Dialogar REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEXTA REGIÃO
Ano I Edição nº 2 agosto - novembro 2014
O povo de Messias Cultura de descendentes de escravos está desaparecendo
Memorial:
história da Justiça do Trabalho preservada
Aposentado sim, descansando não Entrevista
Isa Maria de Oliveira REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
CARTA AOS LEITORES Após a boa repercussão do lançamento, estamos publicando o número dois da nossa dialogar. Nesta edição (capa) mostramos os descendentes de escravos do sítio Leitão da Carapuça, uma peculiar e rica cultura que está desaparecendo, suplantada pela cultura pop. Na Entrevista, a secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, socióloga Isa Oliveira, aborda as relações entre pobreza e trabalho precoce, analisa as normas de proteção à criança e ao adolescente e critica a concepção de que o trabalho é a saída para livrar a criança da marginalidade. O tema da criança e do adolescente submetidos ao trabalho ganha mais espaço com a matéria “Trabalho infantil: tolerância e falso dilema”. Eleito como categoria a ser destacada pelo programa Trabalho Seguro em 2014, o trabalhador rural aparece em “Trabalhadores rurais mais próximos dos urbanos”. Dentro desse mesmo tema, “Feira de produtos orgânicos” revela como uma experiência bem sucedida vem ajudando a manter o homem no campo e oferecendo alimentação mais saudável. Para muitos brasileiros, a aposentadoria é apenas o ingresso numa nova atividade profissional. O assunto é tratado em “De volta à ativa”. Em tempos de e-comércio a venda porta a porta, sobretudo de produtos de beleza, é crescente e conquista importante fatia do mercado, como mostra a matéria “O produto vai aonde o cliente está”. Testemunha de mais de sete décadas de desenvolvimento das relações de trabalho no Brasil, o trt-pe reúne muito de sua história no Memorial da Justiça do Trabalho em Pernambuco, o que mostra “Para ficar na história”. Em “Por que escolhi Direito”, os dirigentes do trt-pe revelam como ocorreu o processo de escolha do curso em que se graduaram. A implantação do PJe no Regional pernambucano, que desde junho dispõe da ferramenta em todas as suas unidades, aparece em “trt-pe já funciona 100% com o pje-jt”. Outra novidade que a dialogar traz são três ensaios fotográficos, assinados por Stela Maris (Outro lado do trabalhador rural), Elysangela Freitas (Bordando o maracatu) e Danilo Galvão (Trabalhadores da vida eterna). Boa leitura. Eugenio Jerônimo Chefe do Núcleo de Comunicação Social do TRT6
Expediente TRT da 6ª Região Cais do Apolo, 739 Bairro do Recife 50.030-902 Recife PE Imprensa: 81 3225 3216 dialogar@trt6.jus.br PRESIDENTE Ivanildo da Cunha Andrade VICE-PRESIDENTE Pedro Paulo Pereira Nóbrega
DESEMBARGADORES FEDERAIS DO TRABALHO Eneida Melo Correia de Araújo André Genn de Assunção Barros Ivanildo da Cunha Andrade Gisane Barbosa de Araújo Pedro Paulo Pereira Nóbrega Virgínia Malta Canavarro Valéria Gondim Sampaio Ivan de Souza Valença Alves Valdir José Silva de Carvalho Acácio Júlio Kezen Caldeira Dione Nunes Furtado da Silva Dinah Figueirêdo Bernardo Maria Clara Saboya Albuquerque Bernardino Nise Pedroso Lins de Sousa Ruy Salathiel de Albuquerque e Mello Ventura Maria do Socorro Silva Emerenciano Sergio Torres Teixeira Fábio André de Farias Paulo Alcantara
Elysangela Freitas
CORREGEDORA Virgínia Malta Canavarro
Danilo Galvão
DIRETOR-GERAL Wlademir de Souza Rolim
EDIÇÃO Núcleo de Comunicação Social do TRT-PE (NCS)
Tradição cultural de descendentes de escravos sob ameaça
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SECRETÁRIO-GERAL DA PRESIDÊNCIA Ayrton Carlos Porto Júnior
SECRETÁRIA DO TRIBUNAL PLENO Nyédja Menezes Soares de Azevedo
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Venda porta a porta se expande no Brasil
REDATORES
NCS: Eugenio Pacelli · Mariana Mesquita Helen Falcão · Fábio Nunes · Estagiários de jornalismo: Jaqueline Fraga e Marcos Carvalho | Signo Comunicação: Iúri Moreira · Francisco Shimada REVISÃO Eugenio Pacelli
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FOTOGRAFIA NCS: Stela Maris · Elysangela Freitas | Signo Comunicação: Danilo Galvão
IMPRESSÃO Gráfica e Editora Liceu (Tiragem: 1.000 exemplares)
Danilo Galvão
PROJETO GRÁFICO e DIAGRAMAÇÃO NCS: Simone Freire · Gilmar Rodrigues | Signo Comunicação: Micaele Freitas
Memorial preserva momentos marcantes da Justiça
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Instituições se unem
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A melhoria das condições
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Vida na roça
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Entrevista
contra trabalho infantil
de trabalho no campo
transformada pela
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Aposentados que precisam
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Dirigentes do TRT-PE:
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Adeus ao papel: desde junho
produção de orgânicos
continuar trabalhando
a escolha pelo Direito
todas as unidades do TRT-PE funcionam com o PJe
Colunas Na prateleira
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Segurança pelo Brasil
Acervo / FNPETI
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Isa Maria de Oliveira
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Socióloga e Secretária Executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil
Opinião Justiça do Trabalho em Pernambuco: 73 anos de Memória e História Marcília Gama da Silva
Planejamento Estratégico 2015-2020
Kátia do Rego Barros
Preparação para Aposentadoria na Justiça do Trabalho
Renatto Marcello de Araújo Pinto
A Mitologia e o Direito
Paulo Alcantara
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Ensaio fotográfico A tradição do maracatu rural
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Confeccionando
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Profissão: sepultador
vestimentas dos brincantes
Há mais de 15 anos atuando na área de proteção à infância, a socióloga Isa Maria de Oliveira é membro titular da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil (conaeti), assumindo, em 2002, a secretaria executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (fnpeti). Na entrevista a seguir, a estudiosa fala sobre a relação entre a pobreza no Brasil e o trabalho precoce, a má qualidade da educação, as normas de proteção à criança e ao adolescente, a influência de programas assistenciais Acervo / FNPETI
do governo.
Entrevista
Isa Maria de Oliveira
Por Mariana Mesquita
Q
ual é a trajetória da legislação
Constituição é outro, pois afirma que
182 da Organização Internacional do
quanto à proibição do trabalho
o trabalho infantil é uma violação
Trabalho (oit), que dispõe sobre as
infantil desde o início da discussão
dos direitos humanos de crianças e
piores formas de trabalho infantil. Em
sobre o tema até os dias de hoje no
adolescentes. Nesse artigo são decli-
2001, o Brasil ratifica a Convenção
Brasil?
nados seus direitos fundamentais,
138, que dispõe sobre a idade míni-
a proteção integral e o princípio da
ma, apesar de já ter uma superior à
prioridade absoluta.
proposta pela norma, que é de 15 anos
Um marco importante foi a aprovação da Emenda Constitucional 20 (1998), que elevou a idade mínima
Na sequência, em 2000, o Brasil
de 14 para 16 anos. O artigo 227 da
se torna signatário da Convenção
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
ou uma compatível com a conclusão da escolarização obrigatória.
A seu ver, muita coisa mudou na
Proteção ao Trabalhador. Outro ob-
esfera do trabalho infantil no país
jetivo era a elaboração e revisão da
após a adesão a esses diplomas?
lista das piores formas. Além disso, a
Da ratificação da convenção 138,
Comissão busca adequar a legislação
que recomenda a elaboração de um
brasileira para o melhor cumprimen-
plano pelo país signatário, decorre
to das convenções da oit.
o surgimento do Plano Nacional de
Quais as principais ações da cam-
Prevenção e Erradicação do Trabalho
panha da fnpeti e oit “Todos juntos
Infantil e Proteção ao Trabalhador
contra o trabalho infantil”, lançada no
Adolescente, em 2003. Em seguida,
dia 12/6? O que se espera da iniciativa?
para cumprir a Convenção 182, o Bra-
A campanha atual, como todas as
sil estabelece as atividades perigosas
outras, busca atingir toda a popula-
e insalubres. Nesse sentido, o marco
ção brasileira, e introduzir o tema na
mais importante foi a aprovação do
pauta política dos governos federal,
“O fato de o Brasil ser
decreto 648, em 12/06/2008, que es-
estaduais e municipais, com o fim
signatário das convenções
tabelece a lista das piores formas.
de sensibilizar, informar e fortale-
da oit fortalece e promove
O fato de o Brasil ser signatário
cer o tema, tornando-o prioridade
as ações de articulação
das convenções fortalece e promove
nas decisões políticas dos gestores
das campanhas contra o
as ações de articulação. Nesse contex-
públicos. Outro objetivo é fazer
trabalho infantil.”
to é instituída no Brasil a conaeti,
com que a sociedade seja cada vez
também em 2003, que é coordenada
mais informada de que a prática traz
pelo Ministério do Trabalho e Em-
inúmeros prejuízos, para contribuir,
prego (mte) e tem uma composição
assim, para desmistificar aquelas
plural: ali estão representados vários
percepções que ainda vigoram na
ministérios federais, centrais sin-
sociedade de que o trabalho é bom,
dicais, confederações patronais, o
de que para a criança pobre ele é uma
Ministério do Trabalho e Emprego
solução – todos os dados estatísticos
(mte), a oit e a unicef (Fundo das
mostram exatamente o contrário.
Nações Unidas para a Infância) como
É considerado trabalho infantil,
observadores, o Conselho Nacional
no Brasil, o realizado por crianças
dos Direitos da Criança e do Adoles-
ou adolescentes com idade inferior a
cente (conanda) e o fnpeti.
16 anos, exceto aqueles que o fazem
Quais os objetivos da conaeti?
na condição de aprendiz, cuja ida-
A conaeti é um órgão consultivo
de mínima permitida é de 14 anos.
do mte, sem caráter deliberativo ou
Mas esses limites não se aplicam ao
executivo, e foi criada com objetivos
trabalho doméstico. Qual o motivo
de elaborar, monitorar e implemen-
para só se poder trabalhar no âmbito
tar o Plano Nacional de Prevenção
doméstico a partir dos 18 anos?
e Erradicação do Trabalho Infantil e
A lista das piores formas de
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trabalho infantil, aprovada pelo de-
consequências da atividade doméstica
– é nesse momento em que se deve
creto 648, estabelece os 18 anos para
precoce. O grave é que os desdobra-
investir no desenvolvimento cog-
o trabalho doméstico e para todas
mentos para a saúde muitas vezes só
nitivo.
as atividades que comprometem o
aparecem tardiamente, comprome-
desenvolvimento físico, psicológico,
tendo o desempenho profissional.
A questão da pobreza no Brasil é fator determinante para que crianças e adolescentes permaneçam tra-
moral e cognitivo, ou seja, que com-
Um estudo realizado recente-
promete o pleno desenvolvimento
mente pela unicef que buscou im-
da criança e do adolescente. Den-
plementar ações para inclusão esco-
A pobreza contribui muito
tre essas piores formas, quer pela
lar até 2015 revelou que o abandono
porque o rendimento médio das
natureza, quer pelas condições por
da escola tem duas causas determi-
famílias no Brasil é baixo. Mas não
meio das quais essas atividades são
nantes no Brasil: o atraso escolar e o
é só isso: temos também a questão
realizadas, está a exploração sexual
trabalho infantil – que compromete
cultural. Ainda não conseguimos
comercial, prevista na Convenção
a escolarização. Mesmo quando a
fazer com que educadores, famí-
182. Esse foi também um marco im-
criança continua estudando, o ren-
lias, gestores públicos, a mídia en-
portante do Brasil, quando foram
dimento é sempre 10, 12% abaixo
tendam que a escola é o locus mais
incluídas na lista atividades proi-
daquelas que só estudam. Nos casos
importante para formar o caráter
bidas a menores de 18 anos.
do trabalho doméstico, esse número
e que o trabalho infantil acelera o
chega a 20%.
processo de “adultizar” a criança,
Quais são as principais implicações na vida adulta para quem tra-
balhando...
Olhando sob a vertente dos di-
que tem comprometido seu direito
reitos humanos, a prática retira da
ao repouso, à brincadeira, ao tem-
Pessoas que trabalham na casa
pessoa o direito a se desenvolver
po de estudo e é exposta a outros
de amigos, parentes, que afirmam
plenamente. Não é sem razão que
riscos. Existe também o caso do
haverem começado a trabalhar aos
não só o Brasil, mas todos os pa-
trabalho infantil informal, que é
10, 12 anos, muito frequentemen-
íses estabelecem uma faixa etária
uma porta aberta para o alicia-
te apresentam tendinites, bursites,
em que a escolarização é obrigatória
mento das redes criminosas, tanto
balhou durante a infância?
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
da exploração sexual como do tráfico de drogas.
Como não há regulamentação, fica a cargo dos juízes autorizar ou
Outro elemento causal impor-
não, e isso tem acontecido de forma
tante é a educação no Brasil, que
indevida. Mais graves ainda são as
ainda não é de qualidade. Isso leva
autorizações para que menores tra-
muitos adolescentes, pela sucessiva
balhem na rua, em lixões, na cons-
repetência e recorrente mal desem-
trução civil, atividades definidas pelo
penho, ao abandono da escola, que
decreto 6.481 da presidência da Re-
não encanta o estudante nem motiva
pública como atividades perigosas e
sua família, cujos membros, que não
não permitidas a menores.
tiveram uma educação de qualidade,
A problemática do labor infantil
não conseguem percebê-la como um
não pode ser responsabilidade apenas
meio de construir um projeto de vida
do governo. A sociedade tem papel
para seus filhos.
importante para a erradicação dessa
“Olhando sob a vertente
prática...
dos direitos humanos, a
O trabalho realizado pelo menor
prática retira da pessoa o
de 16 anos, quando este tem economia
A própria constituição do
própria decorrente de estabelecimento
fnpeti e de todos os espaços onde
direito a se desenvolver
civil ou comercial, ou pela existência
se discutem e se propõem estraté-
plenamente. Não é
de relação de emprego, é devidamente
gias para enfrentar o trabalho in-
sem razão que não só
autorizado pelo Código Civil de 2002.
fantil têm composição plural, pois
o Brasil, mas todos os
Como o Fórum Nacional de Prevenção
o Brasil tem uma compreensão de
países estabelecem uma
e Erradicação do Trabalho Infantil se
que deve haver uma articulação for-
faixa etária em que a
posiciona em relação a isso?
te entre governo e sociedade civil.
escolarização é obrigatória.”
Esse trabalho não é autorizado,
A maior incumbência, no entanto, é
a lei maior é a Constituição Fede-
do poder público, pois é responsável
ral, que proíbe qualquer trabalho
pela elaboração, implementação e
a menores de 16 anos, salvo como
eficácia das políticas públicas, por
aprendiz, a partir dos 14. O traba-
meio das quais os direitos são uni-
lho infantil artístico, no entanto, é
versalizados. Como se vê, na socie-
tema controverso. No artigo 8º da
dade civil temos várias ongs que
convenção 138 há uma excepciona-
desempenham atividades extrema-
lidade ao trabalho artístico: tem que
mente importantes, mas é um papel
ser autorizado judicialmente, caso
complementar. O que buscamos é
a caso e por tempo determinado,
a universalização de direitos, tais
e em consulta com as entidades
como uma escola de qualidade, pro-
de trabalhadores e empregadores.
teção integral, acesso a uma saúde
Além disso, devem ser respeitados
de qualidade, ao lazer, à cultura. Só
os interesses maiores da criança.
assim é que teremos uma prevenção
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efetiva contra o trabalho infantil e
pois a lei que o institui estabelece
contra toda e qualquer violência
apenas duas condições: a frequência
contra a criança e o adolescente.
à escola e o atendimento à saúde.
“A pobreza contribui muito porque o
Qual a situação do Brasil em
O programa alcançou 18,5 mi-
comparação a outros países de nível
lhões de crianças e adolescentes,
rendimento médio das
econômico similar com relação à er-
mas tanto o gestor municipal quan-
famílias no Brasil é baixo.
radicação do trabalho infantil?
to as famílias não foram motivados
Mas não
Temos muita dificuldade em
a priorizar o combate ao labor pre-
é só isso: temos também
fazer essa comparação, porque a
coce. É frequente encontrar crianças
a questão cultural. Ainda
própria coleta de dados não parte
atendidas pelo programa trabalhan-
não conseguimos fazer
dos mesmos patamares. Segundo a
do. Então a frequência à escola é
com que educadores,
oit, que apresentou um estudo em
bom para atacar o trabalho infantil,
famílias, gestores públicos,
2012 sobre a situação nas grandes
mas o serviço socioassistencial não
a mídia entendam que
regiões, subdivididas em América
se estabeleceu nem à altura da qua-
a escola é o lócus mais
Latina e Caribe, Ásia e Pacífico, e
lidade da escola, que já não é boa,
importante para formar
África, a situação mais grave é na
nem tampouco na mesma extensão.
o caráter e que o trabalho
África: uma em cada cinco crianças
O que vence, portanto, é a in-
infantil acelera o processo
trabalha. O mesmo relatório revela
terferência dos fatores culturais: já
uma redução na Ásia. Já na América
que a criança está indo para a esco-
Latina, onde está inserido o Brasil,
la, não há problema em continuar
houve uma redução muito tímida,
trabalhando, como se o trabalho
o que causa grande impacto, já que
complementasse essa situação de
lhes foram negadas, para que a família
o Brasil representa 28% do trabalho
direito. Ao contrário, ele nega.
possa cumprir o papel constitucional
de “adultizar” a criança.”
Até onde deve ir a ação educati-
de proteger a criança e o adolescente.
Como a senhora relaciona alguns
va e quando deve começar a punitiva
Então outra política que precisa
programas assistenciais do governo,
quanto à responsabilização das famí-
avançar é a de assistência social,
a exemplo do Bolsa Escola e do Bolsa
lias que têm suas crianças e adoles-
porque o objetivo dos programas
Família, com o combate ao trabalho
centes no mercado de trabalho?
não é apenas de transferir renda;
infantil da região.
infantil? Esses programas funcionam
O Fórum Nacional defende
a transferência de renda implica
como uma ferramenta que auxilia na
e compreende que a família não
em dar à família inclusão em pro-
erradicação do trabalho precoce?
pode ser punida. Estamos falando
gramas de formação profissional,
Como prevenção, qualquer pro-
de adultos que não tiveram oportu-
inclusão produtiva, para que ela
grama que visa a fortalecer a inclusão
nidade, não têm escolaridade e não
saia desse patamar para, então, po-
escolar é muito importante. O Bolsa
são atendidos adequadamente e com
der ser orientada e cobrada a dar a
Família, sucessor do Bolsa Escola, ao
eficiência pela política de assistência
proteção à criança e ao adolescen-
ser integrado ao peti (Programa de
social. Então essa responsabilização
te. Isso não é dado geneticamente,
Erradicação do Trabalho Infantil),
só deve acontecer quando se assegu-
é construído cultural, histórica e
perdeu o foco no trabalho infantil,
rarem todas as oportunidades que
socialmente.
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Acervo / FNPETI
“É melhor estar trabalhando do
e da proteção ideal, as opções são
Esse número é expressivo, mas o re-
que roubando”. Esta é uma afirmação
estudar, brincar, ter acesso a uma
sultado veio depois de duas décadas,
que encontra eco na sociedade. A isso
educação de qualidade na proteção
então é preciso analisá-lo inserido em
se resumem as opções dadas às crian-
da sociedade, da família e do Es-
todo esse contexto: em quanto tempo
ças e adolescentes brasileiros? Quais
tado. É essa a opção legal, não há
conseguiremos erradicar a prática?
são os direitos a eles assegurados?
outra. Além de equivocado, esse
Evidentemente que temos bons
Esse mito, essa inverdade é cons-
posicionamento tem um caráter
planos, estratégias e propostas, mas
truída e faz parte da ideologia do
discriminatório, uma vez que quan-
ter um universo de 3,4 milhões de
país e vem sendo repetida. Essas não
do se fala em trabalhar ou roubar,
crianças e adolescentes trabalhando
são opções. É proibido o trabalho
está-se falando na criança pobre e
é muito grave. Precisamos ultrapas-
infantil, e o roubo é um ato ilícito.
excluída. Isso é muito perverso.
sar as propostas para uma eficácia na
O Estado, a sociedade e as famílias têm que trabalhar juntos para que
Há algum aspecto que a senhora acharia importante frisar?
prática. Esse esforço tem que partir de todos os setores sociais e do go-
as crianças sejam protegidas e não
O nosso país tem tudo muito gran-
verno, a fim de reverter a situação
se envolvam ou sejam aliciadas por
de: o maior programa de transferência
e eliminar, em 2016, todas as piores
essas redes criminosas. Do ponto
de renda, uma redução expressiva no
formas de trabalho e, em 2020, todas
de vista ético, de direitos humanos
trabalho infantil de 56% em 20 anos.
as formas de trabalho infantil.
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Uma cultura que se vai A contínua migração do campo para a cidade, o predomínio dos valores urbanos e a força da cultura de massa ameaçam a rica tradição cultural dos descendentes quilombolas do sítio Leitão da Carapuça
Fotos: Elysangela Freitas Texto: Eugenio Jerônimo
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P
assados 126 anos da abolição da
eles se situam no mesmo patamar
escravatura, descendentes de es-
da maioria dos pequenos sitiantes
cravos que vivem no Leitão da Cara-
do Sertão. Ao longo do tempo de-
puça, sítio do município de Afoga-
penderam dos anos bons de chuva
dos da Ingazeira (380 km do Recife),
para terem colheita com fartura, para
Sertão do Pajeú, encontram-se no
“lucrarem”, como se diz na variante
geral integrados à sociedade da re-
linguística dos sertões nordestinos.
gião. Mas eles ainda enfrentam uma
Os integrantes das 45 famílias
dissimulada discriminação e, com os
sempre sobreviveram da agricultura
últimos praticantes, está acabando
de subsistência, principalmente do
um rico conjunto de manifestações
cultivo de feijão, milho, macaxeira,
culturais que ainda mantém viva a
mandioca, castanha de caju e de ou-
arte de seus ancestrais.
tras culturas em menor proporção.
Esses descendentes de escravos,
A criação, em pequena escala, de
que formam 45 famílias, levam uma
gado, porco, bode e galinha é ou-
vida semelhante à dos demais habi-
tra atividade que remonta a hábitos
tantes do entorno. Economicamente,
muito antigos.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Mas seu modo de vida está mudando. Embora permaneçam ligados à agricultura e à pequena criação, começam a diminuir os rebanhos e as roças. A casa de farinha, na frente da qual os moradores faziam fila na disputa por um espaço para a transformação da mandioca, está desativada. O preço da farinha já não compensa o trabalho e as instalações foram alugadas a uma igreja evangélica. Fonte importante de incremento do cardápio e, ao mesmo tempo de divertimento, a caça de aves, tatus e veados deixou de ser praticada porque quase já não se encontram algumas espécies e porque a legislação nacional de proteção à fauna tornou-se mais rigorosa, com vigilância constante do Ibama. Novidade é o beneficiamento de castanha de caju para comercialização, com orientação técnica da Prefeitura Municipal de Afogados da Ingazeira sob o selo “Mãos crioulas”, criado pela comunidade. Organizada em cooperativa, a atividade complementa a renda de 20 famílias, que vendem por ano até 3 mil quilos do produto, o que gera uma renda de r$ 96 mil. Um problema que se avizinha é a praga conhecida como mosca branca, que destrói os cajueiros, porém “professores da Universidade Federal Rural de Pernambuco já estão dando orientação para combater a mosca, com o uso de defensivos naturais”, adianta o líder da comunidade, Sebastião [Veneranda] José da Silva.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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Liderança. Sebastião Veneranda encaminha os pleitos da comunidade
A venda de castanha de maneira
armazenamento de água da chuva
Governo Federal, como o Pronaf,
profissional e com o valor agrega-
e a construção de uma barragem
que apoia a agricultura familiar, e
do da marca é o índice de um novo
de médio porte, com capacidade
o bolsa-família.
período. Com uma organização
para 150 mil metros cúbicos, recém-
Sebastião também integra a di-
marcada pela solidariedade de seus
-concluída e que aguarda as chu-
retoria do Sindicato dos Trabalha-
membros, sempre prontos para um
vas para garantir o abastecimento.
dores Rurais de Afogados da Inga-
mutirão, seja para fazer farinha, seja
A pequena vila não tem posto de
zeira, exercendo pela terceira vez o
para limpar uma roça de milho, seja
saúde nem escola, serviços que são
cargo de diretor de política agrária,
para rebocar uma casa de taipa, o
encontrados na Carapuça, a 6km da
agrícola e de meio ambiente, eleito
povo do Leitão passou a articular-se
localidade. Para os estudantes a Pre-
para o período de 2012 a 2016. Ele
politicamente e começou a reivin-
feitura de Afogados da Ingazeira ga-
avalia que a organização do povo
dicar do poder público a oferta de
rante o transporte à escola vizinha,
do Leitão vai se intensificar e será
serviços básicos. Criou em 1995 a
que oferece o Ensino Fundamental.
mantida porque vê “novas pessoas se
Associação Rural do Umbuzeiro e
De acordo com o líder comu-
preparando para continuar a luta em
Leitão – arul –, com o apoio do
nitário e sindical Sebastião José da
busca de projetos de geração de ren-
Sindicato dos Trabalhadores Ru-
Silva, “A criação da arul foi um
da”. Embora vivam na terra há muito
rais de Afogados da Ingazeira, que
importante passo dado pela comu-
tempo, os moradores ainda não têm
já atuava na região.
nidade, pois o povo teve mais for-
o título, para isso aguardam um novo
A partir das reivindicações im-
ça para exigir seus direitos, como
cadastro do Governo Federal.
pulsionadas pela Associação, os
a manutenção da estrada de terra,
Apesar da integração com os de-
moradores receberam energia solar,
que liga o Leitão a Afogados, agora
mais grupos da sociedade em volta,
em 1995, substituída pela energia
sempre ajeitada pela máquina”. É
um fenômeno demonstra um tipo de
elétrica em 1998. Outras conquis-
também a Associação que orienta e
silenciosa discriminação. Ao longo
tas foram a edificação de banheiros,
organiza os habitantes a terem aces-
da história da comunidade, os ca-
a construção de 20 cisternas para
so aos programas instituídos pelo
samentos se deram sempre entre os
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
membros do grupo de descendentes
da comunidade e a valorização de ex-
de escravos. Esta regra tácita, conse-
pressões como o coco e o pífano, o
grupos até em capitais como o Re-
quência de uma segregação velada,
preconceito vem diminuindo. “O pre-
cife e Brasília gerou mais admiração
permanece em vigor nos dias atuais,
conceito era maior”, afirma Sebastião.
que reconhecimento e recompensa
mesmo depois de um mais intenso
“Não chamavam a gente nem pelo
financeira. Com os últimos artistas,
relacionamento do povo do Leitão
nome, só diziam ‘os nego do leitão’
estas duas manifestações culturais
com a sociedade e de sua inserção na
ou os ‘neguim do Leitão’”, lembra.
da comunidade estão morrendo. O
arena da luta política, mas já se re-
Chama a atenção o talento para
“batalhão” de bacamarte também
gistram casamentos e relacionamen-
a música de muitos integrantes da
está ameaçado de acabar porque seus
tos fora dos limites do grupo social.
comunidade. A banda de pífano tor-
integrantes, a exemplo de Zé de Zul-
Isso mostra que, apesar de séculos de
nou-se célebre e nos anos 70, uma
mira, 88 anos, têm idade avançada,
existência, e de convivência harmô-
época em que os remanescentes
embora a tradição possa ter continu-
nica com outros grupos sociais da
quilombolas eram quase invisíveis,
adores uma vez que não depende do
área, este grupo de afrodescendentes
conquistou por duas vezes o prê-
desenvolvimento de um talento tão
não pode transitar livremente por
mio de melhor banda da categoria
específico como no caso do coco e
todos os espaços sociais. Etnias de
de Pernambuco, em concurso rea-
do pífano.
outras origens que não dos escravos
lizado pela Fundarpe. Redescoberta
A banda de pífano acabou sem
vindos da África mantêm deles uma
pelos meios oficiais nos anos dois
deixar sucessores. Único remanes-
discreta distância quando o assunto
mil, a banda, ao lado do Coco do
cente da famosa formação que ti-
é união matrimonial.
Leitão, teve um cd gravado com a
nha Luís de Dona Branda (pife), Zé
É verdade que com a descoberta do
produção do Quinteto Violado. Mas
João (zabumba), Mané Pedro (caixa),
talento artístico de muitos integrantes
parece que a exibição de ambos os
Gonzaga de Dona Branda já não toca
Ao longo da história da comunidade, os casamentos se deram sempre entre os membros do grupo de descendentes de escravos. Casados, Gonzaga e Neuza são primos.
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seu pife, a saúde não o permite. De-
puxa as toadas. Herdeiro musical de
Perseguidos pelos senhores e
sintegrado, o grupo não atrai mais o
seus parentes Joaquim Gonçalo, Luís
abafados por séculos de pressão da
interesse de alguns talentos novos,
Gonçalo e Zé Júlio, Inácio Pedro está
Igreja Católica, perderam-se nas
como Francisco Venerando, 42 anos,
desanimado. “Perdi meu pareia em
noites do tempo os cultos a outros
que foi fazer parte do quarteto de
2012”, fala com saudade. “Sozinho
deuses que os ancestrais africanos
outra comunidade.
não dá pra cantar, um tem de cantar
trouxeram quando chegaram ao
“A gente não se preocupou de
e o outro responder”, explica, refe-
Brasil, como mão de obra servil. O
ensinar [a tocar pífano], e os mais
rindo-se à morte do outro mestre,
povo do Leitão professa – com en-
moços também nunca ligaram mui-
Aguinaldo Gonçalo. Mesmo assim,
tusiasmo – a fé católica e, mais que
to”, lamenta Gonzaga.
nas festas de São João a comunidade
isso, organiza e patrocina novenas,
Também sem deixar continu-
se reúne para “mazurcar”, na dança
como no mês de Maria, em maio,
adores, está acabando o Coco do
do “miudinho”, adiando o fim, que
que ocorre no Lajedo, sítio no mu-
Leitão. Aos 68 anos, Inácio Pedro
parece inevitável, de uma bela forma
nicípio de Custódia, onde moram
é o último representante que ainda
musical, poética e de dança.
descendentes do grupo. A igreja do Quitimbu (360 km do Recife), distrito de Custódia-PE, abriga uma imagem de Nossa Senhora do Rosário, doada pela comunidade de descendentes de escravos. “Os cativos prometeram que, se ganhassem a liberdade, davam a imagem da santa à igreja”, conta Dona Messias, neta de escravos. Certamente alguns elementos afros se amalgamaram aos rituais que praticam nas liturgias católicas, mas não é fácil identificá-los. Os primeiros escravos podem ter chegado ao Leitão da Carapuça cerca de três séculos atrás, para construir uma comunidade livre. O núcleo principal dos pioneiros veio do sítio São José, de Custódia, onde havia uma fazenda de criação de gado e plantação de algodão com amplo uso de mão de obra cativa. Os registros escritos são escassos e, apesar das visitas recebidas, feitas por estudantes da região e de locais
mais distantes e até de interessados
públicas para a construção do de-
O Leitão reunia as condições ide-
estrangeiros, o povo do Leitão ain-
senvolvimento na Comunidade”, afir-
ais para a formação de um quilombo.
da aguarda o registro escrito de sua
ma o professor.
Situado na Bacia Sedimentar de Betâ-
história. Um trabalho inicial foi re-
Mesmo na tradição oral circulam
nia, a área é um mesoclima, por isso
alizado pelo professor e Mestre em
poucas histórias sobre a formação da
apresenta índice de chuvas maior que
Extensão Rural e Desenvolvimento
comunidade do Leitão da Carapuça.
a média do semiárido, tem lençóis
Local pela Universidade Federal Ru-
Também os integrantes das famílias
freáticos mais generosos e um solo
ral de Pernambuco, Alfredo Sotero
são econômicos em transmitir aos
fértil, o que propiciava a plantação de
(Unicap). “A pesquisa centra-se em
novos membros a história dos seus
roças para sobrevivência. Além disso,
compreender as reconversões cul-
antepassados. Invisíveis durante muito
remoto, cercado de montanhas, de
turais que a população quilombola
tempo, depois de “descobertos” os
muito difícil acesso, o local deixava
procede em seu trabalho e em sua
descendentes quilombolas correm o
a salvo da perseguição dos senhores
vida, face às propostas das políticas
risco de terem sua história apagada.
os negros rebelados.
A pré-história mora ao lado
Palco de uma história significati-
rupestres feitas há muitos séculos.
va para compreensão da sociedade
Segundo o arqueólogo do Iphan
brasileira em suas múltiplas faces,
Onésimo Jerônimo, “O local era
o Leitão tem um vizinho de histó-
pródigo em frutos e rico em ani-
ria ainda muito mais antiga: o “Le-
mais”, por isso atraía os homens
treiro”, furna que guarda inscrições
primitivos.
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A grande mãe Mais velha representante da comunidade do Leitão da Carapuça, aos 94 anos, Dona Messias conserva plena lucidez, e caminha, mesmo com certas limitações. É uma “rezadeira” de novenas e “cantadeira” de antigos e longos “benditos” nas missas e outras cerimônias religiosas. É ela a personagem principal na cerimônia em que velam os mortos, as sentinelas, em que desfia extensos e pesarosos cantos. “Hoje em dia o povo não quer mais, acha muito pe-
dedica todo mês de maio uma no-
noso, mas quando é parente da gente
vena a Maria, que era feita em casa,
eu canto”, afirma Dona Messias. Ela é
mas agora a comunidade construiu
a última da comunidade que domina
uma capela, que passou a receber a
este ritual.
novena e outras obrigações católicas.
Durante a entrevista, soltou a voz
Ela trabalhou a vida inteira na
firme e grave para demonstrar um
roça e fala das secas que enfrentou.
dos cantos que entoa nas sentine-
“Eu me alembro da de 28 e da de 32,
las, O pranto de Nossa Senhora. “Tão
as pior”, diz em alusão às estiagens de
contrita e tão aflita/Estava a Virgem
1928 e 1932 no Sertão. Afirma: “meu
bendita/Mãe do nosso redentor,/O
pai não, mas meu avô foi cativo”.
qual chorava e gemia/Suas penas
Boa contadora de histórias, narra
cruéis e via/De Jesus meu doce amor.
a demanda que sua família teve com a
/Vós nem sentis nem chorava/De ver
Igreja Católica porque um padre reti-
a mãe de Deus preclara/De dores tão
rou da igreja do Quitimbu a imagem
trespassada/Vós nem se entristecia/
de Nossa Senhora do Rosário, doada
Nem se compadecia/De ver mãe tão
como agradecimento pela Abolição
penalizada./Tem de misericórdia, ai
da Escravatura, e à qual devotam uma
Senhor/Tem de misericórdia, ai de
novena todo mês de dezembro.
nós.”
Faz uma cara séria e um pouco
“Eu não tenho leitura”, diz, “mas
enfurecida quando conta a passa-
aprendi tudo [orações e hinos] com
gem em que a santa é subtraída e
meu pai”.
ri quando narra o desfecho feliz da
No sítio Lajedo, onde mora,
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história: a volta da santa à igreja.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Na prateleira História do Direito Brasileiro
SUS versus Tribunais Limites e Possibilidades para uma Intervenção Judicial Legítima
Transexualidade e Direitos Humanos - O Reconhecimento da Identidade de Gênero entre os Direitos da Personalidade
Autor Rui de Figueiredo Marcos, Carlos Fernando Mathias e Ibsen Noronha Editora Forense Universitária (Grupo GEN)
O livro trata da história do Direto no Brasil desde a época colonial até o século XXI. Em 21 capítulos, os autores refletem o ponto de vista doutrinal e o modo histórico de pensar o direito. Assinam a obra o magistrado e professor aposentado da UnB ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça, Carlos Fernando Mathias, o professor da Faculdade de Coimbra, Rui de Figueiredo Marcos e o doutorando Ibsen Noronha.
Autor Camila de Jesus Mello Gonçalves
Autor Vinícius Pacheco Fluminhan
Editora Juruá
Editora Juruá
O tema da transexualidade é atual e desafia a compreensão de profissionais de diversas áreas. No meio jurídico surgem questões como a alteração no registro civil do nome e do sexo do transexual. Este livro aprofunda o assunto de maneira interdisciplinar sob a vertente do princípio da dignidade da pessoa humana. A autora é magistrada, especialista em Direitos Humanos pela USP e professora universitária.
A obra propõe uma tipologia das demandas judiciais surgidas contra o SUS, que vem crescendo nos últimos anos, numa abordagem voltada para o Estado como prestador de serviço. O advogado e professor universitário Vinícius Pacheco Fluminhan discute o tema relevante e atual propondo a utilização de tutelas coletivas às tutelas individuais como forma de melhor preservar o princípio democrático e igualitário.
Direito Eleitoral
Desaposentação
Direito Constitucional do Trabalho – da análise dogmática à concretização de questões polêmicas
Autor
Autor
Autor
Rodrigo Tenório
Dávio Antonio Prado Zarzana e Dávio Antonio
Tereza Aparecida Asta Germignani e Daniel
Editora Método (Grupo GEN)
Prado Zarzana Júnior
Gemignan
Editora Elsevier
Editora LTr
A renúncia à aposentadoria recebida para pleitear outra mais vantajosa vem sendo uma prática recorrente nos últimos anos. Este livro apresenta um seguro instrumento para todos aqueles que desejam esclarecer as complexas questões envolvendo o tema, além de um capítulo de perguntas e respostas e modelos de peças processuais. Os autores são especialistas em Direito Tributário e Previdenciário e atuam como professores universitários.
Lançado pela desembargadora e vice-diretora da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas-SP), Tereza Aparecida Asta Gemignani com o auditor fiscal do trabalho Daniel Gemignani, o livro analisa a constitucionalização do Direito do Trabalho e seus efeitos nas questões trabalhistas. Os temas e questões propostos são discutidos com base na doutrina e no estudo de casos concretos.
A mais nova edição da Série Carreiras Federais proporciona um estudo sistemático, analítico e crítico do Direito Eleitoral. A obra, que traz as últimas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para as eleições de 2014 e a jurisprudência mais recente sobre o tema, destinase tanto àqueles que desejam ingressar nas carreiras jurídicas federais como a agentes políticos, servidores, advogados, professores e demais profissionais da área jurídica.
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Outro lado do trabalhador rural
A
brir valetas, plantar, limpar, adubar, tombar, cortar cana. São tarefas que fazem do
cotidiano dos canavieiros uma atividade penosa. Mas esta vida extenuante não os impede de sonhar a festa, a dança, o simbolismo, a arte. Talvez até os inspire. Os moradores do engenho Cumbi, em Nazaré da Mata (50 km do Recife), vestem-se de cores e animação no Maracatu Rural, criando uma alegre realidade que contrasta com o árduo dia a dia. O maracatu é uma tradição que faz parte do acervo cultural de Pernambuco.
Stela Maris
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21
A
Trabalho infantil: tolerância e falso dilema
exploração da mão de obra de crianças e adolescentes ainda
é praticada em muitos países, como no Brasil, em geral nas regiões economicamente menos favorecidas,
“É melhor a criança estar trabalhando ou estar roubando?”.
por causa da necessidade de renda
Essa é uma pergunta que muitas pessoas fazem, optando
familiar, principalmente na camada
pela resposta óbvia: “É melhor estar trabalhando.” O
mais pobre da população, onde se
problema é que a questão está mal colocada. O melhor é a
registra maior índice de natalidade.
criança estar estudando e brincando. Trabalhar ou roubar
Mesmo com muitas normas e re-
não devem ser as alternativas
gulamentações proibindo o trabalho infantil, essa exploração ainda é alta Danilo Galvão
Texto: Fábio Nunes
nos municípios brasileiros, seja nos centros urbanos, seja em áreas rurais. O governo do Brasil se comprometeu a erradicar, até 2016, as piores formas de trabalho infantil e, até 2020, todas as formas dessa exploração. Mas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ibge), ainda há muitos jovens em situação de trabalho irregular no país. De acordo com o Instituto, dados de 2012, há no país 42.139.454 crianças e adolescentes, sendo 3.517.540 em situação de trabalho. Em Pernambuco, são 2.076.781 crianças e adolescentes, com 137.593 em situação de exploração. Ainda segundo o ibge, no Brasil, 258 mil crianças e jovens realizam trabalho doméstico nas casas de outras pessoas e a grande maioria (94%) é de meninas. O Trabalho Infantil nos centros urbanos envolve crianças que trabalham nas feiras livres, em lixões e que vendem produtos nas avenidas e semáforos, além das que são aliciadas pelo narcotráfico. No
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
campo, trabalham 450 mil meninos
em locais prejudiciais à sua forma-
e meninas, segundo o ibge, sendo
ção, ao seu desenvolvimento físico,
que quase 75% dessas crianças estão
psíquico, moral e social, e em ho-
na agricultura familiar, sem receber
rários e locais que não permitam a
pelos serviços realizados.
frequência à escola.
Estatísticas de 2012 da Organiza-
A oit considera as “piores formas
ção Internacional do Trabalho (oit)
de trabalho infantil” certas as ativi-
mostram um panorama mundial
dades mais nocivas e cruéis aos jo-
em que 168 milhões de crianças e
vens, como o trabalho escravo, o uso
adolescentes, entre 5 e 17 anos, es-
de crianças em conflitos armados, a
tão em situação de trabalho infantil,
prostituição de menores e o uso de jo-
cerca de 11% da totalidade da popu-
vens na produção e tráfico de drogas.
lação infantil e mais da metade (85
Em um recente relatório, o Fundo
milhões) está envolvida com traba-
das Nações Unidas para a Infância
lhos perigosos. De 2000 a 2012, o
(unicef) afirma que uma aborda-
trabalho precoce vem apresentando
gem integrada envolvendo governos,
uma redução, com 78 milhões de
organizações internacionais, socie-
crianças a menos, representando
dade civil, setor privado, os próprios
uma queda de 33%.
jovens e suas famílias é a chave para
Conforme o Estatuto da Criança
a eliminação do trabalho infantil.
e do Adolescente (eca), a pessoa é
Isso envolve o apoio às famílias, a
considerada criança até os 12 doze
melhoria da qualidade da educação, a
anos incompletos e adolescente, dos
prevenção da violência nos lares e nas
12 completos aos 18 anos incom-
escolas, o enfrentamento da pobreza
pletos. O eca conceitua Trabalho
e das desigualdades e a mudança na
Infantil como aquele realizado por
cultura que trata o trabalho infantil
crianças ou adolescentes com idade
como algo natural.
inferior a 16 anos, a não ser na con-
Contribuindo para erradicar o
dição de aprendiz, quando a idade
problema social, o Programa Inter-
mínima permitida passa a ser de
nacional da oit para a Eliminação
O trabalho em canaviais, em
14 anos. No Brasil, a Constituição
do Trabalho Infantil (ipec), imple-
minas de carvão, em funilarias,
Federal (cf) admite o trabalho, a
mentado no Brasil desde 1992, tem
em cutelarias (locais onde
partir dos 16 anos, exceto nos ca-
mais de 100 ações de combate ao
se fabricam instrumentos de
sos de trabalho noturno, perigoso
trabalho infantil, em todo o territó-
corte), na metalurgia e junto
ou insalubre, para os quais a idade
rio nacional. Em 12 anos de atuação,
a fornos quentes são formas
mínima é 18 anos. A Consolidação
o ipec conseguiu retirar do trabalho
nocivas de trabalho infantil
das Leis do Trabalho (clt) garante
mais de 800 mil crianças.
registradas no Brasil.
ao trabalhador adolescente entre 14
A Justiça do Trabalho também
e 18 anos a proibição do trabalho
vem agindo em busca da erradicação
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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Fruto de uma parceria entre o tst, o csjt e o trt
da 2ª Região (sp), a
A juíza ouvidora, Patrícia Brandão, considera que muitos são os desafios, sobretudo se considera-
revista em quadrinhos
do o grande número de crianças e
“Trabalho Infantil, nem de
adolescentes atuando no mercado
brincadeira”, desenhada
informal. Para a magistrada, a erra-
pelo cartunista Maurício
dicação depende de investimentos
de Sousa, foi lançada em
na área de educação e intensificação
outubro de 2013, com os
das fiscalizações, em uma conjun-
personagens da Turma
ção de esforços. Ela lembra que a
da Mônica. O gibi traz
proteção da criança e do adoles-
situações que explicam o
cente não é dever apenas do Estado,
que é o trabalho infantil,
mas também da família e de toda
além de direitos e deveres
sociedade.
dos menores, mostrando
“É um equívoco imaginar que
que todas as histórias com
o ingresso precoce no mercado de
crianças e adolescentes
trabalho afaste o jovem da criminali-
devem ter um final feliz.
dade. As crianças e adolescentes que começam a trabalhar desde cedo, a exemplo daquelas que atuam nas
do trabalho infantil no país. Em 2013,
se divide em duas porções antagôni-
ruas e feiras livres, estão muito mais
uma iniciativa do Tribunal Superior
cas: ou o jovem está trabalhando ou
vulneráveis à violência”. Para a magis-
do Trabalho (tst) e do Conselho Su-
está roubando quando na verdade
trada do trt-pe, é preciso combater
perior da Justiça do Trabalho (csjt)
pôr uma criança para trabalhar é
a cultura de que o trabalho infantil
instituiu o Programa de Combate
privá-la do seu desenvolvimento.
é normal e positivo para a formação
ao Trabalho Infantil, cujo objetivo
“Eu acredito em muitas das pes-
do caráter. Ela ainda destaca que a
é elaborar ações em prol da erradi-
soas que estão envolvidas na exe-
Ouvidoria do trt-pe também está
cação dessa prática e da formação
cução da política de erradicação
engajada na defesa desta causa,
profissional do adolescente.
do trabalho infantil, gerando uma
recepcionando e direcionando as
O Tribunal Regional do Traba-
união de esforços nesse combate.
denúncias aos órgãos competentes.
lho da 6ª Região (trt-pe) indicou
Cada vez mais procuramos ampliar
Em Pernambuco, instituições
ao csjt dois magistrados: o de-
o conjunto de órgãos públicos e
ligadas à erradicação do Traba-
sembargador Fábio Farias e a juí-
privados e pessoas físicas, além da
lho Infantil lançaram a campanha
za ouvidora Patrícia Brandão para
associação com outros parceiros,
“Trabalho Infantil não é legal. Não
atuarem como gestores regionais do
em campanhas, debates, palestras
compre”. A articulação da campa-
Programa no âmbito da respectiva
para a execução de movimentos
nha envolve o trt-pe, o Ministé-
área de jurisdição. O desembarga-
de esclarecimentos junto a nossa
rio do Trabalho e Emprego (mte),
dor Fábio Farias destaca que existe
comunidade”, comentou o magis-
o Ministério Público do Trabalho
a ideia equivocada de que o mundo
trado.
(mpt), o Ministério Público de
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
de Justiça de Pernambuco (tjpe)
Mariana Banja
Pernambuco (mppe), o Tribunal e o Fórum Estadual de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Fepetipe). A campanha procura conscientizar a população a não comprar bens e serviços oferecidos por crianças e adolescentes e pretende mobilizar as pessoas a usarem o Disque Denúncia, que vai contribuir para a fiscalização e ação dos órgãos públicos por meio de ligações para o número 100. Para a auditora fiscal da Supe-
Procurador do Trabalho Leonardo Osório
rintendência Regional do Trabalho
de assistentes sociais e psicólogos de
privadas. “Se todos se engajarem e
e Emprego (srte/pe), Paula Neves,
instituições formadoras parceiras do
cada um fizer seu papel dentro de
o trabalho infantil é um problema
programa”, destacou a auditora.
suas possibilidades e de acordo com
multicausal, que demanda uma atu-
De acordo com o procurador do
suas obrigações, é possível que den-
ação concentrada e sinérgica dos
mpt Leonardo Osório Mendonça,
tro de um espaço razoável de tempo
órgãos governamentais, sociedade
a aquisição de produtos e serviços
possamos erradicar o problema”.
civil, famílias e população em ge-
oferecidos por crianças, a princípio,
Ele defende que a única opção
ral. A srte/pe realizou, entre 2011 e
pode parecer uma boa ação para
para a criança é estudar. “Só existe
2013, 1.414 fiscalizações de combate
minimizar a condição de pobre-
criança na rua vendendo produtos
ao trabalho infantil em 91 municí-
za do menor, mas é, na verdade, a
porque há alguém comprando dela.
pios pernambucanos, sendo encon-
perpetuação da miséria. “É preciso
É preciso que os governos implemen-
tradas 3.328 crianças e adolescentes
desmistificar o pensamento de que
tem políticas públicas voltadas a com-
trabalhando. Somente de janeiro a
o trabalho infantil é algo bom. Cul-
bater o trabalho infantil. Não basta
maio de 2014, foram 350 fiscaliza-
turalmente, o brasileiro é tolerante a
apenas afastar a criança dessa prática,
ções, sendo identificados 320 jovens
essa ideia, por considerar o trabalho
deve-se oferecer condições adequadas
nessa situação.
uma opção para manter a criança e
a sua idade, para que ela possa sonhar
o adolescente longe da criminalida-
com um futuro melhor”.
“Desde 2012, iniciamos o Programa de Erradicação do Trabalho
de e do ócio”. “É preciso desmistificar o
Infantil e Incentivo à Aprendizagem
Segundo o procurador, erradi-
Profissional em Pernambuco, através
car o trabalho infantil é uma meta
pensamento de que o trabalho
do qual os jovens resgatados, com
difícil e ousada e a luta contra esse
infantil é algo bom”
idade a partir de 14 anos, são enca-
problema é de toda a sociedade,
minhados para programas de apren-
sendo necessário um maior envol-
dizagem, com o acompanhamento
vimento de instituições públicas e
Leonardo Osório procurador do trabalho
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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Trabalhadores rurais mais próximos dos urbanos A agricultura brasileira evoluiu de extensas monoculturas para a diversificação da produção nos dias atuais, tanto para subsistência quanto para comércio e exportação. Segundo previsão do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (ibge), a produção para 2014 está estimada em 184,2 milhões de toneladas, um aumento de 1,8% em relação a 2013. Tema do Programa Trabalho Seguro do Tribunal Superior do Trabalho (tst) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (csjt) em 2014 e parte fundamental do setor primário da economia, era de se esperar que as condições do trabalhador no campo compartilhassem o avanço das tecnologias de plantio e colheita. A equipe da Revista Dialogar viajou para São Lourenço da Mata, município-sede da Copa de Mundo, para conferir de perto a situação dos trabalhadores rurais. Fotos: Stela Maris
26
Texto: Iúri Moreira
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
A
constatação é de que a situa-
na carteira de trabalho e a maioria
Os exames médicos periódicos, que
ção melhorou. “Hoje a gente
nem sabe os seus direitos”, reclama.
deveriam ser feitos a cada três meses,
se encontra numa situação melhor,
Presidente do sindicato dos tra-
com mais proteção e conhecimento
balhadores rurais de São Lourenço
O advogado do Sindaçúcar,
do produto que estamos trabalhan-
da Mata, Antônio Ferreira Nóbrega,
Marcelo Brandão Lopes, discorda.
do”, conta o aplicador de herbicida
engrossa o coro: “Somente em áreas
“Não é verdade que não existe o
da Usina São José, Edinaldo Luiz de
de assentamento são mais de três mil
pagamento de adicional de insa-
Souza. No entanto, ainda falta muito
famílias, além de seis mil pequenos
lubridade. Ele existe em todas as
para que as condições sejam ideais.
agricultores aqui em São Lourenço.
hipóteses em que há um laudo pe-
“Nós trabalhamos com produtos de
Mesmo assim nós não temos uma
ricial informando que o ambiente
alta periculosidade e não recebemos
secretaria de agricultura.” Antônio
é insalubre. Também há, inclusive,
a insalubridade, por exemplo. Apesar
Nóbrega relata, ainda, que os agri-
uma comissão paritária, que está
de contar com Equipamentos e Pro-
cultores não contam com assistência
analisando e fazendo experiências
teção Individual (epi), como botas,
técnica nem maquinário e os empre-
de campo sobre a questão em todo
chapéu, avental, luvas e perneira, o
gadores não cumprem as convenções
o setor no Estado”, comenta. Ainda
respirador fornecido é de má quali-
coletivas. “Para se ter uma ideia, os
de acordo com ele, os respiradores
dade, o que faz com que a gente te-
trabalhadores das usinas têm que
atendem ao “Compromisso Nacio-
nha dificuldades para respirar. Nossa
tombar três, quatro toneladas de
nal” e possuem Certificado de Apro-
atividade também não é registrada
cana nas costas, o que é um absurdo.
vação de Equipamento de Proteção
são ignorados”, avisa.
Sindicalista Antônio Ferreira Nóbrega aponta dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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Individual (caepi), expedido pela
Para a Procuradora do Minis-
vigente, com destaque para a Norma
secretaria de inspeção do trabalho
tério Público do Trabalho (mpt)
Regulamentadora 31 do Ministério
do Ministério do Trabalho e Em-
Débora Tito, os homens do campo
do Trabalho e Emprego (mte), que
prego. Brandão também revela que
tinham, historicamente, um déficit
enuncia basilares regras norteado-
a Usina São José contesta as afirma-
em relação aos operários urbanos,
ras para a salvaguarda da dignidade
ções do Presidente do Sindicato dos
corrigido apenas no Artigo 7º da
dos trabalhadores rurais”, pondera.
Trabalhadores Rurais, reafirmando
Constituição Federal de 1988. “Até
A Procuradora lembra ainda
que cumpre religiosamente a tabe-
então, eles não tinham os mesmos
que, apesar de previstos na Cons-
la de tarefas que regula o trabalho
direitos e eram regidos por uma
tituição, as dificuldades de fiscali-
por produção no setor, assim como
norma específica (Lei 5.889/73) até
zação nas localidades isoladas geo-
cumpre rigorosamente as determi-
hoje em vigor, mas com as amplia-
graficamente e fronteiras agrícolas,
nações da Norma Regulamentadora
ções determinadas com a equipara-
o distanciamento dos trabalhadores
(nr 31) que disciplina a segurança
ção constante na carta magna. Na
rurais dos sindicatos em algumas
e medicina do trabalho rural, razão
prática, entretanto, o trabalho rural
localidades, a complexidade de
pela qual realiza todos os exames
ainda precisa de muitos avanços e
acesso a alguns setores mais con-
médicos previstos.
efetiva implementação da legislação
servadores e o traço de cunho ainda
28
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
escravocrata que permeia a hierar-
vendemos nas feiras de Tiúma e
a lavoura”, completa Nóbrega.
quia em algumas culturas agrícolas
São Lourenço. Mas só a feira não
Mesmo quem já está estabele-
constituem os maiores obstáculos
sustenta”, conta, revelando a im-
cido enfrenta dificuldades. “Faz 57
ao pleno gozo dos direitos desses
portância do salário de r$ 736,00
anos que sou agricultor e mesmo
trabalhadores. “Esses entraves vêm
oriundo da cana.
assim não tenho direito à aposen-
sendo enfrentados principalmente
Para completar o orçamento, vale
tadoria”, conta José Cândido Caval-
pelo Ministério Público do Traba-
até tapar buraco das estradas: “A
cante. No caso dele, a falta de do-
lho e pelo Ministério do Trabalho e
gente conta com a boa vontade dos
cumentação é o problema. “Nasci
Emprego. Deixando claro que ainda
agricultores que utilizam a estrada
e me criei em João Alfredo, onde
há muito a ser feito, vale ao menos
para escoar a produção. Eles ajudam
trabalhei no roçado por 40 anos.
destacar a redução paulatina nos
com r$ 5,00 ou r$ 10,00, pois sabem
Daí passei mais 10 anos na enxada e
números de trabalho semelhante
que, sem a via, fica complicado le-
há sete cultivo minha própria terra.
ao de escravo no setor, na última
var as mercadorias para a cidade”,
Infelizmente só consegui compro-
década, e o incremento de proje-
revela o menor j.s., que divide seu
var 20 anos junto ao inss” lamenta.
tos preventivos relacionados à área
tempo entre os estudos e a lavoura
Mesmo assim, José Cândido acorda
agrícola”, comemora.
da família. “Falta ajuda dos gover-
todos os dias para cultivar macaxei-
Complementando a renda - Ain-
nos municipal, estadual e federal,
ra, mandioca, feijão e milho, entre
da segundo o ibge, aproximadamente
as estradas vicinais são um caos e a
outros, e não esconde o orgulho:
84,4% dos estabelecimentos agrope-
maioria dos agricultores familiares
“Possuo 900 pés de plantas. Quan-
cuários do país são da agricultura
perde parte de suas produções, pois
do cheguei aqui não tinha 30, e tudo
familiar, correspondendo a apenas
no inverno os carros não chegam até
morrendo”.
24,3% da área total ocupada por estabelecimentos rurais. “Boa parte
Principais diferenças entre trabalhadores urbanos e rurais
desses produtores acaba tendo que trabalhar também no corte da cana,
URBANO
pois o tamanho de suas propriedades não permite o sustento. Em média,
Aviso prévio
30 dias, com redução de 2h da jornada diárias ou descanso durante sete dias no decorrer do aviso
30 dias, com um dia de folga por semana
Horário noturno
22h às 5h
20h às 4h para o trabalhador rural da pecuária e das 21h às 5h para o trabalhador da lavoura
Adicional noturno
20%
25%
cada família tem três hectares de terra, quando seriam precisos no mínimo sete para gerar lucro”, revela Nóbrega. É o caso do agricultor Roberto Martins da Silva, que começou a trabalhar no corte da cana em abril. “Saio de casa às 4h e trabalho na cana das 6h às 11h. Depois
RURAL
do almoço, ajudo minha esposa na nossa plantação. Nós cultivamos feijão, coco, inhame, caju, macaxeira, jambo, banana e manga, que
*Todos os direitos básicos já estão equiparados, de acordo com o art. 7º da CF (salários, férias, proteção ao trabalho, décimo terceiro salário etc). Nenhuma diferença que denote uma diminuição ou discriminação do trabalhador rural poderá ser admitida.
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29
Feira de produtos orgânicos: mais saúde na mesa e melhor vida no campo
Fotos: Danilo Galvão Texto: Iúri Moreira
H
á quatro anos, todas as
agricultores orgânicos na região
varas do Recife, na sudene, no final
quartas-feiras, o Tribunal
de Glória de Goitá e na cidade de
de 2009, e a partir da Semana do
Regional do Trabalho da 6ª Re-
Ibimirim (316 km do Recife) Sertão
Meio Ambiente de 2010 na sede do
gião (trt-pe) recebe a feirinha de
do Moxotó. “Eu já conhecia o traba-
trt-pe, sempre às quartas-feiras”,
produtos orgânicos da Associação
lho deles e tinha muita vontade de
informa o presidente da Comissão
dos Produtores Rurais de Palmeira
desenvolver alguma parceria. Daí
Socioambiental e assistente social
(Aprup), de Glória de Goitá, Zona
calhou que um dos projetos estraté-
do trt, Renatto Pinto.
da Mata pernambucana, a 45 km do
gicos da Comissão Socioambiental
Desde então, são sempre de cin-
Recife. Parceria entre o trt-pe e o
era estruturar essa feira. Fizemos
co a seis bancos atendendo os ser-
Serviço de Tecnologia Alternativa
a primeira edição num dia da Se-
vidores do Regional, além de atrair
(Serta), a feira teve início na Semana
mana do Meio Ambiente de 2009
funcionários de empresas e orga-
do Meio Ambiente de 2009, numa
e depois fizemos outra experiência
nizações instaladas no entorno do
ação da Comissão Socioambiental
na Semana da Saúde. Nos dois ca-
trt-pe. E o sucesso foi tamanho que
com o objetivo de beneficiar famí-
sos, a procura foi muito grande e os
outros órgãos passaram a organizá-
lias produtoras e trazer produtos de
servidores perguntavam por que ela
la. “Depois da nossa experiência, ou-
boa qualidade para os servidores e
não poderia ser periódica. Depois
tros tribunais nos procuraram para
magistrados do Regional.
de várias conversas com a Admi-
implantar ações semelhantes, como
O Serta é uma Organização Não
nistração, ela passou a acontecer
o Tribunal de Contas, tj-pe, tce e
Governamental que trabalha com
semanalmente, primeiramente nas
o tre”, revela. Detalhe importante é
30
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
que a feira do Tribunal já foi inspe-
divulgação e maior variedade de
também conhecida como Casca de
cionada e aprovada pela Agência de
produtos. Hoje praticamente somos
Azeite –, e a folha do Nim, árvore
Defesa Agropecuária de Pernambu-
só nós da Aprup, ficaram apenas
de origem indiana utilizada como
co (Adagro) que faz os exames pe-
duas pessoas de Pombos”, lembra o
inseticida natural no controle das
riodicamente. “Uma vez por ano, eles
produtor e presidente da associação,
pragas agrícolas”, revela o produtor
vêm e coletam amostras para serem
Severino Arruda, conhecido por
Edílson Bonfim de Arruda.
analisadas nos laboratórios do Ins-
“Biu da Boia”. De acordo com ele, a
Trabalho e consumidor não
tituto de Tecnologia de Pernambuco
Aprup é composta por 62 famílias
faltam: “Nossa produção semanal
(Itep), no intuito de comprovar se os
de agricultores, num total de 42 pro-
média é de 52 toneladas e as perdas
produtos são mesmo orgânicos. Nas
dutores, todos de lavoura orgânica.
são mínimas, pois o que sobra acaba
vezes em que isto aconteceu, tanto
“Nós produzimos chuchu, ma-
virando adubo natural. Atualmente
aqui quanto na Sudene, as amostras
mão, couve, salsinha, salsão, couve-
promovemos feiras quase todos os
passaram sem nenhum problema”,
-flor, beterraba, cenoura, pimenta,
dias. Além do trt, também esta-
conclui Renatto.
brócolis, milho, alho-poró, rúcula,
mos no Tribunal de Contas; tre;
Em suas primeiras edições, a
coentro, tomate, feijão, quatro varie-
Secretaria de Educação; Shopping
feirinha era mantida por um gru-
dades de alface... e tudo orgânico!
Recife; Canal do Cavouco (no bair-
po de produtores de Pombos e Chã
Usamos apenas adubos naturais,
ro recifense da Iputinga); Fortim de
Grande. No entanto, o custo de pro-
como esterco e sobras de produção
Olinda; Ceasa e Cordeiro, em vários
dução e do frete era muito alto. “Foi
e defensivos agrícolas também na-
horários”, enumera Biu.
quando nos juntamos a eles, o que
turais como calda bordalesa – fei-
Com a procura dos consumido-
gerou um impulso maior, com mais
ta a partir da folha da mamona e
res pelos orgânicos, a vida na roça
“Depois da nossa experiência, outros tribunais nos procuraram para implantar ações semelhantes, como o Tribunal de Contas, de Justiça, de Contas do Estado e o Regional Eleitoral.”
Renatto Pinto assistente social do trt-pe
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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se transformou: “Depois que mon-
servidores do Tribunal: “Frequen-
tamos a associação e começamos a
to a feirinha desde o início e acho-a
trabalhar com os orgânicos, a vida
uma maravilha, pois a gente usufrui
de todo mundo melhorou. Antiga-
de produtos naturais, sem agrotó-
mente a gente trabalhava para os ou-
xicos e ainda agiliza a vida, pois já
tros. Hoje isso acabou: não temos
fazemos a feira no próprio trabalho”,
intermediários, trabalhamos para
elogia a servidora do Setor de Ma-
nós mesmos e somos os donos da
lote, Jaqueline Albuquerque. Carlos
produção e dos lucros. Cada vez in-
Fernandes, servidor do gabinete da
vestimos mais, cada vez tem mais
desembargadora Dinah Figueirêdo
feira e o resultado é que todo mundo
Bernardo, é outro que bate ponto na
vive tranquilo. Eu, por exemplo, já
feira desde o seu início. “Sempre fiz
estou até contratando mão de obra
questão de participar, é uma gran-
fora”, comemora Edílson, um dos
de iniciativa e os produtos são de
integrantes da Aprup.
excelente qualidade. A avaliação é
Quem ganha com isso são os
positivíssima”, atesta.
Severino Arruda (Biu da Boia), presidente da Aprup
Feirinha acontece há mais de quatro anos, toda quarta-feira
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Faça sua horta orgânica em casa Muita gente mora em casas com jardins, quintais ou outras áreas verdades disponíveis e não sabe que pode cultivar hortaliças e temperos dentro de casa. Além de uma volta às origens, a horta doméstica pode se transformar num belo hobby. Basta um pouco de sol, adubo natural e cuidado na irrigação. “É importante que a área não seja compartilhada com cães e gatos, pois eles podem acabar tudo. Ela deve receber sol e ser regada de uma a duas vezes por dia, dependendo da quantidade de luz solar. O ideal é que seja logo pela manhã e no fim da tarde”, avisa Biu. O canteiro deve ser de terra fofa com 20cm de altura. “Basta fazer um buraquinho com 5cm de profundidade e 10cm de distância entre as sementes e cobrir de esterco que as hortaliças vão crescer sensacionais. Pode-se plantar feijão, alface, coentro, cebolinha, tomate, mamão... Qualquer coisa dá!”, conclui. Mesmo quem mora em apartamento e sofre com limitação de espaço pode montar uma horta caseira suspensa, escolhendo espécies de pequeno porte e reutilizando garrafas pet. Numa só tacada, a horta suspensa reaproveita materiais que iriam para o lixo, é
Elysangela Freitas
decorativa e deixa um aroma agradável no ambiente.
Danilo Galvão
De volta à ativa Texto: Francisco Shimada
Fenômeno recente no Brasil, um quarto dos mais de 14 milhões de aposentados decidiu retornar ao trabalho nos últimos anos. A jornaleira Ivone de Lima e o professor Genno Silva integram esse grupo
J
ogar dominó, passar a tarde numa
recente mudança de postura de em-
fenômeno. “O retorno do aposenta-
praça ou simplesmente descansar
pregados e empregadores. “A gente se
do ao labor decorre da melhoria nas
após anos de dedicação ao emprego.
arraigou a uma legislação protetiva,
condições de saúde da população; da
Essa visão que se tem do trabalhador
mas que está desatualizada. Aqui, no
possibilidade da complementação da
aposentado, no Brasil, aparenta não
Brasil, a média é conseguir se apo-
renda, combinada com o crescimen-
mais condizer com a realidade atual.
sentar aos 50 anos de idade. Então,
to da oferta de emprego; e da opor-
De acordo com pesquisa do Instituto
a gente se aposenta relativamente
tunidade de obter uma mudança no
Somatório, com dados referentes ao
cedo. Isso faz com que pessoas com
patamar da aposentadoria através
ano de 2013, 25% dos 14 milhões de
plena capacidade laboral não quei-
de um pedido de ‘desaposentação’,
aposentados voltaram ao mercado
ram deixar o mercado de trabalho
uma renúncia da aposentadoria.
de trabalho ou decidiram manter-se
naquele momento”, afirma.
Esta última situação é polêmica, do
A pesquisa do ibge ainda con-
ponto de vista jurídico, mas que, na
firma uma das razões pelas quais os
realidade, vem contribuindo para a
O avanço de pessoas mais velhas
aposentados e pensionistas decidem
volta do aposentado ao mercado de
na ativa também é constatado nos
voltar ao trabalho. Esse grupo, mui-
trabalho”, pontua.
dados da Pesquisa Mensal de Em-
tas vezes, assume mais da metade
prego do Instituto Brasileiro de Ge-
da renda familiar. Essa participa-
ografia e Estatística (ibge). No ano
ção é maior à medida que o estrato
passado, se comparado a 2012, a faixa
social fica menor. Na classe A, por
etária que mais cresceu na População
exemplo, as finanças de aposentados
Economicamente Ativa (pea) foi a
respondem por 55% da renda da fa-
do grupo com mais de 50 anos de
mília; na classe D, por 88%.
nos postos de emprego. Em 2009, esse número era de 20%.
14 milhões de aposentandos no Brasil
O desembargador do Tribunal
idade. Um aumento de 5,5% . Os dados obtidos possibilitam
Regional do Trabalho da 6ª Região
contextualizar a situação do traba-
(trt-pe), Ruy Salathiel de Albu-
lhador aposentado no País. O advo-
querque e Mello Ventura, aponta
gado Paulo Perazzo acompanha essa
três razões para a ocorrência desse
34
Mercado de trabalho
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
25% na ativa Dados: Instituto Somatório / 2013
Emprego e diversão Um exemplo de disposição para o
jornaleira, que tem preferência por
O semblante descontraído da
trabalho e que se encaixa nas infor-
uma notícia específica, independente
jornaleira apenas é interrompido ao
mações apresentadas vem da jor-
das vendas: “Eu só gosto de ver quan-
lembrar-se de quando ela foi dis-
naleira Ivone Fernandes de Lima,
do meu Santinha ganha. Para mim,
criminada, no trabalho, por conta
ou dona Ivone, como prefere ser
é a melhor manchete”, completa a
da idade. “Um jornal disse que era
chamada. Aos 67 anos de idade,
fanática torcedora do Santa Cruz.
muito velha para ficar no shopping
Figura bastante conhecida, du-
vendendo jornal; eu fui para a rua.
sábado, realiza afazeres domésticos
rante a entrevista, dona Ivone ace-
Eles diziam ‘a senhora tá muito ve-
e sai para vender jornais no cruza-
nou, tirou fotos e recebeu o carinho
lha, vai voltar pro sinal’. Conheci
mento da rua Antônio Falcão com
de outras pessoas. Ela ressalta que
uma advogada, cliente minha, que
a avenida Engenheiro Domingos
a venda de jornais complementa
me ajudou. Já precisei da Justiça
Ferreira, no bairro de Boa Viagem,
a renda, mas funciona mais como
dessa forma, porque eles me dis-
no Recife (pe).
uma terapia. “Sou muito querida
criminaram”, revelou a vendedora,
Mineira, dona Ivone vive em
aqui. Você viu os meninos que pas-
que entrou com uma ação contra a
Pernambuco há mais de 60 anos.
saram no carro falando comigo? Eu
empresa e foi indenizada.
Ela mora só numa casa alugada,
conheço todo mundo. Para mim,
em Brasília Formosa (Teimosa) e
isso é uma terapia, uma diversão.
recebe ajuda dos parentes nas varia-
É uma alegria estar aqui.”
Fotos: Elysangela Freitas
ela acorda às 3h30, de segunda a
das despesas, com destaque para a compra de medicamentos. “Já fiz cirurgia de vesícula e cisto no ovário. Agora estou cuidando da tireóide. Também gasto muito com remédios de pressão”, explica. A jornaleira, que já trabalhou de carteira assinada, recebe meio salário mínimo de pensão pela morte do marido. Dona Ivone vive a rotina da comercialização de jornais há mais de uma década. Ela recebe de trinta a sessenta centavos de real por cada exemplar vendido, o que ajuda a complementar a renda. Num bom dia, chega a vender 40. “As notícias policiais vendem muito mais, mas isso vem mudando. Quando a matéria é boa, vendo tudo”, diz a
Ivone Fernandes de Lima 67 anos, jornaleira
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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Voltar a viver Quem também decidiu retornar ao
por questão vocacional. “Naquela
Os seis meses longe da sala de aula
mercado de trabalho após a apo-
época, além dos conteúdos peda-
fizeram mal ao professor, que não se
sentadoria foi o professor de inglês
gógicos, nós aprendíamos até como
via mais útil para a sociedade. “Eu
Genival Antonio da Silva, que pre-
segurar os objetos em sala de aula:
tinha depressão por estar em casa.
fere não revelar a idade por conta
apagador na mão esquerda; giz, na
Eu me sentia como uma pessoa sem
de marketing pessoal. “Pode escre-
direita. Questões de ética e postura
vida, que teria uma morte rápida, sem
ver na matéria que eu tenho mais
profissional”, relembra, com saudo-
fazer nada. Foi minha mulher quem
de cem anos”, brinca. Genno Silva,
sismo sadio, antes de falar sobre a
percebeu que eu não queria mais
como é conhecido, mora e trabalha
saída das salas de aula. “Eu estava
viver, que eu não me cuidava mais.
no bairro de Maranguape II, loca-
cansado da vida educacional. Parei
Precisava agir”, declara. A mudança
lizado na cidade do Paulista (pe).
em junho de 2005, mas voltei, no
de postura trouxe novo ânimo.
começo de 2006, por arrependi-
A exemplo da jornaleira, o pro-
na segunda metade da década de
mento. Voltei para não me sentir
fessor Genno Silva acorda cedo. Às
1970 e escolheu a área de Letras
uma pessoa inativa, mas tive de me
5h, de segunda a sábado, ele inicia
adaptar às mudanças e a conviver
as atividades que seguirão, duran-
em parceria com professores mais
te todo o dia, entre alunos, notas,
jovens”, destaca Genno Silva.
livros e cadernetas. O professor se
Francisco Shimada
O professor começou a lecionar
divide entre duas escolas particuFrancisco Shimada
lares, além de manter um curso de inglês e estar prestes a lançar um livro didático. Com especialização nos Estados Unidos em fonética internacional e sistema educacional, apenas de experiência em sala de aula, ele tem mais de 35 anos: “Ainda posso contribuir, ajudar as pessoas”.
Stela Maris
Ele também passou por situa-
Stela Maris
ções de incômodo relacionadas à discriminação, dentro e fora do ambiente de trabalho, por conta da idade. “As pessoas me viam como um velho caduco, que não servia mais para nada. Isso me fez muito mal. Agora, muita gente me vê ape-
Genival Antonio da Silva idade não revelada, professor
36
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
nas como um caduco, mas com um degrau a mais, com mais experiência e qualificação”, revelou.
Questão de Justiça Casos de discriminação, a exem-
do Ministério ao tratar da condição
Genno Silva ainda pretendem conti-
plo dos sofridos pela jornaleira e
do trabalhador aposentado e idoso.
nuar por muito tempo no mercado
pelo professor, são acompanhados
“Vamos agir em qualquer caso de
de trabalho. “Eu já disse ao chape-
pelo Ministério Público do Trabalho
descumprimento de normas traba-
leiro, o rapaz que entrega o jornal:
(mpt). A procuradora Lorena Bravo
lhista e também na situação especí-
quando eu não aguentar mais, eu
acredita que é preciso ter uma aten-
fica do idoso aposentado, que voltou
largo a bata e entrego o cargo. Mas,
ção diferenciada, não excludente,
ao mercado de trabalho. Infelizmen-
enquanto eu aguentar, eu não paro,
sobre esse trabalhador no ambiente
te a gente vê que, no caso do assédio
não. Eu gosto tanto daqui. Eu ado-
de trabalho. “O mpt não tem uma
moral, existem alguns grupos que es-
ro tá aqui no pedaço”, declara dona
atuação específica em relação aos
tão mais propensos à discriminação
Ivone. “Não quero me sentir um
aposentados. A gente observa se, no
no ambiente de trabalho. Colocar o
inativo. Só paro na morte. Além da
contexto desse retorno, esse aposen-
idoso dentro desse grupo é realmen-
família, o trabalho é a existência do
tado, na condição especial de idoso,
te devido”, diz a procuradora.
viver”, afirma Genno Silva. Tempo,
está sofrendo alguma espécie de dis-
Cientes do papel exercido para a
qualificação, experiência e boa von-
criminação e violação do contrato
sociedade e o bem-estar adquirido
tade, pelo que se pôde observar, não
de trabalho dele”, explica.
com o emprego, tanto a jornaleira
faltam a eles e a tantos outros apo-
Ivone de Lima quanto o professor
sentados brasileiros.
A procuradora ressalta a atuação
“A volta ao mercado de trabalho tem de ser encarada com muita seriedade, com muita sabedoria, para que essa renda extra, que é tão boa hoje, não venha a se transformar num problema futuro, quando a pessoa vier a se jubilar de fato e de direito.”
“Na contratação laboral, o aposentado volta a contribuir para a Previdência Social, sem que isso signifique algum acréscimo no valor da aposentadoria, e tem a carteira profissional devidamente registrada; também haverá recolhimento do fgts.”
“Nesta reinserção no mundo corporativo, a gente tem de ver se o idoso está tendo a garantia dos direitos especiais dele, enquanto cidadão idoso; e, se na qualidade de trabalhador, genericamente falando, ele tem os direitos garantidos.”
Advogado Paulo Perazzo
Desembargador Ruy Salatiel
Procuradora Lorena Bravo
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Bordando o maracatu
P
ara que a brincadeira do Maracatu de Baque Solto aconteça
é necessário riscar, cortar, bordar e trançar, práticas milenares na história da humanidade. Com linhas e agulhas; tecidos, tesouras e lantejoulas; fitas e cordões, os brincantes tecem e entretecem, confeccionando suas vestimentas e adornos. A crescente profissionalização do brinquedo vem exigindo a contratação de mais e mais pessoas para esta tarefa, o que não diminui seu caráter lúdico e criativo. Ao contrário, a arte, além de ser uma forma de trabalho, é um meio de expressão e comunicação, cujo desenvolvimento supõe a construção coletiva de cultura e, consequentemente, a interação entre os indivíduos numa dimensão comum de produção de vida socializada, o que é bem representado pelo Maracatu de Baque Solto. Elysangela Freitas
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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O produto vai aonde o cliente está Mesmo em tempos de proliferação de shoppings e comércio eletrônico, as vendas porta a porta representam fatia significativa do mercado
Texto: Helen Falcão
Danilo Galvão
Q
uem nunca comprou um pro-
vendas diretas no mundo, ficando
duto de beleza ou de higiene
atrás apenas nos Estados Unidos,
através de um catálogo? Hoje, as
Japão e China, conforme estudos
famosas revistinhas tradicionais
do World Federation of Direct Selling
ou eletrônicas estão em todos os
Associations (wfdsa). Estima-se
lugares, no trabalho, faculdade,
que 4,5 milhões de pessoas atuem
academia, cabeleireiro, Facebook
como revendedores no país, sendo
etc. O revendedor sabe quando o
75% delas mulheres, segundo infor-
produto que você usa está em pro-
ma a Associação Brasileira de Em-
moção ou quando um lançamento
presas de Vendas Diretas (abevd).
pode atraí-lo. O prazo de entrega
Nesse cenário, o consumo de pro-
das empresas diminuiu, e muitos
dutos de higiene e beleza é destaque.
vendedores já fazem estoque pró-
Veteranas do setor, as marcas
prio para atender de imediato aos
Avon e Natura viram, nos últimos
pedidos dos clientes.
anos, diversas empresas com a mes-
A larga presença dos catálogos se
ma proposta surgirem ou se expan-
reflete em números na economia: o
direm, a exemplo das nacionais
Brasil é o quarto maior mercado de
Jequiti e Racco e da estadunidense
40
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Estima-se que 4,5 milhões de pessoas atuem com revendedores no país, sendo 75% delas mulheres.
Mary Kay. Além disso, a gigante O
natureza não eventual, subordinação
Boticário, que possui cerca de 900
jurídica e percepção salarial, como
franqueados pelo país e 175 unida-
contraprestação pelo serviço pres-
des próprias (dentre lojas e quios-
tado. Os requisitos estão previstos
ques), entrou para as vendas diretas
no artigo 3º da clt (Consolidação
em 2011. O grupo também lançou a
das Leis do Trabalho).
marca Eudora, concebida para atingir essa área de consumo.
A desembargadora aponta que, com a subordinação jurídica, o empre-
Nesse segmento de vendas, a
gado fica sujeito ao controle do patrão,
presença feminina é ainda maior.
que dá ordens e estipula normas de
Em algumas empresas, as mulhe-
trabalho, como obrigações, horário
res correspondem a mais de 90% do
de serviço e local onde desempenhar
total de vendedores. O perfil delas,
as tarefas. “Há de se observar que
contudo, é diversificado, tanto no
é de conhecimento geral a forma
aspecto de idade, como no de ocu-
como se processa a comercialização
pação, formação acadêmica e classe
do material produzido por empre-
econômica. Em geral, as únicas re-
sas revendedoras de produtos, com
gras para se tornar uma revende-
vendas porta a porta, alcançando os
dora são: ter mais de 18 anos e não
clientes, até nos locais de trabalho
ter restrições em órgãos de proteção
desses. Essas condições, justamente,
ao crédito.
revelam ser de natureza meramente
“Não há exigência de metas a cumprir nem obrigatoriedade de comparecimento à empresa, ou seja, a habitualidade na prestação de serviços não é inerente à atividade de consultora de vendas, mais um óbice para o reconhecimento de vínculo de emprego.”
Cumpridos os requisitos, a in-
comercial a relação jurídica mantida
teressada recebe orientações sobre
entre os consultores de vendas e as
clara saboya
os produtos e adquire um kit de
empresas correspondentes, onde os
DESEMBARGADORA DO TRT6
amostras para iniciar as vendas. Em
produtos são cedidos em consignação,
atividade, é preciso arregimentar e Stela Maris
administrar clientes; receber e enviar pedidos; distribuir produtos e fazer cobranças. Juridicamente os consultores não possuem vínculo empregatício com o fabricante, pois conforme explica a desembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (trt-pe) Maria Clara Saboya Albuquerque Bernardino, não atendem aos três elementos essenciais que caracterizam o contrato individual de trabalho: prestação de serviços de
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
41
responderam à pergunta. Quanto Como funciona
às consultoras entrevistas, a maior parte delas calcula receber menos
1
Investimento inicial – O kit, com amostras e produtos para revender, varia entre R$ 75,00 e R$ 149,00, a depender da instituição. Segundo as empresas, o valor investido é recuperado com a revenda dos itens do kit.
que r$ 725,00 por mês. Em sua tese de doutorado, (Universidade Estadual de Campinas) intitulada O Make up do trabalho: uma empresa e um milhão de revendedoras de cosméticos, a socióloga Ludmila Costhek Abílio trouxe os
2
Pedido mínimo (para empresa enviar o pedido ou para a consultora obter lucro) – Varia entre R$ 55,00 e R$ 580,00, a depender da empresa e do sistema de pontuação dos produtos.
aspectos da baixa remuneração e ausência de vínculo empregatício para analisar a questão da informalidade e precarização do trabalho no setor. Além desses pontos, abordou a imbricada relação de venda /consumo entre as consultoras: “Na maioria
3 Lucro – Em média 30% do valor do produto, mas há promoções como “compre 1 e leve 2”.
dos 30 relatos, as mulheres afirmam que revertem parte de sua comissão em consumo dos produtos, e eventualmente gastam com ele mais do
4
que recebem com as vendas”, obserOutras bonificações – Viagens, descontos em
vou a socióloga que entrevistou 30
plano de saúde, brindes, cursos e, até, carros.
revendedoras de cosméticos para
um óbice para o reconhecimento
assumindo os riscos da atividade, na
de vínculo de emprego nos moldes
medida em que pagam pelo produto
previstos no art. 3º da clt”.
não revendido”, pontuou.
Apesar do grande número de
Além da ausência de subordina-
profissionais que se dedicam a essa
ção jurídica, a magistrada sinaliza
atividade e do volume de capital que
fragilidade no atributo da não even-
o setor mobiliza, o trabalho de con-
tualidade: “Não há exigência de me-
sultor de vendas rende, normalmen-
tas a cumprir nem obrigatoriedade
te, menos de um salário mínimo por
de comparecimento à empresa, ou
mês. A Natura estima que cada re-
seja, a habitualidade na prestação
vendedor ganhe por ano uma mé-
de serviços não é inerente à ativi-
dia de r$ 2.047,00, as outras em-
dade de consultora de vendas, mais
presas indagadas nesta matéria não
42
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Danilo Galvã
com revenda a clientes, inclusive,
o
construir o documento científico.
Segundo Ludmila, híbrido tam-
Coutinho, 84 anos, 20 deles como
bém é o tempo de trabalho e o de
representante de venda direta. Já
descanso. “As indistinções entre
Bernadete Pedroso, a “Betinha”,
tempo de trabalho e de não traba-
conta que consegue aumentar seu
lho são bastante reconhecíveis: todo
lucro adquirindo produtos em um
tempo torna-se potencial
mês de promoção e revendendo-o
tempo de trabalho”,
em outro período. Ela avalia que a provisão também facilita quan-
analisou.
do o cliente quer comprar um presente de última lvão
o Ga
Danil
hora. O risco do calote foi men-
Na tese, também foi
cionado, se ele
levantado o aspecto da
acontecer, a consultora
transferência dos riscos empresa-
deve cobrir a compra, sob pena de
riais. Em caso de calote, por exem-
não poder fazer novos pedidos. Por
plo, o ônus fica para a consultora.
outro lado, caso o produto venha
Concomitantemente, foi explorada a
com problemas ou cause alergia ao
questão dos estoques pessoais – situ-
consumidor, é a empresa que realiza a
ação na qual a revendedora mantém
troca e faz outras ações de pós-venda.
um acervo de produtos, para atender
Quanto à relação venda consu-
de pronto o cliente. Assim, a empresa
mo próprio, todas as entrevistadas
se pouparia do capital imobilizado
afirmaram adquirir artigos da mar-
da estocagem.
ca que revendem. A possibilidade
Identificaram-se situações como
de comprar com desconto é tida, in-
essas junto às entrevistadas desta
clusive, como o gatilho para o início
matéria, contudo os episódios não
da representação. Edvânia da Silva,
eram descritos de forma negativa.
consultora há aproximadamente
“Quando se é vendedora, você apro-
sete anos, vai além, e alega ser essa
veita oportunidades. Quando se trata
a maior vantagem da ocupação.
de maquiagem, às vezes o momento
No que tange à remuneração, ela
de lazer é a oportunidade perfeita. Já
é sempre tratada como uma pro-
fiz vendas em jantares com amigas,
porção direta do esforço e tempo
na praia, enfim...”, argumentou a con-
dedicado à atividade de revenda.
sultora Patrícia Porto. “Você tem que
“Pode-se afirmar que os ganhos va-
saber o que pedir e como manter o
riam de acordo com o tempo que os
seu estoque, isso é uma questão de
revendedores se dedicam à ativida-
experiência” falou Elisa de Oliveira
de e com a rede de relacionamento
Todas as entrevistadas afirmaram adquirir artigos da marca que revendem. A possibilidade de comprar com desconto é tida, inclusive, como o gatilho para o início da representação.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
43
que eles têm”, considerou a diretora executiva da abevd, Roberta Kuruzu. A afirmação faz eco com o dito por consultoras: “Se eu vivesse disso, com certeza ganharia mais”, considerou Betinha, que, com emprego fixo em um salão, faz da atividade de revendedora uma segunda fonte de renda. Os ganhos tendem a ficar maiores quando a revendedora é promovida e passa a gerenciar uma equipe. Após um ano no ramo das vendas diretas, Fernanda Misael Lima pediu exoneração da Prefeitura do Recife para se dedicar exclusivamente à
Danilo Galvão
atividade, hoje, coordena 58 pesso-
Coutinho, que, assim como outras
as e, além de receber pelas vendas
entrevistadas, recusou a promoção
que faz, também ganha percentuais
em razão da maior liberdade como
pelo que é comercializado pelas ge-
revendedora.
renciadas. “Essa expectativa de fazer
No que tange à relação jurídica
minha agenda e ter flexibilidade de
formada nessa ascensão, há decisões
dar assistência aos meus filhos foi o
de Tribunais Regionais do Trabalho,
que, a princípio, me encantou. Mas o
bem como do Tribunal Superior do
retorno financeiro também é muito
Trabalho (tst) , que reconhecem o
positivo”, expressou.
contrato de emprego. “Com relação
“Essa expectativa de fazer minha agenda e ter flexibilidade de dar assistência aos meus filhos foi o que, a princípio, me encantou. Mas o retorno financeiro também é muito positivo.” Fernanda Misael Lima
O reforço no rendimento é se-
às consultoras, a jurisprudência é
guido por mais responsabilidades,
pacífica quanto à inexistência de
Isso pode acontecer inclusive
a gerente (diretora, promotora,
vínculo de emprego. Todavia, com
quando a promotora atua por in-
executiva de vendas, a depender
relação às executivas de vendas,
termédio de uma empresa própria,
da nomenclatura adotada pela ins-
de fato, podemos encontrar posi-
cujo cnpj é utilizado para crédito
tituição) possui metas a cumprir
cionamento diferenciados, sempre
das comissões. Nessa situação, a de-
e precisa dar assistência às vende-
dependendo das provas produzidas
sembargadora do trt-pe alega que
doras de seu grupo. Há institui-
nos respectivos processos” destaca a
a Justiça do Trabalho é competente
ções, inclusive, que exigem que a
desembargadora Maria Clara Saboya.
para declarar a fraude no contrato
profissional se vincule a um cnpj
Ela justifica que, comprovados os
e reconhecer a natureza trabalhista
(Cadastro Nacional da Pessoa Jurí-
qualificadores da relação de emprego
da relação. “Vai depender, sempre,
dica). “Para ser promotora tem que
- aqueles do artigo 3º da clt – será
das provas produzidas pelas partes”,
ter tempo integral”, considera Elisa
admitida a existência do vínculo.
sintetizou.
44
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Segurança pelo Brasil NORDESTE Segurança para quem trabalha em postos de gasolina
também concentra esse elemento
curso “Benzeno – riscos, efeitos
(em menores proporções do que o
sobre a saúde e estratégias de pre-
petróleo), de forma que a frequente
venção”, para orientar frentistas e
exposição a esse combustível pode
outros profissionais envolvidos.
trazer danos como inflamação e
As aulas acontecem de 23 a 25 de
O benzeno é uma substância quí-
intoxicação em graus variados de
setembro, no Recife.
mica tóxica, inflamável e explo-
gravidade. Nesse cenário, a Fun-
siva, comum na exploração de
dacentro (Fundação Jorge Duprat
Mais informações pelo telefone
materiais orgânicos como petró-
Figueiredo de Segurança e Medi-
(81) 3427-4566/4775 ou pelo e-mail
leo e carvão mineral. A gasolina
cina do Trabalho) desenvolveu o
eventos@fundacentro-pe.gov.br
“Perícias de marcas de mordida”
de Especialista em Medicina Legal
SUL Medicina legal e perícia médica
e “Psiquiatria Forense”; a mesa- e Perícias Médicas. redonda com o tema “Perícia Ju-
Estima-se que o Congresso irá
De 03 a 06 de setembro acontece,
dicial X Perícia previdenciária” e
atrair cerca de 1.200 profissionais
em Florianópolis-sc, o 2º Congres-
a conferência “Perícia Médica en-
das áreas de Saúde e Direito (espe-
so Brasileiro de Medicina Legal e
quanto peça processual: limites e
cialmente Previdenciário e Traba-
Perícia Médica. Dentre as ativi-
possibilidades”. Durante o evento
lhista). Mais informações no site:
dades previstas, estão os cursos de
também acontece a prova de título
http://www.abmlpm2014.com.br/
SUDESTE
sp e inclui, também, uma feira com
O Congresso tem como público-
congresso
produtos e serviços voltados para a
alvo acadêmicos, profissionais das
área. Com palestrantes de sete di-
áreas de Saúde e de Segurança do
A Associação Brasileira de Er-
ferentes nacionalidades, o evento
Trabalho.
gonomia realiza, entre 15 e 19 de
busca apresentar novidades e pro-
Veja mais detalhes em: http://
setembro, o 17º Congresso Brasi-
mover o debate sobre a temática
www.protecaoeventos.com.br/
leiro de Ergonomia. Neste ano, o
“Transversalidade da Ergonomia e
eventos/content/evento/?id_even-
encontro acontece em São Paulo/
Competitividade”.
topai=522
Ergonomia é tema de
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
45
Trabalhadores da vida eterna
A
frieza de espírito e a fé na vida são as ferramentas mais eficientes no trato dos se-
pultadores com as famílias dos falecidos. Gilvan dos Santos Nascimento é sepultador desde 1965 e crê na vida após a morte. Jorge Carneiro da Costa dedicou, até o momento, 26 anos da sua vida ao trabalho e afirma que cabe aos homens nascer e morrer; a Deus, julgar os vivos e os mortos. Natanael da Paz Filho é o mais jovem dos coveiros fotografados, mas, não por isso, o menos experiente. Durante seus 27 anos de profissão, enterrou o pai e outros familiares, e suaviza: “é melhor, que eu enterro com carinho”. Os três trabalhadores dividem o ofício no Cemitério de Santo Amaro, no Recife (pe). Danilo Galvão
PARA FICAR NA HISTÓRIA Personagens históricos precisam viver além das memórias; devem estar vivos e imortalizados nos documentos, nas fotos e nas ações por eles realizadas. Um povo só pode se (re)conhecer, se conhecer a própria história. Há cinco anos, o Memorial da Justiça do Trabalho em Pernambuco tem como principal objetivo resgatar a memória do Judiciário Trabalhista no Estado. Do desejo pela criação das leis trabalhistas no Brasil, até a completa instalação do Processo Judicial Eletrônico no TRT de Pernambuco. A reportagem e a linha do tempo, a seguir, relembram alguns dos momentos marcantes para o País e para o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, preservados no Memorial da Justiça. Texto: Francisco Shimada
MEMÓRIA SECULAR
1912 Congresso Operário, no Rio de Janeiro, propõe criação de leis trabalhistas. (Jornal da época)
48
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1939 Justiça do Trabalho instalada pelo presidente Getúlio Vargas.
1932
1940
Criação das carteiras profissionais e regulamentação do trabalho infantil.
Lei do Salário Mínimo anunciada em 1º de maio. (Máquina contábil)
C
om o intuito de preservar o
estudantes, pesquisadores e público
Pernambuco também é exemplo
acervo histórico do Judici-
em geral.
para outros tribunais e museus de
ário Trabalhista do estado, o Me-
De processos históricos a mo-
todo o Brasil. Além da conquista de
morial da Justiça do Trabalho em
biliário cinquentenário, o museu
prêmios, a realização de eventos e
Pernambuco foi fundado em maio
já conquistou o reconhecimento
as pesquisas acadêmicas marcam
de 2009, durante a gestão da desem-
de importantes instituições, como
a história recente do Tribunal e do
bargadora Josélia Morais da Costa
a Organização das Nações Uni-
próprio Memorial.
à frente da Presidência do Tribunal
das para a Educação, a Ciência e
A atual gestora do museu, a pro-
Regional do Trabalho da 6ª Região
a Cultura (Unesco), o Ministério
fessora doutora Marcília Gama da
(trt-pe). Com pouco mais de cinco
da Justiça e o Instituto Brasileiro
Silva, da Universidade Federal Rural
anos de existência, o Memorial pos-
de Museus (Ibram). O modelo de
de Pernambuco (ufrpe), recorda o
sui rico patrimônio disponível para
gestão processual desenvolvido em
começo dessa história. “O primeiro
1941
1946
Em 1º de maio, criado o Conselho Regional do Trabalho da 6ª Região, que tem Joaquim Amazonas Filho como primeiro presidente. (Ata da primeira audiência trabalhista no Recife)
Implantação do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, integrado pelos estados de Pernambuco, da Paraíba, do Rio Grande do Norte e de Alagoas. (Inauguração da Vara em Penedo / AL)
1943
1964
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
Reação dos trabalhadores ao Governo Militar apoiado por setores da sociedade civil.
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49
Memorial da Justiça do Trabalho foi
pernambucano, a desembargadora
revelar uma época. A memória não
o Pontes de Miranda, em Maceió
Eneida Melo Correia de Araújo,
se esconde tão somente nos docu-
(al), há mais de 20 anos. O fato
presidente do trt-pe entre 2009 e
mentos, mas também em outros ele-
motivador que levou à criação do
2011, deu continuidade ao trabalho
mentos”, afirma a desembargadora.
Memorial, em Pernambuco, deve-
iniciado por sua antecessora. “Mi-
A magistrada reforça a neces-
se à perspicácia e sensibilidade da
nha ligação com o Memorial co-
sidade de preservação da história
então presidente, a doutora Josélia
meçou quando a desembargadora
construída por juízes, advogados,
Morais, que teve a iniciativa de criar
Josélia pediu que eu coordenasse
servidores, trabalhadores e sin-
um espaço que pudesse guardar a
o Fórum Nacional de Memória. A
dicalistas para que o Judiciário
memória e a história dos feitos da
partir desse momento, ficou real-
pernambucano possa manter um
6ª Região”, lembra Gama.
çada a importância de se conservar
forte marco de memória. “Muito
Entusiasta da preservação his-
documentos, emblemas, mobiliá-
material foi preservado por conta
tórica do Judiciário Trabalhista
rios e todas as marcas capazes de
da prudência e do bom senso de
1972
1996
Inauguração da sede do TRT6, no Cais do Apolo, no Recife (PE), o Fórum Agamemnom Magalhães.
Posse da primeira mulher a assumir a Presidência da 6ª Região, a desembargadora Irene de Barros Queiroz. No mesmo ano, o Tribunal ingressa na internet.
50
1987
2001
Instituição da Medalha Conselheiro João Alfredo Correia de Oliveira. Comenda instituída pelo então presidente do TRT-PE, desembargador José Gondim, para marcar os 100 anos da abolição da escravatura.
Criação da Ouvidoria do Tribunal, para receber críticas, denúncias e sugestões.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
quem trabalhava com os arquivos
Com o intuito de divulgar o acer-
anualmente; e o projeto Cultura e
na época. Tínhamos funcionários
vo do Tribunal, a equipe do Memo-
excelentes, a exemplo de seu Cézar
rial organiza diversos eventos. Den-
O próximo passo da Coordena-
Ramos e Marcos Antônio Gomes
tre os realizados nos últimos anos,
ção do Memorial, com o apoio do
e, agora, Marcília. Esse esforço per-
destacam-se: o I Fórum de Memória
Núcleo de Comunicação Social do
mitiu que os documentos fossem
do Judiciário do Norte-Nordeste,
trt-pe, é realizar um projeto junto
reconhecidos como ‘Patrimônio
em 2014; o I Fórum Regional de
aos servidores. “Pretendemos im-
da Humanidade’. Tal fato serviu de
Arquivos Judiciais, realizado, em
pulsionar a questão da memória,
modelo para que outros tribunais
2009, com o apoio da Fundação de
fazendo uma iniciativa que envolva
recebessem premiações, a exemplo
Amparo à Pesquisa de Pernambu-
os servidores, como forma de tra-
do Regional do Rio Grande do Sul,
co (Facepe); a Semana Nacional de
zer à tona esse passado que ficou
que já tem o reconhecimento da
Museus e a Primavera dos Museus,
esquecido na memória dos que o
Unesco”, ressalta Melo.
realizados em parceria com o Ibram
vivenciaram”, revela Marcília Gama.
Memória, com a ufpe.
2009
2006 Início da cooperação técnica entre UFPE e Tribunal, com surgimento do Projeto Memória e História TRT6. Destacam-se processos de causas agrárias e sindicais.
Inauguração do Memorial da Justiça do Trabalho. No mesmo ano, acervo passa a integrar base de dados do Ministério da Justiça – Projeto Memórias Reveladas, que cataloga processos do Período Militar (1964-1985).
2008
2010
Criação do Selo da Memória. Impresso com o qual processos históricos são identificados.
Inclusão do Memorial no Cadastro Geral de Sistemas de Informação Museal do Ibram.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
51
ANTES DO MEMORIAL “Severino e João Barbosa da Sil-
relacionadas à busca pelos direitos
Dentre os processos já analisa-
va, analfabetos, trabalhadores rurais,
trabalhistas foram conhecidas através
dos, destacam-se os das questões
contam que o dono do engenho man-
do Projeto Memória e História.
agrárias e sindicais. A professora
dou destelhar suas casas, no inverno.
A preservação da história da
Vera Acioli, também da ufpe e a
Eles passaram uma semana moran-
Justiça do Trabalho iniciou-se antes
convite do professor Montenegro,
do nas casas destelhadas. O fato con-
do Memorial. Em 2003, o professor
organizou o acervo. “Este lugar
figurou danos físicos e morais.”
doutor Antônio Montenegro, da
de memória vem se consolidando
ufpe, e outros acadêmicos soube-
como um veículo de contínua apren-
A situação vivida pelos dois traba-
ram do descarte de processos arqui-
dizagem do sujeito do trabalho e de
lhadores, em 1970, integra o processo
vados no Arquivo-Geral do trt-pe.
suas lutas, resistências e conquistas,
0679/63 da Junta de Conciliação de
Diante disso, uma negociação entre a
possibilitando, assim, a recuperação
Jaboatão (pe). A exemplo dele, mais
Comissão de Documentação do Re-
da informação e a recomposição da
de 200 mil estão sob os cuidados da
gional e o Departamento de História
História do trabalho neste Estado”,
Universidade Federal de Pernambuco
da Federal permitiu o repasse dos
explica Acioli. Alunos da ufrpe
(ufpe). Desse total, 21 mil histórias
documentos à academia, em 2006.
também auxiliam a pesquisa.
2012 Início da implantação do Processo Judicial eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT), em 18 de setembro, na Vara do Trabalho de Igarassu.
2014 TRT-PE dá adeus ao papel com a implantação do PJe-JT em todas as unidades de Pernambuco. Em 5 de junho, o último processo físico (papel) foi ajuizado em Serra Talhada.
2012 Acervo do TRT-PE recebe da Unesco o certificado de inscrição documental no Registro Nacional do Brasil no Programa Memória do Mundo. Primeiro Tribunal do Brasil a receber essa certificação internacional.
52
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Danilo Galvão
N
em só de processos é formado
telefone vermelho realmente exis-
o acervo do Memorial da Jus-
tiu e funcionou como uma linha de
tiça do Trabalho em Pernambuco.
emergência entre o Executivo e o Ju-
Entre os objetos da coleção, há um
diciário, durante as décadas de 1960
“telefone vermelho”. Sim, aquela
e 1980, como lembra a curadora do
peça histórica tão presente em fil-
Memorial. “Esse telefone era utili-
mes sobre a Guerra Fria e que, na
zado para um contato direto entre o
verdade, se tratava de uma máquina
governador e o presidente do Tribu-
de escrever eletromecânica ligada a
nal, quando as greves e os conflitos,
uma linha telefônica, chamada de
por exemplo, aparentavam não ter
teletipo.
mais solução”, explica a professora
A cor vermelha do teletipo, ou
Fotos: Stela Maris
Ele existe
Marcília Gama.
telefone, foi “atribuída” pela im-
Além do telefone vermelho, o
prensa da época, para destacar a
Memorial possui outras peças que
importância desse aparelho de co-
chamam atenção: móveis de aço e
MEMORIAL DA JUSTIÇA
municação durante o período da
madeira ergonômicos, produzidos
DO TRABALHO EM
Guerra Fria. Ele permitia o conta-
na Alemanha e na Itália, na pri-
PERNAMBUCO
to direto entre a Casa Branca, nos
meira metade do século passado;
Endereço: Avenida Engenheiro
Estados Unidos, e o Kremlin, na
máquinas de escrever; globo de
Domingos Ferreira, 3510, bairro
Rússia, e surgiu após a Crise dos
bingo, utilizado para o sorteio de
de Boa Viagem, Recife (pe).
Mísseis Cubanos, em 1962. O apare-
distribuição dos processos; relógio
Agendamento de visitas:
lho telefônico vermelho só passou a
de corda; placas alusivas à inaugura-
Telefone (81) 3326-8136
ser utilizado no ano seguinte e, com
ção de fóruns durante o período da
o tempo, foi substituído por formas
Ditadura Militar, entre 1964 e 1985;
E-mail memorial@trt6.jus.br Dias e horários para visitação:
mais modernas de comunicação.
togas e demais objetos utilizados
terça a quinta-feira, das 8h às 14h.
A versão pernambucana do
por magistrados; entre outras peças.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
53
Por que escolhi Direito
A
Texto: Jaqueline Fraga
escolha profissional é uma de-
indagam, por exemplo, se é melhor
caracterizam sua passagem para a
cisão difícil na vida de muitos
trabalhar no que se gosta ou naquilo
vida adulta”, avalia.
jovens. Algo compreensível, de fato,
que traz mais retorno financeiro. É
tendo em vista que se trata do mo-
possível equilibrar essa equação?
Para auxiliar na tomada de decisão, uma das opções adotadas
mento em que eles mesmos, seus
A psicóloga Ana Karolina Ma-
pelos jovens é a realização de testes
familiares e amigos, esperam que
cedo, especialista em orientação vo-
vocacionais. Como explica Ana Ma-
definam seu futuro. São adolescentes
cacional, explica que tais questões
cedo, os testes são utilizados como
na faixa dos 17 anos que estão prestes
podem, de fato, dificultar a identi-
recurso para o autoconhecimento e,
a completar a maioridade e se torna-
ficação da carreira que se pretende
juntamente com outras ferramentas,
rem adultos. E adultos têm responsa-
seguir. “Muitos jovens costumam
como textos, dinâmicas e diálogos
bilidades e obrigações que não eram
lidar com esta escolha de forma
analíticos, integram o processo de
cobradas na época ainda recente da
conflituosa e angustiante por so-
orientação vocacional.
escola. Adultos trabalham. Adultos
frerem interferência da família nas
“A escolha da profissão se dá
têm uma profissão.
suas decisões, por se verem com a
pelo próprio sujeito. Somos ape-
Esses fatores são velhos conheci-
responsabilidade em acertar e obter
nas o facilitador deste processo.
dos por profissionais que atuam na
o sucesso profissional e por se de-
Vamos auxiliá-lo a identificar suas
orientação vocacional de jovens que
frontarem com alguns deveres que
habilidades, seus interesses, seu
54
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Fotos: Acervos pessoais
Ivanildo Andrade durante a época de estudante da Faculdade de Direito do Recife (foto à esquerda). Pedro Paulo Nóbrega, agachado (segundo à esquerda), junto aos colegas do terceiro ano da Faculdade. Virgínia Canavarro ao lado do seu pai, Pedro Malta Filho, durante o baile de formatura em 1971
comportamento em determinadas situações, seus gostos e preferências,
Entre Direito, Sociologia e Jornalismo
o mesmo resultado: Sociologia em primeiro lugar, Direito em segundo
sua análise da realidade e mercado
e Jornalismo em terceiro.
de trabalho para traçarmos, juntos,
Presidente do Tribunal Re-
A decisão final, explica o desem-
o seu perfil”, esclarece a psicóloga.
gional do Trabalho da 6ª Região
bargador, foi fortemente influencia-
(trt-pe), o desembargador Ivanil-
da pelo fato de a área jurídica abran-
do da Cunha Andrade revela que
ger características dos dois outros
os testes vocacionais o auxiliaram
cursos e também pela expectativa
quando da escolha do curso que iria
financeira. “O fenômeno social
seguir. “Logo cedo defini-me pela
sempre foi objeto de preocupação,
área de humanas. Mas não foi fácil
de divagações, e desde cedo me in-
a escolha do curso. Durante algum
teressei por aspectos políticos, eco-
tempo vacilei entre Sociologia, Di-
nômicos. O Direito modula em boa
reito e Jornalismo. Inclusive, recorri
parte todas essas questões”, avalia.
Ana Karolina Macêdo
ao teste vocacional que a minha ge-
Formado em 1973 pela Facul-
Psicóloga
ração costumava fazer para auxiliar
dade de Direito do Recife, da Uni-
a escolha”, conta. Foram três testes e
versidade Federal de Pernambuco
“Os estudantes que optam pelo curso de Direito geralmente apresentam como perfil gosto pela organização, iniciativa para tomada de decisão e aceitação de responsabilidade. ”
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
55
(ufpe), o então graduado não estava
Dica do presidente
certo de que desejava ingressar na magistratura. A decisão aconteceu
“Eu diria para os jovens que estão na fase de escolha
após a conclusão do curso de Ciên-
da profissão que devem avaliar suas aptidões
cias Criminológicas pela Universi-
naturais para que a carreira escolhida atenda às
dade Livre de Bruxelas, na Bélgica,
suas motivações e habilidades, sem descuidar da
em 1977. No ano seguinte, tornou-se
dimensão financeira, mas sem nunca colocar esta
mestre em Gestão Financeira Públi-
dimensão acima dos outros pressupostos. O homem
ca pela Universidade da Antuérpia,
nasceu para ser feliz”.
no norte do país. “Ao terminar o curso de Direito, não tinha clareza sobre a atividade que iria exercer. Mas quando retornei da Bélgica, onde estudei durante pouco mais de três anos, já havia
Direito: “Tenham sempre em mente
dizer que também me realizei no
definido que seria magistrado e que
que a liberdade é o pressuposto para
Tribunal. A única diferença do ofí-
a atividade judicial me traria não só
a afirmação da dignidade humana e
cio é que antes eu postulava e aqui
a profissionalização como também
de todos os direitos, buscando sem-
eu examino as postulações, mas a
um terreno fértil para afirmação
pre se nortear pela ética e alimen-
matéria é a mesma, a matéria é Di-
pessoal e política”, lembra.
tando a responsabilidade social e
reito do Trabalho”, avalia.
Foi no ano de 1981 que Ivanildo Andrade tornou-se juiz do traba-
política que fazem do profissional de Direito construtor da democracia”.
Direito do estado de Pernambuco.
reito pela Universidade Federal de Pernambuco em 1968. Possui tam-
lho. Na época, havia sido também aprovado no concurso para juiz de
Pedro Paulo graduou-se em Di-
Da advocacia para a magistratura
“A nomeação do trt6 antecedeu em
bém pós-graduação em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Universidade Cató-
alguns meses a de juiz de Direito. E
O vice-presidente do trt-pe, de-
lica de Pernambuco (Unicap). A
eu encontrei na Justiça do Trabalho
sembargador Pedro Paulo Pereira
escolha pela área jurídica, revela,
um bom ambiente e condições ade-
Nóbrega, ingressou na 2ª instância
foi imediata: “Nunca tive dúvidas
quados para o exercício da magis-
da Justiça do Trabalho em Pernam-
quanto ao curso”.
tratura”, conta.
buco, no ano de 2001, em vaga do
O seu interesse pelo curso, em
Promovido ao cargo de desem-
quinto constitucional reservado à
especial pelo Direito do Trabalho,
bargador do Regional pernambuca-
advocacia, conforme prevê a Cons-
teve grande influência do jurista
no em 2001 pelo critério de antigui-
tituição Federal de 1988.
José Inojosa de Andrade, um dos
dade, o magistrado vê como natural
Ao tomar posse como desem-
precursores da advocacia trabalhis-
a sua chegada à 2ª instância, tendo
bargador, Pedro Paulo já possuía
ta em Pernambuco e amigo de seu
em vista que escolheu se dedicar
33 anos de advocacia trabalhista.
pai. Foi trabalhando no escritório de
à Justiça Trabalhista. E aconselha
“Minha vocação, toda ela, sempre
Inojosa, que era totalmente voltado
aos bacharéis recém-formados em
foi para advocacia. Mas eu posso
à Justiça do Trabalho, que definiu o
56
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
“Dedicar-me à área trabalhista é a
Danilo Galvão
ramo em que iria atuar. consequência disso tudo. E a Justiça do Trabalho sempre foi caracterizada pela celeridade, o que permitia que todos os meus processos tivessem início e fim. Isso é fundamental para a sociedade: ter a solução dos seus processos o mais rápido possível”, analisa o desembargador. Como advogado, participou de importantes causas trabalhistas, representando, inclusive, organismos da Prefeitura do Recife, do Go-
Topo da carreira. Os desembargadores Pedro Paulo, Ivanildo Andrade e Virgínia Canavarro - vice, presidente e corregedora - dirigem o TRT-PE até 2015
verno de Pernambuco e da União. “Nos anos 1980, eu me tornei um advogado muito requisitado para
descumpridos”, avalia.
a doutrina jurídica. Estejam mais
acompanhar as negociações coleti-
Com a experiência de quem
presentes nos tribunais, sustentando
vas. Participei de muitos dissídios
advogou por mais de três décadas,
oralmente as teses que desenvolve-
e muitos acordos coletivos, o que
o desembargador recomenda aos
ram em defesa de seus constituintes,
me fez ver algo muito importan-
jovens advogados: “Não deixem de
não se esquecendo de que a conduta
te: os ajustes coletivos, quando são
estudar. Não se limitem aos casos
moral é fato imprescindível para a
realmente celebrados em razão do
que estão em suas mesas. Procu-
advocacia, como esta é uma peça
interesse das partes, dificilmente são
rem se reciclar. Colaborem com
importantíssima para a Justiça”.
Voz feminina
Palavra do professor
De acordo com o Censo Nacional do Poder Judiciário, realizado
Titular da disciplina Legislação Social, da Faculdade de
no segundo semestre de 2013 pelo
Ciências da Administração da Universidade de Pernambuco,
Conselho Nacional de Justiça (cnj),
Pedro Paulo vê uma mudança de perfil e atitude dos alunos:
36% da magistratura do país é com-
“Os estudantes cada vez mais não se conformam com a
posta por mulheres. No Pleno do
mera interpretação da norma jurídica, exigindo do professor
trt-pe, esse percentual é supera-
um esforço para trabalhar com o Direito ideal e não só com
do: dos 19 membros que compõem
o Direito posto como De lege ferenda (A lei a ser feita)”.
a Casa, nove são mulheres (48%). Entre elas, a atual corregedora
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
57
regional, desembargadora Virgínia
tomou posse no cargo de Oficial de
Malta Canavarro.
Administração. Seis anos mais tar-
Relembrando que chegou à 2ª
Formada em Direito pela ufpe
de, quando era assessora do desem-
instância do trt6 em 2002 pel0 cri-
no ano de 1971 e pós-graduada em
bargador José Ajuricaba da Costa e
tério da antiguidade, a desembarga-
Direito do Trabalho pela Unicap,
Silva, foi aprovada para o concurso
dora revela o imenso orgulho pelo
a desembargadora relembra que a
de juiz do trabalho. “Tomei posse no
Judiciário Trabalhista, em especial
sua opção pela área de humanas foi
último dia do prazo por ter dúvidas
pela atuação feminina. “A Justiça do
influenciada pelo seu intenso gosto
se devia ou não exercer a magistra-
Trabalho nasceu moderna, tanto que
pela leitura. No entanto, o interesse
tura. Tinha uma filha de um ano de
possibilitou o acesso das mulheres à
pelo ramo jurídico concorria com
idade, além de gostar de ser asses-
magistratura. Sempre foi mais ágil,
dois outros cursos: Jornalismo e
sora”, conta.
informal e acessível ao jurisdiciona-
fundamental do ser humano”.
Filosofia. A decisão, conta, deu-se
Mas, a juíza logo teve a convicção
do, servindo de modelo às reformas
após participar de um júri simula-
de que a escolha fora acertada: “Não
de normas processuais civis. Esse é
do sobre Alexandre Magno (rei da
me arrependi da opção, apesar do
um legado que precisa ser preserva-
Macedônia em 338 a.C.) quando
difícil caminho trilhado por um ma-
do pela nova geração de juízes, que
cursava o primeiro ano do ensino
gistrado. Os pesados encargos são
devem ter em mente a relevância do
médio. “Eu me encantei com a dia-
recompensados pelo sentimento de
seu cargo e o compromisso com a
lética jurídica”, relembra, e acres-
que, ao prestarmos justiça, estamos
nossa carente sociedade”.
centa: “Pesou também na escolha
atendendo um anseio primordial e
o leque de opções que o curso de Direito oferece”. Ao concluir a graduação, quando já trabalhava na Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
Escolha pessoal
(Sudene), abriu, juntamente com al-
A corregedora Virgínia Canavarro teve de convencer a
guns colegas recém-formados, um escritório de advocacia no centro do Recife. Mas, avalia a desembargadora, não possuía habilidade para o exercício da atividade. Com o desejo de seguir carreira nas instituições públicas, prestou concursos para alguns órgãos, incluindo o trt6, cuja inscrição para o certame foi efetuada por seu pai, Pedro Malta Filho, antigo juiz classista. Em 1973, após ter sido aprovada no concurso para servidores do Sexto Regional, Virgínia Canavarro
58
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
família sobre a sua vocação: “No meu núcleo familiar não havia ninguém da área jurídica. Todos foram contrários, inicialmente, a minha opção, o que foi revertido quando ficou clara a profunda identificação e o meu entusiasmo com o curso de Direito”.
TRT-PE já funciona 100% com o PJe-JT Texto: Mariana Mesquita
Danilo Galvão
H
á menos de dois anos começa-
físico pelo eletrônico. O dia 18 da-
políticas públicas de sustentabilida-
va a maior mudança de para-
quele mês seria um marco para a
de socioambiental”, como acentuou
digma já vivenciada pela Justiça do
história da justiça especializada do
o juiz Fernando Cabral Filho, titular
Trabalho da 6ª Região. Os processos
estado – a segunda instância do Tri-
da 2ª vt de Igarassu, que presidiu
físicos, com seus pesados e empo-
bunal e as duas Varas do Trabalho
a primeira audiência nos moldes
eirados volumes, começavam a dar
(vt) de Igarassu passariam a fun-
eletrônicos.
espaço a um novo modelo processu-
cionar de maneira inovadora. Dar
Com a preocupação de criar
al: o Processo Judicial Eletrônico da
entrada em ações e petições remo-
maior empatia com os usuários e
Justiça do Trabalho (pje-jt). O novo
tamente, consultar processos sem a
fazendo frente à resistência natural
padrão processual colocava em
necessidade do uso de papel ou do
que acontece em qualquer mudan-
foco os princípios constitucionais
deslocamento às unidades judiciais
ça de padrão, o trt promoveu, ao
da Razoável Duração do Processo
já não mais fariam parte do imagi-
longo dos anos que vieram, pales-
e da Celeridade – os mais represen-
nário, passando a ser uma excelente,
tras, apresentações, treinamentos e
tativos da esfera trabalhista. Além
porém desafiadora, realidade.
várias ações visando ao adequado
disso, era fortíssimo o argumento
Na solenidade de implantação,
funcionamento e uso do pje. Na me-
da necessidade de informatização
o então presidente do Tribunal
dida em que o sistema avança, os
do processo como condição de me-
Superior do Trabalho (tst) e do
magistrados e servidores vão sendo
lhoria da prestação jurisdicional.
csjt, ministro João Oreste Dalazen,
capacitados. No final de 2012, o Re-
Foi em setembro de 2012, sob
descreveu o pje como uma “revolu-
gional já instalara a nova platafor-
a gestão do desembargador André
ção silenciosa, apta a concretizar a
ma em 14 unidades – o equivalente
Genn de Assunção Barros, que o
promessa democrática de acesso à
a 20% das suas vts – o dobro dos
Tribunal Regional do Trabalho da
Justiça”. Naquele momento, o trt-
10% determinados na Meta 16 do
6ª Região (trt-pe) deu o pontapé
pe ingressou numa nova era, a digi-
Conselho Nacional de Justiça (cnj)
inicial à substituição do modelo
tal, “mais ágil e sintonizada com as
para aquele ano.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
59
Stela Maris
“Encerrando o ultrapassado
superior específica no setor. No
se despediu da Presidência salien-
último trimestre do ano, com a
tando a acessibilidade, economia
publicação da lei que autorizava a
e celeridade proporcionadas pelo
criação de 57 cargos de analista, e o
pje-jt: “Encerrando o ultrapassa-
diálogo constante com o csjt, que
do modelo em que cada Tribunal
resultou na transferência de recursos
representava uma ilha, isolado na
que possibilitou todas as nomeações
repetição de tarefas, chegamos ao
ainda em 2012, ficou consolidada a
salutar sentimento de unidade”, co-
equipe que, a partir dali, contribuiria
memorou.
expressivamente para a superação
Em fevereiro de 2013 assumiu a
das metas do cnj de forma virtuo-
Presidência o desembargador Ivanil-
sa: “Sem a extensão do quadro, não
do Andrade. “O pje é irreversível”,
poderíamos jamais ter dado o passo
posicionou-se, em seu discurso de
de duplicar esses números”, revela.
posse, lembrando também que o
A transformação do padrão pro-
trt-pe vinha realizando todas as
cessual começou a tomar forma e
ações necessárias a facilitar o do-
se aproximar mais da sociedade no
mínio da ferramenta. No mesmo
primeiro dia de 2013, quando passou
mês, reforçando a política de treina-
a vigorar ato que determinava que
mento, a Escola Judicial do Regional
Para o desembargador André
a 2ª instância do Tribunal atuaria
(ejtrt6) lançou o “ambiente virtual
Genn, o êxito das operações pela
exclusivamente pelo PJe nos casos
de aprendizagem”, que permanece
via eletrônica não teria sido possí-
de sua competência originária. No
no site do trt até hoje e disponibi-
vel sem a renovação do parque de
final de janeiro, com a inclusão das
liza manuais, vídeos, versões atua-
informática, a ampliação de links de
cidades de Petrolina, Palmares e
lizadas do pje-jt, além de espaços
internet e o aumento significativo do
Cabo de Santo Agostinho, o sistema
de treinamento livre em Educação
quadro de pessoal de Tecnologia da
já funcionava em 21 vts.
à Distância.
modelo em que cada tribunal representava uma ilha, isolado na repetição de tarefas, chegamos ao salutar sentimento de unidade.” ANDRÉ GENN DESEMBARGADOR ex-presidente DO TRT-PE
Informação (ti). No começo, conta
Conhecido como engajado na
Enquanto o Tribunal se esforçava
o ex-presidente, o Regional tinha
promoção do uso de novas tecnolo-
para familiarizar seu quadro de pes-
apenas 11 servidores com formação
gias, o desembargador André Genn
soal, órgãos relacionados à Justiça
quadro da evolução do pje em quantitativo de varas e percentual de alcance
nov
10%
2012
Igarassu e Jaboatão
60
[ 7 VTs ]
dez
21%
[ 14 VTs ]
Ribeirão, Paulista e Ipojuca
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Alcançou antecipadamente a meta estabelecida pelo CNJ abr
40%
[ 27 VTs ]
Petrolina, Palmares, Cabo, Vitória de Santo Antão, Nazaré da Mata, São Lourenço da Mata e Olinda
2013
do Trabalho tomavam iniciativas
como um dos exemplos mais bem
2013), na categoria de Educação a
para sensibilizar o público usuário
sucedidos do país e atribuiu parte
Distância. Para o juiz Agenor Mar-
externo. A ej6 promoveu curso de
desse sucesso ao modelo misto de
tins, um dos gestores responsáveis
formação de multiplicadores em pje
capacitação elaborado pela Esco-
pelo projeto e coordenador-geral da
voltado a servidores do Ministério
la Judicial. O corregedor elogiou,
ej6, a experiência foi positiva, pois
Público do Trabalho (mpt6). Na
ainda, a contribuição do Regional
“possibilitou que os servidores tives-
mesma época, o tst lançava cur-
para o desenvolvimento do sistema
sem um contato prévio com as fun-
so de capacitação para advogados,
nacionalmente, já que tem cedidos,
cionalidades do pje, gerando maior
transmitido ao vivo da sede da tv
desde 2012, 11 analistas da área de ti
segurança no uso da ferramenta”.
tst pelo Youtube.
ao tst/csjt.
Mas o alcance da meta do Con-
Em abril de 2013, com a chegada
Modelo Inovador – Em maio de
selho não freou as implantações pre-
do sistema ao Fórum de Olinda, o
2013, a ej6 concluiu um projeto-pi-
vistas para 2013. Entre setembro e
Tribunal atingiu antecipadamente a
loto inovador para a capacitação dos
outubro foi concluída a capacitação
meta do cnj para aquele ano, que era
servidores lotados nas três Varas do
dos juízes e servidores que atuavam
de implantar a plataforma em 40%
Trabalho de Caruaru, maior muni-
nas 23 varas da capital, as próximas
das suas varas. Na solenidade que
cípio do interior pernambucano. A
que receberiam a plataforma. Foi
oficializou a chegada àquelas unida-
nova sistemática trazia um formato
com a chegada ao Recife, em outu-
des, o presidente Ivanildo Andrade
misto, utilizando tanto as tradicio-
bro, que houve a conclusão do cro-
não deixou de alertar que o sistema
nais aulas presenciais quanto aquelas
nograma de 2013, sendo alcançada
era uma ferramenta “em aperfeiço-
na modalidade a distância, em for-
a marca de 56 das 67 vts do trt-pe,
amento”, e que seu êxito dependia
ma de videoconferências. Diante da
o correspondente a 83,6%, ou seja,
de todos os envolvidos com a justiça
grande repercussão, em outubro do
mais do que o dobro da meta de 40%
especializada.
mesmo ano, o projeto foi convidado
traçada pelo cnj, superada em 109%.
Em setembro, o trt6 se subme-
para ser apresentado no 5º Fórum
Em maio passado, foi retomado
teu à Correição Ordinária da Justiça
de Educação a Distância do Poder
o calendário de instalações, com
do Trabalho, realizada pelo tst. No
Judiciário. Dois meses depois, a Es-
a chegada à Vara de Catende. No
relatório final, o pje foi apontado
cola colhia novos louros, receben-
início de junho, com a implantação
pelo então corregedor geral, Mi-
do o Prêmio Nacional de Educação
em Serra Talhada, o trt começou
nistro Ives Gandra Martins Filho,
Corporativa do Judiciário (pecjus
a operar 100% eletronicamente,
Mais do que o dobro da meta estabelecida pelo CNJ (de 40%) out
84%
[ 56 VTs ]
Caruaru, Barreiros, Escada e Recife
mai
89%
2014
[ 63 VTs ]
Catende, Garanhuns, Pesqueira, Belo Jardim, Goiana e Timbaúba
jun
100%
[ 67 VTs ]
Limoeiro, Araripina, Salgueiro e Serra Talhada
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
61
na análise das avaliações por com-
80% – estabelecida pelo cnj para
petência, “a partir da qual se iden-
2014. A nova realidade advinda da
tificam lacunas nas habilidades dos
totalidade das vts do estado fun-
servidores, o que possibilita uma
cionando com o sistema também
formação voltada ao preenchimento
acentuou o cuidado da gestão do
delas”, esclarece.
Regional com a atualização de ser-
Dificuldades surgem em todo
vidores que sempre trabalharam
processo de mudança. Foi assim
com rotinas burocráticas, como
quando da troca das máquinas
carimbar e numerar as páginas dos
de datilografar pelos modernos
autos físicos.
computadores na Justiça Traba-
Com a extinção de alguns seto-
lhista; não seria diferente com o
res, consequência da mudança, e
pje-jt. Apesar dos desafios que
a exigência de um maior conheci-
vêm a reboque com a transição do
mento jurídico e tecnológico, o trt
processo físico para o eletrônico,
se antecipou à mudança cultural
o novo modelo traz benefícios ir-
que viria gradativamente. Para en-
refutáveis. Mais celeridade, trans-
frentar os obstáculos trazidos pela
parência, qualidade da prestação
nova situação, o desembargador
jurisdicional e maior segurança das
presidente, Ivanildo Andrade, lan-
informações são apenas algumas
çou um programa de qualificação
dessas vantagens. Além disso, com
profissional para serventuários que
o uso da plataforma eletrônica pela
se encaixavam no perfil. Segundo a
Justiça Trabalhista, deixarão de ser
diretora da Secretaria de Gestão de
desmatadas cerca de 50 mil árvo-
Pessoas (sgep), Eliane Remígio, a
res por ano. No fim das contas, é a
capacitação é permanente e consiste
sociedade quem sai ganhando.
Stela Maris
suplantando de novo a meta – de
Antecipando-se à mudança cultural e à extinção de setores prioritariamente burocráticos – decorrentes da transição de modelo processual –, o desembargador presidente Ivanildo Andrade lançou programa de capacitação permanente, a fim de preencher as lacunas verificadas nas habilidades dos servidores e treiná-los a desenvolver tarefas voltadas à atividade fim do Regional. ivanildo andrade DESEMBARGADOR presidente DO TRT-PE
Números No primeiro ano de funcionamento,
esse número era de aproximadamente
Judicial eletrônico em todas as unida-
a 1ª instância do Regional recebeu
76 mil. Durante o ano que precedeu o
des do Tribunal refletiu na quantidade
31.070 processos eletrônicos, e a 2ª,
início do funcionamento eletrônico,
de chamados por parte dos usuários,
877. Em dezembro de 2013, o Tribunal
o Regional recebeu cerca de 102 mil
recebidos na si. Para ele, apesar dos
já contabilizava, desde a inauguração,
processos físicos.
atuais 15 mil usuários externos e 1.700
quase 45 mil processos ajuizados pelo
Segundo o diretor da Secretaria de
internos, o número de pedidos de aju-
PJe no primeiro grau, e 1.500 no se-
Informática, João Adriano Pinheiro,
da e chamados para tirar dúvidas sobre
gundo. No final de abril deste ano,
o êxito na implantação do Processo
o sistema é insignificante.
62
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Justiça do Trabalho em Pernambuco: 73 anos de memória e história Stela Maris
Marcília Gama da Silva Coordenadora do Núcleo de Gestão Documental e Memória do TRT6, Profª Dra. do Departamento de História –UFRPE e Pesquisadora do CNPq/PROEXT-MEC
A
Justiça do Trabalho surgiu em
defesa da preservação da memória,
Memória da Justiça do Trabalho
decorrência da necessidade de
levada a cabo pelo convênio de co-
(cgmnac-jt) e o Programa Nacional
se estabelecer outro tratamento às
operação técnica assinado entre o
de Gestão Documental e Memória
relações conflituosas do mundo do
trt6 e o Programa de Pós-Gradu-
do Poder Judiciário (Proname), sem
trabalho, constituindo como instru-
ação em História da Universidade
falar nas Recomendações 37 do Con-
mento de cidadania consagrado no
Federal de Pernambuco (ufpe), que
selho Nacional de Justiça (cnj), que
artigo 766, do texto da Consolidação
possibilitou o tratamento do acervo
dedica alguns itens específicos ao
das Leis do Trabalho (clt).
destinado à eliminação. A partir daí,
trato da Memória do Judiciário.
Os registros que se formam des-
atividades de pesquisa e preserva-
Nesse viés, registram-se alguns
sa trajetória de luta da classe tra-
ção vêm sendo desenvolvidas, tendo
eventos no âmbito da Justiça do
balhadora representam a memória
como um dos produtos um farto
Trabalho de Pernambuco, que, já
de um passado às vezes esquecido,
material de estudo resultante das
em 2009, promove o I Fórum Re-
silenciado, marcado por histórias
pesquisas, aos níveis de bacharela-
gional de Arquivos Judiciais, em
de conflitos, manifestações e greves,
do, mestrado e doutorado.
parceria com entes do Judiciário
associadas à ideia de perigo a uma
Observa-se em todo o Brasil a
local e nacional de diferentes esfe-
dada ordem, sempre desigual e injusta
necessidade de preservar. Grupos e
ras. Em 2014, é realizado, no Recife,
imposta pelos interesses do capital.
Comitês pela preservação se multi-
o I Fórum de Memória do Judiciário
O acervo do Tribunal Regional
plicam a partir de 2004. A necessi-
do Norte-Nordeste, que se reuniu
de Pernambuco por meio de uma
dade de preservação dos autos como
para criar uma rede de memória
atividade historiadora e arquivís-
forma de salvaguardar essa memória
do Judiciário, com o objetivo de
tica proporciona o conhecimento
se materializa nos seus documen-
sistematizar ações e competências,
de nossa história, eternizada nos
tos, ao longo de mais de 70 anos de
promover a troca de experiências,
interstícios, na busca por melhores
história. Nessa senda foram criados
informações e rotinas por meio da
condições de vida e trabalho, tendo
os selos da Memória, destinados a
internet, a fim de que fosse conso-
sido reconhecida sua importância,
identificar os processos relevantes
lidado um protocolo de intenções a
por meio da conquista do pioneiro
para a história em cada Regional.
ser entregue ao cnj, para subsidiar
título de patrimônio da Humani-
Criou-se o Fórum Permanente pela
uma Política Nacional de Memória
dade pela unesco para seu acervo.
Preservação da Justiça do Trabalho
para o Judiciário, garantindo, assim,
Esse reconhecimento é fruto
(Memojutra), o Comitê Gestor do
às atuais e futuras gerações, o direito
de um árduo e longo processo em
Programa Nacional de Resgate da
à história e à memória.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
63
Acervo pessoal
Planejamento Estratégico 2015-2020 KATIA DO REGO BARROS Assessora de Gestão Estratégica do TRT6
O
Tribunal do Trabalho da 6ª
as execuções fiscais, cíveis e traba-
coleta de propostas consolidadas
Região, alinhado às diretrizes
lhistas”, “Assegurar a celeridade e
e apreciadas durante o Fórum de
traçadas pelo Conselho Nacional
produtividade na prestação juris-
Gestão Estratégica, ocorrido nos
de Justiça, à tendência da adminis-
dicional”, “Gerir as demandas re-
dias 13, 14 e 15 de agosto. O intuito
tração pública de modernizar seus
petitivas e dos grandes litigantes” e
é propiciar o amplo debate para
processos de gestão, à adoção de uma
“Garantir os direitos da cidadania”.
definição das prioridades que se-
postura mais proativa e dinâmica em
Com o intuito de garantir o en-
rão definidas para o Planejamento
relação aos problemas enfrentados,
volvimento de todos os integrantes
e também aos resultados a serem
da organização na construção de um
Com a finalidade de estender
alcançados, iniciou o processo de
Planejamento Estratégico Participati-
ainda mais a participação de todos
elaboração de seu Planejamento
vo para o trt6, como primeira etapa
nesse processo, foi criado um e-mail
Estratégico Institucional, que terá
foram solicitadas sugestões para to-
(age.comunicacao@trt6.jus.br) para
vigência entre 2015 e 2020.
das as varas, magistrados, gabinetes,
receber sugestões, aberto ao público
Durante o vii Encontro Nacional
unidades administrativas, sindicato
externo e interno. O objetivo prin-
do Judiciário realizado pelo cnj em
e associações de classes partícipes da
cipal é proporcionar o engajamento
novembro de 2013, em Belém-pa,
prestação jurisdicional. Também foi
de todos os integrantes do trt6 na
foram definidos os macrodesafios
promovido um Workshop sobre Pla-
construção do novo Planejamento
do Poder Judiciário Nacional, que
nejamento Estratégico em conjunto
Estratégico e no desenvolvimento
são os objetivos gerais que a Justiça
com o Núcleo de Desenvolvimento
da estratégia a ser adotada.
perseguirá até 2020. Entre os prin-
de Pessoal no dia 27 de maio, com
Assim, é fundamental o envol-
cipais tópicos estão o de “Assegurar
a participação de todos os diretores
vimento de todos que fazem o trt6
a efetividade na prestação jurisdi-
de varas, para discutir as opiniões e
para que se construa um planeja-
cional, ”Promover a melhoria da
ideias colhidas nas unidades.
mento que traduza as expectativas
Estratégico 2015-2020.
gestão de pessoas e da qualidade
Durante o Módulo Concentra-
dos cenários prospectivos e que seja
de vida”, “Aperfeiçoar a gestão de
do de Aperfeiçoamento de Magis-
alinhado às diretrizes e políticas de
custos”, “Fortalecer os processos de
trados (mcam), foi realizada uma
governança do Poder Judiciário
governança administrativa e judi-
apresentação sobre a formulação
Nacional e dos objetivos, projetos
ciária”, “Melhorar a infraestrutura
do novo Planejamento Estratégico
e metas do segmento da Justiça do
e governança de tic”, “Impulsionar
2015-2020, com espaço aberto para
Trabalho.
64
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
Danilo Galvão
Preparação para aposentadoria na Justiça do Trabalho Renatto Marcello de Araújo Pinto Chefe da Seção de Serviço Social do TRT6 e especialista em planejamento e gestão pública
A
pós anos de trabalho, chega
que, cada vez mais, as organizações
que regulamenta o Programa de
enfim o momento da aposenta-
públicas e privadas desenvolvam
Preparação para Aposentadoria no
doria. Para uns, o tão sonhado tempo
políticas que apoiem e facilitem ao
âmbito da Justiça do Trabalho de 1º e
de descansar, de cuidar melhor de
trabalhador a planejar adequada-
2º graus, proposta de autoria do De-
si mesmo, de se dedicar à família,
mente o seu futuro.
sembargador André Genn de Barros
ao bem-estar e à qualidade de vida.
O trt6 possuía em maio deste
em seu mandato naquele Conselho.
Para outros, no entanto, essa fase
ano 137 pessoas com os requisitos
Um importante reconhecimento do
da vida também poderá trazer algu-
necessários à aposentadoria e outras
trabalho que já era desenvolvido em
mas perdas e apresentar vários desa-
103 (34 homens e 69 mulheres) com
vários trts.
fios. A saída do mundo do trabalho
idade igual ou superior a 60 e 55 anos,
Embalado por essa nova con-
e, consequentemente, a mudança de
respectivamente. Isto quer dizer que
juntura, em 2014 o Programa de
status profissional, o distanciamento
nada menos que 240 magistrados
Preparação para Aposentadoria do
do círculo de amizades, a diminui-
e servidores estão próximos de se
trt6 foi reestruturado, passando a
ção nos rendimentos, a alteração na
aposentarem, aproximadamente
se chamar “Programa Novo Tempo:
rotina, nos hábitos e nas relações
11,5% do seu corpo funcional.
Preparação para Aposentadoria”, ga-
familiares.
Na perspectiva de estimular e
nhou uma identidade visual própria
Não por acaso, especialistas na
orientar o planejamento destas pes-
área chamam a atenção para os casos
soas para essa importante fase da
A implantação de programas de
de adoecimento, separações e até
vida, surgiu em 2008 o Programa
preparação para aposentadoria na
mesmo de morte de trabalhadores
de Preparação para Aposentadoria,
Justiça do Trabalho constitui-se num
pouco tempo após a aposentadoria.
instituído pelo Ato trt nº 094/2008,
avanço da gestão de pessoas trazendo
Segundo estimativas do Instituto
proposto e coordenado pela Seção de
benefícios tais como: diminuição do
Brasileiro de Geografia e Estatística
Serviço Social do Núcleo de Saúde.
impacto da aposentadoria; perspecti-
(ibge), a população brasileira acima
De lá para cá, 60 servidores e magis-
va positiva de vida; aumento da satis-
de 65 anos irá quadruplicar até o
trados participaram dos três ciclos
fação e motivação dos funcionários;
ano de 2060, passando dos atuais
realizados (2008 – 2010 – 2012).
sensibilização sobre a necessidade
e ampliou sua programação.
14,9 milhões (7,4% do total) para
No final de 2013, o Conselho
de pensar na “Carreira do Futuro”;
58,4 milhões (26,7% do total). Essa
Superior da Justiça do Trabalho
estímulo à integração e fortaleci-
transformação etária vem exigindo
(csjt) aprovou a Resolução nº 132,
mento da responsabilidade social.
REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
65
Danilo Galvão
A Mitologia e o Direito
PAULO ALCANTARA Especialista e mestre em Educação e desembargador do TRT6
Q
uando criança, fui apresenta-
– Platão, Confúcio, o Buda, Goethe
órgão de Urano nascerá Afrodite. O
do à Mitologia e desde então
e outros, que falam dos valores eter-
mesmo Cronos, temendo a sorte do
não parei de pesquisar sobre o tema.
nos, que têm a ver com o centro de
pai, depois de ter casado com a titã
Sempre achei interessante a maneira
nossas vidas. Quando um dia você
Reia, engole os próprios filhos após
como os antigos procuravam expli-
ficar velho e, tendo as necessidades
o nascimento. Reia, com a ajuda de
car aquilo que não entendiam por
imediatas todas atendidas, então se
Gaia, engana Cronos e esconde um
meio das figuras mitológicas. Mas
voltar para a vida interior, aí bem,
dos filhos, Zeus, o maior de todos
por que nos importar com os mi-
se você não souber onde está ou o
os deuses do Olimpo. Zeus, antes de
tos? O Mitólogo Joseph Campbell
que é esse centro, você vai sofrer”.
se casar com Hera, ainda se casará
diz o seguinte: “Vá em frente, viva
Esse pequeno ensaio pretende
com Metis (filha da titã Tetis), e com
a sua vida, é uma boa vida – você
estimular uma investigação sobre
Têmis, filha de Gaia e Urano, com
não precisa de Mitologia. Não acre-
a origem do Direito, sob o prisma
quem terá muitos filhos.
dito que se possa ter interesse por
mitológico. Para a Mitologia Grega,
A correspondente na Mitologia
um assunto só porque alguém diz
o início era o Caos absoluto, donde
Romana da deusa Têmis era a deusa
que é importante. Mas você poderá
surge Gaia, uma deusa imponente
Iustitia (Justiça). Atribuía-se a Deus,
descobrir que, com uma introdu-
e bela. Gaia é a matriz da vida, das
aos deuses e depois ao homem a
ção apropriada, o mito é capaz de
plantas, dos animais e dos deuses que
função de julgar, o que demonstra
capturá-lo. Um de nossos proble-
habitariam o Olimpo. Caos e Gaia
uma nítida influência da Mitologia
mas, hoje em dia, é que não estamos
são imensamente contraditórios e
no surgimento e na aplicação do Di-
familiarizados com a literatura do
imprescindíveis um ao outro. Porém,
reito. Na atualidade, nos confronta-
espírito. Estamos interessados nas
sem algo que os harmonize, não bas-
mos com questionamentos como
notícias do dia e nos problemas do
tam ao mundo. É Eros, com seu amor
o papel do Judiciário, os limites de
momento. Antigamente, o campus
e energia, quem vai fazer explodir
atuação e o ativismo do juiz, talvez
de uma universidade era uma espé-
a vida nas entranhas de Gaia e dar
sem saber bem o que seja isso. O
cie de área hermeticamente fecha-
algum sentido ao Caos. Já Cronos,
estudo do Direito não deve ficar res-
da, onde as notícias do dia não se
filho de Gaia e Urano, revoltado com
trito aos códigos e leis, até porque
chocavam com a atenção que você
o pai, que não permite que os filhos
as mudanças na sociedade impõem
dedicava à vida interior, nem com
nasçam, corta-lhe o órgão e atira ao
uma revisão e atualização legislativa
a magnífica herança humana que
mar. Das gotas de sangue sobre a ter-
ou uma nova interpretação por par-
recebemos de nossa grande tradição
ra nascerão outras divindades, e do
te do aplicador do Direito.
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REVISTA DIALOGAR · AGOSTO - NOVEMBRO 2014
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