, quer o contacto com os antigos alunos com endereços desactualizados quer a inclusão dos novos mais recentes ex-alunos. Deu também um grande realce à aprovação em Assembleia-Geral da inclusão, nos Estatutos, dos antigos professores, como sócios honorários, o que irá permitir a oportunidade de, nos próximos Encontros, os antigos alunos poderem desfrutar da sua companhia. É com certeza um grande incentivo à nossa presença. A presidente da nova Direcção interveio também, lembrou alguns momentos do seu percurso como professora nesta Escola, enfatizou o valor humano e saudosista destes Encontros e terminou com a declamação de um poema de sua autoria, a eles alusivo. Foi também muito interessante a cerimónia que se seguiu da entrega dos já referidos prémios aos melhores alunos dos anos 2006 a 2010, já que os referentes ao ano 2011 tinham sido entregues na abertura do actual ano lectivo. O Convívio terminou com os abraços do costume mas também com uma falha enorme, não foi tirada a fotografia da praxe. A reportagem mais completa do Encontro pode ser vista na Página da Associação, na net. NOTA: Este texto é apresentado na ortografia antiga, anterior ao Acordo Ortográfico, por vontade expressa do autor.

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APELO ASSOCIATIVISTA António Nunes Ferreira Girão 1

Depois de um interregno de alguns anos, a nossa Associação fez prova de vida, em 12 de Novembro do ano findo, com a realização do Encontro bienal, ao qual acorreram antigos alunos de várias gerações e em número que não deixou ficar mal a Direcção então em exercício por, em boa hora, ter decidido dar cumprimento aos Estatutos. Numa época de doentios e insuportáveis egocentrismos, em que cada um só se preocupa em puxar a brasa à sua sardinha o mais possível (e muitas vezes, infelizmente, sem olhar aos meios eticamente mais recomendáveis), estas iniciativas de congregação e de convívio entre pessoas que receberam em conjunto, numa fase etária especialmente sensível das suas vidas, parte importante da sua educação escolar, constituem verdadeiros oásis de recobro de forças e de esperança para uma vivência mais humanizada e menos materialista. Este arrazoado de lugares comuns pode parecer temporalmente desajustado, bafiento e, por isso, inócuo. Mas a verdade é que a vida é feita de lugares comuns e muito de bom da nossa vida tem sido perdido ou deteriorado por não termos tido a coragem de afrontar o preconceito de que já não se usa falar destas coisas e de falarmos – e, principalmente, praticarmos –, até à exaustão e em todos os lugares e momentos que se propiciem, os chamados valores universais, que de nós tão arredios andam. Por isso é que os movimentos associativos são tão importantes, cabendo aos mais velhos – ou, num usual eufemismo mais elegante, aos mais experientes – a engenhosa tarefa de aliciar os mais novos a dar continuidade à vida associativa, convencendo-os de que o sentimento de pertença ajuda-nos, e muito, a encarar com mais força as naturais dificuldades da vida e também a protelar a solidão, a que, mais tarde ou mais cedo, nenhum de nós escapa. É com esse desiderato incentivador que a actual Direcção da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Dom Egas Moniz e da Escola Secundária de Estarreja, aproveitando e agradecendo a generosa oportunidade concedida pela Revista da Escola Secundária de Estarreja, decidiu dirigir-se aos seus leitores na forte expectativa de, dando-nos a conhecer melhor, conseguirmos a vossa adesão a este projecto de continuidade de pertença a uma específica comunidade escolar. 1 antigo aluno do Colégio D. Egas Moniz (1955-1960), Juiz Conselheiro Jubilado e vice-presidente da atual Direção da Associação.

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REENCONTRO

Maria Georgina C. Landeiro 2 Fiquei surpreendida quando recebi o convite para participar na Direção da Associação dos Antigos Alunos do Colégio D. Egas Moniz e E.S.E. A título honorífico e, com o suporte de uma equipa qualificada e amiga, aceitei a proposta e senti que voltei, de certa maneira, à Escola. É uma honra que sinto e que espero viver durante o tempo que for possível e ajustado às conveniências da Associação e minhas. Revisitar a “minha ESCOLA” com estas novas funções faz-me renascer e sentir que, tal como todos os sistemas que registam memórias e experiências, também o meu relógio do tempo funcionou e me transportou aos dias em que a minha vida era preenchida com as aulas ministradas e sua preparação, bem como com o convívio com colegas, alunos e funcionários. Foram 34 anos com muita dedicação e trabalho, com alegrias e algumas agruras, mas com situações inesquecíveis. Não quero deixar de referir os dois períodos diferentes do funcionamento do Colégio, 1.º com direção do Dr. Ramos cujas características foram exploradas várias vezes, e o 2.º com a Direção do Dr. Júlio Pereira até à oficialização e criação da Escola Secundária de Estarreja. Quero referir os anos em que presidi ao Conselho Diretivo, anos difíceis, mas em que tive a ajuda extraordinária dos outros membros da direção como o Saramago, a Manuela Bagão, o Cirne, o Dr. Augusto e a Elisabete Camões. Nesse período a escola tinha 3 polos – o edifício do Colégio, a escola da Fontinha (onde funcionou a Escola Industrial) e uma residência na Fontinha. Como tudo evoluiu! Nalguns pavilhões, em dias de chuva, a água caía na sala e era difícil manter os alunos com interesse e atentos. Conseguimos a vinda da Diretora Geral para observar as nossas instalações e dessa visita acelerou-se a construção da nova Escola. Quero referir ainda as sucessivas camadas de alunos do Colégio e da Escola Secundária que deixaram marcas na nossa memória, e é com enorme satisfação que registo serem muitos os que singraram na vida ocupando lugares na ciência, nas letras e na economia. Que dizer-vos mais da vida de uma professora? Das estratégias que por vezes tínhamos de improvisar para conseguir alcançar os objetivos curriculares? A compreensão de alguns conceitos e a sua memorização eram difíceis para alguns alunos. Então pensei que seria mais fácil se conseguisse aliar um processo

idêntico à memorização de uma música à sua letra. Assim sendo, na época uma das canções em voga era “I just call to say I love You”, do cantor Stevie Wonder, e foi assim que conseguiram saber a definição de massa molecular. Algumas outras historinhas existem na memória dos alunos que sabem e gostam de recordar os episódios mais caricatos, felizes ou infelizes, que todos os professores tiveram na sua vida de docentes. São registos que se repetem nos encontros ao longo da vida, e a Associação dos Antigos Alunos contribui e contribuirá para tal. Como despertar em todos os ex-alunos e ex-professores o desejo de se encontrarem recordando e confraternizando todas as vivências? Eis uma função do nosso grupo e esperamos criar iniciativas que alarguem os horizontes e reúnam mais elementos para uma vida mais rica e participada.

2 Antiga Professora (1960-1994) e Presidente do Conselho Diretivo (1978-1981) da Escola Secundária, atualmente reformada, e Presidente da atual Direção da Associação.

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MEMÓRIAS DAS MINHAS VIVÊNCIAS COMO ALUNO António Manuel Vidal 3

Entrei para o Colégio quando ainda era director e proprietário o Dr. Augusto Ramos, academicamente conhecido por “O Careca”. Nesse meu primeiro ano tive a “sorte” de o apanhar como professor de Matemática o qual, para além de ser um profundo conhecedor da matéria, ninguém põe isso em dúvida, era também um inato distribuidor de lambada, tendo eu sido contemplado com algumas. Nesse tempo, nas faltas dos professores, ou furos no horário, não havia aulas de substituição mas o salão de estudo com um Prefeito (pessoa que tomava conta dos estudantes para haver silêncio), onde estudávamos para os testes e fazíamos os trabalhos de casa, hoje os “TPC”. As portas tinham vidro por onde se via toda a sala e por onde por vezes o director espreitava só para ver se tudo corria bem e ninguém estava distraído ou a falar, caso contrário “caía o carmo e a trindade”. O Colégio foi vendido entretanto, sendo o novo director o Dr. Júlio Pereira, que também foi meu professor de Geografia. Ele e a esposa, em questão de “tratamento” dos alunos, também nada deixavam por mãos alheias. Tenho de referir que, verdade seja dita, nunca ficámos traumatizados psicologicamente… fisicamente às vezes, mas não havia muito a fazer, pois se em casa fazíamos queixa éramos capazes de ter tratamento à maneira, por via das dúvidas era sempre por falta nossa. Demos gente, singrámos na vida, uns como médicos, outros como advogados, juízes, professores, investigadores, comerciantes, operários especializados, etc. Tivemos bons professores e formadores que ainda hoje são recordados com saudade, porque já nos deixaram, como o Dr. Jaime Vilar, Dr.ª Arnaldina Guiomar, Dr.ª Laura Fragateiro, Dr.ª Fernanda. Outros, felizmente, como a Dr.ª Georgina Negrão, Dr.ª Adelaide Maria, Dr. Pinaz, Dr.ª Maria Luísa, ainda vivos, temos a felicidade do seu convívio aquando dos encontros da Associação dos

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Antigos Alunos do Colégio D. Egas Moniz e Escola Secundária de Estarreja. Estes são alguns dos professores que agora me passam pela memória, mas tantos outros fizeram a história do Colégio. Entretanto feito o meu 5.º ano (actual 9.º ano), rumei ao Liceu de Aveiro durante dois anos e alguns meses, por esse motivo não estive no último ano do colégio. O Dr. Júlio Pereira foi o último director e dono, tendo as instalações sido adquiridas pelo Estado para aí funcionar o Liceu de Estarreja/ Escola Secundária. Uma das causas do meu regresso a Estarreja foi também a mudança das linhas de comboio na Linha do Norte, que provocava horas de atraso, para além da falta de descanso, o que se reflectiu no aproveitamento escolar e fez com que eu, depois do Carnaval, pensasse em voltar, uma vez que já havia ensino oficial em Estarreja, mais económico para as famílias. Quando cheguei ao Liceu/Escola Secundária Estarreja já conhecia os cantos à casa e alguns dos professores. Era o filho pródigo que à casa voltou. Era director o Dr. Jaime Matos, já falecido, que eu conhecia pessoalmente de Estarreja e do qual nunca tive qualquer razão de queixa. Passados uns dias do meu regresso deu-se a Revolução dos Cravos, o “25 de Abril de 1974”, e houve movimentações dos alunos da escola que fazendo acusações, que hoje, passados estes anos, considero exageradas e até infundadas, fizeram com que o Dr. Jaime fosse saneado de director e regressasse à sua escola de quadro. Fica na memória o Plenário de alunos, no ginásio da escola, seguido de manifestação até aos Paços do Concelho, em que reivindicavam o seu saneamento. Alguns alunos, ainda muito novos, são actuais “políticos da nossa praça”. Não querendo julgar ninguém, e pondo-me numa posição neutra pois, como disse, nada me movia contra o director, eu estava há pouco tempo debaixo da sua alçada. Penso que houve aproveitamento de alguns professores mais novos na escola e de alunos mais velhos para defenderem interesses que na altura começavam a surgir no nosso País. É de referir que os mais velhos muitas vezes saíam directamente da escola para a tropa, pois o antigo 7.º ano, hoje o 11.º ano, era o terminus do ensino secundário e por vezes demoravam anos a concluílo. Entretanto atingiam os 20 anos e íam para a tropa sem possibilidade de pedirem adiamento. Passaram-se anos sem ter quaisquer contactos com a Escola


Secundária, até que os meus filhos entraram também no ensino secundário e aí comecei a pertencer aos órgãos sociais da Associação de Pais e em sua representação fiz parte da Assembleia de Escola, Conselho Pedagógico e Conselho Geral Provisório, onde trabalhei com vários Conselhos Directivos. Novamente a Escola Secundária de Estarreja passou a ser dirigida por um director e fiz parte do Conselho Geral que elegeu o actual director Prof. Jorge Ventura. Com a saída dos meus filhos do ensino secundário, tive de deixar de participar na vida da Escola. No Conselho Geral existem representantes de algumas colectividades do Concelho. Quem sabe se através de alguma associação, de que faço parte, um dia voltarei... A Associação dos Antigos Alunos do Colégio Dom Egas Moniz e Escola Secundária de Estarreja, da qual faço parte, pretende ser o elo de ligação entre os antigos, actuais e futuros alunos, unindo gerações e partilhando experiências “ontem, hoje e amanhã”… 3 Antigo aluno do Colégio D. Egas Moniz (1965-1970) e da Escola Secundária (1974), atualmente funcionário da DOW Portugal, e Tesoureiro da atual Direção da Associação.

ROMAGEM A vida passa... Como um voo de ave Silencioso e breve Rumo à eternidade! Alegria ao rever-te Estarreja, oh cidade! Do Colégio à Escola És nossa saudade! Cinzas da memória Lembram os ausentes E a nossa romagem Ficará na história Dos aqui presentes, Sinal e homenagem Para os que partiram E ficam p’ra sempre. Maria Georgina C. Landeiro

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O MEU TESTEMUNHO COMO RECENTE EX-ALUNO Christian Neves 4

A Escola Secundária de Estarreja foi o estabelecimento de ensino que me acolheu após a minha vinda para Portugal há 6 anos e posso dizer que tive muito orgulho e prazer em aqui estudar; fui totalmente integrado pelos meus colegas, pessoal não docente e por todos os professores. Terminei o Secundário (2008-2009), entrei na Universidade e, como eu, todos os meus amigos do 12º ano o fizeram; acabámos por nos dispersar por todo o país, cada um foi para a sua cidade académica escolhida e, desta forma, o contacto foi diminuindo e até com alguns se perdeu completamente. A Escola é um local onde se descobre muito, não só em termos de educação, como também na criação de laços afetivos, seja com os funcionários, seja com os colegas; haverá sempre algo novo para aprender e acreditem que, quando forem mais velhos, quererão voltar a vê-los, recordar alguns momentos bem passados e ter a noção de que todos aqueles anos de estudo serviram para algo, nem que fosse para aprender com a experiência dos professores o que depois iríamos passar aos nossos filhos; o mesmo se passou com os nossos avós e pais, que nos transmitiram conhecimentos, alguns dos quais provavelmente aprendidos dos seus professores na altura. Acreditem que após se criar uma amizade entre colegas, com o passar dos anos os contactos vão diminuindo e é aqui que a Associação dos Antigos Alunos do Colégio Dom Egas Moniz e da Escola Secundária entra! Esta associação pretende que a convivência não termine, que se mantenha um contacto mínimo entre todos; é bem provável que venham a encontrar alguém que já estão há muito tempo sem ver. Até mesmo os professores, é sempre bom voltar a vê-los. Portanto, é preciso a colaboração de todos, a Associação precisa de nós, ex-alunos, para funcionar e permitir que a chama da amizade se mantenha acesa para sempre.

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Torna-te Sócio! Para algum esclarecimento, sugestão, pedido ou até mesmo para te inscreveres, passa pelo site ou facebook, onde também poderás encontrar notícias atualizadas e todas as atividades que se pretendem realizar. Deixo-vos com um conselho: leiam esta “Dedicatória aos Amigos…” (da autoria de Vinícius de Moraes): “Um dia a maioria de nós irá separar-se. Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, das descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos que partilhamos. Saudades até dos momentos de lágrimas, da angústia, das vésperas dos finais de semana, dos finais de ano, enfim... do companheirismo vivido. Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre. Hoje não tenho mais tanta certeza disso. Em breve cada um vai para seu lado, seja pelo destino ou por algum desentendimento, segue a sua vida. Talvez continuemos a nos encontrar, quem sabe... nas cartas que trocaremos. Podemos falar ao telefone e dizer algumas tolices... Até que os dias vão passar, meses... anos... até este contacto se tornar cada vez mais raro. Vamo-nos perder no tempo... Um dia os nossos filhos vão ver as nossas fotografias e perguntarão: “Quem são aquelas pessoas?” Diremos...que eram nossos amigos e... isso vai doer tanto! “ Foram meus amigos, foi com eles que vivi tantos bons anos da minha vida!” A saudade vai apertar bem dentro do peito. Vai dar vontade de ligar, ouvir aquelas vozes novamente... Quando o nosso grupo estiver incompleto... reunir-nos-emos para um último adeus de um amigo. E, entre lágrimas abraçar-nos-emos. Então faremos promessas de nos encontrar mais vezes desde aquele dia em diante. Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a sua vida, isolada do passado. E perder-nos-emos no tempo... Por isso, fica aqui um pedido deste humilde amigo: não deixes que a vida te passe em branco, e que pequenas adversidades sejam a causa de grandes tempestades... Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!”

4 Antigo aluno da Escola Secundária (2006-2009), atualmente finalista do curso de Ciências Biomédicas na Universidade de Aveiro, e Vogal da atual Direção da Associação.


RECORDANDO O PADRE DONACIANO DE ABREU FREIRE José Garcia

Tendo sido um pioneiro do ensino secundário em Estarreja e criado o Externato, que depois deu lugar ao Colégio Dom Egas Moniz, o Padre Donaciano merece sempre que recordemos os momentos mais salientes da sua vida. A Associação dos Antigos Alunos teve já oportunidade de o homenagear no Encontro anual de 1992, descerrando um medalhão na Escola Secundária. Este ano recordamo-lo no centenário da sua ordenação sacerdotal – 1912-2012 -, citando um poema que a sua antiga aluna e nossa amiga Maria Lucília Albuquerque (frequentou o Colégio D. Egas Moniz entre 1942 a 1945) lhe dedicou por altura do centenário do seu nascimento (1989).

Este vulto de grande dimensão, O ilustre Senhor de que vos falo, Às gavetas do tempo fui buscá-lo, Por ser dever, dever de gratidão!

Ficávamos ali, quietos e mudos, Sentindo a consciência mais pesada... - Então, meninos?! Não ouvistes nada? Ou sereis, por acaso, todos surdos?

Fora meu professor de Português No antigo Colégio Egas Moniz... Belos tempos, em que eu fora tão feliz, Pudessem eles voltar, uma só vez...

De vez em quando pedia voluntários Que quisessem, ao pé dele, dar lição... Como ninguém de nós erguia a mão, Erguia-se ele sem mais comentários...

Mantendo-se de pé, sobre o estrado, Corria-nos de olhos penetrantes, Tentando descobrir nos estudantes, Quem não tinha o texto bem estudado!

- Lê tu, anda... Nada de enganos!!! - Divide e classifica as orações! Assaltavam-me diversas sensações, Pois se tinham gorado tantos planos!

E parece que acertava sempre em cheio, Ao fazer recair a sua escolha... Lia-o ele e, virando logo a folha: Estudai dois, pois não há recreio!

Padre Donaciano: Que bom era Voltarmos a juntar-nos outra vez... Teria melhorado em Português, Teria lido como nunca lera... Boletim da Associação dos AACEMESE, n. º 1, 1993, pág. 11

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obras-vivas

Em 1998, líamos na capa do jornal O Moscardo...

Da esquerda para a direita: Na proa, o Professor Rui Vidal (na altura, Presidente do Conselho Executivo) No canto inferior direito, os professores de Mecânica, Vítor Resende, Fernando Costa e Silva e Armando Rodrigues

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À esquerda, a D. Irene Santos O segundo da direita, Professor Fernando Costa e Silva

Recordamos, aqui, os nomes de todos os alunos das duas turmas, não necessariamente representados nesta fotografia, pelo que confiamos na memória dos nossos leitores para uma plena identificação de cada um! Alunos do 9.º ano+1, curso de Serralheiro Mecânico (por ordem alfabética da pauta) 1997-1998: António Manuel Campos Ruela (Murtosa), António Pedro Pais Ferreira (Canelas), Carlos Manuel Marques Valente (Canelas), Francisco António Pinho Neta (Cacia), João Diamantino Andrade Pinho (Canelas), Miguel Melo Lourenço (Estarreja), Nilton Jorge Tavares Rebelo (Murtosa), Ricardo Manuel Costa Andrade (Canelas), Sérgio Alexandre Matos Almeida (Canelas). 1998-1999: António José de Oliveira Aguiar (Canelas), António Manuel Andrade Pinto (Canelas), Carlos Manuel Marques Azevedo (Aveiro), Fernando Eduardo da Silva Valente (Canelas), Francisco José Tavares Gurgo (Murtosa), Gilberto Manuel Leite da Silva (Aveiro), Luís Miguel Fernandes Esteves (Cacia), Nelson Tiago de Almeida Marques (Beduido), Rui Pedro da Silva Costeira (Canelas),Vítor Manuel Marques Tavares (Beduido).

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lugar próprio e com bom fundo para um navio fundear em condições de segurança

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e Zzzás... Momento Poético por Abril Graciete Oliveira, Rui Vidal, Carlos Oliveira

Liberdade Por ela se abriram, em Abril, as portas da Escola. Por ela se enfrentaram obstáculos que não se podem deixar reerguer. Por ela se escreveram poemas que não se podem deixar de reinventar. Por ela se quis homenagear todos os que ousaram querer um País onde a Poesia é uma arma. Este texto foi construído pelos professores Carlos Oliveira, Graciete Oliveira e Rui Vidal, aquando da celebração do 30.º aniversário da Revolução de 25 de Abril de 1974, a partir de poemas de Vinícius de Morais, Sérgio Godinho, Zeca Afonso, José Mário Branco, Ermelinda Duarte, José Régio, Ary dos Santos, Manuel Alegre, José Fanha, Adriano Correia de Oliveira, Natália Correia, António Gedeão e Chico Buarque. Representado no antigo polivalente da Escola Secundária de Estarreja, em dois momentos distintos e com alunos de turmas e cursos diferentes, constituiu sempre um trabalho de reflexão sobre os valores democráticos, a obrigatoriedade da intervenção cívica e a necessidade de construção permanente da Liberdade.

(Apaga-se a luz do palco. Ambiente de clandestinidade na plateia. No ecrã passa o videoclipe dos Radio Head. Som: Nasce selvagem. Diferentes personagens vão entrando por vários pontos da sala. Transportam rolos (murais) que colam nas paredes. Ao som das violas cantam enquanto trabalham. Apenas Maria se alheia e observa sentada nas escadas. A operária em construção fala de cima do andaime. O Foco sobre a operária em construção sobe de intensidade.)

que um tijolo valia mais do que um pão? Tijolos ele empilhava com pá, cimento e esquadria. Quanto ao pão, ele o comia... mas fosse comer tijolo!

Era ele que erguia casas onde antes só havia chão. Como um pássaro sem asas, ele subia com as casas que lhe brotavam das mãos. Mas tudo desconhecia de sua grande missão: não sabia, por exemplo, que a casa de um homem é um templo, um templo sem religião. Como tão pouco sabia que a casa que ele fazia, sendo a sua liberdade, era a sua escravidão.

(À medida que os murais são descerrados, vão-se acendendo focos de luz. A operária em construção dirige-se a um mural já iluminado.)

(A operária em construção desce do andaime e continua a falar olhando o público. No ecrã passam imagens da repressão sobre o movimento operário.) De facto, como podia um operário em construção compreender porque é

(A operária em construção observa os seus camaradas e continua.) E assim o operário ia, com suor e com cimento, erguendo uma casa aqui, adiante um apartamento, além uma igreja, à frente um quartel e uma prisão; prisão de que sofreria não fosse, eventualmente, um operário em construção.

Operárias em construção - A toda a parte chegam os vampiros, batendo as asas pela noite calada. São os mordomos, mandadores sem lei. Ouvem-se os gritos na noite abafada. (…) Maria – Não é nada comigo, não é nada comigo! Eu quero lá saber desse paleio, vou mas é ao futebol!

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Ah... homens de pensamento, não sabereis nunca o quanto aquele humilde operário soube naquele momento! Naquela casa vazia que ele mesmo levantara um mundo novo nascia de que nem sequer suspeitara. (Todas as operárias param o trabalho e observam as suas


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mãos. Devem procurar as luzes.) O operário emocionado olhou sua própria mão, sua rude mão de operário. E olhando bem para ela teve num segundo a impressão de que não havia no mundo coisa que fosse mais bela. (As operárias continuam a observar as suas mãos.) Foi dentro da compreensão desse instante solitário que, tal como a sua construção, cresceu também o operário. E um facto novo se viu que a todos admirava: o que o operário dizia outro operário escutava. E foi assim que o operário do edifício em construção que sempre dizia sim começou a dizer não. E o operário ouviu a voz de todos os seus irmãos. (Terminam as imagens no ecrã. As personagens que não têm texto começam a construir o mural do Povo.) 1.ª operária - Viemos com o peso do passado e da semente. 2.ª operária - Vivemos tantos anos a falar pela calada. Operária em construção Esperar tantos anos torna tudo mais urgente. Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão... 1.ª operária - …habitação, saúde, educação. 2.ª operária - Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão... 3.ª operária - …habitação, saúde, educação. Operária em construção - Só há liberdade a sério quando houver liberdade de mudar e decidir. 2.ª operária – Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão, habitação, saúde, educação. Operária em construção – Chiiiiiiu, chiu....chiuui!

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(Volta a luz da clandestinidade. Oculto, atrás da parede da cantina, o Pide fala com walkie talkie.) Pide – Casimiro. Estás no teu posto? Consegues vêlos? Olho neles. Já constam nos nossos ficheiros? A que está em cima do andaime é a que cantava em Setúbal na semana passada. Tenho a certeza! Casimiro – É ela! Mas presta atenção àquela do lenço vermelho. Essa é nova aqui. (Neste entretanto, as operárias refugiam-se na escuridão. Apenas Maria se mantém expectante.) Operárias em construção - A toda a parte chegam os vampiros, batendo as asas pela noite calada. São os mordomos, mandadores sem lei. Ouvem-se os gritos na noite abafada. 1.ª operária - Eles comem tudo e não deixam nada. (Os murais voltam a iluminarse.) Maria – Não é nada comigo, não é nada comigo! Eu quero lá saber desse paleio, vou mas é ao futebol! 1.ª operária - (dirigindo-se a Maria) – Somos a voz sufocada de um povo a dizer não quero. Somos livres de o dizer! 2.ª operária (dirigindo-se a Maria) – Quantos bufos é que não há neste país? Maria – É só paleio, pá! O pessoal não quer é trabalhar, pá! Cada um que se vá safando como puder, é mesmo assim! Operária em construção – E é por isso que a tua solução é não ver, é não ouvir, é não querer ver, é não querer entender nada! Maria – Estás-me a querer convencer de que a culpa é minha e eu sem culpa nenhuma. Que se lixem as alternativas. Para trabalho já me chega! Tratem da


vossa vida que eu trato da minha. Isto é que é uma porra! Que raio haviam vocês de inventar?! Parecem uma matilha de cães a rosnar. 2.ª operária - Mais vale ser um cão raivoso do que um carneiro a dizer que sim ao pastor o dia inteiro. 1.ª operária (dirigindo-se a Maria, em tom de gozo) - Mais vale ser um cão raivoso do que uma sardinha enlatada na lata, educadinha. Maria – Deixa-me em paz, porra! Deixem-me em paz e sossego! Não há paciência! Para esse peditório já dei! 3.ª operária - Que a voz não te esmoreça, vamos lutar. Enquanto há força seremos muitos, seremos alguém! (Do alto do pedestal, o Pide procura com o foco o operário em construção) 3.ª operária - Aqui não há lugar para os filhos da mãe. Ratos, ratos. Vivem escondidos nos nossos sapatos. Vivem escondidos nos nossos segredos. Operária em construção - Não nos soa na memória, outra palavra que o medo. Medos, medos vivem escondidos nos nossos segredos. Somos um povo que cerra fileiras. Dançai rapazes e raparigas, cantai também. 2.ª operária - O povo é quem mais ordena. Em cada rosto igualdade. Pide – Pluralismo a dar com pau! A produtividade, ora aí está! Há tanto nesta terra que ainda está por fazer! A revolução é uma finta vossa p’ra virem p’ra aqui com esse paleio. Saiam daqui p’ra fora! (Na janela da rádio, com a luz acesa.) Poeta – E se inventássemos o mar de volta...? E se inventássemos partir... para regressar? Partir aqui... para ficar?

Operária em construção – Não me obriguem a vir para a rua gritar! Não há machado que corte a raiz ao pensamento! É irreversível! Pide – Deixa-te de políticas que a tua política é o trabalho! Que o trabalhinho é muito lindo. O teu trabalhinho é muito lindo! Para ver se a gente consegue, num grande esforço nacional, estabilizar esta desestabilização. Consolida, filha, consolida! Tudo corre bem. Fica descansada que há milhares de gajos inteligentes a pensar em tudo neste mesmo instante, enquanto tu vais adormecer a não pensar em nada. Milhares de tipos inteligentes e poderosos com computadores, telefones, congressos universitários, eu sei lá! Eles decidem tudo por ti. Quanto menos souberes a quantas andas, melhor para ti. 1.ª operária – E quem se lixa é sempre o mexilhão. Pide – Cambada de líricos. Meia dúzia de líricos que acabam todos a fugir. Descansa, não penses em mais nada. Assim é que te fazes uma mulherzinha. (A Maria retira o vestido e com a farda da Mocidade Portuguesa executa ginástica retilínea. No ecrã passam imagens de paradas da Mocidade Portuguesa) Poeta - (descendo as escadas do palco, observando a ginasta e as imagens do ecrã) - “Vem por aqui “ – dizem-me alguns com olhos doces estendendo-me os braços, e seguros de que seria bom se eu os ouvisse quando me dizem: “ Vem por aqui”! Eu olho-os com olhos laços (há nos meus olhos ironias e cansaços) e cruzo os braços e nunca vou por aí. Pide – Estás p’ra aí a olhar p’ra mim? Este gajo quem é que julga que é? O respeitinho é muito lindo e nós somos um povo de respeito, não é? (pausa) Nós

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somos um povo de respeitinho muito lindo! Olha que te trago debaixo d’olho! Onde está o teu Extremo Oriente, filho? Poeta - (dirigindo-se, destemido, ao Pide) - Não, não vou por aí! Só vou por onde me levam os meus próprios passos... Prefiro escorregar nos becos lamacentos, redemoinhar aos ventos e como farrapos, arrastar os pés sangrentos, a ir por aí... Ah...! Que ninguém me dê piedosas intenções! Ninguém me peça definições! Ninguém me diga “vem por aqui”! (Termina a ginástica e as imagens no ecrã. Maria volta a colocar o vestido.)

1.ª operária - Anda alguém pela noite de breu à procura e não há quem lhe queira valer. Vejam bem daquele homem, a fraca figura, desbravando os caminhos do pão. 2.ª operária - Este parte, aquele parte e todos, todos se vão. Temos campos de solidão. Temos mães que não têm filhos, filhos que não têm pais. Longas ausências mortais. Viúvas de vivos mortos que ninguém consolará. 3.ª operária - Ei-los que partem, novos e velhos, buscando a sorte noutras paragens. Ei-los que partem, coração triste, de saco às costas.

Operária em construção - (dirigindo-se ao Pide enquanto vai juntando todos) - Deixa-me contar-te uma coisa:

Maria - Já é tempo de embalar a trouxa e zarpar. Virão um dia ricos ou não. Virão um dia vivos ou não. Virão um dia ou não.

(Maria vai-se aproximando do grupo, curiosa.)

(No ecrã passam imagens das prisões.)

Era uma vez um país onde entre o mar e a guerra vivia o mais infeliz dos povos à beira terra. Ora passouse porém que alguém, que lhe queria bem, um dia plantou um cravo.

Operária em construção - Por trás daquela janela, faz anos o meu amigo e irmão. Um grande silêncio dentro do meu coração. Um silêncio de martírios, um silêncio de prisão.

Pide - Não procurem nos livros o que não vem nos livros Não procurem na história o que não vem na história.

1.ª operária - Um silêncio de torturas e gritos de maldição.

Operária em construção - O país de Abril fica no ventre das manhãs, não fica nos terraços da saudade. Fica exatamente aqui, tão perto que parece longe. O país de Abril é o sítio do poema, é uma saudade de vindima. Aqui te afirmamos, dente por dente, assim: Que um dia rirá melhor quem rirá por fim.

(Ao som das violas, canta-se “Aquele inverno”. No ecrã passam imagens da guerra. Termina com foto de um monumento aos soldados da Guerra Colonial.) Operária em construção - Não, não é loucura no sangue nem poesia nas vísceras, não querer mortos de guerra morando num pedestal.

Pide (num tom de ameaça) – A morte saiu à rua num dia assim! (e sai)

2.ª operária - O soldadinho já não volta do outro lado do mar.

Operária em construção - Eu sou português aqui em terra e fome talhado no silêncio da agressão. Eu sou português aqui mas nascido deste lado, do lado de cá da vida. Do lado do sofrimento, da miséria repetida, do pé descalço... do vento.

3.ª operária - Não, não é loucura vã. Loucura é semear abutres cá na terra.

(No ecrã passam imagens da emigração.)

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1.ª operária - Quando for grande não vou combater. (Terminam as imagens no ecrã. Som - Introdução da “Grândola”)


Poeta (dirige-se à mesa dos capitães, acende o candeeiro e mexe na boina) - Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida tão concreta e definida como outra coisa qualquer. Eles não sabem nem sonham que o sonho comanda a vida. (A Operária em também da mesa.)

construção

aproxima-se

O país de Abril fica no ventre das manhãs, não fica nos terraços da saudade. Fica exatamente aqui, tão perto que parece longe. O país de Abril é o sítio do poema, é uma saudade de vindima.

Operária em construção - Somos filhos da madrugada. Navegamos de vaga em vaga à procura da manhã clara. (Som - Introdução da “Grândola”) Poeta - Mesmo na noite mais triste em tempo de servidão, há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. (Do alto do andaime) 2.ª operária - Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não. (Do alto do andaime) 1.ª operária - Pergunto ao vento que passa notícias do meu país e o vento cala a desgraça, o vento nada me diz. Operária em construção (dirigindo-se à 1.ª operária) - Amiga. Por esta estrada, amiga vem. Não percas tempo, que o vento é meu amigo, também. Aqueles, aqueles que ficaram, trá-los contigo também. (1.ª operária desce do andaime e junta-se à Operária em construção e ao poeta. As restantes seguemnos.) Poeta - Ouvem-se já os rumores Ouvem-se já os clamores Ouvem-se já os tambores. Operária em construção - Venha a maré cheia para nos empurrar. Venha a maré cheia para nos despertar. (A Operária em construção retira a boina das mãos

do poeta e coloca-a na cabeça.) Poeta - Ouvem-se já os rumores Ouvem-se já os clamores Ouvem-se já os tambores. (Som – “ Grândola, vila morena”) (No ecrã passam imagens da revolução. As últimas são desenhos de crianças. Todos se dirigem ao palco que se ilumina. Perfilandose, cantam “Grândola, vila morena”. Por entre eles, aparece a Aurora com uma criança pela mão e dirige-se ao meio da sala. Terminam as imagens no ecrã. Apagam-se as luzes do palco. Apenas um foco de luz sobre a Aurora e a criança.) Aurora - Nasci aqui no mês de Abril e comecei a inventar em cada gesto a liberdade. Havia uma lua de prata e sangue em cada mão. Era Abril. Havia um vento que empurrava o nosso olhar. Era Abril que descia aos tropeções pelas ladeiras da cidade. Mar antigo a que regresso. Neste cais está arribado o barco sonho em que voltei. Eu sou português aqui e trago o mês de Abril a voar dentro do peito. Abril já feito. E ainda por fazer. Criança - Foi bonita a festa, pá. (No ecrã fixa o desenho “A liberdade é tão linda como a minha mãe.” Ao som de “Avril au Portugal”, a luz vai diminuindo de intensidade até se apagar. Entretanto, Aurora e a criança regressaram ao palco. Ao som do “Rap Deadema” acendem-se as luzes dos murais e do palco, e agradecem os aplausos.) NOTA: no n.º 2 da Preia-Mar, por lapso, não foram mencionados no cabeçalho os nomes de dois dos professores autores da peça de teatro 00:13:13, Rui Vidal e Carlos Oliveira. Aqui apresentamos o nosso devido pedido de desculpas e efetuamos a correção.

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VAMOS ILUSTRAR A ILHA DESCONHECIDA! Rosário Bastos

Docente de Português

Nas aulas de língua portuguesa do 1.º período, os alunos da turma F, do 9.º ano, estudaram e analisaram o conto de José Saramago, O Conto da Ilha Desconhecida. Pouco a pouco, a mensagem que iam descobrindo tornava-se mais rica e mais profunda: afinal não era só a história de um homem simples que, sem nada a perder, pretende descobrir uma ilha desconhecida, ainda que todos lhe digam que esse lugar não existe. Lutando contra tudo e todos, e com a ajuda de uma única aliada, esse homem prepara-se para iniciar a sua viagem pelo mar da vida, pois «se não sais de ti não chegas a saber quem és». Este processo de (auto)descoberta da verdadeira essência da viagem (a ser realizada por cada ser humano, pois «todo o homem é uma ilha») levou a que a professora da disciplina lhes propusesse um desafio: E que tal ilustrar o conto? Individualmente, cada um deles representaria a sua interpretação do conto, destacando a parte - ou partes - de que mais gostou. Este desafio foi, de imediato, aceite pelos alunos e, num trabalho conjunto com a disciplina de educação visual, cada um produziu a sua ilustração que foi, posteriormente, apresentada e explorada na aula de língua portuguesa, procedendo-se, desta forma, à avaliação da oralidade. Mais tarde, já no 2.º período e a propósito da

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comemoração, a nível de escola, da Semana da Leitura, por iniciativa das professoras envolvidas e com a cooperação da professora bibliotecária da escola, decidiu-se que, dada a boa qualidade dos trabalhos produzidos, estes poderiam ser partilhados com a restante comunidade escolar, através de uma exposição na biblioteca. Esta exposição foi também acolhida pela Biblioteca Municipal do nosso concelho, durante o mês de maio. Os alunos gostaram muito de desenvolver este projeto, mantendo-se sempre muito empenhados e trabalhando atempada e afincadamente para que o resultado final fosse o melhor. Tal objetivo foi amplamente alcançado, uma vez que todos aqueles que visitaram o evento se manifestaram muito satisfeitos. As professoras responsáveis por esta iniciativa agradecem a todos os que com elas direta e/ ou indiretamente colaboraram e felicitam todos os alunos nela envolvidos, desejando que, com o mesmo empenho, todos eles prossigam a viagem que os levará à descoberta da sua Ilha Desconhecida.


APRENDER FAZENDO... Rosa Domingues Docente de Biologia

Nos dias de hoje, somos permanentemente bombardeados com notícias de descobertas científicas e inovações tecnológicas e metodológicas que interferem ou poderão vir a interferir com o quotidiano e a qualidade de vida dos cidadãos. Por outro lado, a globalização do conhecimento e a rapidez de comunicação levam a que cada vez mais áreas do saber interajam na construção do conhecimento científico e na aplicação desse conhecimento ao serviço da humanidade. A rapidez com que a ciência avança e o mundo se altera, devido a esse avanço, tem de ter consequências e implicações no processo de ensino-aprendizagem das ciências experimentais. O professor, consciente desta mudança permanente, tem de formar, educar e ensinar, servindo-se dos conteúdos científicos e da realidade do quotidiano, não apenas como metas mas, sobretudo, como pontos de partida para desenvolver o gosto pela procura e atualização permanente do saber, a análise e crítica fundamentada da realidade envolvente, bem como a capacidade de resolução de problemas e adaptação à mudança. Assim, capacitar-se-ão os alunos para intervir e tomar posições na sociedade, para mobilizar conhecimentos e competências de vários domínios do saber, estimulando a inovação e a criatividade, condições essenciais para a distinção e o sucesso na sociedade atual. Isto exige que o aluno seja ativo na construção do seu saber (aprender fazendo), implicado na análise da forma como constrói o seu conhecimento (aprender a aprender). Consequentemente, é fulcral na planificação do ensino-aprendizagem a seleção de temas e situações-problema envolvendo a relação entre ciência, tecnologia e sociedade, a definição de tarefas e atividades diversificadas a desenvolver pelos alunos, que impliquem a mobilização e desenvolvimento de diferentes tipos de competências, a aplicação e/ou construção de

instrumentos de organização do conhecimento que permitam ao aluno autoavaliar-se e perceber os mecanismos de construção do seu conhecimento, que podem também servir como instrumentos de avaliação para o professor. Na nossa escola, no caso do ensino das Ciências Naturais e da Biologia e Geologia, há alguns anos a esta parte, têm sido construídos e aplicados por alguns professores do grupo 520 guiões de atividades de ensino-aprendizagem para os alunos, estruturados por unidade de ensino. Estes instrumentos de trabalho foram apresentados ao grupo (e também aos restantes professores da escola, numa sessão formativa) pela professora Dorinda Rebelo (resultam de uma das áreas do seu trabalho de investigação na Universidade de Aveiro) e foram aplicados pela primeira vez por alguns professores, trabalhando em equipa com a referida professora. Os guiões são construídos à volta de uma ou mais situações, de preferência que pertençam à realidade dos alunos, que envolvem a ciência, a tecnologia e a sociedade. Pode ser a apresentação de estudos de caso, notícias sobre descobertas e avanços científicos e a sua aplicação no quotidiano, artigos de opinião, artigos de divulgação científica, estudos científicos ou dados de estudos epidemiológicos, textos sobre casos da História da Ciência. Perante estes, são apresentadas questões-problema ao aluno, ou pode também levar-se a que os alunos coloquem algumas. Estas são o ponto de partida para que se inicie o trabalho que tentará dar resposta às mesmas. Para resolver as questões-problemas, e em função da temática, as atividades propostas podem ser: - pesquisa e organização de informação científica, em pequeno grupo, com posterior apresentação e debate alargado à turma, momento em que o professor poderá sistematizar e destacar os

O professor, consciente desta mudança permanente, tem de formar, educar e ensinar, servindo-se dos conteúdos científicos e da realidade do quotidiano, não apenas como metas mas, sobretudo, como pontos de partida (…)

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conteúdos essenciais; - realização de atividades laboratoriais (Fig. 1, 1A ); - elaboração de hipóteses, planificação e execução de atividades experimentais e elaboração de relatórios/ Vês de Gowin (Fig. 2); - construção de organizadores gráficos do conhecimento como mapas de conceitos (Fig. 3); mapas mentais (Fig. 4), tabelas, diagramas de Venn, posters científicos (Fig. 5); - pequenos trabalhos de investigação sobre a realidade local/ regional relacionada com as questões em estudo, apresentados à turma ou à comunidade escolar ou local (Fig. 6); - pesquisa individual sobre temas científicos polémicos na sociedade, tomada de posição fundamentada e debate na turma (ver, neste número, o artigo “Técnicas de Procriação Medicamente Assistida - que limites à sua utilização?”); - trabalho de campo, geralmente integrado nos guiões das unidades de ensino, que envolvam temáticas mais globalizantes, como o estudo dos ecossistemas (Fig. 7) ou da geologia regional, por forma a permitir aplicar técnicas de trabalho de campo e o conhecimento teórico adquirido na interpretação de estruturas e fenómenos naturais e antrópicos “in loco”; - visitas de estudo de curta duração que complementam as atividades e aprendizagens realizadas nas aulas (Fig. 8). Para as visitas de estudo e as atividades de campo, são propostas aos alunos atividades antes da saída, que permitem a sua preparação e esclarecem sobre os objetivos a atingir. É fornecido um guião de atividades a desenvolver durante a mesma e, após a saída, são apresentadas propostas de atividades em que os alunos trabalham a informação ou amostras recolhidas, interpretando e relacionando dados e tirando conclusões. Por exemplo, ao 12.º B, no presente ano letivo, foi solicitada, como atividade pós-saída, a elaboração de um artigo para esta revista, sobre a ida ao Visionarium, em Santa Maria da Feira (ver “Jovens cientistas alteram bactérias”), onde efetuaram uma atividade laboratorial de manipulação de DNA, impossível de realizar na escola, no âmbito da unidade de ensino “Património Genético”. Ao longo do guião, são assinalados os momentos correspondentes à avaliação formativa e sumativa, que surge, assim, contextualizada e integrada ao longo da unidade, com indicação aos alunos do instrumento que poderá servir para a realização da

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(nesta página) Figuras 1 e 1A, 2, 3 (pág. seguinte) Figuras 4, 5, 6, 7


mesma (mapas de conceitos ou mentais, trabalhos verificadores da aprendizagem, Vê de Gowin, relatório laboratorial, teste teórico ou teórico-prático, …). O guião de trabalho da unidade de ensino pode permitir ao aluno: - obter uma visão global da unidade de ensinoaprendizagem; - a sistematização regular das aprendizagens e a deteção atempada das dificuldades, permitindo que procure solução para as mesmas durante o processo de aprendizagem; - a consciencialização da forma de construção do seu saber; - ir além das atividades propostas para aprofundar o seu conhecimento (para alunos mais curiosos e empenhados); - organizar atempadamente o seu estudo e o trabalho de preparação para a avaliação; - aprender e aplicar diversificados métodos e instrumentos de organização de informação e de apresentação/divulgação do conhecimento adquirido. Ao professor é exigida uma preparação atempada e completa da totalidade do trabalho a desenvolver na unidade de ensino, o que normalmente leva um tempo significativo, pois exige pesquisa e seleção de informação, a criação de uma articulação das atividades e conteúdos, de modo a estabelecer uma sequência coerente, atrativa e de progressivo aumento de complexidade e exigência na aplicação de conhecimentos e desenvolvimento de competências. Porém, é um instrumento orientador e não rígido, que permite ao professor, ao longo do processo de ensino-aprendizagem, em função das necessidades que deteta nas suas turmas, fazer adaptações e introdução de atividades de remediação ou enriquecimento que julgue necessárias. Nestes anos, desde o início da aplicação dos guiões com diversificadas atividades e instrumentos de avaliação, a reação inicial de pais e alunos é de estranheza perante esta metodologia. Os pais, relativamente à avaliação, porque continuam a considerar que esta apenas se realiza com um ou dois testes. Os alunos porque, regra geral, não estão habituados a um trabalho continuado em que são intervenientes ativos na construção do seu conhecimento nas aulas e fora delas, nem a que o seu trabalho e aprendizagens sejam avaliados com frequência e com diferentes instrumentos de avaliação. No entanto, na generalidade, no

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final do 1.º período, os alunos já reconhecem que esta metodologia de ensino e de avaliação lhes é favorável. Considero que integração e consolidação da aprendizagem é sempre, em última análise, um processo individual que depende da vontade, interesse e esforço do aprendiz. Porém, cabe ao professor encontrar caminhos diversificados que forneçam aos vários perfis de alunos, que coabitam na mesma turma a possibilidade de desenvolver capacidades e descobrir novas apetências, bem como muni-los de ferramentas e competências para enfrentar esta sociedade do conhecimento em permanente e rápida mudança.

(…) a reação inicial de pais e alunos é de estranheza perante esta metodologia. Os alunos porque, regra geral, não estão habituados a um trabalho continuado em que são intervenientes ativos na construção do seu conhecimento nas aulas e fora delas (…)

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Figura 8


JOVENS CIENTISTAS ALTERAM BACTÉRIAS

Cátia Martins, Daniela Costeira, João Eduardo Valente, Rafael Marques Alunos do 12.º B. Curso de Ciências e Tecnologias

Introduzir novas e diferentes características numa bactéria foi um dos principais objetivos pretendidos pelos alunos do 12.º B da Escola Secundária de Estarreja. Para isso, no dia 24 de janeiro de 2012, realizaram uma aula prática laboratorial, no âmbito da disciplina de Biologia, no Visionarium de Santa Maria da Feira (Fig. 1), acompanhados pela professora de Biologia, Rosa Domingues. Logo que chegaram, foram encaminhados para um laboratório, onde lhes foram fornecidas luvas e uma bata descartáveis. Algum material, que iria ser utilizado no realizar da experiência, já se encontrava preparado nas bancadas (Fig. 2): caixas de petri com o meio de cultura (LB- Luria Broth), micropipetas, ansas e tubos com cloreto de cálcio. Todos estes materiais foram previamente esterilizados num autoclave, a uma temperatura de 120o C, tendo o processo demorado vinte minutos. Para além disso, os alunos podiam, ainda, recorrer a uma lamparina, álcool etílico e algodão. Estes materiais serviam, em conjunto, para tentar reduzir os microrganismos na bancada e no ar, de modo a não influenciar a experiência, evitando a contaminação do meio de cultura com outros microrganismos. O objetivo do trabalho realizado era aprofundar o conhecimento relativamente aos seres geneticamente alterados e aos mecanismos de “engenharia genética”. Os alunos tiveram, inicialmente, uma palestra sobre o procedimento que iriam seguir, os seres geneticamente alterados, tanto a nível animal e vegetal, como a nível bacteriano, e as aplicações destas tecnologias. No decorrer desta aula, a orientadora referiu também quais as vantagens destes “novos” seres relativamente àqueles cuja evolução não levou à formação de determinado genoma. Nas plantas, destaca-se a resistência a algumas pragas, a diminuição da necessidade de adubos e a resistência à seca. Nos animais, por sua vez, uma melhor qualidade/ quantidade do leite ou da carne é a principal finalidade. Mas as vantagens da utilização desta técnica na indústria não ficam por aqui. Na indústria farmacêutica, por exemplo, destacase a produção de hormonas, como a insulina, vitaminas e outras substâncias para aplicação na área da saúde.

Existem várias técnicas para manipular o genoma de um ser vivo, desde a do “DNA complementar” às “reações de polimerização em cadeia”, “DNA fingerprint” e “técnica do DNA recombinante”, tendo sido esta última a utilizada pelos alunos. Contudo, não foi realizado o procedimento completo da técnica, tendo apenas sido inserido um plasmídeo, ou seja, uma molécula de DNA circular, que já continha os genes pretendidos, dentro da bactéria Escherichia coli, bactéria esta que é conhecida por viver no intestino do Homem e que se caracteriza por ter um ritmo de crescimento elevado. O plasmídeo servia então como vetor, ou seja, como uma entidade que transporta o material genético. Os alunos começaram por colocar o meio LB, que se encontrava dentro de uma caixa de petri, num gobelé e adicionaram cerca de 40 mL de água desionizada. Esta solução iria ser, posteriormente, levada ao autoclave durante vinte minutos a 120oC. Após isto, a solução iria ser vertida para quatro placas de petri, adicionando amplicilina (antibiótico) e arabinose (açúcar usado pelas bactérias) em duas delas. Este último passo não foi realizado pelos alunos, pois na mesa já se encontravam as caixas de petri com os meios preparados. O procedimento realizado consistia em transferir bactérias de E.coli, com ajuda de uma ansa, para quatro tubos diferentes, todos contendo cloreto de cálcio. Dois deles estavam identificados com DNA+ e os outros com DNA−. Nos primeiros colocou-se o vetor PGLO (Fig. 3) e nos segundos não. O vetor foi retirado com uma ansa de um tubo identificado com a letra p, sendo posteriormente colocado nos tubos de DNA+. Ao retirar as colónias da caixa de petri, os alunos tiveram a necessidade de o fazer perto da lamparina, de modo a que estas não sofressem

O objetivo do trabalho realizado era aprofundar o conhecimento relativamente aos seres geneticamente alterados e aos mecanismos de “engenharia genética”.

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contaminação pelo ar. Caso não o fizessem, além das colónias de E.coli, poderia haver a formação de colónias de outros microrganismos presentes no ar. Relativamente a este vetor, pode-se afirmar que contém aproximadamente trinta genes diferentes, três dos quais merecem um certo destaque: o Amp+, o araC e o GFP. O gene Amp+ codifica as enzimas betalactamases que tornam a bactéria resistente a um grupo de antibióticos, os antibióticos betalactâmicos. O araC é um gene em que a presença do açúcar arabinose torna o seu repressor inativo, ativando-se a síntese de três enzimas que permitem o metabolismo daquele açúcar, concluindo-se, portanto, que se trata de um operão indutivo. No que diz respeito ao gene GFP, este codifica um aminoácido, o GFP, que é responsável pela fluorescência das bactérias na presença de luz ultra-violeta, mas o gene só é ativado na presença de arabinose. Seguidamente, todos os tubos foram colocados em gelo durante cerca de dez minutos, após o que foram transferidos para um autoclave a uma temperatura de 42oC durante 50 segundos, provocando um choque térmico que abre poros na membrana das bactérias, o que permite a entrada do vetor (plasmídeo). Feito isto, colocaramse os tubos novamente em gelo durante 2 minutos para fechar os poros da membrana. Com uma micropipeta adicionou-se 250 µL de meio LB a cada um dos tubos, tendo sido deixados à temperatura ambiente durante 10 minutos. O passo seguinte consistiu no plaqueamento. Com uma micropipeta adicionou-se 50 µL de cada um dos tubos às quatro caixas de petri que contêm o meio LB, distribuindo-se mais ou menos de forma uniforme com o auxílio de uma ansa. Deixou-se secar as placas durante 5 minutos, tendo, de seguida, sido inseridas pela orientadora numa estufa a 37OC durante 24horas. Ao colocar na estufa, teve-se o cuidado de inverter as caixas de petri para que não houvesse contaminação e evitar a queda de água sobre as colónias, devido à condensação. Este passo tem um papel relevante no desenvolvimento das bactérias, pois aqui elas encontram-se num meio com condições favoráveis à sua rápida e eficiente proliferação (nutrientes do meio LB e temperatura adequada). Numa fase final, a orientadora explicou aos alunos quais os resultados esperados. Nos meios com DNA−, não se iria observar fluorescência, já que

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Fig.1 – Visionarium de Santa Maria da Feira

Fig.2 – Instalações laboratoriais


não havia bactérias geneticamente alteradas (não foi introduzido o plasmídeo). No meio com DNA+ (com plasmídeo), arabinose e ampicilina, iria observarse fluorescência, já que só se formavam bactérias geneticamente modificadas. A amplicilina permitiu que só se desenvolvessem as bactérias alteradas, pois estas eram as únicas que apresentavam resistência ao antibiótico (por possuírem o gene Amp+), levando à morte daquelas que não se encontravam alteradas. A presença de arabinose permitiu ativar o gene GFP, que concede fluorescência. Por fim, no meio com, apenas, DNA+ iriam formar-se bactérias geneticamente alteradas e outras normais, mas não seria observada fluorescência pois não existe arabinose no meio. De seguida, a orientadora mostrou os resultados que poderiam ser observados passadas 24 horas. Levou a cada grupo as caixas de petri com DNA+ e com o meio de arabinose e ampicilina (aquela em que existiriam bactérias fluorescentes) e uma lâmpada de luz ultravioleta, para que os alunos conseguissem observar esta fluorescência. Depois de realizada a atividade laboratorial, os alunos regressaram à escola. Esta aula prática, fora das instalações escolares, permitiu aos alunos trabalhar com material mais específico e sofisticado, que não existe na escola, praticar novas técnicas e procedimentos experimentais e, claro, aprofundar os conhecimentos no que diz respeito à técnica do “DNA recombinante”. Quem sabe, poderá também ter criado o desejo, por parte dos alunos, de seguir uma área mais diretamente relacionada com a manipulação do DNA.

Fig. 3 – Vetor pGLO

Webgrafia/ Bibliografia http://en.wikipedia.org/wiki/Green_fluorescent_protein (22/02/2012) http://pt.wikipedia.org/wiki/Ampicilina (22/02/2012) http://pt.wikipedia.org/wiki/Arabinose (22/02/2012) http://faculty.sdmiramar.edu/dtrubovitz/micro/pglo/852473.gif (22/02/2012) http://nei2011.eu/wp-content/gallery/santa-maria-da-feira/ fotos-laboratorio-108.jpg (22/02/2012) http://www.cienciahoje.pt/files/15/1594.jpg (22/02/2012) http://www.babec.org/oldsite/images/pglo.gif (22/02/2012) SILVA, Amparo Dias da; SANTOS, Maria Ermelinda; MESQUITA, Almira Fernandes; BALDAIA, Ludovina; FÉLIX, José Mário. Terra, Universo de Vida. Porto: Porto Editora. pp. 115-123.

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TÉCNICAS DE PROCRIAÇÃO MEDICAMENTE ASSISTIDA – - QUE LIMITES À SUA UTILIZAÇÃO? A primeira unidade de ensino da disciplina de Biologia do 12.º ano relaciona-se com a Reprodução Humana, que é abordada numa perspetiva CTS – Ciência, Tecnologia e Sociedade: o conhecimento científico atual, avanços nos processos e tecnologias associadas aos processos reprodutivos humanos e as consequências que trazem para a sociedade. Acerca da utilização de técnicas de reprodução medicamente assistida, foi solicitado aos alunos que se preparassem para um debate a realizar na turma, durante o qual teriam de mobilizar os conhecimentos adquiridos e a informação pesquisada, nomeadamente sobre a legislação em vigor, para opinar fundamentadamente sobre cada um dos seguintes aspetos: Acesso de mães sós à reprodução medicamente assistida (PMA); Fertilização com recurso a doação de gâmetas; O recurso a mães de aluguer; O uso de embriões ou células para investigação. As tomadas de posição dos alunos do 12.º B foram diversificadas e o debate foi muito rico. Registamos, aqui, os pontos de vista de alguns alunos e a respetiva fundamentação, os quais, evidentemente, não esgotam o tema, deixando antever a controvérsia e as possibilidades de um debate sempre proveitoso. Rosa Domingues. Docente de Biologia

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1. Acesso de mães sós à reprodução medicamente assistida (PMA) Segundo o artigo 6.º da Lei n.º 32/2006 de 26 de Julho, relativo à procriação medicamente assistida, o acesso a técnicas deste tipo é nulo para mães sós. Ao debater esta questão na turma, defenderei uma perspetiva contra este artigo da lei, ou seja, a favor do acesso de mães sós à PMA. Mulheres, ainda que sem marido ou cônjuge, mas com condições de saúde mental e física e condições financeiras, de modo a poderem criar uma criança e educá-la convenientemente, deveriam ser autorizadas a utilizar métodos de procriação medicamente assistida para a poderem gerar. Sendo que também está assente nesta mesma lei, no artigo 21.º, a exclusão da paternidade do dador de sémen, não lhe cabendo quaisquer poderes ou deveres em relação à criança gerada, a criança deverá ficar à responsabilidade da mãe que utilizou os processos de PMA (nomeadamente a inseminação artificial) e nunca será apontado o dador como pai da criança, já que há uma condição de confidencialidade que, segundo o n.º 2 do artigo 15.º, assegura que poderão ser obtidas todas as informações de natureza genética que digam respeito à criança, excluindo a identificação do dador. Para além disto, a vida em conjunto entre dois indivíduos não prova a existência de condições para criar e educar uma criança, por isso, hipoteticamente, é possível que uma mãe solteira com apoio familiar tenha melhores condições para o suporte ao desenvolvimento da mesma do que um casal instável. De que é que uma criança verdadeiramente necessita para crescer num ambiente familiar saudável? De um pai e de uma mãe, tendo ou não uma relação estável? Ou, simplesmente, do amor e afeto daqueles que a acolhem e a incorporam no seio da sua família? Sem dúvida, podemos concluir que não é necessário um pai, desde que a mãe se sinta capaz (e o seja) de tratar da criança.

(…) Assim, quero estabelecer que não concordo com o acesso de mães sós aos métodos de PMA, estando em concordância com a legislação portuguesa. Existem muitas razões pelas quais a minha opinião pode ser refutada. É verdade que numa legislação democrática que tenha tido a igualdade de direitos como um dos seus princípios de base, como é a nossa, uma mãe solteira não deveria ser discriminada no acesso a métodos de PMA, comparando com um casal. Por exemplo, no que toca à adoção de crianças, uma mulher solteira tem tantos direitos quanto um casal. Então, porque não pode uma mulher solteira recorrer à PMA? Existem, também, mulheres que dizem ter uma vocação para ser mães, mas, por outro lado, não se sentem vocacionadas nem para casar, nem para assumir relações por grandes períodos de tempo. Se assim é, porque não pode uma mulher satisfazer a sua vocação de mãe, sem ter que ter um parceiro? Ora, em resposta a esta argumentação, vou começar por me focar no ponto da adoção de crianças. Quando crianças vivem em orfanatos ou lares de adoção, é porque ou perderam os pais e não tinham mais família com condições para os educar, ou estes rejeitaram-nas à nascença, ficando sob a tutela do Estado. Assim, ao adotar uma criança, uma mulher solteira vai tomar a responsabilidade de a educar, assumindo duas posições: de pai e de mãe; posições essas que foram ambas renegadas, em vida, à criança em causa. Por outro lado, uma mulher solteira que recorra à PMA irá assumir as mesmas duas posições em relação à criança que irá gerar, sendo que a primeira (que deveria e poderia ser assumida por outra pessoa) lhe está a ser renegada mesmo antes de esta existir. São inúmeros os casos de crianças que crescem com problemas morais devido ao facto de não terem uma figura paternal (ou maternal) em casa, devido a não terem, no fundo, um pai, ou porque este morreu, ou porque fugiu de casa, ou até porque se separou da mãe e nunca mais quis ter um papel ativo na educação dessas crianças. Imaginemos, agora, uma criança que não tem uma figura paternal em sua casa porque a mãe

(…) De que é que uma

criança verdadeiramente necessita para crescer num ambiente familiar saudável? De um pai e de uma mãe, tendo ou não uma relação estável?

Cátia Rodrigues

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simplesmente não quis, uma criança que sabe que não foi fruto de uma relação física e sentimental entre os seus dois progenitores porque a mãe não quis, uma criança que só tem meia identidade porque a sua mãe assim o quis. Será assim tão benéfico satisfazer uma vocação pessoal se, no final, vamos deteriorar a identidade de um ser humano, cujo maior sonho poderá ser ‘ter um pai’? O próprio conceito de reprodução envolve os conceitos de ter um pai e uma mãe, e uma à qual seja renegado um destes vai-se sentir incompleta. Resumindo e concluindo, eu penso que para este primeiro tema não podemos pensar unicamente nos direitos da mulher que deseja ter um filho sozinha, mas também nos da criança que poderá vir a nascer. João Abreu

2. Fertilização com recurso a doação de gâmetas Em relação à fertilização com recurso à doação de gâmetas, eu estou de acordo com a legislação portuguesa, que permite a doação de oócitos II e espermatozoides para futura fecundação. O único caso que a legislação portuguesa restringe é o de fecundação de oócitos II com espermatozoides de pessoas falecidas, exceção de que eu discordo. Penso que a doação de gâmetas pode ajudar muitas pessoas cujos gâmetas não são viáveis (anomalias morfológicas e fisiológicas, derivadas muitas vezes de anomalias congénitas nas gónadas), logo, a utilização de gâmetas de outros é a única solução. Mais uma vez, penso que uma criança não vai ser mais amada ou menos amada por ter tido ou não origem na fecundação de um espermatozoide do pai com um oócito II da mãe, e por isso possuir características provenientes do código genético de

cada um. Em relação à proibição da utilização de espermatozoides de pessoas falecidas, discordo porque o facto de o doador se encontrar vivo ou falecido não vai mudar o propósito dos gâmetas doados, que é ajudar pessoas que necessitem desses mesmos gâmetas devido a questões de infertilidade. Logo, não vejo nenhum impedimento para a sua utilização, desde que eles se encontrem crioconservados e em bom estado de utilização. A pessoa que doa os gâmetas nem sequer vai ter nenhuma relação com a família e com a criança que surgir da fecundação desses gâmetas, já que os doadores não são considerados progenitores da criança, nem é permitida a divulgação da identificação destes mesmos. João Rodrigues

Em regra, quando um casal é infértil, a sua causa é proveniente do homem ou da mulher e mais raramente dos dois. Assim sendo, podemos dizer que quando apenas uma das duas pessoas envolvidas é infértil, pode haver ainda um tipo de gâmetas viáveis. Quando então se recorre a PMA, dever-se-ia em primeiro lugar garantir ou verificar se é possível utilizar gâmetas das partes diretamente envolvidas. Se apenas uma pessoa do casal produzisse gâmetas viáveis, poderse-ia recorrer a gâmetas doados, assim garantindo que o embrião daí resultante pudesse prosseguir o seu desenvolvimento e crescimento no corpo da mulher, possuindo pelo menos uma parte da informação genética dos diretamente envolvidos. Se nenhum dos dois produzisse gâmetas viáveis, não deveria ser permitida a utilização de dois gâmetas provenientes de dois indivíduos diferentes ou embriões, tendo como resolução para esta situação a adoção, um processo menos dispendioso em termos monetários e temporários. Vejamos que a essência da PMA é poder possibilitar a alguns casais a criação de um filho biológico, ou seja, possuidor de informação genética proveniente de pelo menos um dos envolvidos no processo. Se através destes processos se criarem indivíduos sem laços genéticos perde-se esta essência ou objetivo a que a PMA se propõe, tomando a adoção mais sentido, para mim.

O recurso a uma barriga de aluguer é, na minha opinião, algo que só deve ser considerado em casos de infertilidade, em que o casal já tentou todos os processos existentes, sem qualquer êxito. Mas, mesmo nesse caso, é necessário que o casal faça uma análise.

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Ana Margarida Silva


3. O recurso a mães de aluguer

Em relação à utilização de embriões em determinadas investigações, concordo se existirem garantias de que dessa investigação saem resultados que possam beneficiar a Sociedade, de modo a que seja possível salvar mais vidas no futuro (...).

O recurso a uma barriga de aluguer é, na minha opinião, algo que só deve ser considerado em casos de infertilidade, em que o casal já tentou todos os processos existentes, sem qualquer êxito. Mas, mesmo nesse caso, é necessário que o casal faça uma análise. Assim, o casal deve refletir sobre se ter uma criança os deixará felizes por poderem criar e educar um ser, ou se só serão felizes tendo eles uma criança com o seu património genético. Caso se verifique o primeiro caso, o casal deve, na minha opinião, recorrer aos serviços de adoção, pois existem milhares de crianças que não têm pais à espera de ser acolhidas por uma família que as queira. No segundo caso, considero que o casal poderá recorrer a uma barriga de aluguer, mas, tal como referi, isto só deve acontecer em casos extremos, em que mais nenhuma hipótese seja viável. Porquê? Porque quando uma mulher tem um ser a formar-se dentro de si, cria laços com esse ser e, ao fim de 9 meses, torna-se por vezes muito difícil romper esses laços e simplesmente dar a criança que se formou dentro de si, até porque, pela lei, quem gera o bebé dentro de si é que é considerada a mãe. Por último, nos casos em que a mulher tem condições para gerar uma criança e não o quer fazer devido às alterações físicas que ocorrem durante a gravidez, considero que a barriga de aluguer não deve ser uma opção. Esta possibilidade deve, sim, ser conferida às pessoas que biologicamente não podem gerar uma criança, não àquelas que têm problemas ao nível da estética, e que apresentam, por isso, argumentos fúteis. Rafael Marques

Recorrendo ao artigo 8.º da Lei n.º 32/2006 de 26 de Julho, é possível observar que é proibida e punível por lei (no artigo n.º 39) a maternidade de substituição, que é precisamente o recurso a barrigas de aluguer, ou seja, qualquer situação em que uma mulher se disponha a suportar uma gravidez por conta de outrem e a entregar a criança após o parto, renunciando aos poderes e deveres próprios da maternidade. No debate, defenderei uma posição a favor do recurso a barrigas de aluguer. As mulheres sujeitas a este tipo de “trabalho” fazem-no com plena consciência

dos seus atos, bem como dos efeitos secundários que possam vir a existir (como danos emocionais ou mesmo físicos). O principal motivo que as leva a escolher este caminho é a necessidade financeira e, na grande maioria das vezes, compensa. Estas mães de aluguer chegam a receber milhares de euros por carregar a criança de outros. Mesmo sendo ilegal em Portugal (e em outros países), há muitos casais que recorrem às maternidades de substituição, principalmente em clínicas fora do país, em locais onde sejam legais. O que os leva a fazêlo são, maioritariamente, as malformações no útero das mulheres, devido a um acidente, a uma doença oncológica ou quando o útero não tenha dimensões ou outras características que inviabilizam uma gravidez. Existem também muitos casais homossexuais, tanto masculinos como femininos, que recorrem a este tipo de soluções para conseguirem ter filhos, em vez de adotarem uma criança já com alguns meses ou mesmo anos de vida, para que possam acompanhar o seu desenvolvimento por completo. Estes negócios são, geralmente, negócios de sucesso em que as duas partes saem a ganhar, uma financeiramente e outra emocionalmente. Do ponto de vista biológico, a criança é filha do casal, já que são extraídos os óvulos e os espermatozoides do casal. Estes são depois submetidos à fertilização in vitro e, no momento da transferência dos embriões, estes são colocados no útero de uma segunda mulher. Cátia Rodrigues 4. O uso de embriões ou células para investigação O uso de células (zigotos) ou embriões para investigação não é permitido, exceto se dessa investigação vier, com garantias razoáveis, algum benefício para a Sociedade. Eu concordo com a

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legislação portuguesa, porque penso que tanto o zigoto como o embrião são fases prematuras de um ser humano que pode surgir do desenvolvimento dessas células ou conjuntos de células, logo, se se usar essas células e embriões para experiências, é como se se estivesse a utilizar seres humanos como cobaias, matando-os após a realização da experiência, já que muitas das células e embriões não continuariam viáveis para serem implantados no útero e darem origem a uma criança. Em relação à utilização de embriões em determinadas investigações, concordo se existirem garantias de que dessa investigação saem resultados que possam beneficiar a Sociedade, de modo a que seja possível salvar mais vidas no futuro, vidas essas que não seria possível salvar se não se prosseguisse com a investigação. Com essas investigações, podese evoluir em áreas não só relacionadas com a Fertilidade e Reprodução, como também com a Genética, Citologia, entre outras. Nessas investigações autorizadas pela lei, são essencialmente utilizados embriões pouco viáveis para fins de procriação, pelo que existe assim uma seleção de embriões que acaba por ser prática, mas que pode pôr em causa questões como a eugenia. João Rodrigues

Pela lei portuguesa, “é proibida a criação de embriões através de PMA com o objectivo deliberado da sua utilização na investigação científica” (n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 32/ 2006). No entanto, é permitida a investigação científica em embriões em certos casos que são referidos nos n.º 2 e 3 do mesmo artigo citado. Concordo que não se devem criar embriões, propositadamente, para a investigação científica. A ciência e a tecnologia vão evoluindo, mas cabe à sociedade impor limites éticos e morais. Acho que ao criar embriões com o único propósito de servirem para investigação estamos a “jogar” demasiado com a vida humana. Utilizar embriões que não foram criados para esses fins terá o mesmo resultado, claro, mas, provavelmente, seriam embriões que iriam ser destruídos de qualquer modo, então porque não utilizá-los para benefício da ciência? Embriões que pertencem a casais que não desejam ter mais filhos nem querem doá-los a outros casais podem, perfeitamente, ser utilizados com o objetivo de aperfeiçoar as técnicas de PMA ou de utilização das células estaminais, por exemplo. Estes embriões não devem ser disponibilizados para uma qualquer investigação. Devem, sim, ser atribuídos a investigações com uma perspetiva razoável de resultados positivos. E só devem estar disponíveis depois do consentimento dos iniciais beneficiários. Pela lei portuguesa, é isso que deve acontecer e eu concordo. Alejandra Silva

Mesmo sendo ilegal em Portugal (e em outros países), há muitos casais que recorrem às maternidades de substituição, principalmente em clínicas fora do país, em locais onde sejam legais.

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COR E INQUIETAÇÃO Foram vinte os barcos que chegaram a esta praia. Não se tratava de uma corrida, apenas de uma viagem com marinheiros em modo turístico. Os outros, carregados de trabalhos dos meus alunos dos 7.º e 8.º anos, podem ser visitados em www. professor.paulocorceiro.com. Uns são maiores, outros mais pequenos, uns navegam em velocidade de cruzeiro, outros lembram pequenas jangadas saídas das mãos de uma criança. Mas todos demonstram, pelo menos, uma vontade de encher de cor e inquietação os olhos de quem está na praia. Afinal, nasceram dos sonhos de quem está naturalmente inquieto na sua juventude e com vontade de inquietar. Paulo Corceiro Docente de Educação Visual

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O CURRÍCULO DO ENSINO SECUNDÁRIO GERAL EM TIMOR-LESTE Marciana Ximenes

Docente de Português de Timor-Leste

Em Timor-Leste, após o referendo em 1999, e depois de o país ter retomado a sua independência, a primeira preocupação da educação foi a de reabrir as escolas desde o ensino básico até ao ensino secundário. Havia grandes obstáculos, porque os professores eram formados em língua malaia, no tempo da ocupação indonésia. Este foi o grande desafio que se colocou ao governo de Timor-Leste. Mesmo assim, as escolas foram funcionando, e os professores do ensino básico (o 1.º e o 2.º ciclo) começaram logo a lecionar em português em todas as disciplinas, com o apoio dos professores portugueses que chegaram a TimorLeste no ano 2000, que também ajudaram a fazer o programa. Mas no ensino básico, 3.º ciclo, e no ensino secundário foi-se lecionando com base no currículo deixado pelos indonésios. O currículo do ensino básico (1.º e 2.º ciclos) foi feito nesse ano. Para responder a esse desafio, no ano 2000, o Ministério da Educação de Timor-Leste decidiu cooperar com os serviços de educação da Embaixada de Portugal em Díli, com o intuito de dar formação aos professores, partindo do nível I – bacharelato, com o Projeto de Reintrodução da Língua Portuguesa (PRLP) em Timor-Leste, ao longo de 7 anos, desde 2000 a 2007. Mas este projeto, em 2007, modificou-se, passando a Projeto de Consolidação da Língua

Portuguesa (PCLP), dinamizando várias oficinas de língua. Isto também não foi suficiente para a formação dos professores. Então, o Ministério da Educação criou um outro modelo de formação para os professores através deste projeto: consiste na frequência de cursos de formação intensiva em algumas disciplinas importantes, exclusivamente em língua portuguesa, por professores portugueses e alguns timorenses, após os exames trimestrais, durante as férias dos alunos. Todavia, o Ministério da Educação não tinha ainda preparado um

plano curricular. Neste contexto, o Ministério da Educação de TimorLeste pediu apoio ao governo português, e em particular aos docentes da Universidade de Aveiro, para colaborarem na elaboração do plano curricular e, ao mesmo tempo, darem formação aos professores timorenses do ensino secundário. Certamente que nem todos os professores deste nível de ensino poderiam ter a formação ao mesmo tempo. Deste modo, o Ministério da Educação decidiu enviar um grupo de 28 professores deste grau de ensino (dois de cada disciplina), a fim de frequentarem uma formação intensiva de seis semanas em Portugal, na Universidade de Aveiro, para se capacitarem sobre a Reestruturação do Ensino Secundário Geral, comparando o sistema e o processo de ensino-aprendizagem em Portugal e em TimorLeste, refletindo sobre ambas as realidades e respetivos contextos, com vista à implementação do novo currículo do ensino secundário geral em 2012. Isto não significa que consigamos transformar totalmente o sistema educativo em Timor, mas com o que vimos e aprendemos, e com o espírito de dedicação a esta causa nacional, vamo-nos esforçando, melhorando aos poucos o sistema educativo no nosso país. Embora ainda com uma grande barreira de língua, estamos a implementar já este currículo segundo a política do nosso

Sabendo que os professores são os principais intervenientes a assegurar o sistema educativo num país, quer se queira, quer não, o futuro da nação depende dos educadores que formam os jovens para assegurar o futuro.

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novo currículo para o ensino Secundário, e as escolas iam funcionando com o currículo já existente, ligeiramente adaptado, deixado pelo governo indonésio. Então, já com uma década de independência, o Ministério da Educação quis criar um novo currículo para este nível de ensino, fazendo a reestruturação de todo o ensino secundário geral. Neste caso, obviamente que foram necessários peritos em educação dos países irmãos, como os países da CPLP, para apoiar o desenvolvimento deste


governo. Mesmo com a nossa capacidade limitada e com os poucos recursos humanos qualificados, estamos a fazer a sensibilização aos colegas nos distritos, para que todos estejam integrados neste novo currículo e assim possam implementar o programa traçado pelo Ministério da Educação, a nível nacional. Já temos um currículo aprovado, mas é pena que ainda não tenhamos os recursos suficientes para o implementar. Para que este novo currículo seja bem sucedido, é necessário que o ministério competente se preocupe integralmente com a criação de manuais, do programa e do guia para esse nível de ensino. Sendo o currículo uma realidade, ainda existem algumas falhas na sua implementação no terreno. Mesmo com a falta dos manuais e do programa, ele já está implementado em algumas escolas, nomeadamente em Díli e em alguns distritos. Sabendo que os professores são os principais intervenientes a assegurar o sistema educativo num país, quer se queira, quer não, o futuro da nação depende dos educadores que formam os jovens para assegurar o futuro. Quando o nosso país tiver os recursos humanos para garantir uma boa implementação do currículo, será um privilégio para a educação e para a melhoria do sistema educativo em Timor-Leste.

No final de uma aula de Português, com o 12.º M, na ESE. Da esq. para a dir.: Professora Filomena Sousa, alunos Pedro Fidalgo, André Pereira, César Madaleno, Professores Leoneto Pinto e Marciana Ximenes. À frente, ao centro: alunos José António Matos e Nuno Almeida

O Ministério da Educação decidiu enviar um grupo de 28 professores deste grau de ensino (dois de cada disciplina), a fim de frequentarem uma formação intensiva de seis semanas em Portugal, na Universidade de Aveiro (…)

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fonte luminosa, independente da sua fonte de energia, que serve para atrair o peixe durante a noite a fim de facilitar a sua captura (a luz forte perturba o peixe na água, de tal maneira que ele se deixa apanhar à mão ou fisgar)

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ARDUINO EXPLICADO AOS MAIS JOVENS Joaquim Matos. Docente de Eletricidade Alunos do 12.º M. Curso Profissional de Eletrotecnia

O Arduino é uma plataforma eletrónica programável por computador, que pode ter as mais diversas aplicações no nosso quotidiano, de modo a simplificar e a melhorar muitas situações distintas em que as novas tecnologias representam um avanço. Começou a ser utilizada há cerca de sete anos. A mais recente plataforma, ainda em fase de desenvolvimento e melhoramento, é a Arduino UNO (figura 1). Para além desta, outros modelos têm vindo a ser utilizados, como podemos ver na ilustração (figura 2). São características do microcontrolador, em termos de memória, as que se especificam na tabela:

Na memória Flash, são armazenados o sketch e o bootloader. Na memória Sram, são criadas e modificadas as variáveis ao longo da execução. Por último, a Eeprom pode ser usada para guardar informação não volátil. No computador, há que instalar um software de desenvolvimento específico, de modo a programar o Arduino, a ler ou a enviar dados através da porta USB. O esquema da ilustração (figura 3) mostra melhor o ciclo de desenvolvimento e as etapas a percorrer para efetuar essa programação. À direita, no esquema, identificamse os dispositivos que podem ser comandados por esta plataforma (motores, leds, displays,dispositivos de alarme, etc.); para além destes, pode controlar equipamentos utilizando sensores (de temperatura, de toque humano, pressão, luz, gás, etc.), ou semáforos. Nos dias de hoje, o Arduino poderá estar presente numa diversidade de aplicações que vão desde pequenos equipamentos eletrónicos e eletrodomésticos, à domótica, pequenos robots e ao desenvolvimento de protótipos para novas aplicações.

Figura 1 Figura 2 Figura 3

NOTA: as tabelas e imagens reproduzidas neste artigo integravam o suporte informático que o formador, professor Sérgio Santos, utilizou durante a sessão e que disponibilizou aos professores da ESE.

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UM REINO VIVO NA POESIA Rosário Rito

Docente de Português/Francês

A extensa e multifacetada produção poética do padre Reinaldo Matos justificaria variados estudos, que destacassem a expressividade lírica das suas visões do mundo e do humano. Por conseguinte, é sempre difícil a abordagem de uma temática, porque limitativa e pouco abrangente. Mesmo conhecendo esses riscos, pretendemos fazer uma breve aproximação à evidência que assume uma das imagéticas mais expressivas: a imagética animal. São inúmeras as figuras animais que povoam o universo poético e narrativo de José Reinaldo Matos. De entre elas, comecemos pela figura de uma ave marinha versátil e com profunda capacidade de adaptação, a gaivota, que aqui “volita” em torno de uma praia deserta, “improvisando mensagens de piratas e sereias/ tormentos e naufrágios”´. A gaivota surge associada ao perigo de uma vida marcada pela luta tenaz pela sobrevivência. Assim, a lapa que corajosamente se agarra ao penedo torna-se alimento fácil da “gaivota atrevida”, que, mergulhando, a comeu “viva e sã”. Ela é “astuta e atenta” e a lapa representa a merecida recompensa pela sua paciência, coragem e perseverança (em

Contos e Parábolas em Verso). Mas, se à gaivota se associa o perigo iminente, metaforicamente enuncia o desejo de evasão, por exemplo, no poema “Pedi Asas” (em Cicios de Asa), escrito a 6 de setembro: “Pedi asas às gaivotas/ Que me bateram/ As penas”. As asas da liberdade nem sempre assistem ao poeta, que constata que “Fogem de mim, as gaivotas”. Este pedido é reiterado no poema “Asas de gaivota”; escrito dez dias depois, aí confessa a sua admiração latente e desabafa o frustrado desejo de evasão: Ai, quem me dera asas De gaivota, Para voar por sobre as ondas bravas! Ó ondas do meu mar encapelado, Que bateis contra a proa do meu bote!

Não obstante ser o elemento marítimo um tradutor das incertezas de um quotidiano “encapelado”, em permanente conflito com as aves que dele retiram sustento, o mar é efetivamente dominado pela aparente fragilidade das asas da gaivota, que só se rende ao poeta pela dependência das “migalhas” do outro: “Já me conhecem/ os passos.// Gostam/ das minhas migalhas.” Acrescentaríamos a esta abordagem a referência natalícia constante no poema “Natal das gaivotas” (em Cem Sonetinhas Partidas). Um certo misticismo religioso perpassa esta sonetinha. Sendo a gaivota uma sobrevivente solitária, também ela sabe valorizar o convívio familiar, pelo qual anseia, como necessidade vital de enraizamento, após

Poderemos, então, concluir que a natureza é uma fonte inspiradora para o autor, naturezadesejo, força, perfume.

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horas e horas de voo em solidão, que a transmutam num ser mais espiritual, porque em contacto permanente com os limites do céu: Era o Natal das gaivotas: Numa ilhota Junto à praia. (…) Havia anjos no mar Ensaiando sinfonias...

As asas são o mote da passagem da figura da gaivota para a da andorinha, confessando o poeta: Nas asas duma gaivota Gaivota Branca tão linda, Quero pintar a minh’alma, Minh’alma Que é de andorinha. Quero que ela cante salmos Como canções de embalar, À maresia das gaivotas, Às ondas, ao vento, ao mar.

É curiosa a assunção de que as asas alongadas são da gaivota, mas a sua alma se identifica com o pequeno pássaro migratório que nos anuncia a Primavera. Impõe-se a procura de uma resposta interpretativa, a partir de uma análise mais metódica da representatividade desta segunda ave. De facto, a andorinha simboliza a saudade omnipresente da pátria longínqua e a sua teimosia em voltar “aos beirais onde nasceram”, nunca resistindo às saudades da terra que a viu nascer: “Com alegria/ sincera/ visitam/ a Primavera”. Em “Chilreios de andorinha” (em Contos e Parábolas em Verso), estabelece uma associação implícita com a temática do amor. O ambiente é primaveril, ameno,


calmo: Reconfortei-me Sempre que vi Colher mancheias De botões de rosa, No meio De chilreios De andorinha.

O abrupto afastamento do “seu Amor” conduz também à partida das andorinhas, pois do amor do passado só restam cinzas e saudades, “e já/ não há/ chilreios/ de andorinha”. Talvez agora seja possível enunciar uma resposta para a questão anterior: o que justifica a alma de andorinha? Deverse-á, porventura, ao facto de se encontrar inebriada com a leveza – de espírito -, reveladora de grandes paixões. Com o desfecho anunciado, partem as andorinhas, talvez reveladoras da sua intemporal saudade do espaço de proteção e de aconchego paternos, conferido pela casa, entretanto abandonada por ter ido viver para um país longínquo. Analisemos, agora, duas sonetinhas de Cicios de Asa, “Ninho” e “Alpendre” (com data de 1989). Na primeira, recorda com saudade as andorinhas “no beiral da igreja velha”. Sinestesicamente, estabelece a associação das vozes que cantam “dentro da igreja” com o som do chilreio, acabando por fundir todos em “cânticos, na igreja velha, tanto dentro como fora, -// Dando a impressão que eram vozes/ de crianças e freirinhas”. Este cântico em uníssono, esta união desejada entre aves e homens é reiterada em “Alpendre”, em que o “beiral de andorinhas” assume o estatuto de espaço de refúgio, pleno de encanto. Conclui mesmo que as andorinhas, pelo seu cantar, e as glicínias, pelo seu perfume, são “Razão da minha vida -/ E o meu

Nume!” Poderemos, então, concluir que a natureza é uma fonte inspiradora para o autor, natureza-desejo, força, perfume. A terceira figura animal que destacamos, nesta extensa galeria, é a pomba. Ora sozinha, ora vista como “casal”, só uma leitura superficial nos permitirá associá-la à “simplicidade” mencionada em “Casal de Pombas”: Mesmo exemplar casalinho! – Na simplicidade, em tudo. Nunca se viu que brigassem O pombo mais a pombinha.

O entendimento dos pombos, num mundo marcado pela violência e pela guerra, evidenciase de forma notória. A brancura das pombas é paz saída das trevas do mundo: Das trevas Saíram Pombas Que invadiram Nevoeiros Em revoada de penas. E o Sol matou as Estrelas. E fugiu a lua cheia. De pretas, que eram, as pombas Ficaram da cor da neve.

Eis a brancura anunciada, mais que pressentida, eis a pureza inicial saídas das trevas! De facto, revelase alargadíssima e curiosa a referência a animais na obra de Reinaldo Matos. Deter-nos-emos apenas em mais algumas figuras, onde o feminino é dominante: a coelhinha, a burrinha e a vaca. Por último,

o cavalo, o cão e lobo. A “coelhinha branca” surge em Contos e Parábolas em Verso, num diálogo vivo com a cabra montês. Inicialmente desanimada e amedrontada com a figura ameaçadora da cabra, é ajudada pela formiga rabiga, que entra pela fechadura e ameaça furar a barriga à cabra. Retorna a paz à floresta pela coragem da intrépida figura da pequena formiga, que contrasta com o medo dos animais de maior porte. Por conseguinte, facilmente se identifica aqui a recuperação do imaginário tradicional, nas muitas reminiscências das fábulas, intemporais histórias de proveito e de exemplo, contadas aos mais pequeninos. Outro animal doméstico, a burrinha, vive no distante Egito. José e Maria decidem comprála para esta os acompanhar, enfrentando o trajeto de Belém a Nazaré. É a “Burrinha do Presépio”. Metáfora da abnegação dedicada, da simplicidade de quem serve, à espera da merecida recompensa e compaixão, morreu quando tinha Jesus “oito aninhos ou dez”, rodeada da Sagrada Família. Na mesma obra, surgem ainda a porca e a vaca, curiosamente integradas num universo popular marcado pelo “mau-olhado” e pelo

Desta lição morigeradora dos animais fica a lição para os homens: é necessário saber ouvir a voz dos outros, de modo a respeitar e potenciar a luz que existe dentro de cada um.

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“quebranto”. Apesar de homem culto, o poeta assume as suas raízes de ligação à terra e conta-nos duas histórias protagonizadas pelo mau agouro, em que a inveja de vizinhos provoca a doença dos pobres animais, salvos somente pelas orações e benzeduras de mulheres do povo, que “tiraram o mal” que outros haviam feito aos bichos. Questiona-se, então: Será isto bruxedo? Ou apenas intrujice De ladina feiticeira? Ou é (sei lá) o demónio, Como alguém me quer dizer? Eu o arrenego, se é ele!...

O “cobranto” da vaca e o “mau olhado” da porca são provocados pelo mal de inveja e estas narrativas fazem nascer a dúvida num homem que não consegue explicações científicas para pequenas histórias que marcaram o seu universo infantil e juvenil. Contadas muitas vezes à lareira, povoam a alma de Reinaldo Matos, misturando superstição com fé religiosa e, sobretudo, fazendo nascer a dúvida em relação à imperfeita condição humana. Por fim, imbuídos de todo o sentido místico que soube dar aos seus textos, ficamos agora com o “cavalo índio” (em Cinzas duma Sombra). Este cavalo é um hino à liberdade desejada e visível no apelo “não te deixes/ prender/ por arame/ farpado”. Ao dirigir-se diretamente ao cavalo, deixa latente o seu apelo reiterado na figura do lobo (na obra Orvalhadas). Conta-se, neste poema, o diálogo travado entre o lobo esfaimado e friorento com o cão luzidio, que encontra na beira do riacho. O cão diz-lhe que não há necessidade de o lobo passar tantos sacrifícios e promete arranjar-lhe um dono, “uma

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casota, e côdeas, caldo e ossos”. Com altivez, responde-lhe o lobo “Prefiro a liberdade”. Portanto, a fome, o frio, o abandono não esmorecem este animal, que assume preferir esta realidade à prisão e à domesticidade, verdadeira condenação da sua natureza indómita. Terminamos esta abordagem com uma referência ao sentido da vida associado à noite, entendida como momento inspirador e revelador das forças da natureza. No poema “O rouxinol e o pirilampo” (ainda em Cinzas duma Sombra), surge-nos um rouxinol esfomeado, que vê no pirilampo uma possibilidade de se alimentar. Assustado, o pirilampo pede: “Respeita a voz em ti e a luz em mim…” O rouxinol, conhecedor do segredo do equilíbrio da Terra, baseado no respeito mútuo, evita a morte do pirilampo, que então lhe diz que “Nós damos ambos poesia à noite”. Desta lição morigeradora dos animais fica a lição para os homens: é necessário saber ouvir a voz dos outros, de modo a respeitar e potenciar a luz que existe dentro de cada um.


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O PECADO DE JOÃO AGONIA DE BERNARDO SANTARENO, UMA ATUALIZAÇ Etelvina Soares

Docente de Português

Bernardo Santareno, pseudónimo de António Martinho do Rosário, nasceu em Santarém, a 19 de novembro de 1924, e morreu em Lisboa, a 29 de agosto de 1980. Licenciou-se em Medicina, especializando-se em Psiquiatria, não tendo contudo exercido a atividade. Na sua produção literária, além de experiências poéticas algo esporádicas, predomina de modo relevante a dramaturgia, começando, desde 1957, a produzir sistematicamente peças de teatro. São deste ano as peças A Promessa, O Lugre e A Excomungada. Seguemse O Lugre e O Crime de Aldeia Velha (1959), António Marinheiro (1960), O Duelo, O Pecado de João Agonia, Irmã Natividade e Os Anjos e o Sangue (1961), Anunciação (1962), O Judeu (1966), O Inferno (1967), A Traição do Padre Martinho (1969), Português, Escritor, 45 Anos de Idade (1974), Os Marginais e a Revolução; deixou inédita uma peça, O Punho. Porém, apesar de ter uma vasta obra dramatúrgica, Bernardo Santareno é pouco conhecido atualmente, embora uma das suas obras, O Judeu, tenha feito parte do corpus textual a ser lecionado aos alunos do 12.º ano dos cursos de Humanidades até à década de 90, como aconteceu comigo. Porquê então o interesse em relembrar, neste texto, uma das obras de Santareno? É que é minha

convicção de que, infelizmente, muito do que levou à escrita das peças de Santareno, nos anos da repressão, continua a existir nestes primeiros anos que abrem o novo milénio, mercê de um mundo que insiste em manterse agarrado a preconceitos e tabus ancestrais e até irracionais, que deixam transparecer que os nossos alunos pensam, em muitos casos, como pensavam os seus pais e avós. A evolução é, muitas vezes, apenas aparente. Ora, o que acabei de afirmar prende-se com uma experiência de ensino de mais de vinte anos. Com efeito, lembro-me de, desde o primeiro ano, o de 1990-1991, em que estagiei, discutir com os alunos assuntos polémicos mas que lhes despertavam a curiosidade, entre eles os que se prendem com a sexualidade, nomeadamente o da

homossexualidade. Contudo, o que surpreende ou não, se formos a pensar na natureza humana, tão instintivamente conservadora, é que a opinião acerca desta temática não tem variado muito ao longo dos tempos. Assim, e porque este ano voltou a aflorar-se a temática nas aulas de Português, lembrei-me de partilhar a experiência de leitura que fiz há mais de quinze anos, aquando da elaboração da tese de mestrado, de uma das obras onde Santareno aborda, de forma dolorosamente bela, esta temática. A tese pretendeu tratar o trágico em Bernardo Santareno, porém, neste curto texto referir-me-ei apenas a uma das suas peças, O Pecado de João Agonia, onde a temática da homossexualidade é tratada à luz dos anos quarenta do século passado, anos marcados pela repressão ideológica salazarista e pela educação extremamente conservadora e católica, circunstâncias contextuais que evoluíram em alguns aspetos ao longo dos tempos. O Pecado de João Agonia faz parte da primeira fase da produção dramatúrgica de Bernardo Santareno, de cariz mais clássico, de acordo com a conceção aristotélica da arte. A segunda fase, anunciada com O Judeu em 1966, é caracterizada pelas obras dramáticas de índole narrativa de influência brecthiana, afastandose das da primeira fase, marcadamente dramáticas.

(…) muito do que levou à escrita das peças de Santareno, nos anos da repressão, continua a existir nestes primeiros anos que abrem o novo milénio, mercê de um mundo que insiste em manter-se agarrado a preconceitos e tabus ancestrais e até irracionais (…).

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ÇÃO DA TRAGÉDIA CLÁSSICA Assim, nesta como noutras peças, são vários os aspetos que a aproximam da tragédia clássica enquanto género dramático, embora outros aspetos haja que as afastam. De entre estes destacam-se, pelo seu relevo, a presença de conflitos de vária ordem, que levam à constatação, por parte das personagens, de que se encontram perante uma fatalidade que inexoravelmente se cumprirá e as arrastará para a infelicidade. Ora a única saída encontrada como libertadora de toda a angústia existencial daí decorrente é a morte, bem à maneira clássica. Além disso, é ainda fonte de trágico na obra santareniana o facto de todos os protagonistas se encontrarem numa encruzilhada da vida, tendo, assim, que optar por um caminho 1 . A escolha acarreta, necessária e obrigatoriamente, tal como nas tragédias clássicas, a respetiva punição, o devido castigo, uma vez que, opte-se por aquilo por que se optar, haverá sempre um desafio lançado aos deuses, a Deus, ou a qualquer outra espécie de transcendente moderno, que reclama vingança, ou castigo, como acontece no Antigo Testamento. Ora, desta constatação decorre a colocação inevitável da seguinte questão: a verdadeira realização pessoal encontra-se fora de nós e é inalcançável ou poderemos atingi-la, servindo-nos apenas dos nossos próprios meios? Convém sublinhar, por outro lado, que todos estes elementos podem ser integrados dentro daquilo que,

por vezes, se designa por trágico nacional, uma vez que, embora sejam elementos atemporais e atópicos, a sua denúncia permite caracterizar o Portugal do Estado Novo, sobretudo o ambiente rural e popular eivado de crenças irracionais e deixando-se arrastar pelas superstições e pelo medo, causadores da infelicidade dos heróis e castrador da sua plena realização humana. É que, tal como para Federico GarciaLorca, para Bernardo Santareno, que sem dúvida se deixou por aquele influenciar, o povo era, simultaneamente, a origem, a medida e o destino do seu labor dramático. De facto, Lorca definiria o teatro como sendo “a poesia que se levanta do livro e se torna humana” 2. Por isso, as personagens eleitas por Santareno pertencem quase todas ao povo, e estão eivadas do medo, da ignorância, da superstição, do não esclarecimento racional, que as leva, as mais das vezes, a agirem erradamente. Além disso, como já foi referido, são muitos os fatores que contribuem para a sua infelicidade e angústia existencial, bem como para um contínuo desequilíbrio emocional. Passemos, então, à análise de O Pecado de João Agonia, sobretudo das características que a filiam na tradição da tragédia clássica. Comecemos, então, pela insolubilidade dos conflitos, característica básica das tragédias clássicas, uma vez que não há tragédia sem conflitos. Estes, na modernidade, vestem-se de novas roupagens e apresentam-

-se bastante diversificados dos das obras congéneres da Antiguidade. Assim, e em Bernardo Santareno, os conflitos, natural, angustiada e, muitas vezes, incompreensivelmente insolúveis, prendem-se ora com o sexo – frustrações, insatisfações, desvios e desintegrações sociais daí decorrentes –, ora com as opções que as personagens têm de realizar, gerando intensos combates interiores, ora ainda com a insatisfação dos heróis perante a sua situação. Estes lutam, como todo o ser humano, pela sua efetiva felicidade, o que lhes vai acarretar inevitável e inelutavelmente a desgraça. Comecemos então pelo primeiro aspeto considerado como fonte de trágico – a sexualidade desviante – ao qual se aliam os outros aspetos considerados acima. Ora, tal como em quase todas as peças do autor em estudo, o protagonista de O Pecado de João Agonia é assolado pela frustração sexual, neste caso devido aos tabus sociais, à não aceitação da sexualidade considerada anormal. O protagonista, João, centra em si um conflito de resolução impossível. Homossexual, ao regressar à sua aldeia depois da estadia na tropa, poderia ter disfarçado as suas tendências, tentado ludibriar a família, mas Tóino Giesta não lho permitiu. É a

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candeio paixão do protagonista pelo amigo que vai acentuar o caráter trágico desta personagem. “Como tu és amigo do Tóino, João Agonia!...” 3 , exclama com admiração Maria Giesta. Sempre que se encontram, é notório o seu interesse por este rapazinho e, quando ele está em perigo, por causa dos lobos, o jovem hipersensível transfigurase por amor, cresce, fortalecese, matando os animais com as próprias mãos. O inconsciente impõe-se e a verdade acaba por ser descoberta. Além disso, o aparecimento em cena de Manuel Lamas, membro da aldeia que tinha estado com o protagonista na tropa, vem acelerar o desenlace funesto da peça. Podemos constatar assim que o sexo contrariado, aliado ao amor não concretizável, é o grande vetor temático do teatro de Santareno. Em quase todas as suas obras, como na que estamos a analisar, por uma razão ou por outra,

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“frustra-se a realização amorosa pela dramática impossibilidade de dar-lhe um caminho humano, impossibilidade agravada pela repulsa do meio onde a personagem é forçada a viver”, como escreveu Deniz-Jacinto 4 . Joga-se em quase todas as peças com a oposição entre o espírito e a carne, esta luta ancestral e imorredoira; com efeito, é-nos apresentado o homem continuamente dilacerado entre os dois pólos, combatendo para alcançar o equilíbrio que lhe permita viver sem a angústia constante que lhe inunda a alma e lhe tolhe os movimentos. Bernardo Santareno expõe assim, sem peias de nenhuma espécie, os instintos pulsionais primitivos, característicos de todo o ser humano enquanto composto de corpo e alma, desejoso da sua plena realização, retratando, ao mesmo tempo, um ambiente atávico e retrógrado que, devido

a características peculiares, cria nos heróis uma enorme frustração e a consequente revolta, uma vez que impede a sua plena felicidade enquanto seres humanos e sociais. Passemos, de seguida, à presença da fatalidade, outra das características basilares da tragédia grega, plasmada, agora num transcendente moderno, visto atualizar-se de acordo com o tempo e o espaço que as obras retratam. Com efeito, todas as peças de Bernardo Santareno que fizeram parte do corpus do trabalho de mestrado apresentam muitas marcas de fatalidade, quer entendida em sentido tradicional – em que o fatum coincidia com a vontade de uma entidade superior aos deuses ou que com estes se identificava – ou moderno – em que a moira pode coincidir com a sociedade, a natureza, a história, etc., podendo identificar-se com


a carne, as obsessões sexuais ou comportamentos considerados desviantes, a vontade do clã ou da comunidade em que as personagens se inserem, etc. É de realçar que agora o destino é sentido muito mais como uma entidade interior, ainda que muitas vezes se manifeste aparentemente do exterior. Além disso, esse destino era, nas tragédias clássicas, comummente encarnado por heróis de superior estirpe social. A ação era interpretada por reis, príncipes, deuses ou heróis. Só assim podiam as tragédias funcionar como exemplo a seguir pelos espectadores, pois só deste modo o que as personagens diziam ou pensavam funcionava como uma espécie de preceito moral que devia reger a vida dos atenienses, dos romanos ou de outros espectadores de tragédias. O protagonista era também, normalmente, uma

personagem que se opunha ao poder vigente ou à moral pública – contra os quais é lançado o desafio – ou que, de algum modo, era diferente das restantes personagens, servindo-lhes de contraponto. Passando ao nosso dramaturgo, também Bernardo Santareno cria personagens diferentes das comuns, mas não porque de superior classe social ou elevado estatuto moral. Na realidade, as suas figuras são do povo – excetuando-se o caso das peças Anunciação e O Bailarino, em parte de O Duelo e de alguns quadros de Os Anjos e o Sangue –, camponeses ou pescadores que, agitados por grandes angústias interiores, dão vida a obras intrinsecamente trágicas. Além disso, trouxe o nosso autor para o palco os marginais, glorificandoos com a sua representação: prostitutas, atrizes decadentes, ladrões, leucémicos e solitários

anónimos, a todos tratando com dignidade semelhante à que inspira uma Antígona ou um Édipo, um Prometeu ou um Filoctetes. O teatro trágico desceu às ruas e aí se inspirou e buscou a sua verdadeira vocação: a de revelar o mundo em que vivemos, espelhando aquilo que de melhor ou pior tem a nossa sociedade. Agora os heróis assumemse assim como diferentes das outras personagens, com problemas mais profundos ou mal compreendidos pelos outros, debatendo-se por ideais que os outros não aceitam e recriminam e condenam. Podemos considerálos sempre como marginalizados, em constante luta com a comunidade onde pretensamente se integram, mas sendo, a maior parte das vezes, senão sempre, aniquilados por ela. É o caso dos Agonias, família rude e campesina, intrinsecamente marcada pelo atavismo rural e retrógrado.

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Por outro lado, a mãe e a irmã mais lindos!... O meu menino continuamente uiva à sua de João, em O Pecado de nasceu com os olhos verdes...” porta, também ele um solitário João Agonia, marcadas pela 7, aceitando-a com paciente desprezado pelos da sua raça. típica sensibilidade feminina, são resignação. A identificação entre os dois caracterizadas desde o início Como já vimos, o herói da peça seres, o homem e o animal, é pela angústia e por prenúncios é também caracterizado como indelevelmente simbólica, ou não funestos, pressentindo, ora uma diferente, com uma sensibilidade seja a parte animal que vai também ora outra, as mudanças operadas e uma maneira de ser fora do segregar João e condená-lo à em João: “Tenho medo que ele comum - um marginal que será morte. venha mudado, minha mãe; ainda mais marginalizado ao São ainda indícios trágicos nesta que já não seja para mim o que longo da ação . Marcado por peça a imagem de Tóino Giesta dantes era...!?” 5. Nesta peça, uma hipersensibilidade, que lhe que João esculpe instintivamente são sobretudo a mãe de João, permite adivinhar o que sentem na madeira, bem como a sua Rita - extremamente supersticiosa os que o rodeiam 8, João sintetiza destruição num momento de -, e a própria personagem raiva 10. que dá o nome à peça a (…) a evolução idiossincrática, Também, e finalmente, a demonstrar consciência presença da morte como de que foi o destino que o naquilo que nos caracteriza única solução viável, ora vista marcou: “(...) Na véspera de mais profundamente, foi e negativamente, ora, e assim eu dar à luz o João, aquela acontece a maior parte das continua a ser muito mais rogou-me uma praga... uma vezes, encarada como a praga medonha, como eu lenta, continuando nós a ter única saída possível para nunca ouvi outra: “Que a os conflitos insolúveis das dificuldade em interiorizar lua ruim faça um ninho no personagens, a única forma coração da tua cria! que o princípio basilar da sã e de pôr cobro às angústias e sejam verdes os seus olhos aos medos que as assolam profícua convivência humana: 6 e verde o seu destino!...” . e as arrastam para uma E, inconscientemente, ao o do respeito pelo outro, pelas infelicidade inevitável, é uma entregar a educação de das características basilares João ao senhor Sousa, Rita suas diferenças, escolhas ou da tragédia clássica e, acelera o processo, quando ações. consequentemente, das pensava estar a retardá-lo, obras de Santareno. numa tentativa de evitar que Richard Wagner questionou: a praga que a sua sogra lhe rogou assim o homem dialético, o que “Que faz a morte senão eliminar à nascença se concretizasse. De rompe com os limites humanos obstáculos?”. Ora, a presente resto esta situação não é nova; e contacta com o sobrenatural. reflexão permite concluir que tal acontece em tragédias como É o ser que, contactando com o só a morte, ou a loucura, sua Rei Édipo ou no mito de Danae. Mal (ainda que assim entendido aliada, porão fim à marginalização O destino inexorável cumpre-se, apenas do ponto de vista da que caracteriza as personagens mesmo que o ser humano tente moral vigente), dividido entre este santarenianas, em geral, e a evitá-lo. e o Bem (?), transpõe a barreira de O Pecado de João Agonia Por isso, quando sabe da morte e irreversivelmente se afasta dos em particular. De acrescentar do filho, Rita constata que apenas outros seres que o rodeiam. também que, à maneira sofocliana se cumpriu a sua sina: “O meu Como diz Alencar Guimarães e contrariamente a Eurípides, que filho nasceu com os olhos verdes: Lima, “mais do que tocar a parte privilegiava os sacrifícios em cena, e os olhos dessa cor foi coisa divina do humano, é a descoberta Bernardo Santareno não permite que nunca ninguém viu nem na do Deus em si (ou do Demónio?) que os espetadores - para não minha gente nem na gente dos que o deixa à beira do abismo...” 9 se chocarem tanto - assistam Agonias... Ninguém, nem mesmo e do qual tem plena consciência. à imolação das vítimas, tendo os velhos!... Verdes, verdes... Marginal, gosta do cão que dela conhecimento através das

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indicações cénicas ou de outras personagens. Os Agonias são sóbrios, mas terríveis; práticos e eficientes, resolvem em conselho de família a decisão a tomar e executamna, inflexivelmente, sem que lhes trema o braço ou vacile o coração. Por isso é que o José Agonia é “filho de pedra dura e do cardo espinhoso”. E se por momentos a piedade familiar, ou talvez o indefinível apelo dum profundo instinto de conservação, parece movê-los a uma atitude mais humana, em breve a rudeza primitiva do caráter e o atavismo da condição os submetem à sua lei e lhes impõem o caminho a seguir. Tornam-se, assim, o instrumento do rancor popular; e do passo em que enfrentam a turba, defendendo dela João - um dos seus, afinal - ascendem os quatro Agonias a um plano trágico ao liquidarem voluntariamente, pelas próprias mãos, a carne da sua carne. O miasma, hereditário e contagioso para os gregos, só pode ser banido perante uma purificação ritual, neste caso a morte do pecador às mãos do clã familiar. João Agonia deixa-se matar não por autopunição, não porque reconheça o seu erro, mas porque se sente impotente ante o código moral da sua família que, afinal, é o código da coletividade em que se insere. Nesta personagem, a morte está no seu próprio nome: ou não fosse a agonia o derradeiro combate travado pelo homem – o combate com a morte. Tragicamente, o fim da personagem já podia ser antevisto no momento em que mata os lobos, morte bem semelhante à sua. Por outro lado, João pode representar aquele

que deve morrer para redenção dos outros, já que apenas na sua personagem se aliam o humano e o divino, permitindo aos outros, nomeadamente a seu pai, ver mais longe do que lhe permitem os seus pobres olhos humanos 11 . É portanto um fim bem trágico, o da peça. Concluindo, e de acordo com Isabel da Nóbrega, este fechar de todas as saídas e a consequente procura da morte pode ser um ato provocador por parte do dramaturgo. Com efeito, cremos que uma das formas de abalarmos alguém distraído e em perigo é mostrar-lhe esse perigo sem aviso nem comentários. A reação virá por si. E o quadro focado terá sido fecundante se os espectadores não estiverem mortos. Ora Santareno não escreve para mortos - os vivos que não preguicem e entendam 12 ! Com efeito, quando não resta outra saída para o absurdo existencial e para a angústia daí decorrente, a morte é legítima e legitimada. Chegados ao fim da apresentação de alguns excertos reflexivos sobre os aspetos trágicos de O Pecado de João Agonia, impõese destacar um ou outro aspeto, a meu ver motivadores da elaboração deste texto. Com efeito, a partir da análise da peça em causa, sobretudo do tema que lhe subjaz, conclui-se que Santareno, refletindo sobre a temática da homossexualidade e sua condenação nos meios atávicos aldeãos das décadas de 40 e 50 em Portugal, se torna extremamente atual e atualizante. Com efeito, apesar de termos evoluído, económica, social e, sobretudo, culturalmente

(pelo menos aparentemente), a evolução idiossincrática, naquilo que nos caracteriza mais profundamente, foi e continua a ser muito mais lenta, continuando nós a ter dificuldade em interiorizar o princípio basilar da sã e profícua convivência humana: o do respeito pelo outro, pelas suas diferenças, escolhas ou ações. Só deste modo o ser humano evoluirá harmoniosamente, contribuindo para a felicidade de todos, fim último da existência humana. Repetindo, e alargando as palavras de Isabel da Nóbrega supracitadas, Santareno e todos os escritores de maneira geral não escrevem para mortos – os vivos que não preguicem e os entendam, ou não valerá a pena continuar a ensinar literatura, numa tentativa de releitura e reflexão intertextual permanentes. NOTAS O presente artigo é uma breve síntese da dissertação de mestrado da professora Etelvina Soares, O Trágico em Bernardo Santareno, apresentada à Faculadade de Letras da Universidade de Coimbra, em 1996. 1 O drama da opção é também acentuado pelo Existencialismo, que neste aspeto coloca a sua tónica dominante. Daí também a relacionação de Santareno com esta corrente. 2 Rebelo, Luiz Francisco, “Sentido trágico da obra teatral de Frederico García Lorca”, in Aqui e Além, abril de 1946, p. 56. 3 Bernardo Santareno, “O Pecado de João Agonia”, in Obras Completas, II, Lisboa, Caminho, 1985, p.301. 4 Deniz-Jacinto, “O Pecado de Jogo Agonia”, in Teatro II, Porto, Lello e Irmão, 1992, p. 24. 5 Ibidem, p. 254. 6 Ibidem, p. 263. 7 Ibidem, p. 348. 8 Ibidem, p. 282. 9 Lima, Alencar Guimarães, “O Pecado de João Agonia: Vigência e Duplicação do Símbolo”, in Arte e Linguagem, Petrópolis, Editora Vozes LTDA., 1973, p. 81. 10 Ibidem, pp. 301 e 321 respetivamente. 11 Cf., a este propósito, Lima, Alencar Guimarães, op. cit., pp. 84-85. 12 Cf. Nóbrega, Isabel da, “Breve nota sobre Bernardo Santareno e «A Promessa»”, in Santareno, Bernardo, A Promessa, Lisboa, Círculo de Leitores, 1973.

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A CONSTRUÇÃO DE UMA ESTRATÉGIA DE SALVAÇÃO – GNOSEOLOGIA, ESTÉTICA E METAFÍSICA EM JOSÉ RÉGIO Rui Rufino

Docente de Filosofia 1. A ironia como método interpretativo da vida A vida e a busca de uma compreensão globalizante do mundo e da realidade levam, tendencialmente, à constatação da inevitabilidade da contradição, subjacente ao homem e aos seus conhecimentos. Para Régio, porém, a contradição não constitui uma característica essencial da realidade e da vida, mas antes um sinal da insuficiência da razão humana. Como refere na Confissão dum Homem Religioso, «só há contradições para a nossa razão humana, sendo as contradições lacunas, falhas, interrupções, fífias denunciativas dos seus limites, nunca perante a Razão Divina». Só a pequenez da nossa razão impede a visão da unidade que está por detrás da contradição – máscara e aparência para a capacidade de conhecer do homem, centrada na razão e na lógica. Importa, então, encontrar uma nova abordagem gnoseológica, um novo método interpretativo do mundo e da vida, que permita ultrapassar a contradição – essa nova compreensão das coisas constitui aquilo que, no Jogo da Cabra Cega, Jaime Franco, esse alter-ego do que em Régio há de imoral e a-social, designa por ironia e que define nos seguintes termos: É uma tentativa de se exprimir atitudes opostas, faces adversas, juízos desencontrados, sentimentos complexos – com palavras que aparentemente, isto é: superficialmente, só têm um sentido... (Régio, 1982: 56).

Um pouco adiante, Jaime Franco irá explicitar melhor o que entende por este novo método para encarar a vida, que tem como principais exemplos Dostoievski e Nietzsche, e que nasce do maior de todos os conflitos, como é o caso da tragédia: A ironia nasceu da tragédia, é talvez a sua quinta-essência intelectual. O próprio da tragédia é o conflito, e toda a solução é inimiga do espírito trágico. (...) É que a verdadeira ironia brota da visão compreensiva dum conflito perpétuo, da apreensão simultânea de aspectos adversos em actividade... É pelo sentimento, pela paixão, que se afirma ou nega. É pela razão que se nem nega nem afirma. É pela inteligência, a verdadeira, que se aceita sem afirmar nem negar... Assim a ironia é uma das manifestações mais completas da inteligência e da compreensão. Um ironista opta por tudo, e sempre que afirme seja o que for afirma consequentemente o contrário. Daqui veio a concepção rudimentar de que um ironista é um homem que diz o contrário do que pensa. Ele não só diz o contrário do que pensa!: Pensa também o contrário do que pensa, e põe-se à margem da vida para a julgar de fora, compreendendo ao mesmo tempo que não pode sair da vida. (...)... É um céptico ideal porque nem nas suas próprias negações crê... (Régio, 1982: 64).

É por possibilitar a aceitação do que ao mesmo tempo afirma

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e nega que a ironia ultrapassa a contradição, superando-a pela compreensão da sua profundidade e que é algo que a lógica presa na razão não consegue atingir. Esta nova compreensão, a que Jaime Franco apela, encontra-se muito para lá da lógica e da razão e do que pode ser entendido intelectualmente: Queria eu dizer que me não interessava ser intelectualmente compreendido; sobretudo neste momento. (...) A lógica..., não é ela a força dos meus discursos! nem dos meus actos. (...) A lógica..., a lógica é geralmente uma pequena faculdade acessória. Qualquer simples interjeição passional actua mais profundamente que um raciocínio luminoso. (Régio, 1982: 97).

A lógica racional é demasiado pequena e insuficiente para poder abarcar toda a complexidade da vida, pelo que fica bloqueada perante o conflito e a contradição que não consegue solucionar. Só uma nova abordagem a-lógica e a-racional permite alcançar aquilo que se encontra à profundidade e que é mais autêntico e real. Deste modo, aquilo que esta heterodoxa teoria do conhecimento propõe é uma crítica radical da ciência e dos seus pressupostos, assentes no privilégio da razão sobre todas as outras formas de conhecer. 1 2. Da crítica à razão científica, à crença como fundamento gnoseológico No artigo “Ainda uma Interpretação de Modernismo”, publicado na presença em Dezembro de 1939, José Régio enuncia detalhadamente os limites da ciência e da razão, procurando mostrar a impossibilidade desta razão científica se provar a si própria como o modo gnoseológico mais capaz de alcançar a verdade humana: Mas... Senhora Dona Ciência, o seu nariz é curto. E os seus olhos não vão mais longe do que a ponta do seu nariz: As suas descobertas... não foram feitas por si. Os seus códigos são provisórios – como sabe. As suas explicações não provam nada, porque de resto nada se prova. E o pior é que nem explicam! Se eu for capaz de ver, tão real e perfeitamente como vejo o meu próprio corpo, o corpo duma pessoa inexistente ou desaparecida, - que me explica a ciência chamando a isso uma alucinação? E como me prova que essa pessoa que eu vejo não existe? É por meio dos sentidos do meu corpo que me apercebo do meu corpo. E é também por meio dos sentidos do meu corpo que me apercebo desse outro corpo... irreal. E que me importa que qualquer pessoa presente possa não ver esse fantasma (chamemos-lhe assim) que estou vendo? Essa outra pessoa e eu não estamos no mesmo instante: Ela não vê agora o fantasma que eu vejo – como não vê agora as pessoas com quem eu ontem falei. Exploremos ainda um exemplo idêntico: Uma noite, eu estava deitado a ler quando ouvi chamar-me do corredor a voz duma pessoa querida. Todo me arrepiei de entusiasmo e pavor –


porque essa pessoa estava a léguas de distância. Mas sem saber como, respondi num berro abafado: - “Quem é?” – “Apaga a luz”, (disse a voz) “precisas de descansar...” Ora como sabia que a pessoa que me falava não podia estar presente, - concluí que tinha sido isso a que chamam uma alucinação. Suponhamos, porém, que essa pessoa morava então na mesma casa; e que eu a não interrogava depois. Nunca eu sonharia ter tido uma alucinação – mas poderia igualmente tê-la tido... Resumindo: A ciência não passa da constatação de alguns fenómenos – cuja utilização presta, decerto, grandes serviços ao homem. Mas essa própria constatação é provisória e contingente. Em verdade, a ciência nada pode afirmar ou negar. E só avança... através de criadores que até certo ponto a desmentem. Pode assim, por hipótese, avançar ilimitadamente – mas outras actividades avançarão ilimitadamente adiante dela. De modo que as hipóteses que eu aventure, (algumas das quais são, ou podem sê-lo, simples crenças minhas) não as julgo tão facilmente invalidáveis como à primeira vista o podem parecer. Porque se recorremos ainda ao testemunho da razão (apesar de nada aventar que propriamente vá contra a razão) – poderei ainda responder que a própria razão se apercebe da estreiteza própria. (Régio, 1977: 93,94).

Neste longo texto está explícito o essencial do pensamento gnoseológico de Régio em relação à ciência: a ciência é provisória, contingente e incapaz de explicar as suas próprias provas, que, em última análise, nem explicam nem provam. Estas limitações da ciência são, no fundo, uma consequência das limitações da razão, incapaz de explicar uma grande variedade de fenómenos e situações que ocorrem ao indivíduo. Também no teatro de Régio se pode encontrar, noutro tom, a repetição destas mesmas críticas à ciência. A Salvação do Mundo, Benilde ou a Virgem-Mãe, e até essa pequena fantasia em um acto, escrita em 1935, Sonho duma Véspera de Exame, constituem três obras que evidenciam a insuficiência e falibilidade da ciência incapaz de aceder a uma verdade mais profunda e essencial, que inevitavelmente a ultrapassa. O mesmo se passa ao longo dos volumes de A Velha Casa, onde se faz referência a uma razão que não consegue explicar o tenebroso e doentio 2 e a uma ciência incapaz de ultrapassar as aparências 3 e de avançar no conhecimento do homem 4. No romance O Príncipe com Orelhas de Burro podem encontrar-se

estas mesmas e outras críticas à ciência, acusando-a o Príncipe Leonel de classificar como loucura aquilo que não consegue entender, restringindo a sua capacidade de descrição ao que é superficial: – Vistes até onde vai a ciência humana! – disse o príncipe em voz bastante clara – Chama loucura a tudo o que desconhece ou não entende. Quando julga conhecer e entender, já lhe chama natural; isto é: já volta costas ao seu mistério. Que faz, as mais das vezes, a ciência humana, e embora preste muitos serviços ao homem, senão escamotear a realidade à conta de meras aparências? Mesmo assim presta muitos serviços ao homem, concordo. Mas não vai longe! E toda a filosofia humana não chega muito mais longe, e nem sequer nos presta os mesmos serviços. Cada grande filósofo parece ter descobrido a verdade, apresenta a sua hipótese que passa a ser catalogada, - e toda a colecção dos sistemas não vapora senão uma impressão de formidável engenho e vácuo... (Régio, 1986: 298).

Concebendo-se, deste modo, a ciência tão limitada e insuficiente em termos gnoseológicos, importa saber como se pode e o que se pode conhecer da realidade. Se a ciência fica pelo que é aparente e superficial, como se poderá aceder ao que é profundo, autêntico, verdadeiramente real? À volta desta problemática gnoseológica anda um dos contos de Há mais Mundos, neste caso, aquele que tem o sugestivo título de “Os Alicerces da Realidade” (Régio, 1973: 189-222) e onde se narra a história de Silvestre, um indivíduo que começou por ter uma impressão estranha, que lhe sugeriu não ser o real exterior mais que uma representação não real. Depois de viver algum tempo atormentado com esta impressão, acorda uma noite «com esta frase na cabeça: “A vida é um sonho.”». Relacionou esta frase com a impressão tida anteriormente, mas não valorizou muito estes acontecimentos estranhos. Aquilo que mais o preocupava, naqueles tempos, era a presença num jantar íntimo em casa do seu ex-Diretor, por ocasião da transferência deste para outro serviço – era um jantar a que apenas iria «gente bem», pelo que Silvestre sentia ser uma honra ter sido convidado, apesar de já ser funcionário aposentado e do Senhor Diretor nunca lhe ter

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dado grande importância. Chega o grande dia e Silvestre vai ao dito jantar, cheio de formalidades e convenções. Como não era pessoa daquele meio social, vai sentir-se muito isolado e distante de todo aquele mundo de vaidades. Até que, de repente, irá ter outra daquelas impressões estranhas que lhe sugerem a ausência de realidade do que parece real: Ora agora, o que tudo repentinamente pareceu ao nosso amigo Silvestre, não foi gravura nem pintura: foi teatro; com a agravante, porém, de nem saber se realmente os actores eram gente viva, ou títeres muito perfeitos, muito rigorosamente copiados dos homens, e movidos por maquinismos invisíveis os mais apurados. (...) Toda aquela sala, por exemplo, não estava arranjada como uma sala num palco? As paredes não eram cenário? E aqueles grupos de gente que faziam, que diziam, com falsas palavras e falsos gestos sem peso, que não fosse comédia? Tudo uma ficção, na qual o senhor Director e ele tinham papéis de relevo: mas inverosímeis, inaceitáveis na realidade. Pois quem poderia imaginar que um senhor Director real houvesse convidado um pobre Silvestre real, pequeno funcionário aposentado, para um jantar e uma reunião reais de tão apurada elegância?

A insistência destas impressões atormenta-o tanto que chega a pensar consultar um médico. Entretanto, começa a vislumbrar quão ténues são as fronteiras que separam o sonho daquilo que pensava ser real, ao mesmo tempo que nele se começa a formar um outro Silvestre, muito mais profundo que o velho Silvestre superficial:

Neste novo Silvestre, assim como nas ocultas camadas do chão pode fluir uma corrente subterrânea, que pode vir à flor da terra, se desenvolvia aquela frase já muito mais que uma frase: “A vida é um sonho. A vida é um sonho”. Muito mais que uma frase! Uma verdade tão evidente (pensava, lá no fundo, o nosso amigo Silvestre) que parecia impossível não a reconhecer toda a gente. Senão, vejamos: quando sonhamos, deitados na cama, também nos não é tudo tão real? Não há acontecimentos, pessoas, paisagens, objectos, pensamentos, nos nossos sonhos? toda a nossa vida, em suma? Não andamos nós próprios lá dentro, não estamos ali vivos, aparentemente consistentes? Não poderia ele, Silvestre, por exemplo, haver sonhado o que se dera em casa do senhor director? Às vezes sonhamos coisas disparatadas, sim. Quando as achamos disparatadas? não é quando acordamos? E também, no que chamamos vida, não vemos nós mesmos que há disparates, absurdos, incongruências? Quantos mais não haverá pelos quais nem damos, simplesmente porque estamos sonhando! sonhando o sonho da vida. Quando acordarmos os veremos, quando acordarmos na morte do sonho da vida. Então veremos a irrealidade de tudo isto! Não é de manhã, quando acordamos na nossa cama, que se desfazem as imagens dos nossos sonhos?

Esse outro Silvestre, mais lúcido, pressente agora uma nova e mais profunda verdade: quão ténues são as fronteiras que separam aquilo que consideramos como sonho e o que definimos como realidade. Não será a própria realidade social e material nada mais que um sonho que apenas permanece até se despertar para um mundo e uma vida mais autêntica? Silvestre desiste de ir ao médico. Afinal, o que poderia ele

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fazer? Se o sonho da vida era irreal, o que poderia a medicina ou qualquer outra ciência fazer para o ajudar? 5. Naturalmente, Silvestre vai desprezar o pouco valor das convenções sociais e do reconhecimento material, ilusões do sonho da vida, acabando por ser acusado de loucura por parte daqueles que, sonhando, não possuem a menor consciência dessa irrealidade em que vivem. Neste conto está enunciado um dos principais problemas da gnoseologia de Régio e que é o de saber como pode a ciência garantir que aquilo que conhece e entende é, de facto, a realidade. Nenhuma ciência consegue provar este ponto de partida indispensável à sua construção: o de considerar que a nossa vida é real e que temos meios para alcançar parte do significado dessa realidade. Um desses meios é a razão, a qual também não se consegue autojustificar como o modo mais correto de atingir a verdade. Deste modo, Régio encontra-se num relativismo gnoseológico, onde nenhuma forma de conhecer se pode legitimar como superior, podendo a própria razão ser acusada de falta de razão 6 e acabando por se sustentar, tal como toda e qualquer ideia, no único fundamento próprio ao homem: a crença. Esta crença nunca deve, porém, ser encarada como um estagnar num saber dogmático, mas como um estímulo à dúvida e à investigação; se tudo é crença, nada é certo. Criticando, então, a dogmatização, Régio defende, em Introdução a uma Obra, o caráter progressivo e renovador da ciência, considerando como plausível a articulação da ciência com outros modos de conhecer aparentemente antagónicos, como seja o caso da mística 7 - uma vez que ambas comungam da crença como verdadeiro fundamento gnoseológico. «Tudo, no homem», diz Régio no seu Diário, «são crenças ou hipóteses»


e «sobre as crenças e as hipóteses, trabalha a razão humana» (Régio, 200: 365), pelo que a crença é o principal pressuposto da própria razão. A explicitação filosófica desta gnoseologia fundamentada na crença é apresentada na Confissão dum Homem Religioso, onde se anuncia aquela que será a única crença que poderá iluminar todas as outras no caminho da verdade – a da Revelação de Deus: Adiante ensairei desenvolver um pouco a minha ideia (central naquilo que tenho de chamar a minha filosofia) de que ou se aceita a Revelação, a Palavra-Espírito de Deus pelo mesmo Deus falada ao homem mesmo sem palavras, a comunicação com a Verdade Absoluta, em suma, - ou tudo em nós são puras crenças, e sobre crenças tentamos fundamentar racionalmente todas as nossas certezas. Isto mesmo que estou dizendo pode resultar de pura crença, que pode, ou não, apreender qualquer verdade, como pode não passar de pura crença o predomínio que concedemos à Razão na apreensão de qualquer verdade ou realidade. A Razão pode não ser senão o nosso meio mais comum de superficialmente nos entendermos. Se, porém, tudo são crenças, porquê condenarmos umas em benefício de outras? (Régio, 1983: 139-140).

O homem, no seu processo de conhecer, está sempre cercado de crenças que não tem forma de superar; a própria razão é uma outra forma de crer, que tem também na crença, inevitavelmente, o seu fundamento gnoseológico. Acreditase na validade da razão e na sua superioridade em relação a outras faculdades de conhecer, mas não se pode encontrar um modo de provar racionalmente essa mesma vantagem. Tudo são crenças, tudo aquilo que o homem diz e defende, a mais pequena ideia, depende sempre de crenças e jamais passará de crenças. Numa perspetiva gnoseológica desta dimensão, a demarcação do objetivo e do subjetivo tornase muito difícil de definir, uma vez que, se tudo são crenças, aquilo que subjetivamente se crê se encontra ao mesmo nível gnoseológico daquilo que “objectivamente” se crê pelo pensamento, pela razão, pela ciência. 3. A objetividade da subjetividade O mundo interior de cada um ultrapassará, deste modo, as fronteiras da sua própria subjetividade, uma vez que, sustentando-se a crença como fundamento gnoseológico, o conjunto das vivências pessoais de cada um coloca-se num plano de igualdade não só em relação às vivências de qualquer outro mas também em relação a qualquer ideia, teoria ou lei. Mais que ultrapassar a sua subjectividade, é a própria noção de subjetividade que deve ser encarada doutro modo: aquilo que é subjetivo é também aquilo que é objetivo, pois se tudo são crenças, qualquer experiência possui a mesma carga de objetividade, a qual acaba por se identificar com

a sua própria subjetividade. O mundo pessoal de cada um não será apenas um «estado de espírito», mas antes um verdadeiro «estado de ser» 8, o que acarreta algumas repercussões ontológicas, na medida em que as vivências pessoais passam a ser concebidas como a verdadeira realidade do mundo que cada um vive – o único, afinal, de que cada um pode falar, que cada um pode conhecer. Esta fusão da subjetividade e da objetividade, para além das implicações antropológicas e metafísicas, resultará numa interpretação da criação artística assente na valorização do que é próprio do criador, rejeitando qualquer cânone de graduação do fenómeno estético. Antes de mais, importa mencionar a impossibilidade da objetividade da crítica: Fala-se muito em objectividade quando se fala em crítica. Ora a verdade é que a opinião dum crítico deixa de merecer interesse em deixando de ser a opinião dum indivíduo. Quando as palavras de quem escreveu sobre um livro, um quadro, uma partitura ou uma individualidade não hajam sido sinceras – sinceras quer dizer: sentidas e pensadas por quem as escreveu – tais palavras resultarão mudas, frias, ineficazes... (Régio, 1977: 125).

Sendo impossível a objetividade crítica, o critério de verdade do crítico será a expressão sincera daquilo que sente, devendo assumir a subjetividade e as crenças inerentes a esse sentir. Sem um sentir pessoal, nada se pode afirmar sobre o que quer que seja, a objetividade só pode advir da subjetividade das sensações e dos pensamentos próprios. Atente-se, a este propósito, no que escreve num artigo publicado na Seara Nova e onde Régio pretende esclarecer esta questão em relação aos mal-entendidos de que tinha sido alvo: Ama-te a ti próprio, odeia-te a ti próprio, frequenta-te a ti próprio; estuda-te, critica-te, conhece-te; e o mundo abrir-se-te-á. Pois como conheceríamos o mundo, - e por esta palavra designo aqui tudo o que existe – se dêle não tivéssemos as nossas sensações, as nossas impressões, as nossas ideas, e a nossa faculdade de conhecer e corrigir estas próprias? A objectividade não é senão um esfôrço e uma conquista nossos, - pessoais. (Régio, 1937).

O homem, no seu processo de conhecer, está sempre cercado de crenças que não tem forma de superar; a própria razão é uma outra forma de crer, que tem também na crença, inevitavelmente, o seu fundamento gnoseológico.

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de uma teoria gnoseológica que se fundamenta na crença e que afirma a objetividade da subjetividade, pelo que coloca, no plano da criação, o lugar de uma verdade essencial, de um ser a expressar-se.

No interior do artista, considera Régio a existência, no âmago da sua criação subjetiva, de uma força objetivante que ultrapassa as circunstâncias e os particularismos, sendo a responsável pela atribuição de universalidade e intemporalidade à obra de arte: Decerto, bem pode a personalidade dum escritor haver crescido e evoluído – ou evoluir – consoante muito várias contingências; ainda que não penso, eu, que alguma vez possa uma personalidade ser mera fluidez, e antes suponha que um seu núcleo resistente persiste superior às circunstâncias que lhe alteram a superfície, ou a fazem debater-se entre os seus diversos aspectos, momentos, inclinações. Como quer que seja, a criação artística só a essa personalidade obedece. A ela, e a nada de externo. Neste sentido é livre a obra de arte: Livre, por não sujeita senão à personalidade criadora; livre, também, por transcender o mais particular dessa personalidade, atingindo, como obra intemporal e universal, aquele fundo ou altura em que a mesma personalidade transcende seu próprio particularismo (...) (Régio, 1937: 137)

A subjetividade confunde-se, deste modo, com a objetividade. Em cada criador há algo que «subsiste de inassimilável a quaisquer circunstâncias e contingências» e «pelo qual se define cada indivíduo como indivíduo, cada criador como único» (idem: 143). É naquilo que a personalidade do artista tem de mais íntimo e próprio que está também o que é mais universal e eterno, é no mais subjetivo que resplandece o mais objetivo. É por tudo isto que «a criação artística é, por um lado, fundamentalmente subjectiva» e, «por outro, fundamentalmente objectiva» (idem:167). A importância da teoria estética regiana resulta diretamente

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4. A estética funda uma metafísica Fundando uma teoria gnoseológica que mostra os limites do conhecimento e que abre a verdade a uma estética que, por isso, também é uma metafísica, toda a obra de Régio concorre para uma determinada estratégia de salvação. Voltemos ao artigo da presença intitulado “Ainda uma Interpretação de Modernismo” (Régio, 1977: 93-100), onde se aborda a riqueza transcendente do homem. Como vimos anteriormente, este artigo começa por estabelecer os limites da ciência 9 que, embora preste grandes serviços à humanidade, não é mais que uma «constatação provisória e contingente» de determinados fenómenos, e mesmo os da razão, a qual «se apercebe da estreiteza própria». Estabelecidos os limites do conhecimento, resta ao homem sugerir explicações da realidade e da vida, como seja o caso de desde sempre existirem no homem «todos os seus limites e ilimites», o que faz com que nele nada haja de novo, mas antes que já tudo seja eterno, indo-se ainda mais longe quando é afirmado o seguinte: Pode-se até conceber que a própria humanidade seja eterna: porque em suma, a noção de humanidade pode ser alargada a outros seres, a outros astros, a outros mundos... Deixem-me ir às do cabo - como se diz num calão tão legitimamente usado como o dos pensadores profissionais:... pode ser alargada até à Divindade! Pois um Deus capaz de ser sentido ou pensado (ou concebido, entrevisto, adivinhado, pressentido…, como queiram!) pelo homem - pode ser incluído na noção de humanidade. Bem! Portanto, nada de novo há no homem. Nada de novo... a não ser cada sua nova intuição, cada sua nova apercepção das riquezas que já possuía, mas que ainda não descobrira. Após concluir, deste modo, que no homem já está inscrito tudo o que pode/poderá ou não fazer, prossegue a especulação, dividindo-se aquela conceção em duas hipóteses, o homem ser limitado ou ilimitado, sendo tão aceitável uma como a outra, uma vez que «a história da humanidade nada nos diz senão do que passou», o que é insuficiente para se poder legitimamente tirar uma conclusão definitiva sobre as capacidades do homem. De seguida, retira Régio algumas consequências da hipótese que considera o homem «possuidor de ilimitadas possibilidades», podendo-se, assim, confundir «na noção de Humanidade a de Vida e a de Divindade», o que pensa estar na base do Modernismo, que entende definir-se pela não aceitação definitiva de qualquer afirmação ou negação do passado ou presente, esperando «sempre mais do futuro», e da Arte Moderna, que concebe como «a expressão estética de novas (mas eternas) riquezas que o homem em si pressente».


Deste modo, a grande descoberta da Arte Moderna é a «de que há sempre mais mundos dentro ou fora deste mundo, e de que o homem é sempre mais rico, pode ser sempre mais rico... do que supunha», crescendo infinitamente em possibilidades. Daqui resulta, pois, uma superação da finitude humana, onde a salvação se define pela coincidência do indivíduo com o todo, com o Absoluto. Porém, se por acaso for a outra hipótese, que

concebe o homem como limitado, que esteja certa? Nesse caso, afirma o autor no final do seu artigo, «se de toda esta anunciação dum homem mais rico num mundo mais rico nada mais ficar... ficarão, ao menos, as Obras iluminadas por tal Sonho». Quer dizer, surge aqui uma segunda noção de salvação para o caso do homem ser limitado, que consiste no assumir da arte como a única redentora da tragicidade

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Deste modo, a grande descoberta da Arte Moderna é a «de que há sempre mais mundos dentro ou fora deste mundo, e de que o homem é sempre mais rico, pode ser sempre mais rico... do que supunha», crescendo infinitamente em possibilidades. humana10, o que constitui uma conceção análoga à de Nietzsche, de quem, pensamos, José Régio estar muito próximo, embora o não confesse de forma explícita. Recapitulando, vemos traçado, neste artigo da presença, o seguinte itinerário: da incerteza gnoseológica abrem-se duas hipóteses, ou o homem é ilimitado ou limitado, de acordo com a primeira hipótese há nele um crescer infinito de possibilidades que tem como consequência uma noção de salvação que assegura a transcendência do indivíduo e do Homem por se identificarem um com o outro e ambos com o Absoluto, em relação à segunda hipótese o homem já enfrenta um limite de possibilidades que reduz a noção de salvação a um Sonho de transcendência cristalizado na obra de arte. No primeiro caso, a Estética funda e suporta uma Metafísica, no segundo, a Estética constitui a própria Metafísica. Julgamos que Régio não só prefere a primeira hipótese como também a sua própria obra, em especial a poesia, se inclina para entender por salvação a capacidade de vencer a finitude - o que não significa que conclua necessariamente pela sua concretização -, como se pode comprovar, por exemplo, a partir de um soneto de Biografia: Vejo, enfim, que sem Ti, nada me presta! Sem Ti, quebrada a lança, inane o escudo. Silêncio e escuro, - o cego surdo-mudo, De qualquer vida, eis ao que chega nesta. Inútil tentar mais!, que não me resta Mais do que o vício, solitário e agudo, De tentar por tentar, e achar em tudo O azedo a cinza após a febre e a festa. Só Tu me podes restituir a mim, Revelar um Princípio no meu fim, Compenetrar de Ser a morte e o nada. Cheguei!, se aqui mandaste que eu chegasse. Mostra-me, pois, de novo, a Tua face, Que até essa ilusão me foi roubada! (Régio, 1978: 133-134).

No meio da incerteza e da dúvida que anseia resolverse, define-se de um modo muito claro o que se entende por salvação - «compenetrar de Ser a morte e o nada»,

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ou seja, ultrapassar num sentido ontológico e não apenas estético a finitude e limites que ameaçam o ser humano na sua individualidade, sentido esse que necessita sempre do recurso ao transcendente. Está, assim, demonstrada, a nosso ver, a equivalência de todos os saberes para Régio, uma vez que tudo se reduz, em última análise, a crenças, pelo que a ciência deve ter consciência da sua subjetividade e a religião e a metafísica podem ser o lugar da verdade essencial ao indivíduo, a chave de reencontro com um sentido de vida, muitas vezes esquecido e disperso pelo quotidiano terreno, regulamentado, uniformizado. Esta vertente metafísica mantém-se permanentemente aberta, sempre a caminho, a partir de uma certa espontaneidade, mas também de uma reflexão apurada de ideias e conceitos em busca de soluções, que se sabe não passarem de meras hipóteses 11, o que acontece não só com a Arte e com a Filosofia, como também com a Ciência. Quando se fala de subjetividade da ciência não se quer menorizar a ciência, apenas lembrar a impossibilidade desta alcançar a verdade total; quando se menciona um caráter objetivo da metafísica, não se pretende estabelecer uma nova dogmática, mas apenas salientar a manutenção de um espaço em branco, uma zona de sombra, que o ser humano individual exige com urgência e ansiedade preencher e que se prende com a busca de uma redenção que exige o encontro com o Absoluto. Nesta busca e neste movimento em direção a um sentido que depende do encontro com um Absoluto que não se chega a saber se é algo mais que um espelho transcendente do indivíduo, podemos vislumbrar aquele movimento de que Merleau-Ponty fala a propósito do filósofo, ou seja, «o movimento pelo qual vamos de nós próprios para o Absoluto» e que «subentende incessantemente o movimento descendente que um pensamento desligado julga realizar do Absoluto para si mesmo e, por isso, o que o filósofo estabelece não é nunca o absolutamente Absoluto, mas o Absoluto em relação consigo» (Merleau-Ponty, 1986: 12). Pensamos que este foi o grande projeto de Régio - a partir da sua obra literária elevar-se ao

(…) surge aqui uma segunda noção de salvação para o caso do homem ser limitado, que consiste no assumir da arte como a única redentora da tragicidade humana, o que constitui uma conceção análoga à de Nietzsche (…)


NOTAS O presente artigo é uma breve síntese da dissertação de doutoramento do professor Rui Rufino, José Régio. A Filosofia do Eu, apresentada na Universidade Nova de Lisboa, em 2002. 1 Esta crítica à lógica e à ciência sugere alguma proximidade com a obra de Miguel de Unamuno, neste caso concreto de Amor y Pedagogía, o que não passa, neste momento, de mera hipótese, uma vez que, na obra de Régio, nada de explícito se encontrou que a permitisse confirmar ou rejeitar. Flávio Gonçalves chega mesmo, numa carta de Setembro de 1967, a indagar Régio sobre a influência do escritor espanhol na sua obra, não obtendo qualquer resposta por parte do seu amigo, que habitualmente evitava referir influências e autores mais marcantes: «...reli o Sentimento Trágico do Unamuno. E a propósito: este autor impressionou-o? Quando o leu? Pareceme que, nalguns pontos do problema religioso do meu Amigo há afinidades com aspectos do pensamento e drama de Unamuno. Acho que é assunto para conversarmos.» (João Francisco Marques, José Régio e Flávio Gonçalves – Os Caminhos de uma Amizade, Póvoa de Varzim, 1989, p. 294) 2 «Quase de chofre o sufocava o sentimento da sua solidão. Que solidão? e porquê tal sentimento? Eis o que lhe fora difícil definir, ou justificar pela razão. Mas que pode a razão (pensara já Lèlito) nos dias, horas, momentos em que se vê jogado o pobre doente num redemoinho de forças tenebrosas?» (Uma Gota de Sangue, Porto, Brasília Editora, 1981, p. 99). 3 «Assim o pior mal de Lèlito era da alma, ou esta o foco da sua verdadeira doença. E da profundeza desse mal ninguém parecia, sequer, suspeitar! Contra esse, pouco podiam os tónicos e os conhecimentos do bom do Dr. Lage. Tanto mais que Lèlito se concentrava num silêncio, numa apatia, numa abstracção, que desnorteariam até olhos mais experientes ou penetrantes; - e assim ocultava as mais estranhas coisas que sentia, sob a aparência dum mero e renitente abatimento físico.» (As Raízes do Futuro, Porto, Brasília Editora, 1983, p. 45). 4 Jaime Franco considera que a ciência não consegue «penetrar os mistérios do homem» e que «avança em tudo, menos no conhecimento do nosso próprio ser» (Os Avisos do Destino, Porto, Brasília Editora, 1980, pp. 334, 335). 5 «Pois no sonho que todos andamos sonhando, em que se revelava a sua doença? Em saber que tudo, na vida, é inconsistente, falso, irreal, como nos sonhos sonhados dentro do próprio sonho da vida. Era esta sabedoria que ele iria pedir ao médico para curar? Era o desenvolvimento do senso do cómico, ou a atenção que propicia a visão do minúsculo, - relacionados com tal sabedoria? Naturalmente, pois, renunciara o nosso amigo Silvestre a visitar qualquer especialista. Coitados dos especialistas!». 6 Num outro conto de Há Mais Mundos, “Os Paradoxos do Bem”, pode ler-se a seguinte passagem: «Não sabes que vives, que vivemos, em vários planos, como numa casa de vários andares...? Cada plano tem a sua verdade; cada andar os seus habitantes. Uma obscura harmonia os relaciona. Mas às vezes baralham-se os planos, os andares, as verdades, os habitantes, foge-nos a unidade de tudo isso, e, por excesso de razão, o pobre homem por demais rico é arrastado nessa vertigem, considerado como tendo perdido a razão...» (Há Mais Mundos, ed. cit., p. 160). 7 «O próprio amor da ciência, que parece devera ser continuamente progressivo, dir-se-ia impedir muitas vezes os sábios – certos sábios – de se aventurarem em qualquer inquietante região. Dir-se-ia que, para estes, ciência é só o já feito; ou em vias disso, quando muito. (...) Por um lado me parece então possível não se incompatibilizarem com uma atitude mística, ou religiosa, certas inclinações e atitudes vulgarmente consideradas suas antagónicas.» (“Introdução a uma

candeio

Absoluto elevando-se a Si Próprio e vice-versa, independentemente de qual dos pólos seja o Criador e qual a Criatura, apenas sabendo que ambos se fundam num só princípio, numa só entidade.

Obra”, in Poemas de Deus e do Diabo, Porto, Brasília Editora, 1972, p. 119). 8 É assim que se designa, em Os Avisos do Destino, o mundo pessoal de Lèlito (Os Avisos do Destino, ed. cit., p. 103). 9 «Senhora Dona Ciência, o seu nariz é curto. E os seus olhos não vão mais longe que a ponta do seu nariz: As descobertas... não foram feitas por si. Os seus códigos são provisórios - como sabe. As suas explicações não provam nada, porque de resto nada se prova. E o pior é que nem explicam!» (Páginas de Doutrina e Crítica da “presença”, ed. cit, p. 93). 10 Noutro artigo afirma Régio o seguinte: «Pela moralidade intrínseca já apontada na obra de arte, - a arte redime tudo em que toca» (Páginas de Doutrina e Crítica da “presença”, ed. cit., p. 103). 11 Num outro artigo da Presença, Régio define o pensador como aquele «cuja interrogação já é uma resposta, e cuja resposta ainda é uma interrogação» (Páginas de Doutrina e Crítica da “presença”, ed. cit., p. 111), o que se pode perfeitamente aplicar a si próprio, mantendo este caráter aberto e hipotético das soluções alcançadas.

BIBLIOGRAFIA

Merleau-Ponty (1986). Elogio da Filosofia. Lisboa: Guimarães Editores. Régio, José (1982). Jogo da Cabra Cega. Porto: Brasília Editora. ______ (1986). O Príncipe com Orelhas de Burro. Porto: Brasília Editora. ______ (1977). Páginas de Doutrina e Crítica da “presença”. Porto: Brasília Editora. ______ (1973). Há mais Mundos. Porto: Brasília Editora. ______ (2000). Páginas do Diário Íntimo. Lisboa: Imprensa NacionalCasa da Moeda. ______ (1983). Confissão dum Homem Religioso. Porto: Brasília Editora. ______ (1937). “Sobre o «Eu» e o Mundo”, in Seara Nova, n.º 528, Ano XVII, Lisboa, 25 de Setembro de 1937, pp. 464, 465. ______ (1978). Biografia. Porto: Brasília Editora.

(imagens) Ponte, António (coord.) (2006). José Régio. Casa de José Régio. Câmara Municipal de Vila do Conde. Novais, Isabel Cadete (org.) (1999). José Régio e os Mundos em que Viveu. Catálogo da Exposição. Lisboa: IN-CM.

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1. poeira de água salgada arrastada pelo vento na direção da praia; cheiro que exala da vasa do mar; por extensão, o cheiro que vem do mar; 2. barulho do mar, marulhada

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MINIMAMENTE MÁXIMAS João Fidalgo

Docente de Português

Sem folhas perenes erguidas e folhas caducas caídas, o outono é mono. Alicário de Metiles dixit e tinha razão. Nas sombras, há sóis que queimam e malmequeres que giram. Agafestos de Antioquia dixit e tinha razão. Quem vive na borda da vida não lhe saboreia o néctar central, feito de luz e aguardente de medronho. Miguel soalheiro é só dinheiro, S. Miguel chuvoso, Natal piolhoso. S. Carlos Borromeu dixit e tinha razão. (Os farmacêuticos gostam que haja chuva no S. Miguel, porque, no final do ano, consolam-se de vender Quitoso.) Porque é que as pessoas têm duas orelhas e só excecionalmente dois narizes: o nariz nariz e o nariz empinado? Quem não puder assobiar que faça o pino. Desvia as pedras que te atravancam o caminho e olha o mar a partir do farol do Guincho na companhia da lua cheia a descair para o quarto minguante. A raiz da aorta não deve medir mais de 39 milímetros... Na palma das mãos corre o teu destino, mas, se não fizeres por ele, bem te lixas. Antíbio (cigano grego do século II a.C.) dixit e tinha razão. (Tradução livre do grego da autoria de JF) Por caminhos vicinais, o menos transforma-se em mais. Madre Teresina de Alenquer (séc. XVII) dixit e tinha razão. Ó Rosa, arredonda a saia, mas com cuidado para que ela não caia e seja uma pouca vergonha. Mário Sanhudo, etnólogo luso do século XVIII, dixit e tinha razão. Como dizia S. Carlos Borromeu, quem tem dinheiro destrocado não amealha bocado. No aluguer da vida se vê quem são os inquilinos da existência.

POESIA

A poesia está em tudo, Ela não é rara como parece, Até na boca de um mudo A poesia acontece. A qualquer hora, A qualquer instante, Desabrocha a poesia; Embora não parecendo importante, Ela é fonte de harmonia. É capaz de transformar Uma profunda tristeza Numa sensação de alegria Graças à sua imensa beleza. A poesia Não é mais do que o dom De quem cria, De quem é exigente, De quem faz uma melodia Abordando o mau e o bom, Consoante o que sente.

A poesia acontece Na coisa mais insignificante, Um olhar, um gesto, Tudo se torna importante, Sendo ela o manifesto. Uma carícia, Um beijo, Uma ingénua malícia, Um malicioso desejo. Poesia é também Liberdade de expressão Que ao ser lida Deve deixar a oculta sensação De que algo a mantém. Que não será esquecida, Que emergiu da alma e do coração. Enfim… foi sentida. Poesia? São palavras com magia. Pedro Miguel Silva Ex-formando do CNO-Antuã (Nível Secundário)

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TAMBÉM EU, CESÁRIO Dez da manhã! Passam pessoas, Sem olhar, algumas a falar, Outras que nem se lembram se Falamos em figuras importantes. Os antigos invocaram as Musas! Nós invocamo-nos a “nós” mesmos. Na Grécia Antiga eram nove as Musas, Na vila de Salreu inspira-nos o seu Visconde! Hoje mesmo ligado a uma banda de Músicos. Sal com fartura da Ria de Aveiro. Antigo! Eternizado em estátua! Inspira-nos. É ducalmente esplêndido! Todos os valores antigos Podem ser disputados e hoje Lembrados. Doze da manhã! Passam pessoas, Sem olhar, algumas sem falar, Outras que se lembram, se Falarmos em figuras importantes. É hoje! Entro na Associação, Assumo o meu papel ao balcão Entre mãos de incógnitos e Pés de desconhecidos! Caras e sensações de seres humanos que não se conhecem. Uma da tarde! Pessoas passam, De olhos fechados, sem falar! Outros que se lembram, se falarmos Em tudo o que nos rodeia. Come-se sem fome, Sente-se sem sentido, Vive-se sem viver. Já passa das cinco horas! Passam pessoas! Sem olhar! Sem falar! E há outras que se lembram e as olham

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Na volta, com saudade, E aos bordos sobre as pernas! Cantam, de braços levantados, uns tristes bebedores. É de noite! Ela cai, esmaga. Nos Passeios da calçada, estão A crescer, sem estrofes de ferrugem, Ervas de nome desconhecido São pisadas, ignoradas, Tudo acaba! Mas tudo cansa! Apagam-se as luzes em algumas fachadas, e Ligam-se as televisões, que iluminam as fachadas. Marcam a Guerra e as fortunas de vários, Temem o presente e fazem Com que nada lhes aconteça, Temem o futuro e fazem Previsões do tempo. Marcam o poder de compra, É menos económico! Tudo passa pelas mãos de marca, Tudo é político, Tudo é de fora. Face ao desemprego, pessoas Lutam! Fazem com que tudo comece de novo, Mas … É tudo uma nova vida. Recorda-se no Presente E vive-se com a memória Dos Grandes! Ana Cristina. 12.º L


Poemas realizados no âmbito da introdução ao Texto Poético/Texto Lírico, na disciplina de Língua Portuguesa, com a professora Etelvina Soares.

ESTA PALAVRA

SER UM ANJO

Esta palavra é um amigo. Aquela palavra é uma árvore.

Eu queria ser um anjo, Um anjo que guarda, Um anjo que protege. Quebrando todas as barreiras para ser Apenas um anjo. Mas não é permitido a um anjo Amar uma única pessoa Não é permitido a um anjo Chorar por todas as pessoas Que anjo poderei eu ser? Que amor poderei eu dar? Que olhos ir-me-ão ver? A quem irei eu amar? Eu queria tanto ser um anjo Ter a bondade nas faces A sabedoria no olhar Saber sorrir, Saber confortar, Saber entender, Saber ensinar. Ser…. Um anjo qualquer! Um anjo comum! Só queria ser um anjo.

Esta palavra é uma pedra. Aquela palavra é fogo. Esta palavra é o mar. Aquela palavra é uma arte. Esta palavra é uma melodia. Aquela palavra é um grito. Esta palavra é o sol. Aquela palavra é a água. Esta palavra é uma brisa. Aquela palavra é uma ventania. Esta palavra é um sonho. Aquela palavra é um pesadelo. Esta palavra é um vulcão. Aquela palavra é uma pessoa. Esta palavra é a que eu quiser. Aquela palavra é a que eu sonhar. Ana Madalena Miranda. 7.º A

Inês Macedo. 7.º A

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OS TRÊS ANDARES

Trabalhos de escrita criativa realizados no âmbito da disciplina de Português (Módulo 9), com a professora Teresa Bagão «Os três andares. (argumento) Um edifício tem três andares e em cada um dos andares vivem pessoas igualmente válidas. No primeiro andar, com algum estilo, um homem, a sua mulher e uma criada. No segundo andar, de estilo algo inferior, um homem, a sua mulher e filha. No terceiro andar, de estilo baixo mas velho, um homem velho com a sua velha governanta. (A ideia é reproduzir a mesma cena, com as devidas variações, nas três histórias e fazer três fugitivos encontrarem-se à porta da rua, quando pretendem ir embora – ou algo semelhante) regressam encharcados da chuva.» Patricio Ferrari e Claudia Fisher (org. e trad.) (2011). Fernando Pessoa. Argumentos para Filmes. Obras de Fernando Pessoa. Nova Série. Lisboa: Ática/ Babel. p.74.

Era hora de jantar num edifício com três andares, onde habitavam três famílias, uma em cada andar. No primeiro, morava o Alberto, um homem elegante, com boa posição social, e muito simpático; a sua mulher, Ana, loira, olhos azuis, muito arrogante; ao contrário do marido, não era nada simpática. A criada que eles tinham é que não gostava da patroa, tal como os vizinhos dos andares de cima. Todos comentavam que tratava mal o marido e a criada. No segundo andar, viviam três pessoas: o João era gordo, moreno, a sua mulher, igualmente morena, e a filha deles, uma adolescente de 16 anos, muito conflituosa e desobediente. O terceiro andar era habitado por um velho e a sua governanta, também velha, pessoas recatadas, que quase nem saíam de casa. A Ana mandava a criada servir o jantar: – Maria, sirva o jantar, sem demora! – Tenha calma, minha senhora. Então Ana, virando-se para o marido, reage: – Tu não fazes nada? Não ouviste como ela me respondeu? A criada pensava como o patrão era paciente… – Então, de que está à espera? Sirva! – ordenou a mulher. A criada serviu o jantar. No andar acima, também começavam o jantar. A mulher serviu o marido e depois a filha, Catarina. – Queres mais, filha? – Se eu quisesse mais pedia, não achas? – protestou Catarina, com arrogância. – Catarina, fomos à escola e a professora disse-nos

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que tu andavas a faltar. Já conversei sobre isto com a tua mãe. – Lamentamos, mas vais ficar de castigo! Catarina, que estava a pensar em fugir de casa (até já tinha a mala feita), decidiu que fugiria logo a seguir ao jantar. – Não posso fazer nada, estou sempre de castigo! Detesto-vos! - ripostou. – Mas filha… Nós só queremos o melhor para ti, e para isso tens de te comportar bem. – disse a mãe. E fala baixo, que até os vizinhos te ouvem! Enquanto a acesa discussão continuava, no andar de cima, o velho e a governanta estavam a jantar silenciosamente, como era costume naquela casa. Quem quebrou o silêncio foi a governanta: – O senhor não tem filhos, só me tem a mim e eu a si, porque não se casa comigo? O velho, que não gostava destas constantes pressões da governanta, sabia muito bem que ela só queria ficar com o seu dinheiro, e isso ele não deixaria nunca. Então, inventava desculpas. – Eu já sou muito velho para me casar. – Não é nada velho, ainda é um homem forte. – tentava ela persuadi-lo. Ele levantava-lhe um olhar furioso. Agora diria tudo o que tinha a dizer! – Eu sei muito bem o que tu queres! Queres o meu dinheiro! Mas isso eu nunca permitirei. Já estou farto das tuas pressões! Sem resposta, a governanta levantou-se bruscamente e foi para o quarto. O velho, então, começou a imaginar como poderia livrar-se da governanta e teve uma ideia: – É isso! Vou fugir desta casa e trato de doar tudo o que é meu a uma instituição de caridade. Foi para o seu quarto fazer a mala. No primeiro andar, acabavam agora de jantar, depois de mais esta discussão que a mulher armava sempre com Alberto. Nos pensamentos dele, já pairava a ideia de se divorciar, mas sabia que não ia ser fácil. Optou por algo mais radical. Fugir. No segundo andar, os pais da Catarina foram para o quarto e ela viu aí a sua oportunidade. – É agora! – exclamou.


Foi buscar a mala ao seu quarto e, sem pensar nas consequências, saiu de casa. Ao entrar no elevador, depara-se com o velho, também com uma mala. – Vai viajar, Sr. Manuel? – Não, minha filha, sabes, estou farto de certas companhias… Sempre a ouvir as mesmas coisas… – Olhe, que coincidência, eu também! Estou cansada dos castigos dos meus pais! Desceram e, quando chegaram ao primeiro andar, encontraram Alberto a sair de casa, também com uma mala. – Não nos diga que também vai… fugir de casa? – perguntaram os dois. – Como é que acertaram? – É fácil! Olhando para tanta mala! - respondeu a Catarina. – Olhem, então vamos os três juntos. Passado cinco dias, regressam ao prédio. Vinham completamente molhados e os três juntos, tal como saíram. André Pereira, 12.º M

Num prédio de três andares, em Lisboa, moravam várias famílias. No primeiro andar morava um homem com a sua mulher e uma criada, no segundo andar, morava um homem com a sua mulher e a sua filha, e, no terceiro, um velho com uma governanta. O prédio tinha mau aspeto por fora, com as paredes aos buracos, a cair aos bocados, janelas com vidros partidos, o telhado com remendos de plástico preto para a chuva não entrar. Para além disso, os moradores andavam sempre ao barulho, o que fazia mesmo com que o prédio tivesse um ambiente

horrível. O terceiro andar era o mais sossegado deles todos. No primeiro, a mulher desconfiava que o seu marido tinha um caso com a sua criada; ele andava sempre a discutir com ela, tratava-a muito mal, só lhe faltava bater. E para a criada era sempre muito carinhoso, dava-lhe dinheiro extra, o que fez com que a mulher desconfiasse dos dois. No segundo andar, a filha andava sempre a discutir com os pais, porque queria dinheiro. Os pais davam-lhe vinte euros por semana, o que não chegava para ela, porque fumava e bebia, e, como era maior de idade, os pais não lhe queriam dar mais dinheiro, devido a ela não querer trabalhar para se sustentar. Numa reunião de condomínio, o velho apareceu todo bem vestido, logo houve uma série de trocas de olhares entre ele, a filha do segundo andar e a mulher do primeiro andar. Ambas pensavam que ele era rico, o que ia resolver os problemas das duas. A do primeiro andar ia deixar o marido, assim livravase das discussões e viveria como queria. A filha do segundo andar escusava de estar sempre a ouvir dos pais, por eles não lhe quererem redobrar a semanada. Durante a semana seguinte, as duas iam metendo conversa com o velho, quando se encontravam na porta do prédio. E tudo começou a encaminharse. Um dia, farta de discussões e também para ver se o dinheiro do velho lhes vinha parar às mãos, combinaram fugir os três, a mulher, a filha e o velho, mal acabassem de jantar. E, como combinado, depois do jantar, encontraram-se todos à porta do prédio; pouco falaram para não levantar suspeitas, e lá foram eles. Enquanto o velho tinha dinheiro, foi tudo à grande, era hotéis de luxo, spa, restaurantes, lojas, enfim, a vida que qualquer pessoa queria ter. Mas como o velho não era rico como elas pensavam, rapidamente o dinheiro acabou. Para não darem o braço a torcer e voltar para casa, arranjaram um sítio abandonado para ficarem a dormir. Esse sítio era assustador, tinha o telhado a cair, as paredes caiadas de branco também a cair, o soalho com buracos, chovia muito lá dentro. Ainda tentaram aguentar lá um tempo, mas, como chovia muito, viram-se obrigados a voltar para

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casa. E assim o fizeram, um de cada vez para ninguém desconfiar de nada, voltaram a casa todos encharcados da chuva. Nuno Almeida, 12.ºM

A mulher do primeiro andar é irmã gémea da mulher do segundo andar, a qual é neta da velha governanta do terceiro, existe uma pequena familiaridade entre estas três pessoas dos três andares diferentes, mas elas não comunicam umas com as outras, apenas se encontram como se fossem umas vizinhas normais, que não sabem da vida umas das outras. No primeiro andar, a criada encontra-se, como habitualmente, a fazer limpeza, a mulher, Ivone, encontra-se sentada no sofá, ao lado de uma pequena janela, de onde pode desfrutar duma paisagem deslumbrante. Neste preciso momento, chega o marido Carlos, que trabalha num escritório na área da gestão de empresas, pousa a sua mala, pendura o casaco e desloca-se até Ivone, uma linda mulher de longos cabelos loiros, alta, de pele rosada, que passa os dias sem trabalhar. O marido já a interrogava há uns meses sobre qual seria a razão de não arranjar um emprego, pois Carlos queixava-se que qualquer dia teria de despedir a empregada, visto que o dinheiro não chegava para todas as despesas. Nesse mesmo momento, entra a criada e escuta a conversa, interroga-os se iria ser despedida, mas estes não repondem, pois foram apanhados de surpresa. A criada, indignada, sai a correr pela porta. No segundo andar, o casal conversava bruscamente com a sua filha Rita de dezoito anos, pois esta era um pouco problemática na escola, e os pais não aceitavam bem a relação que a filha tinha com um rapaz de lá. Rita já namorava há algum tempo, até já tinha iniciado a sua vida sexual com o namorado, mas os pais não sabiam, nem sequer desconfiavam. A situação torna-se mais complicada quando os pais descobrem que Rita estava grávida e a confrontam com o problema, pois esta devia ter-lhes contado e não ter feito “asneiras” – na visão dos pais, ainda era uma rapariga nova, não sabia nada da vida, não tinha idade para construir uma família. A jovem, ao ser confrontada com a situação da gravidez, fica revoltada, visto que os pais só lhe apontam o dedo em vez de a ajudarem. Rita decide então fugir de casa, enquanto os pais dormissem – ainda bem que se deitavam cedo…

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O andar do edifício em que parecia estar tudo mais calmo era onde habitava a avó das gémeas do segundo e do terceiro andares, a governanta do velhinho Sr. Rui. Poucos sabiam mas há anos que formavam um casal. Tinham ambos alguma idade, mas mesmo assim pareciam um casal de namorados dos dias de hoje. Raramente discutiam, mas nesse dia parecia que o edifício tinha sido enfeitiçado por uma bruxa, em todos os andares acontecia sempre alguma coisa e aquele não seria exceção. Gera-se uma discussão entre eles e por um motivo um pouco invulgar, pois a governanta tinha pedido a Rui para comprar pão, mas este já estava cansado, depois de um longo dia, disse-lhe que na manhã seguinte iria à padaria, e continua a descansar na sua cadeira de baloiço. Então, sai ela porta fora, zangada e contrariada. Na porta do edifício, depara-se com Rita e com a criada de Carlos. Carlos tenta ligar à criada várias vezes, até que finalmente esta atende, depois de tanto insistir, pede-lhe delicadamente muitas desculpas e para regressar, pois, como Ivone não sabia cozinhar, aquela casa sem ela não seria a mesma coisa. A empregada acaba por aceitar voltar para casa do “patrão”. Enquanto Rui, o velhote do primeiro andar, sai de casa a correr atrás da governanta, com receio que ela se constipe, ao frio. E ainda o pai de Rita, a descer pela escadaria abaixo, todo preocupado com a filha e, claro, com o netinho que viria a caminho. Desencontram-se… Os três fugitivos, entretanto, regressam todos encharcados da chuva que começara a cair, naquele dia de Inverno! Sofia Barbosa, 12.º L

1981. Um prédio em Lisboa com três andares. Vizinhos muito distintos. A família do primeiro andar era muito conflituosa. Um dia, o homem, no meio de uma discussão com a mulher, agrediu-a e ela saiu porta fora a chorar. No mesmo instante, no segundo andar, a mãe pediu à filha para ir buscar pão à mercearia da rua, ao mesmo tempo que a velha governanta do terceiro andar foge de casa do velho, porque estava farta de cuidar dele. À porta do prédio, encontraram-se os três vizinhos, a mulher do primeiro andar, que tremia por todo o lado, a filha do segundo andar, que ia a ouvir música, e a velha governanta, que ia toda contente, mas


desconfiada com aquele encontro inesperado. Num instante, os três seguiram o seu caminho. A mulher do primeiro andar estava tão transtornada que precisava de ir apanhar ar, então, foi ao parque perto de casa, apreciar as floreiras, as árvores e o ar puro, o melhor para respirar e pensar melhor na sua decisão. A filha do segundo andar gostava muito de ir à mercearia, pelo caminho via muita gente conhecida e cumprimentava-a. Ali, a certa altura, olha para a vitrina da mercearia e vê a velha governanta, com as suas malas; imediatamente, a menina agarra no saco do pão com muita pressa e vai atrás da velha. No céu, iam aparecendo umas nuvens muito carregadas, que cobriam a grande Lisboa. Com a cabeça mais fria, a mulher tristonha caminhava vagarosamente pela rua, até que começa a cair uma chuva infernal e não tem como se abrigar. No outro lado da rua, a menina recolhe-se debaixo de um coberto de uma loja. A chuva veio para ficar. Nesse mesmo instante, a velha abre o guardachuva, vai pensando na sua vida sem o pobre velho, sem o seu carinho e sem a sua companhia. Vira suavemente para trás, mas, ao voltar para o prédio, o seu guarda-chuva voa com uma rajada de vento e, desesperadamente, com as malas na mão, vai ficando toda molhada. A mulher do primeiro andar chega ao prédio toda molhada e à porta estava o seu marido à espera, com uma manta.

A chuva para e o sol começa a brilhar, como se uma luz estivesse a indicar o caminho à governanta que, com as malas, sobe até ao terceiro andar. Ao mesmo tempo, a menina do segundo andar corria rua acima, entrando pela porta do prédio a correr, com o saco do pão, toda encharcada. José António Matos, 12.º M

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ALGURES EM LONDRES

Concurso de Fotografia (março/abril 2012) O mote foi dado: English everywhere in London (captado pelo olhar e eternizado pela camera). O desafio foi aceite, com garra e com máquina e, a toda a hora e em qualquer lugar, durante a visita de estudo, os alunos paravam e disparavam em terras de Sherlock Holmes, na tentativa de obterem o melhor shot, com o desejo de trazerem consigo as melhores imagens e ambientes com que Londres nos delicia o olhar, nos refresca a mente e revigora a alma. O júri, constituído pelas professoras de Inglês acompanhantes dos alunos na visita de estudo, e pela professora Cláudia Carvalho, decidiu atribuir as seguintes classificações: 1.º classificado - Jessica Ferreira (11.º B) 2.º classificado – Ana Brandão (Escola E.B 2,3 da Murtosa) 3.º classificado – Diogo Silva (11.º B)

Jessica Ferreira - “Big things have big eyes” (London Eye)

Cláudia Carvalho Elsa Machado Eulália Gomes Glória Silva Docentes de Inglês

Diogo Silva - “The lights before the blackout”

Ana Brandão Important Underground Message This picture was taken in a London underground on 30/04/2012. The message that is seen on the picture was written by the Mayor of London. It can be seen in most London undergrounds and subways. I chose this picture for this contest because something that I learned about London, while I was on the trip, was how much British people care and respect the environment. It is very rare to see garbage on the floor and there are bins everywhere. I think this is a very important factor to the environment and I think these values should be followed by other countries, including Portugal. It helps our planet.

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Concurso de fotografia da ESE - fotografias selecionadas e premiadas em ediçþes anteriores -

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altura de água entre a superfície e o fundo

duas águas


APRENDER, COOPERAR E PARTILHAR Fátima Alçada e Teresa Amaral Equipa Projeto ACP

Igualdade de oportunidades e sucesso, mais do que conceitos e linhas orientadoras das políticas educativas atuais, exige-se que sejam cada vez mais objeto de clarificação, nomeadamente daquilo que lhes está subjacente, daquilo que implicam, das mudanças necessárias para a sua obtenção. Hoje, cabe à escola um importante papel de socialização, instrução, educação e formação de uma sociedade democrática, daí a necessidade cada vez maior de uma transformação de práticas e (re)descoberta de novos caminhos, a fim de se poder assegurar uma formação de base para todos os alunos. É bem evidente que a escola não pode resolver as desigualdades sociais existentes; pode, contudo, contribuir para as minorar, tendo em consideração as diferenças iniciais, e para tentar compensálas através de estratégias diferenciadas, que possam levar os alunos a adquirir os mesmos instrumentos, conhecimentos e competências. Mas educar passa também por integrar, pela aquisição de comportamentos, pela reformulação de atitudes face aos outros e ao mundo que nos rodeia. Foi com base neste espírito que surgiu o projeto ACP – Aprender, Cooperar e Partilhar. Este projeto consiste na implementação de um sistema de interajuda entre alunos, numa linha de estratégia que implica um método de ação participativo e solidário, tendo em vista o estabelecimento de objetivos de comum acordo, em que um aluno mais velho (mentor) e mais experiente serve

de guia e orientador a outro mais novo, podendo dar-lhe apoio sistemático semanal ou pontual em domínios como o absentismo, desmotivação, fraca autonomia no estudo ou problemas de integração na escola, e as novas exigências de ciclos de ensino. Neste âmbito, é trabalhada mentora Ana Patrícia Silva e João Silva não só a vertente académica, mas também o domínio do relacionamento interpessoal. Os alunos envolvidos no projeto veem facilitada a sua adaptação à escola e estabelecem redes afetivas e de solidariedade, reforçam a auto-estima, partilham conhecimentos, habilidades e técnicas de estudo. SentemFilipa Almeida (esq.ª) e mentora Ana Margarida Silva se mais estimulados para a aprendizagem e desenvolvem o sentido de responsabilidade social. O projeto enquadrase no âmbito do Projeto Educativo da Escola Secundária de Estarreja, ao pretender “proporcionar múltiplas oportunidades de aprendizagem, promover a cidadania, mentora Soraia Silva (esq.ª) e Hugo Guiomar a prevenção de comportamentos de risco e o desenvolvimento de competências cívicas”. As atividades desenvolvidas ao longo do ano passaram pela

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ajuda nas tarefas escolares (tirar dúvidas ou acompanhar na realização de trabalhos de casa), por conversas informais sobre dificuldades pessoais/escolares, ou simplesmente pelo apoio e companhia aos mais isolados. Todo o trabalho desenvolvido na seleção e formação dos alunos mais velhos, despiste e encaminhamento dos alunos mais novos, acompanhamento dos grupos formados, esteve a cargo das responsáveis pelo projeto, psicóloga Fátima Alçada e professoras Teresa Amaral e Elisabete Gonçalves. A adesão ao projeto foi muito significativa, com a inscrição de 25 alunos do secundário que se voluntariaram para apoiar os mais novos, o que superou largamente as expectativas iniciais. Estudos e experiências recentes têm demonstrado as vantagens destes programas, tanto para os mentorados como para os próprios mentores, no sentido de fomentarem nestes últimos a colaboração, o espírito de voluntariado e, ainda, possibilitarem uma maior reflexão crítica sobre os seus próprios processos de aprendizagem e de relacionamento intra e interpessoal. Esta foi também a conclusão a que chegámos, após a avaliação final do projeto, que permitiu verificar a existência de um grau de satisfação muito elevado por parte de todos os implicados.

mentor Rui Pedro Sachse (direita) e Nelson Tavares

Mas educar passa também por integrar, pela aquisição de comportamentos, pela reformulação de atitudes face aos outros e ao mundo que nos rodeia.

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mentor Flávio Carvalho (esq.ª) e Diogo Ferreira

Francisca Pinto Moutela (esq.ª) e mentora Teresa Resende

mentora Carla Fonseca (esq.ª) e Nuno Sousa


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1. local onde se processa a primeira venda do pescado fresco; 2. no Furadouro: conjunto de rapichĂŠis de peixe que, tirado do saco da rede, era espalhado na areia, em forma circular


ESPAÇO VIVO! Etelvina Bronze Docente bibliotecária

Pé ante pé, espreito pela porta entreaberta, vejo um salão de baile e os operários dançam com as máquinas de alisar ou afagar o soalho… que bonita que ela está a ficar! Tento empurrar um pouco mais a porta para matar a minha curiosidade. “Sim? Deseja alguma coisa? Ah! Ainda não pode entrar”. Lá se foi o momento mágico: ver sem ser vista. “Desculpe! Mas sabe, eu…” A porta fechou-se e na garganta ficou preso o elogio ao espaço que iria ajudar a criar. Foram precisos mais quinze dias para que pudesse habitar aquele lugar. Habitar sim, pois não é habitar sentir-se no seu ambiente ideal? Povoar cada centímetro do espaço com aquilo que nós podemos dar de melhor, num determinado tempo? Assim foi crescendo, mês a mês: primeiro as mesas e as cadeiras (novinhas em folha), os poucos livros e revistas transportadas do contentor M14 e os já velhinhos computadores repescados e transformados por mãos hábeis. Era um gosto vê-la sair dos cueiros e começar a dar os primeiros passos. E os primeiros sorrisos foram aparecendo nos rostos que iam primeiro espreitando e, depois, ocupando a ritmo lento as cadeiras e as mesas. “Posso fazer os trabalhos de casa?”, “Será que tem um livro que fale de empreendedorismo?” Vem aquela vontade interior de corrigir de imediato: Os livros não falam! Mas a verdade é que os pequenos estão cheios de razão, porque, quando abrimos cada monografia, parece que existem mil bocas a contarem-nos biliões de coisas e nós deixamo-nos envolver por aquela magia de sonho e de conhecimento. Dia a dia ela ia tomando forma, elegante diga-se, e, qual modelo na passerelle, ia assimilando piropo a piropo: “É o espaço mais giro da Escola!”, “É um espaço nobre!”, “É fantástica!” Não se deixava envaidecer e ganhava a cada mês uns elementos novos: as estantes que, a pouco e pouco, se vão preenchendo, novas mesas, novas cadeiras, sofás, a sinalética, mais computadores e mais documentos… e ouviam-se novos elogios, também dos discentes que ganhavam o espaço e que o preenchem agora até à exaustão. Está quase pronta a nossa menina… digo, senhora! Cresceu, tomou o seu lugar e já tem asas para voar. O seu primeiro voo, ainda tímido, aconteceu no início de dezembro, lançou-se, em parceria com uma livraria de Estarreja, na sala polivalente e durante uma semana pairou sobre a Feira do Livro com a ajuda dos docentes de Português e Francês. Seguiram-se exposições, palestras, colóquios, aulas de apoio, aulas de pesquisa e tantos outros pequenos adejos que a fizeram amadurecer e sentir-se pronta para outras aventuras. As façanhas continuaram durante todo o mês de março, quando o concelho de Estarreja assinalou o início do Mês da Leitura. No dia 1 iniciou a sua saga em prol dos livros e, qual andorinha, lá andou a espalhar a primavera pela Escola: O Principezinho saiu às 9:15 da sua estante, e foi pelas mãos dos alunos percorrendo os vários espaços da Escola até chegar às 18:25 à Direção. Que bonito, a leitura passeou na ESE! Mas não ficou por aí: a leitura saiu à rua no dia 21 de março, assinalando o Dia da Poesia e vagueou, na voz dos alunos do 9.º B, por espaços públicos da cidade de Estarreja. Entretanto, nas semanas anteriores,

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Se pensam que esta senhora está afadigada, enganem-se, pois até que haja quem precise dos seus préstimos, ela estará lá de portas abertas a desfilar na sua elegância e a revelar os seus documentos.


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tinha fomentado workshops de animação para duas turmas do ensino profissional, pelas mãos de Ana Patrícia Mendes, e de promoção da leitura pela voz de Margarida Bandeira, dirigidas a todas as turmas do 8.º ano. Recebeu as turmas de 9.º ano no dia 15 de março, na realização do Peddy Paper das Letras, e as de 7.º no dia 20, oferecendo-se para que estas aplicassem os seus conhecimentos de utilizadores no jogo Caça ao Livro. Que mês! Ufa! Mas se pensam que esta senhora está afadigada, enganem-se, pois até que haja quem precise dos seus préstimos, ela estará lá de portas abertas a desfilar na sua elegância e a revelar os seus documentos. Depois do encerramento da exposição de trabalhos elaborados pela turma do 9.º F sobre a obra de José Saramago, O Conto da Ilha Desconhecida, preparou-se para servir de casa a mais duas exposições: “Devaneios”, de Ana Patrícia Mendes, e “Acordo Ortográfico”. Sempre em atividade, é o lema desta senhora que dá pelo nome de BIBLIOTECA ESCOLAR e que tem como finalidade principal incentivar o espírito inovador através da leitura, da cultura e da investigação, com o objetivo de desenvolver uma consciência crítica e criativa, de modo a alicerçar um futuro com mais oportunidades.

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ESE EM CONTEXTO EUROPEU Paulo Neves

Equipa de docentes coordenadores do projeto

Dezanove alunos dos cursos profissionais de Técnico de Gestão e de Animador Sociocultural que frequentaram o 12.º ano, em 2010/2011 e em 2011/2012, realizaram com sucesso estágios internacionais financiados pela União Europeia, no âmbito do programa Leonardo Da Vinci. Os principais objetivos que o projeto procurou alcançar foram a partilha de conhecimentos, de processos e métodos de trabalho entre os jovens e as organizações recetoras, a aprendizagem de novas práticas profissionais que permitissem despertar a criatividade, a inovação e o empreendedorismo. Procurou-se, igualmente, desenvolver capacidades profissionais que concorram para a integração dos alunos no mercado de trabalho a nível nacional e no espaço europeu, na senda da mobilidade preconizada pela União Europeia. Puderam estes alunos desenvolver competências de teor linguístico-comunicativo, comparar práticas, métodos, instrumentos e processos dentro das suas áreas de formação. Contactaram com o modus operandi/ know how técnico de outras realidades socioculturais e despertaram para o desenvolvimento de uma cidadania democrática e europeia.

Trata-se de efeitos a longo prazo que se revelam úteis, numa lógica macroestrutural, na perspetiva de uma evolução contínua da nossa economia.

Os temas de trabalho desenvolvidos, para além dos transversais, implícitos nos objetivos supra, prenderam-se com as áreas de formação dos participantes no projeto, alunos do 12.º ano de escolaridade nos cursos profissionais de Técnico de Gestão e de Animador Sociocultural. Este projeto previa (e concretizou-se em) dois fluxos, o primeiro, em 2011, composto por dez participantes, e o segundo, em 2012, formado por nove. Em ambos os fluxos, os participantes foram distribuídos pelos destinos Sevilha (Espanha) e Plymouth (Inglaterra). Tal como foi planificado, os períodos de formação em contexto de trabalho foram desenvolvidos em seis semanas por fluxo, um período que se revelou suficiente para permitir alcançar os objetivos. Os estágios foram realizados em empresas comerciais (fins lucrativos), mas também em organizações não lucrativas, como Câmaras de Comércio e Indústria. Curiosamente, dois estágios foram realizados num Tribunal em Plymouth. A organização que mais estagiários recebeu foi a reputada empresa “Isla Mágica”, em Sevilha, que recebeu 7 estagiários (no conjunto dos dois fluxos), todos do curso profissional de Animador Sociocultural. Os nossos jovens alunos ficaram alojados em famílias de acolhimento, que lhes proporcionaram também as refeições diárias. Além disso, os alunos receberam uma bolsa do programa que lhes permitiu fazer face a outras despesas de subsistência. Durante a estadia, realizaram também algumas visitas culturais e assim puderam conhecer um pouco mais das cidades que os receberam. Os benefícios alcançados pelos participantes são por demais evidentes, quer nas avaliações qualitativas e quantitativas alcançadas, quer

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expressos nos seus depoimentos e nos ganhos de experiência pessoal e profissional obtidos. A validação das competências foi conseguida quer pelos EUROPASS, quer pela classificação atribuída a cada participante, uma vez que estas 6 semanas de formação em contexto de trabalho foram parte integrante do desenho curricular do curso e a sua avaliação quantitativa é tida em conta na fórmula de cálculo da classificação final. O documento “caderneta de estágio” que acompanhou cada estagiário incluiu uma folha de presenças e uma avaliação qualitativa e quantitativa da prestação de cada um. Tal como previsto na candidatura, foram adotados procedimentos de validação de forma a assegurar o reconhecimento das capacidades e competências adquiridas, que se traduziram em “certificados de frequência de estágio” entregues aos participantes. As expectativas relativas aos resultados da execução deste projeto não foram defraudadas, na medida em que o transfer de conhecimentos, práticas profissionais e competências que


“Que experiência!”, são as palavras que saem da minha boca quando me perguntam como correu o estágio em Inglaterra. Isto porque foi algo fantástico, incrível e único! Plymouth é um lugar calmo e enorme, cheio de beleza e com muitas coisas para descobrir. Pessoalmente, não me arrependo de ter escolhido Inglaterra, pois é um país bastante rico em cultura e bastante acolhedor. Ter estagiado longe de casa fez-me amadurecer um pouco, pois fui obrigada a tomar decisões sozinha e a integrar-me num meio social que não conhecia. Como me diziam, tenho de abrir a minha mente para novos horizontes. Às pessoas que para o ano tenham a mesma oportunidade, dou um conselho: escolham este destino, pois é “AMAZING”! E, se não querem escolher Inglaterra por causo da língua... esqueçam! Podem não ser uns experts na língua, mas lá o vosso inglês melhorará bastante, se se esforçarem um pouco! Sancha Silva A duração de 6 semanas deste estágio internacional foi muito rentável e muito vantajosa, não só para uma vida futura no mundo do trabalho, mas também a nível pessoal. Neste tempo, foi possível viver diferentes situações, desde a adaptação a uma diferente maneira de viver até ao à-vontade que se começou a ter para falar com os ingleses. O que mais me fascinou foi a maneira como é organizada uma empresa, completamente diferente do que aqui em Portugal se faz, a personalidade de todas as pessoas com quem tive o prazer de conviver e os hábitos que as mesmas têm, não só daquelas com quem convivi, mas de todas as pessoas em geral, porque os ingleses dão muita importância ao ambiente, à Natureza e àquilo que a mesma fornece. O que menos me fascinou foi a alimentação, principalmente ao almoço, mas ao jantar gostei de tudo o que a família de acolhimento servia. Quando tiver uma outra oportunidade, vou repetir a experiência! Sara Raquel

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resultaram da experiência beneficiaram todos os intervenientes, em particular os alunos envolvidos. Tais “ganhos” acabam por se disseminar junto das entidades empregadoras que, mais tarde, vêm a contar com estes colaboradores. Tratase de efeitos a longo prazo que se revelam úteis, numa lógica macroestrutural, na perspetiva de uma evolução contínua da nossa economia. No que toca às competências linguísticas, foi por demais evidente a aquisição de novas competências comunicativas, orais e escritas, e o aperfeiçoamento das já existentes.


102 deixar-se levar pela corrente ou vento

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“ESE – TALENTO EM MOVIMENTO” Rosário Santos

Docente de Contabilidade e Economia

As atividades artísticas, culturais e científicas são formas de linguagem fundamentais que devem garantir e ajudar os alunos a desenvolver modos imaginativos e criadores de fazer e de pensar, exercitando os seus modos de expressão e comunicação. Cumpre à Escola, também, educar de forma lúdica, libertando emoções, despertando talentos. Transforma-se, assim, num espaço rico de possibilidades e significados para o desenvolvimento dos alunos em todos os campos, tomando destaque todas as linguagens artísticas e culturais. A arte e a cultura significam a riqueza da própria vida! Sabendo que na Escola Secundária de Estarreja existem jovens de elevado talento ao nível das artes, performances, ciências e humanidades, muitas vezes sem possibilidade ou oportunidade para demonstrarem o seu valor, o concurso “ESE - Talento em Movimento”, promovido pelo Clube/Núcleo de Empreendedorismo da nossa escola, pretende não só descobrir e fomentar as capacidades e o talento desses jovens, como estimular o empreendedorismo pessoal, reforçando o sentido da Escola Inclusiva. Para a consecução deste compromisso, e no intuito de revelar e valorizar os talentos existentes na Escola, três empresas de sucesso de Estarreja e de Albergaria constituíram-se como as aliadas mais importantes neste propósito, tendo patrocinado este evento com excelentes prémios: para 1.º prémio, um cheque oferta do Grupo FRUTAS ERNESTO S.A. no valor de €250, reconvertido num cheque brinde da FNAC; para 2.º prémio, um telemóvel Samsung GT-C3330 Metalic Silver e uma máquina fotográfica Samsung S860 Black, da empresa AVEICELLULAR; para 3.º, um cheque brinde em produtos da empresa CARLOS SANTOS HAIR SHOP. De acordo com o regulamento do concurso, a sessão eliminatória decorreu no novo anfiteatro da Escola, tendo contado com um júri de qualificação que incluía dois elementos da Comissão Organizadora (Orlando Carvalho, Rosário Santos e Teresa Bagão) e com os professores Goretti Capela (Educação Tecnológica), Paula Vilasboas (Educação Visual) e Carlos Oliveira (Educação Física), que prontamente acederam ao nosso convite. A grande final, que definiria três premiados, aconteceu no dia 22 de junho de 2012, na ESE, num espaço ao ar livre, qual anfiteatro grego, transformando-se numa noite indiscutivelmente memorável, feita de momentos inesquecíveis, porque protagonizada por jovens incomparavelmente talentosos. Quatro apresentadoras do 8.º D, Ana Margarida Matias da Silva Alves, Beatriz da Silva e Cruz, Bárbara Tavares de Melo e Ana Miguel teixeira do Paço, participaram na elaboração do guião, sob orientação da sua professora Goretti Capela e, posteriormente, da Comissão Organizadora, guião esse que as alunas se disponibilizaram para preparar, estudar e ensaiar com afinco. Abriram, então, o espetáculo com toda a força exigida pela ocasião, irradiando alegria, harmonia e profissionalismo. Durante mais de duas horas de espetáculo, numa sequência eletrizante, salpicada de efeitos especiais, dezoito jovens alunos da Escola Secundária de Estarreja apresentaram-se perante um júri, no melhor das suas performances. A afirmação e o sucesso de um concurso passa, também, pela escolha do júri, pelo que este não foi exceção, sendo composto por quatro profissionais e especialistas de relevo nas áreas a concurso: os professores da ESE Paulo Neves e Alzira Rosa, a bailarina Suzana Rosas e o cantor lírico Pedro Figueiredo. Os concorrentes apresentaram-se pela seguinte ordem:

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Grupo “A Rusga” Com um projeto acústico tradicional, criado em 2012, por Fábio Ferreira e Daniel Diaz da Costa, estes jovens de 18 e de 15 anos, respetivamente, utilizaram na sua atuação, instrumentos como o baixo, guitarras e percussão. Interpretaram um cover dos “Resistência” e dois originais seus. Carolina Moutela - MENÇÃO HONROSA Com formação em órgão, flauta e trompa de harmonia (o seu instrumento preferido), integra atualmente as Orquestras Juvenil e Ligeira do Clube Cultural e Desportivo de Veiros. Interpretou as canções “Vício”, de Ivo Cruz, e “Porquê”, de Marta Ferreira. Selecionou, também, a canção “Onde Deus te levar”. Miguel Seara – 1.º LUGAR Jovem com 17 anos, tem o Beatbox como uma das suas paixões. Amante do desporto, é jogador de andebol, adora conversar, ouvir música, viajar e partilhar bons momentos com os amigos. Tem como objetivo maior SER FELIZ e procura que a boa disposição, sempre que possível, esteja presente na sua vida. Daniela Pereira Uma das atividades que esta aluna de 17 anos mais gosta de fazer é desenhar, a forma mais completa de se expressar. Para além do desenho e da pintura, gosta de ouvir música, e é ao som de música, que desenha. Apresentou uma seleção de desenhos e três pinturas suas. Grupo “Nuwanda” Grupo de jazz composto por cinco elementos, Pedro Miguel Silva (guitarra elétrica), Bruno Pereira (guitarra), Pedro Jorge Silva (saxofone alto), João Martins (trombone) e Jonathan Silva (bateria). Juntaramse propositadamente para participar no concurso. Estes jovens músicos integram diferentes bandas e orquestras da região e frequentam o Conservatório de Música Gulbenkian, em Aveiro, há alguns anos, onde têm aperfeiçoado o seu talento. Atuaram, reinterpretando a música “Watermellon Man”, de Herbie Hancock. Rianne de Sousa Barbosa - 3.º LUGAR Esta aluna, com 14 anos, é natural do Brasil (da cidade de Goiânia) e tem a música no sangue. Desde sempre canta e gosta de karaok. Juntamente com amigos, tem uma banda e gostaria de apostar mais em temas originais. Interpretou as músicas “Jar of hearts” (Christina Perri) e “Someone like you” (Adele). Renato Dias Este jovem irreverente dançou Tektonik, também chamada Electro Dance, forma frenética e peculiar de dança de rua. Efetuou duas performances com coreografia da sua autoria e eletrizou a assistência. Catarina Rebimbas e Pedro Silva A Catarina desde pequenina que tem contacto com a música. Estuda no Conservatório de Música de Aveiro (está no 2.º ano de Técnica Vocal). Já tocou órgão e saxofone alto. Quer seguir música, no futuro. O Pedro Silva também começou cedo. Aos 12 anos, fez parte da Banda de Pardilhó, onde tocou trompete durante dois anos. Toca guitarra há um ano, que aprendeu com os amigos, e foi com esse instrumento que se apresentou neste concurso. Neste momento, o Pedro tem uma banda. Bruno Duarte Cêpa - MENÇÃO HONROSA É um grande apreciador de stand-up comedy e programas de humor e foi essa a modalidade que escolheu para o concurso da ESE. Integra o grupo de samba estarrejense “Vai-Quem-Quer”, já que adora o Carnaval. Bem disposto, o Bruno tem sempre uma piada para cada situação. Jéssica Alves Forte – 2.º LUGAR Uma jovem aluna com apenas 13 anos, é apaixonada por música e pela Europa… Interpretou a canção que representou o Azerbaijão no Festival Eurovisão da Canção, neste ano de 2012, “When the Music Dies”.

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Fábio Rafael Aleixo Desde muito cedo, revelou gosto pela fotografia. Aos 6 anos de idade, deixava-se encantar pela máquina fotográfica dos pais e começou com ela a tirar as primeiras fotografias (que se lembra, pelo menos!). Eram fotos ou de família ou simplesmente para acabar o rolo da máquina. Atualmente, amplia os seus conhecimentos na área da fotografia através de pesquisas na net e através da prática, aproximando o máximo possível as técnicas dessa prática quotidiana. Apresentou-se com uma seleção de fotografias suas. Inês Araújo – MENÇÃO HONROSA Tem 13 anos, frequenta a Associação de Ginástica Cultural de Estarreja, onde pratica ginástica rítmica com outras jovens. Participou neste concurso porque é uma forma de mostrar aquilo que gosta mesmo de fazer. Efetuou uma rotina em tapete (solo). O evento foi encerrado com a atribuição dos prémios e das menções honrosas, seguido de um breve discurso do diretor da ESE, Dr. Jorge Ventura. O compromisso com o futuro depende do presente que somos. Valorizar o talento de uns pode constituir um incentivo para a excelência de outros. Este foi o pensamento que, desde o primeiro momento, norteou a Comissão Organizadora, ao empenhar-se em levar a cabo este concurso. Uma forte aposta, ganha, na dinamização do espírito empreendedor jovem e na valorização do TALENTO EM AMBIENTE ESCOLAR. Concluída a 1.ª edição, queremos enfatizar o destaque e o total reconhecimento que são devidos a todos os participantes pela qualidade das suas performances, nas diferentes categorias, que contribuíram para o sucesso deste evento. Os agradecimentos estendem-se a todos os convidados, à autarquia representada pelo Vereador da Cultura, Dr. João Alegria, aos encarregados de educação, alunos da ESE e público em geral, pela calorosa adesão. Um sincero agradecimento à colaboração e apoio de colegas e colaboradores da Escola Secundária de Estarreja: Carlos Oliveira, Goretti Capela e Paula Vilasboas, professores que integraram com inteligência o júri da sessão eliminatória; Fernando Silva, pela disponibilidade e profissionalismo patenteados na colaboração técnica (áudio e vídeo), em ambas as sessões; José de Sá, pelo constante apoio logístico e técnico; assistentes operacionais e o porteiro, Sr. Rui, pela vigilância e apoio, durante a final. Na página web da ESE ou no blogue <http://eusouempreendedor.wordpress.com>, ficam disponíveis e podem ser visionadas as prestações dos alunos concorrentes durante a final da 1.ª edição deste concurso. A Comissão Organizadora: Luísa Garraio, Marília Teixeira, Orlando Carvalho, Rosário Santos,Teresa Bagão

Um atento júri, na final...

(da esq. para a dir) Paulo Neves, Suzana Rosas, Alzira Rosa e Pedro Figueiredo

Momento da entrega de prémios

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ISSO É TALENTO Goretti Capela

Docente de Educação Tecnológica

Nos melhores momentos de criatividade e talento, a arte proporciona um espelho para a alma. As expressões criativas representam a força que existe dentro de cada um de nós, a qual se manifesta numa simbiose de impressões, sentimentos e conhecimentos que nos transcendem. Essas expressões superam o passado e “falam” diretamente ao coração de cada um de nós. Isso é TALENTO. No estado livre e natural, cada um de nós liberta o desejo de viver, a necessidade de alimentar a vida, a paixão incondicional de criar para si próprio e para os outros, além do ego pessoal, tentando exibir e recriar as melhores qualidades humanas, a cada momento. Essas ações criativas incluem coragem, força, conhecimento, técnica, inovação e isenção, e oferecem prosperidade e saber, alguma ansiedade, talvez, desejo e paixão contidos. Podem ocorrer distorções de comportamento e variabilidade, alguma limitação aparente, pontual letargia, mas logo se liberta outra fonte de energia criativa que leva a nova fase de criação, consciência pura, potencialidade, continuidade e vida. A arrojada confiança na produção, o salto quântico para a manifestação original, qual feliz exultação personificada de forma expressiva e simbólica, fazem do autor um artista puro. Isso é TALENTO.

ARTE Universo do saber Do sonhar Do construir Aprofundar Resolver As emoções Que o amor Pode descobrir O antes O depois E o depois O devir No infinito - absoluto O sentir A verdade De ser De intuir De crer Querer Desenvolver A íntrega beleza Que o Ser - só por o ser – Pode admitir.

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COMEÇAR A EMPREENDER posted by Rosário Santos

Docente de Contabilidade e Economia

Os responsáveis pelo Clube/ Projeto de Empreendedorismo da ESE, “Educação para o empreendedorismo”, juntamente com os seus parceiros Câmara Municipal de Estarreja/ DESTAC/ CLDS – Incubadora de Empresas de Estarreja, organizaram um Seminário dirigido a jovens alunos do ensino básico e secundário (ensino profissional), que decorreu no dia 12 de janeiro de 2012, com os seguintes objetivos: . promover e estimular o espírito empreendedor junto dos alunos da Escola Secundária de Estarreja; . fomentar a indução de atitudes e comportamentos propícios ao desenvolvimento de uma cultura inovadora, criativa, tecnológica e empreendedora. Diferentes olhares, sobre um tema muito oportuno, encheram, nessa manhã, o Cineteatro de Estarreja. Alunos de todas as turmas do ensino profissional, com alunos de mais cinco turmas do ensino básico da nossa Escola, participaram efusivamente neste primeiro evento. Criação de empresas, importância de logótipos, inovação, empreendedorismo, criatividade e associativismo jovem foram alguns dos temas abordados pelos oradores convidados, Dr.ª Ana Arromba Dinis, da Flyng Thoughts, e Paulo Ramalho, Presidente da AIESEC Aveiro. Como moderadora, tivemos a participação da Dr.ª Andreia Rocha, gestora no CLDS (Contrato Local de Desenvolvimento

Social de Estarreja), uma jovem profissional de excelência, próativa, e com uma visão clara daquilo que pretende atingir. Paralelamente, foram apresentados os projetos vencedores referentes ao “2.º Concurso de Ideias de Negócio Inovadores”: o projeto “Arte no Papel”, empresa de comunicação social, dedicada especialmente à produção de revistas, dos associados José Manuel Garrido, Francisca Martins e Ana Rita Pires (alunos do 8.º Ano); o projeto “Fonseca & Fonseca Unipessoal, Lda.”, da aluna Vanessa Fonseca do 12.º I do Curso Profissional de Gestão, com a fascinante ideia de comercialização do “Sappi”, um sensor auditivo para pessoas invisuais. A Dr.ª Teresa Silva, em representação da DOW – Portugal, para além de entregar o prémio à aluna Vanessa Fonseca, deixou aos jovens o exemplo da empresa e de Herbert Dow, grande empreendedor, que teve a ideia de tomar o risco, de montar um negócio, primeiramente num pequeno barracão (o começar do nada), hoje, uma multinacional.

Uma centenária história de alguém que desenvolveu o seu negócio sem receio de arriscar. O Sr. José Teixeira Valente, Presidente da Direção da SEMA, muito aplaudido, deu o exemplo de Steve Jobs, lembrando aos jovens presentes que para persistir e confrontar barreiras com êxito é necessária paixão, capacidade de saber onde se quer chegar e, principalmente, força de vontade e entusiasmo. O discurso do Diretor da ESE, Dr. Jorge Ventura, chegou debaixo do som das palmas, referindo-se à proteção da propriedade intelectual de quem desenvolve as ideias. Abordou o empreendedorismo como algo que “não é mais do que a materialização de ações intencionadas e direcionadas para um povo, no sentido de promover a sua comunidade e o seu bem-estar. Vivemos em comunidade, onde é fundamental que todos os dias possamos ser empreendedores, desenvolver atitudes inovadoras que possam evidenciar o conhecimento que todos fomos beber na Escola”. Terminou o seu discurso enfatizando a atitude correta que os alunos tiveram, realçando que “estudam numa Escola e vivem num Município que, com a materialização desta iniciativa, provam que são organismos empreendedores”. O Presidente do município, Dr. José Eduardo de Matos, encerrou o Seminário, lembrando as palavras de Albert Einstein: “em

Criação de empresas, importância de logótipos, inovação, empreendedorismo, criatividade e associativismo jovem foram alguns dos temas abordados pelos oradores convidados.

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tempo de crise, só a imaginação é mais importante do que o conhecimento”. Neste sentido, fez um apelo “à energia e vontade de fazer e criar”, incentivando os 500 jovens presentes a acreditarem nas suas capacidades, realçando que a vida só faz sentido se contribuirmos para “melhorar o nosso dia a dia, o mundo onde estamos”. Com pequenos passos se faz o caminho, e este Seminário é bem o exemplo de um novo tipo de abordagem inovadora, promotora da educação para o empreendedorismo. Estas iniciativas permitem aos jovens aperceberem-se do seu próprio potencial e de como o podem aproveitar para construir o seu próprio caminho. Ser criativo, ousado, pró-ativo, determinado diante de riscos, sonhar e desejar conquistar poder, bem como ter capacidade de enfrentar desafios, são as competências intrínsecas a um e m p re e n d e d o r, cruciais e cada vez mais exigidas na formação pessoal e profissional dos nossos jovens e valorizadas no mundo do trabalho. Tenham a certeza de que o incentivo ao empreendedorismo é o estímulo que faz despertar nos nossos jovens a sua motivação para aprender.

Tenham a certeza de que o incentivo ao empreendedorismo é o estímulo que faz despertar nos nossos jovens a sua motivação para aprender.

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EMPREENDEDORISMO EM AÇÃO – 3.º NEGÓCIOS INOVADORES Marília Teixeira e Rosário Santos Docentes de Contabilidade e Economia

Pelo 3.º ano consecutivo, o Núcleo de Empreendedorismo da ESE, com o Projeto “Educação para o Empreendedorismo”, ganha grande relevância ao proporcionar desafios de forte impacto, nomeadamente nos campos da iniciativa, da inovação e da criatividade, ao promover e dinamizar o 3.º Concurso de Ideias de Negócios Inovadores, numa parceria com a CME, DESTAC/ Incubadora de Empresas de Estarreja e DOW Portugal. No dia 23 de março do corrente ano, num ambiente descontraído e no novo anfiteatro de Escola Secundária de Estarreja, o vereador da cultura da Câmara Municipal de Estarreja, Dr. João Alegria, conjuntamente com o diretor da escola, Dr. Jorge Ventura, brindaram os concorrentes e todos os presentes com palavras entusiásticas, elogiando o exemplo dos jovens em concurso e o espírito empreendedor que cultivam. Com este tipo de iniciativa é possível adquirir conhecimentos, competências e atitudes que incentivem e proporcionem o desenvolvimento de ideias e de projetos capazes de gerar mudanças na vida de cada um… O mote estava dado: “Vamos ao DESAFIO, ACREDITEM, o futuro é HOJE !!” Vencedores - Categoria Ideia Jovem (7.º ao 9.º ano) 1.º Classificado: M&S – Reaproveitamento de roupa usada. Através de um processo inovador de design, é reinventada essa roupa usada. Na mesma, é inserido um mini-chip, o qual fornece as informações de lavagem e cuidados a ter com a roupa, assim como uma seleção de músicas ligadas à essência de lavanda (MUSIC FRESH). Promotores: José Manuel Garrido e Francisca Martins (alunos do 8.º Ano). 2.º Classificado: Marómania - Atelier de peças de cerâmica ligadas com o mar, utilizando porcelana e criadas à mão: Chávenas onde a pega é um moliceiro e com pires de fácil utilização para quem tem pouca mobilidade (pessoas que não possam sair da cama e onde o pires já engloba lugar para o açúcar e para a colher). Promotora: Vânia Valente (8.º Ano). 3.º Classificado: MJM – Atelier de Artes Criativas.


º CONCURSO DE IDEIAS DE

Atelier onde se fazem trabalhos artesanais: pintura à mão de chávenas, canecas e pires. Promotoras: Ana Margarida Tavares, Juliana Pinho e Mariana Bastos (alunos do 8.º Ano). Vencedores - Categoria Jovem Empreendedor (10.º ao 12.º ano) 1.º Classificado: AJL Lda. – Projeção e Comercialização de Produtos Eletrónicos. O DIGISHOPS é um aparelho eletrónico que ajuda os consumidores a pouparem dinheiro de uma forma simples e sem preocupações. É instalado nos carrinhos de supermercado e quando o consumidor está a chegar ao seu plafond/ orçamento é avisado pelo aparelho. Promotoras: Jessica Neno e Letícia Amaral (alunas do 12.º Ano). 2.º Classificado: Sensovoz – Produção de sensores de voz para cadeira de rodas, que se diferencia das cadeiras de rodas normais, uma vez que é indicado para pessoas com deficiência motora, sem mãos ou incapacitados. Estas podem apenas usar o sensor de voz para movimentar a cadeira. Promotor: Miguel Ângelo dos Santos (10.º Ano). 3.º Classificado: Dreams, Lda. – Empresa de promoção de eventos. O primeiro evento a ser lançado seria a Feira da Mulher, onde seria apresentado o produto “Inspira o Teu Dia”. Este produto seria a comercialização de camisolas, t-shirts, com uma camada de cristais líquidos, que ao ter contacto com o corpo transmitiria na cor o estado de espírito da pessoa… Essa cor é alterada devido a pequenos chips que estão inseridos na camisola, t-shirt. Promotoras: Lívia Matos, Sancha Silva, Sara Cabilhas (alunas do 12.º Ano).

Com este tipo de iniciativa é possível adquirir conhecimentos, competências e atitudes que incentivem e proporcionem o desenvolvimento de ideias e de projetos capazes de gerar mudanças na vida de cada um.

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DESENVOLVER E AVALIAR COMPETÊNCIAS SOCIAIS - A ESE E O PROJETO COMENIUS Eulália Gomes e Emídio Ferro Equipa do Projeto Comenius

Os diferentes projetos europeus têm como principais objetivos contribuir para o acesso e partilha de informação entre vários países do velho continente, proporcionar aos cidadãos o contacto com diferentes culturas e vivências, desenvolver uma perspetiva educacional de europeísmo e simultaneamente possibilitar a visita aos vários países parceiros destas iniciativas, concretizando, assim, parte do sonho do “arquiteto” da atual União Europeia, Jean Monnet. Ao longo dos últimos dois anos, a nossa escola tem estado envolvida no Projeto Comenius, tendo como representantes os professores Emídio Ferro, Eulália Gomes e Paulo Corceiro, que têm desenvolvido e participado em iniciativas no âmbito das Soft Skills (Competências Sociais). Entre os dias 16 e 18 de maio de 2012, realizou-se na ESE uma conferência, onde foram discutidos e analisados os materiais desenvolvidos no âmbito do projeto “SOS.NET: Social Skills Trainer for European Teachers”. Nela participaram os representantes dos países parceiros no projeto, a saber: Bulgária, República Checa, Roménia, Turquia e Portugal, dando o seu contributo com as seguintes apresentações: The limits of freedom of speech - César Lopes, Miguel Rego From body care to disrespect for its uniqueness - Margarida Gonçalves, Maria Marques, Marta Amaral, Nuno Adrego Consequences of scientism in education - Margarida Coelho, Joana Tavares, Joana Faria, Rita Vinha Photosynthesis - Katerina Salamonova 1st International School of Ostrava - Tana Mickova Soft skills in the school activities - Jiri Okrouhly Blogging as a form of interactive communication - César Lopes, Miguel Rego, Nuno Adrego Bulgarian educational system and soft skills training – Nelly Kostova Soft skills in Bulgarian schools with vision for the future – Vladimir Mikov New generation soft skills trainers – Rozalina Geneva The critical mass effect - Valentina Antonova Soft skills in the classroom - contexts and development of a shared practice – Emídio Ferro Soft skills training - a modern approach in the educational field - Alina Soava, Madalina Chiosa, Lenuta Ciurel, Camelia Sfeia, Emil Varga There are many things to do for a happy life - Ali Ulusoy É de destacar e de louvar a participação dos alunos da nossa escola, que, com motivação, entusiasmo, profissionalismo e empenho, deram um contributo muito válido para a concretização desta conferência com o sucesso que ela teve, captando de forma significativa a atenção do público presente. Na sequência das atividades das aulas de formação cívica, os alunos César Lopes e Miguel Rego (10.º D) apresentaram os seguintes temas: “The limits of Freedom of Speech”; os mesmos alunos e o seu colega de turma Nuno Adrego também discursaram sobre “Blogging as a form of Interactive Communication”; o tema “From Body Care to Disrespect to its Uniqueness” foi apresentado pelas alunas Margarida Gonçalves, Maria Marques, Marta Amaral e Nuno Adrego (10.º D). Dissertaram sobre “Consequences of Scientism on Education” as alunas Margarida Coelho, Joana Tavares, Joana Faria e Rita Vinha (10.º B), tendo desenvolvido a temática no decorrer das aulas de formação cívica. Aos docentes envolvidos, quer na conceção dos trabalhos, quer na revisão linguística, Rosa Mendonça, Rui Rufino e Elsa Machado, se agradece o empenho. Trabalharam “nos bastidores” os alunos de Educação Visual dos 9.º A, C e D, com a orientação da professora Paula Vilas-Boas que, de forma criativa e inovadora, tornaram o acesso e o auditório da escola, onde se realizou a conferência, locais mais coloridos e integrados nas ideias do projeto. É de salientar que a língua oficial da conferência foi o Inglês, facto que não impediu uma comunicação efetiva e fluente, mas, pelo contrário, permitiu comprovar que também os nossos alunos participantes o dominam com proficiência.

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(…) os alunos da nossa escola, com motivação, entusiasmo, profissionalismo e empenho, deram um contributo muito válido para a concretização desta conferência com o sucesso que ela teve, captando de forma significativa a atenção do público presente.

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SAÚDE TODOS OS DIAS! A Equipa de Educação para a Saúde, da Escola Secundária de Estarreja, constituída pelas professoras Ana Almeida, Anabela Amorim, Fernanda Pereira, Fernanda Trigo, Rosário Bastos e Sandra Martins, e coordenada pela professora Manuela Azevedo, tem vindo a dar continuidade ao trabalho desenvolvido nos anos transatos, implementando e desenvolvendo várias atividades no âmbito da cidadania, da sexualidade, da alimentação, das escolhas assertivas, dos primeiros socorros, da violência no namoro e violência doméstica, ações estas direcionadas para a comunidade educativa em geral. Destacam-se aquelas que visam a promoção da atividade física, de hábitos alimentares saudáveis, de cidadania e do desenvolvimento de competências pessoais de uma escolha assertiva. Atividades: a) Sensibilização para a reciclagem: aquisição de ecopontos distribuídos pelos diferentes espaços da escola. b) 17 de novembro: comemoração do dia do não fumador: - sensibilização da comunidade escolar para a importância da ausência do consumo de tabaco; - distribuição de autocolantes por toda a comunidade escolar c) Promoção de hábitos saudáveis de alimentação: dinamização contínua do bar da sala de professores e proposta de alteração dos hábitos alimentares da comunidade escolar. d) Rastreio oral: com vista à atribuição de cheques dentários, para alunos nascidos em 1998, e levado a cabo por uma higienista

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oral. e) Atividade física destinada a pessoal docente e não docente: todas as terças-feiras, das 18:30 às 19:30, os interessados podem praticar ginástica, nas sessões orientadas, gentil e graciosamente, pela professora de educação física da escola Ana Almeida.

A equipa tem vindo a dar continuidade ao trabalho desenvolvido nos anos transatos, implementando e desenvolvendo várias atividades no âmbito da cidadania, da sexualidade, da alimentação, das escolhas assertivas, dos primeiros socorros, da violência no namoro e violência doméstica. Ações de formação promovidas pela equipa: a) Para professores e assistentes operacionais: Emergência na Sala de aula; Consumo de substâncias psicoativas; A Educação Sexual em meio escolar: metodologias de abordagem/intervenção; Formação no projeto «Eu e os outros». (de realçar que as duas últimas foram ações de formação creditadas) b) Para alunos: 7.º ano: Escolhas assertivas;


Segurança Rodoviária (147 alunos envolvidos) 8.º ano: Vacinação; Cidadania e direitos humanos (119 alunos envolvidos); Formação sobre sexualidade; formação sobre higiene oral (implementado nas turmas CEF, envolvendo 33 alunos) 9.º ano e 10.º anos do ensino regular (e 3 do ensino profissional): Primeiros Socorros (377 alunos envolvidos) 11.º ano (e algumas turmas de 10.º): Violência no namoro e Violência doméstica (124 alunos envolvidos)

ainda mais interventiva, sendo a promoção da Saúde e do BemEstar a sua mais alta causa.

Estas atividades foram implementadas em parceria com diferentes entidades, nomeadamente ACES Baixo Vouga III, representado pela higienista oral e pela enfermeira Carla Barbosa; CLDS (Contrato Local de Desenvolvimento Social); Projeto Generus (Cáritas Diocesana); Agentes da “Escola Segura”; Centro de Formação Intermunicipal de Estarreja, Murtosa e Ovar; Câmara Municipal de Estarreja; IDT (Instituto da Droga e da Toxicodependência). Para além do gabinete de apoio à Saúde Escolar, a equipa também disponibiliza a toda a comunidade um acesso permanente através do endereço eletrónico ese. saude@gmail.com, para onde podem ser canalizadas todas as sugestões e questões relacionadas com o âmbito do projeto desenvolvido. É intenção desta equipa, no próximo ano letivo de 2012/2013, diversificar as atividades e estratégias no sentido de se tornar

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A ESE na Feira da Rede Social (2011)

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marca que os pĂŠs deixam no solo ao pisar; sinal, vestĂ­gio, pista

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DIÁRIO DE CAMPANHA 1916 Maria de Jesus Oliveira e Silva Docente de História

“Triste de mim, que me encontro no alto de uma serra, onde está construído o forte há dias tomado, e rodeado de vastas florestas”. O 2.º sargento de infantaria 24, em expedição a Moçambique, que em 1 de novembro de 1916, dia do seu 22.º aniversário, escreve estas palavras amarguradas no seu Diário de Campanha, teria então bons motivos para denunciar o sofrimento da situação em que se encontrava. A primeira página deste Diário, um livrinho de capa preta, manuscrito em letra miúda, informa-nos do conteúdo: “Apontamentos diários em campanha e antecedentes – expedição a Moçambique”. Como anexo, solto, um mapa do norte de Moçambique, feito à mão em fino papel de seda, assinalando as diferentes etapas percorridas. Pertenceu a um cidadão natural de Salreu, que conheci e muito estimei. Este seu notável Diário veio-me casualmente ter às mãos, por interposta herança. Guardo-o com veneração. Iniciada a escrita em 13 de janeiro de 1915, dia em que o nosso soldado assentou praça na segunda Companhia do Regimento de Infantaria 24, termina em 27 de dezembro de 1917, com a chegada a Lisboa, depois de uma áspera campanha de um ano e tal em Moçambique. É, por isso, um precioso testemunho de um interveniente direto nos acontecimentos. De fina inteligência e agudo sentido de observação, deixa-nos relatos e impressões de momentos decisivos das campanhas de Moçambique, durante a Primeira Guerra Mundial. Convido-vos, pois, para uma viagem de minutos, no espaço e no tempo, a Moçambique dos anos 191617, em companhia deste nosso conterrâneo que, se fosse vivo, completaria 118 anos a 1 de novembro próximo. Primeiro, porém, algumas palavras que minimamente esclareçam os menos informados das circunstâncias que determinaram a ida deste e de muitos outros portugueses de então para combater em terras de África. Em 1916, Portugal, com uma jovem República de 6 anos, a dar os primeiros passos, permanentemente ameaçada com golpes e contragolpes, entra na Primeira Guerra Mundial, encerrando o período de exceção que representava a posição portuguesa de não intervenção ativa no conflito deflagrado em agosto de 1914. A defesa das colónias contra os alemães levará à

expedição que dá corpo ao nosso Diário, aliás, uma das que, entre 1914-18, foram organizadas pelos governos republicanos. Tinham como objetivo a defesa das fronteiras com as colónias alemãs. Cerca de 32 mil portugueses metropolitanos, juntamente com tropas coloniais e soldados indígenas, somaram um total de 55 mil homens mobilizados. Neste contexto, a zona Norte de Moçambique vai ser especialmente importante – os acontecimentos essenciais constam das páginas deste Diário. A ação passa-se numa área à volta do Rio Rovuma, que separa, ao norte, a então colónia de Moçambique do território do Tanganhica, atual Tanzânia, e desde 1890 ocupada pelos alemães. Foi através do Rio Rovuma que as forças portuguesas penetraram, em 1916, no Leste Africano Alemão. O inimigo alemão está presente logo nas primeiras páginas do Diário, quando, depois da saída da barra em direção a Moçambique, o nosso autor escreve, em 28 de maio de 1916: “Passámos pela torre do Bugio, à saída da barra pelas 7 horas da tarde. Acompanhava-nos a pequena distância o vapor de guerra Douro… À 1 da tarde, o Douro desapareceu, voltando para Lisboa. Seguimos sem nenhum vapor de guerra nos acompanhar, apesar de se dizer que a viagem era bastante perigosa, por causa dos submarinos alemães, que se supunha que andassem no Atlântico. Navegavamos de noite, com toda a iluminação apagada, sendo expressamente proibido acender fósforos no convés.”

Em 1916, Portugal faz a apreensão dos navios mercantes alemães fundeados em portos portugueses e coloniais, a fim de serem colocados ao serviço da aliança luso-britânica. Em 4 de junho de 1916, quando o vapor chega à ilha de S. Vicente, em Cabo Verde, o Diário refere também: “… além d’outras embarcações ligeiras e de navios de carga”, estavam “12 vapores alemães que tinham sido requisitados pelo governo português.” A presença inglesa em território colonial português é citada amiúde no Diário, por exemplo, “fundeando no porto de S. Vicente 2 vasos de guerra ingleses e um transporte de guerra da mesma nacionalidade” (4 de junho de 1916). Passado um mês de viagem, surgem as primeiras referências à chegada ao porto de Lourenço Marques. As páginas seguintes relatam a entrada progressiva e crescente no cenário de guerra. Constituem um

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roteiro de algumas das ofensivas mais importantes contra os alemães em Moçambique, a partir da base de operações da cidade de Palma. Por exemplo, a 5 de julho de 1916, “Pelas 7 horas desembarquei do vapor. O desembarque de tropas era feito em pequenas lanchas de vela… Pelas 13 horas estava o bivaque feito um pouco a oeste da cidade de Palma, ao lado de uma mata bastante espessa. Pelas 14 horas fundeou o Moçambique, que transportava a infantaria 28.” É também descrita a preparação das tropas para o combate que conduziu à reocupação de Quionga, em 10 de abril de 1916, na embocadura do Rio Rovuma (rio de fronteira a norte), depois de 22 anos de presença alemã. Cito: “Eis que chegou hoje o primeiro dia de alarme. Às 9 horas da noite tocou para formar a 9.ª Companhia que em seguida foi a Palma receber armamento.” A célebre passagem de três colunas militares portuguesas para a margem esquerda do Rovuma aparece assim no Diário: “19 de Setembro de 1916. Aqui é grande o movimento das tropas, pois na madrugada de amanhã vai ser iniciada a passagem do Rio Rovuma. // 19 de Setembro. Era 1 hora da madrugada quando todas as tropas formaram para n’este dia se efectuar a passagem do Rio Rovuma. Distribuíram-se às praças mais 50 cartuchos que fazem a conta de 200. Momentos depois tudo seguia para a margem direita do rio. Eram 5 horas da manhã quando se começou a efectuar a passagem que foi iniciada por fortes tiros de canhão do nosso vapor de guerra, o Adamastor. A passagem foi brilhante pois as tropas manobraram distintamente. Avançámos por território alemão alguns kms a norte, seguindo depois na direcção nascente. Tomámos as casas que serviam de quarteis ao inimigo, algumas munições e diversos objectos e mobílias. (…) Fizemos prisioneiros pretos. Durante o avanço sede insuportável; as pernas alquebravam-seme, que me era impossível avançar mais.”

Pelo meio destas descrições de guerra, muitas reflexões do tipo da que se segue: “31 de Outubro de 1916. Pelas 10 horas da manhã ouvi dentro da minha barraca o eco repetido de palmatoadas, que davam a um soldado preto, por este se ter ausentado do bivaque sem ordem. Sempre a África equatorial… dos negreiros e dos escravos…” Dada a dureza da campanha, o nosso repórter adoece gravemente. A 1 de novembro de 1916 escreve: “E como o meu estado físico e moral se encontra bastante cansado, pelos grandes martírios que tem sofrido, obrigaram-me a comparecer à revista de saúde… Presente ao médico, baixou-me ao Hospital de Palma.// 3 de Novembro. Às 11 e 1/2 da manhã será a minha última paragem com destino

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a Mocimboa (que é um posto nosso, já na nossa fronteira)…” A ofensiva alemã, entretanto, acentua-se. Em 19 de novembro, os portugueses são cercados em Nevala. Depois de alguma resistência, os portugueses retiram para o Rio Rovuma, alcançando a margem direita com esforço, entrando em zona portuguesa em 1 de dezembro de 1916. O Diário descreve assim a situação: “Pelas 2 horas da tarde informações de que as nossas forças foram infelizes na retirada e que os alemães tinham entrado já em território nosso. (…) Diz-se que alguns oficiais se tinham suicidado para não ficarem prisioneiros. Diz-se mais que o posto de Nangade ainda não fora tomado pelo inimigo, mas está sendo bombardeado.”

Mais adiante, outra circunstância descrita é a ofensiva a Monte-Puez: “10 de Julho de 1917. Pelas 9 horas e 1/2 fomos surpreendidos por alguns tiros feitos a leste deste forte (Monte-Puez). Imediatamente os nossos postos avançados recolheram, já perseguidos pelo inimigo. Principiou o combate, e após 1 hora de fogo, foi resolvido contra atacar o inimigo, saindo do forte o pelotão do tenente Pais Gomes e do alferes Jesus, fazendo eu parte d’este último. Estendemos a ponte, avançando por avanços sucessivos para o inimigo, que não demorou a retirar. Fomos persegui-lo até 1 km, conseguindo neste avanço matar no inimigo 1 branco. No combate matamos-les mais 2 soldados indígenas. (…) O combate durou até às 12 horas. À tarde saíram novamente em reconhecimento algumas patrulhas, que fizeram prisões de pretos da região, os quais tinham servido de espiões para o inimigo, informando-o do que se passava entre nós.” A 10 de novembro de 1917 regista o seu embarque no navio que o trará de volta: “Pelas 6 horas da manhã são mandados apresentar no Comando Militar todos os doentes, a fim de embarcarem. Eram 4 da tarde quando cheguei ao navio.” Cerca de um mês depois, 27 de dezembro, avista finalmente a Serra de Sintra e escreve: “Não tenho palavras para descrever a alegria que sinto, ao ver o barco, que cada vez mais se aproxima, deixando a pouco e pouco ver-se as casas que descem ao longo da dita serra. (…) Fundeámos às 12 e 1/4. Grande multidão de povo aglomerado no cais, aguardando a nossa chegada.” Uma última nota sobre este documento de memória: as observações registadas a partir das zonas e portos abordados fazem dele, para além de notável crónica de guerra, um cativante roteiro de viagem, sobre locais e hábitos que interessam à História, à Antropologia, à Etnografia.


“(…) a viagem era bastante perigosa, por causa dos submarinos alemães, que se supunha que andassem no Atlântico. Navegavamos de noite, com toda a iluminação apagada, sendo expressamente proibido acender fósforos no convés.”

“A primeira página deste Diário, um livrinho de capa preta, manuscrito em letra miúda, informa-nos do conteúdo: «Apontamentos diários em campanha e antecedentes – expedição a Moçambique».“

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“Como anexo, solto, [inclui-se no diário de campanha] um mapa do norte de Moçambique, feito à mão em fino papel de seda, assinalando as diferentes etapas percorridas” na expedição.

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A VIDA ATRAVÉS DE UMA PEDRA DE CALÇADA Flávia Alves

Ex-aluna de Humanidades da ESE

Como falar da vida de um calceteiro, se nunca fiz parte dela exercendo a profissão? Vendo a experiência e vida do meu pai… Mas como transmitir a vida dele através deste papel? Eis as perguntas que mais me vieram à cabeça, enquanto procurava as palavras certas para escrever este pequeno texto. Bem, a primeira ação que tive para me inspirar foi procurar uma definição de calceteiro, que diz: “operário que faz calçadas em estradas, ruas, praças”. Mas isto não define o calceteiro, nem a vida por que passa, a falta de reconhecimento que tem… Não diz tanto como devia, por isso, nem quis escrever mais sobre esta definição vazia. Quero dar a conhecer o meu ponto de vista do calceteiro, apesar de não conseguir colocar-me na sua pele. Então, nada melhor do que ter, como ponto de partida, um caceteiro profissional que conheço – intimamente. Artur Alves, hoje com 45 anos, tem 33 passos de vida na arte de calcetar. Homem comum, viu na calçada à portuguesa uma arte que passava na sua família de geração em geração e aí encontrou, desde pequeno, o seu futuro cinzelado. A admiração e o orgulho pelo que via eram tais que só podia continuar a dar vida a essa forma de talento. Natural da freguesia de Fermelã, começou aos 12 anos a aprender e a trabalhar com o seu pai e avô, ambos calceteiros também, tendo sido eles os seus mestres, que lhe ensinaram todos os truques e pormenores, para que a calçada se transforme numa imagem harmoniosa. Ao longo dos seus anos de trabalho, deixou as suas marcas pessoais em várias localidades: em

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Canelas (que o viu nascer e crescer), principalmente no símbolo da Freguesia recentemente realizado, à frente da sede da Junta de Freguesia de Canelas; em Aveiro, o concelho que apresenta mais trabalhos seus, quase em cada localidade há um pouco da sua arte; e também Santarém, terra em que participou num concurso de Calçada à Portuguesa. Na sua visão, as pedras calcárias pretas e brancas podiam dar origem a muito mais que um simples chão pelo qual passamos, podiam torná-lo numa passadeira ou num tapete artístico que despertasse um sentimento de curiosidade e encantasse quem anda a pé. Assim, a cada passo, passamos e descobrimos mais e mais, fica o nosso interesse afincado e continuamos a querer ver mais e mais – no final, contemplamos o que de belo o homem pode criar, mesmo rente ao chão! A vida não é fácil quando se escolhe este caminho, pois é feito de pedra e não de alcatrão… precisamos de lutar muito para termos o respeito, que muitas vezes não chegamos a ter. É fácil quando se vê a calçada e se diz “Ai, que bonito!”, só que mais nada se faz para que essa apreciação continue a ser ouvida. Hoje em dia, ninguém quer aprender como se trabalha a Calçada à Portuguesa, há cada vez menos trabalhadores neste ramo, menos trabalhos também, porque não há reconhecimento desta forma de empedramento, simplesmente olham para o mais barato, esquecendo a tradição, as raízes do nosso país, a nossa forma de arte, que os nossos antepassados criaram. A calçada foi elaborada pela primeira vez em Lisboa no ano de 1842, tendo exatamente 170 anos de existência, na altura subjacente a um ideal de moda e


de bom gosto, tendo-se apurado o sentido artístico, que foi aliado a um conceito de funcionalidade, originando autênticas obras-primas nas zonas pedonais. E hoje, onde está este conceito de obraprima? Nem há reconhecimento desta forma de arte, nem se lembram dos trabalhadores que se dobram durante horas a fio, para que das pedras nasça “uma forma de vida”. Uma vida de trabalho para que as pedras se transformem em perpétuos desenhos vivos, expressivos e mágicos – em telas aos nossos pés -, razões suficientes para ter orgulho no que se faz. Eu, Flávia Alves, filha - com muito orgulho - do calceteiro Artur Alves, não vou dar continuidade a essas gerações de artistas da pedra que foram criadas na minha família, mas posso tentar fazer com que as pessoas, ao lerem o que escrevi, tentem olhar de outra maneira para a calçada que pisam, dando o devido reconhecimento não só ao que lá está, como também a quem a fez. Horas de trabalho, imaginação, sentido de proporção, criatividade expressas através dos moldes, para que depois os desenhos surjam no chão; muitos cálculos, para que tudo encaixe harmoniosamente e equilibradamente. Já vi esta magia a ser criada diante dos meus olhos, já vi o orgulho que enche o coração de um calceteiro quando vê transparecer na sua obra todo o seu trabalho e engenho, e a esperança de que todos nós olhemos para ela também… Por isso, eu vou continuar a olhar. E você? Vai começar a olhar?

Uma vida de trabalho para que as pedras se transformem em perpétuos desenhos vivos, expressivos e mágicos – em telas aos nossos pés -, razões suficientes para ter orgulho no que se faz.

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De O Jornal de Estarreja, 25 de abril e 10 de maio de 1974

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conjunto de pessoas que guarnece e trabalha numa embarcação; pessoal de bordo

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LER PARA SER

Trabalhos desenvolvidos no âmbito da disciplina de Português, com a professora Zaida Ramos A Leitura, um hábito a não perder de vista… Eu, pessoalmente, gosto de ler desde pequenina. A leitura estimula bastante o nosso cérebro e também aumenta a nossa cultura geral acerca do mundo, de pessoas, de culturas, etc. Está provado por médicos pediatras que, se nós lermos todos os dias um excerto com 10 linhas, conseguimos obter melhores resultados na escola, e em tudo o que fazemos no nosso dia a dia… Claro que tudo depende do tipo de livros que lemos e também de ler aquilo de que nós gostamos, que se enquadra no nosso estilo, ou por vezes no nosso estado psicológico. Existem vários tipos de livros, desde aventuras, comédias, BD, entre outros. Mas, se nós lermos enciclopédias ou livros didáticos, ganhamos mais vantagem de estudo. Ler é bom e faz bem, porque as palavras fazem parte da nossa vida! Bárbara Silva, 8.º B O Livro está na prateleira à tua espera para quando o abrires, ele dá-te imagens, letras que formam palavras que te levam ao conhecimento ou até mesmo apresentaM lições de moral educativas ou ideias inovadoras, mesmo histórias acontecidas com pessoas, como num Drama, Romance e Aventuras. O livro é o nosso melhor amigo. Poder ouvir-te a ler com ternura e entusiasmo, pegálo com delicadeza, vai-te fazer ao até mesmo chorar com a emoção. Quando o abandonares na prateleira, é um amigo à tua espera, quando o estragares é um amigo que te perdoa, quando o abrires é como um amigo a falar para ti, quando é antigo e vai para mãos de outras pessoas, ele nunca se esquecerá de ti. Por isso, vai à biblioteca, requisita ou compra o livro que mais gostarias de ler e vais ver que ler é muito divertido. Cláudia Ramos, 8.º B

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Ler é essencial. Através da leitura, testamos os nossos próprios valores e experiências com as dos outros. No final de cada livro, ficamos enriquecidos com novas experiências, novas ideias, novas pessoas. Eventualmente, ficaremos a conhecer melhor o mundo e um pouco melhor a nós próprios. Ler é estimulante. Tal como as pessoas, os livros podem ser perturbadores, tristes, assustadores e, por vezes, complicados. Os livros colocam-nos em outros tempos, outros lugares, outras culturas. Os livros colocam-nos em situações e conflitos que nós nunca poderíamos imaginar que encontrássemos. Os livros ajudam-nos a sonhar, fazem-nos pensar. Na escola, aprendemos gramática e vocabulário. Contudo, essa aprendizagem nada é comparada com o que se pode absorver de forma natural e sem custo através da leitura regular de livros. O objetivo primordial da escola é proporcionar-nos o acesso ao conhecimento e a formação de pessoas críticas, comprometidas consigo mesmas e com a sociedade, capazes de intervir alterando a realidade, o que passa pela criação de leitores competentes. Geralmente as gerações mais novas mostram desinteresse pela leitura, mas também a incapacidade de fazê-la de forma coerente. Por isso, as escolas e outros responsáveis têm de arranjar maneira de estimular, mais do que a capacidade de ler, o gosto pela leitura. E como o provérbio diz, “A leitura

é como a comida, não alimenta senão digerida.” Jéssica Marques, 8.º B A leitura de livros é considerada por adolescentes, a maioria, um desperdício de tempo. Mas os outros adolescentes dizem que ler não é um desperdício de tempo, nem um luxo, ler é um dever, uma necessidade básica, um hábito imprescindível. A leitura de livros não é apenas um mero passatempo, é antes um “alimento intelectual”. Aristóteles afirmou que “um livro é um animal vivo”. Na minha opinião, a leitura de livros é fundamental na vida, pois através dela aprendemos a ler, a contar, a escrever e a pensar. Ensina-nos também a sonhar, a rir, a chorar, a rezar ou a amar. Descobrese o mundo que nos rodeia, o “eu” e os avanços da ciência. E, como dizia Miguel de Unamuno, “Ler muito é um dos caminhos para a originalidade; uma pessoa é tão mais original e especial quanto mais conhecer o que disseram os outros”. Fábio Freitas, 8.º F


O QUE ME FAZ FELIZ Trabalhos desenvolvidos no âmbito da disciplina de Português, com a professora Zaida Ramos “Também tu, certamente, conheces pessoas que se afastam dos padrões comuns e que, no seu aspeto e no seu modo de agir, marcam a diferença e, por isso, se tornam especiais ou mesmo inesquecíveis.” É esta pessoa que vos vou descrever, que me anima e me faz imensa companhia, não só quando estou deprimida, mas também quando estou feliz e animada. É nessas alturas que passamos momentos super-divertidos e inesquecíveis. Conhecemo-nos quando entrei no mundo da música, desde o princípio que nos demos bem, mas cada vez ficámos mais íntimas e passamos a maior parte do tempo juntas. Podese dizer que a paixão pela música nos uniu. Tudo nela me impressiona, desde a teimosia à delicadeza e sensibilidade. Muitas pessoas, quando a conhecem, não gostam da sua maneira de ser e agir devido ao seu descaramento e teimosia, mas quanto mais a conhecemos, mais gostamos dela. Essa pessoa pode ter tido alguns problemas e desilusões no passado, mas isso só a ajudou a ser o que é e o que virá a ser no futuro, ajudou-a a perdoar e a ter cuidado no campo da amizade. Juntas, já passámos bocados muito complicados, mas ajudámo-nos mutuamente e, além disso, a nossa amizade é mais forte do que qualquer discussão ou afastamento. Eu admiro-a pela sua honestidade. Ela é daquelas pessoas que não tem medo de demonstrar o que sente e pensa, e não finge ser uma pessoa quando, na realidade, é outra completamente diferente. Eu adoro-a e ela é linda por aquilo que é, e espero que a nossa relação se prolongue por muitos mais anos. Bárbara Alves, 9.º D Cada pessoa tem a sua maneira de ver aquilo que é errado e correto para si, tem

o seu modo de pensar, de como deve agir a esta ou àquela situação. É isso que torna as pessoas especiais. Mas existe uma pessoa que eu conheci há uns tempos, que tenho a certeza que nunca esquecerei. Conheci essa pessoa quando, precisamente à minha frente, se deparava uma situação desagradável, quando um pobre senhor queria apenas arranjar um emprego num café, não se importando com qual a função lhe dariam, apenas queria trabalhar, recuperar a sua vida e conseguir ajudar a família. O dono do café responde-lhe que não era o tipo de pessoa que eles procuravam. Claramente, uma resposta dada depois de uma observação do aspeto do senhor feita pelo dono. Já passado bastante tempo, chega uma outra pessoa que, ao aperceberse da situação, reagiu. Fez frente ao dono, insinuando se o tipo de pessoas que o café procurava eram pessoas que aparentavam ter dinheiro (e, no momento, entregou um maço de notas ao pobre candidato) e que receberiam dinheiro sendo antipáticos e sem vontade de trabalhar, ou se eram pessoas honestas, que davam valor ao trabalho, querendo estar lá sem falhar e beijando cada salário recebido. O dono, envergonhado, desculpou-se e o moço ofereceu um trabalho digno ao pequeno trabalhador. Estes acontecimentos são pequenos gestos, mas que marcam e demonstram bondade, seriedade e honestidade nas pessoas. Ana Isabel Pinto, 9.º D

se passa, com ela nos rimos mesmo sem ninguém achar piada. Pode ser diferente dos outros mas é igual a mim. Lembro-me desta pessoa desde sempre, o que nela me impressiona é o facto de perceber tudo o que faço ou falo, o que por vezes é um pouco complicado. É claro que, como tudo, nada é um mar de rosas, pois nem sempre nos damos bem, às vezes as nossas opiniões colidem e não há ninguém que dê o braço a torcer, mas rapidamente fica tudo bem e quando damos conta já estamos novamente às turras, mas acabamos por desculparnos e o ciclo repete-se. O que mais me irrita nesta pessoa é ter os mesmos defeitos que eu: a preguiça do deixar tudo para amanhã, a falta de paciência para coisas insignificantes e, por vezes, o mau humor. Mas, como tudo, também há espaço para qualidades: o companheirismo para o bom e para o mal, mas o principal de tudo é aturar-me, o que não posso dizer que seja fácil. Não posso dizer que é o meu ídolo, mas posso dizer que me é impossível viver sem ela, porque sem ela os dias seriam noites, o sol não brilharia, o frio seria quente e a minha vida monótona. Aluna do 9.º D

Há pessoas com quem sentimos uma maior ligação, com quem nos sentimos melhor e com quem temos um maior prazer de conviver. Pessoas essas que marcam a diferença na nossa vida. Com esta pessoa em questão, basta uma troca de olhar e já sabemos o que

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DEAMBULANDO COM CESÁRIO Trabalhos desenvolvidos no âmbito da disciplina de Português (Módulo 8), com a professora Teresa Bagão

Hoje aqui estou, amigo Cesário, para te contar a verdade daquilo que vejo todos os dias a partir do momento em que entro naquele portão e ouço aquilo bip do cartão como se um canário me dissesse “olá” quando me vê. Ao chegar àquele enorme e aparentemente moderno edifício onde estudo, reparo em tantos aspetos que remetem o meu pensamento para aquele “moderno”, para algo inacabado, tal como hoje tantas obras que se iniciam e demoradamente se acabam ou rematam. Embora a obra não esteja concluída, falo-te, amigo, da parte onde já decorrem aulas, pois a primeira fase da obra já se concluiu durante o verão passado. Tenho de descer toda aquela escadaria de igreja descoberta, sob fogo cerrado da chuva - com tantos milhões gastos, uma cobertura em nada pesaria no orçamento. Ao entrar no polivalente, que é o primeiro edifício, noto ali uma enorme falta de luz natural, o que cria um ambiente monótono, falta de vida e de cor… Quando me dirijo para o bloco onde tenho aulas, existe aí, sim, uma cobertura, pois por cima há uma passagem aérea que não faz ligação ao meu bloco, não sei se nos estão a diferenciar ou se nos põem de parte, como fizeram contigo… Obviamente que, quando chove, a água acumulada em cima da passagem tem de se eliminar. De quando em quando, uns tubos deixam simplesmente a água cair de uma altura de dois metros e meio e, visto que estamos no outono, já tem caído bastante chuva - e a pressão da água cai onde? Na terra daquele jardim que mais parece um abismo e, por conseguinte, arrasta consigo a terra para o fundo, criando um rio de lama. Depois de visto isto, os “engenheiros” colocaram lá umas pedritas que amparam a água, mas não a eliminam. Técnicos, soluções de última hora… Enfim, continua tudo igual… Continuo o meu percurso e, ao descer uma pequena escadaria, tenho de mudar de direção e quando viro à minha direita levo uma molha do diabo! Um erro de cálculo – ou por uma questão estética – aquelas coberturas não se complementam. Não dá para entrar sem me molhar! Se tu visses aquilo… e o chão? Um desnível aqui e ali cria poças e poças de água. Se o jardim virado a norte era um abismo, então este já não sei o que é! O outro tinha um rodapé que amparava a água, mas este, nem isso! A lama simplesmente escorre pelo chão até à grelha de esgoto mais próxima e daqui a um mês, por este andar… Já à porta do bloco, embora um pouco encharcadito, ainda tenho de apanhar umas goteiritas porque a cobertura não está encostada ao bloco. Mas, enfim, pelo menos já lá estou dentro. Estou na sala D14, que é onde eu tenho mais aulas; adiantando já, aquela sala é um fracasso total. Uma falha na encomenda e o estore não tem varão e assim a utilização plena do quadro interativo só é viável sem sol. O computador queimado só há pouco foi reparado. Equipamentos tão caros! Cá fora, ao fim da tarde, mal se vê. As luzes nunca se acendem… Estava a brincar, meu amigo, porque na verdade elas nem existem! Ainda vejo o pavilhão de Educação Física, que nos últimos noventa minutos da tarde

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não tem tido aulas por não haver luz no balneário! Isto é mesmo maravilhoso. Em certa aula, uma professora fica chocada com uma ameaça de um aluno ao professor – uma, duas, três… - e a direção não resolve, mas junta-se depois um vidro partido e aplicam-se logo medidas sancionatórias. Oh, meu amigo, hoje em dia, o material vale mais que as pessoas… Isto tudo me choca. Este País que tanto tem investido na Educação, vê agora as poucas críticas que te apontei… Para quê termos equipamentos se não os podemos usar? E os que estavam previstos, foi tudo ao ar? Para quê o estore, se não o podemos baixar? Para quê os jardins, se não os podemos apreciar? Para quê coberturas, se nos continuamos a molhar? Então agora, amigo Cesário, peço-te que me expliques: se o teu poema era absurdo e malvisto, o que dizer disto? Pedro Fidalgo, 12.º M

Era

possível reduzir esse tráfego, muitas pessoas que, por exemplo, vão para o trabalho, podiam usar transportes alternativos, como a bicicleta, os autocarros, o comboio. Porque os carros são uma das causas da poluição ambiental. O que aprendo com este dia a dia! É que o mundo está como está, com uma poluição global grande, e a culpa é nossa. É claro que devo culpar as grandes indústrias, bem como as pessoas mas elas, com pequenos gestos, podiam ajudar a melhorar essa situação. Não metendo lixo para o meio do monte, reduzindo no abate de árvores, reduzindo nos


transportes individuais, usando transportes públicos. Tudo isto são pequenos gestos, que não custava nada fazer. E assim, amigo Cesário, o meu dia de ciclista resumiu-se a isto.

Nuno Almeida, 12.º M

Ao longo do nosso dia, assistimos a inúmeras coisas que se passam na sociedade, mas há sempre aquelas que mais despertam a nossa atenção, o nosso olhar. Passeava eu por Estarreja, havia uma agitação que era impossível passar-me ao lado, pessoas atrasadas para o trabalho, pessoas que vão ao mercado, pessoas que levam os filhos à escola, outras que abrem o seu negócio. No parque Antuã, diariamente, praticam exercício, sejam as suas caminhadas ou algo mais agitado, grupos de amigos ou até mesmo pessoas solitárias desfrutam do ar puro. Deparei-me com uma situação, uma coisa em que está a ser gasto dinheiro desnecessariamente, quando esse dinheiro dava para ajudar pessoas que mais precisam, que vivem nas ruas, em casas a ruir ou sem luz e água. Mas não, está a ser gasto dinheiro para construírem uma ponte a ligar o parque à rua do hotel, por quê isso? Encurtar o trajeto da caminhada das pessoas não faz sentido. Outra questão com que me deparei foi estarem a alargar e altear o rio, mais uma coisa desnecessária, pois quando chegam à parte do comboio é impossível remexer e não é isto que vai impedir as cheias para o parque e as terras. Continuando o meu passeio, reparei na quantidade de pessoas que pedem nas ruas, se não é nos parques de estacionamento dos carros, é mesmo de mão estendida à nossa frente. Impressionante é haver aqueles que se fazem de “coitadinhos”, estão bem de saúde e vivem às custas da esmola. Tal como Cesário Verde escreve num dos seus poemas, neste caso, “Num bairro moderno ”, “como é saudável ter o seu aconchego/ e a sua vida fácil! Eu descia/ sem muita pressa”, e eu também, a caminho da escola. Muita coisa haveria a descrever do meu pequeno passeio, mas o mais importante está aqui. Existem muitas circunstâncias que nós mesmos não conseguimos compreender. Tudo podia ser mais simples, mas infelizmente não é. Ana Raquel Figueiredo, 12.º L

Normalmente, quando nos deparamos com um problema na nossa vida, pensamos logo que é o fim do mundo, o fim das nossas vidas. Temos, por hábito, olhar sempre para o nosso “umbigo”, e muitas das vezes não queremos saber do que se passa à nossa volta. O que vemos? Vemos aspetos positivos, movimento, alegria, cor, então eu sorrio. Mas também visualizamos aspetos negativos, aquilo que não queremos ver, então eu choro. Está um lindo dia de outono, o sol brilha por entre os buracos da persiana, parece que consigo ouvir as pequenas folhas a cair sobre a estrada. Chega a hora de me deslocar para a escola, hoje vou fazer um trajeto diferente do habitual, vou de carro com a minha vizinha. Nove horas da manhã, como sempre, apanhámos aqueles camiões da Kit Kat, aqueles que vão à Nestlé carregar chocolates, fico logo com uma enorme satisfação e desejo de sair a correr do carro e ir “assaltá-lo”.

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Ao chegar perto de uma rotunda, algo me chama a atenção, vejo uma mulher jovem, loira, perto da estrada, com um homem. Logo de seguida, assalta-me a expressão na face da minha vizinha, apavorada, é claro que nenhuma mulher se sente feliz ao ver jovens raparigas nesta vida de beira de estrada, miúdas, ainda têm um futuro pela frente, ainda têm de aprender muito. Neste preciso momento, também me deparo com um carro que se dirigia para Estarreja, mas este para junto à mulher loira, e ouço comentários críticos… Continuo a minha viagem até à escola, para ter um dia normal de aulas, vejo pessoas aos gritos com outras, uma grande correria entre os alunos. Chego ao fim de mais um dia extenso de aulas e desloco-me agora para a estação de comboios, para ir para casa, coloco os auriculares nos ouvidos e lá vou eu… Uns indivíduos com uns coletes luminosos pareciam pirilampos, só se viam umas letrinhas a dizer TDT, mas, ao mesmo tempo, uma outra situação desperta o meu interesse, um senhor que se encontrava numa cadeira de rodas. Chuviscava e o senhor andava com os indivíduos dos coletes de um lado para o outro. Entretanto, cheguei à plataforma e sentei-me, mas nunca tirando os auriculares dos ouvidos, e dei por mim a olhar para o senhor da cadeira, pois este estava com uma rapariga, ambos tentavam entrar no elevador da estação, mas não conseguiam, a cadeira era demasiado grande…

Causou-me um aborrecimento, pois quem fez os elevadores devia ter pensado, devia ter consciência de que existem pessoas com necessidades diferentes das nossas, mas que têm os mesmos direitos que nós! Chegou o comboio, entrei, encostei-me à porta, mas aquelas imagens não saíam do meu pensamento. Já parámos, nem que seja um minuto, para pensar? No caso da rapariga à beira da estrada? E o senhor da cadeira de rodas? Costumamos pensar só em nós, e já tentámos fazer algo para ajudar os outros? Sofia Barbosa, 12.º L

Causou-me um aborrecimento, pois quem fez os elevadores devia ter pensado, devia ter consciência de que existem pessoas com necessidades diferentes das nossas, mas que têm os mesmos direitos que nós!

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PSICOLOGIA, HIPÓTESE OU REJEIÇÃO? Joana Venâncio e Sara Pinto Ex-alunas de Humanidades da ESE

Muito provavelmente, já há muito que alguns alunos do 12.º ano se andam a questionar acerca da escolha a fazer para o próximo ano. Psicologia é apenas um dos muitos cursos disponíveis para ingressar no ensino superior. O ensino secundário é um ciclo preparatório para os estudantes que pretendem ter acesso a um curso superior e, deste modo, continuar a aprofundar os seus conhecimentos numa área de maior interesse para si. E nós não fomos exceção. Assim, Psicologia sempre foi uma das nossas áreas de interesse, possivelmente, devido à sua complexidade e diversidade. Desta forma, no 12.º ano, escolhemos Psicologia como uma das nossas disciplinas opcionais. Foi assim que tivemos o primeiro contacto com a nossa área de interesse e curiosidade. Pois bem, no final do Secundário, a nossa opção foi mesmo o curso acima mencionado e não estamos nada arrependidas, apesar de ser em universidades diferentes, Aveiro e Coimbra. Assim, Aveiro é mais “empenhada” em unidades curriculares científicas, como matemática, biologia, química, entre outras. Mas é, essencialmente, um curso muito interessante, muito prático e muito envolvente. A área de matemática é importante para alargar o raciocínio humano, analisar e relacionar os sinais que o sistema nervoso emite, e aprofundar aspetos de probabilidade e estatística que são essenciais para este curso. Os vários conteúdos de Psicologia, como a atenção, perceção, motivação, emoção, memória, entre outras, permitem-nos saber que a mente humana é um sistema organizado, interrelacionado e multidimensional. Na faculdade de Coimbra, Psicologia tem como principal interesse a conjugação de cadeiras teóricas com cadeiras

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práticas. Em cada semestre está visivelmente patente a coordenação de unidades curriculares ligadas à biologia, matemática, vários tipos de Psicologia e, também, aspetos mais sociais. Desde o início, o estudante tem contacto com várias vertentes da Psicologia como, por exemplo, em que aspetos o ser humano se distingue psicologicamente; perceber a evolução psicológica dos indivíduos desde os primeiros anos de vida até à idade adulta; como é que aspetos biológicos/fisiológicos influenciam o comportamento humano, e muito mais. Isto permite aos alunos terem uma noção do que os espera futuramente, ou seja, aperceberem-se de que estas áreas estarão sempre interligadas no decorrer da profissão. É esta diversidade de temas, tanto numa universidade como noutra, que torna este curso tão cativante, abrangente, dado que oferece a oportunidade de os alunos adquirirem bases/conteúdos ligados a vários mundos, tais como a medicina, as ciências sociais, a história, a matemática. Porém, é importante salientar que há temas que são abordados numa universidade e não o são noutra. É um curso pouco conhecido de forma aprofundada pelos jovens. Todavia, está a ganhar cada vez mais adeptos e será, decerto, bem defendido pelos futuros profissionais. Antes de ingressar no ensino superior, é difícil ter um feedback do que se passará em determinado curso, no entanto, existem meios para obter alguns dados, como as médias, o programa adotado

pelas diversas faculdades, a carga horária, as saídas profissionais, a reputação. São estes os principais aspetos que devem ser tidos em conta pelos alunos do 12.º ano antes de se lançarem na vida académica. A busca desta informação pode ser feita tanto através da pesquisa pela internet, como por visitas aos próprios estabelecimentos de ensino. É também aconselhável contactar com pessoas que já estejam a frequentar o curso em questão, sendo uma mais-valia para a elucidação e consciência do novo percurso que os espera.

Sara Pinto (em cima) e Joana Venâncio (em baixo)


SAIR TARDE DA ESCOLA, SUAR E SALTAR, PARA BELO(A) FICAR! Anabela Amorim

Equipa de Educação para a Saúde da ESE

“Deitar cedo e cedo erguer dá saúde e faz crescer.” Não só!... Sobe e toca! Sobe o joelho! Passagem do step! Volta ao step! Flexão da perna atrás! Agachamento! Básico! Básico aberto! Cruzamento! Passo em V! Círculo! Joelho e sai ao lado! Joelho e volta! Balanço! Passo em U! Triplo joelho! Joelho em cavalo! Passo lateral! Toque no step!

O espaço é muito bom, a aparelhagem de áudio potentíssima, a turma excelente e a professora maravilhosa, sempre com um sorriso, uma palavra de estímulo, revelando, sobretudo, uma enorme disponibilidade. No corrente ano letivo, o Projeto de Educação para a Saúde estreouse com a aula de step/aeróbica/ ginástica localizada, à terça-feira, destinada a professores, assistentes operacionais e colaboradores desta escola. Com música, alteres, colchões, steps e o ginásio, gentilmente cedido pela direção, trabalham-se braços, pernas, bíceps, tríceps, deltóides, glúteos, abdominais… Para quê? Para promover a atividade, a aptidão e a condição físicas, melhorar a coordenação motora, aumentar a resistência, a força muscular, a flexibilidade, no geral, o fitness. Contudo, para além de todas estas benfeitorias, é forçoso sublinhar o que vem por acréscimo e não pode ser negligenciado: DIVERSÃO, RELAXAMENTO, FUGA AO STRESS! Entra-se cansado, sai-se repousado! Entra-se macambúzio, sai-se bem disposto! Entra-se velho, sai-se remoçado! Entra-se gordo, sai-se magro! Entra-se mole, sai-se rijo!

Ora diga-me, que motivação tem para a aula de terça-feira?Como se sente depois dela? Entro exausta e saio leve, exercício físico com amigos é rejuvenescimento imediato. Antes

Manuela Azevedo

e depois de uma aula de ginástica. Hoje é terça-feira…após um dia de trabalho “enclausurada”, sete horas de pé e sem luz natural, a aula de ginástica funciona como alívio para a mente. Por vezes, as pernas já estão tão pesadas que não “apetece” ir à aula. Mas não se pode deixar a preguiça vencer, porque o grupo é ótimo e a professora Ana está sempre pronta para nos ajudar a relaxar. Pena ser

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só uma vez por semana…

Lurdes Teixeira

Fazer exercício contribui para o bem estar físico e emocional das pessoas e ajuda a prevenir doenças. Em qualquer idade, este assume um papel muito importante na criação de estilos de vida mais saudáveis. Depois de, ao longo deste ano letivo, praticar exercício nas aulas ministradas pela professora Ana Barbosa e para as quais fui convidada a participar, sinto-me “leve” e com a certeza de ter ganho mais anos de vida. No final de cada aula, não só a parte física ficou positivamente afetada, mas o espírito fica mais liberto, não só pelo exercício, mas também pela convivência com o grupo, que é estupendo. Não custa nada tirar um tempinho da nossa rotina diária para esta prática. Na verdade, somos nós que ganhamos com isso… E digo, por experiência própria, que “não devemos deixar para amanhã o que podemos fazer hoje”! Carla Barbosa

Hoje foi uma terça-feira mais “pobre”. Por ter sido feriado, não houve ginástica! Que falta que me fez! E não digo isto com tom irónico, porque aquela hora do dia (18:30) é sempre aguardada com grande expectativa. Ainda que as chatices tenham sido muitas, ainda que a cabeça doa, ainda que as pernas já peçam para me sentar um pouco, a aula de ginástica “fala mais alto”. É um momento que dedico a mim própria e que “vale ouro” (não só pelo exercício realizado, mas, e essencialmente, pela distração, pelo convívio e bem estar que proporciona). Terminada a aula, penso sempre “Amanhã não me mexo! Estou toda partida!”. Contudo, e apesar de muitas vezes à quarta-feira as pernas doerem mesmo, a forma e a boa disposição com que encaro o meu dia de trabalho fazem-me pensar que “Afinal, valeu a pena ouvir aquela voz.”

Rosário Bastos

A aula de ginástica é como um portal de acesso a outra dimensão, a um espaço onde a mente se expande e as ideias se clarificam. Antes… há um cansaço doentio, uma letargia incomodativa; depois … há cansaço, sim, mas… proativo, estimulante… A nossa “professora” facilita enormemente essa transformação. Por um lado, pela vivacidade que imprime aos diferentes exercícios; por outro, pela atenção e compreensão para com as nossas limitações e maleitas. Eu adoro a minha aula de terça-feira!

Lucinda Leal

Como é bom rir, saltar, fazer exercícios trocados, suar, brincar, sentir os músculos a vibrar, torcer à esquerda, virar à direita, fingir que se controla o corpo, que se domina o físico. Como é bom deitar no chão duro e dizer: acordem-me só amanhã de manhã! Como é bom sair e sentir asas nos calcanhares como Mercúrio e subir a escadaria monumental da ESE, à quarta-feira, com uma ligeira impressão na curva das pernas, sublinhada, contudo, por uma maior ligeireza… Como é bom pensar no sofá, na lareira, no livro, na revista, nas aulas a preparar, nos testes a corrigir, no jantar para fazer, no dia de trabalho cansativo quase terminado, na discussão, na confusão, largar tudo e partir para o STEP, o CAVALO, o CRUZAMENTO, o TRIPLO JOELHO…

Anabela Amorim

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“MIND THE GAP” – A ESE OUVIU, EM FINS DE MARÇO Eulália Gomes

Docente de Inglês/Alemão

Não… Desta vez o som não é hip-hop e muito menos nos encontramos num concerto dos “Mind Da Gap” no Porto. É sim ao vivo… com muita audiência, mas em terras londrinas. Também não aconteceu apenas numa noite, mas a todas as horas em que o grupo de 40 e muitos alunos e algumas professoras da nossa escola resolveu viver sons mais underground, em terras de Sua Majestade. “Mind the Gap” é um aviso já tão familiar aos nossos ouvidos, nestes dias em que visitamos Londres, e em que usamos o tube para chegarmos mais depressa aos sítios que planeámos visitar, que, em certas estações em que não o ouvimos, parece que a azáfama tem uma quebra. Quando chegamos ao coração da cidade, abrimos bem os olhos, e aí ela mostra-se em toda a sua essência: Big Ben, Houses of Parliament… mas não temos tempo para mais, por agora… o tube espera-nos de regresso ao hotel! Nove horas da manhã do dia 29 de março. Depois de um tradicional British breakfast, deixamos o hotel Travelodge, nas Docklands, e embarcamos na aventura das vivências underground que nos conduzem a locais que marcam o tal “gap” entre a nossa cultura e a britânica. No Science Museum transportamo-nos no tempo e em nós mesmos, escapando da e para a realidade. Depois vamos ao Harrods comprar uns chás e sorvemos com deleite a realidade britânica. Entre muitos outros veículos, passam por nós táxis que apregoam o slogan “London’s calling” e os sons dos The Clash ecoam na mente, lembrando tempos em que Londres era povoado pelas cristas coloridas dos punks.

E, depois do lunch break, é chegada a altura de ir ao Madame Tussauds… Pode ser que por lá, entre as muitas celebridades “enceradas”, se consiga rever ainda um dos punks da década de 70. Como num passe de mágica, encontramo-los todos por lá. Não os punks, mas os ídolos para todos e mais alguns gostos: o Andy, a Lisa, o Marlon, o Alfred, o Oscar, o George, o Isaac, o Albert, o Freddie, o Jim, o Bob, a Amy, os quatro magníficos, que cantaram “Yesterday”, mas que ainda hoje se ouvem por todo o lado… E também lá está o Winston, mas sem charuto, e o Adolf, sempre com o seu ar irado. Posa-se para as fotos, também ao lado de Obama sorridente e do nosso special one. E, ali mesmo, a máquina do tempo de H. G. Wells, transformada em táxi, levanos a viver The Spirit of London, ao longo de vários séculos… Mas está na hora de apressar… de nos balançarmos para outras dimensões. “We will rock you”… não foi o que nos prometeram? E era isso mesmo que queríamos: balançar e embalarmo-nos ao som dos Queen. E agora? Como poderei descrever as sensações que a música, a mensagem e as representações nos fazem viver? Para não falhar na descrição, limito-me apenas a dizer: Awesome! Desta vez esperanos o British Museum que, contrariamente ao título de uma obra de David Lodge, continua bem de pé e com exposições dignas de qualquer olhar. Depois apetece visitar as pequenas lojas de Covent Garden e assistir a um espectáculo de rua, ali mesmo. Com as vistas saciadas e os pés doridos, retomamos

o metro até Hyde Park Corner. É que apetece refastelar na relva de Hyde Park e desfrutar dum dia de sol de março, tão raro em Londres, mesmo em agosto. Mas nem só de natureza se vive em Londres! Toca então a ir até ao bulício de Picadilly, de Regent, Carnabye Oxford Streets… Também queremos ver o Nelson em Trafalgar Square (já só faltam 118 dias para os Jogos Olímpicos, lê-se em frente à National Gallery… e está quase na hora de ir dormir). Downing Street, Buckingam Palace, onde nos rendemos ao esplendor do render da guarda, Tower of London, Tower Bridge, Tate Modern, Millennium Bridge, St. Paul’s Cathedral,… tudo calcorreado, mas depois visto com outro “olho”: Londres deixounos usar o seu (The London Eye), para termos uma vista mais ampla da cidade. Que frio!!! Será mesmo porque a temperatura baixou significativamente ou porque a tristeza por ter de deixar em breve uma das mais belas cidades do mundo provoca já em nós essa sensação??! Por cima das nuvens, que nos impedem de avistar o Canal da Mancha, dizemos com saudade: See you soon, London!

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HISTÓRIAS DA MINHA HISTÓRIA João Luís Andrade Marques

Ex-formando do CNO-Antuã/ ESE (nível Secundário) As minhas recordações de infância são de um menino do campo, sem brinquedos, mas com muita alegria. Lá na minha rua, na aldeia de Sobreira Formosa, em Proença-a-Nova, havia muitas crianças, brincávamos às escondidas, ao prego, à tala, ao berlinde e aos cowboys. Adorávamos ir aos grilos e o processo era sempre o mesmo: introduzíamos uma palha no interior da “casota” da criatura e dizíamos: Gri-gri Sai daí Que o teu pai Vem aí Com uma faca de leitão P’ra te cortar o coração. Tenho boas recordações desse tempo, porque quando eu era criança brincavase mais livremente, principalmente nas aldeias, porque estávamos em contacto permanente com a natureza. Tínhamos de inventar brincadeiras, jogos, construíamos brinquedos até com a ajuda dos nossos pais, e também recorríamos frequentemente à imaginação, o que era muito positivo. Como o número de filhos por casal também era geralmente maior, havia mais interação entre as crianças. Também tratávamos dos animais, víamos a mãe cozer o pão e íamos regar as hortas. A casa da minha família, além da parte habitacional, tinha também uma loja

(mercearia) e uma taberna, que a minha mãe geria. O facto de os dois espaços serem juntos facilitava o trabalho da minha mãe, que tinha que se dividir entre um lugar e o outro. Tenho a imagem da minha mãe sempre bem-disposta com todos. As clientes da loja eram todas suas conhecidas e havia uma relação de amizade entre ambas as partes. A ida às compras era também um momento de descontração, punha-se a conversa em dia e contavam-se algumas novidades. Este tipo de comércio, conhecido por “comércio tradicional”, tinha um atendimento personalizado e esclarecedor, servindo o cliente a tempo e da melhor maneira possível. Naquela altura, era o dono da loja que ia buscar os produtos às prateleiras e não os clientes. Era tal a relação dos clientes com o dono da loja, que não eram raras as vezes em que estes batiam à porta depois do fecho desta, e eram atendidos. Numa aldeia da minha freguesia, Catraia Cimeira, há um caso curioso em relação ao comércio tradicional: como existem muitas povoações de dimensão reduzida e há falta de meios de transportes públicos, existe um supermercado cujos proprietários, para chegar mais perto dos seus clientes, têm uma carrinha adaptada e deslocam-se às povoações. Neste caso, em vez de serem os clientes a deslocarem-se à loja, é o proprietário que o faz. Durante a minha infância na aldeia, todos nós tínhamos algumas tarefas a desempenhar, as minhas eram lavar os copos da taberna, ir ao pão e levar vinho na hora do almoço a alguns operários que trabalhavam numa serração, que empregava um número elevado de pessoas. A loja da minha mãe era

Aqueles tempos foram para mim úteis, pois na brincadeira aprendi algumas coisas importantes para a escola, como as medidas de capacidade e peso, por exemplo.

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um espaço com muita cor, pois a pintura das paredes era em tons de amarelo e verde. Tinha também todo o colorido dos produtos embalados, como o leite, o açúcar, as bolachas, a farinha 33 e ainda das frutas, maçãs, peras, laranjas, morangos e marmelos. O verde das hortaliças também predominava. E uma vasta gama de cereais que estavam nas tulhas (sítio onde eram armazenados), como trigo, aveia, milho, feijão seco, grão-de-bico, cevada, favas secas e ainda a parte dos vegetais, cenouras e tomate. Uma imagem bem presente em mim era a maneira como as freguesas pediam as coisas: “ó Maria, quero meia barra de sabão azul, um litro de leite e dois rebuçados para o meu menino”. Na maior parte das vezes, quando chegava o momento de pagar, diziam: “ó Maria, assenta aí que o meu home paga logo ou no final”. Este final era o fim do mês. E eu estava sempre atento à maneira como a minha mãe fazia as contas e o que dizia depois de os clientes saírem: “é sempre a mesma coisa… ó Maria assenta aí”. Aqueles tempos foram para mim úteis, pois na brincadeira aprendi algumas coisas importantes para a escola, como as medidas de capacidade e peso, por exemplo. Anexada à loja estava a taberna, que era um local com muitos ruídos e com alguns cheiros próprios das bebidas, principalmente do vinho. O vinho que era vendido na taberna vinha em grandes pipos de madeira, e havia poucas bebidas engarrafadas em doses individuais, lembro-me que até os sumos eram vendidos a copo. As primeiras bebidas em doses individuais de que me lembro eram o Pirolito (uma espécie de gasosa) e também um sumo, Larangina-C, para além da cerveja. Normalmente, tinham um ambiente acolhedor, havia petiscos, vinhos e sangria. No fundo, as tabernas


também eram um local de encontro e não apenas um sítio onde se matava a sede ou se enganava a fome. Ia-se lá também para estar com os amigos e punha-se ainda a conversa em dia. Às vezes encontravam-se nas tabernas uns versos alusivos, como este, por exemplo: Seja branco ou seja tinto Não importa a cor que tem, Bebido nesta casa Todo ele me sabe bem. Quando eu andava na escola primária, tínhamos uma tradição muito engraçada, que já não se pratica atualmente. Na altura do Carnaval, fazíamos uma recolha de dinheiro entre todos e comprávamos um galo para oferecer ao nosso professor. Enfeitávamos um andor com fitas e laços e colocávamos lá o galo (devidamente acondicionado, para não fugir). Depois, percorríamos as ruas com os andores em direção à escola e cantávamos bem alto: Este galo é ladrão, Foi ao Vale do Serrão, Comeu pepinos e melão, Fez a paga a sete tostões. Nós iremos ao juiz Carregadinhos de correntes, Nossa mestra come galos, Nós ficamos bem contentes. Viv’ó galo!!! Era uma alegria nesse dia, porque não tínhamos aulas e ainda recebíamos rebuçados do professor. E assim fui eu subindo, degrau a degrau, de classe em classe, da 1.ª até à 4.ª classe, ano em que se deu em Portugal a Revolução dos Cravos, o 25 de Abril de 1974. Este dia está bem presente na minha memória. Estávamos a iniciar mais um dia de escola quando os professores nos disseram para irmos para casa, pois não haveria escola. O grande largo que se encontrava em frente da escola (o largo das festas da aldeia) tinha muitas árvores e encontrava-se repleto de viaturas militares e muitos soldados.

Dizia-se que ali era um ponto de passagem para Castelo Branco e também se dizia que lá na terra havia algumas pessoas da PIDE, infiltradas. Lembro-me que os soldados tinham um ar pacífico e de eu e os meus colegas perguntarmos o que faziam ali. A resposta foi: “estamos a repor a liberdade”. Depois de brincar com alguns dos militares ali no largo, fui para casa, e senti que os meus pais estavam preocupados. Perguntei-lhes o que é que se estava a passar. Disse-lhes também o que os militares tinham dito em relação à liberdade e o meu pai mandoume calar. Mais tarde, explicou-me que em Portugal não se podia falar de política nem manifestar o nosso pensamento em relação ao governo, pois vivíamos em ditadura. O 25 de Abril de 1974 assinalou não apenas o fim de uma longa ditadura, mas também a subversão revolucionária de um golpe de estado e uma reviravolta nas expectativas da oposição política ao Estado Novo. Na minha família, tenho um caso que mostra até que ponto ia a ditadura e está relacionado com o meu avô Luís, que eu nunca conheci. Ele era enfermeiro e tinha uma vida pacata, até ao dia em que foi ver e tratar um paciente conotado com o Comunismo. Disse-me o meu pai que o meu avô foi de noite ter com o paciente para não ser visto, com medo das forças policiais, mas mesmo assim foi denunciado e passados alguns dias a polícia foi lá a casa, prendeu-o e nem sequer deu uma explicação à família. Esteve na prisão do Forte de Caxias e foi libertado passados

sete meses, mas com muitas marcas de tortura e violência. Faleceu pouco tempo depois e toda a família ficou com a convicção de que o motivo da morte foi por tudo o que passou na prisão, uma vez que nunca foi possível apurar as causas da sua morte. Em outubro de 1976, começo o secundário. E para mim a novidade foi

Na minha família, tenho um caso que mostra até que ponto ia a ditadura e está relacionado com o meu avô Luís, que eu nunca conheci. contundente, estava à espera de um professor, de apenas uma sala de aula, e muitas expectativas em relação aos novos colegas. Mas logo me apercebi de que tudo era novo e diferente. As várias disciplinas, os professores que eram muitos, a correria entre cada aula, os colegas que eram quase todos

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desconhecidos. De referir que a maior parte dos meus colegas tinham ficado na Telescola em Sobreira Formosa, um tipo de ensino que já não existe atualmente, mas que na altura muitos miúdos frequentavam (era um ensino através da televisão, com um professor a acompanhar em sala de aula). Quando tinha dezassete anos, o meu pai comprava pinhais e os meus sábados ficaram logo ocupados, fui de imediato convocado para incorporar a equipa de trabalho na mata. A importância económica, social e ambiental da floresta nacional é fácil de mensurar, bastará olhar para os números do emprego que cria, para o seu peso nas exportações do país e para os benefícios ambientais que nos dá, para chegarmos facilmente à conclusão de que se trata de um dos principais motores de desenvolvimento nacional. Os maiores inimigos das florestas são os homens, quando não as estimam e não as compreendem. O machado, a serra, o arado e a charrua, a pastorícia

em excesso, a roça indiscriminada dos matos, constituem as armas preferidas, sem esquecer a maldade e a incúria. Deverá haver bom senso e comportamentos adequados à proteção da floresta. Sendo as árvores de grande importância para a biodiversidade à escala global, quero agora fazer referência a um velho ulmeiro, que se encontra na minha terra e está classificado como “monumento vivo de interesse público” pela sua raridade. Esta árvore proporciona um espaço muito agradável para estar, porque dá sombra e muita frescura a quem se senta debaixo dela. No concelho de Proençaa-Nova, existem ainda mais algumas árvores classificadas e protegidas; é o caso de mais um ulmeiro, um choupo e uma oliveira centenária que são pertença da Câmara Municipal de Proença-aNova. O aparecimento do maranho, enchido característico deste concelho, está relacionado com o facto de esta zona do pinhal ser, por excelência, zona de caprinicultura. O maranho é dos enchidos mais ricos, pois leva a melhor carne do cabrito ou da cabra, o melhor do porco (presunto e chouriço magro), a que se junta arroz e hortelã, que lhe dá um aroma e gosto característicos. A designação de Maranho está relacionada com o facto de todos estes ingredientes que mencionei serem colocados dentro de um saco de pele, feito a partir do estômago das

cabras, a que, depois de bem lavado, se dá a forma mais ou menos semelhante à dos paios. Normalmente, o maranho acompanha o cozido (couves de repolho ou tronchudas da horta, conforme a época do ano). Houve outros trabalhos que realizei enquanto estudava, a apanha da azeitona era um deles. Os dias frios e chuvosos no final de dezembro e os primeiros de janeiro, que coincidiam com as férias escolares, eram normalmente escolhidos pela família para se realizar este trabalho. Era muito duro mas divertido! Os elementos familiares que habitualmente participavam neste trabalho eram o meu pai, a minha avó, o meu irmão, a minha irmã e também um dia por outro o meu tio, que ganhava à jorna. Chegávamos bem cedo aos terrenos onde estavam as oliveiras. A primeira coisa que o meu pai fazia era uma fogueira, que nos dava muito jeito e onde íamos de quando em vez aquecer as mãos, e também servia para preparar as nossas refeições. A minha avó, com a ajuda da minha irmã, estendia os panais debaixo das oliveiras e nós, os homens, subíamos e colhíamos à mão a azeitona para os panais. Quando as oliveiras tinham um grande porte, tornava-se difícil e até perigoso a apanha da azeitona, era então necessário recorrer a alguns utensílios para o efeito, como o serrote, a corda e também a vara. Era engraçado quando o meu pai recorria ao serrote para cortar uma parte menos acessível, dizia então para a minha avó: – Ó Carmo, deixe cá ver o serrote

Enfeitávamos um andor com fitas e laços e colocávamos lá o galo (devidamente acondicionado, para não fugir). Depois, percorríamos as ruas com os andores em direção à escola e cantávamos bem alto (…).

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para cortar ali aquele ramito… não sou nenhum gaio. E a minha avó, que era da opinião que as oliveiras só deviam ser “limpas” (podadas) uns tempos depois de serem colhidas, dizia, zangada: – Só cortar, só cortar… para o ano eu quero ver… vais buscar o azeite à loja! O meu pai ripostava: – Ó sogra, eu sou o melhor limpador de oliveiras que há por aí, tirei o curso na Universidade em Coimbra! A hora do almoço era, sem dúvida, um grande momento de descontração e, claro, de saborear a refeição. Os deliciosos enchidos, os saborosos queijos, o muito bem curado presunto, o ótimo pão, o bom vinho (tudo produtos caseiros) e uma adorável limonada, como só a minha avó Carmo sabia fazer. O dia de trabalho terminava com a limpeza da azeitona, que consistia em retirar as folhas e outras impurezas, como pequenos ramos. A seguir colocavase a azeitona em sacos, sendo depois transportada para as tulhas do lagar. Era aí que depois se procedia ao fabrico do azeite. Na minha juventude, na época do Natal tínhamos uma tradição que envolvia todos os jovens e adultos, normalmente homens: trata-se da recolha dos madeiros que se destinavam a arder no adro da igreja na véspera de Natal. Atualmente esta tradição, que considero muito interessante, ainda perdura em toda a Beira Baixa. No início de dezembro, começávamos a marcar as cepas que iam ter o privilégio de serem transportadas para o adro, assim como algum madeiro esquecido de um desbaste florestal. Normalmente, eram os rapazes solteiros que se dedicavam a estas tropelias. O transporte das cepas era feito com recurso a carroças, puxadas por animais, normalmente mulas. Claro que havia alguns madeiros mais difíceis de transportar, mas isso fazia parte de todo o processo. Muitas vezes, devido à envergadura das cepas, tentávamos arranjar os carros mais adequados para a transferência dos

cobiçados madeiros. E íamos buscá-los sem os seus donos saberem. Quando se chegava à vila, era uma algazarra infernal e entre a admiração de uns, pela quantidade de madeira trazida, e a estupefação de outros, ao verem o seu carro (carroça) que julgavam guardado, o gozo era enorme. No dia 24 de dezembro, à noite, acendíamos a fogueira e no meio das conversas ao calor, das travessuras e dos relatos, por vezes assávamos uma chouriça. A fogueira mantém-se a arder até ao dia de Ano Novo e nós dizemos que é para aquecer o Menino Jesus. Embora a Sobreira, neste momento, sofra de uma grande desertificação, como aliás todas as zonas do interior, é um sítio muito agradável de visitar. As marcas do abandono na minha zona são inúmeras e muito diversas; o envelhecimento da população é talvez a

grandes cidades, também fez com que muitas escolas fechassem. As escolas estão lá… mas as crianças são apenas uma recordação; na minha zona, assim que se fecha uma escola por falta de alunos, oiço logo dizer as pessoas que é a “morte” da aldeia. E tenho a certeza de que as futuras gerações – com certeza num futuro bem próximo – vão sentir as consequências da desertificação, mais até que nós. Enquanto outros países da Europa fomentam e criam condições para o regresso das populações às cidades pequenas do interior e às localidades mais isoladas, em Portugal, faz-se exatamente o contrário. Em nome de uma falsa poupança, induzem-se as populações da província a abandonarem os seus locais de origem e a migrarem para um litoral por vezes hostil. E isto está a ter implicações negativas na própria

Sendo as árvores de grande importância para a biodiversidade à escala global, quero agora fazer referência a um velho ulmeiro, que se encontra na minha terra e está classificado como “monumento vivo de interesse público” pela sua raridade. mais visível. Faltam as forças, faltam os meios, e as pessoas até têm por vezes uma atitude de apatia e resignação (refiro-me, neste caso, até a pessoas mais novas). Atualmente, o interior sofre com tudo isto: os campos abandonados, assim como as casas, os caminhos e as alfaias; também a floresta entra pelas aldeias porque ninguém a detém (as hortas que existiam na minha infância deram lugar a floresta por vezes desordenada). Outra coisa que deixou de existir, também, é a interação entre gerações mais novas e mais velhas, o que me deixa imensamente triste. A desertificação do interior do país, com a deslocação das populações para as

vivência das pessoas e das famílias: deixam de existir laços fundamentais de coesão social, cultural e familiar. Mais do que subsídios ou isenções fiscais, eu penso que o combate à desertificação deverá ser feito instalando no interior serviços prestados pelo Estado, não criados propositadamente, mas sim, por exemplo, deslocalizando na medida do possível do litoral para o interior universidades ou institutos. Fechar serviços na província é o maior erro, quanto a mim, que foi praticado em Portugal nos últimos anos (como é o caso das escolas e dos correios), pois o esforço deveria ir exatamente no sentido contrário: manter serviços (mesmo em baixa produção) que aliciassem as

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pessoas a ponderarem um regresso à terra – se não definitivo, pelo menos sazonal. Outra solução possível poderia apostar na requalificação dos espaços, como no caso das Aldeias de Xisto. As Aldeias de Xisto são constituídas por 24 aldeias distribuídas por 14 municípios do pinhal interior, na região do centro de Portugal, um território de enorme beleza e que oferece infinitas possibilidades de lazer. Ao longo dos últimos anos, os 24 núcleos foram alvo de um programa de requalificação que permitiu às aldeias adquirir potencial humano de desenvolvimento, transformandose em pólos de atração turística que permitem a criação de uma base económica que passa, nomeadamente, pela recuperação das tradições, pela valorização do património arquitetónico construído, pela dinamização das artes e ofícios tradicionais e pela defesa e preservação da paisagem em que se enquadram. O principal objetivo deste trabalho é melhorar a qualidade de vida das populações das aldeias, elevando os seus níveis de autoestima, qualificando o seu tecido social e agregandoas num processo participativo de desenvolvimento que é, antes de mais, seu. Uma dessas aldeias é a Figueira, que dista 4 km de Sobreira Formosa. Com casario de xisto, ruelas e becos, é uma aldeia viva, ainda com ritmos verdadeiramente rurais. As casas genuinamente rurais e comunitárias são um dos maiores atrativos que a aldeia oferece. O dia a dia é marcado pelos ritmos rurais, que se cruzam com os itinerários da aldeia: a eira, onde desembocam as ceifas; o forno comunitário, onde se coze o pão; a fonte, onde se vai buscar a água. Em todo o redor da aldeia, existe um caminho rural que nos leva até a uma antiga ponte filipina e a um lagar de azeite. O trajeto até ao forno comunitário faz-se por um emaranhado de ruas estreitas sempre ladeadas pelas típicas casas em xisto. As horas que passei a escrever este

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portefólio também despertaram em mim o gosto pela escrita, e as pesquisas que tenho feito, de certa forma, também fizeram com que adquirisse mais conhecimento. Eu próprio fiquei surpreendido com algumas coisas que tenho escrito! Ao longo do processo, a principal dificuldade que senti foi na gestão do meu tempo. Devido à minha profissão, e pelo facto de passar muitas horas fora de casa, a grande dificuldade foi mesmo a falta de tempo. Mas devo dizer que me deu muito prazer fazer este trabalho. Não tive dificuldade em adaptar os conteúdos que eram pedidos à minha história de vida. Sinto este projeto como uma vitória devido ao que aprendi de novo e que contribuiu para a minha valorização pessoal. Nota: O presente artigo constitui uma versão muito abreviada do Portefólio Reflexivo de Aprendizagens do candidato.

Fechar serviços na província é o maior erro, quanto a mim, que foi praticado em Portugal nos últimos anos (como é o caso das escolas e dos correios), pois o esforço deveria ir exatamente no sentido contrário.


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THE TOPIC OF GMF IN ENGLISH LESSONS Elsa Machado Docente de Inglês

GMF (Genetically Modified Food) seems too scientific a subject to be dealt with in English classes. However, as Content Language Integrated Learning (CLIL) advocates the use of English as a means to transmit knowledge from the most varied sources, and bearing in mind the depth of 11th grade syllabus, I decided that I could delve into an area which goes beyond the well trodden path of global warming and environmental issues. (Actually the English curriculum is somehow obsessed by the topic Environment!) Thus, having a class of students from the Science Field supposedly interested in science-based contents, I decided to embrace the challenge of a debate centered around the issue GMF. After some lessons reading and discussing the topic, students set out on a very heated discussion taking the pro or against side. The result was very interesting, proving that for language learners self-confidence and the wish to take risks are crucial in the development of their speaking skills. Students’ enthusiasm and the fact that weaker students could shine was very rewarding to me as a teacher. At the end of this process students had to write a small reflection on the subject. Here is Fabio’s written work which I hope you enjoy reading.

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GENETIC MODIFIED FOOD: SAVIOR OR NEMESIS ? Fábio Rafael Valente Aleixo Aluno do 11.º A

While some people say that GM Food can be our hope, since the world population is increasing and there is the need to grow more crops and produce more food, an equally large group of people argue that GM Food will only drive us closer to extinction by terminating with natural species. From my point of view and since this isn’t yet a widely spread technology, GM Food is closer to be a Nemesis than a Savior. I say this because no one knows for sure how harmful GM Food can be for Human Kind and even more for Nature. In Man’s case GM Food can be a potential disease source because we will not be eating something naturally grown; instead we will be eating a mixture of several organisms, some of them bacterias. And there is also the question: are we prepared to eat these things? Once again I guess not, they’re not natural but we are, so we need to eat natural food, not lab made food. There is also an undeniable concern about nature; the most likely thing that will happen is that GM crops will take over non modified crops, killing every natural species. But, even if this may seem too dramatic, predators will be likely to eat these GM Plants, and since the latter are not naturally grown, their organism may react - affecting the food chains - and those animals will get sick and eventually die, changing in this way Nature’s balance. To conclude, even if in the long run GM Food may seem our hope and its impact on our health is an issue to explore even further, there are still

the consequences which we may not realize, those that affect Nature. And those will only be seen and felt when they throw humankind into extinction. And when I measure these things I think that we should avoid GM Food at all costs because like the Nemesis it will make us pay for our lack of effort to keep this world natural only because we want to have an easier life.

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“THE ONLY WAY TO DO GREAT WORK IS TO LOVE WHAT YOU DO” English lessons not only offer an opportunity for students to develop their communicative skills in a foreign language but they also allow students to reflect on issues and topics which affect the world and humankind in many different ways. One of the topics which is part of the syllabus in the 10th grade is the world of teenagers. Thus, bearing in mind the way teens are such a diverse and complex age group, just imagine what a teacher can do within such a rich realm. When Steve Jobs died, the hype around his death and his personality aroused my curiosity since I started to imagine how I could fit his amazing life story in my lessons. Being a kind of a clumsy self-taught teacher in the ICT world I was suddenly taken away by this computer geek who had created the first Apple computer in the makeshift scenario of his parents’ garage. Then I came across his wonderful speech at Stanford University. There he was advising young graduates to “stay hungry, stay foolish!” I could hardly wait for my 10th D to listen to this enthralling, touching speech. I will leave you with two examples of their reflections, one written by Margarida and the other by Cesar. I hope you enjoy as much as I did. And as Ken Robinson says “The relationship between knowledge and feeling is at the heart of the creative process” 1 and I believe that students’ best creative work comes out of this wonderful combination. Elsa Machado. Docente de Inglês

Robinson, Ken (2001). Out of Our Minds: learning to be creative. Capstone. 1

The whole point here is to identify our “sustainable love” for any particular work, which we call as passion. We should think about this awareness that something is missing, and I know we will fill the void soon.

Steve Jobs rarely spoke about himself. In 2005 though, he gave one of the most moving speeches I have ever heard. During the only graduation speech he ever gave he told the graduating class at Stanford three stories of his life, which are all great lessons. Connecting the Dots. There are a lot of things we love to do in life, sometimes very distinct things, which will possibly lead to our future career. So with love for such diverging career paths, how can we truly find our passion? There are times when you get very well appreciated about the things in which you are good, but not exceptional. These are the points when one may feel too enthusiastic about something, in which he or she may do good but not great. It’s a difficult thing to identify during the initial years of our lives.

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During teenage years, there are so many distractions… but after the degree and initial start of career, you suddenly realise “No, I don’t want to do this forever”. The whole point here is to identify our “sustainable love” for any particular work, which we call as passion. We should think about this awareness that something is missing, and I know we will fill the void soon; and as Steve Jobs said, “you can’t connect the dots looking forward; you can only connect them looking backwards. So you have to trust that the dots will somehow connect in your future”. Maybe we can do all the things we love to do at the same time, or attribute time to each one of them until we love one so much we cannot bear not to do it. I am completely convinced that there are too many people in our world who aren’t doing what they like. I hope that dish is one we never taste... because life is such a huge banquet table. All I can suggest is that we nibble our way through the banquet until we find what you really love! The second story was about “love and loss.” After discovering his passion early on in life, Jobs was crushed when he was fired from the very company

that he had helped found. However, it was that very passion of his that helped sustain him and put his career on the rebound. After starting up his second company, NeXT, followed by Pixar, which created the world’s first computer animated feature film, Apple bought out NeXT and brought Jobs back on board. “Sometimes life hits you in the head with a brick,” Jobs said. “I’m convinced that the only thing that kept me going was that I loved what I did.” And what do we learn from here? We need to follow our dreams, we can’t settle. Being courageous and not quitters can make us happy some years later. After discovering


what we really love to do, we just need to fight for it. Life can be love’s worst and hardest enemy, but we have to overcome the obstacles when we pass from difficult loss moments. Jobs also told a story about death. He came close to the brink after being diagnosed with cancer in 2004, and was even told that he would have no longer than three to six months to live. But doctors found it was in fact a rare and curable form of pancreatic cancer, Jobs recovered, but not before learning an important lesson, which he passed on to the world. Knowing that we’ll die make us remember we will leave behind everything we once wanted to tell, possibly making in those moments big decisions. We should always remember this, never leaving something to tell or to do, because any day can be our last. This genius ended with four simple but powerful words of advice, “Stay Hungry. Stay foolish.”, which really touched me and made me think about my future in other perspective, after hearing this outstanding speech. Margarida Gonçalves, 10th D At Stanford University, Steve Jobs uttered a very emotional speech. He mainly told three stories about his life. Those stories were about connecting the dots, love and loss and death. Let us start from the beginning. Steve Jobs managed to speak about his youth and transmit a life lesson, telling his mistakes and victories while he was at the university. His ideas were clear: we can’t connect the dots looking forward, only looking backwards. And this happens for a simple reason: we can’t predict the future. In the present we do the choices that seem to be the right ones. Only in the future, when we use those choices as an advantage, can we then connect the dots and realize that everything made sense. Now speaking about love and loss. Steve Jobs gave a good example about this. He was forced to quit from Apple. Here’s the good thing: he created one of the most successful companies of computer animation. See, he lost the battle but not the war. Then he married and had kids. And then, a story about death. He faced death for the first time when doctors diagnosed a cancer. Steve Jobs was preparing to die, living each day like it was his last one. When suddenly that cancer was treatable. He learned and taught us that no one wants to die. And by far, death is life’s greatest invention because it allows change. César Filipe Garrido Lopes, 10th D

AO SOM DO MEU VIOLINO Beatriz Moutela Fonseca Aluna do 9.º F

A determinada altura da minha vida decidi estudar música. Porém, estava indecisa entre, violoncelo, violino ou piano; assim, tinha que experimentar e foi o que fiz: procurei uma professora, de música que me aconselhou a tocar violino; gostei tanto do instrumento, que até já nem experimentei os outros. A minha mãe sugeriu que me inscrevesse em aulas de violino com a professora Elizabete Leal. Passado algum tempo, a minha professora falou com a minha mãe, para eu me candidatar ao Conservatório de Música de Aveiro. Para isso, precisava de fazer uma prova de admissão no Conservatório, a qual aconteceu em Maio de 2007. Éramos cinquenta candidatos para doze vagas e a minha professora fez questão de ir assistir. Nunca pensei que conseguisse entrar, no entanto, um certo dia, a minha mãe disse que devíamos ir ver as pautas, nem que fosse só por curiosidade. E assim foi. Quando chegámos ao Conservatório, verificámos com alegria, que eu tinha sido admitida. Ao longo do meu trajeto como estudante de violino, posso dizer que já fui muitas vezes para as aulas sem vontade de lá estar; isso acontecia mais na altura que estava a aprender as bases, porém, agora já estou com mais entusiasmo. Já passaram quatro anos, pois estou no quinto. Tem sido um percurso trabalhoso, porque é preciso estudar bastante, embora o tempo de estudo seja proporcional aos graus e o tipo de aluno. No 5.º grau o meu professor aconselha-me a, estudar 2h30 por dia, mas há dias que não é possível estudar esse tempo. Todavia, ele também diz que é preferível

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estudar menos um bocado, concentrada, do que muito tempo sem vontade. Ao longo do ano temos audições internas, que são só para a família dos alunos e são realizadas nas salas de aulas; e externas, que se realizam no auditório do Conservatório e às quais pode assistir quem quiser. Uma coisa que me entusiasmou ainda mais foi a entrada para a Orquestra do Conservatório, que ocorreu no meu quarto grau, pois deu-me oportunidade para tocar em conjunto com outros alunos e, logo, acompanhando muitos mais instrumentos. Nesta orquestra, em tempos de férias, é costume fazer estágios para realização de audições, que podem ser em Aveiro, no Conservatório e no Teatro Aveirense, ou fora da cidade, em vários auditórios. A música para mim é muito importante pois, através dela, posso expressar os meus sentimentos e criar o meu mundo. Uma Orquestra que gosto de ouvir é a Filarmonia das Beiras, onde o meu professor de violino, André Fonseca, é concertino. Aliás, aprecio qualquer tipo de música, dependendo isso do meu estado de espírito. Futuramente, quando decidir a minha profissão, ainda que não seja música, vou continuar a tocar, de preferência numa orquestra.

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IMAGENS QUE SE FIXAM NA RETINA

Estes trabalhos foram realizados na disciplina de Português lecionada pela professora Etelvina Soares, na sequência da visita de estudo ao Museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto, no âmbito da lecionação da Estética (Filosofia) e da Poética (Português).

Esta imagem é uma fotografia que foi tirada no dia 6 de março de 2012 no Museu Soares dos Reis, no Porto. Ela mostra-nos um candeeiro de meados do séc. XIX em forma de pirâmide circular com

detalhes em dourado e decorado com pedrinhas transparentes, com os fios passando por duas circunferências de metal em tons de dourado, que sobem até ao cabo dourado que segura o candeeiro e que se fixa no teto, formando uma espécie de cascata de diamantes. Na sua base, o candeeiro tem pequenas bases de metal redondas com velas douradas, com pequenas lâmpadas na sua extremidade, e abaixo dessa base existem circunferências diminuindo de tamanho, desde a extremidade

até ao centro do mesmo material das pedrinhas, como se fossem cristais. Por detrás deste candeeiro temos uma varanda de pedra em tons de cinzento e beje com um cercado de ferro em branco, com flores em dourado, que fecha o espaço entre as janelas bejes e colunas de pedra cinzentas, esculpidas na lisa parede beje. Acima dessas duas colunas há uma faixa de gesso branco com bolinhas douradas e no teto, beje como as paredes, há lindos detalhes em gesso fechando circunferências por dentro, como uma faixa e um retângulo no centro do teto com as extremidades trabalhadas com detalhes também em dourado. A luz nesta foto não é muito forte, apesar de se notar perfeitamente, pela luz que incide nas janelas, por ser de dia, o que proporciona uma melhor focagem do candeeiro e de todo o ambiente de fundo da fotografia. Por fim, esta fotografia tem uma função estética, dado que valoriza os contrastes entre as cores e entre os objetos. Foi escolhida por mim pois gosto muito de candeeiros antigos e este chamou-me muito a atenção pela sua forma, que proporciona um ar mais delicado e requintado ao espaço, e pela curiosidade,


porque ao subirmos as escadas ele cerca os nossos olhos. Karina de Carvalho Costa, 10.º D Esta escultura, de António Manuel Soares dos Reis, foi realizada em Roma em 1872 e concluída no Porto em 1874, e está atualmente no Museu Nacional Soares dos Reis. O escultor realizou o trabalho em mármore, de cor natural, e esculpiu um modelo do sexo masculino, de rosto fino, nu e sentado sobre uma rocha. Esta rocha apresenta vestígios do mar que lhe bate. A cabeça, de cabelos encaracolados, encontrase pendente e os braços estão pousados sobre uma das pernas com os dedos das mãos entrelaçados. Os músculos estão bem definidos e há equilíbrio e harmonia entre todas as partes do corpo. O escultor primou pela representação realista de todos os pormenores e fez uso de uma visão objetiva e rigorosa da realidade. Esta escultura permitenos ver a sensibilidade romântica do tema devido ao olhar profundo da figura e à presença do mar. Por outro lado, o homem sobre a rocha, de cabeça pendente, apontanos para a solidão, para a necessidade de refletir sobre a vida representada na imensidade e no mistério do mar. Um olhar ausente, quase desanimado, os dedos entrelaçados, dobrado sobre si mesmo e a onda que vem rebentar

no rochedo junto ao mar parecem demonstrar uma certa prisão, um enorme desalento, um constante sofrimento, um beco sem saída. Esta escultura tem simultaneamente uma função estética, simbólica e expressiva. Se, por um lado, visa a satisfação e o prazer do belo, por outro lado, serve-se de elementos simbólicos (como por exemplo a rocha e o mar) para expressar estados de espírito e sentimentos do escultor, um “desterrado” no seu país. Marta Amaral, 10.º D Durante a visita ao Museu Soares dos Reis, senti particular interesse por um quadro aí exposto, sobre o qual irá ser feita uma breve análise. Chama-se “A tigela partida”, de José Silva Porto. Este quadro está pintado em óleo sobre tela. Nesta imagem, vemos uma figura infantil, aparentemente feminina, com cabelo castanho-escuro comprido, que segura um lenço vermelho na mão direita. Esta menina usa um colar ao pescoço e veste um traje típico italiano, com uma camisa branca e um avental colorido com grande parte de azul-escuro. O braço esquerdo está erguido em direção à cabeça e aí se esconde a mão. Atrás da menina está uma parede, um pouco maltratada, pintada de branco, com uma planta a nascer numa fenda. Aos seus pés, observamos cacos de uma tigela de barro vermelho partida. A menina parece ter deixado cair ao chão a tigela, que se partiu. A sua própria expressão revela embaraço e um pouco de vergonha. A mão atrás da cabeça dá ideia que a criança está constrangida com a situação e parece não saber como explicar o que aconteceu. A face da criança dá noção de inocência, chega mesmo a apelar à compaixão por ela e ao perdão por ter partido a tigela. César Filipe Garrido Lopes, 10.º D

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PERCURSOS DE SUCESSO 150


Corria o ano de 1999 e eu pressentia algum movimento nas placas tectónicas do meu mundo. Viria então o novo milénio, das hormonas pululantes, da angústia inexpressiva, do despertar para o sentir e para o eterno devir da nossa natureza enquanto Homens. A inquietude da minha alma tinha ali o seu início. Eis então que aquele edifício acinzentado, que havia até à data sido a escola da mamã, passou a ser também o meu local de ação, descoberta e exploração de um mundo do qual ainda não me sentia parte integrante. Veio também um novo par de óculos, mais moderno – afinal já tinha onze anos e em breve faria doze. Já não era uma criança, embora desejasse em surdina sê-lo para sempre. Levava já dois anos de estudo no conservatório, dois em piano e um em saxofone. A realidade e o meio subjacentes à música que estudava em Aveiro pareciam-me incoadunáveis com o ambiente que encontrei na ESE. Como poderia ser sempre eu em ambos os contextos, se ainda nem eu sabia quem era (saberei já hoje?)? A verdade é que ainda não havia ensino articulado e passava a maior parte do tempo na ESE. “Qual é que é o teu estilo”, perguntavam-me. “Streetwear”,

dizia, era um estilo circunspecto aos trajes e não requeria o proferir de nenhum manifesto anarquista. O meu niilismo (espaço de encontro com os demais) residia assim nas calças da Resina, no cinto da moda e nas sapatilhas do skate. Para além de uns símbolos desenhados no estojo e nos cadernos. Um espírito revolucionário mas pacífico. Surge entretanto a paixão pela escrita e expressão poética do sentir. Recordo os raios de sol da ala direita do bloco A como os primeiros sons, sílabas, palavras mágicas sobre um papel tão branco que encandeava. Dos poemas saltavam letras e melodias. Formei as primeiras bandas, rock, funk, ensaios na garagem, concertos em bares, algo que completasse a experiência musical do conservatório. Terminei o 9.º ano e o curso básico de piano. Belo início de milénio. Em 2003, os quinze anos. Curso secundário de Humanidades. Ao longo desses três anos, fui discernindo com mais nitidez esse universo de sons que dá azo a música, estabelecendo contacto com pessoas que partilhavam desse meu interesse. Tocando em pequenas formações, nutri o gosto que hoje cresce pela arte de falar em sons e ter conversas em grupo. A par com o crescente interesse pelo cancioneiro de jazz americano, continua a motivação da escrita e um permanente desejo de algo mais, uma vontade insatisfeita acompanhada de uma expectativa gigante quanto aos rumos do futuro. Belas tardes ao sol, no bloco E, criando “desenhos-poema”, com a Jessica, nos furos entre as aulas. Belas aulas de História, no bloco C, ou na biblioteca, a professora

Maria de Jesus a plantar na turma a preciosa ânsia de trepar mais e mais a árvore do conhecimento; de louvar! Português, Inglês, Filosofia – 12.º: feito! Entrei em Ciências da Comunicação na FCSH (U. N. Lisboa), mas do primeiro semestre não concluí nenhuma cadeira senão Semiótica. Estudei durante esse ano na escola de jazz do Hot Club e tornei-me músico profissional. Em 2006 regressei ao norte para frequentar Música – Jazz na ESMAE (I. P. Porto). No Porto formei os meus projetos e criei laços com mais companheiros(as) de caminhada. Comecei a lecionar Saxofone em 2009, ano de conclusão da licenciatura; actualmente, leciono a disciplina de Combo no primeiro curso profissional público de Instrumentista – Jazz (C. M. Coimbra). Permanece em mim, embora diluído em dezenas de outros interesses que são apanágio do ser humano do novo milénio, a paixão pela escrita e pela música das palavras. Ainda componho de quando em vez uma canção para dedicar a alguém, à vida simplesmente, ao mundo ou a mim próprio. Depois destes anos a pensar em notas, acordes, ritmos e intervalos, sinto novamente em mim o impulso das letras, das sílabas e das métricas, pelo que creio que o tempo me dirá o papel que estas desempenharão na minha arte, a das musas. Pois então, um bem-haja a todos os professores e colegas que tive na ESE, bem como aos que hoje dela fazem parte, e obrigado, mamã, por seres quem sou. João Mortágua

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É um privilégio falar de um jovem brilhante e talentoso na área que escolheu, a MÚSICA. Sinto-me orgulhosa por ter sido professora do Gabriel Antão. Embora pudesse ter sido um brilhante economista, enveredou por outra via. Vários talentos lhe são conhecidos, mas foi a música que falou mais alto. Um ser humano excecional, guiado pela sensibilidade e pelos seus próprios valores. Jovem extremamente culto e inteligente que ocupa, atualmente, largos espaços no cenário musical mundial. Gabriel Antão, de 23 anos, é natural de Estarreja e teve os primeiros contactos com o trombone na Banda Visconde de Salreu. No entanto, a vontade de aprender mais levou-o a ingressar no Conservatório de Aveiro, na classe do professor Luís Castro, e mais tarde na Escola Superior de Música e das Artes do Espetáculo do Porto, com o professor Severo Martinez, tendo terminado ambos os cursos com classificação máxima nas aptidões instrumentais. Contrariamente ao que é feito pela

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maioria dos jovens que querem seguir música, frequentar uma Escola de Música, o Gabriel seguiu o Ensino Secundário, numa escola pública, frequentando o Curso Tecnológico de Administração na Escola Secundária de Estarreja, que terminou com a média de 18 valores. Ainda que já tivesse decidido fazer da música a sua vida desde os seus 14 anos, sempre se preocupou com o seu futuro, daí que se tenha matriculado no Curso de Economia, outra das suas paixões, na Universidade do Porto. No entanto, como já se encontrava a estudar no segundo ano do curso superior de trombone na ESMAE (Escola Superior de Música e das Artes do Espetáculo do Porto), tornou-se incompatível conciliar os dois cursos superiores. As exigências e as solicitações musicais eram muitas. Em junho de 2009, termina o curso na ESMAE, com uma média de 18 valores, ingressando na Universität der Künste em Berlim, no mestrado em Trombone, com os professores Stefan Schulz, Andreas Klein e Rainer Vogt, como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, concluindo-o com 20 valores. Desde 2011 frequenta o Konzertexamen, uma pós-graduação especializada na mesma Universidade. Tem colaborado como chefe de naipe na Rundfunk Sinfonieorchester (Berlim), na Deutsches Symphonie Orchester (Berlin), na Orquestra Gulbenkian e na Orquesta Ciudad de Granada. Colaborou também com a Deutsches Sinfonieorchester Berlin, a Orquestra Nacional do Porto, entre muitas outras.

Como solista, tocou com Das Sinfonieorchester Berlin, a Sinfonieta da ESMAE e a Banda Sinfónica do Conservatório de Aveiro. Participou em encontros da Mahler Jugend Orchester e da Dutch Summer Academy. Desde 2011 é Trombone Solista na Tonkünstler – Niederösterreichisches Orchester. Ganhou o 1.º prémio “Helena Sá e Costa”, o “Prémio dos Rotários do Porto”, o segundo prémio no concurso “Prémio Jovens Músicos” e o primeiro prémio no concurso “Terras de La Salette”. O Gabriel Antão é bem o exemplo do jovem moderno, determinado, independente e profissional, que continua, sempre, a correr atrás dos seus sonhos! O meu grande apreço a todos aqueles que, como o Gabriel, ousam e procuram incessantemente o sucesso, sucesso que se constrói com muito trabalho, dedicação e competência. Todavia, não se constrói futuro sem procurarmos a solidez dos ensinamentos ministrados pela ESCOLA. Parabéns! Que continues a brilhar! Rosário Santos


Enquanto aluno da Escola Secundária de Estarreja do 7.º ao 9.º ano, entre 1999 e 2002, dividia os tempos livres entre o andebol e a música, daí que esses três anos na escola tenham sido um “percurso atribulado, pois as aulas não eram a motivação principal”, sobretudo porque a música o foi desde muito cedo e a escola não permitia canalizar essa vocação. Mesmo assim, considera que, com a aprendizagem permanente da música, conseguiu aperfeiçoar a leitura e a capacidade de concentração. A existência de opções de disciplinas de teor artístico, como música, dança ou representação, era e continua a ser uma miragem no currículo nacional ou mesmo nas ofertas de escola. Poder-se-á sonhar com a “criação e manutenção de uma pequena orquestra ou banda escolar”? Para o Cláudio Ferreira, o seu fecundo percurso artístico teve início muito cedo, aos três anos de idade, quando acompanhava o irmão, clarinetista na Banda Bingre Canelense, e quando, antes mesmo de pegar num instrumento, acertava os movimentos dos braços à boa maneira de um maestro em ponto pequeno – antecipando a batuta com que, entre outras experiências, agora conduz em harmonia os cerca de quarenta executantes da Banda Paços de Vilharigues, de Vouzela, que dirige desde janeiro de 2008, ocupando o cargo de diretor artístico. Por conseguinte, “ainda não aprendia música e já sonhava em ser maestro”, pelo que, ao longo dos anos “sempre prestei uma especial atenção aos maestros com quem trabalhei”. O aperfeiçoamento profissional nesta área prossegue, aliás, com a frequência do Mestrado em Direção de Banda, na Universidade de Aveiro. Temos, agora, de voltar a recuar no tempo. Com sete anos de idade, o Cláudio Ferreira começou a frequentar a aula de música da Sociedade Recreativa e Musical

Bingre Canelense e integrou a Banda Bingre Canelense com 13 anos, em 1998. Desde os 14 anos que toca trombone, sendo este o instrumento em que se aperfeiçoou, embora tenha iniciado com o trompete. A longa e duradoura relação com a Banda Bingre justifica-se por proporcionar uma salutar e enriquecedora “interação entre gerações”, a prática de “boa música, a evolução individual e do coletivo”. Cria-se um vínculo que “dificilmente se traduz em palavras”, talvez do domínio do indizível, apenas sentido numa efetiva vivência de emoções que concerta o dia a dia. Por tudo isso – e pelo que inevitavelmente fica por dizer -, o Cláudio também aí dá aulas semanais há dois anos, integrando-se num trabalho de continuidade ao nível do ensino e motivação para a música que a centenária Bingre sempre tem promovido. Em 2001, frequentou o Conservatório de Música da Gulbenkian, em Aveiro. Quando chegou ao final do 9.º ano de escolaridade, na ESE, a opção mais adequada foi ponderada e apontou-lhe o caminho de Santo Tirso, para a Escola Profissional Artística do Vale do Ave (ARTAVE). Aí, durante três anos, frequentou o Curso de Instrumentista de Sopro, concluindo o 12.º ano (8.º Grau do Conservatório). “Nem dei pelo tempo a passar!, era um adolescente a estudar fora de casa pela primeira vez; tinha de gerir uma carga horária muito intensa, de segunda a sábado, com o estudo, a família e a presença na Banda Bingre”. Em Famalicão, foi membro fundador da Cooperativa de Cultura e Solidariedade Social (atualmente, IPSS), decorria o ano de 2005. Seguiu-se, desta feita em Viseu, a Licenciatura em Música (Ramo de Trombone). Desde 2008, integra o corpo docente do Conservatório Regional de Música de Viseu Dr. Azeredo Perdigão, como professor de trombone e de

classe de conjunto. Na Academia de Música e Dança do Fundão, durante um ano letivo, assegurou as aulas de trombone. Faz parte dos seus planos continuar a dar aulas: “ensinar é aprender duas vezes”. Será, em igual proporção, o justo reconhecimento, a todos os níveis, de quem tem a capacidade de transmitir saberes e de conduzir os outros num processo de constante aperfeiçoamento musical. Como o aperfeiçoamento musical não pode parar, tem-se acumulado, ao longo dos anos, a frequência de cursos e de master classes com distintos professores e maestros. Entretanto, à licenciatura sucedeu o Mestrado em Pedagogia do Instrumento (na classe de trombone). A sólida procura do saber e de técnica, o permanente interesse pelo estudo, conduziram o Cláudio a outros dois mestrados, que frequenta em simultâneo: Teoria em Formação Musical, no Instituto Piaget de Viseu, e Direção de Banda, na Universidade de Aveiro. Sim, sim, diz que consegue conciliálos com a colaboração em várias orquestras e bandas … e ainda dar aulas. De certeza que é um corrupio, ou melhor, um allegro vivace, um presto quotidianos. Ou uma questão de temperamento? “Paixão, dedicação, a certeza de que um dia tem 25 horas! Como dizia o maestro e professor Fernando Rainho, da Bingre, «Oh, rapaz, tens de estudar 24 horas por dia e mais uma à noite!» É o que eu digo aos meus alunos”. Teresa Bagão NOTA: “Temperamento – compromisso acústico que permite a igualdade dos intervalos, o acordo dos instrumentos e a utilização de todas as tonalidades.” (Gérard Denizeau (2000). Os Géneros Musicais. Para uma Nova História da Música. Lisboa: Círculo de Leitores)

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1. rede de três panos, um interior de maior altura e de malha miúda, e dois exteriores chamados alvitanas de malha bastante mais aberta e de menor altura, de modo que o peixe que vai à rede leva o miúdo até formar como que uma bolsa; os peixes enredam-se no pano de rede interior após terem atravessado os panos exteriores; serve para o cerco do peixe em arrasto ou como rede de espera; 2. é dos aparelhos mais comuns de toda a costa ocidental portuguesa; 3. também conhecido por rede de albitanas

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O “BOTA-ABAIXO” DA REVISTA DA ESE

Foi com grande entusiasmo que, no dia 27 de outubro de 2012, nas instalações da biblioteca da ESE, a equipa editorial da revista Preia-Mar apresentou, oficialmente, à comunidade esta publicação escolar. Na mesa, contámos com a presença do vereador da Cultura da Câmara Municipal de Estarreja, João Alegria, que acedeu ao nosso convite, do diretor da ESE, Jorge Ventura, e da coordenadora, Teresa Bagão. Entre a assistência, estiveram presentes professores e alunos da nossa escola, bem como distintos convidados e amigos, que connosco partilharam as palavras de apreço, de elogio e de incentivo a este projeto escolar, enunciadas pelos elementos da mesa. O momento contou, ainda, com uma animação criativa de alguns alunos do curso profissional de Animação Sociocultural e, concluída a intervenção da mesa, com a colaboração de quatro alunas do curso profissional de Marketing. Em ambos os casos, deram um bom incentivo para a venda dos dois números da revista, que estão à disposição dos leitores. A revista Preia-Mar tem contado com a colaboração de professores e de alunos da ESE, mas nas suas páginas recebe, igualmente, a palavra de antigos elementos deste estabelecimento de ensino público e de outros colaboradores ligados à nossa escola. Nos próximos números, esperamos que o entusiasmo pela escrita e pela leitura continue a contagiar a nossa escola, enriquecendo cada vez mais esta publicação escolar, que é de todos e para todos.

(em cima) A Ana Rita e o Bruno Cêpa tomaram a palavra... (ao meio) As alunas Andreína e Ana Cristina contagiam com simpatia! (em baixo) No improvisado balcão de vendas, as alunas Susana e Ana Cristina convencem o Sr. José Valente e o professor Jorge Ventura.

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Fig. 1

Docentes de Física e Química

Anabela Viegas, Emília Batista e Margarida Teixeira

SEMANA ABERTA DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA UNIVERSIDADE DE AVEIRO

Um dia, alguém disse que a cultura não se herda, mas conquista-se! De facto, há momentos de aprendizagem informal... Nesta perspetiva, os alunos do 10.º O e do 9.º H interagiram com vários agentes da Universidade de Aveiro, no dia 22 de novembro de 2011, participando na Semana Aberta de Ciência e Tecnologia. No dia 25 do mesmo mês, também houve lugar à participação dos alunos do 12.º M no espetáculo “Física VivA”! Genericamente, observaram o movimento de um automóvel que tinha vários sensores e que falava quando alguém se aproximava (figura 1); detetaram a existência de fenómenos físicos associados a diversas demonstrações experimentais (figura 2); tiveram oportunidade de “ver como andavam os seus pulmões” e, de um modo lúdico, fizeram um pouco de exercício físico. Ressalta desta visita o facto de se mostrarem interessados nas várias atividades experimentais, inclusivamente participaram ativamente nas mesmas, revelando curiosidade em relação ao conhecimento científico! Existiram momentos de convívio entre os vários intervenientes na visita, particularmente entre alunos e alunos e professores.

Fig. 2

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Docente de Física e Química

Anabela Viegas

2011: ANO INTERNACIONAL DA QUÍMICA

O ano 2011 foi proclamado “Ano Internacional da Química” pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Sem dúvida, uma oportunidade para demonstrar a importância da Química… Como é sabido, o conhecimento da matéria que constitui o nosso mundo baseia-se na Química e esta tem um papel relevante na manutenção de um ambiente adequado ao bemestar da humanidade. 2011 constituiu uma oportunidade para comemorar as contribuições das mulheres em ciência, uma vez que fez 100 anos que Maria Sklodowska-Curie recebeu o prémio Nobel da Química, e também de celebrar a colaboração científica internacional, uma vez que a Associação Internacional das Sociedades de Química foi formada há 100 anos! Curiosamente, até hoje houve 4 mulheres premiadas com o Nobel da Química. Para além de Marie Curie (nome pelo qual é conhecida), em 1911, o prémio foi atribuído a Irène JoliotCurie, em 1935; a Dorothy Hodgkin, em 1964, e a Ada Yonath, em 2009. De entre as cientistas referidas, Marie Curie é a mais conhecida, talvez por ter recebido dois prémios Nobel: para além do da Química, em 1903 partilhou com o marido, Pierre Curie, e com Henri Becquerel o prémio Nobel da Física. Este deveu-se aos estudos do fenómeno da radioatividade. Mais tarde, a descoberta do rádio e do polónio, o isolamento do rádio e o estudo desse elemento e dos seus compostos é que lhe valeram o prémio Nobel da Química. A aplicação clínica dos radioisótopos (radioterapia), preconizada pelo casal Curie, constitui na atualidade um dos principais meios de combate ao cancro. O PACOPAR decidiu comemorar o Ano Internacional da Química através de uma ação de divulgação desta ciência a toda a comunidade estudantil do concelho de Estarreja, tendo endereçado um convite à Escola Secundária de Estarreja para participação na mesma. A ação de divulgação decorreu no Cine-Teatro de Estarreja, de 10 a 15 de outubro de 2011, e foi um espetáculo desenvolvido pela Fábrica da Ciência, onde se realizaram demonstrações da aplicabilidade da Química no nosso quotidiano usando materiais do dia a dia. A empresa organizadora foi a DOW Chemical, tendo como objetivos: - divulgar a Química enquanto ciência que está presente no quotidiano das nossas vidas; - demonstrar o caráter experimental da Química; - associar a ESE às comemorações do Ano Internacional da Química. A nossa escola, sendo membro efetivo do PACOPAR e uma referência como instituição de ensino no concelho de Estarreja, aderiu a esta ação e a logística por parte da escola foi organizada pela professora Rosa Domingues e pelo professor Edgar Dias. Participaram 385 alunos do 3.º ciclo do ensino básico, 725 alunos do ensino secundário e 60 professores acompanharam os mesmos alunos. Os alunos da nossa escola tiveram oportunidade de assistir a um espetáculo de cerca de duas horas e meia, de Química. Foi, sem dúvida, uma comemoração local de um evento tão grandioso! Bibliografia: Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas – Resolução 63/209 de Fevereiro de 2009, Revista SPQ, n.º 121, p. 11, Lisboa, 2011. Vanda Capitolino, “Diário do Ano Internacional da Química”, Revista SPQ, n.º 121, p. 13-20, Lisboa, 2011. João Paulo André e Arsénio de Sá, “Radioisótopos e Sociedade: o legado de Marie Curie 100 anos depois”, Revista SPQ, n.º 120, p. 31, Lisboa, 2011.

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Alunos do 12.º M. Curso Profissional de Eletrotecnia

O FUTURO NAS NOSSAS MÃOS

A plataforma de desenvolvimento Arduino foi o tema de uma ação de formação que decorreu na nossa escola no dia 27 de janeiro de 2012, dinamizada pelo professor Sérgio Silva, da Escola Secundária José Macedo Fragateiro, em Ovar. Esta plataforma consiste numa placa de circuito impresso, com um microcontrolador ATMega, programável por computador, que poderá, entre um elevado número de aplicações, ser utilizado para comandar, por exemplo, o funcionamento de um semáforo, a iluminação nas casas, a regulação da intensidade luminosa, muitas outras funções domésticas (rega, segurança e alarmes, aquecimento, racionamento dos consumos energéticos), controle de equipamentos, ou até um pequeno robot. Depois de os participantes se dividirem em grupos, manuseámos placas e foi-nos proposto efetuar uma simulação, em escala reduzida, de uns semáforos. Em primeiro lugar, começámos por ouvir o professor Sérgio e seguir os passos para a aprendizagem da utilização da plataforma. De seguida, fomos desenvolvendo pequenos projetos com leds, até atingirmos um semáforo simples de uma via, com sinalética para peões. Neste processo, os alunos concluíram a atividade com bastante rapidez, tendo apreendido os procedimentos. A plataforma Arduino é um dispositivo que pode simplificar as atividades do utilizador, tornando-as mais eficientes e fiáveis. O Arduino é um dispositivo que demonstra o avanço das tecnologias dos tempos de hoje. É o futuro!

Jovens alunos (em cima) e experientes professores da ESE (ao lado) atentos aos procedimentos da simulação e aos esclarecimentos do orientador, professor Sérgio

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O professor António Neto e os alunos do 12.º M


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Alunos do 12º L. Curso profissional de Marketing. Teresa Bagão. Docente de Português.

REVER OBRAS-PRIMAS NAS LETRAS E NAS ARTES

Fernando Pessoa é um escritor “plural como o universo”. Pudemos conhecer uma parte dessa pluralidade na exposição com este nome, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, no dia 10 de abril de 2012. No primeiro módulo da exposição, prestámos especialmente atenção à composição suspensa, que fazia saltar para a realidade os elementos do quadro de Almada Negreiros, destacando símbolos pessoanos (a mesa, o chapéu, a cadeira e a chávena do café) e o n.º 2 da revista Orpheu. Assim, as várias perspetivas da obra de Pessoa estavam representadas neste objetos dispostos de modo irregular e multifacetado. Em seguida, mergulhámos numa zona mais sombria e labiríntica, na qual se destacavam poemas diversos, alguns virados do avesso e que só se liam refletidos em espelho, mostrando as criativas e distintas formas com que podemos interpretar os textos deste autor, sempre inesperado. No último módulo, estava exposta a arca, a verdadeira arca, que acompanhou Fernando Pessoa em vida, e que chegou a acomodar mais de 25 mil papéis (escritos, datilografados e datiloscritos). Nesta secção, pareceram-nos mais inovadores os espaços interativos: a projeção de poemas de Mensagem na superfície de dois tanques de areia, simulando a ondulação do mar, que iam mudando consoante a ativação dada pelo movimento da mão do visitante; nas duas extremidades de um balcão central, um gigantesco livro num ecrã interativo (touchscreen), mais precisamente, a versão completa de Mensagem (de 1934), com notas manuscritas para tipografia. Havia ainda, em exposição ao público, pela primeira vez, uma seleção de documentos autênticos escritos por Pessoa, desde os 6 anos até aos últimos meses de vida, uma cronologia efetuada pelos organizadores, várias pinturas modernistas de José de Almada Negreiros, Eduardo Viana e Amadeo de SouzaCardoso. Na parte da tarde, detivemos o nosso olhar em “Dez obras-primas da pintura europeia”, na exposição permanente do Museu Gulbenkian. Acompanhámos atentamente as orientações da nossa guia, as perguntas que nos ia fazendo, pelo que fomos descobrindo pormenores e leituras interpretativas dos dez quadros selecionados, obras executadas em países europeus entre os séculos XV e XX. O Museu inclui muitas obras de grande interesse, mas acabámos por não ter possibilidade de ver outras, porque tinha chegado a hora de regressar a Estarreja. Embora cansadas, algumas alunas ainda sorriram para a fotografia, pois os outros fugiram da objetiva e não quiseram tirar uma foto de grupo.

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Apresenta-se, aqui, uma síntese de trabalhos realizados na disciplina de Português, com a docente Etelvina Soares, após uma visita de estudo realizada à Casa da Música e ao Museu Nacional de Soares dos Reis, no Porto, no âmbito da lecionação da Estética (Filosofia) e da Poética (Português). Adotamos o título da autoria do aluno César Garrido, para nomear esta sequência. Embora aparentemente repetitivos, os trabalhos selecionados têm o mérito de apresentar diferentes perspetivas da mesma realidade, uma vez que cada aluno vivencia de uma maneira única e irrepetível o que o rodeia e as experiências educativas em que se integra ao longo do seu percurso escolar.

F. C. PORTO (FASCÍNIO CULTURAL NO PORTO)

O fascínio cultural mencionado no título trata daquela que se adivinhava ser uma enriquecedora visita de estudo ao Porto, realizada no passado dia 6 de março de 2012 e organizada pela Professora de Português, Etelvina Soares. Os principais objetivos da presente visita de estudo foram entrar em contacto com manifestações artísticas diferentes da literatura e desenvolver a consciencialização de que a arte e o homem são indissociáveis. Ao chegar ao Porto, foi feita uma breve paragem no Jardim Botânico. Aqui, pudemos ver as mais variadas espécies de plantas exóticas e nacionais que compõem este jardim. É de salientar a qualidade e o estado de conservação quase excelente deste espaço, bem como a beleza da casa que aí se situa. Dirigimo-nos, de seguida, para a Casa da Música, de onde era possível observar a Rotunda da Boavista e o Monumento aos Heróis da Guerra Peninsular. Após entrar no edifício, começámos então a visita, onde nos foi explicado que a Casa da Música foi construída em 2001, no âmbito da Capital Europeia da Cultura, atribuída ao Porto, e foi projetada pelo arquiteto holandês Rem Koolhaas. De entre os vários aspetos daquele edifício que nos foram explicados, os que me cativaram mais foram os da Sala Suggia (este nome é uma homenagem à violoncelista portuguesa

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Guilhermina Suggia) e os da Sala VIP. Deve-se atribuir a devida atenção à Sala Suggia devido às técnicas usadas na sua conceção, de forma a manter o elevado nível de qualidade acústica (janela dupla ondulada com vácuo entre elas, tecnologia Caixa de Sapatos, difusores de som, cortinas acústicas, entre outros detalhes). A Sala VIP está muito bem decorada com azulejos portugueses (atenção ao azulejo discretamente rodado, simbolizando a imperfeição de homem) e virada para a rotunda da Boavista, de onde se pode ver o Monumento com o leão no topo. Aqui, foi-nos explicado que esse leão simboliza a armada inglesa e está em cima da águia que simboliza a armada francesa, dominando, portanto, os invasores franceses. Seguimos para o Parque da cidade, onde iríamos almoçar, e, de seguida, fomos visitar o Museu Soares dos Reis. Neste museu, começámos a visita com esclarecimentos acerca da história do edifício. Foi fundado durante a Guerra Civil Portuguesa, que opôs absolutistas a liberais. Com o decorrer da visita, fomos vendo e descrevendo alguns quadros da autoria dos mais variados pintores e que foram cedidos pela Academia de Belas Artes. Os termos demasiadamente técnicos e o cansaço da peregrinação pelo museu serviram para degradar a atenção àquilo que a guia dizia. Contudo, os quadros eram bastante chamativos e alguns deles mereceram mais a nossa atenção. Quanto a mim, as obras que mais prenderam a minha atenção foram as pinturas sobre a natureza, nas quais os autores pintavam paisagens com poucas figuras humanas. Seguindo para outra parte do museu, vimos algumas esculturas de Soares dos Reis, das quais se destaca “O Desterrado”. As esculturas em ferro, ou mármore, mereceram a nossa atenção pelo elevado nível de detalhe que lhes foi aplicado. Algumas delas encontravam-se desgastadas pelo tempo, pois tinham estado em lugares públicos antes de fazerem parte do espólio do Museu. Acabámos por não chegar ao final da exposição, pois o tempo esgotara-se. Não aprendi muito com a guia que nos acompanhou, contudo, gostei de observar à minha maneira os quadros que lá se encontravam expostos. Creio que esta visita de estudo mereceu ser feita pelo que aprendemos, mais na Casa da Música do que no Museu Soares dos Reis, e pela beleza que a cidade do Porto tem para oferecer. César Garrido Lopes, 10.º D


pudemos visualizar a sala Suggia. Um pormenor interessante era o facto de este bar estar dentro da caixa-de-ar das janelas e por isso conseguíamos ouvir o ensaio que decorria nessa sala. (…) Visitámos também o Terraço Vip, onde pudemos observar diversos instrumentos que possuíam uns sensores que permitiam “tocar o instrumento” apenas aproximando os dedos deste. De seguida, passamos pela Sala do Renascimento, que tinha uma grande janela com vista para a rua e no lado oposto existia uma zona envidraçada virada também para a Sala Suggia. Aqui pudemos apreciar quatro instrumentos de gamelão robótico. A parede da sala é revestida de azulejos prismas verdes e brancos, típicos das casas portuguesas. A parede transmitia uma certa ilusão de ótica e a ideia de profundidade, dada pelo facto de ao longo da parede os prismas passarem a cubos. A próxima paragem foi a Sala Cybermúsica, considerada um espaço multifuncional, uma vez que aí podem decorrer várias atividades, como, por exemplo, realização de workshops ou projetos educativos. Quanto à decoração, é uma sala revestida por uma superfície irregular verde, constituída por várias pirâmides, o que faz com que o som se propague em diferentes direções. Com uma zona envidraçada para a sala principal e uma escadaria virada para a rua, é um espaço bastante calmo e harmonioso. (…) Depois do almoço, dirigimonos então para o Museu Soares dos Reis. Começámos por fazer pequenos grupos e com a ajuda de uma guia percorremos o museu. Iniciámos a nossa visita com a visualização do retrato de

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A visita de estudo teve início no Jardim Botânico do Porto. Os alunos, em pequenos grupos, puderam observar um jardim que não deixa ninguém indiferente perante a sua beleza e diversidade. O jardim romântico envolve a casa Andresen e traznos à memória a escritora Sophia de Mello Breyner Andresen. De seguida, visitámos a Casa da Música, nomeadamente, a sala 2, o bar suspenso, a sala VIP, o terraço VIP, a sala do Renascimento, a sala Cybermúsica, entre outros espaços. (…) Vimos, através de umas longas janelas de vidro ondulado, a sala principal, a sala Suggia. Os vidros ondulados, pelo facto de possuírem esta forma, permitiam que o som “batesse” na superfície e se espalhasse por toda a sala. (…) As paredes são revestidas de folhas de ouro, o que provocava um efeito visual de movimento e som. A talha de ouro é uma referência ao Barroco e as madeiras das paredes são ótimos materiais acústicos. O palco possui uma estrutura em forma de almofada, designada por “concha” de acústica que tinha como função uma melhor reflexão da música. Foram-nos também apontados os camarotes Vip ao fundo e as filas de cadeiras. Um facto curioso que nos foi dito foi a presença de difusores de som, que permite que o som seja “ampliado”, isto é, que o som seja uniforme da primeira à última filas. E outro dado curioso foi o facto de as cadeiras da plateia possuírem um tecido especial que permite que o som não seja absorvido pelas pessoas. Todos os elementos foram colocados de forma a dar equilíbrio à sala. Passámos pelo Bar suspenso, que possuía um vidro enorme em todo o seu comprimento e foi aí que

Soares dos Reis e a guia fez uma espécie de biografia, anotando os pontos mais interessantes do escultor. Seguidamente, mostrounos diversas esculturas, entre elas: “O Desterrado”, “A Filha dos Condes de Almedina”, “Mistress Elisa Leech”, “Ismael”, etc. Toda a visita foi acompanhada de muita interação entre os alunos, a professora e a guia, no que toca aos aspetos e descrições de cada escultura. Posteriormente, passámos a uma sala onde fomos apreciar e descrever diversos quadros, entre eles: “Cenas familiares”, “Senhora vestida de negro”, “Guardando o rebanho”, “Colheita - Ceifeiras”, etc. Todos os quadros observados faziam referência a uma determinada época, representavam diferentes correntes artísticas e retratavam diferentes temas. (…) Durante toda a visita, tive a preocupação de fazer vários registos daquilo que os guias nos iam mostrando e dizendo para, mais tarde, me lembrar mais facilmente do que visualisei. O balanço final da visita foi muito positivo. Apesar de já conhecer alguns dos locais visitados, é sempre bom revê-los e prestar atenção a coisas novas. Para além da parte cultural, esta visita de estudo permitiu também o convívio agradável entre todos fora do local habitual, a escola, o que é sempre benéfico. Marta Amaral, 10.º D

Iniciámos a visita guiada à Casa da Música, cujo edifício, de grande importância cultural, foi projetado pelo arquiteto holandês Rem Koolhaas, como parte do evento Porto, Capital Europeia da Cultura, em 2001. No entanto, a sua construção só ficou concluída em 2005, transformando-se imediatamente num ícone da

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cidade. A construção da Casa da Música insere-se na corrente modernista e evidencia linhas sóbrias, curvas e ângulos retos. O guia da visita informou-nos, logo no início, que a Casa da Música foi construída em betão, alumínio perfurado e vidro, materiais esses que se encontram bem visíveis, sendo por isso, a meu ver, um edifício com uma arquitetura bastante invulgar e caraterísticas surpreendentes. Aqui ensaiam diversas bandas e orquestras, tais como a Orquestra Sinfónica do Porto. (…) Seguimos para um bar suspenso em frente à sala Suggia (o coração da casa da música), que é a sala principal de espetáculos, em que nos foi explicitada a história e caraterísticas da sala. É dotada das mais exigentes condições acústicas e técnicas, sendo privilegiada para eventos de média e de grande dimensão. Este auditório abre-se à comunicação visual com os restantes espaços através das zonas envidraçadas que a circundam. No seu interior, a decoração prende-se com os prateados e dourados (a imitar o estilo Barroco), como se fossem as riscas negras de uma zebra branca, que contrastam com a luz do vidro. Foi referido também que a escolha do nome dessa sala é em homenagem à famosa violoncelista portuguesa Guilhermina Suggia, que faleceu em 1950. Outro aspeto interessante dessa sala de concertos é o facto de existir um órgão dourado numa das paredes e as cadeiras serem todas feitas de um material que não influencia a propagação do som, de modo a que todos os espetadores estejam sujeitos às mesmas condições durante todo o espetáculo, e isso devese também a todo o isolamento

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sonoro da mesma (aos painéis das paredes, aos cortinados, aos vidros ondulados e a uma caixa designada de caixa sonora). Estas caraterísticas sonoras da sala são constantes, quer estando com pessoas, quer estando sem pessoas. Por este motivo, não há lugares privilegiados nem VIP e os bilhetes são todos ao mesmo preço em todos os 1238 lugares. (…) Iniciámos a visita guiada ao Museu Soares dos Reis subindo para o primeiro piso, entrámos na Exposição Permanente do Museu, seguindo, deste modo, um percurso cronológico pela pintura e escultura portuguesas do século XIX e primeira metade do século XX, apresentando os mais variados temas, desde a agricultura à religião, em pintura como retratos, autorretratos, paisagens naturalistas, situações de abstracionismo, etc. Este critério de exposição permitenos ter uma noção da importância da ligação do Museu à Academia Portuense de Belas Artes, criada em 1836, e atentar melhor na evolução artística nacional. Devido a esta ligação, grande parte da produção de mestres e alunos da Academia ficou no Museu, permitindo-nos agora ter uma visão bastante completa do panorama da criação artística deste período até 1932, ano da separação da Academia. Na primeira sala, um texto de introdução ajuda a enquadrar o programa expositivo. O percurso inicia-se com o Romantismo, representado através das temáticas do Retrato, Costumes Populares e Pintura de História, com obras de Augusto Roquemont, Francisco José de Resende, João António Correia, Luís Pereira de Meneses (Visconde de Meneses), Miguel

Ângelo Lupi, Caetano Moreira da Costa Lima, entre outros (salas 2, 3 e 4). O ciclo do Naturalismo constitui a maior coleção do Museu e a sua representação inicia-se com uma seleção alargada de obras de Silva Porto e Marques de Oliveira, pensionistas em França e Itália, que introduziram na arte portuguesa a possibilidade de uma renovação estética, pela prática de uma pintura de ar livre. Mas outros pintores, como José Malhoa, Columbano, António Ramalho e João Vaz, estão representados na coleção, permitindo observar o panorama da pintura da 2.ª metade do século XIX (salas 5 e 6). Na Galeria de Escultura, expõese a obra de António Soares dos Reis, o artista que dá nome ao museu. Em gesso, mármore ou bronze, são apresentadas obras do escultor enquanto aluno (na Academia Portuense de Belas Artes ou como pensionista em Paris e Roma) e como artista reconhecido. Continuando o percurso pela pintura do séc. XIX, destaque para a obra de Henrique Pousão (Sala 7), a que se seguem uma série de pintores naturalistas, entre outros, Artur Loureiro e Sousa Pinto, artistas nascidos nos anos 50 do século XIX, mas que se mantiveram ativos até aos anos 30 do século seguinte (sala 8). Aurélia de Sousa e António Carneiro representam a rutura do Naturalismo e uma evolução estética. Outros autores, como Carlos Reis, Veloso Salgado, Manuel Maria Lúcio, Cândido da Cunha e Eugénio Moreira, formam o panorama artístico de um tempo de transições. As últimas salas (9, 10 e 11) da galeria de exposição permitem observar algumas das


transformações sofridas pela arte em Portugal na primeira metade do século XX, ditadas pela introdução de correntes vanguardistas então emergentes na Europa. Estão representados pintores como Armando de Basto, Eduardo Viana, Dordio Gomes, José Tagarro, Fernando Lanhas, Júlio Resende, Augusto Gomes e, entre outros, os escultores Diogo de Macedo, Francisco Franco e Ernesto Canto da Maya. (…) Ao longo desta visita, o que mais apreciei foi a participação ativa dos professores acompanhantes na mesma, e o esforço destes e dos guias no sentido de tornarem a visita, cujo conteúdo não é, à partida, muito apelativo para simples adolescentes que frequentam o 10.º ano de escolaridade, o mais interessante possível. Isso foi um fator ótimo que fez com que os alunos desenvolvessem um maior gosto pelas temáticas da arte e da cultura apresentadas, e muitos desses exemplos residem na explicitação concisa e sucinta de todos os acontecimentos e pormenores. Um dos exemplos foi a tentativa de participação crítica dos alunos solicitada pela guia no Museu Soares dos Reis, ao integrar, na sequência de acontecimentos, informações referentes aos artistas e às suas obras, incluindo os mais milimétricos pormenores (por exemplo, o facto de se ver pó num quadro quer dizer que este representa uma estação quente, como o Verão), deixando os alunos questionar e dar a sua opinião, e explicando algo que eu achei bastante interessante, que foi o facto de o pintor pintar melhor por inspiração própria do que por obrigação, quando é pago para fazer tal obra. O que menos apreciei foi os alunos não terem a oportunidade

de “descansar” na visita ao Museu Nacional Soares dos Reis, pois estes não podiam sequer encostar-se às paredes, e isso levou à progressiva falta de interesse por grande parte dos alunos, devido ao cansaço, e também pelo facto de o tema, como já referi anteriormente, não ser o de máximo agrado de todos os alunos, sendo por isso um dos objetivos a desenvolver com a visita. A meu ver, os objetivos definidos foram alcançados plenamente. Esta visita foi proveitosa, na medida em que os alunos tomaram consciência de dois espaços de grande importância na cena cultural portuguesa e de tudo o que nesses espaços existe. Há a destacar a forma cívica e ordeira como os alunos se comportaram ao longo de toda a visita, num clima de agradável convívio entre alunos/ alunos e alunos/ professora. Poderão estes alunos participar em futuras iniciativas do género, visto que correspondem plenamente ao perfil exigido, pois não houve nenhum incidente disciplinar, e creio que os alunos tentaram aproveitar o esforço de quem nos guiou as visitas e as tentou fazer mais interessantes. João Pedro Silveira Vieira, 10.º D

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Aluna do 12.º B

Inês Pinto

O ENCANTO DOS LIVROS

No passado dia 20 de março de 2012, a turma de inglês do 12.º ano foi até Aveiro, para participar num workshop intitulado “The Joys of Books”, na International House (IH) de Aveiro. Quando lá chegámos, fomos recebidos pelo diretor Tony Laurel e pelo professor Neil Murray, de origem escocesa. O professor fez-nos uma visita guiada pela IH e explicou que é uma escola de línguas, fundada em 1980, e que se dedica a ensinar Inglês, Francês, Alemão, Espanhol e Italiano. Falámos sobre o nosso gosto por livros, as nossas preferências, e discutimos em pares os pequenos pormenores que por vezes fazem diferença, por exemplo, se compramos um livro pela capa, se preferimos um livro com capa dura ou com capa mais maleável. Chegámos à conclusão de que há uma diversidade de géneros literários, como o romance, a fábula, o conto, o ensaio, entre outros. Foram distribuídas imagens pelas paredes da sala, sem nenhuma ordem em particular, e a nossa atividade era a de tentarmos criar uma história através daquelas imagens, pô-las por ordem e no fim contar a nossa história. As imagens pertenciam à curta-metragem de animação, vencedora de um Óscar, The Fantastic Flying Books of Mister Morris Lessmore, ou seja, “Os Fantásticos Livros Voadores do Senhor Morris Lessmore”, do autor William Joyce. Após termos contado as nossas hilariantes histórias, visionámos a curtametragem. Esta curta retrata a história de Morris Lessmore. Após um furacão ter destruído a sua cidade, Morris é levado para uma casa velha, mas colorida, cheia de livros, que ganham vida e interagem com ele, a fim de espalhar alegria pela comunidade. Morris fica a guardar os livros por muito tempo, até que chega o dia em que essa tarefa tem de ser passada para outra pessoa. William Joyce usa o objeto livro como

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personagem principal de uma alegoria facilmente assimilável, terna e verdadeira. Centra-se na relação entre o livro e a morte e, dando aos livros propriedades físicas e biológicas que a eles não pertencem, põe de forma clara a tónica na eternidade do livro enquanto conceito e não enquanto objeto físico, sem que este último mereça menor consideração. Ou seja, com este filme percebemos a importância dos livros e que são estes que nos dão alegria, que nos levam a mundos outrora desconhecidos, mas que, para se manterem vivos, temos de os ler, só assim os faremos perdurar por muito tempo. Demos, assim, por terminada a nossa visita à IH de Aveiro, onde fomos muito bem recebidos e todos participámos entusiasticamente nas diversas atividades propostas, recorrendo sempre à língua inglesa como meio de comunicação. Com este workshop ficámos alertados que, apesar das novas tecnologias nos disponibilizarem quase todos os documentos de que necessitamos, um livro é algo único, que nunca pode ser esquecido. Uma mensagem importante: e quando vos perguntarem se “os livros podem vir a ser substituídos por algum meio tecnológico?” Digam que acreditam que não, que para vocês tal não irá acontecer, que gostam de sentir o papel nos vossos dedos, o cheiro de um livro novo e, acima de tudo, leiam, pois todos os livros têm uma mensagem importante que não deverá ser ignorada.


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“When a man is tired of London, he is tired of life…” Samuel Johnson

A TRIP TO LONDON

Travelling to London with students has been a long cherished dream by all English teachers at our school. London is a cosmopolitan city and there’s so much to see and to learn. Its multicultural side fits perfectly our syllabus where the topic multiculturalism takes up a meaningful dimension. So this was the year when we finally mobilized energies and decided to set out on this journey. After the first meeting with parents and students we came up against the” scary” reality that we had to look after 45 students and we were only three. Unfortunately our dear colleague Claudia Carvalho had to give up and we did miss her joy and good mood. The day finally came and from 28th till the 1st of April we could enjoy London with its colourful lively streets, its unexpected contrasts and friendly people (actually the idea of British coldness is nothing but a stereotype because I have never known such kind, polite people). We had busy days trying to make the most of our trip in such a short period of time… getting up in the morning, travelling through the Tube and its incredible net of connections, walking long distances and feeling the scent of streets overflowing with people, teeming with life, brimming up with curious details. What an amazing place! Students tended to complain about walking so much, some of them kept lagging behind, shuffling their feet or treading along with sulking faces… but that’s part of discovering a city, you get tired obviously, you may feel some pain in your backs or your shoes may be nibbling at your ankles but in the end all the memories will remain and as some have told us “Teacher I want to go back!”, or even “Teacher I want to do my college years in this great city!” That’s worth listening to and made us feel that we gave students the opportunity to keep London always in their memories and in their hearts! Elsa Machado Docente de Inglês

Docente de Inglês/alemão

Glória Silva

LONDON AFTERGLOW

The trip to London was an amazing experience for me. I had never been to London before and I was expecting to enjoy the trip as much as I did. All the activities we made during the trip were all very fun to me, even though we walked a lot and were tired, I am sure it was worth it because this way we were able to see a lot of monuments and visit a lot of places that we wouldn’t be able to see if we hadn’t walked as much as we did. The place I liked to visit the most was “Madame Tussauds”. I won’t forget this trip and the amount of fun I had. Ana Brandão. 8.º ano After our school trip to London, whenever people asked me, “How was it?” I was at a complete loss for words since it is hard trying to put London into words: you truly have to breathe the city inside out, no words will ever suffice. There is the sound of Big Ben’s clock and the silent pace of The Thames, the hustle & bustle of street markets, the constant buzz of people and cars moving everywhere, the stretched green grass of parks that invite you to sit and read if only for a few minutes. In a city of millions what is most astounding is that life seems to unfold so smoothly. There is no other place where this feeling is stronger than beneath the city, in the insides of the beast known as Tube. It feels as if there is this other city underground with its own people, secretly disappearing in the tunnels. I hadn’t been on British soil for quite a while. I had almost forgotten what taking a stroll through the streets of London could mean. But that’s between me and the city...

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TEATRO EM INGLÊS - 7 DE MAIO 2012

Clube de Inglês e Alemão

ENGLISH / DEUTSCH CLUB is back…

Nos dias 22 e 23 de março, o Clube de Inglês/Alemão participou na Feira da Juventude, promovendo visitas à sala 1 (Bloco E), cuja decoração dá a conhecer aspetos relativos às línguas e culturas Inglesa e Alemã. Desenvolveu, também, atividades de caráter lúdico, nomeadamente um concurso intitulado “Spelling Bee”, que foi organizado e dinamizado por alunos do 12.º A/B matriculados na disciplina de Inglês. Os visitantes da nossa escola e de outras escolas, incluindo alunos do primeiro ciclo, participaram entusiasticamente nas atividades, revelando curiosidade em relação a assuntos que não são contemplados nos programas e nos manuais escolares. A participação, o empenho e o comportamento positivo dos vários intervenientes demonstraram a importância deste espaço e de toda a sua dinâmica.

À semelhança do passado ano letivo, os professores de Inglês trouxeram a Estarreja, mais precisamente ao cineteatro da cidade, uma companhia de teatro inglesa, desta vez “The Clever Pants”. O objetivo era proporcionar aos alunos do ensino básico, de uma forma lúdica, o contacto próximo com falantes de uma das línguas que estão a aprender. No espectáculo “Three in one”, concebido para estimular a intervenção dos alunos nas histórias, os “Clever Pants” revisitam três estilos clássicos da literatura inglesa, desde a tragédia do séc. XVII, passando pelo melodrama do séc. XIX, terminando com uma aventura policial ao gosto do séc. XX. Com um discurso adequado à faixa etária, momentos de interação controlada e uma grande dose de humor, conseguem captar a atenção e participação da sua jovem audiência, cumprindo plenamente os objetivos a que nos tínhamos proposto. Além dos 190 alunos da nossa escola, estiveram também presentes colegas das escolas Padre António Morais da Fonseca, da Murtosa, e da EBI de Pardilhó. “We hope you’ve all enjoyed the show! See you next year!”


competências sociais/comunicação Marek Prorok e Jiri Okrouhly. Durante esses dois dias, visualizámos alguns vídeos e realizámos alguns jogos que visavam desenvolver a nossa capacidade de cooperação, resolução de problemas, de trabalhar em equipa e de comunicar de forma eficaz. Também se discutiu o tema empreendedorismo, mais especificamente as características que um empreendedor deve possuir para ter sucesso. Achamos que esta experiência foi interessante e divertida, pois tivemos a oportunidade de ficar mais esclarecidos relativamente a algumas competências sociais, essenciais para uma vida com sucesso. Aplicámos também os nossos conhecimentos de Inglês, uma vez que tivemos de comunicar nessa língua com os representantes checos, e aprendemos

PATRIMÓNIO: PRESERVAR E DIVULGAR

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Rafaela Sofia Silva Marques e Equipa Preia-Mar

(1991); também desempenhou distintos cargos na direção de instituições. Nesta sessão em Estarreja, falou-nos sobre “O património e o seu papel cultural no contexto local e regional”. Através de uma breve perspetiva histórica, que abriu a intervenção de José Mattoso, anotámos que o “património herdado de gerações anteriores não existiu sempre”, aliás, foi em 1700 que se fez “o primeiro inventário do património nacional, em França”, e é com a Revolução Francesa que se institui que “os bens culturais são bens públicos, acessíveis a todos”, sendo os estados liberais que iniciam “a defesa do património cultural nas suas Constituições”. Atualmente, a preservação do património cultural (por exemplo, de um concelho, de uma freguesia) é um “dever das entidades administrativas e regionais”, mas também é um “dever dos cidadãos”, portanto, de todos nós. Para José Mattoso, os “museus não devem ser espaços com peças congeladas, (…) o valor do património tem de ser generalizado”; nesse contexto, considera importante colocar “a tecnologia

Aluna do 10.º F.

No passado dia 23 de setembro, as turmas E e F do 10.º ano da área de Línguas e Humanidades da nossa escola compareceram na Biblioteca Municipal de Estarreja, acompanhadas pelos professores Carlos Oliveira (Educação Física) e Maria de Jesus Silva (História A), com o intuito de marcarem presença num evento organizado pela Câmara Municipal, as II Jornadas de História e Património do Concelho de Estarreja, nas quais participaram alguns especialistas do assunto, como o convidado de honra Professor Doutor José Mattoso, bem como arqueólogos e investigadores. Do extenso e reconhecido currículo do historiador português José Mattoso, nascido em 1933, em Leiria, destaco apenas duas obras de investigação historiográfica de referência, A Nobreza Medieval Portuguesa – A Família e o Poder, de 1980, e Identificação de um país – Ensaio sobre as Origens de Portugal, de 1985; entre muitos outros, foi galardoado com o prémio de História Medieval Alfredo Pimenta (1985), o prémio Pessoa (1987) e ainda o prémio Böhus-Szögyény de Genealogia

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Eulália Gomes. Docente de Inglês/Alemão

Alunos do 11.º F. Curso profissional de Animador Sociocultural

SESSÃO-PILOTO DO PROJETO COMENIUS

Nos dias 20 e 21 de março, a nossa turma frequentou um workshop, inserido no projeto Comenius, em que a nossa escola participa durante o biénio 2010-2012, sob a temática SOS. NET: Social Skills Trainer, dinamizada pelo professor Emídio Ferro e com a supervisão de dois representantes da República C h e c a , parceiros no projeto, os formadores em


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Aluna do 11.º B

Jessica Ferreira

ESTARREJA VENCE E CONVENCE

ao serviço da acessibilidade das coleções e documentos”, por exemplo, com microfilmagem, digitalização, bases de dados, publicação em sítios da internet. Falou-nos, ainda, da importância da sensibilidade pública quanto ao acesso aos bens culturais e de princípios indispensáveis na preservação do património local. Nas palavras do historiador, “a memória coletiva é uma manifestação de vida”. Por sua vez, a segunda oradora da parte da manhã, Rosa Maria Rodrigues, atual técnica superior da Câmara Municipal de Estarreja, fez-se ouvir em relação ao que é o “Património Imaterial – um Conceito, uma Realidade”, em que domínios se manifesta e preserva a sua identidade, mencionando casos específicos de provérbios e de expressões populares típicas desta zona, assim preservados pela escrita e acessíveis aos mais jovens, que nem sempre os conhecem, para que não esqueçam. Os alunos de ambas as turmas encheram totalmente a sala de conferências da Biblioteca, mas, devido ao período de aulas, não nos foi possível permanecer o resto da manhã, com muito desagrado nosso. Por isso, não ouvimos falar sobre as “Escavações arqueológicas no Castro de Salreu”. É de realçar o interesse demonstrado pelos alunos relativamente aos assuntos tratados pelos dois palestrantes. Foi um privilégio ouvir a lição de José Mattoso e relembrar expressões populares mais antigas.

Foi de uma forma convincente que a Escola Secundária de Estarreja derrotou a Escola Secundária de Fornos de Algodres, na final do campeonato regional de andebol masculino que decorreu no sábado, dia 28 de abril de 2012, na nossa escola. Os nossos atletas, depois de terem sido apurados em Leiria para esta etapa, entregaram-se confiantes ao desafio proposto, de modo a não desiludirem os (poucos) adeptos presentes no pavilhão, nesta grande final. Embora tenha parecido “fácil” os atletas da Escola Secundária de Estarreja triunfarem, ganhando 42 bolas a 23, o jogo teve alguns momentos mais complicados devido à falta de isenção e experiência dos alunos que desempenharam a função de árbitros. Felizmente, apesar de a comunidade escolar não ter enchido o pavilhão da nossa escola para apoiar os nossos o jogadores, estes conseguiram passar estes pequenos-grandes contras, e com grande espírito de equipa, entusiasmo e paixão venceram, conseguindo, na segunda parte deste grande jogo, “brincar” com o resultado. É de louvar o trabalho feito pelos atletas André Lima, Daniel Castro, Diogo Alves, Diogo Silva, João Bessa, Luís Tavares, Miguel Seara, Rafael Claro, Ricardo Nobre, Tiago Marreiros, Tomás Almeida, não esquecendo o professor Luís Rodrigues. Conseguimos ganhar o campeonato regional, esperemos agora alcançar o campeonato nacional de andebol! Conseguiremos repetir o feito de 2008/2009 e consagrar-nos campeões nacionais?


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Docentes de Biologia

Fátima Borralho e Manuela Azevedo

DIA DA FLORESTA AUTÓCTONE

O Dia da Floresta Autóctone comemora-se a 23 de novembro; pretende alertar para os problemas que afetam a nossa floresta e promover a sua proteção. Os professores de Ciências Naturais solicitaram aos alunos das turmas A, B, D e E do 8.º ano que desenvolvessem trabalhos criativos alusivos ao tema. Após pesquisa sobre o tipo de árvores, as suas características e a sua distribuição em Portugal, os alunos desenvolveram, individualmente ou em grupo, um conjunto variado de trabalhos, dos quais se destacam as maquetes e os cartazes, alguns reutilizando materiais. O carvalho, o sobreiro e o azevinho foram as espécies florestais mais estudadas e em alguns trabalhos focaram também algumas espécies animais que dependem destes ecossistemas. Esta abordagem didática teve como objetivo alertar para a necessidade de preservar a biodiversidade e contrapor a riqueza da floresta autóctone com áreas de produção florestal em monocultura. Estas últimas favorecem os incêndios florestais, diminuem a biodiversidade e conduzem a um empobrecimento social das populações, enquanto que a floresta autóctone ajuda a regular o ciclo hidrológico, potencia a biodiversidade, é fonte de matérias-primas variadas e cria locais aprazíveis para a população poder fruir do contacto com a natureza.

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Teresa Bagão. Docente de Português António Neto. Docente de Eletricidade.

TEMOS QUADROS E TEMOS CARROS

A eletricidade e a mecânica definem o nosso quotidiano, nos seus aspetos mais comuns ou mais sofisticados. Talvez por isso, passam ambas quase despercebidas. Também não paramos para pensar no processo de fabrico nem na importância de equipamentos que estão por detrás do simples gesto de ligar a luz ou da evolução mecânica que permite ligar um automóvel com um cartão. Porém, para os alunos dos cursos profissionais e um CEF de Eletricidade, Eletrotecnia e Mecânica, este desconhecimento já passou à história. Frequentaram as aulas de formação técnica e os seus professores António Neto, Joaquim Matos e Margarida Teixeira propuseram-lhes saber ainda mais com a visita de estudo guiada à fábrica Quitérios e ao Museu do Automóvel do Caramulo. Foram todos os alunos do 9.º H, 10.º O, 11.º M, 12.º M. Na Quitérios, num espaço multi-usos destinado a conferências e formação, o grupo foi recebido pelo dono da fábrica e por duas responsáveis das áreas de engenharia/ produção e relações humanas. A concisa e esclarecedora exposição acerca daquela empresa foi atentamente seguida pelos alunos que, assim, desde logo retribuíram o excelente acolhimento que marcou a manhã que passámos nas instalações. Os alunos foram divididos em dois grupos, tendo percorrido todos os setores de produção da Quitérios. Acompanharam as guias sempre com atenção e interesse, e até tiveram oportunidade de interagir com algumas operárias, no breve desempenho de uma atividade. Desde o inicial corte da chapa efetuado por uma máquina até ao embalamento do produto final, acompanhámos o trajeto de produção de equipamentos que todos os edifícios possuem: quadros de centralização de contagem, caixas de barramento, caixas para instalação de repartidores

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e bastidores para ITED Raquited® (marca registada da Quitérios). No final da visita, os alunos receberam uma pequena lembrança e, mediante proposta da professora Margarida, a escola também, com a generosa oferta de quadros elétricos de cada um dos modelos ali fabricados. Da parte da tarde, visitámos o Museu do Caramulo. Ao percorrer as diversas salas com a Coleção de Arte, deparámo-nos com valiosas peças da autoria de Marc Chagall, Pablo Picasso, Maria Helena Vieira da Silva, Grão Vasco, Silva Porto, Columbano e Amadeo de Souza-Cardoso, para além de estatuária, cerâmica, mobiliário e tapeçaria de diversas épocas. De seguida, conhecemos um pouco da Coleção de Brinquedos. Contudo, o que mais concentrou a atenção dos alunos foi a lição sobre a história do automóvel, na Coleção de Automóveis, Motociclos e Velocípedes, acompanhada pela obsrevação de exemplares verdadeiros e pelas explicações do professor Neto, que também foi contando histórias pitorescas sobre carros e corridas. Encontram-se ali dezenas de automóveis, do mais antiguinho Peugeot de 1899 ou do Ford T, ao mais sofisticado modelo desportivo atual, como é o caso do protótipo de corridas Le Mans Series. Não podemos deixar de salientar o excelente Rolls Royce que transportou a rainha Isabel II de Inglaterra na sua visita a Portugal e que também transportou o Papa João Paulo II, aquando da sua visita a Fátima, ou ainda o excelente Lamborghini MIURA, de que há muito poucas unidades construídas no mundo inteiro. Mas também aquele automóvel Pegaso, de que ninguém conhece sequer a marca, não esquecendo o único automóvel 100% português, o Alba, totalmente fabricado nas instalações da ALBA em Albergaria-a-Velha, ou, por que não referir, a excelente coleção de veículos Bugatti que foram produzidos durante vários anos e que vão desde o modelo espartano de corridas ao superluxo com estofos de cabedal e madeira verdadeira no seu interior. Em todas as suas vertentes, esta foi uma visita muito positiva, que a todos enriqueceu.


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Alunos do 12.º D e do 12.º E

E O PARLAMENTO AQUI TÃO PERTO…

A Escola Secundária de Estarreja foi alvo de um excelente convite feito pela eurodeputada Regina Bastos, que oferecia a alguns alunos a oportunidade de conhecer o Parlamento Europeu e o seu funcionamento. A visita foi organizada no âmbito do programa “Meet your MEP” (que contou com a colaboração da funcionária do PPE, Sandra Carreira). O convite dirigia-se a nove alunos da ESE. Nesse sentido, foram selecionados alunos que frequentam o 12.º ano do curso de Línguas e Humanidades (Ana Marques, Fabrícia Teixeira, Inês Moreira, Jorge Oliveira e Patrícia Tavares) e do curso de Ciências Socioeconómicas (Andreia Fial, Carla Ferreira, João Lima e Maurício Chipelo). Foram acompanhados pelas professoras Manuela Afonso (docente de Francês e subdiretora da escola) e Manuela Ressurreição (docente de História). A viagem teve início no dia 4 de dezembro de 2011. Partimos por volta das 13h30, do aeroporto Sá Carneiro, tendo o grupo chegado ao seu destino cerca das 17h30 (hora local). Na primeira noite, jantámos com o engenheiro Daniel Azevedo, antigo aluno da ESE, que mostrou aos alunos e professoras um pouco do centro histórico de Bruxelas. O segundo dia começou bem cedo, com a visita aos monumentos históricos mais emblemáticos da capital: Manneken Pis, Cathédrale St. Michel et Ste. Gudule, Place Royale, a Grand Place, etc. Durante o dia, o grupo deparou-se com um pequeno obstáculo à visita, pois viu-se perante uma manifestação de congoleses, o que provocou o corte de algumas estradas e até do metro, impedindo a deslocação ao Atomium. Enfim, nada que impossibilitasse que a palavra

À la suite du voyage à Bruxelles

À la suite du voyage à Bruxelles, nous voulons ajouter ce que nous avons appris et vécu autant que citoyens d’un pays européen: Être Européen, c’est partager et échanger tout en gardant sa culture, ses traditions et un ensemble de valeurs proprement européens (la dignité humaine, les droits de l’homme, la démocratie, la solidarité et la tolérance) qui réunissent le “peuple européen”. Alunos do 12.º D

“diversão” dominasse o dia. No dia 6 de dezembro, deu-se o momento mais importante desta jornada. De manhã, tivemos o privilégio de visitar o Parlamento Europeu e de conhecer o funcionamento desta instituição da União Europeia. Assistimos a palestras proferidas pelos eurodeputados Carlos Coelho e Regina Bastos. A tarde foi preenchida com a visita a um Parlamentarium e o resto do dia, coma compra de recordações. No dia seguinte, 7 de dezembro, acabou a aventura na Bélgica, o grupo dirigiu-se ao aeroporto para embarcar. Sentimo-nos privilegiados e bastante agradecidos com a oportunidade concedida, pois sabemos que são muito raras estas oportunidades. Podermos dizer que visitámos uma instituição da União Europeia, especialmente o Parlamento – por onde passam muitas das decisões que nos afetam -, é estupendo! Estamos muito gratos e agradecemos em particular à eurodeputada Regina Bastos pela oportunidade concedida e pela

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Docente de História

Paulo Pacheco

À DESCOBERTA DE ALMEIDA, TRANCOSO E DO PALÁCIO DO GELO

forma adorável como nos recebeu. Queremos também frisar que o ambiente vivido durante estes quatro dias foi simplesmente fantástico, divertimo-nos imenso e alargámos os nossos horizontes culturais. Finalmente, queremos deixar uma palavra de apreço à ESE e às professoras que nos acompanharam, pois foram fantásticas e verdadeiramente camaradas! Na sequência desta visita, a escola endereçou um convite à eurodeputada, que se comprometeu a visitar a ESE com o objetivo de reforçar a importância dos jovens na construção do modelo europeu.

A partida estava marcada para as 8h15 do dia 19 de maio de 2012, mas ocorreu com um ligeiro atraso de alguns dos participantes. O primeiro destino deste grupo de alunos do 8.º G e 8.º H (CEF de Serviços Comerciais e de Operador de Informática) era Almeida. Fez-se uma primeira paragem cerca das 10h00 na estação de serviço de Mangualde, onde as energias foram repostas. A Almeida chegou-se às 11h00 e havia que descobrir a fortaleza: os diversos fossos, o museu histórico-militar, os baluartes. As novidades eram muitas, mas o entusiasmo foi maior no “Picadeiro d`El rey”, onde houve contacto com cavalos e seus apetrechos. Após aproveitar ao máximo tudo quanto o espaço propiciava, estava quase na hora de partirmos rumo a Trancoso – concelho vizinho. Eram 12h40 e ansiava-se pela chegada, pois a fome já apertava. Pelo caminho recebeu-se alguma informação sobre alguns ilustres locais: o “profeta” Bandarra, o “magriço” local que terá participado na saga dos Doze de Inglaterra, falada n’ Os Lusíadas; D. Dinis que terá casado na cidade; o Padre Costa, Prior de Trancoso, que teve 299 filhos, 214 do sexo feminino e 83 do sexo masculino. Sobre este último ilustre, causou a estupefação dos participantes, para além do número, o facto de terem sido gerados por 53 mulheres. Aí, em confraternização, decorreu o almoço e sem demora avançou-se à descoberta do centro histórico: Pelourinho manuelino, Igreja de S. Pedro e o excitante castelo. Pelas 15h30, e após novo (re)abastecimento de estômagos de novo famintos, partiu-se em direção a Viseu e ao Palácio do Gelo, onde a Prof.ª Fátima Carvalho aguardaria o grupo. Aqui, a pista de gelo foi a grande apoteose, com três corajosos alunos a experimentarem com sucesso os patins: a Amanda, a Patrícia e o Renato, todos do 8.º G. O tempo “voou” e a muito custo, e já com saudades das aventuras do dia, rumou-se à ESE. O que importa salientar desta visita? A grande maioria dos alunos desconhecia os locais e as histórias ou a História a eles ligadas. Assim, os seus conhecimentos alargaram-se, através duma postura


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Alumnos de la clase de español del 11.º D

VIAJE A SALAMANCA

sempre correta, acatando pacificamente todas as instruções veiculadas, evidenciando espírito de curiosidade, até no trato com as pessoas com que se foram cruzando. Os docentes participantes – Cristiana Pata, Helena Rego, Cristina Campizes, Paulo Neves e Paulo Pacheco – consideraram ser de louvar a atitude dos alunos em todas as situações, quer nas lúdicas, quer nas de aprofundamento dos seus conhecimentos, ao longo de toda a viagem e nos locais visitados.

En el día 16 de abril de 2012, fuimos de viaje a España, a saber a Salamanca. ¡El día empezó a las siete de la mañana con la llegada de nuestro “mini autobús”! Después de algún tiempo de viaje, nuestro primer paraje fue en la estación de servicio de Viseu, donde tomamos el desayuno. Seguimos viaje hasta Guarda donde visitamos la “Sé da Guarda”, recibiendo algunas informaciones históricas de la profesora Maria de Jesus sobre esta iglesia. De entre algunas visitas, continuamos el viaje a nuestro principal destino: Salamanca. Cuando llegamos a España, nos quedamos sorpresas con la buena organización de la agricultura, como por ejemplo, los campos verdes y bien cuidados. Por fin, para nuestra satisfacción, llegamos a Salamanca. ¡Su belleza nos encantó y conquistó! Caminamos por las típicas calles de la ciudad donde había una grande diversidad de tiendas de recuerdos. Visitamos la Catedral, la Universidad pero, desdichadamente, estaban cerradas. ¿Y por qué? ¡Era el “Lunes de Aguas”! – Una fiesta que se celebra en familia o en compañía de las amistades. Las personas se reúnen para ir a merendar al rio o campo, con un clima de ociosidad, esparcimiento y diversión. Hasta hace no mucho, servía también como desahogo de los estrictos ritos de la Semana Santa, época de recogimiento y hastío. Nuestro local de elección fue, sin duda, la Plaza Mayor de Salamanca. ¡Encantadora! Allí descansamos, quitamos fotos, nos quedamos fascinados por su arquitectura e historia. Hicimos nuevas amistades, como por ejemplo, un chico chino que allí estudiaba. Con el día llegando al fin, tuvimos que regresar a Portugal, dejando para tras “la ciudad de la rana”, Salamanca. Después de un día diferente, llegamos a Estarreja con muchas ganas de regresar de nuevo a Salamanca. ¡Sin duda un día a recordar!

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