O BOOM DO ROCK PORTUGUÊS - ANOS 80

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ANOS

80 E O NOVO ROCK PORTUGUÊS

CADERNO DE PESQUISA



ANOS

80 E O NOVO ROCK PORTUGUÊS

CADERNO DE PESQUISA REVOLUÇÃO 9


INDÍ


ÍCE 06. 08. 14. 18. 20. 24. 32. 34. 36. 37. 38. 40. 46. 49. 52. 58.

«ANOS 80» «OS PRIMEIROS PASSOS - NOVO ROCK PORTUGUÊS» «AR DE ROCK» «NO INÍCIO» «RUI VELOSO E CARLOS TÊ» «ARTIGOS» «A FÁBRICA PORTUGUESA» «84/85» «O ROCK DE 2ª GERAÇÃO» «O ESTADO DA NAÇÃO» «PIRATARIA DE DISCOS, CHEGOU A PORTUGAL?» «ROCK RENDEZ VOUS - RRV» «A RÁDIO» «A TELEVISÃO» «E NADA VOLTOU A SER COMO ANTES» «CITAÇÕES»


80 81 82 Um país inteiro, ainda à procura de rumo, entretém-se a dar voltas ao cubo de faces coloridas inventado pelo húngaro Rubik. Há uma solução correcta entre 43,2 quinquilhões de possibilidades... A cores é agora a TV, que passa Dallas («quem matou J.R.?»). Em concertos de música brasileira nunca houve tanta fartura: Milton Nascimento, Chico Buarque, Simone na Festa do «Avante!». Na Rádio Comercial há Pão com manteiga (Carlos Cruz), Lugar ao sul (Rafael Correia) e Café concerto (Maria José Mauperrin). Rui Veloso funda o rock com Chico Fininho e Marco Paulo confessa-se (Eu tenho dois amores). Victor Espadinha ainda fala aos corações (Recordar é viver) e as Doce fazem sucesso (Amanhã de manhã). Eternos são Amália (Gostava de ser quem era) e John Lennon (Woman). Babooska (Kate Bush) e Enola Gay (OMD) são outros sons que andam no ouvido. Já chegou o CD, mas ainda em fita vemos Apocalypse Now, Kramer contra Kramer, A Sombra do Guerreiro e Manhã Submersa. E Com um brilhozinho nos olhos (Sérgio Godinho) lemos O Nome da Rosa (Umberto Eco). Dá se ainda a morte de Sá Carneiro em Camarate.

Parte do Mundo vive o conto de fadas de Carlos e Diana. O outro extremo corre violento como Crónica de Uma Morte Anunciada (Gabriel García Márquez). A todo o planeta chega o concerto de Paul Simon e Art Garfunkel, no Central Park de Nova Iorque, e o canal dos «clips», MTV, que passa êxitos como Golden Brown (The Stranglers) e Don't You Want Me (The Human League). Aos cinemas chegam Os Salteadores da Arca Perdida, A Amante do Tenente Francês e o Touro Enraivecido. O cinema português está no auge: Kilas, O Mau da Fita (Fonseca e Costa), Francisca (Oliveira) e Oxalá (António-Pedro Vasconcelos). O rock continua em ebulição, como Cavalos de Corrida (UHF). Na Rádio Comercial, Grafonola ideal e Febre de sábado de manhã (de Júlio Isidro) realizam concertos de bandas estrangeiras e revelam valores como os Trovante (Baile no bosque) e os GNR (Portugal na CEE). Grande êxito faz o Cavaquinho de Júlio Pereira, mas os adolescentes querem é fazer «dança jazz». Na TV, vê-se o Cosmos por Carl Sagan e o Sabadabadu de Camilo de Oliveira e Ivone Silva.

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Portugal entra na CEE. Mário Soares não escapa à paulada na Marinha Grande e Freitas do Amaral, de sobretudo verde, faz campanha à americana. O país divide-se: «Soares é fixe» ou «Prà Frente Portugal». Na Rádio Comercial, Herman José realiza Rebeubéu, pardais ao ninho e Eunice Muñoz é Mãe Coragem, no Teatro Nacional. Na música, há Amália (Estranha forma de vida), os GNR (Efectivamente), Fausto (O despertar dos alquimistas), Madonna (Papa don't preach), Everything But The Girl (Don't leave me behind) e os Pretenders (Don't get me wrong). No cinema há África Minha, Nove Semanas e Meia, Era uma Vez na América, Top Gun (Ases Indomáveis) e A Missão. Eduardo Mendonza escreve A Cidade dos Prodígios, John Le Carré O Espião Perfeito e Franco Nogueira Um Político Confessa-se. Morrem Alexandre O'Neil e o Presidente moçambicano Samora Machel. No futebol, Maradona dá à Argentina o título no Mundial. Marca com a mão o golo dos quartos-de-final com a Inglaterra - «foi a mão de Deus», explica, e a Argentina está vingada. Há outros jogos memoráveis: Sporting-Benfica 7-1; Benfica-Sporting 5-0.

O computador foi feito à medida do Homem, mas vai alterar a sua vida de forma radical. A generalização dos «personal computer», PC, leva a revista americana «Time» a elegê-lo «homem do ano». É tão fantástico como a criatura de Steven Spielberg, que põe salas de cinema a chorar («ET go home!»). Na verdade, não falta boa ficção: As Brumas de Avalon (Marion Z. Bradley), A Balada da Praia dos Cães (J. Cardoso Pires), A Casa dos Espíritos (Isabel Allende) e Memorial do Convento (José Saramago). Na TV, passa Reviver o passado em Brideshead, A balada de Hill Street, O mundo misterioso de Arthur C. Clark, O passeio dos alegres (Júlio Isidro) e O sítio do pica-pau amarelo. No Mundial de futebol, em Espanha, a Itália de Paolo Rossi acaba de vencer o Brasil de Zico, Falcão e Sócrates. Michael Jackson (Thriller) faz furor, bem como os Culture Club (Do you really want to hurt me) e os Duran Duran (Save a Prayer). Há Amor (Heróis do Mar) e Por este rio acima (Fausto). Zandinga prevê a descoberta de petróleo em Portugal. Palavra de adivinho.

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Fazer depósitos a prazo é ser «bota de elástico». Jogar com acções na Bolsa, seja em OPA ou em OPV, é o que rende. Quem tudo quer, tudo perde, mas ninguém quer saber. Cavaco Silva é primeiro-ministro absoluto e Mário Soares vê subir a popularidade nas «presidências abertas». Em Viana do Castelo, é julgado um dirigente dos GAL e suspeita-se do envolvimento dos serviços portugueses de informações militares. Os hipermercados estão a alterar os hábitos de consumo em Lisboa e Porto. Os hábitos sexuais também mudam e o preservativo está em voga. A Ciência avança: anunciase o AZT, medicamento para retardar a sida, e já são possíveis as «barrigas de aluguer». O país diverte-se com o pestanejar da Viúva Porcina (Regina Duarte) e o chocalhar das pulseiras de Sinhôzinho Malta (Lima Duarte) em Roque Santeiro. As «rádios piratas» nascem como cogumelos. Passam os êxitos do momento: Xutos & Pontapés (Circo de Feras), Madonna (Who's that girl?), Michael Jackson (Bad) e Suzanne Vega (Luka). No cinema há Platoon, O Último Imperador e O Navio. Tom Wolfe escreve A Fogueira das Vaidades.


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A humanidade sente-se em permanente ameaça: há mísseis prontos a disparar e o vírus da sida (isolado e baptizado HIV) em toda a parte. Um sentimento definido pelos Police: «Every breath you take, every move you make, i'll be watching you». Os pacifistas gritam «Nuclear não, obrigado»; no Festival de Tróia apela-se «Dêem uma oportunidade à paz»; Paul McCartney canta Pipes of peace. Portugal vive em profunda crise e as preocupações são outras. Como sempre, «É prà amanhã» (António Variações, Anjo da Guarda) e com muita Paixão (Heróis do Mar). N'O tal canal, de Herman José, há «música ró» (Tony Silva), «imensa paprika» (Cozinho para o Povo) e «o esférico rolando sobre a erva» (Estebes). Na RTP, o Pato com Laranja ficou a meio, porque a audiência telefonou. No cinema, há Tootsie (Dustin Hoffman era ela), Sean Connery de novo 007 (Nunca Mais Digas Nunca) e Sem Sombra de Pecado (Fonseca e Costa). Em livro, A Insustentável Leveza do Ser (M. Kundera) e As Cruzadas Vistas pelos Árabes (Amin Malouf); em BD chora-se a morte de Hergé, criador do Tintin e lê-se as sagas do Incal e do Tenente Blueberry (Moebius/Giraud).

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A realidade que chega pela televisão é dolorosa: corpos esqueléticos, ventres redondos e olhos cavados. As secas, cheias e guerras fazem um milhão de mortos na Etiópia e dois a três milhões em toda a África. A ocidente, o americanos dominam. Bruce Springsteen devolve-lhes o orgulho em Born in the USA e Glory Days. No «top» estão ainda Tina Turner (What's love got to do it), Prince (Purple rain), Wham (Wake me up) e Paul McCartney (We all stand together). Dança-se Breakdance e no cinema vemos Os Amigos de Alex, Os Eleitos, Os Amantes de Maria e Paris, Texas. Em Portugal, a ambição é ir ao 1, 2, 3, com prémios nunca vistos. Há também A jóia da coroa, Hermanias e Palavras ditas (Mário Viegas). Mas, como diz o prefeito de Sucupira, Odorico Paraguaçú (O Bem Amado), «deixemos os entretantos e vamos aos finalmentes». Em português correcto, lemos O Ano da Morte de Ricardo Reis (José Saramago). No Europeu de futebol, em França, brilham Chalana, Carlos Manuel e Jordão. Michel Platini é o nosso carrasco.

A História inverteu o seu curso: «A guerra fria acabou» (Margaret Thatcher) e Gorbatchov anuncia o desarmamento e faz reformas na URSS. Tem o mundo a seus pés. Só as notícias do massacre dos curdos, um povo sem nação, estragam o optimismo. Portugal vive alguns escândalos: negócios pouco claros na TDM e três comandos mortos na instrução. Pode ler-se tudo nos novos títulos da Imprensa (O Independente, Primeira Página, O Europeu, Sábado e O Século. Os esteróides anabolizantes é que tramam Ben Johnson, em Seul, que vê anulado o recorde nos 100 metros. Sem «doping», Steffi Graf é campeã no ténis. Joga-se o Trivial Pursuit, e no cinema há Atracção Fatal, A Última Tentação de Cristo, A Lei do Desejo e Quem Tramou Roger Rabbit. Música é com os Vaya con Dios (Puerto Rico), GNR (Vídeo Maria) e Xutos & Pontapés (A minha casinha, recuperada). Alf aterra na TV e no futebol a Holanda (de Gullit, Van Basten e Rijkaard) vence o Europeu. Karl Popper escreve Em Busca de Um Mundo Melhor, Stephen Hawking Breve História do Tempo e Eduardo Lourenço Nós e a Europa.

Correm ventos de mudança na «aldeia global». Uma canção, We are the world, e uma palavra, «perestroika», assumem dimensão planetária. A CEE, prometese, vai mudar Portugal. O país já deu muitas voltas e agora dá mais uma, pela Figueira da Foz, com Cavaco Silva ao volante do seu Citroën, rumo ao congresso do PSD. Sai dirigindo o partido. Espantosas são as obras do arquitecto Tomás Taveira, baptizadas de «taveiradas», e a mesquita de Lisboa. Já temos Multibanco e código de barras, mas há quem não esteja para modernices, como os católicos liderados por Krus Abecasis, contra o Je Vous Salue Marie (Jean-Luc Godard). Maior consenso têm Amadeus, Regresso ao Futuro, O Exterminador Implacável, Rambo, Silverado e Le Soulier de Satin (Manoel de Oliveira). Ouve-se The Boss (Springsteen), Dire Straits (Brothers in arms e Money for nothing) e Simple Minds (Alive and kicking). Desculpem qualquer coisinha (Paulo de Carvalho), pois vamos às Dunas (GNR). Um golo milagroso de Carlos Manuel à Alemanha apura a selecção para o Mundial. No xadrez, Kasparov é campeão, contra Karpov.

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Um objecto construído pelo Homem, a Voyager II, ultrapassa Neptuno. Na Terra, um vendaval varre o Leste. Há eleições na Namíbia e Paris comemora 200 anos de Revolução, à grande e à francesa. Cavaco Silva diz que não lê jornais, mas vai à RTP ler uma mensagem, por causa dos boatos que surgem com a cassete de Taveira, reproduzidas na revista espanhola «Interviú». Marcelo Rebelo de Sousa mergulha no Tejo, mas é nas eleições de Lisboa que vai ao fundo. A festa do Pontal é um «must» político, com Cavaco a denunciar «um acordo secreto» PS-PCP. Dias Loureiro jura que nunca disse «Pai, sou ministro!», mas toda a gente pensa que sim. Noutros palcos, Rita Ribeiro faz What Happenned to Madalena Iglésias? Um cartaz, com um bebé branco a mamar ao colo de uma negra, mostra as cores unidas da Benetton. Dança-se a Lambada e no cinema vemos Os Acusados, Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos, Batman e Ligações Perigosas. García Márquez edita O General no Seu Labirinto e Torrente Ballester Crónica do Rei Pasmado. Em BD, há As Falanges da Ordem Negra de Enki-Bilal.

ANOS 80 VISTOS PELO JORNAL EXPRESSO

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OS PRIMEIROS PASSOS

O NOVO PORTUG Com o 25 de Abril, estoiraram nas rádios, infinitas vezes, todas as músicas que ao longo de décadas de ditadura haviam sido proibidas, retiradas do grande público, apenas ouvidas em tertúlias secretas e na clandestinidade. Os cantores de intervenção passaram das secretas actividades à exposição total, e passeavam-se então pelo país, expunham a sua música, na maioria das vezes em termos gratuitos. As canções, e o género de intervenção, estavam mais fortes do que nunca e com uma divulgação sem precedentes. Por toda a parte, só essas canções eram ouvidas, numa sede de combater a falta que haviam feito ao país, e ao seu povo, durante tanto tempo. Como representação social de uma realidade que agora estava vencida, e como tal devia ser celebrada. As emissões radiofónicas por elas eram dominadas, assim como as notícias; os sonhos de futuro eram representados por aquelas palavras outrora proibidas. Muito pouco se fazia além das canções de intervenção, das baladas de revolta, e o pouco que se fazia não encontrava possibilidade de divulgação, nem espaço de audição.

Com alguma insistência iam surgindo, no entanto, alguns projectos, mas o rock era quase inexistente... até que se começou a ouvir falar dos Tantra, uma banda que ia beber as suas principais influências a bandas como os Genesis, a um rock sinfónico e encenado, e que conseguiu, apesar de tudo, encher o Coliseu, numa altura em que tudo faltava -- até o público, pouco habituado a ritmos eléctricos e a este tipo de propostas. Mas, como Zé Pedro, guitarrista dos Xutos e Pontapés, recorda, havia outras bandas precedentes, que foram abrindo alas ao que se iria passar de seguida. «Comecei a ver concertos quando os circuitos que havia eram dos convívios de liceu, em que havia uma série de bandas a tocar covers, e que começavam a apresentar alguns originais. Nessa fase, e falamos do início dos anos 70, as maiores referências eram os Objectivo, uma banda que reunia uma série de gente conhecida, desde o Guilherme Inês ao Zé Nabo; havia os Chinchilas, a banda do Filipe Mendes... O concerto dos Genesis, em Cascais, em 74, foi um marco bastante importante para o pessoal. Apareceram, ou estavam já envolvidas, uma série de bandas que estavam a beber dessa onda musical do rock progressivo, com os Beatnicks, com a Lena d'Água e o Tó Leal a cantar; também os Ananga-Ranga tinham uma certa importância. Até que surgiram os Tantra, a primeira banda a aparecer com uma verdadeira postura de banda. Eles tinham um PA próprio...

tinham um espectáculo cénico grande, dentro da dimensão do meio musical da altura. Eles usavam máscaras, faziam um jogo teatral muito curioso. Os álbuns deles eram conceptuais, do início ao fim, o que naquela altura era moda. Os Tantra cantavam em português e têm um álbum que se chama «Mistério e Maravilhas». Também havia os Perspectiva, uma banda da margem sul. Do norte, surgiram os Arte & Ofício, liderados pelo Sérgio Castro, e havia ainda uma outra que eram os Psico, que também eram uma banda de fusão».

Apesar das muitas bandas, a escassez era total: não havia meios técnicos, não havia instrumentos, nem grandes possibilidades de gravação, de promoção do trabalho efectuado. Mas a mesma juventude que tinha despontado para a vida com o 25 de Abril estava a despontar também para a música, para uma cultura jovem que não existia em Portugal. E com a mesma vontade de vencer um regime fascista, alguns desses jovens tomaram nas suas mãos a responsabilidade de rejeitar mais um sistema instituído: o de que, em Portugal, só havia espaço para as canções de intervenção. Com o relativo sucesso dos Tantra, outros jovens houve que se sentiram ansiosos por encontrar o seu lugar musical, numa altura em que ser músico significava um olhar de lado, uma incompreensão da própria actividade, e implicava também a necessidade de busca de outro meio de subsistência, já que ser músico em Portugal, na época, significava nenhum dinheiro ganho. Apenas um sonho vivido. Com a chegada da democracia, o ímpeto de viver tudo de uma vez tornou-se ainda maior. Os partidos políticos aumentaram, assim como o debate de ideias, que punha os


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O ROCK GUÊS jovens em constante confronto intelectual, nos ginásios dos liceus, rapidamente transformados em espaço de albergue de concertos. A música estrangeira era devorada com enorme sofreguidão, e aos poucos foram pululando as bandas nacionais. Porventura, uma das mais importantes da época terão sido os Faíscas, estreados em 1978, no Pavilhão do Restelo, e apresentados como o primeiro grupo punk português. «Lembro-me que, em 78, pouco tempo depois de ter chegado do InterRail, houve um concerto no Pavilhão do Restelo, em Outubro ou Novembro, que reunia os Arte & Ofício, os Psico, e onde aparecia uma banda nova que eram os Faíscas. Eram uma banda punk, daí eu ter ido assistir ao concerto e ter-me tornado amigo deles, e ter andado com eles durante o tempo em que a banda existiu. Acabaram por nunca gravar nada. Os Faíscas terão sido a banda mais punk da altura», recorda Zé Pedro. O grupo reunia Paulo Gonçalves, Pedro Ayres Magalhães e Emanuel Ramalho. A indumentária era a requerida, baseada nos blusões de cabedal, e a música, a esperada, com temas muito rápidos. «Faíscas era a melhor banda do seu tempo. Era uma banda adequada a essa altura, a um mundo peregrino, quando não havia amplificadores, não havia guitarras, não havia nada, só havia conjuntos de baile e cantores de intervenção -- e queríamos fazer uma banda eléctrica, que fizesse música a que não chamávamos de rock. Aliás, durante todos esses anos do rock português, em todas as entrevistas que demos, e nos concertos, eram os jornalistas a chamarem-nos de rock e nós a dizermos que não éramos rock, mas que fazíamos música moderna portuguesa, eléctrica, mas que não era rock. E nem éramos a juventude operária ou industrial que deixava os postos de

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trabalho para falar das suas condições de vida. Todos vínhamos de uma burguesia média alta, fazíamos aquilo com intenções artísticas e intelectuais. E essa aproximação que tínhamos à música era diferente da que o rock exigia. Na sua altura, os Faíscas já eram contra o explicar toda a música eléctrica como sendo rock, porque achávamos que isso só ia afastar os portugueses de se relacionarem com uma música eléctrica cantada em português. Por outro lado, o que queríamos, sim, era fazer concertos, criar ocasiões de convívio, criar um repertório em português, fazer comentários sociais, criar um sistema de convívio alternativo ao sistema bem-comportado que havia na altura. E acho que o fomos fazendo, nessa altura. Lá montávamos os concertos, fazíamos os cartazes, acartávamos com os instrumentos, como fizeram todas as bandas da nossa idade. E reunimos à nossa volta uma enorme vontade de fazer música», afirma Pedro Ayres Magalhães. Dispostos a marcar a diferença, os Faíscas começaram a organizar concertos, criando a tradição das matinés de sábado, nos Alunos de Apolo -- onde terão inspirado o nascimento de outras bandas, como os Xutos & Pontapés, os Aqui D'El Rock, os UHF. Queriam que a sua importância fosse notada e instituíam as suas próprias acções de divulgação, já que não conseguiam entrar nos programas de rádio, nem nos jornais, e não havia música na televisão. Faziam uma fanzine chamada apenas «Faíscas», que distribuíam durante os concertos, com uma grande irregularidade e pouca informação. A desatenção geral em relação ao que se passava com um novo género de música portuguesa era de tal ordem que não há registos fotográficos dos concertos dados,

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OS PRIMEIROS PASSOS (...)

não há registos audio dos seus temas, com excepção de uma gravação efectuada por António Sérgio, para o seu programa de rádio, registo a que os músicos perderam o rasto. «Os Faíscas gravaram só uma vez para o programa «Rotação» do António Sérgio. Aliás, ele deve ser a única pessoa a ter essa gravação. Na altura não era uma coisa que nos preocupasse. Claro que gravámos umas fitas, mas ficaram em casa de não sei quem, e acabaram por se perder. Mas o António Sérgio fez uma gravação de um concerto que demos num clube em Lisboa, onde tocávamos muitas vezes», continua Pedro Ayres. Perante a desatenção da industria discográfica face às novas expectativas do mercado, iam surgindo discos piratas, numa ânsia de divulgar o que mais ninguém divulgava, e de ver satisfeita uma curiosidade de um novo público, que emergia ao mesmo tempo que as novas bandas. Os concertos, que rapidamente começaram a nascer nas caves de qualquer bar nas duas cidades maiores do país, eram divulgados de boca em boca, ou com pequenos panfletos, sabiamente colados às portas dos liceus. «Nessa altura, as pessoas nem sequer sabiam tocar mas acabaram por se associar ao nosso entusiasmo, que se demarcava e definia por oposição às bandas que existiam na altura, que tinham nascido nas gerações anteriores, e que eram apenas ou os tais conjuntos de baile ou os cantores de intervenção, ou as bandas de rock sinfónico que cantavam em inglês como os Psico ou os Arte & Ofício, ou os Tantra, que partiam dos ídolos da música rock e que faziam uma linguagem musical que se assemelhasse à realidade inglesa. E começámos precisamente por ir contra essa corrente. Mas tivemos sempre muitas dificuldades em fazer valer essa filosofia. E nessa altura era um entusiasmo muito pioneiro, difícil de explicar, e muito contra o espírito de Lisboa, que ou era queque, com o comportado social com os cafés e as praias e os carros; ou era a parte dos cantores de intervenção. Sempre fomos olhados de lado, mas isso ainda hoje somos, ainda hoje é difícil sermos olhados com dignidade, é um estatuto difícil de explicar às pessoas, a dignidade que a nossa actividade tem, as pessoas não lhe conferem dignidade, e na altura nem sequer sabiam o que era a nossa actividade», conta Pedro Ayres. Com a intensidade da vontade de fazer música, instaurada pelos Faíscas, as iniciativas de concertos aumentavam. Novas salas surgem, como os Alunos d'Apolo. «Em Janeiro de 1979, decide-se fazer nos Alunos d'Apolo um concerto comemorativo dos vinte cinco anos do rock'n roll. É aí que os Xutos se apresentam pela primeira vez, e os Faíscas, pela última. Tenho a impressão que havia mais uma

ou duas bandas por lá, mas nem me lembro quem eram. Aparecemos a actuar por eu ser muito amigo dos Faíscas, e eles ensaiarem na minha garagem... O Pedro andava sempre a picar-me para eu fazer uma banda. E foi assim que as coisas começaram», recorda Zé Pedro. Com o final dos Faíscas, alguns dos membros da banda decidem não desistir do sonho que os havia unido. «Houve umas discussões internas nos Faíscas, e acabámos por decidir parar com o grupo. Foi assim que apareceu o Corpo Diplomático, que era um grupo diferente. Nesse já estava com o Carlos Maria Trindade, e queríamos ainda fazer algo diferente. Fizemos audições para cantores (um dos que foi prestar prova foi o António Variações) e o Corpo Diplomático já era um grupo, entre 78 e 80, diferente. Já gravou, para uma editora que era do António Sérgio, a "Nova", e esse grupo teve a mesma vida que os Faíscas. Fez alguns concertos, em Lisboa e pela província, organizados por nós ou inseridos em festas populares. O Corpo Diplomático gravou um disco muito giro, do qual ainda hoje gosto muito. Gravámos em três dias, e fizemos as primeiras partes dos Tubes, em Cascais... Era um espírito muito pioneiro. Claro que o disco que gravámos só passava no programa do António Sérgio...», ironiza o baixista. Mas com o nascimento de muitas bandas, as editoras acabaram por ver nestes grupos a possibilidade de uma nova descoberta, de um elemento nunca antes pensado: o rock português. A esmagadora maioria das bandas durava pouco tempo -- os Faíscas, por exemplo, tiveram apenas um ano e meio de existência -- mas rapidamente os seus músicos se organizavam novamente, com outros colegas de profissão. O Corpo Diplomático -- Pedro Ayres, Paulo Gonçalves, mas também com Carlos Maria Trindade -- editou apenas um álbum, intitulado «Música Moderna», editado em 1980. E à excepção do programa de rádio de António Sérgio, o álbum «Música Moderna» não passou em mais lado nenhum, já que as rádios limitavam-se às canções de intervenção, ainda, e começava a descobrir-se a música brasileira, com José Nuno Martins, no programa «Os Cantores de Rádio». Os Corpo Diplomático, apesar da sensação causada através dos seus concertos, acabaram por definhar e pôr um termo à sua actividade -- aliás, o que viria também a acontecer à Nova. Mas nem tudo ia mal. Aos poucos, vão surgindo outros programas, outras pessoas interessadas. Segundo Zé Pedro, «para todos os efeitos, o Rock em Stock deu bastante atenção a bandas, conseguiu mostrar algumas bandas nacionais, e misturá-las com as estrangeiras, o que foi bastante importante. Também havia um programa do Rui Pego, na Rádio Renascença, que era


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só de música nacional, que tinha um top e tudo, e que era um programa que se ouvia muito -- mesmo em viagem, ouvíamos sempre. Portanto, a nível de rádio, até se gahou alguma projecção. Já na televisão, lembro-me apenas que havia o «Vivámúsica», que dava as notícias, e pouco mais». De banda em banda, com tantas a aparecerem, com o investimento das editoras em algumas delas, com o sucesso alcançado com o álbum «Ar de Rock», de Rui Veloso, todo este movimento começou a ser intitulado de «boom» do rock português -- uma expressão tudo menos consensual. Para Zé Pedro, essa ideia de «boom» é verdadeira porque «acho que até aí não havia, ou pelo menos não se estava a ligar muito, ao facto de estarem a aparecer bandas . Fazia-se rock e punk, mas não se ligava muito. Nem às novas tendências, como os Police. O Rui Veloso, por exemplo, no «Ar de Rock» tem muitas pinceladas de Police. E depois do «Ar de Rock» houve uma enxurrada de bandas e um despertar bastante curioso do público, interessado em ouvir rock cantado em português, e apareceram as bandas todas -- até as bandas de baile apareceram a cantar originais. Acho que isso só se pode chamar "boom" do rock português, porque foi a primeira vez que se começou a vender rock português; foi a primeira vez que as bandas começaram a andar na estrada, e havia concertos». Já Pedro Ayres Magalhães considera impossível concordar com essa ideia «porque me envolve a mim também quando acho que não era isso que eu estava a fazer. O Rui Veloso fazia rock cantado em português; fazia blues,

com as mesmas notas, as mesmas malhas, cantado com letras em português; os UHF faziam o típico rock português, com as guitarras eléctricas e a bateria, mais as letras de intervenção. Mas nós [Heróis do Mar] não; fazíamos aquilo que achávamos ser uma música eléctrica, portuguesa, que também era música de dança, coisa que os outros grupos não andavam a cultivar, mas queríamos que o público sentisse isso. Aliás, já desde o tempo dos Faíscas que o nosso repertório era mais virado para a dança. Apesar de no caso dos Faíscas ser uma coisa mais inspirada no rock'n roll e o Corpo Diplomático ser mais virado para um rock new wave». Com ou sem «boom», a verdade é que o final da década de 70 e o início dos anos 80 marcaram uma verdadeira revolução no universo musical português. Marcou também o início de uma batalha, ainda com muitos capítulos por escrever. As condições de trabalho eram más, os instrumentos e restante equipamento quase inexistentes. Como em qualquer outra revolução, o sonho era o único sustento. E a única inspiração. «O que é preciso deixar claro é que quem sempre gozou o prato fomos nós. Não lamento coisa nenhuma porque fui fazendo as coisas com muito entusiasmo, e com muito espírito de intervenção. E não há duvida nenhuma que eu, e os meus companheiros músicos, e as pessoas que se dedicavam à música e compreendiam o que estávamos a fazer, na altura, todos nos divertimos à grande», afirma Pedro Ayres. Com mais ou menos história, houve bandas que se mantiveram. Outras houve das quais só irão restar memórias. ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL BLITZ EM 05.09.2000


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AR DE ROCK Um breve retrato do momento intenso que transformou a cena musical portuguesa entre 1980 e 81. Em finais de 70 vivia-se a ressaca do 25 de Abril. Do canto livre, da redescoberta das raízes e de tudo o que a revolução movimentou num circuito antes dominado pela canção ligeira, o fado e o folclore feito para inglês ver. Pop? Rock? Era brincadeira para rapazes em tempo de liceu, que a chamada para incorporação na tropa e consequente embarque para África deixava esquecida para trás, como uma entre tantas outras recordações dos dias despreocupados antes do terror no capim. Não havia carreira que sobrevivesse ao regresso de músicos/soldados. E só na fuga para França ou outras paragens, a continuidade era possível. Mas nunca em domínios pop/rock. De facto, "todas as experiências anteriores tinham sido inconsequentes, sobretudo por causa da guerra colonial", defende António Manuel Ribeiro, dos UHF, numa ideia partilhada por Ricardo Camacho, que mais tarde formaria a Sétima Legião. 1980. À idade de fazer música, fumar uns cigarros e dar valentes escapadelas nocturnas chegava uma geração que passara demasiado jovem ao lado da revolução. Sem necessidade, portanto, de traduzir nas suas conversas e canções a carga política de quem viveu 74 e 75 a pulmão cheio. Sem dívidas a saldar com um passado que estava já longe ou lhes era alheio. Porque, como recorda Tozé Brito, que em 1980 era A&R nacional da PolyGram, depois da revolução "quem não estivesse na área da canção política não tinha para onde ir". Em Julho desse ano, sem par na história, um disco catalizava entusiasmos. "Ar de Rock", apresentando o estreante Rui Veloso, acompanhado por uma desconhecida Banda Sonora, com uma canção que marcou a história: "Chico Fininho". E, de repente, tudo mudou. "Não quero carregar os louros sozinho", diz Rui Veloso, que aponta nas importantes contribuições de Francisco Vasconcelos (então A&R nacional da Valentim de Carvalho), em David Ferreira (na altura a trabalhar na promoção da mesma editora), António Pinho (produtor do álbum "Ar de Rock") e Carlos Tê (o letrista). O que aconteceu em 1980 foi, a seu ver, "uma sucessão de eventos que conduziram a uma feliz conclusão". E justifica na aposta de Francisco Vasconcelos em editar rock cantado em português um dos trunfos maiores da explosão que então se viveu.


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"Foi um período de intensa militância", recorda David Ferreira, que defende a tese da confluência geracional entre quem fazia música, quem a editava e ouvia. "Eu tinha 26 anos, e o Chico (Francisco vasconcelos) tinha 24", e isso é determinante". António Manuel Ribeiro acrescenta que o facto de haver personagens com a mesma idade neste universo "facilitava a comunicação" e aponta que tanto David Ferreira como Francisco Vasconcelos "tinham o bichinho da música" e que em todo o processo a figura de Tozé Brito "é também importante". Ricardo Camacho faz, por seu lado, questão lembrar que, na altura, os UHF fizeram, pela primeira vez, uma canção pop em português: "uma canção simples com três minutos, mais nada"! "Tudo aconteceu na hora certa. O Rui Veloso tinha um álbum preparado em inglês e estava a passá-lo para português quando nós batemos à porta da editora", recorda António Manuel Ribeiro, dos UHF que acrescenta outro dado importante numa tentativa de explicar o momento de "boom" que o então chamado "rock português" viveu há 20 anos: "houve uma greve de músicos, e o próprio Festival da Canção nem teve acompanhamento", recorda. "Artistas como um Paulo de Carvalho ou um Carlos Mendes não conseguiam gravar. Houve então uma abertura de espaço porque nem as editoras nem os estúdios podiam estar parados. Como havia propostas interessantes e nem nós nem o Rui éramos sindicalizados, avançámos. E a Valentim de Carvalho teve muito mérito em todo este processo, já que a PolyGram esperou um ano para ir procurar os Taxi", relata. A adesão da rádio, imprensa e televisão foi igualmente determinante para a sustentação do fenómeno emergente.

Em finais de 70 as movimentações nas caves dos acontecimentos com direito a rádio e televisão tinham-se intensificado. Os Tantra enchiam o Coliseu dos Recreios em 1977, no mesmo ano em que os Arte & Ofício faziam a primeira parte dos Can num Pavilhão dos Desportos à pinha. Alimentado a ideias divulgadas por António Sérgio nas noites da Renascença, o movimento "punk" português surgia discreto com direito a registo em disco num single dos Aqui d'El Rock. Os Xutos nasciam sem pressa. Os Faíscas terminavam uma curta existência, das suas cinzas emergir o núcleo do Corpo Diplomático. Este grupo, no qual militavam Pedro Ayres Magalhães, Paulo Pedro Gonçalves e Carlos Maria Trindade, é o responsável pela introdução no vocabulário pop/rock português do conceito "música moderna", de resto título do álbum de estreia (e único na carreira da banda) editado em 1979 e com morte ditada pela recusa de Luís Filipe Barros, o "Berros", como então lhe chamavam, em passar o álbum no "Rock em Stock" na Rádio Comercial. "Ainda passei uma faixa ou outra, mas assim que me mostraram o disco disse que não se ouvia nada", recorda hoje Luís Filipe Barros. E acrescenta: "Quando os conheci, num cocktail de apresentação da Stiff, achei-os muito cheios de peneiras". António

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(...) Sérgio, produtor do álbum do Corpo Diplomático, recorda também essa festa de lançamento da Stiff, onde o grupo actuou, como um momento desastroso. "O vocalista perdeu a cabeça e, no meio das piruetas, desligou os instrumentos todos... Os outros ficaram furiosos". Sobre o "não" do "Berros", António Sérgio reconhece o peso que essa decisão teve na carreira do grupo: "O Rock em Stock era quem levava os discos a um mercado maior". Em 1979, ano do "caso" Corpo Diplomático, já os UHF corriam o país. Já Rui Veloso entrara em contacto com a Valentim de Carvalho. Já os Taxi surgiam, da morte dos Pesquisa. Já os Xutos tocavam ao vivo (com primeiro e histórico concerto nos Alunos de Apolo a 13 de Janeiro). Já Vítor Rua, Alexandre Soares e Tóli César Machado ensaiavam, num núcleo do qual um ano depois nasceriam os GNR. Os seis primeiros meses de 1980 poucas novidades acrescentam a este cenário ainda feito de penumbras e sussurros. Os Street Kids formam-se em Cascais. No Porto nascem os Trabalhadores do Comércio. Em Lisboa surge a Salada de Frutas. Em grande forma, os UHF (de Almada) correm os palcos do país. Com um single editado em 1979 pela pequena independente Metro-Som ("O Jorge Morreu"), com primeiras partes em concertos dos Dr. Feelgood, Ramones e Elvis Costello, com muitos mais espectáculos em nome individual por todo o lado durante todo o Verão, solidificavam as bases. Chamavam atenção para o nome. E preparavam-se para o salto de divisão, ao assinar pela Valentim de Carvalho. Tudo parecia apontar para que, nos UHF, surgisse o primeiro caso de sucesso de um grupo de rock cantado em português. Inesperadamente, do Porto, chegou uma surpresa. Com carreira inicialmente pensada para seguir um rumo em inglês, Rui Veloso e, sobretudo, Carlos Tê, foram desafiados pela mesma editora a fazer um disco em português. Opção que se viria a mostrar fundamental na génese de todo o fenómeno. "O Tê escreveu em português muito relutantemente, e eu musiquei aquilo que nunca tinha feito", lembra o então jovem estreante que deixa claro que o fenómeno que aconteceu no Verão de 1980 "não foi uma coisa pré-concebida nem planeada". Com "um timing certo" para a equipa que trabalhou o disco e conquistou um lugar na primeira divisão das atenções. Rui Veloso conclui: "dá-me um certo gozo termos sido os primeiros a gravar na mesa de 24 pistas no estúdio RPE", num trabalho fulminante de 70 horas nas quais foram feitas gravações e misturas... António Sérgio, já rodado na música quando Rui Veloso edita "Ar de Rock" não escondeu a surpresa com que, também do lado de quem divulga, o álbum foi recebido. "Há uma franca genialidade naquele álbum de estreia", explica, compreendendo na força do disco um dos motores do fenómeno que desencadeou.

David Ferreira, na altura responsável pela promoção da Valentim de Carvalho, recorda a carreira fulminante de Rui Veloso: "ele explode ao ponto de ser convidado para fazer a primeira parte dos Police antes do Natal". Pouco depois da edição bem sucedida do álbum de estreia de Rui Veloso, o segundo single dos UHF, "Cavalos de Corrida", sublinha e reforça o momento de franca adesão do público jovem português ao rock cantado na sua língua. E ultrapassa em larga expressão os resultados do single "O Jorge Morreu", editando no ano anterior. "Não havia estrutura de promoção na Metro-Som", recorda António Manuel Ribeiro que, com os colegas, fez em mão própria a distribuição do single na rádio. "Olhavam para nós como bichos, mas esse desbravar de terreno foi importante", lembra. Em 1980 entregam pela segunda vez uma maqueta à Valentim de Carvalho na qual estava já a canção "Cavalos de Corrida" que, recorda António Manuel Ribeiro, "era precisamente a mesma maquete que tínhamos entregue em 1979". Com outra predisposição para gravar e lançar rock cantado em português, o mercado recebe com entusiasmo a música dos UHF e de grupos que, entretanto, começam a brotar do anonimato. "Havia uma lacuna de música nova, e as pessoas estavam à espera de uma coisa nova. Que apareceu". Aos "Cavalos de Corrida" o grupo faz suceder "Rua do Carmo" e "À Flor da Pele", álbum de estreia no qual o grupo vê reconhecido o estatuto de popularidade entretanto conquistado. "Mas o sucesso correu mais depressa que nós", explica o homem do leme dos UHF. "Tivémos de montar uma empresa de som. Não havia técnicos nem managers, pelo que tivémos de trabalhar rapidamente. E aprendemos muito nos bastidores das primeiras partes das bandas estrangeiras com que tínhamos tocado no ano anterior". Já com quase dois anos de vida, os Xutos & Pontapés continuam sem gravar, e o sucesso entretanto conquistado por Rui Veloso e pelos UHF não os incomoda. "Éramos uma banda mais punk e não procurávamos ainda editora", explica Zé Pedro. "Acima de tudo estávamos empenhados em andar para a frente e verificámos que surgia uma predisposição para ouvir coisas novas, em português". Os Xutos só se estreariam em finais de 81, com "Sémen", editado pela Rotação. "Eles souberam esperar", vinca António Sérgio. "Mesmo mais tarde, quando o álbum saíu, em 1982, não tocou na rádio, que pôs uma pedra em cima dos Xutos". E o grupo insistiu no palco. E sobreviveu. Entre os finais de 1980 e a Primavera de 1981 surgem no mercado os singles de estreia dos Salada de Frutas, dos Trabalhadores do Comércio, dos Street Kids, dos GNR. Todos com considerável êxito. O fenómeno seguinte chegaria em Maio, com o álbum de apresentação dos Taxi, quarteto


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portuense nascido dos Pesquisa e que, tal como Rui Veloso, são desafiados pela respectiva editora (a PolyGram) a fazer canções em português. "Lembro-me de ter ido ao Colégio Alemão, no Porto, ouvir os Taxi", recorda Tozé Brito. "Cantavam originais, mas em inglês. Achei-os muito bons e propus-lhes gravar imediatamente, mas em português. Foi a única condição. E, em vez de lhes propôr um single, que era a regra, falei-lhes num álbum. O João acabou por se revelar um dos letristas mais inspirados daquela geração". Rui Taborda, baixista do grupo, frisa que "a princípio a ideia dos Taxi não era a de fazer carreira em Portugal", estando decididos a ir de malas e bagagens para fora, o que acabou por não se concretizar. "Não havia referências rock em português a não ser o Rui Veloso e, depois decidimos ficar por cá". Sem acreditar em razões maiores para a justificação do momento que Portugal viveu, Rui Taborda refere, mesmo assim, que "havia entre nós a redescoberta de um certo orgulho em nós mesmos" e que, entre outras coisas, "passámos a ouvir rock feito em português". Sobre a carreira de sucesso de "Chiclete", confessa não o ter surpreendido que a canção tivesse sido um êxito: "Só não esperava aquela amplitude, pelo que nem queríamos acreditar. Não era habitual haver vendas naquela ordem entre nós". Convém aqui recordar que "Taxi" foi o primeiro disco de ouro do rock português, com vendas acima dos 35 mil exemplares, feito que o "Ar de Rock" de Rui Veloso, apesar de editado antes, só mais tarde conseguiu atingir. "Tudo vendia naquela altura", defende Tozé Brito. E, colocado o cenário de sucesso, assinaturas, apostas e edições multiplicaram-se. Surgiram grupos novos todas a semanas. Uns a Leste do alvo. Outros com sucesso pontual, como os Iodo, CTT ou o bizarro Grupo de Baile e o inesquecível "Patchouly", um dos casos do ano de 1981. A vida deste single está associada à primeira grande manobra de "marketing" do rock português: a questão dos "piis", com os quais a Valentim de Carvalho tapava a palavra "pentelho" numa versão "censurada" da canção, colocada no mercado e nas rádios em simultâneo com o original. "O Chico mostra o disco, e pensamos `e agora?", relata David Ferreira. "O Chico Fininho tinha já sido censurado numa estação de rádio por causa da `merda na algibeira, e pentelho é mais explícito", justifica, apresentando assim os motivos que o levaram a inventar as duas versões, com e sem "pii". Sendo que a não censurada vendeu muito mais (quase 100 mil) que a versão pudica... "Os piis, além de nos contornarem o problema, funcionavam um pouco como aquelas tiras pretas com que se tapava, na imprensa da altura, fotos mais pornográficas. E, em vez de escondermos, estávamos a chamar a atenção, num exemplo de como se podia usar a censura em nosso favor", explica, referindo ainda que o grupo, descoberto por Ricardo Cama-

cho, "era mesmo um grupo de baile do Seixal, e a imagem foi por nós fabricada com precedentes nos Blood Sweat & Tears". A vida do Grupo de Baile foi curta, já que a editora não editou aquela que deveria ser a canção sucessora de "Patchouly", e que teria por título "O Pirilau do Rock". "Não tinha graça nehuma", defende David Ferreira. Entretanto, dado o excesso de propostas e edições, a ressaca começa a desenhar-se. "As rádios, que antes rodavam tudo o que tivesse o rótulo `rock português, deixam de passar os discos e começam a fazer uma triagem", conta António Manuel Ribeiro. "É o primeiro revés, já que aparecem muitos discos pelos quais a rádio não se interessa. E há concertos que são uma fraude". Depois de um 1981 de euforia, com o "Robot" da Salada de Frutas, "Foram Cardos Foram Prosas" de Manuela Moura Guedes, "Chamem a Pulissia" dos Trabalhadores do Comércio e os dois primeiros singles dos GNR ("Portugal na CEE" e "Sê Um GNR") a vender bem, a ressaca mostrou-se implacável. "1982 foi o ano dos flops", recorda David Ferreira: "O segundo do Rui Veloso quase não vendeu, assim como o primeiro álbum dos GNR, o álbum da Lena d'Água e o JTX, que na altura surgiu. A única excepção foi o máxi do António Variações". "Viveu-se um fenómeno semelhante ao que hoje temos nas boy bands. Tudo grava e o mercado não comporta a oferta. Qualquer tipo inventava um grupo rock, chegava a uma editora e gravava", lembra António Manuel Ribeiro. A ressaca decretaria vítimas em nomes como os Street Kids, os Taxi ou os Jáfumega. Sobre estes últimos, que Tozé Brito lembra como um grupo "genial", a voragem louca, não foi meiga. "O que não vendia ficava para trás e eles, que estavam mais avançados e não entregues a esquemas comerciais, pagaram. Enquanto os Taxi vendem 50 mil e os Heróis do Mar, com o `Amor disparam para esses números, eles ficavam pelos quatro ou cinco mil... E na altura até dez mil discos não interessava. E isto matou muitos outros projectos. O que não impede que aí tenha havido algumas escolas incríveis". Com Rui Veloso, o primeiro "motor" do fenómeno a cantar "não quero ser estrela do rock'n'roll", a apresentar um álbum de título "Fora de Moda", o capítulo encerrava. Para dar entrada a duas novas gerações. A geração pop de meados de 80, com figuras como António Variações, Heróis do Mar, Rádio Macau, Ban e os sobreviventes e transformados GNR na proa dos acontecimentos. E uma geração urbana atenta a raízes antigas, comandada pelos Trovante, acompanhados por uma legião de bandas de recolha das quais poucas sobreviveram aos respectivos 15 minutos de fama. ARTIGO PUBLICADO NO DN MAIS, TEXTO DE NUNO GALOPIM


NO IN «OLHAVA-SE PARA TUDO COM UM HORIZONTE CURTO: O DO SUCESSO IMEDIATO, O DAS VENDAS RETUMBANTES, O DE “CHEGAR, VER E VENCER” NOS TOPS NACIONAIS, O DOS DISCOS DE OURO CONQUISTADOS EM 30 A 60 DIAS.»

“O filão de ouro foi descoberto com "Ar de Rock" de Rui Veloso, editado em princípios de 1980. De repente, o rock'n'roll falava de figuras às quais os portugueses eram familiares. Aqui e além viam-se "chico fininhos" a subir as ruas de muitas cidades do país, de um momento para o outro dava-se conta de inúmeras "rapariguinhas do shopping" a deambular pelos corredores dos grandes espaços comerciais portugueses. O rock começava a falar de nós, das nossas coisas, das pessoas com que nos cruzávamos todos os dias. José Nogueira, o ex-saxofonista dos Já Fumega, encontra aqui uma das primeiras razões do "boom" do rock português. "Foi absolutamente inevitável. Estava a começar-se a falar dos sítios onde todos vamos, onde pelo menos já fomos uma vez, das pessoas que conhecemos ou que já vimos", explica. (...) “ ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA PÚBLICA - 14.11.1999 TEXTO DE DULCE FURTADO


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«GINGANDO PELA RUA AO SOM DO LOU REED SEMPRE NA SUA SEMPRE CHEIO DE SPEED SEGUE O SEU CAMINHO COM A MERDA NA ALGIBEIRA O CHICO FININHO, FREAK DA CANTAREIRA ...» A letra de Carlos Tê, interpretada por um tal Rui Veloso, começava a passar nas rádios nacionais e a entrar no imaginário de todos os portugueses. Estava-se no ano de 1980, num país ainda a viver um pouco o rescaldo da «Revolução dos Cravos». "Ar de Rock", aquele que é considerado por muitos como o primeiro álbum de rock português, tinha acabado de ser lançado, marcando o arranque da carreira de um pequeno grupo de jovens portuenses, amantes de blues e de rock'n'roll, liderados por Rui Manuel Gaudêncio Veloso. (...)

cas em português, porque todo o ambiente envolvente teria sido outro. Mas, por cá, o meio musical era de uma pobreza confrangedora», vai contando Rui. «Nós começámos a fazer coisas em 76, logo a seguir ao 25 de Abril. Na altura ainda não havia nada, a não ser a canção revolucionária, em contraponto o fado - que era uma coisa conotada com o regime anterior - e depois o Festival da Canção. Não existia nenhum circuito de espectáculos, e os grupos de então acabavam sempre a tocar em bailes de finalistas e em liceus.»

Rui e Tê conheceram-se através de um amigo comum, que os apresentou, nos tempos em que se costumavam reunir em casa de uns e de outros para ouvir música. «Eram pequenas tribos que se formavam em torno da música», esclarece Tê. As letras que escrevia começaram a ser aproveitadas por Rui para as suas músicas, conforme este último afirma: «Juntámo-nos fazendo músicas à base dos blues, que era um género fácil para improvisar. Aquilo tinha por base apenas uns três acordes de guitarra. Ouvíamos muitas outras coisas, como King Crimson, Gentle Giant, mas essas já não davam para improvisar.»

Quanto às influências que vinham de fora, sempre estiveram ambos claramente mais perto das bandas anglosaxónicas, em detrimento de outros ventos que então se faziam sentir. «Na altura, havia aquela moda da música francesa revolucionária, mas nem eu nem o Tê estávamos para aí virados. Nós sempre detestámos a música francesa», diz Rui. «Era o predomínio do texto sobre o ritmo, sobre a harmonia», explica Tê. «A música servia de mero suporte para os textos poéticos», complementa Rui, citando nomes como Léo Ferré e Jacques Brel, «eram grandes testamentos, e eu sempre gostei mais do oposto, de quando o texto serve de suporte à música.»

Criar músicas em português era algo que nem lhes passava pela cabeça, até porque as suas referências musicais estavam bem longe daqui. «Desconfio que, se tivéssemos nascido no Brasil, teríamos começado logo por fazer músi-

Carlos Tê nem sequer dominava o francês e achava que, para o género de música que gostavam, as letras teriam de ser necessariamente em inglês «Havia uma única


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coisa em português, que era o 'Chico Fininho', que tinha sido feita para aí três anos antes, em 77. Foi uma letra que fiz a pensar na impossibilidade de se cantar em português... Ou seja, era possível, mas soava mal. O resultado era o que eu definia como uma azeitice. O 'Chico Fininho' começou por ser apenas um momento de humor», recorda Tê. «Olha-me esta foleirice», ironiza Rui. «Mas acabou por ter exactamente um efeito contrário. As pessoas (da EMIValentim de Carvalho) ouviram e disseram: 'Arranjem mais dez temas em português.' (risos) Depois pôs-se a questão de fazer isso ou não. Caso não o fizéssemos não haveria disco para ninguém.» Como é óbvio, optaram pela segunda hipótese, o que significou deixar de lado praticamente tudo o que tinham feito até aí e criar temas em português. Mas o resultado acabou por superar todas as expectativas: "Ar de Rock" tornou-se num inesperado sucesso, chegando a disco de ouro. E Rui Veloso, um jovem franzino de bigode e com uma grande dose de introversão e timidez, saiu subitamente do anonimato, tornando-se numa das figuras centrais do «boom» do rock português. «Na altura não dei conta de nada, andava ali simplesmente ao sabor das coisas que me iam acontecendo. Tinha 23 anos, tinha saído do Porto e vindo para Lisboa. Andei muitos anos sem saber sequer se seis meses depois já não teria largado a música e estaria a fazer outra coisa, se não teria já voltado para o Porto. Não

tive muito a noção do que estava a acontecer. Foi uma fase inicial em que toda a gente estava ainda a aprender. Nós fomos completamente cobaias», lembra Rui. As letras de Tê transportavam uma série de expressões de uso popular para um contexto que procurava acentuar o seu lado mais «kitsch», como em «Chico Fininho», em «Um Café e Um Bagaço», ou nas canções criadas para a banda sonora do filme "Crónica dos Bons Malandros", de Fernando Lopes. Mas, ao interpretá-las, Rui Veloso nem sempre conseguia criar o afastamento necessário, e as músicas acabavam muitas vezes por ser tomadas quase por autobiográficas e por lhe ficarem «coladas à pele», como aconteceu no caso de «Chico Fininho». Foi o preço que teve de pagar por ter sido ele a subir aos palcos para interpretar os temas juntamente com o baixista Zé Nabo e o baterista Ramon Galarza, enquanto o verdadeiro autor das letras permanecia (e continuou a permanecer) «oculto» nos bastidores. «Isso é uma coisa engraçada», diz Rui. «O João Monge, por exemplo, também é um bocado como o Tê, fica na retaguarda. Diz que lhe dá imenso jeito poder ir para o meio do público nos concertos da Ala dos Namorados e ficar a ouvir os comentários do pessoal sem ser reconhecido. O que é bestial. Eu sofri um bocado com isso... Uma pessoa não tem preparação nenhuma para ser conhecido, e é uma chatice. Agora já estou habituado, mas penei durante muitos anos.»

(...)


(...) Duas décadas e oito álbuns depois de "Ar de Rock", Rui Veloso e Carlos Tê mostram-se dispostos a continuar a colaboração, até porque «em equipa que vence não se mexe». Mas, apesar disso, as edições tendem a ser mais espaçadas, porque a vida do rock não mata mas mói e a disponibilidade para compor começa a já não ser a mesma: «Antigamente colaborávamos na base da irresponsabilidade. Não tínhamos filhos, éramos jovens e preocupávamo-nos apenas em desbundar e em tocar numa boa. Hoje as coisas são diferentes. Quando vamos para o estúdio levamos já uma série de coisas apontadas, porque temos menos tempo


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a perder.» Depois procuram também diversificar a sua actividade: Tê tem-se dedicado a produzir os trabalhos de diversas bandas e editou recentemente um romance, enquanto Rui planeia aproveitar o seu estúdio para criar uma pequena editora e promover novos projectos musicais. Quanto ao actual panorama musical português, Rui Veloso mostra-se algo céptico, porque muita coisa mudou, mas nem tudo para melhor: «Um dia destes um gajo ainda é atropelado por um McDonalds em construção. Estão criadas todas as condições para que daqui a três ou quatro gerações isto não tenha identidade nenhuma...» ARTIGO PUBLICADO EM 28/10/2000 NO JORNAL EXPRESSO TEXTO DE ALEXANDRE COSTA


“O BOOM DO ROCK PORTUGUES (OU DO ROCK CANTADO EM PORTUGUES): COMECOU A EXPLODIR COM OS CONCERTOS DE BANDAS INTERNACIONAIS POIS OS GRUPOS LOCAIS FAZIAM SEMPRE A PRIMEIRA PARTE. ERA MODA E ESTAVA NA MODA.“

LUIS VITTA

DE ARTIGO PUBLICADO NA BLITZ A 14 DE MAIO DE 1985

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A FÁBRICA PORTUGUESA Todos conhecem a história da mítica editora inglesa Factory, contada várias vezes e até registada no altamente ficcionado filme de Michael Winterbottom, "24 Hour Party People". O que muitos ignoram é que Portugal também teve a sua Factory – a Fundação Atlântica, fundada em 1983 por Miguel Esteves Cardoso, Pedro Ayres Magalhães e Ricardo Camacho. A Fundação durou até 1985 e produzia e prensava discos que eram distribuídos pela Valentim de Carvalho. Miguel Esteves Cardoso era jornalista e tinha estudado em Oxford. Foi correspondente de publicações portuguesas em Manchester, onde acompanhou a evolução da Factory e criou uma extensa rede de contactos. Pedro Ayres Magalhães era membro dos Heróis do Mar e estudante de Psicologia. Ambos eram amigos de infância. Ricardo Camacho era médico, músico e produtor. Trabalhou com Miguel Esteves Cardoso pela primeira vez num single de Manuela Moura Guedes. Foi após este lançamento que as três figuras centrais da Fundação começaram a pensar em fazer algo pela música do seu país, e foi assim que a editora nasceu. Segundo Ricardo Camacho, a Fundação funcionava anarquicamente: "na altura éramos pessoas com muitas ideias e sem sentido prático. Poderíamos ter tornado a história da música portuguesa diferente se tivéssemos conseguido sobreviver mais dois ou três anos. A Fundação desapareceu numa altura em que os seus grupos atingiram vendas que lhe teriam permitido subsistir mais tempo e também avançar com outros projectos que nunca chegaram a realizar-se." Dentro da editora, Camacho dirigia a produção, Magalhães o reportório e Cardoso era o Director-geral da companhia, enquanto outros tratavam da gestão comercial, da questão jurídica, da imagem, das actividades de promoção e informação e das actividades externas de divulgação: "o Miguel tratava dos contactos com Inglaterra. Eu e o Pedro trabalhávamos em estúdio. E discutíamos muito, tínhamos muitas ideias, nem todas eram convergentes. Mas era giro." "Na Fundação da Fundação: Os Nossos Primeiros Propósitos", primeiro comunicado público da editora, foi escrito por Miguel Esteves Cardoso em 1983. O documento expunha as ideias da Fundação. Esta pretendia fazer com que a exportação excedesse a importação e contribuir para aumentar a quantidade de produção nacional no estrangeiro. Usando pouco dinheiro, pretendia cortar com

todas as despesas extra e canalizar todos os meios para a produção. Utilizou uma "estética da pobreza", ou seja, procurava qualidade sem gastar dinheiro. Nunca houve dinheiro próprio da editora, pelo que as despesas eram suportadas pela Valentim de Carvalho. Ricardo Camacho explica: "Agora gravo coisas em casa, antigamente tínhamos que ir para estúdio gastar dinheiro. Por isso, ao fazermos um único disco, estávamos endividados durante muito tempo. Foi isso que rebentou com a Fundação Hoje teria sido diferente." Tanto Ricardo Camacho como Miguel Esteves Cardoso falam das pessoas da Fundação como jovens inexperientes. Camacho diz que um dos factores que levou ao fracasso da editora foi a existência de gente com personalidades muito fortes dentro da mesma. "Não existia uma liderança. Por exemplo, na Factory havia uma personalidade muito forte, o Tony Wilson, como nas outras editoras independentes. Toda a gente queria fazer o que lhe apetecesse. Isto não é viável numa editora sem meios." Os discos nacionais da Fundação, na sua maioria singles, eram de artistas como Sétima Legião, Delfins ou Xutos & Pontapés. A Fundação lançou também discos estrangeiros, quase todos licenciamentos de editoras inglesas. Entre os artistas estrangeiros da editora, encontravam-se nomes como The Raincoats ou Young Marble Giants. Os objectivos que a Fundação propunha cumprir eram difíceis. A editora acabou por fracassar economicamente. Ricardo Camacho explica: "Tivemos a ideia de transpor para Portugal a experiência inglesa das editoras independentes. Era um fenómeno desconhecido em Portugal, que o Miguel tinha trazido de Inglaterra. Não o fizemos da melhor maneira, e como pioneiros cometemos todos os erros que os que vieram depois puderam evitar. Erros de relacionamento e avaliação do mercado e de distribuição." A Fundação não chegou a ter sucesso, existindo com dívidas e fracassos. Para Camacho, a Fundação "podia ter dado uma verdadeira editora, verdadeiramente independente, e com capacidade económica para prosseguir um projecto próprio. Dispersámo-nos por coisas sem lógica que não encaixavam naquilo que devíamos estar a fazer. Gastámos imenso dinheiro num projecto que nunca viu a luz do dia, que inclusivamente o Pedro Ayres Magalhães foi gravar a


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Manchester. Pessoalmente, gostaria de ter concentrado as atenções da Fundação na Sétima Legião, nos Xutos, e naquilo que viriam a ser os Madredeus." Curiosamente, a história da Fundação, que tudo teve a ver com a da Factory, acabou até por se cruzar com a história da editora britânica. Miguel Esteves Cardoso convidou uma das bandas do catálogo da Factory para gravar em Portugal: os Durutti Column, projecto do guitarrista Vini Reilly, que vieram gravar um single. Acabaram por gravar um disco inteiro, "Amigos em Portugal". Ricardo Camacho conta que "Reilly estava habituado a gravar com poucos meios, chegou cá e viu equipamento como nunca tinha visto. O Tony nunca lhe tinha pago um estúdio. Foi assim que conseguiu experimentar coisas novas e criar aquele som." A história não acaba aqui. Havia um acordo entre a Factory e Vini Reilly que fazia com que a editora desse ao artista 50% das vendas totais, descontando os gastos com tempo de estúdio. Não se sabia se este acordo era válido para todo o mundo. A lei portuguesa especificava que apenas se podia dar menos de 20% das vendas. Os ingleses acabaram por ficar extremamente desiludidos por causa do dinheiro. Esta é a versão portuguesa da história. Tanto Wilson como Reilly contam outra versão. Wilson, na reedição de "Another Setting", um dos discos dos Durutti Column, escreve, a seguir a uma contextualização histórica dos defeitos dos portugueses: "Amigos em Portugal. Amigos em Portugal? Uma vez queixei-me à minha primeira mulher que o álbum tinha posto a empresa do Miguel e dos amigos a andar, e mesmo assim quando o Vini tocou em Lisboa seis meses depois nem um deles apareceu no concerto. Porque é que haviam de ter aparecido? Honra, gratidão, dívida. Que estupidez, eles são portugueses, não têm tais conceitos mundanos." Tanto Miguel Esteves Cardoso como Ricardo Camacho se apressam a refutar isto. Cardoso explica que foi a todos os concertos que Vini Reilly deu em Portugal, enquanto Camacho explica que os Durutti Column chegaram mesmo a tocar com equipamento da Sétima Legião. Tanto Tony Wilson como Vini Reilly julgam que "Amigos em Portugal" deu muito dinheiro à Fundação e fez da editora um sucesso, quando, na verdade, nada disto parece ter acontecido. Hoje em dia é muito difícil encontrar os discos que a Fundação lançou entre 1983 e 1985. A última edição da editora saiu com o selo da editora mas pela EMI-Valentim de Carvalho. Era um single de Pedro Ayres Magalhães, "O Ocidente Infernal/Adeus Torre de Belém". Foi este o adeus de uma editora que ambicionou fazer algo pela música do seu país como nunca havia sido feito, e como nunca se chegou a fazer. ARTIGO PUBLICADO ORIGINALMENTE n'Os FAZEDORES DE LETRAS Nº. 62 DE 2005 TEXTO DE RODRIGO NOGUEIRA

LISTA DAS EDITORAS DA DÉCADA DE 80 AMA ROMANTA ALLIANCE RECORDS CBS CLICHÉ DACAPODISCOSSETE DISREGO EDISOM EMI-VALENTIM DE CARVALHO FACADAS NA NOITE FUNDAÇÃO ATLÂNTICA GIRA HORIZONTE IMAVOX MATERFONIS MBP METRO-SOM MOVIEPLAY MVM NOVA OVAÇÃO POLYGRAM PROMUSIX RÁDIO TRIUNFO RCS RM DISCOS RODA ROCK ROTAÇÃO ROSSIL RPE EDITORES SASSETI TRAGIC FIGURES TRANSMÉDIA UNIÃO LISBOA UPAV VADECA VIMÚSICA


84 85 “Proponho um pequeno stroll down memory lane que, para alguns, poderá ser o primeiro contacto com aqueles nomes. Não vou falar do "primeiro boom do rock português" - isso ficará para os arqueólogos. O que proponho é um recuo até um período cronológico que tem início por volta de 1984/85... Portugal ascendia à sua actual categoria de nação europeia e a sua juventude espraiava-se num longo espectro que ia da rebeldia tardo-punk à problematização do ser português. Aproveitando um quadro legal omisso, o espaço aéreo nacional era povoado por centenas de rádios piratas a transmitirem regularmente e responsáveis, muitas delas, pela divulgação de novas propostas internacionais e nacionais. Na área lisboeta, o projecto recordado com mais saudade chamava-se RUT (Rádio Universidade Tejo), responsável pela formação musical de uma geração privilegiada. Na imprensa apareciam novos espaços com o Blitz. Ainda com a atenção centrada na capital, uma sala de espectáculos assumia-se como epicentro da movimentação que se adivinhava: o Rock Rendez-Vous (RRV), ali para os lados de Santos. O Porto, com locais como o Indústria, Aniki-Bóbó e Luís Armastrondo, funciona como cena alternativa à capital; e Braga, numa postura marcadamente contra-corrente, é uma produtiva fonte de propostas. Os concursos anuais promovidos pelo RRV congregam a actividade de bandas espalhadas pelo país que vêem na possibilidade de gravação de trabalhos seus um incentivo importante, capaz até de compensar os assobios e as bocas de uma plateia… empenhada.

Entre as editoras, surge alguma actividade nas chamadas 'independentes'. Destacam-se alguns nomes que vão, também eles, incorporar e dar vazão ao "movimento": a Fundação Atlântica (responsável pelos primeiros trabalhos da Sétima Legião), a Ama Romanta de João Peste e dos Pop dell’Arte ou a Dansa do Som, ligada ao próprio RRV e cuja loja na Ressano Garcia era um local de passagem obrigatória. Era a época em que a Motor (actual Bimotor), a Contraverso e a One-Off (nas Amoreiras) se encarregavam de importar a música alternativa (então chamada de «som da frente» ou «vanguarda») sobretudo em vinil e, depois, num formato novo a que muitos torciam o nariz, chamado compact disc. Cedo as editoras maiores, como a EMI-VC, a PolyGram ou a CBS despertaram para o que se estava a passar e

acabaram, elas próprias, por alinhar na tendência. A MMP vendia bem, sobretudo graças a alguns nomes estandarte que abriam portas: Xutos & Pontapés, Rádio Macau, Heróis do Mar. Mas esta era apenas a linha da frente, com elementos treinados de outras eras. Por trás, a fervilhar, havia um mar de propostas imenso, tantas que é difícil não nos perdermos. Muitos deles conseguiram furar as barreiras e chegar a gravar. As suas sortes foram diversas: uns entraram directamente para o estrelato, outros gozaram a fama efémera, outros viram-se reduzidos a cultos localizados. Muitos nunca gravaram discos e apenas persistem nas nossas memórias pelos concertos que deram ou pelas maquetes que as rádios passaram. Uns ainda existem, doutros perdeu-se o rasto, outros, finalmente, criaram novos projectos. Olhando agora para trás, o que vem à memória é uma época de enorme diversidade e vontade de criar e experimentar. Proponho um breve e subjectivo guia. A escolha das bandas é obviamente pessoal e baseia-se em nomes que ainda hoje sabe bem reouvir ou saber que existiram. Nomes que influenciaram o modo de fazer as coisas, nomes que encheram o coração da crítica ou de algum público. A opção por colocar a tónica numa certa cultura underground serve para acentuar os paralelismos com aquilo a que assistimos hoje - não vou falar do que vendia, do que chegava aos tops, mas do que se produzia e conseguia chegar, de uma forma ou de outra, a um público remoto. Verão que não era pouco.


34/35 1. A PORTUGALIDADE Neste primeiro grupo, coloco as bandas que se debruçaram sobre a forma portuguesa de fazer música moderna. Era o período pós-Heróis do Mar e o começo do reinado de Miguel Esteves Cardoso junto de uma certa intelectualidade juvenil portuguesa. O toque de ambos fez-se sentir sobre algumas destas bandas; as outras poderão funcionar como contraponto (até ideológico) da «portugalização» da MMP. Nos primeiros colocaria Madredeus, inicialmente concebidos como grupo sem nome para um disco gravado na igreja da Madredeus que, por isso, se intitulou Os Dias da Madredeus - a expectativa criada foi enorme e o sucesso, sobretudo com o segundo disco, levou-os até onde todos sabemos; e Sétima Legião, cruzando, sobretudo no primeiro àlbum, influências da corrente depressiva da Manchester do início dos anos 80 com a tradição portuguesa (recriada). Noutra vertente, havia a recuperação quase folk-rock da tradição com grupos como Essa Entente (participantes de um CMM do RRV) ou Seres (inéditos). 2. POP EXPERIMENTAL Uma das áreas mais rica e surpreendente. A procura de criar música de uma forma nova, marcadamente europeia, senão mediterrânica, explorando universos tão distintos como o das músicas do mundo, ambientes de cabaret e cinematográficos, uma certa portugalidade pós-moderna, ambientes de quase-esquizofrenia, propostas dançantes directamente direccionadas ao cérebro, exploração e manipulação de sons em estúdio… Nomes: Mler Ife Dada de Anabela Duarte e Nuno Rebelo; Pop dell’Arte de João Peste; Ocaso Épico de Farinha Master; K4 Quadrado Azul (inéditos); Melleril de Nembutal (inéditos), Repórter Estrábico, a banda do vocalista articulado (António Olaio, igualmente pintor). 3. UMA POP MAIS MAINSTREAM A par das propostas menos convencionais, a música pop portuguesa vivia também de produções capazes de atingir públicos mais vastos e de competir por lugares nos tops de vendas. Uns GNR que entram na segunda metade da década com uma pujança renovada pela tomada dos comandos por parte de Rui Reininho; uns Delfins a tactearem o caminho e a saírem da Linha; uns Ban recuperados da depressão mancuniana de Alma Dorida e aptos a entrar num universo colorido de bolhinhas que fazem pop!; uns Radar Kadafi saídos dos concursos do RRV e a mostrarem-se capazes de produzir sons de Verão que ficaram na memória; finalmente uns Requiem Pelos Vivos, outros concursantes, com uma pop melodiosa e florida, uma espécie de «Os Smiths Vão Ao Campo». 4. POLITICAMENTE EMPENHADOS Num Portugal governado sob a égide do Prof. Aníbal Cavaco Silva, a expressão política na MMP faz-se pela oposição. Três projectos particularmente interessantes, destacam-se: os Linha Geral, talvez uma das mais inteligentes propostas, alinhando por uma esquerda poética e

quase épica; os Clandestinos, responsáveis por temas que iam do mais tresloucado escárnio a toadas quase Eisensteinianas; os Sitiados, com a abordagem afadistada e boémia que marcou a sua música até ao primeiro álbum. 5. PUNK Um universo próximo do anterior era o das bandas punk, que teimava em fazer sobreviver um movimento velho de 10 anos. A mais bem sucedida junto do grande público dava pelo nome de Peste & Sida, com uma carreira à la The Clash, explorando diferentes estilos, sem grandes concessões. Outros nomes que saíram das garagens: MataRatos (O Armando é um comando e A minha sogra é um boi, são os nomes dos seus clássicos), Censurados, Crise Total, Bastardos do Cardeal. 6. ROCKABILLY Inesperadamente naquela segunda metade da década, surge em Portugal uma onda rockabilly encabeçada pelos geniais Emílio & A Tribo do Rum (futuros Capitão Fantasma). Era o rock de popa e contrabaixo, de carros e raparigas, de jeans e cabedais, que encontrou ecos noutras bandas como os Tequila Mal ou Tédio Boys. 7. ROCK ALTERNATIVO Uma longa lista de nomes integra este grupo, talvez por ser o mais geral. Erro do escriba? Não duvido. Aqui incluo todos aqueles cuja produção seguia, de perto ou de longe, os trâmites ditados pela cena independente anglosaxónica. Assim, falo de gente muito diferente, tão diversa quanto as ofertas da época. Rock de guitarras, urbano, com ligações a Inglaterra via Lloyd Cole (Bateau Lavoir) ou a cena indie britânica (Entes Queridos, Rongwrong); rock com distorção, segundo o paradigma Sonic Youth, mais ou menos melodioso (Flávio com F de Folha, Santa Maria Gasolina em Teu Ventre, Tina & The Top Ten); rock intelectual, de palavras e extensos épicos (Croix Sainte); rock alternativo, recreando atmosferas sombrias e ritmicamente espessas (Mão Morta). 8. DESBUNDANTES E para terminar, as bandas de tipo circense, desconstrutivas pelo humor assumido. Nomes que adoptam a explosão de géneros como forma de dar vazão a tudo o que têm para arrasar, com humor mais ou menos ácido, mais ou menos brejeiro. É fácil destacar um nome: Ena Pá 2000, que, depois de lançarem o maxi Telephone Call / Pão Amor e Totobola, muitas salas tiveram que percorrer até conseguirem gravar um álbum, deixando um legado imenso de entrevistas geniais. Num registo próximo, sobretudo pela postura em palco, não posso deixar de referir os conimbricenses M’As Foice (leia-se é mas foice) famosos por deixarem atrás de si rastos de legumes (alfaces, sobretudo) em cada palco que pisavam; finalmente, noutro registo, os Afonsinhos do Condado (de Gimba, futuro irmão Catita) e a sua incorporação de ritmos latino americanos e tropicais.

ARTIGO PUBLICADO NA EDIÇÃO DE 30 DE JANEIRO DE 1999 DO SITE “RÀDIO PIRATA”, TENDO SIDO REPUBLICADO EM 2003 NO SITE “A PUTA DA SUBJECTIVIDADE” TEXTO DE NUNO CAMARINHAS


O ESTADO DA NAÇÃO


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Há uma mania tradicional portuguesa de condescendência para - como e usual dizer-se o que é nosso. Dito de outra maneira, é comum entender-se que o facto de alguma coisa - um disco, um filme, uma batedeira de claras de ovos, uma telenovela, umas calças de ganga falsificadas - por ser produzida no Pais, por cidadãos nacionais ou nacionalizados, não precisar de ser bom para ser apreciado. É o contrario de dizer «é português e basta» - que e a outra face da moeda. A expressão mais odiosa que conheço é «Para uma coisa feita cá não é mau», como se todos nós fôssemos uns menores mentais incapazes de enfrentar a concorrência estrangeira, obrigados a considerar bom, porque «nosso», qualquer produto que, produzido noutro pais, não teria mais consideração que a dispensada à banalidade. A outra expressão mais odiosa que conheço é «Isto é que esta a dar», aplicado por tudo e por nada como se a vida cultural não fosse mais que uma mera questão de moda. Ainda é pior do que sermos um pais de poetas. Dito assim, estou em crer, se os Afonsinhos do Condado fossem ingleses, não teriam mais consideração do que o povo dispensa às minhocas, mas como são «nossos», até o critico de caneta mais afiada amacia a escrita. Como exemplo outro também José Fonseca e Costa e o seu filme «A Balada da Praia dos Cães» se por ventura o realizador fosse norte-americano ou francês - não merecia mais que o desdém dedicado à mediocridade desenrascada, mas como é português, ate há quem se atreva a dar-lhe mais estrelas que as aplicadas a um filme a todos os títulos notável na cinematografia mundial como «Teresa» de Alain Cavalier. É, está visto, um mal português, parente do mesmo padecimento que permite a tantos pensarem ser artistas sem potência, apenas não revelados aos olhares da população por conta das habituais condicionantes sociais e políticas, culturais e económicas. O PERCURSO DO CARANGUEJO Entrando no assunto, acontece em Portugal, de um momento para o outro, «ser português é o que esta a dar». E isto é bom, principalmente depois de tantos anos de desdém pelo trabalho de artistas pátrios, mas também é mau, por provocar um sentimento generalizado de condescendência permissor do entendimento de tanto fazer ouvir os Mler lfe Dada ou os Ena pá 2000, Amália Rodrigues ou Marco Paulo, pela razão única de todos eles serem portugueses apesar de alguns não serem maus, mas péssimos, repelentes, abjectos. Talvez esteja a exagerar, mas é basto irritante assistir a

contratações de bandas, necessitadas de mais três ou quatro anos de garagem, por multinacionais discográficas, ainda para mais quando o critério é apenas e só «o que é português é que está a dar», ou assistir a entrevistas de novos valores, ate aqui considerados muito marginais e alternativos, que ocupam o tempo de antena com a bajulação rasteira à editora. Não é triste nem é desgostoso. Mete raiva. O que está a acontecer, aparenta-se demasiado com o início da década, quando qualquer conjunto de baile gravava desde que se afirmasse pelo - até faz arrepios escrever «rock português». Quero dizer: o que está a suceder é que dentro de um ano, ou dois, quando as editoras se fartarem de sucessivos afundamentos financeiros provocados por uma política antinatural de contratação, voltarmos a situação de só ver bandas novas no Rock Rendez-Vous ou na Fábrica, e, pior um pouco, de ver os mais interessantes projectos estéticos desaparecerem ainda antes de saberem o que é um estúdio decente. O PATRÃO DÁ LICENSA Tenho para mim que é a muita conversa e os poucos actos a principal responsável pela situação que, se ainda não existe, está aí, está a bater-nos a porta. O facto de apenas uma editora independente, naturalmente a Ama Romanta, pugnar pela edição de música nacional desprezada pelas companhias discográficas tradicionais e multinacionais, é sinal evidente de não ser este o melhor caminho para a música moderna portuguesa. Quase dez anos depois do tal «rock português» - de que hoje sobram os GNR e os Xutos & Pontapés na pose «estrela de rock'n'roll» - não ter surgido nenhuma alternativa além da mui digna, mas também mui pobre, editora dirigida por João Peste, só traduz a ausência de iniciativa da maioria dos artistas, a sua incapacidade para encontrarem alternativas no terreno comercial suficientemente energéticas para não permitirem a dependência dos patrões do disco em Portugal. O mal, não se pense, não são as contratações da Polygram ou da CBS ou da EMI-Valentim de Carvalho, pois esses representam condignamente o seu papel; o mal está nos criadores preferirem ter um patrão e temerem ser patrões de si próprios, recearem até procurar alternativas, quando, nunca se sabe - dizem alguns - «ainda aparece para ai uma editora a sério. O mal está em quererem agradar a gregos e a troianos, a Deus e ao Diabo. Em preferirem ser Fausto e não Zeus.

ARTIGO PUBLICADO NO JORNAL BLITZ - 7.4.1987 TEXTO DE RUI MONTEIRO



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O antigo Cinema Universal, situado na Rua da Beneficiência, nº 175, exibia o seu néon de 12 metros anunciando a chegada da primeira verdadeira sala de espectáculos rock portuguesa. Lá dentro ouviam-se os temas do acabado de editar (Julho de 1980) "Ar de Rock", de Rui Veloso, inaugurando assim dez anos que ficariam para a história e que mudariam para sempre o panorama da música portuguesa. Aconteceu na noite de 18 de Dezembro de 1980. Em poucos anos o Rock Rendez Vous (RRV) transformou-se numa sala mítica. Foi lá que os Xutos & Pontapés deram os primeiros passos, que se formaram os Pop Dell’Arte, que actuaram pela primeira vez em Portugal os Killing Joke, os Teardrop Explodes ou os Chameleons. Era ali que se tomava contacto com o movimento pós-punk, através das tardes e noites do radialista António Sérgio, e foi graças ao RRV que se gravaram 140 discos de novas bandas e se realizaram 1500 concertos em dez anos. Foi através do RRV que se formou a editora – Dansa do Som - que lançou discos dos Ocaso Épico (banda do malogrado Farinha Master) ou o primeiro álbum dos Xutos ("Cerco"). E acima de tudo naquela sala que se realizou o primeiro concurso de Música Moderna Portuguesa, que deu a conhecer bandas como os Mão Morta, M’as Foice, Ena Pá 2000, Quinta do Bill, Sitiados e Ritual Tejo (cujo primeiro nome foi Easy Gents). «A indústria musical em Portugal não existia e estava tudo a começar; o que existia em termos de produção era muito ligado ao fado. As multinacionais não estavam instaladas, com excepção da Valentim de Carvalho, e mesmo assim não tinha uma actividade por aí além. A nível de música moderna - rock e pop - era todo um mundo novo que se estava a criar. E o RRV foi importantíssimo para isso», explica Adolfo Luxúria Canibal, vocalista dos Mão Morta. «Até tínhamos excursões. As pessoas tinham de vir ver o Papa. Era a única sala de espectáculos rock em Lisboa e no país. Era a Meca daquela gente», repara Mário Guia, proprietário do espaço.

A SORTE DE TER UM ROCK RENDEZ VOUS «Actuar no RRV era uma coisa almejada por uma banda, tanto ou mais do que fazer um disco», conta Adolfo Luxúria Canibal. E actualmente, há alguma sala de espectáculos como o RRV? «Não», garante taxativamente o vocalista dos Mão Morta. «Criaram o Hard Club, em Gaia, mas não é tão caloroso. É muito bonito… demasiado bonito. É menos clube e mais um bar com vista. Havia o Le Son, em Coimbra, que parecia uma daquelas salas das sociedades cooperativas já decadentes. Tinha boas condições, mas também está fechado. O que há são teatros fechados ou salas bizarras. Interessantes, mas não possuem a mística, a intimidade e a concentração que o RRV conseguia», resume Adolfo Luxúria Canibal. Outro ponto forte do RRV eram as matinés, com os superêxitos da época como a versão de «Ziggy Stardust», pelos Bauhaus; «Ball of Confusion», dos Love and Rockets, «Heaven», dos Psychedelic Furs, mais os New Order, The Sound ou os Chameleons. Na opinião de João Palma, frequentador assíduo do RRV que chegou mesmo a ocupar o palco (tocou com os Ocaso Épico, por exemplo), o RRV «era uma sala com o tamanho justo para concertos de pequena dimensão, e isso foi importante. O que acontecia era que os concertos de bandas estrangeiras eram no estádio d’Os Belenenses ou no Pavilhão de Cascais, e isso fazia com que apenas viessem cá bandas que conseguissem encher esses espaços, tipo Whitesnake. O RRV permitiu que viessem cá tocar os The Sound, Chameleons, Killing Joke... Bandas interessantes e actuais que nunca encheriam um estádio. Quanto às bandas nacionais, tinham um espaço para tocar com material e condições como alternativa às salas das sociedades recreativas e clubes desportivos».


RRV

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OS GLORIOSOS ANOS... 80! Portugal não viveu o «Summer of Love». Viveu os anos 70 imerso em conspirações e a preparar uma revolução. Portugal viveu 48 anos em ditadura, 13 dos quais em guerra colonial. João Peste, vocalista dos Pop Dell’Arte, frisa que «as consequências económicas e políticas da queda da ditadura e da perda do império só podiam provocar uma grande confusão na cabeça das pessoas. E em termos culturais ainda mais, porque de repente tanto parecia que se tinha acesso a tudo como se considerava algumas coisas alienantes. No início dos anos 80 (de 81 a 83) trabalhava numa loja de discos em Campo de Ourique e as pessoas nem sabiam o que era um disco». Este era o panorama português no que respeita à música. Proliferavam os grupos de baile, as festas populares, o fado e pouco mais. Com o fim da ditadura, em apenas seis anos, deu-se o boom da música moderna portuguesa, cantada em português. Em 1980, "Chico Fininho", de Rui Veloso, estava a fazer sucesso nas rádios e a transformarse num hino da geração rocker portuguesa dos anos 80. Outras bandas seguiram as pisadas de Veloso, como os UHF, os Heróis do Mar, os GNR ou os Táxi, e poucos anos depois os Xutos & Pontapés, os Mão Morta ou os Pop Dell’ Arte. E se os primeiros emergiam das influências punk dos anos 70, os segundos são quase como que filhos do RRV, o berço do boom da música moderna portuguesa. Para isso muito contribuiu o primeiro Concurso de Música Moderna (CMM) do RRV, iniciado em 1984 e que contou com seis edições (até 1989). Mário Guia, fundador do clube, conta como tudo se processava: «Colocava anúncios a perguntar quem queria ir tocar ao RRV e depois mandavam-me cassetes. Só que a maior parte dos que apareciam eram grupos de baile, as bandas pop rock eram poucas. Consequentemente, não facturávamos e começámos a fazer o concurso, para arranjar bandas que fossem tocar lá. E resultou de tal forma que chamou a atenção dos media e trouxe gente interessante. Tenho em casa mil cassetes,

cada uma com quatro originais inéditos. São as cassetes de inscrição», conta. As inscrições estavam abertas a todas as bandas, desde que cantassem em português e não tivessem nenhum álbum editado. Para o primeiro concurso, Mário Guia recebeu 101 cassetes. «Havia boas bandas, mas depois havia aqueles que tocavam mal mas que tinham qualquer coisa e por isso, a partir do segundo concurso, resolvemos criar o prémio originalidade», diz ainda. Prémio que foi atribuído a bandas como os Mão Morta ou os Pop Dell’ Arte – que, curiosamente, marcaram mais que as bandas que ganharam o prémio principal. «Todas as bandas que ganharam o primeiro prémio acabaram», comenta Mário Guia. João Peste atribui importância capital ao RRV na formação de novas formações: uma vez apurada, a banda «dava concertos e tinha logo um tema num disco. Isso fez com que uma série de pessoas começasse a pensar em formar uma banda, arranjar sítios para ensaiar, a trocar conhecimentos, referências musicais, emprestar discos. E isto num Portugal que tinha aquelas condicionantes culturais». A reflexão chega mesma a implicá-lo directamente: «Pergunto-me se teria formado uma banda se não houvesse o concurso RRV». Quatro anos após o encerramento do RRV, a RTP e Mário Guia ainda tentaram reviver os concursos do RRV organizando o sétimo (e último) concurso de música moderna. Gravado no cinema Odeon, nos Restauradores, durou três meses e concorreram mais de 400 bandas. Os Drowning Men foram os vencedores. O Prémio de Originalidade, esse, coube aos Ornatos Violeta.

(...)


(...) A DANSA DO SOM Mário Guia decidiu gravar os concertos que decorriam durante os concursos e para os editar criou a Dansa do Som. Em 1985, foi lançado "Ao Vivo no Rock Rendez Vous 1984", que apresentava as gravações de algumas bandas que passaram pelo primeiro concurso de música moderna. A tiragem de 500 cópias foi oferecida aos clientes habituais da casa. A ideia pegou e, a partir daí, outros discos foram surgindo, como o já citado primeiro álbum dos Xutos, dos Ocaso Épico, e Quinta do Bill. Guia recorda que a totalidade dos concertos era objecto de gravação. Infelizmente, desse riquíssimo espólio «quase nada» terá sobrado. «As bandas arranjavam maneira de subornar o Pita [técnico de som], que lhes dava as cassetes», conta entre risos. A QUEDA DO IMPÉRIO O nº 175 da Rua da Beneficiência, em Lisboa, é actualmente uma pastelaria e um prédio de habitação (175 A). Do RRV, que encerrou em Julho de 1990, não resta nada. Só as memórias - e essas já se sabe que são muitas. Mário Guia tinha 36 anos quando abriu o RRV. Sempre foi interessado por música e chegou mesmo a fazer parte dos Ekos, banda formada em 1964. Uma fase que acabou para dar lugar a um trabalho na área dos têxteis. Área que, felizmente, o obrigava a viajar muito, principalmente para Inglaterra. «Foi aí que tomei contacto com os clubes, e pensava sempre por que é não havia salas daquelas em Lisboa». De regresso à capital, Mário Guia encontrou o local ideal (um antigo cinema no Bairro Santos, perto da Praça de Espanha e de Sete Rios) e transformou-o no RRV. E porquê Rock Rendez Vous? «Porque era rock e era um encontro com o rock». Estava aberto todas as noites, excepto aos domingos - em que só abria à tarde para as matinés. Os tempos áureos prolongaram-se até 1989, com os concursos e noites de sábado a abarrotar (a entrada custava 300 ou 400

escudos, com direito a duas cervejas). O objectivo era fazer uma sala à imagem de um clube inglês de finais dos anos 70, início dos anos 80. Mas cedo as consequências deste ideal se começaram a fazer sentir. «A casa era só procurada pelos homens, porque as mulheres naquela altura saíam pouco, mas quando o faziam gostavam de ter as atenções concentradas nelas e ali não tinham - a música e o palco é que contavam. Sentiam-se mal. Só iam aquelas que estavam viradas para a música e eram muito poucas. Mas a caixa registadora não se compadecia com essas coisas. Facturava pouco. Então fiz a experiência de só entrarem homens acompanhados, só que não resultou durante muito tempo», conta Mário Guia. Mas o grande problema do RRV era o facto de ser uma casa para uma elite. «Nem toda a gente ouvia aquele tipo de música», diz. Chegou-se a um ponto em que não havia bandas para tocar, daí a criação dos concursos. Mas havia sempre dívidas. «A partir de 86 comecei a ver que aquilo estava a cair. Era sempre uma elite que ia lá. E depois já só havia dois concertos cheios por mês», lamenta. Se tivesse sido mais comercial tinha tido um fim diferente? «Não. Quando o António Variações tocava a casa estava vazia. Quem gostava dele eram pessoas simples que não iam ao RRV. Quem ia ao RRV não gostava do Variações. Aos poucos as pessoas deixaram de ir porque começaram a abrir discotecas noutros lados e deixámos de ter o exclusivo. Em relação à música ao vivo continuávamos a ter público, principalmente com as bandas estrangeiras, e depois com os GNR, os Xutos ou os Mão Morta. Mas não chegava porque as despesas eram elevadas. Agora é que dava. Estou a ver se convenço o proprietário da discoteca W a fazer lá um Pop Rendez Vous. Fazer algo mais abrangente porque não acredito que o rock cá se aguente por muito mais tempo», remata Mário Guia. ARTIGO PUBLICADO NA BLITZ TEXTO DE ANA BAPTISTA


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TUDO COMEÇAVA COM O CIRCUITO PELAS “CAPELINHAS” DA ÉPOCA: “ A FEBRE DE SÁBADO DE MANHÔ E “ O PASSEIO DOS ALEGRES”, AMBOS DO JÚLIO ISIDRO, ASSIM COMO O “ROCK EM STOCK”, DE LUÍS FILIPE BARROS, O “ROTAÇÃO” E O “ROLLS ROCK”, DE ANTÓNIO SÉRGIO, PROGRAMAS DE GRANDE AUDIÊNCIA, EM RÁDIO E EM TELEVISÃO, QUE SERVIRAM DE RAMPA DE LANÇAMENTO A TODAS ESTAS BANDAS DO “BOOM” DO ROCK PORTUGUÊS. ARTIGO PUBLICADO NA REVISTA PÚBLICA - 14.11.1999 TEXTO DE DULCE FURTADO


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RÁDIO RÁDIO RENASCENÇA MEIA DE ROCK Realização de Rui Pego Apresentação de Luís Vitta e Rui Pego Tendo em conta que existia a necessidade da RR estar mais atenta aos movimentos jovens começava em 8 de Junho de 1981, na Rádio Renascença, o programa Meia de Rock. «Não é certamente um armazém de música, mas poderá ser um suculento pedaço de rádio rock, arejado e vivo. Agora, trinta minutos depois da meia-noite, "alto e para o baile. O tempo é nosso. Vamos viver a nossa época.» A equipa foi reforçada com a entrada de António Duarte e nasceu uma edição especial ao Domingo com a coluna de António Duarte sobre o rock português. A partir do dia 19 de Setembro de 1981 as emissões de sábado passaram para uma hora de duração. Nas noites de Sábado - dilatavase o tempo de emissão de meia para uma hora. Era nas emissões especiais de sábado à noite que António Duarte "encostava à parede" as referências mais significativas da produção nacional de rock. A partir de Janeiro de 1982, o programa passou a ter uma hora de duração. O programa continuou a ser Meia de Rock, uma meia de rock dupla que ia para o ar todos os dias entre as 00:00 e as 01:30 . Permitindo passagens mais largas de certos discos e maiores intervenções de António Duarte.

POP/TOP/ROCK O programa tinha um top com os 20 mais (álbuns) do programa POP/TOP/ROCK. A tabela era resultante das listas de preferências dos vários núcleos de ouvintes do programa. Com o “boom” do rock português tornou-se usual a presença de discos portugueses (Táxi, À Flor da Pele, Heróis do Mar, Humanoid Flesh; Pronto a Curtir e Se Cá Nevasse são alguns dos exemplos). O programa também promoveu uma lista com os “10 mais da Produção Nacional”. A primeira tabela incluía temas como “Sê Um GNR”, “Patchouly” , “Totobola”, “Um Café e um Bagaço”, “Sémen” ou “Touch Me Down”. «Privilegiava-se o contacto com com os jovens admiradores do rock e a máquina montada permitindo o funcionamento do conhecido Clube dos gatos.» NÓS POR CÁ «Connosco você vai sentir-se em casa» Em Abril de 1982 começou na Rádio Renascença, Onda Média de Muge e Porto, Aos Sábados, entre as 15 e as 16 horas. O programa era apresentado por António Duarte e Rui Pego (que também era o realizador do programa). Posteriormente o programa passou a ter duas horas, entre as 14 e as 16 horas de Sábado. O programa costumava destacar um álbum de produção nacional, tanto podia ser Fausto (“Por Este Rio Acima”) ou o “Persona Non Grata” dos UHF. O programa tam-

bém tinha um top com as “Mais” Mais da semana. “Intelectual do Café” de Fernando Girão foi o primeiro líder da tabela Nós Por Cá. Uma tabela que é o espelho fiel sem artifícios, das vossa preferências. Preferências que todos vocês podem manifestar, constituindo-se em núcleos e enviando semanalmente os cinco temas que vos fazem perder a mona. «O objectivo é trazer para o som forte da Média, um jornal da produção nacional que tratasse os principais acontecimentos e dispensasse às propostas mais interessantes, um apoio crítico.» «Dois roteiros - um de edições, outro de espectáculos - “flashes” de notícias, uma coluna de critica de discos e cinco minutos... nem mais um, com um convidado de que se evoca a trajectória, para se tocarem de perto as origens de tudo isto.» «Olho vivo e alguma música ligeira. Alguma porque nós por cá, estamos particularmente “viradinhos” para o roque que valha a pena, para os incompreendidos Tradicionais, para esse movimento que vai engrossando e que muita boa gente chama já MPP (Música Popular Portuguesa) e ainda para todas as propostas que ousem.» NÍVEL NACIONAL [RFM] Em 1989 a RFM divulgava a música portuguesa, aos sábados e domingos, a partir das 21h00. Programa de Paulino Coelho e Manuel Jorge Roque.


ROTAÇÃO (entre 1977-1980): Foi o primeiro programa de autor, de António Sérgio ainda na Rádio Renascença. Foi através deste programa que ajudou a lançar nomes cimeiros da música portuguesa, incluindo os Xutos&Pontapés.O programa Rotação termina em Janeiro de 1980 pois António Sérgio é convidado por Jaime Fernandes e João David Nunes a mudar-se para a Rádio Comercial.

OCIDENTAL PRAIA Em Janeiro de 1986, o FM da Renascença passou a transmitir o programa "Ocidental Praia" de Rui Pego. Aos Sábados entre as 00h00 e as 02h00. O programa tinha uma tabela de preferências denominada "Quinta dos Portugueses", em que entravam muitos temas em maqueta, que era publicada no jornal Blitz.

46/47 CABO DO ROCK [RFM] Realização e apresentação de João Pedro Costa. Passa exclusivamente música moderna portuguesa de bandas já consagradas ou ainda por revelar.

RÁDIO COMERCIAL ROCK EM STOCK «Um dos programas de maior audiência e popularidade. Programa que marcou uma época.» «Em Abril de 1979 teve lugar a primeira emissão, no FM Stereo da Rádio Comercial, do programa diário "Rock em Stock", apresentado por Luís Filipe Barros e Rui Morrison. No meio de um alinhamento composto por discos de rock, muitos dos quais importados, começaram a ouvir-se produções nacionais como temas (instrumentais) dos Ananga Ranga e mais tarde Salada de Frutas ("Shui de Choque) e "Chico Fininho" de Rui Veloso que viria a escalar o tope de preferências do "Rock em Stock" ao lado de nomes como The Police ou Cheap Trick.» MFC «Em 1981 o programa de rádio "Rock em Stock", com Luís Filipe Barros ao comando promove um concurso, durante várias semanas, com uma canção que (saberse-ia mais tarde) pertencia ao novo álbum dos Ananga-Ranga. Luís Filipe Barros começou a passar esses novos grupos no programa. No caso dos Trovante só passava a segunda parte do tema "Balada das Sete Saias". Os discos passaram também a ostentar um autocolante com a indicação de que tinha chegado a nº1 do top do programa (Iodo, Street Kids, NZZN, etc...). «O Barros chegou a ter um tema [dos Xutos] no top do Rock em Stock... Passava bastante o "AvéMaria" até porque estava proibido na Renascença, assim como o

"Sémen", e era uma certa forma de provocação» (Ricardo Camacho/Conta-me Histórias) O programa contava com a assistência de Ricardo Camacho. Contou também com a colaboração de Ana Bola. A festa comemorativa do 2º aniversário do programa foi, no dia 19 de Abril de 1981, no Pavilhão do Restelo. Actuaram os Street Kids, NZZN, GNR, Jáfumega, Roxigénio, UHF e Arte e Oficio. Nesta época, Luís Filipe Barros lançou o disco "Lusitansos", com grande êxito, e apresentou na RTP o programa "Berros e Bocas" com Manuela Moura Guedes. O programa acabou por terminar e Luís Filipe Barros passou a apresentar o programa da manhã,"Café Com Leite", e mais tarde o "Ondas Luisianas" nas tardes da Comercial e o "Calor da Noite". O programa "Rock em Stock" regressou em Fevereiro de 1986. TNT «O programa diário de onda média onde se dá a conhecer o gosto musical dos ouvintes de Rádio Comercial» O programa começou em Fevereiro de 1981. Com realização de Jorge Pego e apresentação de Adelino Gonçalves e Jorge Pego. Era emitido de segunda a sexta entre as 17 e as 18 horas. Depois passou a ser apresentado no FM da Rádio Comercial. «Podem colaborar na tabela TNT - Todos No Top todos os ouvintes da RC que o desejarem bastando

que, para esse efeito, enviem um postal para a Rua Sampaio e Pina, 26, 1000 - Lisboa, indicando qual o tema que preferem entre quantos ouviram nas emissões da RC. A partir do dia 5-06-81 a tabela passou a ser publicada na revista TV Guia onde era publicado um cupão. Passou também a ser divulgada no programa “Vivá Musica” da RTP. Na primeira fase do programa entravam muitos temas portugueses para a tabela. Temas como “Ribeira”, “A Tua Noite”, “Patchouly”, “Robot” ou “Rua do Carmo” chegaram a nº 1. O programa foi co-apresentado por nomes como Manuela Moura Guedes, Pedro Costa e Luís Montez. LUSO CLUBE A partir de Fevereiro de 1986, com apresentação de Pita (DJ do Rock Rendez-Vous). Sábados das 20h00 às 21h00. A Tabela de preferências era elaborada apenas com artistas portugueses. O cupão era publicado no jornal Blitz. Podia votar-se em três temas de música portuguesa (editados ou em maqueta). A Festa do 1º aniversário do programa foi no dia 6 de Fevereiro de 1987, no RRV, com a presença dos Sétima Legião e Ena Pá 2000.


RÁDIO COMERCIAL ROLLS ROCK O primeiro programa que António Sérgio fez na Rádio Comercial, que na altura ainda dava pelo nome de RDP – Canal 4. O conceito por detrás do programa - nas palavras de João David Nunes - era ser “uma coisa especial, edições muito específicas e muito boas”. era apresentado diariamente entre a uma e as duas da manhã. SOM DA FRENTE Em 1982, António Sérgio passa a ocupar o espaço 16-18h com o programa “O Som da Frente”, o primeiro indicativo (gravado em 10/82) era da autoria dos Xutos & Pontapés mais tarde foi substituído por um da autoria de Ricardo Camacho. Como o próprio nome indica, tinha como missão estar na linha da frente das novidades; trazer até aos ouvintes portugueses o que de novo se fazia em Portugal e no Mundo e estar na vanguarda das novas sonoridades.Que viria a durar até ao ano de 1993.

FEBRE DE SÁBADO DE MANHÃ

Começou a ser transmitido na Onda Média da Rádio Comercial, marcou toda a década de 80. Em plena época da afirmação do rock português, o programa dava espaço a grupos ainda a “gatinhar”. Eis a perspectiva de Júlio Isidro sobre a importância na época. “Eu voltei a pôr a rádio na rua. Pus as pessoas a ouvirem (sic) rádio (a expressão não é minha, é do José Duarte). Lá se estrearam os Heróis do Mar em pé de igualdade com o Mário Mata. Até os Broa de Mel começaram ali. Ao fim de três anos, matei a Febre cheia de saúde. É a única coisa de que me arrependo. Podia tê-lo feito durante mais anos. Nem sequer sabia quais eram as audiências. Apenas sabia que o País parava para ouvir o programa”. “Havia passatempos, mas não oferecíamos carros. Isto não impedia que as pessoas se manifestassem. Não tenho a certeza se alguma vez oferecemos viagens. Lembro-me de um concurso em que se namorava ao telefone.

RÁDIOS LIVRES/RÁDIOS PIRATAS «A existência de um monopólio RDP / RR, impediu que o sector se desenvolvesse normalmente até que em 1984 algo começa a mudar e surgem as chamadas... Rádios Piratas ; Estas rádios também chamadas de "livres", reflectiam a falta de legislação sobre radiodifusão e à inexistência Jurídica que impedia que grupos económicos privados pudessem abrir as suas próprias estações. Estas rádios que mais tarde serviriam de jurisprudência, criaram uma situação ilegal que mais tarde o estado teve de resolver. O "surto epidémico" começou em Lisboa.» «O governo decidiu, finalmente, intervir. Em 24 de Dezembro de 1988 man-

Houve um rapaz que chegou a casar”. “Não tinha “cachet”. Recebia apenas horas extraordinárias. Eram três horas de boa disposição, porque os tempos eram de depressão. Continuo a receber frutos do programa. Foi a maior experiência profissional da minha vida, em termos emocionais. Envolvi-me muito noutros projectos, mas nenhum como este”. Júlio Isidro/DN “A Maria Elisa convidou-me a apresentar um projecto para um programa aos Domingos à tarde. Não podia ser igual à Febre de Sábado de Manhã, mas era inspirado. Acabei por fazer o programa durante quatro anos”.

dou encerrar todas as rádios "piratas". Todas elas puderam então apresentar o seu projecto de Legalização e perante condições, estruturas, motivações e outros indicadores, o governo decidiu uns meses depois quem deveria continuar e quem teria de encerrar os seus emissores. Em meados de 1989, começavam a aparecer as primeiras rádios privadas e legais em Portugal, num processo que, embora tardio, permitiu adequar a quantidade de rádios ao mercado nacional Português. Segundo o Go-verno o nº de rádios diminuiu para menos de metade.»


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TELEVISÃO

PASSEIO DOS ALEGRES O programa divulgava muitos dos primeiros artistas de rock português. Apresentava também alguns nomes estrangeiros como Duran Duran, Fisher Z, Spandau Ballet e Classic Noveaux «Primeiro, havia uma certa desconfiança, não sabiam ao que vinham; depois, começaram a passar a palavra.» Uma revista de música americana até chegou a dizer que «era muito importante vir ao programa do disc-jockey português Júlio Isidro. Baixinho era a consciência critica do programa. O programa englobava dança, passatempos (Braço de Ferro, O Artista Sou Eu, ...), humor, musica nacional e estrangeira,

Marretas e Pantera Cor de Rosa, etc... A partir de Outubro de 1981, Baixinho passou a ser o correspondente do "Passeio" no Brasil e entrou para o programa o macaco Xoné. Verificou-se também a entrada de Herman José que começou por fazer duas ou três rábulas por programa (Tony Silva, Asdrúbal Todobem, Salette Pureza,...) «O Tony dá um conselho a todos os cantores portugueses: aperfeiçoem a vossa técnica do pulmão! Quanto aos grupos de rock, aqui fica um apelo: parem de copiar o repertório do Tony Silva!» Ao "Passeio de Alegres" seguiriam-se os programas "Festa é festa" e "A Festa Continua", entre outros.

TODA A INFORMAÇÃO ENCONTRADA RESPECTIVA AO TEMA RÁDIO E TELEVISÃO FOI RETIRADA DO SITE : http://anos80.no.sapo.pt


ROQUES DA CASA Programa da RTP2 apresentado por Rui Pego e António Duarte. Foi um veículo eficaz de divulgação e promoção da música portuguesa. Foram emitidos 14 programas com uma média de quatro bandas por programa. «Ao longo de 14 emissões o programa "Roques da Casa" movimentou 150 músicos, todos portugueses o que traduz a importância que o programa poderá ter tido para os músicos, que cumpriu assim o seu objectivo fundamental» diz Rui Pego ARTIGO RETIRADO DA REVISTA TV GUIA Nº 199

OS MUSICAIS DO SUDOESTE A RTP iniciou no dia 19 de Julho de 1987 (tardes de domingo) a série “Os Musicais do Sudoeste” realizada por Edgar Pêra. “Os Musicais do Sudoeste” pretendiam apresentar as bandas como elemento participante numa narrativa que se desenvolve ao longo dos 6 programas. História policial que joga no absurdo mais completo. Participaram os GNR, Rádio Macau, Sétima Legião, Heróis do Mar e Xutos & Pontapés. Para além dos músicos foram actores Paula Monteiro, Rui Quaresma, Anamar, José Nascimento, José Pina, Pedro Leiroa, João Sodré, Inês Simões, Manuel Mozos, Cristina Vilar e Isabel Galhardo. A música incidental foi composta e executada por Pedro Bidarra. Manuel Mozos foi o assistente de realização.

VIVAMÚSICA «Magazine musical que vai para o ar quinzenalmente e é inteiramente dedicado à musica rock portuguesa incluindo também um noticiário de actualidades musicais. Serão igualmente divulgadas as posições no TNT (Todos No Top)».Programa da autoria de Jorge Pego, João Egreja e Manuel Medeiros. Produção de Manuel Medeiros e apresentação de Jorge Pego. Nasceu para fazer o aproveitamento dos telediscos que iam chegando todos os dias à RTP. O autor e apresentador era Jorge Pêgo que na mesma altura apresentava o programa "TNT - Todos No Top" na Comercial. Trabalhava em rádio desde o início da década de 70 tendo colaborado em televisão no programa "ligeirissimo" (1977) e na segunda fase de "Semi-Breves" (1979). Depois de ser convidado para fazer o programa sugere que o programa passe a apoiar a música portuguesa que vivia o emergente "boom" do rock português. O programa começa por ser transmitido, quinzenalmente, na RTP2. Graças à popularidade obtida o programa passa a ser transmitido, todas as semanas, pela RTP1. Os três primeiros programas foram apresentados na RTP-2. O primeiro programa foi dedicado ao Rock, o segundo à Banda do Casaco e o terceiro ao último álbum de Sérgio Godinho ("Canto da Boca"). No programa de 10 de Junho de 1981 (Quarta-Feira, RTP2) foram divulgados Banda do casaco ("No Jardim da Celeste"), Dina, Sérgio Godinho e Fisher Z. Depois de um intervalo, durante o mês de Julho, o programa retomou em Agosto passando a ser transmitido semanalmente na RTP-1 aos sábados ao fim da tarde. «O programa deve grande parte do seu êxito, numa primeira fase, ao empenhamento, à carolice e amor à música de uma equipa liderada por João Igreja e Manuel Medeiros. Ao ter feito mais de uma centena de telediscos com músicos portugueses contribuiu decisivamente para que se ouvisse mais música portuguesa. Os tempos do boom do rock português foram os tempos em que o programa esteve no cume mais alto da sua popularidade e aceitação.» afirma Jorge Pêgo Em 1986 começou uma segunda série com o trabalho de realização a cargo de Ricardo Nogueira. O programa tinha 25 minutos de emissão. Veio substituir o programa "Videópólis" de Alvaro Costa. Foi também a época em que começaram a ser transmitidos os programas do Europe Chanel e Music Box/Super Channel. «O projecto inicial tinha como objectivo prioritário de apoiar a divulgação da música portuguesa mas também considerava a música estrangeira. Não tem tido o indispensável suporte de meios técnicos que permitisse incluir a percentagem de produção nacional desejada O que levou a uma maior presença do material internacional. Pode ser que um dia a RTP dê à música outra importância» desafiou Jorge Pêgo em 1987. «Entre a primeira e a segunda séries de Vivamúsica passaram-se três anos. A segunda fase do programa duraria seis meses, e já lá vão oito desde que acabou essa série. [em Abril deste ano]. Estava para voltar em Outubro mas houve um atraso devido à passagem de produção interna para produção externa.» «O programa, nesta terceira série, inclui o top de vendas nacional. Além de Jorge Pego o programa passou a contar com a participação de Luís Montez. O programa contava também com a colaboração de João Gobern e de Luís Pinheiro de Almeida.»


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E NADA V SER COM Love Will Tear Us Apart... Again No princípio dos anos 80, em Manchester, criava-se uma revolução tranquila. Em Lisboa, Miguel Esteves Cardoso escrevia, António Sérgio divulgava, na RockHouse ouvia-se e os Sétima Legião nasciam. LISBOA... ERA DIFERENTE HÁ 20 ANOS Os circuitos, os ritmos, os locais. Mas também as pessoas. Criavam-se cumplicidades, secretas, a partir de consumos culturais. Fossem discos, filmes, livros ou... Manchester. Trocavam-se cassetes. Ouvia-se Joy Division, mas não se ouvia Donna Summer. Um círculo restrito ensaiava algo de novo. A música era um dos elementos de ligação, mas rapidamente transbordou para outros campos. Na rádio ouvia-se o "Rolls Rock" de António Sérgio, à noite iase à Rockhouse e ao Frágil, nos gestos e nas roupas tentava-se ser como Ian McCulloch, nas garagens ensaiavam-se os acordes de uma pequena revolução na música moderna feita em Portugal, e no Rock Rendez Vouz (RRV) expunha-se ao vivo os resultados das experiências. Directa ou indirectamente, o que sucedia em Manchester - e o legado pós-punk - marcava o que de mais estimulante acontecia na cidade. Na altura poucos sabiam; mas nada voltou a ser como antes.

ESTAR Rodrigo Leão, ex-Sétima Legião e Madredeus, actualmente com carreira a solo, recorda-se bem: "Coincidiu com o momento em que comecei a fazer música mais a sério. Éramos [Sétima Legião] putos quando gravámos, em 1982, o 'Glória'. Foi quando comecei a ouvir Joy Division, New Order ou Echo & The Bunnymen. Foi a última corrente musical que me despertou tanto interesse." Os ecos do que se passava em Inglaterra eram dados pelos textos de Miguel Esteves Cardoso (MEC) no "Sete", por artigos da imprensa musical da altura ("Música & Som", "Musicalíssimo", suplemento "Som 80", "Rockweek") e, mais tarde, em 1984, pelo "Blitz". "O meu contacto com a onda de Manchester, que identificávamos com as gabardinas, começou pelos textos do MEC - a coluna 'Bolas Para o Pinhal' no 'Sete' - e apanhei também ecos através do 'Rolls Rock'", confirma Jorge Ferraz, sociólogo e mentor de inúmeros projectos (Bye Bye Lolita Girl, Ezra Pound & A Loucura, Santa Maria Gasolina Em Teu Ventre, Acidoxibordel, God Spirou). "Mas o primeiro contacto com essa música surgiu através de amigos que importavam discos, via postal. Eram objectos raros, quase secretos. Aliás, todo o imaginário colado à música ajudava a uma ruptura com o meio onde estávamos. Todos mitificámos essas figuras. Enquanto músico, nunca me interessaram essas bandas, embora tivesse uma grande paixão pelos Joy Division em 1981 e 1982." Quem importava discos, via postal, era João Pinto, ao tempo a residir no Barreiro. Hoje é advogado, em Lisboa. "Não perdia os programas do Sérgio e chegava a ouvir o John Peel, mesmo com interferências", conta, acrescentando: "Comprava discos de importação numa loja do Imaviz, mas a maior parte mandava-os vir de Inglaterra. Foi uma época fantástica. Durante a semana juntava os amigos em casa, ouvíamos música e, aos fins-de-semana, íamos para Lisboa. Sábado de manhã, à Feira da Ladra, à tarde à Juke Box e, à noite, ao RRV. Dávamo-nos com gente de Campo de Ourique ou de Almada. Enfim, existia um círculo que partilhava o gosto pela mesma música. Depois, vestíamos de igual: de cinzento, gabardines, camisas abotoadas até cima, cabelo espetado, sapatos ingleses ou botas da tropa."


VOLTOU A MO ANTES 52/53

LER E OUVIR Ao tempo, a Rockhouse (a partir de 1982, Juke Box), ao Bairro Alto, era visita obrigatória. Na cabine de DJ estava Fernando Nabais, hoje ligado ao universo da net e da música, nomeadamente ao projecto O Homem Invisível. A leitura do "New Musical Express" era imprescindível, mas não só. "Eram sagradas as crónicas do MEC. Os discos chegavam através de um dos sócios do Eduardo, da Rockhouse, que vivia na Alemanha." A história de Rodrigo Leão não é diferente: "A música chegava-me através de amigos e quando alguém ia a Inglaterra aproveitava-se a deixa." À volta dos Sétima Legião gravitaram duas das mais importantes figuras dessa época - o músico e produtor Ricardo Camacho e MEC. O primeiro viria a tornar-se membro da banda, produzindo o primeiro álbum, "A Um Deus Desconhecido", manifestamente influenciado pelos truques de estúdio aprendidos com o amigo Vini Reilly. "O Camacho foi fundamental", refere Rodrigo. "Era fã dos Durutti Column, dos Joy Division. O Miguel era também amigo do Vini Reilly e captou o espírito da Factory na nossa música." Mas outros acontecimentos revelaram-se decisivos no alimentar da paixão: "Recordo-me de, em 1980, termos ouvido um dos primeiros singles dos U2 e do fascínio que provocou e, mais tarde, em 1982, quando fui ao Festival Vilar de Mouros ver Echo & The Bunnymen, U2 ou A Certain Ratio. Coincidiu com a fase em que começámos a ir para a Juke Box e é evidente que o princípio da Sétima está ligada a esse ambiente. Num dos primeiros concertos tocámos de gabardines, existia uma identificação." Até Dezembro de 1979, o programa "Rotação", da Rádio Renascença, era o veículo de divulgação do punk, new wave e pós-punk. Inclusive, de bandas portuguesas como

os Faíscas, Aqui D'el Rock, Minas & Armadilhas, Xutos & Pontapés e Corpo Diplomático. Em 1980 nasceu o "Rolls Rock". Ao leme destas iniciativas estava António Sérgio. "Havia uma loja ou outra, caso da discoteca do Carmo, onde pessoas esclarecidas importavam discos em pequenas quantidades. Mas a maior parte arranjava-os nas viagens trimestrais a Londres", recorda o responsável pela eclosão do conceito de "som da frente" (nome do seu programa de rádio posterior). "Nessa altura, divulgar música nova tinha um rótulo de militância e era objecto de admiração, até pelo país que Portugal era, onde o peso do antigo regime estava fresco." A música era elemento aglutinador, mas era um novo estilo de vida que se queria implantar e Sérgio tinha consciência disso: "As entrevistas dos músicos serviam de referência bibliográfica. Quando o Joe Strummer dos Clash falou do [Charles] Bukowski despertou-me a atenção. Mais tarde, os Manic Street Preachers levaram-me à Sylvia Plath. Existia esforço para acompanhar um comboio de cultura, de alegria de viver, que era irreversível. Não era só música, era uma maneira de pensar, que tem a ver com livros, filmes. Foi uma bóia de salvação, uma forma de dizermos 'vamos sair daqui', do marasmo dominante em Portugal." João Pinto também refere esse elemento de ligação: "Foi através da música que cheguei a Kafka, Mishima, Artaud, Duras, Coppola, Scorsese. Algumas das referências já nem me dizem muito, mas tudo aquilo fazia-nos sentir vivos. Existia uma curiosidade natural pelo mundo. Provavelmente tem a ver com o tempo da adolescência - que é algo que marca - mas existia um sentimento que estávamos a iniciar algo de novo."

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EDITAR Para suprir a dificuldade que era obter os discos, começam a surgir tentativas de implantar lojas, editoras, mecanismos de distribuição. As extintas Fundação Atlântica e loja Contraverso - "que nasceu da intenção de editarmos o Wim Mertens e a Isabel Antenna que pertenciam à Les Disques Du Crépuscule, associada da Factory", segundo José Guedes, hoje responsável pela distribuidora Última seriam dois dos casos mais conhecidos. Mas antes existiu a Cliché. Uma ideia de Rui Pavão, que o Y foi encontrar em férias na ilha de Porto Santo, na companhia de Ana da Silva das Raincoats - também elas modelos do pós-punk em Inglaterra. "Nos anos 80 regressei a Portugal, depois de ter vivido em Inglaterra. A minha mulher tinha tirado um curso de moda e, na companhia de uns amigos, pensámos em criar uma loja de roupa, mas depois a ideia evoluiu para um espaço misto com discos", conta Pavão. "Paralelamente, através de uma pessoa na América, que conhecia um tipo dos Material de Bill Laswell, pensámos em editar o grupo. Ao mesmo tempo, tínhamos contactos em Inglaterra através da Ana das Raincoats, que estavam na Rough Trade. Ou seja, tínhamos amigos que começaram a trazer discos, tudo ilegal. E foi assim que começámos a vender Young Marble Giants, Raincoats e Pig Bag. Mas era uma coisa pequena, não rendia." A Cliché editora acabou e a loja também não se aguentou, mas as sementes estavam lançadas. "Era um sítio onde se juntava malta jovem. Quase não consumiam, mas existia algo no ar. Era malta como o Rui Cunha dos Heróis [do Mar] ou gente que gostava de música, como o Ricardo Saló ou o Leonaldo de Almeida do Lux. O Cunha era grande devorador de revistas e o que se passava em Inglaterra não nos passava ao lado."

CRIAR Em Manchester, Liverpool ou Londres, Joy Division, Echo & The Bunnymen, Teardrop Explodes, The Sound, The Chameleons, The Fall ou Siouxsie & The Banshees eram adulados. No Porto, Ban ou Culto Da Ira representavam a geração cinzenta. Em Lisboa, no princípio dos anos 80, surgiam os primeiros sucedâneos dessas bandas inglesas. Na Av. de Roma, Alvalade, Campo de Ourique ou, na outra margem, em Almada, uma nova geração nascia, ao lado dos GNR ou Rádio Macau. Tinham nomes como Sétima Legião, Croix Sainte, Urb ou Dead Dream Factory e serviriam de embrião a outras que surgiriam nos anos vindouros, como Pop Dell'Arte, Mão Morta, Linha Geral, Jovem Guarda, Mler Ife Dada, Essa Entente ou Golpe De Estado. O Rock Rendez Vouz, ao Rego, era a catedral, mas na António Arroio, n'A Teia em Alcântara, no ISCTE, em BelasArtes ou nos liceus de Campo de Ourique existia algo a pulsar. "Fizemos os primeiros concertos no RRV, em Belas-Artes e no Liceu D. Leonor", recorda Rodrigo Leão. "Existiam bandas como os Croix Sainte ou os Urb, que frequentavam os mesmos circuitos. Recordo-me de ir a casa do Luís San Payo, então nos Croix Sainte, buscar amplificadores e íamos a pé com aquilo até ao RRV. Existia um entusiasmo muito grande. Estávamos a concretizar um sonho." O Dramático de Cascais acolhia os Clash, o Pavilhão do Restelo os Echo & The Bunnymen e Siouxsie & The Banshees e a Aula Magna os Durutti Column. Mas foi ao Rego, no Rock Rendez Vouz, que tudo parecia acontecer. Por lá passaram The Woodentops, Danse Society, The Sound ou The Chameleons, mas bandas portuguesas era coisa que não faltava. "Não existia um ambiente de tertúlia à volta deste consumo de música, embora os concertos do RRV tivessem sido importantes. Ia-se ver grupos portugueses, muitas vezes até sem quaisquer referências", lembra Ferraz.


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SAIR Aos sábados de manhã, a Feira da Ladra servia de ponto de encontro. Trocavam discos, criavam-se cumplicidades, arranjavam-se mais membros para a banda. "Vinham pessoas de Lisboa e arredores", recorda João Pinto. "Falava-se de discos, roupas, das viagens que se sonhava fazer a Inglaterra. Era ponto de passagem antes de irmos às 'matinées' da Rockhouse." Fernando Nabais refere o Chiado e a Av. de Roma como poisos habituais. "Parávamos nos cafés do Chiado. Também na Av. de Roma, no Vá-vá. Era lá que parava o pessoal dos Heróis e da Sétima, que ensaiavam no prédio em frente. De vez em quando, à tarde, ensaiavam no terraço e aparecia também o Zé Pedro e o Cabeleira dos Xutos." As memórias de Rodrigo Leão não são diversas: "Andava a estudar no Liceu D. Leonor. Ouvíamos música em casa uns dos outros, íamos ao cinema às famosas sessões do Quarteto, da meia-noite às cinco. À noite íamos para o Bairro Alto, para as tascas, como o Gingão, a Tia Alice e, claro, a Juke Box e o Frágil." À noite, a Rockhouse, o Café Concerto, a Ocarina e o Frágil funcionavam como pontos de encontro. À porta da Rockhouse estava Zé da Guiné, lá dentro os corpos movimentavam-se ao som de "Transmission" dos Joy Division ou "Temptation" dos New Order. Na cabine de DJ, Fernando Nabais. "Comecei como cliente, ia às 'matinées', gostava da música e tornei-me amigo do DJ Bruno. Estava sempre a chateá-lo para ele me dizer o que estava a tocar e, a certa altura, convidou-me a pôr música. Passava Joy Division, A Certain Ratio, Teardrop Explodes - a 'pop das gabardinas' como o MEC lhe chamava - e também aquelas coisas que os influenciavam, como Velvet ou Doors. Mais tarde, passei Rip Rig & Panic ou Pig Bag." Entre os clientes, gente da música, moda e artes. "Era um público exigente que não saía só aos fins-de-semana. Estavam em cima dos fenómenos em Inglaterra e preparavamse para a noite. Sair era um ritual. Recordo-me do António Variações, do Al Berto, do Lima Barreto, dos músicos dos Heróis do Mar antes da formação do grupo, do Rui Reininho quando viveu em Lisboa... À conta dessa aura, passavam por lá também os músicos estrangeiros, como o Vini Reilly ou os Echo & The Bunnymen."

VESTIR Não eram só os discos que interessavam que eram difíceis de encontrar. Também a roupa exigia imaginação. "Vestíamos roupa em segunda mão. Fornecíamo-nos na Feira ou nas Madames Bettencourt e Irene. As pessoas vestiam de preto, beije, cinzento, azul e castanho. Os sapatos eram um drama, tínhamos que pedir a alguém que fosse lá fora", explica Fernando Nabais. As gabardines eram fundamentais, mas não eram o elemento-chave. "O principal era, a partir de um elemento comum, atribuir-lhe um cunho de diferença", diz João Pinto. "Claro que era uma diferença partilhada, porque se não fosse assim não fazia sentido. Às vezes bastava um pormenor, como a camisa totalmente abotoada, um crachá, um penteado, para surgir identificação. O sentimento de pertença passava por aí. Mais tarde começaram a surgir designações como 'urbano-depressivos' ou 'vanguardistas', mas sempre me pareceu redutor. O que existia era gente, diferente entre si, que ansiava por algo de diverso, mesmo se, depois, por reacção, negasse esse período. O que é natural." António Sérgio partilha da mesma visão: "Não foi o meu caso, mas naturalmente quando nascem fenómenos deste género existe um acompanhamento no modo de vestir. Recordo-me de ver um concerto no pátio de Belas-Artes com a Sétima e os Croix Sainte e de olhar à volta e ver tudo de cinzento. Parecia-me soturno de mais, afinal aquilo era música pop." Música pop que organizava o que vinha de trás - Velvet, Doors, Can, punk - e que prenunciava o que viria a seguir - dança, hip-hop, dispersão, reciclagem, ambiguidade. Um período-charneira que em Portugal se veio a revelar decisivo para a implantação de novas formas de olhar.

ARTIGO PUBLICADO NO DIA 20.09.2002 SUPLEMENTO Y DO JORNAL PÚBLICO TEXTO DE VITOR BELANCIANO


«COM QUATRO ANOS SOBRE O 25 DE ABRIL, GRUPO QUE TOCASSE ROCK, ERA UM GRUPO DE GADELHUDOS E DROGRADOS. ÉRAMOS CORRIDOS DAS SALAS DE ENSAIOS NOS MOMENTOS MAIS DRAMÁTICOS, QUANDO ÍAMOS GRAVAR UMA MAQUETA OU FAZER UM ENSAIO PARA UM CONCERTO.» «NOS ANOS 80, HAVIA MAIS MILITÂNCIA E ISSO NOTAVA-SE NOS CONCERTOS, NO NÚMERO CONSIDERÁVEL DE MAQUETES QUE CIRCULAVAM NAS RÁDIOS. CHEGAVA A CASA, SINTONIZAVA O RÁDIO NA R.U.T. E OUVIA O MALHÃO TOCADO EM BIDONS POR UMA BANDA INDUSTRIAL DO BARREIRO, COISAS ASSIM, SURPREENDENTES. ALGUNS ANOS DEPOIS, APARECERAM VÁRIAS EDITORAS INDEPENDENTES QUE TINHAM AMOR À CAMISOLA, EDITAVAM UMA BANDA DESCONHECIDA EM QUE ELES ACREDITAVAM. MUITAS DESAPARECERAM PORQUE ESSES DISCOS VENDIAM MUITO POUCO E PERDIAM DINHEIRO. POR MUITO BOA VONTADE QUE TIVESSEM, HAVIA CONTAS A PAGAR.» «... ACHEI MUITO POSITIVO O FACTO DE AS PESSOAS COMEÇAREM A TOCAR DESCOMPLEXADAMENTE, A COMPOR EM PORTUGUÊS E A IR PARA A ESTRADA. ISTO FOI UM ASPECTO IMPORTANTE DESSE BOOM DO ROCK PORTUGUÊS, DEPOIS HOUVE O APARECIMENTO DO VELOSO, QUE TAMBÉM FOI IMPORTANTE...»


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«ENCONTRÁMOS UMA COMUNICAÇÃO SOCIAL MUITO ABERTA. ENTRE O QUE SERIA UM GUIÃO PREVISTO DE UM PROGRAMA DO JÚLIO ISIDRO OU UM PROGRAMA DO JORGE PÊGO OU DO LUÍS FILIPE BARROS, HAVIA UMA GRANDE LIBERDADE. TODA A GENTE PARTICIPAVA. ENTRAVA-SE NUMA ESTAÇÃO DE RÁDIO E UM DISCO TINHA FORTÍSSIMAS CHANCES DE SER OUVIDO. PASSAVA DE IMEDIATO PARA O PRATO.» «ERA FÁCIL GRAVAR UM DISCO, MAS TAMBÉM ERA MUITO MAIS FÁCIL NÃO GRAVAR MAIS NENHUM.» «NOS ANOS 80, NÃO HAVIA PROFISSIONAIS. HAVIA ATÉ A MODA DOS GRUPOS NÃO PROFISSIONAIS. ERA “BOM” TER OUTRAS CARREIRAS “PORQUE HAVIA MAIS AMOR À MÚSICA”, DIZIA-SE NA ALTURA. ERA BOM, PORTANTO, SER MÉDICO, ENGENHEIRO OU PINTOR.” «EU FUI MÚSICO DURANTE QUINZE ANOS. COMECEI A TOCAR EM PRINCÍPIOS DE 80, OU SEJA, PASSEI POR TODAS AS FASES: TIVE MÁS CONDIÇÕES, TIVE BOAS CONDIÇÕES, TIVE CONDIÇÕES PÉSSIMAS... TIVE COISAS MAL ORGANIZADAS.»

TODOS AS CITAÇÕES AQUI REFERIDAS FORAM RETIRADAS DO SITE : http://anos80.no.sapo.pt SECÇÃO - ARQUIVO SEPARADOR -COMENTÁRIOS


«E COMO TUDO QUE É A GENTE VÊ-A COMO U QUE SE PROVA, MASTI SEM DEMORA.»


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COISA QUE PROMETE, UMA CHICLETE, IGA E DEITA FORA Tテ々I



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EM ANEXO SERÁ ENTREGUE UM CD COM RECOLHA DE DADOS

DOCUMENTÁRIO - 24 HOURS PARTY PEOPLE ARQUIVO RTP- ANOS 70 - BANDAS IMPULSIONADORAS PERDIDOS E ACHADOS - PESTE&SIDA E CENSURADOS (SIC) ANOS 80 - MÚSICA ÊXITOS DE:

ALBATROZ / BAN / CÃES VADIOS / CENSURADOS / CRISE TOTAL / CROIX SAINTE CTT / DA VINCI / DELFINS / É MAS FOICE / ECOS DA CAVE / ENA PÁ 2000 FLÁVIO COM F DE FOLHA / GNR / GOLPE DE ESTADO / HERÓIS DO MAR / IBÉRIA IK MUX / IN LOCO / IODO / JÁFUMEGA / KÚ DE JUDAS / LINHA GERAL LOBO MEIGO / MÃO MORTA / MATA-RATOS / MLER IFE DADA / NZZN OPINIÃO PÚBLICA / PESTE&SIDA / POP DELL’ARTE / QUINTA DO BILL RÁDIO MACAU / ROQUIVÁRIOS / ROXIGÉNIO / RUI VELOSO / SALADA DE FRUTAS SÉTIMA LEGIÃO / SITIADOS / STREET KIDS / TÁXI TRABALHADORES DO COMÉRCIO / UHF / XUTOS&PONTAPÉS


ANOS

80 E O NOVO ROCK PORTUGUÊS

CADERNO DE PESQUISA REVOLUÇÃO 9


FACULDADE DE BELAS ARTES - UNIVERSIDADE DE LISBOA CURSO DESIGN DE COMUNICAÇÃO 3º ANO - 1º SEMESTRE

DC IV TIAGO FRANCEZ Nº 4798


ANOS

80 E O NOVO ROCK PORTUGUÊS


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