O Rio Grande para o próximo governo Com o calendário de 2014 alcançando a data marcada para o primeiro turno das eleições, em 5 de outubro, o Editorial J buscou encontrar a resposta para uma pergunta a respeito do futuro do Estado: qual é a situação das principais áreas de atuação governamental para o próximo governador do Rio Grande do Sul? Ao mergulhar em dados sobre educação, saúde, transportes, qualidade de vida, desenvolvimento e finanças públicas, a equipe do laboratório de jornalismo procurou traçar o cenário que será herdado pelo novo governo do Estado, a ser definido junto com a votação para a Presidência e para o quadro legislativo estadual e federal. Asfixiado por uma dívida pública de R$ 50,4 bilhões, com 93% do valor correspondente ao débito interno com a União, o Rio Grande do Sul é o quarto estado mais endividado do país. A dívida consolidada líquida gaúcha foi duas vezes maior do que a arrecadação de 2013. Esta crise nas finanças, que começou a ser gerada pela gestão descontrolada há 40 anos, embaraça os investimentos em todas as áreas e trava o crescimento. Atualmente, cerca de 13% da arrecadação do Estado vai para o pagamento de juros e amortização da dívida estadual. Meta comum aos programas de governo dos candidatos ao Palácio Piratini, a renegociação da dívida pode ser avaliada pelo Senado ainda em 2014. O novo modelo, proposto através de um projeto de lei da presidente Dilma Rousseff, prevê a substituição do IGP-DI, índice de correção da inflação, cujo cálculo eleva ainda mais a dívida, pelo IPCA, um indexador de inflação menos elevado. O projeto de lei também reduz os juros do pagamento. Professor de economia da PUCRS, Alfredo Meneghetti lembra que, em 1998, quando ocorreu a primeira negociação da dívida, durante o governo Antônio Britto (1995-1998), o IGP-DI era considerado um bom índice. Hoje o cálculo deste mesmo indexador pode chegar ao dobro da correção feita pelo IPCA, o corretor oficial da União. Meneghetti também ressalta a diminuição do percentual da receita voltada para investimentos. Segundo o professor, a questão é mais um problema estrutural das finanças gaúchas.“Há 30 anos, chegamos a destinar 30% da receita corrente líquida para investimentos. Hoje temos um gasto de investimento em 5%. Estamos investindo um sexto do que era investido”, afirma. Os gastos com servidores aposentados também impactam as finanças públicas. Segundo dados de junho deste ano, do total de 285.665 mil funcionários públicos do Estado, 139. 455 mil são aposentados. Apesar de a receita do setor público estar comprometida, a renda da economia gaúcha apresenta crescimento. O Produto Interno Bruto do Estado (PIB) superou a média nacional em 2013 e cresceu 5,8%, enquanto o Brasil registrou alta de 2,3%. A região metropolitana de Porto Alegre tem o menor índice de desemprego entre as seis regiões estudadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com índice de 6,4%, no ano de 2013, a região deixou para trás Belo Horizonte, Fortaleza,
Recife, Salvador e São Paulo. Em 2002, a taxa era de 15,3% de desempregados. A última colocada em 2013 foi a região metropolitana de Recife, que apresentou o índice de 13% de desempregados, enquanto em 2002 este número era de 20,3% para a mesma região. “A perspectiva para 2014 é o Brasil crescer 0,9% em termos de PIB e o Rio Grande do Sul chegar a 3%”, explica Meneghetti. Assim como a constrição das finanças, outros problemas já são velhos conhecidos dos gaúchos, como a saúde pública. Os investimentos no setor, apesar de ampliados, ainda são insuficientes. Durante o período de dez anos, o Rio Grande do Sul subiu três posições no ranking nacional de gastos com saúde a cada grupo de 100 mil habitantes, do 14º lugar para o 11º, segundo dados divulgados pela Secretaria do Tesouro Nacional que mostram quanto cada estado brasileiro aplicou em saúde pública nos anos de 2002 e 2012. Em 2002, o Rio Grande do Sul despendeu cerca de R$ 8,9 milhões na saúde pública, à frente de 12 estados. Dez anos depois, o Estado gaúcho gastou em R$ 34,5 milhões em saúde para cada 100 mil habitantes. Segundo Marcelo Schenk, coordenador do curso de Gestão em Saúde da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), esse crescimento na tabela, à primeira vista, pode ser um bom sinal. “O avanço de posições pode ser considerado bom, entretanto, se comparado a outros estados com população semelhante, ainda ficaríamos para trás”, afirma. De acordo com dados divulgados na primeira semana de setembro,a situação da educação no Rio Grande do Sul será recebida pela nova gestão em um cenário mais otimista. No último ano, atingiu a 2ª posição no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) entre todos os estados do país m relação ao 3º ano do Ensino Médio. No relatório anterior, de 2011, estava no 12º lugar, ficando abaixo do Paraná e de Santa Catarina Em 2005, o Rio Grande do Sul figurava na primeira posição entre os estados da região Sul e em terceiro lugar no ranking brasileiro. Na tabela de evasão escolar, no ano de 2005, o Rio Grande do Sul ocupava a 23ª posição, com a taxa de 8,1% de abandono no Ensino Médio. Em 2011, houve piora, subiu para a 16ª, com 10,3% de evasão, acima da média nacional. Sobre o abandono dos estudos, a falta de investimentos desde as séries iniciais aparece como explicação. “Os alunos não conseguem se manter no Ensino Médio devido ao baixo nível de ensino no Fundamental atualmente” relaciona Marta Luz Sisson, pesquisadora especialista em educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Na faixa etária correspondente ao Ensino Médio, muitos adolescentes desistem dos estudos para ingressarem em seus primeiros empregos por não enxergarem o sistema de ensino como uma possibilidade atrativa de posicionamento no mercado de trabalho. O abandono precoce da escola tem impacto na qualificação profissional e engrossa o quadro da precarização do trabalho. A pesquisadora explica que os números mostram o que aconteceu gradativamente ao longo dos anos com a educação no Estado. O modo de reverter essa situação seria
ampliar o investimento em infraestrtura e modernização, começando pelo salário e qualificação dos professores. Apesar das contradições na educação gaúcha, em 2013, o crescimento no ranking nacional foi importante ainda que pouco expressivo em uma relação comparativa, uma vez que muitos outros estados apresentaram baixa. “O índice cresceu, sim, mas muito pouco em relação ao anterior”, observa Marta. O ensino politécnico seria um dos motivos para o crescimento. “O sistema politécnico tem avaliação interdisciplinar. O aluno que não vai bem em determinada disciplina tem sua avaliação compensada por outra, em que se saiu melhor”, explica. Ainda no rastro das finanças enfraquecidas do Piratini, o contexto atual da infraestrutura viária do Rio Grande do Sul é frustrante. No último levantamento do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit), de 2013, sobre a pavimentação entre os 26 estados e o Distrito Federal, o Rio Grande do Sul figura na última posição no quesito estradas asfaltadas: 7,2% das estradas estaduais, federais e vicinais pavimentadas. A expectativa de vida e o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) também caíram no Estado, regredindo duas posições de 2000 para 2010, apesar de o Rio Grande do Sul ainda apresentar boa colocação na tabela nacional. Está em 5º lugar no ranking brasileiro de 2010, segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), com média de 75,38 anos de vida. O primeiro é o Distrito Federal, com média de 77,35. Mas, apesar de estar apenas cerca de dois anos atrás do primeiro colocado, o estado já esteve melhor: em 2000, era 3º colocado, e a expectativa de vida era quase igual à do primeiro – 73,22 em comparação a 73,86. Em relação ao IDH, Rio Grande do Sul é o 6º colocado, com 0,746 no cálculo de 2010, segundo dados do PNUD. O primeiro, assim como no índice anterior, é o Distrito Federal, com IDH de 0,824. Em 2000, o Estado também estava melhor no ranking: era o 4º colocado. Estes e outros aspectos, revolvidos em exaustão durante o pleito eleitoral, formam o quadro que aguarda e desafia a gestão do Rio Grande do Sul para os próximos quatro anos.