Biblion #8 (PT)

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Revista de Livros, Livros em Revista

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PUBLICAÇÃO DE INSPIRAÇÃO CRISTÃ | Nº 8

Ele ressuscitou! MARTIN LUTHER KING, JR.

ANASTASIOS KIOULACHOGLOU

OSMAR LUDOVICO

FRANCIS SCHAEFFER


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EDIÇÃO Nº8


BEM-VINDOS

EDITORIAL W W W . B I B L I O N . P T

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Revista de Livros, Livros em Revista

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Tempo de Celebrar

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PUBLICAÇÃO DE INSPIRAÇÃO CRISTÃ | Nº 7

Ele ressuscitou!

C A PA :

RISEN MARTIN LUTHER KING, JR.

ANASTASIOS KIOULACHOGLOU

OSMAR LUDOVICO

FRANCIS SCHAEFFER

DESIGN: DA N I E L G O M E S

Revista de Livros, Livros em Revista

Edição VIII Abril / Maio / Junho 2018 COLABORAM NESTA EDIÇÃO: Daniel Gomes, Susana Pires, Vitor Marini (Ilustrações), Samuel Ascenção (apoio à Produção)

FICHA TÉCNICA

email: mag@biblion.pt web: www.biblion.pt

PROPRIEDADE: Unique Creations, Lda. REDAÇÃO: Tv. Francisco dos Santos, 2-6ºD 2745-271 Queluz REGISTO: Dep. Legal Nº 405423/16 NIPC nº 510951910 ISSN: 2183­-7899

EDIÇÃO: BIBLION MEDIA by Unique Creations EDITOR E DIRECTOR: Paulo Sérgio Gomes DESIGN E PROJETO GRÁFICO: UC Design Studio

MISSÃO / PROPÓSITO: Promover e estimular hábitos de leitura de inspiração Cristã, criando condições para todos poderem aceder aos livros. Conheça o que nos move e os nossos valores em www.biblion.pt. CONTEÚDOS: Os conteúdos apresentados representam a opinião dos seus autores. REPRODUÇÃO DE CONTEÚDOS: Tendo como objectivo primordial a divulgação de obras e autores, é permitida a reprodução dos textos, desde que mencionada a fonte, quando não para fins comerciais. PREÇOS E DISPONIBILIDADE: Os valores mencionados incluem IVA. Os produtos apresentados estão sujeitos a disponibilidade de stock aquando da encomenda.

Numa época em que celebramos a morte e ressurreição de Jesus Cristo, baseamos na abordagem do conhecido autor Tim LaHaye ao desaparecimento do Seu corpo como uma evidência fundamental para provar a Sua existência e divindade. Neste mês de Abril, ao dia quatro, decorrem cinquenta anos da fatídica manhã em que esse personagem notável – Martin Luther King Jr. – foi assassinado. Nesta edição, vamos conhecer os acontecimentos históricos que marcaram a sua vida e quão grande impacto tiveram para o fim da segregação racial. Na entrevista que nos concedeu em exclusivo, Anastasios Kioulachoglou, autor grego que vimos apresentar aos nossos leitores, fala-nos como aprendeu no meio da luta que é a vida cristã, que o “caminho é estreito e a porta pequena.” Constituirá uma surpresa agradável conhecer a história e a obra deste autor que, há mais de 20 anos, criou um ministério no seio da comunidade estudantil na Universidade de Leicester, onde terminava a sua tese de doutoramento. Esse embrião de partilha da Palavra de Deus desenvolveu-se e consolidou-se numa publicação – o Journal of Biblical Accuracy, que é hoje traduzida em 18 línguas. Mais uma vez, é enriquecedor e gratificante para a Biblion podermos trazer temas de inegável relevância aos nossos leitores. Uma Santa Páscoa, e boas leituras! PAU L O S É R G I O G O M E S

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Í ndice

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ESCOLHA DO EDITOR inspiratio osmar ludovico

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Em destaque

anastasios kioulachoglou Entrevista • As Advertências do Novo Testamento • O Dízimo, a Doação e o Novo Testamento

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efeméride

Martin Luther King, jr. A Biblion celebra o 50º aniversário da morte de Martin Luther King, Jr. com o livro Eu Tenho Um Sonho.

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filosofia

a morte da razão A história da filosofia medieval e moderna pelos olhos de um dos mais conceituados pensadores cristãos do último século.

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Jesus

o garante de autenticidade Um artigo inspirado na obra de Tim LaHaye, Um homem chamado Jesus.

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Ficção

a utopia livre Uma das obras de ficção mais aclamadas por todo o mundo está agora disponível gratuitamente.

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outras ediç õ es

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Q uem S omos

CONHEÇA A NOSSA REVISTA

Quem Somos A Biblion é uma revista digital de distribuição gratuita e produção trimestral que visa promover a literatura cristã e o hábito de leitura. Criada em 2016, a Biblion é uma iniciativa da editora Unique Creations que conta com a participação de colaboradores residentes e convidados. Atualmente a revista encontra-se na sua 7ª edição, com as versões Digital (Issuu) e Interativa (Joomag) disponíveis em Português (EU) e Inglês (US).

O Que Fazemos Reviews de livros considerados benéficos para a edificação intelectual e/ou espiritual do leitor; Entrevistas a autores, pastores e personalidades envolvidas com o desenvolvimento e divulgação da literatura cristã; Crónicas relativas a temáticas éticas e religiosas; Produção de conteúdos próprios; Divulgação de literatura cristã e de interesse geral; Promoção de hábitos de leitura para todas as idades.

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Q uem somos

A Nossa Missão Promover a literatura cristã e a produção de livros de inspiração cristã em Português de Portugal; Estimular a publicação de obras de autores nacionais; Incentivar a prática do “preço justo” e tornar a leitura acessível às condições económicas de todos; Promover hábitos de leitura salutares; Acolher o diálogo saudável entre perspetivas diferentes.

Como Você Pode Ajudar Subscreva a Biblion na Joomag e na Issuu para não perder nenhuma edição da revista! Descarregue a aplicação BiblionApp e mantenha-se atualizado! Classifique os nossos artigos em www.biblion.pt e deixenos o seu feedback!

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escol h a do editor

i n s p i r at i o O smar L udovico E d i to r a M u n d o C r i s tão

p o r Pau l o S é r g i o G o mes

Mentor. Conselheiro. Diretor espiritual. Osmar Ludovico é muito considerado entre quem se inspira no seu ensino, como os autores Ed René Kivitz, que prefacia a obra, e Maurício Zágari, o editor, que o apelida de pensador piedoso. Depois de O Caminho do Peregrino, escrito em parceria com Laurentino Gomes, e Meditatio, um hino à intimidade com Deus, eis que surge o seu terceiro livro - Inspiratio. Não se assumindo como escritor, Osmar revela-se num manifesto exemplar (anti-credo), aquilo por que pauta a sua consciência e caráter. Fiel ao recolhimento e contemplação, ao discreto serviço em comunidade, à partilha de amizades e afetos. Através de Inspiratio, com o duplo sentido de fonte de criatividade, e indispensável ação respiratória vital à vida, somos estimulados a uma busca profunda pela espiritualidade, vincada na simplicidade, oração, silêncio, meditação. Este livro de reflexões está dividido em quatro temas: Deus, Igreja, Fé e Sociedade, e Espiritualidade. Em Divinitatis, descobrimos a grandiosi8

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dade do amor de Deus no nosso meio, enquanto em Ecclesia sobressai o legado de esteios do cristianismo que ajudaram a perpetuar o movimento encetado por Jesus ao longo de dois milénios. No capítulo Fide et Societas são abordados temas que tocam a cada um de nós: dinheiro, casamento, adoração, entre outros. Para o final, Osmar Ludovico reservou Spiritus, onde a sua intimista compaixão torna-se evidente, convidando o leitor à imersão contemplativa para ouvir a voz de Deus, lendo a Bíblia, expondo a nu toda a sua vulnerabilidade e levando ao arrependimento e devoção a Ele.


BÍBLIA SAGRADA NA JORNADA COM CRISTO Do grego koinonia deriva a palavra “comunhão”, que Ludovico salienta não se tratar de um mero ajuntamento no templo de pessoas que partilham um contexto social e cultural comum, nem pensar que se cinge à comunhão mística entre membros do Corpo de Cristo. Para estar presente, conhecer o outro e desenvolver uma real amizade espiritual – para viver a verdadeira koinonia bíblica – é necessário tempo, tolerância e amor. A respeito da espiritualidade clássica (pré-Reforma), o autor refere que o Espírito Santo se manifestou durante os primeiros mil e quinhentos anos da história da Igreja através da “contribuição de santos e doutores da Igreja nos movimentos da patrística, do monasticismo e da mística medieval”. É tal o interesse na espiritualidade clássica que destacados pensadores contemporâneos, como Hans Burki, James Houston ou Eugene Peterson, entre os evangélicos, ou Thomas Merton, Henri Nouwen ou Anselm Grün, entre os católicos, procuram resgatar o que essa tradição tem de bom e integrá-la na busca espiritual dos dias de hoje. Ao invés de uma “prática mística e alienante, (…) a ênfase no silêncio, na solitude, na meditação e na contemplação não é um fim em si mesmo, mas um meio para uma vida de santidade e de serviço ao próximo. Com a lectio divina, nós evangélicos, podemos resgatar leitura bíblica com o coração!”

Textos profundos, mas de fácil compreensão, sobre as principais doutrinas da fé cristã. Publicação cuidadosamente pensada para fornecer ferramentas que ajudem o cristão a desenvolver-se espiritualmente e intelectualmente nas coisas de Deus, conta com uma série de estudos e reflexões para que o leitor possa compreender as Escrituras com mais profundidade e clareza. De fácil leitura e entendimento, com tradução da Nova Versão Transformadora (NVT), em português do Brasil, é ao mesmo tempo devocional e teológica, prática e teórica. Com diversos recursos especiais, a secção central, intitulada “Na jornada com Cristo”, contém 28 textos cujo intuito é proporcionar entendimento das doutrinas básicas da fé cristã. A secção “Encontros com Deus” destaca lições de vida extraídas da experiência que 22 personagens bíblicos tiveram com Deus. Já a secção “Desafios da jornada” reúne 22 artigos com alertas e orientações para preparar o leitor sobre o que o espera na sua caminhada de fé. Cada um dos 66 livros da Bíblia recebeu uma introdução que esclarece o cenário do livro e apresenta um resumo da sua mensagem dentro do contexto maior das Escrituras. No final de cada livro, há uma oração e algumas perguntas para reflexão pessoal ou em grupo. Inclui ainda uma timeline com a ordem cronológica dos principais eventos bíblicos, uma sugestão de plano anual de leitura da Bíblia e mais de quatro mil notas de rodapé. Um estudo prático, com aplicações concretas nas questões da vida quotidiana, sem perder tempo com superficialidades, faz dela uma ferramenta valiosa para recém-convertidos e para pessoas mais experientes. Elaborada para cristãos de todas as denominações, linhas doutrinárias e crenças teológicas, a Bíblia Sagrada Na Jornada com Cristo é um instrumento que estimula o crescimento e o fortalecimento na vida espiritual.


ANASTASIOS KIOULACHOGLOU E m Desta q u e

Conheça o autor e economista grego responsável pela criação de um dos mais antigos fóruns online dedicados ao estudo da Bíblia, o “Journal of Biblical Accuracy”, que ainda hoje continua a espalhar as boas novas por todo o mundo.


a Entrevista com Anastasios Kioulachoglou B: Nas últimas duas décadas você desempenhou um papel vital no Journal of Biblical Accuracy, um projeto que chega a dezenas de universidades e milhares de pessoas. Como é que tudo começou? Esperava que viesse a crescer e a durar tanto? AK: Tudo começou em 1995. Eu estava a estudar para o meu doutoramento em Leicester, no Reino Unido. Estava bastante envolvido com a União Cristã da universidade e tinha começado pequenos grupos na minha casa onde eu ensinava a Bíblia, concentrando-me nas bases. Ainda que tivesse apenas cinco pessoas a assistir, para mim tudo isto era muito importante. Naquela altura eu tinha tempo, uma vez que estava quase a terminar a minha tese e encontrava-me completamente absorvido por esta comunidade. Pensei em passar para o papel aquilo que partilhava, para que o pessoal tivesse algo escrito quando nos fossemos embora no fim do ano lectivo. Mas aquilo que eu escrevia começou a circular pelos estudantes que por sua vez me pediam mais cópias. Em breve tinha trinta alunos na minha lista de contactos a quem dava uma cópia cada vez que escrevia. Era óbvio que algo consistente estava a crescer, ainda que não tivesse nome nem forma. E depois, aconteceu o seguinte em Janeiro de 1996: eu fui imprimir mais algumas cópias, e quando fui buscar uma das cópias à impressora, reparei num bocado de papel com um endereço de email. Deus nos fala muitas vezes, normalmente através da Sua segurança reconfortante ou da Sua voz serena. Mas por vezes a Sua voz é enfática, clara e inconfundível. Tu sabes quando o ouves e isso não é nenhum equívoco. Isto aconteceu-me

Anastasios "Tassos" Kioulachoglou

bio do autor • Nascido em 1969, na Grécia, • Aceitou Cristo como salvador na cidade de Tessalónica, em 1991, • Funda o Journal of Biblical Accuracy em 1996 durante o seu doutoramento, na Universidade de Leicester, • Trabalha no ramo das finanças e gestão, • Escreveu grande parte das suas obras nas viagens de comboio para o emprego, • É casado e tem três filhos.


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umas quatro ou cinco vezes em toda a minha vida. Uma dessas vezes foi naquela manhã. Quando vi aquele papel, a minha mente só pensava na seguinte frase: “põe os artigos na Internet!”, “põe os artigos na Internet!”. O mais engraçado é que eu não fazia ideia do que era a Internet! Talvez já tivesse ouvido a palavra numa ocasião mas não fazia ideia do que era realmente. Lembra-te que estamos no início de 96. Até aquela altura eu tinha enviado um ou dois “emails” só para experimentar. Eu nunca tinha visitado uma página da “Web” até então! Tendo esta ordem bem clara na minha mente eu fui imediatamente à assistência da sala de computadores na universidade e perguntei “como é que se põe uma coisa na Internet”? Então um rapaz muito gentil sentou-se comigo à frente de um computador e mostrou-me os “newsgroups” (Usenet), algo parecido com fóruns onde eu podia fazer posts, e ele levou-me diretamente aos fóruns cristãos. Em 24 horas eu estava a enviar material a estes grupos. Imediatamente comecei a receber subscrições de todo o mundo via email. Na mesma noite eu decidi que ia haver uma revista com o nome Journal of Biblical Accuracy (“rigor bíblico”, sendo esse o tema em que 12 EDIÇÃO Nº8

estava focado naquela altura). Em dois meses eu tinha cem subscritos, mas não tinha uma página da web. Foi aqui que um subscritor do Mississippi (EUA) se ofereceu para montar uma página da web para mim, o que ele fez com muita amabilidade. O endereço tinha meio metro de comprimento mas funcionava; eventualmente eu obtive o meu próprio domínio. O que começou naquele mês de Janeiro existe hoje em dezoito línguas, tem cerca de seis milhões de visitas por ano e perto de oitenta mil subscritos. Nunca esperei que se tornasse tão grande mas calculava que manter o projeto ativo seria uma luta. Ao mesmo tempo tinha decidido que iria lutar, pois eu o considerava um dos meus mandatos nesta terra. B: Compreendo que se tornou um cristão há quase trinta anos, num pequeno grupo de Tessalónica. Pode-nos dizer mais acerca desta transição e do impacto que teve na sua vida? AK: Sim, isto foi em 1991. Eu tinha um passado e uma educação cristãs enquanto criança, mas durante a minha adolescência eu tornei-me agnóstico. No meu interior eu andava à procura da verdade. Eu sempre fui alguém que busca a verdade. Algures


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em 1991, eu enfrentei uma grande crise que me fez curvar e clamar a Deus: “Se Tu existes, manifesta-Te a mim.” Na mesma semana o meu melhor amigo do trabalho falou-me de um grupo cristão e convidou-me a aparecer lá. Isto não era como os estritos grupos religiosos da Igreja Ortodoxa grega que eu conhecia e detestava. Pelo contrário, aqui as pessoas vestiam-se normalmente e o Deus que proclamavam era um Pai que amava o homem e se interessava por ele. Eles diziam que a Bíblia tinha poder. Por isso quando eu li, “pede e ser-te-á dado” eu pensei: “vamos lá ver isso”. Nas semanas seguintes Deus mudou a minha vida, interna e externamente! Era como se Ele estivesse a ouvir tudo o que eu dizia e se importasse com isso! Como diz a Bíblia: “vós haveis experimentado que o Senhor é bom” (1 Pedro 2:3). É assim que Deus muitas vezes nos atrai a Si mesmo. E isto eu nunca esquecerei. Eu já passei por tempos bem difíceis em que Deus não parece estar em lado nenhum. Meses e anos no deserto. Nessas alturas eu voltava-me para os primeiros dias e para os milagres que Deus tem feito na minha vida, e aí eu encontro o meu refúgio. Andar com o Senhor nem sempre é fácil. Irá haver perseguição,

até dos próprios cristãos. Não nos esqueçamos que “o caminho é estreito”. Ao mesmo tempo Deus não nos deixa nem nos abandona. Como eu fiquei a saber: a vida é dura, por vezes muito dura, mas Deus é bom. Ambas as coisas são verdadeiras! B: Você diz que é um economista por educação com vários anos de experiência no ramo. Como é que consegue conciliar o emprego com o trabalho da JBA e com a sua família? AK: É tudo um desafio. Sempre foi assim. O meu último livro foi escrito no comboio que apanho para o escritório. Basicamente, tudo o que fiz nos últimos anos foi feito no comboio e de madrugada. Até 2004, eu ainda gozava do fim-de-semana inteiro. Há vinte anos, quando estava na tropa, eu andava com uma torre de computador (ainda não haviam portáteis naquele tempo) na minha bagagem e enviava artigos de cibercafés primitivos. Com as obrigações familiares as coisas tornaram-se ainda mais complicadas, mas é mesmo assim. De qualquer forma, eu sou apenas um de milhões de entre o povo de Deus. Se não tiver tempo de escrever por causa do meu emprego ou da minha família, outra pessoa o fará. Assim é no Corpo!

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B: O que o levou a escrever um livro? Planeia escrever mais algum? AK: Algures em 2008 eu deixei de escrever mensagens relativamente pequenas baseadas num tema para escrever sobre certos “fardos” que carregava. Considero o meu último livro, As Advertências do Novo Testamento, o mais importante que já escrevi. Era algo que já carregava seis ou sete anos antes de escrever o livro. Por vezes o tópico está no meu coração durante anos até que eu pegue no teclado e escreva sobre o assunto. B: O que é que o futuro tem reservado para o JBA? AK: Não tenho bem a certeza. Eu acabei de sair de um teste tremendo, do qual eu te falarei numa próxima vez. Eu aprendi muito com isto e creio que eventualmente será posto em escrita. Sobre o que é que será? Mais do caminho estreito e da porta apertada. Mais da perseguição e da aflição por causa da Palavra. Nós cristãos somos chamados a andar pelo caminho estreito e a não desistir quando somos perseguidos. É este o paradoxo em que vivemos: uma vida cheia do poder e do amor de Deus e ao mesmo tempo uma vida com muitas aflições, embora também haja libertação aí. A minha mensagem para os irmãos é: não 14 EDIÇÃO Nº8

percam a vossa coragem. Continuem. Corram a corrida da fé com paciência e não olhem para trás. Corram até ao fim! Corram não importa o que se levantar contra vocês. A fé é uma viagem. Ela vai vos levar a lugares onde vocês não querem estar e ela pode-se tornar muito diferente daquilo que vocês tinham em mente que era. Lembrem-se no entanto que Deus está no controlo mesmo quando tudo parece estar fora de controlo. Vamos nos certificar de que continuamos a correr para que no fim possamos dizer o que Paulo disse: “combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé. Agora me está reservada a coroa da justiça, que o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amam a sua vinda.” (2 Timóteo 4:7-8)


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A s A dv e r t ê n c i a s d o N ov o T e s ta m e n to A nastasios K ioulac h oglou

p o r Dan i e l G o mes

“Pode o cristão abandonar a fé?” É uma das questões mais importantes na soteriologia (“estudo da salvação”) cristã, que divide estudiosos e teólogos desde o tempo de Agostinho de Hipona. A sua mera discussão originou uma das disputas mais cismáticas da Igreja Protestante – o debate calvinista-arminiano – cujos efeitos persistem entre os intelectuais cristãos até hoje. Como se quisesse acabar com o debate de uma vez por todas, Anastasios Kioulachoglou defende a ideia de que os cristãos podem de facto abandonar a fé, apresentando um vasto número de passagens do Novo Testamento que visam apoiar a sua posição nesta obra. Embora o seu título pareça algo vago, o livro faz-lhe toda a justiça: As Advertências do Novo Testamento é uma obra dura que não aceita desculpas. Do princípio ao fim, o livro é uma derradeira investida de passagens do Novo Testamento apelando ao ponto do autor, de que “uma vez salvo” não significa “para sempre salvo.” A escrita sincera e sucinta de Kioulachoglou é bastante evidente nesta obra, com o autor perdendo pouco tempo com postulações e teorias teológicas, 16 EDIÇÃO Nº8

preferindo apoiar-se diretamente no cânone bíblico. Ele expõe as condições para a salvação como foram estabelecidas na Nova Aliança no primeiro capítulo: “A salvação é dada livremente, por meio da graça, como um presente para todo aquele que crê em Jesus Cristo como seu Senhor, O Messias, O Filho de Deus.” A partir daí, Kioulachoglou cita um número impressionante de passagens que apoiam a sua premissa de segurança condicional, assim como excertos de


comentários da Bíblia (em particular o de Albert Barnes). O autor tem também o cuidado de mostrar o significado e contexto originais de certos termos relevantes que estão presentes em algumas destas passagens; após oferecer todos os indícios bíblicos que apoiam a possibilidade de abandonar a fé, Kioulachoglou conclui o seu livro ao abordar as objeções mais comuns que ele encontrou ao ensinar esta perspetiva da salvação. A análise de Kioulachoglou sobre apostasia e recaída em As Advertências do Novo Testamento condensa provas com persuasão. Em vez de se emaranhar com a história e as opiniões polarizadas sobre estes dois temas, o livro dedica-se de forma inabalável a dizer as coisas “como elas são”, a mostrar como Jesus e os Apóstolos viam o abandonar a fé e as suas graves consequências. Esta obra está disponível gratuitamente em formato PDF no site do Journal of Biblical Accuracy, enquanto que as versões eBook e impressa podem ser adquiridas na Amazon.

APOSTASIA EM TOUGH TOPICS A perda da salvação e apostasia estão incluídas nos Tough Topics de Sam Storms, que toma a posição calvinista de segurança eterna. Storms baseiase fortemente no conceito de eleição incondicional dos santos predestinados de acordo com Romanos 8, assim como nas palavras de Jesus em João 6, para provar que é impossível “perder” a salvação. O teólogo também usa João 10, Filipenses 1:6 e Judas 24-25 para sustentar o seu argumento – passagens abordadas por Kioulachoglou como algumas das objeções mais comuns com que se deparou. Por sua vez, Storms afirma que Hebreus 6 e 10 – duas passagens que Kioulachoglou apresenta como “advertências” – não defendem a possibilidade de apostasia, dedicando uma secção do seu livro a este argumento: “ao passo que todos os cristãos são inspirados, nem todos os que são inspirados são cristãos” (tradução livre). Kioulachoglou responde ao apresentar o comentário de Albert Barnes sobre Hebreus 6, que defende a posição do autor grego. Como foi esclarecido na introdução deste review, o tema da apostasia é divisivo. A possibilidade da sua execução e as suas consequências têm sido discutidas ao longo de várias décadas, sem um fim definitivo à vista. Dito isto, este não é um tema para ser ignorado; é certo que um estudo das obras dos dois autores será interpretado de maneiras diferentes por pessoas diferentes – e isso não tem mal desde que os crentes não ponham de lado o amor fraterno que é suposto partilharem uns com os outros.


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O D Í Z IMO , A DOAÇ ÃO E O NOVO TESTAMENTO A nastasios K ioulac h oglou

p o r Dan i e l G o mes

A primeira obra de Anastasios Kioulachoglou, intitulada O Dízimo, a Doação e o Novo Testamento, analisa o conceito cristão de dar e debate a prática do dízimo – uma prática da lei judaica – e o seu lugar entre cristãos batizados. Ah, o dinheiro. Nunca deixa de ser um tema sensível, não é? Porém Kioulachoglou, economista de profissão, não tem receios. No seu estilo cru e incisivo, o autor Grego afirma exatamente aquilo que o Novo Testamento tem para dizer sobre o dinheiro e a sua gestão; para isso, ele começa a sua primeira obra ao abordar uma das práticas presente na Igreja moderna mais conhecidas – o dízimo. Apoiado por um número surpreendente de passagem bíblicas, Kioulachoglou conclui que o dízimo faz parte da lei de Moisés circunscrita ao povo a quem a lei foi dada – os judeus – e que um paralelo da mesma prática não deve ser imposto a quem está fora do alcance da lei, isto é, os

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cristãos. Em vez de considerar se deve dar 10% dos seus ganhos brutos ou líquidos, o cristão deve ter em mente o que o Novo Testamento realmente requer: dar de forma generosa e consciente. O autor apresenta vários exemplos do que é a dádiva genuína no Novo Testamento; ela é uma dádiva que abençoa, que é voluntária, e que não é necessariamente material. Kioulachoglou também dedica uma parte da sua obra à realidade das finanças da Igreja moderna, oferecendo a sua opinião no papel dos cristãos no apoio aos salários do staff das igrejas, aos missionários e às viúvas a partir dos ensinamentos bíblicos do Novo Testamento. Ele condena a forma de gestão financeira prevalente


nos nossos dias: “Por que nós pegamos o que normalmente iria para os santos pobres e para as missões para aumentar o reino de Deus e damo-lo para manter estruturas e tradições que são estranhas à Palavra de Deus?” Ele desafia o leitor a colocar as questões difíceis, mas para o fazer em amor e com o desejo sincero de aperfeiçoar o corpo de Cristo. O Dízimo, a Doação e o Novo Testamento é uma obra breve mas poderosa. Ela consegue mostrar o prazer de Deus em dar genuinamente ao desafiar uma antiga (e incompreendida) tradição da Igreja. Tal como a segunda obra de Kioulachoglou, As Advertências do Novo Testamento, este livro está disponível como um PDF gratuito no site do Journal of Biblical Accuracy, enquanto a sua versão impressa e versão eBook podem ser adquiridas na Amazon.

O DÍZIMO EM TOUGH TOPICS O último tema no primeiro volume da série Tough Topics de Sam Storms é exatamente o dízimo. Aqui, para variar, Storms e Kioulachoglou parecem estar do mesmo lado do debate: ambos concordam que o dízimo não pode ser exigido do cristão. No entanto, Storms defende que o dízimo como uma prática voluntária do crente tem o seu lugar na Igreja de hoje, desde que respeite os critérios de Deus no que toca a uma dádiva genuína. O teólogo defende também que os cristãos têm a responsabilidade de serem “generosos com as suas riquezas” (p. 319, tradução livre), mas reconhece que tal responsabilidade não pode ser tomada de má vontade ou com remorso, o que alinha com a postura de Kioulachoglou do dar verdadeiramente como algo generoso e voluntário.


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Eu tenho um sonho M artin L ut h er K ing , Jr . E d i to r a B i z â n c i o

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A vida de Martin Luther King Jr. confunde-se com a luta contra a discriminação racial, que experimentou ainda em tenra idade. Embora os pais tivessem transmitido valores exemplares de cidadania e dignidade, o sistema vigente onde vivia, no Sul dos Estados Unidos, reprimia a todo o custo a população Negra, e ele cedo se rebelou contra isso. As restrições eram uma obsessão das autoridades. “Em Atlanta, uma criança negra não podia ir a nenhum parque. Eu não pude frequentar as chamadas escolas para brancos. (…) Não podia entrar num restaurante para comer um hambúrguer ou tomar um café. Havia um ou dois cinemas para Negros…” Pensava consigo mesmo, “Um dia destes vou pôr o corpo onde tenho o espírito”. A formação de King deu-lhe oportunidade de evoluir a sua orientação intelectual, com alguns dos melhores professores, estudando correntes filosóficas, identificando-se com as teorias dos maiores líderes mundiais, preparando-se para uma função única na história da humanidade. 20 EDIÇÃO Nº8

Passou as férias de Natal de 1949 a ler Karl Marx, tentando perceber a atração que o comunismo exercia sobre tanta gente, mas foi por Gandhi que ficou fascinado ao escutar o testemunho do Dr. Mordecai Johnson, acabado de regressar de uma viagem à Índia, onde falou sobre essa figura notável, cuja abordagem pacífica ao amor e à não-violência veio a servir de exemplo para a reforma social que há tanto tempo procurava implementar. “Gandhi foi provavelmente a primeira pessoa da história a elevar a ética de Jesus acima da mera interação entre indivíduos, fazendo dela uma poderosa e eficaz força social em larga escala. O amor, para Gandhi, era um


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potente instrumento de transformação social e coletiva.” Mahatma Gandhi serviu de inspiração aos Negros de Montgomery a empreender um movimento social de grande dignidade. Enquanto Jesus os inspirou a servirem-se do amor como arma criativa nas ações de protesto, ao juntarem o método de não-violência de Gandhi à doutrina cristã do amor, conceberam a mais poderosa arma ao seu dispor na luta pela liberdade. O Movimento de Montgomery desencadeia-se na sequência da recusa de Rosa Parks se levantar no autocarro para dar o seu lugar a um passageiro branco. Foi presa, e em sua defesa Martin Luther King acaba por proferir o discurso mais decisivo da sua vida. Ali teve início o processo mobilizador que viria, muitos anos e mortes depois, a culminar no fim da segregação racial. O boicote aos autocarros de Montgomery (onde existia uma lei anti-boicote!), durou treze semanas, ao longo das quais, os seus habitantes Negros andavam a pé, sacrificialmente, sendo intimidados, perseguidos e presos por não utilizarem os transportes públicos. Arquitetando um engenhoso sistema de transportes alternativos e improvisando, os aderentes ao boicote alimentaram a revolta até à vitória.

Um conteúdo único Esta obra tem um valor acrescido ao transcrever as mais importantes alocuções e mensagens escritas de Martin Luther King, algumas na íntegra, desde a sua participação num concurso de oratória, que ganhou com apenas 14 anos, até ao seu último sermão. Para leitores interessados em aprofundar o seu conhecimento sobre esta figura notável, entre muitos outros conteúdos, vão poder encontrar: •

Primeiro sermão como ministro da Igreja Baptista da Avenida Dexter, em Atlanta

No arranque do Movimento de Montgomery (caso Rosa Parks) fez, apesar de improvisado, o discurso mais decisivo da sua vida.

Sermão sobre Mahatma Gandhi.

Durante o Movimento de Albany, no verão de 1962, os Diários da Prisão, e telegramas enviados ao Presidente Kennedy.

A Carta da Prisão de Birmingham, dirigida a 8 eclesiásticos, de diversas confissões religiosas, que criticaram as manifestações e o extremismo das ações.

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Um conteúdo único (cont.) •

Discurso “Eu tenho um sonho”, na Marcha Nacional sobre Washington.

Comunicações de pesar pelo assassinato de 4 meninas negras durante a aula de Escola Dominical da Igreja da Rua 16, em Birmingham, assim como após o assassinato do Presidente Kennedy.

Discurso de aceitação do Prémio Nobel da Paz, de 1964, e na Conferência da Universidade de Oslo.

Várias alocuções relacionadas com os acontecimentos de Selma, Alabama, e a Campanha de Chicago.

Apelos contra a Guerra do Vietname

Campanha dos Pobres e marcha sobre Memphis

Derradeiro sermão no Templo do Bispo Charles J. Mason, em Memphis, um dia antes da sua morte.

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No final de 1956, o Supremo Tribunal declara como sendo inconstitucionais as leis de segregação nos autocarros. Com a sua ação na liderança do movimento, King começou a ser conhecido como “um negro novo e corajoso”. Montgomery contribuiu com uma nova arma para a revolução dos Negros, um instrumento social da resistência não-violenta. Revelou ao mundo uma pessoa com quem os Brancos tinham de contar e a quem tinham de respeitar, mesmo contrariados. Alguém que os Negros admiravam, que largou a “passividade paralisadora e complacência entorpecente”, emergindo com um novo sentido de dignidade e destino. O novo e corajoso Negro de Montgomery adquiriu uma nova determinação de alcançar a liberdade e a dignidade humana, apesar do elevado preço. Segue-se, em 1960, o Movimento dos Sit-Ins nas cafetarias, uma galvanizante mobilização de estudantes Negros que alastrou às escolas e townships do Sul dos Estados Unidos, com a ocupação de cafetarias (“sit-ins”) e outras manifestações, que deram à América um exemplo brilhante de ação não-violenta, disciplinada e digna contra o sistema de segregação instituído.


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Ao longo de mais de 400 páginas, o livro prossegue, baseado em textos e conteúdos originais, reais e verídicos, descrevendo minuciosamente os eventos marcantes no processo de luta pelos direitos civis da população negra, sob a liderança abnegada do Reverendo King. A narração das campanhas de Birmingham e Chicago, das Marchas de Selma e Washington, do envolvimento com Malcolm X e do Black Power, das conversas com Presidentes Americanos – Kennedy, Johnson, Nixon; episódios passados nas inúmeras passagens pela prisão;

relatos da vida familiar, que apesar de limitados, eram fulcrais para a sua motivação. Até ao completo teor do seu derradeiro sermão, na véspera do seu assassinato, que aconteceu em Memphis, a 4 de Abril de 1968. “Não sei o que vai acontecer, para mim já não importa, já cheguei ao cume da montanha, olhei lá de cima e vi a terra prometida. Pode ser que não a alcance convosco. Mas quero que saibais esta noite que o nosso povo há-de alcançar a terra prometida.” (p. 397, Martin Luther King, extraído do seu último sermão.)

Uma obra imperdível Clayborne Carson, como diretor dos Arquivos de Martin Luther King Jr., é um profundo conhecedor da gigantesca quantidade de documentos que constituem o seu acervo. Com naturalidade foi convidado pelos herdeiros de King para compilar em livro o vastíssimo legado de cartas, mensagens e diários inéditos, incluindo gravações e imagens dos seus sermões e discursos públicos. Foram lidos, escutados e visualizados milhares de documentos e registos, posteriormente alinhados numa narrativa cronológica, histórica e factualmente coerente, na primeira pessoa, conferindo a esta “autobiografia” uma identificação sui generis desse personagem único da história mundial. Como dizia no sermão proferido na véspera do seu assassinato: “Quero que digais, nesse dia [do seu funeral], que tentei amar e servir a humanidade” (p399). E sem dúvida o fez. Mais do que uma autobiografia de Martin Luther King Jr., este é um longo e fundamentado desfiar de acontecimentos históricos da libertação racial conseguida pelos Negros norte-americanos.

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filosofia

a M o r t e da R a zão F rancis A . S c h aeffer E d i to r a V i da N o va

p o r Dan i e l G o mes

O segundo livro na famosa “trilogia” de Francis Schaeffer, A Morte da Razão examina a busca histórica da verdade e do conhecimento nas áreas da filosofia, teologia, artes e ciências. É uma obra curta mas compacta, que permanece atual no séc. XXI desde que foi publicado em 1968. Começando com a visão filosófica de Tomás de Aquino, o célebre teólogo e apologista Francis A. Schaeffer percorre os séculos de desenvolvimentos na filosofia que levaram ao relativismo e a fuga do objetivismo dos nossos dias. Ele critica a distinção tomista entre graça e natureza, que separa as coisas celestes e espirituais (como a “alma”) das coisas terrenas e materiais (como o “corpo”). Schaeffer também culpabiliza a percepção tomista do intelecto humano autónomo – onde a razão encontra-se à parte da fé – por originar, ainda que de forma involuntária, uma teologia natural completamente independente de revelação divina, que depois iria

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evoluir para o humanismo (porém ele reconhece que Tomás de Aquino acreditava que a razão humana e revelação divina estavam sempre sujeitas a concordarem uma com a outra). À medida que a teologia natural autónoma trazia um interesse renovado no Neoplatonismo durante o Renascimento, um novo movimento dentro do Cristianismo procurou unir de novo os campos da natureza e da graça: a Reforma Protestante. Schaeffer afirma que a teologia das Igrejas Reformadas, encabeçada pelas Institutas de Calvino, trouxe o conhecimento unificado que a teologia natural tanto procurava desde os tempos de Tomás de Aquino. Schaeffer explica


como a teologia reformada foi bem sucedida na sua tarefa de providenciar conhecimento unificado (ainda que incompleto), uma vez que apresenta um Deus pessoal e infinito como o ser autónomo no lugar do homem finito, e que junta a graça e a natureza na realidade do homem – uma criatura feita na imagem de Deus mas corrompida pelo pecado da Queda – com Cristo sendo soberano sobre todos os homens, e por conseguinte, sobre a própria graça e natureza. A partir daí Schaeffer continua a examinar a espiral descendente da teologia natural independente da revelação divina: a filosofia iluminista de Kant, Rousseau e outros esgotou o racionalismo, afirma o autor, com o Hegelianismo a ser o último suspiro da busca por conhecimento unificado. O existencialismo de Kierkegaard, afogando-se no desespero e na perda de esperança num conhecimento exclusivamente racional que possa unir o verificável com o inverificável, desiste totalmente da racionalidade, relegando a verdade e o propósito à subjetividade do indivíduo. Na perspectiva de Schaeffer, tudo isto eventualmente resulta no homem moderno: um homem que não mais ambiciona ter um conhecimento unificado – ainda que incompleto – e

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cujo dilema já não é entre a graça e a natureza, mas sim entre o racional e o não-racional. Schaeffer conclui que existe hoje um enorme abismo filosófico entre a Igreja e o homem moderno e que a Igreja deve reconhecer exatamente isso de forma a melhor compreender o próprio homem moderno, ainda que ele alerte para os sinais da dualidade moderna que se estão a infiltrar na teologia unificada do corpo de Cristo. Não se deixe enganar pelo tamanho do livro; A Morte da Razão não é nada menos que provocativo, e dá contas de ser uma daquelas que obras que, nas palavras de Sir Francis Bacon, devem ser “mastigadas e digeridas.” Um tal estudo detalhado no desenvolvimento da epistemologia ocidental é para ser acarinhado por todo o leitor que queira obter um entendimento sólido das bases da filosofia moderna.

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AS PREVISÕES DE SCHAEFFER SÃO REAIS? Talvez o maior golpe de génio de Schaeffer no seu livro não está no que o autor fala em relação ao passado, mas sim no que ele prevê que seja o futuro. Em A Morte da Razão, Schaeffer avisa-nos sobre a “filosofia das definições” – o que ele afirma ser uma abordagem anti-filosófica às questões filosóficas por meio da análise linguística. Nada é mais evidente nos dias de hoje, uma vez que o paradigma existencialista e a desconstrução linguística de Derrida trabalham em sintonia para formar o significado da linguagem de acordo com as necessidades dos dias de hoje. Basicamente, existem certas palavras e terminologias às quais estão a ser atribuídas novas definições que suplantam certas noções há muito tempo associadas a essas mesmas palavras. Por exemplo, o “casamento” já não é “um compromisso vitalício entre um homem e uma mulher”; em vez disso, ele pode ser definido como “um vínculo estabelecido entre duas pessoas, mediante o reconhecimento governamental, cultural, religioso ou social e que pressupõe uma relação interpessoal de intimidade, cuja representação arquetípica é a coabitação, embora possa ser visto por muitos como um contrato” (Wikipedia), onde género e termo da união não são definidos. O relativismo cultural e moral é a atitude dominante na filosofia e nos estudos antropológicos, e está determinado a extinguir os absolutos do passado – incluindo os absolutos da fé Cristã, sem os quais não haveria “uma base adequada para o direito, para a lei,” de acordo com Schaeffer. É portanto fulcral que os crentes abracem e protejam os valores das Escrituras numa era secular que coloca a subjetividade acima de todas as coisas.


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j esus

o garante de au t e n t i c i da d e p o r Pau l o S é r g i o G o mes

No livro Um homem chamado Jesus, o conhecido autor de Deixados Para Trás, Tim La Haye, faz uma retrospetiva profunda sobre o impacto que, não só a vida e morte de Jesus, mas especialmente a Sua ressurreição tem tido sobre todos os que creem. A execução de Cristo pode ser considerada uma trágica conduta ilegal da justiça, mas quando incluímos a ressurreição, a mensagem da cruz transforma-se em gloriosa vitória. A ressurreição de Jesus é que dá poder à cruz e prova a confiabilidade do cristianismo. Como disse Napoleão, “para fundar uma religião há que morrer na cruz e ressuscitar ao terceiro dia”. Jesus ressuscitou fisicamente e não em espírito. Um espírito não anda, fala, e come, como Jesus o fez com os dois discípulos na estrada de Emaús, tendo-lhes instado “... porque sobram dúvidas em vossos corações? Vede as minhas mãos e os meus pés. Que sou eu mesmo: apalpai-me e verificai porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho”. 28 EDIÇÃO Nº8

Pode-se dizer que o verdadeiro cristão crê “na morte de Cristo pelos nossos pecados, no sepultamento do seu corpo num sepulcro, e na sua ressurreição corpórea (…) nenhuma pessoa que se recusa a crer na ressurreição de Cristo pode ser salva”. A ressurreição confirmou as suas profecias, bem como dos profetas dos Antigo Testamento, sendo a mensagem central da igreja do primeiro século, e confortando os seguidores de Jesus nos séculos posteriores, culminando na adoção do cristianismo como religião predominante do Império Romano, no séc. IV. Foi a doutrina essencial dos reformadores protestantes, sendo fulcral na mensagem que as igrejas com base bíblica hoje pregam.


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de Jesus. A salvação pela fé, a (nossa) Um destacado racionalista, Dr. justificação, a própria ressurreição dos Charles Guignebert, que (pasme-se!) que creem, ou a promessa da foi professor de História do segunda vinda de Cristo, são Cristianismo, na Sorbonne, e “... ressurgir evidências disso. Por isso as que rejeitava absolutamente a ressurreição de Cristo, e de entre os igrejas que se cingem a apresentar a ressurreição durante os seus milagres do Novo mortos é o Testamento, acabou recoque garante a Páscoa, esquecendo-a no resto do ano, acabam prenhecendo que “não haveria a autengando o Evangelho apenas cristianismo se a crença na ticidade pela metade. ressurreição não tivesse sido de tudo o Assim, cada convertido estabelecida (…) através resto.” é uma “nova criatura em dessa crença, a fé em Jesus Cristo”, e recebe Cristo e na sua missão tornou-se como seu Senhor e Salvador, o elemento fundamental de acreditando na ressurreição, e experiuma nova religião que (…) partiu para mentando “o poder da ressurreição” conquistar o mundo. que o capacita a viver uma plena vida A fé cristã assenta em doutrinas que dependem na ressurreição física cristã.

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ficção

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A utopia livre p o r Da n i e l G o m e s

Utopia, o clássico de literatura que imortalizou o nome do seu autor e deu forma a todo um subgénero de ficção, encontra-se agora totalmente disponível e gratuito em theopenutopia.org, um website dedicado a honrar o legado da obra prima de Thomas More. alta traição que levou à sua execução Sir Thomas More foi um homem assim como à sua canonização, uma excepcional no seu tempo: ele gozou vez que a Igreja Católica venera o de uma carreira bem-sucedida como Santo Thomas More como advogado e estadista, que um mártir que morreu em culminou na sua nomeadefesa da união da Igreja. ção para a posição de "O orgulho Porém nenhum destes Lord High Chancellor da presume que a feitos pode igualar a sua Inglaterra, em 1529. Ele sua felicidade sátira inovadora, Utopia. foi também um filósofo católico e humanista renas- brilha de forma Publicada pela primeira centista que se relacionava mais radiante vez em 1516, a obra de com algumas das mais ao compará-la ficção tem vindo a formar brilhantes mentes do seu com os infortú- os alicerces da literatura utópica e distópica e a tempo, incluindo o seu nios das outras inspirar ideologias políticolega humanista Erasmo pessoas." cas e económicas como o de Roterdão. Além disso, a fé de More na doutrina (tradução livre) socialismo e o comunismo. Baseado em grande parte católica levou-o a combater na República de Platão e a Reforma Inglesa e, por nos ideais humanistas emergentes conseguinte, a rejeitar a supremacia no tempo de More, Utopia retrata do rei inglês sobre a igreja – um ato de

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ficção

uma nação e sociedade idílicas que todas as outras nações devem imitar, e o seu conteúdo permanece um foco de muita discussão, quinhentos anos depois da sua publicação. Utopia foi escrita como a transcrição de uma conversa entre Thomas More, o seu amigo Peter Gilles (Pieter Gillis), e uma personagem fictícia, Raphael Hythloday (Hythlodaeus). É esta última personagem, descrita como um explorador e filósofo português que viajou com Américo Vespucci, que consome a maioria do diálogo no livro: Hythloday é quem fala a More e ao seu amigo acerca da Utopia, a ilha sublime onde ele afirma ter passado cinco anos na companhia generosa dos seus habitantes. Ele descreve Utopia com um detalhe rigorosíssimo, desde a sua geografia e economia às mais ínfimas particularidades da sua sociedade e religião. Ao longo da sua história, Hythloday oferece-nos uma imagem

extremamente positiva da nacão insular, elogiando a ênfase dos Utopianos no bem comum e no domínio público acima da propriedade privada, assim como o compromisso daquele povo para com a aprendizagem e as virtudes da Natureza. Embora intrigado por alguns dos aspetos da política e cultura Utópicas, Hythloday apercebe-se de que existe muita sabedoria por detrás desses mesmos aspetos. Por exemplo, Hythloday não compreendia porque é que a nação contratava um número excessivo de mercenários, visto que isto seria considerado algo estranho e ineficaz nas guerras do Velho Mundo. Contudo, a decisão dos Utopianos passou a fazer todo o sentido assim que lhe contaram que eles não tinham necessidade de ouro nem prata – as duas coisas pelas quais os mercenários matam e morrem – ainda que possuíssem ambas em abundância, e como eles preferiam pagar bem aos

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mercenários em vez de sacrificar o próprio povo nas linhas da frente; sem contar com o facto de, ao fazerem isto, os Utopianos garantiam que os seus inimigos não podiam fazer o mesmo. Um conhecimento mais profundo de como os Utopianos viam o derramar de sangue em geral ajuda Hythloday (e por sua vez, o leitor) a perceber que este era de facto a melhor forma de prosseguir para o povo Utopiano. São estes modos sábios de Utopia que muitas vezes levam Hythloday a contrastar a nação insular, que ele considera como “a única república que realmente merece ter essa designação,” com os reinos insignificantes da Europa e as suas leis opressivas, a sua cultura bélica e a sua natureza orgulhosa. Ele conclui que estes reinos podem aprender muito com o exemplo de Utopia, mas também que não é a ele que cabe transformá-los. O papel que More desempenha nesta conversa dominada por Hythloday é a de um mero espectador com uma etiqueta exemplar; até na sua conclusão à conversa fictícia, More manteve-se bastante reservado em relação ao seu veredicto, declarando de forma vaga que gostaria de ver mais de Utopia em Inglaterra apesar de não estar de acordo com algumas das suas

políticas e tradições. Isto, porém, não é surpresa nenhuma: More era um Católico e contra-reformador obstinado e como tal, ele provavelmente não iria aceitar o princípio Utópico de sacerdotisas, ou o ponto de vista daquela nação em relação ao divórcio. O que é bem capaz de surpreender, no entanto, é que, sendo More o católico devoto que era, visionava estas coisas como parte de uma república genuína e perfeita. A interpretação de Utopia é de facto algo complicada, uma vez que a sátira é tão complexa e credível, e ao mesmo tempo tão indicativa do absurdo, que o seu significado e propósito exatos tornam-se inescrutáveis. Se More estava a ser algo cínico com a sua obra é no entanto irrelevante; Utopia e os seus conceitos têm sido cruciais na formação do espectro político mundial e realçam os princípios do bem comum e da responsabilidade cívica. Ainda que Thomas More possa nunca ter tido a expectativa de ver uma Utopia terrena durante a sua vida, a realidade continua a querer imitar a ficção; assim, é a nós que cabe honrar o legado de More e a procurar materializar aquilo que apenas parecia ser um sonho esperançoso no séc. XVI – e isso começa com o ler esta obra magnífica.

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Jul - Ago - Set

A Cruz e o Punhal Joni Eareckson Tada e a Eutanásia Tributo a Mandela e muito mais...


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