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OUTRAS PARADAS

Artistas e profissionais do mercado musical falam sobre as razões de terem decidido trabalhar — e morar — fora do Brasil

por_ Eduardo Lemos de_ Londres

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Na última década, tornou-se comum ouvir falar que um artista ou produtor musical está se mudando do Brasil — em muitos casos, não só para trabalhar, mas também em busca de um outro lar. Dois dos destinos mais recorrentes são Portugal (morada de Marcelo Camelo, Mallu Magalhães e Adriana Calcanhotto) e Estados Unidos (onde vivem nomes como Rodrigo Amarante e Sérgio Mendes, entre muitos outros).

Há dois anos, o músico, compositor e produtor Domenico Lancellotti, 49 — conhecido pelo projeto +2 (com Moreno Veloso e Kassin) e por tocar nas bandas de Gal Costa e Gilberto Gil — juntou a família e embarcou para Portugal. “Foi um empreendimento familiar”, conta. “Escolhemos o país porque tem a mesma língua, porque tem um céu azul e porque tinha alguns amigos que poderiam nos ajudar a nos estabelecer.” Colegas dele, como Ricardo Dias Gomes e José Ruivo, também vivem em Lisboa atualmente, formando uma pequena e produtiva cena brasileira na capital portuguesa. “Temos tocado juntos, cada um colaborando com o trabalho do outro.”

Domenico cita a eleição de Jair Bolsonaro e os projetos de desmonte da Cultura como motivos para a mudança. Outra razão é o desejo de se dedicar à carreira autoral. “O mais interessante de estar em Portugal é estar na Europa e ter a chance de circular por aí”, opina ele, que tem disco novo previsto para sair em 2021.

Domenico Lancellotti:

“O mais interessante de estar na Europa é ter a chance de circular por aí”

Um dos integrantes do grupo Rosa Neon, o músico e compositor mineiro Luiz Gabriel Lopes tem uma relação de longa data com Portugal — desde 2010, ao menos uma vez por ano ele vai ao país para realizar shows em cidades portuguesas e também na Europa. “Nos últimos dois anos, acabei ficando mais lá do que no Brasil”, relata. As oportunidades profissionais e as relações de amizade ajudaram o músico a decidir que, em 2021, ele se muda para Lisboa. “O público português é muito atento e interessado. Tem um lance com a língua, com a poesia, uma escuta refinada com as palavras, esse jogo do idioma que é o mesmo e não é ao mesmo tempo, tudo isso me encanta muito.”

A experiência de ser um artista fora do país, diz, tem transformado a sua própria visão sobre a riqueza da música brasileira. “Existe espaço para o entendimento da imensa miríade de gêneros e sonoridades que brotam do nosso país como uma das nossas mais avançadas tecnologias, e enxergar isso de uma perspectiva distanciada é inspirador.”

Atual diretora de programação do Summerstage, um dos principais festivais de música de Nova York, a produtora brasileira Paula Abreu, 39, deixou o Rio há uma década para fazer mestrado em Performing Arts Administration na New York University. Também trabalhou em organizações culturais como o Lincoln Center e a Red Hot. Persistência e pensamento de longo prazo são, para ela, a receita do sucesso: “Os EUA têm várias vertentes de mercado que podem funcionar para um artista brasileiro, como as comunidades brasileiras, o circuito de casas e clubes independentes ou a rede de universidades e Performing Arts Centers.” No entanto, ela alerta para as barreiras legais (como a necessidade de visto de trabalho) e de idioma: “Em geral, é mais fácil para artistas de língua espanhola criarem público.”

A saga de artistas do Brasil em terras estrangeiras ganhou até um curso, “A História do Sucesso Mundial dos Músicos Brasileiros”, ministrado pelo produtor e jornalista Arnaldo DeSouteiro, 57. Ele testemunhou de perto a carreira internacional de artistas como Luiz Bonfá, João Gilberto, Antonio Carlos Jobim, João Donato e Eumir Deodato, dentre outros. “O que havia em comum entre todos era o desejo de aperfeiçoamento, de crescimento artístico. Esse é o fator motivacional essencial para uma carreira dar certo com solidez”, avisa.

“Até mesmo gênios como João Gilberto, Luiz Bonfá, Tom Jobim e Luiz Eça aprimoraram seus dons nos períodos em que viveram no exterior. Porque encontraram melhores condições de trabalho e souberam interagir com outras culturas sem perder a brasilidade”, resume DeSouteiro. “Tem que haver um desejo de crescimento artístico, de interação cultural. Ninguém é uma ilha. E é preciso estar atento ao seguinte: há mercado para o meu trabalho no lugar onde quero morar e desenvolver a carreira? Se houver, mande brasa”, estimula o produtor e jornalista, que viu o próprio processo de orientação da sua atuação para o exterior e os de alguns de seus maiores ídolos, que fizeram o mesmo, como ritos de passagem.

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PALAVRA DE ESPECIALISTA

por_ Paula Abreu | de_ Nova York

Faça uma análise extensiva, pesquise quem é o seu público ou público em potencial e como ele consome música. Avalie quem são os potenciais compradores de shows (festivais, casas, teatros) e parcerias (selos, PR, distribuição). As feiras internacionais são excelentes oportunidades para conhecer compradores e criar relacionamentos internacionais. Costumo dizer que no nosso mercado, o “ativo” mais importante é o relacionamento.

Depois dessa pesquisa e análise, faça uma estratégia bem planejada e tenha em mente que colher resultados satisfatórios talvez só aconteça depois de algumas turnês ou trabalhos realizados.

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