“Sou professor aposentado, escrevo há vários anos, pertenço à Academia Amparense de Letras e, às vezes, sinto uma enorme frustração por ser penas um cronista amador e completamente ignorado pela mídia. Não vejo quase nenhuma perspectiva de sucesso e... Nós, os apagados.” Li e reli a crônica do Prof. Carlos Oliveira no jornal A Tribuna desta sexta, 13. Incomodou-me o conteúdo todo e em especial a revelação de alguns sentimentos nada saudáveis, porém reais e também não exclusivos do escritor.
Frustração, desvalorização, negação, relegado à exclusão, vítima da hipocrisia, foram alguns dos destaques que me ocorreram na leitura. Um desabafo, mas mais que isto uma constatação de nossa realidade: um escritor relegado e renegado como objeto descartável. Creio que dentro de algumas semanas grande parte dos leitores de sua crônica nem mesmo lembrar-se-ão do título: “Nós, os apagados”, do qual tomo a liberdade de me incluir. Também apagado com frequência. Embora com outro sotaque e foco a exposição do Prof. Carlão me trouxe a lembrança da canção “Alagados” dos Paralamas do Sucesso, principalmente na parte que diz: “E a cidade que tem braços abertos num cartão postal com os punhos fechados da vida real lhe nega oportunidades mostra a face dura do mal” Alagados e apagados somos muitos milhares de cantores, escritores, autores, atores, diretores teatrais, gestores de academias de danças, construtores culturais, escultores artísticos; enfim uma elite invisível que não tem a devida valorização das instituições oficiais; e muito menos das organizações sociais atrofiadas pela poeira de suas paredes apáticas. O retrato exposto pelo Prof. Carlos é resultado da falta de escrita e leitura como rotina sociocultural. Temos eleitores e não leitores e então sua crítica também no campo político tem fundamento. Somos carreados a votar em representações nada competentes, mas sim popularescas e
até grotescas. Prova disto foi recentemente um vereador tecer uma crítica dizendo estar carente de projetos na Câmara Municipal, sem qualquer constrangimento ao ‘assinar’ assim sua incompetência na elaboração de projetos. Se Amparo perdeu um suposto protagonismo político ao comparar com o passado, continua ainda perdendo com gestões medíocres suportadas com propostas fisiológicas, boçais e principalmente de baixo impacto na formação psicossocial dos estudantes. Não existe nenhum programa oficial de incentivo à Leitura e à Escrita em nosso ‘cartão postal’, então os ‘punhos fechados’ para a vida real de uma futura geração de cidadãos habilitados exclusivamente em copiar e colar no celular. Somos uma manada de péssimos leitores de manchetes, tais como os alagados na “arte de viver da fé, só não se sabe fé em quê” e assim consumindo boçalidades e opinando sobre ignorâncias das quais nem sabemos lidar. Esperar o que se a sociedade nega valor à leitura e à escrita? Ler não é produto de primeira necessidade na favela da Maré e nem aqui. Vide os níveis do IDEB de nossas escolas e compare-os com as 10 melhores escolas do país que estão distantes das aldeias paulistas. Mucambo, a melhor das escolas está no Ceará. E nós aqui a procura de mecenas em um cotidiano cheio de cenas dantescas. Cabe ao Prof. Antonio Carlos de Oliveira a teimosia de escrever e escrever, ocupando um espaço jornalístico, mesmo supondo que poucos irão ler e muito menos irão se lembrar na semana que vem, pois lamentavelmente as favelas da Maré estão entre nós, os alagados pela mesmice e atrofia mental.
Caro Carlão, pode ser que até o final do mês tenhas novidades, pois irei escrever ao Ministério da Educação da Nova Zelândia propondo o financiamento de um festival de redações como forma de combate à pandemia do analfabetismo funcional que nos assola. Até lá fique com um forte abraço, como num digno cartão postal. PS Em tempo fica aqui um convite público
Amparo, 13 mar/2021 Tito, psicólogo CRP 06-1631-3
Nota adicional: Amanhã, domingo, dia 14 março é Dia do Vendedor de livros, Dia da Poesia, nascimento do poeta Castro Alves; já na segunda é Dia da Escola. Alguma comemoração oficial?