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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
CARTA AOS LEITORES A dialogar chega a sua terceira edição. Neste número a revista viaja ao passado para trazer a repercussão da greve dos canavieiros, de 1979. Esse movimento paredista na Zona da Mata pernambucana marcou o início da mudança das condições de trabalho da classe e influenciou as negociações nos 35 anos que se seguiram, com pioneira atuação do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região. As mudanças do Judiciário Trabalhista ao longo dos anos, o papel desta Justiça Especializada na construção do Estado Democrático de Direito no Brasil e a reforma na Consolidação das Leis Trabalhistas (clt) foram alguns dos assuntos discutidos na entrevista com o ministro aposentado Carlos Alberto Reis de Paula, ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (tst) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (csjt). A contribuição da Educação a Distância na construção da democratização do conhecimento é outro assunto de relevante importância, que aparece em “Conhecimento disponível em qualquer lugar e a todo momento”. “Brasileiros pelo Mundo” aborda o cotidiano de emigrantes que deixam o país em busca de novas experiências e melhores condições profissionais. A reportagem traz histórias de brasileiros nos cinco continentes. Tema atual e em evidência após a edição da Lei do Descanso, no início de março de 2015, a rotina dos caminhoneiros é revelada em “Uma Jornada sobre-humana”. Outra questão polêmica aparece em “Profissão tem cor e classe”. A matéria mostra a divisão a partir da renda, da etnia, da cor e do sexo, capaz de determinar o perfil profissional das pessoas e seu lugar na sociedade. As inscrições rupestres, que datam da Pré-História, retratando cenas de caça a animais e coleta de frutas e mel, trazem a ideia da dependência da natureza para subsistir. “Trabalho na Pré-História” apresenta as principais atividades do homem no período e os primórdios e a evolução do trabalho até os dias atuais. Esta terceira edição traz ainda o ensaio fotográfico de Stela Maris, que registrou diversas atividades, muitas das quais penosas, realizadas por mulheres ao redor do mundo. Boa leitura.
Eugenio Jerônimo Chefe do Núcleo de Comunicação Social do TRT6
Expediente TRT da 6ª Região Cais do Apolo, 739 Bairro do Recife 50.030-902 Recife PE Imprensa: 81 3225 3216 dialogar@trt6.jus.br
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PRESIDENTE Gisane Barbosa de Araújo VICE-PRESIDENTE Virgínia Malta Canavarro
DESEMBARGADORES FEDERAIS DO TRABALHO Eneida Melo Correia de Araújo André Genn de Assunção Barros Ivanildo da Cunha Andrade Gisane Barbosa de Araújo Pedro Paulo Pereira Nóbrega Virgínia Malta Canavarro Valéria Gondim Sampaio Ivan de Souza Valença Alves Valdir José Silva de Carvalho Dione Nunes Furtado da Silva Maria Clara Saboya Albuquerque Bernardino Nise Pedroso Lins de Sousa Ruy Salathiel de Albuquerque e Mello Ventura Maria do Socorro Silva Emerenciano Sergio Torres Teixeira Fábio André de Farias Paulo Alcantara
Elysangela Freitas
CORREGEDOR Ivan de Souza Valença Alves
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SECRETÁRIO-GERAL DA PRESIDÊNCIA Sérgio Ricardo Batista Mello DIRETOR-GERAL Wlademir de Souza Rolim
Danilo Galvão
SECRETÁRIA DO TRIBUNAL PLENO Nyédja Menezes Soares de Azevedo EDIÇÃO Núcleo de Comunicação Social do TRT-PE (NCS) CHEFE DO NCS Eugenio Jerônimo REDATORES NCS: Eugenio Jerônimo · Mariana Mesquita Helen Falcão · Fábio Nunes · Jaqueline Fraga · Marcos Carvalho | Signo Comunicação: Patrícia Castelão · Francisco Shimada
REVISÃO Eugenio Jerônimo | Mariana Mesquita
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Elysangela Freitas
FOTOGRAFIA NCS: Stela Maris · Elysangela Freitas | Signo Comunicação: Danilo Galvão
IMPRESSÃO Gráfica e Editora Liceu (Tiragem: 1.000 exemplares)
Caminhoneiros: luta por dignidade ao volante
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ESTAGIÁRIOS DE JORNALISMO Jaqueline Fraga e Marcos Carvalho
PROJETO GRÁFICO e DIAGRAMAÇÃO NCS: Simone Freire · Gilmar Rodrigues | Signo Comunicação: Micaele Freitas
A relação do homem da Pré-História com o trabalho
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Atuação pioneira do trt-pe nos dissídios coletivos dos canavieiros
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Mão de obra brasileira em
na etnia e nas profissões
60
O dia a dia dos garçons
28
Músico, um produtor
64
A arte em tipos
04
Entrevista
16 24
O avanço do ensino a distância
Divisão social expressa
de bens de consumo?
todos os continentes
Colunas Na prateleira
Acervo / FNPETI
41 Carlos Alberto Reis de Paula Ex-presidente do tst/csjt
68
Opinião
42
Ensaio fotográfico Labor das Deusas Stela Maris
O direito à memória como direito humano Eneida Melo
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Entrevista
Ministro Carlos Alberto Reis de Paula
Ilustração: Mica Freitas
Stela Maris
Por: Francisco Shimada
Ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (tst) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (csjt), o ministro Carlos Alberto Reis de Paula é o entrevistado desta terceira edição da Dialogar. Aposentado compulsoriamente em fevereiro de 2014 e com, aproximadamente, 35 anos de dedicação à causa trabalhista, o magistrado fala sobre as mudanças ocorridas na Justiça do Trabalho ao longo dos anos.
N
esta entrevista, o ministro Car-
Mineiro de Pedro Leopoldo,
chegou ao Tribunal Regional do
los Alberto comenta o papel da
Carlos Alberto Reis de Paula nasceu
Trabalho da 3ª Região (trt-mg)
Justiça do Trabalho na construção do
em 26 de fevereiro de 1944. Iniciou
por merecimento e ingressou no
Estado Democrático de Direito no
a carreira pública como professor
tst em 1998. Bacharel em Direito
Brasil e analisa a competência do Ju-
do Colégio Estadual de Pedro Leo-
pela Universidade Federal de Minas
diciário Trabalhista. O diálogo com a
poldo e foi aprovado em concurso
Gerais (ufmg) e licenciado em Filo-
sociedade, o grau de padronização das
para técnico de controle externo do
sofia pela Faculdade de Divinópolis,
decisões, a jurisprudência defensiva e
Tribunal de Contas da União. Na
o ministro Carlos Alberto é mestre
a reforma na Consolidação das Leis
magistratura, foi juiz do Trabalho
e doutor pela Faculdade de Direito
Trabalhistas (clt) também são alguns
substituto da 3ª Região, presidiu
da federal mineira, professor uni-
dos temas abordados na conversa.
Juntas de Conciliação e Julgamento,
versitário e autor de diversos livros.
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Ministro Carlos Alberto, é possí-
A partir da Emenda Constitu-
do melhor serviço à sociedade, com
vel imaginar o Estado Democrático
cional número 45/2004, quais os
todos os mecanismos de ação cria-
de Direito no Brasil sem a existên-
principais avanços da Justiça Tra-
dos por força dessa atribuição ins-
cia da Justiça do Trabalho?
balhista? Em quais pontos ainda se
titucional. Entendo que houve uma
fazem necessários avanços?
aproximação entre a sociedade e o
Para se entender a importância
Poder Judiciário.
da Justiça do Trabalho na estrutu-
O grande avanço da Justiça do
ração do Estado Democrático de
Trabalho com a Emenda Consti-
Direito é indispensável que se firme
tucional (ec) nº 45/2004 decorreu
que os seus princípios fundantes
da ampliação de sua competência,
Principalmente a partir da ec
são a dignidade da pessoa humana
agora alcançando toda e qualquer
45/2004, parece-me que cresceu a
e os valores sociais do trabalho e
relação de trabalho. A consequên-
preocupação na Justiça do Trabalho
da livre iniciativa. No nosso regime
cia imediata foi a maior projeção
com o diálogo com a sociedade. É
capitalista, há de se correlacionar
da própria Justiça do Trabalho no
fundamental que haja essa aproxi-
a função social da empresa com a
concerto dos demais ramos do Judi-
mação, porquanto nós falamos para
valorização do trabalho humano,
ciário. Há de se destacar, também, a
a sociedade, através de nossa atua-
sendo valor prevalente a dignida-
previsão de criação, pelos Regionais,
ção jurisdicional. Essa indispensável
de da pessoa humana. Nessa ótica
da justiça itinerante assim como o
aproximação está inclusive presente
é que se situa o Direito do Traba-
funcionamento descentralizado dos
no disposto no artigo 93, vii, intro-
lho e a Justiça do Trabalho, para
trts, por meio de Câmaras Regio-
duzido pela ec 45, válido para todos
garantir esse valor máximo com o
nais. Entendo também como rele-
os magistrados, quando estabelece
assento constitucional do princípio
vante na mencionada ec a criação
que “o juiz titular residirá na res-
da igualdade, vetor dos direitos e
do cnj para a instituição de uma es-
pectiva comarca, salvo autorização
garantias fundamentais.
tratégia de ação da Justiça em busca
do tribunal”.
A Justiça do Trabalho tem dialogado com a sociedade?
“Para se entender a importância da Justiça do Trabalho na estruturação do Estado Democrático de Direito é indispensável que se firme que os seus princípios fundantes são a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.”
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Qual o principal papel da Justiça
Uma parcela da sociedade acha
A exacerbação na análise dos
do Trabalho na busca de uma rela-
que a Justiça do Trabalho protege ex-
requisitos de admissibilidade dos
ção harmônica entre empregados e
cessivamente o trabalhador...
recursos, conhecida como jurispru-
empregadores?
A Justiça do Trabalho sempre so-
dência defensiva, como todo exagero,
Na busca de uma relação har-
frerá críticas, por se opor sempre a
há de ser evitada, com o gravame de
mônica entre empregados e empre-
tudo que desvalorize o trabalho, e
impedir uma resposta do Judiciário
gadores, a Justiça do Trabalho deve
não se reconheça ao trabalhador a
à pretensão que lhe foi levada para
abrir suas portas para dialogar com
sua dignidade. Óbvio que esse não
julgamento. É a filosofia presente no
os dois segmentos, assim como, à
é o único valor a ser considerado,
disposto no § 11 do artigo 896 da clt,
medida do possível, trazê-los, por
mas sempre terá primazia em rela-
introduzido pela Lei nº 13.015/2014,
meio de seus legítimos representan-
ção a outros. O caput do artigo 170,
ao estabelecer que “quando o recurso
tes, para um diálogo a ser celebrado
ao cuidar dos princípios gerais da
tempestivo contiver defeito formal
nos próprios tribunais, ou mesmo
atividade econômica, consagra que
que não se repute grave, o Tribunal
varas, quando a questão for relevan-
a ordem econômica é fundada na
Superior do Trabalho poderá descon-
te e no âmbito de sua jurisdição. De-
valorização do trabalho humano e
siderar o vício ou mandar saná-lo,
vemos, também, procurar manter
na livre iniciativa.
julgando o mérito”. A aplicação do
Com o aumento da procura dos
princípio da duração razoável do
República, não só para a elaboração
cidadãos pela Justiça do Trabalho,
processo, de índole constitucional,
ou a alteração da legislação como
como o senhor analisa a jurisprudência
é um grande desafio que há de ser
também para ações conjuntas.
defensiva e a duração de um processo?
enfrentado diariamente por todos
Acervo tst
contatos com os demais poderes da
“A Justiça do Trabalho sempre sofrerá críticas, por se opor sempre a tudo que desvalorize o trabalho, e não se reconheça ao trabalhador a sua dignidade.”
os magistrados, para o que se deve
soluções extrajudiciais de solução
Não se pode olvidar que o ideal é
tentar encontrar soluções individuais
de conflitos. Para a Justiça do Tra-
que a atuação do Judiciário sempre
e coletivas. Certo ser necessário que
balho a Constituição da República
gere segurança e previsibilidade. A
se busque ter magistrados, sempre
previu (art. 114, § 1º) a arbitragem
surpresa não pode ser uma das ca-
comprometidos com a sua tarefa ins-
no dissídio coletivo. Tanto para o
racterísticas da atuação jurisdicio-
titucional, em número adequado à
dissídio individual como para o
nal. A Lei nº 13.015, de 21 de julho de
demanda e que a informática seja um
dissídio coletivo, a clt estabelece a
2014, que fez alterações substanciais
instrumento eficaz e eficiente para
obrigatoriedade da tentativa de con-
no sistema recursal trabalhista, re-
auxiliá-los, assim como os advogados
ciliação. Continuo a entender que,
vela essa preocupação quando, no
e servidores, nesse grande desafio.
atualmente, esses institutos não de-
§ 3º do art. 896 da clt, estabelece a
A aplicação das formas extraju-
veriam ser introduzidos para o dis-
obrigatoriedade da uniformização
diciais de solução de conflitos, como
sídio individual, em que a atuação
da jurisprudência dos Tribunais
a arbitragem e a mediação, é correta?
do Estado não deve ser substituída
Regionais do Trabalho. Da mesma
Essas alternativas devem ser utiliza-
por particular. Creio que podemos
forma quando, pelos artigos 896-B
das até que ponto?
criar mecanismos e procedimentos
e 896-C, cuida dos recursos repeti-
que facilitem a conciliação traba-
tivos. De outra sorte, ao tratar da re-
lhista já prevista legalmente.
visão da jurisprudência firmada em
Sabemos que o Congresso tem em sua pauta dois projetos sobre mediação e um projeto sobre ar-
Que observações podem ser feitas
julgamento de recursos repetitivos,
bitragem, esse último alterando
sobre o grau de padronização das de-
prevê a modulação dos efeitos da
a Lei nº 9.307, de 23.09.1996. São
cisões no ramo trabalhista?
decisão que altera a decisão anterior,
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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tudo em nome da segurança jurídi-
os interesses do empregador. Não
tecnológico ou mesmo estrutural.
ca das relações firmadas sob a égide
pode haver desenvolvimento com
Não me oponho à terceirização, não
da decisão anterior.
a desvalorização do trabalho.
posso é me filiar a soluções que pre-
Uma reforma na Consolidação das Leis Trabalhistas (clt) deve ser discutida? Qual seria a legislação
A terceirização causa incômodo na Justiça Trabalhista?
carizem o trabalho. O Processo Judicial eletrônico da
Sobre terceirização, tema hoje de
Justiça do Trabalho (pje-jt) já pode
repercussão geral, por decisão do
ser considerado um projeto exitoso?
Pessoalmente entendo que não
stf, há de se destacar a sua grande
Por quê?
é conveniente no atual momen-
presença no universo do trabalho.
O Processo Judicial Eletrônico
to pensar-se em reforma geral da
O número de processo em que se
da Justiça do Trabalho está implan-
clt. Como fruto principalmente
discutem direitos decorrentes de
tado em todos os Tribunais Regio-
do diálogo entre empregados e
terceirização é muito expressivo. Pa-
nais e sua abrangência, respeitadas
empregadores podem ser levadas
rece-me que a solução dada pelo tst
as diferenças de situação, se amplia
a termo alterações pontuais. Se
por meio da Súmula 331 tem fun-
gradativamente. Sob esse ângulo,
bem observamos, a clt, ao longo
damentos no nosso ordenamento
a Justiça do Trabalho é pioneira e
do tempo, foi alterada inúmeras
jurídico. O que me parece relevante
avalio que o projeto, cuja implan-
vezes. A regulamentação sobre fé-
é que ao se aplicar os princípios lá
tação teve início em 2012, é exitoso.
rias, por exemplo, foi amplamente
assentados se tenha sensibilidade
No nosso entender, a preocupação
alterada. O objetivo de qualquer
para as alterações que ocorrem no
maior há de ser com a acessibili-
alteração deve sempre ser a prote-
campo dos fatos quer no campo
dade, a segurança e a estabilida-
ção do empregado conjugada com
social, de governança, no âmbito
de do sistema, pelo que não pode
trabalhista ideal para o país?
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“Na condução do tst e do csjt procurei estar conforme o entendimento consensual dos meus colegas ministros, o que sempre foi o alicerce de nossa conduta.”
prevalecer a preocupação de apenas
O exercício da Presidência do
Após atuar em todas as esferas do
expandi-lo. Com a obrigatória alte-
tst, de 05 de março de 2013 a 25
Judiciário, qual o maior aprendizado
ração de rotinas, indispensável que
de fevereiro de 2014, foi um dos
adquirido e qual o maior ensinamen-
haja uma adaptação de advogados,
maiores privilégios da minha vida.
to transmitido?
servidores e juízes ao novo instru-
Tive condições de conhecer melhor
A minha jornada na Justiça do
mento de trabalho, que deve estar
a própria Justiça do Trabalho, não
Trabalho iniciou-se em 6 de junho
a serviço do processo.
apenas em sua estrutura, mas prin-
de 1979, com a posse como juiz do
Como o senhor avalia ações espe-
cipalmente em sua dinâmica. Pude
Trabalho substituto no trt da 3ª
cíficas da Justiça Trabalhista, a exem-
me relacionar institucionalmente
Região, e foi sendo tecida ao longo
plo do programa Trabalho Seguro e do
com os outros poderes da Repúbli-
do tempo com desafios, acertos e
enfrentamento ao trabalho infantil?
ca, bem como com representações
desacertos, mas continuamente com
Sempre me pareceram como
sindicais e associativas. Adicionan-
a determinação de bem servir. Para
iniciativas elogiáveis por significar
do meu biênio como corregedor-ge-
a minha vida fica a grande lição da
a participação do Judiciário Traba-
ral da jt, pude conviver com juízes
importância de se ouvir o outro e
lhista em questões fundamentais
de primeiro e segundo graus, dignos
o respeito a pontos de vista con-
vinculadas ao trabalho, no que diz
de admiração por seu profissionalis-
trários, o que sempre nos ajuda a
respeito à dignidade da pessoa hu-
mo e talento. Na condução do tst e
melhor refletir e decidir. Principal-
mana, e uma forma de estabelecer
do csjt procurei estar conforme o
mente a compreensão de que sem-
um diálogo com a própria sociedade.
entendimento consensual dos meus
pre se deve procurar o consenso,
O que significou presidir o Tri-
colegas ministros, o que sempre foi
que será a força a nutrir as ideias e
o alicerce de nossa conduta.
os projetos.
bunal Superior do Trabalho?
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A noção de trabalho na Pré-História Texto: Eugenio Jerônimo
O
grande número de desenhos
esse ponto coincidente não impe-
arqueólogo Onésimo Santos. “De
em cavernas e superfícies ro-
de o desenvolvimento de aspectos
fato, as ferramentas de pedra desta
chosas elevadas – as chamadas ins-
singulares em cada comunidade de
época são mais abundantes e tec-
crições rupestres – no Brasil forne-
indivíduos, sobretudo do conjunto
nicamente superiores àquelas dos
cem elementos para a compreensão
de técnicas desenvolvido para mo-
períodos posteriores e até dos grupos
do modo de vida e da organização
dificar a própria natureza, tais como
indígenas que ainda as utilizavam
social do homem na Pré-História.
armas de caça, modos de pesca e
no momento dos primeiros conta-
Nas pinturas são frequentes as cenas
instrumentos para a agricultura.
tos com os europeus”, continua o
de animais abatidos, transpassados
Com uma melhor adaptação
por flechas ou cercados por grupos
desses grupos – que migraram da
Embora em todas as eras a fun-
de caçadores. Também aparecem
África há cerca de 12 mil anos – aos
ção do trabalho como garantia da
desenhos que retratam coleta de
trópicos, foi ocorrendo a substitui-
sobrevivência e da integridade físi-
frutas e mel, além da pesca. Esse
ção das ferramentas de pedra por
ca dos membros do grupo social se
conjunto de painéis demonstra as
outras de origem orgânica. Assim,
mantenha, cada civilização tem seus
principais atividades do trabalho do
eles passaram a utilizar “dentes de
valores próprios, os quais fazem com
homem no período pré-histórico.
roedores para cortar e raspar, con-
que em cada época e lugar a motiva-
A dependência da natureza para
chas de molusco e lascas de taqua-
ção para o trabalho seja única.
subsistir é um traço comum aos
ra para cortar, dentes de tubarão
Quando falamos em trabalho
diversos grupos do período. Mas
para as pontas de flechas”, revela o
na Pré-História, estamos falando
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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
arqueólogo.
Onésimo Santos
de algo bem diferente dessa práti-
pesca – que também pode ser prati-
natureza, modificando-a para aten-
ca no mundo contemporâneo, na
cada pelas mulheres –, a derrubada
der suas necessidades de sobrevi-
dita pós-modernidade, com o apa-
de grandes árvores, a confecção de
vência. A coleta de frutos, a caça, a
gamento das fronteiras geográficas
ferramentas para estas atividades. Às
pesca e a construção de abrigos são
e a volatilização do capital.
mulheres cabe a criação dos filhos, a
exemplos de trabalho nessa época”,
Na sociedade de nossos lon-
coleta de alimentos vegetais, as ati-
explica.
gínquos antepassados, conceitos
vidades de processamento dos ali-
Reflexo da organização do traba-
centrais na economia atual como
mentos e confecção de ferramentas e
lho, que não separava a sociedade
jornada de trabalho ou acúmulo
utensílios ligados a estas atividades”,
em classes, o tipo de organização
de bens e riquezas eram inexisten-
informa o pesquisador.
governamental também era muito
tes. Também não havia divisão de
O produto do trabalho, coleti-
diferente das formas de governo
classes sociais e consequentemente
vamente realizado, visava a suprir
conhecidas nas sociedades moder-
nenhum rudimento da ideia da re-
as necessidades imediatas de ali-
nas. “Por analogia com os grupos
lação entre capital e trabalho.
mentação, pertencia a todos e era
indígenas atuais ou extintos sabe-
igualmente partilhado.
mos que na Pré-História havia sim
Pode-se atribuir à divisão sexual do trabalho uma grande diferença
Segundo Onésimo Santos, no
organização social, embora o tipo
entre o trabalho na Pré-História e o
período da Pré-História o trabalho
de governo seja bastante diverso
trabalho contemporâneo. “Aos ho-
tem de ser interpretado “no sen-
do nosso. O mais comum é que o
mens tocam as caçadas, às vezes a
tindo da ação do homem sobre a
cacique ou chefe seja pouco mais que
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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um líder das operações de guerra e
desastrosas para a coesão do grupo”,
e instrumentos usados por nossos
que seja tratado em outros contextos
informa Onésimo.
ancestrais. Era comum a todos os
como um membro normal”, conti-
À primeira vista parece haver con-
grupos a tecnologia do fabrico de
nua Onésimo Santos. Entretanto, tal
tradição no fato de que, nômades, as
machados de pedra, raspadores, fu-
modelo de arranjo governamental
tribos pré-históricas fizeram pinturas
radores, facas de sílex, pilões, pontas
não exclui o clã do chefe do gozo
tão duradouras, chegado até aos nossos
de flechas. Fragmentos descobertos
de privilégios e da legitimação de
dias. Mas não se verifica incompati-
em muitos sítios atestam o domínio
um certo prestígio entre os demais.
bilidade, primeiro porque não existe
da produção de objetos de cerâmica
Este tipo de governo caracteriza-se
indicação de propósito de construir
como pratos, alguidares ou urnas
essencialmente porque não com-
uma obra duradora e depois porque
funerárias, destas últimas há mui-
pete ao cacique a administração da
esse nomadismo se realizava dentro
tos exemplares em íntegro estado
Justiça. “Conhecemos, por exemplo,
de certos limites territoriais, com os
de conservação.
o caso dos Tupinambás onde um
indivíduos voltando periodicamente
A noção de tempo é outro com-
assassinato era punido com a exe-
a alguns locais com fartura d’água e
ponente que diferencia radicalmen-
cução do assassino pelos seus mais
abundância de frutas ou com impor-
te o trabalho no mundo dos nossos
próximos parentes, com o objetivo
tância para celebração de rituais.
distantes antepassados e o da épo-
claro de evitar qualquer possibi-
Objetos encontrados em esca-
ca em que vivemos. A técnica de
lidade de vingança ou o início de
vações de sítios arqueológicos re-
fabricação de embarcações, ainda
uma guerra de famílias, que seriam
velam com segurança os utensílios
comum entre as tribos indígenas quando os europeus aqui chega-
Deyvesson Gusmão/IPHAN
ram, serve para pensarmos de forma mais concreta a relação do homem da Pré-História com o tempo. Necessitando de uma canoa para lançar-se ao rio e pescar, os índios escolhiam uma árvore ideal para a embarcação. Como não possuíam machados eficientes para enfrentar um caule de grande circunferência e solidez, arrancavam a casca da árvore. Pacientemente aguardavam que a madeira secasse. Depois, no início do tronco, colocavam fogo, que era um importante elemento de seu acervo tecnológico, derrubando a árvore. Também com fogo Além da sobrevivência. Para o arqueólogo Onésimo Santos, o homem da Pré-História dividia os esforços entre o trabalho destinado às necessidades essenciais e as expressões rituais e artísticas
14
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
retiravam madeira da tora, dando forma ao interior da canoa. Assim,
Domínio público
decorriam alguns meses entre a es-
feitas de pedra, foi inclusive utilizado
colha da árvore destinada à fabrica-
como parâmetro para atestar a feitu-
ção da canoa e o seu lançamento no
ra humana dos primeiros artefatos
rio. Tempo que era cumprido sem
deste tipo descoberto e estudados
pressão, não havia, o que é demais
na PréHistória europeia. Se fez na-
óbvio, o conceito do capitalismo de
quela época uma analogia bastante
que “tempo é dinheiro”.
simples, mas nem por isso falsa. Se
Algumas tribos indígenas da
os indígenas da América utilizam
atualidade que vivem em espaços
um machado de pedra como estes
remotos com nenhum ou pouco
que encontramos na Europa, estes
contato com o dito mundo civili-
aqui também são machados de pedra
zado dão uma boa ideia do modo de
e foram utilizados por grupos pré-
vida dos povos primitivos. Caracte-
históricos”, explica Onésimo.
rísticas, tais como o nomadismo, a
Mudanças importantes nas ati-
dedicação à coleta de frutas e à caça,
vidades do homem da Pré-História
marcantes no cotidiano do homem
começaram a acontecer com o cul-
da Pré-História brasileira, continuam
tivo de plantas, o que, de maneira
presentes no dia a dia desses povos.
incipiente, pode ter tido início por
“De fato o modo de vida de grupos
volta de 5 mil anos, no Brasil.
indígenas das américas, especialmen-
No intervalo entre o ano 1000
te a utilização de certas ferramentas
aC e 1000 dC, a Amazônia teve uma
2
Fotos: Onésimo Santos/ Museu Câmara Cascudo – UFRN
1
3
1- Raspador 2 e 3 - Lâminas de machados
A noção de tempo é outro componente que diferencia radicalmente o trabalho no mundo dos nossos distantes antepassados e o trabalho da época em que vivemos.
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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agricultura com técnicas bastante
como o cará e cultivavam também
como espécie de cerimônia ritual e
avançadas e os recursos que dela se
o fumo, mas essas plantações não
expressão artística.
originaram propiciaram a formação
tinham importância significativa
Afirma o arqueólogo Onésimo
de populosas aldeias, quase cidades,
para a sobrevivência desses últimos.
Santos que “O trabalho na Pré-
com milhares de habitantes. Mas,
Entretanto nem todo o esforço do
História também difere do trabalho
como aconteceu em outros aspec-
homem primitivo era direcionado
nos dias de hoje pela parte que era
tos, o desenvolvimento da agricul-
à satisfação das necessidades essen-
dedicada à modificação da nature-
tura não se deu uniformemente.
ciais tais como alimentar-se, abrigar-
za por motivações que vão além da
Essa gradação se observa também
se do sol e da chuva e proteger-se de
universal satisfação das necessidades
quanto aos indígenas que viviam
animais ferozes. As pinturas rupes-
de sobrevivência biológica. Por de-
aqui à época da chegada dos euro-
tres com cenas de caça e dança não
finição, uma atividade ritual é antie-
peus. Os Tupi cultivavam a mandio-
constituíam uma atividade prática,
conômica, ou seja, nela se despende
ca e o milho, enquanto os Jê plan-
transcendem as exigências materiais
mais que se ganha energia necessária
tavam raízes de ciclo mais curto
do dia a dia e podem ser entendidas
à sobrevivência do grupo humano.”
Imensas e fantásticas figuras Os geoglifos, que vemos na foto abaixo, são sulcos e banquetas de terra construídos ao longo do ano mil depois de Cristo. Essas construções localizam-se principalmente no Amazonas e no Acre. Alguns deles têm centenas de metros de tamanho com quase três metros de profundidade. Embora ainda se saiba pouco sobre essas grandes figuras esculpidas no solo, o certo é que elas não se ligam a exigências materiais dos habitantes da Pré-História, e sim
Onésimo Santos
sugerem a prática de algum culto.
A Ouvidoria do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região é um serviço oferecido ao cidadão para receber críticas, denúncias ou sugestões, visando ao aprimoramento das atividades jurisdicionais.
Ouvidoria como um canal permanente de comunicação entre a sociedade e o TRT6.
Conhecimento disponível em qualquer lugar e a todo momento A Educação a Distância (ead) possibilita que estudantes e trabalhadores, mesmo em regiões mais remotas, tenham acesso a variados conteúdos, ampliando suas perspectivas educacionais e profissionais
Ilustração: Mica Freitas / Foto: Stela Maris Texto: Fábio Nunes
C
ontribuindo para a democra-
das épocas, passando pelo rádio, tele-
menor socialização entre discentes
tização do ensino, principal-
visão, fitas de videocassete, cds, dvds,
e docentes, adaptação à tecnologia,
mente devido a sua eficácia e ao seu
teleconferências via satélite e mais
exigência de disciplina por parte do
alcance, a Educação a Distância (ead)
recentemente internet e redes sociais.
aluno e, no contexto da educação
vem constituindo-se numa ferra-
A modalidade, na qual a me-
corporativa, a dificuldade de con-
menta efetiva de apoio à aprendiza-
diação pedagógica ocorre com o
gem nos sistemas de ensino regular
uso de tecnologias de informação
Com sua ampla experiência na
e nas áreas de formação profissional.
e comunicação, com educadores e
área de Fundamentos da Educação,
Oficialmente, a modalidade surgiu
educandos em lugares/tempos di-
o professor da Universidade Fede-
no Brasil instituída pela Lei 9.394/96,
versos, apresenta benefícios como
ral de Pernambuco (ufpe) Sérgio
que estabelece as bases da educação
flexibilidade, redução de custos,
Abranches avalia que, com o uso de
nacional, porém a aplicação do ensino
ampliação de recursos didáticos e
tecnologias digitais, novas práticas
a distância já era efetiva, em 1939,
fácil acesso ao conhecimento. Con-
vão sendo introduzidas no cam-
através dos cursos “por correspon-
tudo, muitos aspectos podem inter-
po educacional e como os alunos
dência”, evoluindo com as tecnologias
ferir na eficácia do modelo, como a
têm maior familiaridade com esses
18
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
ciliar estudos e trabalho.
dispositivos do que os professores,
O professor Tiago Falcão, que
surge um aparente conflito. “O pro-
atua com ead desde 2009, é docente
fessor deve se apropriar dos recur-
do ifpe na área de Tecnologia da In-
sos tecnológicos e refletir sobre a
formação e comenta que a interação
nova forma de se relacionar com
nos cursos é feita através do moodle,
o aluno na era digital”. O docente
ambiente virtual de aprendizagem
explica que o papel do professor está
(ava) gratuito. O professor aponta
sendo deslocado, pois antes era um
que a atual qualidade da formação
personagem central e agora estão
no ensino básico e médio dificultam
sendo criadas novas formas de re-
a adaptação na modalidade. “O de-
lação social e de acesso ao conheci-
senvolvimento da autonomia é ne-
mento. “A interatividade é o elemen-
cessário para o estudante no ensino a
to principal para um bom processo
distância. Alguns ainda ficam muito
de aprendizagem, e ela deve estar
dependentes do modelo presencial”.
claramente explicitada no projeto
Aluno do quarto período do cur-
pedagógico do curso virtual”.
so tecnólogo em Processos Geren-
Um grande marco de desenvol-
cias da UnoparVirtual – braço ead
vimento da modalidade no país
da Uiversidade Norte do Paraná –,
foi a instituição da Universidade
Vicente de Paula escolheu fazer um
Aberta do Brasil (uab), criado em
curso na modalidade ead devido
distância, o Serviço Nacional do
2005 pelo Ministério da Educação
à vida profissional que leva. “Com
Comércio (senac) investe há dé-
(mec), que oferece cursos em ead
viagens pelo Brasil, fico impossi-
cadas nesta modalidade, oferecendo
de reconhecido nível. Em Pernam-
bilitado de estar sempre presente
cursos livres, cursos técnicos (al-
buco, a uab funciona em parceria
em sala. Com aulas via web, pode-
guns gratuitos), de graduação e de
com várias instituições, entre elas
mos estar no trabalho, em casa ou
pós-graduação, disponíveis em mais
o Instituto Federal de Educação,
qualquer outro lugar e não perder
de 250 polos presenciais pelo Brasil,
Ciência e Tecnologia (ifpe).
o conteúdo”, destacou.
sendo 6 polos em Pernambuco.
O ifpe, que iniciou na modali-
Henrique Mercês é tutor presen-
A coordenadora de pós-gradu-
dade em 2007, conta hoje com 2100
cial no polo Recife da Unopar Vir-
ação ead da Faculdade senac-pe,
alunos. Segundo a diretora de ead,
tual e explica que sua função é ser
Michelle Pinheiro, comenta que a
Fernanda Dornellas, o Instituto bus-
uma espécie de guia, que estimula
modalidade se consolida a cada ano
ca cada vez mais integrar o ensino,
e interage com os alunos. “O papel
com o crescimento das matrículas e
pesquisa e extensão. “Acreditamos
do tutor é acompanhar as ativida-
da variedade de cursos disponíveis.
na formação de um cidadão mais
des dos discentes, oferecer sua ajuda
“Alguns fatores contribuem para
completo e responsável socialmente,
como especialista e fazer a ponte
essa expansão, entre eles o aumen-
por isso, como meta vamos buscar
com os professores, além de gerar
to do poder de compra das classes
oferecer mestrado e doutorado, e
interesse e motivação no alunado”.
c e d, o crescimento econômico
disponibilizar novos cursos técni-
Uma das instituições do país
das cidades do interior e o aumen-
cos profissionalizantes e superiores”.
que mais se destaca no ensino a
to do investimento na qualificação
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
19
profissional, motivado pela compe-
ead na formação profissional, que
à Gestão Estratégica, tema de rele-
titividade do mercado de trabalho”.
pode expandir-se nos próximos anos.
vância à atualização profissional de
Dados do Censo ead.br 2013/2014,
O projeto de educação corporativa
todos os servidores.
realizado pela Associação Brasileira
inclui educar o colaborador com
A Escola Judicial do trt-pe (ej)
de Educação a Distância (Abed),
foco curricular em treinamento.
também tem utilizado a ead para
registrou aumento de matrículas de
Alcançar o funcionário-aluno onde
oferecer cursos aos magistrados do
alunos nos cursos profissionalizantes
quer que ele esteja, a flexibilidade
Regional. Em 2011, a ej lançou um
de nível médio e em cursos tecno-
de tempo para o trabalhador e a
curso semipresencial (blended) para
lógicos de nível superior. Esse fato
redução de custos são os principais
formar magistrados como profes-
indica a tendência de ampliação da
motivos apontados para a adoção
sores em educação a distância e,
da modalidade pelas empresas.
em 2013, seu ambiente virtual de
Mais de 4 milhões de alunos matriculados na modalidade, num total de 15.733 cursos ofertados. Os cursos corporativos corresponderam a 3.775 ofertas. A maioria dos alunos de ead é do sexo feminino (61%), com idade entre 21 e 30 anos.
Como exemplo de educação
aprendizagem com o portal para
corporativa, o Tribunal Regional
ensino. A iniciativa maximizou a
do Trabalho da 6ª Região (trt-pe)
logística do Tribunal, diminui gas-
oferece aos seus servidores um es-
tos com o pagamento de diárias e
paço ava, com informações de uti-
deslocamento de pessoal, além de
lização da plataforma, tutoriais de
permitir a participação de um maior
livre acesso e fórum de discussão.
número de servidores-alunos. Esse
Em 2013, o Núcleo de Desenvolvi-
projeto foi apresentado em vários
mento de Pessoal do trt-pe, em
eventos pelo Brasil, sendo premia-
parceria com uma empresa de edu-
do no III Congresso Brasileiro de
cação corporativa, disponibilizou
Educação Corporativa do Judiciário
um pacote de cursos ead voltados
(conecjus 2013).
Ensino a Distância e evolução no tempo: 1900
1930
Correspondência
Rádio
20
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
1970
TV
Satélite
“Não há dúvidas, a educação a distância é o melhor meio para que todos, da capital ao sertão, tenham constante acesso a essa rede de conhecimento.”
Juiz Agenor Martins – ejtrt6
O coordenador da ej (biênio
quadro de pessoal habilitado para
que as ações em educação a distância
2013/2015), o juiz Agenor Martins
formatação de ambientes virtuais de
devem observar as peculiaridades
comenta que a ead é o melhor cami-
aprendizagem, design instrucional
locais e as particulares necessidades
nho para conferir uma capacitação
e tutoria on-line, ainda se percebe
do Tribunal. “A perspectiva é de que
qualificada para grande contingente
uma demanda reprimida cuja res-
a ej se desenvolva como fonte de
de servidores e magistrados, por eli-
posta exige maior infraestrutura
produção de conteúdo educacional
minar as barreiras de tempo e espa-
humana e material”.
para cursos e outras modalidades de
ço, e trazer a vantagem de otimizar
Embora o mercado possua boas
a utilização dos recursos públicos.
referências de centros educacionais
“Apesar das ações para ampliar o
em ead, o coordenador compreende
atividades formativas a distância”, destaca.
1980
1990
2000
2010
Fitas VHS
CD/DVD
Computador
Redes Sociais
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21
Uma jornada sobre-humana A Lei do Descanso busca, desde 2012, regular o tempo de trabalho dos caminhoneiros. Alguns deles chegam a dirigir mais de 24 horas sem parar.
Fotos: Danilo Galvão Texto: Helen Falcão
A
Lei 12.619 (Lei do Descanso), em
A jornada tem de ser fracionada,
intervalos para refeição e repouso
vigor desde 2012 e alterada em
de modo que, a cada cinco horas e
e foi incluída a obrigatoriedade de
02 de março de 2015 pela Lei 13.103, visa
meia dirigindo, o profissional des-
exames toxicológicos periódicos,
garantir o repouso de caminhoneiros,
canse por 30 minutos. Esses prazos
aos quais os motoristas deverão se
limitando a jornada diária de trabalho
podem ser dilatados, em situações
submeter na admissão, desligamento,
e o tempo ininterrupto de direção.
extraordinárias, pelo “tempo neces-
renovação de carteira de habilitação
Dentre outras previsões, de-
sário” para que o motorista chegue
e a cada dois anos e meio de contrato
termina que o condutor dirija, no
a um local que ofereça segurança e
com um empregador.
máximo, 10 horas por dia — oito
atendimento. Antes da alteração, o
Embora sejam indiscutíveis os
horas de jornada habitual e duas ex-
período ininterrupto de direção era
benefícios assegurados com as novas
traordinárias —, salvo em casos es-
de quatro horas e a jornada só pode-
leis, a falta de estrutura física, como
pecíficos em que a duração pode ser
ria ser excepcionalmente estendida
estacionamento protegido a distân-
estendida para 12 horas, dependen-
durante uma hora.
cias regulares, o baixo valor dos fre-
do de acordo ou convenção coletiva.
Permaneceram assegurados os
tes e exigência para cumprimento
de prazos muito exíguos, somados
havia: “Ela sabe, mas fica quieta.
Sua avaliação sobre a Lei 12.619/12
à ausência de fiscalização, acabam
Sabe que tem motorista que dirige
é positiva. Para ele, é uma quebra
impedindo sua completa aplicação.
de madrugada e que se enche de
de paradigmas, entre o respeito e o
“Se a gente for seguir a lei, nunca
rebite, mas, quanto mais rápido for
desrespeito ao motorista. O respeito à
a entrega, melhor para ela.”
condição biológica desse profissional,
vai entregar a mercadoria no prazo”, relatou o carreteiro, com 22 anos de
Números da Polícia Rodoviária
submetido a jornadas extenuantes
profissão, Lindomar Barbosa. Hoje
Federal de Pernambuco mostram
de trabalho. Mesmo assim, o procu-
autônomo, ele reclama das condi-
que, em 2013, houve 2.466 acidentes
rador reconhece que ainda é preciso
ções das estradas, da falta de pontos
envolvendo caminhões no estado de
superar algumas barreiras: “A entra-
de apoio para estacionar e do baixo
Pernambuco. Destes, 59 foram cau-
da em vigor da Lei foi seguida de
valor do frete: “Antes do Congresso
sados porque o motorista dormiu
uma oposição ao seu cumprimento
obrigar a gente a descansar, tinha
ao volante. Segundo os dados, os
de alguns setores, interessados em
que solucionar o valor do frete. Do
acidentes caíram em 2012, quando
manter o frete no valor que está”,
ano passado [2013] para cá, o die-
a Lei surgiu, mas voltaram a aumen-
expressou. Ele acredita que o rigor
sel já aumentou seis vezes e o frete
tar no ano seguinte. Em 2014, até
na fiscalização contribuirá para
continua o mesmo. Sempre quem
setembro, ocorreram 1.659.
o aumento dos valores, inclusive
fica no prejuízo é o caminhoneiro”.
A ocorrência de óbitos no trans-
porque dificultará a sonegação das
Ele revela que chegou a dirigir
porte terrestre supera os índices da
por 36 horas seguidas e que, por
construção civil. É o setor que mais
Além da questão dos prazos de
diversas vezes, já cochilou no vo-
mata no país, conforme informou o
entrega e dos baixos pagamentos,
lante. O mesmo já aconteceu com
procurador do Ministério Público
os carreteiros apontam como di-
Orlando Santana Filho, que, apesar
do Trabalho do Mato Grosso do Sul
ficuldade a falta de locais para es-
de vinculado a uma empresa, dirige
(mpt-ms) Paulo Douglas Almeida
tacionar e cumprir os 30 minutos
diariamente uma média de 18 ho-
de Moraes. Apesar de a infeliz po-
de descanso. Em razão da ausência
ras, destas, até 11 são contínuas. “Se
sição ter sido mantida após a legis-
de estacionamentos coletivos nas
não fizer, atrasa a entrega”, explicou.
lação, o procurador explica que, em
estradas, os motoristas recorrem
Questionado sobre a fiscalização da
2013, o número de óbitos no país
aos postos de gasolina. Nesses es-
transportadora, ele falou que não
caiu em 1.500.
tabelecimentos, porém, é comum a
horas-extras.
cobrança de taxas, entre R$ 10,00 e Número de acidentes envolvendo caminhões em Pernambunco
R$ 20,00, para permitir o pernoite do caminhão. Há locais que tam-
2011
2012
2013
bém cobram pelo uso do chuveiro
2014 (até setembro)
e exigem que o motorista abasteça. “Pátio pequeno, muito carro. Todo
3000 2500
ele agora cobrando. Pra dormir den-
2000 1500
tro do seu carro, você ainda paga
1000 500
10 conto”, falou o carreteiro Joelmir
0
Moura. O presidente do Sindicato Fonte: Polícia Federal de Pernambuco
dos Trabalhadores em Transportes
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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Para fazer pausas periódicas, Rodolfo Domingos planeja as paradas antes de a viagem começar. Ainda assim, quando vai para Fortaleza (CE), costuma dirigir por 12 horas, para entregar a mercadoria a tempo
Rodoviários de Cargas nas Regiões
Para o procurador do trabalho Paulo Moraes a Lei é um divisor de águas entre o desrespeito e o respeito à dignidade do motorista
24
não se preparou para a Lei.
do Recife Metropolitano e Mata Sul
A despeito dessa opinião, o pro-
e Norte de Pernambuco (Sintra-
curador Paulo Moraes lembra que
cargas), Lourival Formiga, reforça
compete ao empregador garantir
a queixa: “Era para ter pontos de
condições dignas de trabalho para
apoio a cada 300 km”, afirmou.
seus funcionários. É, portanto, de
Na ausência de locais específicos
responsabilidade dos empresários
para atender ao previsto na Lei do
financiar os valores cobrados nos
Descanso, o profissional autônomo
postos e se empenhar na adequação
Rodolfo Domingos diz que calcula
dos locais de paradas existentes. “O
as paradas em postos conhecidos
empregador fica em uma posição cô-
antes de a viagem começar. Por
moda quando diz que não vai cum-
possuir um veículo pequeno, a fa-
prir a Lei porque não tem pontos de
cilidade de estacionar é maior, re-
parada, mas cabe à empresa dar essa
vela. Planejamento como esse é um
assistência. Não é um dever do Esta-
elemento importante para o presi-
do”, enfatiza. Alguns empregadores
dente do Sindicato das Empresas
reembolsam os caminhoneiros das
de Transporte de Cargas no Estado
taxas cobradas para estacionar, es-
de Pernambuco (Setcepe), Antônio
pecialmente no caso do “motorista
Gaspar de Oliveira. Contudo, ele
frota”, que trabalha com carteira assi-
avalia que os locais de parada são
nada. O autônomo, porém, costuma
pontos improvisados, sem estrutu-
pagar todas as despesas da viagem.
ra adequada e, ainda, alvos fáceis
Segundo Antônio Gaspar de Oli-
de assalto. Ele conta que R$ 870
veira, não há uma mobilização das
milhões em carga foram roubados
empresas de transporte para cus-
em 2013. Para ele, o Poder Público
tear ou construir esses pontos em
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
barreiras fiscais ou alfandegárias não é computado na jornada de trabalho. Conforme a lei de 2015, as horas serão consideradas como tempo de espera e indenizadas na proporção de 30% do salário-hora normal. Apesar das queixas, a nova legislação vem trazendo mudanças para a categoria, além da redução de acidentes e de vítimas fatais. A regulamentação colocou o assunto em debate e embasa decisões na Justiça Trabalhista de todo Pernambuco. No Setcepe, os esforços
apoiar investimentos nessa área.
país. Quanto ao aumento da fiscaliza-
estão em estabelecer mais indústrias
Além da excessiva jornada de
ção, o Ministério Público do Trabalho
em Pernambuco, por meio de in-
trabalho, os carreteiros alertam que
encaminhou, no dia 15 de setembro
centivos fiscais. O intuito é que não
são expostos a situações degradantes
de 2014, a recomendação para que a
seja necessário transportar tantos
também no momento de carga e des-
Agência Nacional de Transportes Ter-
produtos de São Paulo, cuja distância
carga da mercadoria. Eles chegam a
restres passe a exigir o uso de tacógrafo
é de, aproximadamente 3.000 km.
esperar horas em pátios de empresas.
digital nos veículos de carga do país. A
“Traria benefícios para emprega-
Na br 101, no Curado (Recife-pe), filas
tecnologia registra automaticamente
dos, empregadores e também para
de caminhões aguardam para entrar
e com maior precisão dados acerca da
o consumidor”, expôs.
na Ceasa. Há quem chegue às 6h e só
condução do veículo, como velocidade
Os motoristas que realizam viagens
consiga descarregar às 11h. No pátio,
e tempo de direção. Sua utilização,
mais curtas, de fato, têm mais facilidade
é possível ver pessoas dormindo ou
segundo o procurador Paulo Moraes,
para cumprir o período de descanso
urinando no chão. Muitos aguardam
facilita identificar se a legislação está
exigido, porém os pontos de apoio
dentro do veículo desligado, no calor,
sendo cumprida.
permanecem imprescindíveis quando
para economizar combustível. Para
Três anos após a vigência da Lei
se percorrem distâncias maiores.
Lindomar Barbosa, o carreteiro do
do Descanso, ela ainda não está
Em busca de dirimir o embate
início dessa matéria, a falta de estru-
em plena efetividade. Trabalhado-
sobre o custeio dos pontos de apoio,
tura para recepcionar os embarca-
res, empresas, órgãos públicos e a
a Lei 13.103/15 estabeleceu que a ins-
dores não é incomum: “Você chega
opinião pública concordam que a
talação desses espaços será da livre
na empresa e não tem lugar para se
sobrejornada é prejudicial não só
iniciativa, porém o Poder Público
alimentar. Sequer tem banheiro, às
para o caminhoneiro, mas para a
contribuirá para criação de mais
vezes é preciso fazer as ‘necessidades’
segurança nas estradas, porém são
pontos, seja incluindo cláusulas
embaixo da carreta”, falou.
necessários investimentos em infra-
específicas nos contratos de con-
O período gasto com carga e
estrutura para que a categoria dos
cessão de exploração de rodovias,
descarga do veículo, assim como
motoristas possa ter direito a uma
seja abrindo linha de crédito para
com fiscalização da mercadoria em
jornada digna.
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
25
Fotos: Mídia Ninja
Profissão tem cor e classe Fotos: Stela Maris Texto: Marcos Carvalho
P
raça da Cinelândia, Rio de
de salários ou de condição social.
dois terços da população econo-
Janeiro, 6 de março de 2014.
Diferenças tão marcantes quanto
micamente ativa (72,1%), os negros
Mais de 300 garis se reúnem para
estas não são restritas somente às
são maioria apenas nos postos de
reivindicar aumento de salário após
duas categorias. Subsiste no mun-
trabalhos da construção civil e de
cinco dias de greve. A foto do mo-
do do trabalho uma divisão que se
serviços domésticos, setores mar-
vimento que circulou pelas redes
delineia a partir da renda, da etinia,
cados por menor proteção social,
sociais mostra o quanto a profissão
da cor e do sexo. Estes fatores são
formação menos específica, baixos
é formada majoritariamente por
capazes, inclusive, de determinar
salários, maiores jornadas e alta ro-
negros. Em julho do ano anterior,
o perfil profissional das pessoas e
tatividade.
a mesma praça havia sido palco do
o lugar que cada uma delas ocupa
protesto de cerca de mil médicos
na sociedade.
Um exemplo disso é o trabalhador João Cândido, que já passeou
contra a vinda dos colegas estran-
O que as imagens traduzem as
tanto pela construção civil quanto
geiros por meio de programa do
pesquisas confirmam. Segundo
pela área de serviços. O olindense,
Governo Federal. O registro foto-
dados do Departamento Inter-
homônimo do célebre marinheiro
gráfico é, mais uma vez, revelador:
sindical de Estatística e Estudos
líder da Revolta da Chibata, deno-
a classe médica ali representada era
Socioeconômicos (dieese), a di-
minado “Almirante Negro” e eter-
constituída, quase que totalmente,
visão social do trabalho pautada na
nizado na canção de João Bosco e
por brancos.
etinia e na cor da pele ainda é real
Aldir Blanc, não é muito afeito ao
Basta comparar as duas ima-
no Brasil. A Pesquisa de Emprego
mar, mas é um verdadeiro guer-
gens para perceber o contraste
e Desemprego (ped) realizada na
reiro. Começou a trabalhar aos 13
social existente entre as duas pro-
Região Metropolitana de Recife
anos como ajudante de pedreiro,
fissões. Garis e médicos não estão
entre os anos 2011 e 2012 verificou
depois atuou como cobrador de
no mesmo patamar de formação,
que, apesar de constituir mais de
ônibus, garçom, e agora se ocupa
26
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
exclusivamente do ofício de mar-
superior de escolaridade provavel-
negócio, que é de apenas 5,8% con-
ceneiro, que exerce com habilidade
mente são fatores que explicam a
tra 9,8% de não negros.
e dedicação.
exclusão de grande parte dos ne-
A divisão sexista do trabalho
Aos 49 anos, o marceneiro negro
gros”. Apesar disso, João Cândido
também é uma barreira histórica
orgulha-se de ter concluído o ensino
ainda sonha em ter seu próprio res-
na organização social, mas começa
médio em 2007 e da profissão que
taurante e administrar, como seu
a ser ultrapassada.
escolheu. “Na minha família nunca
pai, uma cozinha, entrando, assim,
“Agora eu estou despreocupada
teve um marceneiro. Meu pai era
para o percentual de negros empre-
porque a senhora está indo com
cozinheiro e minha mãe doméstica.
gadores, profissionais universitários
uma mulher”, dizia uma filha ao
Tenho irmão padeiro, operário de
autônomos ou donos de seu próprio
colocar a mãe no táxi de Solange
fábrica e guia de turismo. Mas eu
Almeida. Frases como estas fazem
gosto mesmo é de talhar, de traba-
parte do dia a dia da pernambuca-
lhar com a madeira. E também de
na de 44 anos no exercício de sua
receber os elogios do pessoal”. João
profissão. Há dois anos trabalhando
trabalha como autônomo prestando
como taxista na praça ao lado do
serviços tanto nas casas dos clientes
Hospital Português do Recife, ela
quanto na oficina improvisada no
tem conquistado a simpatia tanto
beco de sua residência, no bairro de
dos passageiros quanto dos colegas
Amaro Branco, em Olinda.
do ponto. Realizada no que faz, ela
Quando está em casa, João Mar-
trabalha 12 horas por dia e só folga
ceneiro, como é mais conhecido pe-
no domingo à tarde. Quanto à pro-
los vizinhos, costuma trabalhar das
fissão, não considera tão diferente:
seis da manhã até as dez da noite. “Pra mim, quanto mais produzir melhor. Tendo serviço, eu trabalho de domingo a domingo. Folga só para
O marceneiro João Cândido
dormir”. Pensando na aposentadoria,
e a taxista Solange Almeida
ele planeja recolher a contribuição da previdência, mas já dá graças a Deus por viver do que ganha. Numa emergência a família busca o hospital público. “Plano de saúde é luxo”, resigna-se o trabalhador. Níveis de escolaridade e condição econômica são requisitos para ocupar certos postos de trabalhos. Segundo o dieese, “Dispor de riqueza acumulada que permita montar um negócio e/ou possuir nível
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
27
ainda consideram algumas profissões melhores que outras. “Diziam pra mim: você está louca, vai deixar de ser médica para ser fotógrafa?... Quer queria, quer não, quando você chega a algum lugar e diz que é médica há uma reação diferente de quando você diz que é fotógrafa”, atesta Cristiane. A opção pela medicina surgiu Cristiane Silva deixou a medicina pela fotografia. A família
dentro de casa. Com um tio, um
influenciou na escolha da
primo e o ex-marido médico, ela
primeira profissão.
reconhece: “A família termina influenciando pelo fato de ser uma
“Se fosse assim a mulher não teria
no comércio (21%) e no setor de
profissão estável, segura e conside-
carro particular, não dirigia”.
serviços (71,1%), onde “o emprego
rada de futuro. Busquei a medicina
Solange é um exemplo de como
doméstico, ocupação tipicamente
porque não tive um incentivo para
as mulheres vêm ocupando postos
feminina, permanece como uma das
estar por trás das lentes porque, se
de trabalhos antes considerados
principais possibilidades de inser-
tivesse, eu seria fotógrafa desde pe-
exclusivamente masculinos. “Pra
ção das mulheres, em especial as ne-
quena”. Cristiane concluiu o curso
mim não existe profissão de ho-
gras e as mais pobres, com menor
de Fotografia pela Universidade Ca-
mem ou de mulher. Foram tantos os
escolaridade”.
tólica de Pernambuco no ano pas-
preconceitos quebrados e eu estou
Já na Grécia antiga as atividades
sado e hoje trabalha fotografando
aqui ajudando a quebrar mais esse.
intelectuais eram mais valorizadas
gestantes, partos, e bebês de até 10
Acho muito bonito, por exemplo,
que o trabalho manual. Apesar do
dias de vida (new born).
ver uma mulher mecânica. Eu tiro
tempo, esta concepção ainda preva-
o chapéu”, orgulha-se, contando que
lece hoje. Agricultores, pedreiros,
os passageiros têm mais confiança
mecânicos e motoristas, por exem-
com uma mulher ao volante.
plo, não têm o mesmo prestígio que
Passos históricos
Apesar de uma presença cada
advogados, médicos ou arquitetos,
Não há linha que separe os mo-
vez maior no mercado de traba-
conhecidas no Brasil como profis-
delos de organização do trabalho
lho, as mulheres ainda possuem
sões imperiais.
das formas de estruturação social.
menos oportunidades de acesso ao
Cristiane Silva estudou medici-
O modo de produção fordista, por
emprego e os postos que ocupam
na na Universidade Federal de Per-
exemplo, no qual cada operário des-
têm baixos rendimentos. Segundo
nambuco, mas há três anos deixou
penha uma função específica dentro
outra pesquisa do dieese, em 2013
de atuar na área para dedicar-se
da fábrica, mantém estreita relação
as mulheres da Região Metropoli-
inteiramente à fotografia. Entu-
com a concepção funcionalista da
tana do Recife estavam presentes na
siasmada com seu novo trabalho,
sociedade. O sociólogo francês
indústria de transformação (6,2%),
ela sentiu de perto como as pessoas
Durkheim compara a sociedade a
28
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
um “corpo vivo”, com órgãos que
mas cada pessoa faz o seu trabalho”,
formas embrionárias dos sindicatos
executam funções diversas e espe-
esclarece o professor.
que temos hoje”.
Leonardo recorda, no entanto, que
E foram justamente as organiza-
a divisão do trabalho tem sua origem
ções sindicais que romperam com
O historiador e antropólogo
muito antes do processo de industria-
muitas desigualdades existentes no
professor Leonardo Borges consi-
lização, já na Pré-História, quando
mundo do trabalho. Redução da
dera a industrialização como marco
os primeiros agrupamentos humanos
jornada, acesso a educação e possi-
importante para compreensão da
passam a subjugar os outros. “A par-
bilidade de ascensão foram alguns
divisão social do trabalho que temos
tir deste período temos uma divisão
dos avanços notados pelo professor
hoje. “Ao contrário da Idade Média,
inicial do trabalho, baseada sobretudo
Leonardo, que reconhece, sob outra
quando um produto era feito pelo
no sexo: os homens vão à caça e as
perspectiva, a necessidade de uma
artesão do começo ao fim, a partir
mulheres ficam em casa por conta dos
divisão social do trabalho: “A diver-
da Revolução Industrial ele começa a
filhos”, acrescenta. O professor lembra
sidade de habilidades e aptidões pode
vender o seu trabalho. É a repartição
também que na Idade Média come-
gerar uma troca sadia no trabalho,
das tarefas. Uma montadora de car-
çam a surgir as guildas, associações
cada um entendendo que todo mundo
ros é o exemplo mais emblemático.
de artesãos, alfaiates, sapateiros ou
é importante, desde o juiz até quem
O carro tem uma série de elementos,
comerciantes que, para ele, “seriam
encera o chão que ele passa. ”
cíficas, todas necessárias para seu bom funcionamento.
“A diversidade de habilidades e aptidões pode gerar uma troca sadia no trabalho”. Leonardo Borges historiador e antropólogo
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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Músico: um produto?
M
úsico é aquele que entre-
menos, entre os que querem viver só
toda a parte burocrática e adminis-
tém o público e leva a sua
da arte e suas ramificações. O mer-
trativa da carreira.
vida entre festas, shows, diversão...
cado tem transformado o músico em
Atuando como empresários ou
Só glamour? Não! Ledo engano de
produto, submetendo-o à condição
freelancers, consequentemente a
quem pensa que isso é vida de mú-
de objeto. Por isso, viver da profissão
grande maioria não tem vínculos
sico. Esses artistas cada vez mais
não significa apenas ensaiar e estar
empregatícios e nem todos os bene-
têm que acumular funções para
bem preparado para subir aos palcos
fícios garantidos, como inss, fgts,
preencher os requisitos e ocupar
e fazer uma boa apresentação. Para
férias, 13º salário... E nesse cenário o
as oportunidades que o mercado
muitos isso é só uma das partes, pois
músico tem que se lembrar do futuro
oferece para “ganhar a vida”. Pelo
para complementar a renda e apro-
e se organizar contribuindo para a
menos essa é a realidade daqueles
veitar 100% dos cachês a maioria tem
previdência pública ou fazendo uma
que não estão entres os consagrados
que ser ainda produtor, professor,
previdência privada, poupança ou
nomes nacionais.
roadies (carrega os equipamentos,
investindo em bens que possam lhe
Empreender, essa é a palavra do
prepara e monta aparelhagem nos
garantir a sobrevivência no futuro.
momento entre os músicos ou, pelo
palcos), compositor e ainda realizar
É cada vez mais difícil encontrar
Texto: Patrícia Castelão Danilo Galvão
“A música está em tudo. Do mundo sai um hino”. Victor Hugo
Acervo pessoal
profissionais de música que tenham algum tipo de vínculo profissional, apenas alguns que atuam em bandas de renome e com proprietários. Considerado por muitos um dos melhores guitarristas do Brasil, Renato Bandeira toca há 14 anos na Orquestra Spokfrevo, uma das maiores expressões da cultura local e com a qual já pisou em alguns dos principais palcos da Europa, e não tem contrato nem vínculo nenhum com a orquestra. “No caso meu com a Orquestra, a questão da informalidade continua, porém não existe exclusividade. Se eu for contratado para um evento e
esclarece que a profissão é regida
depois aparecer um show da Spok,
pela Lei nº 3.857/1960, que também
eu sigo com meu evento e coloco
disciplina a Ordem dos Músicos do
outro músico em meu lugar”, conta
Brasil: “São normas que devem ser
Bandeira, mas ele ainda revela que dá
respeitadas, cabendo ao Ministério
o máximo de prioridade à Orquestra
do Trabalho e à própria Ordem ve-
por se tratar de um trabalho que o
lar pela sua observância. O músico
satisfaz como músico.
pode trabalhar basicamente sob
“Depois do contato com o instrumento, posso dizer que tudo perdeu o sentido pra mim... jogar bola, jogar pião, bola de gude, enfim, meu objetivo era desvendar todas possibilidades daquele instrumento”
Ainda sobre o assunto Renatinho
duas modalidades: mediante con-
(como é chamado no meio) enfati-
trato de substituição ou prestação de
zou: “posso afirmar que essa é uma
serviço eventual, denominado Nota
questão muito complexa, tamanha a
Contratual, ou por meio de contrato
bagunça e desorganização da nossa
de trabalho ou emprego (por prazo
emprego com o músico, nos moldes
classe. Sinto-me numa cidade sem
determinado ou indeterminado)”.
dos artigos 2º , 3º e 443 da Conso-
Renato Bandeira
lei! Não temos contratos, na maioria
O magistrado acrescenta, ainda,
lidação das Leis do Trabalho (clt).
dos casos tudo é feito de boca, não
que a Nota Contratual “somente
Renatinho já tocou com nomes
temos um sindicato que funcione e
deve ser utilizada para temporadas
como Silvério Pessoa, Alceu Valença,
muito menos uma ordem dos mú-
culturais de até dez apresentações,
Paulo Diniz, Amelinha, Domingui-
sicos, não temos uma tabela para
sendo proibida sua adoção nos cin-
nhos, entre outros, e está prestes a
organizar a questão financeira”.
co dias posteriores ao término da
dar o passo mais importante de sua
O juiz Gustavo Augusto Pires
temporada”, complementando que,
carreira, como ele mesmo descreve,
de Oliveira, do Tribunal Regional
não sendo essa a hipótese, deve-
o lançamento do primeiro trabalho
do Trabalho da 6ª Região (trt-pe),
-se firmar contrato de trabalho ou
solo com o grupo Som de Madeira,
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
31
do qual é um dos fundadores. Renatinho apaixonou-se pela
música teria um lugar especial em sua
música aos 10 anos, dedilhando o
vida, assim como soube logo depois
violão do irmão Rinaldo Bandeira.
que viver só dela seria difícil. Fez
“Ele trabalhava durante o dia e eu
faculdade e hoje, concursado como
comecei a estudar, com aquelas re-
auditor da Controladoria-Geral da
vistas do tipo aprenda a tocar violão.
União em João Pessoa, mantém a
Depois do contato com o instrumento,
música em sua vida como um com-
posso dizer que tudo perdeu o senti-
plemento de renda e a oportunidade
do pra mim...jogar bola, jogar pião,
de manter essa paixão, dedicando-se
bola de gude, enfim, meu objetivo
principalmente a ritmos como o jazz,
era desvendar todas possibilidades
blues, rock e mpb. Desde a adolescên-
daquele instrumento”, relembra. A
cia montou bandas com os amigos.
partir desse momento, nunca mais
Na faculdade, fez novos grupos e in-
parou e passou por todo o roteiro
tegrou conjuntos bem conhecidos do
comum à classe: cantor de barzinho,
circuito local, como a UpTown Band,
músico de estúdio, bandas com os
os Back Beatles e a El Mocambo. Atu-
amigos... Ele foi mais além e buscou
almente atua em dois grupos: Fou-
uma profissionalização, formando-se
blues e Rodrigo Morcego e Banda.
no Conservatório Pernambucano de
Embora sempre tenha amado a
Música, o que considera um destaque
música, Gilson explica por que não
no seu currículo dentro do mercado
consegue viver apenas como artista.
tão competitivo.
“É um ramo muito difícil, falta de
Outra barreira encontrada é o
reconhecimento artístico e financei-
mercado, nesse caso, o pernambuca-
ro, dia a dia de trabalho muito duro.
no. Apesar de Pernambuco ter uma
Tenho muitos amigos que vivem
cultura reverenciada em todo o País,
apenas de música, mas, para isso,
os músicos locais encontram dificul-
trabalham em média dez horas ao
dades de se destacar. Para sobreviver,
dia ou mais e não têm o resultado
isso quer dizer cumprir com todas
merecido. Pois têm que se dividir
as obrigações financeiras impostas
entre os ensaios e apresentações e
pelo meio social, além da pluralidade
atividades paralelas, ligadas à pro-
de funções, muitos partem para em-
fissão, para ganhar algum dinheiro.
pregos fixos, tendo a música como
Hoje sou convicto de que tomei a
segunda fonte de renda, e outros
decisão acertada na minha vida pro-
que querem dar um passo ainda
fissional”, explica, complementando
mais além deixam o Estado e vão se
que o “ganha-pão” ficou ainda mais
aventurar no Sul e Sudeste brasileiro.
difícil sem as vendas de cds, pois era,
O engenheiro eletrônico Gilson
mesmo que restrita para os artistas
32
Danilo Galvão
Peixoto soube desde pequeno que a
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“Amo tocar e isso me deixa realizado, além de que hoje é um acréscimo no meu orçamento, com o qual já conto para viver, mas é muito difícil passar a noite tocando e no outro dia ter que estar disposto e trabalhar, ou não ter finais de semanas e nem feriados” Gilson Peixoto
de menor expressão nacional, um
e grava sequências musicais utilizan-
e, como músico, no Motorciclano.
dinheiro a mais que entrava.
do um sistema que permite mistu-
Com a experiência e vivendo exclu-
“Para mim seria impossível viver
rar sons de diversos instrumentos
sivamente do ramo, Moraes compara
só de música, pelo menos no meu
isolados, como se fosse uma banda),
a profissão a outras do mercado e
padrão de vida. Aqui [em Pernam-
arranjador e produtor de pequenas
que tem tantas dificuldades quanto
buco] para você ganhar bem ou entra
bandas paulistas. Aos 23 anos, en-
as demais. “A recompensa não é uma
num campo muito popular ou de-
veredou para a vida de fotógrafo de
questão de profissão ou dinheiro, e
pende de apoio do Governo”. Mesmo
moda e posteriormente de agente de
sim de foco e planejamento de car-
sem se dedicar com exclusividade à
modelo, mantendo a música apenas
reira. Mas, indo além, muitos músi-
arte, o músico/auditor ainda dispen-
como um hobby e se dedicando a es-
cos se negam a enxergar que, se você
sa uma média de quatro horas do
tudos do jazz.
quer ganhar dinheiro tocando, você
seu dia à atividade, além de tocar em
De volta ao Recife e ao meio mu-
está no mercado e, portanto, deve se
bares e restaurantes do Recife e Re-
sical, aos 30 anos, começou a tocar
situar nele, entender de comércio,
gião Metropolitana e algumas vezes
com a banda Bluestamontes e atuar
aplicando esse conhecimento a seu
fazer show no interior e outras cida-
depois como produtor de eventos do
produto. Se você não se enxergar
des do Nordeste. O artista confessa
bar Burburinho. Hoje ainda trabalha
como produto, não está à venda,
que às vezes também é difícil conci-
na área de produção, só que indepen-
não pode esperar receber dinheiro”.
liar a carreira profissional e a paixão.
dente, com a sua produtora Bacurau,
Como empresário da noite recifense, Moraes ainda avalia positiva-
“Amo tocar e isso me deixa realizado, além de que hoje é um acréscimo no
Acervo pessoal
mente o mercado local. “Para ficar
meu orçamento, com o qual já conto
ainda melhor, é preciso abrir mão
para viver, mas é muito difícil passar
da lenda de que em Recife a cena é
a noite tocando e no outro dia ter que
mais criativa. Ao entender isso você
estar disposto e trabalhar, ou não ter
vai conhecendo mais e entendendo
finais de semanas e nem feriados”,
melhor o que acontece. Fica menos
finaliza Peixoto.
ingênuo, mais estudioso e mais apto
Rico de Moraes também come-
a se colocar nessa cena maior”. E,
çou cedo a sua aproximação com a
quando o assunto é financeiro, ele
música e aos 13 anos já se aventurava
é bem enfático. “É só entender que
em bandas. Inicialmente com o punk
como em qualquer profissão não
rock, depois música eletrônica, jazz
basta ser bom, mas tem de ter algo
e hoje com o blues. Ele se mudou
para vender que interesse ao cliente,
com os pais aos quatro anos para
ao público. Quando você consegue
São Paulo, onde criou as raízes com
“... Se você não se enxergar como
isso, se dá bem. E dentro da ideia
a arte. Na época em que se dedicou
produto, não está à venda, não
de que o músico é empreendedor,
à música eletrônica, paralelamente
pode esperar receber dinheiro”.
tem de ser como qualquer outro, se
também atuou com produção de estúdio, tornando-se programador de sequencers (profissional que cria
Rico de Moraes
organizar, aprender a gerenciar suas contas, guardar dinheiro, pagar inss se achar que é bom pra ele”.
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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pernambucana, Ferraz declara que
“Para viver de música é
e artesão de instrumentos musicais
já recebeu muito apoio em projetos
preciso saber se equilibrar
ou luthier, Cristiano Ferraz é mais
culturais dos governos. “Meu traba-
nas ondas da instabilidade,
um profissional a enfatizar que “não
lho independe do governo, mas se
sem levar nenhum caldo”
é só tocar e cantar, mas o artista tem
temos essa oportunidade, por que
que saber de toda a área que o cir-
não?”, comenta. Hoje o grupo Coco
cunda. É importante ainda estudar,
do Manuel de Casa Amarela, do qual
se reciclar, se especializar para ter
o artista participa e é fundador, re-
um diferencial no seu trabalho”.
cebe receita do Governo Federal
Filho de índio maranhense com
em um dos seus projetos. Ele ainda
uma negra (como fez questão de
integra o Maracatu Almirante do
enfatizar) pernambucana, ele teve
Forte, do bairro recifense do Bon-
no berço da família uma vertente
gi, o projeto “Vem Cantar Comigo”,
momento entre os músicos “mil e
artística muito forte. Primeiro en-
com o cantor Romero Andrade, faz
uma utilidades” da cena atual. Bem
veredou para o teatro e posterior-
sonoplastia em contação de história
diferente daquela imagem do artista
mente encontrou na música e áreas
com Flavioleta e dá aula de música
bon vivant do passado, ele ainda tem
ligadas a ela a sua realização.
em uma escola particular do Recife.
que ter um lado economista e admi-
Com a sua veia artística ex-
Versatilidade, visão empresarial e
nistrador da sua carreira, além de não
tremamente ligada à cultura
profissionalismo são as palavras do
Charles Teony
se esquecer de olhar para o futuro.
Elysangela Freitas
“... não é só tocar e cantar, mas o artista tem de saber de toda a área que o circunda. É importante ainda estudar, se reciclar, se especializar para ter um diferencial no seu trabalho” Cristiano Ferraz
Acervo pessoal
Músico percussionista, professor
Com este trabalho foi convidado novamente para o evento musical de Nova Orleans, sendo agraciado com uma matéria de capa de um dos mais importantes jornais local. “Aquilo foi um divisor de águas em minha carreira”, orgulha-se. A mudança para o Rio aconteceu em 2009 com perspectivas de crescer no cenário nacional. “O Rio é um caldeirão de influências musicais, e ainda está no imaginário como “terra das oportunidades”, mas quando vivemos aqui vemos que é uma ilusão. A cidade funciona como uma vitrine, mas
Do Sertão para o mundo Embolada, canto das rezadeiras,
indígena de tribos vizinhas à minha
não remunera o artista. Proporciona,
cidade, como as tribos Tuxá e Panka-
sim, incríveis encontros artísticos e
raru”, ressalta.
tem um potencial criativo enorme”,
repentes, cordel, forró pé de serra, cul-
Em 1992, aos 17 anos, chegou ao
analisa. Desde 1992 ele faz o Carna-
tura da feira e ainda com uma pitada
Recife para estudar e em menos de
val de Recife e Olinda. “Tenho lá um
de ritmos indígenas, essa foi a base do
dois meses estava integrado ao Ma-
significativo reconhecimento do meu
músico Charles Teony. A riqueza e a
racatudo Nação Camaleão, partici-
trabalho. É na minha terra que sem-
pluralidade do interior foram pon-
pante do movimento dos maracatus
pre volto para me reciclar. Não fosse
tos fundamentais na vida do artista
que ganha força naquele momento
minha constante inquietude artística,
nascido na cidade de Inajá, Sertão do
no cenário nacional. O grande passo
não teria tentado a vida fora”, constata.
Moxotó pernambucano. Hoje, mora
aconteceu em 1995 quando assumiu o
O artista também destaca a im-
no Rio de Janeiro, mas já subiu em
vocal do Maracatu Nação Pernambu-
portância de se reconhecer como
palcos nos Estados Unidos e em al-
co, onde ficou até 2003. Com o grupo
‘músico empresário’. “O crescimento
guns dos principais países da Europa.
ganhou o mundo e fez uma turnê pela
e as oportunidades vão depender da
“Eu digo que eu não busquei a
Europa, por 88 cidades e dez países, e
administração e da forma que você se
música, mas que ela nasceu em mim”,
participou do Festival de Jazz de Nova
divulgue no mercado. Eu sou músico,
assim define o músico a sua paixão
Orleans (eua).
produtor, contador, desenvolvo site,
pela arte. Filho de agricultores, ele
“Nos anos 90 e início de dois mil,
escrevo os meus projetos, faço clip-
acompanhava os pais na feira onde
o mercado estava motivado e aberto
ping. Este tem que ser o novo músico”.
iam vender os produtos e lá come-
para as novidades musicais. Foi uma
Teony é mais um músico mil e uma
çou a somar as suas primeiras influ-
época importante, pois estávamos no
utilidades do cenário atual. “Para vi-
ências musicais. “Ouvi muita radiola
boom da cultura pernambucana”, lem-
ver de música é preciso saber se equi-
com músicas populares, fora tudo o
bra. Já em carreira solo, Teony gravou
librar nas ondas da instabilidade, sem
que me circundava. Além da cultura
o primeiro CD “Tambor do Mundo”.
levar nenhum caldo”, finaliza.
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Fernando Gusm達o/DP/D.A Press
Greves, dissídios, acordos: um novo tempo nos canaviais Jornada sem limite de horas ou com tarefas inatingíveis, violência recorrente, transporte dos trabalhadores em carrocerias de caminhão, refeições feitas debaixo de um sol extenuante marcaram grande parte da história da cultura da cana-de-açúcar. Graças à organização dos canavieiros, que resultou na greve de 1979, à nova visão do patronato e à atuação da Justiça do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho (mpt) e do Ministério do Trabalho e Emprego (mte), a categoria conta com um ambiente mais digno e vivencia conquistas que jamais poderiam ser vislumbradas há 35 anos.
Texto: Mariana Mesquita Fotos: Acervo do Diario de Pernambuco / Danilo Galvão
E
m termos oficiais, os direitos
de portugueses – e XVII, a cultu-
extenuantes de trabalho, repressão
dos trabalhadores rurais come-
ra da cana-de-açúcar passou por
policial. Foi principalmente graças à
çaram a tomar forma – pelo me-
várias transformações ao longo da
organização da classe, em especial a
nos no papel –, há 70 anos, quando
história. Antes de alcançar o cená-
partir da greve deflagrada em 1979,
foi regulamentada asindicalização
rio atual, com melhores condições
um dos primeiros movimentos pa-
rural pelo Decreto-lei Nº 7.030 de
de trabalho, a exemplo de intervalo
redistas no campo e o primeiro na
1944. Mas, entre sua publicação e
para almoço, acesso a água potá-
Zona da Mata de Pernambuco de-
o reconhecimento da legitimidade
vel, local apropriado para descanso,
pois do golpe militar de 1964, que a
dos primeiros sindicatos pelo Esta-
transporte seguro e fornecimento de
realidade dos canavieiros começou
do brasileiro, muita coisa aconteceu.
Equipamentos de Proteção Indivi-
a mudar.
Mais importante produto brasi-
dual (epis), os rurícolas enfrenta-
Era final da década de 70 e a
leiro entre os séculos XVI – quando
ram muitos abusos: violência por
estratégia de paralisação escolhida
desembarcou no Brasil pelas mãos
parte da classe patronal, jornadas
pelos canavieiros da Zona da Mata
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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Danilo Galvão
encontrou força na conjuntura nacional, já que até setembro de 1979 haviam ocorrido em todo o país 68 movimentos grevistas envolvendo mais de dois milhões de trabalhadores. Deflagrada em outubro daquele ano, a greve mobilizou 250 mil trabalhadores rurais da região, o que rendeu conquistas expressivas para a categoria que ali atuava. As vitórias de 35 anos fazem eco nas condições do homem do campo de hoje. Na época, a greve foi tida como bastante audaciosa. “Em São Paulo, por exemplo, a primeira greve nos canaviais só veio acontecer em 1983”, assinala a historiadora da
1964). “Era uma preocupação fazer
ufpe Maria do Socorro de Abreu e
algo organizado e dentro da lei, que
Lima. Enquanto nos centros urba-
continha uma porção de exigências”,
nos as greves ganhavam visibilidade
enfatiza Rodrigues.
com o apoio da imprensa, no campo
Na época, 25 sindicatos da Zona
a situação era ignorada: a sombra da
da Mata publicaram os editais exigi-
ditadura militar e a repressão que
dos pela lei, mas os de São Lourenço
sofriam os trabalhadores por parte
da Mata e Paudalho, sob o coman-
da classe patronal e da polícia difi-
do dos presidentes Agápito Fran-
cultavam as mobilizações.
cisco dos Santos e Ulisses Roque,
O então presidente da Federação
fizeram com antecedência, parali-
dos Trabalhadores na Agricultura
sando os trabalhos oito dias antes
do Estado de Pernambuco (Fetape),
dos demais. “Ambos foram muito
José Rodrigues da Silva, um dos lí-
atuantes durante as negociações,
deres do movimento, explica que a
principalmente o Agápito, grande
intenção era reivindicar e denun-
argumentador”, lembra o advogado
ciar, e que inicialmente foi cogitado
Horácio Mendonça, que representa-
o ajuizamento de um dissídio coleti-
va o Sindaçúcar e era o interlocutor
vo. Receosos, porém, do tempo que
da classe laboral.
levaria o trâmite da ação coletiva
Com a greve desses dois sin-
na Justiça, optaram pela greve, feita
dicatos em curso e na expectativa
inteiramente dentro do que deter-
da adesão dos demais, iniciaram
minava a Lei de Greve (Nº 4.330 de
as negociações entre canavieiros
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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
“No caminhão que ia para a área de serviço iam os bois, as ferramentas, a cana, os trabalhadores, tudo junto no mesmo lugar. Havia muito acidente, muita gente morria, se machucava”
José Rodrigues da Silva Ex-presidente da Fetape
e patronato. “No oitavo dia, um
Apesar das intensas negociações,
“A paralisação dos trabalhadores
dia antes de os demais sindicatos
a pauta era extensa e com muitas
rurais teve grande repercussão na-
aderirem, conseguimos fechar a
reivindicações novas”, conta.
cional, pois o governo ficou receoso
convenção, que abrangeu todo o
Sobre a situação dos canaviei-
de que tal expediente viesse a ser
estado”, recorda José Rodrigues.
ros naquele período, esclarece o
utilizado por oturos trabalhadores,
A convenção foi homologada pela
advogado que a indústria seguia as
ocasionando uma greve geral e pa-
Delegacia Regional do Trabalho e
normas do Estatuto do Trabalha-
ralisação do país”, analisa o então
teve a participação da Procuradoria
dor Rural, com carteira de trabalho
procurador do Trabalho Manoel
Regional do Trabalho da 6ª Região
registrada e pagamento de direitos
Goulart, que acompanhou as ne-
(Ministério Público do Trabalho).
comuns ao trabalhador urbano. “A
gociações pela prt. Tanto assim
Mendonça recorda as longas horas
diferença é que não havia o fgts
era que a convenção atendeu toda
de conversa entre os sindicatos: “As
rural (permanecia o sistema de esta-
a categoria da Zona da Mata, bene-
negociações foram intensas e mui-
bilidade no emprego e indenização
ficiando os 250 mil trabalhadores
to demoradas, ao longo de vários
por rescisão injusta) nem prescrição
da região.
dias (e algumas noites), sempre com
para reivindicar direitos na vigên-
Entre as principais conquistas
mediação da Delegacia Regional do
cia do contrato de trabalho rural”.
obtidas por meio da convenção co-
Trabalho. A greve foi deflagrada es-
No entanto, pondera que havia um
letiva, estava a do aumento de 52%
trategicamente, logo após o início
contingente de informalidade, a
sobre o salário mínimo. “Durante
da colheita da safra para moagem,
depender da região e do porte do
as negociações, fizemos cerca de
o que lhe dava uma enorme força.
produtor rural.
30 reivindicações. Depois do golpe
Julio Jacobina/DP/D.A Press
Repercussão: canavieiros em greve, durante negociações com usineiros, na Delegacia Regional do Trabalho (drt), em 1989.
de 64, o salário dos canavieiros tinha ficado congelado no mínimo”, rememora José Rodrigues. Além do acréscimo salarial, a convenção também garantia transporte gratuito e seguro, fornecimento de ferramentas e de epis. Apesar dessa previsão, muitas dessas conquistas só se efetivaram anos mais tarde, com a realização de dissídios numa frequência anual, inspirados pelo
1.
pioneirismo do movimento de 79. “No caminhão que ia para a área de serviço, iam os bois, as ferramentas, a cana, os trabalhadores, tudo junto no mesmo lugar. Havia muito aci-
2.
dente, muita gente morria, se machucava”, lamenta José Rodrigues. “Além da reivindicação sala-
3.
rial, pretendiam os trabalhadores a normatização das atividades no campo”, comenta Manoel Goulart, remetendo-se a outra conquista importante da classe: a restauração e o cumprimento da tabela de tarefas de
4.
1965, que continha as especificações de produtividade necessária para o recebimento do salário, como tamanho da área de terra por tarefa diária, média dos pesos e quantidades de feixes de cana, capacidade da pesagem da balança etc. Em 1979, essa tabela foi base para a negociação entre a Fetape e o patronato, com mediação da drt. “A repressão sofrida pós-golpe militar implicou na violência contra os canavieiros, que eram tachados de agitadores ou subversivos, eram presos,
40
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
5.
os produtores de cana não aceita-
noticiado em jornais e redes de
ram fazer novo acordo, os canaviei-
televisão de todo o país. Atento às
ros, então mais experientes, tiveram
circunstâncias nas quais acontecia
seu primeiro dissídio na Justiça do
a convenção coletiva, o Tribunal
Convenção Coletiva de outubro de 1979. Principais cláusulas aprovadas:
Trabalho de Pernambuco.
Regional do Trabalho da 6ª Região
“Em 80, os patrões não cederam
(trt-pe), sob a presidência do juiz
1. Transporte gratuito pelo empregador em condições de segurança. 2. Área de terra para plantação e criação necessárias à subsistência da família do trabalhador, a título gratuito 3. Aumento salarial de 52% sobre o salário mimímo. 4. Fornecimento de ferramentas necessárias a execurção das tarefas. 5. Fornecimento de equipamento de proteção individual.
ao acordo e nem concordavam com
Duarte Neto, mediou a conciliação
muita coisa que havia sido negocia-
em quase todos os pontos divergen-
da em 79, não querendo se com-
tes. No dia seguinte, a greve termi-
prometer por mais um ano”, explica
nou. Em reportagem de O Globo,
Rodrigues. No dia 30 de setembro,
o presidente do trt-pe declarou
com os trabalhadores em greve
haver sido o dissídio mais rápido
após pressionarem a classe patronal
realizado no Brasil.
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Pernambuco
quanto ao cumprimento da conven-
Horácio Mendonça explica que
ção do ano anterior, e sob a ameaça
o movimento de 1980 e dos anos
de o mercado canavieiro entrar em
posteriores “seguiu a mesma práti-
sofriam represálias quando exigiam
colapso, temor já vivenciado em 79,
ca do inicial, que era a reivindicação
o cumprimento ou reclamavam seus
o Ministério do Trabalho instalou
de aumento salarial e manutenção
direitos”, explica José Rodrigues.
dissídio coletivo, na busca da urgen-
das conquistas do ano anterior,
te solução do problema.
com apresentação de alguns novos
A convenção também previu outras concessões, como adicional
Assim como a repercussão da
pedidos”. Apesar das negociações
de insalubridade e periculosidade, o
greve de 79, o dissídio de 80 era
coletivas, o advogado pondera: “os
àqueles que tinham mais de um ano de serviço de utilizar uma área do engenho para plantação e criação necessárias a sua subsistência e de sua família – e a estabilidade no emprego
Acervo Memorial da Justiça do TRT6
cumprimento da lei do sítio – direito
para o delegado sindical.
Dissídio de 1980 Esse primeiro movimento paredista na Zona da Mata pernambucana influenciou as relações entre as classes e as posteriores negociações. Na campanha salarial de 1980, como Histórico. O juiz Alfredo Duarte Neto (à direita) presidiu o primeiro dissídio dos canavieiros, em 1980
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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descumprimentos de convenção
rural. Paulo Roberto conta que o
ginástica laboral por algumas usinas
sempre podiam ser reclamados na
respeito entre as classes ao longo
que buscam as melhores práticas – o
Justiça do Trabalho a qualquer época
desses 35 anos cresceu exponencial-
que ameniza os efeitos dos movi-
do ano”.
mente. Uma das principais razões
mentos do corte da cana –, a in-
O sindicalista José Rodrigues
disso, segundo o sindicalista, são
clusão de intervalos para descanso
também afirma que a greve teve uma
as convenções coletivas de trabalho,
com local apropriado para refeições
conotação muito importante em ní-
realizadas anualmente, e decorren-
e a gradativa redução da jornada de
vel nacional: foi a segunda do Brasil
tes da cultura de dissídios e movi-
trabalho dos canavieiros.
(a primeira foi a dos metalúrgicos,
mentos paredistas iniciada pelos
Mendonça estima que o movi-
em 1978) e teve forte influência na re-
trabalhadores no final dos anos se-
mento de 35 anos atrás foi bastante
alização e resultados das campanhas
tenta. Apesar disso, também atribui
organizado. “Havia coesão entre os sindicatos dos trabalhadores parti-
salariais dos anos seguintes. “As relações trabalhistas
Hoje
ficaram mais formalizadas e foi criada uma rotina de
Os 250 mil trabalhadores de 1979 foram reduzidos para 80 mil em 35
movimentos semelhantes em cada ano seguinte”
anos. Para Paulo Roberto Rodrigues,
cipantes. O acordo foi assinado por todos, e pelos sindicatos patronais das usinas de açúcar e dos fornecedores de cana”, lembra. “As relações trabalhistas ficaram mais formalizadas e foi criada uma rotina de movimentos semelhantes em cada ano
diretor de assalariados da Fetape, o
Horácio Mendonça
decréscimo se deu em razão da saída
Representante do Sindaçucar
de várias usinas e destilarias do mer-
em
1979
seguinte”, avalia o advogado. Rodrigues também atribui àquela greve a fluência das negociações
cado, fato que impulsionou o êxodo
ocorridas nos anos seguintes, além
rural. Outra queda da indústria su-
do fortalecimento e da expansão
croenergética do Nordeste – então
para os estados vizinhos das cam-
chamada de sucroalcooleira – foi em
o sucesso das negociações entre
panhas salariais que vieram depois.
relação à produção. Nos anos 70, o
classes à evolução da consciência
Para ele, a greve de 79 se consolidou
Nordeste representava 15% do mer-
dos patrões quanto à necessidade da
como marco inicial das melhorias
cado nacional, número que hoje caiu
melhoria das condições no canavial
das condições de trabalho no cam-
para 3%. O solo acidentado da região,
e à atenção da Justiça do Trabalho e
po: “A gente fez uma greve que so-
a estagnação produtiva frente ao ex-
órgãos fiscalizadores – como mpt e
cializou os benefícios para toda a
pansionismo do Centro-Oeste e Su-
mte –, que aos poucos foi se voltan-
região canavieira, não só para de-
deste (onde o relevo plano favorece a
do para o labor no campo.
terminado município”, estima.
automação na colheita, implicando
As negociações ganharam cada
A organização dos trabalha-
no barateio dos custos de produção)
vez mais força depois de 79, trans-
dores, a mudança de atitude dos
são alguns dos fatores que influencia-
formando em realidade, ao longo
patrões e a atuação do trt-pe, da
ram a retração da produção.
dos anos, benefícios como o for-
prt-te e do mte refletem-se hoje
Mesmo assim, são visíveis as me-
necimento de água potável durante
em condições mais dignas de tra-
lhorias na conjuntura do trabalho
toda a jornada, a implementação de
balho no setor canavieiro.
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Na prateleira Carnaval - Os Efeitos Jurídicos da Folia
Repercussão geral da questão constitucional
Perícia digital - da investigação à análise forense
Coordenadoras
Autor
Coordenadores
Fernanda Schaefer e Karin Cristina Bório Mancia
Evandro Della Vecchia
Luiz Fux, Alexandre Freire e Bruno Dantas
Editora Juruá
Editora Millennium
Editora Forense
A obra trata dos possíveis desdobramentos judiciais decorrentes do carnaval. Entre os temas abordados estão “Filhos do Carnaval e Reconhecimento Voluntário de Filiação”, trabalhado pela doutora em Direito das Relações Sociais, Fernanda Schaefer, e “Crimes de Carnaval - A Fantasia da Liberdade Sem Limites”, exposto pela mestra em Filosofia e especialista em Direito Penal e Criminologia, Thathyana Assad.
Versando sobre os crimes digitais, o livro é dividido em duas partes. A primeira, voltada para a investigação digital, aborda conceitos e técnicas para o rastreamento e a identificação do criminoso. Na segunda, que corresponde à fase da perícia digital, são apresentados conceitos e procedimentos adequados para análise forense em equipamentos. O livro tem autoria de Evandro Della Vecchia, Mestre em Ciência da Computação e perito criminal na área de Perícia Digital desde 2004.
Tendo o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux como um dos coordenadores, a obra reúne estudos realizados por importantes juristas nacionais sobre o instituto da repercussão geral, criado pela Emenda Constitucional 45/2004. A coletânea avalia os 10 anos de criação do instrumento, concebido como ferramenta para a redução da sobrecarga de recursos submetidos à apreciação do stf
Para entender o salário
Os limites constitucionais da terceirização
História do Direito no Brasil
Autor
Autores
Autor
Márcio Túlio Viana
Gabriela Neves Delgado e Helder Santos Amorim
Antonio Carlos Wolkmer
Editora LTr
Editora LTr
Editora Forense
Juiz do trabalho aposentado e professor na pós-graduação da PUC-Minas, Márcio Túlio Viana fala sobre questões que ajudam a entender a composição do salário. Respondendo a perguntas como “O que é o salário?”, “Como entender a lógica dos cálculos, mesmo sem saber calcular?” e “Quais as formas tradicionais de proteção do salário e quais os modos usados hoje para desprotegê-lo?”, o autor explica com linguagem simples e olhar crítico a natureza deste meio de pagamento.
A obra, de autoria da doutora em Filosofia do Direito Gabriela Delgado e do mestre em Direito Constitucional e procurador do trabalho Helder Amorim, reflete de forma doutrinária e jurisprudencial sobre os limites constitucionais da terceirização em um horizonte humanista de proteção ao trabalho. Para tanto, percorre os caminhos trilhados pela jurisprudência trabalhista na construção interpretativa da Súmula 331 do tst e apresenta debates entre o Direito Constitucional e o Direito do Trabalho.
Doutor em Filosofia do Direito e da Política, Antonio Wolkmer retoma, nesta obra, os estudos históricos no âmbito do Direto. Permitindo a releitura e a revisão da cultura jurídica tradicional brasileira, o livro apresenta o fenômeno jurídico enquanto expressão cultural de ideias, práticas normativas e instituições, apontando para a construção de nova historicidade no Direito, sob uma perspectiva desmistificadora.
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ENSAIO: labor das deusas por Stela Maris Domicílio de Vênus Maria Alice Amorim Invoco
Deméter
devi eva lilith maria
amamenta a terra
todas as musas
parvati kali shakti oxum ó feminino
mater mamapacha explode estas sementes
revigora o bosque de romãs
Héstia
Perséfone
os alimentos escolhidos
e traz a primavera
a lenha está pronta
acende a lareira assa o pão
vivifica a lamparina
vem
não esquece
as flores acordam o lume perfumam o labirinto acendem o céu
Ísis
Hécate
colhe o junco
ó deusa antiga
toma o tear
fia e tece a vida dá o abrigo do sicômoro o balanço de barcos
o aconchego das águas
a saciedade contentamento
ó velha
atenua o rigor da labuta
suaviza a firmeza da rocha de pérola e escuma é o caminho
Brasileiros trabalhando pelo mundo
Do Canadá à França, de Angola à Índia, em busca de novas experiências ou melhores condições de vida, profissionais deixam o Brasil e passam a trabalhar em países dos cinco continentes
Texto: Francisco Shimada Fotos: Arquivos pessoais dos entrevistados
N
uma
simples
observa-
de pau-brasil; e brasileiro era quem
equivale a 2% do total de migrantes
ção da língua portugue-
trabalhava na extração da madei-
em todo o planeta durante o período,
sa, percebe-se que o sufixo eiro é
ra. Numa livre interpretação do
que chega a 200 milhões de pessoas,
utilizado na formação de palavras
adjetivo pátrio, todos, neste país,
segundo informações da Organiza-
com referência às profissões. Tem-
já nascem com uma profissão e,
ção das Nações Unidas (onu).
se, então, jornaleiro, carpinteiro,
numa visão empírica, conseguem
No início dos anos de 1980, os
padeiro, borracheiro, engenheiro
se destacar no trabalho que venham
principais destinos dos brasileiros
e tantas outras atividades. Nesse
a escolher, seja em terras brasileiras
eram Estados Unidos, Japão, Para-
ponto, a história por trás do gentílico
ou estrangeiras.
guai e países da Europa. Com o pas-
brasileiro também faz referência a
De acordo com dados do Ministé-
sar dos anos, esse fluxo migratório
rio de Relações Exteriores (mre) e do
ficou mais diversificado e intenso.
Colônia de Portugal entre os
Ministério do Trabalho e Emprego
Para além de turismo e estudo, mui-
séculos xvi e xviii, o Brasil, por
(mte), nos últimos 35 anos, mais de
tos são trabalhadores, em busca de
muitos anos, apenas serviu como
quatro milhões de brasileiros passa-
oportunidades de emprego e renda
terra para a exploração da árvore
ram a viver no exterior. Esse número
no exterior.
uma ocupação profissional.
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Um Brasil no Canadá
o engenheiro de software potiguar Uelber Dantas e a gerente mineira Myrna Saramago. A violência, a corrupção e a instabilidade econômica do Brasil são algumas das razões citadas pelos en-
Canadá
trevistados como justificativas para a mudança. Sobre os aspectos que influenciaram a opção pelo Canadá, todos são unânimes: oportunidade profissional, qualidade de vida e estabilidade social. “Na verdade, não foi simplesmente uma decisão de morar fora do Brasil, e sim o desejo de morar e crescer com minha fa-
Licença maternidade (50 meses) / paternidade (20 meses) sem vencimento integral. Férias não remuneradas proporcionais ao tempo de trabalho. Não existe pagamento de 13º salário, vale refeição e vale transporte.
Atraídos pelas oportunidades
mília no Canadá, combinado com o
oferecidas por empresas e pelo
descrédito do sistema sócio-político
Governo canadense, milhares de
brasileiro. O Brasil é um país que
brasileiros têm se dirigido para a
não garante segurança, educação,
América do Norte em busca de
saúde, oportunidades para os nos-
Carvalho, vê na comparação en-
empregos. Estima-se que 30 mil já
sos filhos, sistema político respei-
tre os modos de vida canadense e
vivam no Canadá, de acordo com
tável e idoneidade administrativa”,
brasileiro a razão para continuar
informações do Governo do Brasil.
justifica o químico Átila de Carva-
em terra estrangeira. “Quando nos
Uma das localidades que mais atrai
lho, 48.
mudamos para cá [Cibele e o ma-
Flexibilidade de horário.
os trabalhadores é Edmonton, capital
Há 13 anos no Canadá, o quí-
rido], nossa intenção era cumprir
da província de Alberta, no meio
mico baiano começou a trabalhar
o prazo necessário para adquirir a
oeste canadense.
aos 19 anos de idade em empresas
cidadania canadense e, então, voltar
Na cidade, vivem profissionais
de grande porte nos ramos de pe-
para o Brasil. No entanto, hoje, 11
de diversas regiões do Brasil, que
tróleo e petroquímico, com pas-
anos depois, nosso plano mudou.
conseguiram, em grande parte, após
sagem, inclusive, pela Petrobras.
O Canadá se tornou nossa casa, e
um período inicial de adaptação,
Atualmente, Átila de Carvalho é o
não consigo mais imaginar minha
seguir atuando em sua área de ori-
responsável técnico pelo Departa-
família morando no Brasil. O pro-
gem. Entre esses brasileiros, estão o
mento de Operações Ambientais da
blema da segurança é o principal
químico baiano Átila de Carvalho,
Dow Chemical Company, empresa
motivo. Estabilidade financeira e
a advogada paulista Cibele San-
norte-americana de produtos quí-
o futuro dos meus filhos também
vido, a coordenadora de projetos
micos, plásticos e agropecuários.
têm um grande peso nessa decisão”,
pernambucana Christina Mesqui-
Também há mais de uma déca-
ta, o administrador de banco de
da no Canadá, a advogada Cibele
Cibele Sandivo e o marido de-
dados paraibano Luciano Jordão,
Sanvido, 40, a exemplo de Átila de
cidiram deixar Campinas, em São
enumera.
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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Paulo, após a multinacional onde
sem dominar a língua é quase im-
exoneração do Ministério Público
ele trabalha solicitar a transferên-
possível. O clima pode ser consi-
da União (mpu) para trabalhar fora.
cia dele do Brasil para o Canadá.
derado um desafio, em proporções
Além das motivações e dos de-
Depois de atuar no ramo jurídico
bem menores. Começar por ‘baixo’,
safios enfrentados com a mudança,
por sete anos, no interior paulista,
ou seja, aceitar uma vaga inferior
o que atrai tantos brasileiros para
a advogada se viu na situação de
ao que você tinha no Brasil só para
território canadense? As respostas
mudar de país e atuação. “Encer-
entrar no mercado de trabalho,
podem estar nos argumentos a se-
rei minha carreira, quando mudei
também pode ser considerado um
guir. Dono de uma empresa de con-
para cá, pois não pude validar meu
desafio”, detalha a coordenadora
sultoria, com filiais em Edmonton,
diploma aqui. Teria de fazer o curso
de projetos Christina Mesquita.
no Canadá, e João Pessoa – Paraíba,
de Direito novamente, para poder
Aos 38 anos, a recifense conseguiu
no Brasil, o potiguar Uelber Felicia-
advogar aqui”, lembra a brasileira,
permanecer na área de Tecnologia
no Dantas Júnior, 42, descreve como
que hoje trabalha num programa
da Informação (ti), mesmo ramo
incríveis as situações de trabalho
chamado Childminding na ymca,
de trabalho em que atuava em Per-
naquele país. “As condições gerais
um centro recreativo para a família.
nambuco.
de emprego no Canadá chegam a
Mais um ponto de convergência
Natural de Campina Grande,
ser surreais, se comparadas à rea-
entre os brasileiros que decidiram
na Paraíba, o também profissional
lidade brasileira. Flexibilidade é a
trabalhar no Canadá é as dificulda-
da área de ti Luciano Jordão, 40,
palavra chave. Você pode solicitar
des enfrentadas em outro país, com
lembra o processo de adaptação
alguns dias de férias mesmo antes de
destaques para adaptação climáti-
como maior desafio enfrentado no
começar no trabalho. Estou citando
ca, diferença cultural, procura por
Canadá. “Para mim, o principal foi
esse exemplo porque, recentemente,
emprego e aprendizado do inglês.
me acostumar com a diversidade.
descobri que não poderia deixar um
“A língua! Definitivamente é um
Eu sou nordestino, mas, depois que
empregado da filial do Brasil gozar
grande desafio. Procurar emprego
terminei a universidade, fui morar
suas férias antes que completasse 12
em Brasília. Os costumes são um
meses de trabalho. Outras diferen-
pouco diferentes, mas é tudo Bra-
ças notórias: 50 meses para licença
sil. Já aqui, você encontra gente de
maternidade, podendo ainda o pai
todo o lugar do mundo, cada um
usufruir até 20 meses desse perío-
com suas manias e costumes. Acei-
do, e horário flexível”, destaca o em-
tar certas coisas ainda é um desafio
presário, presidente da One Logic
para mim. Outro problema foi em
Soluctions.
relação à comida, muito diferente da
A preocupação com o bem-es-
nossa. Além da distância da famí-
tar da família é justamente mais
lia e idioma”, explica o administra-
um aspecto que chama a atenção
dor de banco de dados, que pediu
dos brasileiros que trabalham no
A competição entre as empresas em busca do melhor profissional chama a atenção do baiano Átila de Carvalho, que mora no Canadá há 14 anos
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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
Canadá. Esse é o ponto de vista da gerente Myrna Saramago, que, aos
estava sem companheiro, achei uma
Contraste europeu
boa oportunidade para aproveitar e
38 anos, é Engineering Cost Asso-
tentar a vida fora do Brasil. Ao me-
ciate da Enbridge, maior empresa
nos, estudar outra língua, para
canadense de oleoduto. “Todos
enriquecer minha área pro-
aqui valorizam muito a qualidade
fissional”, lembra Acioli.
de vida e o tempo disponível para a
Catorze anos depois e
família. A família é mais importan-
mais experiente, a per-
te do que o trabalho. Geralmente
nambucana agora trabalha
fico até mais tarde no trabalho, e o
na Eurotech France sas, no ramo
meu chefe me lembra sempre que
da construção civil.
eu tenho filhos e que preciso de-
Com ampla experiência em em-
dicar mais tempo a eles. Sempre
presas e instituições brasileiras, a
escuto frases como ‘deixe isso para
exemplo do Grupo ASA, do Servi-
amanhã’; parece nada ser urgente!
ço Brasileiro de Apoio às Micro e
Não consigo ainda pensar como os
Quando decidiu deixar o Recife em
Pequenas Empresas (Sebrae) e do
canadenses, pois, no Brasil, tudo
direção a Paris, a secretária técnica
Grupo Moura Dubeux, engana-se
era para ‘agora’”, relembra a minei-
e administrativa Sony Acioli tinha
quem pensa que Sony Acioli teve
ra de Belo Horizonte.
34 anos e buscava novas experi-
vida menos burocrática na França
Entre as diferenças trabalhistas
ências. “No fim do ano 2000, um
para conseguir emprego. “Adapta-
vivenciadas nos dois países, alguns
período da minha vida em que eu
ção e a dificuldade para encontrar
pontos chamam a atenção. No Ca-
uma atividade profissional, para en-
nadá, ao contrário do Brasil, não
trar no mercado de trabalho, são os
há pagamento de 13º salário, adicio-
principais desafios. Comecei como
nal de férias ou vencimento integral
estagiária e tive de fazer uma forma-
durante a licença maternidade. Em
ção de mais de 800 horas para voltar
agosto de 2014, entrou em vigor um
a atuar profissionalmente, além de
acordo previdenciário entre os dois
preparar um dossiê com certifica-
países, que beneficia trabalhadores
dos de horas exercidas nas empresas
e servidores migrantes brasileiros
brasileiras e diplomas de formação,
e canadenses. Os benefícios con-
tudo isso para comprovar que você
templados no acordo são aposen-
é uma profissional. Depois precisa
tadoria por idade, aposentadoria
se atualizar com formação na área
por invalidez e pensão por morte.
de trabalho escolhida, no caso de
Após conhecer as peculiaridades do
você ser estrangeira”, explica.
trabalho no Canadá, é hora de atravessar o oceano Atlântico e observar o estilo de vida dos trabalhadores brasileiros na Europa.
Pernambucana Sony Acioli, há 15 anos na França, aponta a burocracia como uma das principais dificuldades para entrar no mercado de trabalho europeu
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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França
roupas masculinas e produtos de
merece pelos patrões e pelos even-
jardim, além da experiência brasi-
tuais clientes”, afirma a tradutora
leira nas áreas de construção civil,
Vanusa Brasil. “Não tenho resposta
indústria e comunicação.
jurídica para a questão dos direitos
Outra nordestina na França é a
e deveres, mas posso dizer que o sis-
tradutora autônoma Vanusa Brasil,
tema trabalhista é mais organizado
44. Natural de Riachão do Jacuípe,
e mais justo que o do Brasil. Em mi-
na Bahia, a professora de formação
nha opinião, não existe realmente o
decidiu se mudar após ganhar uma
sistema do ‘jeitinho’ com o patrão.
bolsa para mestrado em uma univer-
Tudo deve ser declarado e todos têm
sidade francesa. A rotina dela é de-
direito às suas férias, queira o patrão
Férias remuneradas de cinco semanas.
finida pela própria como “trabalho,
ou não”, exemplifica a tradutora, ao
trabalho, trabalho” e superação de
complementar a opinião sobre a or-
Jornada de trabalho semanal de 35 horas.
desafios variados. “Inicialmente, há
ganização do trabalho na França.
dificuldades para comunicar devido
Numa comparação com o Bra-
13º salário é facultativo.
à nova língua, o preconceito e a dis-
sil, por exemplo, a jurisprudência
criminação no cotidiano, concorrên-
trabalhista francesa também é con-
cia no trabalho entre outras coisas
siderada protetiva pelas brasileiras.
como as condições difíceis, mercado
“França é um país que protege os
exigente, nenhum reconhecimento,
trabalhadores. Você não pode ser
muita concorrência, muitos impos-
demitido sem um motivo muito
Quem também decidiu deixar
tos a pagar, vida cara, adaptação à
grave e, quando acontece, você
o Nordeste brasileiro em busca de
cultura, ao clima...”, relata a baiana.
tem direito, durante dois anos, a
mudanças na capital francesa é a
Em Paris, antes de se dedicar total-
setenta por cento (70%) do salário.
alagoana Maria Raquel Boulanger,
mente à tradução, dublagem e narra-
Você tem a oportunidade de estu-
42. Assistente comercial em uma
ção, Vanusa Brasil trabalhou por um
dar também”, informa a assistente
empresa de locação de veículos, ela
ano na área de publicidade de uma
comercial Maria Raquel Boulanger.
divide a rotina doméstica e o cui-
empresa portuguesa com mercado
“A relação entre direitos e deveres
dado dos dois filhos com o marido
em território francês.
é correta. Existem vários sindica-
Seguro desemprego no valor de 70% do salário por até dois anos.
francês e também produz bijuterias,
Os relatos das brasileiras apon-
tos, sempre prontos para intervir.
que vende às amigas e colegas de
tam as dificuldades vivenciadas na
Não é obrigatório o 13º salário,
trabalho. “Encontrei meu marido
Europa. Comparada à situação no
por exemplo; em compensação,
em Maceió e vim para morar com
Canadá, onde, segundo os brasi-
a legislação trabalhista é de cinco
ele. O idioma, o frio, a cultura dife-
leiros, existe uma maior preocu-
semanas de férias”, completa a se-
rente e a saudade de nossa família e
pação com a qualidade de vida, na
cretária Sony Acioli. Bem ao sul da
do Brasil são os principais desafios
França, prevalece a necessidade de
França, mas agora no continente
enfrentados no exterior”, afirma.
trabalho. “As condições são difíceis.
africano, é o momento de conhe-
Antes desse emprego, ela já havia
Você se dá conta de que vive para o
cer a realidade de um trabalhador
trabalhado como vendedora de
trabalho e não é reconhecido como
brasileiro na pátria-irmã Angola.
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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
Proximidade entre
que as condições de emprego não
exemplo, copeiras, vigilantes, auxi-
angolanos e brasileiros
recebem a tutela do Estado e nem
liares de limpeza e motoristas, que
a supervisão adequada para garan-
recebem salários muito mais bai-
tir os padrões mínimos de higiene,
xos”, afirma. Em Angola, a exemplo
segurança e qualidade”, alerta.
do Brasil, o serviço público é sinô-
Sobre os empregos formais, o educador Júlio Henrique destaca a
nimo de segurança e estabilidade em longo prazo.
existência do serviço público e da
Ainda sobre os empregos for-
iniciativa privada, num processo
mais, eles garantem direitos aos
de seleção, divisão de tarefas, sa-
trabalhadores angolanos: recolhi-
lários e demais benefícios também
mento dos impostos previstos por
bastante parecidos com o Brasil.
lei, e eventuais outros benefícios
“A minoria dos cidadãos trabalha
discriminados dentro das cláusu-
no setor formal, que pode ser o da
las contratuais, como subsídio de
função pública ou o do setor pri-
transporte, alimentação e seguro de
vado. Na função pública, cujo en-
saúde. Esses direitos são estendidos
quadramento acontece por meio de
aos trabalhadores da iniciativa pri-
um concurso de ingresso, existem
vada. “Temos ainda o setor privado,
várias categorias profissionais que
que, em Angola, está muito presen-
A exemplo do Brasil, Angola tam-
recebem vencimentos e benefícios
te e desenvolvido, sobretudo nos
bém foi colônia portuguesa por sé-
muito diferentes entre elas. De fato,
setores petrolífero, da construção
culos. As semelhanças entre os dois
temos categorias privilegiadas e
civil, da extração de minérios, das
países transpassam a miscigenação
bem pagas, e outras categorias, por
finanças... Nesses setores, trabalham
e o idioma, e também chegam às relações trabalhistas, como descreve o educador social pernambucano Júlio Henrique Lopes da Silva, 31, que vive há cinco anos na nação africana. “Existe uma primeira grande diferença dentro do mercado do trabalho em Angola, e é a entre trabalho formal e trabalho informal. A grande maioria dos cidadãos angolanos estão empregados no mercado informal, sobretudo na venda de bens e serviços nos pequenos e grandes mercados a céu aberto. Esse tipo de profissão não está formalmente regularizado, pelo
Com pouco mais de cinco anos em Angola, o pernambucano Júlio Henrique observa a semelhança nas relações de trabalho entre brasileiros e angolanos
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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os quadros gerenciais estrangeiros
Em 2010, quando passou a tra-
e nacionais, ocupando posições de
balhar em Luanda, capital angola-
alto nível e de alta renda. Nessas
na, Júlio Henrique pôde observar
profissões, são representadas as
os contrastes e semelhanças entre
camadas sociais melhor sucedidas
os cotidianos de trabalhadores. “A
do país, apesar de ser uma minoria”,
realidade urbana da cidade capital
aponta Júlio Henrique.
nos proporciona outros desafios em
A história do educador social
comparação ao meio rural da pro-
fora do Brasil começou em 2008,
víncia. Por exemplo, a concentração
quando ele foi morar na Itália. Após
de pessoas que vivem em Luanda
o período de um ano na Europa,
torna a cidade muito caótica em
acompanhado da esposa italiana,
termos de deslocação e fruição de
Júlio Henrique ingressou na Or-
serviços que são insuficientes para
ganização Não Governamental
todos. Para ter uma ideia, aproxi-
Volontariato Internazionale per
madamente a metade da população
lo Sviluppo (ong vis). Logo após
total de Angola vive em Luanda”, de-
integrar o grupo, o casal foi trans-
clara. Outros desafios enfrentados
ferido a Angola, para a província
estão ligados à violência causada
fronteiriça do Moxico, na cidade
por questões econômicas e sociais.
de Lwena, na qual desenvolveu
Júlio Henrique trabalha no Hos-
inúmeras atividades humanitárias.
pital da Divina Providência. Ele im-
“Em 2009, quando fui para Angola,
plementa projetos de sensibilização
comecei a conhecer outros desafios
comunitária através do desenvolvi-
enfrentados por um brasileiro no
mento de atividades de informação,
exterior. Na província do Moxico,
educação e comunicação sobre te-
hospital para monitorizar alguns ca-
que se encontra a 1.300 quilômetros
mas relacionados à saúde pública.
sos de pacientes mais delicados ou
de distância do litoral de Angola
Além de ser educador social, ele
vulneráveis”, lembra Júlio Henrique,
e que faz fronteira com a Zâmbia,
apoia a Seção de Estatística do hos-
que acompanha, especialmente,
tive que enfrentar as limitações li-
pital, através do recolhimento e do
pessoas vítimas de hiv/Aids.
gadas à carência de luz e água, bem
processamento de dados epidemio-
A percepção da realidade de tra-
como a escassez de bens e serviços
lógicos, e também realiza ações vo-
balhadores do Brasil e de Angola
dos quais normalmente precisa-
luntárias. “Tendo em conta que eu,
também pode ser aplicada a outras
mos. Outro desafio foi a questão
como trabalhador expatriado, moro
nações. Na Índia — segundo país
da língua, porque, mesmo sendo
numa casa dentro do perímetro do
mais populoso do mundo, com
um país de língua portuguesa, nas
hospital, às vezes, tiro um tempo
aproximadamente 1,21 bilhão de
províncias a maioria das pessoas
após o trabalho para visitar os do-
habitantes, de acordo com o censo
falam apenas o dialeto local, que,
entes e conversar com os acompa-
indiano publicado em 2011 —, a in-
no caso do Moxico, era a língua da
nhantes. Aos finais de semana, dou
formalidade nas relações de trabalho
tribo Tchockwe”, conta.
uma volta pelos internamentos do
é uma característica recorrente.
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Angola
Informalidade do mercado de bens e serviços, sem a tutela do Estado. Subsídios para transporte, alimentação e seguro de saúde, além de outros benefícios estabelecidos em contrato. Estabilidade no serviço público.
Informalidade indiana “formalizada”
mas mudou de ramo e tornou-se diretora de uma escola particular Montessoriana, que utiliza método educacional desenvolvido pela multiprofissional italiana Maria Montessori. Com 180 alunos e funcionando apenas em um turno, a esco-
Índia
la conta com o
trabalho
de Helena em todas as áreas. “A minha escola só funciona pela manhã, das 8h30 até as 12h30. Como sou a diretora, chego sempre lá pelas 8h20, recebo as crianças e cumprimento os pais. Depois obQuando tinha 23 anos, a jornalista
servo as classes, crianças e profes-
pernambucana Helena Sales Mama,
sores. Quando necessário, ajudo as
46, decidiu viajar do Recife para
professoras na classe, faço toda a
Londres. Em solo inglês, ela trocou
administração escolar, admissão,
a experiência em jornais, rádios e
matrículas, programa e segurança”,
assessorias pelo trabalho como au
detalha.
Não existe legislação trabalhista normatizada. O 13º salário é facultativo. Em caso de demissão, não há aviso prévio ou indenização para algumas profissões, a exemplo de professores. Férias de três semanas. Trabalhadores domésticos não têm carteira assinada.
pair – cuidadora de criança – e gar-
Para a diretora Helena Sales
consolida as relações de trabalho
çonete. Nesse período, ela conheceu
Mama, na Índia as relações de tra-
com determinações para pagamen-
um indiano, com quem se casou, e
balho ainda são atrasadas e não
to de salário-mínimo e hora-extra,
mudou-se com ele para Bombaim, a
contam com uma legislação norma-
tempo de jornada de trabalho, fé-
maior e mais importante cidade da
tizada, o que acaba desfavorecen-
rias, licença maternidade, entre ou-
Índia, inclusive à frente da capital,
do os trabalhadores. “As questões
tros direitos. “Quando fiz freelancer
Nova Déli, localizada às margens
trabalhistas aqui na Índia ainda são
para a revista e o jornal, também
do oceano Índico.
bastante rústicas. Os [trabalhado-
não precisamos de nada oficial.
Na Índia, a jornalista teve de su-
res] domésticos não precisam de
Recebia só um cheque por material
perar as dificuldades para apren-
carteira assinada, nem fundo de
escrito”, relembra.
der o idioma, fazer novos amigos
Previdência. Fica tudo na mão do
Ela explica que o processo de
e adaptar-se a costumes tão dife-
empregador. Se ele for bom, ótimo;
administração do próprio empre-
rentes. No começo, ela prestou
senão…”, revela. Num contraponto,
endimento é, de certa maneira, mais
serviços autônomos à revista Auto
já está em vigor, no Brasil, desde
livre. “Como é uma escola privada
Índia e ao jornal The Times of India,
2013, a Lei das Domésticas, que
para crianças de dois a cinco anos,
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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não precisamos seguir nenhuma regra governamental. As professo-
Cara e coragem na
“Terra dos Cangurus”
ras recebem salários mensalmente, pagamos impostos e fundo de garantia, mas, se elas são despedidas ou pedem demissão, não há nenhuma formalidade a cumprir. Não precisamos pagar um décimo terceiro salário, nem indenização. Os professores também não precisam dar aviso prévio”, explica a diretora, que cita um exemplo de emprego no qual há maior formalização. “Se o empregado trabalha para um hotel, ele já recebe um bônus no Diwali, ano novo indiano,
A piauiense Gisele Scantlenbury, 39,
mudança, mesmo que não fosse
como um décimo terceiro salário.
passava por dificuldades, quando
tão radical. Lembro que, na mesma
O empregador investe num fundo
decidiu mudar-se para outra cidade,
época, uma amiga que morava na
de garantia, férias obrigatórias de
outro país. Ao deixar o Brasil, ela
Nova Zelândia há algum tempo me
três semanas e, se o trabalhador sair
trabalhou de babá, faxineira, gar-
instigou a passar um tempo por lá.
do emprego ou for demitido, rece-
çonete e auxiliar de escritório em
Não foi uma decisão fácil, mas eu
be quinze dias de salário por cada
Auckland, na Nova Zelândia. Com
senti naquele momento que não ti-
ano trabalhado”, completa Helena
pouco dinheiro e sem dominar o in-
nha muito a perder e resolvi peitar o
Sales Mama. Importante destacar
glês, ela viu no exterior uma forma
desafio. Fui com a cara e a coragem
que, além das ações de cada país
de se reinventar. “Eu estava passan-
mesmo. Pouco dinheiro e quase não
voltadas para a regulamentação da
do por um momento difícil, tanto
falava inglês”, relembra.
legislação trabalhista, nove conven-
profissional quanto emocionalmen-
A experiência com o jornalis-
ções da Organização Internacional
te. Não estava bem, um pouco can-
mo, adquirida no Brasil, foi válida,
do Trabalho (oit) e quatro da onu
sada de tudo e precisando de uma
quando Gisele Scantlenbury decidiu
visam a proteger os trabalhadores
trocar a Nova Zelândia pelo Japão.
migrantes em todo o mundo.
Como já havia trabalhado como as-
Na Austrália vive outra jornalista
sessora de Comunicação da Superin-
brasileira, que se tornou professora
tendência de Desenvolvimento do
e atualmente é gerente de projetos.
Nordeste (Sudene) e da Secretaria de
A realidade dos brasileiros nesse
Defesa Social de Pernambuco, além
país assemelha-se ao cotidiano dos trabalhadores no Canadá, ambos os países de colonização inglesa.
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Ao mudar-se para a Índia, há mais de duas décadas, pernambucana Helena Sales trocou as redações jornalísticas pela administração escolar
de passagens pela Gazeta Mercantil,
preocupação com a qualidade de
pela Rádio cbn e por campanhas po-
vida e o cuidado com a família.
líticas, ela se tornou correspondente
“Acredito que aqui os trabalhadores
internacional na Ásia. “Já em Tóquio,
são mais protegidos. Para se demitir
trabalhei para um jornal brasileiro.
alguém, por exemplo, você precisa
Comecei como freelancer e fui edi-
dar alguns avisos verbais e um por
tora chefe por um período. Depois,
escrito. Não pode, simplesmente,
sabendo que poderíamos [ela e o ma-
mandar o cidadão embora. Uma
Flexibilidade de horário.
rido] voltar para a Nova Zelândia,
coisa que percebo na cultura aus-
resolvi que precisava trabalhar em
traliana é que aqui a gente não vive
Salário calculado a partir de horas trabalhadas.
algum lugar para treinar meu inglês
para trabalhar. Eles têm preocupa-
e virei professora.” A mudança acon-
ção com o lazer, passar tempo com
teceu, mas não foi um retorno para
os filhos. O emprego é apenas um
Auckland. Gisele e o marido austra-
meio para se conseguir o padrão de
liano se mudaram para Melbourne,
vida desejado, mas ninguém vive
na Austrália.
para trabalhar”, destaca a brasileira.
Austrália
Cumprimento de aviso prévio e pagamento de seguro desemprego. Auxílio-creche de 50% dos gastos com filhos até cinco anos.
A situação de trabalhadores
Gisele ainda cita outros exem-
em Melbourne se assemelha à
plos de como funcionam as relações
dos brasileiros em Edmonton, no
de emprego na Austrália. Alguns
normalmente inclui alguns meses
Canadá, personagens de abertura
pontos se assemelham ao Brasil,
de salário. Há certa flexibilidade
reportagem. Gisele Scantlenbury,
como o pagamento de seguro de-
para quem tem filhos, muitas mães
que deixou as redações jornalísticas
semprego. “Outra opção é quando a
não trabalham em horário integral
e se tornou gerente de projetos de
empresa não tem mais como manter
ou apenas alguns dias da semana. O
uma empresa de tecnologia, avalia
sua vaga, por questões financeiras.
salário é calculado de acordo com
que, na Austrália, o empregado é
De forma geral, precisam te pa-
as horas trabalhadas.”
bastante valorizado e há uma maior
gar um pacote de demissão, que
Ainda sobre as semelhanças entre Brasil e Austrália, a brasileira também destaca o cumprimento do aviso prévio. “Dos empregados é exigido apenas que deem o melhor de si, cheguem no horário, avisem quando vão faltar e ofereçam, em média, quatro semanas de aviso se vão deixar o emprego”, completa Gisele Scantlebury.
Há mais de uma década fora do Brasil, piauiense Gisele Scantlenbury trabalhou de babá, faxineira, garçonete, auxiliar de escritório e jornalista
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Retorno para “casa”
“Queridas filhas, vocês chegam
brasileira, do jornalista Pedro Bial,
para viver em Edmonton, é categó-
ao Brasil depois de amanhã. (...) Em
publicada no livro Crônicas de re-
rica sobre um retorno: “Nunca”. Já o
primeiro lugar, tenham paciência.
pórter: o correspondente internacio-
químico Atila de Carvalho, que tro-
Principalmente porque vocês vêm
nal conta tudo o que não se diz “no
cou Salvador também pela cidade
morar no Rio de Janeiro, onde parece
ar”, da Editora Objetiva. Quando
canadense, utiliza o mesmo nunca
que a primeira solução de qualquer
decidiu voltar a morar no Brasil,
com uma paráfrase ao ditado po-
problema é o adiamento. Mas, com
na década de 1990, depois de uma
pular: “A vida me ensinou a nunca
tolerância e esquecendo a pressa, as
temporada na Europa, o jornalista
dizer nunca sobre alguns aspectos, e
coisas acabam se resolvendo. Por-
escreveu uma carta às filhas com
voltar a morar no Brasil é certamente
que, na batata mesmo, o número de
detalhes sobre o lar de origem, na
um deles, mas poderia expressar que,
pessoas que gostaria de resolver as
qual, entre outros pontos, fala sobre
neste momento, não tenho planos de
coisas, de melhorar a cidade é maior,
readaptação, costumes e mercado
voltar a morar no Brasil”.
bem maior do que o número de pre-
de trabalho brasileiro.
guiçosos e aproveitadores. Os brasi-
Quem também não deseja voltar
Entre os personagens ouvidos
para os trópicos, para a Paraíba, é o
pela Dialogar, a possibilidade de
administrador de banco de dados
As aspas que abrem a parte final
voltar ao Brasil revela um pouco
Luciano Jordão, ao afirmar, em nome
desta “viagem” pelo cotidiano dos
como cada um se sente em outros
da família, que “não pretendemos
trabalhadores brasileiros no exte-
países. A gerente mineira Myrna Sa-
voltar a morar no Brasil. Hoje temos
rior é um trecho da crônica Cartilha
ramago, que deixou Belo Horizonte
uma vida confortável aqui. O que
leiros trabalham muito.”
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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
sinto falta do Brasil é os meus filhos
de Uelber Dantas, a advogada pau-
não pretende voltar para o Brasil
não conhecerem bem a nossa cul-
lista Cibele Sanvido não mais imagi-
no momento. “Ainda mais agora,
tura, apesar de falarem português”.
na a família vivendo no Brasil.
que tenho uma esposa e uma filha,
Enquanto isso, a coordenadora de
Da França, a assistente comercial
não é minha vontade atual. Caso, no
projetos Cristina Mesquita gostaria
Maria Raquel Boulanger diz querer
futuro, se abrissem caminhos para
de levar os familiares pernambuca-
voltar ao Brasil, quando os filhos
conseguir algo na minha terra, en-
nos para o Canadá: “Difícil respon-
estiverem na universidade; a tradu-
tão, será um opção a ser tomada em
der. Tem muita coisa que precisa ser
tora Vanusa Brasil também deseja
conta. Amo muito o Brasil, mas não
avaliada antes de tomar uma decisão.
retornar; e a secretária administra-
pretendo voltar até que não veja uma
Se eu pudesse trazer a minha família
tiva Sony Acioli pondera o retorno,
oportunidade concreta para mim e
pra cá, não voltaria”.
mas se sente motivada pela compa-
para o bem da minha família.” Julio
O empresário potiguar Uelber
nheira a viver no Brasil novamente.
Henrique continua as atividades em
Dantas, momentaneamente, tam-
“Depois de 14 anos aqui, ainda não
Angola, mas, no período da entrevis-
bém não tem intenção de deixar o
surgiu essa vontade, como em ou-
ta, estava na Itália, para acompanhar
Canadá. “Nossos filhos nasceram e
tros amigos, a maioria de São Paulo,
o nascimento da primeira filha.
estão crescendo aqui. Temos uma
que voltaram em 2013. Tem a ques-
Já as (ex)jornalistas Helena Sales
roda de amigos com laços muito for-
tão da idade, o medo para entrar no
Mama e Gisele Scantlenbury estão
tes, e, no final das contas, atingimos,
mercado de trabalho novamente...
decididas a permanecer no exterior.
ou melhor, superamos os ideais tra-
Mas há a possibilidade de voltar
Sales pretende ficar na Índia, no ge-
çados antes da imigração. Mas talvez
com um projeto meu, por exem-
renciamento da escola, e visitar o
exista a possibilidade de passarmos
plo. Hoje tenho uma companheira
Brasil “só de férias”. Da Austrália,
temporadas no Brasil quando nos
francesa, Isabelle Bousson. Estamos
Scantlenbury afirma sentir falta da
aposentarmos, uma vez que o verão
juntas há 12 anos. Ela é professora
família e dos amigos brasileiros,
brasileiro coincide com o inverno
primária, muito mais motivada a
mas se encontrou no novo lar e no
rigoroso daqui”, justifica. A exemplo
morar no Brasil e atuar na área pro-
gerenciamento de projetos de tec-
fissional. Quem sabe, um dia, vol-
nologia. “Eu sinto muita falta da
tarei, acompanhando Isabelle com
minha família e dos meus amigos,
todo esse amor que ela desenvolveu
mas Melbourne é minha nova mo-
pelo Brasil e, essencialmente, pelo
rada. Amo a cidade, as pessoas, os
nosso Nordeste, que ela já visitou
costumes, a tranquilidade, a segu-
inúmeras vezes”, declara Sony.
rança”, declara.
Por conta das oportunidades de
No Brasil ou no exterior, com
trabalho e a estabilidade no exterior,
desejo de retornar ou não, o conta-
o educador social Julio Henrique
to com cada uma dessas histórias possibilita perceber que o brasileiro, como o significado do próprio nome, é um trabalhador. Trabalha-
Mesmo sem o desejo de voltar para o Brasil, a mineira Myrna Saramago faz questão de manter o “verde e amarelo” no Canadá
dor do Brasil e do mundo.
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SERVINDO COM QUALIDADE
Você já pensou em ir para um restaurante de um chef renomado, com uma comida maravilhosa, um lugar lindo, mas ter um atendimento de péssima qualidade? Garçom desatencioso, mal humorado, demorando, que não sabe como servir, não conhece o cardápio e com má vontade. Com certeza, apesar de todos os demais aspectos positivos, não seria umas das programações mais agradáveis e talvez você nem retornasse ao estabelecimento. Garçons bem preparados e satisfeitos com o ambiente de trabalho é um ponto fundamental para a receita do sucesso de um estabelecimento. Manter a equipe de salão atenta aos pedidos dos clientes e bem humorada não é uma tarefa fácil. Levando ainda em consideração que em sua grande maioria eles estão trabalhando em horário como finais de semana, feriados, tarde da noite e sem horário certo de encerrar o expediente. O horário de trabalho é uma das realidades mais difíceis da categoria. E, para os que atuam na noite, pegar o transporte de volta para casa é mais uma verdadeira luta. Texto: Patrícia Castelão
Fotos: Danilo Galvão
Arte: Gilmar Rodrigues
A
garçonete Priscila de Lima,
diferença entre os dois serviços. “Lá
ele e seus sócios foi dividir a gorjeta
do restaurante Bercy Villa-
era só servir, e num restaurante te-
(os 10%) entre toda a equipe. “Te-
ge Recife, resolveu com o marido,
mos também que vender e para isso
mos internamente um sistema de
que também é garçom, comprar
é muito importante estudar o cardá-
pontuação que distribui a gorjeta
um carro. “Bastava sair um pouco
pio e se comunicar bem”, ressalta. Ela
compulsória (taxa de serviço de 10%
mais tarde que para pegar o ônibus
lembra que, quando chegou à casa
que é cobrada na conta do clien-
e voltar para casa era um sacrifí-
(há quatro anos), todos os dias reser-
te) para a equipe, a partir do cargo
cio. Chegava a pegar até o dobro
vava um tempinho para ler e reler o
que o funcionário ocupa. A ideia de
de conduções do normal, dando
cardápio e tirar as suas dúvidas. Só
distribuir para praticamente todos
uma verdadeira volta na cidade”,
parou de fazer isso quando realmen-
os funcionários do restaurante é
relembra. Para curtirem também
te se sentiu segura e preparada para
calcada na crença de que a quali-
os momentos de folga juntos, eles
oferecer um bom atendimento.
dade do atendimento e a satisfação
sempre se organizam para tirá-las
Há oito anos atendendo aos clien-
do cliente é responsabilidade de
no mesmo dia. “É muito difícil todo
tes do restaurante Villa Cozinha de
todos: garçons, cumins (como são
mundo de folga e você trabalhando.
Bistrô, José Henrique Albuquerque
chamados os auxiliares de garçons),
Então você tem mesmo que gostar
revela que o segredo da casa é que
cozinheiros, auxiliares de cozinha,
do que faz”, pondera.
os funcionários trabalham em har-
copeiro, barman”, explica.
Mas para ser um bom profissio-
monia e, assim, o atendimento flui.
José Henrique, antes de ser gar-
nal e desempenhar um bom servi-
“Aqui não tem esta história de um
çom trabalhou nove anos como vi-
ço é preciso se preparar. Estudar o
não ajuda o outro. Sim, temos cada
gilante. Quando ficou desemprega-
cardápio e conhecer os produtos
um uma praça (conjunto de mesas),
do, devido ao falecimento do antigo
comercializados pela casa é muito
mas estamos sempre um colaboran-
patrão, teve a primeira experiência
importante, além de saber servir da
do com o outro”, explica.
no ramo atual. Ele chegou a fazer
maneira correta, ser agradável e ágil.
O sócio do grupo Bercy Villa-
um trabalho extra como garçom e
Antes de se empregar em um esta-
ge Recife, La Vague, Villa e Ponte
não gostou, mas, desempregado há
belecimento comercial, Priscila teve
Nova, Leonardo Pontual, explica
mais de seis meses, terminou sendo
seu primeiro contato com a proffisão
que uma boa solução para o traba-
convidado para uma nova entrevista,
em bufê, mas destaca uma grande
lho em equipe fluir encontrada por
onde está até hoje, e resolveu encarar
o desafio. “Algumas pessoas pensam
capacitação em vinhos e higiene
do curso de garçons do Serviço Na-
que é só colocar a bandeja na mão e
pessoal. A discrição é outro ponto
cional de Aprendizagem Comercial
servir, mas é muito mais do que isso.
que conta muito para a sua decisão
(senac). Ele era cobrador de ônibus
Hoje realmente sou feliz com o meu
final. “Já selecionei funcionário fora
e observou o mercado de bares e
trabalho e com amizades dos colegas
do ‘padrão’ determinado por nós,
restaurante em ascensão e decidiu
e clientes”, fala. Na casa onde traba-
mas, de uma forma geral, quanto
investir na carreira. Para o garçom,
lha, além de treinamentos oferecidos
mais discreto for o visual melhor,
o curso foi um diferencial no início
pela própria empresa, eles degustam
além de ter uma boa educação e
da carreira e recomenda a todos que
o cardápio e até mesmo algumas be-
cuidado com o linguajar”, analisa.
pretendem ingressar no mercado.
bidas, como o vinho. “Com certeza
Outro aspecto levantado pelo em-
Hoje trabalhando em uma casa
fica muito mais fácil dar a sua opi-
presário é o conhecimento mínimo
fina, que exige todo o conhecimen-
nião e ajudar o cliente”, analisa.
em computação. Isso mesmo! Além
to e detalhes da profissão, Almir diz
Assim como foi a história de
de anotar no antigo bloquinho de
que continua sempre se reciclando e
José Henrique, o grupo comandado
papel, em muitas casas hoje o em-
interessado no que surge de novo no
por Leonardo Pontual e seus sócios
pregado precisa lançar o pedido num
mercado. “Algumas pessoas não que-
prima pela preparação do pessoal
programa de computador que o di-
rem se tornar um profissional, mas
com capacitação personalizada,
reciona para cozinha ou bar. Pontual
apenas um emprego. Para crescer tem
introduzindo a filosofia e valores
destaca que a geração mais nova não
que estudar, senão fica na mesmice
da empresa. O proprietário expli-
encontrou nenhuma dificuldade de
e no lugar comum”, avalia, revelando
ca que prefere profissionais menos
trabalhar com a moderna ferramen-
que se sente realizado em trabalhar
experientes que não venham com
ta e a aquisição agilizou e facilitou o
num ambiente que exige todo o re-
‘vícios’ do mercado. E, uma vez
trabalho no dia a dia .
quinte, conhecimento do serviço de
contratado o trabalhador, ele passa
Para Almir de Oliveira, garçom
mesa, de vinhos e ingredientes mais
por treinamentos diversos como
do restaurante Ponte Nova, o meio
finos da culinária. “Realmente este é
atendimento, segurança alimentar,
de chegar ao mercado foi através
o serviço que gosto de fazer”, conclui.
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REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
O presidente do sintrah/pe
cct admite que 45% do total da gor-
serviços, entre outros.
(Sindicato Intermunicipal dos Tra-
jeta compulsória arrecadada devem
Ao fim da formação, os nomes
balhadores em Hotéis, Flats, Restau-
ser absorvidos pelo restaurante para
dos alunos concluintes são integra-
rantes e Similares de Pernambuco),
acerto de encargos relativos a ela, na
dos à Central de Oportunidades
Marcos Sérgio da Silva, esclareceu
folha de pagamento do trabalhador.
Profissionais do Egresso (copeg).
que os direitos da classe são todos
O restante, 55%, deve ser dividido
Lá é atendida a demanda de vários
os encontrados na Consolidação das
para a equipe.
estabelecimentos, que muitas ve-
Leis do Trabalho (clt), como cartei-
curso – O Curso de Garçons do
zes querem contratar profissionais
ra assinada, vale transporte, férias,
senac tem a carga horária de 500
novos no mercado, mas com boa
adicional noturno, 13ª salário e fgts.
horas-aulas e uma duração de três
preparação.
O piso salarial atual é de R$ 810,00.
meses. Com atividades curriculares
A capacitação integra o Pro-
Mas os salários chegam a ficar entre
teóricas e práticas (no restaurante
grama de gratuidade da institui-
r$ 1 mil a r$ 2 mil com o acréscimo
e lanchonete da instituição), o cur-
ção, ou seja, é totalmente de graça
das taxas de serviço de 10%.
so é dividido em quatro módulos:
e o aluno ainda recebe o almoço
Essa taxa é um dos assuntos mais
Atendente de Lanchonete, Eventos,
e lanche, já que o horário é inte-
polêmicos da categoria. Na ausência
Ajudante de Garçons (cumins) e
gral. Fora um auxílio transporte,
de leis federais sobre ela, o que guia
Garçom Propriamente Dito. Alguns
com cartão vem no valor de dois
é a Convenção Coletiva de Traba-
dos pontos fundamentais aborda-
vales A (r$ 2,45 cada trecho) por
lho (cct), que define dois tipos de
dos com os alunos são: manipulação
dia. “Hoje a demanda de garçons
gorjeta: a espontânea, entregue pelo
de alimentos, informações jurídi-
é muito grande e quem tem um
cliente ao garçom, sem conhecimen-
cas, etiqueta social e profissional,
bom serviço não fica desempre-
to da empresa e a compulsória. Essa
vocabulário técnico de inglês para
gado”, assinala o coordenador
última, apesar de ser calculada na
garçons, comunicação verbal e não
pedagógico do senac, Eduardo
conta do cliente, não é obrigatória. A
verbal, qualidade na prestação de
Alexandre Alves da Silva.
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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Grandes responsáveis pela difusão de jornais até a primeira metado do século XX, as tipografias artesanais resistem ao tempo e precisam ter sua técnica valorizada para não serem extintas com o avanço das gráficas digitais Texto: Jaqueline Fraga Fotos: Danilo Galvão
O meu curso de Gráfi-
Modernos”. Eridan e Pedro Paulo
ca tinha 25 alunos, só eu
da Silva, tipógrafo formado na dé-
continuo na profissão”. A fala é de
cada de 1980, manuseiam os tipos
José Eridan, 49 anos, dono da única
- como são chamadas as letras -, e a
tipografia artesanal localizada no
máquina responsável pela impres-
centro da cidade do Recife (pe).
são dos materiais, repetidas vezes
Formado em 1979 no curso téc-
ao dia. “O dia a dia é trabalhoso,
nico promovido pelo Serviço Nacio-
a gente tem oito horas de serviço,
nal de Aprendizagem (Senai), Eri-
de segunda a sexta. Para fazer 100
dan reflete a resistência das gráficas
talões, por exemplo, levamos três
que imprimem em chumbo, metal
horas”, explica o gráfico.
utilizado no surgimento da impren-
O método de produção que hoje
sa, no século xvii, ante o avanço das
se encontra praticamente esqueci-
tecnologias digitais.
do foi o principal responsável, no
Com endereço fixo na Rua da
Brasil, pela impressão de jornais e
Palma, bairro de São José, há 10
periódicos durante grande parte
anos, Eridan conta que montou sua
dos séculos xix e xx. Com o avan-
tipografia em 1990. O dinheiro para
ço das tecnologias digitais, o uso de
arcar com as despesas, afirma, foi
tipografia artesanal foi substituído
economizado dia a dia.
por tecnologias que trabalham o de-
As atividades desempenhadas na gráfica lembram as cenas eter-
senho dos tipos com o auxílio de programas de computador.
nizadas por Carlitos, personagem
Professor da Universidade Fe-
de Charles Chaplin em “Tempos
deral de Pernambuco (ufpe) e
66
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
José Eridan, dono da tipografia artesanal localizada no bairro de São José, Recife-PE
Pedro Paulo Silva, técnico em tipografia pela Escola Dom Bosco de Artes e Ofício
coordenador do Laboratório de
abordar as particularidades da pro-
Tipografia do Agreste, Leonardo
fissão, Pedro Paulo participou, em
Costa, conhecido no meio acadê-
2012, da Feira da Indústria realizada
mico como Buggy, avalia o porquê
no Centro de Convenções de Per-
de as gráficas tradicionais ainda
nambuco. “Foi uma experiência bem
resistirem. “Esta resistência, quase
interessante. Durante a exposição, eu
sempre, se dá por falta de recursos
falei sobre as etapas da composição
para aquisição de novas tecnologias
tipográfica, destacando o dia a dia
quando deveria se dar pela valoriza-
numa gráfica artesanal”, conta.
ção da cultura e de um tipo de aca-
Repleto de gráficas modernas,
bamento gráfico precioso”, pondera.
conhecidas como offset, o merca-
Comprovando em parte a teoria
do afunila a atuação de tipografias
do professor, o gráfico José Eridan
artesanais, mas, apesar desse cená-
revela que possuía o desejo de am-
rio, Eridan e Pedro Paulo garantem
pliar os serviços oferecidos: “Eu
que a firma possui clientela fiel e,
queria crescer mais, mas não deu”,
ao mesmo tempo, sempre atende a
comenta, finalizando com a frase
novos clientes. “Vem gente de lon-
que poderia ser considerada o seu
ge e vem muita gente por indicação
bordão “Mas é só alegria!”.
também. Agora mesmo nós estamos
Parceria. Há um ano, José Eridan
imprimindo um livro”, comenta José
trabalha com o amigo Pedro Paulo
Eridan. E finaliza: “A gente ama a
da Silva, formado no curso técnico
profissão da gente, não temos outra.
de tipografia oferecido pela Escola
E tudo o que eu tenho dou graças a
Dom Bosco de Artes e Ofício. Para
Deus e a minha profissão”.
REVISTA DIALOGAR · DEZEMBRO / 2014 - MARÇO / 2015
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Poesia em tipos Poeta e artista plástica, a pernambu-
“Eu comecei a pesquisar e andar
cana Jussara Salazar lançou recente-
pelo centro do Recife. As pessoas
mente o seu novo livro “Cantiga de
me indicavam alguma tipografia,
Maria Degolada”. A obra, inspirada
mas, sempre que eu chegava no lo-
na história da santa popular não ca-
cal, ela estava fechada, até que um
nonizada, Maria Bueno, assassinada
dia eu encontrei a gráfica do Seu
em um crime passional, foi impressa
Eridan”, relembra Jussara. E acres-
na tipografia artesanal José Eridan
centa: “Ele é um tipógrafo artesanal
Gráfica, na cidade do Recife.
muito bom e já está certo que vou
“Eu considero os livros impres-
fazer outros trabalhos com ele”.
sos em tipografia lindíssimos, eles
Designer Gráfica pela Univer-
podem até ser comparados a gravu-
sidade Federal de Pernambuco, a
ras. E eu queria fazer o livro num
escritora busca a referência visual
formato que tivesse a ver com a ro-
para influenciar seus projetos: “Eu
maria, criando uma relação entre
sempre olho o desenho que os tipos
a cultura popular e o meio que se
estão fazendo, para que tenham um
encontra praticamente em extin-
ritmo visual. Isso em poesia é muito
ção”, explica a escritora.
importante, já que o texto não pre-
A dificuldade para encontrar
enche toda a página. Então, observo
uma tipografia artesanal foi imensa:
questões gráficas em relação ao som”.
Acervo pessoal
Entrevista
Pesquisador com interesse nas áreas de tipografia, Leonardo Buggy transferiu, em 2009, parte de seu acervo pessoal para a criação do Laboratório de Tipografia do Agreste (lta), localizado no campus Caruaru da ufpe, e que hoje conta com seis grupos de trabalho, compostos por 25 alunos em média. Nesta entrevista, ele fala sobre a importância da tipografia artesanal e sobre as perspectivas de futuro da atividade.
Como e por que surgiu a ideia de
design gráfico praticado no Agres-
montar um laboratório de tipografia?
te: a disponibilidade de mais um
O movimento de interioriza-
recurso de estilo e a rememoração
ção do ensino superior público
de um método de raciocínio visual.
realizado em Pernambuco através
As tipografias artesanais estão
da ufpe trouxe em 2006 o design
cada vez mais raras. Você acha que
para o meio acadêmico agrestino.
elas vão existir por muito tempo?
Os alunos que experimentam essa
O que não é observado por es-
formação devem ser aproximados
tas pequenas empresas é o fato de
da tecnologia tipográfica para que se
que acabamentos gráficos somen-
promova seu encontro com a mais
te realizados com equipamentos
legítima expressão gráfica produ-
tipográficos são hoje alguns dos
zida pelo povo nordestino [a lite-
serviços mais caros ofertados por
ratura de cordel]. Trata-se de, entre
uma gráfica offset. É preciso uma
outros fatores, permitir o estudo de
revolução no pensamento empre-
escala industrial nos tempos de
aspectos visuais de sua identidade
sarial do mercado gráfico local para
hoje. A esse respeito, vale lembrar
através da análise e interpretação
que a tecnologia de impressão por
que muito do que se produz em ter-
da linguagem plástica da poesia
tipos móveis possa se manter viva
mos de impressos no setor de casa-
narrativa, popular, impressa.
e produtiva.
mentos e formaturas é feito com o
Com o avanço das tecnologias
Há alguns anos, a editora Cosac
emprego do sistema de impressão
digitais, por que é importante conti-
Naify lançou o livro “Pensar com Ti-
tipográfico. As letras douradas,
nuar a ensinar o modelo tradicional?
pos”, que teve sua capa impressa de
gravações em relevo e os envelopes
A reintrodução da estética
forma artesanal. Como você avalia
cobiçados por formandos, noivas
decorrente do processo de com-
o resgate proposto por algumas em-
e debutantes também configuram
posição manual e impressão com
presas?
mais um dos caminhos para atingir
fôrmas em relevo no ambiente de
São iniciativas positivas que
uma condição digna e economica-
ensino superior implica em dois
provam a viabilidade econômica
mente viável de manter-se ativo no
fatores que afetam diretamente o
do emprego de tipos móveis em
mercado gráfico.
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O direito à memória como direito humano
direito de não esquecer a história alusiva à formação e desenvolvimento dos direitos humanos. É a guarda dos documentos que torna possível o registro da histó-
Danilo Galvão
Eneida Melo Correia dE Araújo Desembargadora do TRT-PE e professora da Faculdade de Direito da UFPE
A
ria política, econômica e cultural de uma sociedade e de uma instituição. A preservação dos documentos que contêm a comprovação de direitos
preservação da memória da
que inspirou os estados democráti-
afirmados existentes pelos magis-
Justiça do Trabalho assenta-se
cos a adotar uma legislação provi-
trados do trabalho ao decidirem
nos princípios e normas que integram
da de uma nova concepção de um
as questões que lhes foram subme-
a Constituição da República, a qual se
direito geral de personalidade.
tidas permite a identificação dos
traduz como marco formal, no Brasil,
E, em especial, perante o Poder
fatos marcantes para a história do
do reconhecimento da dignidade hu-
Judiciário, no plano da memória,
trabalho e do Direito do Trabalho.
mana e da cidadania, acompanhando
procura manter-se viva as narrativas
A manutenção dos acervos refe-
a doutrina dos direitos humanos, em
contidas nos documentos produzi-
rentes à história da Justiça do Tra-
cuja essência avultam a Declaração
dos em suas instâncias. Tal sucede
balho, de suas estruturas formais,
Universal dos Direitos Humanos, a
porque se entende que os documen-
dos documentos que traduzem a in-
Declaração de Filadélfia, o Pacto de
tos aí gerados revelam o papel e o
terpretação conferida ao direito ao
Direitos Civis e Políticos, o Pacto de
perfil da magistratura, a atuação dos
longo dos tempos e do desempenho
Direitos Econômicos, Sociais e Cul-
advogados e dos servidores. Mos-
dos diversos atores sociais também
turais, entre outros.
tram ainda a interpretação conferi-
enriquece o patrimônio cultural e a
Seguindo as balizas desses docu-
da às normas jurídicas ao longo dos
pesquisa científica do país. E torna
mentos, o Estado brasileiro assumiu
anos, dando ensejo ao conhecimen-
efetivos os princípios constitucio-
o compromisso jurídico e político
to da jurisprudência dos Tribunais.
nais e os objetivos do Estado no que
no sentido de assegurar aos indiví-
Todas essas vertentes contribuem
diz respeito à produção, promoção
duos os direitos humanos, entre os
para garantir o direito à lembrança
e difusão dos bens culturais.
quais se acham os alusivos à cultura
e à memória no âmbito do Estado.
Em síntese, nunca é demais re-
e à memória. É que a cultura e a
Na Justiça do Trabalho, a história
petir que o direito à memória é di-
memória se traduzem em direitos
das relações de trabalho, dos confli-
reito de personalidade e, como tal,
humanos, de acordo com os docu-
tos individuais e coletivos também
direito humano, cabendo ao Estado
mentos referidos e que integram o
brota dos processos. Estes integram
e à sociedade desenvolver todos os
sistema normativo do Direito In-
o acervo documental produzido,
esforços pra que esse direito seja
ternacional dos Direitos Humanos.
guardado, conservado e posto pelas
protegido e efetivado. Por fim, es-
Revela-se, no mundo contem-
autoridades à disposição daqueles
crever, lembrar, registrar, guardar,
que necessitem consultá-lo.
conservar, divulgar, participar dessa
porâneo, uma visão humanística, democrática e com tendência à uni-
A preservação documental, por-
versalidade, oriunda da Declaração,
tanto, desponta neste contexto: o do
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história é o convite que se dirige aos indivíduos e às instituições.
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