SALVADOR QUARTA-FEIRA 24/4/2013
THALITA LIMA
Em 2003, quando o rock nacional era dominado por bandas como Detonautas, Capital Inicial, Charlie Brown Jr, Skank e Los Hermanos, a voz de uma garota baiana ganhava destaque entre as adolescentes. Elas se identificaram de imediato com seu estilo diferente de vestir-se e com a mensagem de suas canções. Nesta época, Pitty, a garota em questão, lançava pela Deck Disc seu primeiro álbum, Admirável Chip Novo. Dez anos depois, o disco que colocou a cantora baiana entre os principais nomes do rock brasileiro está sendo relançado em vinil, na cor roxa e com o encarte original, pela empresa Polysom. O relançamento é uma forma de comemorar uma década deste trabalho que reconfigurou o cenário brasileiro do rock. Além de ter sido determinante para a inserção da cantora no grande mercado, Admirável Chip Novo reafirmava o potencial da voz feminina de se adequar ao som pesado das guitarras. Pitty se colocava assim como a representante moderna de uma tradição que conta com nomes como Celly Campello, Rita Lee, Cássia Eller, Marina Lima, Paula Toller, Fernanda Takai e Érika Martins, entre tantas outras. Para o produtor Rogério Big Bross, responsável por apresentar Pitty a Rafael Ramos, da Deck Disc, a cantora baiana reacendeu a ideia de que o gênero também era coisa de garota. “Num período dominado pelo rock macho, que cantava com a mão no saco, aparece uma garota à frente de uma banda de rock, bonita, voz marcante. Se você é uma garota de 15 anos, em 2003, vai se identificar com Chorão ou com Pitty?“, questiona Big.
Influências
Para Pitty, “talvez a palavra que permeie o álbum seja questionamento”. O título veio do livro
ROCK Lançado em 2003, Admirável Chip Novo revelava a cantora baiana para o Brasil e reafirmava o potencial feminino de se sobressair em um gênero dominado por homens
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Disco que revelou Pitty completa 10 anos e é relançado em versão vinil Divulgação
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safios, dúvidas, descobertas e sem a noção do sucesso que estaria por vir. “O que vão pensar de uma música de cinco minutos, com um mar de guitarras, falando que é ok ser bizarro e com uma parte C cantada em inglês? Realmente não tínhamos a menor ideia”, diz. Segundo ele, os integrantes da banda – então com a formação original, que, além de Pitty nos vocais, contava com Peu Sousa (guitarra), Joe Tromondo (baixo) e Duda Machado (bateria) – foram orientados principalmente pela intuição e o desejo de fazer um bom disco de rock, que se equiparasse aos discos gringos que curtiam.
Trabalho árduo
A formação original da banda que gravou Admirável Chip Novo pela Deck Disc, com Peu Souza, Joe Tromondo, Pitty e Duda Machado
A produção teve que lidar com difíceis escolhas sobre cada detalhe, que se tornam dilemas para o primeiro álbum de determinado artista ou banda. Definir que roupa cada música deveria usar, qual seria a linha adotada para a bateria, que arranjos de guitarra entrariam foram algumas das dificuldades citadas pelo produtor, que afirma ter sido um trabalho demorado e suado. Outra missão foi montar uma banda completamente nova, pois queriam “fazer com que aquilo soasse orgânico e natural, como se tocassem aquelas músicas, naqueles arranjos, há séculos”, diz Rafael. Com o álbum Admirável Chip Novo, Pitty saiu do anonimato e seu sucesso inspirou mais grupos e gravadoras a buscarem vozes de mulheres entre os novos talentos do rock.
Novo disco
Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, que narra uma sociedade onde os indivíduos têm seu comportamento pré-condicionado, ideia refletida na letra de Admirável Chip Novo. Além do livro, a cantora conta que teve influências das obras de George Orwell (escritor e jornalista britânico), Thomas Hobbes, cuja citação “o homem é o
lobo do homem” é utilizada na canção O Lobo, e referências da corrente filosófica do existencialismo, como Simone de Beauvoir.
Escola de rock
O produtor do disco, Rafael Ramos, conta que o processo de preparação funcionou como uma escola de rock, com de-
Enquanto o vinil do primeiro disco está em produção, é possível acompanhar Pitty no seu projeto paralelo, Agridoce, realizado com Martin Mendonça. Sobre esse projeto, a cantora diz que a ideia é dar um tempo na turnê e só fazer shows muito importantes com ele. Assim, garantirá espaço na agenda para fazer um novo disco de rock ainda esse ano.
O CD vendeu 370 mil cópias e estourou singles como Máscara, Equalize e a faixa-título
Bienal de Arte, uma discussão no ar Almandrdade Artista plástico, poeta e arquiteto almandrade2@hotmail.com
O diretor do Museu de Arte Moderna da Bahia fez bem, mostrou que sabe agir com bom senso abrindo o auditório do museu e convidando artistas, críticos e o público para sessões livres sobre uma possível mostra bianual de artes visuais. Um fantasma que ronda o inconsciente dos artistas, principalmente os mais jovens e se manifesta em reivindicações que, algumas vezes, chegam a ignorar a função sócio cultural da instituição. As falas são muitas, faltam os analistas. Uma mostra de arte de repercussão nacional é o objeto da ansiedade de artistas e uma promessa do Estado que merece uma atenção mais depurada. Nos últimos vinte ou trinta anos, não avançamos no pensamento, nem construímos, ainda, uma política cultural mais
efetiva, apesar do investimento na mobilização de comunidades e operários da arte em torno do tema. A discussão é oportuna, coloca sobre a mesa questões pertinentes que ultrapassam as dúvidas da mostra, como: as próprias ações, não só do MAM, como também dos outros museus de arte, o estágio em que se encontra a formação dos artistas e a arte nos dias hoje. Entre a burocracia dos editais, as leis de incentivo e a superioridade do mercado, os museus se encontram numa corda bamba, sem recursos para realizar seus projetos e manter uma programação livre de pressões externas alheias aos compromissos culturais da instituição.
Projeto curatorial
Se o MAM deve, ou não, promover uma mostra nacional de arte, primeiro é necessário que ele disponha de um projeto curatorial e a referida mostra esteja integrada nesse projeto, para não vir a ser uma grande festa isolada, que acaba com a ressaca do dia seguinte.
Afinal, museu não é instituição de caridade para adotar “pobres artistas” e muito menos casa de eventos à disposição de proponentes. Embora muitas salas de exposição se encontrem atualmente à espera de propostas premiadas nas loterias dos editais, algumas até nem precisariam apelar pra sorte, para ter visibilidade: são necessárias ao circuito cultural. Depois que a cultura foi dominada pela barbárie, numa sociedade que privilegia a produção de mercadorias culturais, o pensamento foi derrotado pela indústria do entretenimento e o poder do mercado. Quem acaba decidindo o que é arte, é o mercado,comoapelopublicitário,ele impõe o valor de legitimação. As feiras mobilizam os investidores, superaram em termos de expectativa as bienais de arte, que foram transformadas em supermercado de periferia, com produtos mais em conta para o consumidor de classe média. Não se acredita mais na linguagem, mas no valor de troca. O pensamento é o líquido derramado que brilha na superfície
Entre a burocracia dos editais, as leis de incentivo e a superioridade do mercado, os museus se encontram numa corda bamba, sem recursos para realizar seus projetos da obra, com prazo de validade limitado. Se, objeto de arte, for um falso brilhante, não importa, satisfaz à chamada economia criativa. O público de formação estranhaàhistóriadaarteprocuraum investimento seguro. Uma bienal de arte, como uma feira de automóveis, se não for um banco de informações confiável, traz
para o mercado novidades para estimular ou chamar a atenção do consumidor. Mas, com um mínimo de inteligência, pode trazer discussões para uma avaliação, informação e transformação do meio de arte, neste caso o auditório do MAM, sem querer, faz a provocação: se o Estado, em nome de uma democracia cultural, investe na formação de proponentes, em cursos de preenchimento de formulários e de formatação de projetos, em detrimento da crítica, da informação de artista, formação de público, capacitação de recursos humanos e da qualificação dos espaços culturais, onde e como tornar a promessa da bienal viável? O relato de quem vivenciou e de quem acompanhou os acontecimentos, mesmo distante no tempo, do final da década de 1960, das Bienais da Bahia, coloca em cena um contexto diferente do momento que estamos vivendo, esquecido no fundo da memória, importante para se retomar uma experiência, com as referências históricas. O cenário das artes em 1966
e 68 era de uma Bahia centro da descentralização da arte brasileira. A crescente industrialização do Nordeste, a Sudene, o Centro Industrial de Aratu, o Banco do Estado da Bahia inauguravam uma nova consciência no Brasil e acreditava-se numa mudança na cultura do Nordeste, contexto favorável para a Bienal da Bahia, a mais importante exposição de arte do País, depois da Bienal de São Paulo.
Vozes Literárias de Escritoras Negras
Filmes inéditos no Quartas Baianas
O livro Vozes Literárias de Escritoras Negras, de Ana Rita Santiago, será lançado nesta sexta, às 18h, no espaço Katuka – Africanidades, na Praça da Sé. A publicação da Editora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (EDUFRB) apresenta leituras descritivo-interpretativas de trajetórias, prosas e poéticas das autoras negras baianas Aline França, Angelita Passos, Elque Santos, Fátima Trinchão, Jocélia Fonseca, Mel Adún, Rita Santana e Urânia Munzanzu. No lançamento, o livro será vendido por R$ 20.
Dois filmes inéditos do cineasta Son Araújo serão lançados hoje na Sala Walter da Silveira, no projeto Quartas Baianas. Meu Pé de Manga e Acenderam os Céus serão exibidos gratuitamente, às 19 horas, integrando a programação de homenagem ao mês do curta-metragem. Acenderam os Céus conta a história de uma garota que acredita que só seria feliz se encontrasse um amor de verdade, enquanto Meu Pé de Manga se baseia na dúvida de Marcos: virar sacerdote ou partir com seu amigo de infância.
Sonho
Fechada a segunda Bienal, logo após a inauguração, em decorrência do momento político crítico que passava o País, não teve continuidade. A mudança cultural esperada com a industrialização, não passou de um sonho. A realidade cultural e política hoje é outra, mas é preciso conhecer o passado para dar um passo adiante. Se a promessa de mostra não for adiante, a discussão do MAM já vale a pena, a reconstrução da história é favorável ao pensamento, a cultura é quem lucra. Nem tudo é absurdo e bizarro.
CURTAS Projeto discute arte e a cidade O projeto Muros: Territórios Compartilhados – Residência em Salvador realiza hoje e amanhã, às 19h, um seminário para debater arte e cidade na Biblioteca Central dos Barris, com entrada gratuita. A discussão se dá a partir das intervenções urbanas que estão sendo desenvolvidas em uma residência artística realizada neste mês na capital baiana. Hoje acontece a mesa Intervenções Urbanas e Arte Como Ponto de Fuga e amanhã A Construção Compartilhada da Cidade: Entre o Controle e o Caos.
Bárbara Machado / Divulgação
Intervenção urbana de Bárbara Machado durante a residência
Homenagem a contadora de história A Biblioteca Juracy Magalhães Júnior, no Rio Vermelho, homenageia nesta sexta-feira a professora Maria Betty Coelho Silva por seus 90 anos. Ela formou diversas gerações de contadores de histórias por mais de cinco décadas. A programação será aberta às 14 horas pela diretora Sonia Morelli, seguida pela palestra A Vida e a Obra de Betty Coelho, por Bernadeth Argolo, bibliotecária e escritora infantil. Às 14h30, acontece a Hora de Ouvir História, com a professora Maria José Bello Goldwin, e, às 15 horas, acontece a apresentação musical do
grupo de alunos da Escola Senhora Santana. Às 15h30, ocorre o momento musical com o Grupo Presente.
Os 90 anos da contadora de histórias Betty Coelho será comemorado na Juracy Magalhães