Obra de Picasso. Mulher Chorando (1937) Óleo sobre tela, 60 x 40 cm; Tate Gallery (Londres) http://medicineisart.blogspot.com/2010/09/depressao-na-obra-de-pablo-picasso.html
Autoria Tito, psicólogo CRP 06-1631-3 email fhoo@uol.com.br
“Aqui não cabem bajulações e nem mesmo adulações: ambas inúteis”
Então o Prefeito Carlos Alberto fala na „live‟ de 26/fev/21: “tem algumas pessoas, Ah! Eu não posso voltar a trabalhar, mas vai no bar beber, vai na praia, vai no supermercado, bate pernas pra cima e pra baixo... Só não pode trabalhar na escola, agora tudo pode fazer... Só não pode trabalhar na prefeitura, mas tudo pode fazer... Estou dizendo isto, não vale para todos, vale para alguns. Um percentual pequeno de pessoas que reclamam porque o prefeito chamou de volta pra trabalhar. Temos 400 pessoas ganhando salários em casa afastadas pelo decreto do Covid”. Em contrapartida uma senhora, ex-paciente no atendimento psicológico de uma Unidade de Saúde do centro, me procura e relata sua apreensão e algo desorientada diante do que ouviu do prefeito. Fui posteriormente conferir os fatos e as falas. E daí vem o espanto. Creio que seria mais adequado classificar como uma aberração o posicionamento do prefeito, pois usa de um artifício chulo, grosseiro e até irresponsável quanto às consequências psicológicas para pacientes afastados, nas mais diversas morbidades e até com diagnósticos de comorbidade. Qualquer leitor com um nível aceitável de neutralidade poderá constatar que as rotulações feitas em público pelo executivo só serve para gerar constrangimentos, pressões, preconceitos, classificações chulas e/ou demérito para com aqueles servidores „afastados‟. O prefeito disse que se tratava de uma minoria, “um percentual pequeno de pessoas que reclamam”. Então para não alimentar tal rotulação cabe exigir do prefeito esclarecer quem são estes que „reclamam‟? Que percentual é este? De quem ele está falando? Ao tratar de tema tão delicado de forma tão popularesca e chula o prefeito „joga na vala comum‟ todos os „afastados‟,
pois para o público generalista, adeptos do achismo „todos são farinha do mesmo saco‟, isto é ganham sem trabalhar, não querem trabalhar e ainda passeiam como todo ser saudável. Oh! Prefeito, “e agora o que dizer para a Da. Maria (nome fictício) com quadro de depressão crônica e com sérias fragilidades diante de rotinas outrora de fácil manipulação?” O que dizer para a Da. Maria, pois durante várias sessões psicoterápicas discutimos a necessidade de sair de casa, de ir ao supermercado, de ir para a praia no final do ano com uma amiga, de fazer os cabelos no salão, de pintar as unhas, de fazer visitas às lojas, de também ir à praça Pádua Salles para bater papo com outras pessoas? E então Doutor Carlos Alberto? A Da. Maria agora está constrangida em sair de casa. Já começou a ter insônia só em pensar em passar pelo perito da prefeitura, depois de várias peritagens e constrangimentos no INSS. E agora como negar as rotulações das vizinhas que já começaram a olhar com ares de condenação para com a servidora afastada, agora sendo vista provavelmente como uma „corrupta‟. Na conversa com a Da. Maria não pude satisfazer um pedido da mesma que era fornecer um atestado dos tempos de psicoterapia ocorrido em uma Unidade de Saúde. Orientei a mesma para procurar a coordenação da entidade e citar que está passando por tal cenário de constrangimentos, de um lado pelas rotulações já assimiladas por vizinhos e por outro lado pela postura do prefeito pressionando o retorno ao trabalho de uma forma nada agradável e racional. Dizer que “400 pessoas ganhando salários em casa afastadas pelo decreto do Covid” é quase que como dizer que temos 400 vagabundos ganhando sem trabalhar, que foi exatamente esta colocação que a servidora ouviu de outra pessoa sobre o posicionamento do prefeito.
Se o prefeito conclui que tem „uma minoria‟ que está enquadrada na „vagabundagem remunerada‟, então que adote procedimentos oficiais personalizados e individualizados, mas jamais generalistas e com rotulações mais comuns nas filas bancárias. Cito as filas bancárias, pois na agência do Bradesco, em uma fila enquanto aguardava meu atendimento ouvi falas neste sentido de „analfabetos políticos‟ concluindo coisas do tipo: - tem que cortar os pagamentos de todos os afastados; - tem um bando de sem vergonha que não quer trabalhar; - depressão, ora, pega numa enxada pra ver se dá depressão; - isto é doença de rico; - tem um vizinho que vive no supermercado, mas não quer trabalhar. E assim creio que o repertório dos „especialistas em boçalidades‟ vai muito mais longe. Há que se lamentar também a postura de bajuladores ao adorarem total apoio a todas as mazelas verbais dos políticos e aqui não faltam atores com este perfil, que nada ajudam na democracia, mas sim alimentam a demagogia. Ao concluir se constata que o prefeito Carlos Alberto, de forma „imperial‟ expõe certa camada de servidores para julgamentos preconceituosos, indevidos, deprimentes e escorchantes. Aplaudir esta postura é como ser partidário de rotulações toscas, de uma postura ditatorial e falta de senso de respeito para com os humanos, aqui neste caso, já em sofrimento.
PELA BOCA MORREM O PEIXE E OSCAR WILDE. FERNANDO PESSOA