Obras já publicadas:
• "Justiça Juvenil: a lei, os tribunais e a (in)visibilidade do crime feminino", Vida Económica (2017). • "Os tribunais como espaços de reconhecimento, funcionalidade e de acesso à justiça", Vida Económica (2015).
Émile Durkheim é um clássico da sociologia, autor incontornável para todos quantos se interessam pelo estudo das teorias sociais e sociológicas. Este livro procura organizar, sistematizar e apresentar as principais ideias do pensamento de Émile Durkheim, ao mesmo tempo que questiona as leituras canónicas que o apresentam como um autor positivista e conservador. Alternativamente, defende-se a relevância do seu contributo para o pensamento teórico e político, construído em torno de noções como a do individualismo moral e da sua intervenção enquanto sociólogo público. O livro destina-se, sobretudo, aos leitores interessados no estudo da teoria social e das teorias sociológicas e reveste-se de especial interesse para o público universitário ligado às áreas da sociologia, ciências políticas, relações internacionais e direito.
Outros titulos de António Casimiro Ferreira: • La société d’austérité - L’avène-
ment du droit d’exception". Paris: L.G.D.J. (2017). • "Política e Sociedade - Teoria social em tempo de austeridade", 2ª Edição, Vida Económica (2016). • "Contextos e desafios de transformação das magistraturas", Vida Económica (2013). • "Sociedade da Austeridade e direito do trabalho de exceção", Vida Económica (2012).
IISBN SBN 978989-768-439-5 978-989-768-421-0
www.vidaeconomica.pt livraria.vidaeconomica.pt ISBN: 978-989-768-421-0 978-989-768-439-5
99 789897 789897 684395 684210
Émile Durkheim
• "A proteção das crianças no concelho de Lisboa", Vida Económica (2017).
O SOCIAL, O POLÍTICO E O JURÍDICO
ANTÓNIO CASIMIRO FERREIRA
Coordenação de: António Casimiro Ferreira e João Pedroso
Émile Durkheim
ANTÓNIO CASIMIRO FERREIRA
Émile Durkheim O SOCIAL, O POLÍTICO E O JURÍDICO
António Casimiro Ferreira Doutorado em Sociologia do Estado e do Direito pela Universidade de Coimbra, professor auxiliar da Faculdade de Economia e investigador do Centro de Estudos Sociais da mesma Universidade. Em 2006, foi distinguido com o Prémio Agostinho Roseta. Atualmente, é co-coordenador do Programa de Doutoramento Direito, Justiça e Cidadania no séc. XXI, da Universidade de Coimbra.
ÍNDICE Introdução ....................................................................................
11
1. A noção de sociedade durkheimiana ....................................
16
2. Positivismo e irredutibilidade da vida em sociedade ............
19
3. Ciência da moral e consciência coletiva ...............................
22
4. Da teologia civil à educação moral .......................................
25
Capítulo 1 – Esboço de um autor ................................................
33
1.1. O sociólogo crítico e comprometido .................................
35
1.2. Émile Durkheim, um clássico ...........................................
40
1.3. Um ou dois Durkheim? .....................................................
49
1.4. Que contexto para o pensamento durkheimiano? .............
51
1.5. A atualidade de Durkheim ................................................
55
1.5.1. A crise de 2008, segundo Émile Durkheim ................
58
Capítulo 2 – A Divisão do Trabalho Social ...............................
65
Introdução ................................................................................
65
2.1. O “problema de Durkheim”: a questão da diferenciação social
69
2.2. Solidariedade social ............................................................
74
2.2.1. A prioridade conferida à solidariedade orgânica .........
74
2.2.3. As características da solidariedade mecânica e orgânica
76
7
Émile Durkheim - Sociedade, Política e Direito
2.3. Consciência coletiva e tipos de solidariedade ....................
78
2.4. Mudança social ..................................................................
81
Capítulo 3 – A Divisão do Trabalho Social e as suas formas anormais .......................................................
85
3.1. A distinção entre o normal e o patológico ........................
85
3.2. A Divisão Anómica do Trabalho ......................................
88
3.3. A Divisão Forçada do Trabalho ........................................
92
3.4. Outra Forma Anormal de Divisão do Trabalho ...............
97
3.5. Comentário final ...............................................................
98
Capítulo 4 – Uma sociologia das instituições políticas ..............
101
4.1. O Estado durkheimiano como crítica ao liberalismo utilitarista e ao hegelianismo .............................................
104
4.2. Uma alternativa à teoria da separação de poderes: a regulação dos despotismos da sociedade e do Estado .........................
109
4.3. Uma teoria democrática .....................................................
114
4.4. Estado, democracia e corporações ......................................
118
Capítulo 5 – A sociologia do direito de Émile Durkheim .........
125
5.1. Os clássicos e a sociologia do direito .................................
125
5.2. A vida social por todo o lado onde existe organiza-se sob a forma de direito ........................................................
129
5.3. Uma definição sociológica do direito ................................
130
5.4. Direito: solidariedade mecânica e solidariedade orgânica ..
131
5.5. Sanções repressivas e sanções restitutivas ..........................
133
5.6. A forma do direito predominante nas sociedades modernas ..
136
5.7. O processo de juridificação segundo Émile Durkheim .....
138
8
índice
Capítulo 6 – As duas leis de evolução penal ...............................
143
Introdução ................................................................................
143
6.1. A primeira lei penal (quantitativa) .....................................
146
6.2. A segunda lei penal (qualitativa) ........................................
149
6.3. A relação entre a primeira e a segunda lei .........................
151
Capítulo 7 – Os fundamentos do individualismo moral ...........
157
7.1. O falso anti-individualismo de Émile Durkheim ..............
159
7.2. Alegações em defesa do individualismo durkheimiano .....
163
7.3. Da Divisão do Trabalho Social a O Suicídio: o individualismo não é um egoísmo ..............................................................
166
7.4. A consolidação teórica do individualismo moral ..............
170
7.5. Homo duplex: o anjo-besta .................................................
175
7.6. Sofrimento e efervescência: roteiro para debates teóricos em torno de Durkheim .....................................................
178
Capítulo 8 – O espaço público como fonte teórica ...................
193
8.1. O caso Dreyfus: mais do que o caso Dreyfus! ...................
193
8.2. Manifesto: “o individualismo e os intelectuais” .................
198
Capítulo 9 – Teoria política .........................................................
203
9.1. Liberdade liberal ou segurança comunitarista? ..................
203
9.2. A invenção da solidariedade ..............................................
207
9.3. Republicanismo e socialismo liberal ..................................
211
9.4. O socialismo durkheimiano ..............................................
215
9.5. A questão social e a reorganização moral ..........................
218
9.6. A questão da justiça social em Émile Durkheim ...............
222
9.7. Propriedade social e questionamento da herança ..............
228
9
Émile Durkheim - Sociedade, Política e Direito
9.8. Mercado e amoralidade ......................................................
232
9.9. O contrato leonino e a desconstrução da lógica contratual ....
234
Nota conclusiva ...........................................................................
237
Bibliografia ...................................................................................
241
10
INTRODUÇÃO A intenção de escrever este livro dedicado a Émile Durkheim resultou de dois objetivos: primeiro, o de organizar e sistematizar materiais utilizados na minha prática docente e de investigação1; o segundo, o de desenvolver um exercício de análise dos trabalhos do autor, crítico do cânone das interpretações reducionistas que o apresentam como um sociólogo positivista, determinista e conservador. Dos durkheimólogos pode-se esperar grandes contributos para a análise e história das teorias sociológicas em torno de debates relevantes para a comunidade científica. Mas não é nesse sentido que esta reflexão é levada a cabo. O Durkheim aqui apresentado ao leitor faz parte do meu itinerário pessoal, com as opções que tal implica em termos de seleção de materiais e da literatura consultada. Tem evidentes preocupações pedagógicas, mas, simultaneamente, é um exercício de análise metateórica orientado pela minha agenda de investigação em teoria social apostada na clarificação das teorias sociais existentes e no desenvolvimento de novas teorias, mais integradas e sintéticas (Ritzer, 1992:228). Na fixação desta tarefa identifico dois aspetos estruturadores do trabalho metateórico. O primeiro relacionado com a relação entre a teoria social em geral e a teoria sociológica em particular. Sabemos que desde os clássicos da sociologia até aos pensadores contemporâneos as formas de legitimação
1. No ensino das disciplinas de Teoria Política, Teorias Sociológicas, Sociologia do Poder e da Política, seminário de Sociologia Política e seminário do Estado, Direito e Poder Judicial lecionadas em diferentes momentos nas licenciaturas em Relações Internacionais, Sociologia e no programa de Doutoramento em Direito, Justiça e Cidadania no século XXI, na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.
11
Émile Durkheim - Sociedade, Política e Direito
da sociologia como disciplina científica conduziram à pretensão de transcender a tradição e os desenvolvimentos do pensamento filosófico, político, moral e jurídico. Contudo, a história da procura da autonomia por parte da sociologia enquanto ciência foi paralela a outra história – a do reconhecimento da sua incapacidade de se fechar sob uma pretensa neutralidade e objetividade científicas. A dissolução desta pretensão fundacional por parte da sociologia enriqueceu as diferentes teorias e perspetivas, que, de uma forma clara, desde a crise da sociologia dos anos 1970, procuraram explorar as interdependências e combinações entre estas diferentes áreas do conhecimento. Encurtando razões nos argumentos relativos à matéria conhecida na história da sociologia e reduzindo a complexidade da enorme riqueza paradigmática e teórica não só da sociologia, mas das ciências sociais em geral, pode-se afirmar que a “sombra” da política, do jurídico e da moral ainda persiste. A este propósito, contrapõem-se os defensores das diferentes formas de positivismo (hard ou soft) às posições dos que se reveem na viragem normativa da sociologia e nas diferentes tradições da teoria crítica. O autor deste livro identifica-se com a segunda posição, de que resulta que o trabalho teórico, quer se trate da organização e sistematização, quer do desenvolvimento de estratégias de teorização, inicia-se com a recusa da dicotomia entre teorias substantivas e teorias normativas (as teorias são simultaneamente formas de interpretação da realidade e entendimentos do modo como ela deve estar organizada), com o afastamento da presunção de uma teoria sociológica pura (as teorias evidenciam dimensões políticas, morais, éticas e jurídicas) e com a subversão do princípio da propriedade disciplinar – utiliza-se uma conceção alargada de teoria social, nela se incluindo os diferentes contributos das ciências sociais e humanas. O segundo está associado à ideia de Alvin Gouldner de que toda a teoria social é também uma teoria pessoal, expressando inevitavelmente a experiência e a perspetiva do seu autor (Gouldner, 1972:41). Pelo que, neste sentido, toda a teoria social está imersa num nível subteorético, sob o domínio de assunções e sentimentos que simultaneamente a constrangem e libertam. Este nível subteorético que é
12
introdução
moldado e partilhado com a sociedade, mas também individualmente organizado, diferenciado e modificado através da experiência social no mundo, é designado por Alvin Gouldner como “infraestrutura teórica” (cf. Gouldner, 1972:46). Esta é resultado de uma preocupação que advém do realismo empírico, um esforço de aproximação aos sistemas humanos aos quais qualquer trabalho teórico está visível e intimamente ligado. O que está em questão é a analítica através da qual nos movemos entre pessoas e estruturas sociais, entre a sociedade e a dimensão local mais especificamente ligada aos ambientes e contextos nos quais a teoria social é criada (cf. Gouldner, 1972:47). Do mesmo modo, também qualquer teoria social está embutida na ideologia de quem a compõe. Qualquer teoria social assume crenças sobre o que é real no mundo, contendo implicações sobre o que é possível fazer, e sobre o que é possível mudar, os valores que incluem indicam quais os cursos de ação desejáveis, moldando, assim, as suas condutas. Neste sentido, segundo Gouldner, “qualquer teoria e qualquer teórico ideologizam a realidade social” (Gouldner, 1972:48). Tendo presente as considerações anteriormente produzidas, quero acrescentar que o esforço aplicado na escrita deste texto é, para retomar uma expressão de Umberto Eco, um “passeio inferencial”, onde procuro figurar como parte integrante e colaboradora dos escritos de Durkheim. Amadureço o meu pensamento “através do estudo escrupuloso de um grande mestre”, tal como Durkheim confidenciava a Maublanc, a propósito da importância de Renouvier para a sua obra. O desafio maior é o de, sem reverenciar nem banalizar a obra de Durkheim, investigar a sua relevância para a teoria social, a teoria política, a sociologia política e a sociologia do direito. Parto do pressuposto de que, para além do consenso existente em torno do seu importante lugar no pensamento sociológico, patente em noções como sejam as de divisão do trabalho, consciência coletiva, representações coletivas, factos sociais, anomia e outras, ele permanece relevante para o estudo das sociedades atuais e para o desenvolvimento de estratégias de teorização. Muitos leem Durkheim ensaiando um jogo de descobertas acerca do que escreveu de diferente de Marx, Weber, Simmel ou Tonnies. 13
Émile Durkheim - Sociedade, Política e Direito
Aqui, alternativamente, procura-se a visão sociologicamente implicada e a profundidade da existência social da sua reflexão que o tornam num autor radical, no mesmo sentido de Freud, com o qual existe um paralelo, dado que Durkheim tenta entender as fontes inconscientes da existência social, tal como Freud tentou entender as fontes inconscientes da existência pessoal (cf. Bellah, 1973:liv). Por outro, Durkheim situado no tempo presente deixa realçar a pertinência das suas ideias para o estudo de matérias como as da crise financeira, ética e crise moral, diferenciação social e individualismo moral, sentido e funções do direito, Estado, sociedade civil, teoria da separação de poderes, teoria democrática, justiça social, regulação sociopolítica, liberalismo, comunitarismo, republicanismo, direitos humanos, teologia política, etc. Contudo, se a comunidade sociológica admite a importância de clássicos como Durkheim, verifica-se uma dissonância entre este reconhecimento e o andamento de projetos de investigação, em regra sujeitos a prazos concursais que justificam a opção por quadros teóricos “afeiçoados” e “à la carte”. É esta tendência fast science para o imediatismo teórico dos estados da arte e a urgência das burocracias financiadoras que gera uma diferença entre o conhecimento utilitarista, e com resultados à vista, e o conhecimento slow science, teórico, erudito e aprofundado, todavia considerado, por muitos, inútil, pelo excesso de tempo a decorrer entre a imediação do conhecimento dos clássicos e a sua operacionalização. Dois exemplos: os fenómenos da precariedade e da atipicidade dos mercados de trabalho não podem ser abordados com recurso às “formas anormais de divisão do trabalho” estudadas por Durkheim, operacionalizando estas empiricamente? Será de recorrer necessariamente às inovadoras e performativas conceptualizações da flexigurança e mercados de trabalho em transição? O rendimento básico incondicional não poderá ser encarado como um novo elemento a relacionar com a crítica ao instituto da herança? No esquecimento ficam as sensatas observações de Robert Merton a propósito da dialética entre “redescobrimentos”, “pré-redescobrimentos”, “antecipações” e “prefigurações”, que colocam os cientistas sociais numa cadeia de união com os seus antecessores clássicos, muitas vezes esquecida, em prol de
14
introdução
inovadoras ruturas paradigmáticas. Felizmente, o registo da “ciência normal” da transmissão, organização e sistematização do conhecimento não parece incomodar autores como Jurgen Habermas, que recorre a Durkheim, Weber, Mead, Parsons, entre outros, no seu labor de combinar análise conceptual com reconstrução da história da teoria social. Importante é que a formação de conceitos básicos e o tratamento de questões substantivas permaneçam inseparáveis (Habermas, 1984, 1987), assentes num diálogo com a história das teorias sociológicas, encarando-se os clássicos como autores que “nos têm algo a dizer”. Só para citar mais alguns exemplos de análises sociológicas marcadas pela influência de Émile Durkheim, podem-se mencionar, sem qualquer pretensão de exaustividade: Robert Merton, e a revisitação do conceito de anomia na sua relação com a estrutura social; Erving Goffman, e a noção de rituais de interação; Ralf Dahrendorf, e a aplicação do conceito de anomia ao tema da lei e da ordem; Randall Collins, com a sua estratégia de teorização da tradição durkheimiana; o conceito de diferenciação social enquanto expressão da divisão do trabalho por parte dos neofuncionalistas; a defesa da sociologia cultural de Durkheim, tendo como figura central Jeffrey Alexander; as discussões acerca do homo sociologicus, no quadro dos processos do individualismo institucionalizado de Ulrich Beck; o individualismo durkheimiano e os direitos humanos debatidos pela escola durkheimiana de Oxford; e a perspetiva moral da globalização, desenvolvida por Eugen Schoenfeld. Em benefício do esclarecimento da exposição que se vai seguir e reconhecendo o facto de que o pensamento de Durkheim evidencia especificidades e um estilo que podem dificultar a sua leitura, a que acresce o uso de uma linguagem argumentativa pouco usual nos dias de hoje, assinalam-se quatro aspetos preliminares que devem ser esclarecidos no início deste livro. Eles correspondem a pressupostos ou entendimentos básicos, onde se respaldam a análise e interpretação do trabalho de Émile Durkheim: a noção de sociedade; o positivismo e a irredutibilidade da vida em sociedade; a ciência da moral e consciência coletiva; a teologia política e a educação moral.
15
NOTA CONCLUSIVA De 1 a 3 de junho de 2017, decorreu em Bordéus, a cidade onde Durkheim começou por exercer o seu magistério intelectual e pedagógico e que foi também a testemunha do nascimento dos seus primeiros trabalhos, um colóquio de comemoração dos cem anos do seu desaparecimento, a 15 de novembro de 1917. O colóquio, sob o título “A posteridade da obra de Durkheim cem anos depois”, foi pensado pelo Centre Émile Durkheim, de Bordéus, e a sua organização realça o processo através do qual a reflexão de Durkheim se pode tornar pertinente no presente sociológico ativo. De facto, Durkheim continua vivo convocando leituras e interpretações, discussões e interrogações. A sua dimensão enquanto clássico é desde logo visível no título da primeira mesa de trabalhos, “Os Temas Clássicos”, mas o que nos desperta um atento olhar é a constatação de que os seus campos de reflexão se articulam inequivocamente com os grandes temas de referência nos nossos dias: moral; regulação; democracia; cidadania; estado; globalização; relação individual/coletivo; direito e trabalho, poderiam ser, pois, as chaves de um diálogo que continua a alimentar o interesse de quem sobre estes tópicos reflete e produz conhecimento hoje em dia. Convoco este facto por ilustrar a forma como este livro foi construído, na distância face aos posicionamentos normativos e eruditos do mundo académico, de modo a afastar o desperdício de discussões com a vulgata ortodoxa sobre Émile Durkheim, procurando alternativamente o encontro com o caráter fecundo de um pensamento que transmite 237
Émile Durkheim - Sociedade, Política e Direito
conhecimento pelas suas realizações contextualmente situadas, mas sobretudo pelos caminhos intelectuais que continua a proporcionar. Durkheim não tem, a meu ver, herdeiros legítimos ou ilegítimos, tem leitores que se sentem desafiados pelo seu pensamento e fazem opções. Com a consciência de que o humanismo durkheimiano se cruza com o problema do sentido da ciência, enunciado por Max Weber, de projeção da esperança da superação do conhecimento, em que outros de nós chegarão mais longe, numa espiral que não tem fim, na construção desse mesmo conhecimento. Ao intitular o livro, Émile Durkheim, Sociedade, Política e Direito, construí um mapa desdobrável, capaz de se transformar num guião de leitura, de múltiplas dimensões, da obra do autor. Se me perguntassem se conseguiria sintetizar numa frase o que me parece ser a grande mensagem de Durkheim, diria que, para ele, o caráter oculto da sociedade, não pode ser um mistério, porque os cidadãos intuem o abandono de princípios e ideais com os quais as sociedades não são viáveis. Combater o deficit de ocultação das formas de organização da sociedade, com uma fundamentação sociológica, só será, assim, compreensível se se tiver presente a sua descoberta de um individualismo impensável sem a solidariedade social. A lógica do social, explicada através da sua teoria social, convoca simultaneamente os seus valores éticos e políticos, tornando compreensível o individualismo moral como manifestação do individualismo contemporâneo, assente, no caso das sociedades ocidentais, na defesa do princípio da dignidade das pessoas e dos seus direitos, tornados um culto pelo recurso à linguagem dos símbolos e das crenças na religião do humanismo laico, republicano e socialista. Como referi na introdução deste livro, o uso de uma linguagem religiosa para defender princípios humanistas e democráticos faz com que, por vezes, exista uma certa desconfiança relativamente a Durkheim. Contudo, e este é um ponto em que quero voltar a insistir, o uso de uma linguagem religiosa para expressar os valores do republicanismo, do socialismo e do humanismo, corresponde a uma opção semântica radical, através da qual, de uma forma radicalmente ética, Durkheim, o autor, expressa o que hoje encontramos em expressões 238
Nota Conclusiva
como “ ética do cuidado”, “respeito”, “reconhecimento”, “dignidade decência”, “vulnerabilidade” e “solidarismo”, todas elas ligadas por essa magnífica fórmula de que nos pertencemos inteiramente a nós próprios e devemos sempre alguma coisa aos outros. Outro ponto a realçar na estrutura concetual de Durkheim é o do uso de uma linguagem de base evolucionista, onde pontuam expressões como “ povos primitivos inferiores” e na qual se assinalam hoje grandes ausências, como sejam as da desigualdade de género, do multiculturalismo e do relativismo ético. No entanto, como fica atestado pela diversidade de estudos que utilizam o autor para debater estas e outras questões, deveremos percecionar que não estamos perante um obstáculo epistemológico que desqualifica Durkheim, mas antes diante de um resultado que, no quadro de uma sociologia da sociologia designaríamos por “estilo de época” ou “máximo de consciência possível”, utilizando a conhecida expressão de Lucien Goldmann. Apesar de ter procurado sobrevoar a obra durkheimiana em diferentes perspetivas, muitos tópicos continuam a prometer-me uma leitura desafiande e desafiadora. Entre eles, quero destacar as suas reflexões em torno do nacionalismo, do universalismo, do cosmopolitismo e de uma educação para o humanismo, matérias incontornáveis, se pensarmos nas dinâmicas sociais em curso. Também o seu pensamento sobre o pacifismo e a possibilidade de construção de uma “pátria humana”, merecem um olhar mais atento, um apontamento mais cuidado. Nesta medida, fecho com um programa a cumprir: é que Durkheim convida a infindáveis diálogos com o presente e, nessa medida, o seu pensamento é uma porta aberta para uma construção discursiva e teórica projetada para o futuro, operacionalizando a função que atribui ao sociólogo, construtor de uma sociedade mais justa e fraterna, uma sociedade melhor.
239
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Bibliografia
Duclert, Vincent (2012) L’Affaire Dreyfus. Paris: La Découverte Dumont, Louis (1983) Essais sur L’individualisme. Une Perspetive anthropologique sur l’ideologie moderne. Paris: Seuil. Durkheim, Émile (1887) “La science positive de la morale en Allemagne”. Revue philosophique, 24, 33-142 Durkheim, Émile (1893) De la division du travail social. Paris: Félix Alcan Durkheim, Émile (1895) Les règles de la méthode sociologique. Paris: Félix Alcan Durkheim, Émile (1897) Le Suicide. Paris: Félix Alcan Durkheim, Émile (1898) “L’individualisme et les intelectuels”. Revue Bleue, X, 7-13 Durkheim, Émile (1904) “L’élite intellectuelle et la démocartie”. Revue Bleue, 1, 705-706 Durkheim, Émile (1922) Éducation et sociologie. Paris: Félix Alcan Durkheim, Émile (1928) Le socialisme. Sa définition – Ses débuts – La doctrine Saint-Simonienne. Édition électronique Paris: Les Presses universitaires de France. Disponível em: http://classiques.uqac.ca/classiques/ Durkheim_emile/le_socialisme/le_socialisme.html Durkheim, Émile (1966) Montesquieu et Rousseau Précurseurs de la sociologie. Édition électronique Paris: Librairie Marcel Rivière et Cie. Disponível em: http://classiques.uqac.ca/classiques/Durkheim_emile/ montesquieu_et_rousseau/montesquieu_et_rousseau.html Durkheim, Émile (1967) Sociologie et Philosophie. Paris: PUF Durkheim, Émile (1975) A Ciência e a Ação. Amadora: Livraria Bertrand Durkheim, Émile (1977), A Divisão do Trabalho Social I. Lisboa: Editorial Presença. Durkheim, Émile (1977a), A Divisão do Trabalho Social II. Lisboa: Editorial Presença. Durkheim, Émile (1982) Suícidio. Lisboa: Editoral Presença
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Émile Durkheim - Sociedade, Política e Direito
Durkheim, Émile (1983) Lições de Sociologia. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. Durkheim, Émile (1984), As Regras do Método Sociológico. Lisboa: Editorial Presença. Durkheim, Émile (1991 [1915]) «L’Allemagne au-dessus de tout» La mentalité allemande et la guerre. Paris: Armand Colin Durkheim, Émile (1991) Les Formes Élèmentaires de la Vie Religieuse. Paris, Le Livre de Poche. Durkheim, Émile (2002) La educación moral. Madrid: Ediciones Morata Durkheim, Émile (2014) “Duas leis da evolução penal” - Tradução de Hyago Sarraff de Lion. Primeiros Estudos, São Paulo, 6, 123-148 Durkheim, Émile (2014) Educação e Sociologia. Lisboa: Edições 70 Durkheim, Émile (s.d.) Sociologia, pragmatismo e filosofia. Porto: Rés Eco, Umberto (1993) Interpretação e sobreinterpretação. Lisboa: Editorial Presença Elias, Norbert (1989 [1939]) O Processo Civilizacional (1.º Vol.). Lisboa: Dom Quixote. Elias, Norbert (1993 [1987]) A sociedade dos indivíduos. Lisboa: Dom Quixote Elias, Norbert (1994) Teoria do Símbolo. Oeiras: Celta Elias, Norbert (2008) Introdução à Sociologia. Lisboa: Edições 70 Feagin, Joe R. (2001) “Social Justice and sociology: Agendas for the twenty-first century”. American Sociological Review, 66, 1-20 Fernandes, Teresa Sousa (1993) “Modernidades e Geometrias. A Representação da Ordem na Obra de Émile Durk,heim”. Cadernos de Ciências Sociais, 12/13, 107-148. Ferreira, António Casimiro (2014) Política e Sociedade: teoria social em tempo de austeridade. Porto: Vida Económica Ferreira, António Casimiro (2016) Política e Sociedade: teoria social em tempo de austeridade, 2ª Edição. Porto: Vida Económica
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Obras já publicadas:
• "Justiça Juvenil: a lei, os tribunais e a (in)visibilidade do crime feminino", Vida Económica (2017). • "Os tribunais como espaços de reconhecimento, funcionalidade e de acesso à justiça", Vida Económica (2015).
Émile Durkheim é um clássico da sociologia, autor incontornável para todos quantos se interessam pelo estudo das teorias sociais e sociológicas. Este livro procura organizar, sistematizar e apresentar as principais ideias do pensamento de Émile Durkheim, ao mesmo tempo que questiona as leituras canónicas que o apresentam como um autor positivista e conservador. Alternativamente, defende-se a relevância do seu contributo para o pensamento teórico e político, construído em torno de noções como a do individualismo moral e da sua intervenção enquanto sociólogo público. O livro destina-se, sobretudo, aos leitores interessados no estudo da teoria social e das teorias sociológicas e reveste-se de especial interesse para o público universitário ligado às áreas da sociologia, ciências políticas, relações internacionais e direito.
Outros titulos de António Casimiro Ferreira: • La société d’austérité - L’avène-
ment du droit d’exception". Paris: L.G.D.J. (2017). • "Política e Sociedade - Teoria social em tempo de austeridade", 2ª Edição, Vida Económica (2016). • "Contextos e desafios de transformação das magistraturas", Vida Económica (2013). • "Sociedade da Austeridade e direito do trabalho de exceção", Vida Económica (2012).
ISBN ISBN978-989-768-439-5 978-989-768-421-0
www.vidaeconomica.pt livraria.vidaeconomica.pt ISBN: 978-989-768-421-0 978-989-768-439-5
99 789897 789897 684395 684210
Émile Durkheim
• "A proteção das crianças no concelho de Lisboa", Vida Económica (2017).
O SOCIAL, O POLÍTICO E O JURÍDICO
ANTÓNIO CASIMIRO FERREIRA
Coordenação de: António Casimiro Ferreira e João Pedroso
Émile Durkheim
ANTÓNIO CASIMIRO FERREIRA
Émile Durkheim O SOCIAL, O POLÍTICO E O JURÍDICO
António Casimiro Ferreira Doutorado em Sociologia do Estado e do Direito pela Universidade de Coimbra, professor auxiliar da Faculdade de Economia e investigador do Centro de Estudos Sociais da mesma Universidade. Em 2006, foi distinguido com o Prémio Agostinho Roseta. Atualmente, é co-coordenador do Programa de Doutoramento Direito, Justiça e Cidadania no séc. XXI, da Universidade de Coimbra.