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PAULO VIEIRA
Paulo Vieira
PAULO PONTES UM HOMEM DE MUITAS PALAVRAS
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por: Paulo Vieira
Ator, Dramaturgo com diversos textos escritos e premiados, Diretor de Teatro, Doutor em Teatro pela Universidade de São Paulo, escreveu e publicou o livro Paulo Pontes: A arte das coisas sabidas, que foi a sua dissertação de mestrado.
Durante a década de setenta, em plena vigência dos governos militares, Paulo Pontes foi um dos homens mais importantes do país, e isto não apenas em relação ao teatro, mas, sobretudo, em relação à cultura brasileira. O autor de Doutor Fausto da Silva era aquilo que hoje se poderia chamar um multimídia: homem de televisão, de rádio, de educação (foi militante do movimento de educação da Ceplar, inspirado nas ideias de Paulo Freire), e também um homem de teatro. Paulo Pontes era não apenas um talento único, mas era também um líder nato, capaz de reunir a inteligência brasileira, de Chico Buarque a Antônio Calado, em torno de um projeto para discutir Não bastasse, o autor campinense era também empresário de teatro no Rio de Janeiro, onde chegou pela primeira vez para participar de um encontro sobre cultura popular e educação na véspera da tomada do poder pelos militares. Esse fato fortuito foi, talvez, decisivo na carreira profissional do então jovem homem de teatro e radialista, que já fazia um programa de sucesso na Rádio Tabajara da Paraíba, Rodízio.
Surpreendido pelas mudanças na política brasileira, foi ficando no Rio e dessa maneira tornando permanente aquilo que era apenas transitório. Juntou-se ao grupo remanescente do antigo Centro Popular de Cultura, o CPC,e daí, ao lado de Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, do poeta maranhense Ferreira Gullar, de João das Neves, de Armando Costa e de tantos outros, fundou o grupo Opinião, que fez a sua estreia em dezembro de 1964 com o show do mesmo nome. E já esse primeiro trabalho profissional no Rio de Janeiro foi marcante para a música brasileira por diversos motivos, entre eles por reunir artistas de caráter e formação tão diversas quanto Zé Kéti (a voz do morro), João do Vale (migrante maranhense) e Nara Leão (musa da Bossa Nova zona sul do Rio); além disso, o show Opinião inovou na técnica de apresentação de espetáculos musicais, atribuindo certa teatralidade aos cantores que agiam como atores, representando papéis, falando textos, afirmando uma opinião, coisa tão necessária para aquele momento, e ainda mais necessária (e perigosa, politicamente falando) se tornaria nos anos subsequentes. Depois, em janeiro de 1965, Nara Leão foi substituída por uma moça desconhecida, trazida especialmente de Salvador, por sua vez já migrando de Santo Amaro da Purificação, na Bahia, e que faria retumbante sucesso cantando Carcará, Maria Bethânia.
Somente em 1968 Paulo Pontes voltou à Paraíba. E aí escreveu, produziu e dirigiu o espetáculo Paraí-bê-a-bá, por sua vez enorme sucesso de público e de crítica, estrelado pelos saudosos atores Ednaldo do Egypto e Lucy Camelo. Não demorou muito essa volta para casa, logo logo ele partia outra vez retornando ao Rio, agora para trabalhar na equipe de criação da TV Tupi, para onde levou o amigo Vianinha, selando dessa forma uma parceria que depois se estenderia à Rede Globo de Televisão, onde eles criariam no início da década de setenta um programa de enorme sucesso, A grande família. Mas foi na TV Tupi que Paulo Pontes conheceu a atriz Bibi Ferreira, com quem se casou, quando ele produzia o programa Bibi, série especial.
Paulo Pontes
A ARTE DAS COISAS SABIDAS
Paulo Vieira
Todavia, foi no ano de 1971 que Paulo Pontes deu início verdadeiramente a sua vertiginosa e estonteantemente curta carreira de autor teatral, quando escreveu o texto Um edifício chamado 200, como o qual ganhou no ano seguinte, em São Paulo, o prêmio de Autor Revelação. Daí em diante sua carreira de dramaturgo só conheceu sucesso. Em 1972 viriam os textos Check-up, no qual investiga a condição de um paciente hospitalar, ele que desde muito já conhecia a rotina de hospitais. Doutor Fausto da Silva, em que o autor se volta para o temerário sucesso de um apresentador de televisão, quando dar a conhecer esse Fausto brasileiro e contemporâneo, capaz de realizar os atos mais amorais do mundo para manter o Ibope. Em todos os seus trabalhos, fosse no rádio, na televisão ou no teatro, Paulo Pontes tinha como preocupação basilar buscar o público, escrever para um numeroso público, encontrar no cotidiano das pessoas comuns os temas e as matérias para a sua criação estética.
Esta sua busca culminou com o enorme sucesso do seu último trabalho, Gota D’Água, em 1975, a partir de uma ideia desenvolvida inicialmente por Vianinha num caso especial, Medeia, apresentado pela Rede Globo de Televisão, com Fernanda Montenegro no papel-título.
Nos anos setenta o teatro brasileiro, atormentado pela censura política que proibia frequentemente os artistas de apresentarem os seus espetáculos, tendeu, uma parte, para o desespero, a desesperança, e, com isso, para a agressão ao público. Uma outra parte, a que tinha Paulo Pontes entre os seus líderes, chamava a atenção para o contrário: o público não era o inimigo, não podia e não devia ser agredido; devia, antes isso, ser conquistado, ser um aliado do teatro, do artista brasileiro, do autor que Paulo Pontes queria tanto ver sempre no palco, lá onde é o seu lugar. E foi aí que a enorme liderança do autor paraibano se fez sentir, quando juntou artistas e intelectuais, quando propôs a razão contra o furor do que agrediam a própria plateia, quando lutou pela liberdade de criação, contra a censura, qualquer que fosse, contra o amesquinhamento das relações que separam as pessoas, os amantes, os amigos, juntando forças para gritar em uníssono pela liberdade que tardava chegar, liberta e aí serás também, do modo como dizia o trocadilho com o lema da bandeira mineira.
Em dezembro de 1976, no dia 27, Paulo Pontes morreu vítima de câncer no Hospital Samaritano, no Rio de Janeiro. Tinha apego à vida, não queria morrer, tinha planos ainda por realizar, queria comunicar tudo o que queria, e talvez por isso não tenha parado de falar um instante enquanto agonizava as suas últimas horas. Morreu deixando como herança para o teatro brasileiro uma de suas mais preciosas joias dramatúrgicas. A Gota d’Água. E qualquer desatenção, faça não.