OPINIÃO
sexta-feira, 12 Novembro de 2010
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Luís Oliveira, da Miranda & Associados, avisa
É de prever uma escalada continuada do endividamento público A situação económica de Portugal levanta sérias preocupações. O que se passa neste momento, mesmo ao nível da política fiscal, tem que ser entendido à luz das raízes da crise e do que irá suceder no futuro próximo. Luís Oliveira, da Miranda & Associados, apresentou algumas das linhas de reflexão para este Orçamento do Estado, tendo em conta o seu enquadramento macroeconómico. Reflexões que tiveram lugar durante um seminário organizado em conjunto por aquele gabinete de advogados e a “Vida Económica”. Desde logo, pode-se concluir que este OE terá efeitos de contracção e é possível uma escalada continuada do endividamento público. Também não será de estranhar o aumento dos gastos financeiros do Estado e pode-se chegar à estagnação da economia. Neste cenário, torna-se cada vez mais inevitável o recurso ao Fundo Monetário Internacional. De salientar ainda que existe uma ligação entre a dívida soberana e a crise do sector
bancário. De facto, a banca tem activos fortemente afectados por situações de imparidade (valores públicos e privados). Luís Oliveira chama também a atenção para o facto de os nossos bancos não terem acesso ao financiamento internacional e estarem a viver sobretudo dos apoios do Banco Central Europeu. No entanto, “é imprescindível manter a estabilidade do sistema financeiro, uma situação que implica uma clara partilha do risco”. A actual situação de Portugal está estreitamente ligada à sua presença na Zona Euro. E esta é uma realidade de que o país não se pode alhear, avisa Luís Oliveira. “O país tem que se consciencializar que já não existem mecanismos cambiais e que não podemos mexer na massa monetária. O grande instrumento de política económica que fica é a política orçamental, mas esta também obedece a balizas, havendo supervisão multilateral da política orçamental e procedimentos sobre défices excessivos.” Adianta ainda que há mecanis-
RICARDO RIO rioric@gmail.com http://econominho.blogspot.com
S
e há algo que, sendo por vezes incontornável, me causa algum desconforto, como sempre sucedeu ao longo dos últimos onze anos de “colunista económico”, é a circunstância de ter que escrever sobre alguém com quem tenho alguma proximidade. Desde logo porque, a ser por boas razões, temo estar a ser parcial no juízo efectuado, vendo a racionalidade ser toldada por outros factores de natureza emocional. Pelo contrário, quando me vejo forçado a assumir uma postura crítica do desempenho, da conduta ou do discurso de alguém que merece o meu apreço, hesito sempre entre a tentação da condescendência e o receio dos danos que podem resultar de tal opinião, quanto mais não seja no plano das relações pessoais. Em verdade, este é um desses momentos. O “meu” Professor Fernando Teixeira dos Santos, hoje reconhecido por todos os Portugueses na sua qualidade de Ministro das Finanças, é uma pessoa com quem sempre cultivei uma óptima relação e a quem reconheci o valor associado às suas capacidades técnicas e científicas, a sua ponderação e bom senso, a postura determinada na defesa das suas convicções e a capacidade para estabelecer bases de entendimento em contextos de disputa de interesses.
mos importantes como a protecção de “bail out” e de monitorização da dívida pública. Neste âmbito, importa lembrar que o Banco Central Europeu apenas pode comprar dívida pública no mercado secundário. É essencial ainda a criação de um mecanismo permanente de emergência para situações em que a Zona Euro esteja ameaçada, designadamente o apoio financeiro público com partilha de “bail in” pelos credores. O problema do “lixo tóxico”
Luís Oliveira considera que é fundamental fazer um enquadramento histórico para se compreender como se chegou à actual situação de graves problemas para a economia nacional. Para o efeito utiliza o estudo da OCDE que aponta factores essenciais nesta evolução. Desde logo, o que se passou nos Estados Unidos, com uma política de financiamento à habitação sem que que houvesse garantias por parte de quem pe-
“Este OE terá efeitos de contracção” , afirma Luís Oliveira.
dia o crédito. A banca começou a entrar num espaço de agências de empréstimos e a seguir a mesma política. Finalmente, a securitização resultou em que os bancos aumentassem a sua rentabilidade, deixando de ser meros intermediários financeiros. Ou seja, “a inovação
financeira acabou por gerar vários activos tóxicos”, explicou Luís Oliveira. Outros estudos também apontam que na raiz da crise financeira esteve a ideia que o capitalismo tem a capacidade inerente de auto-estabilização, pelo que a regulação poderia ser dispensada. GUILHERME OSSWALD
Santos e pecadores Foi assim que sucedeu no nosso relacionamento professor/aluno, nas participações comuns em diversos órgãos de gestão da Faculdade de Economia do Porto e em diversos contextos profissionais posteriores. Apesar da experiência “nacional” que resultava da Presidência da CMVM – Comissão do Mercado de Valores Mobiliários e da passagem pela Secretaria de Estado das Finanças com Sousa Franco no primeiro Governo de António Guterres, a sua indigitação para Ministro das Finanças após a ruptura de Luís Campos e Cunha acabou por ser uma boa surpresa. Em particular durante o primeiro mandato de José Sócrates, e pese embora a falta de sentido político que pautou algumas das suas intervenções públicas (muitas vezes em abono da sua própria credibilidade), Teixeira dos Santos assumiu-se como um Ministro disciplinado e disciplinador, mas com resultados pouco sensíveis no processo de consolidação orçamental. Aqui, tal como transpareceu para a própria opinião pública, o Ministro das Finanças ficou várias vezes com o ónus das opções menos simpáticas do ponto de vista político, entrando até diversas vezes em contradição com outros colegas do Executivo e com o próprio Primeiro-Ministro, José Sócrates.
Nesse período, Teixeira dos Santos construiu uma aura de uma espécie de “grilo falante” da governação socialista - qual consciência última dos despautérios praticados pelos Governos de Sócrates -, numa tarefa tão louvável quanto mal sucedida por entre a cultura do desperdício, da tomada de assalto do aparelho de Estado e do populismo reinante, em especial em períodos pré-eleitorais. Percebeu-se, pois, a saturação com que atingiu a fase final desse mandato e as expectativas publicamente ventiladas de uma “reforma dourada” que pudesse recompensar devidamente os serviços prestados à Pátria no exercício dessas funções. Acontece, porém, que esse exílio não se consumou e que, continuando Ministro das Finanças, Teixeira dos Santos se vê confrontado com uma conjuntura política, económica e financeira cada vez mais agreste, à medida que se altera a conjuntura internacional (ou a perspectiva como a envolvente olha para situações como a portuguesa) e que, sobretudo, se vai descobrindo o muito lixo que a Governação de Sócrates procurou esconder debaixo do tapete. Sem a solidariedade política e efectiva do resto do Executivo e do Primeiro-Ministro – sistematicamente mergulhados numa lógica de facilitismo e deslumbramento que
muito condicionou as nossas possibilidades de mitigar de forma atempada os graves problemas que o País hoje enfrenta -, sem a capacidade política para gerir melhor algumas das suas intervenções públicas recentes e, porventura, sem a visão ou a vontade para encontrar soluções efectivas para os problemas existentes, Teixeira dos Santos tornouse um dos rostos do colapso do Governo, do seu irremediável fracasso nas metas traçadas, em particular na esfera orçamental, e da nossa condenação colectiva a um prolongado período de “vacas magras”. Nesta fase, invocar situações como os deslocados ataques aos Presidentes de Junta de Freguesia, as críticas à “falta de patriotismo” da PT no processo dos dividendos, a famigerada entrevista ao Expresso em que colocava a taxa de juro de 7% sobre a nossa dívida soberana como o limiar para a intervenção do FMI, ou os atrasos e erros técnicos do OE/2011 são meros apontamentos no turbilhão de incidências que já conduziram à sua “nomeação” como “Pior Ministro das Finanças da União Europeia” em diversos media internacionais de relevo. Sejamos claros: pessoalmente, continuo a achar que Teixeira dos Santos não é aquilo que hoje parece. Mas, como se pode beber da sabedoria popular, “Diz-me com quem andas…” PUB