IAU USP TGI II Glicério: às margens - Ressignificando relações entre cidade, memória e água

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Instituto de Arquitetura e Urbanismo IAU-USP Trabalho de Graduação Integrado II

‘Glicério: às Margens’

Ressignificando relações entre cidade, memória e água

Comissão de Apoio Permanente (CAP) Prof. Dr. David Moreno Sperling Prof. Dr. Joubert José Lancha Prof. Dra. Lúcia Zanin Shimbo Prof. Dra. Luciana Bongiovanni Martins Schenk (orientadora)

Orientador do Grupo Temático: Prof. Dr. Tomás Antônio Moreira Tiffany Liu 2017



Agradeço às pessoas que caminharam comigo desde o início e àquelas que encontrei durante a jornada; e sem as quais não teria chego até aqui: Aos meus pais, pela compreesão e força; Aos companheiros de TGI, pelas conversas e pausas para o café; À Genos, pelo aprendizado constante; Aos amigos de longe e de perto, não tenho como lhes agradecer o suficiente; Ao Victor pelo companheirismo e apoio. Obrigada!


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NDICE

INQUIETAÇÕES Estrangeiro Homem e Metrópole Homem e a Natureza

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SÃO PAULO A Cidade e os Rios Levantamentos


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PROJETO Caminhar Diretrizes Narrativa Considerações Finais

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ANEXO Fichamentos Referências Bibliográficas Pranchas



INQUIETAÇÕES INICIAÇÃO Se vens a uma terra estranha curva-te se este lugar é esquisito curva-te se o dia é todo estranheza submete-te — és infinitamente mais estranho. Orides Fontela



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ESTRANGEIRO

estrangeiro = estranho = extra (fora)

As inquietações sobre o tema de TGI surgiram de modo a tentar externalizar sentimentos de deslocamento e não pertencimento dentro de uma sociedade. A busca pelo estrangeiro vem tanto de uma matriz pessoal, como também de inquietações no âmbito fenomenológico da arquitetura no que se diz aos sentimentos de desconforto e desnorteio dentro de uma cidade. Segundo as origens semânticas da palavra “estrangeiro”, esta possui as mesmas raízes do “estranho”, que por sua vez tem a mesma etimologia de “extra”: o que é de fora, que não pertence, que não compartilha. Sendo assim, uma maneira de entender o que é ser um estrangeiro vem da noção de não-pertencimento evoluído para o estranho. Pode se considerar estranho em relação à um grupo ou sociedade. Esse processo é evidenciado nos escritos de Clarice Lispector, sua condição como imigrante se reflete em sua literatura, onde ela distorce a compreensão do real. Em particular no livro Legião Estrangeira, o objeto é desbanalizado trazendo na narrativa a singularização; o que

À esquerda: Registro de Imigração da minha avó paterna


nos permite ver o banal com outra lente. O livro apresenta uma atemporalidade em sua narrativa que infere uma generalidade e representatividade das personagens que nunca acham seu lugar, de uma multidão de estrangeiros: crianças, velhos, loucos, animais; elementos na sociedade que são o não pertencimento, o outro o externo de nós. Traz deste modo a perspectiva do outro, ampliando, trazendo o de fora para dentro, o de dentro para fora. Alargando assim o próprio horizonte e abraçando diferenças ao reconhecer que todos somos estranhos. (JAFFE, 2016) De maneira a entender as diferentes maneiras em que se pode abordar o tema, os conceitos de teoria da arte do Formalismo Russo trazem questões importantes a serem consideradas. O conceito de ostranenie de Viktor Chklovsky em “A Arte como Procedimento” traz o estranhamento como ferramenta fundamental para a produção artística, um método que singulariza e traz nova luz ao objeto. Para ele, o proposito da imagem não seria sua rápida assimilação, mas a criação de uma visão. Adquirindo assim uma nova perspectiva onde o estranhamento é essencial à produção artística, esse processo traz um novo olhar ao objeto: pela desbanalização, este consegue assim ser digerido de outra maneira, como se estivesse sendo visto pela primeira vez. “O objetivo da arte é dar a sensação do objeto como visão e não como reconhecimento; o procedimento da arte é o procedimento da singvularização dos objetos e o procedimento

O livro apresenta uma atemporalidade em sua narrativa que infere uma generalidade e representatividade das personagens que nunca acham seu lugar, de uma multidão de estrangeiros


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Ă€ esquerda: Snow Storm, Hannibal and his Army Crossing the Alps, William Turner. 1812. Acima: Wanderer Above the Sea Fog, de Caspar David Friedrich. 1818.


que consiste em obscurecer a forma, aumentar a dificuldade e a direção da percepção.” Viktor Chklovsky Sob o ponto de vista da psicanálise, o Unheimlich de Freud - que pode ser grosseiramente traduzido como “O estranho familiar” - traz para a questão estética uma nova categoria que expressa uma ruptura da realidade cotidiana. Questionando-a, o sujeito suscita uma sensação de angústia que alguns chamam de ‘sublime’, o fantástico inserido na realidade. Isso causando um desnorteio nas noções previamente estabelecidas do indivíduo. Há, portanto, um processo de descolamento do que nos é cotidiano, uma externalização do que entendemos por “mundo organizado” de acordo com Fernando Fuão. Assim, podemos - através do desnorteio – trazer a singularização e desfamiliarização do anteriormente banal. Sob uma perspectiva da percepção espacial, que é evidenciada através das sensações, Merleau-Ponty traz estudos que abrangem a sensação como uma experiência, trazendo o corpo como norteador espacial. O espaço é compreendido não somente pelo corpo, mas também com a extensão deste, deste modo, o entendimento não é encontrado preexistente no mundo, mas é produto da atividade do corpo no mundo. Deste modo, um espaço só tem valor quando é vivenciado pelo indivíduo, por isso sua elasticidade de tempo e significado sob influencia do próprio sujeito. O estranhamento tem um papel importante nos questionamentos contemporâneos sobre arquitetura, paisagem


e cidade, onde tensiona conceitos e estabelece paralelos entre a vivencia do indivíduo nas cidades e fatores socioeconômicos e históricos.

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Labirinto como a epítome do desnorteio espacial: Ainda refletindo sobre as questões de percepção no meio, tem-se o labirinto como ápice deste descolamento do cotidiano: ”O labirinto expressa o mundo existencial, simboliza o inconsciente, o erro, a errância e o distanciamento da origem da vida. A qualidade de perdido que determina a particular psicologia do paraíso relaciona-se com o sentimento geral de abandono e de queda que o existencialismo reconhece como estrutura essencial no humano, como afirmou Jean-Eduardo Cirlot. Para ele o tema de se perder e tornar a se encontrar.” Fernando Fuão

Hélio Oiticica. Invenção da cor penetrável (1977)



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HOMEM E METRÓPOLE Cena do filme Metropolis de Fritz Lang 1927.

A metrópole é um espaço onde se vivencia o desnorteio e o estranhamento de maneira intensa. De acordo com Ana F. Alessandri Carlos, o processo de reprodução do espaço na metrópole tende à destruição dos referenciais urbanos, onde existe uma constante atualização em busca de um ideal de “modernidade” que constrói cidades sobre cidades: a cidade palimpsesto, em constante transformação que nem sempre é acompanhada pelo indivíduo. As práticas urbanas acabam sendo diretamente afetadas e causam confusão e perda de identidade com o entorno no indivíduo, fragmentando essa noção de referenciais individuais, o espaço e simultaneamente, a fragmentação da identidade como memória social através desta perda de elementos norteantes na cidade. O estranhamento se torna o resultado dessas mudanças quase que instantâneas na paisagem da cidade, e “produzem as possibilidades que atestam o empobrecimento das relações de vizinhança, a mudança das relações dos homens com os objetos que lhe são próximos e o esface-


lamento das relações familiares” (CARLOS, p. 13, 2007) Assim, a relação entre cidade, sociedade e indivíduo sofre um processo de reprogramação para a vivencia na metrópole. Uma habitação marcada pelo desnorteio provocado pela ausência de referenciais que resistam à temporalidade da urbanidade contemporânea. Esse processo acaba gerando espaços amnésicos, vazios de uso e carentes de relações sociais na cidade. Deste modo, a interiorização da vida se reflete no constante movimento de introspecção dos espaços traz lugares de apropriação cada vez mais herméticos e segregados, onde o espaço interno é privilegiado em detrimento do urbano tornando o viver na cidade mais limitado e movimentos de apropriação cada vez mais raros. (DIAS, 2005) Quando visto de uma escala local, os trajetos e percursos traçados pelo indivíduo no seu cotidiano trazem em si uma apropriação marcada pelo corpo no espaço. Que se mostra uma apropriação de fato real e concreta. Paola Berenstein Jacques questiona o processo de espetacularização das cidades contemporâneas através de uma “micro-resistência” que através do perder-se e se reorientar na cidade consegue enriquecer a experiência do indivíduo no contexto urbano. As errâncias implicam em um andar mais lento e observador pelos espaços, uma presença do corpo na cidade, uma “corpografia”. Esse território se modifica pelo uso e ocupação desses corpos nele. ”Os urbanistas indicam usos possíveis para o espaço

O processo de reprodução do espaço na metrópole tende à destruição dos referenciais urbanos, onde existe uma constante atualização em busca de um ideal de “modernidade”.


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O filme ‘Her’ se passa em uma Los Angeles utópica. Apesar do ambiente futurista exacerbar algumas situações, a discussão presente no filme é extremamente atual. Este levanta questionamentos existenciais sobre solidão e isolamento do indivíduo em uma sociedade cada vez mais introspectiva. Cena do filme “Her” de Spike Jonze. 2013.


projetado, mas são aqueles que o experimentam no cotidiano que os atualizam. São as apropriações e improvisações dos espaços que legitimam ou não aquilo que foi projetado, ou seja, são essas experiências do espaço pelos habitantes, passantes ou errantes que reinventam esses espaços no seu cotidiano.” (Paola Berenstein Jacques – Corpografias Urbanas) A cidade mais vivida é aquela que não sofre influencia dessa espetacularização, mas sim do próprio indivíduo nela, uma domesticação do seu espaço. Na errância como prática de experiência urbana, tira-se desse experimento uma compreensão mais profunda da cidade que vai além de um traçado no mapa. Esse processo pode ser visto através dos elementos que a autora chama de territorialização, desterritorialização e reterritorialização aplicados pelo sujeito errante. Esse sujeito tem mais interesse na prática de se perder, ou o desterritorializar. Essa transição entre territorializar e reterritorializar traz o realce de outros sentidos além da visão e traz uma percepção mais intensa. Esse processo pode se encontrar dentro dos outros elementos, sendo o desterritorializar intencional que traz realce à figura do errante que consegue constantemente refazer o processo de se perder e por consequência desbanalizar o ordinário, esse indivíduo possui padrões de deslocamento fora do caminhar intencional que fazem com que este tenha uma constante busca por referencias espaço-temporais, o que o leva à lentidão (JACQUES, 2008). O que isso traz é uma ruptura no andar rápido e alienado

“ A dimensão corpórea constitui-se na relação dialética com o percebido, que se faz corpo, estranhamento e reconhecimento daquilo que nos olha. A cidade pode ser compreendida como


termo que nos olha, memória fracionada sempre perdida retomada pelo hábito e por um campo de imagens que a modela. Inquietar o ver é então romper seu confinamento em relação a essas condições já constituídas.” Luciano B. da Costa

criando mudanças na própria noção de tempo e inserção no território. Como afirmado por Jacques, a corpografia como ato de resistência se põe como alternativa ao modo do indivíduo encarar sua vivencia na metrópole ditada pelo capital, uma experiência que se impõe nas relações sociais e prefencia o individualismo e a mercadoria, exacerbando o sentimento de solidão na cidade

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Foto: Edna Marques. Brasília. 2015


HOMEM E A NATUREZA Em “Técnica Espaço Tempo – globalização e o meio científico informacional”, Milton Santos tensiona a relação dúbia que o sujeito possui com a natureza. Relação inicialmente simbiótica e que se torna cada vez mais hostil com o tempo. Causando uma transição da natureza amiga, aquela que nutre e dá os frutos para a sobrevivência até uma natureza hostil que se manifesta de maneira destrutiva dentro das cidades. Essa transição se dá a partir do momento em que o homem se torna transformador do espaço ao seu redor de maneira cada vez mais abrangente e intensiva, ou como diz Santos, “o homem se torna fator geológico, geomorfológico, climático”. As mudanças (quase) sempre planejadas no espaço vivido pelo homem entram em conflito com os modos da natureza que são imprevisíveis e momentâneos, os quais o homem sabe lidar gradativamente menos com a natureza. Dentro da lógica de produção, a necessidade da prática comercial atrelada ao uso de recursos, trouxe a o longo da história novas maneiras de se entender espaços, e

Water: Salinas #2, Cádiz, Espanha. Edward Burtyinsky Markarfljót River #1, Erosion Control, Islândia, 2012 Nickel Tailings, Sudbury, Ontario, 1996 As fotografias de Burtyinsky mostram espaços que foram modificados pelo homem de maneira drástica e muitas vezes irreversível, o tamanho dessas intervenções é assustador e levanta questionamentos sobre a cultura do consumo e a fragilidade dos recursos naturais


uma revisão de desejos e necessidades dentro de uma sociedade. Hoje, com a globalização as sociedades se encontram sujeitas a esse modelo que “se sobrepõe à multiplicidade de recursos naturais e humanos” (p. 6, SANTOS, 1990) Deste modo, a atual relação do homem com o território é conflituosa e distante. O indivíduo tem dificuldades de se relacionar com o ambiente ao redor, sente-se deslocado e o ambiente lhe é estranho. Cercado de afirmações e reafirmações midiáticas de preservação de algo distante que este não possui nenhuma familiaridade, o meio-ambiente tratado como espetáculo. A natureza continua assim se distanciando cada vez mais da nossa sociedade atual e reflete, segundo Milton Santos, a ausência de um sentido comum, de uma Moral.

Dentro da lógica23 de produção, a necessidade da prática comercial atrelada ao uso de recursos, trouxe a o longo da história novas maneiras de se entender espaços



SÃO PAULO

SÃO PAULO DA GAROA

Tonico e Tinoco

Como o tempo passa, como o tempo voa, Neste meu São Paulo, terra da garoa. (bis)

São Paulo de dante, que o bonde corria, Na ruinha estreita, na garoa fria. O luar de prata que não vorta mai, Minha serenata no bairro do Braiz. (...) Como o tempo passa, ... A Light que acende lá nas marginais, Viaduto se estende, tá crescendo mais. Como o tempo passa...


A area se insere no Centro de São Paulo, entre as subprefeituras da Sé e Liberdade. A seguir serão discutidas as relações históricas entre os corpos d’água e a cidade, em especial na região da Várzea do Carmo.


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A CIDADE E OS RIOS Encarando a paisagem como construída e formada pelos anos de maneira coletiva, a cidade pode ser lida como uma montagem de tempos acumulados. Essa construção da cidade pela sociedade é constante e portanto sempre transformando-se. Os mapas mostrados a seguir são uma tentativa de cartografar de modo a evidenciar os processos sociais e de territorialização (BESSER, 2014) ocorridos no decorrer dos anos na Várzea do Carmo e, consequentemente em São Paulo. Nota-se um processo de urbanização rápido e violento (CARLOS, 2007) que consolida uma hierarquia social na cidade que se traduz em desigualdades espaciais e diferenças na paisagem de maneira brusca.


Mapa hídrico do município à esquerda , e os corpos de água presentes na área.




O território inicial do que veio a ser conhecido como São Paulo, ou São Paulo de Piratininga foi escolhido por se localizar em uma imensa clareira natural na floresta e por propiciar cursos de água abundantes na região, sendo as margens as áreas mais povoadas pelos índios, e posteriormente também pelos jesuítas. Desde o início, o rios tinham um papel importante na vida de seus moradores. O Tamanduateí e o Tiete sendo altamente navegáveis naquele tempo, eram utilizados para fins comerciais e de lazer, relatos sobre essa relação remontam ao século XVIII, onde o Tamanduateí é destacado como “o único recreio e divertimento do povo dessa cidade” (BRUNO, in: (SILVA, 2014, p. 29), onde marcava também o uso rotineiro dos moradores, através do uso para o banho e lavagem de roupas. “Da Rua Glicério e de toda a encosta da colina central da cidade, desciam lavadeiras de tamancos, trazendo trouxas e tábuas de bater roupa. À beira da água, juntavam a parte traseira à dianteira da saia, por um nó no apanhado da saia, a qual tomava aspecto de bombacha. Sugavam-na pela parte superior, amarravam-na à cintura com barbante, de modo a encurtá-la até os joelhos ou pouco acima, tomando agora o aspecto de calção estofado. Deixavam os tamancos, entravam n’água e debruçavam-se sobre o rio, sem perigo de serem mal vistas pelas costas.” (AMERICANO, 1957 in: SANTOS) Sobre esse uso, Carlos José Ferreira Santos, afirma em “Várzea do Carmo: lavadeiras, caipiras e pretos véios” que a várzea do Carmo se constitui como um espaço

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rico de manifestações socioculturais de camadas ostracizadas na cidade de São Paulo desde sua constituição. Aquela várzea era cenário de uma rica expressão dessas camadas, como viviam e como utilizavam a cidade, o que muitas vezes, ia de desacordo com as normas e códigos desejados, uma vivencia marginal. É importante ressaltar a qualidade cênica do rio. De acordo com Maria Luiza Ferreira de Oliveira, no que se concerne a produção artística da São Paulo no período do século XIX, a região da várzea do Carmo era repetidamente objeto de estudo, a cidade era “representada a partir de seus caminhos e rios” (OLIVEIRA, 2003). Isso se dava pela área resgatar um bucolismo retratado repetidamente em aquarelas e pinturas. As vistas panorâmicas evidenciavam os cursos dos rios, em especial a Estrada para o Mar e a várzea do Carmo em primeiro plano. O tropeiro também foi representado, seu chapéu de aba larga, ponchos, e os animais. As mulheres, sempre lavadeiras, carregando cestos de roupa nas cabeças. São Paulo é retratada nessa época justamente por uma população que faziam questão de esconder, mas que evidenciavam o nítido contraste dos processos de urbanização da cidade. E que continuou sofrendo transformações ao longo do século, gradativamente, a atenção foi também se virando dos rios para mostrar uma São Paulo cada vez mais industrializada. Sob um ponto de vista econômico, o rio era de vital importância nos primeiros séculos. A sua navegabilidade trazia a conexão de São Paulo com o bandeirismo e era


beneficiada pela proximidade com a nova capital no Rio de Janeiro. No século XVIII e XIX, o Tamanduateí já se estruturava como ponto nodal comercial por fomentar o comércio do principal porto da cidade, o Porto Geral. Comercializava-se mercadorias produzidas pelas populações ribeirinhas, produtos das olarias dos arredores. Ao lado do porto, foi construído um armazém para proteger tais mercadorias. São Paulo era um ponto de parada comum na província, provia aos viajantes hospedarias localizadas em chácaras na periferia imediata da cidade e transporte na forma de mulas descansadas e pastos. Até 1836, São Paulo ainda era uma cidade pequena de 22 mil pessoas, as mudanças se iniciam no século XIX, mas somente tomam força a partir do início do século XX. O crescimento urbano nesse período se configurou por construções no sentido da Igreja da Consolação, “na margem esquerda do Anhangabaú e nos bairros da Mooca e Ipiranga, na direção do caminho do Mar. “ ((SILVA, 2014). Caminho esse que os estudantes da faculdade de direito percorriam para retornar às suas cidades. Esse crescimento, apesar de comedido até então, traz a necessidade de urbanização dessas novas áreas, muitas delas que eram mais vulneráveis à natureza. Mostrando que, a relação com o rio e seus moradores sempre foi conflituosa, tem-se registros de solicitações por parte da população para resolução dos problemas das cheias do Tamanduateí. Em 1810 realiza-se a primeira de muitas obras no rio com o intuito de melhoria da drenagem: a construção de

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uma vala para conter o espraiamento das aguas, sendo que a primeira discussão que se tem registrada sobre o rio é de 1821, as cheias do Tamanduateí foram discutidas, porem por falta de verbas, nada de imediato foi realizado, até 1841 quando estudos foram realizados sobre a retificação do rio, e em 1848, obras de canalização são feitas e a Rua 25 de Março é inaugurada às margens do Tamanduateí. Essas obras tiveram como consequência a perda da navegabilidade do rio.




Jacob Penteado narra sua infância no livro Belenzinho 1910, nesse trecho ele relata um passeio ao Marcado Municipal: ”Todas as semanas, eu e tia Romana íamos ao Mercado Municipal, antes Mercado Grande, na Rua 25 de Março, ao pé da Rua General Carneiro, antiga Ladeira João Alfredo. Ao seu lado, já nos terrenos da várzea, havia o chamado Mercado Caipira onde ficavam os vendedores de farinha de mandioca, milho, doces de frutas, aves domésticas, papagaios, araras, macacos, ouriços, ervas medicinais, etc. Defronte da Ladeira Porto Geral saía o trenzinho da Cantareira [...] Um belo passeio, pois atravessávamos a várzea inteirinha, então cheia de valetas, lagoas e mato bem alto.” O Mercado Caipira e o antigo mercado sobrevivem até 1890, sendo substituídos pelo Mercado Municipal. As mudanças no final do século XIX começam diretamente ligados à ascensão da economia cafeeira no país. A época da “Metrópole do Café” se inicia com forte influencia do mercado internacional sobre a cidade. Investimentos de capital estrangeiro e uma forte onda imigratória no período de 1890 à 1914 (SILVA, 2014) são essenciais para a estruturação do que conhecemos por São Paulo dos dias de hoje. A relação da cidade nas ultimas décadas do século XIX com o rio vai continuar complicada. Os ideais sanitaristas foram deixadas de lado em favor à uma linha de pensamento desenvolvimentista que promove a construção de infraestruturas básicas para o crescimento da cidade, mas que também instaura de maneira forçosa a comer-

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cialização da água, que até então era feita por chafarizes públicos e nascentes. Além disso, com uma descarga de água cada vez maior, e ameaçando o represamento das águas no canal do Tiete. Os problemas se agravavam à medida que a cidade ia crescendo e a questão das áreas de várzea são ignoradas, culminando em 1887 com a primeira das numerosas enchentes históricas na cidade. (idem) A construção da malha ferroviária para facilitar o escoamento do café produzido no interior do país para o porto de Santos foi uma ação pivotal para o estabelecimento da urbanização das áreas de várzea do Tamanduateí, já nas ultimas décadas do século XIX (MONTEIRO, p. 19) pela instalação de indústrias em sua extensão e logo em seguida de moradias de trabalhadores destas mesmas indústrias nas redondezas. A cidade tem seu primeiro grande surto urbanístico nesse período dobrando o número de habitantes.

Benedito Caxlito, 1892 mostra-se as indústrias surgindo, assim como a linha do trem e, nas áreas de várzea a grande inundação




”O aspecto do velho núcleo urbano modificava-se com a construção de casas de vários andares, a antiga cidade transformava-se num bairro de negócios que as grandes famílias deixavam aos poucos para construir em bairros novos. Após 1890 o impulso para oeste, [...] acentuou-se ainda mais quando Nothmann teve a idéia de lotear os terrenos situados no flanco da colina que desce docemente do espigão de 815 m. [...] esse loteamento de Higienópolis, [...] fez concorrência aos Campos Elíseos, onde a boa burguesia já apreciava menos a vizinhança das vias férreas, com suas estações e sua fumaça” (MONBEIG, 2004 in: SILVA). Os bondes elétricos são instalados na cidade em 1901, criando aglomerados urbanos que se estruturavam ao redor das estações (FRANCO, in: MONTEIRO) e de novo reafirmando o investimento de capital estrangeiro na cidade. Portanto, pode-se entender o crescimento na época por três vertentes: densificacao da área central, nas proximidades das estações, e no loteamento de áreas periféricas para uso rural da cidade que, segundo Monteiro, solidificou o padrão periférico de expansão da aglomeração urbana de São Paulo (p. 23), onde os espaços dos rios e paisagens submetem-se ao longo dos anos à lógica de valor que invisibiliza os processos naturais até então presentes na cidade. Segundo Silva, em 1905 a região da várzea do Carmo já apresentava leito regularizado e margens tratadas. As reformas sobre o rio Tamanduateí se estendem por vinte anos. Em 1911, a avenida que o margeia é nomeada

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São Paulo 1947 - Dimitri Kessel


Avenida do Estado, em 1914 a canalização do rio já se estendia desde sua foz no rio Tiete até o bairro do Cambuci; e em 1916 se inaugura o leito artificializado do Tamanduateí. O projeto do Parque Dom Pedro II é feito por Joseph Bouvard e o parque concluído em 1922, este reflete os desejos de uma São Paulo de aparência “europeia” (SILVA, 2014. p. 42) que refletisse a “Metrópole do Café”. Assim, há uma europeização nas reformas urbanísticas e a criação de bairros voltados para a burguesia cafeeira, enquanto se estabelece a moradia de operários nas proximidades das indústrias, que por sua vez preferenciavam uma localização vantajosa na questão do transporte ferroviário. Tem-se, portanto, uma urbanização pautada pela ferrovia, a especulação imobiliária e a industrialização. (idem, p. 47) A Crise de 1929 reduziu as atividades rurais e intensificou a industrialização, o que trouxe mais visibilidade para a cidade, além de acelerar os processos migratórios de mão-de-obra para a região sudeste do pais. Os processos já em vigor trouxeram anos depois em 1930 o início da implementação do Plano Prestes Maia, plano radial-perimetral planejado para toda a área central e a canalização e instalação de avenidas nas margens dos rios e parkways. Este trouxe mudanças bruscas em particular para o rio Tamanduateí, que segundo Silva modificou não só a paisagem, mas também seu significado social. O início das obras do Plano se iniciam em 1940 e marcam o início de uma nova relação do rio com a cidade




A região do Parque Dom Pedro II em 1970. Fonte: PMSP/SMC/AHSP (2013).

As intervenções urbanísticas também se deram de tal modo que influenciaram o estabelecimento das atividades terciárias para a região sudoeste, segundo Rolnik. O vetor oeste de urbanização da elite se solidifica e expande em direção à marginal pinheiros (HIRATA, 2008) e no processo, abandona a região central, simultaneamente, a região do vale do Anhangabaú sofre reformas de modo a se tornar a mais nova imagem da cidade. Outras intervenções urbanas são realizadas na região central, como a reforma da praça da sé e do largo São Bento como tentativas de manter a valorização imobiliária na região. Enquanto isso, a moradia popular segue na porção Leste de São Paulo, e é notada pela verticalização na produção de quitinetes na região do Glicério. De acordo com Fátima Guedes, quando analisando os perfis de ocupação de Santo André, nota-se que as áreas com proximidade com o Tamanduateí não possuíam apelo imobiliário das classes mais altas por serem sujeitas às enchentes constantes e das barreiras físicas formadas pelo rio e pela ferrovia, estabelecendo um vetor de crescimento sentido sul. O período pós segunda guerra foi marcado pelo fortalecimento da indústria nacional. Em São Paulo isso acarretou na expansão populacional, o que dinamizou o mercado imobiliário, principalmente em áreas atreladas à mobilidade: nas ferrovias, linhas de bonde, e mais recentemente, de ônibus. E em 1950 São Paulo atinge a uma população de mais de 2 milhões de habitantes, sendo que no período de 40 à 50 há um crescimento de

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65% (SILVA, p.51). Uma nova onda de migração ocorre na década de 60 influenciada pela construção da nova capital e toda uma rede de infraestrutura viária para conectar o país. Isso traz como consequência para São Paulo além da expansão populacional, a necessidade de infraestruturas que conectassem a malha urbana. Nos anos 70, a cidade, juntamente com outros municípios do entorno eleva-se à condição de metrópole, chegando a mais de 8 milhões de habitantes. A urbanização nessa época foi pautada pelo Plano Urbanístico Básico (PUB), que realizou obras como o Elevado Costa e Silva (Minhocão) em 1971, a radial Leste-Oeste, com os viadutos Alcântara Machado, Glicério e 21 de Março. Essas iniciativas se provaram ter um efeito de fragmentação da área da várzea do Carmo. O parque Dom Pedro II “foi retalhado e ilhado por um complexo de viadutos” (BARTALINI in: SILVA, p. 54) Nos anos 80, a população continua crescendo, e a promulgação da Nova Constituição Federal de 1988 traz o início de uma prática de politicas urbanas em âmbito nacional que obriga todas as cidades com mais de 20 mil habitantes a possuírem um Plano Diretor indica a transição do país para uma realidade urbana sobre a rural. Sob uma perspectiva mais pontual, São Paulo se submete ao modo de produção das metrópoles globais, e destina a maior parte de seus recursos públicos à investimentos econômicos, deixando de lado investimentos sociais.




PROJETO


GLICÉRIO A região da baixada do Glicério é uma área compreendida pela porção sul da várzea do Carmo inserida na subprefeitura da Sé, entre os distritos da Liberdade e Sé. Ela se destaca na paisagem e no desenho da região central de São Paulo. A designação de áreas na região como Zona Especial de Interesse Social na década de 70, trouxe uma paisagem nessas áreas que não mudou drasticamente ao longo dos anos; significando um deslocamento da região da lógica geral da metrópole. Espacialmente isso se traduz por um bairro de sobreposições de edifícios gabarito alto com edifícios térreos e um desenho irregular de ruas. Isso não significa que a área passou intocada, mas de certo modo, marginalizada. A instalação agressiva da Radial Leste – Oeste, trouxe descontinuidade da malha urbana, produziu vazios. Enquanto o movimento da mudança das indústrias para a periferia e cidades do entorno descaracterizou um bairro majoritariamente composto pelos trabalhadores fabris, cujos edifícios sofrem


um processo gradativo de encortizamento, além de pressões de gentrificação das áreas do entorno. Segundo Andre Luis Canton, o processo de valorização imobiliária que vem ocorrendo na área nos últimos anos tem se caracterizado pela demolição das Vilas já em processo de degradação e liberação do terreno para novas edificações, atrelado a um processo de mudança no uso e ocupação do espaço, no modelo similar aos processos em ação na região da Luz. O autor denomina as ações de preservação da área contraditórias já que acabaram por realizar o contrario ao agravar o processo de degradação dos edifícios. Especula-se a possibilidade de congelamento para futura valorização imobiliária, o que é preocupante considerando o caráter residencial da área. Demograficamente, apresenta segundas, terceiras gerações dos processos migratórios ocorridos nas ultimas décadas, assim como um novo afluxo de imigrantes, em sua maioria vindos da América Latina. O território na porção norte apresenta moradores de médio padrão em sua maioria e é extremamente densificada, tanto devido ao conjunto de quitinetes construídas nos anos 50 mas também por uma nova onda de edifícios que ocupam principalmente a Rua Glicério. Essa área norte também possui um número maior de serviços e comércios. A porção sul apresenta uma ocupação menos densa, mas também diversa pelos grupos sociais e usos.


Densidade


Sobrepôs-se o mapa de cheios e vazios com o levantamento de áreas de estacionamentosna área. Pode-se notar a escassez de espaços livres na área e a fragmentação da malha pelo viaduto.

edificações estacionamentos Cheios, Vazios e Estacionamentos


O mapa espacializa as questões de presevação e encortizamento, assim como visualiza os edificios antigos da região.

Cortiços, ZEIS e vilas


Ponto de Ă´nibus Ciclovia MetrĂ´ Vias Viaduto

Mobilidade



MORADORES E MOBILIZAÇÃO SOCIAL A região possui uma forte mobilização social, iremos discorrer sobre algumas delas e seu papel na região. A Organização Auxílio Fraterno (OAF) distribuía na década de 70 um sopão semanal, cujo alimento era retirado das sobras da feira livre das imediações e que tinha a participação ativa dos moradores de rua. Com o tempo outras iniciativas foram se consolidando na área como a Associação Minha Rua Minha Casa, a escola de marcenaria Casa Cor da Rua, e projetos como o Hotel Social e Aluguel Social (HIRATA, 2011). Além disso, o Movimento Nacional da População de Rua surge na área e ganha força no início dos anos 80, apesar de já se mobilizarem como coletivo desde os anos 60, hoje conta com um Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento, cujo objetivo é garantir o cumprimento da Política de atenção à população em situação de rua (Lei 12.316/97), essa também fruto do coletivo. A mobilização dos catadores de recicláveis surgiu concomitante a um evento organizado pela OAF, cujo encontro incentivou a formação de um grupo de catadores que decidem trabalhar de maneira coletiva, visando maiores lucros com a atividade. A Associação cresce nos próximos anos, mas perde a força no Glicério com a saída da MNCR para a Vila Mariana. A atividade


hoje em dia é mais difundida e aceita, e muitas cooperativas têm parcerias com as instituições do entorno, mas a ameaça de expulsão territorial por interesses imobiliários é uma realidade em muitos casos, inclusive para o Glicério. Em Março de 2017, a Cooperglicério foi ameaçada de despejo pela prefeitura, localizada atualmente no baixo do viaduto Leste-Oeste. A mobilização religiosa é também forte na região, além da OAF, há a Província Franciscana da Imaculada Conceição, o Recifran e a Igreja Nossa Senhora da Paz. Fundada em 1936 por padres Scalabrianos acompanhando imigrantes oriundos da Itália. A igreja atualmente realiza um importante papel no apoio e acolhimento de imigrantes na cidade de São Paulo, a Casa do Imigrante conta hoje com uma infraestrutura que inclui alojamento para até 110 pessoas, refeitório, lavanderia, bagageiro, 2 salas de TV, primeiros socorros, além de atividades de lazer, oficinas e comemoração de datas religiosas e culturais. A instituição acolhe imigrantes, migrantes, dentre outros, de maneira temporária e desde o seu início já abrigou europeus, asiáticos, nordestinos e atualmente latino-americanos; tem a participação de catadores e moradores de rua em seus eventos e oficinas por eles mesmos serem muitas vezes migrantes de outros estados e terem contato de um modo ou de outro com a associação. Recentemente, uma iniciativa relevante para a região foi organizada pela ONG Cria Cidade. Esta realizou um projeto de dois anos com as crianças em parceria com as escolas da área. Dentro desse projeto, inúmeras ações com o intuito de fazer a criança tomar o espaço das ruas. Inicialmente, as crianças foram incitadas a desenharem mapas mentais para procurar entender seus referenciais dentro do Glicério. A partir desse levantamento foi produzido uma


mapa afetivo coletivo do lugar em que são destacados, o Duque (EMEF), CCA, a Rua Lins, brinquedão, Boxe, coxinha do Seu Valdomiro, Rua São Paulo, Igreja da Paz e Viaduto. (MOURA, 2016) Outro projeto relevante realizado pela ONG foi uma parceria com a faculdade de Arquitetura da Belas Artes. Os alunos, juntamente com as crianças realizaram um projeto para a praça José Luis de Mello Malheiro, o resultado final se encontra na imagem abaixo. As crianças também participaram de uma intervenção nas ruas Anita Ferraz, Sininbu e na Vila Suíça em que pintaram as residências e as ruas. A escolha dessas localidades indica uma maior apropriação por esse grupo, e a intervenção acaba servindo de catalisadora para o uso renovado nestes espaços. Além dessas iniciativas mais recentes, há a Comunidade Esportiva Novo Glicério, que proporciona atividades físicas para as crianças da região, além do projeto Curumin do Sesc Carmo.



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CAMINHAR ”[...] Apenas reconhecemos o fato de que o homem é parte integral do ambiente e que ele somente contribui para a alienação e ruptura do ambiente quando se esquece disso. Pertencer a um lugar quer dizer ter uma base de apoio existencial em um sentido cotidiano concreto.” (NORBERG-SCHULZ, Chistian. P. 459) Francesco Careri, em Walkscapes, desconstrui a prática do caminhar e o encara como uma prática estética que se configura arquitetura da paisagem. Para o autor, a prática do caminhar a esmo é teorizada através do que ele definiu como transurbâncias que exploram os “espaços do entre”. Esses espaços são as zonas cinza onde não se define interior, exterior; público, privado, tornando possível a transição de não-lugares* para possíveis lugares, exemplificado por de Certeau da seguinte maneira: “O terreno é baldio, mas no momento que decidimos fazer um piquenique ali ele se torna menos baldio”. O que se conecta diretamente com a presença do corpo e sua modificação no espaço de Jacques, Careri define esse


ato “o grande jogo do brincar” (homo ludens) aferindo à característica lúdica desta prática, onde se resgata o romantismo inerente em cada um em busca da “cidade nômade dentro da cidade sedentária”, onde a cidade nômade são os espaços do ir, do percurso e considerados vazios; e a cidade sedentária os espaços do estar. Compreende-se o percurso como “construção simbólica do território”, ou seja com valor estético tão grande quanto os espaços definidos como sedentários. Alia-se a esse conceito a paisagem como indutora de uma narrativa, argumento defendido por Anne Spirn. Compreende-se que ao recuperar e renovar a linguagem da paisagem descobre-se e imagina metáforas, além de contar novas estórias e criar novas paisagens. A paisagem natural por si só já carrega em si uma significância inerente, de acordo com Pallasmaa: “A paisagem natural nunca expressa solidão da mesma maneira que um edifício. A natureza não precisa do homem para explicar a si mesma, mas um edifício representa seu construtor e proclama a ausência dele.” Portanto, trago os dois elementos como guias aplicados no contexto da metrópole. O percurso se dá como parte do projeto, o conector entre espaços feito de maneira a incitar a curiosidade no indivíduo. pensados de maneira a levantar a questão do ambiente e sujeito e tensionar essas experiências, desbanalizando assim o ordinário.


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LEGENDA

69 fachada ativa percurso áreas de intervenção edifícios propostos

DIRETRIZES

bebedouros

O projeto buscou firmar uma relação positiva entre água e metrópole, assim como enaltecer a temporalidade do Glicério, reforçando seu papel social e cultural. Por meio da visibilização da natureza e seus processos através de espaços públicos e de estratégias pontuais voltadas ao pedestre, onde a rua é considerada uma articuladora e facilitadora de atividade sociais, culturais e comerciais, em outras palavras, um espaço público de conectividade onde são estabelecidas relações entre pessoas. Em adição, há o incentivo à deriva pela criação de um percurso que reforça as questões de identidade local e memória.

AÇÕES GERAIS

Água + espaços livres - criação de espaços de convívio e pontos de encontro - gerenciamento de águas cinza - ludicidade - legitimar a memória -aumento de espaços permeáveis


Habitar: - densificar a área com HIS, habitação mista, incentivando a fachada ativa - projeto Autonomia em Foco estendido para refugiados e imigrantes e expansão do projeto para pelo menos mais uma localidade nas imediações - cortiços: implementar programa de aluguel social e/ou comércios, sendo os moradores/comerciantes responsáveis pela pintura da fachada e manutenção das edificações Ruas - regularização de calçadas de acordo com a NBR 9050 (desobstrução da faixa livre, rampas de acesso, calçadas rebaixadas, mobiliário urbano); - caso a rua possuir caráter comercial/misto, alargamento desta para dimensões maiores que 2,5m; - tornar a Rua Glicério exclusiva para pedestres aos domingos e feriados; - uso de piso intertravado permeável para as vias de fluxo moderado e de caráter local.


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Iniciamos nossa caminhada pela Rua Conde de Sarzedas, logo à frente do Tribunal de Justiça e do chamado “castelinho”- morada do antigo conde que deu nome à rua. Esta será a primeira área a percorrermos. Buscou-se estender o caráter presente na rua, de pequenos comércios e serviços, propondo um edifício de serviços sociais nos pavimentos superiores e comércio no térreo adentrando na área. Todo o projeto gira em torno de diferentes graus de contato com a agua, sempre apa-

rente e de maneira, por vezes, lúdica. Essa ludicidade se iniciou pelo playground inserido na região sul e foi lentamente contaminando o restante do projeto. Aparecem sprinklers e um sistema de retenção de água da chuva que dobra de função, servindo como quadra esportiva pela maior parte do ano e um lago com pedras. A aproximação com a natureza também é enfatizado pelo contato irrestrito com a vegetação, tanto dentro do playground como fora. Além disso, as árvores servem


também para marcar as estações do ano. No período de secas, a paisagem colore com a floração dos Ipês, Jacarandás e Flamboyants.

Seguindo o caminho pela Conde de Sarzedas, passamos pelos comércios, que são em sua maioria bem específicos, vendendo artigos religiosos: bíblias, cálices, estrelas de Davi, túnicas, dentre outros. Logo se avista uma pequena abertura, onde se encontra uma escadaria que nos leva para para uma rua mais residencial, a Rua Anita Ferraz. A escadaria é utilizada pelas crianças para brincar. À frente, podemos ver uma pequena área verde. Alguns moradores usam a sombra das



desenho preliminar de ambientação LEGENDA 1 lago 2 quadra esportiva 3 sprinklers 4 fio de água naturalizado 5 edifício misto 6 playground a. areia b. gramado com montanhas e escorregadores c. piso emborrachado 7 pau-ferro 8 ipê amarelo 9 ipe branco 10 piso intertravado permeável

A antiga Vila Sarzedas foi demolida em meados dos anos 80 como parte de uma iniciativa de revitalização. Projetos foram feitos, mas não foram concretizados, e com o passar do tempo, a área acabou se tornando estacionamento do Tribunal de Justiça do Estado. No entanto, o traçado das ruas da vila permanecem e foram usados como caminhos no projeto. Usando o formato pre-estabelecido, foram então surgindo as propostas, que tensionavam a situação do entorno, a topografia em dois dos lados têm um desnível de 4 a 6 metros em relação à Rua Conde Sarzedas e as ruas do entorno, o que tornam a área “contida” por taludes, buscou-se intensificar essa característica com vegetação de altura similar ou maior ao talude, o que traz um contraste entre rua e espaço. Ao mesmo tempo, propõe-se um edifício que tenha comércios pequenos no térreo de maneira a não isolar a área e atrair passantes.


O projeto procurou evidenciar a água de maneira superficial, com o objetivo de tornar visíveis os tempos da natureza. Assim, na figura acima, temos elementos de alagamento primários (simbolizados pela cor azul mais forte) que retêm a água como mecanismo de mitigação e elementos secundários (representados com o azul mais claro), com áreas de maior permeabilidade, que deixam visíveis esses processos. A criação de um eixo visual de diferentes expressões da água foi intencionado, de maneira que, nas extremidades, vê-se uma gradação deste elemento simbolizado pelo lago com a queda d’água, logo depois pela bacia de contenção, seguido pelos sprinklers e finalizado pelo córrego.

Acima: curso de água pela área e mecanismos de armazenamento de água. Ao lado: esquema da vegetação


desenho preliminar de ambientação e abaixo vista da parte central do playground

Para o escoamento da água dos caminhos no projeto, criou-se um sistema que viabiliza a utilização da área de esportes por um período prolongado através do uso de dois sistemas de captação de água. Caso seja sobrecarregado, o segundo é ativado.







árvores para estender roupas e lençóis e é a primeira das áreas que recebe um bebedouro. Este foi proposto para ser inserido em todas as áreas livres já presentes na região do Glicério, com o objetivo de aglomerar e resgatar o antigo papel do córrego que corta a região: o córrego Moringuinho era historicamente uma fonte de água potável para o centro de São Paulo e hoje se restringe a canalizar parte do volume de água do Itororó e ele próprio para desaguar no Tamanduateí.

As crianças brincam nas ruas e já se avista, em seguida a Rua dos Estudantes, onde na esquina propõe-se uma das HIS que recebe um recuo para arborizar a rua e o edifício, já que se trata da fachada que rebe o sol da tarde. Virando à esquerda, adentramos a segunda área de intervenção. O galpão é utilizado atualmente como estacionamento privado. Buscou-se preservar os elementos já existentes, portanto, a fachada, aberturas e estrutura de cobertura do galpão foram mantidos.


A cobertura do edifício ao lado esquerdo é translúcida para acompanhar a vegetação e para prover iluminação natural para uma área de descanso e ocasionais exposições. Já no lado direito temos uma midiateca na primeira parte e, passando o jardim de chuva, uma biblioteca infantil. No fim do galpão, temos um anexo, onde funcionam aulas, oficinas e workshops, tanto no térreo como no mezanino. Saindo da estrutura, chegamos à parte externa do projeto com uma área inicial

voltada para atividades ao ar livre e uma cisterna para armazenamento da água de chuva, que desvia água da galeria do córrego Moringuinho para o sistema de reserva, servindo de irrigação para uma horta urbana. A horta é cortada por uma escadaria que conecta a área à Rua Conde Sarzedas, o acesso podendo ser feito por ambas as vias. O cultivo de espécies será a cargo da comunidade, sendo um dos lados da escadaria ladeado com árvores frutíferas para sombreamento. Em


cada patamar da escadaria temos um caminho que incita o passeio pela horta, com pontos de descanso feitos no muro de gabiĂŁo, e um fio de ĂĄgua que percorre todo o projeto.




LEGENDA 1 midiateca 2 jardim de chuva 3 biblioteca infantil 4 sala de aula 5 banheiro 6 piso de cimento 7 cisterna 8 horta urbana


Esquema de usos do galpão. Os usos e a própria horta foram pensados de forma a tornar o galpão uma área de encontro e interação entre os membros da comunidade do Glicério. Temos também um curso de água que passa pela horta e cai para uma sisterna. O mesmo acontece com o curso de água de dentro do galpão, que é captada do telhado.







A imagem acima foi retirada da cartilha “Low Impact Development” da Universidade do Tennessee, Estados Unidos. O sistema de cisterna apresentado é utilizado para este projeto e também para o último. Ao lado temos o sitema de captação da água da chuva do telhado para o curso de água no interior do galpão.



Detalhe em corte do sistema de assento, muro de gabião com reforço de arrimo de concreto e largura de canteiro das hortas


Saindo da Rua dos Estudantes em direção ao viaduto, chegamos em outra área sombreada que também é utilizada para estender roupas de uma pensão dos arredores, as pessoas usam a mureta que circunda as árvores para sentar e descansar. Seguindo o viaduto pela Rua Dr. Lund, alcançamos a intersecção de travessia dos carros nos dois sentidos da via com um ponto de travessia de pedestres que desejam continuar na Rua Francisco Glicério.

Chegamos enfim, à terceira área. Nela buscou-se trazer o caráter já existente na rua para o baixo do viaduto, ou seja, trazer comércio e serviços que funcionem dia e noite, para fornecerem passagem segura às pessoas, e também como meio de fomentar uma área já famosa pela academia de boxe inserido no viaduto. Historicamente, antes do viaduto ser construído, esse foi o ponto de chegada de migrantes vindos do Nordeste durante as décadas de 1970


e 1980. Faz-se então um memorial que tenta resgatar a memória dessa jornada para São Paulo, o caminho se inicia com paralelepípedos e depois faz a transição para um deck de madeira suspenso sobre a areia. Ao andar, trechos da música de Elomar Figueira Mello são apresentados em meio a galhos de árvores retorcidos.



“Cadê os pé dos imbuzêro qui florava todo ano nas baxada e nas vereda mana mia cadê os pé d’imbu meu mano adeus pé dos imbuzêro” LEGENDA 1 piso de paralelepípedo 2 rua compartilhada 3 piso de cimento 4 memorial 5 quiosque 6 comércio

A música de Elomar Figueira Mello faz parte do memorial do viaduto e faz referencia ao Umbuzeiro (ou Imbuzeiro). Essa árvore tem seu nome oriundo do Tupi-Guarani e significa: “árvore que dá de beber”, por ser uma das únicas que sobrevive às rigorosas secas no Nordeste do país. Por essa característica, Euclides Cunha em “Os Sertões” a chamou de “árvore sagrada do sertão”.




Voltando à Rua Francisco Glicério em direção ao centro, nos direcionamos à ultima área. A rua sofre ocasionais prolongamentos do passeio, de modo a inserir mobiliário urbano e árvores de porte pequeno, podadas regularmente para não entrarem em conflito com os postes elétricos. Nos aproximando do fim da rua, chegamos à quarta área, nela também há atualmente um estacionamento. Buscou-se utilizar do formato triangular para criar uma praça que enfatize a perspectiva,

onde um fio de água cria um eixo entre fonte e espelho d’água, além de Jacarandás (cuspidifolia) que ladeiam ambos os lados do projeto e sombreiam os bancos. Embaixo da praça temos outra cisterna. Em períodos de chuva, a região do espelho d’água é alagado. O fundo do lote encontra um paredão de 9 metros que ainda apresenta os resquícios das antigas edificações já demolidas. Preserva-se esse registro e no lado direito da parede propõe-se ocasionais projeções de filmes.



LEGENDA 1 calha com grelha 2 calha aberta 3 espelho d’ågua 4 gramado 5 piso de cimento


MOBILIDADE A área foi submetida à fragmentação pela inserção do estacionamento, apresentando um retorno para entrada e saída de veículos. Foi feita uma ação de alargamento das calçadas imediatas e estrangulamento da via nas faixas de pedestre, de modo a diminuir o tempo de travessia do pedestre em uma área de alto fluxo de pessoas e automóveis. O tráfego de veículos é organizado pela pintura das faixas e locais de estacionamento, intercalados com a extensão de calçadas para instalação de mobiliário urbano e arborização




10 min

A fonte localizada na extremidade da área possui um movimento de transbordar e esvaziar da água. Este acontece de maneira regular em intervalos de 10 minutos, a água excedente é então levada por uma canaleta formando um fio de água até a outra extremidade da área. A intervenção teve como principal referência o trabalho da artista plástica Cristina Iglesias, em especial ‘Tres Aguas’ na cidade de Toledo.


O percurso segue passando por uma pequena praça triangular, muito utilizada pelas crianças, que sofre um prolongamento da calçada eliminando estacionamento de ambos os lados. Depois, caminhamos pela praça Dr. Margarido, à frente da EMEI Duque de Caxias, que recebe mobiliário urbano voltado para as crianças e adolescentes da escola. E então finalmente voltamos à Rua Conde Sarzedas.



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FICHAMENTOS VISITA À PARÓQUIA NOSSA SENHORA DA PAZ A visita à Igreja Nossa Senhora da Paz se inicia com uma apresentação introdutória onde Wellington, o responsável pelo acervo da biblioteca do CEM, conta um pouco sobre a história da igreja. Inicia explicando que a Missão Paz é uma instituição católica, mas apesar disso, é um espaço ecumênico que possui atualmente cerca de 100 funcionários. É dividido em Igreja, Casa do Imigrante, Centro Pastoral de Mediação de Imigrantes e o Centro de Estudos Migratórios. Desde sua construção, a Igreja tem como objetivo atender seu entorno, de início oferecendo suporte à comunidade italiana, e posteriormente a latino americanos oriundos de trocas migratórias do Mercosul durante os anos de 70-80, posteriormente nordestinos que desembarcavam na rodoviária provisória do Glicério e atualmente pessoas de várias partes do mundo procuram abrigo lá, no dia da visita, a missão contava com 90 pessoas alojadas, podendo abrigar até 110 indivíduos. Os serviços ligados à imigração fornecem apoio para os primeiros passos de aclimatação ao país fornecendo a documentação


necessária, assistência psicológica, aulas de Português e auxiliam a procura de emprego. O processo inteiro dura de 2 a 4 meses, mas raramente o indivíduo permanece além deste período, depois disso ele deve procurar um lugar para morar. Ao começarmos a andar pela igreja, Wellington também menciona novos movimentos migratórios que vem acontecendo recentemente, estes diretamente ligados: a feminização e a familiarização da imigração, ou seja, o crescente número de famílias e mulheres que tem imigrado recentemente, a igreja coletou fundos a pouco tempo atrás para a construir 6 quitinetes para famílias, já que antes o que se via é uma proporção muito maior de homens. Atualmente, muitas mulheres vêm sozinhas com crianças e ficam à espera dos maridos. O Pe. Paolo Parisi nos diz que devido ao alto valor dos aluguéis da região, eles se assentam temporariamente no Glicério para depois procurarem moradias com preços mais acessíveis, sendo que muitos são participantes dos movimentos de direito à moradia, como nas ocupações na região do centro de São Paulo. A seguir, relatos de ex-moradores da casa do imigrante retiradas da revista de veiculação própria: O cotidiano de Jorge na Paróquia: “Logo às 5h30, de segunda à sexta, nós somos chamados por um agente da organização, (...) e a partir daquele momento normalmente vai se lavar o rosto, tudo mais... vai se fazer as atividades, trocar de roupa, aguardar o momento ideal para tomar o chá, com pão, um tody... uma alimentação logo na faixa se 6h30 da manha. Então alguns já estão trocando de roupa, consciente que sete horas, sete e dez, saem todas as pessoas, em destino, em busca de trabalho, com aquela esperança de ver se encontra uma solução” (trecho retirado da revista Travessia-revista do imigrante, publicada pelo Centro de Estudos Migratórios. Edição de Dez/2013)


VISITA AO PROJETO AUTONOMIA EM FOCO De acordo com a apresentação do projeto pela Prefeitura de São Paulo: “O Projeto Autonomia em Foco, como proposta da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, em trabalho transversal com as secretarias municipais de Saúde e de Direitos Humanos e Cidadania, tem como objetivo, ofertar um acolhimento de grupos familiares ou pessoas adultas sozinhas, em situação de rua, que estejam inseridos ou não na rede sócio-assistencial, mas em processo de autonomia.” Desço a Rua dos Estudantes em direção ao fim da rua, o edifício do projeto fica ao lado do Projeto Cor da Rua, e possui uma cerca e interfone. Toco a campainha e uma moça abre o portão. Pela sua desconfiança com a minha visita, percebo que poucas pessoas devem vir conhecer o programa. Me direcionam para um corredor escuro, leio os banners no quadro de aviso, há informações sobre DSTs, código de conduta, e uma oficina de marcenaria que aconteceu em Julho. Sou direcionada para uma sala onde conheço Inês, começamos a conversa com um resumo do que o projeto realiza, e como funciona. Ela me diz que o local tem capacidade para 150 pessoas, mas que a população acaba flutuando, existem além dos dormitórios: um pátio, cinemateca, brinquedoteca, cozinha coletiva, lavanderia e banheiros. As facilidades não são sobrecarregadas e atendem sem problemas os moradores, porém a infraestrutura, poderia ser melhor. Há também atividades esporádicas como rodas de conversa, oficinas de artesanato e outras atividades de caráter socioeducativo.


A maior parte dos residentes são famílias, as crianças frequentam as escolas da região além de participar do projeto Curumin do Sesc Carmo (localizado próximo à Rua Tabatingueira), porém são as crianças que ficam mais ociosas e que conhecem melhor o Glicério, já que os pais saem para trabalhar e nem sempre existem muitas distrações. Pergunto sobre a questão das enchentes, mas Inês me diz que, apesar de alagar a rua quase por inteira, o prédio se encontra em uma cota um pouco mais alta que as outras edificações e portanto não sofre muito com as chuvas. Nossa conversa chega ao fim, agradeço a Inês pelo tempo, e volto para a rua em direção à Paróquia Nossa Senhora da Paz.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CANTON, André Luiz. PRESERVAÇÃO CONTRADITÓRIA NO CENTRO DE SÃO PAULO: degradação das Vilas Preservadas na Baixada do Glicério no contexto da renovação urbana (Operação Urbana Centro). FFLCH/USP, 2007. CARLOS, Ana Fani Alessandri. O Espaço Urbano: Novos Escritos sobre a Cidade. São Paulo: FFLCH, 2007, 123p. SANTOS, Milton. A Natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. Edusp. 2004. CALVINO, Ítalo. Cidades Invisíveis. Companhia das Letras. 1990. CARERI, Francesco. Walkscapes : o caminhar como prática estética. Editora GG. 2002. JACQUES, Paola Berenstein. Corpografias urbanas. Arquitextos, São Paulo, ano 08, n. 093.07, Vitruvius, fev. 2008 .http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/08.093/165.


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tps://issuu.com/stipoteam/docs/a_cidade_ao_nivel_dos_ olhos Trabalhos de Graduação: Glicério em Movimento: Investigação Arquitetônica no Centro de São Paulo. Renato Tamaoki. IAU USP. 2016. Memórias de uma Travessia. Pedro Giunti. FAU USP. 2016. Habitar o Centro. Renata Cecília. IAU-USP. 2016. Contraponto: Ressignificação de Fluxos e Centralidades. Priscila Kakazu. IAU USP. 2015.



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