Mara Rúbia

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n i f a e r r u nal o l a


A estreia no Theatro Municipal na peça “A Filha de Iório”, em 1947.


ISIS BAIÃO & THEREZINHA MARÇAL

LOURA INFERNAL A

Patrocínio

Realização


Com vestes de princesa de contos de fadas, nos bastidores do Teatro C贸lon, em Buenos Aires.


Quando uma estrela volta ao cĂŠu


magia. o r e u q u E . realismo “Não quero magia. Sim, sim, pessoas. s à er verdade. r s a d ia r e to v n e d te ue É o que e, digo o q d a d r e v a Não digo e.” ara sempr p é pecado, a o d s a o is iç e ld s E ama que eu seja {Blanche Dubois, personagem de Um Bonde Chamado Desejo, de T. Williams}


Se me perguntassem como foi, eu diria : não tenho palavras. Lembro-me de que fazia um dia lindo, com um sol de outono e um céu azul, esplendoroso. Parecia que o céu comemorava a chegada de mais uma estrela. Mas cá na terra brasileira, nós estávamos de luto. Nunca se viu tanta celebridade em um só funeral. Elas iam chegando, uma a uma, acompanhadas de seus pares ou da habitual entourage. Algumas escondiam o rosto sob óculos escuros. Houve quem exagerasse, optando pelo véu negro sobre o pranto. Aos poucos, o salão da Assembleia Legislativa, onde estava sendo velado o corpo, foi tomando ares de estúdio de gravação. Tudo levava a crer que, a qualquer momento, a voz de um diretor romperia os murmúrios dando partida à cena. Havia uma grande diferença de figurinos entre o elenco masculino e o feminino. Os homens vestiam terno e gravata, na maioria, sóbrios. Apenas uns poucos ousaram no colorido das camisas, na estamparia das gravatas ou em algum outro detalhe menos ortodoxo sobre a indumentária (é bem verdade que o maquiador da estrela compareceu de tail-

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leur grafite, peruca loura e cílios postiços que despencaram, encharcados em lágrimas). Quanto ao elenco feminino, bem, um colunista social diria: arrasou no figurino. Mas visto que me falta talento para o colunismo social, digo mais uma vez: não tenho palavras. Chamou-me a atenção, no entanto, a ala das vedetes. Sim, eram tantas as celebridades, que elas se dividiam em alas. Podia-se distinguir perfeitamente a ala das vedetes, a ala das atrizes do chamado teatro sério, a ala das cantoras do rádio e a dos anônimos. As vedetes estavam todas de preto, numa clara manifestação de luto pelo falecimento da estrela maior e mais querida do Teatro de Revista. Sua rival nos palcos tinha sobre o rosto um véu negro, assim como era o vestido longo, que se abria de um dos lados até acima do joelho, deixando à mostra a bela perna quando ela se movia sobre as sandálias altíssimas, mexendo a cabeça adornada por uma égrètte de penas de pavão. Ao lado da grande vedete, uma jovem starlet tinha o corpo coberto por um minivestido de lantejoulas e longas meias de seda, tudo no mais absoluto negrume, exceto a cabeça, onde se destacava um arranjo de penas diversas multicoloridas. Aliás, seria redundante descrever cada traje. Era impactante a ala das vedetes pelo contraste entre o luto dos vestidos e o colorido dos arranjos nas cabeças e das maquiagens cintilantes. Uma delas, ao debruçar-se em prantos sobre o caixão, pespegou na fronte da morta um beijo carmim. A tudo isto, os filhos da falecida assistiam sem estranheza, habituados que estavam a extravagâncias –– às da mãe, sobretudo.


O velório atravessou a noite. Só pela madrugada arrefeceu a fila de fãs que foram prestar sua última homenagem à diva e dos tietes em busca de autógrafos. O ir e vir de celebridades atraiu uma crescente multidão à escadaria e imediações da Assembleia, fazendo a alegria dos vendedores ambulantes. Na manhã seguinte, o transito tornou-se insuportável, o centro da cidade parou. Nas bancas de jornal, os matutinos exibiam, em primeira página, fotos gloriosas da mulher que reinou no Teatro Recreio e esteve no imaginário de toda uma cidade. Numa das fotos, ela está fantasiada de taça Jules Rumet, pairando sobre o Maracanã. Até a imprensa a amou sem restrições, poupando-a de maledicências, mesmo nos anos em que ela se entregou ao alcoolismo. Por volta das 10h, os batedores da polícia militar, com suas sirenes ligadas com excesso de decibéis, garantiram a chegada do governador e outras autoridades. Admirador ardoroso daquela que foi o símbolo sexual de sua geração, o governador não escondia a emoção -– há pouco embargara a voz ao declarar três dias de luto oficial no estado. As sirenes dos batedores voltaram a soar, abrindo caminho para o carro de um ministro, que trouxe à família as condolências do presidente da República. Deputados, senadores, chegavam para o sepultamento. Naquele momento, os políticos tomaram conta da cena. Afinal, foram eles que mais prestigiaram a estrela, marcando presença em todos os seus espetáculos. Alguns não conseguiam dominar a comoção e eram alvo dos cochichos dos fofoqueiros de plantão: sabe-se que, em suas estreias, a diva costumava receber corbeilles contendo joias caras, enviadas por admiradores anônimos. Dizia-se

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que os ditos cujos eram políticos e ficava-se a conjecturar quais deles teriam tido acesso à cama da mais bela vedete do Teatro de Revista. Há pouco falou-se que ela fora amante de um quase presidente da República... Na verdade, embora emanasse sensualidade e sedução, sua galeria de amantes foi bastante modesta, eu diria que até decepcionante para um “diabo louro”. Aproximava-se o momento do sepultamento e muita gente ainda não conseguira chegar ao caixão. A escadaria da Assembleia começou a ser tomada por uma grande inquietação, ameaçando tumulto. A segurança à porta de entrada foi reforçada. Como estavam próximas as eleições, um aspirante a deputado subiu num caixote e fez um discurso dizendo que a estrela era de todos e, portanto, devia ser velada em praça pública. Mas ninguém lhe deu atenção, pois, neste exato momento, estava chegando um famoso cantor, protegido por uma dúzia de halterofilistas, que não conseguiu deter a tempo a mão de uma fã destemperada, que arrancou, a golpe de tesoura, metade da gravata do ídolo. Às 11h, o caixão deixou a Assembleia sob uma chuva de papel picado e aplausos. Para evitar maiores distúrbios no trânsito, a viatura do Corpo de Bombeiros acelerou e somente os que tinham carro puderam compor o cortejo, que formou uma enorme fila entre o Centro e Botafogo. Quando o cortejo chegou ao cemitério São João Batista, já uma pequena multidão esperava e recebeu o féretro, cantando a música do último espetáculo da estrela. O tempo escureceu de repente e uma chuva fininha começou a cair. Fez-se o mais absoluto silêncio, um


silêncio feito de tristeza. Parece que só naquele momento acreditou-se no que acontecera: apagou-se uma estrela das mais luminosas. Um pouco depois de 12h, quando o caixão descia à sepultura, as vedetes gritaram em coro “Mara, Mara, Mara” –– era o refrão do pessoal para a entrada em cena de Mara Rúbia. E a cidade chorou.

Desculpe-me, caro leitor, a “licença poética”. Esse funeral nunca existiu. Este é o funeral que ela gostaria de ter e teria tido, provavelmente, se tivesse morrido no esplendor de sua carreira. O verdadeiro... mas pense: não será a história de uma pessoa uma não se impõem limites. Mas posso lhes garantir: daqui para a frente, tudo é verdade... segundo me contaram.

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PRECISA-SE DE MARA RÚBIA

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rl i G

Ainda era Osmarina, mas já se parecia muito com Mara Rúbia.


QUANDO UMA ESTRELA SOBE AO CÉU

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Quem não era seduzido por aquele charme, aquela vitalidade, aquela vivacidade de espírito? Luis de Lima

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Olhou o relógio e sorriu: 17h45! “Pontualidade inglesa!” — pen-

sou Luiz Marzulo ao ver a moça loura entrar, com seu tailleurzinho de cor clara, meias de seda, saltos altos, luvas e o chapeuzinho de sempre. Ótima para um escritório, impossível imaginá-la entre plumas e paetês, considerou o secretário. Era bonita, e que sorriso, não fosse o acanhamento... Moça de família, certamente. Os pais a arrancariam dali pelos cabelos se soubessem. Ele tentou convencê-la de que aquele ambiente não era para ela, desde o primeiro dia. Foi inútil. Continua a vir, todos os finais de tarde, numa persistência avassaladora. E ei-la novamente, pelo vigésimo primeiro dia consecutivo. — Posso falar com ele? — Minha filha, eu já lhe disse... — O senhor é seu Walter Pinto? — Não. — Pois só saio daqui no dia em que falar com ele. Esse homem é invisível? E a moça loura sentou-se no mesmo banco do jardim interno do teatro. “Malcriada”, pensou Marzulo, contendo o riso, pois se lembrou do primeiro dia: Ela chegou e foi dizendo que estava ali pelo anúncio e que queria ser “gil”. Ele corrigiu: girl. Ela não entendeu,


Os olhos clínicos do empresário passearam pela moça. Tímida, mas decidida, ela enfrentou aquele olhar. Como era bonito e charmoso o tal de Walter Pinto! — pensou ela. Ele não a mandou sentar. — Sabe dançar? — perguntou ele. — Sei. — Faz um plier. — Isso eu não sei não, senhor.

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mas concordou. Jamais vira alguém com tanta determinação de lutar por algo que desconhecia. “Seria louca?”, perguntou-se ele. E resolveu pedir ao patrão que, pelo amor da paciência do secretário, atendesse aquela maluquinha. O anúncio dizia: “Precisa-se de girls. Paga-se 1 conto e 800.” Era o quanto Osmarina precisava para completar o orçamento doméstico daquele momento. O salário que ganhava na imobiliária “Devoto & Cia.”, 1 conto e 200, não dava para pagar o colégio do filho mais velho, Ronaldo, que viera com ela de Belém do Pará. Aquele anúncio tinha caído do céu. Desde que chegou ao Rio, percorria com afinco e avidez as páginas de anúncio do Jornal do Brasil. Recortava aqueles que selecionava e ia à luta. Um deles procurava “moça de boa aparência e de confiança para trabalhar com grandes valores”. Bateu à porta da joalheria na rua Uruguaiana e foi atendida por um ve-lhote magrelo, com uma corcunda pronunciada. Sorridente, ele a levou para um apartamento nos fundos da loja e deixou claro que os “grandes valores” a serem manipulados estavam na extensão de seu corpinho. Ela sentou-lhe o braço, armou um escândalo. Sorriu ao lembrar-se do espanto na cara sem juízo do velhote. Depois de outras tentativas frustradas, terminou arranjando emprego na “Devoto & Cia.”, mas o salário de datilógrafa era pequeno. Não dava para o presente e muito menos para um futuro próximo, quando sonhava em ter, com ela, os dois outros filhos, Therezinha e Birunga, que ficaram com os avós, Alípio e Cezarina, em Capanema, no Pará. Mais uma vez, os pais se mudavam de Belém, pensou Osmarina.


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— Então, faz um passo qualquer. — Bom, se o senhor me tirar pra dançar, eu danço... Ele riu. Marzulo tinha razão, a moça era maluquinha, mas muito interessante. — Você canta? — Canto e sei uma música muito bonita: “Eu sonhei que tu estavas tão linda/ numa festa de raro esplendor/ teu vestido...” Tinha uma voz de soprano ligeiro. Ele a fez repetir a música de Lamartine Babo algumas vezes. A espontaneidade da moça o divertia, mas ele não estava ali para perder tempo. — Você nunca trabalhou em teatro, não é mesmo? — Não senhor. — Então, o que veio fazer aqui? — Eu quero esse ordenado. — Pois levante a saia que eu quero ver suas pernas. Uma vermelhidão tomou conta do rosto da moça. Estava claro que ela não tinha a menor ideia do emprego a que estava se candidatando. Por instantes, pareceu prestes a sucumbir de vergonha, mas respirou fundo e contra-atacou: — Se eu mandar o senhor descer suas calças, o senhor desce? O empresário segurou firme o cachimbo para que não lhe caísse da boca. — Não estou entendendo... — disse ele. — É muito feio uma mulher levantar a saia para mostrar as pernas. Se o senhor me pagar um maiô, eu boto o maiô e mostro as pernas, mas, levantar a saia, não! Osmarina saiu do teatro com os quinhentos reis que lhe dera o empresário e a certeza de que aquele emprego seria dela. No dia seguinte compraria o maiô. Enquanto esperava o ônibus, comprou um sorvete. Era novembro e fazia calor, não tanto quanto em Belém. Lá sempre chovia no final da tarde, mas a chuva não refrescava. Sentia que, desta vez, deixara Belém para sempre. Ia vencer no Rio, sim, e com


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Walter Pinto, o empresário que descobriu e “batizou” Mara Rúbia.

dignidade, pensou ao lembrar-se do que falou Benedicto, o ex-marido, quando soube de sua decisão: “Vai terminar prostituta do Mangue.” Ao lado do ponto de ônibus, as manchetes numa banca de jornal chamaram-lhe a atenção. Manchetes banhadas de sangue. A Europa continuava imersa na guerra, uma guerra ainda mais horripilante fora das frentes de combate. Os milhares de judeus covardemente exterminados em fornos crematórios chocariam o mundo e envergonhariam para sempre a Alemanha. Mas o nazifascismo perdia terreno e o final estava próximo. O ano de 1944 foi marcado por acontecimentos decisivos, como o desembarque das forças aliadas na Normandia — a Operação Overlord (o “Dia D”) — o maior assalto anfíbio de todos os tempos. Também decisiva foi a atuação do exército russo na frente oriental, abrindo a marcha sobre Viena. Foi ainda, naquele ano, que o


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Brasil enviou ao front sua Força Expedicionária, com três contingentes de tropas, que lutaram na Itália, ao lado de norte-americanos, ingleses e canadenses, “irmanados no mesmo ideal comum: o extermínio ao nazifascismo”, dizia o jornal. Essas histórias de guerra dão-lhe socos no estômago, pensa Osmarina, já maldizendo seu vício da leitura. Finalmente, o ônibus para Botafogo! Não está cheio e ela pode se sentar. Ao seu lado, um homem lê a revista O Cruzeiro. Como ele sabia evitar que alguém tirasse uma casquinha da revista! Enquanto ela queria ver o “Amigo da Onça”, o sujeito fissurava-se nas páginas de guerra. Que horror! — quase grita. Quando o mundo teria paz? Quantas mães, naquele momento, perdiam seus filhos! Sentiu um nó na garganta, não sabe se pelas mães dos que morrem na guerra ou se por sentir saudade de seus filhos. Felizmente, o próximo fim de semana Ronaldo passará com ela. Teve que interná-lo num colégio, pois a família que a acolhera já se apertava demasiadamente no apartamento. Ao chegar ao Rio há três meses, Osmarina bateu na porta dos Veras, velhos amigos do Pará. Em Belém, D. Nair Veras era sua vizinha, sua costureira e se tornou uma amiga de fé. D. Nair e o professor José Veras tinham dez filhos legítimos e dois adotados. Rebocando essa filharada, mudaram-se para o Rio em 1942. Não foi bem um ato de heroísmo, mas uma fuga. Além de professor do Liceu Estadual, José Veras era também advogado e durante algum tempo contou com a simpatia do interventor Magalhães Barata, que o nomeou delegado de Polícia. Barata quis fazer do professor um de seus braços armados na perseguição aos desafetos políticos, mas Veras era um homem de paz. Não correspondeu às expectativas do governador e caiu em desgraça. Acusado de redigir um boletim em que seus alunos espinafravam o governo, o professor foi preso. Não fosse o protesto dos estudantes, que pararam o trânsito, deitando-se nos trilhos do bonde, o professor provavelmente teria tido o destino de outros desafetos. Assim, arranjou algumas passagens com amigos da Aeronáutica, mandou a mulher e uma parte da filharada


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de avião e veio com o restante em um navio de passageiros, que viajava protegido por um comboio de 28 navios da Marinha. Era uma época de pânico, em terra e no mar. Apesar da simpatia do Estado Novo pelos nazifascistas, o Brasil tinha tido 13 navios mercantes torpedeados por submarinos alemães. A agressão foi a gota d’água, fazendo eclodir protestos populares por todo o país e acirrando o movimento a favor dos aliados, o que obrigou o presidente Getúlio Vargas a declarar guerra à Alemanha. Em terra, nossas cidades conviviam com os “apagões” noturnos. No mar, o pesadelo era ainda maior. Para despistar os submarinos alemães, nossos navios faziam peripécias, com idas e vindas ao mesmo porto, triplicando o tempo de uma travessia. O silêncio a bordo era absoluto. Durante o dia, os marujos comunicavam-se de um navio para outro pelo uso de bandeiras. À noite, tripulantes e passageiros dormiam no convés para não ficarem presos nos camarotes, caso o navio fosse torpedeado. Mas para o professor Veras e sua família era mais perigoso ficar no Pará. Quando Osmarina aportou na casa dos Veras, em Botafogo, o casal abrigava, além dos 12 filhos, a empregada, uma sobrinha e o pai do professor, que viera operar-se no Rio. No apartamento de duas salas e três quartos na Rua Voluntários da Pátria, Osmarina era a décima sexta habitante, além de Ronaldo, que até ir para o internato, dormia numa caminha improvisada dentro de um gavetão na sala, ao lado da mãe. Durante a noite, um dos filhos do casal, Sidney, que servia ao Exército e era sonâmbulo, às vezes levantava-se e marchava por entre as camas: um, dois, um, dois, direita, volver! Certa vez, confundindo-se no caminho do banheiro, fez xixi em cima de um irmão. Se faltava espaço nos Veras, sobravam braços abertos para a nova hóspede: “Mamãe adorava a Osmarina”, conta Nelly, a segunda filha de D. Nair. “Quando ela chegava em casa, nós ficávamos deslumbrados, era uma festa. Ela estava sempre rindo, um riso lindo, e cantando ‘Eu sonhei que tu estavas tão linda...’” — O maiô custou 86 reis, mas não vou lhe dar o troco porque


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preciso desse dinheiro. Se me contratar, depois o senhor desconta no pagamento. Se não me contratar, quando puder, eu lhe pago — disse a moça, adentrando a sala de Walter Pinto. Ele sorriu levemente, avaliou-a entre duas baforadas no cachimbo, enquanto pensava: “Osmarina, um nome inimaginável para o show business!” — Vá vestir o maiô — ordenou o empresário. Osmarina olhou-se no espelho do camarim. Sabia que tinha um corpo bonito, mas nunca pensou em ter que mostrá-lo para conseguir emprego. Pelo reflexo do espelho, a camareira a olhava com ar de admiração. Assegurou-lhe que o patrão aprovaria aquelas pernas brancas e bem torneadas. No entanto, Osmarina não conseguia fazer com que as pernas a levassem até Walter Pinto. Se fosse na praia, estaria certo, mas num escritório! No escritório não, no palco, explicou Madame Lou, bailarina e coreógrafa do teatro, que já a puxava pela mão para levá-la à coxia. Na coxia, a moça novamente recuou, tomada de estranho pânico. Não, ela não dava mesmo pra esse negócio de “gil”. Ia tirar aquele maiô, devolvê-lo e dizer que pagaria a dívida assim que pudesse. Porém, Madame Lou, mulher de muita força, em cena e na vida, não o permitiu. Vestiu-lhe um saiote por cima do maiô e a empurrou para o palco. Na plateia, Walter Pinto viu entrar em cena uma garota tonta, de saiote, que, de repente, tirou o saiote e sentiu no palco a sua casa.


a l u f x a ú m r í d lia s e a

LAMEIRA CINTRA

Mara com Tia Ninga, uma das figuras extravagantes da família Lameira Cintra.


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