O novo jeito de fazer história
Ano 1 - Edição especial 1 - Terça-feira, 31 de agosto de 2010 - R$ 9,90
Assassinato de Montezuma tem várias versões No dia 30 de junho de 1520 no atual México, o antepenúltimo imperador asteca, Montezuma II, mantido como prisioneiro dos espanhóis de Hernán Cortés, é assassinado. Os espanhóis dizem que o imperador foi atacado por seu povo. Os astecas, que ele foi morto no cativeiro. Por Flávia Monteiro e Vágner Benatti uem matou Montezuma: seu próprio povo ou as tropas de Cortés? Essas são duas das hipóteses que guiam as investigações dos historiadores. Dentre inúmeras especulações, existem versões baseadas nos arquivos enviados pelos conquistadores à côrte espanhola e outras, em relatos e manuscritos mexicanos. Motecuhzoma Xocoyotzin (14671520) foi eleito grande comandante de Tenochtitlán pelo conselho imperial asteca em 1502 e, posteriormente, obteve o título honorário de “Senhor dos Colhua”. Quando os conquistadores espanhóis apareceram na costa do México, ele era o principal governante do império asteca, que incluía várias nações do México. Apesar do significado literal do seu nome (Motecuhzoma, no idioma nahuatl, significa “aquele que se torna governante por sua cólera”), Montezuma não fora um líder forte diante dos espanhóis. Ele tentou impedir o avanço dos invasores lhes dando uma recepção rica e calorosa. Esta abordagem não funcionou. Ele também permitiu que os espanhóis o levassem como refém e o humilhassem. Como resultado, ele perdeu o apoio de seus súditos. Pouco depois de sua morte, a cidade de Tenochtitlán foi completamente destruída e o império asteca ruiu. Os espanhóis avançaram dentro de um império Asteca com vários fracassos em guerras locais, problemas econômicos e agitação social. As virtudes militares e a rígida estrutura de classes sociais estavam se despedaçando. Montezuma precisava centralizar o poder e manter o império sob seu controle. Seus domínios ao longo do Vale do México e da América Central durante o século XV eram mantidos num regime baseado na força para conseguir tributos. Com o Estado asteca enfraquecido, seus governantes e sacerdotes exigiam o sacrifício humano para alimentar os seus deuses, apavorar seu povo e seus inimigos. Até 1519, o império asteca era frágil, não só internamente, mas desprezado também pelos povos vizinhos. Quando as hostilidades com os espanhóis começaram, os astecas tiveram poucos aliados. Hernán Cortés não tinha nada a perder. Não podia voltar à Espanha ou à Cuba, pois ignorara sua destituição do cargo de capitão-general e velejou rumo ao México mesmo sem o aval do governador espanhol de Cuba, Diego de Velásquez. A história dos conquistadores está repleta de relatos de rivalidade, disputa por posições, motim e traição. Uma década antes da chegada dos espanhóis no México, Montezuma e seu povo vivenciaram uma série de eventos que lhes trariam maus presságios. Atormentado, Montezuma exigiu que seus adivinhos explicassem o significado daqueles sinais terríveis. As profecias previam a destruição de seu reino. Logo, Cortés tratou de estimular o boato de que era um deus e fazer alianças com nativos insatisfeitos com o governo de Montezuma e apavorados com as armas que matavam à distância dos 600 homens de Cortés. Mensageiros de Montezuma traziam para o imperador os relatos terríveis de seu encontro com os espanhóis: as armas, cavalos, cães e sua cobiça por ouro. O imperador, perplexo, começou a temer, mais ainda, Cortés pela possibilidade dele ser o próprio Quetzalcoatl, a “serpente emplumada”, uma divindade exilada que prometeu voltar um dia para reivindicar o seu reino. Montezuma tinha poucas opções. Se contraatacasse, perderia seu reino e sua vida; Se recebesse os invasores, perderia seu reino, mas preservaria sua vida. Acabou decidindo por recepcionar o inimigo calorosamente e com muito ouro. Já que inevitável, perderia o poder, mas, ligado aos prazeres do mundo, preservaria sua vida. A manhã de 8 de novembro de 1519 é
Q
considerada por muitos historiadores como o maior símbolo do encontro entre dois continentes. Naquele dia, Montezuma e Hernán Cortés ficaram frente a frente pela primeira vez no imenso Vale do México. Os dois maiores líderes do Novo Mundo estavam ali para um encontro amigável, mas a tensão era inevitável – afinal, o imperador asteca acolhera em suas terras um comandante que queria justamente conquistá-las. Meses depois, eles voltariam a se encontrar, dessa vez numa batalha sangrenta que terminaria com a morte do líder nativo e tornaria Cortés o homem mais poderoso das Américas. Os relatos dos conquistadores eternizaram o comandante espanhol e, até hoje, acredita-se que ele estava à frente de seu tempo. Sua genialidade militar, no entanto, não ia além de padrões já conhecidos à época. Cortés não apresentou novas táticas de guerra, nem estratégias revolucionárias. O que ele fez foi adotar rotinas de conflitos anteriores ao Descobrimento. Uma das mais importantes foi a aliança com nativos rivais dos astecas. Mas havia outras: o sarampo, a varíola e a gripe dizimaram um terço dos habitantes da capital, Tenochtitlán, em apenas seis meses. Esses males aniquilaram mais índios do que as espadas dos espanhóis.
“O Encontro de Cortés e Montezuma”: pintura do século XVII da coleção de Jay I. Kislak.
Montezuma, acreditando que Cortés era uma encarnação divina, ofereceu-lhe ouro para lhe acalmar o ânimo. Mas não se tratava de um deus. O imperador, receoso quanto as profecias e se acovardando diante do invasor, ao invés de colher o que desejava, colheu a própria morte: aumentara ainda mais a cobiça dos espanhóis e a revolta de seu próprio povo. Montezuma admitia entregar o império, mas não daria sua vida para defendê-lo. Cortés e o povo asteca tinham os motivos para assassinar Montezuma. Ainda não se chegou a um consenso entre os historiadores, mas, de antemão, podemos dizer que o responsável pela morte do rei foi o próprio Montezuma. Como avaliou Marcos Rey no livro “Grandes crimes da história”: “O ouro não suborna a morte”. ■
Rota tomada por Cortez e seus aliados desde a costa do MéxicoTenochtitlan Chalchiuhcueyecan em 1519. Fonte: Atlas do México préhispânico, edição especial de Arqueologia Mexicana
Templo Mayor em Tenochtitlán: Mural de Diego Rivera Mostrando a vida em tempos astecas. Cidade do México - Palácio Nacional.
Curiosidades do novo continente
O
s astecas conheciam o papel, possuíam uma escrita pictórica e suas crianças tinham escolas. Os incas não sabiam escrever, mas eram bons matemáticos e usavam o sistema decimal. A metalurgia era especialidade dos povos dos Andes: já fundiam a platina, coisa que na Europa só iria acontecer no século XVII. Todos dominavam a astronomia, sabiam prever eclipses e mediam o tempo, como nós, pelo ano solar. Suas roupas, apesar do exotismo das penas, eram de algodão de boa qualidade, e a arquitetura grandiosa. Só a capital asteca tinha 25 pirâmides onde eram realizadas cerimônias religiosas e os sacrifícios humanos que tanto chocaram os forasteiros. Não só conheciam o banho de vapor, tão prezado na Europa, como mantinham o hábito do lavar-se diariamente, enquanto, no Velho Mundo, entrava na moda o perfume, agradável ardil para evitar a água. Os gigantescos impérios americanos, cuja organização faz lembrar as civilizações do Egito, da Babilônia ou da China, também deixaram monumentos arquitetônicos grandiosos. Os aquedutos que abasteciam Tenochtitlán, trazendo água de fontes localizadas a quilômetros, não ficavam muito atrás das obras do período áureo do Império Romano. O império inca, por sinal, foi o mais extenso de todos, embora o mais atrasado. Com 10 milhões de habitantes, reunindo uma centena de etnias, seu domínio se estendia por 950 mil quilômetros quadrados, do Equador à Argentina, e deixou uma herança de 16 mil quilômetros de estradas pavimentadas. Já que os Incas não possuíam um sistema de escrita eficiente, tinham um sistema de correio pelo qual uma mensagem era transmitida de boca em boca por até 2 mil quilômetros em apenas dois dias. Técnicas eficientes de irrigação eram conhecidas e ainda hoje, 500 anos depois, os terraços construídos para plantar milho enfeitam as encostas ardinas como escadarias monumentais.
Abalando as estruturas
Motecuhzoma Xocoyotzin: “O grande comandante oficial”, Huey Tlatoani em Nahuatl. Nascimento: 1466; Contingente: aproximadamente 100 mil homens; Combatentes: nativos guerreiros concentrados na capital do império, Tenochtitlán; Armas: lanças e machados; Principal feito: aguentar o cerco dos espanhóis à capital durante meses seguidos; Morte: 1520, após a batalha com os espanhóis. A causa ainda divide os historiadores.
Hernán Cortés Monroy Pizarro Altamirano Nascimento: 1485; Contingente: 200 mil homens (na maioria, nativos rivais dos astecas); Combatentes: artesãos, comerciantes e aventureiros – e não soldados; Armas: espadas, carabinas, canhões, cavalos e cachorros; Principal feito: agrupar as tribos rivais contra os astecas; Morte: 1547, de pleurisia (inflamação dos pulmões).
Jornalistas responsáveis: Flávia Monteiro e Vágner Benatti jornalismo@novahistoria.com.br www.novahistoria.com.br/blog
No século XIV, os astecas construíram a capital de seu império, chamada Tenochtitlán, numa ilha no lago Texcoco. Com a conquista dos espanhóis, a capital asteca foi destruída e, assim, iniciou-se a expansão territorial sobre o lago onde, hoje, no lugar de Tenochtitlán, esta situada a Cidade do México. As consequências do aterramento do Texcoco são sentidas hoje em dia, porque o solo se tornou frágil com o peso das atuais cidades situadas a cerca de 2.250 metros acima do nível mar. Em outras palavras, há pontos que estão afundando, como é o caso da Basílica de Guadalupe na cidade de Frida Kahlo. Tudo isso é reflexo de um crescimento urbano incrível sobre um aterro alagadiço. Para compensar, especialistas têm feito grandes trabalhos de reestruturação.
Anuncie aqui comercial@novahistoria.com.br (11) 1234-5678 / (21) 2345-6789