Revista Portal da Ciência 2014

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ISSN 2178-9090

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Ano IV • Número IV • Setembro / Outubro de 2014

A BOA IDEIA QUE NÃO DEU CERTO

Mais de 40 anos após a construção da Barragem do Bacanga, uma investigação apresenta os reais problemas e os pontos polêmicos do projeto que originou a obra

Festa da Juçara está cada vez mais distante daquele que deveria ser seu público cativo: os próprios maranhenses Entrevista: professor da UFMA, Alexandre Freire, fala sobre a aplicabilidade e as implicações da Lei de Proteção Intelectual Estudo propõe mudança na caracterização da Alienação Parental enquanto ato infracional


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Natalino Salgado Filho Reitor da Universidade Federal do Maranhão

UMA UNIVERSIDADE QUE INVESTE NA DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA

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ompartilhar com a sociedade as descobertas resultantes da curiosidade de cientistas e pesquisadores nos faz acreditar que trabalhamos cada vez mais em favor da cidadania, por meio da transparência e da prestação de serviços que são de interesse público. Nesta quarta edição da Revista Portal da Ciência, pautamos mais uma vez o esclarecimento de questões que servem de cenários para a Sociedade Civil, sob o compromisso de oferecer uma amostra expositiva à respeito de parte da produção científica da Universidade Federal do Maranhão. A elaboração desta edição é o resultado de uma parceria de sucesso entre aqueles que detém o conhecimento, capaz de propiciar a divulgação da ciência e tecnologia, e os pesquisadores que compartilham os resultados e as suas observações. É por conta desta relação de confiança que a Revista, criada como um espaço criativo, ganhou mais páginas, e diversificou o seu olhar, sempre na busca pela unidade e coerência de um discurso que privilegia a atualidade, a produção do conhecimento, a difusão e a divulgação científica. Com valores assentados nesta proposta de divulgação do conhecimento, e com o reconhecimento e a aceitação cada vez maior da comunidade acadêmica, a equipe responsável pelo periódico realizou uma ampla pesquisa que culminou, naturalmente, - como todo o trabalho desta natureza-, em grandes descobertas onde é possível ratificar a quantidade e mensurar a qualidade produtiva dos trabalhos. E, a comprovação desta afirmação poderá ser conferida pelos leitores ao longo da Revista que temos, nesta oportunidade, o prazer de apresentar.

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ESTRUTURA ORGANIZACIONAL PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Dilma Rousseff

EXPEDIENTE Ano IV • Número IV • Setembro / Outubro de 2014

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MINISTRO DA EDUCAÇÃO

José Henrique Paim UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO REITOR

UMA PUBLICAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO

Natalino Salgado Filho

(UFMA) www.ufma.br

VICE-REITOR

IDEALIZAÇÃO

Antônio José Silva Oliveira

ascom@ufma.br

PRÓ-REITORA DE ENSINO

ASSESSORA DE COMUNICAÇÃO E EDIÇÃO GERAL

Isabel Ibarra Cabrera PRÓ-REITOR DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

Fernando Carvalho Silva

Francisca Ester de Sá Marques Prof ª Adjunta do Departamento de Comunicação/UFMA

PRÓ-REITORA DE EXTENSÃO

EDIÇÃO

Marize Barros Rocha Aranha

Francisca Ester de Sá Marques, Roberth Meireles

PRÓ-REITORA DE RECURSOS HUMANOS

Maria Elisa Lago Braga Borges

PRODUÇÃO

PRÓ-REITOR DE GESTÃO E FINANÇAS

Luís Félix Rocha, Nelciane Dias, Marcelo Oliveira, Rosana de Oliveira

José Américo da Costa Barroqueiro REPORTAGENS CIDADE UNIVERSITÁRIA

Av. dos Portugueses, Nº 1966 CEP 65085-580

Alexssandro Rodrigues, Arlan Azevedo, Daryane Caldas, Fabiana França, Henrique Coutinho, Letícia Mourão, Luama Alves, Marcele Costa, Osmilde Miranda, Roberth Meireles, Rosana de Oliveira, Sansão Hortegal REVISÃO DE TEXTO

Charles Martins, Patricia Santos PROJETO GRÁFICO E DIAGRAMAÇÃO

Kleyton Kerlison ILUSTRAÇÃO

Fabiana França, Kleyton Kerlison IMPRESSÃO

Motográfica/CE TIRAGEM

5.500 exemplares

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Editorial

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o longo das próximas páginas, gostaríamos de convidá-lo a desenvolver uma experiência de leitura diferente, sem condicionantes e conservantes, e desvencilhada de posicionamentos já cristalizados em outros meios de comunicação. Para isso, nesta quarta edição da Portal da Ciência, assumimos o desafio de produzir reportagens cujos posicionamentos contrários causaram conflito entre si . A solução, pelo somatório de vozes e pela pluralidade de pontos de vista, custou caro à nossa equipe de produção, que precisou prestar atenção individual e igualitária a cada fonte e, ao mesmo tempo, em todas as nuances dos fenômenos retratados nas reportagens. Ao término da produção, tivemos a certeza de que o resultado final da experiência do olhar capturado, dos detalhes fotografados pelas lentes de nossa equipe de fotografia assinaram a constatação do compromisso que a Universidade carrega de decifrar o que, muitas vezes, o academicismo dificulta na apreensão e no entendimento do mundo. Desta maneira, trabalhando de forma equilibrada com pesquisas no âmbito da Graduação e da Pós-Graduação, apresentamos como capa da quarta edição da Portal da Ciência uma reportagem que poderia ser facilmente uma conversa aberta, franca e esclarecedora à respeito de uma boa ideia de infraestrutura que não deu certo: a Barragem do Bacanga. O objeto tão próximo, e por onde passam, diariamente, milhares de integrantes da comunidade acadêmica da UFMA, integrou um conjunto de outras reportagens, onde foi possível, por exemplo, tomar conhecimento à respeito do processo de digitalização do acervo de um dos maio-

res literários do Maranhão. Na editoria de Cultura, trazemos um diagnóstico sobre a tradicional Festa da Juçara; e na editoria Saúde, a constatação e os motivos que levam o Maranhão a ser um dos estados com o maior índice de recusa no que se refere à aceitação na doação de órgãos. A entrevista desta edição da Portal da Ciência trata sobre o tema Proteção Intelectual. O assunto chamou a atenção de nossa equipe que localizou um projeto na UFMA que está estudando a aplicabilidade da Lei sobre a Proteção Intelectual. De forma inédita, temos o prazer de apresentar o Herbário de Biologia - espaço que tem servido como viveiro de espécies da flora maranhense. O reconhecimento sobre as nossas riquezas não se restringe apenas à área das Ciências Biológicas, pois encontramos uma equipe de pesquisadores do curso de Design que descobriu que pode inovar aproveitando o que antes ceramistas maranhenses consideravam lixo. Exemplo de soluções criativas e de fácil acesso, tal como o Beiju à moda maranhense - inovação gastronômica produzida na UFMA, premiada e reconhecida internacionalmente. Agora que já apresentamos parte das reportagens que esta Portal da Ciência carrega consigo, desejamos que o convite para um posicionamento atento e participativo tenha sido aceito.

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oa leitura

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Sumário MEU PAI NÃO GOSTA DE MIM Estudo especializado propõe que casos de Alienação Parental não são cometidos apenas pelos pais de crianças em contexto de separação

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DESEQUILÍBRIO SILENCIOSO E INVISÍVEL NOS SOLOS Grupo de pesquisa da Universidade está mapeando, de forma inédita, a presença de poluentes químicos em solos e águas subterrâneas do Estado

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DIGITALIZAÇÃO DE ACERVO DE BANDEIRA TRIBUZI Quase 40 anos após o seu falecimento, projeto da UFMA reunirá legado intelectual e artístico de um dos maiores literários maranhenses

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ACESSO À PRODUÇÃO CIENTÍFICA Plataforma eletrônica facilita a divulgação e a submissão da produção acadêmica. Conheça quais são os periódicos da UFMA e suas áreas de abrangência

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UMA TRIBO SOBRE DUAS RODAS Pesquisador identificou um grupo social considerado muitas vezes invisível na dinâmica de centros urbanos: os bicicleteiros

DA BEIRA DO MANGUE PARA O ASFALTO Falta do cumprimento de promessas e de acompanhamento socioeconômico resulta em novos problemas para população que saiu do mangue para conjunto habitacional

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BEIJU À MODA MARANHENSE Alimento enriquecido mostra-se capaz de combater carência de vitamina A, e ganha destaque internacional em evento

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FALTA DE INFORMAÇÃO É O QUE CALA A SOCIEDADE

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Sem indicadores para mensurar os impactos do principal instrumento de combate à exploração sexual infantojuvenil, meninas e meninos continuam sofrendo abusos no Maranhão

ENTREVISTA

Professor da UFMA esclarece questões relacionadas com aplicabilidade da Lei de Proteção Intelectual, e apresenta grupo de pesquisa que tem estudado a temática de forma aprofundada

A BOA IDEIA QUE NÃO DEU CERTO

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Da concepção de um projeto visionário a um dos maiores problemas a ser solucionado pelo Poder Público em São Luís. A criação da Barragem do Bacanga é o foco de uma investigação sobre as causas e os efeitos de sua construção

HERBÁRIO VIRTUAL

FESTA DA JUÇARA É DESCONHECIDA POR TURISTAS E MARANHENSES

Conheça o espaço da UFMA que reúne e disponibiliza mudas de plantas da flora maranhense para o desenvolvimento de estudos científicos

Organizadores da festa popular que acontece há 40 anos relatam problemas que ameaçam a sua existência

NA FILA DE ESPERA

DA MESA DE FESTA PARA A UNIVERSIDADE

Maranhenses lideram o ranking de recusas em salvar vidas por meio da doação de orgãos

Estudo realça potencial do doce de espécie, iguaria típica da culinária alcantarense

INOVAÇÃO EM CERÂMICA ARTESANAL MARANHENSE

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Equipe de pesquisadores da UFMA propõe procedimentos científicos à produção de ceramistas maranhense, e inova com produtos pensados a partir do aproveitamento de materiais e design diferenciado

CÁRIE PRECOCE

Pesquisadoras da UFMA desenvolvem proposta de atendimento e aconselhamento para casos de cárie precoce, por meio de um trabalho que está reunindo dados sobre o problema no Estado

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Comportamento

MEU PAI NÃO GOSTA DE MIM

Denegrir o genitor na frente dos filhos é crime, e quem mais pratica o ato são as mães, que desconhecem o fato de que podem estar atrapalhando o desenvolvimento de crianças e adolescentes, como propõe um estudo especializado

Por Daryanne Caldas

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que fazer quando pais em conflitos conjugais envolvem os filhos nas brigas e disputas matrimoniais? Para a Justiça Brasileira, esta prática pode caracterizar-se como um crime previsto em lei desde agosto de 2010, e recebe o nome de Alienação Parental. Este problema é uma disfuncionalidade, onde ocorre a desqualificação da conduta do pai ou da mãe, ou até mesmo pelos dois, diante de seus filhos, com o interesse de prejudicar a relação existente entre estes. O problema em si não é nem um pouco novo, mas o tema somente começou a ser debatido na segunda metade da década de 80, quando a terminologia Alienação Parental foi criada, e as suas causas e efeitos sob a ótica de diversos campos sociais, como o do Direito e da Psicologia, começaram a ser discutidos. A presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família do Maranhão (IBDFAM/MA), Bruna Barbieri Waquim, em sua dissertação de mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), propôs a percepção da Alienação Parental não da forma como o Sistema Judiciário Brasileiro tem tratado a questão: com o direcionamento de penalizar infratores. Pelo contrário, a advogada buscou entender o ponto de vista de quem sofre com esse tipo de ação: os filhos, que são o alvo preferido e que perdem, devido à Alienação Parental, o direito fundamental que é a convivência familiar. “A identidade de cada pessoa é formada a partir da observação de conflitos, concessões e acordos daqueles que lhe servem de primeira referência no mundo, que são os pais. Quando um desses modelos está ausente, a criança, inevitavelmente, terá um desenvolvimento incompleto, pois não lhe foi permitida a construção da sua identidade como um direito. São seres humanos que irão se tornar adultos com dificuldade para manter relacionamentos saudáveis, superar críticas e desafios, e que terão transtornos de identidade. Serão adultos que não poderão acrescentar tudo o que poderiam para a sociedade”, explica a mestre em Direito pela UFMA, sobre os males que afetam o desenvolvimento de filhos acometidos pela Alienação Parental.

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Sobre este problema enfrentado pela instituição Familiar no Brasil, políticas públicas pautadas na realização de campanhas de conscientização e incentivo ao registro civil existem, e apresentam resultados positivos. Entretanto, Bruna Barbieri Waquim, diz que a Alienação Parental, continua a ser pensada apenas como o resultado de disputas entre pais e mães pela atenção dos filhos, sem que os poderes públicos e as instituições do Sistema de Justiça levem em consideração os efeitos dessa prática. Durante sua pesquisa, Bruna Waquim descobriu que a Alienação Parental é um problema enfrentado pelos núcleos familiares compostos apenas por mães, pois estas, depois do divórcio, tentam usar os filhos como um instrumento de agressão contra o genitor. De acordo com os dados de Registro Civil, divulgadas em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 87,3 por cento dos casos de divórcio, são as mães que ficam com a guarda dos filhos.

REVISÃO DA LITERATURA JURÍDICA: ALIENAÇÃO FAMILIAR EM VEZ DE ALIENAÇÃO PARENTAL Nesse cenário, ainda segundo o IBGE, cerca de um terço dos filhos perde contato com o pai, sendo privados do afeto e do convívio com o genitor ausente, e os dispositivos utilizados por elas, na maioria das vezes, é certamente a prática da Alienação Parental. Em sua dissertação, Bruna Barbieri defende que o vocábulo a ser utilizado no meio jurídico para tratar da Alienação Parental seja ampliado. Sua proposta foi fundamentada por seu estudo, após a aplicação de mais de cem questionários, onde a pesquisadora constatou que não só os pais são sujeitos agressores em casos de conflito no contexto de uma separação. Esta prática, na maioria das vezes, não agride apenas esses subsistemas parentais. “A Alienação Parental pode acontecer antes mesmo da dissolução do vínculo conjugal. O problema pode acontecer como conflitos entre avós e pais, entre padrastos e pais, entre mães e madrastas,


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9 FOTO: SANSテグ HORTEGAL


A presidente do Conselho Tutelar em São Luís, Maria Neusa

A mestre em Direito pela UFMA, Bruna Barbieri Waquim, propõe o uso de terminologia mais abrangente para tratar casos de Alienação Parental

Nessas situações, o pai ou a mãe transfere o sentimento de uma relação que não deu certo para os filhos. É um fardo pesado para uma criança, que cresce achando que o pai não gosta dela Juiza da I Vara da família, Patrícia Marques Barbosa

entre padrastos e irmãos unilaterais, e é por isso que eu proponho com meu estudo a adoção do termo Alienação Familiar Induzida, o que vai permitir com que os dispositivos do Sistema de Justiça possam tomar as medidas cabíveis, compreendendo todo o fenômeno da vida real que são possíveis de identificar”, afirma a mestre em Direito sobre a necessidade de uma nova redação na atual legislação para que esta se torne mais completa e abrangente. Quem observa a disputa por menores, no cenário municipal, é a juíza da I Vara da Família, Patrícia Marques Barbosa. A representante do Poder Público explica que os casos de Alienação Parental são muito constantes nos processos de separação judicial. “Em muitos casos, um dos genitores ,mesmo que não impeça a visita, fala mal do outro próximo à criança, comenta que o genitor não dá atenção para o filho ou filha. Quando cometida pela mãe, é comum que esta fale na frente dos filhos que foi abandonada pelo marido”, afirma. Enquanto isso, o Conselho Tutelar, que é outra frente de enfrentamento da Alienação Parental e de outras questões configuradas pela negação de direitos fundamentais da criança e do adolescente, reconhece a atualidade do tema. Fator que segundo a Presidente do Conselho em São Luís, Maria Neusa, se reverte também em dificuldade para combater a ação de genitores. Ela alega que a discussão ainda não se tornou uma demanda do conselho devido ao fato deste não ser suficientemente público, o que é ocasionado pela sutileza das práticas que caracterizam a Alienação Parental. Para a juíza da I Vara da Família, Patrícia Marques Barbosa, o maior problema nas crianças que sofrem de Alienação Parental é que elas crescem com o sentimento de abandono pelo genitor. “Nessas situações, o pai ou a mãe transfere o sentimento de uma relação que não deu certo para os filhos. É um fardo pesado para uma criança, que cresce achando que o pai não gosta dela”, explicou.

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A juíza esclarece a sutileza que Alienação Parental possui, e que é apontada pela Presidente do Conselho Tutelar. “São os advogados que entram com a ação de reversão do direito de guarda, de regulamentação do direito à visita ou do próprio divórcio. Na petição inicial que é identificado o problema de que os pais estão cometendo a Alienação Parental. A maior parte dos genitores que praticam a ação, nem sabem que isso configura um crime, e que ele está sujeito às penalidades da lei”, reforça. Em relações onde a Justiça identifica, por meio de avaliação biopsicológica, um caso de Alienação Parental, a consequência prevista em lei é a perda da guarda. Por isso, o procedimento que tem sido tomado é sempre o de advertir sobre as implicações que esta prática pode acarretar. “O juiz responsável pelo processo tenta explicar as consequências em relação à alienação, e, às vezes, a família consegue entrar em um acordo. Nos casos em que não conseguimos realizar uma conciliação, a Justiça tem tomado a decisão extrema de transferir a guarda da criança para o outro genitor”, elucida.

Bruna Barbieri Waquim É graduada em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Tem mestrado em Direito e Instituições do Sistema da Justiça. Especialista em Direito Civil e Processo Civil e em Direito de Família e Sucessões. É servidora pública do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. Palestrante e autora de diversos artigos jurídicos e do livro “Relações Simultâneas Conjugais: o lugar da Outra no Direito de Família”.


FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

Tecnologia

Poesia Digital Projeto digitalizará mais de 400 peças do acervo fragmentado do poeta Bandeira Tribuzi

Por Henrique Coutinho

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ual adjetivo caracteriza um literário que, ao mesmo tempo, era jornalista, prosador, político, economista, músico e poeta? José Tribuzi Pinheiro Gomes, mais conhecido como Bandeira Tribuzi, nasceu em São Luís, em 1927, e, ao longo de seus 50 anos de vida, produziu e redigiu de forma incomum e, como poucos, obras literárias em todos os estilos. Ao sabor de textos sem pontuação regular, sem rimas ou métricas perfeitas, mas permeados de abordagens que levavam em conta o contexto social, Tribuzi liderou o início da modernização literária no Estado, após regressar de Portugal, em 1946, onde viveu por 17 anos. Na área da Economia, Bandeira Tribuzi produziu o estudo Formação Econômica do Maranhão – Uma Proposta de Desenvolvimento. Como músico, compôs a canção Louvação a São Luís. No Jornalismo, fundou aquele que se tor-

naria o jornal de maior circulação no Estado, O Estado do Maranhão. O literário maranhense morreu, em 1977, aos 50 anos e deixou como legado intelectual obras escritas desde os seus tempos de internato, onde publicava poemas em revistas portuguesas, além de outras produções datadas dos seus anos de criação intensa, até obras publicadas postumamente. “Com suas ideias modernistas, ele atraiu para si outros literatos, artistas e músicos para discutir sobre suas pretensões estéticas na busca por uma linguagem mais contemporânea ao seu tempo. Tivemos em Bandeira Tribuzi o estímulo necessário para despertar os autores maranhenses a pensar sobre a sua realidade literária”, explica o professor da Universidade Federal do Maranhão e doutor em literatura maranhense, Dino Cavalcante, sobre a representatividade do intelectual maranhense. Portal

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Intelectual raro e ativista social, Tribuzi atuava em diversas frentes e vivia a interdisciplinaridade. Daí, a importância de resgatar e contextualizar a vida desse poeta tão significativo para a literatura maranhense Coordenador do projeto que vai digitalizar o acervo de Bandeira Tribuzi, José Ferreira Júnior

DIGITALIZAÇÃO Em 2014, quase 40 anos após o seu falecimento, Bandeira Tribuzi terá boa parte de sua produção artística e literária completamente digitalizada pelo Laboratório de Convergência de Mídias (LABCOM), da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). A ideia da equipe, coordenada pelo professor do Departamento de Comunicação Social, José Ferreira Júnior, é digitalizar mais de 400 documentos escritos pelo próprio literário, ou sobre ele, como partituras musicais, livros, fotografias, poemas avulsos, recortes de jornais e revistas, documentos e correspondências, além de livros. Com o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa e Desenvolvimento Científico do Maranhão (FAPEMA), o projeto vai submeter, ao processo de digitalização, fragmentos e obras de Bandeira Tribuzi em posse da sua família, e, posteriormente, após a catalogação deste conjunto, transformará tudo em um acervo que será disponibilizado à comunidade por intermédio de um Guia digital que irá auxiliar a compreensão do processo de criação e produção de Tribuzzi, que até agora se manteve dispersa. “A disponibilização do acervo digitalizado será de grande utilidade para professores e alunos de Graduação e de Pós-Graduação de diversos campos do conhecimento. Para além da comunidade acadêmica, a digitalização do Guia será oportuna para fazer com que a obra de Tribuzi seja mais conhecida pelo público, facilitando não somente o acesso, mas, sobretudo, a sua compreensão”, pontuou.

ACERVO QUE SERÁ DIGITALIZADO Livros consultados

60

Livros publicados

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Livros publicados sobre Bandeira Tribuzi

09

Artigos de jornais e revistas sobre Bandeira Tribuzi

159

Poemas avulsos (publicados em jornais ou revistas)

46

Prêmios recebidos

02

Manuscritos

12

93 + 3

Correspondências

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Partituras

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Letras de músicas

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Documentos

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Imagens

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Para digitalizar o acervo, o grupo da UFMA precisou adquirir equipamentos de scanner, edição e câmeras

Sendo desenvolvido nas dependências do Laboratório de Convergência de Mídias (LABCOM), o projeto contará com todas as tecnologias disponíveis para a digitalização do acervo, desde um software específico para trabalhos de digitalização, um banco de dados, a mineração de dados e soluções de web. Equipamentos, como scanner, câmeras, computadores, materiais de consumo (CD, DVD, fitas de vídeo e itens de informática avulsos), bem como ambientes mobiliados para a edição serão essenciais para a concepção do projeto. Além dos estudantes bolsistas que irão trabalhar na recuperação deste acervo, sob a orientação do coordenador José Ferreira Júnior; participam também o professor da UFMA e consultor técnico deste projeto, Márcio Carneiro, e a consultora literária, que é mestre em estudos literários com ênfase na obra de Bandeira Tribuzi, Clarissa Rodrigues Pinheiro Gomes. “A criação de um acervo digital, contendo manuscritos, poemas e documentos, entre outros elementos digitalizados, possibilitará não apenas a preservação como a proteção deste material, explicou Ferreira Júnior, para ressaltar que esse trabalho irá propiciar um maior contato de estudantes, pesquisadores e curiosos com a obra do poeta, fomentando novos projetos de pesquisa e investigação, sobretudo pela disponibilização do material por meio de uma plataforma de acesso facilitado”, afirmou.

José Ferreira Júnior É graduado em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Tem mestrado e doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Atualmente, é professor da UFMA, onde atua no curso de Comunicação Social, e no Programa de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade.


Mapeamento

DESEQUILÍBRIO SILENCIOSO E INVISÍVEL NOS SOLOS MARANHENSES Em parceria com Secretaria de Estado do Meio Ambiente, um grupo de pesquisa da UFMA quer conhecer o impacto de poluentes químicos em solos e águas subterrâneas do Maranhão

FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

Por Letícia Mourão

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nvisível aos olhos, mas altamente perigosos à vida no planeta, a presença de poluentes químicos em solo e águas subterrâneas se tornou o principal objeto de estudo de uma equipe de pesquisadores da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Com apoio e financiamento da Secretaria Estadual de Meio Ambiente (Sema), o Grupo de Estudos em Química Ambiental (GEQA) deu início, no primeiro semestre deste ano, a análise de 59 pontos espalhados por todo o Estado, cuja intenção é mapear, para, em seguida, propor um plano de ação para as áreas consideradas contaminadas. Para o grupo da UFMA, produzir conhecimento com a meta de corrigir os problemas ambientais em solos e águas é uma forma de reverter as atuais estatísticas de contaminação dos solos brasileiros, e contribuir para que as conseqüências do depósito indiscriminado de dejetos sem tratamento, e da utilização de agrotóxicos possa ser compreendido por meio de diagnóstico preciso acerca da sua atual situação de seus usos e efeitos. No cenário mundial, segundo o Ministério do Meio Ambiente, o Brasil é o pais que mais consome agrotóxicos– produtos ou agentes de natureza química ou biológica utilizados para controlar doenças e aumentar a produtividade nas lavouras. No Maranhão, estudos sobre agrotóxicos, e capazes de determinar a dimensão do seu impacto no meio ambiente ainda aparecem de forma incipiente devido a pouca abrangência e pontualidade como vem sendo realizado. Agora, com esta pesquisa inédita que vem sendo realizada pela UFMA, juntamente com a Sema, a produção de conhecimento irá propiciar intervenção nas áreas em que forem identificadas concentrações de contaminantes. “É um plano bastante arrojado, e esperamos que ele transforme a qualidade de vida do povo maranhense”, afirma a coordenadora do projeto de pesquisa na Universidade, Gilvânda Nunes. O estudo será realizado com base na mesma metodologia que é utilizada pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, que contempla desde as coletas de amostras de solo, análises de campo, determinações dos teores de substâncias químicas, além da interpretação de dados, imagens e elaboração de mapas temáticos. “Vamos confrontar as amostras de solos e água colhidas em regiões de grande concentração populacional, e de outras consideradas intactas, do ponto de vista da ação humana”, explica a coordenadora do estudo. Amparada sob estes métodos, a equipe da UFMA espera estabelecer de forma inédita valores referenciais que mensurem a quantidade de substâncias químicas no solo e nas águas subterrâneas em todo o estado do Maranhão. O projeto custará R$ 3,9 milhões e está dividido em duas etapas. A primeira delas, em andamento, fará a quantificação dos teores químicos, em regiões cuja atividade de agricultura, agropecuária são desenvolvidas em larga escala, e também em áreas indígenas e de preservação. A segunda etapa do projeto deverá ser iniciada apenas em meados no início do próximo ano, quando o grupo de pesquisadores da Universidade focalizará suas atenções de estudo as áre-

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as consideradas como fonte de contaminação, sobretudo de metais pesados, tais como lixões e aterros sanitários. De acordo com a coordenadora do projeto de pesquisa que irá mapear a presença de poluentes em solos e águas subterrâneas do Maranhão, Gilvanda Nunes, a segunda fase da proposta de estudo será conclusiva, na medida em que possibilitará com que os agentes, nestes casos empresas, ou atividades que impactem o meio ambiente possam sofrer intervenção do poder público, já que com os dados da pesquisa em mãos, a Sema conhecerá a situação da poluição de solos e águas que se apresenta quase que de forma invisível. Cerca de vinte pessoas compõem a equipe deste projeto, dentre profissionais da Secretária de Estado de Meio Ambiente, estudantes dos cursos de biologia, geografia e química, além de alunos de Pós-Graduação que vão atuar na pesquisa junto aos docentes da Universidade Federal do Maranhão. Na rotina da equipe, o dinamismo e a integração serão as bases para o desenvolvimento do seu trabalho, já que devido a natureza das amostras coletadas de solo e água, estas não poderão ser armazenadas por muito tempo, já que possuem um prazo de conservação limitada. A pesquisa que respeita a determinação à Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente homologada em 2009 será uma maneira de obter respostas e transmiti-las à sociedade. “Nos fomos convidados para participar deste projeto, e dentro de um período de dois anos vamos descobrir a atual situação dos nossos solos e águas subterrâneas que estamos consumindo diariamente”, ressalta a professora da UFMA que coordena o projeto de estudo sobre as áreas de desequilíbrios geradas por poluentes químicos, Gilvânda Nunes.

Gilvânda Nunes É graduada em Química Industrial pela Universidade Federal do Maranhão. Tem mestrado em Agroquímica pela Universidade Federal de Viçosa, e é doutora em Química pelo Instituto de Química da Universidade Estadual de São Paulo. Possui pós-doutorado em Ecotoxicologia pela Universidade de Perpignan Via Domitia, na França. Hoje integra o quadro de docentes do Departamento de Tecnologia Química da Universidade Federal do Maranhão. É diretora do Departamento de Apoio a Projetos de Inovação e Gestão de Serviços Tecnológicos da UFMA.


Divulgação

ACESSO À PRODUÇÃO CIENTÍFICA POR MEIO DO PORTAL DE PERIÓDICOS A plataforma eletrônica facilita a divulgação da produção acadêmica em todos os níveis, assim como o processo de submissão de trabalhos

Por Osmilde Miranda

Lançado em 2010, o Portal

de Periódicos da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) serve à comunidade de pesquisadores e à Sociedade Civil que, por meio deste, tomam conhecimento e têm acesso às revistas e periódicos científicos produzidos pela UFMA. O projeto, que é uma parceria entre o Núcleo Integrado da Biblioteca (NIB) e a Pró- Reitoria de Pesquisa e Pós- gradação (PPPG), conta com 15 revistas cadastradas, onde é possível encontrar artigos científicos de diferentes áreas de conhecimento. De livre acesso, o Portal de Periódicos da UFMA existe para facilitar a consulta da produção científica e a submissão

de trabalhos que podem ser feitos por qualquer pesquisador interessado em ter sua pesquisa publicada. “Transmitir à comunidade o conhecimento de novas descobertas, o desenvolvimento de novos materiais, técnicas, e métodos de análise nas diversas áreas da ciência é fundamental para o próprio desenvolvimento da produção científica. Para quem está se graduando, ou para estudantes de pós-graduação, um artigo publicado, além de servir como experiência, enriquece o currículo acadêmico, aumentando as oportunidades do pesquisador obter uma melhor colocação na área do desenvolvimento científico”, declara a coorde-

nadora geral do Portal de Periódicos da UFMA, Tatiana Cotrim Serra Freire. O Portal de Periódicos da UFMA funciona em uma plataforma de publicação e editoração eletrônica de revistas on line. Uma tecnologia desenvolvida originalmente pelo Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, e que conta com uma versão em português, inglês, espanhol, francês e italiano, sendo que, desde o início deste ano, já recebeu mais de 2.000 mil visitas. O acesso ao Portal de Periódicos pode ser realizado por meio do próprio site da UFMA (www.ufma.br), ou diretamente no endereço eletrônico: <www.periodicoseletronicos.ufma.br>.

CONHEÇA AS REVISTAS QUE PODEM SER ACESSADAS NO PORTAL DE PERIÓDICOS DA UFMA Cambiassu: Estudos em Comunicação Publicação do Departamento do Curso de Comunicação Social da UFMA. Recebe artigos, ensaios, entrevista e resenha. Foca-se em questões relacionadas ao campo da Comunicação e seus mecanismos de produção, distribuição e consumo.

Fenomenologia e Psicologia Publicação do Grupo de Estudos e Pesquisas em Fenomenologia e Psicologia Fenomenológica (GEPFPF) do Centro de Ciências Humanas (CCH) da UFMA. Publica artigos, ensaios, resenhas e resultados de pesquisas cujo exista o ponto de encontro das interfaces entre a Fenomenologia, as Filosofias da Existência e a Teoria Crítica.

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Revista Educação e Emancipação

Cadernos Zygmunt Bauman Periódico da Universidade Federal do Maranhão empenhado em proporcionar espaço para o debate que envolve temas como as Relações Humanas, Axiologia, Violência Pública, Insegurança, Consumismo, Moda.

É uma publicação do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da UFMA. Sua missão é a de publicar dissertações e teses de pesquisadores e estudiosos brasileiros e de outros países que tratem sobre o tema Educação.

Boletim do Laboratório de Hidrobiologia; Publicação do Departamento de Oceanografia e Limnologia da UFMA Trabalha sob o escopo da divulgação de publicação científica de trabalhos originais na área de Biologia Aquática e ciências correlatas. Está avaliada, segundo a Capes, como: Qualis B4, na área de Biodiversidade e Interdisciplinar; B5 em Ciências Ambientais e Engenharias I, Geografia, Medicina Veterinária, Zootecnia - Recursos Pesqueiros.

Littera

Publicação do Programa de Pós-Graduação em Direito e Instituições do Sistema de Justiça da UFMA. Essa revista tem como objetivo fomentar debates e temas relativos ao Direito e às Instituições do Sistema de Justiça, destinados à publicação de trabalhos científicos de pesquisadores de instituições de ensino do País e do exterior.

Revista Húmus Publicação do Departamento de Letras (DELER) do Centro de Ciências Humanas (CCH) da UFMA. Destina-se à publicação de trabalhos científicos e culturais produzidos na área da Linguística e de Letras. Qualis CAPES: B5 Letras/ Linguística, Filosofia/Teologia.

Revista Brasileira do Caribe Esta é uma publicação do Grupo de Pesquisa de Estudos Caribenhos e do Programa de Pós-Graduação em História da UFMA. Focaliza as suas produções nos estudos que debatem as culturas afro-americanas e na sua relação com outras culturas e com suas matrizes africanas, apoiando-se na mais ampla interdisciplinaridade.

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Revista Publius

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A Revista Húmus é dedicada aos Estudos Interdisciplinares em Ciências Humanas, Ciências Naturais, Educação, Contingência e Técnica. Tem a pretensão de analisar o impacto da Técnica Moderna na sociedade contemporânea e os diversos aspectos da condição humana na contemporaneidade.

Revista de Ciências da Saúde Publicação do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) da UFMA. Publica trabalhos originais das áreas de Ciências Biológicas e Ciências da Saúde. Qualis CAPES: B5 Biodiversidade, Ciências Biológicas III, Interdisciplinar, Medicina I e II, Odontologia.


Cadernos de Pesquisa

Revista Trópica: Ciências Agrárias e Biológicas Publicação da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (PPPG) da UFMA. Tem como missão divulgar trabalhos originais produzidos nas diversas áreas do conhecimento. Qualis CAPES: A1 – Educação; B4 – Geografia; B5 - Administração, Ciências Contábeis e Turismo / Enfermagem / História / Interdis-

Publicação do Centro de Ciências Agrárias e Ambientais (CCAA). Tem como missão divulgar a produção científica de professores e pesquisadores que atuam no campo das Ciências Agrárias e Ambientais no Campus de Chapadinha/UFMA.

ciplinar / Psicologia.

Revista de Pesquisa em Saúde Publicação do Hospital Universitário da UFMA (HUUFMA). Tem como objetivo promover e disseminar a produção de conhecimentos e a socialização de experiências acadêmicas na área de saúde, assim como possibilitar o intercâmbio científico com programas de Pós-Graduação e Instituições de pesquisas nacionais e internacionais. Qualis CAPES (online): B4 - Enfermagem, Saúde Coletiva; Versão impressa: B4 - Enfermagem, Interdisciplinar, Odontologia, Saúde Coletiva; B5 - Medicina II.

Revista Pós-Ciências Sociais Publicação do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFMA. Publica trabalhos em forma de artigos/ensaios, entrevistas, traduções, resenhas e instrumentos de trabalho. Tem classificação, na Capes, na versão on line como B1 em Sociologia; B4 em Antropologia / Arqueologia. Na versão impressa: A1 Ciências Ambientais; B1 em Sociologia; B2 em Educação e Interdisciplinar; B3 em Artes/Música, Ciência Política e Relações Internacionais, Geografia, Serviço Social; B4 em Antropologia / Arqueologia, História, Planejamento Urbano e Regional / Demografia; B5 em Engenharias III, Medicina II.

Revista de Políticas Públicas Publicação do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da UFMA. Publica e divulga estudos considerados relevantes para o avanço teórico e prático das Políticas Públicas. Qualis CAPES (online): A2 Serviço Social; B1 Ciências Ambientais, Interdisciplinar; B2 Educação; B3 Economia - Versão impressa: A2 Serviço Social; B1 Ciências Ambientais, Interdisciplinar ; B2 Sociologia, Planejamento Urbano e Regional/Demografia; B3 Ciência Política e Relações Internacionais, Ciências Sociais Aplicadas I, Economia, História, Psicologia; B4 Educação, Saúde Coletiva; B5 Administração Ciências Contábeis e Turismo, Engenharias III, Ensino, Ciências Agrárias I.

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Cotidiano

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no guidon e no cilindro permitem uma forma diferenciada de experimentar os espaços de circulação urbana. Na capital maranhense, São Luís, composta por mais de um milhão de habitantes - de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2013 – o mestre em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Irinaldo Lopes Sobrinho, resolveu unir estilo de vida, o interesse pela pesquisa e a vontade de estudar a realidade da sua cidade. O resultado foi a descoberta de sujeitos dotados de identidades que circulam, algumas vezes, quase que de forma invisível, na contramão da maior parte da população brasileira e que utiliza como principais meios de locomoção o transporte coletivo e o veículo particular. Eles podem ser chamados de ciclistas, mas preferem o termo bicicleteiros e o que eles têm em comum é que todos possuem a bicicleta como um elemento social identificador. Tal como é conhecida hoje, a bicicleta nasce como a invenção de um brinquedo no início do século XIX na Alemanha. No Brasil, o invento não tarda a tornar-se popular e, na segunda metade do mesmo século de sua criação, já era possível identificar os primeiros relatos de sua presença no Paraná, em Curitiba. Considerada atualmente, pelo Código Brasileiro de Trânsito,

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como um meio de transporte movido à propulsão humana, a Organização das Nações Unidas (ONU) considera a bicicleta como o transporte ecologicamente mais sustentável do planeta e que, frente à atual saturação da maior parte dos sistemas de mobilidade urbana no mundo, vem se transformando em algo mais do que uma alternativa de circulação nas cidades, a exemplo de países, como a Holanda, que hoje empresta exemplos do bom uso que a bicicleta pode trazer à vida urbana e social da população. O CASO DO PESQUISADOR CICLISTA: UM DESLOCAMENTO DE PERSPECTIVA Mas não são sobre os benefícios do uso da bicicleta já tão difundidos que a pesquisa realizada pelo mestre em Cultura e Sociedade, Irinaldo Lopes Sobrinho, trata. Ao contrário, é certeiramente sobre a abordagem sociológica e etnográfica desenvolvida pelo pesquisador durante o período de dois anos, nos quais ele percorreu mais de cinco mil quilômetros da malha viária de São Luís, percebendo a experiência de inserção de 100 sujeitos que utilizam a bicicleta na cidade como principal meio de transporte. “Primeiro, eu utilizei mapas de geolocalização para encontrar os vetores de grande movimentação urbana. E, de bicicleta com


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Q U E M S AO ? D E S Ã O LU Í S uma bolsa de guidon, máquina fotográfica, e questionários, eu abordava os ciclistas quase diariamente em uma distância que comparativamente, ao final do meu trabalho de campo, corresponderia a um percurso do Oiapoque ao Chuí (extremos territoriais do Brasil)”, disse. Para além disso, Irinaldo Lopes Sobrinho partiu da sua experiência acumulada, vivência e intimidade com a bicicleta para desenvolver a proposta de sua pesquisa no mestrado de Cultura e Sociedade. “Por ser um pesquisador ciclista, consegui não desconsiderar traços antropológicos da experiência do uso da bicicleta na minha pesquisa”. Natural de Santa Inês, município maranhense localizado a 245 quilômetros da capital, o pesquisador que é cicloativista e cicloturista, percorre, em média, 16 quilômetros em 40 minutos sob a bicicleta diariamente para ir de sua residência, localizada no bairro do Turu, até o seu local de trabalho - uma escola da rede pública de ensino que fica no Centro de São Luís. Sua história com o veículo movido a pedaladas começou em 2007, quando um amigo que fazia um percurso de dez quilômetros todos os dias para ir de casa ao trabalho lhe propôs a nova experiência de perceber a paisagem da cidade em cima de bicicleta. “Para mim, como para boa parte das pessoas, a bicicleta foi o meu primeiro instrumento de liberdade. Quando criança, eu usava a bicicleta da minha irmã mais velha. Depois eu ganhei uma, e com o passar dos anos, eu acabei abandonando o seu uso. Quando eu tinha doze anos, eu nem tinha mais bicicleta. Então, a bicicleta era qualquer coisa que não é hoje”, conta Irinaldo Lopes Sobrinho sobre o início da sua relação com a bicicleta, ao afirmar que até hoje causa surpresa nos colegas do trabalho o percurso diário que faz. “Eles ficam curiosos”, completa.

Assumidamente como um elemento identificador da personalidade do professor, a bicicleta e essa forma de perceber o veículo foi a deixa para o início do estudo acerca da questão das identidades das pessoas que utilizam o veículo como principal meio de locomoção. Na pesquisa, o mestre em Cultura e Sociedade identificou a categoria ou tribo dos bicicleteiros, descrito, pelo mesmo, como o sujeito que sai de casa na bicicleta, principalmente para trabalhar de segunda a sexta-feira. Eles também não têm preocupação com equipamentos de segurança, dimensão comprovada no estudo que aponta que cerca de 70 por cento dos bicicleteiros não utiliza qualquer equipamento de segurança na hora de pedalar. “O bicicleteiro não é um defensor da bicicleta, apenas a utiliza pela praticidade, e, sobretudo, pela necessidade. Eles não se denominam ciclistas, pois, dizer que eles são assim, é como compará-los a esportistas e eles não se consideram como tais”, diz. Ao todo, foram aplicados 100 questionários com os ciclistas ou bicicleteiros em mais de 50 pontos da Ilha. De acordo com os dados apresentados na dissertação de Irinaldo Lopes Sobrinho, a parcela mais significativa do grupo pesquisado tem a renda baixa e pouca escolaridade. 87 por cento dos bicicleteiros são homens, que têm entre 25 e 44 anos de idade. Especificamente sobre renda, 60 por cento declararam ganhar entre meio e dois salários mínimos. Apenas cinco por cento das pessoas que utilizam a bicicleta como meio de transporte tem curso superior completo. Pouco mais da metade pedala de dez a mais de 20 quilômetros por dia. Quase a metade dos bicicleteiros identificados na pesquisa costuma utilizar o veículo para ir ao trabalho, e 61 Portal

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por cento destes declararam-se negros ou pardos. Apesar dos resultados, o pesquisador chama atenção por este se tratar de um trabalho sociológico, e, por isso, o grupo pesquisado apresenta diversidade de identidades. “Não há uma única identidade para essas pessoas que utilizam a bicicleta na perspectiva de um meio de transporte. Mas há um traço socioeconômico que faz com que o deslocamento na cidade aconteça de outra forma”, pontua Irinaldo Lopes Sobrinho.

A BICICLETA NÃO É A SOLUÇÃO Esses sujeitos que fogem a este perfil retratado na pesquisa são pessoas que passaram a integrar a bicicleta como meio de transporte, sem que esta prática signifique o abandono de outros meios de transporte como o carro, ou o ônibus. Foi assim com a zeladora Fernanda Vale Silva, de 23 anos. Há cinco meses, ela abandonou o uso do ônibus de segunda a sexta, e, para chegar ao serviço hoje, só de bicicleta. Desta forma, os quarenta minutos que gastava de sua casa até o seu trabalho, hoje ela faz na metade do tempo sem os inconvenientes que o transporte público acarreta. “Não enfrento as filas, ônibus lotado, ou aperto, e ainda economizo dinheiro. Para mim é uma economia que reflete no fim do mês. O único problema é a falta de segurança. Tem uns trechos que até dá para andar sobre as calçadas, mas em outros é na avenida mesmo. Na avenida, somos invisíveis e é ai que bate o medo de não conseguir voltar para casa”, diz.

O bicleteiro, José Raimundo Martins. Ele utiliza há dez anos a bicicleta como principal meio de transporte

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Irinaldo Lopes Sobrinho É formado em Letras pela Universidade Federal do Maranhão, e tem mestrado em Cultura e Sociedade pela mesma Instituição. Cicloativista e cicloturista, atua como professor da rede básica de ensino.

Afonso Barbosa da Silva, de 51 anos, e José Raimundo Martins de 30 anos são bicicleteiros. A volta pra casa geralmente acontece quando o sol começa a diminuir de intensidade no final do dia. Afonso Barbosa trabalha como operador de uma rede de supermercados na capital, e há 15 anos adotou uma companheira na hora de ir e voltar do seu trabalho, a bicicleta. Neste tempo, nunca utilizou capacete, sinalização, e nem mesmo retrovisor. O caso de José Raimundo é semelhante. Equipamentos para o uso seguro da bicicleta, ele só vê mesmo na bicicleta de ciclistas. Entregue à sua própria sorte, nos últimos dez anos, já sofreu dois acidentes envolvendo uma colisão entre a sua bicicleta e outros veículos. “No último acidente, minha bicicleta não prestou para nada. O motorista do carro me deu uma nova. Eu me machuquei no acidente, mas continuo a utilizá-la, apesar do medo que dá às vezes. O bom de andar de bicicleta é que a gente acaba conhecendo companheiros, histórias, e a cidade realmente é diferente para quem anda de bicicleta”, expõe o porteiro que realiza diariamente o trajeto de volta para casa com a zeladora, Fernanda Vale Silva. A escolha da bicicleta como um meio de locomoção não é predileção pelo veículo, informa Irinaldo Sobrinho ao confirmar que ela é um vetor. “A bicicleta é um elemento a contribuir, mas não é uma solução”. Ele chama a atenção também para a existência de uma culpa que deve ser compartilhada entre quem dirige veículos motorizados e bicicleteiros, já que estes últimos não se adéquam às exigências de segurança para o uso do equipamento. Em sua opinião, a cidade de São Luís vive um momento propício para o uso sistemático da bicicleta. “Gradativamente, estamos debatendo o uso da bicicleta. Até mesmo depois que defendi a minha dissertação, muitos vieram me perguntar o que eu poderia contribuir para o avanço de olhares mais sensíveis e objetivos acerca do uso da bicicleta. A minha contribuição é a compreensão deste grupo, que eu afirmo: são milhares. É um grupo imenso, só que ninguém está olhando para eles”, conclui o pesquisador sobre o seu trabalho que poderá servir para a proposição de políticas públicas, a partir da identificação das demandas do grupo de ciclistas e bicicleteiros que circulam em São Luís.


FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

Cotidiano

DA BEIRA DO MANGUE PARA O ASFALTO Com a mudança para as novas moradias, famílias que saíram das palafitas, às margens do rio Anil, enfrentam desafios sem acompanhamento social Por Marcele Costa

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o residencial Fé em Deus, moram 320 famílias reassentadas por meio do Programa de Aceleração do Crescimento - Habitação (PAC) do Governo Federal, em São Luís. Elas deixaram as palafitas, construídas sob o mangue do rio Anil, onde viviam sem qualquer estrutura de saneamento básico, e receberam um apartamento cada uma. Além disso, receberam um poço artesanal, ruas de terra batida, falta de segurança e de espaço para lazer. Um legado que não estava previsto no cumprimento da proposta que pretendia mudar a vida desse grupo da população por meio de oferta habitacional.

URBANIZAÇÃO DAS MARGENS DO RIO ANIL No papel, ou seja, o projeto original do PAC - Rio Anil, visava à transformação social de famílias por meio da urbanização integrada em bairros como a Camboa, a Liberdade, a Fé em Deus, a Vila Sésamo, a Vila Cristalina, a Alemanha, o Apeadouro e o Caratatituia. Para isso, o Governo Federal pretende construir 2 mil e 720 unidades habitacionais, para os quais destinou um total de R$ 364 milhões, sendo que, até agora, já entregou 832 residências. Um investimento aplicado e que, segundo uma pesquisa desenvolvida pela assistente social

formada pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Thaíse de Cássia Corrêa Muniz, seria capaz de garantir seguridade social aos beneficiários deste projeto. Ao investigar, em sua monografia, a eficácia do programa do Governo Federal que reassentou famílias em São Luís, Thaíse de Cássia Corrêa Muniz realizou um estudo de caso sobre o residencial Fé em Deus. Na pesquisa, ela abordou os problemas provocados pela mudança dos moradores do mangue para o asfalto, e alegou que esta não representava apenas melhorias, já que a oferta de habitação sozinha, ou seja, sem políticas públicas complementares e permanenPortal

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tes, não soluciona os problemas sociais desta parcela da população. Pior do que isso, expõe aos outros as mazelas sociais que estão subliminares ao problema, inviabilizando a manutenção da sua própria estrutura enquanto comunidade. “O governo precisa dar condições básicas para a reprodução social”, completa a pesquisadora.

NOVA CASA, NOVOS HÁBITOS, NOVOS PROBLEMAS Localizado no bairro da Camboa, o residencial Fé em Deus foi o terceiro conjunto habitacional do PAC – Rio Anil a ser entregue aos moradores ludovicenses, em 2013. Ele é o maior conjunto em número de residências e está dividido em 20 blocos de apartamentos, onde moram famílias com um perfil específico, segundo levantamento do Governo. Das famílias que atualmente ocupam o residencial, 20 por cento são analfabetos, apenas 40 por cento terminaram o ensino médio e 90 por cento dependem de benefícios sociais de distribuição de renda como o auxílio Bolsa Família. Agora, estabelecidos em locais mais seguros do ponto de vista da infraestrutura dos imóveis, eles comemoram a certeza de que a sua moradia não irá desabar ou ser invadida pela água, tal como acontecia anteriormente quando viviam nas palafitas.

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Entretanto, apesar de reconhecerem os benefícios, os moradores identificam os problemas que estão relacionados com a ausência de Políticas Públicas e serviços urbanos básicos, como saneamento, segurança e lazer. Assim, diante da ausência do Poder Público e da falta de assistência para estas famílias que, anteriormente, moravam sob o mangue, a principal reclamação é quanto à falta de água. O casal de aposentados, Lincoln Rodrigues (71) e Maria Catarina Sousa Silva (62), temem, inclusive, que acidentes possam acontecer em detrimento da disputa pelo recurso hídrico que acontecem com frequência no Residencial. “Somos muitos aqui, e temos apenas uma bomba de água para abastecer 320 famílias, o que não é suficiente. Diariamente, ocorrem discussões por causa disto. São muitas pessoas que precisam de água para beber e tenho medo de que ocorra uma tragédia qualquer dia desses”, lamenta o aposentado. Nas ruas sem pavimento, área de vivência ou serviços de atendimento social aos moradores do residencial Fé em Deus, as reclamações descansam sem previsão para serem solucionadas. “Estamos aqui há um ano e meio e, em todo esse tempo, temos recebido muitas promessas, mas poucas atividades para resolvê-las. Queremos um posto policial que melhore a segurança, porém não

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nos dão prazo algum sobre quando nossas reivindicações serão atendidas”, complementa o morador Lincoln Rodrigues. “O que as autoridades muitas vezes esquecem é que entregar um apartamento não significa dar condições de habitação para essas famílias. Para isso, é necessário propiciar outras estruturas mínimas, como ter um local de lazer para que as crianças não fiquem ociosas”, ressalta Thaíse de Cássia Corrêa Muniz, ao afirmar que estes entraves, apontados pelos moradores e identificados na pesquisa, poderiam ser rapidamente resolvidas, caso houvesse um maior acompanhamento, por meio de um trabalho permanente e conjunto entre engenheiros civis e de assistentes sociais. O coordenador do PAC no Maranhão, Márcio Machado, admite que houve um equívoco de planejamento na execução das obras do residencial. “As obras da Avenida Quarto Centenário, que está sendo construída no lugar em que os moradores do residencial Fé em Deus moravam anteriormente, deveriam ter sido executadas apenas após a retirada de todas as famílias do local, o que não aconteceu. Infelizmente, arcamos com uma decisão tomada pela gestão anterior que deu início a este projeto no Estado”, justifica. Sobre a ausência de abastecimento de água, o coordenador conta que o problema é que a única fonte de abas-


tecimento do bairro da Camboa sempre foi a Companhia de Abastecimento de Água do Maranhão (CAEMA) e nunca houve planejamento para aumentar o fluxo de água para atender também os moradores do residencial. “O poço é uma tentativa nossa de amenizar o problema. O residencial se encontra próximo ao mangue, o que nos fez buscar lençóis freáticos profundos, a fim de encontrar água potável para os moradores, o que também acabou não sendo suficiente para atender a todos”, admitiu. Marcio Machado afirmou ainda que reuniões quinzenais são realizadas com as associações dos moradores de todos os residenciais já entregues pelo Governo, objetivando uma maior comunicação com essas famílias. Por conta disso, as questões de urbanização, paisagismo e lazer estão em andamento, apesar de terem sofrido uma paralisação por conta das chuvas características do início do ano, o que, segundo ele, acabou por exceder o prazo estipulado para o atendimento destas demandas sociais. “Estamos firmando um acordo com a Fundação Sousândrade para que, juntamente com a Secretaria de Estado das Cidades e Desenvolvimento

Urbano - SECID, possa ser oferecida a estas famílias uma maior assistência social”, expõe o coordenador. Para a pesquisadora Thaíse de Cássia Corrêa Muniz, essas famílias precisam passar por um processo de reeducação acompanhado devido às suas novas condições de moradia. “Sabemos que estas famílias possuíam outro modo de viver e, ao chegarem aos apartamentos, se depararam com diversas questões, como o surgimento de taxas fixas para pagar, diferentes doenças respiratórias devido à poeira. Uma verdadeira mudança de hábitos que precisa ser acompanhada e receber atenção” finalizou ao propor o acompanhamento das famílias de maneira permanente por uma equipe de assistentes sociais.

O aposentado de 71 anos, Lincoln Rodrigues, constata que o abastecimento de água no residencial onde mora não é suficiente

Thaíse de Cássia Muniz É assistente social graduada pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Defendeu monografia cujo título é "A análise dos impactos na vida das famílias reassentadas no Residencial Fé em Deus em São Luís do Maranhão". Teve como orientadora neste estudo a professora do Departamento de Serviço Social da UFMA, Annova Míriam Ferreira Carneiro.

Avenida 4° centenário construída na beira do mangue. Á direita é possível visualizar a construção habitacional para onde os antigos moradores do mangue foram alocados

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Produção de Alimentos

BEIJU À MODA MARANHENSE O consumo do alimento, enriquecido por pesquisadoras da UFMA, é capaz de suprir a principal carência vitamínica da população do Estado

Por Luama Alves

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ostar do que faz é o pré-requisito para quem realiza estudos científicos, o que dizer de quem toma para si a missão de produzir alimentos que dêem prazer ao comer e que, ao mesmo tempo, sejam ricos em vitaminas e nutrientes necessários para o bem-estar humano. Por isso, a aluna do curso de Nutrição, Talita Veloso, e a sua professora, Yuko Uno, desenvolveram uma receita de sucesso na área de produção de alimentos: um beiju capaz de combater a principal carência vitamínica enfrentada pela população maranhense, o que lhes rendeu reconhecimento internacional em congresso. O beiju é um alimento da culinária brasileira de origem indígena e tem como principal ingrediente para a sua produção a fécula extraída da mandioca, e, nas suas variações de preparo, pode receber recheios que lhes garantem diferentes sabores, de acordo com o gosto do consumidor. A ideia inicial foi utilizar ingredientes regionais num mesmo alimento, adicionando cores e sabores à receita tradicional da tapioca por meio do uso da abóbora - leguminosa que é rica em vitamina A. Um fator que, conforme a professora responsável pelo estudo e desenvolvimento do produto, Yuko Uno, assegurou o destaque que o beiju à moda maranhense provocou, sobretudo, em relação ao contexto nutricional de déficit da vitamina A apresentada por parte da população no País. Segundo dados da Coordenação-Geral de Alimentação e Nutrição (CGAN), a vitamina A é a principal deficiência nutricional da população dos países considerados subdesenvolvidos. O Brasil, que também está incluído neste grupo, tem na região nordeste, cujos baixos indicadores sociais são mais expressivos, o maior percentual de pessoas com carência de vitamina A. De acordo com o CGAN, por meio do combate ao déficit desta vitamina, seria possível reduzir em 23 por cento a mortalidade infantil, em 40 por cento a mortalidade materna, assim como seria possível reduzir drasticamente os quadros de infecções, além da manutenção da saúde ocular.

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FOTO: ROBERTH MEIRELES

Equipe da UFMA responsável pelo desenvolvimento do Beiju à moda maranhense

O SEGREDO ESTÁ NA ABÓBORA Para as pesquisadoras Yuko Uno e Talita Veloso, o segredo do beiju está na abóbora e no seu recheio que leva em sua composição a vinagreira – rica em ferro. “O beiju à moda maranhense começou a ser pensado após um desafio proposto por mim dentro de sala de aula, onde a intenção era captar ideias possíveis de serem desenvolvidas para o concurso alimentar em um evento internacional. Neste processo, o que eu achei mais interessante foi como a Talita teve a perspicácia de unir elementos da culinária regional como a fécula de tapioca, a vinagreira, e ainda adicionar uma fonte de vitamina A, tudo em um mesmo alimento”, explicou Yuko Uno. Com uma massa de cor alaranjada devido à inserção da abóbora e um recheio que leva carne dessalgada, tomate, cebola, alho e vinagreira, o beiju à moda maranhense manteve o seu gosto característico após a mistura, o que se deveu ao sabor único que a tapioca possui, não deixando com que o gosto da abóbora sobrepusesse o seu. “Esse resultado sensorial foi comemorado, especialmente por que muitas crianças não são habituadas a consumir vegetais como a abóbora. Se misturamos a abóbora com a fécula e o seu gosto não for percebido, é ainda melhor. Vamos ter um alimento de cor atrativa, rico em vitamina, sem que o gosto esperado do beiju tradicional sofra qualquer interferência por ter recebido a adição de novos ingredientes”, explicou Talita. Com os testes de aceitabilidade e de qualidade do beiju, Talita Veloso, Yuko Uno e mais as estudantes Andressa Monteiro, Bruna Araújo, Samara Lima, Heryana Ferreira, Kelly Costa e Lays Lima inscreveram a proposta do alimento enriquecido com vitamina A no III Congresso o Internacional de Gastronomia, que aconteceu, em Fortaleza, em novembro do ano passado. Durante o evento que reuniu pesquisadores de todo o Brasil e do exterior, a equipe apresentou a forma de concepção do produto alimentício, que foi considerada inovadora pela comissão julgadora, resultando na premiação do trabalho da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) na categoria Cultura Alimentar Regional. “O beiju à moda maranhense possui um pedacinho da experiência de cada uma das sete participantes do trabalho. Cada uma utilizou e emprestou ao beiju uma habilidade, o que nos garantiu o sucesso reconhecido no evento internacional”, ressaltou a professora orientadora do trabalho, Yuko Uno.

PRÓXIMO DESAFIO: INSERIR O BEIJU À MODA MARANHENSE NO CARDÁPIO DA MERENDA DE ESCOLAS PÚBLICAS Agora, a estudante de nutrição, Talita Veloso, sonha com a possibilidade de inserir o beiju à moda maranhense, desenvolvido na UFMA, no cardápio dos alunos da rede pública de ensino da capital. “Vou tentar implementar o beiju na alimentação de estudantes de escolas públicas, a partir dessa discussão, na minha monografia que deve ter início ainda este ano”, explicou. Por ser considerado um alimento de preparação de dificuldade média, o beiju com vitamina A, se inserido no dia a dia dos jovens estudantes, pode contribuir para o desenvolvimento e consequentemente, para o aumento do seu rendimento escolar. Sob os cuidados da docente da Universidade Federal do Maranhão, Yuko Uno, a aluna Talita Veloso acredita que o beiju à moda maranhense vai se transformar em um estudo científico mais complexo, para ressaltar, além disso, que essa “é a maneira de agradecer à sociedade pela minha formação profissional e por todo investimento no trabalho de pesquisa que realizei na Universidade” afirmou. Portal

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Do preparo da fécula ao recheio: o passo a passo do Beiju à moda maranhense A produção do beiju à moda maranhense custa em média R$ 1,55 centavos cada unidade. O seu consumo pode mostrar-se uma alternativa para combater a carência de vitamina A e de ferro no organismo. Para preparar a receita deste beiju enriquecido, siga as seguintes etapas:

Primeiramente, separe os ingredientes: 400 gramas (g) de fécula de mandioca 300 g de abóbora cortada em cubos de, aproximadamente, três a quatro centímetros 150 g de carne de sol dessalgada 50 g de folhas de vinagreira 50 g de tomate 50 g de cebola 10 g de alho 25 g de óleo de canola 5 g de sal.

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Preparando a massa:

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Em uma panela de pressão, cozinhe a porção de abóbora em 400 ml de água por três minutos após o início da pressão.

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Após essa etapa, retire a abóbora já cozida e coloque em um recipiente. Amasse a abóbora com auxílio de um garfo até alcançar a consistência de ‘purê’.

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Acrescente a fécula de mandioca e sal à massa da abóbora no recipiente. Misture bem, até formar uma massa homogênea.

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Preaqueça a frigideira e peneire a massa espalhando-a com uma colher pela frigideira.

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Vire a massa e deixe assar por um minuto

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Com a massa do beiju pronta, é hora de preparar o recheio:

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Refogue em uma frigideira: alho, tomate e cebola até dourar

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Depois, acrescente vinagreira e deixe refogar

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Misture a carne aos outros ingredientes, deixando no fogo por aproximadamente três minutos

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Por último, recheie a massa

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Talita Veloso Gomes

Decore à sua maneira e sirva

Yuko Ono Silva Graduada em Nutrição pela Universidade Federal do Pará, tem mestrado em Ciências da Nutrição pela Loma Linda University, nos EUA. É especialista em Alimentação Coletiva pela Associação Brasileira de Nutrição – ASBRAN. Atualmente, é professora assistente II do curso de Nutrição da Universidade Federal do Maranhão.

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Possui Graduação em Agronomia pela Universidade Estadual do Maranhão (2005). Pós-Graduação pela Universidade Federal de LavrasMG (2011). Cursa atualmente o curso de Nutrição pela Universidade Federal do Maranhão. Tem experiência na área de ensino de idiomas e Agronomia.

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Cenário

FALTA DE INFORMAÇÃO É O QUE CALA A SOCIEDADE FOTO: SANSÃO HORTEGAL

Sem priorizar resultados, Ministério do Turismo e Secretaria Estadual de Turismo desconhecem o retorno de suas campanhas de conscientização e fracassam no combate à exploração sexual de jovens e crianças no Estado

Por Daryanne Caldas

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m 18 de maio de 1973, a menina de nome Araceli Cabrera Sanches, de apenas oito anos, saiu de sua casa, localizada no bairro Fátima, em Serra no Espírito Santo, para ir à escola e não voltou mais. Naquele dia, a filha do eletricista Gabriel Crespo e da boliviana, Lola Sanches, foi violentada e morta. A história que envolveu a tragédia da jovem nunca foi completamente esclarecida, mas a memória da barbárie permaneceu viva, e foi transformada, quase 30 anos depois, em referência à Lei Federal 9.970/00, que instituiu a data de 18 de maio como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e a Exploração Sexual de Crianças. Atualmente, uma das formas mais recorrentes de abusos contra crianças e adolescentes é a exploração sexual, que ocorre principalmente em meio à situações de pobreza ou à falta de assistência que estes jovens encontram-se expostos. Neste contexto, a exploração pode apresentar-se de diferentes maneiras, dentre elas, destacam-se àquelas em que os atores são sujeitos intrafamiliares, isto é, quando os pais ou parentes próximos são os próprios agressores, ou até mesmo

quando este agente que promove a violência não faz parte do seio familiar. Nesta modalidade a prática de exploração ganha uma nova fisionomia, em que o público infantojuvenil passa a servir como mercadoria. Nesta atividade ilegal de exploração, meninos e meninas se transformam em alvo principal do turismo sexual. Neste tipo de exploração, os agressores são estrangeiros que realizam viagens, cuja principal motivação é a realização de práticas sexuais. Eles ficam hospedados, normalmente em regiões litorâneas, alimentando o segmento do turismo sexual no País, e junto às redes criminosas interessadas na exploração sexual, aliciam não apenas adultos, mas também jovens e crianças. Há dez anos, o Brasil é considerado uma das rotas mais conhecidas do turismo sexual no mundo. Para diagnosticar e propor políticas públicas de combate na área, o Governo Federal criou o Programa de Ações Integradas e Referenciais de Enfrentamento à Violência Sexual Infantojuvenil (Pair), que mantém, desde 2008, cinco cidades maranhenses no grupo das cidades mais vulneráveis para a prática dessas atividades.

ZONAS DE PROSTITUIÇÃO COLECIONAM HISTÓRIAS REAIS DE ABUSO Os municípios maranhenses de São Luís, Imperatriz, Caxias, Timon e Açailândia integram uma lista que inclui outras 94 cidades brasileiras, onde ocorreram notificações de casos de violência sexual contra meninos e meninas. De acordo com o levantamento realizado pelo Pair, os pontos onde há maior ocorrência de violência sexual infanto juvenil são os postos de gasolina, rodovias estaduais e federais, portos e bairros periféricos, sendo que, na capital este crime está concentrado, sobretudo, no bairro da Praia Grande, onde diariamente há uma acentuada circulação de transeuntes. “Aqui, meninas entre 13 e 16 anos vêm em busca da promessa de dinheiro fácil. Geralmente, elas estão passando por algum problema com a família, e muitas delas vêm de outros municípios maranhenses. Sem qualquer trabalho que dê condições para viver, elas não encontram outra coisa para fazer a não ser se prostituir, como foi o meu caso”, declara a profissional do sexo, Clenilde Marques, de 34 anos. Portal

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Aqui, meninas entre 13 e 16 anos vêm em busca de dinheiro fácil. Geralmente, elas estão passando por algum problema com a família, e muitas delas vêm de outros municípios maranhenses. Elas não encontram outra coisa para fazer a não ser se prostituir, como foi o meu caso Clenilde Marques que há 8 anos se prostitui em uma zona no centro da capital Maranhense

No centro de São Luís, as cenas de abuso e a prática de prostituição se repetem, sendo que, em muitos casos, meninas e meninos são as principais vítimas da violência

Apesar de ter atualmente emprego fixo em um restaurante da capital como cozinheira, durante um expediente do dia ou nas horas livres, trabalha como prostituta no movimentado Centro de São Luís. Na profissão há oito anos, Nilde, como é mais conhecida pelas colegas e pelos clientes, diz já ter vivido muitas experiências e ter visto muita gente ingressar na atividade. A maior parte deste grupo, segundo a profissional do sexo, é de jovens menores de 18 anos. “É nessa idade que elas começam a trabalhar e, posteriormente, não param mais. Boa parte delas começou quando ainda era menor de idade, elas falsificam a identidade, e

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passam por coisas que eu acho que uma criança não deveria passar. Aqui na zona (como se refere ao local onde acontecem as atividades da prostituição), além do sexo, elas acabam se envolvendo com as drogas, e isso as maltrata ainda mais ”, esclareceu. Mãe solteira de uma menina de 13 anos, Nilde afirma que não é obrigada a se prostituir, e as meninas que chegam à zona também não. Ela conta que, pelas conversas que tem com as colegas no dia a dia da profissão, percebe que elas entram na prostituição oriundas de lares onde sofreram algum tipo de violência, são rejeitadas, ou até mesmo por que lhes faltam condições para viver. “Essas jovens

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não tem opção. Comigo foi assim. Eu tinha que sobreviver e, por falta de opção, vim para cá. As meninas começam a receber pagamento pelo que fazem e ficam animadas. Olha, uma menina que nunca teve um celular, e ganha um de presente do cliente, fica muito feliz. O presente significa muito para ela e, por isso, não quer sair mais da profissão”, expõe. Clenilde Marques diz não se envergonhar da sua atividade. Confessa que o seu maior medo ainda é ver a filha, no futuro, seguir o mesmo caminho. Neste ponto, ela acha uma violência uma criança precisar se sujeitar à prostituição para viver, e reclama que, apesar de reconhecer a fiscalização do Poder Público para


DAS NOTIFICAÇÕES APRESENTADAS NO RELATÓRIO DO PAIR:

57% 82%

envolvem violência sexual contra crianças

se referem a casos em que a abuso meio da exploração de terceiros

dos casos de abuso sexual é cometido contra crianças do sexo feminino evitar que os menores frequentem a zona de prostituição, ainda falta políticas assistenciais mais amplas para que as garotas nem mesmo façam o primeiro programa. “Já chegou menina aqui ainda na primeira menstruação. Não sabia o que fazer. Eu ajudei e aconselhei para que saísse dessa profissão, mas as meninas novas são a preferência dos clientes e são também as que sofrem mais, por que não possuem experiência”, analisou a profissional do sexo, ao opinar que a solução para o problema seria o Governo garantir a permanência das jovens na escola de educação integral, ou curso profissionais que ocupassem o tempo das jovens. Foi a falta de estudos sobre o fenômeno social de crianças exploradas e abusadas sexualmente, conforme retratado no depoimento de Clenilde Marques, que inquietou a bacharel em Turismo pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Patrícia Melo da Silva, durante o seu curso de graduação. No seu estudo monográfico em 2013, ela realizou uma análise sobre as campanhas de conscientização e combate à exploração sexual de crianças e jovens desenvolvidas na capital maranhense, sob a orientação da professora do departamento de Turismo e Hotelaria da Universidade, Conceição de Maria Belfort Carvalho.

43%

O Ministério do Turismo utiliza as campanhas de conscientização de forma estratégica, visando transmitir uma mensagem para um determinado público. Algumas peças e materiais de campanha são destinados à conscientização dos turistas, outros ao trade turístico, ou ainda para a população. Observando este cenário, Patrícia Melo teceu considerações sobre os impactos e gargalos existentes nas campanhas de enfrentamento da exploração sexual infantojuvenil da Secretaria Estadual de Turismo, por meio do programa Turismo Sustentável e Infância (TSI), do Ministério do Turismo. Ela realizou uma pesquisa quali-quantitativa para analisar os métodos estatísticos coletados e também informações descritivas. “Realizei pesquisas in loco. Entrevistei empresários, assim como os órgãos e instituições que trabalham com o TSI. Na oportunidade também apliquei questionários com a sociedade civil para saber como a campanha chega na população, e como contribui para o combate à exploração sexual infantojuvenil em São Luís. Além disso, para fundamentar o trabalho de pesquisa, realizei levantamento e apuração de dados estatísticos do Disque Direitos Humanos, e da Matriz Intersetorial de Enfrentamento à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes”, explicou.

A PRÓPRIA SECRETARIA ESTADUAL DE TURISMO DESCONHECE O RETORNO DE SUAS CAMPANHAS Após a realização de sua pesquisa, ela identificou vários itens pertinentes ao tema, dentre os quais, o fato de que o Poder Público não conta com qualquer ferramenta de mensuração dos resultados de suas campanhas e, por isso, desconhece a eficiência das campanhas do TSI para o enfrentamento ao crime de exploração sexual contra crianças e adolescentes. Patrícia Melo da Silva lembra que, todos os anos, a Secretaria Estadual de Turismo do Maranhão intensifica o seu trabalho em períodos estratégicos, como no carnaval, durante as festas juninas, e em datas especiais como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças, visando o incentivo às denúncias dos casos de exploração sexual de crianças e adolescentes no turismo. Entretanto, critica a postura dos órgãos públicos de trabalhar somente com campanhas de conscientização em períodos pontuais, sem contemplar outras estratégias permanentes de campanhas com o uso de outras ferramentas que levem informação à população. Para a professora do curso de Comunicação Social da UFMA, e que ministra a disciplina de Campanhas Institucionais, Francineth Portal

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Em São Luís, é possível encontrar campanhas de combate a exploração sexual de crianças em bares da orla e em hotéis

Louzeiro, o trabalho do Ministério do Turismo e da Secretaria Estadual de Turismo esbarra no problema do alcance que pretende abraçar ao ser criada. Uma campanha precisa comunicar-se com diferentes públicos e, para cada um deles, são utilizados discursos diferentes. “Com base nesses discursos, são necessárias estratégias e ferramentas de conscientização que mudem de acordo com o público. É o que acontece com as campanhas como esta de exploração sexual realizada pelo Ministério do Turismo. São campanhas que não particularizam um grupo para conscientizar porque tentam incluir um público muito amplo, sem priorizar os resultados. A prova disso é que as empresas não possuem métodos para medir a eficácia do seu trabalho de enfrentamento da questão”, explica. Ela destaca ainda que as intervenções por meio de campanhas, de temas como doação de órgãos ou de sexualidade, precisam ser tratadas dentro de suas peculiaridades, já que cada sujeito ou grupo encara o assunto de uma maneira diferente. “Se não conhecemos o público que está do outro lado, as campanhas tornam-se ineficazes”, reforça.

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FALTA DE INFORMAÇÃO É O QUE CALA A SOCIEDADE A falta de informação para formar a opinião pública é um dos problemas apontados pela pesquisadora. Assim, tanto a Secretaria de Turismo desconhece os efeitos destas campanhas quanto o público por falta de conhecimentos sobre o cenário da violência no Brasil. Durante a realização da pesquisa, a maior parte do grupo pesquisado mostrou completa falta de informação sobre as campanhas, e as formas de como é possível agir no caso de presenciar um crime como este. “A população só poderá combater o crime se houver informações (onde e para quem denunciar ao identificar o tipo de violência), pois, sem isso, a sociedade irá se calar diante do crime, como acontece em muitos casos, cujo denunciante identifica o crime, mas não o denuncia. Se o cidadão conhece o problema e as formas de denúncia, saberá certamente tomar as providências corretas” diz.

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Patrícia Melo da Silva É bacharel em Turismo pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

A solução do problema estudado por Patrícia Melo seria uma ação efetiva entre a comunidade e o poder público, que precisa realizar atividades em diferentes pontos da cidade, bem como massificar a mensagem de combate à exploração sexual de crianças e adolescentes através de campanhas publicitárias; conversas com o trade, e outras ações estratégicas como seminários, palestras e reuniões. “Dessa forma, quando um turista chegar no Brasil e optar por esse tipo de serviço, a Sociedade Civil saberá como e quais as providências corretas a serem tomadas”, aconselha, ao propor ações corretivas nas campanhas, mensuração dos seus efeitos, e novas formas de combate ao problema no Maranhão.


Cenário

A BOA IDEIA QUE NÃO DEU CERTO Construída na década de 70, a Barragem do Bacanga cumpriu parte de seu objetivo, e se transformou em um impasse de difícil resolução para o poder público

FOTO: SANSÃO HORTEGAL

Por Daryanne Caldas, Roberth Meireles e Sansão Hortegal

Estrutura da Barragem do Bacanga vista sob a ponte

Residências Irregulares estabelecidas às margens do Bacanga

A

proposta era a seguinte: primeiro, o nível do mar seria reduzido para que áreas litorâneas, antes submersas, pudessem ser ocupadas frente à acentuada curva de crescimento urbano que São Luís enfrentava nos anos 70. Depois, seria criado um lago como espaço de lazer, e, por fim, uma ponte ligaria as duas extremidades da bacia do Bacanga, propiciando a liberação de acesso às áreas como a do Porto do Itaqui. A proposta parecia bem simples no papel, e, quando o projeto arquitetônico foi concluído, há exatos 44 anos, nascia aquilo que foi considerada uma proposta visionária de planejamento urbano. A Barragem do Bacanga de fato cumpriu as promessas a que se propôs. Transformou a vista que se tem da parte mais alta do bairro da Madre Deus. Deste ponto, a nova paisagem passou a ser de uma região completamente inundada, sendo uma porção mais alta e outra mais baixa, dividida atualmente por quatro faixas de avenida que se perdem no horizonte e revela um projeto que se perdeu nos seus próprios objetivos. Logo nos primeiros metros da via que passa sob a Barragem e que dá acesso a cerca de 60 bairros da capital, são as dezenas de residências irregulares o que mais chamam à atenção de quem passa pelo local. Adiante, milhares de famílias que compõem um grupo populacional estimado em 350 mil, e o poder público que conhece de perto o alto preço acarretado pela urbanização informal. E, é esta falta de planejamento urbano que é apontado pelo pesquisador da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Márcio Vaz, como o grande motivo da Barragem, considerada, outrora, como uma boa ideia, não ter dado certo no final das contas. “Tivemos na região onde está a Barragem do Bacanga uma ocupação de áreas impróprias e que aconteceu de maneira irregular. Essa população que vive às margens da Bacia, como é o caso dos moradores do bairro do Sá Viana poderia até viver nestas localidades, mas para isso era necessário que tivesse ocorrido, no passado, uma severa intervenção na barragem, que propiciasse a qualidade de vida da população”, explicou. Portal

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Nessa perspectiva, o pesquisador da UFMA reforça que o problema não é a Barragem, e sim o modelo de ocupação que foi desenvolvido pela população sem que o poder público tomasse as medidas necessárias para conter o problema. “Existe uma grande desinformação de que a Barragem do Bacanga é um projeto errado, mas não é. Ela foi construída para ser antes de tudo uma barragem e, somente depois é que poderia servir como ponte, dividir um lago, mas antes de tudo teve o propósito de ser uma barreira artificial para a retenção de água doce e controle do nível do mar”, ressaltou Vaz, ao afirmar que esta percepção de que a Barragem é a geradora de problemas é um equívoco, já que, até mesmo, o seu próprio funcionamento encontra-se hoje comprometido devido ao que ele considera ser o real problema da região - a ocupação irregular que aconteceu e continua a avançar nas margens da Bacia. De acordo com o seu projeto original, a Barragem foi construída em um limite topográfico específico, e está localizada na segunda maior bacia de drenagem de São Luís, com dez mil hectares, que recebe as água absorvidas pelo solo em um raio médio de 25 quilômetros. “É como se a Barragem servisse para segurar toda a água das chuvas que caem sob uma área que vai do aeroporto da cidade até o bairro do Maracanã – zona rural de São Luís”, explicou o pesquisador Márcio Vaz. O projeto previa o armazenamento de água doce e seu despejo no mar por meio da abertura de três comportas. Dentro desta sua dimensão utilitária, a construção foi o que permitiu que as margens próximas ao Centro Histórico de São Luís passassem, no final da década de 80, a abrigar bairros como a Areinha, Parque dos Sabiás e Coroadinho. “Sem a Barragem, bairros inteiros ficariam com água no joelho. É o caso daqueles que estão próximos à Avenida Senador Vitorino Freire e do Bairro do Sá Viana, local que melhor ilustra a situação, já que ele está abaixo do nível do mar”.

Estrutura de sustentação de ocupação irregular na margem esquerda da bacia do Bacanga

Estrutura de contenção da barragem

NOVOS PROBLEMAS ÀS MARGENS DO BACANGA Do ponto de vista técnico, a ocupação irregular nas proximidades da Barragem resultou numa cota de entrada de água de 3,5 metros para 4 metros. Com o passar do tempo e com a diminuição do nível do lago, as áreas que estavam com o nível reduzido, atualmente, estão na cota de 1,2 metros de água. E foram nestes novos espaços de terra, que, - na época passaram a pertencer a União - , que o problema do gerenciamento público permitiu a ocupação irregular da área, resultando hoje em vários problemas sociais, econômicos e ambientais. Essa tríade sintomática do impacto da instalação da Barragem do Bacanga foi justamente o objeto de estudo de uma pesquisadora no mestrado em Sustentabilidade e Ecossistemas da Universidade Federal do Maranhão.

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Em sua pesquisa, Jackgrayce Dutra verificou indicadores socioeconômicos e ambientais da bacia do Bacanga. O estudo desenvolvido, em 2010, na UFMA teve como título ‘O índice de sustentabilidade ambiental do uso da água como ferramenta de contribuição às políticas públicas de desenvolvimento e conservação na Bacia do Bacanga’. Ela constatou que o nível educacional e financeiro da população influencia diretamente na qualidade do meio ambiente, já que, conforme detectado na pesquisa, quanto menos abastados os indivíduos, menor sua consciência ambiental, condições sanitárias e possibilidades de reutilização de objetos por meio da reciclagem, tendo, em contrapartida, maior consumo, descarte negligente do lixo, e, consequentemente, maior poluição por resíduos sólidos provocada por estes. “Quando este sujeito frequenta a escola, tem mais chances de ter uma formação em educação ambiental. Por exemplo, a instrução lhe dá condições para que comece a perceber que tudo em seu meio depende de seus atos e que jogar lixo no chão, assim como o desperdício de água, influencia diretamente no meio em que ele vive”, ilustrou a pesquisadora.


Existe uma grande desinformação de que a Barragem do Bacanga é um projeto errado, mas não é. Ela foi construída para ser antes de tudo uma barragem, e depois poderia servir como ponte, dividir um lago, mas antes de tudo teve o propósito de ser uma barreira artificial para a retenção de água doce e controle do nível do mar Ao constatar que toda a margem esquerda da Bacia do Bancaga possui o menor índice socioeconômico se comparada à margem direita e consequentemente a menor qualidade ambiental, a mestre em Sustentabilidade e Ecossistemas apontou também que grande parte da região da margem esquerda da Bacia do Bacanga não tem abastecimento de água e nem tratamento de esgoto. “O esgoto da população que habita essa região da margem esquerda é despejado in natura para dentro da Bacia, o que afeta a qualidade de vida dessas pessoas, pois grande parte dos habitantes dessa região pesca e consome a água dos rios que compõem a Bacia”, elucidou a pesquisadora, Jackgrayce Dutra. Quem concorda com os apontamentos desta pesquisadora, é o presidente da Associação Comunitária Itaqui Bacanga, (ACIB), Josué Silvestre. Tendo em vista todos os problemas sociais, ambientais e econômicos com os quais a população das margens da Bacia do Bancaga convive, a entidade declara que tem desenvolvido ações, projetos e discussões em parcerias, inclusive com órgãos públicos, sobre a conscientização da população acerca de questões ambientais da região. Eles têm buscado, juntos, encontrar soluções para reverter os atuais quadros que hoje estão presentes na vida da população. “Eu costumo dizer que é mais cômodo para a sociedade reclamar do que participar das discussões de interesse das comunidades. É mais prático assistir a uma novela, por exemplo, do que participar de uma discussão que é de interesse público. Esta postura de quem mora aqui degrada a localidade e vem acompanhada da diminuição, cada vez, maior do interesse por debater especialmente estes problemas”, declara o líder comunitário da ACIB.

Márcio Fernandes Vaz É bacharel e tem licenciatura em Ciências Biológicas pela Universidade Santa Úrsula. Tem mestrado em Engenharia Ambiental pela Colorado School of Mines, e doutorado em Ciências Ambientais pela University of Virginia. Atualmente, é professor da Universidade Federal do Maranhão. Tem experiência na área de Geociências, com ênfase em Ciências Ambientais, atuando principalmente nos seguintes temas: avaliação de impacto ambiental, zoneamento econômico e ecológico, geoprocessamento, hidrologia costeira e manguezais.

Sem medidas a longo prazo que contemplem a resolução dos problemas sociais, econômicos e ambientais da Barragem, o pesquisador da UFMA, Márcio Vaz, afirma que o avanço de moradias irregulares continua a ocorrer e que o grupo estabelecido no local é composto atualmente por cerca de 300 famílias. Enquanto isso, o governo estadual mantém, definido em seu planejamento, apenas um projeto de manutenção em fase de licitação, para que uma empresa possa realizar uma reforma de segurança do sistema de controle do nível da água que entra e sai da barragem. Um trabalho que consiste na recuperação das comportas existentes, sendo que, atualmente, das três comportas, somente uma está funcionando. Após a reforma, as comportas devem ser automatizadas, ou seja, serão programadas para abrir e fechar de acordo com as tábuas das marés. Se a maré estiver cheia, a comporta ficará fechada. Em seguida, no momento de vazão da maré, quando for necessário retirar água do lago, as comportas abrir-se-ão sozinhas. Segundo o secretário de infraestrutura do Maranhão, José Raimundo Frazão Ribeiro, esta obra que, está orçada em R$ 43 milhões de reais, terá a duração de 18 meses. “A recuperação não é da barragem toda, e sim somente das três comportas, já que hoje apenas uma funciona. O objetivo agora é corrigir este problema, transformando esses vagões que passarão Jackgrayce Dutra a receber cargas dos dois lados da Barragem, facilitando o fluxo de entrada e saída de água para o lago”, Possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal pontuou. De acordo com o representante do goverdo Maranhão, e é mestre em no, este projeto recebeu aprovação também da prefeiSustentabilidade de Ecossistemas pela tura de São Luís, uma vez que esta desenvolve ações Instituição. Tem experiência na área de na região Itaqui Bacanga em relação à infraestrutuEcologia, com ênfase em Ecologia de ra e atendimento socioambiental. Após a reforma, a Ecossistemas, atuando principalmente nas seguintes áreas: educação ambiental, pretensão do poder público é que, quando o nível da gerenciamento de bacias hidrográficas água aumentar, a cota de água dentro da Barragem urbanas e resíduos sólidos. possa ser controlada, sem colocar em risco a comunidade que vive no local. Portal

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FOTO: SANSÃO HORTEGAL

Entrevista

O que diz a Lei sobre a Proteção Intelectual? Em entrevista à Revista Portal da Ciência, o professor Alexandre Freire esclarece a jurisdição e o cenário da Proteção Intelectual no Brasil A colaboratividade na produção do conhecimento se mostra cada vez mais fundamental para assegurar a legitimidade do registro de ideias que propiciam o avanço da área científica. Por isso, nos últimos anos, juristas têm voltado suas atenções à formulação de propostas que envolvam a proteção efetiva de obras literárias e artísticas, softwares, domínios na rede mundial de computadores, cultura imaterial, patentes de intervenção, modelos de utilidade, desenhos industriais, cultivares, marcas e indicações geográficas que detêm valores econômicos, sociais e políticos. Esta efetividade processual e a aplicabilidade do direito sob a Proteção Intelectual (PI) é o objeto de estudo de um projeto desenvolvido na Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Sobre este assunto, a Revista Portal da Ciência (RPC) entrevistou o coordenador da proposta, cujas ideias desenvolvidas já se transformaram em livro. Veja:

RPC - ‘Tutela Jurisdicional Efetiva e a Proteção dos Direitos de Propriedade Intelectual’ é o nome do projeto de pesquisa. Quando ele começou a ser desenvolvido e o que ele pretende analisar?

publicidade e acesso. Para compor a equipe de pesquisa, é necessário que o aluno tenha dedicação, competência, técnica e apresentação de um projeto de pesquisa com o tema relacionado com as linhas de investigação do Núcleo de Direito Processual Civil Contemporâneo (NPC).

AF - O projeto existe desde o ano passado, quando re-

RPC - Qual é a ponte relacional que existe

cebeu aprovação do Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) da Universidade. A partir de então, passamos a desenvolver um trabalho baseado na análise das tutelas de proteção dos direitos de Propriedade Intelectual, ou seja, aquelas que impedem a ocorrência do ato ilícito, assim como as tutelas de urgência que asseguram a imediata reparação do ato ou a recomposição do dano causado aos direitos de PI.

RPC - Quem participa do projeto na UFMA? AF - Participam do projeto, discentes a partir do terceiro período do curso. Para integrar o grupo, eles participam de uma seleção que ocorre, periodicamente, com ampla

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entre a produção de ciência de forma mais ampla com a sociedade?

AF - As criações intelectuais fazem parte da sociedade contemporânea de uma forma diferenciada, já que aparecem em maior volume se comparada com a produção em outros períodos da história. Desse modo, compreendendo a atual conjuntura econômica, social e política percebemos que o que nem sempre existiu foi a proteção efetiva dos direitos dos produtores do conhecimento, ciência, técnicas e tecnologias. Assim, as criações acabaram por se tornar elementos essenciais, permitindo a afirmação de que o patrimônio intelectual, indubitavelmente, integra o arsenal competitivo em âmbito geral.


RPC - O que caracteriza

a apropriação ilegal de uma propriedade intelectual?

AF - A apropriação ilegal é um ato ilícito contra a PI e ocorre quando um agente não respeita os limites do uso da Propriedade Intelectual, fazendo o seu uso sem a devida autorização do titular de direito. Por exemplo, quando um terceiro rotula seus produtos com uma marca semelhante à de outro produto, causando confusão no mercado consumidor e se apropriando da referência que aquela marca tem no mercado.

RPC - Existe uma lei específica no Brasil capaz

de amparar todos os casos que envolvem abuso do direito de propriedade intelectual?

AF - Atualmente, não existe uma legislação codificada que disciplina todas as questões referentes à Propriedade Intelectual, mas diplomas específicos apontam sanções civis e penais em casos onde a identificação de abuso do direito de Propriedade Intelectual. Em meio a estas questões, podemos destacar a LPI (Lei de Propriedade Industrial – Lei n. 9.279/96), a LDA (Leis de Direitos Autorais – Lei n. 9.610/98), entre outras específicas, e mesmo o Código Civil, disciplinando as linhas gerais do direito de propriedade.

RPC - A que dispositivos e penalidades está sujeita uma pessoa que comete o crime de apropriação ilegal?

AF -

Essas sanções podem ser tanto civis, quanto penais. No âmbito, o que se busca é inibir ou remover o ato ilícito referente aquele direito. Contudo, as sanções penais variam de acordo com o ato praticado e o direito de PI envolvido, por exemplo, no que está previsto no artigo 189 da Lei n. 9.279/96, e no artigo 190 da mesma lei, que preveem aplicação de sentença baseada em uma detenção que pode chegar de um a três meses, ou multa como forma de ressarcimento pela apropriação ilícita.

RPC - Onde se concentram estas demandas de solicitações por reparação via judicial? De universidades? Centros de pesquisas aplicadas? Setor privado? AF - No aspecto regional, se concentram na região sudeste, principalmente pelo fato do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual e do ECAD (sede principal) se situarem no Rio de Janeiro, e por serem locais de grande produção técnica-científica-literária-cultural. As demandas se dividem entre as que envolvem o uso dos direitos pelos particulares (setor privado) e na concessão, administração, fiscalização, desenvolvimento e possibilidade de anulação (ou suspensão) envolvendo esses direitos, nos quais estão envolvidos particulares e Estado.

RPC - As atividades do projeto estão rendendo publicação em forma de livro, certo?

AF - Sim, temos uma obra coletiva que está em seu segundo volume. O livro, que tem como título ‘Direito, Inovação e Desenvolvimento: tópicos de propriedade intelectual e concorrência’, reúne artigos científicos de professores e pesquisadores de universidades de todo o País, e traz atualizações e debates, resultantes dos encontros semestrais que o Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito realiza.

RPC - Atualmente, de que tipo são as principais denuncias envolvendo a Proteção Intelectual que chegam aos tribunais?

AF - Chegam muitos casos que envolvem lesão aos direitos de PI como a contrafação de direitos de marca que está relacionada com uma concorrência desleal; alguns casos envolvendo patentes, desenhos industriais, indicações geográficas, programas de computadores, assim como a reprodução, a divulgação ou qualquer forma de utilização ilícita de direitos autorias. No entanto, todas essas questões que são levadas ao Poder Judiciário são relevantes (independente da quantidade em cada um dos casos) porque estão relacionadas aos impactos sociais, econômicos culturais expressivos.

Alexandre Freire Graduou-se em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e tem mestrado na mesma área pela Universidade Federal do Paraná. Atualmente, é doutorando em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC). Integra o corpo docente da Universidade Federal do Maranhão. Conferencista, o pesquisador é membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP e coordenador de Cursos da Associação dos Advogados do Estado de São Paulo.

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Inovação

BIBLIOTECA... DE PLANTAS Herbário na UFMA revela diversidade botânica do Maranhão

Por Alexssandro Rodrigues

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m vez de livros com páginas ilustradas em que a diversidade da flora maranhense aparece estampada, mudas de espécies botânicas vivas servem igualmente para a consulta de pesquisadores de todo o mundo, como em uma grande biblioteca, só que de plantas. Esta é a proposta do Herbário do Maranhão do Departamento de Biologia da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) - um laboratório onde a vida é compreendida de perto, no contato direto e diário com a natureza. É neste espaço que estudantes de graduação e de pós-graduação, coordenados por um professor da Instituição, desenvolvem a iniciativa inédita que vai possibilitar tanto a identificação do patrimônio natural que compõe a flora do Estado quanto a multiplicação de estudos focados no levantamento de novos conhecimentos, tendo essas plantas como principal objeto de estudo. O espaço, que abre suas portas para o mundo, apresenta de forma organizada, a riqueza e a variedade da vida vegetal que serve a estudantes como Flávia Serra. A mestranda em Biodiversidade e Conservação da UFMA desenvolveu, durante a graduação um trabalho que chamou a atenção da comunidade científica, ao revelar a existência de 23 novos registros de espécies, nunca antes catalogadas no Estado. O estudo florístico considerado pioneiro foi

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realizado em uma área de restinga no município de São José de Ribamar e, agora, ela pretende utilizar o Herbário Virtual para entender como estas espécies encontradas se distribuem na vegetação de restinga, assim como de que forma elas interagem ecologicamente entre si. Com a sua pesquisa já em andamento, a contribuição científica da mestranda Flávia Serra foi um dos estudos que corroborou para que o Herbário do Maranhão pudesse formalizar o pedido de veiculação e constituição de um acervo junto ao Herbário Virtual da Flora e dos Fungos(INCT). “Para que alcançássemos o atual patamar que temos hoje, foi fundamental o trabalho realizado há dez anos atrás pelos professores do Departamento de Biologia, ligados à área de Botânica, assim como as pesquisas de monografias e dissertações de mestrado. Este foi um trabalho que começou com o Laboratório de Estudos Botânicos e que, agora, ganha visibilidade”, reforçou o curador do Herbário, Eduardo de Almeida Júnior. Após um ano de veiculação junto ao INCT, o Herbário do Maranhão já coleciona mais de três mil plantas que representam as principais espécies vegetais existentes em solos maranhenses, com a possibilidade de ser acessado por qualquer botânico do País interessado no desenvolvimento de pesquisa na área, e que pode inclusive solicitar o empréstimo das plantas para fins de estudo e pesquisa. “Nossa aposta é que com isso, o Maranhão se apresente floristicamente para o mundo”, afirmou o coordenador do Herbário, Eduardo de Almeida Júnior.


FOTO: SANSÃO HORTEGAL

Amostra de espécies de plantas maranhenses secas do Herbário do Maranhão

No Herbário, em vez de livros, a equipe reúne plantas e disponibiliza amostras em espaço virtual para consulta

No Herbário, estudantes de Graduação e Pós-Graduação desenvolvem pesquisas e catalogação de plantas maranhenses

O FUNCIONAMENTO DA CATALOGAÇÃO As pesquisas científicas desenvolvidas pelos professores e alunos da UFMA iniciam com a coleta das plantas. Logo após, elas são levadas para o Laboratório de Estudos Botânicos (LEB), onde passam por um processo de secagem, são costuradas em cartolinas, nomeadas com seus respectivos nomes científicos e, por fim, registradas no acervo do Herbário. No entanto, este é um trabalho que requer, antes de tudo, apoio de parceiros, como o da Fundação de Amparo à Pesquisa e Desenvolvimento Científico do Maranhão (Fapema), que dá suporte ao trabalho de acervo do Herbário, uma vez que, com o financiamento de projetos aprovados, é possível custear o deslocamento dos alunos que vão pesquisar áreas de vegetações de restingas, localizadas nas regiões litorâneas do Estado. A oceanógrafa e mestranda em Biodiversidade e Conservação do curso de Biologia na UFMA, Monielle Alencar, participa das atividades de catalogação do Herbário. Ela identifica que a vegetação de restinga possui os elementos que mais sofrem a influência de fatores oceanográficos, e, a partir desta perspectiva, espera correlacionar em sua pesquisa do mestrado o quanto esse tipo de solo influencia a vegetação homônima. “O Herbário é uma forma de registrar as espécies do Estado, e, mais do que isso, um meio de conhecer para propor mudanças na realidade destes cenários, no que diz respeito à preservação de sua biodiversidade”, diz.

DESAFIOS NO MEIO DO CAMINHO O curador do Herbário do Maranhão, Eduardo de Almeida Júnior, alega que a ausência de espécies da botânica maranhense em acervos espalhados pelo País ocorre principalmente devido à extensão do seu território. Outro fator que implica no registro limitado das espécies e a pouca disposição para estudos científicos é o baixo número de botânicos no Estado. “Por conta disso, desconhecemos a maioria das espécies vegetais que possuímos, por exemplo, uma espécie

que só tivemos registro em 1915 e de lá para cá, nunca mais houve nenhuma menção sobre esta espécie, embora ela estivesse lá”, expôs. Agora, com o Herbário de Biologia da UFMA, esta espécie voltará a ser pesquisada novamente, assim como outras que, até o presente momento, possuem pouco ou nenhum conhecimento à respeito de sua natureza. O objetivo dos pesquisadores é elevar o Herbário do Maranhão a um patamar internacional, quando deverá disponibilizar mais 10 mil exemplares da botânica maranhense para o acesso on line. Enquanto isso, em 2015 o Herbário do Departamento de Biologia da Universidade Federal do Maranhão receberá novas instalações. Um novo prédio que abrigará todo o acervo e poderá receber ainda melhor a comunidade que deseja conhecer mais sobre a riqueza da flora maranhense. Conheça o Herbário Virtual da UFMA, visite: (www.splink.cria.org.br/manager/detail?setlang=pt&resource=MAR)

Eduardo de Almeida Júnior É licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE). Tem mestrado e doutorado em Botânica pela mesma Instituição de Ensino. Atualmente, integra o corpo docente da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). O pesquisador também é orientador no Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação (PPGBC); é bolsista de Produtividade/FAPEMA. Atua nas áreas de Botânica e Ecologia.

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FESTA DA JUÇARA É DESCONHECIDA POR TURISTAS E MARANHENSES Dificuldades na captação de financiamento e pouca divulgação resultam na insatisfação e na baixa popularidade da festividade tradicional

Por Fabiana França

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ternizada em canções e multiplicada em versos de compositores maranhenses, os frutos da palmeira conhecida como Juçara movimentam, há quarenta anos, uma comunidade localizada na zona rural da capital maranhense. No bairro do Maracanã, que fica acerca de 20 quilômetros do Centro de São Luís, um cantador de bumba meu boi encontrou inspiração para compor toadas marcantes da cultura maranhense, assinalando, com isso, a forte representatividade que a Juçara ganha, principalmente no mês de outubro, quando o consumo e a venda do fruto dão lugar a uma das mais tradicionais manifestações da cultura popular do Estado, a Festa da Juçara. A história da Juçara como principal elemento da Festa tem início, em 1970, quando a agrônoma Rosa Mochel fixou residência no Maracanã e percebeu a riqueza do ecossistema da região, composto por um grande número de juçareiras, de onde os moradores, além de consumirem o produto, comercializavam o

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seu fruto em larga escala para pontos espalhados na região metropolitana de São Luís. Certa do potencial da Juçara, Rosa Mochel criou o evento que é realizado, anualmente, por comerciantes e extrativistas que passaram a se agrupar para distribuir e aumentar a sua renda com as vendas do fruto. Quarenta e três anos após a sua criação, a festa - já tradicional - sofre com a pouca divulgação e com as dificuldades para obter financiamento, o que gera insatisfação e pouco ou nenhum conhecimento, até mesmo por parte dos próprios maranhenses sobre a manifestação popular, como aponta um estudo realizado na Universidade Federal do Maranhão (UFMA) em 2014. A pesquisa foi desenvolvida pela turismóloga formada pela UFMA, Eliene Santos Costa, sob a orientação da professora do departamento de Turismo e Hotelaria, Kláutenys Guedes Cutrim. Ao realizar o diagnóstico sobre a festa, a pesquisadora identificou que ainda faltam investimentos e exploração do potencial turístico da Festa da Juçara. “São os meios de promoção das manifestações que as mantém enquanto atra-

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tivo turístico. Na Festa da Juçara, esses meios são completamente escassos. Para a promoção de uma festa ou brincadeira, é preciso difundir os seus atrativos e isso não tem acontecido com o evento do Maracanã", explicou Eliene Santos Costa ao apontar o motivo do pouco interesse da população em conhecer a localidade.

QUEM QUER FESTA, SUA-LHE A TESTA Habituada à preparação anual da Festa da Juçara, Maria de Jesus Assis, mais conhecida como Dona Cotinha, ficou famosa por sua presença à frente da festa. A aposentada lembra de maneira nostálgica dos tempos em que comandou a atração, tornando-se uma autoridade sobre o assunto. “A própria forma de preparar a Juçara não é mais a mesma. Antes, ela era amassada à mão, e isso representava um processo demorado. Então, o pessoal que vinha à festa, ficava mais tempo nas mesas esperando pelo produto e conversando com a gente. Lembro também que sempre

FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

Cultura


PARQUE DA JUÇARA Atualmente, no Parque da Juçara, existem cerca de 50 barracas, onde o público pode encontrar desde a tradicional polpa da juçara, até peças artesanais produzidas a partir da fibra da palmeira da juçara, assim como bebidas e comidas típicas do Maranhão. No mês de outubro, quando há maior incidência da Juçara na região, o Parque fica aberto de segunda a domingo. É no último dia que a festa conta com apresentações de grupos culturais, o que aumenta bastante a movimentação de turistas e demais visitantes no local da festa.

ELIENE SANTOS COSTA

passamos por muitas dificuldades. No início da Festa, eu montei uma chapa com apoio de outros barraqueiros, pois a festa corria o risco de desaparecer. Eu estava empolgada e a nossa união nos deu força para enfrentarmos estes problemas, e darmos continuidade ao evento”, expõe a Maria de Jesus Assis. O receio de que a festa desapareça como quase aconteceu no passado volta a rondar os participantes. As recentes mudanças no sistema de financiamento da cultura têm imposto novos desafios aos organizadores do evento. “No ano passado, nós não tivemos ajuda da Secretaria de Cultura e tivemos que pagar tudo, inclusive as apresentações artísticas que, geralmente, são caras. Tudo isso só foi possível devido ao esforço da comunidade que custeou as atrações”, reclamou Maria de Jesus Assis. Essa falta de apoio e divulgação por parte do Poder Publico é a base da pesquisa de Eliene Santos Costa que, segundo ela, resultou na ausência da Festa da Juçara no circuito turístico de São Luís. A prova disso é que, conforme este estudo, do público total que visita a festividade, menos de vinte por cento é de turistas. A pesquisa utilizou como ferramentas metodológicas a aplicação de entrevistas e questionários que possibilitaram a apuração de dimensões quantitativas e qualitativas da manifestação. Dados revelaram que quase cinquenta por cento das pessoas que visitam o evento

estão insatisfeitas com relação à festa. Ao justificar o grau de satisfação da clientela da Festa da Juçara, ela descobriu que o que mais agrada os visitantes é o meio ambiente onde o evento é realizado, e o ponto avaliado que recebeu a maior parte das críticas diz respeito à infraestrutura do evento. “A Festa da Juçara é bem local e a maioria do público é ludovicense. Os vendedores são daqui, a renda é local e permanece na comunidade. Durante as minhas pesquisas de campo, percebi que poucos turistas visitam a festividade, mesmo o Parque da Juçara obedecendo aos padrões da vigilância sanitária. O que temos é uma população que já ouviu falar da Festa de Juçara, mas, de fato, não conhece, pois nunca chegou a ir ao Parque”, disse.

LEI DE INCENTIVO: UM DESAFIO A SER ENCARADO PELAS FRENTES DE PRODUÇÃO CULTURAL Em vigor desde 2012, a Lei Estadual de Incentivo à Cultura emparelha-se à lei nacional conhecida como Lei Rouanet, permite que empresas e cidadãos possam investir em eventos artísticos, culturais e esportivos em troca de incentivos e deduções fiscais no âmbito estadual. No Maranhão, cabe à Secretaria

Possui graduação em Turismo pela Universidade Federal do Maranhão.

Estadual de Cultura (SECMA) a função de executar e fomentar projetos, programas e ações culturais, que utilizam como principal fonte de financiamento o Fundo Nacional de Cultura e a Lei Estadual de Incentivo à Cultura. Dentre estes projetos, a Festa da Juçara compõe o grupo de manifestações culturais que ainda precisam adequar-se à nova dinâmica da produção cultural. O procedimento para isso começa com o encaminhamento de projeto pelos grupo à SECMA que os analisa segundo a viabilidade de investimento na manifestação, que precisa atender à regulamentação relacionada à política de cultura adotada no País. De acordo com o secretário estadual adjunto de cultura, Israel Ferreira, em 2013, a Lei de Incentivo recebeu mais de 60 projetos apoiados. Porém, ele lembra que é necessário que a proposta seja sempre apresentada na Secretária com antecedência. “Isso não aconteceu com a Festa da Juçara no ano passado, o que inviabilizou a participação financeira na realização do evento. Muitos associados, representantes dos grupos de cultura popular maranhense, não entregam os documentos padrões necessários para a submissão dos projetos para avaliação e perdem o prazo”, esclareceu. Portal

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Saúde

Na fila de espera Maranhenses lideram o ranking de recusas em salvar vidas por meio da doação de órgãos

Ao autorizar a doação de órgãos, é a linha da vida de outra pessoa que continua Antônio Marinho, 40 anos

Ver meus netos

Este é o sonho de apenas um dos mais de 800 maranhenses que aguardam na fila de espera pela doação de um rim ou de uma córnea.

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Antes de passar por essa situação, eu me denominava doador, mas não sabia de verdade a diferença que meu ato poderia fazer na vida de uma pessoa. Hoje, eu sei bem como é estar na fila de espera e ser contemplado com um verdadeiro presente O aposentado transplantado, Frazão Serra

Por Luama Alves

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odo mundo, pelo menos uma vez na vida, já sonhou em ser um herói ou ser salvo por um. No Maranhão, nos últimos 14 anos, mais de 1.400 pessoas já encontraram os seus heróis. Eles receberam os órgãos de pessoas que optaram por fazer a diferença e salvar vidas. Os motivos para isso, em alguns casos, acontece como um ato de amor e amizade por pessoas conhecidas mas, na maioria das vezes, é na solidariedade e gentileza que reside o gesto que pode pôr fim à espera angustiante de quem está na fila de espera por um transplante. Foi assim com o técnico de telecomunicações, Fábio Gomes, que há 19 anos, realizava tratamento de hemodiálise. Com apenas uma semana de transplantado, ele define a experiência da fila de espera e do transplante de rins que passou como uma experiência de retomada da sua liberdade. Fábio Gomes poderia ser o personagem desta reportagem, mas ele faz parte de um grupo caracterizado proporcionalmente como pequeno, se comparado com a quantidade de pessoas que ainda aguarda a doação de órgãos no Maranhão, e, neste caso, serve apenas para ilustrar um exemplo bem sucedido de transplante. No Estado, são 853 pessoas à espera de transplante, sendo que 676 aguardam uma córnea e 177 um rim, segundo a Central Estadual de Transplantes. E, o mais preocupante é que o Maranhão aparece, no Relatório Brasileiro de Transplante (RBT) de 2013, como o segundo Estado com os maiores índices de rejeição à doação de órgãos por parte da família, ficando somente atrás de Sergipe. Em 2014, o número reduzido de doadores tem tornado a situação ainda mais crítica e preocupante. Até o dia 11 de julho, ou seja, praticamente na metade do ano, foram transplantados apenas dez rins, sendo que destes, três eram de doadores falecidos e apenas dois deles eram maranhenses. Em relação à córnea, o quadro sofre uma leve melhora e até a mesma data, foram contabilizados 56 pacientes transplantados. No ano passado, até setembro, foram, ao todo, 108 transplantes realizados.

A coordenadora da Central Estadual de Transplantes, Silvana de Oliveira, lembra que a família é a agente autorizadora da doação de órgãos, em caso de falecimento do doador, e que não há um mecanismo na legislação brasileira que assegure o procedimento em caso da não autorização. Deste modo, é importante que as pessoas comuniquem aos familiares à respeito do desejo de doar órgãos. “A família, no processo de doação de órgãos , possui um papel fundamental nos dois extremos da relação. De um lado, são os que têm o poder de consentir a doação, com variáveis sentimentais, como a dor da perda, que, muitas vezes, dificulta a decisão. Do outro lado, a família que convive com o sofrimento de um parente que vive à espera de um órgão na busca por qualidade de vida”, conta.

NA FILA DE ESPERA A enfermeira que coordena a Central Estadual de Transplantes acredita que o reduzido número de doadores seja uma questão cultural, e que a maneira mais eficiente de naturalizá-la, prevendo o aumento do número de autorizações positivas de doação, é por meio da educação. A Sociedade Civil deve ter acesso às informações, no intuito de acabar com os mitos e preconceitos que se enraizaram ao longo da história dos transplantes no Brasil. O Hospital Universitário Presidente Dutra (HUUFMA) é o pioneiro no sistema de transplantes no Maranhão. Realiza cirurgias de transplante renal e de córnea. Os órgãos podem vir de qualquer lugar do Brasil, em casos de emergência. A Central Maranhense de Transplantes entra em contato com a Central Nacional, alocada em Brasília, que se comunica com outras Centrais Estaduais para localizar um órgão que possa ser disponibilizado para este paciente. A fila de espera respeita critérios como a urgência; os casos de pacientes que sofreram rejeição; os casos mais avançados que podem levar o paciente à cegueira ou a morte; assim como os pacientes menores de 16 anos. Portal

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RECUSA PELA DOAÇÃO DE ÓRGÃOS O aposentado, Frazão Serra, mostra as marcas deixadas pelo tratamento de hemodiálise que realizou por quase seis anos

O problema da recursa das famílias para doarem órgãos não é um problema exclusivo do Brasil. Estudos recentes sugerem que, na América Latina, a taxa de notificação de potenciais doadores é menor que 50 por milhão de habitantes por ano. Em países desenvolvidos, o índice é de 50 a 60 por milhão de população e a taxa de efetivação é de 20 a 40 doadores por milhão de habitantes, por ano. O ato da recusa para doar os órgãos de um familiar falecido está baseado em alguns preconceitos, como a falta de conhecimento. A não autorização do procedimento envolve, em alguns casos, crenças religiosas da família, e, em outros, a espera de um milagre’. Ou seja, a família não compreende a morte encefálica e acredita na reversão do quadro. Nesta perspectiva, o consentimento é interpretado pela família, como sendo o mesmo que assassinar, decretar ou autorizar a morte do parente – sendo, deste modo, o motivo da não autorização.

Estes trâmites que garantem a segurança e a conservação dos órgãos doados é também o que dificulta o andamento da fila de espera. Falta de celeridade que o aposentado Frazão Serra conhece bem. Ele passou quase seis anos na fila de espera, após um diagnóstico de insuficiência renal. Hoje, transplantado, ele mostra apenas as cicatrizes no braço, resultado do procedimento de hemodiálise que fez durante muitos anos. E são essas marcas que o ajudam a manter viva a história de superação que ele precisou vencer. Há cerca de dois anos, ele recebeu a ligação que tanto esperava. Havia um rim que poderia servir para transplante no Hospital Universitário da UFMA. “Antes de passar por essa situação, eu me denominava doador, mas não sabia de verdade a diferença que meu ato poderia fazer na vida de uma pessoa. Hoje, eu sei bem como é estar na fila de espera e ser contemplado com um verdadeiro presente”, expõe o aposentado ao lembrar dos momentos difíceis que deixou para trás e que foram superados graças à família de uma senhora de 56 anos, que decidiu que os seus rins poderiam ajudar outra pessoa a continuar a viver. De todo o processo do transplante que realizou, Frazão Serra lembra também da importância da família e pessoas próximas neste momento conturbado de sua vida. “O apoio que eu recebi da minha família me deu força, e ajudou-me a superar a dor de todo o processo que foi ficar na fila de espera. Assim como eles são importantes na hora de decidir à respeito da doação de um ente falecido, eles são fundamentais no processo antes e depois do transplante”, conta o aposentado.

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FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

o aposentado ressalta que o apoio da família foi fundamental para enfrentar a fila de espera pelo transplante. Na foto, Frazão Serra e sua esposa Elisabeth Serra

Este conhecimento pré-concebido mostra-se como um empecilho para a mudança de posicionamento da família. A assistente social da Central de Transplantes do Maranhão, Deusilene Viegas, esclarece, mediante a sua experiência, que, entre as maiores dúvidas que dificultam o processo de doação, está a incerteza da morte encefálica por parte da família, ou o medo da desfiguração física do familiar. “O diagnóstico de morte encefálica é assegurado pelo Conselho Federal de Medicina, e deve ser comprovado por três médicos diferentes, para que não restem dúvidas de sua veracidade. Quanto às possíveis deformações do corpo, é preciso lembrar que o transplante é uma cirurgia como outra qualquer e o doador poderá ser velado normalmente”, explica. Os doadores vivos podem doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula óssea e parte do pulmão. Enquanto isso, os doadores falecidos podem doar coração, pulmões, pâncreas, intestino, rins, córnea, veias, ossos e tendões. “São por meio destas doações que nos deparamos com exemplos de esperança todos os dias. Estas doações representam histórias de vitórias e a esperança para as pessoas que estão na fila de espera”, relata a assistente social, Deusilene Viegas.


FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

Cultura

GASTRONOMIA TRADICIONAL DE ALCÂNTARA Pesquisa realça potencial do Doce de Espécie enquanto elemento da culinária regional

Por Sansão Hortegal

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oco ralado, açúcar, manteiga, ovo, cravinho, trigo e uma pitada de sal. Ingredientes que constituem parte da identidade culinária da cidade de Alcântara. O município maranhense que é conhecido pelo seu conjunto arquitetônico colonial português, e pela realização de sua tradicional Festa do Divino Espírito Santo, possui atrativos saboreados não apenas pelos olhos, mas também pelo paladar de visitantes e moradores da região. Trata-se do Doce de Espécie, uma arte gastronômica construída ao longo do tempo por meio de uma produção pautada na tradição familiar. A observância deste alimento produzido em Alcântara, assim como os processos sociais e culturais que ladeiam a sua produção artesanal gerou curiosidade na então estudante do curso de hotelaria em 2013, Luana Isthael Carvalho, que na busca por entender a partir de um olhar sistemático a produção do Doce, propôs o desenvolvimento de um projeto de pesquisa para compreender o que ela acredita ser um ‘produto da história’. Meses depois, o resultado de seu estudo culminou em um trabalho inédito cujo testemunhos, entrevistas e apontamentos sobre o produto encontram-se distribuídos ao longo de 57 páginas. No seu trabalho de conclusão de curso, que Luana Isthael Carvalho intitulou de ‘Saberes e Fazeres da Gastronomia Tradicional: um estudo sobre as características histórico-culturais aplicadas à produção do Doce de Espécie no Município de Alcântara’, a turismóloga caracteriza o Doce como um elo entre

o passado e o presente da população de Alcântara. “A evolução humana é moldada culturalmente por meio de sua alimentação. Este processo começa desde a infância, momento em que os sujeitos estabelecem vínculos alimentares que, em muitos casos, carregam para toda a vida. E, com o doce de espécie o processo é semelhante”, expôs.

DA SENZALA PARA O MUNDO De acordo com os dados levantados durante a elaboração do seu trabalho, Luana Isthael Carvalho, corroborou a proposição de como o Doce de Espécie chegou a Alcântara, ou seja, de que forma o seu consumo e produção artesanal foi incorporada à cultura local. “Temos evidências de que o Doce de Espécie tem origem nos Açores, e chegou ao Maranhão por meio dos escravos que vieram para cá na época da colonização”, completou. Mas, a pergunta seria por que o Doce de Espécie deu tão certo, e hoje se apresenta de forma tão marcante em Alcântara? A resposta para este questionamento, sem rodeios, são as circunstâncias por meio das quais essa afinidade se estabeleceu. Pelo menos é o que a pesquisadora aponta em seu estudo. Assim como outras tantas receitas culinárias que fazem parte de um catálogo de alimentos, hoje considerados tipicamente representantes da identidade brasileira, mas que tem origem em terras estrangeiras, o processo de colonização e conjugação da identidade no país ajudam a compreender o motivo do Doce de espécie ter caído no gosto popular. Segundo a pesquisa, a guloseima chega no Brasil como parte da carta culinária dos portugueses que aportaram nestas terras, e passaram a produzir o produto nas chamadas Portal

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Casas Grandes, onde moraDona Zoralda que é uma das organizadoras da vam os senhores e seus paFesta do Divino Espirito rentes. Nas cozinhas das CaSanto, em Alcântara, sas Grandes, o ofício do prevê o Doce como um elemento típico da paro dos alimentos era resculinária local ponsabilidade de escravas, a quem chamavam de sinhás. Por este motivo, essas sinhás foram as responsáveis por introduzir novos ingredientes à receita do Doce de Espécie. “A receita podia até ser das senhoras portuguesas, mas a produção e os modos de fazer eram das escravas, de referência cultural, idenque realizavam adaptações tificamos a Festa do Divino na receita original, conforme Espírito Santo”, enfatizou. Isto a disponibilidade dos inacontece pois a política de pagredientes. E, em Alcântara, trimônio imaterial instituída esse Doce de Espécie ganha pelo decreto Nº 3.555 do ano evidência, principalmente de 2000, e que cria o Programa pela sua distribuição gratuiNacional de Patrimônio Imata e profusão no período da terial, não trabalha a questão Festa do Divino”. da comida em si, ou seja, não A compreensão a resexiste nenhuma comida no peito de que forma o Doce Brasil que tenha sido patrimode Espécie foi incorporado nializada. “O que ilustra essa à cultura brasileira, mais essituação é o acarajé na Bahia, pecificamente em Alcântara, que ao contrário do que muipassou a carregar consigo o fato de associar divertimento e tos imaginam, não é patrimonializado. O que na verdade é mesas fartas e unindo o sagrado e o profano, permitindo com registrado é o modo de fazer, ou seja, o ofício das baianas que que Luana Isthael Carvalho desse prosseguimento ao seu esproduzem o acarajé”, explicou Kátia Bogea. “O doce é apenas tudo. No segundo momento de sua pesquisa, ela realizou avaum dos componentes da festa. Nós estamos trabalhando no liação microbiótica do produto comercializado no município sentido de vir a instituir o inventário da Festa do Divino, para maranhense. Sua intenção foi analisar, desta vez, a qualidade pedir o registro da festa, e não do doce”, comentou a superinsanitária do alimento produzido de modo artesanal. Para isso, tendente do IPHAN. ela submeteu amostras do Doce ao trabalho laboratorial da Neste contexto da ausência de uma política capaz de equipe do Departamento de Tecnologia Química – Programa salvaguardar o Doce, Luana Istael Carvalho reforçou que a Controle de Qualidade de Alimentos e Água. Ao final da avasua preservação depende do incentivo aos produtores locais, liação, o resultado apresentou bons níveis do ponto de vista de uma política pública e privada de valorização dos sabede segurança alimentar, respeitando a resolução da Agência res e fazeres tradicionais do doce de espécie e do interesse Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. dos jovens pela manutenção da tradição cultural quanto ao Essas pontuações e descobertas realçaram o potencial do saber-fazer aplicado ao Doce. “É sem dúvidas uma iguaria Doce de Espécie, e o debate acerca de sua proteção enquanto que sustenta a cultura alcantarense, por meio de tradições e patrimônio cultural. Isto por que, ações desta natureza tem práticas que envolvem este alimento”, concluiu a pesquisasido cada vez mais debatidas no cenário brasileiro. No Maradora sobre a importância de proteger os modos de produção nhão, esta política voltada à patrimonialização tem sido um do Doce de Espécie. desafio enfrentado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional do Maranhão (IPHAN-MA). No caso do Doce de Espécie como uma prática cultural da cidade de Luana Isthael Carvalho Alcântara existe uma lacuna quando o assunto é a sua É bacharel em Hotelaria pela Universidade patrimonialização. “As novas famílias têm deixado de Federal do Maranhão. Defendeu a transmitir para os seus filhos os costumes das relações sua monografia em 2014, que teve como tema "Saberes e Fazeres do entre os parentes, os rituais das datas comemorativas, as 'Doce de Espécie' do município de rotinas do dia a dia, as receitas da família, isto é, os valoAlcântara". Desenvolveu a pesquisa res construídos por gerações”, afirmou a pesquisadora. sob a orientação da professora do A superintendente do Iphan, Kátia Bogea explicou Departamento de Turismo e Hotelaria, que não há um registro preciso sobre o Doce de Espécie. Elaine Cristina Silva Fernandes. “O que existe é um inventário das referências culturais do município de Alcântara, e dentro desse inventário nacional

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Inovação

CERÂMICA ARTESANAL ENVOLVIDA COM

PROCEDIMENTOS CIENTÍFICOS A produção em cerâmica maranhense é o foco da pesquisa que incentiva a inovação neste meio

Por Arlan Azevedo

Em que ponto arte e utilidade se encontram? A resposta para a pergunta é a solução de

um problema que ceramistas maranhenses enfrentam, e que um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) encontrou como forma de resolução sem precisar ir muito longe para respondê-la. Utilizando as peças em cerâmicas produzidas em um dos polos ceramistas do Estado, uma equipe de alunos do curso de Design, coordenados pela professora Luciana Caracas, descobriu que inovar por meio da resignificação de desenhos, atribuindo um toque de arte à usabilidade nas peças feitas de cerâmica, pode ser a solução para atrair o público consumidor. No Maranhão, a atividade ceramista, que é um saber popular, está centralizada em dois polos do segmento no Estado. Um fica no município de Rosário – a 70 quilômetros da capital maranhense; e o outro em São José de Ribamar, localidade que compõe a região metropolitana de São Luís. São nesses lugares que os pesquisadores do curso de Design encontram base para desenvolver os seus estudos. Ao perceber a necessidade, tanto de consumo quanto de produção de material cerâmico no mercado local envolvendo a utilidade e a arte, a equipe do projeto Produto Cerâmico no Maranhão iniciou uma pesquisa para a produção de luminárias envolvendo a arte maranhense. Um ano depois, com a ideia do projeto finalmente concretizada, o resultado é um experimento capaz de comprovar que o encontro entre sustentabilidade, design, utilidade e arte, inspirada em traços endógenos da cultura local, pode ser o grande diferencial no mercado ceramista local, alavancando a venda dos produtos desta natureza que hoje mantém os pontos de distribuição em São Luís.

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O interessante do projeto é poder aplicar o conhecimento teórico, pesquisar

em campo, desenvolver o produto e analisar os problemas que surgem durante o processo, pensando soluções para eles, o que ajuda não só na formação profissional, como também na formação pessoal

Estudante de Design, Pedro Rocha

FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

Coordenados pela professora luciana caracas, o grupo de pesquisa em cerâmica inova na produção de cerâmica

SUSTENTABILIDADE NA PRODUÇÃO Para fundamentar tanto a proposta quanto a aplicabilidade dos materiais para a produção das cerâmicas, os pesquisadores do projeto de pesquisa da UFMA buscaram conhecer primeiro o mercado ceramista; como os artesãos estavam organizados e como as suas peças são produzidas. A partir desse estudo, e do contato com os produtores, a equipe obteve informações sobre a atual situação deste segmento no Estado, e conheceram os materiais mais acessíveis para a fabricação de produtos cerâmicos, o que permitiu a equipe inovar o processo de produção sem aumentar os custos para o artesão, ou para o cliente. “No começo da pesquisa, traçamos alguns requisitos que as peças deveriam carregar consigo. Um deles foi que nossas produções tinham que ser feitas com argila local, por ser ecologicamente correto, diminuir a logística e valorizar a região. Também definimos que seria usada uma forma de trabalhar que fosse passível de ser absolvida por qualquer artesão, com poucos ou muitos equipamentos”, justifica a coordenadora do projeto Produto Cerâmico no Maranhão, Luciana Caracas. Durante seu estudo, a equipe do projeto conseguiu aproveitar a argila encontrada no município de Rosário – material comumente descartado pelos artesãos da região durante o processo de fabricação da cerâmica. Até agora, o projeto já produziu três luminárias feitas de raspas de torno, linhas e alumínio – materiais de fácil acesso a população maranhense. O processo de produção detalhado começa com a criação de moldes que servem como formas para a transformação e argila. Em seguida, ocorre no início da secagem das peças em forno próprio para a atividade que fica no Núcleo de Design Cerâmico, no Centro de Ciências Exatas da UFMA. Nas altas temperaturas deste forno, que pode chegar a mais de mil graus, as peças são cozidas e finalmente vitrificadas.

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INSPIRAÇÃO QUE LEVA A MARCA DA CULTURA LOCAL Com as peças forjadas no forno, os pesquisadores realizam a montagem dos produtos, neste caso das luminárias, que para dar sustentação eles utilizam linhas de lã e peças de material alumínio. Entretanto não é o modo de confecção ou acabamento que garante o potencial do projeto de pesquisa da Universidade, já que na perspectiva técnica, os procedimentos adotados não carregam exclusividade. É na ‘contação’ de histórias que está de fato a solução que os ceramistas tanto almejavam. Ao entrar em contato com os artesãos e com a cidade de São José de Ribamar, o estudante Pedro Rocha, propôs produzir peças com inspiração na Igreja de São José de Ribamar - Santuário que leva o mesmo nome da cidade, e que homenageia o santo Padroeiro do Estado. São as formas das peças de azulejo que estampam as peças em cerâmica do projeto Produto Cerâmico no Maranhão, que para atingir esse resultado, experimentou texturas e relevos a partir de uma gama de materiais para montagem de peças, sempre pensando na inovação para a melhoria da produção. Nesse caso, a do polo de São José de Ribamar. O projeto de pesquisa completa um ano de existência em agosto, e o objetivo agora é envolver os próprios ceramistas dos polos, que poderão se apropriar do conhecimento e técnicas pelos pesquisadores. Para o bolsista, Pedro Rocha, “o interessante do projeto é poder aplicar o conhecimento teórico, pesquisar em campo, desenvolver o produto e analisar os problemas que surgem durante o processo, pensando soluções para eles, o que ajuda não só na formação profissional, como também na formação pessoal”, conclui.

Luciana Bugarin Caracas É designer de produtos e de interiores. Tem graduação em Desenho Industrial pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA), e mestrado em Desenvolvimento Urbano pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Hoje é professora do Departamento de Desenho e Tecnologia da UFMA, onde desenvolve ações de ensino, pesquisa e extensão relacionadas a História do Design, Design de Produto, Produtos em Cerâmica e Artesanato.

Pedro Rocha É estudante do curso de Design da Universidade Federal do Maranhão, e trabalha como bolsista no Núcleo de Cerâmica da mesma Instituição.

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Saúde

FOTO: LUÍS FÉLIX ROCHA

CÁRIE NA INFÂNCIA

Doenças que acometem os dentes das crianças revelam deficiências, e podem indicar que algo vai mal na saúde geral dos pequenos Por Rosana Oliveira

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les começam a ‘sair’ logo nos primeiros meses de vida, e até aos 12 anos, os dentes provisórios serão substituídos por aqueles ditos permanentes. Entretanto, antes que esta substituição aconteça, os dentes precisam de cuidados que não se restringem somente à prática correta de higiene bucal, mas também da manutenção de marcadores nutricionais dentro de uma faixa adequada. É por meio desta constatação, e frente ao elevado número de casos identificados de cárie precoce, que duas professoras da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Cecília Cláudia Ribeiro e Elisabete Lima Costa propuseram desenvolver um projeto de pesquisa e extensão em forma de atendimento e atenção odontológica, voltada exclusivamente aos pequenos sob duas frentes de atuação. Após a conclusão dos seus primeiros estudos na área, elas afirmaram que os casos de cárie precoce revelam que não é só a saúde da boca que vai mal, mas o desenvolvimento da criança que pode estar comprometido.

SAÚDE TOTAL DE CRIANÇAS DEPENDE DA INGESTÃO DE NUTRIENTES Baixo peso, estrutura física em desacordo com a idade, carência em Ferro, Albumina e Zinco. Este é o principal perfil das crianças atendidas pela equipe da Clínica Infantil da UFMA. Também conhecida como Clínica do Bebê, o consultório, que abre suas portas e atende à comunidade

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uma vez por semana, vem contribuindo para a formação de profissionais nesta área específica, e para a redução da incidência de casos de cárie precoce no Estado. E, o mais importante, vem ajudando a compreender que o desenvolvimento dessas crianças, sem a devida atenção, pode estar seriamente comprometido. Na Clínica do Bebê, a professora Cecília Cláudia Ribeiro e estudantes de Odontologia da UFMA atendem crianças de até cinco anos de idade, e realizam o levantamento, acompanhamento e tratamento de casos de cárie infantil que predominam na primeira idade dos pequenos. O atendimento gratuito à comunidade busca prestar atenção à demanda gerada pela falta de acesso aos serviços de profissionais de saúde bucal que a população, não somente do Maranhão, mas do Brasil enfrenta. “Em 2010, estudos recentes mostraram que 80 por cento das lesões de cárie não foram tratadas justamente por conta desta dificuldade de acesso ao tratamento adequado. Em relação aos aspectos epidemiológicos, a doença da cárie precoce é um sério problema de Saúde Pública, sendo que a sua prevalência é considerada elevada, principalmente nas classes de me-


É comum o uso de mamadeiras com líquidos açucarados, dadas principalmente à noite, sendo que o bebê, logo em seguida, adormece sem higiene bucal. Assim, dependendo da frequência das mamadas e da falta de limpeza dos dentes, o hábito pode culminar na proliferação de cárie Pontuou a coordenadora da Clínica do Bebê, Cecília Cláudia Ribeiro

Na Clínica do Bebê, casos de cárie precoce são tratados de forma gratuita

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nor poder econômico, e esse quadro torna-se ainda mais crítico quando se trata de atendimento por um cirurgião dentista às crianças nesta faixa etária de cinco anos de idade”, expôs a pesquisadora da UFMA, Cecília Cláudia Ribeiro. A pesquisadora não dispensa o fato de que o consumo de açúcares por crianças aumentou nas últimas décadas, e a sua associação diária a alimentação de crianças precisa de prevenção desde a amamentação. “É comum o uso de mamadeiras com líquidos açucarados, dadas principalmente à noite, sendo que o bebê, logo em seguida, adormece, sem higiene bucal. Assim, dependendo da frequência das mamadas e da falta de limpeza dos dentes após as mesmas, o hábito pode culminar na proliferação de cáries”, pontuou. Para combater o problema, a melhor sugestão é a amamentação de crianças com o próprio leite materno, que possui propriedades que agem como protetores da cárie, ao contrário do leite industrializado.

BINÔMIO MÃE-FILHO Quando os pais não levam em conta esse consumo de açúcares, assim como os cuidados que precisam ter, bactérias entram em cena, metabolizando as substâncias nas bocas das crianças. Esta perspectiva de binômio mãe-filho, que envolve os seus hábitos de saúde é o foco das atividades de pesquisa e extensão da professora da UFMA, Elisabete Lima Costa. Com uma equipe de alunos da Universidade, ela leva informação às creches e maternidades da capital maranhense, onde busca sensibilizar o público-alvo sobre a importância do cuidado com a boca das crianças. Para entender de forma bem simples o trabalho da professora, sua proposta está pautada em promover a reeducação a respeito dos hábitos alimentares. Por exemplo, a transmissão da cárie ao filho por meio do contato íntimo do sopro da comida, beijo na boca da criança, falta de limpeza na chupeta, assim como o oferecimento de outros alimentos ricos em sacarose. O projeto existe há décadas, e teve início com um grupo de adolescentes gestantes na maternidade Marly Sarney. Em seguida, passou a ser direcionado às creches comunitárias e da rede municipal, assim como no Hospital Paulo Ramos, onde a professora e os acadêmicos que participaram do projeto levantaram dados sobre a saúde bucal de mães e crianças; participaram de palestras educativas semanalmente, utilizando recursos motivacionais tais como filmes, cartazes, música e desenhos para pintura em associação com a técnica direta (escovação dentária e aplicação tópica de flúor). Atualmente, o projeto mantém como principal atividade a instrumentalização de um estudo de corte retrospectivo com um grupo de 600 crianças de 30 a 71 meses de idade matriculadas em creches e escolas de São Luís, acompanhadas de suas mães. As mães res-

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ponderam um questionário contendo dados de identificação socioeconômico e demográfico, inquérito alimentar e variáveis de saúde em mãe e filho e membros da família, que agora passam por exames clínicos de cavidade bucal para a aferição de lesões de cárie, índice de placa visível (IPV), índice de sangramento gengival (ISG) e análise microbiológica da saliva. Para a professora, estes estudos tem permitido atuar no centro do processo de reeducação “A informação é a base fundamental para o processo. As mães aceitam o trabalho da equipe do projeto, onde os alunos de odontologia interagem na motivação; as crianças são acompanhadas desde o berçário e a mãe não é conhecedora dessa doença. A criança é dependente da mãe em tudo e os hábitos adquiridos pela criança estão relacionados com os hábitos da mãe, ainda que o conhecimento e a experiência de saúde da mãe possam influenciar no comportamento da sua saúde e da saúde de seu filho.” Os resultados tabulados da pesquisa serviram de base para o desenvolvimento de ações conjuntas a serem aplicadas no cotidiano dos participantes, para avaliar a similaridade da doença no binômio mãe-filho e para implementação de medidas preventivas, incluindo políticas públicas que revertam o quadro de cárie precoce sem tratamento no Maranhão.

Cecília Cláudia Ribeiro Possui graduação em Odontologia pela Universidade Federal do Maranhão. É mestre em Odontopediatria pela Universidade Federal de Santa Catarina, e tem doutorado em Odontologia na área de Cariologia pela Universidade Estadual de Campinas. Atualmente é professora da Universidade Federal do Maranhão, onde atua na graduação e na Pós-Graduação.

Elizabeth Lima Costa A pesquisadora tem mestrado em Odontologia Social e Preventiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. É especialista em Odontologia em Saúde Coletiva em Odontopediatria (UFMA); Educação em Saúde Pública (UNAERP) e Planejamento Educacional (UNIVERSO). Realiza trabalhos técnicos ao Governo do Maranhão, e é professora da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).


UFMA APOSTA NA VOCAÇÃO PESQUEIRA DA BAIXADA

A Universidade iniciou o processo de instalação de um curso de Engenharia de pesca em Cururupu, por meio do qual espera beneficiar cerca de 270 mil habitantes da região

Por Roberth Meireles

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desenvolvimento de estudos e inserção de novas e mais modernas técnicas, que irão melhorar a produção e comercialização de pescados e mariscos. Com a proposta de implantação do curso já aprovada e liberada pelo Ministério da Educação (MEC), o curso da Universidade funcionará no antigo Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente, CAIC, do município de Cururupu, e deve ter suas atividades iniciadas no segundo semestre do próximo ano. “A região onde a cidade de Cururupu está localizada é atualmente responsável por 70 por cento do pescado comercializado no Maranhão. Frente este quadro, a Universidade busca propor por meio deste curso a formação acadêmica em favor da população, aperfeiçoando a atividade pesqueira e estimulando a organização produtiva, isso sempre respeitando a tradição local”, expôs o reitor da UFMA, Natalino Salgado Filho.

FOTO: SANSÃO HORTEGAL

ais uma cidade da Baixada Maranhense receberá as atividades da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Agora é a vez de Cururupu, município caracterizado pela intensa produtividade pesqueira, onde passará a funcionar em 2015 o curso de Engenharia de pesca. A escolha desta graduação no município faz parte do processo de expansão desenvolvido pela UFMA, visando, primordialmente, atender às necessidades da população maranhense, conforme as suas vocações regionais. O novo curso da Instituição irá beneficiar mais de 270 habitantes de dez municípios que compõem a Baixada Maranhense e que formam o litoral ocidental do Estado. Para o coordenador do curso de Engenharia de pesca, Alexandre Vitor de Lima, a implantação da graduação será uma oportunidade para que o segmento pesqueiro seja qualificado por meio do

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A Universidade que Cresce com Inovação e Inclusão Social

Uma Universidade que atende a sua vocação por meio da Inovação no Ensino, na Pesquisa e na Extensão 54

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