A Ação Executiva
Na segunda parte da obra é apresentada uma coletânea da legislação que versa sobre a ação executiva, facilitando a sua consulta aos que, na vida académica ou profissional, lidam com esta temática.
Lurdes Mesquita
O texto que compõe a primeira parte destaca e comenta as principais alterações introduzidas pelo novo Código no regime da ação executiva.
no Novo Código de Processo Civil
A presente obra visa proporcionar, a todos quantos estudam ou lidam profissionalmente com a ação executiva, um instrumento de trabalho sobre o atual regime da ação executiva, após as alterações introduzidas pelo novo Código de Processo Civil.
Francisco Costeira da Rocha
A Ação Executiva no Novo Código de Processo Civil
Lurdes Mesquita Francisco Costeira da Rocha
A Ação Executiva no Novo Código de Processo Civil Principais alterações e legislação aplicável
2ª Edição revista e atualizada Novo Código de Processo Civil (articulado relativo à ação executiva) Regulamentação da ação executiva Tramitação eletrónica dos processos judiciais Meios eletrónicos de identificação do executado e dos seus bens Citação eletrónica de instituições públicas Remuneração dos serviços prestados por instituições na ação executiva Registo informático de execuções Lista pública de execuções
ISBN 978-972-788-911-2
www.vidaeconomica.pt ISBN: 978-972-788-911-2 Visite-nos em livraria.vidaeconomica.pt
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Sistemas de apoio a situações de sobreendividamento
Lurdes Mesquita Doutora em Direito. Professora Adjunta do Departamento de Direito da ESG do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave. Professora Auxiliar do Departamento de Direito da Universidade Portucalense Infante D. Henrique.
Francisco Costeira da Rocha Mestre em Direito. Juiz de Direito nos Juízos de Execução do Porto.
ÍNDICE GERAL Prefácio à 2ª edição.....................................................................................................7 Nota dos autores.........................................................................................................8 PARTE I Síntese das principais alterações introduzidas pelo novo Código de Processo Civil no regime da ação executiva para pagamento de quantia certa I - Nota prévia.........................................................................................................11 II - A reforma da ação executiva de 2013.........................................................13 1. Linhas gerais da reforma da ação executiva de 2013...................................13 2. Paradigma da ação executiva e modelos de tramitação...............................16 3. A ação executiva na nova sistematização do Código de Processo Civil.......18 4. Aplicação da lei no tempo...............................................................................20 III - Agente de execução, juiz de execução e secretaria...............................23 5. Repartição de competências: agente de execução, juiz de execução e secretaria......................................................................................................23 6. Regime de substituição do agente de execução.............................................25 7. Pagamento de quantias devidas ao agente de execução...............................26 8. Exercício de funções de agente de execução por oficial de justiça................27 IV - Os títulos executivos no novo Código de Processo Civil......................31 9. Introdução.......................................................................................................31 10. Aplicação da lei no tempo.............................................................................32 11. O atual elenco dos títulos executivos...........................................................33 12. Título executivo e tramitação processual....................................................39 V - Tramitação da ação executiva para pagamento de quantia certa......43 13. Formas de processo executivo......................................................................43 14. Requerimento executivo...............................................................................47 15. Fase inicial da execução...............................................................................50 16. Incidente de comunicabilidade da dívida....................................................53 17. Embargos de executado................................................................................55 18. Consultas e diligências prévias à penhora..................................................63
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19. Penhora.........................................................................................................65 20. Oposição à penhora.......................................................................................72 21. Citações.........................................................................................................76 22. Concurso de credores....................................................................................77 23. Acordo de pagamento em prestações da dívida exequenda e acordo global de pagamento......................................................................79 24. Venda no processo executivo........................................................................81 25. Extinção da execução....................................................................................83 PARTE II Legislação Novo Código de Processo Civil Exposição de motivos................................................................................................91 Lei n.º 41/2013, de 26 de junho...............................................................................115 Articulado do novo Código de Processo Civil relativo à ação executiva...............119 Regulamentação da ação executiva Portaria n.º 282/2013, de 29 de agosto...................................................................225 Tramitação eletrónica dos processos judiciais Portaria n.º 280/2013, de 26 de agosto...................................................................329 Meios eletrónicos de identificação do executado e dos seus bens e citação eletrónica de instituições públicas Portaria n.º 331-A/2009, de 30 de março................................................................349 Remuneração das instituições públicas e privadas que prestam colaboração à execução Portaria n.º 202/2011, de 20 de maio.....................................................................361 Registo informático de execuções Decreto-Lei n.º 201/2003, de 10 de setembro.........................................................369 Lista pública de execuções Portaria n.º 313/2009, de 30 de março...................................................................381 Sistemas de apoio a situações de sobre-endividamento Portaria n.º 312/2009, de 30 de março...................................................................391
Prefácio à 2.ª edição Esgotada, em pouco tempo, a 1.ª edição de “A Ação Executiva no Novo Código de Processo Civil”, publica-se nova edição. O Código de Processo Civil de 2013 tem escassos meses de vigência e, por isso, ainda não é tempo de fazer o balanço sobre a eficácia das alterações introduzidas, em especial – atendendo à temática que nos ocupa – no âmbito do processo executivo. Cabe a todos os intervenientes processuais continuar a refletir sobre o texto aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, e procurar aplicar adequadamente as suas disposições. Mantém-se como objeto desta obra a apresentação e comentário breve das principais alterações introduzidas pelo Código de Processo Civil de 2013 no regime da ação executiva. Por essa razão, foram mantidas a estrutura e a forma da edição anterior, mas procedeu-se à revisão de diversas partes do texto inicial, clarificando alguns dos temas tratados. Na segunda parte, relativa à coletânea de legislação que versa sobre a ação executiva, foi atualizada a Portaria n.º 331-A/2009, de 30 de março (que regulamenta a consulta, por meios eletrónicos, de informação referente à identificação do executado e dos seus bens e a citação eletrónica de instituições públicas), entretanto alterada pela Portaria n.º 350/2013, de 3 de dezembro. Fevereiro de 2014 Lurdes Mesquita Francisco Costeira da Rocha
Nota dos Autores As numerosas e significativas alterações consagradas no novo Código de Processo Civil, que vão muito para além da renumeração e de uma nova sistematização, impõem que os diversos atores judiciários lhe dediquem especial atenção. A presente obra visa proporcionar, a todos quantos estudam ou lidam profissionalmente com a ação executiva, um instrumento de trabalho sobre o atual regime da ação executiva, após a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil. O texto que compõe a primeira parte destaca e comenta as principais alterações introduzidas pelo novo Código no regime da ação executiva. Sem a pretensão de tratar exaustivamente todo o regime da ação executiva, foi nosso objetivo salientar os aspetos mais relevantes e de interesse prático, numa abordagem didática, simples e comparativa, centrando-nos na ação executiva para pagamento de quantia certa. Propositadamente, evitaram-se referências doutrinais e jurisprudenciais expressas, procurando não desviar a atenção do leitor das principais alterações ao regime da ação executiva, à luz do atual Código de Processo Civil. Na segunda parte da obra é apresentada uma coletânea da legislação que versa sobre a ação executiva, facilitando a sua consulta aos que, na vida académica ou profissional, lidam com esta temática. Adverte-se que a leitura dos textos legislativos disponibilizados nesta obra não dispensa a consulta dos textos legislativos originais publicados no Diário da República.
PARTE I Síntese das principais alterações introduzidas pelo novo Código de Processo Civil no regime da ação executiva para pagamento de quantia certa
I – Nota Prévia Analisado o novo Código de Processo Civil (de ora em diante NCPC), verificamos que a ação executiva para pagamento de quantia certa foi a modalidade de ação executiva que, verdadeiramente, sofreu as alterações mais significativas. Além disso, continua a ser a «execução paradigma» e o seu regime aplica-se subsidiariamente às demais execuções (artigo 551.º, n.º 2)1. Por estas razões, é sobre ela que, no essencial, se desenvolve o presente texto, onde serão apresentadas as principais alterações introduzidas pelo novo Código no regime da ação executiva. No que diz respeito à execução para entrega de coisa certa, são de realçar as alterações consagradas no artigo 626.º, n.º 3, para o caso em que a execução se baseie em decisão judicial condenatória. Agora, nos termos gerais no n.º 1 desse mesmo artigo, em regra, a execução corre nos próprios autos (ressalvando-se o caso de decisão judicial condenatória proferida no âmbito do procedimento especial de despejo); e, além disso, passa a vigorar um regime de «entrega prévia» à notificação do executado para deduzir oposição. À semelhança da tramitação das execuções com penhora imediata, já há muito vigente no âmbito do processo executivo para pagamento de quantia certa, primeiro opera-se a apreensão e entrega da coisa e só depois é chamado o executado para apresentar a sua defesa no âmbito da execução. A tramitação da execução para prestação de facto também sofre alterações, no caso de a execução se basear em decisão judicial condenatória. De acordo com o artigo 626.º, n.º 4, se a execução tiver por finalidade, para além do pagamento de quantia certa ou da entrega de coisa certa, a prestação de facto, a citação do executado para os termos da execução para prestação de facto (prevista no n.º 2 do artigo 868.º) 1 - Doravante, as referências legais desacompanhadas de indicação expressa do respetivo diploma reportam-se ao novo Código de Processo Civil (NCPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.
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é realizada em conjunto com a notificação do executado para deduzir oposição ao pagamento ou à entrega. E, estabelece o n.º 5 do mesmo artigo 626.º, podem ser logo penhorados bens suficientes para cobrir a quantia decorrente da eventual conversão destas execuções, bem como a destinada à indemnização do exequente e ao montante devido a título de sanção pecuniária compulsória. Esta possibilidade, porém, apesar de se sustentar na celeridade processual, pode colidir com as garantias do executado. Considerando que se trata de execução de sentença, logo com penhora imediata, avançar com a penhora de bens como «garantia» do pagamento da quantia devida pela eventual conversão da execução em execução para pagamento de quantia certa, bem como da destinada à indemnização do exequente, sem que o executado seja ouvido e sem que esses valores hajam sido liquidados, põe em causa o princípio do contraditório e, quanto ao ato da penhora, o princípio da proporcionalidade. Relativamente às disposições do NCPC que versam sobre a execução para prestação de facto, verificamos que a tramitação aí estabelecida permanece inalterada, face ao disposto no anterior Código, com exceção da competência quanto à aprovação das contas relativas às obras e trabalhos necessários para a prestação do facto, que volta a ser do juiz (artigos 871.º e 872.º).
II – A reforma da ação executiva de 2013 1. LINHAS GERAIS DA REFORMA DA AÇÃO EXECUTIVA DE 2013 Se houvesse que definir em poucas palavras a reforma da ação executiva de 2013, introduzida pela Lei n.º 41/20132, de 26 de junho, que aprovou o novo Código de Processo Civil, dir-se-ia que a mesma visou repor a normalidade na ação executiva e na sua tramitação. As últimas alterações significativas nesta matéria tinham sido levadas a cabo pelo Decreto-Lei n.º 226/2008, de 20 de novembro, e trouxeram, na sua maioria, medidas boas mas que não eram novas e medidas novas que não eram boas. Por isso se justificou repensar, mais uma vez, alguns aspetos do processo executivo, em especial na ação executiva para pagamento de quantia certa, embora sem afastar o modelo de ação executiva com penhora imediata e dispensa de citação prévia versus o de ação executiva com citação prévia. Dualidade que, aliás, remonta às modificações levadas a cabo em 1997 e que permaneceu até hoje, embora progressivamente com contornos diferentes. Como sabemos, nem sempre o legislador é feliz nas suas intervenções. Malgrado, não o tem sido, reiteradamente, no caso da ação executiva: - Em 2003, não tanto por razões de fundo, pois a desjudicialização foi largamente aceite como uma boa opção, mas sobretudo por falta de meios e por motivos de má operacionalidade da reforma. - Em 2008, arrebatado por um zelo excessivo, pretendeu «aprofundar» a desjudicialização, «clarificar» as posições e competências do juiz de execução e do agente de execução, mas o que conseguiu foi obscurecer e entorpecer os mecanismos, além 2 - Retificada pela Declaração de Retificação n.º 36/2013, de 12 de agosto.
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de causar lacunas indesculpáveis, nuns casos, e inocuidades, noutros. O mal-estar na ação executiva – área que constitui o barómetro da eficácia do sistema – foi razão mais do que suficiente para, uma outra vez, serem alterados os contornos do modelo adotado. Por isso mesmo, a Reforma do Processo Civil, iniciada em 2010, teve a ação executiva como prioridade. Desta vez, a ação executiva não foi relegada para segundo plano, lamentavelmente por motivos relacionados com a crise económico-financeira. Essa prioridade já tinha sido apontada no memorando da troika, passou para o Programa do Governo e foi assumida na exposição de motivos da proposta de alteração ao Código de Processo Civil. Numa apreciação geral, a revisão da ação executiva tem aspetos positivos. O traço essencial da reforma está no retomar de soluções que foram indevidamente adulteradas em anteriores alterações ao Código de Processo Civil. A reforma da ação executiva introduzida pelo NCPC provocará, no geral, o regresso a uma “normalidade” de onde não se devia ter saído, por referência à Reforma de 2003, embora sejam também repristinados aspetos que remontam a 1997. Foram, ainda, melhorados ou ajustados aspetos instrumentais ou complementares, mas igualmente importantes para o curso da execução. Por outro lado, resolveu algumas querelas doutrinárias e jurisprudenciais, no sentido de consagrar, em letra de lei, soluções já assumidas na prática. Além de que trouxe algumas inovações que visam contribuir para a maior eficácia da execução. Antecipando algumas das alterações do NCPC, em especial as que o próprio legislador enumerou na sua exposição de motivos, vejamos o que temos de novo: a. É revisto o elenco dos títulos executivos; b. Consagra-se a possibilidade de os cidadãos recorrerem ao sistema público de justiça, requerendo que o oficial de justiça desempenhe as funções de agente de execução, em dois casos; c. Clarifica-se a repartição de competências entre o juiz, a secretaria e o agente de execução, estabelecendo-se que a este cabe efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz;
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d. A cessação de funções do agente de execução pode resultar de substituição promovida pelo exequente, devendo este expor o motivo da substituição; e. Na tramitação do processo executivo comum para pagamento de quantia certa, retoma-se a distinção entre forma ordinária e forma sumária; f. Na execução de sentença, consagra-se a regra de que a execução de decisão judicial condenatória corre nos próprios autos; g. Na oposição à execução, é repristinada a terminologia tradicional do processo civil português (embargos de executado, embargante e embargado); h. Altera-se o regime dos efeitos da pendência dos embargos de executado: deixa de haver suspensão automática da execução no caso de haver penhora imediata; i. Nos regimes de penhorabilidade, clarifica-se que a parte a penhorar nos salários é a parte líquida e alarga-se a noção de rendimentos abrangidos; abandona-se a determinação legal de uma ordem de prioridade quanto aos bens penhoráveis, ficando estabelecido que o agente de execução deverá respeitar as indicações do exequente quanto aos bens que este pretende ver prioritariamente penhorados; j. É criado um novo regime de comunicabilidade da dívida exequenda ao cônjuge do executado; k. Na penhora de depósitos bancários, não há necessidade de despacho judicial; l. Na penhora de veículos automóveis, no sentido de evitar a ocultação e o uso do veículo a penhorar, prevê-se que a penhora seja precedida de imobilização do veículo, sendo estabelecida a regra da sua remoção; m. As diligências necessárias para a realização do pagamento devem ser efetuadas, obrigatoriamente, no prazo de três meses a contar da penhora, independentemente do prosseguimento do apenso da verificação e graduação de créditos; n. Nos casos de penhora de rendimentos periódicos, não tendo havido oposição, ou depois de esta ter sido julgada improcedente, as quantias depositadas são entregues ao exequente e as vincendas são-lhe adjudicadas;
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o. No regime da venda por proposta em carta fechada, é consagrada a possibilidade de o exequente adquirir o bem, abrindo-se logo licitação entre o exequente e o proponente do maior preço; p. É admitida a celebração de acordo global de pagamentos entre exequente, executado e credores reclamantes; q. No âmbito da execução para entrega de coisa certa e para prestação de facto, o processo comum continua a seguir forma única; r. Na execução para entrega de coisa certa, se o título executivo for uma decisão judicial, só depois de feita a entrega terá lugar a notificação do executado para deduzir oposição; s. Quando o exequente pretenda a prestação de um facto conjuntamente com o pagamento de quantia certa ou com a entrega de coisa certa, a interpelação do executado tem lugar em conjunto com a sua notificação para deduzir oposição ao pagamento ou à entrega.
2. PARADIGMA DA AÇÃO EXECUTIVA E MODELOS DE TRAMITAÇÃO O NCPC não altera o paradigma da ação executiva. O ordenamento jurídico português continuará, neste âmbito, a assentar num sistema desjudicializado, com o agente de execução a manter as funções de natureza executiva, competindo-lhe realizar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz. Na tramitação inicial do processo, sem abandonar o esquema das execuções com penhora imediata versus as execuções com citação prévia (logo, sem penhora imediata), deixa de haver as lacunas e obscuridades que resultavam dos antigos artigos 812.º-C a 812.º-F. É substituída a forma única da ação executiva, prevista no anterior artigo 465.º (que, na verdade, era uma falácia), pelas formas ordinária e sumária da ação executiva comum para pagamento de quantia certa (artigo 550.º, n.º 1), mantendo-se, no entanto, a forma única para o processo comum para entrega de coisa certa e para prestação de facto (artigo 550.º, n.º 4). O processo ordinário retoma a regra do despacho liminar (artigo 726.º, n.º 1), isto é, após o recebimento do requerimento executivo – que
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neste caso volta a ser da competência da secretaria – o processo é concluso ao juiz para ser proferido despacho liminar que, consoante os casos, será de indeferimento liminar, convite ao aperfeiçoamento ou, havendo o processo de prosseguir, de citação do executado (artigo 726.º, n.ºs 2 a 6). É, assim, bem-vindo o regresso à consagração expressa da regra do despacho liminar. Consequentemente, poupam-se os operadores judiciais de toda a instabilidade e insegurança que reinou no período pós-Decreto-Lei n.º 226/2008 e que, apesar dos esforços de clarificação por parte da doutrina e mesmo do legislador, se foi prolongando por mais tempo do que seria desejável e provocou, sem dúvida, morosidade processual. Por sua vez, no processo de execução sumário (artigo 855.º) o requerimento executivo é remetido eletronicamente ao agente de execução, sem precedência de autuação do processo e de despacho judicial, com indicação do número único do processo. Feita a remessa dos autos para o agente de execução, compete-lhe receber ou recusar o requerimento executivo, bem como provocar a intervenção do juiz de execução, se for caso disso, e, se o processo houver de prosseguir, seguem-se as diligências para a penhora, que será realizada antes da citação do executado. Continuamos num sistema de execução a «duas mãos», articulada entre o juiz de execução e o agente de execução, embora com reforço do papel da secretaria judicial, designadamente como «pivot» entre os demais intervenientes, mas com uma definição mais clara das tarefas de cada um e dos casos em que o juiz tem um papel prevalecente (nas execuções comuns ordinárias) face àqueles em que o juiz tem um papel mais residual (nas execuções comuns sumárias). Com os mesmos tipos de tramitação inicial da execução, há, apesar de tudo, uma diminuição dos casos sujeitos ao regime da penhora imediata, num sinal claro de que se pretende conferir maiores garantias ao executado e evitar execuções injustas através do reforço da intervenção inicial do juiz de execução. Por exemplo, com esta opção legislativa, as obrigações pecuniárias tituladas em documentos autênticos ou documentos particulares autenticados, sem garantia real constituída, de valor entre 10.000 e 30.000€, que até agora poderiam estar abrangidas pelo regime de penhora imediata, passam a seguir o regime regra de despacho liminar e citação prévia porque a respetiva execução será classificada como ordinária. Assim, a fase liminar da ação executiva pode ter uma das tramitações seguintes:
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- Execução sem citação prévia e sem despacho liminar, que corresponderá à tramitação da execução sumária (artigo 855.º, 3); - Execução sem citação prévia mediante despacho liminar, conforme previsto no artigo 727.º; - Execução com citação prévia e despacho liminar, que corresponderá à tramitação da execução ordinária e será o modelo regra (artigo 726.º); Porém, deixa de estar consagrada a hipótese de execução com citação prévia e sem despacho liminar (anterior artigo 812.º-F, n.º 2). Esta tramitação foi excluída e os casos que seguiam essa tramitação são absorvidos pela execução ordinária, com exceção da alínea d) do citado artigo 812.º-F, que já era letra morta. Em especial, no caso de execução movida apenas contra o devedor subsidiário, considerando o regime de penhorabilidade subsidiária, se o mesmo não renunciou ao benefício da excussão prévia, terá de haver citação prévia e por isso a execução é sempre ordinária [artigo 550.º, n.º 3, alínea d)]. Admite-se, contudo, a possibilidade de ser requerida dispensa de citação prévia pelas razões e nos termos do artigo 727.º.
3. A AÇÃO EXECUTIVA NA NOVA SISTEMATIZAÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL A opção pela renumeração do NCPC trouxe, inevitavelmente, consequências no enquadramento sistemático das normas relativas à matéria do processo executivo. Mas não foi esta a única causa, houve ainda uma notória intenção de conceber uma outra arquitetura das normas relativas à ação executiva que, aliás, ganha autonomia no Livro IV, o qual acolhe quase toda essa matéria. Para além disso, a circunstância de passar a haver diferentes formas de processo para a ação executiva comum para pagamento de quantia certa (ordinária e sumária) determina, reflexamente, uma diferente arrumação das respetivas disposições legais. As espécies de ações, consoante o seu fim, estão previstas no artigo 10.º do NCPC. Nele se distinguem as ações em declarativas e executivas e se encontra a noção de ação executiva como aquela em que o credor3 3 - Na anterior redação referia-se «autor». O termo «credor» é, na verdade, mais adequado, na medida em que as execuções podem basear-se em títulos executivos judiciais ou extrajudiciais.
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requer as providências adequadas à realização coativa de uma obrigação que lhe é devida (artigo 10.º, n.ºs 1 e 4). Na mesma norma, passa a constar a regra nulla executio sine titulo e, ainda, a classificação das ações executivas quanto ao fim: execução para pagamento de quantia certa, para entrega de coisa certa e para prestação de facto, positivo ou negativo (artigo 10.º, n.ºs 5 e 6). Ao longo do NCPC, a matéria da ação executiva encontra-se sistematizada nos termos seguintes: - No capítulo IV (Disposições especiais sobre execuções) do título III (Das partes), do Livro I (Da ação, das partes e do tribunal), as disposições sobre os pressupostos processuais relativos às partes, com as regras sobre legitimidade, incluindo a coligação, e sobre patrocínio judiciário obrigatório (artigos 53.º a 58.º). - Na secção V (Disposições especiais sobre execuções) do capítulo III (Da competência interna) do título IV (Do tribunal), do Livro I (Da ação, das partes e do tribunal), as disposições sobre os pressupostos processuais relativos ao tribunal, com definição dos critérios de competência em razão do território (artigos 85.º a 90.º). - No capítulo III (Processo de execução), do título VII (Das formas de processo), do Livro II (Do processo em geral), são definidas as formas do processo executivo comum e o direito supletivo (artigos 550.º e 551.º). - No Livro III (Do processo de declaração) consta a norma relativa à execução da decisão judicial condenatória, mais precisamente no capítulo III do título IV, relativo aos efeitos da sentença (artigo 626.º). Tendo em conta que a execução de sentença passará, em regra, a correr nos próprios autos, justifica-se que esta norma esteja inserida na parte do processo declarativo. - O novo Livro IV trata Do processo de execução e está dividido em cinco títulos: I - Do título executivo (artigos 703.º a 708.º, sobre as espécies de títulos executivos e respetivos requisitos de exequibilidade, e artigos 709.º a 711.º, sobre a cumulação de execuções); II - Das disposições gerais (artigos 712.º a 723.º); III - Da execução para pagamento de quantia certa, onde se distingue o processo ordinário (artigos 724.º a 854.º) e o processo sumário (artigos 855.º a 858.º); IV - Da execução para entrega de coisa certa (artigos 859.º a 867.º) e V - Da execução para prestação de facto (artigos 868.º a 877.º).
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Há uma clara opção, correta, de agregar todas as normas que dizem respeito ao processo executivo, mantendo apenas, no lugar próprio do Código, as normas sobre as partes e o tribunal.
4. APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO O regime transitório definido para a ação executiva, previsto no artigo 6.º da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, determina como regra geral a aplicação imediata do NCPC às execuções pendentes a 1 de setembro de 2013. Às execuções pendentes à referida data são aplicáveis as alterações introduzidas pelo NCPC. Nessa medida, por exemplo, os novos regimes de penhorabilidade, as novas regras em matéria de venda e pagamento servem também as execuções pendentes, pondo-se fim à existência de execuções que se regem por diferentes normas processuais consoante as disposições em vigor à data em que o respetivo processo deu entrada. Contudo, há exceções. No que diz respeito aos títulos executivos, às formas do processo executivo, ao requerimento executivo e à tramitação da fase introdutória, as execuções pendentes continuam a reger-se pela lei antiga e, por isso, as normas do NCPC que alteraram as referidas matérias apenas se aplicam às execuções iniciadas após a sua entrada em vigor (artigo 6.º, n.º 3, da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho). Em consequência, a título exemplificativo, uma execução pendente, a 1 de setembro de 2013, em que o título executivo seja um documento particular vai prosseguir os seus termos na medida em que são salvaguardados os efeitos da força executiva do documento conferida pela lei em vigor à data em que o respetivo processo executivo deu entrada. Do mesmo modo, as execuções pendentes à referida data e que seguiam forma única não serão «reclassificadas». As novas formas do processo, em particular as formas de processo ordinário e sumário das execuções para pagamento de quantia certa, bem como a respetiva tramitação da fase introdutória, só vão aplicar-se aos processos que se iniciem após a entrada em vigor do NCPC. Convém salientar, ainda, que a aplicação imediata do NCPC deve estar sujeita a uma interpretação que leve em consideração os princípios gerais de processo civil e não desvirtue os efeitos e expectativas criadas pela lei em vigor no momento da prática de certos atos. No
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caso particular do acordo de pagamento em prestações, considerando que estamos perante a celebração de um negócio jurídico, embora com efeitos processuais, o conteúdo da relação jurídica parece não poder desvincular-se dos factos que lhe deram origem e, consequentemente, poderá questionar-se se a lei nova pode aplicar-se às relações já constituídas e que subsistam à entrada em vigor no NCPC. Assim, os acordos de pagamento celebrados ao abrigo da lei antiga produziram efeitos – suspensão da execução e manutenção da penhora – e a alteração dos mesmos de acordo com a lei nova – extinção da execução e conversão da penhora em hipoteca ou penhor – sempre estará dependente, pelo menos, da audição das partes. Porém, nas execuções pendentes nas quais as partes venham a celebrar o referido acordo aplicar-se-á a lei nova. Relativamente aos enxertos de natureza declarativa, dita o n.º 4 do citado artigo 6.º que a lei nova apenas se aplica àqueles que sejam deduzidos a partir da data da sua entrada em vigor. Os procedimentos e incidentes de natureza declarativa que se encontrem pendentes a 1 de setembro irão continuar a sua tramitação de acordo com a lei antiga, mas aqueles que venham a ser deduzidos após essa data seguirão a lei nova, mesmo dizendo respeito a execuções que deram entrada antes da entrada em vigor do NCPC. A norma transitória dispõe ainda que as execuções instauradas antes de 15 de setembro de 2003 são tramitadas por oficial de justiça, que passa a praticar os atos que são da competência do agente de execução (artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho). Por fim, é de referir a consagração do poder de intervenção oficiosa do juiz, vigente até 1 de Setembro de 2014, através do qual o juiz, oficiosamente, deve atuar no sentido de garantir a correta aplicação quer das normas transitórias previstas na Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, quer do regime processual aplicável de acordo com o NCPC. Assim, determina o artigo 3.º da Lei que aprovou o NCPC que, durante o primeiro ano subsequente à entrada em vigor da nova Lei: a) O juiz corrige ou convida a parte a corrigir o erro sobre o regime legal aplicável por força da aplicação das normas transitórias previstas na presente lei; b) Quando da leitura dos articulados, requerimentos ou demais peças processuais resulte que a parte age em erro sobre o conteúdo do regime processual aplicável, podendo vir a praticar ato não admissível ou omitir ato que seja devido, deve o juiz, quando aquela prática ou omissão ainda sejam evitáveis, promover a superação do equívoco.
III – Agente de execução, juiz de execução e secretaria
5. REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS: AGENTE DE EXECUÇÃO, JUIZ DE EXECUÇÃO E SECRETARIA Artigos 719.º a 723.º do NCPC Artigos equivalentes do anterior CPC: artigos 808.º e 809.º Sobre a repartição de competências versam os artigos 719.º a 723.º. No essencial, não há significativas alterações sobre os poderes atribuídos ao agente de execução e ao juiz de execução. Este mantém todas as competências relacionadas com o exercício do poder jurisdicional, acrescendo a devolução de algumas competências atribuídas ao agente de execução aquando das alterações de 2008, continuando a partilha de funções a assentar no respeito pelo princípio da reserva de juiz. Conforme se extrai do artigo 723.º, todos os atos conexionados com o princípio da reserva de juiz ou suscetíveis de afetar direitos fundamentais das partes ou de terceiros são da competência do juiz de execução. Designadamente, proferir despacho liminar, quando este deva ter lugar, julgar a oposição à execução e à penhora, verificar e graduar créditos, decidir reclamações de atos e impugnações de decisões do agente de execução (artigo 723.º, n.º 1). Este mantém-se, ainda, como guardião da legalidade de todos os atos processuais e da regularidade da instância, sendo que esse poder de sindicância deve ser exercido quando a sua intervenção seja provocada por algum dos intervenientes processuais, nos termos do artigo 723.º, n.º 1, alínea d), ou quando o processo lhe seja concluso por força de alguma competência direta e expressamente atribuída por lei. Com efeito, continua a estar previsto o poder de o juiz conhecer oficiosamente, até ao primeiro ato de transmissão dos
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A Ação Executiva no Novo Código de Processo Civil
bens penhorados, das questões que poderiam ter determinado, em sede liminar, o indeferimento liminar ou o aperfeiçoamento do requerimento executivo (artigo 734.º). Salientam-se, agora, algumas das competências que voltam a estar expressamente atribuídas ao juiz de execução: adequar o valor da penhora de vencimentos à situação económica e familiar do executado (artigo 738.º, n.º 6); tutelar os interesses do executado quando estiver em causa a sua habitação (artigos 704.º, n.º 4; 733.º, n.º 5; 785.º, n.º 4); designar administrador para proceder à gestão ordinária do estabelecimento comercial penhorado (artigo 782.º, n.os 2 e 3); autorizar o fracionamento do prédio penhorado (artigo 759.º); aprovar as contas na execução para prestação de facto (artigo 871.º); autorizar a venda antecipada de bens penhorados, em caso de deterioração ou depreciação ou quando haja vantagem na antecipação da venda (artigo 814.º); decidir o levantamento da penhora em sede de oposição incidental do exequente a esse levantamento, perante o agente de execução, na sequência de pedido de herdeiro do devedor (artigo 744.º, n.º 3). Para clarificação da repartição de competências, mantêm-se as disposições que especificamente se reportam ao agente de execução (artigo 720.º) e ao juiz de execução (artigo 723.º), mas é aditada uma norma de caráter geral – o artigo 719.º – que, em primeiro lugar, se reporta aos poderes do agente de execução usando o critério residual que já vigorava. Assim, cabe ao agente de execução efetuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz. Segue-se uma enumeração exemplificativa mas mais completa dessas diligências, como sejam citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações, pagamentos (artigo 719.º, n.º 1). Por outro lado, fica esclarecido que as funções do agente de execução podem prolongar-se para além da extinção da execução, pois deve ser ele a assegurar a realização de atos emergentes do processo que careçam da sua intervenção, mesmo depois de extinta a ação executiva (artigo 719.º, n.º 2). Fica a seu cargo, por exemplo, o levantamento da penhora (artigo 763.º), bem como a conversão da penhora em hipoteca ou penhor em consequência da celebração de um acordo de pagamento em prestações ou de acordo global e, ainda, a extinção dessas garantias após o cumprimento dos respetivos acordos (artigos 807.º e 810.º). Como se vê, na norma sobre «repartição de competências» é feita menção expressa à secretaria. À semelhança do que acontecia antes de
A Ação Executiva
Na segunda parte da obra é apresentada uma coletânea da legislação que versa sobre a ação executiva, facilitando a sua consulta aos que, na vida académica ou profissional, lidam com esta temática.
Lurdes Mesquita
O texto que compõe a primeira parte destaca e comenta as principais alterações introduzidas pelo novo Código no regime da ação executiva.
no Novo Código de Processo Civil
A presente obra visa proporcionar, a todos quantos estudam ou lidam profissionalmente com a ação executiva, um instrumento de trabalho sobre o atual regime da ação executiva, após as alterações introduzidas pelo novo Código de Processo Civil.
Francisco Costeira da Rocha
A Ação Executiva no Novo Código de Processo Civil
Lurdes Mesquita Francisco Costeira da Rocha
A Ação Executiva no Novo Código de Processo Civil Principais alterações e legislação aplicável
2ª Edição revista e atualizada Novo Código de Processo Civil (articulado relativo à ação executiva) Regulamentação da ação executiva Tramitação eletrónica dos processos judiciais Meios eletrónicos de identificação do executado e dos seus bens Citação eletrónica de instituições públicas Remuneração dos serviços prestados por instituições na ação executiva Registo informático de execuções Lista pública de execuções
ISBN 978-972-788-911-2
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Sistemas de apoio a situações de sobreendividamento
Lurdes Mesquita Doutora em Direito. Professora Adjunta do Departamento de Direito da ESG do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave. Professora Auxiliar do Departamento de Direito da Universidade Portucalense Infante D. Henrique.
Francisco Costeira da Rocha Mestre em Direito. Juiz de Direito nos Juízos de Execução do Porto.