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isto é uma

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o trânsito e as escolas estão intimamente relacionados e É possível dizer, inclusive, que um deu origem ao outro texto e fotos Natália Garcia

As escolas e as cidades, tais como você as conhece hoje, foram moldadas mais ou menos na mesma época e lugar: na Inglaterra do século XVIII, durante a

Revolução Industrial. As indústrias, que cresciam no país, precisavam de gente trabalhando nas linhas de montagem. Nessa época o trabalho se tornou a forma quase obrigatória

de sobrevivência em espaços urbanos. Foi essa lógica de produção na linha de montagem que moldou as escolas. Divisão por idade e sexo, alarmes sonoros sinalizando o início e o fim de atividades, salas fechadas em que todos precisam fazer silêncio e prestar atenção no professor. Esses símbolos das escolas – muitos que perseveram até hoje – foram inventados no chão das fábricas e indústrias de então. Foi naquele século que o trabalho para a produção industrial e a educação

– que servia, principalmente, para preparar as crianças para trabalhar na idade adulta – entraram nas principais funções das cidades. Segundo o urbanista francês Henri Lefebvre, “Em uma cidade as funções determinam a forma, que determinam a estrutura”. Em outras palavras, o trânsito é um reflexo de como foi pensada a estrutura da cidade, que é um reflexo de suas funções: o trabalho e a escola.

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No The Edible School Yard, nos Estados Unidos, as salas de aula são ao ar livre, e o material didático são as plantas do jardim junho

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Jardim comestível Dentre as maneiras de melhorar as cidades, há um componente importante: a educação. A forma e o conteúdo do que é ensinado em escolas e universidades podem ter um impacto impressionante na melhoria das cidades. Não era exatamente nisso que pensava a chef de cozinha Alice Waters quando criticou a escola pública Martin Luther King Jr. Middle School, na cidade de Berkeley, Califórnia, nos Estados Unidos. Na verdade, sua declaração à rádio local foi contra a merenda servida pela escola aos seus filhos e o mau aproveitamento das áreas verdes ao redor das salas de aula. Por sorte, o então diretor da escola estava ouvindo

a rádio naquele dia e chamou Alice para uma conversa. Foi dela, no final de 1996, que surgiu o programa The Edible School Yard – traduzindo, de maneira literal, “O Jardim de Infância Comestível”. As áreas verdes ociosas foram ocupadas por uma horta cuidada pelos alunos e usadas como sala de aula interdisciplinar. No canteiro com legumes, frutas e uma grande composteira, os alunos deixam as mochilas no chão para colocarem a mão na terra. Aprendem sobre a sazonalidade e a origem de cada alimento e têm aulas baseadas em suas experiências no jardim. O Jardim de Infância Comestível foi tão bemsucedido e adorado pelos alunos que, anos

to n o e p d a t vis Convidamos gente que vive ou trabalha na região para comentar esta reportagem – e dizer como ela pode inspirar o futuro de Alphaville

"As ideias da matéria são inspiradoras pois propõem uma aproximação positiva e animadora para o aproveitamento respeitoso da natureza e a interatividade produtiva nas redes sociais. Uma vez que é uma urgência do mundo abordar desde as origens (o uso da terra) até a modernidade (o uso da internet), isso é tema obrigatório nas escolas que procuram contagiar e motivar toda a comunidade" Isabella Freitas, da Escola Morumbi de Alphaville

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Cozinha da Martin Luther King Jr. Middle School

mais tarde, uma cozinha foi construída por essa mesma parceria entre Alice Waters e a Martin Luther King Jr. Middle School, para que as aulas nos jardins fossem complementadas por ensinamentos de cozinha. “As pessoas comem três vezes por dia, não é possível que as escolas não percebam como é importante ter aulas de culinária”, disse Alice em uma entrevista sobre o sucesso da iniciativa. Ela fez questão de que a “cozinha de aula” fosse um espaço criativo e divertido. Os balcões são coloridos, e, no fundo da sala, há um piano, livre para o uso dos alunos. A cozinha tem várias áreas de

preparo, fogões, e as facas são de verdade – os adolescentes aprendem pouco a pouco a usálas e se sentem felizes, pois seus professores confiam neles. Com o tempo, o jardim do colégio foi aberto para que a comunidade local pudesse se juntar aos alunos na tarefa de cuidar das plantas. “Sinto que isso tem provocado uma conscientização das pessoas, que agora fazem escolhas que priorizam alimentos frescos e orgânicos, por exemplo”, diz Alice. O plano inicial da chef era apenas aproveitar melhor a área do colégio e incentivar alimentos mais saudáveis na cantina dos alunos. O resultado foi


um projeto de educação admirado no mundo todo. Planejando urbano Agora, será que esse projeto daria certo em outras cidades? Será que qualquer centro urbano absorveria bem a ideia? Foram essas as questões que nortearam a criação do Department Planning Unit, um grupo de mestrados da University College London. Na década de 60, professores que lecionavam disciplinas ligadas ao planejamento urbano começaram a perceber que aquelas regras não eram universais. O urbanismo simplesmente não considerava realidades de países subdesenvolvidos. Realidades como a informalidade (do ponto de vista habitacional, as favelas) não eram contempladas nas

técnicas de planejamento urbano ensinadas. Foi aí que se decidiu criar o DPU, para trazer acadêmicos desses países e construir uma espécie de teoria paralela do planejamento urbano. O departamento se especializou no diagnóstico de problemas e de potenciais em áreas informais pelo mundo para criar modelos replicáveis de soluções simples e baratas. Em 2007, alunos do DPU visitaram a favela de Kibera, em Nairóbi, no Quênia, e fizeram seu mapeamento na internet. O resultado: Kibera tornou-se uma das favelas mais famosas do mundo, foi urbanizada e recebeu patrocínio de empresas para potencializar as pequenas soluções que eles já desenvolviam para o saneamento básico e o plantio de alimentos.

to ponde a t vis “Na unidade Alphaville, temos um espaço para o plantio de leguminosas, folhas e frutos, seguido da colheita e degustação. Assim os alunos percebem a importância do solo como fonte de alimento e saúde. Depois de aprender o conteúdo pedagógico, procurar pessoas que buscam discutir os assuntos do bairro é uma maneira interessante de aplicar noções de ecologia e sustentabilidade” Jessica Brihy, do Colégio Objetivo de Alphaville

CONECTANDO PESSOAS Iniciativas como essas não precisam se restringir à educação formal. Convencidas disso as irmãs Camila e Anna Haddad criaram a plataforma de crowdlearning Cinese.

Nela, qualquer pessoa pode oferecer um curso ou workshop sobre um assunto que domina. Elas mapearam espaços públicos de São Paulo, onde o Cinese foi inaugurado, que pudessem receber esses Rua de carregamento de carros elétricos em Portland, projeto criado pela Portland State University e apoiado pela iniciativa privada local

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encontros. “A cidade pode ser um ótimo território de aprendizagem”, defende Camila, que aposta na educação informal como forma de distribuir conhecimentos e promover conexões interessantes entre pessoas. Formas e conteúdos criativos podem ser potencializados quando utilizados em intervenções na cidade. Era no que pensava Rob Bennett, criador do Portland Institute of Sustainability, em Portland, Estados Unidos. O instituto faz conexões entre poder público,

iniciativa privada, escolas e universidades. Projetos pensados pelos alunos da Portland State University, como uma rua com pontos públicos de carregamento de carros e bicicletas elétricos, foram colocados em prática graças às parcerias intermediadas pelo instituto. O poder da educação na melhoria das cidades fica evidente com histórias como essas – que também deixam claro que não se trata de um benefício restrito a idades ou instituições. Como dizia Paulo Freire, educar-se é preencher suas atividades de sentido.

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Lição de casa dos alunos da Martin Luther King Jr. Middle School: cultivar este limoeiro

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"Considerando que a aprendizagem significativa é o caminho para o desenvolvimento pessoal e social, não restam dúvidas de que buscar soluções para que a humanidade conquiste um lugar melhor é o nosso desejo. A +40 é um excelente canal para elencar os problemas da comunidade e buscar as soluções. Por isso, a Fernão Gaivota abraçou essa ideia maravilhosa”

“A escola poder criar formas de reação e transformação no seu entorno. Por exemplo, como muitas crianças têm boa parte de sua alimentação na escola, os educadores podem gerar intervenções que ampliem ou confrontem a cultura alimentar das famílias. Esse exemplo pode ser generalizado para outros campos da vida no bairro, como reciclagem e redução do lixo”

Aparecida Rivetti, da Escola Fernão Gaivota

Débora Vaz, da Escola Castanheiras

quer comentar o tema?

Acesse alphavilledonossojeito.com.br e dê sua opinião sobre esta e outras reportagens da +40 Patrocínio

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