Revista Portal da Ciencia 2012

Page 1


Natalino Salgado Reitor da Universidade Federal do Maranhão

CIÊNCIA E CULTURA: SABERES QUE SE ENTRECRUZAM PARA GARANTIR A EXISTÊNCIA HUMANA Estamos de volta com uma edição especial da Revista Portal da Ciência. Neste número, a revista tem como enfoque principal o tema escolhido para abrigar a 64ª Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência: Ciência, Cultura e Saberes Tradicionais para Enfrentar a Pobreza. Um tema instigante que exigiu da equipe de produção um trabalho de mineração de projetos de pesquisas, ofícios e temas que relacionam as duas áreas de investigação. Não foi uma tarefa fácil porque o tema ainda é um tabu pelo fato do saber tradicional não ser considerado, no trabalho acadêmico, um conhecimento com epistemologia própria. Mas, o desafio valeu a pena! Temos aqui uma revista diferente que demonstra, em todas as suas páginas, como é possível conjugar narrativas e experiências díspares com o propósito de criar conhecimento em que a criatividade, a inovação, a diversidade, a geração de renda e a inclusão social são recorrentes.

REALIZAÇÃO

APOIO

2

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Sumário

08

A SBPC no Maranhão The SBPC in Maranhão Conheça a história da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência no Maranhão e como a sua unidade regional tem se organizado e atuado em prol do desenvolvimento do Estado. Learn the history of the Brazilian Society for the Advancement of Science in Maranhão, and how their regional unit has organized and worked towards the development of the state.

11

O equilíbrio entre o saber científico e o saber tradicional The balance between scientific knowledge and traditional knowledge A jornalista e pesquisadora em cultura, Ester Marques, realiza uma análise sobre a relação entre o saber científico e o saber tradicional, e confirma a importância da coexistência entre os dois diálogos. The journalist and researcher in culture, Ester Marques, analysis of the relationship between scientific knowledge and traditional knowledge, and confirms the importance of coexistence between two dialogues.

16

Cobre em aguardentes: estudo revela a presença da substância em grande quantidade na produção de cachaças no interior do Estado Cuprum in brandy: study reveals the presence of the substance in large quantities in the production of cachaça in the State of Maranhão

30 Praias de São Luís: Patrimônio Perdido? São Luís beaches: Lost heritage? O Maranhão, um dos Estados do Nordeste com o maior número de praias, vive uma crise: toda a orla marítima de São Luís está imprópria para banho. Pesquisadores da UFMA analisam as condições de uso de praias e de mangues e apresentam as possíveis soluções para enfrentar esse problema. Maranhao, one of the northeastern states with the largest number of beaches, is experiencing a depression: the São Luís’ entire coastline is unfit for bathing. UFMA’s researchers analyze the conditions of beaches’ use and mangroves’ and they present possible solutions to address this problem.

Pesquisador da UFMA afirma que os problemas vão muito além de questões estruturais ou de capacitação, mas também de higiene durante a produção do produto, e, o pior, é que muitos não sabem as complicações que isso pode trazer ao organismo. UFMA researcher says that the problems go far beyond structural issues or training, but also of hygiene during production of the product, and many people do not know the complications it can bring to the body.

Forno solar: uma alternativa viável de enfrentamento à pobreza Solar oven: a viable alternative to cope the poverty Inventado no século XVIII, a técnica de produção e utilização do Forno Solar tem sido ensinada e utilizada no Núcleo de Extensão da Vila Embratel (NEVE). O forno tem se apresentado como uma ferramenta útil por sua praticidade para a população de baixa renda. Invented in the 18th century, the production and use of Solar Oven technique has been taught and used in the Vila Embratel Center Extension . The oven has presented is a useful tool for lowincome population by practicality.

20

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

3


Sistema de bombeamento solar da UFMA é o melhor do mundo em tratamento emergencial de água UFMA’s solar system pumping is the best emergency water treatment in the world

24

O Projeto de Bombeamento Solar, desenvolvido pela UFMA, ganhou o título de melhor do mundo em otimização de sistemas de tratamento emergencial de água acionados por sistemas solares. O produto pode ser uma boa opção para problemas de abastecimento de água, mas ainda falta ser comercializado para benefício social.

The Solar Pump Project, developed by UFMA, won the title of world’s best water treatment emergency system optimization powered by the sun. The product can be a good option for water supply problems, but it has yet to be marketed for social benefit.

28 Com criatividade é possível produzir energia limpa e sustentável With creativity you can produce clean and sustainable energy Capaz de armazenar energia por meio de painéis solares, o Poste Solar criado no Instituto de Energia Elétrica da UFMA pode ser uma alternativa para o enfrentamento do problema de escassez das fontes energéticas. Desenvolvido em 2009, o projeto começa a perceber os primeiros olhares de empresas interessadas na implantação da tecnologia. Capable of storing energy via solar panels, the Post Solar Energy created by UFMA’s Electrical Institute can be an alternative to facing the shortage of energy sources problem. Developed in 2009, the project begins to realize the first looks for companies interested in technology deploying.

56 Embarcando em um sonho Embarking on a dream Escola pioneira no Brasil e de referência internacional na construção naval demonstra potencial do Maranhão na fabricação artesanal de embarcações. O Estaleiro Escola que começou na década de 80, por meio de um projeto de pesquisa, apresenta peculiaridades que chegam a se elevar ao nível artístico e tem ajudado a manter vivo um saber diferenciado e único. Pioneer school in Brazil and internationally shipbuilding renowned demonstrates the Maranhão potential in homemade boats. The Estaleiro School, that began in the 80s through a research project, has peculiarities that come to raise the artistic level and it has helped to keep alive a different and unique knowledge.

Dream In: o despertar para um mundo de sonhos

41

Dream In: awakening to a world of dreams

44

Higiene bucal e Meio Ambiente: uma parceria que deu certo Oral Hygiene and Environment: a partnership that worked

Projeto inspira participantes a criar soluções inovadoras e criativas por meio de sonhos. A Universidade Federal do Maranhão é a instituição que tem representado a região nordeste do Brasil e vem realizando um trabalho para que sonhos possam integrar vários atores da sociedade pautada nos conceitos de economia criativa.

Pesquisadores desenvolvem utensílios sustentáveis e de baixo custo para combater a placa bacteriana e manter a higiene bucal da população em dias. São escovas, fios dentais, abridores de boca e até porta-escovas feitos com material reciclado e vegetal.

Project inspires participants to create innovative and creative solutions through dreams. The Federal University of Maranhão is the institution that has represented the northeast region of Brazil and it has been working for dreams can integrate various society actors based on the creative economy concepts.

Researchers develop sustainable and low cost tools to fight plaque and maintain oral hygiene of the population. They are brushes, dental floss, mouth openers and even a brush holder made from recycled material and plant.

4

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


61

50

Entrevista

SBPC inclusiva

Interview

SBPC Inclusive

A secretária de Estado do Trabalho e Economia Solidária, Mariana Nascimento, fala em entrevista à Revista “Portal da Ciência” sobre o Projeto da Feira de Saberes e Sabores da Economia Solidária no Maranhão a ser apresentado pela primeira vez durante a 64ª Reunião Anual. In an interview to Science Portal Periodical, Special Issue SBPC, the secretary of State for Labour and Solidarity Economy, Mariana Nascimento talks about the design of the Knowledge and Taste Fair of the Maranhão Solidarity Economy will be first introduced during the 64th Annual Meeting.

Entenda como a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência na Universidade Federal do Maranhão tem sido pensada para que pessoas com deficiência possam transitar livremente e ter acesso à toda programação do evento científico. Understand how the annual meeting of the Society for the Advancement of Science at the Federal University of Maranhão has been designed for people with disabilities can move freely and have access to the entire scientific program event.

Amazônia maranhense: Ecossistema vulnerável Maranhão Amazon: Vulnerable ecosystem Incluído junto a mais oito estados brasileiros dentro do espaço considerado Amazônia Legal, o Maranhão enfrenta um processo acentuado de devastação de sua área verde original, que tem acontecido com celeridade e onde a falta de informação e recursos humanos especializados nesta região são problemas que dificultam a implantação de políticas e ações em prol da conservação da Amazônia maranhense. Neste sentido, o programa de pós-graduação em rede recentemente implantado, o Bionorte, pretende formar pesquisadores que desenvolvam pesquisas e estudos específicos sobre a Amazônia, capazes de apontar novos rumos para os trabalhos de preservação da Amazônia Legal.

37

Included among the eight Brazilian states within the Legal Amazon space, Maranhão faces a severe case of destruction of its original green area, which has happened quickly and where the lack of information and human resources in this region are problems which hindering the politics implementation and actions to conserve Amazonian Maranhão. In this sense, the graduate program recently deployed network, the Bionorte, aims to train researchers to develop research and specific studies on the Amazon, able to point to new directions for the preservation work of the Legal Amazon.

Dê bom dia, ganhe um sorriso! Have a good day, get a smile!

27

Estimular e manter o bom relacionamento entre estudantes e servidores é o foco do projeto de pesquisa e extensão Hospitalidade no Campus da UFMA. O projeto ganhou visibilidade e atraiu a atenção de pessoas para discussões que há muito já tomavam conta principalmente das salas de aula dos cursos de Turismo e Hotelaria. Agora o projeto se prepara para a 64º Reunião Anual da SBPC, na qual além do acolhimento dos participante do evento, vai oferecer oficinas sobre hospitalidade.

Encouraging and maintaining good relationships among students and servers is the UFMA Campus Hospitality research and extension project focus. The project came to life and drew attention to discussions that have long been mainly took care of the Tourism and Hospitality Academic courses classrooms. Now, the project is preparing to carry out the 64th Annual Meeting of the SBPC.

46

Acadêmica de Engenharia de Alimentos da UFMA apresenta hambúrguer de caju

Raízes, cascas e ervas: saberes que curam Roots, barks and herbs: healing knowledge Pesquisa realizada com um grupo de idosos entre 51 e 90 anos mostra a preferência pelos remédios caseiros feitos com plantas que possuem princípios medicinais. Razão da escolha: ótimos resultados e baixo custo. Os pesquisadores alertam que quando utilizadas de forma correta, as plantas medicinais têm o mesmo efeito positivo que os medicamentos industrializados. Research conducted to an elderly group at about 51 and 90 years shows a preference for herbal medicines. Reason for choice: good results and low cost. The researchers warn that when used correctly, medicinal plants have the same positive effect that the manufactured drugs.

53

UFMA’s Food Engineering Academic presents the cashew burger

Acadêmica do 10º período do curso de Engenharia de Alimentos do campus da UFMA - Imperatriz desenvolveu um hambúrguer feito do pedúnculo do caju. A novidade foi aprovada na amostra sensorial realizada com acadêmicos, professores e servidores da própria Instituição. Rico em fibras e vitamina C, o hambúrguer de caju é fácil de fazer e pode ter um custo mais baixo que o tradicional. The 10th period of the Food Engineering Academic Course, campus UFMA – Imperatriz, developed a burger made of cashew beef. The news was passed in the sample sensory held with academics, teachers and servants of the institution. Rich in fiber and C vitamin, the cashew burger is easy to make and can have a lower cost than the traditional beef.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

5


ESTRUTURA ORGANIZACIONAL PRESIDENTE DA REPÚBLICA Dilma Rousseff MINISTRO DA EDUCAÇÃO Aloizio Mercadante SECRETÁRIO DE EDUCAÇÃO SUPERIOR DO MEC Amaro Henrique Pessoa Lins UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO REITOR Natalino Salgado Filho VICE-REITOR Antônio José Silva Oliveira PRÓ-REITOR DE ENSINO Sônia Maria Corrêa Pereira Mugschl PRÓ-REITOR DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO Fernando Carvalho Silva PRÓ-REITOR DE EXTENSÃO Antônio Luiz Amaral Pereira PRÓ-REITORA DE RECURSOS HUMANOS Maria Elisa Lago Braga Borges PRÓ-REITOR DE GESTÃO E FINANÇAS José Américo da Costa Barroqueiro CIDADE UNIVERSITÁRIA Av. dos Portugueses, Nº 1966 – CEP 65085-580

6

Nossos cumprimentos aos leitores e leitoras da Revista Portal da Ciência.

E

m sua segunda edição, a Portal da Ciência traz um exemplar especial sobre alguns temas relacionados à 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. 2012 é um ano de muitas comemorações para São Luís e para a Universidade Federal do Maranhão. A cidade celebra dois grandes momentos que prometem marcar a história da capital maranhense. São 400 anos de história, de cultura, de derrotas e de vitórias. São Luís comemora em grande e típico estilo seus 400 anos de fundação com toda a alegria e aconchego que o povo maranhense sempre teve. Motivo de alegria também para a UFMA - que faz parte da história desta ilha encantada-, e que presenteia a cidade sediando o maior evento científico da América Latina e do Caribe, a 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), cujo tema Ciência, Cultura e Saberes Tradicionais para o Enfrentar a Pobreza não poderia ser mais oportuno diante da diversidade de saberes da nossa gente. Buscamos retratar, nesta publicação, o que a Universidade tem de melhor em relação ao ensino, à pesquisa e à extensão, e como o nosso saber científico está direta ou indiretamente relacionado com o saber popular. Destacamos a situação atual de praias e mangues de São Luís, decorrentes da ação humana. Apresentamos como as fontes de energia limpa são mais viáveis e eficazes do que se imagina, como é o caso do Bombeamento Solar, considerado no ano de 2011 como o melhor do mundo na categoria de otimização emergencial de água acionados por sistemas solares. Apresentamos também projetos que vão desde o mapeamento de manifestações culturais; uso de plantas medicinais por idosos; experiências mais saudáveis como o hambúrguer de caju e, também, projetos que visam trabalhar com o bom relacionamento na Universidade, como é o caso do projeto Hospitalidade no Campus. Não deixamos de pautar, os principais eventos que marcam a SBPC, como a Expotec, o Enapet, a SBPC Cultural e a SBPC Jovem, sem deixar de abordar a SBPC Inclusiva, que promete ser o grande diferencial desse evento. Ao longo das páginas desta revista, nós apresentamos uma série de ofícios, uma extensão do artigo primeiro desta publicação que aborda de forma direta a condição dos saberes tradicionais. Orientados pela afirmação do educador e filósofo brasileiro, Paulo Freire, de que "Não há saber mais ou saber menos: Há saberes diferentes”, conduzimos a produção do presente material, trabalho que nos permitiu o encontro com especialistas e pessoas que dominam um saber que não está na academia. O resultado final deste encontro entre o saber científico e o popular pode ser conferido no Portal da Ciência – Especial SBPC, que foi planejada com muito carinho e respeito às tradições, sempre buscando o diálogo e a troca de saberes para amenizar os problemas que assolam a sociedade, um encontro entre gente simples que mantém viva a cultura, os costumes transmitidos de geração em geração e a produção de tecnologias e a sistematização do conhecimento. Por fim, gostaríamos de agradecer a toda a equipe de produção desta revista, repórteres, fotógrafos, colaboradores, revisores e professores que contribuíram imensamente para o produto final. Esperamos que cada um possa absorver nesta revista as pesquisas e os detalhes da cultura maranhense, em um ambiente propício para discutir como a ciência, a cultura e os saberes tradicionais podem, juntos, contribuir para o enfrentamento da pobreza, na 64ª Reunião Anual da SBPC. Uma boa leitura e um bom encontro!

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


EXPEDIENTE

Portal da Ciência

Uma publicação da Universidade Federal do Maranhão www.ufma.br

IDEALIZAÇÃO E PRODUÇÃO ASCOM ascom@ufma.br

ASSESSORA DE COMUNICAÇÃO E EDIÇÃO GERAL

Our greetings to the Science Portal Magazine readers

O

n its second edition, the Science Portal brings a special issue about the 64th Brazilian Society for the Progress of Science’s meeting. Two thousand and twelve is a year of many celebrations for Sao Luis and the Federal University of Maranhao. The town celebrates two great moments that promise to mark the history of the capital of Maranhao. There are 400 years of history, culture, defeats and victories. In a typical style, São Luís celebrates its 400 years of foundation with all the joy and warmth that the people of Maranhao has always had. THE ANNUAL SBPC MEETING UFMA, as part of the history of this enchanting island, hosts, as a gift to the city, the largest scientific event of Latin America and the Caribbean: the 64th Annual Meeting of the Brazilian Society for the Progress of Science (SBPC), which theme “Science, culture and traditional knowledge to cope against poverty” could not be more timely due the diversity of knowledges of our people. We seek to portray in this publication, what the University has to offer when it comes to the best teaching, researching and extension practices, and how our scientific knowledge is directly or indirectly related to the popular wisdom. The publication also highlights the current status of beaches and mangroves of Sao Luis, due to human actions, and even shows how clean energy sources are more viable and effective than you may think, as it is the case of Solar Pumping, considered, in 2011, as the world's best in the emergency water optimization category driven by solar systems. We also present projects ranging from the cultural events mapping, the use of medicinal plants for the elderly; healthier experiences as the cashew burger and also projects that aim to work the relations on the University’s area, as the Campus Hospitality. Are also included on this publication, the major events that mark the SBPC, as much as the Expotec, the Enapet, the Cultural SBPC and Jovem SBPC, while addressing the SBPC Inclusive, which promises to be the most distinguishing point of this event. Throughout the pages of this magazine, we present a series of letters, an extension of the first article of this publication that directly addresses the status of traditional knowledge. Guided by the assertion of the Brazilian philosopher and educator, Paulo Freire, that "Nobody is smarter than others: There are different knowledges," we conducted the production of this material, work that allowed us to meet with experts and people who have knowledges not found in the academy. The final result of this encounter between the popular and scientific knowledge can be seen on the Portal of Science - SBPC Special, which was planned with great care and respect for traditions, always seeking dialogue and knowledge exchange to soften the problems facing - a encounter between ordinary people that keeps alive the culture, customs handed down from generation to generation and the technology production and knowledge systematization. Finally, we would like to thank the entire production team of this periodical: reporters, photographers, contributors, reviewers and teachers who contributed immensely to this final product. We hope everyone absorb a little bit of the researches and experience details of the Maranhao’s culture, in an opportune environment to discuss how science, culture and traditional knowledge can together contribute to the fight against poverty, at the SBPC’s 64th Annual meeting. A good reading and a good encounter!

Francisca Ester de Sá Marques Prof ª Adjunta do Departamento de Comunicação/UFMA

ASSISTENTE DE EDIÇÃO

Anissa Ayala Cavalcante, Roberth Meireles

PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA André Souza, Larissa Régia

REPORTAGENS

Aline Alencar, Amy Loren, Ana Paula Coelho, Anissa Ayala Cavalcante, Anna Caroline Guimarães, Camila Carneiro, Carla Rejane Dutra, Caroline Ribeiro, Daniela Ribeiro, Emerson Machado, Ester Marques, Gutemberg Feitosa, Hemerson Pinto, Jonatan Cardoso, Letícia Maciel, Lígia Guimarães, Luciano dos Santos, Liliane Cutrim, Mariana Salgado, Murilo Azevêdo, Roberth Meireles, Rayssa Oliveira, Sansão Hortegal, Welbert Queiroz

REVISÃO DE TEXTO Carla Morais

FOTOS

Ana Paula Coelho, André Souza, Áurea Everton, Caroline Ribeiro, Cláudio Mendes, Diniz Costa, Érica Muniz, Josiane Mendes, Marileide Lima, Sansão Hortegal, Thais Fernanda

TRADUÇÃO Carol Veloso, Murilo Azevêdo

COLABORAÇÃO Raila Maciel

IMPRESSÃO Gráfica Ronda Tiragem 30 mil exemplares

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

7


Especial SBPC

1

2

3

4

1 - A Secretária Executiva da 47ª Reunião da SBPC em visita às obras do evento científico 2 - Avaliação do concurso Jovem Cientista 3 - Abertura da 47ª Reunião Anual da SBPC no Maranhão 4 - Stand de divulgação e promoção da 64ª Reunião Anual da SBPC na Multifeiras 5 - O então Secretário Regional da SBPC José Maurício Bezerra e o Reitor da UFMA Natalino Salgado, na inauguração da atual sede da Secretaria Regional da SBPC em 2011

5

A SBPC no Maranhão Um instrumento do desenvolvimento científico no Estado

E

TEXTO: ROBERTH MEIRELES FOTOS: ARQUIVO PESSOAL DO ENTREVISTADO

m maio de 1948, um grupo de cientistas e amigos da ciência decidiu fundar no Brasil uma sociedade que, baseada na noção de progresso, pensasse a ciência nos moldes das que já existiam em outros países. O movimento em prol do Progresso da Ciência, iniciado na cidade de São Paulo, se propagou rapidamente, e, anos depois, possuía unidades regionais espalhadas por todo o país. Atualmente, existem, no Brasil, 98 sociedades científicas associadas e sociedades regionais que, juntas, totalizam 6 mil sócios ativos, entre pesquisadores, docentes, estudantes e amigos da ciência. No Maranhão, a unidade regional da SBPC foi inaugurada em 1982 e, desde então, vem desempenhando um papel fundamental para o avanço e o fomento das pesquisas, e da própria construção de uma cultura científica no Estado. O atual secretário regional da SBPC no Maranhão, Luiz Alves, relembra dois momentos considerados por ele célebres, em que a regional cumpriu seu papel de forma persistente. Um deles foi o caso da manutenção da Fundação de Amparo à Pesquisa (FAP) e, o outro, a realização da 47 ª Reunião Anual da SBPC que aconteceu em São Luís no ano de 1995.

8

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Luiz Alves conta que o segundo momento, em que a regional obteve um grande destaque, foi a realização da reunião em 1995 e, posteriormente, o seu legado. “A cultura do fazer ciência, em 1995, ainda era muito incipiente, já que a própria imagem do cientista era algo muito distante da realidade”. A partir da reunião entre diversos profissionais, estudiosos e atores da sociedade, providenciada pela SBPC de 1995, São Luís deu um salto no que diz respeito ao desenvolvimento de ciência e tecnologia. “A troca positiva entre estes atores deu força para que a regional mantivesse sua existência e fizesse com que a sociedade maranhense entendesse de uma vez por todas que a ciência deve contribuir diretamente para o desenvolvimento do povo, sendo que esta não deve estar presente apenas na academia, mas desde as primeiras séries da educação básica”, completa o secretário regional da SBPC no Maranhão. Inauguração da unidade regional da SBPC no Maranhão, durante a 47ª Reunião da SBPC (foto à esq.)

Foi durante a 47 ª reunião da SBPC que a regional ganhou sua sede própria, localizada no antigo Centro de Estudos Básicos (Ceb). A mudança definitiva para atual sede, situada no prédio Castelo Branco, na Cidade Universitária da UFMA, só ocorreu em 2011. De acordo com o conselheiro da regional no Maranhão, José Maurício Dias Bezerra, a Reunião Anual da SBPC de 1995 promoveu a reorganização da Instituição para o progresso da ciência no Estado. Ele exemplifica que a Caravana da Ciência foi uma atividade em que alunos e professores percorreram o interior do Estado levando experimentos práticos e realizando eventos de divulgação em prol da ciência. A própria realização do já consagrado evento anual de ciência do Brasil, a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT), foi um dos primeiros eventos fomentados pela regional da SBPC no Maranhão, que continua até hoje dando total apoio à realização da semana científica no Estado. Por isso, o Estado vem alcançando destaque pelo envolvimento de um número cada vez maior de pessoas na pesquisa científica.

Os cursos de pós-graduação são outro legado, frutos da reunião da SBPC. Eles surgiram, em maior número, após a realização da Reunião Anual de 1995, que, com incentivo da regional, propuseram um novo cenário para a ciência no Estado. O resultado da proposta, que usava como base sustentadora a carência de uma cultura científica no Maranhão, pode ser observado atualmente no aumento contínuo de especialistas,

O escritor Josué Montello (à dir.) e o antropólogo Darcy Ribeiro (à esq.) durante a realização da 47ª Reunião da SBPC em São Luís

Inauguração da atual Secretaria Regional da SBPC, em 2011, com a presença dos conselheiros e do então secretário (à esq. na foto)

mestres e doutores que não necessitam sair de suas cidades para realizarem seu aperfeiçoamento. A consequência disto tudo é o crescente volume de pesquisas desenvolvidas por estes profissionais que, agora, mais qualificados, pretendem mostrar a ciência produzida no Maranhão quando todos os olhares interessados no progresso da ciência no Brasil estarão voltados para o Estado, durante a 64 ª reunião anual da SBPC.

In memorian, o presidente de honra da SBPC, Aziz Ab’Saber, na abertura de uma das mesas que compôs a programação da SBPC em 1995

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

9


Especial SBPC

ESPAÇOS DA 64ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC SBPC JOVEM A SBPC Jovem é realizada desde 1993 e nasceu da necessidade de aproximar a ciência e a escola. Na 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), o espaço da SBPC Jovem trará uma programação com diversas atividades que objetivam proporcionar o desenvolvimento científico e cultural aos jovens, alunos das escolas públicas e privadas do ensino básico, médio ou técnico. Com o tema “Trilhando saberes e saberes e sabores”, a SBPC Jovem promoverá intercâmbio de conhecimentos por meio de oficinas, minicursos, ciclo de palestras, exposições, mostras de vídeos, entre outras.

SBPC Cultural A valorização da cultura é um dos focos centrais da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Dessa forma, as atividades culturais terão lugar especial durante os cinco dias da reunião da SBPC em São Luís. Privilegiando a expressão regional, a reunião trará neste espaço diversas atividades que incluem shows, apresentações e manifestações locais. Para os participantes da 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, será uma oportunidade de entrar em contato com a cena cultural do Estado em um momento em que esta se encontra aquecida devido às festividades pelo quarto centenário de São Luís.

ExpoT&C Uma das maiores mostras de ciência também fará parte da 64ª Reunião Anual da SBPC. A ExpoT&C reunirá ciência, tecnologia e inovação (C,T&I), com a participação de centenas de expositores, como universidades, institutos de pesquisa, agências de fomento, entidades governamentais e outras organizações interessadas em apresentar novas tecnologias, produtos e serviços. Com espaço de 6 mil metros quadrados e capacidade para 64 stands, serão montadas tendas para a exposição de mostras científicas de inovação e tecnologia. A ExpoT&C é, sem dúvida, uma excelente oportunidade para divulgação de produtos e serviços, socialização e compartilhamento de tecnologias. O acesso às exposições deste espaço da SBPC são gratuitas, livres para inscritos ou não inscritos, com exceção dos minicursos, que requerem matrícula antecipada devido ao limite de vagas.

ENAPET O Encontro Nacional do Programa de Educação Tutorial (ENAPET) é um evento anual que reúne todos os grupos PET para discussões e deliberações acerca do programa. Participam do ENAPET todos os integrantes discentes do programa (bolsistas e não bolsistas), tutores e interlocutores, além de representantes do ministério da educação responsáveis pela sua gestão. O XVII ENAPET, que será sediado este ano na Universidade Federal do Maranhão, traz o tema “Educação Tutorial: novos rumos, novas fronteiras”. O evento conta com uma programação que inclui palestras, debates, oficinas, apresentação de trabalhos (painéis e simpósios) e grupos de discussão. Por razões históricas, o ENAPET ocorre concomitantemente com a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Sua primeira edição aconteceu em 1996, durante a 48ª Reunião da SBPC, na cidade de São Paulo, cujo objetivo era ampliar os conhecimentos entre os grupos e possibilitar a troca de ideias sobre o Programa. Em termos de organização e estrutura o ENAPET é autônomo. A programação do evento é toda voltada para questões internas do grupo, como produção acadêmica dos estudantes dentro dos grupos PET ao qual estão inseridos, mesas-redondas para discussão de questões institucionais e/ou de relevância para os PETs, grupos de trabalho para discutir a gestão do programa, entre outras atividades.

10 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Especial SBPC

O equilíbrio entre o saber científico e o saber tradicional TEXTO: ESTER MARQUES

D

esde sempre, a relação entre o saber tradicional e o saber científico foi uma relação tensional e, considerada por muito tempo, narrativas incompatíveis por terem naturezas diversas, sistematizações e regras de legitimação diferentes, assim como comprovações diferenciadas - definidas pelo século das Luzes -, como o século da razão. A necessidade de separação dos saberes foi uma exigência dos enciclopedistas Diderot, D’Alembert, Rousseau e Montaigne, por exemplo, que exigiam um saber focado somente na razão humana e eram contra todas as narrativas orais, tradicionais ou consideradas místicas e religiosas, originárias, sobretudo, dos grupos sociais populares. É o Iluminismo que dá expressão à modernização cultural com o seu inconformismo revolucionário por meio da fundamentação da autonomia da razão, instituída como instrumento capaz de libertar o homem da ignorância, do fanatismo, do obscurantismo e da superstição; que promove uma aversão profunda ao princípio da autoridade tradicional por esta se apoiar, muitas vezes, em pretensas tradições históricas não comprovadas; que acredita na crença de uma ciência universal como um imperativo de regulação da natureza física e da natureza humana e, que considera como norma última da conduta humana, as paixões em toda a sua pureza original. Deste modo, com o movimento progressivo de secularização e racionalização da experiência, do desencantamento das concepções tradicionais do mundo e do esta-

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

11


A mudança de visão restabeleceu o saber tradicional que passou a ser pensado pelas ciências humanas e sociais, a partir de uma epistemologia ou fenomenologia do senso comum.

belecimento das diferentes esferas de valor tão bem formulados por Weber, a noção de cultura deixa de estar relacionada ao trabalho com a terra na sua relação biológica com a natureza para ser pensada como sinônimo de sociedade e de civilização, e consequentemente, vinculada à noção de cultivo do corpo, mas também à noção de espírito ilustrado. Ao longo desse processo, uma dicotomia torna-se habitual: de um lado, as atividades denominadas nobres ou superiores, consideradas como culturais e, do outro, as coisas cotidianas e práticas, desprovidas de qualquer aura intelectual e consideradas práticas populares. Essa separação, além de desqualificar os saberes tradicionais vistos como patrimônio material/imaterial original do homem em favor de uma lógica científica, também desqualificou a criatividade, a diversidade e a pluralidade desse tipo de saber que sempre esteve vinculado à cultura local como base de sua funcionalidade e existência. A situação só começou a mudar no século XIX com o movimento romântico, que passou a utilizar esses saberes como fonte de inspiração e de criação e, posteriormente, na década de 60 do século XX, quando houve por parte da academia uma reviravolta na forma de interpretar esses saberes – já não mais com o caráter positivista da época, mas a partir de um viés interpretativo ou hermenêutico, naquilo que passamos a denominar de virada linguística.

A mudança de visão restabeleceu o saber tradicional que passou a ser pensado pelas ciências humanas e sociais a partir de uma epistemologia ou fenomenologia do senso comum. Nesta perspectiva, o saber científico com as suas características – produzido, sistemático, controlado, contínuo e com necessidade de comprovação –, passou a dialogar com o saber tradicional, cuja lógica é a da funcionalidade de um tempo e de um espaço atemporais. DOIS DIÁLOGOS, DUAS LÓGICAS O diálogo cultivado pelas duas lógicas se tornou a base fundamental para pensar problemas como a cultura, o meio ambiente, a sustentabilidade econômica, as tecnologias sociais, a inovação e a promoção de novas áreas do saber e o desenvolvimento de mecanismos para a superação das desigualdades sociais, políticas e culturais, por exemplo. Mas, se para nós, o saber científico é uma narrativa racional, baseada nos argumentos da observação e da interpretação da realidade, o que identifica e legitima o saber tradicional? Inicialmente, o saber tradicional é resultante da experiência baseada na palavra oral ou na palavra viva como bem a definiu Platão, porque cada um dos momentos da cadeia de narração é um processo sempre renovado e de reinterpretação da tradição, o que permite, ao mesmo tempo, mantê-la atual, impedindo a sua fixação e o seu imobilismo. Daí, a narrativa tradicional ser a maneira privilegiada de transmissão dos saberes e das normas herdadas do passado. Deste modo, aquele que transmite os saberes é também o que dá o testemunho da experiência, se legitimando como uma autoridade enunciativa, representante fiel dos antepassados de quem recebeu a responsabilidade e o poder para falar em nome de todos. Por isso, o discurso da experiência tradicional impõe-se a todos de forma indiscutível e incontestável porque se fundamenta no senso comum e, também, no bom senso. Por isso, o saber tradicional é sempre coletivo, fundamentado na capacidade que cada um possui de se tornar testemunha e elo da cadeia de transmissão dos saberes que a memória coloca nas suas bocas, num ciclo que alimenta permanentemente a experiência. Esta força enunciativa funciona como uma característica do processo de pertencimento dos sujeitos a uma comunidade concreta e particular de mundo, uma comunidade de vida e de destino porque só é válido no quadro dessa comunidade para os que nela foram iniciados e assim adquiriram as suas marcas identitárias.

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 12 Revista 12


“Aquele que transmite os saberes é também o que dá o testemunho da experiência, se legitimando como uma autororidade enunciativa, representante fiel dos antepassados de quem recebeu a responsabilidade e o poder para falar em nome de todos”

SABEDORIA SIMBÓLICA É da sua natureza oral que o discurso da tradição tem a força de se renovar e de se atualizar em cada processo de transmissão. Por isso, o que valoriza este discurso não é a exatidão e o rigor material das formas discursivas, mas a capacidade de atualização e de renovação de um sentido que se mantém inalterado através das variantes produzidas por cada uma das suas enunciações. Desta maneira, o saber tradicional é baseado na sabedoria, não uma sabedoria formal baseada numa competência pragmática e racional, mas uma sabedoria baseada, segundo o antropólogo americano Clliford Geertz, “na vida como um todo, já que o mundo é a sua autoridade”, disse. Assim, apesar de estar fundamentado na experiência cotidiana da qual se retira a sua substância principal, o saber tradicional se caracteriza por seu conteúdo sagrado, ou seja, por sua capacidade de fundar o mundo a cada transmissão, constituindo, desta forma, uma ruptura na homogeneidade do tempo e do espaço comum, permitindo a cada um re-conhecer-se como igual, a partir do re-conhecimento do outro, dentro da vida grupal, de uma vivência coletiva que é preenchida no decorrer da produção simbólica, envolvendo fortes laços de solidariedade e identidade. O saber tradicional parte de uma epistemologia do senso comum, visto por Geertz como um sistema cultural, construído historicamente e, portanto, sujeito a padrões de juízo também historicamente definidos e validados pela convicção de quem o possui. Uma epistemologia oriunda filosoficamente do que Husserl, Schütz e Merleau-Ponty denominam de uma fenomenologia do cotidiano, trabalhada sob as bases da experiência comum. Neste caso, a sabedoria coloquial julga e avalia a realidade com bom senso, ou seja, lida com os problemas cotidianos com critério, inteligência, discernimento e reflexão prévia. O bom senso, assim, é uma capacidade que o sujeito possui de captar as realidades básicas por meio da experiência e de chegar às conclusões sensatas, sem fazer distinções entre a ordem natural, o domínio da linguagem, o mundo da cultura e a esfera da consciência individual. Não há diferenciação brusca e racional entre um universo material e um universo simbólico, visto que as necessidades orgânicas e as morais confundem-se no cotidiano da vida grupal, dando-lhe um realismo prático, um senso vivo dos limites e das possibilidades de ação que converge para uma sabedoria cotidiana. Esta sabedoria coloquial tem como características, segundo Geertz, a naturalidade, a praticabilidade, a leveza, a não-metodicidade, a acessibilidade e a simplicidade, o que dão ao bom senso uma lógica própria de interpretação do mundo. Assim, por exemplo, a praticabilidade não tem a ver necessa-

riamente com utilidade, no sentido pragmático do termo, mas com sagacidade. Ser prático, nesta lógica, não significa obter resultados materiais das situações, mas apreender estas situações como demandas do intelecto, como resultados de um esforço da razão para construção de uma consciência prática dos fatos; para que o sujeito saiba exatamente o que é quê, quem é quem em cada contexto. O bom senso permite, então, traduzir o sistema cultural por meio de um sistema de persistência, no qual símbolos, significados, concepções, formas e textos constituem uma estrutura imaginativa da sociedade. Representa um esforço para aceitar a diversidade entre as várias maneiras que os seres humanos têm de construir suas vidas, no processo de vivê-las. É neste contexto que a Ciência e a Cultura podem desenvolver processos de sedimentação de suas memórias, que reconheçam seus certos rituais de celebração, que identifiquem as suas trocas simbólicas, que reavaliem as suas contradições internas e dinamizem o seu fundo arcaico, e que reforcem cada vez mais o seu processo de reconhecimento diante do mundo, dos outros e de si mesmos.

Francisca Ester de Sá Marques Atualmente é Assessora de Comunicação da UFMA e Professora Adjunta do Departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão. Possui Mestrado em Comunicação e Cultura pela Universidade de Brasília e é Doutoranda em Ciências da Comunicação pela Universidade de Lisboa, em Portugal. É autora de vários artigos e do livro Mídia e Experiência Estética na Cultura Popular. Faz parte da Comissão Maranhense de Folclore e do Conselho Estadual de Cultura. Também é Produtora Cultural e presta serviços nas áreas de elaboração de projetos, consultoria, organização de eventos e análise de perfis e cenários culturais.

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 Revista

13 13


Ofício - Parteira

“Tenho orgulho de ser parteira”, revela mãe Sinhá.

Parteira: Ofício de dedicação e resistência Mãe Sinhá, entre muitos sorrisos, diz que já perdeu a conta de quantos partos já fez

ofício é antigo e todo mundo conhece. As parteiras existem há muitos anos e têm em suas mãos um compromisso com a vida. Em algumas regiões viajam a pé, a cavalo, por rios ou no meio da mata. Às vezes, devido às dificuldades de locomoção, passam vários dias na casa da parturiente, esperando pelo parto. Assim é a história de dona Maria de Lurdes Macedo que, com 91 anos de idade, já perdeu a conta de quantos partos realizou. Hoje, com as mãos calejadas, relembra da sua primeira experiência, com o parto de sua amiga Conceição. Daí por diante não parou mais: vizinhos, netos e bisnetos vieram ao mundo por suas mãos. Apesar das dificuldades na hora do nascimento, dona Sinhá, como é conhecida, conta com orgulho que nunca perdeu uma criança, mas passou por situações difíceis em gravidez de risco. Nessa hora, clamava por sua mãe, em pedido de ajuda: “Valei-me minha mãe, valei-me minha mãe”, como sinal de fé naquela que lhe prometeu, em vida, sempre lhe atender. Parteira por opção e por amor ao ofício, mãe Sinhá, como é chamada por aquelas que ela ajudou a dar à luz, recebia pelo serviço cerca de cinco tostões (moeda da época). A maioria das pessoas não tinha condições de pagar pelo “serviço” e dona Sinhá aceitava agrados ou, às vezes, quando a amizade era muito forte, não recebia nada. Hoje, nas grandes cidades, em tempos de maternidades e mecanismos cada vez mais sofisticados, as parteiras estão desaparecendo e sendo substituídas por profissionais da medicina. Na família de dona Sinhá, por exemplo, os filhos deixaram

de lado a tradição de continuar o ofício da mãe e seguiram por caminhos bem diferentes. Ela, em contrapartida, não se entristece: “cada qual representa o seu papel na Terra e cada um tem o seu dom”, afirma. Por outro lado, as parteiras ainda são encontradas nas cidades do interior, que não possuem hospitais e nem maternidades para atender a população. São elas que dão assistência às mulheres que, mesmo tendo o direito constitucional de assistência ao parto, não o possuem.

O

TEXTO: CAROLINE RIBEIRO

Cada qual representa o seu papel na Terra e cada um tem o seu dom

Mais do que um parto, as parteiras ajudam a trazer ao mundo quem há muito era esperado. É um trabalho de dedicação, zelo e responsabilidade. O compromisso da parteira não é só com a mãe, pois é ela quem cuida do recém-nascido durante os oito primeiros dias de vida. É ela quem dá os primeiros banhos e orienta as parturientes nos cuidados com a criança. Para dona Sinhá, ser parteira é um dom que está fadado ao esquecimento, mas que tem o seu valor reconhecido por quem ainda prefere ou precisa desses serviços. E, para ela, esse reconhecimento é a maior recompensa que pode receber. “O que vale é a amizade que fica”, conta sorrindo.

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 14 Revista 14


Grandes eventos guardados na história da UFMA e dos 400 anos de São Luís Neste primeiro semestre, a Universidade Federal do Maranhão foi palco de uma série de eventos que marcaram a história da Instituição e de São Luís, que comemora seus 400 anos de fundação TEXTO: ANISSA AYALA FOTOS: ASCOM/UFMA

A

UFMA sediou dois grandes eventos sobre religiões que movimentaram toda a comunidade acadêmica, um deles foi o I Colóquio Internacional com tema Cem Anos de Publicação da Obra: As Formas Elementares da Vida Religiosa, cujo objetivo era relembrar a importância do trabalho de Émile Durkheim e, assim, discutir a sua aplicabilidade no mundo contemporâneo. Outro evento marcante foi o XIII Simpósio Nacional da Associação Brasileira de História das Religiões – ABHR, que reuniu estudiosos da área das Ciências Sociais de vários Estados. Um momento de discussão e compartilhamento de estudos científicos sobre religião, promovendo o intercâmbio entre investigadores e estudantes das diferentes áreas. Destacamos, também, o I Encontro de Rádios Comunitárias – ABRAÇO; o lançamento do novo Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas – SIGAA; a acolhida da Cruz e do Ícone de Nossa Senhora, principais símbolos da Jornada Mundial da Juventude – JMJ; o VI Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas – ABRAPCORP; a IX Con-

ferência sobre a Prevenção da Doença Renal em populações desfavorecidas na América do Sul e do Caribe; a 10ª Semana Nacional de Museus, com participação do memorial Cristo Rei; I Microsoft Day; a 19ª edição da Ação Global; o IV Seminário Internacional de Educação Fenomenológica e Filosofias Existenciais; 35º Festival Guarnicê de Cinema; II Oficina UFMA-UFF/ONU Habitat; a 5ª Conferência Brasileira de Comunicação e Tecnologias Digitais, que contou com a participação de renomados pesquisadores da área de tecnologia e inovação, dentre eles Sebastião Squirra (UMESP); entre tantos outros eventos importantes para o fomento do conhecimento. Um dos momentos que ficaram na lembrança dos pesquisadores do Centro de Ciências Sociais da UFMA foi o lançamento de doze livros, frutos de teses e dissertações desenvolvidos por meio do Programa de Apoio à Publicação de Livros do CCSo, que visou incentivar a editoração e a publicação de livros. Todas as obras abarcam as inquietações, estudos e resultados de pesquisadores que contribuíram para a pesquisa científica no estado do Maranhão e no Brasil.

LIVROS LANÇADOS NO CCSo >> Rádios Comunitárias no Maranhão: história, avanços e contradições na luta pela democratização da comunicação – Ed Wilson Ferreira Araújo >> Os fluxos internacionais de capitais e a fragilidade fiscal da União no período de 1990/2011 – José Lúcio Silveira >> Singularidades do espaço transitório: um estudo a partir de quebradeiras de coco babaçu – João Claudino Tavares >> Concepções de Matemática do professor em formação: outro olhar sobre o fazer matemático – Raimundo S. de Castro >> Diluindo Fronteiras: hibridizações entre o real e o ficcional na narrativa da telenovela – Larissa Lêda Fonseca Rocha >> Pobreza, resistência e enfrentamento no Estado do Maranhão – Lília Penha Viana Silva >> A Ciência da Informação em revista nos anos 90 no Brasil – Cláudia Maria Pinho de Abreu Pecegueiro >> Políticas de formação do educador no Maranhão – Cacilda Rodrigues Cavalcanti >> Hospitalidade: perspectiva de uma nova abrangência para o campo das relações públicas – Esnel José Fagundes >> Jovens imaginários de paz e televisão – Vera Lúcia Rolim Salles >> O desenvolvimento desigual da agricultura: a dinâmica do agronegócio e da agricultura familiar – Benjamin Alvino de Mesquita

I Colóquio Internacional

19ª edição do Programa Ação Global

>> Discurso jornalístico, política e liderança no Brasil (1985-1990) – Joanita Mota de Ataíde

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

15


Foto: Érica Muniz

Produção de Alimentos

Cobre em aguardentes: estudo revela a presença da substância na produção de cachaças no Maranhão Pesquisador da UFMA afirma que os problemas vão muito além de questões estruturais ou de capacitação, mas também de higiene durante a produção do produto, e o pior, é que muitos não sabem as complicações que isso pode trazer ao organismo TEXTO: ANA PAULA COELHO

A

pesar da longa tradição da cachaça, no Maranhão, não há uma produção de destaque nos grandes circuitos por conta de uma série de fatores, sendo que o principal deles é que os produtores não possuem registro junto aos centros reguladores. Existe produção, existe demanda, porém não há o registro desses produtos nos órgãos públicos, o que gera desconfiança no mercado. Falta também a padronização dos produtos e a regulamentação dos alambiques. A maior parte desses alambiques fica na região do Médio Sertão do Maranhão, local no qual o Sebrae tem uma maior atuação de incentivo à produção de cachaça dentro das normas e da legislação do produto. Segundo Mauro Borralho, gerente do Sebrae, o maior desafio para o Estado é a regulamentação dos produtos, um processo difícil por envolver diversos fatores. Ele aponta que muitos produtores não possuem recursos próprios para investir em melhores estruturas e nem todos têm a capacitação exigida, tanto para gerenciar o negócio quanto para produzir o destilado. Estudos ainda assinalaram características desses produtores participantes dos projetos da instituição e mostraram o perfil deles. A maioria não tem a produção de cachaça como principal atividade, o que pode prejudicar a questão do investimento e atenção à qualidade do produto.

16 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Os problemas vão muito além de questões estruturais ou de capacitação, há também a falta de higienização. O químico industrial e professor da Universidade Federal do Maranhão, Sílvio Marinho, realizou pesquisas sobre a presença de cobre nas cachaças da região do Médio Sertão. Ele observou que a não higienização do destilador, que geralmente é de cobre, resulta no acúmulo de uma substância dentro do próprio aparelho chamada azinhavre (didróxido de Cu-II), que é tóxica e tem cor azul-esverdeada, e libera o cobre durante o processo de destilação. Várias amostras

desse estudo mostraram altos índices do metal, todas com níveis acima do que a legislação brasileira permite. “A legislação é tolerante, pois permite até 5 ppm (partes por milhão por litro da bebida). Isso já é um agravante porque a legislação internacional diz que esse quantitativo deve descer para 2 ppm. Então, se quisermos escoar a nossa produção para o exterior, temos que tomar as medidas cabíveis e produzir uma bebida de qualidade”, ressalta. Das 30 amostras do pesquisador, a menor quantidade de cobre encontrada foi de 9 ppm e a maior foi 43 ppm, tendo uma média de 15 ppm.

COMPLICAÇÕES DA INGESTÃO DO METAL PRESENTE NAS CACHAÇAS O cobre é um metal que, em grandes quantidades no organismo, altera o metabolismo, por meio de reações enzimáticas, e, com o passar do tempo, afeta o fígado, causando doenças como a cirrose, levando a óbito. O que ocorre é que a eliminação do metal não é realizada de forma imediata pelo corpo, acarretando o seu acúmulo no organismo. O professor Sílvio aponta para o fato de que o maior perigo está no consumo frequente de altas quantidades do metal, como é o caso das pessoas da região que consomem frequentemente o destilado. O que poderia solucionar esse problema seria uma maior preocupação com a higiene dos equipamentos e da própria estrutura. Além disso, deve haver uma

Silvio Carvalho Marinho Doutor em Química (Universidade Federal da Paraíba-2010), Mestre em Química pela Universidade Federal do Maranhão (2005). Especialista em Tecnologia de Alimentos (Universidade Federal do Maranhão-2011), Especialista em Educação a Distância (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial-2012) e Graduado em Química Industrial (Universidade Federal do Maranhão-2001). Pesquisador do Grupo de Química de Óleos Essenciais e Alimentos da UFMA. Tem experiência na área Química, com ênfase em alimentos e bebidas (Bromatologia), águas de recreação (piscinas) e Química dos Produtos Naturais (plantas medicinais). Professor Substituto do Departamento de Tecnologia Química da UFMA. Professor do Curso de Nutrição da Faculdade Santa Teresinha-CEST. Professor do Curso de Especialização Lato Sensu "Gestão da Segurança de Alimentos" (Pós-Graduação da Rede em EAD do SENAC).

atenção especial com a água utilizada no processo, que deve ser bem tratada e livre de contaminações e impurezas. São cuidados que parecem simples, mas que representam muito, tanto para a qualidade do produto e sua viabilidade no mercado quanto para a saúde da população que consome esses produtos. A própria produção da cachaça é algo cultural em muitas regiões do Estado, porém, como não houve avanço tecnológico no processo de produção e, consequentemente, não houve especialização dos produtores.A bebida é produzida sem a devida separação do que é cabeça, coração e calda. A cabeça, a primeira parte, possui maior teor alcoólico e grande quantidade de impurezas,

já a calda, última parte, possui menor teor alcoólico (por volta de 14 por cento) e uma maior quantidade também de impurezas. O coração é a principal parte, pois possui maior equilíbrio em relação ao teor alcoólico, acidez e poucas impurezas (em uma boa cachaça, nenhuma), e é ela que deve chegar ao consumidor. Quando essa diferenciação e divisão não são feitas, compromete a qualidade do produto de forma significativa e pode, inclusive, aumentar o teor de cobre, e também o teor alcoólico, que pode chegar a mais de 50 por cento na bebida.

é realmente discutível, porém, há quem produza cachaça dentro dos padrões exigidos. Muitos produtores estão buscando o registro e se especializando, e, dessa forma, valorizam o seu produto. Alguns chegam a apresentar cachaças com variedade de cor, aroma e idade. Muitas são envelhecidas em barris de madeiras especiais, como o jatobá e o carvalho. Os esforços para valorizar a produção de cachaça no Estado estão dando cada vez mais resultados. A última vitória do setor foi com a primeira cachaça registrada do Estado em março de 2011. É a cachaça Vale do Riachão, produzida na região do município de Sucupira do Riachão. Segundo o próprio dono do negócio, Seu Erivan, a produção da cachaça é um hobby que começou pela história da cachaça produzida pela família de sua esposa e que ele deu prosseguimento por gostar do trabalho. Ele disse que para conseguir o registro investiu na modernização do alambique e contou com a ajuda de consultores de Minas Gerais. O resultado é uma cachaça comercializada na região e no Piauí, e vem se expandindo para outras regiões, inclusive para São Luís.

Na capital, as cachaças mais consumidas vêm de outras regiões, como Santo Antônio dos Lopes, na região do Médio Mearim, no centro do Estado. São cachaças que passam pela mesma situação das outras. Porém, a forma de consumo é diferente. A cachaça, além de ser consumida pura, é usada também em preparos com frutas ou em licores. Nesses preparos, a fruta e os demais ingredientes como a cachaça, passam meses em processo de infusão, e depois, para serem consumida, é necessário colocar mel ou algum outro elemento açucarado, deixando-a doce e mais licorosa, e assim, encontramos uma diversidade maior de sabores. A produção da cachaça teve um aumento considerável em decorrência dos incentivos para se aumentar a qualidade do destilado. De certa forma, houve avanços no setor, porém a realidade predominante é de alambiques precários. Ainda há muito que avançar para que o Maranhão tenha mais e mais cachaças registradas, até porque o Estado tem que saber produzir e tem que saber apreciar. O mercado deve se expandir nos próximos anos e os circuitos de cachaças já possuem lugar para os sabores maranhenses.

LEGISLAÇÃO DA PRODUÇÃO DE CACHAÇA Os trabalhos de incentivo visam às questões de licenciamento do produtor para a comercialização de forma segura e legal. Para obter o registro e as licenças, é necessário ter um alambique dentro das normas da legislação de produção de cachaça. São documentos que exigem investimento para o negócio, bem como é de extrema importância a capacitação dos produtores. Como muitos deles não são regularizados, por diversos motivos (falta de recursos, de documentação, ou, até mesmo, de interesse), a cachaça acaba escoando para as cidades próximas para o consumo local ou mesmo para cidades do Piauí. Esse comércio de bebidas não registrado no Maranhão revela um perigo à saúde, a partir do momento que as produções de diversos lugares são misturadas ou até mesmo diluídas e vendidas em outras embalagens, chegando ao consumidor com um preço bem acima do inicial, feito pelo pequeno produtor. Desta forma, cachaças contaminadas e de má qualidade se misturam com cachaças não contaminadas e de melhor qualidade, e as pessoas não sabem o que consomem. A qualidade de muitos alambiques

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

17


Fotos: Josiane Mendes

Ofício - Cachaceiro

Seu Santos: “O alquimista do Maranhão” Organização e esmero pelo o ofício fazem dele um personagem intrigante do centro de São Luís

N

TEXTO: ANA PAULA COELHO

o centro de São Luís, mais precisamente na Rua Humberto Campos, número 25, encontra-se uma placa que diz: Ambulatório Santos. Trata-se de um casarão com porta larga que dá para uma pequena sala de comércio, onde trabalha Seu Santos, figura carimbada da cidade. É ali que vende as bebidas que ele mesmo produz manipulando frutas, especiarias e cachaças. Como é um ambulatório, é claro que ele também trabalha com alguns medicamentos, aplica injeções e, também, mede pressão. Muitos chegam lá sentindo dores e Seu Santos logo tenta identificar o problema e curá-los. A maioria dos seus pacientes são velhos conhecidos, mas, nem por isso, ficam sem levar bronca por não se cuidarem como deveriam. A história de Seu Santos é longa e cheia de reviravoltas. Ele nasceu na cidade de Arari, filho de libaneses comerciantes. Começou um curso de farmácia na capital, na antiga Faculdade de Farmácia e Odontologia de São Luís, mas teve que abandoná-lo para cuidar dos sobrinhos e da família, voltando, posteriormente, para a cidade natal. Lá, trabalhou como enfermeiro durante 27 anos, chegando a ser o médico e o cirurgião da cidade. Fez várias cirurgias, partos, receitou medicamentos e, sozinho, cuidou da saúde do município como médico, enfermeiro, cirurgião e farmacêutico.

Em 1976, retornou a São Luís com sua família e montou o ambulatório. Paralelo às suas atividades na pequena enfermaria, que mantém até hoje, ele possui, também, uma pequena fábrica de bebidas, localizada em sua casa, na qual prepara licores e outros produtos utilizando cachaças de Santo Antônio dos Lopes, Colinas e outras cidades próximas. Em sua casa há várias prateleiras com bebidas em processo de infusão ou curtição – processo no qual as frutas e ervas ficam durante meses ou até anos dentro de garrafas com cachaça –; caixas de materiais, como livros e outros objetos que ele guarda com muito cuidado, bem separadas e todas com etiquetas. Mais adiante, no fundo da casa, ele tem uma pequena edícula, onde ficam guardados mais materiais, mas estes são diferentes. Logo se vê nas prateleiras potes com tampas plásticas separadas por cor, diferentes tipos de rolha, várias garrafas vazias, algumas sacolinhas de papel – que ele mesmo faz para empacotar as bebidas vendidas –e uma série de detalhes que ele cuida pessoalmente. Seu Santos é dono e único funcionário da fábrica, ou seja, não há mais ninguém além dele. Ele é uma pessoa muito exigente e prefere fazer tudo sozinho. Ninguém que ouse mexer em seu trabalho! Esse é um dos detalhes mais interessante nesse senhor: a sua organização e carinho com o trabalho são surpreendentes, notados rapidamente quando se vê o capricho com que faz seus produtos e as embalagens

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 18 Revista 18


Nas prateleiras do Seu Santos há diversidade de gostos.

O OFÍCIO O processo de fabricação de bebidas parece simples. Seguindo o passo a passo, seria apenas misturar as frutas com a cachaça, deixar descansar por alguns meses e depois colocar um mel ou um xarope de açúcar. Mas é bem mais complicado. É necessário um tratamento especial com as ervas, paciência e conhecimento sobre a cachaça e a manipulação dos ingredientes. Durante uma conversa, ele revela a fórmula secreta da “Catuaba”, uma de suas cachaças mais vendidas. A sua filha, a poetisa Lúcia Santos, protesta, mas ele mesmo fala: “Muita gente já tentou fazer, mas ninguém acertou!”. São ingredientes simples, como cravo, canela, erva doce, catuaba e jatobá. Mas essa simplicidade engana, pois o ofício demanda trabalho e tempo. O açúcar colocado por meio do xarope após meses que o produto passa em curtição é o segredo para uma bebida doce com o sabor da cana e do álcool suavizado. Os licores contêm mais xarope, ao contrário de outras cachaças que levam bem menos, já que devem ser menos licorosas. A cachaça mais famosa de Seu Santos é feita seguindo uma receita que herdou da mãe e que depois a aperfeiçoou. É uma bebida que muitos conhecem como Meladinho, mas o seu cunhado foi quem a batizou com o nome Bom que Dói. Primeiramente, ele começou a fazer a bebida para uso caseiro e, anos depois, começou a vendê-la conquistando clientes de

diferentes paladares. Existem várias formas de se apreciar a cachaça: pura, envelhecida num barril de pequi ou de jatobá, ou mesmo em preparos, como é o caso dos licores. Homens com esse trabalho e conhecimento são os que valorizam a cachaça e o seu potencial. É isso que faz com que sempre se tenha boas histórias para contar sobre a cachaça. São anos de luta e muita experiência em tudo que faz. Mesmo com quase 90 anos de história e comemorando 62 anos de casado, Seu Santos continua trabalhando, bem menos do que antes, é verdade, mas, com certeza, feliz: “Até hoje eu tô aí, mais feliz, mais pobre, mas, com certeza, feliz do que eu era antigamente!”, confessou Seu Santos, “o alquimista do Maranhão”.

Até hoje eu tô aí, mais feliz, mais pobre, mas, com certeza, feliz do que eu era antigamente! confessou Seu Santos, “o alquimista do Maranhão”.

em sua pequena fábrica. O esmero é tamanho no ofício de Seu Santos. O ofício de um produtor de bebidas não é nada fácil. Onde se consegue encontrar, hoje em dia, um licor de gengibre feito na medida certa, sem ardor e com o sabor surpreendente da raiz? Mesmo estando mais velho e trabalhando menos do que costumava, ele não consegue deixar de ser cuidadoso com seu trabalho.

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 Revista

19 19


Tecnologias Sociais

Forno solar: uma alternativa viável de enfrentamento à pobreza Além do baixo custo para a fabricação, o forno solar torna possível cozer alimentos sem que eles percam as suas propriedades nutricionais

U

TEXTO: RAYSSA OLIVEIRA • ILUSTRAÇÃO: ANDRÉ SOUZA

ma caixa de papelão é dividida e forrada com papel, retalhos e palhas de banana e, no final, é coberta com papel alumínio. Nela, são colocadas panelas pretas tampadas, com o alimento desejado, tais como arroz, feijão, carne, frango, ovos, entre outros. A caixa é tampada com um plástico grosso, enlaçada com uma liga em volta e, posteriormente, posta ao sol durante cerca de 6 horas, e voilà: a comida está completamente preparada, quente e pronta para ser consumida. Esta narrativa parece mentira, mas não é. Trata-se do forno solar, uma cozinha sustentável de baixo custo e com simpli-

cidade de fabricação, que torna possível cozer alimentos sem que eles percam as propriedades nutricionais. Não é usado gás, lenha, nem energia elétrica. O calor que cozinha o alimento vem diretamente do sol. Inventado pelo naturalista Horace de Saussure, o primeiro modelo de forno data do ano de 1767, levando séculos para ser popularizado. Em São Luís, o Núcleo de Extensão da Vila Embratel (NEVE), interligado à Universidade Federal do Maranhão (UFMA), vem desenvolvendo este experimento e tem conseguido resultados muito positivos. As responsáveis pela produção e utilização do

forno solar são as próprias moradoras do bairro da Vila Embratel. “Este trabalho é muito importante para as comunidades mais necessitadas, pois poupa o tempo de quem precisa dar atenção à comida. Para quem não pode manter um forno a gás o tempo todo, este projeto é uma alternativa bastante viável, uma ótima forma de economizar durante grande parte do ano”, explica a coordenadora do NEVE, Maria de Fátima Costa Lobão. SUSTENTABILIDADE E ECONOMIA Além do baixo custo, o forno solar tem muita importância para a sustentabilidade. Segundo o Instituto Brasileiro

FORRANDO A CAIXA MENOR COM PAPEL DE ALUMÍNIO

PREPARANDO A CAIXA MENOR

lher (Isso facilita as dobraduras). Passar a ponta da colher fazendo pressão ao longo da linha pontilhada. 1. Começar colando no fundo da caixa todas as abas descoladas. Espalhar a cola com pincel ou espátula (ou um pedaço de papelão dobrado). Usar pesos como tijolos ou livros até a cola fixar. 2. Marcar a caixa nos 4 lados, por dentro e por fora, com uma linha pontilhada 20 centímetros acima do fundo. 3. Cortar com faca serrilhada ou estilete os quatro cantos da caixa até a linha pontilhada. 4.

5. Depois de criar os vincos sobre as linhas pontilhadas, dobrar para o lado de fora da caixa todas as abas, colando nos quatro lados. Depois de espalhar a cola com uma espátula, fixar as partes a serem coladas aplicando um peso até a cola segurar. (Usar cola branca ou até mesmo cola caseira). 6. Se ainda sobrarem pedaços das abas, criar vincos, dobrar e colar no fundo da caixa.

Depois de cortar, fazer vincos sobre as linhas pontilhadas usando régua e uma co-

Desenho em corte mostrando a caixa com as abas dobradas e coladas nas laterais e no fundo da caixa.

20 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

1. Aplicar cola nos 2 lados de cada canto interno da caixa. Aplicar também na base do canto. 2. Cortar 4 faixas de papel de alumínio de mais ou menos 8 centímetros de largura por 25 centímetros de comprimento. Dobrar ao meio com uma régua e aplicar sobre cada canto com a parte fosca do alumínio em contato com a cola 3. Cortar no canto da faixa de alumínio. Dobrar e colar nos lados de fora da caixa. 4. Com os 4 cantos já forrados, espalhar cola no fundo e nas paredes laterais internas da caixa, colando, em seguida, o papel de alumínio. Aplicar o papel de alumínio com a parte mais fosca para baixo, sobre a cola e a parte mais brilhante para cima.


de Geografia e Estatística (IBGE), a utilização deste produto por 30 por cento da população brasileira reduziria anualmente a extração de lenha para cozimento de alimentos em 5 milhões e 370 metros cúbicos, uma quantidade bastante significativa para o ecossistema, que sofreria menos com a colheita e com os gases de carbono liberados com sua queima. A moradora da Vila Embratel, Maria das Graças Araújo, é agricultora e frequentadora do NEVE, além de usuária do forno solar. Para ela, que passa o dia na rua, o suporte é muito vantajoso. “Deixo a comida dentro do fogão, no quintal, e saio para resolver meus problemas, fazer consultas, entre outras coisas. Quando volto, a comida está pronta. Economizo bastante com o uso do forno, apesar de ele poder ser usado somente quando há sol. O gás que guardo é usado durante a época de chuva. Se não houvesse o forno solar, gastaria duas vezes mais”, afirma. É assim, uma solução prática, econômica e sustentável para atender às famílias mais carentes.

Além do forno solar, o NEVE oferece uma série de cursos e atendimentos à comunidade, em parceria com a UFMA, como o acompanhamento de adolescentes grávidas até o nascimento da criança e, também, cursinho pré-vestibular, que acontecia até ano passado, ministrado por alunos da Universidade, gratuitamente. Fora isso, há vários cursos profis-

5. Passar sobre o alumínio um pano seco para reduzir as rugas e as bolhas de ar. Melhorando, ao mesmo tempo, a aderência da cola.

largura do que o tamanho do fundo da caixa menor para não ferir o forro de papel de alumínio. Furos e pregos de cima para baixo. Arredondar os 4 cantos para não rasgar o forro de alumínio. Essa chapa não deve encostar diretamente no fundo da caixa para não transmitir parte do seu calor para o fundo. Para garantir o isolamento térmico entre a chapa e o fundo, pregar em baixo no sentido do comprimento 3 pedaços de cabos de vassouras fixados por pregos que atravessam a chapa de cima para baixo através de pequenos furos. No caso de uma chapa de metal mais fina os cabos de vassoura ajudam a manter a chapa mais plana e mais resistente.

6. O papel de alumínio deve ser dobrado sobre as bordas da caixa e colado também nas laterais externas da caixa, pelo menos até a metade.

Maria de Fátima Costa Lobão Técnica em educação na Universidade Federal do Maranhão. Formada em Pedagogia pela UFMA e especialista em Educação Infantil pela Universidade Estadual do Maranhão. Coordena o Núcleo de Extensão da Vila Embratel (NEVE), desde 2003, junto a mais de dez professores, desenvolvendo atividades voltadas para a comunidade.

PREPARANDO A CAIXA MAIOR FAZENDO A CHAPA COLETORA QUE VAI NO FUNDO DA CAIXA MENOR No fundo da caixa menor vai a chapa metálica pintada de preto fosco sobre a qual colocam-se as panelas. Essa chapa coletora absorve a luz transformando-a em calor. A chapa coletora deve medir um centímetro a menos no comprimento e na

sionalizantes, como de manicure, de camareira, de mecânico; e cursos básicos, como informática básica, informática avançada e capoeira, entre outros. A intenção do núcleo é sempre ocupar os jovens e moradores da comunidade e dar a eles uma forma de aprendizado, para livrá-los da violência e das drogas, que são estigmas no bairro da Vila Embratel.

1. Comece colando no fundo todas as abas que estejam descoladas. Use um peso (tijolos ou livros) até fixar. 2. Marcar a caixa nos 4 lados por dentro e por fora, com uma linha pontilhada, 28 centímetros acima do fundo. 3.

Cortar nos 4 cantos até a altura

da linha pontilhada. 4. Depois de fazer vincos sobre as linhas pontilhadas usando uma régua e uma colher, dobrar as abas para dentro formando uma tampa sobre a caixa.

JUNTANDO AS CAIXAS 1. Colocar a caixa menor já forrada de alumínio centralizada sobre a tampa da caixa maior. 2. Marcar o contorno fazendo uma linha pontilhada com lápis ou caneta. Fazer isso sobre todas as abas de papelão que cobrem a caixa. 3. Fazer vincos sobre as linhas pontilhadas com uma régua e uma colher e, em seguida, dobrar para dentro da caixa cortando os excessos - as abas dobradas para dentro não devem ser maiores do que a profundidade da caixa menor, isto é, 20 centímetros. Dica: Para fazer os vincos com maior facilidade, emborcar a caixa (com a boca para baixo) sobre uma mesa com as abas abertas para os 4 lados.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

21


FAZENDO A SOBRETAMPA DE PLÁSTICO TRANSPARENTE

4. Duas das abas em lados opostos devem ser cortadas nas laterais para permitir o fechamento das 4 abas. Ao fechar as abas, fechar primeiro as inteiras e depois as cortadas.

Com a tampa colocada sobre as paredes da caixa grande, tomam-se as medidas para cortar o plástico da sobretampa. Atenção: Usar fita métrica ou trena É interessante arredondar os 4 cantos para evitar o efeito “ponta de gravata” que se prolonga além da base da caixa, quando a sobretampa está montada. O plástico transparente da sobretampa é idêntico ao plástico transparente que está pregado na moldura da tampa.

5. A caixa maior deve ainda ser pintada para tornar o papelão impermeável, aumentado assim sua vida útil. Pode-se também decorar a caixa fazendo desenhos ou colando figuras sobre as laterais pintadas (Nesse caso é bom aplicar um verniz transparente ou uma solução fina de cola branca para impermeabilizar as figuras).

FAZENDO A TAMPA DO FORNO SOLAR

A tampa é feita com 4 pedaços de cabos de vassoura aparafusados e pregados nos 4 cantos. O uso de cola branca além do parafuso pode tornar desnecessário o uso de pregos. Furo para a instalação dos barbantes de apoio da tampa. Barbantes esticados em forma de cruz criam um apoio para o plástico da sobretampa, evitando o contato com o plástico da tampa esticando abaixo. Isso garante a manutenção de um colchão de ar entre os dois plásticos criando isolamento térmico. Detalhe do corte a ser dado em cada ponta do pedaço mais longo dos cabos de vassoura. É aconselhável furar antes de usar pregos e parafusos. O uso de cola ou de um prego ao lado do parafuso evita que a outra peça gire livremente. Essa fixação extra é importante na hora de esticar os barbantes de apoio da sobretampa e na hora de pregar o plástico na moldura. Esticar o plástico transparente por baixo na moldura de cabos de vassoura dobrando e pregando por coma com tachinhas de sapateiro, grampos de pistola ou de grampeador de papel.

USANDO A SOBRETAMPA Retângulo de plástico transparente cobrindo todo o forno solar ( a sobretampa). Tampa com o plástico transparente esticado em baixo da moldura e pregando por cima com tachinhas. A sobretampa de plásticos transparente deve cobrir a tampa e descer pelos 4 lados da caixa maior até sua base onde é fixada por elástico, barbante, corda ou uma liga de borracha cortada de uma câmera de ar de pneu. Tira de borracha fixando a sobretampa de plástico em redor da base da caixa maior.

CORTE ESQUEMÁTICO DO FORNO SOLAR

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 22 Revista 22

1. Espaço de ar criando isolamento térmico entre a tampa pregada em baixo da moldura de cabos de vassoura e a sobretampa esticada por cima. 2. Sobretampa de plástico transparente descendo sobre os 4 lados da caixa grande preso perto da base com uma liga de borracha de câmera de ar ou elástico. 3. Tampa de plástico transparente esticado por baixo de uma moldura de cabos de vassoura. 4. Panela preta com tampa de encaixe para reduzir a perda de vapor. 5. Liga de borracha de câmera de ar prendendo a sobretampa de plástico transparente. 6. Cabos de vassoura dando apoios para a chapa coletora, isolando-a do contato com o fundo da caixa. 7. Chapa preta de metal –coletora de luz que transforma a luz em calor. 8. Sacos plásticos contendo tiras de papel de jornal amassadas criando um isolamento térmico entre as paredes da caixa menor e as de caixa maior. 9. Pedaços de papelão empilhadas no fundo da caixa criando o isolamento térmico na base do forno.

HORÁRIO DE MAIOR EFICIÊNCIA PARA O USO DO FORNO SOLAR

Esse horário pode variar conforme a latitude e a época do ano. De maneira geral, vale a regra que diz que o melhor horário para o uso do forno solar começa quando a sombra do seu corpo atinge o mesmo comprimento da sua altura. Quanto mais alto o sol, menor será a sua sombra e maior será a incidência da luz gerando maior calor dentro do forno. Ao nascer do sol, a sombra projetada pelo seu corpo é muito comprida, medindo muito mais do que a sua altura. É cedo demais para iniciar o cozimento solar. Assim mesmo é bom já colocar o forno no sol, para que ele vá acumulando calor. Pode-se aproveitar o fato de ainda não ter panelas dentro e inclinar a caixa apoiada numa parede ou num tamborete e com a tampa voltada diretamente para o sol. De manhã cedo, essa é a posição ideal para o aquecimento do forno.


A devota das Almas Santas e Benditas é especialista na cura. Eline Rocha da Silva é a mulher que cura pela fé e faz desse ofício uma missão

E

TEXTO: ANNA CAROLINE GUIMARÃES

line Rocha da Silva é um rosto que se confunde aos de outros tantos maranhenses que migraram do interior do Estado para a capital. Mas, ela não é uma pessoa comum. Aos 62 anos, D. Eline é uma benzedeira dedicada a uma missão que recebeu desde criança. Natural da cidade de Caxias, distante a 360 km da capital maranhense, D. Eline afirma ter um dom especial, o dom da cura. Suas primeiras experiências como curandeira aconteceram quando ainda morava em Caxias, geralmente com mulheres grávidas na ânsia do parto. Ao presenciar essas situações, D. Eline imediatamente se põe a rezar e, em poucos minutos, uma nova criança vem ao mundo. Sobre este seu dom mediúnico, ela afirma: “Sou devota das Almas Santas e Benditas”. D. Eline ora pelas Santas Almas todas as segundas-feiras e os pedidos, segundo a benzedeira, são para obter força, coragem e para abrir as portas de sua casa para a felicidade. “Tenho Deus ao meu lado também. Oro a ele e a Nossa Senhora. Rezo o PaiNosso, o Credo, a Ave-Maria e a Salve-Rainha. Sem a presença de Deus, em conjunto com as Benditas Almas, não há cura”, conta a benzedeira. D. Eline é portadora de um saber específico e tradicional, longe da academia e de qualquer laboratório. Suas receitas de remédios não estão guardadas em livros ou cadernos, mas na sua memória privilegiada. Sobre o início de seu ofício como benzedeira ela conta que o ritual de iniciação durou cerca de seis anos e ressalta que a cura depende também do doente, pois só tem a cura quem realmente crê nas Almas Santas e tem fé em Deus. Gente de longe visita Eline e sua fama ultrapassa a pequena comunidade onde a benzedeira mora com seus netos e seu esposo há mais de vinte anos. No seu bairro não são poucos os seus afilhados. “O que me deixa mais triste é ver uma criança sofrer, é uma coisa que me parte o coração, eu sofro junto com ela. Se a mãe dessa criança permitir, faço uma prece e benzo,” explica D. Eline sobre o trabalho de benzimentos em crianças que lhe levou a ser madrinha de inúmeras delas no bairro onde mora. Todo este cuidado, principalmente com os pequenos, tem uma justificativa, pois seriam frutos das suas experiências

Assim, já tirei muito quebrante de criança

quando ainda era criança. “Sou de família pobre e meu pai morreu quando eu e meus irmãos éramos muito pequenos. Nós tínhamos mãe, mas como a vida era muito difícil, cedo tivemos que trabalhar. Na sua visão, ela nasceu para ajudar o próximo sem pedir nada em troca. “Não pego dinheiro de ninguém”, conta D.Eline ao afirmar que não tem ambições. Casada há vinte e dois anos com o agricultor aposentado José Benedito, diz que tem o suficiente para viver. “Tenho um bom marido, bons filhos e três netos maravilhosos. Sou muito grata pela vida que tenho, sobretudo pela grande ligação com as Almas Santas e Benditas e pela presença de Deus em mim. É isso, sou feliz por ter esse dom e por fazer dele uma missão, que é ajudar a curar o sofrimento das pessoas”, afirma Dona Eline.

EUCALIPTO, URUCUM E BABOSA: O CONHECIMENTO POPULAR EM UMA ABORDAGEM MEDICINAL Além de todas as atividades de mulher, mãe, avó e madrinha, D. Eline exerce também o seu principal ofício: a produção de remédios caseiros e lambedores. Ela diz que usa qualquer tipo de planta que dê para curar: urucum, eucalipto, babosa, entre outros. Segundo a benzedeira, os remédios caseiros dão certo. “Elas me dizem tudo o que tenho de fazer no momento em que as pessoas procuram a minha ajuda. Não posso errar em uma só palavra. Oro por essas Almas Santas”, disse.

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 Revista

23 23

Ofício - Benzedeira

Foto: Thaís Fernandes

A devoção que cura


Fotos: Marileide Lima

Tecnologias Sociais

Sistema de Bombeamento Solar da UFMA é o melhor do mundo em tratamento emergencial de água TEXTO: LILIANE CUTRIM

P

roblemas como a falta de água, infraestrutura, precariedade na educação e tratamento do lixo são alguns dos pesadelos que atormentam o mundo e exigem soluções de toda a natureza. Uma dessas soluções é a proposta de bombear água utilizando apenas a energia solar. O projeto ganhou, em 2011, o título de melhor produto do mundo na categoria Otimização de sistemas de tratamento emergencial de água acionados por sistemas solares, durante o International Future Energy Challenge (IFEC). O equipamento de baixo custo e eficiente foi criado pelo professor do Departamento de Engenharia Elétrica, Luiz Antonio de Souza Ribeiro, orientador do projeto que é composto também por três alunos. Um equipamento eleito o melhor do mundo em energia renovável foi produzido em um Estado do Nordeste que, como os demais, enfrenta sérios problemas de abastecimento de água. O equipamento foi fruto de um desafio lançado pelo Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), que criou uma disputa bienal visando premiar as melhores pesquisas relacionadas às questões relevantes para o mundo. O desafio era desenvolver um conversor eletrônico capaz de acionar uma bomba de água a partir de um painel solar de 205 Watts, o suficiente para abastecer uma família de quatro pessoas. Alguns problemas como a falta de equipamentos; o desafio de unir uma ideia à prática; a falta de recursos financeiros e muitos estudos para encontrar o modelo mais ajustado às condições locais foram desafios à parte enfrentados pela equipe. “Sem dúvida, a falta de investimento foi um obstáculo para o desenvolvimento do projeto, mas nós acabamos conseguindo vencer essa e outras barreiras”, ressaltou Luíz Antonio.

24 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


O SISTEMA DE BOMBEAMENTO SOLAR O Bombeamento Solar foi desenvolvido no Instituto de Energia Elétrica (IEE) no laboratório de energias renováveis. O equipamento consiste, basicamente, em um conversor que é capaz de bombear 8 metros cúbicos de água ou o equivalente a oito mil litros de água por hora com energia solar. Durante o International Future Energy Challenge (IFEC), o projeto da UFMA concorreu com outros 29 projetos de instituições de ensino superior internacionais que se inscreveram na competição. No entanto, diferentemente dos outros, obteve grande êxito em todos os testes e avaliações. Na competição, foi provado que o protótipo brasileiro, orçado em R$ 139 reais, é capaz de gerar água duas vezes

mais do que o protótipo alemão, orçado em R$ 1.235 reais. Mesmo tendo recebido o prêmio, o projeto ainda está sem a devida utilização. Os alunos Luís Felipe Teixeira, Guilherme Farias e João Victor Caracas, que fazem parte do projeto, se mostram satisfeitos com o produto final. “Foi muito bom participar da criação do Bombeamento Solar, mas o fato de ainda estar parado nos deixa triste. Quando ganhamos o prêmio, recebemos a proposta de vender o projeto para outro país. Nós não fizemos isso porque queremos que seja algo nosso, brasileiro, mas até agora ninguém se mostrou interessado”, afirmou João Victor Caracas.

UMA SOLUÇÃO SUSTENTÁVEL PARA O ABASTECIMENTO DE ÁGUA No Maranhão, várias cidades sofrem com a falta de abastecimento de água. Nas regiões mais distantes, onde a população sobrevive da agricultura familiar, o problema com a irrigação chega a comprometer a sobrevivência das famílias. O gerente de inclusão produtiva da Secretaria de Desenvolvimento Social e Agricultura Familiar, Paulo Roberto Lopes, diz já conhecer o Bombeamento Solar e acredita que ele possa ser uma solução viável para o problema da falta de água. O produto, além de não precisar de energia elétrica, tem as vantagens de ser uma solução de baixo custo, pois não precisa de assistência técnica, sendo útil para as regiões distantes. O construtor civil José Ayres, que ainda não tinha ouvido falar desse tipo de sistema, achou a ideia maravilhosa e disse que deveria ser mais divulgada e utilizada. “É um absurdo que projetos como esse feitos no Maranhão não te-

nham o reconhecimento que merecem. Os líderes políticos devem observar melhor esses tipos de projetos para ajudar a população carente”, declarou. O vice-governador Washington Luís alega que o Maranhão está enfrentando sérios problemas, não só com relação à água, e ressalta que é necessário buscar soluções inovadoras para enfrentá-los. “Eu estou disponível para conhecer o projeto e ver a viabilidade dele para o Estado, principalmente para São Luís, que é uma capital com sérios problemas de abastecimento de água”, defendeu. Ainda segundo o vice-governador, o Estado está formando parcerias com projetos de sustentabilidade e de energias renováveis, que hoje são uma necessidade para o planeta, e frisou a importância de eventos que contribuam para enriquecer pesquisas científicas, como a Reunião Anual da SBPC. “É de fundamental importância que haja uma relação estreita entre

Acadêmicos de Engenharia Elétrica apresentam o projeto do Bombeamento Solar na Semana do Meio Ambiente na Vale

o governo e os pesquisadores. A reunião da SBPC serve para que nós, gestores, estejamos atentos aos conhecimentos que serão passados, pois eles serão úteis para que façamos um governo melhor”, destacou o vice-governador. O projeto do Bombeamento Solar com energia limpa e de baixo custo, reconhecido internacionalmente, assim como outros produtos desenvolvidos, ainda precisam ser reconhecidos dentro do seu próprio país. Em um tempo de discussões ambientalistas e de combate à pobreza no mundo, a reunião científica é um excelente espaço para aprofundar os conhecimentos sobre as produções científicas e de que modo elas podem melhorar o planeta. É importante também discutir a utilização desses produtos em benefício da sociedade para que soluções como o Bombeamento Solar não caiam no esquecimento. A ciência é válida se acontecer em benefício da sociedade.

Luiz Antonio Ribeiro Possui graduação em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Maranhão (1990), mestrado em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal da Paraíba (1994) e doutorado em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal da Paraíba (1998). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do Maranhão. Tem experiência na área de Engenharia Elétrica, com ênfase em Eletrônica Industrial, atuando principalmente nos seguintes temas: ac drives, induction motors, acionamentos estáticos, parameter estimation e máquina de indução.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

25


Foto: Arquivo pessoal

Ofício - Rezadeira

Rezadeira: Motivando a fé de uma comunidade “Sancta Trinitas, unus Deus, miserere nobis; Sancta Maria, ora pro nobis; Sancto Dei Genitrix, ora pro nobis; Sancta Virgo virginum, ora pro nobis” TEXTO: ANISSA AYALA CAVALCANTE

E

de dona Socorro e fundador dos festejos na comunidade do Pau Ferrado. Ela mantém a capela até hoje com as doações dos fiéis e dos noitaros, pessoas responsáveis por uma determinada noite no período dos festejos.

A família de Dona Socorro chega a 4 ª geração realizando os festejos que já se tornaram famosos na região onde mora

O primeiro festejo da capela data no ano de 1850. Antônio contava com seus filhos, que se dividiam nas funções, e, dentre eles, D. Socorro. Uns “tiravam” a novena, que até hoje é toda rezada em latim, outros tocavam o sino e ainda tinham os que se encarregavam de soltar os foguetes. Uma banda com bateria, guitarra, clarinete e saxofone animava as noites no período festivo. Antônio festejava os três santos todos os anos. O mais popular era o festejo de São Francisco das Chagas, padroeiro de várias famílias que, atraídas pelos pedidos atendidos, participavam todas as noites para agradecer, por meio de promessas, vestidos de marrom, descalços nas noites de festejo, doando velas e foguetes, entre outros. Seu Antônio nunca pediu a nenhum de seus filhos que continuassem com os festejos quando viesse a falecer. No entanto, D. Socorro, com a morte do seu pai em 1958, resolveu continuar com os ensinamentos que ele deixou. Sua criação foi rígida e, como ainda era de costume na sua época, também criou os filhos com toda a rigidez. Assim como D. Socorro ajudou o pai nos festejos, hoje, são os seus filhos que desempenham essa função. Com 60 anos ininterruptos festejando os santos, dona Socorro ressalta: “enquanto vida eu tiver, os festejos vão continuar e, assim como meu pai, não vou pedir a nenhum filho meu que continue a fazê-los, a não ser que seja por livre e espontânea vontade, e compromisso com Deus, como eu e meu pai tivemos 60 anos atrás”, explica. Esta já é a quarta geração da família de Socorro que vem mantendo a tradição das festas religiosas, uma forma de manter os traços culturais e a devoção de toda uma comunidade viva.

strada sem asfalto, onde a poeira sobe alto quando algum automóvel passa por ali, casualmente. Ar puro, sem poluição. Águas limpas, sem contaminação. Barulho? Somente do vento batendo nas árvores ou da cantoria dos pássaros que voam livremente pelo céu azul. A atividade preferida das pessoas? Bem, depois de um dia de trabalho na plantação ou no rebanho, nada melhor do que acomodar uma cadeira pertinho da porta e admirar o pôr do sol e, logo mais, apreciar um céu estrelado e uma lua brilhante. Pode parecer exagero ou mesmo impossível, mas, sim, esse lugar existe. Localizado a três quilômetros do município de Santo Antônio dos Lopes, Pau Ferrado é um povoado bastante conhecido pelos moradores da região, principalmente pelo festejo de São Francisco das Chagas, que acontece todos os anos na Igreja do Pau Ferrado na Fazenda São José, assim identificada pelos moradores.

Uma capela simples, com bancos de madeira sem encosto, uma cruz de cimento na entrada, um sino que emite um som forte ao anunciar a hora das celebrações e imagens de três santos: Santo Antônio, São Francisco das Chagas e Nossa Senhora da Conceição. Maria do Socorro, de 78 anos, viúva, mãe de oito filhos – Ednalda, Edna, Ednalva, Edneuza, Edma, Edileuza (in memoriam), Evaldo e Erivaldo (filho de criação) e, aproximadamente, quatorze netos – é a responsável pela administração da igreja e pela reza, em latim, desses três santos. A igreja é uma herança de Antônio Tibúrcio Rocha, pai

SAGRADO E PROFANO

26 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Especial SBPC

Dê bom dia, ganhe um sorriso! TEXTO: MURILO AZEVÊDO FOTOS: ARQUIVO DO PROJETO

D

esde maio do ano de 2011, estudantes e professores da Universidade Federal do Maranhão uniram esforços para o desenvolvimento de um projeto de extensão, criado para discutir e conscientizar as pessoas sobre a importância de analisar a hospitalidade no mundo universitário. O projeto Hospitalidade no Campus cresceu, atraindo a atenção para discussões que há muito já tomavam conta principalmente das salas de aula dos cursos de Turismo e Hotelaria. Motivado pelo interesse de seus alunos em pensar a hospitalidade na Instituição que frequentam, o professor Davi Andrade iniciou o projeto que coordena. A necessidade de desenvolver a maneira como os públicos da Universidade se relacionam foi, inclusive, detectada numa pesquisa de opinião realizada pelos envolvidos. “Fizemos campanhas para incentivar a gentileza e multiplicar a boa receptividade na UFMA. Foi algo muito interessante pensar em práticas da nossa profissão e interferir na realidade em que estamos inseridos”, relatou a aluna participante do projeto, Ana Isabel Bílio. A partir do reconhecimento de todo o trabalho desenvolvido, foi criado um segundo projeto intitulado Hospitalidade na SBPC. Segundo o professor Davi Andrade, o projeto tem prestado todo o apoio necessário às comissões organizadoras do 64ª Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. “Neste segundo projeto, estamos tendo a oportunidade de realmente envolver os estudantes na

recepção de um evento de grande porte como é a SBPC. Eles têm se mobilizado e realmente levado a sério os trabalhos para bem receber os 20 mil visitantes que aportarão no Maranhão para participar da Reunião”, lembrou. De acordo com o professor, várias são as vertentes de atuação do projeto no evento. Estão sendo feitos planejamentos para a recepção dos participantes do evento no interior do Campus, assim como treinamentos para todos os alunos que estão inscritos na monitoria da SBPC. “Estamos pensando em maneiras de mobilizar todo o trade turístico da cidade. Já fechamos a construção de bureaus em hotéis de São Luís para atrair a atenção ao evento”, comentou. Davi Andrade discorreu ainda sobre os trabalhos de logística que tem recebido orientação dos membros do Hospitalidade na SBPC. “Estamos nos reunindo diretamente com as comissões de Infraestrutura e Alimentação para oferecer nossas contribuições. Ofereceremos aos vendedores informais de alimentos, treinamentos de manipulação e de atendimento ao público, bem como uma oficina sobre o evento voltada para os taxistas, no intuito de torná-los aptos a bem informar os visitantes. Durante a Reunião Anual da SBPC, além de todo o trabalho de acolhimento, o projeto também irá oferecer oficinas que acontecerão no espaço da SBPC Jovem. Serão duas oficinas, sendo uma dirigida às crianças e adolescentes sobre as práticas de gentileza e a outra voltada para os professores e diretores de escolas, atores que vão entender de que forma poderão desenvolver nos seus

próprios ambientes escolares um projeto de hospitalidade semelhante ao que é atualmente instruído pelo Departamento do curso de Turismo e Hotelaria da Universidade Federal do Maranhão. “Os professores e diretores da rede de educação básica serão qualificados para replicar um projeto de hospitalidade nas suas próprias escolas. Esperamos que eles já saiam da oficina com um roteiro de como desenvolver a hospitalidade no ambiente escolar”, explica o professor e coordenador do projeto Hospitalidade no Campus. Davi Alysson da Cruz Andrade É Bacharel em Turismo pela Universidade Federal da Paraíba e Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente pelo Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Atualmente é Professor Assistente do Departamento de Turismo e Hotelaria da Universidade Federal do Maranhão, onde vem ministrando disciplinas e desenvolvendo estudos e pesquisas sobre hospitalidade, qualificação profissional e planejamento, e gestão do turismo. Coordena projetos de extensão que tratam da temática da hospitalidade cultural e profissional.

Conheça mais sobre o projeto Hospitalidade no Campus, acesse o sítio www.hospitalidadenocampus.blogspot.com e www.nuppho.blogspot.com.br

Participação do projeto na Ação Global, junho de 2012

Projeto Hospitalidade no Campus em frente à Universidade

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

27


Tecnologias Sociais

Com criatividade é possível produzir energia limpa e sustentável Projeto de baixo custo é capaz de armazenar energia solar e ajudar a resolver o problema da produção de energia sem que haja impacto ambiental TEXTO: JONATAN CARDOSO

A

Foto: Josiane Mendes

s modificações que o planeta vem sofrendo nos últimos 100 anos, tais como o aumento da temperatura, o descongelamento das calotas polares e o consequente aumento do nível dos mares, são fenômenos que têm sido motivo de discussões fomentadas em todo o planeta. O objetivo é que sejam criadas políticas capazes de rever ou de reter o quadro de destruição do planeta e de estimular cada cidadão para o desafio da mudança, visando à sobrevivência da espécie humana no planeta. Dentre as preocupações que compõem este cenário está a escassez das fontes de energia, que é, em especial, um desafio mundial, pois é preciso encontrar novas fontes que possam ser usadas em abundância com uma prerrogativa: elas têm que ser fontes limpas e sustentáveis. Da superação deste desafio depende o conforto e o bem-estar da população. A pergunta que instiga cientistas, políticos, pesquisadores é como será possível lidar com um planeta onde crianças nascem no mesmo ritmo em que as principais fontes de energia estão acabando? Foi pensando nisso que surgiu o projeto Poste Solar, desenvolvido em 2009, pelo Departamento de Engenharia Elétrica, da Universidade Federal do Maranhão. Trata-se de um protótipo de baixo custo, capaz de armazenar energia solar, a partir de painéis solares que realizam a captação da luz.

28 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Foto: Marileide Lima

Inicialmente pensado para ser instalado em áreas remotas onde não há energia elétrica, o poste sofreu várias adaptações e tem sido projetado como uma ferramenta para enfrentar o problema de escassez das fontes energéticas, agora e no futuro. Assim, após a captação de luz, um controlador de carga, que é responsável pela carga e descarga de uma bateria, e o inversor de tensão transformam a energia contida em bateria de 220 Vca, apropriada para uso em lâmpadas compactadas de 15 Watts. O projeto une em um só o controlador de carga e o inversor de tensão com um custo de produção de R$ 850 reais em média, destacando-se pela sua integração, baixo custo, eficiência e tecnologia totalmente nacional.

TECNOLOGIA QUE VALE

O Parque Botânico da Vale, localizado a poucos quilômetros da IEE, foi a primeira empresa que mostrou interesse em adquirir essa tecnologia. Renato de Jesus dos Reis, orientador ambiental do Parque Botânico, afirma que o Poste Solar deve ser pensado como um produto viável e que pode melhorar a qualidade de vida no planeta. “As discussões em todo o mundo giram em torno da questão da sustentabilidade. Então, como não poderia ser diferente, o Parque Botânico mostra interesse em adquirir, conscientizar e disponibilizar para a sociedade um produto tão interessante.” Segundo o secretário adjunto da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Sectec ), João Torres, o interesse da instalação do Poste Solar no Parque Botânico da Vale é um exemplo que encabeça o cenário de incentivos das empresas que estão vindo para o Estado. Ele considera que

O mestrando João Victor Caracas é pesquisador e membro integrante do Instituto de Energia Elétrica da UFMA (IEE/UFMA), um núcleo de pesquisas que visa explorar as vocações energéticas do Maranhão desenvolvendo experimentações e propostas de novas tecnologias para a produção de energia elétrica. O Instituto já realizou várias publicações e, também, conquistou prêmios nacionais – Prêmio excelência em P&D na categoria sistemas e periféricos e o Prêmio CNI na categoria desenvolvimento sustentável da confederação nacional das indústrias – e internacionais – International Future Energy Challenge (IFEC).

Parque Botânico da Vale em São Luís

as ideias como a do Poste Solar são bem vindas e que ainda há muito a ser feito sobre este assunto no país. Torres ilustra isso citando um exemplo de programa modelo para o assunto, que é o Projeto Alcântara, Cidade Sustentável, em parceria com a Agência Espacial Brasileira (AEB), que tenta atender as comunidades quilombolas do município de Alcântara por intermédio da conscientização e das ações da rotina dos cidadãos, partindo do princípio sustentável em todas as áreas. Há várias ideias para serem desenvolvidas e conhecidas sobre as energias renováveis. A ciência tem um papel fundamental nesse movimento, pois projetos como o do Poste Solar podem significar uma mudança na concepção do consumo de energia. Mudança esta que interfere diretamente no enfrentamento à pobreza, representando uma solução social e econômica para as questões atuais e futuras.

Possui graduação em Engenharia Elétrica pela Universidade Federal do Maranhão (2010). Atualmente é mestrando da UFMA, bolsista pelo CNPq. Tem experiência na área de Engenharia Elétrica, com ênfase em Eletrônica de Potência, Inversores e Conversores de Energia, Fontes Renováveis.

ENERGIAS RENOVÁVEIS O IEE tem vários projetos que pensam a questão das energias renováveis, sendo o Poste Solar o irmão mais novo de outro projeto bem prático que saiu dos laboratórios do Instituto e que ganhou repercussão, o Projeto Lençóis Maranhenses. Este novo empreendimento leva energia limpa para comunidades muito distantes, por meio de um sistema que combina torres eólicas e painéis solares com um gerador a diesel. O interessante do Instituto é que além de professores e pós-graduandos, os alunos do curso de Engenharia também podem participar da produção de projetos como estes. É o caso de Igor Lopes de Castro, aluno do 4° período de Engenharia Elétrica que, por meio do IEE, tem acesso aos projetos que lhe permitem colocar em prática o que aprende em sala de aula. “É muito gratificante poder levar energia de boa qualidade a quem não a tem”, comenta o aluno sobre a possibilidade da experimentação e elaboração de novas tecnologias dentro do Centro de Energia Elétrica da UFMA. Tanto João Victor quanto Igor concordam que a falta de incentivos para que as boas ideias saiam do laboratório é o que inviabiliza a comercialização de projetos como os citados e, por conseguinte, a produção de novas tecnologias. “Existem incentivos, mas são incompletos e contraditórios. Disponibilizam bolsas de estudo, materiais, mas não dão amparo aos procedimentos metodológicos e não fazem a comunicação com as empresas que poderiam patrocinar e comercializar o produto”, contam. O resultado disso é que alguns projetos correm o risco de ficarem trancados nos laboratório, quando poderiam estar servindo, em especial, à população que mais precisa.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

29


Meio Ambiente

Praias de São Luís: patrimônio perdido? TEXTO: SANSÃO HORTEGAL

C

om 640 quilômetros de litoral, o Maranhão é um dos estados do Nordeste com o maior número de praias. Esse é um dos atrativos turísticos mais procurado em São Luís para além do seu patrimônio cultural e da sua memória fundacional. Na capital, o metro quadrado mais caro é o que fica próximo das praias e, também ligada a elas, há uma economia que movimenta milhões de reais em hotéis, pousadas, restaurantes, bares, clubes, academias, danceterias e outros atrativos que aproximam o homem do mar, sobretudo nas férias e em épocas festivas. Apesar de gerar bastante riqueza e

30 Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012 30Revista

trabalho, as praias do Maranhão, mas especificamente as de São Luís, estão agonizando de tanta poluição – tornando-se impróprias para o banho e para outras atividades balneárias –, à espera de ações públicas que consigam reverter esse quadro. Esse quadro não é novo. Desde que os primeiros fluxos migratórios chegaram aqui, como, por exemplo, o grupo do português Jerônimo de Albuquerque, em 1615, que expulsou os franceses da capital, que as praias são poluídas. Segundo a professora e pesquisadora do curso de Oceanografia, Flávia Mochel, de lá para cá, nunca foi desenvolvido um


rios. Apesar de a SEMA distribuir placas de sinalização de uso próprio ou impróprio para banho, as pessoas as ignoram e continuam utilizando as praias para as mais diversas atividades, convivendo com escoamentos de esgotos de várias origens. O pior disso tudo, é que a praia do Olho d’Água continua sendo a mais procurada pelas classes populares de São Luís. OLHOS DA MÃE D’ÁGUA Conhecida pela beleza de seus olhos d’água que minavam água doce e pura em toda a sua extensão, a praia do Olho d’Água é frequentada desde a década de 50 do século XX. Nas décadas seguintes passou a ser o maior ponto de lazer de São Luís. Tornou-se conhecida também como o cemitério da juventude devido ao registro de muitos afogamentos no local, passando a ser considerada pela religião afro-maranhense como praia encantada, a praia de Iemanjá. Até hoje, todos os rituais – próprios da religião afro

–, são feitos nessa praia pelos mistérios e segredos que guarda. É nesse contexto que a praia do Olho d’Água, desde então, foi a mais enfatizada nos estudos acadêmicos. Primeiro, por sua popularidade e, segundo, pela má utilização. Atualmente, é possível perceber a intensificação da urbanização junto ao descaso, principalmente dos poderes públicos municipais e estaduais em não coletar e não tratar os efluentes líquidos que chegam à praia dos muitos condomínios, bares e restaurantes que existem no local, gerando uma situação que os estudiosos chamam de condição inóspita. “Fala-se muito em praia deserta, mas no Maranhão nós falamos de praia inóspita”, destaca o professor do Curso de Geografia Marcelino Farias Filho. Ele e mais três estudantes do curso de Geografia - Jaílson Ferreira, Zélia Maria Nunes e Irismar Brito - fizeram um estudo focado nos problemas da praia do Olho d’Água. No projeto, eles cons-

Foto: Diniz Costa

projeto de saneamento que levasse em consideração todas as condições de balneabilidade. “A poluição sempre existiu. Hoje, nós temos um problema de escala, já que o número de pessoas aumentou e a produção de lixos despejados também. Estamos completando 400 anos e ainda não fizemos nada para resolvê-lo. O problema não é novo, mas agora ele se intensificou”, afirma. O efeito mais direto resultante desse processo é que todas as praias próximas do centro de São Luís estão impróprias para o banho. Segundo a Secretaria de Estado do Meio Ambiente - SEMA, as praias da Ponta d’Areia e do Olho d’Água estão com altos índices de poluição, enquanto que as do Calhau, São Marcos, do Meio e Araçagi estão inadequadas para os banhistas. Destas, a praia do Olho d’Água é a mais poluída e a que oferece maiores possibilidades das pessoas contraírem doenças, tais como problemas intestinais e respiratórios causados por bactérias e protozoá-

Revista Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano IIII Número Número IIII :::: Julho Julho de de 2012 2012

31 31


Foto: Sansão Hortegal

Placas de sinalização advertem banhistas

tataram que, com a instalação de grandes projetos industriais e de pequenas empresas como restaurantes, pousadas, hotéis, entre outros, houve um aumento populacional na cidade e, consequentemente, um aumento da produção de resíduos sólidos que é diretamente proporcional à demanda gerada por esses investimentos. Uma proposta dada pelos geógrafos seria a intervenção de iniciativas no âmbito da educação ambiental, por meio de campanhas de conscientização sobre o uso do espaço público a fim de que sejam minimizados os impactos causados pelo acúmulo de lixo. Durante a pesquisa, eles observaram que os usuários são os principais agentes de poluição das praias. Por isso, dizem que o poder público deveria colocar lixeiras ao longo da orla para que o lixo produzido pelas pessoas tenha um destino correto, assim como containers de coleta seletiva em pontos estratégicos para facilitar a separação dos resíduos sólidos proveniente dos bares e barracas. Esse mesmo alerta é confirmado pela professora Flávia Mochel ao analisar que

Com o aumento populacional na cidade, a produção de resíduos sólidos também aumenta

a capital maranhense está vivendo um fenômeno mundial, em um planeta que possui uma população de sete bilhões de habitantes. “Não se pode ignorar que há um fluxo migratório enorme de pessoas das grandes cidades vindo para São Luís, à procura de novas possibilidades de empregos, de geração de trabalho e de uma renda sustentável, movida pelo ecoturismo”, ressalta. SANEAMENTO E QUALIDADE DE VIDA Atualmente, existem em São Luís duas estações de tratamento de esgoto – uma na área do Itaqui-Bacanga e outra na área do Jaracati – que foram construídas na década de 90 e pensadas dentro dos padrões mais modernos da época, porém não funcionam completamente. “Sempre faltando uma peça ou outra para fazer o equipamento funcionar”, explica a pesquisadora. “A planta do Bacanga trabalha com aproximadamente 20 por cento da sua capacidade e a do Jaracati com mais ou menos 30 por cento”, analisa. A professora ressalta que, além do descaso em relação às estações, nunca houve um trabalho sério de educação ambiental que envolvesse a Sociedade

32 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

Civil para fazê-la entender que cada um tem que fazer a sua parte, pois o problema é de todos e é, sobretudo, uma questão de qualidade de vida. Basta andar pelas ruas da capital maranhense que é fácil encontrar bueiros estourados a céu aberto, que permanentemente vazam material de esgoto para a superfície, contaminando o lençol freático e as praias. Outro exemplo, também, é o Rio Anil, que concentra grande parte de coliformes fecais, cujos principais prejudicados são os bairros circunvizinhos e as pessoas que moram nessas localidades. “O problema é que está tudo interligado. A maré mistura tudo e não há nada que fique parado porque ela enche e seca. Nosso golfão é muito grande e consegue diluir essa sujeira”, completa. Como a maré alcança até oito metros, o lixo que já existe no mar pode ser diluído. “Essa sujeira vai sendo reciclada automaticamente. Tudo se transforma, até as próprias bactérias vão se degradando”. Todos os dias, toneladas de resíduos sólidos são despejados nas praias e, nem mesmo a construção de canais de esgoto, ligados a uma estação de tratamento, resolveu


o problema. É possível que hoje alguns quiosques das praias ainda não estejam ligados a esta rede ou, mesmo os que já estão, não possuem a manutenção devida e acabam colocando esses resíduos sólidos no mar. O MANGUE E O DESMATAMENTO Além das praias, os mangues sofrem o mesmo problema, mas com um agravante: o desmatamento. Com o objetivo de realizar a recuperação desses manguezais, visto que são eles que evitam enchentes em regiões próximas ao mar, a professora Flávia Mochel coordena o Centro de Recuperação de Manguezais (Cermangue), no qual realiza um estudo da região em que o mangue foi desmatado e verifica se é possível recuperar ou não a área afetada. Segundo disse, existem extensões de mangues que já estão tão degradados que são irrecuperáveis. “A recuperação de uma área de manguezais, assim como de qualquer área degradada, não é um panaceia. Não devemos ter em mente a ideia de que é só desmatar que depois alguém recupera, porque o procedimento não funciona assim. Para realizar este tra-

Foto: Áurea Everton Foto: André Souza

Foto: André Souza

Erosão provocada pelo avanço do mar já tomou conta de parte da avenida

Foto: Sansão Hortegal

Foto: Sansão Hortegal

Resíduos sólidos se misturam à diversão dos banhistas

balho, é necessário verificar a escala do problema e o tipo de degradação. Alguns ecossistemas já estão irreversivelmente danificados, mas outros ainda podem ser recuperados”, alerta. Os principais agentes da degradação dos manguezais na Ilha de São Luís são o desmatamento, o corte e o aterro, que vêm acontecendo em zonas urbanas para a construção de residências e comércios, bem como áreas industriais. Com a instalação destes novos edifícios, o desmatamento, além do corte e do aterro, ocorre de forma indireta, ou seja, todos os resíduos são jogados nos mangues, o que tem prejudicado toda a área de manguezais. “Grande parte dos nossos resíduos sólidos de construção civil são jogados no mangue”. O Maranhão é uma região coberta por mangues. Além de São Luís, é possível destacar também o município de Apicum-Açú, localizado a 147 quilômetros da capital, área muito rica em manguezais e que já sofre o mesmo problema. Assim, a professora e sua equipe ampliaram as suas pesquisas para esta área, onde ministra palestras, oficinas, minicursos e outros caminhos que ve-

No dia 06 de junho, o LAMA/Cermangue (Laboratório de Manguezais do Centro de Recuperação dos Manguezais), do Departamento de Oceanografia e Limnologia da UFMA, recebeu um prêmio de reconhecimento, concedido pela Fundação Alcoa, pelo trabalho que desenvolve no ecossistema dos manguezais e pelas ações de educação ambiental na comunidade. O cheque simbólico, no valor de U$ 150 mil, foi entregue pelo presidente mundial da Alcoa, Klaus Kleinfeld, à coordenadora do Centro de Recuperação, professora Flávia Mochel. O Cermangue, fundado no laboratório com o objetivo de recuperar os manguezais, será destaque na 64ª Reunião Anual da SBPC, quando a professora Flávia Mochel coordenará o Simpósio dos Manguezais Brasileiros, que será realizado nos dias 26 e 27 de julho durante a Reunião.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

33


Foto: Áurea Everton

Registro de esgoto sendo despejado nas praias

nham alertar a comunidade local sobre a questão. É importante lembrar que os mangues são fundamentais para proteger a região de erosões, enchentes ou outros fenômenos do ecossistema que acabam afetando lugares como a ilha de Cajual dos Pereiras, que antes possuía mais de 600 moradores com aproximadamente 150 famílias.

Cajual era uma ilha intocável, mas, com o desmatamento da região, a erosão das marés foi separando as praias. A água invadiu a ilha dividindo-a em duas partes: uma denominada Ilha de Cajual dos Pereiras e a outra ainda sem nome definido. Para a pesquisadora Flávia, isto acontece pelo fato de que uma parte da erosão está ligada à dinâmica natural

de fluição da areia, já que esta é jogada em cima dos mangues, fazendo-os secarem e morrerem. É por causa deste desmatamento – e com o aumento do nível do mar – que a água avançou tanto a ponto de “cobrir” a Ilha do Cajual dos Pereiras, o que obrigou a retirada dos moradores para outras regiões. “Hoje, a ilha não existe mais como era conhecida na década de 90”, lamenta. Em São Luís não é diferente e, um exemplo disso, é a praia da Ponta D’Areia, onde a água avança sobre a zona urbana destruindo tudo à sua volta: prédios e muros de proteção. É preciso, portando, estabelecer a importância desses ecossistemas para a sobrevivência da própria ilha e, a partir daí, recuperar o que ainda é possível recuperar. O mar não perdoa. A resposta que ele tem dado por conta do lixo que ele recebe todos os dias é o aumento da sua violência pelo espaço violado. Até onde, nós queremos ou poderemos ir?

FLÁVIA REBELO MOCHEL Possui Graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1981), Mestrado em Zoologia - Museu Nacional / UFRJ (1987) e Doutorado em Geociências (Geoquímica) pela Universidade Federal Fluminense (1999). Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal do Maranhão, responsável pelo LAMA- Laboratório de Manguezais e fundadora/coordenadora do CERMANGUE- Centro de Recuperação de Manguezais na UFMA. Possui experiência na área de Ecologia e Oceanografia Biológica, com ênfase em Ecologia e Recuperação Ecológica de Manguezais, atuando principalmente nos seguintes temas: manguezais, educação ambiental, macrofauna bêntica, sensoriamento remoto e ecossistemas costeiros.

IRISMAR DA SILVA BRITO Graduanda em Geografia pela Universidade Federal do Maranhão. Atualmente é componente do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia-GEPEPE do qual é bolsista IEX-CNPq e participante do Projeto de Extensão.

JAÍLSON FERREIRA MOREIRA Graduando em Geografia Bacharelado e Licenciatura pela Universidade Federal do Maranhão. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia e Pedologia (GEPEPE) vinculado ao Departamento de Geociências da UFMA. Faz parte da Divisão Técnica de Pesquisa do GEPEPE desenvolvendo atividades ligadas à Pedologia, Edafologia, Geomorfologia e ao Meio Ambiente.

MARCELINO SILVA FARIAS FILHO Doutorando em Ciência do Solo pela Universidade Estadual Paulista de Jaboticabal, Mestre em Agroecologia, Licenciado em Geografia pela Universidade Estadual do Maranhão e licenciado em História pela Universidade Federal do Maranhão. Atualmente é professor assistente do Departamento de Geociências da Universidade Federal, desenvolvendo atividades de pesquisa e de extensão nas áreas de ciência do solo, geomorfologia, educação ambiental e sensoriamento remoto. É Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia e Pedologia (GEPEPE) vinculado ao Departamento de Geociências, sendo responsável interinamente pelo Laboratório de Cartografia - LABOCART. É coordenador adjunto do Grupo de Pesquisa em Educação Ambiental em Unidades de Conservação do Maranhão - GPEAMA, vinculado ao Departamento de Química e Biologia da Universidade Estadual do Maranhão.

ZÉLIA MARIA NUNES Graduanda em Geografia pela Universidade Federal do Maranhão. É membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Edafologia e Pedologia (GEPEPE) vinculado ao Departamento de Geociências, atuando na Divisão Técnica de Extensão, participa do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

34 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Ofício - Pescador Foto: Ana Paula Coelho

Muito mais que um conto: O ofício solitário de um ser pescador Esterclides que iniciou o ofício aos oito anos de idade, reconhece a importânca do seu trabalho e desabafa: “A profissão está abandonada”

o litoral da Raposa, encontro Esterclides Ribeiro Marques, de 59 anos, trajando camisa de manga longa azul, bermuda escura, com os pés descalços sob a lama do mangue e um chapéu para se proteger do sol forte. Ele é um senhor de fala direta, bem articulada e foge à regra de que pessoas de baixa renda não sabem se expressar de maneira correta. Mais conhecido como Ester (apelido dado pelos amigos desde sua adolescência), o personagem é casado há mais de 30 anos e é pai de seis filhos, de idades que variam entre 37 e 23 anos. Seu ofício? Ele é pescador há 51 anos. Natural da cidade de Axixá, localizada a 90 km de São Luís, Seu Ester saiu do município para morar em São José de Ribamar, quando tinha 10 anos. Seis anos depois, mudou de localidade, fixando, desde então, residência no município de Raposa, onde vive até hoje. O pescador, que começou no ofício aos oito anos de idade, conta que o mesmo trabalho era exercido pelo seu pai, com quem aprendeu tudo sobre a pesca. Seu Ester se mostra uma pessoa polivalente, pois, além de pescador, é pintor, carpinteiro e veleiro (profissional que trabalha na con-

fecção de velas para barcos, lanchas e outros tipo de embarcações), porém, a sua renda principal sempre foi a pesca e dela obteve recursos para criar seus filhos. Ester estudou somente o ensino básico, até a 8ª série, atual 9º ano, porém acumulou um conhecimento que não é possível ser aprendido na escola.

N

TEXTO: EMERSON MACHADO

A atividade pesqueira não é apenas ir para o mar e jogar a rede. Há toda uma estrutura e um saber específico para realizar o ofício

Apesar de ter seguido a profissão do pai, ele nunca quis que seus filhos enveredassem pelo mesmo caminho. “Meu filho mais velho me falou uma vez que não queria ser pescador. Por isso, ele estudou, se tornou marinheiro e hoje é vereador daqui do município. Já meus filhos mais novos também são pescado-

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

35


Foto: Diniz Costa

Foto: Diniz Costa

res. Um tem o próprio barco e o outro trabalha comigo (aponta para o filho que está trabalhando dentro da embarcação). Então, já que eles resolveram isso para a vida, só me resta ensiná-los, não é mesmo?” pergunta. Questionado sobre a visão da sociedade perante a sua profissão, ele afirma que o preconceito já diminuiu bastante, porém, o pescador ainda é visto como uma pessoa que optou por não estudar e que, assim como o pedreiro e o pintor, ele é visto como um profissional de baixa escolaridade. Ele acha que o ofício merecia um pouco mais de atenção dos órgãos governamentais. Na sua opinião, faltam recursos para a profissão, como cursos profissionalizantes ou técnicos, até para que as pessoas mais novas que desejam seguir a profissão comecem a ver que a atividade pesqueira não é apenas ir para o mar e jogar uma rede. Há toda uma estrutura por trás e um conhecimento específico para realizar tal ofício. Seu Ester reconhece que existe

uma carência no número de pescadores na região, considerando ser esta uma atividade básica para a população maranhense, já que é ligada à alimentação. Ele cita que essa necessidade sempre vai existir. “Se o ofício de pescador acabar, como vai ser? Essa profissão está abandonada”, desabafa. Mesmo com a Lei de Apoio ao Pescador, Lei Nº 10.799, que estabelece que durante o período de defeso - tempo de reprodução de peixes e mariscos - o profissional que exerce a atividade pesqueira de forma artesanal tem direito a ganhar um salário mínimo, ele não acha que a lei facilita a vida de quem tem a pesca como ofício. “Projetos como esse do governo, de amparo ao pescador, são importantes, mas essa lei precisa de uma reforma, uma ampliação, porque cada tipo de pesca tem um período de desova. Há a desova do camarão, do peixe. Portanto, esse projeto deveria ser revisto”, analisa o pescador sobre o projeto do governo.

Esterclides Ribeiro Marques é associado da colônia de pescadores da Raposa há mais de 34 anos e já chegou a ser presidente da entidade por duas gestões (19841986 e 1990-1992). Na comunidade, conhece as dificuldades do órgão por não ter uma boa estrutura financeira. Como associado da colônia, ele paga R$ 9,00 mensais e tem direito às consultas médicas-odontológicas e oftalmológicas. “Sei que muito se reclama pela colônia não fazer mais, mas, como já trabalhei lá, pude ver

que temos que nos empenhar bastante para fazê-la caminhar, perceber que o trabalho que ela faz é importante para todos nós (pescadores)”, diz sobre a importância de fazer parte da colônia. Atualmente, a Ferrari, embarcação de Seu Ester, é movida a motor e a velas, um modo preventivo contra qualquer desventura que possa surgir. Seu barco leva este nome em homenagem à escuderia italiana de Fórmula 1, da qual o pescador é fã. Sobre o seu ofício, ele é breve e direto: “O pescador lida com o mar, é um trabalho bonito, mas também, às vezes, é um trabalhador solitário. A nossa atividade é muito solitária, egoísta”, relata com certo desencantamento. Mas, por outro lado, ele diz que ainda está longe de se aposentar, pois ainda quer muito navegar mar adentro, só que agora, na companhia de seu filho, a quem pretende repassar a experiência e o saber acumulado em mais de 50 anos no exercício do ofício de pescador.

36 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Meio Ambiente

Amazônia maranhense: Ecossistema vulnerável De costas para o norte do País, o Maranhão possui o bioma Amazônico como o terceiro maior do Estado

Fotos: Diniz Costa

TEXTO: ROBERTH MEIRELES

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

37


G

eograficamente localizado entre o Norte e o Nordeste do Brasil, o Maranhão possui 640 quilômetros de extensão de praias tropicais, floresta amazônica, cerrados, mangues e o único deserto do mundo com milhares de lagoas de águas cristalinas. Essas belezas naturais compõem um ecossistema rico em diversidade e que chama atenção principalmente pelo número de espécies endêmicas, ou seja, espécies de fauna e flora que só são encontrados neste local. A conservação deste patrimônio depende de uma cadeia que se relaciona diretamente com as questões do desenvolvimento econômico, político e, por conseguinte, com as identidades sociais e culturais do Brasil enquanto nação. O maranhense se considera nordestino, pelo menos culturalmente, e isso é um fato inquestionável. Mas, basta alguns apontamentos para perceber que tanto a posição física quanto a composição ambiental do Maranhão propõem novos parâmetros que precisam ser visualizados. O Maranhão está incluído, junto com mais oito estados brasileiros, na chamada Amazônia Legal, área geograficamente delimitada e que corresponde a

espaços onde há ocorrência de vegetações tipicamente amazônicas. Sozinho, o Estado corresponde a 25 por cento de toda esta área, que, de acordo com as mais recentes pesquisas, é a mais desmatada com maior celeridade. A região maranhense que corresponde à chamada Amazônia Legal localiza-se na Mesorregião Oeste do Maranhão, que é composta pelas microrregiões do Gurupi, Pindaré e de Imperatriz, e inclui 62 municípios do Maranhão. Segundo pesquisas do geógrafo e Presidente de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, Aziz Ab’sabér, o oeste maranhense é uma área onde há incidência predominante da vegetação amazônica, composta por florestas exuberantes, porém frágeis e que sofrem com o intenso processo de devastação. Esse intenso processo de devastação, ao qual Ab’Sabér se refere, são os desmatamentos e instalação de atividades extrativistas, práticas ligadas ao desenvolvimento econômico e que vêm, segundo o geógrafo e pesquisador da UFMA José de Ribamar Campos Neto, sendo praticadas de forma indiscriminada, desrespeitando as normas ambientais e contribuindo para a devastação da Floresta Amazônica.

Nos quiósques distribuídos por todo o Parque, é possível visualizar toda a diversidade de ecossistemas que conpõem o bioma maranhense

O conceito político pelo qual fez nascer a chamada Amazônia Legal surgiu por meio da Lei 1806 de 6 de Janeiro de 1953. O objetivo da delimitação referente às áreas cobertas por vegetação Amazônica era delimitar para melhor investir. A partir de então, foram criados fundos de desenvolvimento e políticas capazes de levar o progresso à região. Entretanto, é preciso considerar que historicamente não podemos dizer que é na década de 50 que começam as atividades exploratórias da mata amazônica, pois antes disso outras políticas governamentais já davam conta do desenvolvimento a todo custo, com um ponto em comum: a falta de preocupação com a sustentabilidade e a intensificação de uma lógica capitalista na exploração da vegetação original da região.

38 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

RODOVIA BELÉM-BRASÍLIA: O INÍCIO DA DEVASTAÇÃO De acordo com um estudo intitulado A Sustentabilidade Ambiental no Oeste Maranhense, desenvolvido pelos pesquisadores do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais da Universidade Federal do Maranhão, a ocupação desta região foi desencadeada com a construção da BR-010, popularmente conhecida como Rodovia Belém-Brasília, em meados do Século XX. Na época, o extrativismo vegetal se transformou na principal atividade econômica da área, desenvolvida pelos trabalhadores envolvidos na construção da própria rodovia, acompanhada pela implantação de outra atividade propagada por lavradores vindos de outros Estados do Nordeste, que deram início à cultura da pecuária na região Oeste do Maranhão. Com uma localização estratégica, beneficiada pela rodovia 010, a região Oeste do Maranhão despertou o interesse de várias indústrias que passaram a desenvolver atividades relacionadas à extração mineral ou vegetal da área, a qual compreende a Amazônia Maranhense. Atualmente, são a Siderurgia, a maior empregadora da região e a maior geradora de divisas na região Oeste do Maranhão, seguida pela Serralheria, isto é, extração de madeiras por meio da derrubada de árvores; e a Silvicultura, ou seja, extração de madeiras em toras para produção de carvão vegetal. Logo, é possível somar todas essas atividades econômicas, considerando o seu desenvolvimento histórico de devastação, juntamente com a atividade de pecuária, para dimensionar o comprometimento que estas atividades juntas têm gerado à cobertura florestal nativa.

Aziz Ab’Saber (1924 -2012) Graduou-se em Geografia pela USP em 1944. Como especialista em geomorfologia foi considerado ainda em vida um dos mais importantes ambientalistas do país. Teve cerca de 300 artigos publicados assim como vários livros e ocupou cargos como o de Presidente Executivo da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) entre 1994 e 1995. Aziz Ab’Saber foi autor de estudos e teorias fundamentais para o conhecimento dos aspectos naturais do Brasil e desenvolveu pesquisas nas áreas de ecologia, geologia, arqueologia e geografia. Nascido em São Luiz do Paraitinga, no interior de São Paulo, Aziz Ab’Saber faleceu no dia 16 de março de 2012.


POUCA INFORMAÇÃO DIFICULTA AÇÕES DE CONSERVAÇÃO De todos os Estados da Amazônia Legal, o Maranhão foi o dade amazônica é obrigatório ser mantida a reserva local de último a ter seus dados detalhados de acordo com a pesqui80 por cento, ou seja, só poderiam desmatar, por lei, 20 por sadora do Museu Paraense Emílio Goeldi, Marlúcia Bonifácio cento da área total. Martins. “Apesar das informações que já se tem, ainda faltam Para modificar este cenário da produção científica na outras mais detalhadas, além de pesquisas científicas Amazônia Legal, uma das iniciativas mais significancom o foco específico na Amazônia Maranhense. tes tem sido o Programa de Pós-Graduação BioEsta carência de produção focal é o que innorte, que visa qualificar pesquisadores na “O programa vai fluencia bastante a falta de pertencimento área da biotecnologia e biodiversidade. ampliar os recursos que o maranhense tem em relação à parNo Maranhão, foram 17 alunos aprovate que lhe cabe da Amazônia”, ressalta. dos no processo seletivo, via edital do humanos e os Marlúcia conta que, por falta de daprograma de pós-graduação em rede, conhecimentos nas dos e pesquisas na área, a Amazônia que prevê a formação de pelo menos áreas de biotecnologia maranhense, inclusive, já foi tratada mais 100 doutores a partir de 2016 em como Pré-Amazônia, discurso que justoda Amazônia Legal. Um investimene biodiversidade por tificou durante muito tempo a explorato de mais de R$ 20 milhões, feito pelo meio da formação de ção dos recursos naturais. Segundo os Ministério da Ciência e Tecnologia e das doutores nos Estados pesquisadores do Museu Paraense Emílio Fundações de Amparo a Pesquisa da reda Amazônia Legal” gião que será revertido em ganhos sociais, Goeldi, que é referência internacional na investigação científica sobre a Amazônia, o termo ambientais e culturais para todo o país, e, em que se referia e tratava à parte o Oeste maranhense especial, para o Maranhão, como afirmou a coordecomo Pré-Amazônia tinha o objetivo de “legalizar” o desmanadora do Bionorte no Estado e professora da Universidade tamento, pois era considerado como área de Cerrado, como é Federal do Maranhão, Patrícia Albuquerque, durante o lançaproposto pelo conceito de Pré-Amazônia. A área de conservamento do Programa de Pós-Graduação Bionorte, que aconteção legal é de apenas 50 por cento, enquanto que na proprieceu na UFMA no dia 15 de março deste ano.

PARQUE BOTÂNICO OFERECE A PROTEÇÃO ECOSSISTÊMICA DE UM DOS ÚLTIMOS FRAGMENTOS FLORESTAIS DA ILHA DE SÃO LUÍS Em se tratando da atual situação da Amazônia maranhense, é preciso manter vivo o que resta do bioma, investir em recursos humanos e aumentar o número de unidades de conservação, uma responsabilidade que tem sido assumida por empresas conscientes do seu papel social e ambiental em relação à manutenção da flora e fauna da região maranhense. Pensando desta forma, é que a empresa Vale vem realizando ações em prol da proteção e conservação do meio ambiente. No Maranhão, estas ações podem ser melhor visualizadas por meio do Parque Botânico da Vale, uma iniciativa de criação de um espaço composto por área de preservação e visitação com cerca de 100 hectares, onde é possível encontrar além de espécies animais, vegetação de todos os biomas do Estado.

Crianças em visita ao Parque Botânico da Vale. Oportunidade de entrar em contato com uma parte da Amazônia que normalmente eles so vêem nos livros

Criado em 2008, o Parque é uma região remanescente de floresta secundária, ou seja, que está passando por um processo de reconstituição de seu ecossistema, como afirma o Biólogo do Parque, Renato de Jesus. “A maioria das espécies que podemos ver aqui já estavam no Parque quando chegamos. O nosso trabalho é cuidar, plantar novas espécies e perceber quais estão ameaçadas.”, contou o Biólogo. Além da proteção de ecossistemas essencialmente maranhenses, o Parque Botânico também é um espaço de lazer, educação ambiental e atividades físicas. De acordo com a Assessora de Imprensa da Vale, Natália Machado, o parque já recebeu mais de 360 mil visitantes. Na programação mensal do Parque estão incluídas apresentações culturais, oficinas e minicursos, atividades relacio-

nadas sempre com a temática do meio ambiente e de conservação. Para a professora de uma turma de terceiro ano do ensino infantil em visita ao Parque Botânico, Célia Souza, a visita das crianças ao local permite que elas vivenciem e toquem a vegetação que elas veem apenas nos livros. Esta não foi a primeira vez que a escola onde Célia trabalha levou os alunos ao Parque. “As visitas com as turmas acontecem sempre e já fazem parte do calendário escolar.”, declarou a professora. O Parque Botânico Vale em São Luís funciona de terça à domingo, das 8h à 16h, e está localizado na Avenida dos Portugueses, s/n, bairro Anjo da Guarda. As visitas podem ser agendadas pelo telefone 3218-6245.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

39


Açaí /Juçara Euterpe oleracea Mart

Espécie endêmica da região Amazônica, a palmeira que alcança até 20 metros de altura, possui tronco múltiplo, formando touceiras que produzem até 20 plantas. Sua madeira é utilizada, localmente, para construções rústicas e do fruto se faz um vinho muito nutritivo e apreciado pelas populações, servindo de complemento alimentar e que pode ser consumido com açúcar e farinha de mandioca ou tapioca, com camarão ou peixe seco, ou como alimento energético em outras regiões do Brasil. Estudos demonstram que o suco de açaí é essencialmente energético (Cavalcante, 1996, IBGE, 1982), pois possui elevada concentração de fibra alimentar, alto teor calórico e concentrações de ferro. O palmito da juçara é muito estimado e largamente explorado pela indústria de conservas e os frutos da Juçara são atrativos para diversas aves. Além das propriedades nutritivas e energéticas, a espécie amazônica está intimamente ligada ao contexto cultural de algumas comunidades do Maranhão e do Pará, servindo inclusive de objeto de estudo para pesquisadores, den-

40 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

tre eles os da Universidade Federal do Maranhão, que realizaram um estudo Semântico-lexical dos termos específicos da Juçara falados pela comunidade do Distrito de Maracanã, zona rural de São Luís. Sob a orientação da professora do Departamento de Letras da UFMA, Conceição de Maria Ramos, as estudantes do curso de Letras - Ana Carla Gomes Morais, Maria Natália Cavalcante, Késia Rafaella Andrade e Liana Suellen Penha- realizaram uma pesquisa de campo e produziram um glossário com expressões que comprovam a diversidade linguística presente no Estado. O trabalho das pesquisadoras estará na SBPC e será uma oportunidade de pessoas de todo o país, participantes da Reunião Anual da SBPC, conhecerem a espécie endêmica da Amazônia em uma abordagem diferenciada. ”A partir do momento que desenvolvemos um estudo deste tipo, tornamos visíveis os traços locais, mostrando a multiplicidade tanto da cultura quando do universo linguístico da região”, afirmou Ana Carla Morais, uma das integrantes do grupo.


Economia Criativa

Dream In:

o despertar para um mundo de sonhos

N

o mês de junho deste ano, alunos do Curso de Design e Tecnologia participaram de um Conclave Regional que, em um dia de trabalho, discutiu, criou, formatou e transformou sonhos em realidade. O grupo se reuniu com outros estudantes, entrevistados sonhadores e especialistas da área para juntos pensarem em soluções para ideias em movimento. Em meio a mesas recheadas de lápis de cor, papel e pincéis, os alunos puderam pensar em soluções possíveis para os sonhadores que foram entrevistados pelos participantes do projeto Dream In. Um outro encontro, em agosto deste ano, vai reunir num evento nacional todos os parceiros para a identificação das oportunidades contidas nos sonhos coletados nas diversas regiões do Brasil. Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

41

Fotos: Arquivo pessoal

TEXTO: CAMILA CARNEIRO


O evento contará com a presença de grandes sonhadores brasileiros e internacionais que irão inspirar os participantes a criar soluções inovadoras e criativas. “No Conclave Nacional, os sonhos captados durante o primeiro semestre pelos alunos das universidades serão a base para a identificação de oportunidades e geração de soluções inovadoras nas esferas privada, social e pública”, explicou o coordenador do projeto no Maranhão, Delano Rodrigues. O Dream In Brasil é um desdobramento do projeto que aconteceu em 2011, na Índia, realizado pelo escritório Idiom Design and Consulting, com o patrocínio de um dos maiores grupos de varejo da Índia, o Future Group e da maior universidade privada indiana, a Manipal University. O objetivo do projeto é a aplicação do design thinking na identificação, desenvolvimento e implementação de políticas públicas e negócios empreendedores, com a aplicação de um método inovador e de dinâmica distinta. Apesar de ter sido criado na Índia e de ser um método recente, o design thinking, método utilizado pelo projeto Dream In, já é uma iniciativa global. A prova disso, é que ele tem acontecido quase simultaneamente e, de forma similar, em outros países como a

Austrália e Estados Unidos. O Dream In é realizado pelo Instituto Vivarta, uma ONG que participou ativamente do projeto piloto na Índia e, posteriormente, passou a deter os seus direitos no Brasil, desde maio de 2011, quando deu início às atividades planejadas. Para o desenvolvimento do projeto no Brasil, o Instituto Vivarta elaborou parcerias com a Universidade Federal do Maranhão, a Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, a ESPMSão Paulo, a Universidade Estadual de Minas Gerais (UFMG), a Universidade do Vale do Rio dos Sinos de Porto Alegre (Unisinos) e a Universidade de Brasília (UnB). Estas instituições representam as cinco regiões do país que aceitaram o desafio de implementar o método proposto pelo Dream In em uma disciplina do curso de Design desde o primeiro semestre de 2012, envolvendo mais de 200 acadêmicos e centenas de participantes voluntários. “O Curso de Design e Tecnologia da Universidade Federal do Maranhão é o representante da região norte-nordeste no Dream In com a participação de 30 estudantes do curso de Design da instituição”, identificou o Coordenador do projeto, Carlos Delano Rodrigues.

Discussão de um dos grupos para construção de propostas a serem implementadas pelo Dream In

42 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

Participantes do Conclave Regional do Dream In Brasil, no Maranhão, apresentam experiência de sonhadores

SONHOS INICIAM NEGÓCIOS Após a parceria efetivada, os alunos do curso de Design envolvidos no projeto realizaram entrevistas com moradores de diversos bairros, tais como o Maiobão, o São Francisco, o Centro, e até algumas áreas de São José de Ribamar. Os sonhos coletados durante os três meses de entrevistas retrataram a diversidade de ideias da Sociedade Civil sobre como tornar melhor o lugar em que se vive, independente de gênero, classe social e nível educacional. Assim, sonhos simples, tais como ser feliz, ter mais saúde, educação e segurança, foram bastante citados pelos entrevistados revelando um cenário coletivo na constituição da cidadania. Contudo, apesar da recorrência de temas sobre a garantia de direitos sociais e políticos, o Dream In descobriu sonhos mais ousados, como o do morador do bairro da Liberdade, Sebastião de Jesus Barros, que pensou em reativar o Estaleiro-Escola para dar às crianças de seu bairro uma oportunidade futura de trabalho. Sonhos como esses foram reunidos para serem pensados, refletidos e, posteriormente, utilizados no planejamento de políticas públicas mais próximas dos grupos sociais.

Sonhadores inspiram os participantes do Dream In a criar soluções criativas


DREAM IN: BRASIL MAIS INOVADOR, CRIATIVO E SUSTENTÁVEL A realização do Dream In consiste em três etapas chamadas de sonhar, acreditar e realizar. Na fase SONHAR, sonhos de pessoas comuns são captados a partir de uma série de entrevistas que são registradas por meio de uma câmera de vídeo. O método define três níveis de sonhos. É preciso ultrapassar os dois primeiros níveis para captar o sonho mais significativo e criativo do sonhador. Deste modo, o primeiro nível, refere-se a medos e anseios – quem não tem medos? Sonhos deste tipo são os primeiros que vem à mente das pessoas. O segundo nível de sonho trata dos desejos e vontades – dinheiro, educação, saúde, e, o terceiro nível identifica o centro profundo e criativo que todo ser humano tem. Na fase ACREDITAR, os sonhos são assistidos por dezenas de pessoas, entre elas estudantes, empreendedores, acadêmicos, líderes da iniciativa privada, governo e o terceiro setor, que se reúnem em um Conclave para identificar as oportunidades de negócios e as políticas públicas contidas nestes sonhos. Finalmente, na fase REALIZAR, empreendedores, investidores e sonhadores se conectam para implementar as oportunidades que surgiram na etapa anterior, durante o Conclave. Estas oportunidades são disponibilizadas em plataforma aberta para que os empreendedores possam implementá-las. O Portal é o ambiente online no qual estes empreendedores, investidores e sonhadores poderão se conectar para realizar as oportunidades. Além do Portal, o projeto tem parcerias com várias empre-

sas e institutos que trazem as ferramentas, conhecimentos e conexões para que os empreendedores explorem com sucesso as oportunidades identificadas. Assim, por exemplo, o sonho de Janice Ferlato Baldo se tornou realidade quando ela foi entrevistada pelo grupo e sua ideia foi identificada como promissora. No condomínio da fisioterapeuta, a coleta seletiva de lixo tornou-se algo real. Motivada pelo Dream In, Janice, que mora há 11 anos em São Luís, voltou a se reunir com os condôminos para tornar o seu sonho uma possibilidade real. Hoje, Janice é conhecida como “a menina do lixo” por seu engajamento, já que, além de promover a coletiva seletiva em seu próprio condomínio, ela também recolhe lixo em

seu trabalho e, sempre que pode, atende as necessidades de quem a procura. A fisioterapeuta gaúcha veio para São Luís em busca da oportunidade de viver em um lugar mais tranquilo. Mas logo que chegou, algo lhe chamou atenção: a cidade não realizava coleta seletiva, o que já era comum em sua cidade natal. A princípio tentou implantar o sistema de coletas seletivas em seu condomínio, mas não obteve êxito. “No início, todos se predispuseram a ajudar, mas depois foram se queixando do trabalho que dava separar o lixo, resultando em poucos os interessados que ainda realizavam a coleta seletiva”, aponta Janice. Anos depois, Janice foi surpreendida por um grupo de estudantes da UFMA que vieram perguntar: “qual é o seu sonho?”. A gaúcha então despertou o seu antigo sonho de viver em uma cidade mais sustentável.

Carlos Delano Rodrigues Designer, professor e consultor de Branding e Naming. Diretor Nacional da ADG (Associação de Designers Gráficos do Brasil) na gestão 2007-2009. É MBA em Marketing, Mestre em design pela PUC-Rio. Atualmente é professor do curso de Design da Universidade Federal do Maranhão e colaborador do CRIED do IED – Instituto Europeo di Design.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

43


Saúde

Higiene bucal e Meio Ambiente: uma parceria que deu certo Pesquisadores comprovam que é possível manter a saúde bucal utilizando materiais biodegradáveis e de fácil acesso, uma chance de reverter o quadro do baixo nível da saúde odontológica no país

A

TEXTO: EMERSON MACHADO • ILUSTRAÇÃO: ANDRÉ SOUZA

realidade da saúde da população, em especial dos moradores do interior do estado do Maranhão, continua sendo motivo de preocupação de inúmeros especialistas das mais diversas áreas da saúde. Na Universidade Federal do Maranhão, a tarefa diária de alguns pesquisadores é buscar propostas de políticas públicas e criar tecnologias que sejam capazes de reverter o cenário de baixa atenção à saúde pública, presente em dados estatísticos de carência do país. No que se refere à saúde bucal, a pesquisadora Kátia Maria Veloso revela que a do maranhense não está entre as melhores. Durante sua longa vivência no Programa Nacional de Atenção Básica à População, o Programa de Saúde da Família (PSF), Veloso recorda ter visto de perto todos os problemas enfrentados por quem não tem recursos e nem orientação para realizar a higiene bucal de forma adequada. “O Estado possui um histórico de pouca preocupação com a cavidade oral, e essa característica é percebida de forma mais acentuada nas camadas sociais mais baixas. Ter uma escova de dente ou um fio dental convencional não é um hábito presente na maioria das casas das pessoas de baixa renda”, relatou. Foi por meio do serviço pelo PSF, da vontade de propor uma solução viável e do encontro com o estudante do curso de Odontologia da Universidade Federal do Maranhão, Roberto César Gondin, que surgiu, no ano passado, um projeto diferenciado que chamou atenção por sua simplicidade e por sua eficiência comprovada. Juntos, Veloso e Gondin ganharam reconhecimento internacional e provaram que, para

manter a cavidade oral sadia, não é preciso grandes recursos financeiros. A metodologia da proposta veio explícita no título do trabalho: A inserção dos Métodos Alternativos de Higiene Bucal no Programa de Saúde da Família (PSF) no Interior do Maranhão: Uma Nova Estratégia de Prevenção em Saúde Pública.

HIGIENE SEM FERIR A NATUREZA

Para o início do projeto, os pesquisadores utilizaram vegetais presentes na região Nordeste do país, como o bambu, a bucha e outros materiais de fácil acesso, a exemplo de sacos de náilon e garrafas plásticas. Após a higienização e a esterilização de todo o material, eles conseguiram fabricar utensílios para a prática da higiene bucal sem gastar nenhuma verba para isso. Escovas de dente, porta-escovas, fios dentais, abridores de boca e a seleção de uma variedade de fitoterápicos com forte potencial para o tratamento e a prevenção das principais doenças odontológicas da cavidade bucal, foram alguns dos materiais desenvolvidos a baixo custo. Uma solução barata, confiável e biodegradável. Roberto César Gondin explica que a biodegradação, característica diferenciada dos produtos, ocorre porque as escovas de dente, por exemplo, são projetadas com pedaços de bambu e bucha, ou seja, materiais totalmente biodegradáveis e presente em grande quantidade na natureza. Estes utensílios podem ir para o lixo sem agredir a natureza e, em pouco tempo, são absorvidos naturalmente pelo ambiente. “Uma vez descartados, o próprio meio-ambiente trata de fa-

44 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Utensílios de higiene bucal produzidos na pesquisa

Foto: Marileide Lima

Medicamentos fitoterápicos em exposição durante o 30º CIOSP em janeiro deste ano

zer a sua reciclagem de maneira natural, sem causar degradação”, declara o jovem cientista. Veloso considera um paradoxo o alto custo de utensílios de higiene bucal e cita que os experimentos são “uma saída criativa, possível a um custo zero e à disposição de toda a sociedade”. Na opinião dos pesquisadores, os produtos criados por Gondin e Veloso são tão eficazes quanto os métodos convencionais, pois possuem comprovação científica atestada anteriormente. “Quando fomos realizar a pesquisa, descobrimos que a técnica de substituir a cerda das escovas de dente pela bucha não é nova”, contou Veloso. Trabalhando como agente do Programa de Saúde da Família (PSF), a pesquisadora descobriu que moradores mais velhos de algumas regiões sabiam de métodos mais antigos de higiene bucal com materiais alternativos, mas também comprovou que não estavam atualizados. “O que eles realmente não sabiam é que a bucha possui efeito igual ao das cerdas das escovas tradicionais no combate e na prevenção da placa bacteriana”, recordou.

O TRATAMENTO ODONTOLÓGICO POR MEIO DOS FITOTERÁPICOS

As doenças odontológicas que afetam a população também geraram preocupação nos pesquisadores, o que ocasionou uma ampla procura dos fitoterápicos - medicamentos oriundos das plantas medicinais - como tratamento alternativo da gengivite, por exemplo. De acordo com Gondin, estas plantas são conhecidas no Maranhão e possuem grande eficácia, como é o caso da hamamelis e da malva, usadas especificadamente no tratamento da afta. Além delas, também são utilizadas a entrecasca do caju, para o tratamento da cicatrização oral, e a romã, que é usada para o tratamento de infecções em geral, gengivite e periodontite, causadas pelo acúmulo da placa bacteriana devido à falta de higiene bucal.

REPERCUSSÃO CIENTÍFICA

A nova estratégia de prevenção em saúde pública, por meio de utensílios de higiene bucal alternativos, rendeu o segundo lugar na categoria Mesa Clínica Demonstrativa no 30º Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo

(CIOSP), realizado de 28 a 31 de janeiro deste ano. “Enquanto a maioria dos trabalhos estava ligado ao desenvolvimento de tecnologias sofisticadas como soluções para problemas na área da odontologia, nós despertamos o interesse de toda a comunidade ao propormos uma experimentação diferenciada e com forte apelo social”, conta Veloso. Ela afirma que os japoneses, os argentinos e os uruguaios foram os mais interessados nos experimentos. Para o futuro, a pesquisadora pretende colocar em prática o projeto e levá-lo para o interior do Maranhão, onde se concentra a maior parte da população carente do Estado e local em que acredita que o projeto poderá ser melhor aproveitado.

Roberto César Gondim Estudante do 10º período de Odontologia da Universidade Federal do Maranhão. Participou de dois projetos de iniciação científica e também do primeiro projeto de extensão do Hospital Universitário Presidente Dutra voltado para a higiene bucal em pacientes. Paralelamente à conclusão de sua graduação, o aluno também está prestes a concluir sua especialização. Pretende fazer Mestrado em Saúde Pública e seguir carreira na área da saúde pública, linha pela qual sempre optou desde o início de sua formação.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

45


Saúde

Acadêmicas de Enfermagem estudam o uso de plantas medicinais por idosos em Imperatriz TEXTO: HEMERSON PINTO, LÍGIA GUIMARÃES

E

rva cidreira e capim santo. Ao suspeitar que a pressão arterial está elevada, a aposentada Maria dos Santos Mota, de 69 anos, recorre ao chá que prepara utilizando os dois tipos de plantas e garante que o resultado é imediato. Quando o problema é a dor na altura do estômago, indicando que há uma possível inflamação no fígado, é ao chá de boldo que ela pede socorro. Para mais de cinco problemas de saúde, a idosa tem um remédio caseiro à base de plantas medicinais e garante “não gastar um centavo”, disse. O uso de plantas medicinais para o tratamento de algumas doenças é comum, principalmente entre pessoas mais idosas no município de Imperatriz, localizado a 650 km de São Luís. Interessadas em avaliar como essa prática é desenvolvida por idosos como D. Maria Mota, cinco acadêmicas do curso de Enfermagem, sob a orientação do professor Paulo Roberto da Silva Oliveira, do Campus de Imperatriz da UFMA, iniciaram uma pesquisa intitulada A Prática do Saber Popular na Utilização de Plantas Medicinais por Idosos. O grupo de pesquisa escolheu o Centro de Convivência da Melhor Idade

Esperança para entrevistar idosos com idade entre 51 e 90 anos. Na casa situada na periferia de Imperatriz, no bairro Parque das Estrelas, o grupo ouviu, entre os meses de abril e maio de 2011, 54 idosos (37 mulheres e 17 homens). Dos 253 cadastrados no Centro, 75,9 por cento declararam fazer uso de plantas medicinais. De acordo com as estudantes de Enfermagem, 48 plantas foram lembradas pelos idosos como remédios eficazes e utilizados por eles. Entre as preferidas, estão a erva cidreira, com 17,8 por cento; a laranja [folha ou casca] e o noni com 8,7 por cento, respectivamente; enquanto o boldo e a erva doce possuem o mesmo nível de 4,9 por cento. As pesquisadoras ainda descobriram que a forma mais comum de preparo dos medicamentos são os chás das folhas de erva cidreira, boldo, casca de laranja e do fruto da erva doce. Já o noni é preparado como suco e depois misturado ao suco de uva. Quanto às indicações de cada uma das plantas, a erva cidreira e a erva doce foram apontadas como calmante e para a manutenção da pressão arterial, enquanto a casca da laranja e o boldo ficaram responsáveis pela regulariza-

46 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

ção da função digestiva. O noni foi citado como eficiente no tratamento de patologias como diabetes, cardiopatias, inflamações e dores, e classificado pelos idosos como a planta “que serve para todas as doenças”. Hortelã, mastruz, chanana, malva do reino, as cascas de jucá, aroeira, a folha de amêndoa e jalapa também foram citadas, porém, em menor destaque.

DOSAGEM IDEAL

Uma preocupação levantada pelas pesquisadoras é quanto à dosagem do medicamento natural usado pelos pacientes. “Existe o conceito comum entre as pessoas de que o uso de plantas medicinais é inofensivo, uma vez que a população em geral, especialmente os idosos, acredita que por serem naturais, não causam nenhum prejuízo ao organismo. Mas vale ressaltar que estas também contêm princípios ativos e podem vir a complicar o quadro clínico de um idoso e provocar reações adversas”, pondera a estudante do 7º período, Ivone Pereira da Silva. O grupo responsável pela pesquisa defende que, quando utilizadas de forma correta, as plantas medicinais têm o mesmo efeito positivo


Existe o conceito comum entre as pessoas de que o uso de plantas medicinais é inofensivo, uma vez que a população em geral, especialmente os idosos, acredita que por serem naturais, não causam nenhum prejuízo ao organismo

que os medicamentos industrializados. Ivone declara que esse tipo de conhecimento, adquirido ao longo do tempo, representa, em muitos casos, o único recurso terapêutico disponível que a população tem ao seu alcance. "Uma forma de tratar doenças quando o recurso financeiro é insuficiente ou indisponível", define. Ivone também destaca o poder de cura descrito pelos entrevistados, que garantem a dose certa de cada medicamento. "Calmante, para controlar a pressão arterial, como digestivo, para processos inflamatórios, diabetes e doenças cardíacas. Cada planta é utilizada individualmente ou associada para determinadas doenças ou processos inflamatórios". Segundo o professor Paulo Roberto, orientador do grupo de pesquisa, os principais motivos para o uso caseiro das plantas medicinais são o baixo custo e a facilidade de aquisição, além da indicação de outros usuários e da dificuldade de se obter outros medicamentos nos serviços públicos de saúde. “Muitas pessoas não têm dinheiro para comprar medicamentos nas farmácias ou não os encontram no serviço público de saúde. Se torna mais fácil e econômico o uso dessas plantas medicinais", observa.

QUANDO OS SABERES SE ENCONTRAM

Há quase sete décadas sendo curada ou controlando algumas doenças à base de plantas medicinais, a cearense Maria Mota participou da pesquisa do grupo da UFMA, e, mesmo com toda a sua experiência, garante que ouviu atenta algumas dicas das estudantes sobre a forma mais adequada no preparo de alguns remédios. "A mocinha disse que

é melhor preparar o chá em uma vasilha de esmalte do que numa de alumínio. A de alumínio pode soltar alguma coisinha que prejudica a saúde", lembra. Melhor informada sobre as precauções na hora de produzir e se automedicar com os medicamentos caseiros, dona Maria segue alguns cuidados com as plantas medicinais que cultiva no quintal. "Aprendi com minha mãe a plantar, zelar e fazer as receitas caseiras. Casei, tenho cinco filhos. Para eles e para o meu marido sempre fiz e ainda faço remédios com elas. Minha neta sempre me procura quando a filhinha dela adoece. 'Vó, me dá umas folhinhas pra fazer um chá pra neném'. Eu ensino qual é a melhor". A aposentada diz que os vizinhos também recorrem aos santos remédios que ela tem. "Eu não me incomodo e fico feliz por poder ajudar as pessoas. Tenho muita fé nas minhas plantinhas, e nem preciso gastar na farmácia".

Paulo Roberto da Silva Ribeiro Professor Adjunto do Centro de Ciências Sociais, Saúde e Tecnologia da Universidade Federal do Maranhão, Imperatriz MA. Possui Graduação em Farmácia com Habilitação em Análises Clínicas (Bioquímica) e Farmácia Industrial pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2000), Mestrado em Agroquímica (Química Analítica Ambiental) pelo Departamento de Química da Universidade Federal de Viçosa e Doutorado em Química (Química Analítica) pelo Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

47


Ofício - Raizeiro

Chico Raizeiro: O doutor do Mercadinho de Imperatriz TEXTO: LETÍCIA MACIEL , LÍGIA GUIMARÃES • FOTOS: LETÍCIA MACIEL

eu Chico, o que o senhor tem pra enxaqueca aí?” Pergunta um rapaz de semblante cansado, ao adentrar na pequena banca de raízes do senhor Francisco de Assis. Mais conhecido como Chico Raizeiro, o pernambucano de 74 anos vende remédios naturais no Mercado Vicente Fritz, o famoso Mercadinho de Imperatriz, segunda maior cidade do Maranhão. Vendedor há 26 anos, o ofício lhe rendeu o título de “Doutor do Mercadinho”. Nascido na pequena cidade de Triunfo, no interior de Pernambuco, o agricultor teve que se mudar para uma cidade maior e começou a trabalhar no ramo do comércio de temperos, ervas e raízes. Com o estudo formal realizado pelo supletivo, o doutor do Mercadinho lembra que todo o conhecimento sobre plantas medicinais foi adquirido por meio da leitura de livros sobre o assunto na década de 80. Chico trabalha de segunda a sábado, das 06h às 18h, atendendo pessoas com os mais diversos tipos de doenças, às quais o raizeiro analisa e, baseado na experiência e nos ensinamentos que aprendeu, faz o diagnóstico e receita o produto mais adequado para o problema.

“Angico é bom pra gripe. Se for gripe com tosse ou dor na garganta, é bom misturar com sucupira e romã. Já quem sofre de gastrite deve misturar mangabeira com casca de ameixa”, prescreve o raizeiro enquanto abastece um pequeno depósito de vidro com rapé, um pó fino e escuro resultante da mistura de ervas como alecrim, quina-quina, noz-moscada, buchinha

“S

A banca oferece várias garrafadas, raízes e cascas para o tratamento dos mais diversos tipos de doenças

Mandei ele tomar raiz da planta caninana e foi a última vez que ele teve problema de coluna

e cravo-da-índia, torrados e moídos para inalação e indicado para o tratamento de problemas respiratórios, como rinite e sinusite. As prateleiras repletas de garrafas de vidro ou de plástico, médias e pequenas, recobrem as paredes da banca de aproximadamente 6 m2. Nos rótulos rústicos, são descritas as indica-

48 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


ções, composição e posologia de cada tipo de garrafada, nome dado às misturas de ervas e raízes esmagadas e conservadas nas garrafas ali expostas. Apesar do estoque variado, que inclui até banhas de animais como quati, mucura e sucuri (esta última indicada para dores nas juntas), o forte do negócio de Seu Chico é a venda de ervas, raízes e cascas de pau in natura, que os clientes adquirem juntamente com a receita de preparo e consumo. Os que sofrem com dores na coluna são os que mais recorrem aos santos remédios do Doutor do Mercadinho: “Um dia desses, o pai do rapaz que trabalha ali na outra banca ia passando aqui nos corredores e, do nada, a coluna dele travou”, conta o raizeiro, relembrando os gritos de dor que o doente emitia. “Mandei ele tomar raiz da planta caninana e foi a última vez que ele teve problema de coluna”. A casca de aroeira também está entre os produtos mais procurados pelos pacientes de Chico Raizeiro. Recomendada para o tratamento dos “problemas de mulher”, conforme ele mesmo denomina, a casca é imersa em água e deixada de molho até que se obtenha um líquido de coloração avermelhada. A ingestão da bebida promete acabar com qualquer tipo de inflamação, inclusive nos ovários e problemas no útero. O mesmo produto, misturado com ameixa, é indicado para o tratamento de doenças mais graves como o câncer. “A única doença que eu encaminho direto pro médico é a dor de cabeça, porque ela pode ter origem de várias mazelas”, enfatiza. Ele relembra também o caso de uma moça de 17 anos, que morava no interior e cuja barriga crescia como se estivesse grávida: “O povo tava falando mal da coitadinha, mas eu logo percebi que era barriga d’água”. Para ajudá-la, descascou cem laranjas e pôs as cascas de molho, recomendando à mãe da garota que esta bebesse apenas dessa água durante 90 dias: “Foi tiro e queda, a moça ficou boa. Hoje em dia ela já é casada, mãe de família”.

DIALOGANDO COM A MEDICINA CONVENCIONAL Com solução para quase todas as doenças, Chico Raizeiro assegura que possui saúde de ferro: “Tenho 74 anos e nem óculos eu uso”, diz com orgulho, recordando a única vez em que precisou ir ao médico, há cinco anos, por causa de uma hérnia: “Era do tamanho de um coco, pensei que eu ia morrer”. Ele conta que uma semana após a cirurgia de retirada da hérnia, surgiram complicações e foi preciso abrir o corte, deixando-o cicatrizar dessa maneira. “A cirurgia não sarava de jeito nenhum, então eu preparei uma garrafada com sumo de gervão, mastruz e folha de algodão. Tomei só um litro e sarei”. A vitalidade de Chico é refletida na sua descendência. Ao todo são 42 filhos: 16 do primeiro casamento, três do segundo e o restante fruto de relacionamentos extra-con-

jugais. “Eu tenho contato com todo eles, do mais velho ao mais novo”, assegura explicando que, quando tinha dúvidas sobre a paternidade, se rendia aos avanços da tecnologia na área da Medicina e recorria aos exames de DNA: “Quando surgia uma história de que tinha uma mulher grávida de um filho meu, eu esperava a criança nascer e ia fazer o exame, porque eu só assumo se for meu mesmo”. Entre um cliente e outro, ele destaca o prazer que tem no trabalho: “Eu gosto de trabalhar com isso porque as cascas que a gente passa pro pessoal serve e eles voltam satisfeitos”. Depois de um tempo em silêncio acrescenta: “A coisa melhor que existe numa pessoa é a saúde. Quem tem saúde tem tudo”.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

49


Especial SBPC

SBPC Inclusiva

UFMA vai proporcionar acessibilidade inédita às pessoas com deficiência física e sensorial durante a reunião anual da SBPC

TEXTO: LUCIANO DOS SANTOS FOTOS: AUREA EVERTON, THAIS FERNANDA

D

esde que a Universidade Federal do Maranhão foi escolhida como sede da 64ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em 2011, a questão da acessibilidade para as pessoas com deficiência tem sido tratada como uma das prioridades pelos organizadores da reunião. A formulação da SBPC Inclusiva é uma iniciativa que visa à inclusão e o oferecimento das atrações da 64ª Reunião Anual da SBPC, de 22 a 27 de julho, na Cidade Universitária, a todas as pessoas com deficiências físicas e sensoriais. É a primeira vez que a reunião anual da SBPC é pensada com perfil inclusivo. A acessibilidade é um direito garantido às pessoas com deficiência, previsto pela Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, a qual “estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação”. Para garantir este

direito na UFMA, inclusive durante a Reunião da SBPC, foram investidos mais de R$ 2 milhões voltados para as modificações estruturais e a aquisição de equipamentos que possibilitem o acesso ao conteúdo acadêmicocientífico. De acordo com Evandro Guimarães, diretor do Núcleo de Acessibilidade da UFMA, “o pontapé inicial” da SBPC Inclusiva se deu em uma reunião ocorrida no dia 28 de fevereiro entre o Núcleo de Acessibilidade da UFMA e instituições como Centro de Atendimento Especializado na Área da Surdez (CAES), o Centro de Apoio Pedagógico (CAP), a Escola de Cegos do Maranhão e o Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência, cujas contribuições revelaram-se determinantes na elaboração das estratégias a serem empregas na construção da SBPC Inclusiva. Evandro Guimarães divide o projeto da SBPC Inclusiva em dois níveis: “macro” e “micro”. No nível “macro”, o foco é dado à acessibilidade do espaço físico e eliminação de barreiras arquitetônicas. Em nível “micro”, o projeto consiste na criação das condições para disponibilização de conteúdo acadêmico e científico. Por exemplo, as pessoas

50 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

com deficiência auditiva terão acesso aos conteúdos de palestras e minicursos por meio de intérpretes de Libras (Língua Brasileira de Sinais), além da impressão de textos em braile, enquanto os participantes cegos acompanharão a programação da reunião anual por meio de áudiodescrição e serviço de descrição de imagens. O Diretor do Núcleo de Acessibilidade acrescenta que cada pessoa com total ausência de visão terá acesso a um artigo científico por dia em braile, bastando apenas o comparecimento ao Núcleo de Acessibilidade, que fica no prédio Castelo Branco, na Cidade Universitária da UFMA ou no NAPNEE (Núcleo de Apoio à Pessoa com Necessidades de Ensino Especiais), localizado no Colégio Universitário, situado também na Cidade Universitária da UFMA. Ele ressalta que, embora os participantes cegos tenham esta possibilidade, todos os inscritos na Reunião Anual da SBPC com deficiência sensorial terão acesso ao conteúdo disponível no evento. “Vamos disponibilizar um CD com o conteúdo da SBPC, entre artigos e palestras apresentadas, o que vai possibilitar aos participantes cegos e com baixa visão


ouvir todo o material no computador. Mas, o material também vai ser adaptado a outros tipos de deficiência sensorial e vamos montar uma espécie de ‘quartelgeneral’ do Núcleo de Acessibilidade na SBPC para solucionar os imprevistos”, afirmou Guimarães. Como participante ativo, o Núcleo de Acessibilidade da UFMA possui um stand na ExpoT&C, exposição de tecnologia e ciência, no qual o setor de auxílio à pessoa com deficiência vai mostrar seus serviços, os quais têm permitido a acessibilidade e permanência de pessoas com deficiência na Universidade, além de equipamentos desenvolvidos pelo núcleo, como a lupa eletrônica de baixo custo às pessoas com baixa visão, a almofada também de baixo custo para cadeirantes e um mapa tátil que servirá para que o participante com deficiência visual localize os locais da programação da SBPC na Instituição. “É a primeira vez que a acessibilidade é incluída na reunião da SBPC. É uma satisfação sermos a primeira Universidade a fazer uma SBPC Inclusiva e desejamos que isso se mantenha, que faça parte da programação não apenas desta reunião, mas também das próximas. Queremos que outras universidades abracem a ideia e façam com que a pessoa com deficiência tenha acesso ao evento de maneira integral, não só de comparecer, mas também de poder ver e ouvir o que eles desejam”, contou o Diretor do Núcleo de Acessibilidade.

Se de um lado a construção da Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência com caráter inclusivo perpassa pela preocupação com a questão da segurança, trânsito e a disponibilização de material acadêmico e científico, do outro, pessoas com deficiência da UFMA esperam que haja uma mudança social e comportamental mais significativa com a chegada do evento na Universidade. “Minha expectativa é que, por meio da SBPC, se possa

profissionalmente por todos que não têm deficiência. “Aos poucos, a questão da acessibilidade está sendo tratada, mas falta conscientização da população para não considerar as pessoas com deficiência como ‘coitadinhas’. É preciso que deem condições igualitárias para que nos desenvolvamos como qualquer outra pessoa. Somos pessoas também e temos nossas capacidades”, explica o estudante. João Brito, aluno do 4º período de licenciatura em Música, cego desde

Nos deixa felizes sermos a primeira Universidade a fazer uma SBPC Inclusiva e desejamos que isso se mantenha propagar a questão das necessidades que a pessoa com deficiência possui e que a sociedade possa garantir as condições de acessibilidade a essas informações”, disse Gilson Nascimento dos Santos, aluno do 5º período de Administração da UFMA, que possui baixa visão. O estudante que, em todo início de período ou cadeira de férias, tem que avisar aos professores das disciplinas sobre sua deficiência, afirma que consegue estudar por meio de conteúdos digitalizados oferecidos pelos próprios docentes e por lupas eletrônicas do Núcleo de Acessibilidade. Entretanto, considera que mais ações precisam ser feitas para que possa ser reconhecido pessoal e

a infância, é otimista sobre o evento. “Eu acho que a SBPC Inclusiva é boa, assim como tudo o que diz respeito à inclusão. Tudo o que vem para facilitar nossa vida é bem vindo, não só para mim, mas para todos os colegas que vivenciam essa situação”, disse. Apesar de ter a contribuição de muitos amigos na Universidade, ele também espera que pessoas sem deficiência tenham flexibilidade em relação às necessidades das pessoas com deficiências: “Alguns ainda não refletiram sobre a importância da solidariedade para com a pessoa com deficiência e a SBPC pode ser este momento de despertar, ou, pelo menos, o começo do processo de sensibilização”, finaliza. Gilson utiliza a lupa eletrônica, tecnologia criada pela UFMA e disponibilizada na biblioteca central do campus para alunos com baixa visão

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

51


Ofício - Artesã

O trabalho de bordar é muito importante, mas não é uma tarefa fácil. Ainda me emociono quando vejo meu trabalho nos arraiais

D.Tânia afirma que costuma escolher um dia para passear pelos arraiais e apreciar as brincadeiras, ver suas próprias produções nos terreiros e observar ainda o trabalho dos colegas.

Tânia Soares: a artesã de todos os bumba bois No ateliê, ela borda durante o ano inteiro, produzindo arte e beleza para os arraiais maranhenses

T

TEXTO: GUTEMBERG FEITOSA

ânia Lúcia Soares é uma mulher de 50 anos, nascida em São Luís, e que começou cedo a trabalhar para cuidar da família. Casada com Carlos Alberto Soares e mãe de Elaine Barbosa Soares Santos, D. Tânia é uma artesã que borda couros de Bumba-Meu-Boi há mais de 30 anos e desenvolveu uma técnica própria para o seu trabalho. Numa tarde de quarta-feira, a bordadeira, cheia de bom humor, abriu as portas de sua casa, um sobrado erguido nas proximidades do bairro Madre Deus, onde funciona o seu local de trabalho. Descontraída e de conversa fácil, D. Tânia contou que, antes de ser artesã, trabalhou como lavadeira, babá e até empregueti, como ela mesma diz, mas não realizou o sonho de ser professora por que precisou parar os estudos para cuidar da filha e da casa. A sua paixão pelos bordados começou quando foi encarregada pela produção de um espetáculo de Bumba-Meu-Boi. Ela topou o desafio e o resultado foi uma paixão que virou um ofício que ela exerce até hoje.

ESTÉTICA E IMAGINAÇÃO

Dona Tânia explica calmamente os passos do processo criativo. O primeiro passo é pensar no tema, e, em seguida, sentar-se com o desenhista da equipe, Marco Antônio, para a elaboração da arte. Feito o desenho, Tânia o colore e inicia a confecção. A finalização do bordado se dá no bastidor, espécie de mesa na qual se confecciona o bordado. Segundo a bordadeira, a parte mais difícil é a finalização. A bordadeira tem seu pai como uma grande referência. Aprendeu com ele que é o cliente que põe o arroz e o feijão na mesa. Por isso, zela pelo bom atendimento e pela qualidade do seu trabalho, e afirma que para se alcançar os objetivos pretendidos é preciso ser disciplinado, aprender sempre e melhorar cada vez mais. Tamanha é a arte revelada pelas suas mãos de ouro. São desenhos quase perfeitos, frutos de uma estética simbólica nos quais se misturam o esforço de um trabalho doloroso e paciente com a fé de que vale a pena continuar fazendo o que faz. O resultado de muito trabalho poderá ser compartilhado em breve, pois a artesã dará oficinas de bordado com o apoio do Governo do Estado no bairro onde mora. Um passo importante para que as novas gerações possam entrar em contato com uma produção artesanal diferenciada e uma forma de manter viva a tradição. Dona Tânia Lúcia Soares, a artesã de todos os bumba bois, se orgulha, pois sabe que o seu ofício permite que o Bumba-meu-boi possa sair nas ruas, dançar e encantar crianças e adultos submersos no universo simbólico do folclore maranhense. “Arte se ensina, se vende, se passa”, finaliza a bordadeira.

CRIATIVDADE E IMAGINAÇÃO

“Curiosidade nunca me faltou”, revela D. Tânia após ser perguntada se teve algum professor que lhe ensinou o ofício. Uma curiosidade resultante de muita observação e pesquisa sobre a arte do bordado, mas também da influência recebida da Companhia Barrica, com sede na Madre Deus. Hoje, D.Tânia vive dos bordados e estes ganharam uma nova dimensão depois que passaram a ser feitos por ela, que é muito procurada pela maioria dos organizadores do folguedo. A arte de D.Tânia já ultrapassou as fronteiras do Maranhão. Ela já expôs no Rio de Janeiro e as indumentárias que produziu já estiveram em diversos palcos internacionais. Com tanta demanda de trabalho não sobra muito tempo para ela passear, mesmo durante a temporada de arraiais. Mas, apesar disso,

52 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Produção de Alimentos

Acadêmica de Engenharia de Alimentos da UFMA apresenta hambúrguer de caju Os mesmos temperos utilizados na carne comum estão presentes no novo sabor TEXTO: LÍGIA GUIMARÃES FOTOS: ASCOM/UFMA - IMPERATRIZ

P

ão, carne e vegetais são os ingredientes comuns utilizados em um hambúrguer, mas, no Campus da Universidade Federal do Maranhão de Imperatriz, a acadêmica Aline Leme, do 10º período do curso de Engenharia de Alimentos, teve uma ideia diferente. A estudante manteve o pão e os vegetais, mas substituiu a carne por caju numa pesquisa de conclusão de curso, em 2009, sob a orientação da professora Virlane Kelly, da disciplina Microbiologia de Vegetais. O novo sabor do lanche já foi experimentado por 80 provadores durante uma mostra sensorial realizada com professores, alunos de graduação e técnico-administrativos da própria instituição. “Conseguimos constatar que foi um produto bem aceito. De uma escala de 1 a 9, a menor nota que o hambúrguer conseguiu foi 01, ou seja, desgostei muitíssimo, e a maior foi 9, isto é, gostei muitíssimo. Tivemos uma média de mais de 7”, comemora. O hambúrguer de caju é resultado de uma ideia cujo objetivo era investigar a possibilidade de utilização da fibra da fruta para a fabricação de vários alimentos. Aline faz os últimos preparativos com o novo sabor de hambúrguer para o Trabalho de

Virlane Kelly L. da Silva Professora Assistente I do Curso de Engenharia de Alimentos da Universidade Federal do Maranhão- Campus de Imperatriz- MA. Graduada em Engenharia de Alimentos pela UFC (2005), Mestrado em Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal do Ceará - UFC (2008). Atualmente é Doutoranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos pela Universidade Federal do Ceará - UFC. Tem experiência na área de Ciência e Tecnologia de Alimentos, com ênfase em Engenharia de Alimentos, atuando principalmente nos seguintes temas: Tecnologia e Processamento de Frutas Tropicais (manga, melão, goiaba, bacuri e castanha de caju).

Conclusão de Curso, que deve apresentar no segundo semestre de 2012. “Era uma pesquisa que estava bem desenvolvida e a gente já tinha feito uma análise sensorial com adolescentes que têm o costume de consumir hambúrgueres. A gente resolveu trazer a pesquisa para o nível de graduação, para que outras pessoas pudessem conhecer e fazer uma análise mais aprofundada do produto. O hambúguer foi muito bem aceito por quem provou”, ressaltou. A pesquisadora explica que os alimentos embutidos como os hambúrgueres têm grande quantidade de sódio, e que, de acordo com ela, podem ser prejudiciais à saúde. “Um alimento que vem de uma fruta é mais saudável. O caju é rico em fibras e em vitamina C, perdendo apenas para a acerola, tem baixa quantidade de lipídios e é fácil de ser encontrado”, afirma. PREPARO A preparação do hambúrguer de caju é fácil. Na pesquisa de Aline, em vez da utilização da carne, que é bovina, é utilizado o pedúnculo do caju, a parte carnosa usada na preparação de suco e que costuma ser jogada no lixo pelas grandes indústrias. “Nós utilizamos o bagaço, ou seja, a sobra da fruta quando é retirado o suco. Esse bagaço é refogado e temperado como uma carne normal, com cebola, tomate, pimentão, alho, os mesmos temperos da carne do hambúrguer tradicional. Quando a fibra esfria, é-lhe adicionado ovos e farinha de trigo para modelar os hambúrgueres”, explica Aline. Ela conta que após ser modelado e ganhar a forma do hambúrguer tradicional, o hambúrguer de caju pode ser levado ao forno, grelhado ou frito no óleo. “Substituir a carne pela fibra do caju, além de saudável, tem um sabor agradável, e até para vender sairia mais barato”, recomenda. A novidade é apontada por Aline como uma nova opção de lanche, principalmente de famílias

mais carentes. “Tem gente que passa fome com um pé de caju no quintal de casa”, analisou. A orientadora considera o projeto interessante, principalmente do ponto de vista nutricional. “O hambúrguer de caju vem agregar valor à fibra do caju que é descartada pela indústria, além de oferecer um novo produto à população. E, se a gente for pesquisar mais, descobriremos que da fibra é possível fazer outros produtos, como almôndegas, carne básica para macarronada, omelete”, informa a professora Virlane Kelly, acrescentando outros tipos de cozimentos que também poderiam ser testados, como em microondas e a vapor. “Nós formulamos esse hambúrguer e avaliamos as características químicas: pH, acidez, proteínas, umidade, lipídios, análises microbiológicas e análise sensorial com consumidores, na UFMA. As médias mostraram boa aceitação do produto”, completou a orientadora.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

53


Foto: Arquivo pessoal

Cultura

Lindô, a dança que entra na 4ª geração da família de Dona Francisca

Desde que me entendi por gente, danço o Lindô Maria Francisca Pereira da Silva, 68 anos, mais conhecida como Francisca do Lindô, é incentivadora e amante da manifestação cultural popular Dança do Lindô, no município de Imperatriz

A

TEXTO: CARLA REJANE DUTRA, WELBERT QUEIROZ, LÍGIA GUIMARÃES, DANIELA RIBEIRO FOTOS: CONCULTURA, CARLA REJANE DUTRA

paixão de D. Francisca pela dança do Lindô começou aos cinco anos de idade, no município de Caxias, cidade onde nasceu. A manifestação cultural, muito popular na sua infância, era dançada em qualquer período festivo quase como uma obrigação, e D. Lindô, de tanto dançar, incorporou o nome da manifestação ao seu. Atualmente, Francisca do Lindô é casada e mora em Imperatriz. Ensinou a dança para seus filhos, vizinhos e para todos que queriam aprender. O grupo que hoje lidera teve início em primeiro de abril de 1984, em comemoração ao seu 40º aniversário. A partir daí, surgiu o grupo Batalhão Real formado por seus filhos, netos e vizinhos. Com ritmo lento, homens e mulheres, em pares, dançam e entrelaçam os braços, cantando música de versos improvisados e balançando os corpos em forma de círculo, bem parecido com a quadrilha junina. Com saias coloridas e godês, bem rodadas e floridas, as moças embelezam a dança e contagiam o público. Bem marcante na Dança é a presença do tambor, considerado instrumento indispensável. A alegria dos brincantes começa quando Dona Francisca, sentada com o tambor sobre as pernas, inicia a batucada e a cantoria. O ritmo e o som contribuem na marcação dos passos durante o bailado.

54 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


MAPEAMENTO DA CULTURA NA REGIÃO TOCANTINA Situada na divisa com o estado de Tocantins, Imperatriz é a segunda maior cidade do estado do Maranhão. Por estar localizada entre três regiões do Brasil (Nordeste, Centro – oeste e Norte) e ser considerada uma cidade de trabalho e passagem, assume uma tendência multicultural e plural, sendo influenciada pelas culturas indígena, cabocla, sertaneja e agropecuária, trazidas pelas recentes migrações do Tocantins, Goiás e Sul do país. Dentro desta perspectiva, foi inaugurado, em outubro de 2009, o projeto de pesquisa Concultura. Coordenado pelos professores do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Maranhão, Marcos Túlio e Letícia Cardoso, o projeto é considerado atualmente uma referência regional na promoção de articulações entre práticas de comunicação e movimentos culturais locais. O ponto de partida do projeto foi uma pesquisa intitulada Qual a cara de Imperatriz? Trabalho balizado por leitura de textos teóricos e abordagem etnográfica (observação participante, descrição e entrevistas), visando registrar e difundir produções culturais nativas que não têm grande visibilidade no espaço público, apesar de tradicionais. Com o resultado das pesquisas em mãos, o grupo está editando todo o material coletado e pretende lançar, em breve, um livro-catálogo e um documentário. O Concultura analisa que a cidade de Imperatriz tem uma produção cultural diferente e isso se deve à sua diversidade. A preocupação do projeto é trazer à tona manifestações da cultura local que são desconhecidas para a maior parte da população, visando desconstruir alguns

discursos reducionistas e apressados sobre a cidade, como de que Imperatriz não tem cultura ou que é a cidade do sertanejo. Entre as manifestações e produções artísticas presentes, destacam-se o Teatro, a cultura Hip hop, a Festa do Divino, além da Dança do Lindô. O cenário musical também traz seus representantes, intérpretes, compositores e ganhadores de vários festivais de música do país, como Nenê Bragança e Zeca Tocantins. Para a coordenadora do projeto Letícia Cardoso, as identidades construídas em Imperatriz têm uma ligação muito forte com a ideia de região, mais especificamente a Tocantina. “Parte significativa da população, que hoje vive em Imperatriz, não nasceu aqui. Muitos vieram de outros Estados, mas notamos que essas pessoas trazem consigo seus costumes e tradições, que se misturam com as culturas locais. Pense aí, no resultado? Agora é que a população urbana nativa da cidade está se desenvolvendo e criando vínculos com os traços culturais da região,” explica. Outra atividade realizada pelo grupo é a concretização de eventos científico-culturais na própria UFMA, que visam dar voz aos agentes da cultura local que fazem parte da pesquisa. O projeto Concultura realiza debates e mesas-redondas com os produtores culturais e pesquisadores para discutir temas polêmicos e necessários à organização e profissionalização da cultura local. “Dessa maneira, o projeto contribui para o fortalecimento das identidades locais, que também são maranhenses, apesar de também se identificarem com a região Tocantina”, afirma Letícia.

Marcus Túlio Borowiski Lavarda Professor da UFMA- campus de Imperatriz. Atua na área de imagem e iconografia, especialmente em fotografia documental, fotojornalismo e fotografia publicitária. É coordenador do Projeto de Extensão CONCULTURA (MEC/Proext/2010). Possui graduação em Publicidade e Propaganda; Especialização em Imagem e Som e Mestrado em História, tendo a imagem como ponto central para suas reflexões.

Letícia Conceição Martins Cardoso Professora Assistente do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão , onde desenvolve estudos sobre cultura popular e convergência. É idealizadora e coordena o Projeto de Extensão CONCULTURA (MEC/Proext/2010). Graduou-se em Comunicação Social - Jornalismo (2004) na UFMA e em Letras (2003) na Universidade Estadual do Maranhão. É Mestre em Ciências Sociais (2008) pela Universidade Federal do Maranhão.

Dona Francisca e os percussores da dança do Lindô

MÃOS TALENTOSAS Além da intimidade com o tambor, as mãos de Dona Francisca também operam bênçãos em crianças com dor de barriga, quebrante, dor de cabeça e ventre caído. Benzedeira, ela assegura que todas as crianças por quem reza são curadas. Diante de várias dificuldades, como a

Manifestação da cultura do Lindô no campus de Imperatriz

luta de cinco anos contra um câncer, a líder da brincadeira não desiste de seus projetos. Ela sonha ter um espaço cultural para ensinar a Dança do Lindô às crianças e adolescentes de Imperatriz, pois entende que é uma forma de perpetuar essa manifestação cultural na cidade e ajudar

os jovens a sair da marginalidade à qual alguns estão submetidos. “Muitos jovens já saíram das drogas, viraram cidadãos de bem depois que vieram para Dança do Lindô”, afirma Dona Francisca.

O GRUPO ORGANIZA REPERTÓRIO PARA O SEGUNDO CD Dona Francisca conta que seu pai relatou que a avó dele aprendera a dançar o Lindô com os escravos. Ela explica ainda que essa dança veio para o Brasil em 1772, trazida por dois irmãos que vieram de Portugal e chegaram a Caxias, município situado no Leste do estado do Maranhão. Francisca do Lindô continua liderando o grupo Batalhão Real com a ajuda dos filhos. De acordo com a filha Maria Nilda Pereira da Silva, de 38 anos, a dança já está entrando na quarta geração em Imperatriz. A fim de não deixar a manifestação cultural morrer, Maria pretende dar continuidade ao trabalho da mãe. Em 2004, Francisca do Lindô gravou seu primeiro CD com todas as músicas de sua autoria e pretende gravar o segundo CD ainda em 2012, com algumas músicas inéditas.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

55


56 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Educação

mbarcando E em um sonho Estaleiro-escola: técnica, arte e tradição que só se encontram no Maranhão TEXTO: AMY LOREN FOTOS: ÉRICA MUNIZ, JOSIANE MENDES

Q

uem poderia imaginar que de uma simples observação surgiria uma escola pioneira no Brasil e de referência internacional na construção de embarcações artesanais? Este é um dos tesouros tradicionais que o Maranhão esconde, mas, por questões sociais e econômicas, não havia sido revelada sua importância e complexidade. A história teve início há 35 anos, quando o engenheiro Luiz Phelipe Andrès percebeu detalhes únicos nas embarcações aportadas na Praia Grande: velas vermelhas e amarelas, cascos de cores vigorosas, engenharias diversas, adaptadas às características marítimas da região. “Quando eu cheguei aqui, o que chamou a minha atenção foi a beleza das embarcações. Tirei fotos e acabei me aproximando dos pescadores que me explicaram, por exemplo, que as velas coloridas eram tingidas para proteger o tecido”, conta o engenheiro. Phelipe acabou descobrindo que tais atributos poderiam ser encontrados apenas em um lugar do mundo: no Maranhão.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

57


O SONHO Phelipe chegou a São Luís no final da década de 1970 e percebeu a riqueza da tradição dos estaleiros artesanais. Mas foi nos anos 1986 e 1987 que a ideia de expor estes conhecimentos se desenvolveu, com o projeto de pesquisa “Embarcações do Maranhão”, capitaneada pelo engenheiro. A pesquisa foi realizada por meio de um convênio entre o Governo do Estado do Maranhão e a FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos, do Ministério da Ciência e Tecnologia), com o objetivo de recuperar e preservar as técnicas populares de construção de embarcações de madeira.

Oficineiro constrói miniatura de embarcação com as técnicas ensinadas no Estaleiro-Escola

A TRADIÇÃO Aqui podem ser encontradas peculiaridades na produção de embarcações que chegam a se elevar ao nível artístico. Um exemplo são as cores utilizadas nos barcos. Dispostas intuitivamente, porém, de acordo com a indicação acadêmica, elas são responsáveis pela harmonia cromática dos arranjos. A simplicidade do método e, ao mesmo tempo, sua complexidade são o que torna o carpinteiro naval um verdadeiro artista, capaz de fazer um meio de transporte seguro que serve, por exemplo, para levar alimento a milhares de pessoas.

A CRIAÇÃO A pesquisa confirmou a existência de uma diversidade de modelos e técnicas para a construção de barcos, mas, como nem tudo são flores, também revelou uma situação preocupante. Apesar da forte representatividade que a navegação exerce sobre a base da economia regional, a carpintaria naval estava em uma situação deplorável de abandono, além das péssimas condições de salubridade e segurança nas quais os mestres eram obrigados a trabalhar. “De fato, todo este conhecimento transmitido de forma empírica, de pai para filho, há mais de 400 anos, corria o risco de desaparecimento”, explica Phelipe. A contribuição da pesquisa para o resgate desta tradição alcançou horizontes que resultaram na fundação, em dezem-

Barcos de todos os tamanhos são fabricados na escola

58 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

bro de 2006, do Centro Vocacional Tecnológico Estaleiro-Escola. A Instituição carrega a filosofia de valorização e transmissão deste conhecimento e da categoria destes profissionais. “Aqui os velhos mestres carpinteiros navais podem hoje transmitir seus ensinamentos às novas gerações como forma de assegurar a valorização e, por conseguinte, a perpetuação dos conhecimentos tradicionais”. Para o professor de Direito Ambiental e Marítimo, Luiz Francisco Andrès, a divulgação do ofício de carpinteiro naval introduz no mercado de trabalho um profissional que irá garantir a perpetuação da técnica, além da geração de novos empregos e a melhoria de renda para todos os profissionais envolvidos nas etapas de construção naval artesanal maranhense. “Nós pensamos bastante em transformar o estaleiro em uma escola de nível superior. Acreditamos e sonhamos que um dia o estaleiro seja uma referência para o ensino de engenharia naval no Brasil, assim como o ITA é para o ensino da tecnologia aeronáutica”, declara. Atualmente, o estaleiro-escola é pioneiro no país por oferecer cursos técnicos de nível médio relacionados à engenharia naval, a exemplo dos cursos de Construção Naval Artesanal e Velejador. Também são ministrados cursos como Introdução à Informática, Preservação Ambiental, Marcenaria e Eletrotécnica, entre outros. “Além da preocupação em transmitir estes conhecimentos tradicionais, nós também nos preocupamos em oferecer ensino sobre outras áreas que consideramos fundamentais para o desenvolvimento destes profissionais e, inclusive, da comunidade”, acrescenta Phelipe. O diretor revela que, no Estaleiro, ainda existem outras atividades como a produção de pequenos modelos e até oficinas de reciclagem com garrafas pet que chegam à praia, trazidas pela maré.


O técnico de marinha, velejador amador e modelista, Sebastião de Jesus Barros, trabalha com a atividade de navegação há 10 anos e fala sobre o quanto a carpintaria naval artesanal é importante para a população maranhense. “O Maranhão possui muitos rios, sendo este um dos cursos pelo qual navega o meio de transporte como o barco, que é fabricado

pelo mestre carpinteiro. Sem a simplicidade e praticidade que a carpintaria naval traz para a vida das pessoas, a dificuldade aqui e no interior seria muito maior para a população”, explica. Hoje, trabalha com a equipe do estaleiro-escola e fabrica modelos de barcos e canoas em miniaturas, que podem ser encontrados na galeria da escola.

Apesar de possuir uma estrutura completa e organizada para a aplicação dos cursos, o estaleiro - escola esteve recentemente sem oferecê-los à comunidade, mantendo apenas algumas atividades ativas. Entretanto, os cursos reabriram inscrições e devem retornar com suas atividades a partir do segundo semestre deste ano.

>> A canoa-costeira é um tipo de embarcação cujas características, em todo o mundo, podem ser encontradas apenas no Maranhão. Em junho deste ano, a canoa-costeira chamada Dinamar foi tombada como Patrimônio Cultural Brasileiro. >> A escola possui um pequeno museu onde peças raríssimas de embarcações do Maranhão e do Brasil podem ser observadas, além de apresentar dezenas de tipos de canoas e barcos marítimos e fluviais que existem no Estado. >> A economia de subsistência no Maranhão ainda depende essencialmente da atividade naval. Pescadores e velejadores fazem a ponte no transporte de alimentos e passageiros, bem como a pesca. >> O Estaleiro-Escola fica localizado no Sítio Tamancão (área Itaqui-Bacanga), em um antigo moinho de arroz do século XVIII, quando o auge da

>> O Barco Estandarte, que está aberto à visitação durante a SBPC 2012, é um projeto de divulga-

economia maranhense se baseava na exportação

ção do estaleiro-escola. O barco foi completamente restaurado e adaptado para que pudessem

de arroz e algodão. O moinho era utilizado para

ser realizadas apresentações sobre as embarcações do Estado. Ele pertenceu a Sebastião

otimizar o processo de debulha do arroz, feito, até

Barros, que hoje faz parte da equipe do estaleiro-escola. O seu interior é climatizado e tem

então, pelos escravos nos pilões de madeira. Até

capacidade para 25 pessoas. A apresentação inclui a exibição de um vídeo em uma TV de LCD e

hoje ainda é possível ver as ruínas do engenho.

luzes de LED instalados dentro do barco.

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

59


Ofício - Construtor de embarcações

Seu Magno, o homem que faz barcos Mesmo tendo começado o ofícios aos 41 anos de idade, ele não dispensou os ensinamentos do pai agno Garcez de Oliveira é um homem franzino de 62 anos, mas de perceptível vitalidade. Qualifica-se profissionalmente como carpinteiro naval, mas não esconde o orgulho de ser chamado de artesão. Em seu modesto, porém funcional local de trabalho – que prefere denominar de oficina a estaleiro ou fábrica – constrói variados tipos de embarcações. Diz que já perdeu a conta da quantidade de barcos a vela e motorizados, canoas, bianas e igaratés que construiu ou ajudou a construir quando auxiliava o pai, de quem herdou a profissão. Ele tem 10 filhos – dos quais seis são homens – todos adultos e também carpinteiros, que lhe ajudam, mas sem o compromisso de lhe suceder na tarefa de construir embarcações. “São bons filhos, inteligentes e não os aconselho a seguirem a minha profissão. Prefiro que estudem e consigam outra forma de ganhar a vida”, observa. Magno continua a fabricar barcos. “Faço embarcações novas e reformo velhas, de todos os tamanhos e modelos. Monto a estrutura, instalo o motor e ainda pinto”, diz o carpinteiro naval na oficina instalada no quintal de sua casa, no Porto de Mocajituba, povoado banhado pela Baía de São José e pertencente ao município de Paço do Lumiar, encravado na Grande Ilha de São Luís.

Eu gosto da minha profissão. Para mim, é um prazer terminar a construção de um barco e vê-lo no mar Embora tenha herdado do pai a profissão, assumiu o controle da produção somente aos 41 anos. Antes, trabalhou na lavoura, foi pescador e até barbeiro na Marinha. Estudou apenas dos seis aos oito anos de idade, período em que aprendeu a assinar o nome, pois abandonou a escola para ajudar a família na roça. Define-se como autodidata, já que conhece as quatro operações matemáticas e aprendeu o seu ofício apenas observando e auxiliando na produção. “Eu gosto da minha profissão. Para mim, é um prazer terminar a construção de um barco e vê-lo no mar”, confessa Magno, acrescentando que irá trabalhar “enquanto tiver saúde e Deus quiser”.

TRABALHO E PRAZER

A oficina de Magno Garcez está situada numa comunidade bucólica, que acomoda pescadores, marisqueiros, catadores de caranguejos e trabalhadores rurais. Ele é o único construtor de embarcações da área. Seu trabalho é praticamente artesanal e, quando a demanda é grande, contrata vizinhos temporariamente. Ele assegura que sua receita financeira dá para sustentar a família e acumular algum patrimônio. Ele não releva, com precisão, quanto cobra pela construção de um barco de tamanho médio, mas adianta que pede em torno de R$ 10 mil para um trabalho que dura, em média, três meses.

M

TEXTO: MARIANA SALGADO

Oficina de Seu Magno no porto de Mocajituba

60 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Economia, cultura e sustentabilidade

Primeiramente, o que é economia criativa e solidária e qual a sua natureza no contexto econômico atual? Mariana: A economia criativa e solidária vem da criatividade das pessoas que buscam formas alternativas de gerar trabalho e renda. É um trabalho de grupos, de associações e cooperativas para comercializar e produzir. A cooperação entre eles nos ajuda a quebrar alguns gargalos que sozinhos não conseguiriam. São vários os grupos de cooperativas pelo Estado, mas há trabalhadores informais, portanto, é necessária essa solidariedade. O que o Maranhão produz e exporta de bens e serviços criativos? Mariana: Os produtos vão desde o artesanato até a produção do babaçu, que é o produto mais importante. Aliás, o que o Estado tem de mais forte está na área do extrativismo: o mel, bastante produzido, e o babaçu e seus derivados, como o azeite, o sabonete e o mesocarpo. Como é a articulação entre o governo federal, o estadual e a Universidade?

TEXTO: ALINE ALENCAR

Durante a 64ª Reunião Anual da SBPC, nós queremos instigar a comunidade acadêmica a ajudar a secretaria, de forma que estes possam dar apoio a todos os grupos que trabalham com economia solidária

P

rovocar a comunidade científico-acadêmica para a busca do desenvolvimento da economia maranhense de forma sustentável e de combate à pobreza. Esse é um dos objetivos da Secretaria de Estado do Trabalho e Economia Solidária a ser alcançado com a apresentação do Projeto da Feira de Saberes e Sabores da Economia Solidária no Maranhão durante a 64ª Reunião Anual da SBPC. Representando o setor de Economia Solidária e combate ao trabalho escravo, a secretária Mariana Nascimento ressalta a importância deste tipo de economia para o desenvolvimento do Estado e combate à pobreza. Mariana frisa a colaboração de estudantes e pesquisadores na empreitada que é consolidar a Economia Solidária, que existe há mais de 200 anos no mundo, como um modelo válido de economia.

Entrevista

Projeto da Feira de Saberes e Sabores da Economia Solidária no Maranhão, que será apresentado durante a 64ª Reunião Anual, propõe o desenvolvimento da economia maranhense de forma sustentável por meio da economia criativa e solidária

Mariana: Com a Universidade, estamos buscando agora uma interação aproveitando o momento da SBPC, pois, infelizmente, não temos ainda no Maranhão essa integração com as universidades e os grupos da economia solidária. É preciso que haja a encubação de empreendimentos para que os pesquisadores das universidades possam divulgar o trabalho com esses grupos, situação que, enquanto Secretaria de Estado, não sabemos se existe, apesar de em outros Estados como a Paraíba, a Bahia e o Ceará já haver esse tipo de trabalho. Entre o Governo Federal e Estadual há uma

parceria muito grande entre as PNAE’s (Programa Nacional de Alimentação Escolar), Secretaria Nacional de Economia Solidária e a Secretaria Nacional do Trabalho, em que é desenvolvido um trabalho de apoio aos grupos produtivos, buscando o fortalecimento dos mesmos. De que forma cientistas e produtores culturais podem trabalhar em conjunto, deixando a competitividade dar lugar à solidariedade? Mariana: Devolvendo para as comunidades os trabalhos de pesquisa feitos com esses grupos, situação difícil de ocorrer. Nós queremos é a devolução. Hoje, por exemplo, temos várias máquinas que podem facilitar a produção das quebradeiras de coco, mas nenhuma delas consegue chegar ao produto final como as quebradeiras de coco conseguem. É um trabalho que chega à universidade, mas não volta ou fica incompleto. Por isso, durante a 64ª Reunião Anual da SBPC, nós queremos instigar os cursos universitários, como, por exemplo, o de Administração para trabalhar temas como a autogestão, e assim ajudar a secretaria a dar apoio a todos esses grupos, que, em média, são 1.040 cadastrados,

Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012

61


além de dar um subsídio aos estudantes na forma de estágio. Quais os programas do governo do Estado são exemplos de economia solidária?

Mariana: Os programas que temos no momento são voltados para a comercialização e, entre eles, temos o Programa Estadual de Feiras, que busca facilitar a comercialização, e o Programa de Aquisição de Alimentos do PNAE. Ambos orientam os grupos para que eles se organizem e possam comercializar e adquirir produtos para a alimentação escolar. E, muito em breve, haverá um Programa de Assistência Técnica aos grupos produtivos de economia solidária. Quais as diferenças entre economia tradicional e economia solidária? Porque a segunda é considerada melhor para o desenvolvimento da economia local? Mariana: A economia solidária não se preocupa só com o lucro pelo lucro, principal ideal do contexto capitalista em que vivemos. A economia solidária se preocupa com a sustentabilidade, o meio ambiente, o respeito ao próximo e a não exploração ao ser humano. O trabalhador solidário tem tempo para família e trabalha em seu local de origem, agregando valores diferenciados. De que forma, a união entre economia criativa e solidária contribuem para o desenvolvimento do Estado no que concerne ao combate à pobreza e a preservação dos saberes populares (principal tema da SBPC)? Mariana: O combate à pobreza depende da manutenção dos trabalhadores em seus locais de origem, ao contrário do que vemos hoje. Há alguns projetos que tiram a pessoa do seu local de origem e, geralmente, ela acaba na periferia da cidade. Toda a produção da

Quais os desafios do Estado a serem superados para a fixação desse modelo de economia? Mariana: Reconhecer a economia solidária, dar valor ao que temos em nosso Estado e mostrar o que nós temos de melhor na nossa cultura. A economia solidária visa desenvolver o Estado de forma sustentável. A troca de produtos, de saberes e de tecnologias ajuda e muito a divulgar este tipo de economia. Há um levantamento de dados no sentido de permitir uma compreensão ampla das características e potenciais criativos do Estado? Mariana: O trabalho de levantamento dos grupos foi feito com a UFMA, há algum tempo, desde 2005. Alguns dados constatados são em relação ao número

Na SBPC traremos 40 grupos que trabalham com economia solidária, eles vão divulgar para todo o Brasil o que temos no Maranhão, e ainda vamos realizar o lançamento de um livro sobre a estratégia de comercialização da Economia Solidária

A economia solidária não se preocupa só com o lucro pelo lucro, ela se preocupa com a sustentabilidade, o meio ambiente e o respeito ao próximo

economia solidária parte de um saber popular.

de grupos produtivos, quantidade de mulheres (a maioria podem, pela natureza do trabalho, estar mais próximas às famílias) e quantidade de homens. Outro dado já conseguido refere-se à ordem de seguimento da economia solidária: em primeiro lugar, a agricultura familiar, logo depois o artesanato e, por último, está dentro de confecção de produtos entre outros. De acordo com o Ministério da Cultura, os desafios para a implantação da economia solidária são: Levantamento de informações e dados da economia Criativa; Articulação e estímulo ao fomento de empreendimentos criativos; Educação para competências criativas; Infraestrutura de criação, produção, distri-

Revista Portal Portal da da Ciência Ciência :::: Edição Edição Especial Especial SBPC SBPC :::: Ano Ano II II Número Número II II :::: Julho Julho de de 2012 2012 62 Revista

buição/circulação e consumo/fruição de bens e serviços; e a Criação/ adequação de Marcos Legais para os setores criativos. Na sua opinião, qual é o maior desafio no âmbito estadual? Mariana: O maior desafio, com certeza, é o marco legal. Se nos basearmos na lei do cooperativismo de 1975, então uma cooperativa da economia solidária tem os mesmos impactos sociais de uma grande empresa. Porém, nossa produção não tem uma escala continuada do primeiro ao último mês do ano, entre outras questões que nos impedem de regulamentar a economia solidária no contexto do sistema capitalista. Atualmente, nós estamos com 18 leis tramitando no Congresso Nacional e, durante a SBPC, coletaremos assinaturas para agilizar esse processo de reconhecimento do trabalho criativo e solidário como modelo econômico. Ainda de acordo com o Ministério, o não reconhecimento de determinadas atividades como profissões impede o trabalhador criativo de ter acesso aos benefícios, direitos trabalhistas e previdenciários. Quais as atividades aqui do Estado já são reconhecidas como profissão? Mariana: As únicas que tem reconhecimento são as quebradeiras de coco, não enquanto empreendimento, mas sim, por causa das lutas e das conquistas que já tiveram. Porém, o artesão e outros não tem esse reconhecimento, muito menos regularização. O que buscaremos com os 40 grupos que estarão na feira é divulgar e mostrar o que temos no Maranhão de produção de economia solidária, bem como a nossa organização. Além disso, lançaremos o livro Comercialização em rede - uma estratégia da economia solidária, contendo os pontos de comercialização que estão sendo espalhados pelo país e a instalação das budegas no Médio Mearim do Maranhão, por exemplo. Por meio dessas redes, o produtor coloca à venda seu produto, podendo também trocá-lo por algum de seu interesse. O livro contém oito exemplos de comercialização solidária no Maranhão e no país. Teremos também, durante a apresentação da Feira na SBPC, os espaços temáticos da pesca, produção oriunda do babaçu, da mandioca e da juçara e suas variações. Produtos esses de onde as famílias tiram seu sustento produzindo doces, bombons e afins.



“A UFMA se orgulha em sediar o maior evento de pesquisadores da América Latina e Caribe, a SBPC. Sejam bem vindos!” 64 Revista Portal da Ciência :: Edição Especial SBPC :: Ano II Número II :: Julho de 2012


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.