12 canções

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doze canções (twelve edição para

songs)

regina

unica

a.

por dividir seus pretzel’s

de

chocolate com esse guri te amo


1.

tua filosofia de que o universo é uma canção em uníssono da década de 80 é uma falácia

quando olhas pelo vidro plastificado do teu carro bomba sei que pensas em um solo de guitarra elétrica

mas de que adianta galgar pelas autoestradas sem ao menos ter o mínimo de selvageria em querer se perder

rebolar a sina na sarjeta vendar os olhos no picadeiro ou quem sabe abraçar um coringa em chamas? não. tu não queres isso queres a mais afofada mordomia. a mais suntuosa dança do ventre. não queres nada de frente.


só por trás.

sem ver nos olhos a besta que tu furtas o fruto tua filosofia de buteco de que abraços & melodramas salvaram o mundo é puro lero lero. sou mais caminhar pelo solstício hostil e amar as folhas fulvas caídas fora de época.


2.

Uma mariposa pousa no meu dedo indicador e por um segundo penso em capturar o momento em algo físico como uma rede ou um retrato mas a aterrissagem é breve e logo ela põe suas asas de papel reciclado a voar madrugada adentro os pingos de luz fincados no couro de Oswald ofuscam como os olhos ébrios de um gato preto enquanto eu penso em poemas penso em poemas penso em poemas seria tudo tão mais fácil sem uma lira e sim uma guitarra sem os versos e sim a pancada sem a musa e sim a palavra mas me faltam


palavras para lavrar a folha em branco um canário canta seu gorjeio brega em alguma casa no quarteirão e o nome disso é poesia.


3.

marco as páginas do teu livro azul com uma pena de papagaio

que tentei certa vez usar como uma caneta tinteiro em um desenho intuitivo, mas tudo que consegui foi um borrão querendo ser gaivota queria teus lábios da cor carnal de um pêssego

escritos na contracapa para nunca sentir nostalgia dos teus miados

ou dos teus acalentos quando ouço os fantasmas de bombas atônicas urgindo acho que te devo muita coisa pelos sorrisos & sandwichs de búfalo

então segura na minha mão sacode o medo dos pés


e pedala pedala a velha bicicleta que eu te ensino a andar sem rodinhas


4.

Sou aquele pardal atordoado pelos holofotes notívagos que cai entre os pés da mesa e os das suas tias mas bobo fujo para debaixo de um furgão abandonado naquela rua desde 95 à noite o que mais quero é virar um caboclo místico e desbravar a floresta de escamas que você desenhou nas paredes do seu quarto

Pular sobre cada raiz cada assinatura só pra te ver abraçada ao nosso filho ártico dormindo, os dois, lumiados pela lua acanhada atrás dos prédios Quero que da próxima vez você arranque de mim essa farpa estressada fincada no meu colo e me dê a mão


para sumirmos n贸s tr锚s num ramalhete de vincas de gato


5.

Pequenas crianças escrevem poemas às suas mães e paixonites meteóricas no verso de cadernos pautados você senta na cartilagem abandonada de um prédio ao ocaso e descreve as luzes dos carros em movimento como bandos de vagalumes voando para suas tocas em garagens sujas de escuma e óleo do mar pequenas nuvens brincam sobre a tarja celeste de imitar dragões e xícaras e dinos e naves e tudotudotudo que uma cabeça possa esculpir com a retina você faz o mesmo usando somente um hidrocor e a palma da mão de unhas azul imenso


pequenos enfeites colorem, douram competem e incendeiam nas ruas três vezes ao ano com as mesmas canções que tocavam no tempo das cadeiras de balanço você sorri no meio do escarcéu como quem descobre toda uma constelação de palavras num par de olhos acesos & castanhos.


6.

Este poema não fala do mar

ou da sua parcimônia em bebericar do seu corpo em expansão porque isso seria um clichê

igual ao clichê de narrar os dentes de ouro e leite do leopardo das neves este poema não fala do amor

ou do ato desgovernado de um bruto e caloroso abraço despido de saudações porque isso seria belo

igual a beleza de um bebê espirando e rindo de toda à existência este poema não fala de você

ou de mim com você às 16h58 sentados em um banco esperando a despedida chegar lerda

ou de você comigo numa quinta deitados tentando dormir numa rede para aliviar o calor de fevereiro


ou até de nós no quarto da sua avó segurando uma folha em formato de coração que hoje mora com sua mãe terra porque isso seria verdade

igual a verdade do cheiro férreo no nosso sangue vivo este poema não fala sobre tudo fala sobre si

fala sobre ser mágico fazer truque soltar pombos & coelhos da cartola e acabar se revelando um poema: este.


7.

Não podemos esquecer do silêncio das piscinas ou da postura ereta dos manequins albinos quando perdemos a fé para meia dúzia de unhas ruídas Porque te amo e quando criança , sem saber a caligrafia do peito, eu bufava lágrimas na bruma e no rebuliço soluçando sopapos no vento inocente e no riso descabido dos meninos de praga na mandíbula

e isso me levava ao fundo do quintal onde talhava espadas usando uma faca sem dente e as mãos de cachorro em caixas de laranja feitas de compensado preciso de mais aventuras em elevadores espelhados e cinemas viscosos


respirando no tato teu tecido costurado com linha e lĂ­ngua.


8. Não quero esse amor de praça de alimentação cheio de formalidades e bandejas reutilizáveis já que amo as tardes de nomes fáceis e esverdeados junto a você e a qualquer jóquei que saiba cavalgar burricos de madeira

tudo se torna cabível como desligar uma tv para ouvir a tempestade solfejar e, voi la estamos sobre a crosta de um feriado, arremessando pedregulhos sobre uma poça e pondo folhas de hortelã para trafegarem como pirilampos ao deus dará vacilo vez em quando no chão que se mostra lama arranhar joelhos e ossadas nos córregos é meu destino de ocasião


9.

não olhe para gárgulas como se as julgasse por suas rugas e dentes de mármore negro como o asfalto recém apalpado

é mania sua tropeçar num engano e cai de cambalhota numa lagrima de baleia

o pássaro e o peixe continuam lá sobreviventes do apartamento junto a você e as estrofes sublinhadas no livro de caligrafia que trazes no peito desde os 12

mas que venham que venham os trovões & serpentinas nas tardes pálidas nas manhãs flamejantes em qualquer hora degolada porque sou o escafandro decorado de pétalas & horizontes posto sobre a cabeceira da tua cama que range como as dentaduras de um trem


10. CULATRA apontar a espingarda em um frasco de perfume sobre o muro que separa o desapego dos cifrões e atirar sem saber da combustão que atraem os falcões até lá. GATILHO Faltam-me apenas os gatos brancos e rajados que viviam dormindo como anjos sobre a mesa bagunçada da minha tia nos dias úteis e inúteis da semana do mês daqueles anos com cheiro de chuva e pés de feijão falta-me isso para disparar um sorriso


CÃO Moldo cúmulos como um redemoinho amontoando-os em montanhas alvas que a qualquer espectador possam parecer só e somente truques do céu para tombar água fresca CANO

ver o o

n

d

a

s

a s u

s

u

s

r r dos a re ss n seg ss d s ss o s extra u ordinaria e mente calma s

a p e s a r dos banhistas tumultuosos bradando jetskys ir r i t a rem toda a pra i a b o i ando n a raia d’um copo de leite


11.

20/02

sonhei com a noite e suas estrelas de neon cintilando a cada rua que eu dobrava. andava eu numa bicicleta minúscula do tamanho de uma capivara e minha prima estudava em um liceu longe das dunas. virava a madrugada pedalando por quadras desconhecidas sendo abençoado pelas janelas iluminadas dos prédios residenciais. uma agonia pincelava meu corpo como o andar de uma taturana. me achava no mundo quando as ambulâncias gritavam pedindo licença em frente ao shopping. passei em frente a sua casa e pensei em te chamar e lembrei que você não sabia andar de bicicleta e pensei o quão fácil era ir de camelo até seu prédio e amanhecia uma manhã azul piscina no céu. os tuneis tinha ciclovias de borracha, ia por elas pra casa e me sentia como em um tobogã. tirava fotografias dos precipícios. ciclistas praguejavam 7 anos de dor nas costas pra mim. quando acordei chovia como no ano retrasado.


12.

moça

abra as cortinas a praça lá fora permanece quieta como um gato de porcelana tome um gole d’agua pra pensar

guarde nossos lençóis atrás do espelho e esconda o que chamamos de amor atrás de uma onda que quebra e quebra mas nunca se desmonta



victor h. azevedo arruma sua mochila em bosques & calçadas sempre a procura de algo que nunca soube bem o que é

já publicou varios zines, entre eles estão Pé do Ouvido, O amor é Simples, Miragem e Crocodilo Rosa. Lança em breve outro quadrinho, intitulado Fábrica de Flores. publica poemas e desenhos no seu blog: vvctrh.tumblr.com

esse zine foi feito no mês de fevereiro, sob a forte luz de uma lampada comum em um quarto abafado.





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