http://enfoquevilabras.blogspot.com CARINA MERSONI
vilabrás outubro / novembro
2010
distribuição gratuita edição 124
Correspondência Unificação de rua embaralha endereços > Página 3
Realidade Sem creches, mães não podem trabalhar > Página 6
Beleza Moda e economia andam juntas
A vida em > Página 11
lilás > Página 10
Na casa de Marli Kurtz tudo tem a mesma cor, fruto de uma paixão que já ultrapassa duas décadas
02 EXPEDIENTE Universidade do Vale do Rio dos Sinos Av. Unisinos, 950 Bairro Cristo Rei São Leopoldo/RS Reitor Marcelo Aquino Vice-reitor José Ivo Follmann Pró-reitor Acadêmico Pedro Gilberto Gomes Diretor da Unidade de Graduação Gustavo Borba
São Leopoldo, outubro/novembro de 2010
Da Redação Ao descer do ônibus que tem como destino final a Vila Brás, nenhum dos repórteres imagina o que pode acontecer dali para frente. É preciso encontrar uma pauta interessante em tempo hábil para que ela possa ser apurada da forma como qualquer estudante de jornalismo é instruído – ouvindo todas as partes envolvidas, buscando informar sem mostrar-se excessivamente parcial, esclarecendo qualquer dúvida que possa surgir
durante o depoimento de uma fonte. Nenhum dos estudantes imagina, ao ver a avenida principal pelas janelas do ônibus, o turbilhão de emoções que nos atinge tão logo começamos a caminhar pelas casas, becos e praças da Brás. É então que, ao descer do ônibus com caneta e bloco de notas à mão, nos deparamos com novas realidades. Encontramos pessoas que esperam por um jornal, uma conversa, uma fotografia. Esperam porque
querem ser vistas e ouvidas. Esperam porque querem mostrar que estão ali. O Enfoque é uma janela que apresenta a alegria de quem está aprendendo a ler e a tristeza dos que sofrem com alagamentos tão logo começa a chover. O Enfoque é um retrato da Vila Brás e, mais do que isso, das pessoas que ajudam a construir a Brás. O Enfoque é um livro de histórias. Histórias de gente que sempre tem algo a dizer – e a ensinar.
Coordenador do Curso Comunicação Social – Jornalismo Edelberto Behs
de
vilabrás Jornal-laboratório produzido por alunos das disciplinas de Redação Experimental em Jornal e Fotojornalismo do Curso de Comunicação Social Jornalismo da Unisinos.
Em péssimas condições Trabalhadores que moram na Vila Leão reclamam da situação crítica da Avenida 31, que piora em épocas de chuva
FALE CONOSCO! E-mail: enfoquevilabras @gmail.com Edição: Caroline Raupp Eduardo Herrmann Fernanda Herrera Frederico Dilly Leandro Vignoli Lílian Stein (editora-chefe) Luan Iglesias Manuela Teixeira Rafaela Kley Roberta Roth Thaís Jobim Vanessa Wagner
LEANDRO MACIEL
LEANDRO MACIEL
Telefone: (51) 3590.8466
Orientação: Eduardo Veras Flávio Dutra Nikão Duarte Monitoria: Eduardo Nozari
Fotografia: Ana Luiza Melo Ana Paula Figueiredo André Ávila Bruna Schuch Carina Mersoni Débora Soilo Fabiana Eleonora Gabriel Gabardo Harrison Andrade João Pedro Zandonai Leandro Maciel Luana Elias Magda Marques Pedro Barbosa Priscila Pilletti Ramiro Furquim Suelen Dal’Agnol Tamires Gomes Thayna Candido Arte: Agência Experimental de Comunicação (Agexcom) Projeto gráfico: André Seewald Gabriela Schuch Diagramação: Gabriela Schuch Marcelo Grisa Supervisão técnica: Marcelo Garcia
O que parece um banhado é, na verdade, a Avenida 31 Eduardo herrmann
N
a Vila Leão, vizinha à Vila Brás, os moradores do loteamento viabilizado pela Cooperativa Habitacional passam por dificuldades em seu cotidiano. Residentes do que – ironicamente ou não – é chamado de Avenida 31, Vilson Nunes e o casal Volnei e Cristiane Dorneles se queixam das péssimas
condições da via onde moram. “É horrível. Em dia de chuva, nem a pé dá para caminhar. E a água que fica parada aqui vem do esgoto”, se queixa Vilson, que sai todo dia para trabalhar de carro, a muito custo. Já Volnei vai para o trabalho de moto, pois seu automóvel até estragou devido à ruim situação da rua. Outro problema crítico é a falta de segurança. Cristiane conta que foi assaltada e
agredida recentemente dentro de sua própria casa, e a polícia sequer chega ao local de carro, por causa dos problemas de acesso. A justificativa da Cooperativa, segundo os moradores, é que há muita inadimplência por parte de alguns associados, que não honram os valores devidos para o financiamento do terreno. Por isso, as providências não são tomadas.
Jogue o lixo no lixo Caroline Raupp Ao caminhar pela Avenida Leopoldo Wasun é impossível não notar a quantidade de lixo jogado no chão. A falta de locais apropriados faz com que papéis, embalagens plásticas, copos e até mesmo garrafas sejam jogados direto na rua, ficando a cargo dos próprios moradores a tarefa de manter limpos suas calçadas e arredores de suas casas. Quem mais sofre com este problema são os comerciantes, que tentam manter a limpeza para não afastar os clientes. Bernardina de Oliveira, dona da Sorveteira Oliveira, reclama que é necessário varrer a
sujeira todos os dias e que, mesmo tendo lixeira no estabelecimento, muitos clientes não a utilizam. Não há lixeiras públicas, as poucas que se encontram ao longo da avenida são particulares, embora muitos moradores deixem de instalá-las em frente a suas casas e estabelecimentos tentando evitar outro problema, como explica dona Bernardina: “O pessoal coloca o lixo todo aberto, de qualquer jeito, os cachorros acabam revirando tudo e fazendo uma sujeira ainda maior”. É importante que mesmo sem uma estrutura adequada os moradores se conscientizem e façam a sua parte não jogando lixo no chão. Além da poluição
HARRISON ANDRADE
Reportagem: Adriano Carvalho André Ávila Hector Moraes Camila Nunes Caroline Raupp Cecília Medeiros Clarissa Figueiró Daniela Fanti Débora Soilo Eduardo Herrmann Ellen Mattilelo Fabrício Pretto Fernanda Herrera Guilherme Möller Gustavo Alencastro Gutiéri Sanchez Frederico Dilly Leandro Vignoli Priscina Rodrigues Liége Freitas Lilian Stein Luan Iglesias Luana Guimarães dos Reis Luciano Nunes Manuela Teixeira Priscila Carvalho Marco Rocha Matheus Cardoso Miriam Moura Paola Madeira Patrícia Oliveira Pedro Bicca Priscila Zigunovas Rafael Martins Rafaela Kley Roberta Roth Roberto Ferrari Rodrigo Rodrigues Rogério Bernardes Sabrina Schönardie Simone Núñez Stéfanie Telles Suélen Dal’Agnol Tarcísio Bertim Thaís Jobim Vanessa Wagner Vanessa Lopes
Embalagens se acumulam nas sarjetas visual, tal prática gera outros transtornos, como entupimento de bueiros e o surgimento de ratos e baratas, que podem ser evitados com um simples gesto.
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FOTOS Tamires Gomes
Claudemir de Melo Rangel (foto à esquerda) recebe a correspondência destinada ao vizinho Lucas Silva da Costa (à direita), e vice-versa
Duas casas, duas famílias e um mesmo endereço A recente unificação das Ruas 19 e R gera uma grande confusão na Rua das Magnólias M anuela T eixeira
C
laudemir de Melo Rangel e Lucas Silva da Costa são moradores da Rua das Magnólias, nº 90. Os dois não são parentes, não são amigos e tampouco moram na mesma casa, mas têm o mesmo endereço. O compartilhamento de dados é fruto da junção de duas ruas. Há cerca de dois anos, a Rua 19 e a Rua R, que atravessam a Av. Leopoldo Wasun, foram unificadas e ganharam o mesmo nome: Rua das Magnólias. A nova nomenclatura passou
a gerar transtorno para alguns moradores das três quadras que formam a rua, já que algumas das residências apresentam o mesmo número. Assim, mensalmente, Rangel e Costa têm as suas correspondências trocadas pelo Correio. A troca das faturas acaba levando ao pagamento atrasado de algumas contas, que acarretam juros. “Mas o pior é quando elas não chegam a lugar algum e tenho que ligar e solicitar a emissão da segunda via”, completa Rangel. É a filha dele, vizinha de Costa,
que faz a intermediação das faturas. Claudia Angélica também tem suas correspondências trocadas. “Eu ainda tenho sorte porque o terreno que tem o mesmo número da minha casa é também do meu pai. Mas mesmo assim é ruim, porque tem que ficar sempre perguntando o que já chegou”, conta. Rangel já levou a situação para a Associação de Bairros e para a Prefeitura Municipal, mas até agora o problema não parece estar perto de uma solução.
“Comunidade, Associação de Bairros e Prefeitura Municipal deveriam se unir e promover uma ação conjunta para renumerar as casas”, afirma o Diretor de Urbanismo da Secretaria Municipal de Planejamento, Ângelo Schnidt. Segundo ele, a exemplo de outras situações em loteamentos irregulares de São Leopoldo, um processo desses implica num trabalho de conscientização com os moradores, já que muitos são resistentes quanto à troca da numeração de suas residências.
Rua curiosa, problemas comuns G utiéri S anchez Uma rua igual a todas as outras na Brás, mas nem tanto. Quando a maioria tem o nome de flor, ela é a Rua 13. Possui um carro abandonado no meio dela. Uma quantidade enorme de gaiolas de pássaros em frente a algumas casas e uma família que tem sobrenome igual ao da vila. Morador da rua há sete anos, João Batista Brás vive junto com a esposa e dois de seus filhos na casa da frente. A outra filha, o genro e mais dois netos moram em uma outra casa nos
fundos do terreno. Perguntado sobre a origem de um carro modelo Chevrolet Caravan que está abandonado no meio da rua, ele responde com estranheza. “Sinceramente, até hoje eu não sei o que este carro faz aí”, responde. O problema é que não só curiosidades envolvem essa rua da Vila Brás. Há cerca de quatro anos, os moradores da Rua 13 comemoravam o fato do local finalmente ter recebido uma rede de esgoto. Dois anos depois, as coisas pareciam melhorar ainda com o calçamento da rua. A rede entupiu e, quando chove,
alguns problemas são enfrentados. Segundo João Brás, a rede não foi mais limpa e entupimento dos canos provoca mau cheiro na rua, além dos ralos e vasos de algumas residências transbordarem. A reclamação já foi feita ao Serviço Municipal de Águas e Esgoto (Semae) há mais de dois meses, e não foi realizada nenhuma limpeza nos dutos de esgoto. Procurado pela reportagem, o Semae respondeu por meio de sua assessoria de marketing, que serviços como a limpeza de rede de esgoto é feita através das solicitações com os
dados completos dos moradores e que nenhum pedido desta natureza foi encontrado referente à Rua 13. Outro problema encontrado na rua, como em muitas outras da Vila Brás, é a iluminação. À noite, João Brás fica preocupado com os filhos, que vêm pela via onde algumas poucas lâmpadas acendem ou funcionam. A Secretaria Municipal de Obras e Serviços de São Leopoldo é o órgão responsável pela iluminação e também foi avisada segundo ele. Até o fechamento da edição, nossa reportagem não obteve resposta da secretaria.
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A rua que virou lagoa Moradores reclamam da falta de pavimentação na Rua das Peônias de
Carvalho
A
pesar de se transformar em um verdadeiro canteiro de obras nos últimos anos, a Vila Brás possui pontos onde a infraestrutura disponibilizada aos moradores ainda não atende suas necessidades. É o caso da Rua das Peônias, onde os residentes sofrem com a ausência de calçamento. O principal motivo de insatisfação dos moradores se concentra nos efeitos desencadeados pelas chuvas. Mário Antônio Moraes, 40 anos, residente da casa nº 51, é enfático ao apontar as situações que vivencia. “Minha mulher e meus filhos ficam completamente embarrados quando saem de casa em dias de chuva. A rua vira uma verdadeira lagoa e isso nos causa muitos problemas”. Mário, que vive na Brás há 20 anos, também relata que, mesmo com as obras dos novos loteamentos nas
proximidades, a prefeitura não lembrou de pavimentar a Rua das Peônias: “Calçaram diversas ruas aqui perto e a nossa foi a única que ainda não foi beneficiada. Somos os esquecidos da Brás, pode anotar aí”. Outro morador prejudicado é José Cresta Severo, 35 anos, residente do nº 99, que alerta para a frequente passagem de carros e caminhões na rua. Segundo José, os motoristas não se preocupam com as poças e com os pedestres no local: “É uma vergonha. Dias atrás, deram um banho de lama na minha mãe”. A reportagem do Enfoque Vila Brás entrou em contato com a Secretaria de Habitação de São Leopoldo e apurou a situação da obra. Segundo o assessor João Henrique Dias, o entrave para a execução está na resolução de questões contratuais do financiamento: “Vamos providenciar a pavimentação. É a rua que falta para nós finalizarmos o nosso projeto
FABIANA ELEONORA
Adriano
na Brás. Fizemos a licitação, temos a empresa contratada e estamos dependendo de ajustes no contrato com a
Para Mário Moraes, os residentes da Rua das Peônias são os “esquecidos da Brás”
Caixa Econômica Federal. Por conta disso, ainda não podemos definir um prazo para o calçamento”.
Pracinha foi tomada pelo lixo O que começou com uma proposta de melhoria à vida dos moradores acabou se tornado um problema. Atualmente a pracinha da Vila Brás está completamente abandonada e sem nenhum tipo de manutenção. Para piorar a situação, o espaço virou depósito de lixo. Infelizmente, os entulhos armazenados na pracinha são oriundos dos próprios moradores. O espaço público foi construído há três anos. No local, era possível realizar diversas atividades físicas. A pracinha era frequentada por pessoas de diversas idades, pois, além de oferecer uma ampla área para caminhadas, foram instalados também brinquedos para as crianças, uma cancha de bocha, um campinho de futebol, bancos de descanso e plantadas árvores com o objetivo de proporcionar sombra aos
GABRIEL GABARDO
L uciano N unes
Brinquedos instalados na pracinha estão mal conservados frequentadores. Atualmente é possível ver o estado de abandono da pracinha: a cancha
de bocha já não existe mais, os bancos foram completamente destruídos, assim como os brinquedos
voltados ao público infantil. Segundo relatos recolhidos no local, durante a noite a pracinha tornou-
se o lugar predileto para dependentes químicos se reunirem, sendo eles também responsáveis pela depredação do espaço. Na sexta-feira (24), a Prefeitura de São Leopoldo disponibilizou dois caminhões para que fossem retirados os lixos da pracinha. O motivo é que no sábado (25), foi organizado um trabalho evangelista no espaço. Segundo o presidente da Associação de Moradores da Vila Brás, Claudemir Schutze, a prefeitura possui um calendário de limpeza para este tipo de espaço público. Porém, ressalta que é muito importante haver uma conscientização por parte da comunidade quanto ao lixo depositado no local. O presidente lembrou que a área já foi utilizada até para aulas de educação física da escola João Goulart e que no verão reunia muitos moradores, tornando-se assim um ponto de encontro.
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Casa própria de quem?
Problemas financeiros e falta de condições básicas fazem com que alguns moradores acabem vendendo seus imóveis André Ávila ANDRÉ ÁVILA
O
s atuais moradores do loteamento Vila Brás 3 estão convivendo de perto com problemas como falta de iluminação pública, pavimentação para as ruas e saneamento básico. Alguns já moram em suas casas há 10 meses e ainda sofrem com a falta de um projeto social para o lugar. Para o assessor de assuntos comunitários da Trensurb, Edson Ferreira dos Santos, há outro problema que se soma a todos esses fatores. “Nota-se que não há um projeto social efetivo para as famílias daqui e, com essa situação, junto com dificuldades financeiras delas, alguns moradores acabam vendendo as casas que ganham e voltam aos problemas anteriores”. Segundo Edson, há pessoas
Morador do Loteamento Vila Brás 3, Pedro Alves prefere ficar com a casa que ganhou
que trocam de casas umas com as outras, mas entre loteamentos diferentes, o que não há problema, pois não gera prejuízo ao Estado. Porém, algumas vendem para terceiros, que pagam valores quase simbólicos, e as famílias acabam voltando para a irregularidade e precariedade, muitas vezes para outras invasões, representando novos gastos para o Governo. Para Pedro Alves, 55 anos, morador da Vila Brás 3, já foi feita até mesmo uma oferta pela sua casa. “Umas semanas atrás, me ofereceram R$ 2 mil por essa casa, mas eu não quis. Dinheiro a gente precisa, claro. Mas sair daqui e ir pro meio do mato? Não, eu prefiro ficar e ir arrumando minha casinha aos poucos.”
Um lar para chamar de seu Tuane Cristine Martins Fernandes conheceu Wagner Lazarotto da Silva em outubro de 2006. Uma semana depois do primeiro beijo, os dois foram morar juntos. Da casa da mãe de Wagner para um pequeno quarto nos fundos do terreno, e depois para outra construção junto à casa da mãe de Tuane, não demorou muito tempo. Em meio a todas essas mudanças, um novo sonho do casal começou a tomar forma: ter a casa própria. “Imagino o dia em que vou poder dormir em um lugar que chamo de meu. A casa ainda está faltando, mas já tenho todos os móveis”, conta Tuane, orgulhosa. Aos 20 anos, a balconista da padaria Branquinho, na Avenida Leopoldo Wasun, pensa em ter o primeiro filho e garante que essa é a chance de lhe proporcionar mais conforto. “Vamos precisar de lugar para o berço e para os
ANA PAULA FIGUEIREDO
L ílian S tein
Tuane aguarda o sorteio de um financiamento, em dezembro, para começar a construir um novo lugar para morar brinquedos”, planeja. A jovem vê nos programas de financiamento a oportunidade de viver com a família na casa de seus
sonhos. Inscrita no projeto Minha Casa, Minha Vida, do governo federal, aguarda ansiosa o final do ano, para quando está previsto o sorteio dos primeiros
vencedores. “Ganhar seria a maior alegria da minha vida”, emociona-se. Um lugar para guardar lembranças, comemorar conquistas e planejar o
futuro. Seja participando de financiamentos ou economizando durante o mês, o desejo se repete: todos sonham com a conquista da casa própria.
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Falta creche na Brás 3
Sem ter onde deixar filhos, mulheres ficam incapacitadas de trabalhar ou dependem das vizinhas ANA PAULA FIGUEIREDO
Marli largou o trabalho de empregada doméstica para cuidar da filha, hoje com 11 meses Marco Rocha
D
esde que chegaram à Vila Brás há cerca de seis meses, os moradores da Brás 3 enfrentam um problema: a falta de creches.
As duas creches da região já estão lotadas e não podem receber os filhos dos novos moradores. A consequência disso é que as mães dessas crianças ficam incapacitadas de
trabalhar por não terem onde deixar as crianças quando estão fora de casa. É o caso de Marli da Silva, moradora da Brás 3. Mãe de uma menina de 11 meses, fazia serviços
Matheus Cardoso TAMIRES GOMES
Rodrigo Rodrigues
Barulho alto incomoda moradores da Rua 3 Da única casa com rádio ligado que se ouve de longe, Paulo Alves diz que não sabe de reclamações e acha que “cada um tem que cuidar da sua vida”. Morador da Rua 4, afirma que cumpre sua parte e desliga o som antes das 22h, não perturbando nenhum vizinho. Em São Leopoldo, a Lei 6463/2007 regulamenta a emissão de sons e ruídos. De acordo com a Secretaria Municipal do
afirma. Como não há vagas nas creches, muitas mães contam com a boa vontade de vizinhos e familiares. Em outros casos, pagam para conhecidas cuidarem das crianças.
Atenção à saúde
O som que perturba No Loteamento Brás 3, há quem reclame do som alto depois das 22h. O morador Clair Dutra, há seis meses no local, é quem denuncia: “Às vezes vara a madrugada. Se amanhece com a música nas alturas”, reclama. “Tem gente idosa, tem trabalhador. Aí na hora de descansar, ninguém consegue dormir.” Dutra não é o único a reclamar. Outros moradores já fizeram queixas para a empresa Trensurb, uma das responsáveis pela construção do loteamento. “A resposta que tivemos é que tem que chamar a polícia nessas situações”, relata Simone Escobar, moradora da Rua 3 do loteamento. Ela mesma comenta que já houve brigas entre vizinhos em razão do barulho intenso à noite. “Parece até que teve briga de facão nesses dias”, lembra.
domésticos em casas de família, mas teve que parar de trabalhar para ficar com a filha, pois não consegue vaga nas creches da vila. “Se não tenho onde deixar ela, não tenho como trabalhar”,
Meio Ambiente (Semmam), são poucas as reclamações de som alto em áreas residenciais. “O comum são denúncias contra indústrias e estabelecimentos comerciais”, diz o diretor de fiscalização ambiental, Luiz Henrique Scharlau, que complementa: “Se houver queixa entre vizinhos, averiguamos. Mas normalmente são casos para se chamar a Guarda Municipal ou a Brigada Militar”.
Passados quase três anos da inauguração do Posto de Saúde, Unidade Básica de Atendimento (UBA), a comunidade volta a queixarse de problemas. Por falta de atendimento e serviço mal qualificado, moradores ainda buscam acolhimento para seus enfermos em outros postos de saúde de São Leopoldo ou de municípios vizinhos. Segundo alguns habitantes do bairro, o posto, que deveria funcionar das 8h às 17h, normalmente acaba tendo seu expediente encerrado perto das 16h. O atendimento oferecido pela UBA é realizado por meio da distribuição de senhas, realizadas diariamente pela manhã. Contudo, como conta Adão Pereira, 64 anos, residente da Brás há 23 anos, o posto distribui aos moradores somente 10 senhas diárias por médico. “Não há nenhum especialista lá, só contamos com clínicos gerais
e dentistas. É muito pequeno o número de senhas e os agendamentos de consultas demoram mais de um mês”, relata. Já para Ilza Terezinha de Souza, 42 anos, vinda de Esteio para a Brás há sete anos, o maior problema é a demora e a dificuldade de conseguir atendimento. “Eu já desisti de procurar esse nosso posto. Agora, quando tenho que medicar meus filhos, faço por conta e se é grave vou atrás de outro posto”, afirma, com indignação. Para tentar solucionar esses problemas, Luís Sérgio Rodrigues, morador da Rua 23, uniu-se a outras pessoas da comunidade na iniciativa de realizar um abaixoassinado pedindo mais um posto de saúde. Enquanto esperam uma resposta dos órgãos responsáveis, os moradores seguem suas vidas e continuam em busca desse direito que é de todos e do Estado.
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Escolha sua tatuagem Primeiro tatuador da Vila Brás tem um mostruário próprio com 20 opções de desenho
J
eremias Martins, 27 anos, morador há cinco da Vila Brás, viu na arte da tatuagem uma profissão. A opção de desenhar no corpo era conceituada em sua origem como forma de expressão da personalidade ou de identificação dos indivíduos de uma mesma comunidade. Chegou ao Brasil em meados da década de 1960. Hoje, a tattoo é uma das formas de “modificação do corpo” mais conhecidas e cultuadas em todo o mundo. Seu significado não mudou muito: continua sendo a maneira com que as pessoas expressam suas ideias e sentimentos. No ponto comercial instalado logo no início da Avenida Leopoldo Wasun há cerca de cinco meses, o tatuador já conquistou clientela na Brás. Ao ser questionado sobre o que as pessoas visam ao lhe procurarem, ele logo dispara: “Em
primeiro lugar é a qualidade e a segurança no trabalho. Todo meu material é descartável e esterilizado”. Com atendimento de segunda a sábado, Jeremias trabalha inclusive a domicílio e tatua apenas maiores de 18 anos. “É importante estar bem ciente da escolha, para não haver arrependimento depois. A maturidade é indispensável”, completa. Com uma média de 20 desenhos próprios em seu mostruário, os mais demandados são as borboletas, iniciais de nomes e escritos em mandarim. O público jovem e mulheres são os que mais lhe procuram para tatuar. Martins acha interessante quando alguém mais maduro busca pelo trabalho. “As pessoas com mais idade normalmente tatuam o nome dos filhos, datas importantes, algo que se identifique com alguma lembrança”, conclui.
DÉBORA SOLIO
Débora Soilo
Para os interessados no trabalho do tatuador Jeremias, os contatos são: (51) 9300-5675 (51) 9804-7116.
Censo 2010 enfrenta dificuldades Stéfanie Telles O 12º Censo Demográfico iniciou sua coleta de dados no Rio Grande do Sul com atraso. O motivo foi a demora na entrega dos coletes a serem utilizados pelos recenseadores. Previsto para iniciar dia 1º de agosto e se estender até o dia 30 de outubro, o Censo na Vila Brás sofrerá atraso não apenas pelos dias perdidos, mas também porque os recenseadores estão tendo dificuldades em encontrar os moradores em casa. Identificada por colete e crachá do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e portando um computador de mão para auxiliar no registro das informações,
a recenseadora Tamara Primaz, de 28 anos, relata os problemas enfrentados na Vila: “Raramente encontro as pessoas em casa, e, além disso, a numeração das residências é precária. Algumas casas simplesmente não possuem número, isso atrasa muito o nosso trabalho”. Contudo, nem sempre as casas fechadas são o maior problema. Tamara, que também é moradora da Brás, conta que, de cada dez pessoas abordadas para a realização do Censo, uma sempre acaba sendo hostil, dificultando seu trabalho. “O mais complicado é a maneira como somos recebidos. Chegamos animados e dispostos, mas há pessoas que nos xingam. Dá vontade de não voltar mais
lá”, desabafa ela. A moradora Maria Macedo Santos, que reside há 20 anos na Avenida Leopoldo Wasun, afirma que não se importa com a abordagem da recenseadora. “Acho importante o trabalho do Censo. E não é nenhum incômodo dar atenção a eles, é só alguns minutinhos”, comenta Maria. Tamara diz que o lado positivo de ser recenseadora é exatamente o contato com as pessoas que a recebem bem, como Maria. A atenção desses moradores compensa as dificuldades da profissão. “Conheço outras pessoas, faço amizades, sem falar que tem gente que abre a casa e oferece até café”, destaca a recenseadora.
A casa de tatuagem de Jeremias oferece diversas opções de imagens para quem quer levar no corpo uma marca que vai ficar para sempre
Porque hoje é sábado Frederico Dilly É manhã de sábado e Alexandre Hermes, de 30 anos, mede o tamanho da cerca que irá construir em frente à casa recém comprada. Seu pai, Ari, de 69 anos, ajuda a remover a terra que servirá de base para algumas estacas. É esta a tarefa do dia: trabalhar. O sábado se torna a opção de muitos moradores da Vila Brás para tocarem obras pessoais. Alexandre é pintor durante a semana. Utiliza a folga no seu trabalho regular para as reformas do imóvel que adquiriu e no qual pretende morar com a esposa. “Sempre dedico esse dia a reformas na minha nova casa”, diz. Aproveita o tempo bom para dar andamento à obra. “Se não chove,
estou aqui”, completa, ressaltando que não tem pressa para terminar suas tarefas do futuro lar. Algumas quadras adiante da obra de pai e filho, Vitor Monteiro, 51 anos, mostra que é outro trabalhador do sábado: é visto percorrendo as calçadas da Vila em um trabalho voluntário. Motorista em uma indústria de papeis durante a semana, Vitor não reside na Brás. Segundo ele, usa o sábado para visitar a Vila e encaminhar pessoas carentes a uma associação do bairro Cristo Rei na qual atua há 12 anos. “Uso o sábado para meu trabalho voluntário. Percorro vários bairros, trabalho com gente carente, peço patrocínios, essas coisas”, diz o motorista.
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Só faltava a cerimônia Foram oito anos preparando a festa. Ariane e Rodrigo casaram na Associação de Moradores MAGDA MARQUES
Gustavo Alencastro da Costa
A
em que estavam as fotos do casal. No salão, centenas de balões espalhados davam o toque final. Rodrigo conta que os
Moradores terão biblioteca e cinema Camila Nunes Os moradores da Brás estão prestes a ganhar novas alternativas de inclusão cultural. Uma parceria do governo federal com o município viabilizará a instalação de uma biblioteca comunitária, com acesso gratuito para a população. O valor repassado pelo Ministério da Cultura para aquisição dos livros será de R$ 20 mil. Segundo o Coordenador de Projetos da Secretaria Municipal da Cultura, Marcelo Azevedo, a biblioteca deve ser implantada ainda em outubro, em local a ser definido em conjunto com a população. Outro programa que está em período de gestação é o “Cine Mais Cultura”. A proposta, também resultado de uma parceria entre os governos federal e municipal, irá oferecer sessões gratuitas de cinema para os moradores da região. Todos os filmes exibidos serão nacionais. A ideia é que, em dois anos, a população assista a 104 produções do cinema brasileiro, disponibilizadas pela Agência Nacional do Cinema (Ancine). De acordo com Marcelo Azevedo, as sessões serão descentralizadas. O início do projeto também está previsto para o mês de outubro.
convidados, em sua maioria, eram parentes. Já Ariane teve que reduzir parte da sua lista. Ainda assim, eram esperadas cerca de 120
No detalhe, as iniciais dos filhos de Ariane e Rodrigo
pessoas para a cerimônia. O sonho tão esperado se concretizou. Rodrigo e Ariane casaram-se em 25 de setembro de 2010, às 19h30min.
Um sonho em comum Liege Freitas
LUANA ELIAS
lguns problemas dificultavam a formalização da união de Rodrigo Brás Machado e Ariane Freitas de Almeida. Porém, em julho deste ano, após oito anos de convívio, o casal decidiu oficializar a relação. O noivo é bisneto de João Bernardo Brás, conhecido como a primeira pessoa a habitar a região. De acordo com Rodrigo, o local existe há cerca de 30 anos. Uma dificuldade era o lugar onde aconteceria a cerimônia – Ariane conta que, como os dois não são batizados, não era possível selar a união em uma igreja Católica. Mas esse problema logo foi resolvido. O casamento seria conduzido pelo Pastor Paulo Chagas, que é evangélico. A Associação de Moradores da Vila Brás era o cenário da festa. A decoração foi realizada por Ariane. Tudo pensado com capricho. A ornamentação contava com detalhes em branco e vermelho nas paredes, pequenos vasos com flores dispostas sobre as mesas e um quadro estilizado
Nas páginas do Enfoque, Micaela descobriu que quer ser jornalista
Muitos de meus colegas, e eu decidimos fazer o curso de Jornalismo pelos mesmos motivos: o gosto pela leitura, pela escrita, pela comunicação e a grande vontade de explorar o mundo. No final do curso, quando nos matriculamos na disciplina de Projeto Experimental em Jornal, já sabemos que, durante um semestre, seremos a equipe que fará o jornal Enfoque Vila Brás. Três sábados são destinados a ida dos alunos à Vila. O que pouco de nós, alunos, imaginamos é que servimos de inspiração para uma jovem de 12 anos, que já sabe agora o que quer ser quando
crescer: jornalista. Estudante da 5º série, Micaela Machado Soares espera por nós todos os sábados e, quando não vamos à Brás, lê o blog do jornal (http:// enfoquevilabras.blogspot. com/). Comunicativa, Micaela se informa diariamente sobre o mundo em sites de notícias, gosta de escrever, de ler e explorar o mundo que a rodeia. Quando lhe perguntei o que achava de escrever um texto para o Enfoque, ela me respondeu, sem pestanejar: “Topo o desafio”. Então, na próxima edição, vocês poderão ler o que essa menina de 12 anos, que quer ser jornalista, tem para contar ao mundo.
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Fandango na praça I
ntegração e lazer são ingredientes fundamentais para uma boa qualidade de vida. Pensando nisso, a comunidade está se mobilizando para a construção de um CTG, com o objetivo de oferecer mais uma alternativa de entretenimento para a Brás. Integrante da direção da Associação de Moradores há quatro anos, o aposentado Eduíno Pich é o idealizador da iniciativa. Nascido em Santa Rosa e morador da Brás há 18 anos, Pich sente falta de um espaço familiar, que proporcione um ambiente de tradição e cultura para os moradores. “Precisamos de um local onde as famílias possam se divertir. No CTG, podemos realizar festas e bailes, além de propagar as tradições do nosso Estado.” A fim de arrecadar
fundos para as obras, são realizados bailes no salão da Associação de Moradores. Sem cobrar pelo serviço, a construção do CTG será feita por pedreiros da própria comunidade no mesmo terreno em que está localizada a praça da Avenida Leopoldo Wasun. O início das obras está previsto para outubro, assim que a última parcela da legalização do terreno for quitada. O projeto de construção do CTG prevê uma área de 2.500 metros quadrados, com estacionamento e canchas de bocha. Muitos moradores estão ansiosos para usufruir do espaço. “É importante para o lazer da comunidade e para que as crianças vivenciem a nossa cultura”, destaca o comerciante Rúbio de Barros, 28 anos.
SUELEN DAL’AGNOl
Ellen Mattiello
Eduíno indica o local das futuras instalações do CTG da Vila Brás
Moradores em campanha PRISCILA PILlETTI
Eleitores ostentam apoio e promovem divulgação de inúmeros candidatos e partidos Luana Reis
A
grande placa de propaganda eleitoral no muro da casa de Maria Camargo da Silva chama atenção na rua. Para ela, todo candidato merece espaço para divulgação de propostas. Maria conta que cedeu seu muro porque os candidatos são conhecidos de seu irmão, e dá uma pista sobre seu voto: “Eles têm promessas de melhorias para o bairro e a cidade”, ressalta. Na residência de Guiomar dos Santos também existe
um cartaz de publicidade eleitoral. Moradora do bairro há 22 anos, ela faz questão de apoiar os candidatos pelas melhorias que já fizeram na Brás. Guiomar sempre procura o incentivo dos candidatos para desenvolver os projetos da Associação dos Moradores de onde é vice-presidente. Nos finais de semana, Cleber da Silveira circula com o carro de som divulgando o candidato a deputado estadual. Ele é assessor de um vereador da cidade e acha que nas eleições passadas tinha muito mais
Moradores planejam instalação do primeiro CTG da Vila Brás
cartazes e placas nas casas dos moradores. “Acho que as pessoas estão cansadas da política, não acreditam mais na mudança como antigamente” reflete Silveira. Uma surpresa foi ver Vitor Gabriel de Azeredo, de apenas dez anos coletando materiais de campanha no carro de som. O menino distribui panfletos e santinhos de todos os candidatos para a família e amigos. “Sempre quando vem algum candidato aqui na Brás a gente pede ajuda para melhorar o grupo de dança que participo” conta Vitor.
Fiado só no cartão T arcísio B ertim Na Vila Brás, quase não há estabelecimentos comerciais que ainda façam vendas fiadas baseadas na confiança, o famoso caderninho. Mesmo sendo uma comunidade onde todos se conhecem, a tradição deu lugar à modernidade, e as máquinas de cartão de crédito estão em toda parte. O principal motivo é o calote. “Não está escrito na testa quem é gente boa”, afirma Meire Lopes, proprietária da Nati Bazar, que já perdeu R$ 15 mil em mercadorias não pagas. Meire diz que certa vez foi agredida por ter cobrado pessoas que a deviam. “Hoje não abro crediário para ninguém para não perder o dinheiro nem
o amigo”, revela. Justamente para não precisar vender no caderninho, Ademir Vieira criou um cartão próprio para o Supermercado Vieira. Ele afirma que 50% das vendas hoje são com cartão, ao contrário de poucos anos atrás. Estabelecimentos que não têm o mesmo recurso utilizam apenas o cartão de crédito. Ainda assim as vendas não diminuem. Atualmente muitas empresas pagam os funcionários com cartões que podem ser utilizados também para compras, realidade que já chegou à Brás. Josiane Claro, funcionária da Attitude Moda, acha que os moradores apenas não estão acostumados com o cartão, mas a maioria possui o seu.
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Beleza é coisa de homem, sim
Público masculino da Vila Brás também gosta de se arrumar, prova disso é o número crescente de homens nos salões de beleza FOTOS GABRIEL GABARDO
Fernanda Herrera
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aminhando pela rua principal da Brás, encontram-se diversos salões de beleza, todos com bastante movimento. Logo se vê que os moradores da Vila são pessoas vaidosas, tanto para tratar dos cabelos quanto das unhas e sobrancelhas. E o número de homens nestes estabelecimentos utilizando serviços estéticos é grande a olhos vistos. Em dois dos salões de beleza visitados, eram eles que estavam sendo atendidos. Segundo a cabeleireira Lena Blumelhaus, responsável pelo salão Lena Cabeleireiros, os homens estão cada vez mais vaidosos. “Eles não ficam para trás. Pedem cortes como o moicano e luzes, que são os reflexos loiros nos cabelos escuros”. Ela trabalha no mesmo ponto há pelo menos seis anos, e sua clientela está bem dividida entre homens e mulheres. A cabeleireira Regina Toledo, do salão Nuance Hair, também na Avenida Leopoldo Wasun, diz que eles têm uma preocupação a mais: “Pedem para cortar o cabelo, fazem hidratação e aproveitam para alinhar a sobrancelha. Os rapazes estão mais ousados!”. Há dois anos no ponto, Regina
Luzes, hidratação e cortes modernos: homens de todas as idades investem na própria imagem. Eles estão mais vaidosos e preenchem as agendas dos salões da Brás
tem clientes homens na faixa etária dos 17 aos 30 anos. Já as mulheres são de todas as idades. “Como o verão está chegando, todas querem clarear os cabelos, e eu sou especialista nisso”, afirma. No Xica Cabeleireiros, gerenciado por Maria Francisca Pereira, encontramos clientes de todas as idades. Xica, como é conhecida, tem o salão há
quatro anos e, com a ajuda de mais uma cabeleireira e duas funcionárias, oferece também os serviços de manicure e depilação (este último exclusivo para as mulheres). Quando o assunto é a clientela masculina, ela também afirma que eles estão se cuidando mais. “Marcam hora, vem para cortar, pintar o cabelo e fazer as unhas! São muito vaidosos mesmo,
gostam de cortes modernos. E não só os jovens, os mais velhos também se cuidam. Eu estou sempre fazendo cursos para me atualizar”, ressalta a profissional. O valor gasto pelos homens nos salões de beleza da Vila Brás costuma sair em média R$ 4,00 – para cortes simples, R$ 15,00 – para fazer luzes, e R$ 30,00 quando combinam corte, escova e coloração.
Para Marli, o lilás dá cor à vida, embeleza a alma, renova os ânimos e manda embora as tristezas. No fundo, ela
só quer mudar a visão descolorida do mundo. O lilás é o seu refúgio quando a vida insiste em lhe trazer o cinza.
D aniela F anti “Quando eu morrer, quero que me cubram com um veuzinho lilás”, diz Marli Kurtz, 55 anos - que já avisou o filho de seu último desejo. Moradora da Brás há três anos, ela não recorda quando a paixão pela cor teve início, mas sabe que ultrapassa décadas. Além da fachada da casa, localizada na Rua 12, Marli orgulha-se das portas, janelas, escadas e até mesmo da casinha do cachorro, que ela mesma pintou - tudo em lilás. Na parede da sala, um toque especial da proprietária: “Comprei massa corrida e com apenas um garfo criei
um efeito diferente. Quando pintei de lilás, ficou assim, lindo!”, exclama. No guarda-roupa, uma coleção de peças na cor lilás. São blusas, saias, lenços e sapatos. “Fiz questão de escolher um modelo de celular que tivesse opção na cor lilás para combinar com as minhas roupas”, conta. Marli é dona de casa, gosta de frequentar a igreja e cuida com muito carinho de suas plantas. Segundo ela, a simpatia pela cor também é inspirada pela natureza. “Foi Deus quem criou as cores e nos deu a visão para podermos admirálas. É uma dádiva que poucos aproveitam”.
CARINA MERSONI
A mulher lilás
Apaixonada pela cor lilás, Marli orgulha-se da fachada da casa
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A moda é economizar
11 Fotos: Ricardo Santos Modelo: Tatiani Slesaczek Produção: Vanessa Wagner
Como vestir-se bem gastando pouco e sem sair da Brás Vanessa Wagner Liane Priscila Rodrigues
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ontar uma produção de moda bacana - por um preço acessível - exige pesquisa e negociação, mas é totalmente possível. Um bate-perna pelas lojas da Vila Brás revelou achados incríveis. Garimpamos roupas, sapatos, bolsas e acessórios. O resultado foi uma composição moderna, barata e cheia de estilo. A Coleção Verão já está nas vitrines e, segundo Inês dos Santos, proprietária da Mais e Mais Modas, todas as semanas chegam novidades para a estação. A maioria das lojas visitadas aposta na diversificação de produtos – vestuário feminino, masculino e infantil, além de calçados e outros adereços. Moradoras da Brás, Gisele da Silva, 16 anos, Nahiman Soares, 15, e Priscila da Silva dos Santos, 18, argumentam que as lojas da Vila têm a moda que elas gostam de vestir. “Os preços é que não são tão atraentes”, concordam as jovens. Elas buscam no centro da cidade opções de roupas mais em conta. Para derrubar o conceito de que não é possível vestir-se bem gastando pouco sem sair da Brás, apresentamos um look criado exclusivamente com peças de
lojas da Vila - revelando preços dos produtos e onde encontrálos. Aproveite as sugestões, reserve um tempo para percorrer o comércio e boas compras!
•Os cintos fininhos chegam com força total. •As bolsas estão menores e estruturadas. O modelo de mão, Mouskelly, acompanha alça longa. •A estação é de todos os saltos. Na foto, o modelo grosso e robusto, imbatível no conforto. •Blusa branca sempre é coringa para diversas produções. Ouse nos acessórios e na composição com coletes ou sobreposições. •Outra peça legal e que com certeza vai ficar em alta no verão é o micro-short jeans. •Muito jeans no Verão 2011! •Superacessórios transformam qualquer look. As tiaras estão de volta, aposte nos modelos com laços. •Os óculos com armações grandes permanecem em evidência.
Niqueleira Mouskelly em estampa animal, um mimo fashion produzido na Brás!
Short jeans, Nati Confecções e Bazar, R$ 27,50. Colete, Loja e Bazar Eliane, R$ 27,00. Blusa branca, Loja e Bazar Eliane, R$ 15,00. Sapato, Sabrina Modas, R$ 24,00. Óculos solar, Nati Confecções e Bazar, R$ 15,00. Tiara laço, Bazar do Lôlô, R$ 8,50. Tiara tachas, Bazar do Lôlô, R$ 6,90. Cinto fininho, Bazar do Lôlô, R$ 6,00. Pulseira estampa animal, Bazar do Lôlô. Pulseira bracelete, Bazar do Lôlô, R$ 6,90. Brinco ponto de luz grande, Bazar do Lôlô. Anel, Bazar do Lôlô, R$ 13,90. Bolsa, Bolsas Mouskelly, R$ 20,00. Niqueleira, Bolsas Mouskelly, R$ 3,00.
Brechós são baratos e ajudam a compor estilo Os brechós de moda lojas que comercializam roupas, sapatos e acessórios usados – são uma alternativa para quem procura preço baixo. Na Vila Brás eles estão por toda a parte, com grande oferta de produtos. No Brechó da Carla, na Avenida Leopoldo Wasun, é possível montar um visual completo pela bagatela de R$ 40,00. Segundo a proprietária, Carla Mercedes Lopes Thambourindeguy, 49 anos, além dos ótimos preços praticados, os consumidores ainda contam com suas dicas de moda para vestir em qualquer ocasião. “As clientes pedem sugestões e eu vejo que estilo serve para cada uma”, conta a comerciante, orgulhosa. São mais de mil peças de inverno, aproximadamente
Nossas escolhas
Dica quinhentas de verão, além de calçados em ótimo estado. Tudo organizado com o capricho da proprietária, que destaca outra vantagem de comprar nos brechós: “É mais barato, então as pessoas podem comprar para a família toda. Aqui na comunidade a gente tem muitos filhos, dessa forma fica mais fácil vestir, e bem, todo mundo”. É também dos brechós que podem sair peças para compor produções com personalidade. Fashionistas têm lançado mão da mistura de peças modernas com outras de inspiração retrô, descobertas em lojas de artigos usados.
Versatilidade: O colete nos permite brincar e criar diferentes visuais. Com uma simples amarração nas costas, o modelo de pontas longas transforma-se em blusa ou coletinho curto. Invista em peças que possibilitem diferentes usos. Uma compra, várias produções!
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Aulas de informática ao alcance da comunidade Associação de Moradores oferece curso para famílias que participam do Programa Auxílio Solidário MADGA MARQUES
Patrícia Oliveira
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om doações de computadores e trabalhos voluntários, a Associação dos Moradores da Vila Brás está disponibilizando curso de informática para parte da comunidade, interessada em conhecer essa ferramenta digital. No momento, o curso é oferecido apenas para as famílias que fazem parte do Programa Auxílio Solidário (PAS). “Pedimos desculpas por não conseguir abrir para toda a comunidade, mas o nosso problema é a falta de professores capacitados”, explica Claudimir Schutze, há seis anos presidente da Associação. Schutze ainda destaca que o laboratório de informática, localizado na sede da entidade, possui oito computadores, sendo que dois vieram da Secretaria Municipal da Cultura (SMC) e o restante, de doação do Trensurb. As aulas de informática, ministrada por uma professora da SMC, acontecem nas segundasfeiras, das 17h às 20h, atendendo três turmas. Os alunos aprendem apenas noções básicas de informática, já que o local ainda não possui acesso a
internet. Segundo Schutze, a iniciativa do curso é de extrema importância para a comunidade da Vila. “Temos em média 14 mil pessoas morando aqui e somente 8% tem noção de computação. Um índice baixo para o mercado de trabalho que, hoje, exige conhecimentos de informática”, salienta.
Os frequentadores do curso são de todas as idades e realizam atividades como desenhar, pintar e jogar. “Nas primeiras aulas, as atividades são para “desencarangar” os dedos, já que são duros por nunca terem mexido com isso”, explica um dos alunos do curso, Luciano Borba
Machado, que reconhece a importância dessa oportunidade. Schutze ressalta que ainda há receio da comunidade em participar do curso, por não se sentirem a vontade. “Nosso principal objetivo é que a população da Vila se sinta inserida na sociedade, se igualando aos outros”.
Com doações, computadores são a chave para as descobertas dos moradores da Vila
Leopoldo/RS”, é encontrado o perfil de menores de idade, apesar de possuir apenas 24 membros. Segundo o moderador, ela é destinada “a todos que moram na Brás
e querem o melhor para o bairro”, e não existe nenhum tópico postado em seu fórum. O Orkut é o total responsável pelo controle de idade no perfil de seus usuários.
Sites de relacionamento como o Orkut estão entre os preferidos dos internautas da Brás
Me adiciona L eandro V ignoli Nas diversas lan houses ao longo da Vila, os sites de relacionamento são os que mais fazem sucesso entre o público, em sua maioria, de adolescentes. O Orkut é o campeão da preferência, e embora a idade mínima para se criar uma conta no site seja de 18 anos, uma grande quantidade de jovens burla essa restrição. Ricardo Lima, de apenas 12 anos, diz que não possui perfil em nenhuma rede social, mas conhece vários colegas que acessam a Internet apenas para isso. “A maioria dos meus colegas da 5ª série usa Orkut quase todo dia aqui
na lan house”, revela. A moradora Ângela Machado Soares tem uma filha de 12 anos com conta no site de relacionamento e afirma que controla tudo o que a menor faz no site. “Temos uma conta conjunta, onde tenho a senha do perfil, e ela só publica fotos ou adiciona alguém com a minha autorização”. Segundo Ângela, não tem como proibir ou verificar o que todos os adolescentes fazem nesse tipo de página. “Isso é uma questão mais familiar. Cada um deve ter consciência do que seu filho está freqüentando, principalmente na Internet.” Dentro do próprio Orkut, na comunidade “Vila Brás - São
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LUANA ELIAS
Internet para salvar os negócios Quando o movimento na locadora caiu, Jorge apostou na tecnologia. E deu certo Priscila Zigunovas
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orge Soares é dono de uma locadora na Avenida Leopoldo Wasun desde 1996, quando ainda se usava videocassete e o aluguel de filmes em VHS estava no auge (leia ao lado). O movimento era bom, mas, com a difusão do DVD, somada ao barateamento dos computadores, a pirataria ganhou força, e o aluguel de filmes diminuiu drasticamente. Em 2007, Jorge resolveu usar a seu favor a tecnologia que estava roubando seus clientes e abriu, junto à locadora, uma lan house: a Jorge’s L@n. Para ter acesso à internet no local, ele precisou instalar uma antena de uma empresa de internet via rádio, de Campo Bom. Ele cobra R$ 2 por hora de quem quiser acessar a Internet
de um dos seus sete computadores, além de oferecer serviços de xerox e impressão. A empresa também disponibiliza instalação de antenas para os moradores que quiserem ter acesso à internet, a partir de R$ 50 mensais. Os pedidos de instalação chegam a 10 antenas por semana. “A lan house, hoje, dá mais lucro que a locadora”, garante Jorge. A maior procura, explica o proprietário, é para acessar o Orkut e MSN. “As pessoas têm necessidade de entretenimento. O que se tem de diversão por aqui é pouco”, explica. Mas, para ele, apesar do uso difundido da internet, as pessoas ainda não gostam de ler e não sabem escrever. “Essa é uma deficiência que a internet poderia ajudar a suprir. Mas isso não acontece, pois falta uma base cultural no Brasil”, opina.
Jorge Soares diversificou os negócios para se manter no mercado
Para driblar a pirataria Hector Moraes Enquanto a Blockbuster, maior rede de videolocadoras do mundo, pede concordata, Jorge Soares se adaptou ao mercado e expandiu a área de atuação de sua locadora para a internet, tentando evitar o mesmo fim da multinacional. A Jorge’s L@n teve de apresentar novas opções aos antigos clientes, que aos poucos estão deixando de lado o interesse
pela locação de filmes. Segundo Jorge, a grande culpada pela baixa procura por DVDs não é a internet: “O maior problema, na verdade, é a pirataria física, a pirataria de rua”, alerta. Ele afirma que na segunda quinzena de 2007 houve um pico negativo no aluguel de filmes: “Agora somente os cliente fiéis ainda alugam filmes. Houve uma queda de cerca de 250 para 40 clientes por mês”. A esperança, segundo
ele, está nos filmes em 3D que, provavelmente, os falsificadores não terão tecnologia suficiente para copiar. Atualmente, segundo o proprietário, a compra de um lançamento custa R$ 120. “É complicado, porque imagina quantas vezes tenho que alugar um filme para que ele passe a gerar lucro?”, comenta. O valor da diária de locação é de R$ 3, valor 40 vezes menor do que o gasto na compra.
O casal que não troca a Vila por outro lugar SUELEN DAL’AGNOL
P riscila C arvalho Ao passar em frente, parece apenas mais um dos tantos bazares que existem na Brás. Mas quem entra na RV Cell logo descobre a diferença na variedade de itens existentes na loja. São diversos tipos de presentes e utilidades que vão de roupas e ursinhos de pelúcia a capacetes e produtos de informática. Rúbio de Barros, 28 anos, e a esposa Viviane, 26, são os donos do estabelecimento, situado
Viviane e Rúbio apostam na variedade de produtos e preços para agradar os clientes
na Avenida Leopoldo Wasun, nº 515. Ele veio para a Brás com oito anos de idade e já teve até um mercado na Vila: “Resolvi fechar porque não tinha vida, perdia todos os meus compromissos”, comenta Rúbio. Há quatro anos abriu o comércio que tem como foco os celulares: “Vendemos em média um por dia”, afirma. Além disso, são distribuídos aparelhos para outras lojas de fora da Brás e oferecidos alguns consertos: “Algumas coisas nós consertamos, quando não conseguimos, indicamos outras pessoas”, destaca Viviane. Os modelos de celulares são dos mais criativos, desde Homem-Aranha
até um com formato de Ferrari. Os preços variam entre R$ 199 e R$ 499 para os aparelhos que possuem GPS. Para abastecer o estoque, Rúbio viaja semanalmente em busca de produtos para a loja. O sucesso de vendas se deve ao diferencial que o comércio apresenta: ”Trabalhamos em cima do que os outros não têm”, revela, sobre a falta de estabelecimentos que ofereçam esse tipo de produto na Brás. Enquanto o casal está na loja, a filha Nicole, seis anos, fica em uma creche perto dali. “É muito bom saber que podemos contar com isso na Brás”, disse Viviane.
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Jurandi alia prazer e trabalho Viúvo utiliza tempo livre para afiar ferramentas, atividade que lhe rende um dinheiro extra
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rês cães e um papagaio são os companheiros de Jurandi Alves de Mello, 75, viúvo há dois anos. Morando na Vila Brás nos últimos 20 anos, tem como trabalho e passatempo a tarefa de afiar ferramentas. Facas, alicates, serrotes, tesouras comuns e de jardinagem que precisam de renovação vão parar na casa do aposentado. O ofício foi o avô carpinteiro que o ensinou, quando Jurandi tinha nove anos e foi ajudá-lo na produção de móveis. A rotina começa às 6h50min, mas se dedica a afiar as ferramentas de segunda a sábado, das 9h ao meio dia. “Faço pelo prazer, para ter uma atividade. Cobro R$ 6, para ajudar a pagar as despesas com as ferramentas e a conta
de luz” conta Jurandi. As tardes são dedicadas a jogar canastra com os amigos. O serviço é feito por ordem de chegada. “Quando me trazem a ferramenta, coloco o nome do dono nela” e assim Jurandi não se engana na hora de devolver. Só não segue a ordem quando alguém tem muita urgência, o que começou a ser mais comum depois das obras do Trensurb: “O serviço aumentou depois dos loteamentos”. Mesmo com maior demanda, Jurandi afirma que não conhece nenhum outro afiador nas redondezas. Apesar da idade, o afiador garante que não tem problemas de visão. Fez cirurgia há alguns anos e consegue ler o jornal sem o uso de óculos. “Uso os óculos para trabalhar porque o médico pediu, é para não cansar os olhos”.
Iniciativa verde Rafael Soares Martins
Aposentado aprendeu o ofício quando tinha nove anos, com o avô
Uma figura que alegra a vizinhança Pedro Luis Bicca A Lancheria Bom Gosto, localizada na Rua Leopoldo Wasun, além de ter produtos de qualidade com preços baixos e bom atendimento, desfruta da alegria radiante de seus frequentadores. Marcos Quadros, 78 anos, ainda que seja portador de deficiências auditiva e na fala, é dono de um sorriso cativante. O velhinho simpático é presença marcante do local quase diariamente, após as dez horas da
manhã. Sempre curioso aos fatos que ocorrem em volta do estabelecimento, observa atentamente o movimento de pessoas estranhas, que circulavam nas proximidades entregando um material informativo. Eram os repórteres do Enfoque, distribuindo as cópias da última edição. Um jovem se aproximou, lhe entregou um exemplar, indicando uma matéria, ilustrada por uma foto sua. A alegria que sentiu foi instantânea, mais uma vez abrindo seu
BRUNA SCHUCH
Muito mais do que apenas oferecer sombra ou uma bela paisagem, as árvores tornaram-se, na atualidade, um importante fator ambiental para melhorar as condições de vida nos centros urbanos. Essencial para a vida, a vegetação é capaz de reter poluentes do ar, neutralizando seus efeitos na população. A contribuição com o meio ambiente vem revestida de educação ambiental na Vila Brás, ou pelo menos na casa de Ângelo Corrêa Borges. Ele cultiva em seu quintal mudas de árvores frutíferas e hortaliças que são distribuídas para os vizinhos e parques do bairro. “Ter árvores e plantas em casa, para algumas pessoas, é essencial para dar vida ao ambiente”, conta Ângelo. A iniciativa surgiu para estimular os filhos sobre a consciência ecológica. “Hoje em dia os pais não ensinam mais os filhos a cuidarem da natureza. Muito mais do que o retorno, de poder comer uma fruta saudável e
totalmente natural, é poder ensinar que a preocupação deve começar em casa, na escola, no local onde cada um vive. E estas lições as crianças aprendem cedo”, argumenta. A iniciativa de Ângelo é um pequeno passo para amenizar os impactos da degradação ambiental e contribuir para uma vida mais saudável. Ao mesmo tempo, é importantíssimo para as gerações futuras, espelhadas nas netas gêmeas Raíssa e Pâmela. Sobre os resultados já obtidos, Ângelo ressalta que é interessante notar o envolvimento e o interesse de vizinhos e amigos, além da comunidade, no cultivo das mudas. Algo que é importante saber é que, em todas as cidades do mundo, o preço do metro quadrado de terreno é altíssimo. A cada nova construção, há menos espaços para parques e jardins. O resultado é a diminuição do número de árvores, que não têm onde ser plantadas. “Plantem uma árvore, em todo lugar que for possível”, conclama o morador.
RAMIRO FURQUIM
Roberta Roth
sorriso harmonioso. Segundo Eva Buratti, 47 anos, proprietária da lancheria, Marquinho, como é conhecido, está sempre circulando entre seu estabelecimento e o salão estético situado ao lado. “Um senhor muito querido por todos que trabalham ou moram no local”, relatou a microempresaria. Infelizmente, ele não poderá mais desfrutar do ambiente da lancheria, devido à mudança de local que os proprietários pretendem realizar até dezembro. Mesmo assim, Marquinho continuará observando tudo de diferente que ocorre em sua volta e principalmente alegrando um pouco mais as pessoas que visitam a Vila Brás.
Mesmo com deficiência auditiva e na fala, Marquinho está sempre atento ao que acontece na Vila
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Talento para vender
Com apenas cinco meses de funcionamento, bazar anuncia cartão de crédito para breve ANA LUIZA MELO
Roberto Ferrari
“O
senhor não precisa de mais nada, um cinto masculino talvez?”, pergunta Sabrina dos Reis, de 30 anos, proprietária do bazar Sintonia Presentes, a um cliente que finalizava uma pequena compra. É esse talento para o comércio que está possibilitando à empresária novos horizontes nos negócios. Localizado na Avenida Leopoldo Wasun, em frente à Escola Municipal de Ensino Fundamental João Goulart, o empreendimento já tem cinco meses e é chefiado também pela irmã de Sabrina, Sônia dos Reis. “Comecei aos poucos, comprando potes, roupas e calçados. Em seguida adquiri e comecei a vender brinquedos e produtos domésticos, além de uma variedade de sugestões de presentes”, enfatiza. O Sintonia Presentes pode ter pouco tempo de existência, mas a experiência de Sônia no ramo já é de longa data. Ela conta que trabalhou no comércio como funcionária durante sete anos e adquiriu a prática
Num espaço modesto, o bazar oferece diversos produtos, desde brinquedos até peças de vestuário de venda. Como auxiliava o chefe nas compras de produtos, também ganhou a experiência necessária para tocar o seu próprio negócio. Segundo a empresária,
brinquedos – como carrinhos, bonecas e pequenos jogos – e material escolar estão entre os itens mais vendidos. Essa demanda é justificável, possivelmente, pela
Viagem a negócio S uélen D al ’A gnol Arrumar as malas e colocar o pé na estrada em busca de um futuro melhor é uma das mais difíceis decisões para qualquer pessoa. Em todas as cidades é comum encontrar vendedores ambulantes que percorrem quilômetros com seus carrinhos lotados
encaminhamento das máquinas para cartão de crédito. Assim, possibilito mais uma opção de pagamento”, ressalta Sabrina.
À espera da criançada
de mercadorias. Na Vila Brás não é diferente. Com aproximadamente 14 mil habitantes, o bairro passou a ser visto como um importante centro comercial. Atualmente, oito vendedores ambulantes vindos do Ceará escolheram as ruas e avenidas da localidade para comercializar os produtos que trazem de São Paulo. Suélen Dal’Agnol
Nordestinos ganham a vida vendendo de tapetes a espelhos
localização do bazar, a alguns metros da escola. Para o próximo mês, o negócio irá disponibilizar mais comodidade aos clientes. “Fiz o
De acordo com Francisco Antônio do Santos, 24 anos, as vendas são boas. “Com o tempo, cada um conquistou a sua clientela e ganhou o seu espaço”, ressalta. A vida de um vendedor ambulante não é fácil e requer muita força de vontade. Deixar a família, os amigos e toda sua história para lutar por uma vida digna acaba se tornando necessário. Segundo Antônio Alves de Souza, 35 anos, a saudade é amenizada por meio de ligações telefônicas. ”Faz sete anos que vim morar aqui na Vila Brás, e visitar a família ficou para segundo plano”, declara. A maior parte deles retorna ao Nordeste de seis em seis meses no mínimo, mas já aconteceu de ficarem anos distantes. O grupo se divide em duas casas alugadas e trabalha todos os dias da semana, já que aos sábados e domingos as vendas aumentam.
Thaís Jobim Na véspera do Dia das Crianças, os comerciantes se preparavam para as vendas. Como em todo dia especial, sempre é ofertado um mimo, seja ele qual for. Ainda mais quando é para a criançada, elas esperam o dia 12 de outubro ansiosamente. A comerciante Janete Lorscheiter, de 31 anos, e seu marido, Sildo Pompelo, 33, naturais de Bom Princípio, são proprietários do bazar Hanhs e estão há menos de um ano na Brás. Por conta de uma proposta para assumir o comércio da família, vieram para a Vila com o intuito de começar uma nova vida. Para este primeiro dia da Criança, Janete mostrouse empolgada pelas vendas. “Estamos com uma grande expectativa pelo Dia das Crianças, esperamos que
fosse como Natal e Dia das Mães, com grande movimento”, relata. Em seu estabelecimento podem ser encontradas bonecas, carrinhos, controles para videogame, bolas, pulseiras e artigos para cozinha. As pessoas que chegam até a loja são, em sua maioria, mulheres que buscam utensílios de cozinha. Janete, que passa o seu primeiro Dia das Crianças na Brás, pretende ter grandes lucros no seu comércio. Mas com o seu primeiro dia da criança é onde ela pretende lucrar mais. “Com base nas outras datas, temos esperanças de ter boas vendas neste primeiro dia da criança”, declara. Mesmo antes do dia 12 de outubro, as pessoas já fazem as suas pesquisas de preço e muitas vezes acabam levando alguma coisa.
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As letras de Alzira
Moradora encontra na sua história de vida a força necessária para superar dificuldades
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om olhar cabisbaixo, Alzira Moraes, 71, se escora no marco da varanda da sua casa de madeira. E é nesta cena, entristecida pelo passado, que o nascer e o pôr-do-sol parecem não fazer muita diferença para ela: “Daqui só vou para o cemitério e mais nada”. Alzira pouco vê. Pouco ouve. Deficiente visual, auditiva e diabética. Problemas revelados tão somente pela voz. Ao ser abordada durante a entrega da primeira edição do semestre do Enfoque Vila Brás, Alzira, quase como num balançar de ombros, desabafa: “Não adianta me entregar isso aí, moço, eu não sei ler nem escrever...”. No início, ela se mostra receosa. Depois de muita insistência, cede. Resolve falar desde que as perguntas sejam feitas do portão do pátio. A cada resposta, Alzira se deixa abater pela fraqueza.
Até que, envolvida por uma lembrança, sentase no chão da varanda e sentencia: “Quando eu tinha sete anos, meu pai mandou eu estudar, mas eu só queria saber de porco, vaca, boi. Eu só queria cuidar do sítio do meu pai”. Alzira tanto adiou os estudos que hoje não sente mais vontade de realizá-los: “Do que adianta estudar agora? Estou com 71 anos, não consigo nem caminhar”. Bem que ela queria, mas o único lugar que Alzira pode ir sozinha é do quarto para sala e da sala para cozinha. Nesse curto trajeto, ao esbarrar com algumas crianças que frequentemente vão visitála, toda tristeza acumulada dá lugar ao sorriso. “Meus bisnetos são tudo na minha vida...”, conta. Alzira possui pouco dinheiro para sobreviver; tem uma amiga especial que diz amar, mas que mora longe; uma filha dependente química; e uma
FABIANA ELEONORA
Luan Iglesias
gata que adotou há poucos meses. Uma vida simples, cheia de marcas. E mesmo que as letras não façam muito sentido para ela,
Abatida pela fraqueza, Alzira precisa de auxílio para se locomover pela Vila
Alzira imprime na maçã do rosto palavras em forma de tristeza e felicidade. Com ou sem alfabeto, Alzira tem muito a nos ensinar.
De volta à sala de aula Após 16 anos longe da escola, a dona de casa Ivonete Stabel sente-se realizada em estar de volta às salas de aula. A estudante tem 31 anos, é moradora da Rua 22, participa do Programa de Educação para Jovens e Adultos (EJA), na Escola Municipal de Ensino Fundamental João Goulart, e precisa se dividir entre as aulas noturnas de segunda à quinta-feira, as tarefas diárias da casa, cuidar de sua mãe, criar as filhas Mayara de cinco anos e Mariana de nove e, claro, dar atenção para o marido. O grande objetivo de Ivonete é se tornar uma policial civil e espera um dia poder realizar seu sonho profissional: “Sempre quis ser inspetora”, diz, entusiasmada. Ivonete retornou à escola em março deste ano, para completar o ensino fundamental e pretende completar esta etapa até o final de 2010. “E quem sabe cursar uma faculdade no futuro”, completa. Ela fala
PEDRO BARBOSA
Clarissa Figueiró
Ivonete mostra a suas filhas os cadernos que utiliza nas aulas do EJA
com carinho dos professores e ressalta que estes são bastante exigentes, mas, ao mesmo tempo, companheiros dos alunos ao incentivá-los constantemente. Ivonete relembrou, ainda, seu primeiro dia na aula do professor Maicon. “O professor de artes olhou meu desenho e disse que estava lindo, mas eu sabia que não, era só um elogio para me incentivar”, conta a estudante. Para Ivonete, a volta para as salas de aula lhe ajudou muito em vários aspectos. Além de contribuir para o seu conhecimento, também foi muito importante para algumas mudanças no seu comportamento. “Mudei até meu jeito de ser. Agora tenho mais paciência, melhorou a convivência com as pessoas”, diz. Segundo a prefeitura de São Leopoldo, atualmente 2.300 jovens e adultos são atendidos pelo EJA, com previsão de ampliação para mais de 3.000 vagas no ensino fundamental para alfabetização de jovens e adultos na cidade para o próximo ano.
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Olhai os lírios do vale
Pregadoras evangélicas dedicam-se à formação espiritual de crianças, jovens e adultos
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á 13 anos na Rua Leopoldo Wasun, número 1.251, o Círculo Feminino de Oração: Lírios do Vale reúnese aos sábados no salão da Igreja Assembleia de Deus. Coordenado por Leocádia Hasper, o grupo que possui 22 integrantes tem por objetivo orar pela comunidade, evangelizar crianças, jovens e adultos e organizar casamentos, aniversários e batizados. Conhecidas como “Lírios da Vila Brás”, as pregadoras não faltam aos encontros, que são iniciados com uma prece, seguida de pregações e leituras bíblicas, encerrando-se com cânticos gospel e uma oração, durante a qual as integrantes, de mãos dadas, formam um círculo. Costureira e cantora gospel, Solange Linhares é integrante dos “Lírios do Vale” há mais de 10 anos. Atualmente trabalha na gravação do seu
segundo CD individual e seu primeiro DVD ao vivo. Segundo Solange, a origem do nome do grupo tem como referência o Antigo Testamento. “Jesus era conhecido como o Lírio dos Vales”, explica. A cantora recorda que antes de ser “crente”, foi consumista compulsiva, bebia e fumava exageradamente. Ela atribui a qualidade de vida que possui hoje às orientações recebidas no círculo de oração. A pregadora e dona de casa Clair Pinheiro Teixeira relatou no púlpito que há alguns anos, durante uma oração fervorosa, pediu um “Fusquinha” para levar a família aos cultos. Na semana seguinte, surpreendeu-se quando o esposo estacionou o automóvel em frente à residência. “Fui atendida na fé, pois Deus é fiel aos que n’Ele creem!” exclama. Questionada sobre o estilo recatado de vestir-se, diz: “As evangélicas não usam calças, bermudas ou shorts,
Thayna CANDIDO
Simone Núñez Reis
Círculo Feminino de Oração reúne-se aos sábados, no salão da Assembleia de Deus só saias e vestidos, pois está escrito no livro de Deuteronômio, capítulo 22, versículo 5, que não haverá
traje do homem na mulher”. No final do encontro dentre os “Lírios”, o “bendito fruto” José
Natal Mendes, técnico e programador da mesa de áudio, exclama: “Senhor, olhai os Lírios do Vale”.
O lar da família Novaes
Mãe ou avó?
Guilherme Möller
Miriam Moura
Família deixou o interior do estado para viver em São Leopoldo
trabalha, a avó cuida da neta, a única representante da família Novaes natural de São Leopoldo. A vida das mulheres é levada com alegria e satisfação, afinal, a vila é o berço dos Novaes, é o lugar onde escolheram viver. “O nascimento da Hingryd representa nossa felicidade, ver ela crescer aqui é muito bom, é o fruto de nossa alegria”, conta Roseli. LEANDRO MACIEL
Com uma voz mansa e olhar distante, Graciolina Novaes Corrêa, 64 anos, deixou Santo Augusto, no interior do Estado rumo a São Leopoldo. Moradora da Brás há nove anos, Graciolina veio para cidade grande em busca de uma vida melhor. Largou a lida de campo com o objetivo de criar a filha num espaço maior, lhe proporcionando melhores alternativas de trabalho e estudo. “A vida no interior é boa, mas aqui tem mais oportunidades”, ressalta. Conforme ela, o bom de morar na Brás é que o povo é solidário. “Temos muitos amigos, e não me arrependo de ter vindo morar aqui”, explica. A moradora da Rua 23 reside com a filha Roseli Novaes Corrêa, 27 anos, e com a neta, Hingryd Corrêa
Macedo, de dois anos e oito meses. Roseli chegou à cidade com seis anos e aos 18 se mudou com a mãe para a Brás. Roseli diz gostar muito de viver na Vila e pretende criar a filha na comunidade. “É um lugar bom, bem localizado, o comércio funciona. Eu trabalho para criar a Hingryd e sonho que ela tenha um futuro bom”, conta. Enquanto a filha
Para Josefa de Lima, é difícil separar a função de mãe e de avó. Aos 61 anos, depois de ter criado e educado 11 filhos, se vê de novo no papel de mãe, tendo que assumir cinco netos. Quando seu genro faleceu de tuberculose, Josefa assumiu os quatro filhos do casal, pois a partir daquele momento sua filha se envolveu com drogas e álcool, abandonando as crianças. No começo do ano passado, Josefa foi surpreendida pelo nascimento de Nicole, a mais nova das netas, hoje com pouco mais de um ano. Josefa tem uma história de garra e luta. Ela e o marido, Avelino de Lima, de 66 anos, trabalham arduamente para manter as crianças alimentadas e na escola. Ela participa do Programa de Assistência
Social (PAS), do qual recebe R$ 119,00 por mês, e faz trabalhos temporários para uma fábrica de copos, perto de sua casa. Avelino, apesar de aposentado, precisa fazer “bicos” para aumentar a renda mensal, trabalhando como guarda em um serviço temporário. A família se reveza com as tarefas. Enquanto Wellington, de 13 anos, está na escola, Tainara, de 11, cuida dos mais novos, que têm idade de oito, seis e um ano. Quando ela vai à escola, Wellington assume o controle dos irmãos. Josefa faz questão de manter a educação das crianças, inclusive se esforça para pagar cursos de informática para os mais velhos. Apesar de viverem em condições precárias, mantêm um sorriso no rosto e a união da família. “Eles querem ser bem tratados e alimentados, e isso eu e meu marido garantimos”, se emociona.
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São Leopoldo, outubro/novembro de 2010
Esperança entre a sucata
Busca de emprego melhor trouxe Paulo César da cidade de Palmeiras das Missões para a Brás
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m meio a tantas histórias emocionantes que a Vila Brás proporciona, há quem se dispõe a escutá-las. Na Leopoldo Wasun, um homem caminha bem rápido, levando nas costas dois ou três sacos cheios de plásticos e papelão. Com a pele queimada do Sol, Paulo César, de 36 anos, cata sucatas desde que veio de Palmeira das Missões, onde morava com sua mãe. Ele decidiu se mudar para São Leopoldo com a esperança de encontrar um emprego melhor, mas a vida o reservou outros caminhos para trilhar, caminhos difíceis. No dia em que chegou a São Leopoldo foi assaltado. Levaram seus pertences e todos os seus documentos pessoais. Após essa situação, Paulo César começou a catar papelão, plásticos e demais sucatas para depois vender à usina de reciclagem e, assim, juntar dinheiro para refazer seus documentos,
tentando novamente, desta forma, um emprego digno. “Faço isso porque é um trabalho, não tem outra solução”, diz Paulo César, caminhando e olhando para o chão a procura de sucatas. Ao final do dia, ganha com a venda dos materiais para reciclagem em torno de R$ 20. Desse dinheiro, tira seu alimento, e o que sobra é guardado. No final da semana, ele consegue juntar cerca de R$ 40, que vem utilizando, entre outras coisas, para refazer sua documentação. Sempre após um dia de trabalho, ele procura um lugar tranquilo para descansar e dormir. Na manhã seguinte, a rotina se repete. “Tenho esperança de que um dia Deus vai me dar um serviço bom e voltarei a rever minha mãe”, diz Paulo César. Com força de vontade e fé, como ele mesmo diz, Paulo Cesar, ainda um pouco tímido, se despede: “Ainda tenho toda a tarde para trabalhar.”
joão pedro zandonai
Vanessa Lopes Ramos
O catador de plástico e papel Paulo César economiza para refazer documentos pessoais
Uma vitória pessoal
Cecília Medeiros
Manuela Teixeira
Meire Cristiane de Souza, de 31 anos, é moradora da Brás há 12. Ela reclama que não suporta mais ver menores entre cinco e sete anos pedindo alimento e dinheiro pelas ruas da comunidade. Segundo ela, muitas crianças nem frequentam mais a escola, pois passam o dia pedindo de casa em casa. Quando os moradores se recusam a dar alguma coisa, os menores xingam com palavrões. Algumas mães ficam a uma quadra de distância só para arrecadar o que os filhos recebem. “É um desrespeito com essas crianças, serem exploradas dessa forma e serem privadas de frequentar a escola. Às vezes eu até doava alguma roupa ou alimento para ajudar, mas hoje evito, porque essa é uma tática usada pelas mães para roubar as casas. Já roubaram meu celular uma vez”, declara.
No Conselho Tutelar Zona Norte de São Leopoldo, há mais de 50 denúncias sobre crianças pedintes, incentivadas pelos pais, na Vila Brás. A conselheira tutelar Joselaine pede que, quando os moradores virem menores pedindo nas ruas, denunciem o mais rápido possível, para que possam ser tomadas as medidas cabíveis. Joselaine lembra que o Conselho Tutelar atua somente por denúncias e que a função do órgão não é só retirar essas crianças da rua, mas dar todo um encaminhamento para ela e sua família para que não voltem a pedir pelas ruas. Existem muitos projetos que auxiliam a criança e a família, como os CRAS de São Leopoldo. Para denúncias, ligue para o telefone do plantão 24 horas 9725-6182, ou ainda procure o Conselho Tutelar Zona Norte de São Leopoldo, que fica na rua Henrique Bier, 2.709, no bairro Campina da Cidade.
A Vila Brás é cheia de histórias. Histórias felizes, tristes, emocionantes e histórias como a de Cleusa Teresinha Vieira, de 35 anos. Uma história de superação. Há um ano, ela atua como cabeleireira em seu próprio salão de beleza. Mas nem sempre foi assim. Por cinco anos, Cleusa capinou ruas. O trabalho lhe rendia R$117 por mês e estava inserido num projeto de assistência social da Prefeitura de São Leopoldo. Foi a chegada de um novo amor que lhe incentivou a correr atrás de outras perspectivas de vida. O marido, Antônio Alves de Arruda, de 51 anos, foi seu grande incentivador. “Dizia pra ela que tinha de fazer alguma coisa pra crescer, pra ter suas próprias coisas”, conta Antônio. Cleusa e Antônio se conheceram em 2009. Logo no primeiro mês de namoro, ele a encorajou a fazer um curso de manicure e cabeleireira, oferecido pela Prefeitura de São Leopoldo dentro dos programas de assistência social.
Tamires Gomes
Crianças fora da escola
A profissão foi essencial para a autoestima de Cleusa Após quase cinco meses de curso, Cleusa inaugurou seu salão de beleza. “Foi uma vitória”, relata. Hoje, a profissional tem em torno de 20 clientes fixas e oferece serviços de hidratação, chapinha e corte de cabelo, além de manicure, pedicure e limpeza de pele. “Adoro quando as clientes saem felizes. Gosto do que faço”, conta. Em maio, ela
transferiu o salão para uma sala mais nova e ampla. O curso trouxe mais do que uma profissão. Ele foi essencial para o aumento da autoestima da moradora, que sofria de depressão. “A vida dá oportunidades. Quero que outras mulheres consigam dar a volta por cima como eu. Me sinto realizada. Mudei minha vida”, encerra.
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São Leopoldo, outubro/novembro de 2010
CARINA MERSONI
O ganso e a gansa, como são conhecidos pelas redondezas, avisam sempre quando alguém está perto do portão da casa de Carmen da Silva
O segundo melhor amigo
Dois “gansos de guarda” assumem o posto de guardiões e ajudam a proteger a casa da família Silva Rafaela Kley
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asta caminhar pela Vila Brás para perceber que nas ruas ou nos quintais das casas os cachorros fazem parte da vida da comunidade. O cão, melhor amigo do homem, é o primeiro animal que as famílias escolhem para proteger suas moradias. Apesar da preferência nacional, Carmen Rosane Leotte da Silva, junto com sua família, optou por uma alternativa diferente para
resguardar sua propriedade. Gansos. Mais especificamente, dois gansos cuidam da casa de Carmen há quatro anos e, de acordo com a família, cumprem muito bem seu papel de vigias. “Esses animais são conhecidos como gansos sinaleira e avisam sempre quando alguém está perto de nosso portão. Com certeza, os nossos gansos são mais guardiões que muito cão”, conta a dona de casa, de 50 anos. Moradora da Rua Amores Perfeitos há 23 anos, a família
confessa ser apaixonada por animais. “Estou construindo em nosso quintal uma piscina para os gansos, pois eles gostam muito de água. Espero que até o verão ela já esteja pronta”, revela Maikon Luan da Silva, de 21 anos, filho de Carmen. “Além de serem ótimos animais, é muito mais fácil mantê-los, pois não precisam de tantos remédios e vacinas como os cachorros. Sem contar que todo mundo gosta deles, nossos vizinhos dão até ração, milho e talos
verdes”, ressalta Carmen. O ganso e a gansa, como são conhecidos, dividem ainda o quintal com uma galinha, um galo e dois pintinhos. E a família tende a aumentar. Os gansos estão chocando oito ovos. “Não sei ainda o que vamos fazer, mas acredito que iremos vender os filhotes”, diz Carmen. Está aí uma grande dica para os moradores da Brás que estão precisando de um animal de vigia, ou então, um segundo melhor amigo.
Pet shop pode ser uma oportunidade de negócio Fabrício Preto Houve um tempo em que pet shops eram privilégio de poucos. Hoje, essas lojas estão espalhadas por todos os lugares, com preços mais acessíveis e uma grande opção de produtos. Na Vila Brás, percebe-se a oportunidade de negócio que espera por se
concretizar. Jonas Loreni Consul, 48 anos, é o dono da Agropecuária Consul, que vende alguns produtos para animais de estimação. O proprietário diz que muitos clientes procuram por serviços como banho e tosa para cães. Jonas já buscou informações para abrir uma pet shop junto à sua loja. Porém, diz que muitas são as exigências,
impedindo a abertura desse negócio no momento. Para Tatiana Dumke, 32 anos, a falta de um estabelecimento faz os clientes irem para o centro da cidade. Tatiana é moradora da Vila Brás e esteticista de uma pet shop no Bairro Rio Branco. Segundo ela, as pessoas estão se preocupando cada vez mais com
os animais. “Cuida bem do meu filho” é a orientação que diz sempre ouvir daqueles que procuram a loja. Com apenas quatro meses de funcionamento, já contabiliza mais de 150 fregueses. Também lembra que, para exercer a profissão, é necessário fazer curso técnico. “Gosto muito dos animais. Meu sonho é ser veterinária”, diz Tatiana.
São Leopoldo, outubro/novembro de 2010
vilabrás
Enfoquinho
Produção e desenhos: Eduardo Herrmann
Jogo dos sete erros
Raios-X Salada: provando e analisando o lanche Rogério Bernardes
N
a última edição do Enfoque Vila Brás, mostramos que a lancheria Bom Gosto, localizada na Avenida Leopoldo Wasun, vendia um xis salada por apenas R$ 3,00. Agora, eu, Rogério Bernardes, vou provar, dar meu parecer sobre o tão falado lanche e dizer se, além de barato, ele também é saboroso. Na hora do pedido, expliquei
para a proprietária, Eva Buratti, que, ao fazer esta matéria, teria que ser honesto e, se não gostasse do lanche, iria publicar assim mesmo. Sempre atenciosa e tranquila, Eva teve confiança em seu trabalho. “Pode provar e falar se realmente gostou. Mas acho que você vai gostar”, disse ela. Fiz o pedido do xis tradicional, com tudo ao que tinha direito. Em cinco minutos o lanche estava pronto.
Pedi garfo e faca para a degustação. No início, o primeiro ponto positivo. O xis era feito com pão salgado, de minha preferência. Outra coisa que me chamou a atenção foi o tamanho, pois imaginava, pelo preço baixo, um lanche relativamente pequeno, o que não se confirmou. No recheio, um ovo, bife, milho, ervilha, tomate, queijo, presunto e alface, acompanhados de catchup, mostarda e maionese.
Com Z ou com S? Sabrina Schonardie A Vila já tem mais de 40 anos de existência, mas, mesmo depois de tanto tempo, existe uma questão ainda não resolvida: a final de contas, como se escreve o nome dela? Dos 30 moradores entrevistados, 16 disseram que a escrita correta deve ser “Brás”. Já 14 moradores acreditam que o certo seria com “Bráz”, com “z” no final. No primeiro livro de registro da Associação de Moradores, datado de 7 de maio de 1988, está escrito “Bráz”. Porém,
na própria fachada da Associação, o nome da vila está pintado com a letra “s”. “Até hoje ninguém sabe o certo. Acho que está errado na fachada da associação. O certo é com ‘z’”, opina Luciano Borba Machado, secretário do órgão. Maria Gorete Bráz, neta de João Bráz, fundador do bairro, pensa que deveria ser com “z”. “O meu sobrenome é escrito com ‘z’ e acento no ‘a’”, explica. Melissa Santos Fortes, professora de linguística da Unisinos, acredita que o correto seria “Bráz” com
Na primeira garfada, pude comprovar que o xis, além de ter um preço baixo, é muito saboroso e bastante nutritivo, servindo tranquilamente como uma refeição completa. Mas lembre-se: por ter muitas calorias, esse tipo de comida pode fazer você aumentar de peso e sua saúde correr riscos, caso coma diariamente. Portanto, use o bom senso e se delicie com esse xis bom e barato.
Resposta dos Sete Erros “z”. “Se o nome original é ainda usado oficialmente e também pela comunidade que já reside, entendo que se deva optar pela grafia original. Caso contrário, se deverá descobrir qual é a grafia tornada oficial para o nome da localidade, já que se trata de um nome próprio”, explica a professora. O problema é que não há uma definição nem por parte dos órgãos oficias, já que os moradores recebem suas contas com o nome grafado das duas formas.