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NESTA EDIÇÃO

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Novos hábitos, novo mundo Hoje, crianças e jovens tem trocado brincadeiras em ambientes abertos por horas em frente ao computador e manhãs ensolaradas na praia por compras em shoppings. No Brasil, a educação ambiental não só é um dos temas transversais propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), como também está prevista na Lei nº 9.795, de 1999. A professora Eloiza Schumacher discute a importância de ensinar novos hábitos para a criação de um mundo melhor dentro e fora da escola. Um novo contexto na aprendizagem O paradigma educacional baseado em um modelo pedagógico de dependência, em que o currículo é visto como um fim, ainda é uma realidade em muitas escolas da rede pública e privada de ensino. Qual é o papel da escola: ensinar conteúdos ou desenvolver competências? A professora Ana Ruth Starepravo e a professora Célia Bernardo apontam caminhos para a mudança desse paradigma. África? Presente! A Lei 10.639, sancionada em janeiro de 2003, inclui a temática afro-brasileira e africana no currículo escolar. Situações preconceituosas confirmam a existência de discriminação racial contra estudantes negros no Brasil. Os professores Henrique Cunha Júnior e Marlene Pereira mostram uma estratégia pedagógica para introdução da temática da cultura e da história africana na rede de educação básica. Administrar: função de professor? A qualidade da gestão vem sendo vista como um elemento fundamental para a qualidade da educação – pensamento que é compartilhado por vários pesquisadores. Recentemente, um estudo do professor Naércio Menezes Filho (USP), com base nos números do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e na Prova Brasil, ajuda a esclarecer o fato de os estudantes terem mantido ou piorado o desempenho, apesar da diferença no volume de recursos destinados a educação.

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Superar a tradição medieval em busca da educação do século XXI A situação atual da educação no Brasil, os sistemas de avaliação, a disparidade salarial dos professores, que chega até 400% em alguns estados do país, e o Sistema Único de Educação, foram alguns dos assuntos abordados durante a entrevista com o professor pósdoutor em educação Pedro Demo. Autor de mais de 70 livros, aposentado do Departamento de sociologia da Universidade de Brasília, ele afirma que se tivéssemos boa escola 4 Muma AIO / J UNHO 2008pública, poderíamos mudar o perfil de crítica e de posicionamento da população.

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Foto: Banco de Imagens

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CAPA

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Segurança Alimentar e Nutricional: a maior crise em 50 anos O direito humano à alimentação deve ser assegurado por meio de políticas e programas públicos de segurança alimentar e nutricional, pois se trata de um direito da sociedade e de uma responsabilidade do estado. Hoje, são cerca de 850 milhões de famintos no mundo. Segundo Organização para a Agência da ONU para Alimentação e Agricultura (FAO), a crise é a pior em mais de meio século. Confira os novos passos dados e um histórico, no Brasil, da busca pela garantia desse direito na escola.

E AINDA ...

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Editorial Cartas do leitor Notícias da Undime Publicações Educação em notícia Opinião: A educação no enfrentamento do trabalho infantil (Antonio de Oliveira Lima)

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EDITORIAL

É PRECISO ESTAR ATENTO E FORTE! Observamos a mudança na concepção de se fazer educação municipal. Os municípios formam parcerias entre si, com o estado e, principalmente, com a União, capacitando, planejando, avaliando; formando, assim, a cultura da qualidade na educação para todos em todos os níveis. Com a educação como prioridade, poderemos ter os resultados esperados. Há um outro dado fundamental: os 184 municípios cearenses elaboraram o seu Plano de Ação Articulada (PAR), que subsidia a cooperação técnica e financeira do MEC com informações dos municípios. Como se está próximo ao segundo semestre de um ano eleitoral, é bom aplaudir os prefeitos que continuam as boas obras de seus antecessores, sobretudo na educação. A população espera sensibilidade pública de seus gestores, os quais poderiam receber o cargo tal como um atleta de revezamento transmite o bastão ao seu sucessor na prova: cada um despendendo o máximo de si para obter o melhor resultado possível. É sempre oportuno lembrar que os resultados educacionais são de interesse social e colhidos a médio e longo prazo. O mundo tem estado atônito, nos últimos meses, frente a uma crise alimentar sem precedentes em mais de 50 anos, segundo a ONU declarou na Conferência Mundial da sua Agência para Alimentação e Agricultura (FAO), realizada no início de junho último. Em diálogo com esta conjuntura, trazemos como tema de capa a alimentação escolar, focando a análise no Programa Nacional brasileiro (Pnae). Hoje, os municípios estão recebendo um fluxo mais regular de recursos para financiar a merenda escolar – o que fortalece a garantia desse direito, mas também aumenta a responsabilidade dos gestores. Outro grande feito desta edição é a entrevista com o professor Pedro Demo, do curso do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB), referência nacional e internacional quando se fala de educação, cidadania e políticas públicas. De passagem por Fortaleza, o professor aceitou receber a revista para uma conversa sobre o pensamento humano, a atual ordem socioeconômica e política mundial e a necessidade da conformação de um novo paradigma pedagógico na educação. O depoimento de Pedro Demo nos sensibiliza sobre diversos aspectos do cotidiano escolar. Também abrimos espaço para a cultura afro-brasileira, que a rede municipal de Maracanaú trata com método exemplar. A partir de experiências encampadas por estudantes e professores nas escolas, vê-se a possibilidade concreta de efetivação da Lei 10.639/2003, que torna obrigatório o ensino da história da África e da cultura afro-brasileira no currículo da educação básica. O resultado é um retrato de como podemos mesclar as contribuições das mais diferentes etnias para o enriquecimento do todos. Cada cultura tem a sua importância imprescindível, e conhecê-las nos engrandece em tolerância e respeito. Quero concluir fazendo uma observação: todo esforço só tem sentido se continuamos unidos, associados ao preceito de que todos – e cada um (a) – têm direito à qualidade na educação pública. Boa leitura e que Deus abençoe a todos!

Flávio de Araújo Barbosa Presidente da UNDIME/CE e membro da diretoria nacional.

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Cartas do Leitor Av. Oliveira Paiva, 2621 60.822-131 - Fortaleza (CE) Telefone: +55 (85) 4006.4056 Fax: +55 (85) 4006.4057 undimeceara@undime.org.br www.undime.org.br Presidente: Flávio de Araújo Barbosa (São Gonçalo do Amarante) Vice-presidente: Bernarda Freire Joca Romão (Barreira) Secretária de Articulação: Monica Maria Silva de Sousa (Solonópole) Secretário de Coordenação Técnica: José Cavalcante Arnaud (Trairi) Secretária de Comunicação: Maria Vera Vasconcelos (Jijoca de Jericoacoara) Secretária de Finanças: Maria Clara Rodrigues Pinho (Pentecoste) Secretária de Assuntos Jurídicos: Maria Nair Soares (Itarema) Secretária-adjunta de Assuntos Jurídicos: Isabel Freitas (Aquiraz) Secretária-executiva: Sandra Leite Assessoria de Comunicação: Gustavo Menescal

Agradecimentos Recebi, muito honrado, a revista. Só não agradeci antes, pois estava em uma maratona de viagens. Muito obrigado pela atenção e os parabenizo pela nova – e sempre profunda – edição. Um forte abraço e, mais uma vez, parabéns. Com atenção e afeto, Paulo Ronca (PUC) São Paulo (SP)

Diretora: Sandra Lima Röhl Diretor de redação: Peter Röhl (in memorian) Jornalista responsável: Daniel Fonsêca (MTb CE 1690JP) Coordenadora pedagógica: Karla Camila Sousa de Sousa Assessora pedagógica: Maria Luiza Braga Direção de arte e diagramação: Marcelo Della Guardia CONSELHO EDITORIAL Ana Maria Iorio Dias (UFC), Betânia Leite Ramalho (UFRN), Casemiro de Medeiros Campos (Unifor), Clermont Gauthier (Université Laval, Canadá), Flávio de Araújo Barbosa (Undime-CE), Júlio César Araújo (UFC), Luís Távora Furtado Ribeiro (UFC), Marco Aurélio de Patrício Ribeiro (Iesc), Maria de Jesus Araújo Ribeiro (Mieib), Messias Dieib (UFC e Uern) e Sandra Leite (Undime-CE) COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Alessandra Oliveira Araújo, Ana Ruth Starepravo, Antonio de Oliveira Lima, Célia Bernardo, Eloiza Schumacher Corrêa, Henrique Cunha Júnior, Idevaldo Bodião, Luciana Siqueira, Marco Antônio Ferraz, Marlene Pereira dos Santos, Pedro Demo e Renato Maluf ASSINATURA E DISTRIBUIÇÃO Preço de assinatura anual no Brasil: R$ 39,90, para seis edições (bimestrais). Para outros países: R$ 70,00. Edições anteriores: R$ 6,90, mais custo postal. Venda em banca nos estados do Ceará, Piauí e Maranhão. Distribuição direta para colaboradores, governadores, prefeitos, diretores de escolas e assinantes. Tiragem: 5.000 exemplares PUBLICIDADE Gerente: Sandra Lima Röhl Fone: +55 (85) 3214.6971-3081.1607 E-mail: comercial@vidaeducacao.com.br ATENDIMENTO AO ASSINANTE e-mail: comercial@vidaeducacao.com.br telefones: +55 (85) 3214.6971 e 3081.1607 CTP, IMPRESSÃO E ACABAMENTO Pouchain Ramos

Second Life A propósito, gostaria de agradecer a divulgação do nosso livro (“Modos de Brincar, Lembrar e Dizer”), dizer que estamos à disposição para tratar de nossas pesquisas – quando pudermos dispor de mais espaço – e felicitar a equipe pelo trabalho, pois a revista tem um ótimo padrão editorial. Fiquei interessada no número que fala do Second Life, pois uma aluna está trabalhando este tema. Fátima Vasconcelos (UFC) Fortaleza (CE) Internet e Jogos Eletrônicos Parabéns a revista; realmente é ótima. Os temas são excelentes. A reportagem [sobre a Internet e os jogos eletrônicos na educação] me deu outra visão para trabalhar o assunto com meu filho. Vou divulgar junto aos colegas. Abraço. Carmem Amaral São Paulo (SP)

Rua Nestor Barbosa, 129 60.455-610 – Fortaleza (CE) Telefone/fax: +55 (85) 3214.6971 Fone: +55 (85) 3081.1607 brasiltropicalfor@terra.com.br Presidente: Sandra Lima Röhl Assessora-adjunta: Ângela David CAPA

Idéia Criativa Design e Propaganda. marcelo@dellaguardia.com.br

A revista Vida e Educação é uma publicação bimestral da Undime-CE elaborada pela Editora Brasil Tropical Ltda., que mantém todos os direitos reservados. As matérias divulgadas neste veículo não expressam necessariamente a opinião da revista. A publicação se reserva o direito de adequar os artigos. ISSN 1806-0145

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Cartas ou críticas e-mail: redacao@vidaeducacao.com.br Rua Nestor Barbosa, 129 - Parquelândia CEP: 60455.610 - Fortaleza (CE)

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Novos hábitos, novo mundo Banco de Imagens

Eloiza Schumacher Corrêa*

Ainda que não esteja integrada ao currículo escolar de forma transversal, a educação ambiental tem ocupado espaço no cotidiano escolar. Entretanto, o imaginário das crianças e dos adolescentes não é moldado pela educação formal. Para além da escola, família, meio de comunicação e outras instituição contribuem para a formação do repertório de valores, o que é determinante para a possibilidade de requalificar nossa relação com o meio ambiente 8 MAIO / JUNHO 2008

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Todos falam sobre os problemas ambientais, ora envolvendo as mudanças climáticas, o aquecimento global e suas conseqüências catastróficas; ora abordando o perigo de mais uma espécie em extinção; ora expressando o medo frente a um futuro sem água e a uma imensa quantidade de lixo produzida por nós. Nosso discurso a cada dia é amplificado e nutrido pela mídia. Os jornais, a televisão, a Internet e outros meios comunicativos constantemente noticiam e chamam a atenção para a gravidade da situação. Na

* Eloiza Schumacher Corrêa, pedagoga e assistente social, presta consultoria de educação a redes de ensino pública e privada nas áreas da Educação Infantil e do Ensino Fundamental e palestrante em eventos educacionais. É especialista em Alfabetização e Educação Sexual (eloiza.c@superig.com.br).

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mesma direção, novos estudos, filmes, pesquisas e discursos são lançados cotidianamente, de modo que cada um de nós tem condições de saber que a forma como os seres humanos se relacionam hoje com o planeta Terra é insustentável. Até pelo menos duas décadas atrás, a aparição desse assunto na escola se dava de forma esporádica, tímida. Às vezes, havia um atento professor de ciências ou de biologia que se dispunha e ousava alertar os estudantes para a questão; outras vezes a partir das comemorações no dia 5 de junho (Dia Mundial do Meio Ambiente), desencadeavam-se algumas reflexões; outras vezes, alguma notícia da mídia virava pauta de sala; ou ainda a ação intuitiva de algum educador voltavase para discutir o problema. Atualmente, porém, a situação na escola é diferente. A discussão acerca da problemática ambiental chegou com força às salas de aula. Não se trata mais da vontade de um ou de outro professor em trabalhar o assunto. No Brasil, a educação ambiental não só é um dos temas transversais propostos pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), como também está prevista na Lei nº 9.795, de 1999. Portanto, não é possível conceber hoje propostas pedagógicas que deixem de fora a questão. As escolas vêm incorporando discursos, desenvolvendo experiências e encarando o desafio de construir ações coerentes e duradouras para combater esse problema que afeta a todos. Então, não é raro encontrarmos projetos pedagógicos voltados para separação de lixo, reciclagem de papel, cultivo de hortas, organização de composteiras, brinquedos construídos com lixo reciclável, campanhas para economia de água e luz. Da mesma forma, atividades que envolvem, saídas de estudo para reservas ecológicas, observações e constatações sobre o efeito dos materiais deixados no ambiente, pesquisas sobre animais em extinção, discussões sobre a camada de ozônio, são também constantes e contribuem para o aprofundamento no estudo das causas dos problemas ambientais (o que é fundamental, pois conhecendo

essas causas temos mais elementos para combatê-las). Assim, vamos nos orgulhando de nossas crianças e adolescentes que parecem levantar bandeiras, tomando atitudes coerentes e cobrando essas mesmas atitudes dos adultos que convivem. Ficamos encantados, por exemplo, quando o pequeno de quatro anos fala para o pai não demorar no banho, quando a menina de nove anos procura um lugar adequado para depositar seu lixo, quando o adolescente desliga o chuveiro ao se ensaboar no banho. Tudo isso nos convence de que

as mediações pedagógicas são fundamentais se quisermos constribuir efetivamente para amenizar ou reverter as diversas ameaças ambientais que pairam no ar. Mesmo assim, observamos que, muitas vezes, essas mesmas crianças e adolescentes parecem eternamente insatisfeitos com o que têm, cansando seus pais com interminávies pedidos de compras. Assim, eles invadem os shoppings e consomem muito mais do que precisam – e esses objetos de desejo vêm, invariavelmente, envoltos em embalagens desnecessárias. Não trocam suas preciosas e longas horas de computador por passeios ao ar livre; deixam de conversar com alguém porque estão plugados em seus ipods; compram modelos de celulares cada vez mais sofisticados em tempos demasiado curtos; não hesitam em dispensar alimentos naturais em troca de artificiais; preferem tomar banho de piscina ao de mar; entre tantos outros exemplos. É fácil obervar que nessas ho-

ras todo aquele discurso politicamente correto, citado anteriormente, fica adormecido. Mais fácil ainda é constatar que a escola não é o único lugar onde crianças e adolescentes aprendem a relacionar-se com a natureza. Sabemos que boa parte daquilo que aprendem sobre como interagir com o meio ambiente se dá na convivência com os adultos, ou seja, os repertórios de ação são extraídos dos modelos de interações vivenciadas. Outra boa parte é aprendida por meio das referências oferecidas pelas mídias, que, por sinal, mostram-se muito mais competentes quando o assunto é atingir o consumidor infanto-juvenil do que quando o assunto é divulgar a necessidade de proteção ambiental! Por isso, frente ao poder das mídias no sentido de fazer emergir desejos incessantes de comprar, à educação familiar e às demais influências a que estão expostos nossos estudantes, poderíamos nos deixar levar pelo desânimo e pela certeza de que pouco temos a fazer na escola. Entretanto, como seres humanos, penso que precisamos sempre buscar saídas para nossos enfrentamentos. Se por um lado, sabemos que não podemos mudar o mundo através da educação, por outro, também sabemos que certamente podemos fazer com que as pessoas que convivem conosco numa relação educativa, experimentem outras possibilidades de interação. E, é exatamente aí que se centra o propósito deste artigo: discutir sobre a criação de situações de aprendizagem para que nossos alunos experimentem outras formas de ser e agir na convivência com a natureza. Muitos autores têm alertado que educar (formar pessoas) está muito além de ensinar (transmitir saberes), admitindo a presença e a força das emoções como fundamentais em qualquer processo educativo e apontando a necessidade de reinventar as relações na escola (se quisermos contribuir para a construção de um mundo melhor). Nesse sentido, pode ser bem interessante se, nas ações de educação ambiental, forem incluídas experiências que envolvem o sentir. Então, muito mais do que introduzir conteúdos e informações (que atingem o aspecto

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL

cognitivo) é preciso estruturar trabalhos que promovovam uma aproximação sensível e verdadeira com a natureza. Práticas que comovam, afetem os estudantes, ou seja, práticas que atinjam o caráter e as emoções. Preparar visitas a áreas naturais, organizar caminhadas, andar descalço na mata, oportunizar contatos com a terra (onde se possa ouvir os sons, sentir os cheiros, explorar texturas), propor contemplações (onde se fique fascinado com a beleza e a complexidade dos ambientes), entre outros exemplos, poderão ser experiências particularmente ricas. Entretanto, isso só acontecerá se o educador planejar suas ações para que, antes de qualquer informação, consiga provocar a surpresa, o entusiasmo, o encantamento, que possibilitam a emergência dos sentimentos mais profundos em cada vivência (Mendonça, 2005).

Na mesma direção podemos destacar experiências que envolvam celebrações e ritualizações de eventos e de elementos naturais, tal como faziam e fazem comunidades primitivas e indígenas: danças circulares, recriação de rituais, cantos. Ao introduzir os estudantes nessas práticas, estamos contribuindo para que desenvolvam novas maneiras de sentir a natureza, para que aprendam a adorá-la, a respeitá-la, a ser gratos a ela. Estamos contribuindo para que experimentem modos de conviver com o meio ambiente que talvez ainda não conheçam. Experiências como as citadas nos parágrafos anteriores nos levam a pensar que a educação ambiental não deixa de ser uma educação afetiva que tem, como intuito principal, recriar as relações com a natureza. Por isso, talvez seja uma boa escolha refletir sob essa ótica!

Referências MATURANA, Humberto. Emoções e Linguagem na Educação e na Política. Belo Horizonte: UFMG, 1998. MENDONÇA, Rita. Conservar e criar: natureza, cultura e complexidade. São Paulo: Editora Senac, 2005. MORAES, M. C. e LA TORRE, S. Sentipensar: fundamentos e estratégias para reencantar a educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004. MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à Educação do Futuro. São Paulo: Cortez, 2000. __________. A cabeça bem feita: Repensar a reforma, Reformar o Pensamento. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. NICOLESCU, Basarab. O Manifesto da Transdisciplinaridade. São Paulo: Triom, 2001. ROIZMAN, L. G. e FERREIRA, E. Jornada de Amor à Terra. São Paulo: Palas Athena, 2006.

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INFORMATIVO

MARACANAÚ Delânia Holanda

A EDUCAÇÃO REDUZINDO AS DESIGUALDADES SOCIAIS

Educação de qualidade formando cidadãos felizes

A Constituição brasileira estabelece como objetivos fundamentais do Estado a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais. A atual gestão da Prefeitura de Maracanaú acredita que o alcance desses objetivos se dá a partir do tratamento da educação como política estruturante, articulada em ações conjuntas entre poder público, sociedade civil e iniciativa privada. Maracanaú tinha cerca de 30 mil habitantes quando foi emancipado, em

1983. Hoje, 25 anos depois, a população estimada ultrapassa os 200 mil. Devido a esse vertiginoso crescimento populacional, motivado principalmente pela construção de vários conjuntos habitacionais, que exerceram forte atração junto à classe trabalhadora de todo o Estado, a cidade expandiu-se de forma acelerada, com uma origem cultural multifacetada. Em virtude dessa diversidade populacional, com crescimento em progressão geométrica, a construção de um patrimônio cultural no município de Maracanaú não tem sido um empreen-

dimento fácil. Considerando que a população do município se estruturou a partir da migração de vários municípios do Ceará e até de outras regiões do Brasil e que seu principal objetivo era a busca do emprego, a consolidação de uma identidade municipal não era a demanda mais urgente. Atualmente, esse quadro está mudando. A juventude do município, que constitui a primeira geração de maracanauenses, está construindo uma identidade local. A Prefeitura não tem medido esforços. Investiu em diversas políticas públicas que contribuem, incisivamente, para uma elevação da auto-estima, um auto-reconhecimento, e um fortalecimento do sentimento de pertença não só de crianças e jovens, mas de toda a população. Nesses investimentos, merecem destaque: a atração de empresas, como o Feira-Center, que tem contribuído para transformar o Município em um pólo regional da moda; a inclusão digital da população, a partir de diversos centros na comunidade e nas escolas; os investimentos em infraestrutura, urbanização e paisagismo; a instituição de um pólo cultural de grande porte para eventos, contribuindo para transformar o município em pólo turístico; a instalação de níveis mais elevados de escolarização, com a atração de instituição de ensino superior públicas, como o Cefet, e também de particulares, o que contribui para elevar as expectativas da população por mais educação. Desde 2005, a cidade tem como gestor do Executivo o prefeito Roberto Pessoa, um administrador com visão empresarial, cujo objetivo maior é o

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bem-estar do povo. Pensando na qualidade da gestão e na efetivação do slogan o futuro começa agora o prefeito tem priorizado a educação, investindo acima de 30% da receita resultante de impostos.

Divulgação

INFORMATIVO

O SISTEMA EDUCACIONAL

Maracanaú conta com um Sistema Educacional desde 1998, a partir da instituição do Conselho Municipal de Educação. Todas as 85 escolas municipais possuem Conselho Escolar, além de ser destacada a atuação do Conselho do FUNDEB, do Conselho de Alimentação Escolar e do Comitê Gestor do Compromisso Todos Pela Educação.

POLÍTICAS PÚBLICAS PRIORITÁRIAS

As ações da Secretaria de Educação de Maracanaú estão pautadas dentro do cenário brasileiro e baseadas nas Diretrizes e Bases da Educação Nacional e no Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que ganhou um movimento de aceleração a partir do Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação e do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Para a (re)qualificação da escola pública, a Secretária de Educação busca uma educação de qualidade social para todos e todas, dentro e fora da escola. A escola é compreendida nas suas dimensões socioeconômica e cultural. Os problemas sociais são refletidos na escola e repercutem nos resultados da aprendizagem. O objetivo é reverter o quadro de insucesso escolar, com atuação da Prefeitura na redução das desigualdades sociais. Por isso, a alimentação da população é um elemento importante. A Prefeitura passou a investir na Merenda Escolar um total de R$ 1,19 por aluno/ dia. Hoje, a merenda escolar de Maracanaú é considerada uma das melhores do Estado, com um cardápio variado e nutritivo, seguindo normas de higiene

Valorizar o professor é um pressuposto

e de segurança alimentar no preparo dos alimentos. Por ano, a Prefeitura investe aproximadamente R$ 7 milhões na merenda escolar; destes, R$ 5 milhões com recursos próprios, não sendo computados como Manutenção e Desenvolvimento do Ensino. Outro ponto importante na redução das diferenças sociais foi a distribuição, gratuita, do fardamento escolar, para todos os estudantes. Cerca de 45 mil estudantes de todos os níveis de ensino receberam uniformes completos, além de mochilas e agendas. Com essa iniciativa, a Prefeitura acredita contribuir para a redução das desigualdades e para a elevação da auto-estima dos estudantes. Para Orlando Alves, conselheiro escolar e pai de três estudantes da rede pública, os fardamentos beneficiam bastante a comunidade. Ele diz que o custo seria muito alto se fosse comprar fardamento para os filhos. “Outra vantagem é que o aluno pode ser identificado na rua e é mais respeitado. Meus filhos têm o maior zelo com a farda deles”, ressalta Silva. Uma preocupação central da administração são as condições objetivas

de trabalho nas escolas, como espaço físico, equipamento, mobiliário, pessoal etc. A Prefeitura realiza, permanentemente, serviços de reforma, ampliações e renovações na estrutura física das escolas, beneficiando mais de 40 mil estudantes. Todas as instituições de ensino têm acesso a recursos do Programa de Autonomia Escolar (PAE), criado pelo Prefeito para conservação e manutenção do patrimônio. “Em 2007, o mais importante que nós fizemos foi, justamente, a melhoria do parque escolar, que estava sucateado. Criamos, ainda, o Programa de Autonomia Escolar (PAE), que destina R$ 1,2 milhão por ano para que as escolas administrem pequenas reformas”, ressalta Roberto Pessoa. A verba está sendo administrada pelos conselhos escolares, descentralizando a gestão dos recursos e beneficiando a comunidade, que presta serviços diretamente para as escolas. Para Roberto Pessoa, esse programa dá uma injeção muito grande na economia dos bairros, nas escolas e na qualidade dos prédios escolares, sem contar com a valorização dada às pessoas da comunidade onde está inserida a escola.

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PROGRAMAS QUE BENEFICIAM A POPULAÇÃO

Ainda na perspectiva de redução dos impactos das desigualdades sociais, a partir de uma parceria entre Governo Federal, a Prefeitura de Maracanaú implementou, desde março de 2007, o Programa Escola Aberta (PEA). Inicialmente, oito escolas municipais estão abertas nos finais de semana, aproximando mais escola e comunidade, promovendo diversos tipos de oficinas de lazer, cultura e formação inicial para o trabalho. As ações são realizadas através do trabalho de educadores sociais, o que vem contribuindo para uma redução significativa da exposição de jovens e adolescentes aos riscos e à vulnerabilidade social. O desempenho do trabalho promovido nessas unidades escolares motivou o prefeito Roberto Pessoa a estender a iniciativa a outras onze instituições de ensino municipais que já estão desenvolvendo o programa. Cerca de 5 mil pessoas freqüentam as escolas abertas todo final de semana. “O objetivo dos projetos é inserir a comunidade no cotidiano escolar”, explica a coordenadora Salmira Braga.

INCENTIVOS GERAM DESENVOLVIMENTO

A administração acredita que a melhoria da qualidade da aprendizagem dos educandos está diretamente relacionada à valorização dos seus atores, e, nesse caso, o professor é parte fun-

damental. Assim, reconhecer o trabalho dos profissionais que compõem a comunidade escolar é uma das prioridades da gestão. Partindo do pressuposto que um cidadão bem pago exerce suas funções com dignidade e qualidade, foi estabelecido o abono remuneratório especial, correspondente a 100% do salário base de cada categoria, para os servidores das escolas que atingirem ou superarem o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). No ano de 2007, Maracanaú teve a média 3,8. Embora superando as médias estadual e nacional, o secretário de Educação, José Marcelo Farias Lima, afirma que esse resultado não é satisfatório. “Não é nem 50%. Nós não nos conformamos, e por isso, estamos focados em ações que resultem em melhorias”, reforça Marcelo Farias. A partir de 2008, todos os professores que lecionam no 1º ano do Ensino Fundamental que atingirem ou superarem 90% de alfabetização de seus alunos, vão receber uma gratificação correspondente a 10% do seu salário base, durante os 12 meses do ano subseqüente. Também vai ser dado abono correspondente a 5% do salário do servidor, a ser pago para todos os professores da Educação Básica Presencial, seguindo critérios como pontualidade e assiduidade. “Essa é uma ação extremamente necessária para que a educação continue a acontecer – e com resultados melhores do que conseguimos até agora”, destaca o secretário. Desde o início da gestão, o prefeito Roberto Pessoa concedeu mais de 27% de reajuste para os professores, e determinou também a reestruturação da carreira do Magistério. Os professores que possuem pós-graduação têm salários diferenciados dependendo da titulação. Os acréscimos são de 20%, 40% e 60%, respectivamente, para aqueles com especialização, mestrado e doutorado. Além dessas conquistas, todos os professores que têm contrato de 120h e possuem suplementação de carga-horária, há mais

de três anos, poderão incorporá-la, se atendidos os pré-requisitos previstos em lei. O município possui um total de 1.867 professores – destes, 1% com ensino médio, 66% licenciados, e 33% pós-graduados. Nilson Moreira, Coordenador de Planejamento e Controle da secretaria, ressalta que esses benefícios surgiram a partir de uma demanda da categoria e dos administradores. A proposta passou a ser prioridade no Plano Municipal de Educação, transformou-se em lei e foi efetivada. “É importantíssimo destacar a total disponibilidade do prefeito em atender a essa demanda. A valorização dos profissionais também gera uma expectativa no sentido da permanência dos mesmos no município”, argumenta.

FORMAÇÃO CONTINUADA

Ainda com foco no profissional, a Secretaria desenvolve programas de formação para todos os segmentos da educação, bimestralmente, além das reuniões mensais para planejamento, contemplando conselhos escolares, gestores, superDelânia Holanda

Ainda sobre as escolas, a gestão escolar tem uma atenção especial da Secretaria, que mantém um programa permanente de formação continuada de seus gestores, além de um sistema de comunicação muito efetiva, com encontros mensais, por regiões, para as questões administrativas e pedagógicas, e bimensais, para as capacitações. Também são mantidas equipes de suporte técnico para os mais diversos aspectos a serem trabalhados na gestão: pedagogia, projetos educacionais, finanças, pessoal, material e patrimônio, entre outros.

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Stênio Saraiva

Roberto Pessoa: parceria com os profissionais da educação

visores, secretários escolares, auxiliares de serviço e merendeiras. “Estamos desenvolvendo ações em três eixos: a potencialização do acompanhamento pedagógico, o fortalecimento da gestão e o estímulo à qualificação da formação continuada”, explica Salmira Braga, coordenadora de Educação da Secretaria. Em parceria com o Governo Federal e com a iniciativa privada, objetivando capacitar e aprimorar a prática pedagógica, o município investe em projetos como o Gestar, o Formar em Rede e o Gestão para o Sucesso Escolar. “Tudo o que estamos vivenciando é uma quebra de paradigma. Esse reconhecimento do profissional gera resultado”, afirma a coordenadora. A professora Socorro Medeiros Braga, diretora da Escola Instituto São José, afirma os professores e gestores são beneficiados com o suporte fornecido pela Secretaria. “Nós aqui em Maracanaú somos privilegiados por termos equipe capacitada, acompanhando, passo a passo, os projetos e orientando para a aplicação correta dos recursos” conclui.

TRABALHANDO A LEITURA E A ESCRITA

O Nordeste tem o mais elevado índice de analfabetismo entre as cinco regiões do país, segundo dados do IBGE. Na média, um em cada cinco nordestinos declarou que não sabe ler nem escrever um bilhete simples. Se fosse um país, a

região teria o quinto pior desempenho em alfabetização da América Latina e Caribe, à frente de Honduras, Guatemala, Nicarágua e Haiti. Por isso, a razão de ser das escolas – o estudante – é uma preocupação permanente em Maracanaú, sobretudo para proporcionar condições melhores às escolas, fazendo com que estas alcancem, em menor tempo e com menos esforço, o seu principal objetivo: a aprendizagem. A Prefeitura investe no desenvolvimento da leitura e da escrita da população. É utilizada uma metodologia estruturando tempos didáticos que oportunizam os estudantes a apropriação do sistema lingüístico, utilizando, diariamente, diversos gêneros textuais em sala de aula. Nessa perspectiva, o município aderiu ao Programa de Alfabetização na Idade Certa (PAIC), uma política do Governo do Estado que tem a perspectiva de superar o índice de alfabetização com foco na aprendizagem. Em Maracanaú, as características do PAIC estão sendo estendidas ao ensino de crianças do 1º ao 5º ano, com objetivo de proporcionar o domínio da leitura, da escrita e a compreensão de textos. Mais de 19 mil crianças são beneficiadas. Com a metodologia de rotina de leitura e escrita (letramento) para proporcionar a aprendizagem no 3º ao 5º ano do ensino fundamental, o PAIC é estruturado em tempos didáticos para que o estudante se aproprie do sistema lingüístico: 1) tempo para gostar de ler; 2) tempo para alfabetizar e letrar; 3) tempo de leitura e oralidade; e 4) tempo de aquisição da escrita: escrevendo do seu jeito. Os professores trabalham diariamente nessa perspectiva. A estudante Raiane do Nascimento, da Escola Comissário Francisco Barbosa, é um exemplo do sucesso da metodologia. Com seis anos de idade, já escreve e lê sem dificuldades. “Aprendi a ler ouvindo o som das letras. Quando confundia uma sílaba, era porque eu não tinha ouvido direito. A professora repetia perto de mim, e eu escrevia direito. Agora já escrevo o que quero”, relata.

EDUCAÇÃO ESPECIAL INCLUSIVA

A política educacional municipal entende a educação como um direito de todos os cidadãos, independentemente de quaisquer condições sociais. econômicas ou físicas, adotando uma política que favorece a inclusão das pessoas com necessidades especiais na escola regular. Para atender a essa demanda, o município conta com o Centro de Apoio e Desenvolvimento da Educação Especial (CADEE), que possui boas infra- estruturas físicas e profissionais especializados. O centro também possui equipamentos modernos e laboratórios de informática adaptados. Assim, o CADEE atende a diversos estudantes com necessidades especiais matriculados nas escolas regulares e em turmas específicas dirigidas àqueles para os quais a escola regular ainda não está preparada. Sempre buscando uma educação igualitária para todos, recentemente a prefeitura contratou intérpretes e instrutores da Língua Brasileira de Sinais (Libras) para dar suporte aos educadores com educandos surdos. A cidade foi pioneira no estado em implantar telefone público para surdos. Por fim, a Prefeitura de Maracanaú – especialmente, a Secretaria de Educação – compreende que, hoje, impreterivelmente, urge erradicar a pobreza e a marginalização social, reduzir as desigualdades regionais e possibilitar um desenvolvimento econômico sustentável para que se construa uma sociedade livre, justa e solidária. Para tanto, é necessário o estabelecimento de uma política educacional estruturante, focada na aprendizagem dos estudantes, mais intersetorializada e articulada, nos moldes daquela que é desenvolvida no município.

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Evilázio Bezerra

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Um novo contexto social Muito se tem falado sobre competências na escola, nos ambientes de trabalho e na mídia. No entanto, é necessária a superação do paradigma educacional baseado em um modelo pedagógico de dependência, em que o currículo é visto como um fim. Essa lógica, que tem como meta o acúmulo de saberes, adotando metodologias com o foco centrado no ensino, é uma preocupação da escola. Assim, o

desenvolvimento de competências, conhecimentos, habilidades e atitudes tem sido o caminho apontado para a mudança desse modelo. O que significa, de fato, ser competente? Quem são os protagonistas atualmente? Uma escola que tem como prioridade desenvolver habilidades e competências é aquela que valoriza a produção pessoal dos estudantes em oposição à repetição de modelos pré-estabelecidos. VIDA E EDUCAÇÃO 15

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Evilázio Bezerra

ENSINO-APRENDIZAGEM ENSINO-APRENDIZAGEM

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Protagonistas da educação Célia Bernardo* Hoje, não cabe mais ao educador banir as limitações nem se tornar impotente diante delas. Sua missão é a de convivência à base do respeito, tornando-se assim um parceiro ativo e compreensivo. O estudante tornase protagonista porque se impõe com saberes ou deficiências, com uma presença ativa ou passiva, com alarme ou silêncio, com uma boa ou má aparência. O certo é que ele se protagoniza, e ninguém lhe pode negar essa atuação de ator principal Quando nos deparamos com situações em que as dificuldades são diversas e adversas, a atitude instintiva nos sugere desistência, abandono a tudo o que impede a nossa atuação; no entanto, convém lembrar que, nessas mesmas situações, os atores são pessoas, seres humanos que pensam e falam, reagem e aceitam, choram e riem, compreendem e questionam. Tudo é mutável e, em se tratando de termos no centro de nossas ações, é imperativo fazer diferente aquilo que, para muitos, o essencial seria fazer igual. Cada sujeito tem suas particularidades, anseios próprios, desejos infindos, sonhos mágicos e vontades absolutas. Por isso, por mais que tentemos homogeneizar as idéias, jamais conseguiremos essa façanha. O educador vê, analisa e sente cada imperfeição e tem ciência de que ela se configura em cada pessoa, de forma diferente. Que educador não deseja a uniformidade de comportamento, de sabedoria, de facilidade para aquisição aos conhecimentos? Só que essa é uma aspiração velada. Insistir em ser diferente não dá. Se nos inserimos na arte de ensinar, por que isso se converte na arte de cobrar e cobrar muito? É dessa forma que nos distanciamos das mu* Célia Bernardo é professora, poeta e compositora. Já lecionou em diversas escolas em Aracati, onde foi secretária municipal de Educação (celiambc_58@hotmail.com).

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danças: quando elas não nos modernizam, não nos humanizam, mas nos embrutecem. Criamos formas para padronizar as pessoas e esquecemo-nos de mudar nossas posturas e comportamentos. O estudante bom não é aquele que a tudo obedece, mas aquele que tudo questiona. O aluno bom não é aquele que tudo aceita; mas o que apresenta outras possibilidades. É aquele que não apenas copia, mas recria, inventa, sugere e diverge. Ele é um portador de imperfeições necessárias porque, através delas, o educador desperta para uma realidade que mostra a adversidade nas muitas identidades que lhe chegam para a prática da docência. E, nessa prática, muitas vezes se constrói um processo de respeito e de reconhecimento às diferenças que, quando vistas, aceitas e trabalhadas com amor, somam-se a tantos outros valores que não podem se sobrepor a meras imperfeições necessárias. As exigências do novo contexto de sociedade têm-nos imposto uma série de mudanças, e o educador precisa atendê-las; do contrário, irá haver um emaranhado de situações que precisam ser trabalhadas para oferecer aos alunos o modelo de realidade em que eles estão inseridos e, junto a essa realidade, vastas expectativas a serem contempladas como realização daquilo que é nosso dever como escola e direito dos alunos como aprendizes. Para que haja essa sintonia, é preciso aprimorar a capacidade para lidar não apenas com as situações-problema; mas com todas as situações, reconhecendo e valorizando tudo o que o aluno sabe. São eles que estão sob a nossa guarda. Somos nós que estamos na vanguarda do processo educacional e, sem a estreita relação professor-aluno, torna-se inviável pensar em novos acontecimentos, em novas possibilidades e, conseqüentemente, em novas realizações. Há quem já fale das reais competências que nos transformam no verdadeiro educador deste novo modelo de sociedade. Afinal, se tudo está mudando,

em um processo rápido e inovador em todos os aspectos, a escola não pode ficar à mercê desse “rebuliço” em cujo centro estão as crianças e os jovens, apropriando-se de uma diversidade de conhecimentos que, na maioria das vezes, lhes são mais atrativos e mais atraentes do que os que a escola oferece. Logo, cabem a nós educadores a apropriação e a incorporação dessas competências a fim de que não fiquemos reféns de um sistema que avança dia a dia, exigindo adequação e adaptação dos que nele estão inseridos. Precisamos dar como resposta a ação concreta do nosso trabalho, pois, como já citei anteriormente, a nossa “matéria-prima” tem uma essência humana. Esta não nos permite que lhe atribuamos cheiro, cor ou textura e se molda a partir dos nossos exemplos de postura e vivência. Por isso, a necessidade de não apenas conhecermos, mas, principalmente, de pormos em prática as sete competências: de conhecimento, técnico-operacional, intelectual, emocional, espiritual, física e de vida. Elas que nos transformarão em educadores que possam corresponder às exigências do mundo e aos apelos dos educandos. A partir do que nos está sendo colocado como alternativa para melhorarmos as relações de convivência no espaço escolar e fora dele, é possível compreender que não somente o estudante se protagoniza no cotidiano. O professor também é ator principal no enredo das novas políticas educacionais. Nenhuma ação pode realizar-se de forma isolada. O conjunto de habilidades, saberes e de vontades é que realiza e faz acontecer esse processo, cujo resultado também será coletivo. Portanto, se a realidade mudou, e a educação foi fundamental para consolidar essas mudanças, precisamos transformar essas competências em lições que ajudem a construir um mundo de possibilidades reais e positivas para todas as pessoas. Continuo a acreditar que somente do compromisso de cada um é que nasce a educação para todos.

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Competências em foco

Evilázio Bezerra

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Ana Ruth Starepravo* Qual é o papel da escola: ensinar conteúdos ou desenvolver competências? A presente questão tem sido foco de discussão no meio educacional nas últimas décadas e, embora existam partidários para as diferentes concepções, seria no mínimo reducionista tratá-las como dicotômicas, considerando-as numa relação de exclusão Na dinâmica do mundo atual, cujas transformações redesenham continuamente as relações pessoais, profissionais e sociais, a escola cristalizada na mera transmissão de conteúdos perde força, abrindo espaço para um novo modelo de educação preocupado com uma algo mais amplo: a formação pessoal. Neste novo modelo de educação, a discussão sobre conteúdos e competências se dá na esfera do debate sobre meios e fins. A escola centrada no ensino de conteúdos coloca como fim aquilo que na realidade deveria ser da ordem dos meios. Meio para formação pessoal, considerando os diferentes papéis exercidos pelas pessoas em nossa sociedade. Considerando os conteúdos como fins em si mesmos, a escola adquiriu muita pressa em apresentá-los na sua forma mais sistematizada, inviabilizando, assim, as descobertas dos estudantes. Nessa perspectiva, os professores, que dominam os conteúdos, as regras, os fatos e os procedimentos de solução de determinados problemas, ensinam a eles que não “percam tempo” com tentativas que posam se revelar infrutíferas. Na escola conteudista, os educadores fazem de tudo para que os estudantes não errem: explicam, dão muitos exemplos e passam vários exercícios para que pratiquem e memorizem o que foi ensinado. Nessa escola, em vez de se realizar uma mediação que favoreça a aprendi-

zagem dos estudantes, a preocupação central passa ser a de “vencer os conteúdos”. E isso ocorre com a conivência de muitos pais que, pautados num modelo de educação pelo qual foram formados, acreditam que a escola é mais “forte” quanto maior for a quantidade de conteúdos que passa aos seus filhos. Os conteúdos não podem ser vistos como fins em si mesmos, mas como instrumentos para o desenvolvimento cognitivo, social e afetivo dos alunos. Quando a preocupação consiste em vencer o conteúdo, não há tempo para que os alunos formulem suas próprias hipóteses, para que as testem, para que errem e discutam sobre os pró-

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* Ana Ruth Starepravo, pedagoga, tem doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). É autora de livros didáticos e técnicos na área de educação Matemática (starepravo@uol.com.br).

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prios erros. Enfim, não há tempo para aprender! Se os conteúdos são tratados como meios, e não como fins em si mesmos, a escola privilegia a construção de conhecimentos que possam ser mobilizados pelos educandos na abordagem de situações complexas, permitindo uma melhor inserção e intervenção em seu meio. Competência pode ser definida como a soma de conhecimentos ou de habilidades. No contexto educacional, tal definição deve ser ampliada, abordando o aspecto essencial da mobilização de ambos, ou seja, a idéia de competência está mais ligada ao que o indivíduo é capaz de fazer a partir do que possui. Competência envolve, por-

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Marcelo Della Guardia

tanto, tomada de decisão, mobilização de recursos e ação. O que se espera da escola, hoje, é o desenvolvimento de competências, tanto daquelas ligadas a contextos mais específicos, como a realização de cálculos ou a aplicação de regras gramaticais, como daquelas mais amplas, que não estão diretamente relacionadas a uma área específica, como a competência lingüística e a competência racional, principalmente a capacidade de argumentação. A capacidade de expressão é outro exemplo de competência que transcende qualquer disciplina, bem como a mobilização de recursos para resolver problemas de naturezas diversas.

Assim, a escola pode contribuir no desenvolvimento dessas competências quando coloca os estudantes em constante situação de resolução de problemas (lembrando que estes não estão ligados apenas às aulas de matemática) e permite que hipóteses sejam levantadas e discutidas, soluções sejam confrontadas e compartilhadas. Uma escola que trata os conteúdos como meio para o desenvolvimento de competências é aquela que valoriza a produção pessoal dos alunos em oposição à repetição de modelos pré-estabelecidos. Alguns dias atrás, ao final de uma palestra ministrada num Congresso de Educação, uma das participantes me procurou para relatar uma interessante

história envolvendo seu filho, hoje estudante universitário. Na primeira aula de educação física de um dos períodos do curso, realizada no contra-turno, participavam estudantes de várias turmas, sendo que muitos deles não se conheciam. Um deles passou mal, perdendo a consciência. Como nenhum dos alunos o conhecia e o professor ainda não dispunha da lista de chamada, houve uma discussão sobre como poderiam identificar o aluno (nome, turma) para entrar em contato com a família. A participante, orgulhosa, relatou a solução sugerida pelo filho: “cada um pega a sua mochila; assim, aquela que sobrar será do colega que está passando mal”. Com essa idéia, conseguiram identificar o aluno e entrar em contato com sua família. Naquela palestra, havia defendido a necessidade de que os conteúdos escolares sejam trabalhados como meio para o desenvolvimento de competências no sentido abordado nesse texto e relatei algumas experiências vivenciadas com meus estudantes na época em que era professora nas séries iniciais. Todas as experiências envolviam a elaboração de procedimentos pessoais de resolução de problema pelas crianças e a intervenção pedagógica realizada a partir destas soluções, abrangendo diferentes áreas do conhecimento. A participante contou a história de seu filho porque ele havia sido meu aluno quando criança e era personagem de algumas das experiências por mim relatadas durante a palestra. Ela concluiu dizendo que esse tipo de situação pela qual passou ilustrava uma forma de pensar e de lidar com as novas características de seu filho. Segundo ela, a escola fundamental contribui definitivamente para o desenvolvimento de competências importantes para o sucesso no enfrentamento de problemas na vida, e não apenas no âmbito acadêmico. Os conteúdos trabalhados na escola devem ultrapassar os limites da instituição, constituindo-se num conhecimento dinâmico e vivo que deve servir de instrumento para a realização dos projetos pessoais.

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NOTÍCIAS DA UNDIME

I Conferência da Educação Básica Um panorama sintético

A revista Vida e Educação acompanhou, a partir das visões do poder público e da sociedade civil, a preparação para um acontecimento histórico: a I Conferência Nacional da Educação Básica. (Coneb). Foram publicados artigos de vários colaboradores que discutiram a importância dos eixos temáticos da conferência, que teve cerca de 2 mil participantes, foi encerrada com a leitura e votação de 22 moções. Destas, apenas uma foi reprovada pelo plenário. A seguir, você confere um balanço da Coneb, que aconteceu entre os dias 14 e 18 de abril de 2008, em Brasília (DF).

CAQI e fim da DRU são aprovados

Plenárias: entre críticas e elogios

Integrante da metodologia adotada pela Comissão Organizadora, as plenárias dos eixos foram um dos pontos positivos da conferência e serviram como uma espécie de prévia para a plenária final. Nelas, foram debatidas e votadas as emendas específicas de cada eixo, deixando apenas questões polêmicas e sem consenso para a última assembléia, o que agilizou os trabalhos. Apesar disso, as plenárias foram criticadas. A metodologia implantada previa apenas três horas de discussão que deveriam ser cumpridas independentemente do término ou não da análise das propostas. Isso desagradou os delegados, que queriam a apreciação de todo o documento base. Ainda assim, os eixos “Financiamento” e “Inclusão e Diversidade” ultrapassaram o tempo pré-estipulado e analisaram todo o documento. Banco de Imagens

Entre as aprovadas, destacam-se duas referentes à manutenção do salárioeducação, que pode ser extinto com a atual proposta de Reforma Tributária que tramita no Congresso Nacional, e uma de repúdio à responsabilização dos professores, feita por setores da mídia, pela baixa qualidade da educação. Outra moção pedia a aprovação do Projeto de Lei 73/1999, que implementa cotas sociais em universidades públicas, com reserva para negros e índios. A ampliação da Comissão Organizadora Nacional, com representantes do movimento negro entre os participantes, e o fim da Desvinculação das Receitas da União (DRU) também foram tema de moções.

A grande polêmica foi a moção que reconhecia ONGs e movimentos sociais como segmentos oficiais para a próxima conferência. Após uma votação indefinida, essa solicitação foi retirada. No entanto, um destaque aprovado em votação anterior incluiu os movimentos sociais. A única moção reprovada era de autoria de sindicatos patronais das escolas particulares e criticava duramente a Conferência, alegando que o evento foi realizado de maneira a priorizar o debate da escola pública.

A presidente da Undime Nacional, Justina Iva, fez críticas à participação do público. Ela reconhece que a Coneb era algo desejado pela sociedade e por entidades que trabalham com educação, mas avalia que muitos delegados não estavam preparados para o debate. “Faltou certa maturidade em alguns momentos. Há emendas aprovadas que não têm respaldo legal, não são cabíveis”, diz.

Educação Especial é destaque

A parte da diversidade foi marcada pelas discussões sobre a Lei 10.639/2003 (obrigatoriedade do ensino da cultura africana e afro-brasileira nas escolas) e pelas emendas relativas à educação indígena e à educação especial. Neste ponto, prevaleceu o debate sobre a inclusão de pessoas com deficiência na escola pública convencional. A presidente do Centro de Apoio às Mães de Portadores de Eficiência do Ceará (Campe), Keila Leite Chaves, comemorou a reprovação de uma emenda que reconhecia as escolas especiais como instituições oficiais de ensino. No eixo “Democratização da Gestão”, a educação infantil dominou a pauta da plenária.

Mudanças para a II Coneb

A realização, em 2010, de uma Conferência ampla que envolva a educação superior e profissional e que inclua etapas municipais foi uma das principais mudanças solicitadas no processo de realização da Coneb. O secretário de Assuntos Educacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo Filho, disse que, se os debates forem iniciados nas cidades, deve haver um maior envolvimento de escolas no processo, facilitando a compreensão de suas realidades. Outras deliberações também devem ser atendidas, como a que pede a ampliação da Comissão Organizadora. Essa reivindicação consta em uma das moções aprovadas na plenária final. (Com informações da Campanha Nacional pelo Direito à Educação).

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Novos integrantes do CNE tomam posse

Ao dar posse, no dia 10 de junho, aos integrantes do Conselho Nacional de Educação (CNE), o ministro Fernando Haddad apresentou um panorama da educação básica, profissional e superior. Dos conselheiros que assumiram o mandato de quatro anos, seis foram reconduzidos aos cargos. O professor Moacir Feitosa, ex-secretário de Educação de São Luís (MA), foi um dos cinco novos conselheiros nomeados. O ministro disse esperar que o CNE não seja apenas parceiro, mas que ajude a corrigir e alertar para aquilo que precisa ser melhorado. Para ele, o compromisso dos conselheiros não é apenas fazer uma boa gestão, mas preparar o caminho para os sucessores. O ministro visualiza que, com a divulgação dos índices de educação básica, educadores e governantes têm dados para avaliar os avanços na qualidade da educação e buscar caminhos para alcançar a meta, em 2022. O Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), medido em 2005, foi de 3,8 nas séries iniciais do ensino fundamental. Em 2022, espera-se que essa média nacional alcance 6,0.

Sistema avalia qualidade da educação no Ceará

Em solenidade realizada no Centro de Convenções de Fortaleza, no ultimo dia 28 de maio, o governador do Ceará, Cid Gomes (PSB), entregou o boletim pedagógico, analisado por cidade e escola, para os representantes dos 184 municípios. Cerca de 145 mil estudantes participaram do Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica do Ceará (Spaece-Alfa) de 2007. A avaliação, pioneira no Estado, foi realizada em 5 mil escolas com a proposta de produzir informações sobre os estudantes do 2º ano em leitura, além da construção de um índice de qualidade sobre a habilidade dos estudantes nesse aspecto. Os resultados mostram que 47,4% dos alunos des-

conhecem até as letras que formam o próprio nome ou conseguem ler apenas palavras mais simples, formando sílabas. De acordo com o Spaece, no nível intermediário, estão 93 municípios (12,7% dos alunos); entre eles, Fortaleza. Segundo a secretária da Educação Básica (Seduc), Izolda Cela, o resultado da avaliação revela um quadro desafiador e mostra que a tarefa de alfabetizar não está dando certo. A proficiência do município é a média obtida por meio das notas dos estudantes de cada escola.

Municípios assinam convênio com o MEC Cento e sessenta e sete representantes de municípios cearenses assinaram convênios com o Ministério da Educação (MEC), em solenidade oficial ocorrida no ultimo dia 20 de maio, em

Brasília. O “Encontro de Prefeitos”, como o evento foi denominado, contou com a presença de mais de dois mil representantes de municípios, educadores, do ministro da Educação, Fernando Haddad, e do presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva. A partir dessas assinaturas, o MEC se compromete em apoiar tecnicamente 5.563 municípios brasileiros e destinar recursos inéditos para a Educação. Para assinar os convênios, os municípios tiveram de elaborar o Plano de Ações Articuladas (PAR), uma das exigências do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). No Ceará, embora todos os 184 municípios tenham aderido ao compromisso Todos pela Educação, três ainda precisam elaborar o plano: Senador Sá, Tejuçuoca e Itatira. A adesão significa o primeiro passo para que recebam o apoio.

União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) SCS – Q. 6 – Ed. Carioca – salas 611 e 613 CEP: 70.306-900 – Brasília (DF) Telefone: +55 (61) 3037-7888 – Fax: 3039-6030 undimenacional@undime.org.br www.undime.org.br

Secretário de coordenação técnica José Dantas Cyrino Júnior Secretário de comunicação Maria Cecília Amendola da Motta Secretária de finanças Raimundo Moacir Mendes Feitosa Secretário de assuntos jurídicos Jardene de Azevedo Francisco Jadel

Secretária executiva Vivian Ka Fuhr Melcop Secretária administrativa Luciane Guimarães de Oliveira Assistente administrativo José Nilson de Melo Assessores de Comunicação Social Nana Cunha David Telles

Presidente região Centro-Oeste Lúcia Schuster Presidente região Nordeste Maria Luiza Martins Aléssio Presidente região Norte: Moacir Fecury Ferreira da Silva Presidenta região Sudeste: Suely Duque Rodarte Presidente região Sul: Magela Lingner Formiga

DIRETORIA EXECUTIVA Presidente nacional Justina Iva de Araújo Silva Secretária de articulação Carlos Eduardo Sanches

CONSELHO FISCAL Solimara Lígia Moura Márcia Regina Eggerd Soares Wanessa Zavarese Sechim

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DIVERSIDADE CULTURAL

África? Presente! Henrique Cunha Júnior* Marlene Pereira dos Santos**

As “Festas Afros” foram encontradas nas escolas de Maracanaú, na Região Metropolitana de Fortaleza (CE), como uma estratégia pedagógica para introdução da temática da cultura e da história africana na rede de educação. A negação da existência de racismo procura ocultar a realidade das relações étnicas no município, criando um contexto ambíguo em que, ao lado das afirmações da inexistência de população negra, aparecem diversas evidências da mesma. O texto baseia-se em um estudo que examina a implantação em Maracanaú da Lei 10.639, sancionada em janeiro de 2003, que inclui a temática História e Cultura Afrobrasileira e Africana no currículo escolar. 22 MAIO / JUNHO 2008

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* Henrique Cunha Júnior tem mestrado em História pela Universite de Nancy I e doutorado em Engenharia Elétrica pelo Instituto Politécnico de Loraine (França). É professor titular do departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também leciona no Programa de Pós-graduação e Pesquisa em Educação Brasileira da Faculdade de Educação (Faced).

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Este artigo é parte dos resultados da pesquisa de iniciação científica, realizada entre 2006 e 2007, na qual estudamos oito escolas de Maracanaú, com o objetivo de investigar as ações para implantação sobre a História e Cultura da África e dos Afrodescendentes. Foi adotada a metodologia tendo como base a história oral e a pesquisa sociológica com base num território . Estas escolas são tomadas como mostra indicativa das dificuldades para implantação dessa lei federal. Maracanaú está no entorno de Fortaleza, e a divisão territorial entre estes municípios não é nítida para a população, havendo sempre confusões sobre o pertencimento a uma ou outra localidade. Por vezes, um estabelecimento de ensino está localizado numa região administrativa, e as ruas da vizinhança fazem parte legal de outro. Acontece que os participantes da rede escolar de alguns bairros estão sempre fazendo confusão sobre onde moram e onde estudam. Estes municípios da região têm como principal característica a existência de grandes conjuntos habitacionais resultado dos planos de expansão industrial do estado desde 1980. São áreas conceituadas como tendo a maioria população afrodescendente, com base no censo do IBGE de 2000. Entretanto, tal definição esbarra nas declarações vindas do imaginário social cearense que diz “não existirem negros neste estado”. Há a contradição entre a realidade da história e da geografia humana e as declarações da população sobre a existência ou não de população negra no estado do Ceará. O ser negro no estado já foi motivo de pesquisas acadêmicas, estas concluem quanto à ambigüidade sobre aquilo que a população considera ser negro. Estas declarações sobre a existência ou não de negros no estado guardam relação a outro fato social de grande importância que é o racismo. Negando a existência de população negra, considera-se ratificada da inexistência do racismo nesta região geográfica do país. Existe, na maioria dos discursos, a negação da existência do preconceito das discriminações e do racismo.

** Marlene Pereira dos Santos, pedagoga, é professora da Faculdade Kurios (Instituto Superior de Educação), em Maranguape (CE).

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No entanto, de maneira contraditória, também existe um amplo imaginário social de pejorativos e de farta exemplificação dos constrangimentos sofridos pela população negra pela existência de insultos e ofensas. Também é notada fortíssima discriminação sobre a cultura negra e principalmente sobre as religiões afrodescendentes em todo o Ceará. O racismo com construção religiosa é muitíssimo forte e declarado na sociedade cearense, sem nenhum disfarce ou pudor. No contexto de negação da existência de população negra e de interesse sobre a cultura negra, encontramos, em algumas escolas, a realização de “Festas Afros”. Estas, inicialmente, foram uma surpresa, pois, quando começamos a pesquisa, eram muitas as afirmativas categóricas de que não existiria material para a pesquisa proposta. Também se dizia que não encontraríamos nada sendo realizado nas escolas de Maracanaú – afirmações sempre reforçadas pela “não existência” de negros no Ceará. Selecionamos falar das “Festas Afros” porque elas são revestidas de um forte caráter simbólico e fazem parte de uma pedagogia lúdica e participativa de introdução dos temas sugeridos pela lei. Contexto da localidade e das idéias sobre a população negra – As ideologias são histórias e conceitos produzidos com base parcial na realidade, mas que produzem uma coerência social ou histórica e que supostamente explicam uma realidade. Neste sentido, a ideologia de o Ceará não ter negros é completada pela visão histórica, também deturpada. Trata-se da idéia de que o estado não teria uma população escravizada, sobretudo devido a dois fatores: a ausência de plantação de cana ou de café e a abolição precoce no estado, que não pertence aos ciclos econômicos de exportação. Isso também não reduz a importância do escravismo. Este escravismo é notado em todas as cidades e em todas as regiões do estado. As plantações de cana de açúcar foram importantes em diversas

regiões como no Vale do Jaguaribe e na região do Cariri. Os marcadores de cultura de base africana são bastante fortes. Os Reisados e Congadas aparecem em muitas localidades . Na história de diversas cidades, encontramos durante o período escravista a existência de Irmandades de Pretos e de Pardos . Da reunião de um conjunto histórico socioeconômico e geográfico humano, somos levados a garantir que há uma importante presença da população negra e parda no Ceará. Devemos, no entanto, procurar compreender de maneira mais objetiva a aceitação que as pessoas têm em relação à afirmação de que não existem negros no estado. Um dos fatores é relacionado com o passado escravista. As denominações negras e escravas eram tidas como sinônimas. Com a abolição antecipada com relação ao restante do país, em 1884, quatro anos antes da nacional (1888), passou-se a afirmar que não havia mais negros escravizados. Chegava-se, portanto, à idéia original de que não haveria mais escravos e, conseqüentemente, de que não mais existiriam negros. Outra razão é decorrente da percepção de que, devido à constante mestiçagem, estaria extinta a raça negra “pura”, o que significaria a existência, apenas, de mestiços. O mesmo padrão não é aceito com relação à população branca, mas, de toda forma, explica a reafirmação da construção ideológica da inexistência de negros no estado. Deduzimos que trabalhamos no contexto de uma ideologia da mestiçagem, focada na raça pura, e da história do escravismo pouco importante. Fatos que levam a construção no imaginário social da negação da existência de negros no estado. Ao aprofundarmos sobre as realidades históricas, culturais e geográficas, temos indicadores sobre a presença de população negra no Ceará. As “Festas Afros” e sua importância cultural e política – Na pesquisa de campo, foram visitadas oito escolas da rede pública e privada e nelas entrevistando

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Banco de Imagens

os educadores e administradores sobre a existência de trabalhos efetivos para a implantação da lei. Foram sempre solicitados relatos de ações educativas sobre a população e cultura negras ou de combate ao racismo realizado nestas escolas. Registramos que, em algumas escolas, fomos recebidos com certa estranheza e até animosidade. A maioria apresentava muitos entraves para a realização da pesquisa ou havia pessoas muito pessimistas quanto à possibilidade de desenvolvimento da mesma. As pessoas demonstravam certa antipatia pelo tema ou mesmo receio do impacto da pesquisa sobre o âmbito escolar de Maracanaú. Afirmavam por diversas vezes que, no âmbito escolar e educacional da cidade, não haveria nada referente à população afrodescendente, pois – diziam – “são bem poucos os negros no município e nas nossas escolas”. Outro fato observado é que algumas escolas desconheciam a Lei 10.639; em outras, as pessoas temiam falar dela, pois a consideravam muito difícil. Encontramos também professores (as) que dizem ser um tema polêmico e que não gos-

tam de falar desta coisa de preconceito porque “isto é coisa dos próprios negro, que não se aceitam”. Em diversas visitas, ao serem interrogados sobre as ações para implantação da lei, a resposta foi a afirmação de que ali não existia racismo e portanto não se necessitava dessa legislação. Eram repetitivas as falas que diziam: “em nossas escolas, não há casos de preconceito”; “procuramos tratar todos iguais”. Ou mesmo que os (as) professores (as) procuravam trabalhar as diferenças e inclusão social para que não haja “confusão nas escolas”. Entretanto, sempre se procurava fugir do foco das relações étnicas e de tratar de maneira explicita a situação da população negra, da história e cultura desta população no município. Apesar destes discursos de negação de problemas sobre as relações étnicas, temos fatos que confirmam a existência deles pelas “brincadeiras” e xingamentos preconceituosos percebidos nas escolas. Estas situações nos confirmam a existência de preconceito e discriminação racial contra estudantes negros (as) nas escolas desse município.

No entanto, para certa surpresa nossa, pudemos registrar escolas que de maneira não sistemática são realizadas algumas atividades através de iniciativas isoladas de alguns professores. Também encontramos experiências didáticas e materiais literários muito positivos para tratamento da cultura negra e do debate sobre o racismo na sociedade brasileira. Ações quase sempre pouco focadas na realidade local. Neste conjunto algumas ações se mostraram bastante positivas. Dentre as mostras positivas citaremos os trabalhos de três escolas . Um trabalho bastante interessante foi do Colégio Carlos Lobo, que realizou a IX Gincana Cultural com o tema “África Negra, Bem Mais Perto de Nós”. Os estudantes foram divididos em duas equipes (Mandela e Zumbi) e tiveram várias tarefas para representar a histórias e as culturas da África. Outra realização de grande expressão foi a do Colégio Raimundo Nonato Vieira, que promoveu a XVI Semana de Esporte, Arte e Cultura com o tema “Brasil Afro”. As gincanas, competições entre equipes e atos de encenação levaram os estudantes a refletir sobre a diver-

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Também perguntamos sobre a formação oferecida à distância pelo MEC sobre a história e a cultura africanas e afro-brasileiras. Esta formação foi bem divulgada, tendo dois ou três professores inscritos cada escola. Porém, teve impacto mínimo sobre a formação dos educadores. Os inscritos, via de regra, não acompanharam o curso por diversas razões. Para um município onde as pessoas diziam, de início “não ter nada sobre a implantação da lei e nada sobre negro”, essas pequenas amostras de ações pedagógicas já são um começo importante e demonstram a existência de possibilidades variadas de trabalho. As “festas afros” foram marcos políticos e culturais importantes, assinalando uma ruptura com o silêncio e com o imobilismo em relação à implantação da Lei 10.639 nas escolas de Maracanaú. Elas demonstram que, quando existe vontade política, sempre é possível promover atividades didáticas de vulto e de importância pedagógica.

Bibliografia CÂMARA, Isabelle. Presença Negra. Fortaleza: O Povo, O Povo na Educação, 4 mar. 2007, Jornal do Leitor, p. 4. CUNHA JR., Henrique. Nós, Afrodescendentes: História Africana e Afrodescendente na Cultura Brasileira. In: MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO (Brasil). História da Educação do Negro e Outras Histórias. Brasília, 2005. NUNES, Cícera. O Reisado em Juazeiro do Norte (CE) e os conteúdos da história e da cultura Africana e Afrodescendente: uma proposta para a implementação da Lei 10.639/03. Dissertação de Mestrado em Educação, Faculdade de Educação (Faced-UFC), 2007. RIBEIRO, Rosa Maria Barros. Negros do Trilho e as Perspectivas Educacionais. Mestrado em Educação. Fortaleza: UFC. 1995. SANTOS, Marlene Pereira dos. Educação e afrodescendentes em Maracanaú: estudo da implantação da Lei 10.639 no Município. Maranguape (CE): Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Faculdade Kurios, 2007. SILVA, Rebeca de Alcântara. A menina e o Erê nas viagens ao ser negro / ser negra: uma pesquisa sociopoética com educadores em formação. Fortaleza: Dissertação de Mestrado em Educação. Faculdade de Educação (Faced-UFC), 2007. Banco de Imagens

sidade cultural e a vivenciar ações de combate ao preconceito e à discriminação. A escola de ensino fundamental Genciano Guerreiro de Brito preparou uma Semana Cultural com o tema: “Africanidade: História e Cultura Afrobrasileira”. Este evento aconteceu em novembro pensando no Dia Nacional da Consciência Negra. Essas três escolas criaram projetos de trabalhos pensando como objetivo conhecer, resgatar e valorizar a história e cultual africana e afro-brasileira, como também o combate ao racismo. Realizaram esses trabalhos sempre num clima de grandes festas incluindo músicas e representações. A forma lúdica da festa e do teatro foi utilizada para abordar a temática, tendo sempre o destaque do envolvimento da escola em seu conjunto e da mobilização festiva durante vários dias. As semanas culturais e suas festas possibilitaram aos educandos e educadores a elaboração de pesquisa em bibliotecas e na Internet, suprindo, com criatividade, a falta de informações.

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INFORMATIVO

Fortim

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Manoel Lima

Merenda escolar é prioridade em

Para milhões de crianças, a merenda escolar é a principal refeição do dia. Muitas vezes, a única. Por isso, é preciso dar à merenda a importância necessária. No ano passado a ONG Ação Fome Zero realizou a 4º edição do Prêmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar, que teve 751 municípios inscritos e 25 foram premiados. O município de Fortim, localizado a 118 km da Capital do Ceará foi o único município cearense a receber o Prêmio. O projeto Gestão Eficiente da Merenda Escolar tem o objetivo de garantir que os recursos públicos previstos no Programa Nacional de Alimentação Escolar sejam efetivamente gastos em merenda de qualidade, na quantidade e regularidade necessárias para o desenvolvimento dos estudantes da rede pública de ensino do País. A educação de Fortim tem um programa de merenda escolar de qualidade que é pioneiro no país, o Desjejum nas Escolas, que surgiu através de várias visitas do prefeito Caetano Guedes Júnior e sua equipe de trabalho à população, em 2005. De casa em casa eram feitas enquetes a fim de identificar as necessidades das comunidades. Na pesquisa as mães dos estudantes pediam que a merenda escolar fosse servida mais cedo, pois os seus filhos freqüentemente iam para a escola sem o café da manhã. No programa, os alimentos consumidos pelos estudantes são produzidos no próprio município, mobilizando a sociedade civil e gerando emprego e renda para a população. O programa conta com participação efetiva do Conselho de Alimentação Escolar (CAE), e um dos principais objetivos é aumentar o rendimento e a freqüência escolar dos mais de 2,3 mil estudantes das 18 escolas municipais. O cardápio do Desejum é desenvolvido por nutricionistas habilitados respeitando os hábitos alimentares e a vocação agrícola da comunidade. Diante do êxito do programa, o município foi escolhido pela ONG Fome Zero para sediar o 2º Encontro dos Conselhos de Alimentação Escolar do Ceará, que aconteceu no final de maio deste ano.

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Gerlane Lira

avaliações no Ceará e analisar as necessidades de aprendizagem. A escala de proficiência para leitura dos resultados do Spaece-Alfa é constituída por cinco níveis, indo de “não-alfabetização” (até 75 pontos) a “desejável”. Dos 184 municípios cearenses, 14 destacam-se por apresentarem média de proficiência no nível desejável, e Fortim é um deles. O Sistema de Avaliação foi aplicado pela primeira vez, no ano passado, para mais de 140 mil estudantes do 2º ano do Ensino Fundamental de aproximadamente cinco mil escolas públicas estaduais e municipais do Ceará. A avaliação possibilita aos gestores municipais e à comunidade escolar um acompanhamento de informações relativas à Educação Básica.

Prefeitura investe na formação do professor Nos últimos anos, Fortim vem investindo na formação continuada dos professores. O projeto de Ações Socioeducativas Complementares foi desenvolvido no ano de 2006, com duração de seis meses. Foram realizados planejamentos mensais e reuniões para o acompanhamento das atividades e orientações gerais em todas as modalidades de ensino. Outro programa ao qual o município também aderiu foi o Pró-Letramento, do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental. Um destaque da Secretaria de Educação foi o Programa de Alfabetização na Idade Certa (PAIC), Programa do Governo Estadual, em parceria com o governo municipal que tem por finalidade encontrar caminhos para superação do analfabetismo escolar. O programa se desenvolve através de cincos eixos. A Secretaria de Educação faz o trabalho de acompanhamento junto aos diretores, coordenadores, professores e alunos da pré-escola ao 5ºano do ensino fundamental, por meio de seminários, reuniões, capacitações e avaliações.

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Fortalecendo a política de incentivos e remuneração, o prefeito municipal, Caetano Guedes Júnior, o ex-secretário de educação, Robson Assunção, e a atual secretária, Mônica Maria Barreto Barbosa, que, em parceria com os professores da rede de ensino, construíram juntos o Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração, a partir do qual o professor passou a ser valorizado com aumento de salário e reajustes salariais anualmente. O resultado dessas e de outras ações foi a classificação de duas escolas do município que, no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), ficaram entre as 50 melhores do Ceará.

Bons resultados na educação básica O município de Fortim ficou entre os 14 melhores municípios do Ceará, nos resultados do Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica, em sua vertente de avaliação da Alfabetização (Spaece-Alfa 2007). A ação é uma motivação para promover a cultura de

Premiações - Selo Unicef – Município Aprovado (2006) - Selo Prefeito Empreendedor-IV - Melhores Programas de Ação Social do Ceará - Práticas Inovadoras na Gestão do Bolsa Família 2006 - Prêmio micro-regional como município em destaque em projetos inovadores e bom funcionamento da Central de regulamentação - Êxito Administrativo 2007 – Golden Premium Brasil - Dia do Desafio SESC (2007) - Prêmio de Melhor Prefeito (2005 e 2006) - Prêmio Agrinho - Prêmio Gestor Eficiente da Merenda Escolar - Prêmio SEBRAE Prefeito Empreendedor (2007) - Presidente da Associação dos Municípios do Litoral Leste

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ENTREVISTA

Superar a ‘tradição medieval’ em busca da educação do século XXI

Arquivo pessoal

Daniel Fonsêca e Karla Camila Sousa

Pedro Demo: referência no pensamento sobre políticas públicas para a educação

Aparência serena, extensa atuação profissional e densa tradição acadêmica. Com este perfil, o professor titular do Departamento de Sociologia da Universidade de Brasília (UnB) Pedro Demo poderia considerar-se mais um “derrotado” pelo pensamento hegemônico mundial, dadas as posições que sustenta acerca da educação e do modelo de sociedade baseado no mercado. Isso, se não fosse seu permanente esforço de pesquisa, inovação e de compromisso com a renovação dos modelos pedagógicos tradicionais para que as pessoas sejam educadas na lógica de uma cidadania mais próativa frente à realidade socioeconômica e política. O atual modelo, baseado na idéia de transmissão de conhecimento, deve ser superado, segundo Pedro Demo, um pesquisador multifacetado, com formação inicial em Filosofia, Teologia e Música, e que esteve sempre em diálogo com as políticas públicas no país. Com passagem por diversas instituições e ministérios de estado – destacadamente o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do Ministério do Planejamento, onde pôde conhecer diversas realidades brasileiras, levando-o a uma visão mais sistêmica. PhD em Sociologia pela Universidade de Saarbrücken (Alemanha) e pós-doutor pela University of California at Los Angeles (UCLA-EUA), atualmen-

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te Demo leciona no Programa de Pós Graduação Strictu Sensu em Sociologia da UnB. Nesta entrevista, o professor da UnB trata da realidade do Ensino Fundamental no país, em que 90% das crianças encontram-se na escola pública. “Se tivéssemos uma boa escola pública, poderíamos mudar o perfil de crítica e de posicionamento da população”, argumenta. Na Alemanha, segundo Demo, a educação é totalmente gratuita. Nos últimos 30 anos, o Brasil escolheu outro caminho, influenciado pelos Estados Unidos: “privatizou-se a educação”, diz, taxativo, referindo-se principalmente à Educação Superior. No entanto, ele adiciona que não basta ter um sistema público. “Não se pode esquecer que a tradição brasileira no SUS também é essa: hospital público é para o pobre. Quando o hospital é bom, ele não entra”, compara. O professor Pedro Demo analisa diversos assuntos que envolvem a educação, como as tecnologias de informação e a condição de trabalho dos professores, além de discutir conceitos como a “multi-alfabetização” e opinar sobre propostas históricas como o Sistema Único de Educação. Neste ponto, ele alerta: “você pode fazer um sistema com a mesma falta de qualidade”. Para esmiuçar questões como essas, a revista Vida e Educação entrevistou Pedro Demo, que também já dirigiu o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira do Ministério da Educação (Inep/MEC) nos anos 1980.

Vida & Educação – Do ponto de vista biológico, como coloca o chileno Humberto Maturana, autor em que o senhor se referencia bastante, o nosso cérebro funciona interpretativamente, e não passivamente. Como superar a prática pedagógica que ignora essa característica? Pedro Demo – Nós temos uma tradição medieval ou próxima à medieval, que considera a possibilidade de você transmitir conhecimento. O professor fala; o aluno escuta, copia e não participa como construtor do conhecimento. Essas descobertas biológicas feitas por Maturana, entendem o cérebro humano como uma máquina bem diferente do computador. Existe uma grande expectativa de que um dia o computador funcione como o cérebro, por enquanto ele apenas processa, não interpreta e nem reconstrói. A nossa memória é incapaz disso; a memória de ontem já não é a de hoje. Você acrescenta, tira e reconstrói. Nós não conseguimos ser passivos. O ser humano, como todo ser vivo, tem essa capacidade de autonomia. A autopoesia significa o movimento de dentro, que os pedagogos conhe-

Vida & Educação – No seu livro “Educação e Conhecimento”, o senhor afirma que o sistema capitalista não teme os famintos, mas sim o pobre que pensa, porque este, diferentemente do outro, vai atrás de seus direitos. Como a chamada “cidadania ativa” pode ser construída a partir da educação? Pedro Demo – Eu continuo acreditando que um dos apoios mais importantes para a cidadania é uma boa educação, especialmente uma boa aprendizagem. Se as crianças apreendessem a pensar na escola, nós teríamos com o tempo uma outra população, capaz de confrontar, exigir e se organizar e não uma que fica esperando soluções de um bom governo. Para que você tenha uma cidadania razoável, primeiro se precisa vencer a educação fundamental. na Alemanha, há mais de 200 anos esse problema está resolvido, e nós ainda não resolvemos. A maioria das crianças vai para a escola, mas não aprende direito. A aprendizagem é péssima; não é só ruim, mas está em queda: a cada ano, temos um susto a mais. Então a grande cartada da cidadania se joga aí. Evidentemen-

“Existe uma grande expectativa de que um dia o computador funcione como o cérebro, por enquanto ele apenas processa, não interpreta e nem reconstrói. A nossa memória é incapaz disso.” cem desde Sócrates. Ele não tinha uma argumentação biológica, mas sempre dizia que não dava para botar uma idéia dentro da cabeça do aluno, você pode apenas apresenta-la, mas ele tem que reconstruí-la. Geralmente na sala de aula a tradição docente não é essa, o professor sebe e transfere para o aluno. É bom lembrar que Piaget foi biólogo e criou o construtivismo, que é a idéia de que conhecimento não dá para copiar. Sendo ele conhecimento autêntico, é uma produção de quem conhece. Esse ato interpretativo faz parte do que nós chamamos hoje de aprendizagem.

te, a cidadania não se faz só de escola, mas é um vetor fundamental. Se tivéssemos uma boa escola pública, poderíamos mudar o perfil de crítica e de posicionamento da população. Vida & Educação – Com a atual hegemonia do pensamento neoliberal não só no Brasil, mas em todo o mundo, o senhor avalia que é possível planejar políticas que invertam a lógica do “estado mínimo” e façam o poder público do estado investir, de fato, na educação? Pedro Demo – Nós temos tradições muito conflitantes do capitalismo nór-

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ENTREVISTA

dico europeu, que, apesar de ser capitalista, investe muito em educação, embora a argumentação tenha sido sempre atrelada ao mercado. A Alemanha, quando investe, também tem o olho mais voltado para o mercado. Isso nós não vamos certamente mudar no capitalismo. A educação está ficando cada vez mais importante porque está se inserindo na produtividade, não é possível ter um trabalhador bem produtivo sem que ele estude. Mas, na Alemanha, a educação é gratuita, e não há escolas particulares por lá. A nossa tradição é muito diferente; somos puxados pelos Estados Unidos. Privatizouse a educação, [mas] continua tendo

Pedro Demo – Nós temos que cuidar dessa argumentação, porque existe uma proposta de teoria crítica que é só critica, não constrói, não põe nada no lugar é reservada a algumas pessoas. Hoje é muito importante saber aprender e discordar. Convivência democrática é você ter discordância e saber argumentar. Em vez de seguir na linha de argumento de autoridade, preferir a autoridade do argumento, para convencer sem vencer. Então as tradições de teoria crítica nem sempre são muito coerentes, porque não são autocríticas. Você não pode criticar e impedir de ser criticado, quem interpreta vai ser interpretado; não dá para fechar isso em círculos. É importante conseguir que

“A pedagogia está olhando para o século IXX e essa criançada está no século XXI. É urgentíssimo mudar essa pedagogia, mudar essa epistemologia docente.” um sistema público, sendo que ele é minoritário, pelo menos no nível superior. Os pobres não conseguem ir para a universidade federal; é preciso se contentar com outras ofertas. Nós temos uma briga entre dois sistemas, mas, de certa maneira, nós já perdemos o trem da história, porque, agora, apagar a escola particular no Brasil é impossível. Nós temos mais é que conviver com ela e também valorizá-la, mas nós perdemos um pouco aquela idéia de que educação não se compra e não se vende; tem que ser pública e todo mundo tem que ter acesso a ela Vida & Educação – Nos seus trabalhos, existe uma defesa contundente do conhecimento como uma habilidade de questionamento, com “desconstruções” e “reconstruções”. No atual contexto político e socioeconômico, é possível buscar a “teoria crítica” como prática pedagógica?

uma criança se alfabetize dentro desse espírito de senso crítico, tornando-se autor. Existe a perspectiva de como você inventa um aluno autor que supõe um professor autor. É um grande desafio ter professores autores, porque eles são produtos de uma pedagogia que não lhes deu autoria, a maioria dos professores de pedagogia também não era de autores. Lá fora, o que constitui um professor não é dar aula, é ser autor, porque, se você não é autor, não tem aula para dar. Toda essa conversa de pesquisa e elaboração funda a atividade docente e discente. Essa é uma grande mudança que temos que fazer, até porque os dados mostram que se nós seguirmos na escola fazendo o que estamos fazendo vamos cair. O que nós estamos fazendo hoje na escola não funciona, não estamos conseguindo com que as crianças aprendam,estamos dando aula. Nunca o desempenho escolar caiu tanto quando nós aumentamos as aulas. Se você

olhar a tabela do Saeb, a maior queda de desempenho foi em 1999 – uma queda impressionante pelo aumento dos dias letivos para duzentos. Não adianta aumentar a carga horária de ensino, aula estudante tem de sobra, o que ele não está conseguindo é aprender. Vida & Educação – Com o advento das tecnologias de informação e comunicação, os educadores enfrentam hoje uma mudança de paradigmas em relação à pedagogia tradicional? Pedro Demo – A pedagogia está fora da jogada, não se aproxima das novas tecnologias, geralmente tem medo delas e com isso nós estamos deixando tudo nas mãos dos informáticos, que fazem o que querem e a gente não sabe nem discutir. Hoje existe uma dicotomia cada vez maior, como a escola alfabetiza e como as crianças que tem computador em casa se alfabetizam. Essa criança usa o computador antes mesmo de saber ler. Isso não é condição para a criança usar o computador. Ela depois quer ler, mandar e-mail, fofocar na internet. [Com isso], ela se alfabetiza muito antes e melhor, e a escola vai ficando para traz. Isso tem muito a ver com a pedagogia fora de época. A pedagogia está olhando para o século IXX e essa criançada está no século XXI. É urgentíssimo mudar essa pedagogia, mudar essa epistemologia docente. É muito importante o texto coletivo que aparece na Web 2.0, blogs, ipods, e no celular. Tudo é muito ambíguo. Nos chats, as crianças maltratam a língua, inventam gírias, abreviam, fazem coisas que matam de susto qualquer gramático. Elas não são apenas usuárias da língua; produzem a língua na internet. A pedagogia não produz autoria, produz cópia. Podemos criticar a pedagogia como quiser, mas é o curso mais importante da universidade, porque decifra o que é aprender, agora é preciso ver na pedagogia a melhor aprendizagem possível. Não adianta somente criticar o professor. Precisa-se cuidar dele, porque é nele que está a solução. O melhor computador da escola é o professor, mas também não adianta encher a escola de maquina se o ele não souber usar. Precisamos de um professor que puxe as tecnologias, não que seja puxado por elas.

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Vida & Educação – Existiria apenas mais uma estratégia do mercado no sentido de instrumentalizar as novas “habilidades e competências”? Pedro Demo – Esse é um discurso que os professores fazem porque tem medo da tecnologia, que avança com essa velocidade por causa do mercado. O sistema financeiro é todo tecnológico. Vende-se muitos jogos eletrônicos, o celular está dominando o mundo, e qualquer criança tem um celular. A criança se dá muito melhor com a tecnologia – ela é nativa, e nós somos imigrantes. Ela não tem esse papo de que tecnologia é apenas um instrumento. Não estou dizendo que devemos entrar em um determinismo tecnológico. Muita tecnologia faculta a autoria. Essa discussão da Web 2.0 [é] uma descoberta importante, que, para você usar, tem que produzir informação. É uma tecnologia que se bem usada pode favorecer a autoria das pessoas. A internet é ótima para copiar e plagiar. O desafio de fazer da Internet uma plataforma de pesquisa passa pelo professor, ele tem que saber fazer isso e cuidar que o aluno faça também. O computador entrou e ficou, então nós temos que conviver bem com ele. Vida & Educação – O senhor pode explicar o conceito de “multi-alfabetização”? Pedro Demo – São alfabetizações de muitas maneiras: você tem que saber inglês – hoje, começa a aprender inglês na alfabetização. Para você se virar no mundo sem inglês, é complicado. Você tem que ter uma boa experiência com computador; não é só digitar, mexer com Internet, mas é, sobretudo, produzir conhecimento com on-line, participar ativamente, ser autor; então, isso é um desafio, você não tem como se livrar dele; tem que enfrenta-lo. Essa mudança veio para ficar e você tem que saber colocar dentro da educação. O pedagogo não só deve entender, mas deve também humanizar isso. As tecnologias facilmente têm um lado desumano, mercadológico, de queimar a cultura, de fazer só o que é útil ao mercado, nós temos que fazer o que é importante para a vida e para as pessoas.

Vida & Educação – Como os parâmetros curriculares nacionais podem ser atualizados para dar conta desse novo contexto? Pedro Demo – Eu acho que isso deve ser feito com muita rapidez. O problema é que o Ministério da Educação também está um pouco parado nessa área. No Governo Federal, é o Ministério de Ciência e Tecnologia que tem coisas interessantes. O MEC ainda é do tempo da aula, ainda aposta nessa reprodução, nessa pedagogia parada. Os parâmetros curriculares foram uma boa idéia, e tem muita gente boa que cuidou disso e que pode reconhecer muito mérito. [No entanto,] é ainda uma pedagogia do século XX.

mos que arrumar um professor que saiba disso, o nosso grande desafio hoje na verdade é professor, tecnologia não é mais desafio. Os professores estão parados e, de certa maneira, se contentam com o que têm. Nós precisamos mobilizar o professor, tirá-lo dessa letargia, colocá-lo no século XXI, conseguir que as pedagogias assumam esse novo desafio. Dar conta de uma boa fluência tecnológica que geralmente o pedagogo não tem, exige muito tempo, exige dedicação, recursos, um bom computado e uma boa banda larga. Essa mudança que estamos pretendendo de fazer uma população que consiga dar conta do século XXI, passa pela pedagogia e pelo professor.

“Hoje é muito importante saber aprender e discordar. Convivência democrática é você ter discordância e saber argumentar. Em vez de seguir na linha de argumento de autoridade, preferir a autoridade do argumento, para convencer sem vencer.” Você não abraça as novas alfabetizações. Eu acho que toda escola de tempo integral deveria ser tecnologicamente correta, cada aluno devia ter computador, não adianta ir para escola de tempo integral de forma artesanal, olhando para o século XX, para que ficar 8 horas na escola para aprender velharia. O aluno tem que ficar oito horas na escola para entrar no século XXI e se preparar para a vida e para o mercado. Vida & Educação – Como a formação dos educadores pode ser reposicionada a partir dessas novas linguagens? Pedro Demo – Primeiramente, nós devemos às crianças uma alfabetização do século XXI. Não adianta só saber ler, escrever e contar; precisa de fluência tecnológica. Lidar com a informação, selecionar, reconstruir e reinterpretar, tudo isso é fundamental para a gente enfrentar o século XXI. Então nós te-

Vida & Educação - Os sistemas de avaliações atuais como o SAEB têm capacidade de mensurar qualitativamente a realidade da educação brasileira? Pedro Demo – Nem um sistema de mensuração da realidade é satisfatório, todos são apenas aproximativos. Decidir que a proficiência do aluno tem que ser de 200 pontos, isso não está na Bíblia, é uma discussão que se há de fazer. O Sistema de Avaliação da Educação Básica- Saeb ,pode ser muito criticado porque quando se mensura agente se afasta da qualidade, acaba pegando a referência quantitativa de uma qualidade que está por traz da quantitativa, então eu acho que temos que tomar os dados sempre com muita cautela. Se soubermos usar os sistemas de avaliações podem ser úteis nada mais que isso, mas eles também sofrem muitas criticas internacionais, porque, quando existe um sistema rígido de avaliação,

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ENTREVISTA

a escola começa a se adaptar à avaliação e não à aprendizagem do aluno. É a mesma coisa do vestibular: quando o estudante vai fazer cursinho ele estuda o que precisa, e decora tudo, o Saeb também corre esse risco. De todo modo, o Saeb tem uma boa teoria estatística por trás, a teoria da resposta ao item, uma experiência histórica, é uma referência. Mas não podemos tomar nem uma avaliação como retrato da realidade como de fato nem uma é. Eu acho que essas avaliações, que mensuram as coisas e são de referências quantitativas, devem ser completadas por avaliações qualitativas, que são menores, são tópicas, subjetivas e não dá para generalizar.

suficiente. O professor tem que ter uma vida digna, porque ele é um dos construtores da dignidade social. Ele tem que estar dentro da sociedade, então precisa de um bom computador, precisa de banda larga, precisa viajar, ter biblioteca em casa, assinaturas de revistas interessantes. Tudo isso custa muito dinheiro. Então ele precisa estar satisfeito para poder entrar na escola e mostrar às crianças que é possível ter uma vida digna. Quando o professor ganha, em média, R$ 830 por mês, ele não pode ter uma vida digna. Ele entra na sala de aula dizendo que não vale a pena se educar. Nós devemos, aos poucos, vincular o bom salário a uma boa aprendizagem do aluno, e o sindicato dos

“As tecnologias facilmente têm um lado desumano, mercadológico, de queimar a cultura, de fazer só o que é útil ao mercado; nós temos que fazer o que é importante para a vida e para as pessoas.” Você pode perceber melhor se o aluno está aprendendo bem vendo como ele produz texto. O Saeb até produz textos, mas são textos pequenos, porque é muito difícil avaliar texto. Vida & Educação – Hoje, segundo dados do Inep/MEC, existem diferenças enormes quanto ao salário dos professores, que chegam a 400% - Pernambuco teve a média de R$ 831,00, enquanto o Distrito Federal atingiu R$ 3.371,00). Como essa disparidade por ser resolvida sob a ótica de melhorar a educação sem vinculála, necessariamente, à remuneração ou à produtividade do educador? Pedro Demo – O problema é que muitas vezes o salário aumenta, e o aluno não aprende. Se o professor não está bem preparado, você pode pagar o quanto quiser, continua do mesmo jeito, mas eu defendo muito o bom salário do professor. O que ele ganha ainda não é o

professores deve despertar para isso. É preciso ganhar bem para o aluno aprender melhor. Você vê, pelas próprias disparidades salariais do país, duas coisas: as políticas educacionais e algum movimento, que é o segundo ponto, o sindicato. Os professores não se sindicalizam, não se organizam, esperam que o governo que eles tanto criticam resolvam os problemas dele. Hoje em dia, as greves se tornaram curriculares, perderam o sentido. As greves devem ser rápidas; durar dois, três dias, como lá no ABC, se faz, não pode durar três ou quatro meses porque vai apodrecendo. Nós não sabemos fazer greve. Quando a greve é curricular, a imagem da escola pública fica cada vez pior. Ganhar bem é muito importante. O professor trabalha de manhã em um canto a tarde em outro e de noite em outro, então ele se desgasta. Eu acho que o professor tem que trabalhar oito horas em uma escola: só dar quatro horas de aula, e as outras quatro horas seriam re-

servadas a estudar. Um fenômeno que nós ainda não descobrimos no Brasil, o que é estudar. Nós temos que vincular cada vez mais o bom salário a uma boa aprendizagem. Vida & Educação – Em Mato Grosso, desde a constituição estadual de 1989, existe o Sistema Único de Educação, conquistado a partir da mobilização popular, sobretudo de entidades ligadas à educação, como o Andes-Sindicato Nacional. Como o senhor vê a idéia de se constituir um sistema unificado com abrangência nacional, nos moldes do SUS? Pedro Demo – Assim como se criou o SUS [Sistema Único de Saúde], é possível imaginar isso também. No mundo todo, os sistemas de educação não são federalizados; existem muitas discussões. O senador Cristóvam Buarque [PDT-DF] tem a idéia de federalizar a educação, não para tirar do município, mas para comprometer a união profundamente. Mas, se você [houver] muita centralização, fere a federação. O que decide tudo no país é Brasília, e não o município. O que está em tela é não colocar a educação pública como está sendo feita atualmente, na margem. Mas não se pode esquecer de que a tradição brasileira no SUS também é essa: hospital público é para o pobre. Quando o hospital é bom, ele não entra. Há muita coisa para se discutir; o Brasil é um país terrivelmente desigual. Todos deviam poder fazer a universidade federal, mas só alguns fazem. Se você não fez uma escola particular, não fez cursinho, você não chega à Universidade. A tendência é de que os mais ricos fiquem por lá. Não é simplesmente fazer um sistema único. O que se imagina é que o sistema único tenha a mesma qualidade para todos, mas o país não tem essa tradição. O SUS, um bom exemplo, é igual para todos, mas é tendencialmente péssimo. É só olhar como são os hospitais públicos: são horrorosos; não são diferentes da escola pública. Precisamos mexer na concentração de renda, na concentração de poder, em como se dividem as coisas dentro do país. Um estado que não é controlado pela população dá à população miséria.

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PUBLICAÇÕES PUBLICAÇÕES

Educação ambiental em rimas

Neste livro, você vai conhecer, de uma maneira bem diferente, o tema do aquecimento global. Suas causas, conseqüências e soluções são contadas por meio de diversas modalidades de estrofes da literatura de cordel. Além disso, textos vão aprofundar seus conhecimentos para além das geleiras derretidas, dos ciclones e da vida dos ursos polares. A xilogravura, técnica conhecida no processo de ilustração dos folhetos de cordel, ganhou cores e foi a forma escolhida para trazer este assunto tão importante e atual de uma maneira envolvente e cheia de rimas! Aquecimento Global não dá Rima com Legal César Obeid 48 páginas R$ 25,00 Editora Moderna

Um mundo enigmático

Luciana Savaget, jornalista e autora de livros infantis e juvenis, alguns deles premiados e com edições na Colômbia, narra, com sensibilidade e beleza estética, os enigmas que cercam a desolada e deserta vila de Huasao, a noroeste de Cuzco, no Peru. Por um acaso, conheceu Hilaria, uma moradora que lhe revela os fatos, e nasce uma história fantástica e enigmática. Ao visitar a região, a autora conheceu a história de Hilaria, de seu filho Luter, de Rosalia e dos bruxos Martinho Cunha e Félix. “Cumpri a minha promessa escrevendo a vida daquela peruana que vivia num mundo povoado por fantasmas e pela dor”, relata. Enigma de Huasao - uma história peruana Luciana Savaget Gonzalo Cárcamo (ilustrações) Global Editora 40 páginas R$ 27,50

Cultura africana

Este livro ressignifica a história, a cultura e a memória dos afro-brasileiros no processo da formação da nossa nação, tendo como raiz a história da África. Aborda a temática do Brasil Afro-brasileiro, observando aspectos como a diversidade cultural, dominações e resistências, diferenças e semelhanças e permanência e mudança. É possível encontrar todo o colorido e beleza deste país múltiplo e compreender que ser negro não se limita apenas a possuir as características físicas, mas representa a escolha de uma posição política, no sentido de assumir a ascendência africana. Brasil Afro-brasileiro: Cultura, História e Memória. Manoel Alves de Sousa 176 páginas R$ 45,00 Editora IMEPH Contato: (85) 3261.1002

Superação através do esporte

O livro conta a história de Pantico, um menino que, com a ajuda de sua família e dos amigos do bairro, consegue transformar um terreno baldio em um grande campo de futebol e um espaço de lazer para toda a comunidade. Muito mais do que representar um exercício físico ou uma prática saudável, a história apresenta o esporte como uma ferramenta que, aliada à educação, transforma-se em uma excelente oportunidade de sociabilidade. A solidariedade, o cooperativismo e a superação de dificuldades são alcançados através do esporte e da união de toda a comunidade. A Bola da Vez Raymundo Netto Giovanni Muratori (ilustrações) 24 páginas Edições Demócrito Rocha Contato: (85) 3255.6256 www.apdmce.org.br

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Segurança Alimentar e Nutricional: Banco de Imagens

a maior crise em 50 anos

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Banco de Imagens

O mundo vive, hoje, um dos maiores problemas no setor primário da economia. Essa realidade pode afetar, também, a alimentação escolar, cujas políticas públicas podem sofrer abalos, apesar dos avanços alcançados no Brasil com o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae). Nesta matéria, além de acompanhar os principais obstáculos a serem superados pelos países na relação entre a oferta e a demanda de alimentos, é possível conferir os novos passos dados e um histórico da busca pela garantia do direito à Segurança Alimentar e Nutricional na escola nos artigos dos colaboradores Renato Maluf e Luciana Siqueira

Na abertura da Conferêcia Mundial da Agência da ONU para Agricultura e Alimentação, FAO, que aconteceu de 3 a 5 de junho, em Roma (Itália), o diretor-geral da entidade, Jacques Diouf, afirmou que as conseqüências sociais e políticas da atual crise podem ameaçar a paz mundial. Para ele, o problema da segurança alimentar é “político”. Pessimista, ele estimou que “com as tendências observadas (atualmente), este objetivo seria atingido em 2150 em vez de 2015”. Este ano foi o prazo com o qual os países se comprometeram em reduzir, pela metade, a miséria no mundo. Para Jacques Diouf, se não forem tomadas decisões urgentes, as repercussões das mudanças climáticas e a especulação no mercado de futuros vão colocar o mundo em uma situação perigosa. Atualmente, são 854 milhões de famintos no mundo, mas esse número deve aumentar. A reunião foi uma “oportunidade histórica” para o relançamento da luta contra a fome e a pobreza. O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, afirmou que a população mundial deve chegar a 7,2 bilhões de pessoas em 2015. “É preciso rever as políticas comerciais e tarifárias para diminuir as restrições à exportação e as tarifas para importação, contribuindo para a livre circulação dos bens agrícolas”, advertiu. Na avaliação da FAO, o Brasil deve ganhar mercados em vários setores e beneficiar-se da alta, como na venda de carnes e de milho. Mas nem toda a inflação deve ter uma repercussão positiva para o país, principalmente no que se refere ao trigo e ao arroz. Segundo a FAO, o cenário deve levar a um aumento da fome no mundo. “Alimentos não são mais baratos como foram”, afirmou o diretor-assistente da agência da ONU, Hafez Ghanem. Hoje, são 854 milhões de famintos no mundo, mas esse número deve aumentar. A ONU avalia que a crise é a pior em mais de meio século.

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Banco de Imagens

ALIMENTAÇÃO ESCOLAR

Garantindo a hora da merenda Renato Maluf*

mentar e Nutricional (Consea) formou um grupo de trabalho que elaborou propostas, dando origem a um projeto de lei encaminhado ao Congresso para aperfeiçoar o programa de alimentação escolar

O direito à alimentação é essencial à vida e à dignidade da pessoa humana. Todo mundo tem direito à segurança em relação aos alimentos e à alimentação, tanto em suficiência (proteção contra fome e desnutrição), como em qualidade (prevenção de males ligados à alimentação) e adequação (apropriação às circunstâncias sociais, ambientais e culturais). O Conselho Nacional de Segurança Ali-

A segurança alimentar e nutricional é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente de alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer outras necessidades e tendo como base práticas promotoras de saúde, que respeitem a diversidade e a sustentabilidade social, econômica e ambiental. O direito humano à alimentação deve ser assegurado por meio de políticas e programas de se-

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* Renato Maluf, economista, é professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e preside o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

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gurança alimentar e nutricional, pois se trata de uma responsabilidade do Estado e de toda sociedade. Nesse contexto, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) é um bom exemplo, não só pela sua visibilidade, como pelo seu alcance e sua história. Maior programa de alimentação escolar gratuita do mundo, a merenda escolar, como é conhecida, foi instituída em 1955, sob inspiração do recifense Josué de Castro, médico, professor e sociólogo, que foi indicado duas vezes ao Prêmio Nobel da Paz pelos seus estudos e pesquisas sobre as causas da fome no Brasil e no mundo. O objetivo maior desse programa é o atendimento das necessidades nutricionais dos alunos durante sua estada em sala de aula, o que contribui para o crescimento, a aprendizagem e o rendimento escolar, além da formação de hábitos alimentares saudáveis. Apesar dos seus 53 anos de existência, o programa não possui uma legislação estabelecida, sendo sustentado por resoluções e portarias que precisam ser atualizadas, para que a alimentação escolar se consolide no campo da segurança alimentar e nutricional. A atualização da legislação do Pnae dará segurança jurídica às diretrizes já existentes, como o respeito aos hábitos alimentares regionais; o emprego da alimentação adequada e saudável; a descentralização de ações; a participação da comunidade no controle social; e o apoio ao desenvolvimento local sustentável. Por isso, nós do Consea instituímos um grupo de trabalho constituído por representantes do Governo Federal e de entidades da sociedade civil, do qual resultaram as proposições constantes do Projeto de Lei 2.877/08, encaminhado ao Congresso Nacional no início deste ano. O projeto, que tramita na Câmara dos Deputados, expressa diretrizes recolhidas nos processos de conferências e outros fóruns promovidos pelo

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com o objetivo de formar hábitos alimentares saudáveis entre os alunos atendidos. Por fim, o projeto quer evitar que a irresponsabilidade de maus gestores continue prejudicando os alunos. Hoje, a ausência de prestação de contas ou desvio de recursos implica a suspensão do repasse de recursos ao município, medida que acaba prejudicando os estudantes. Nesses casos, o projeto prevê a penalização dos maus gestores, mas os recursos serão repassados, por um prazo de 180 dias, diretamente às escolas - que poderão, emergen-

cialmente, adquirir os gêneros alimentícios sem licitação, mantidas as regras estabelecidas para execução do programa, inclusive quanto à prestação de contas. Agora, o projeto será avaliado pelo Congresso Nacional, que já mostrou sensibilidade para a temática, aprovando, há dois anos, a Lei de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan). Certamente, nossos parlamentares não se furtarão a mais este desafio. Afinal, segurança alimentar e nutricional não deve ser vista como obra de um governo, mas como política de estado.

Pnae: um processo histórico

conceito de segurança alimentar e nutricional (SAN), mais amplo, vem sendo construído ao longo dos anos. Até os dias atuais, vêm-se agregando várias dimensões, norteando a efetivação de suas diretrizes, como, por exemplo, a garantia desse direito no espaço escolar

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Consea. Entre outras medidas, ele prevê a ampliação da alimentação escolar para o ensino médio (antigo 2º grau), a compra de parte significativa dos alimentos diretamente da agricultura familiar e a punição dos maus gestores sem penalizar as crianças. Caso o projeto seja aprovado, mais de oito milhões de alunos serão incluídos no programa, que passará a ter um público de 44 milhões de pessoas. A oferta de alimentação diminui a evasão e a repetência, principalmente no período noturno, no qual muitos jovens vão do trabalho direto para a escola. A compra dos alimentos na própria região – especialmente aqueles produzidos pela agricultura familiar -, além de preservar tradições alimentares da comunidade, pode criar empregos, distribuir renda, dinamizar o comércio e a economia locais e transformar a realidade social. Ela se insere na perspectiva mais geral de aproximar a produção e o consumo de alimentos. Queremos que a educação alimentar seja incluída no processo de ensino e aprendizagem em nosso país, perpassando pelo currículo escolar, abordando as práticas saudáveis de vida, sob a perspectiva da segurança alimentar e nutricional. Os cardápios escolares devem ter gêneros alimentícios básicos, respeitando as referências nutricionais, os hábitos alimentares, a cultura e a tradição alimentar da localidade, a sustentabilidade e diversificação agrícola da região e a preferência aos alimentos consumíveis em estado natural. O projeto de lei prevê que pelo menos 30% dos recursos destinados ao Pnae deverão ser utilizados na aquisição de alimentos da agricultura familiar e do empreendedor familiar, priorizando assentamentos de reforma agrária, comunidades tradicionais indígenas e quilombolas. Pela nossa proposta, os estados e municípios e o Distrito Federal deverão promover a educação alimentar e nutricional, sanitária e ambiental nas escolas sob sua responsabilidade administrativa,

Luciana Siqueira*

Não basta ter comida. Iniciado em 1940 e, ainda hoje, com muitas imperfeições, o programa de alimentação escolar do Brasil é considerado um dos maiores na área de alimentação escolar do mundo e o único com atendimento universalizado. O * Luciana Siqueira, nutricionista, é técnica do Programa de Segurança Alimentar e Nutricional da Associação Vida Brasil (www.vidabrasil.org.br).

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O termo tem seu surgimento com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), quando se relaciona à capacidade do país de produzir sua alimentação, impedindo, assim, sua

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ALIMENTAÇÃO ESCOLAR

vulnerabilidade. Durante a I Conferência de Nacional de Alimentação e Nutrição, realizada em 1986, a Segurança Alimentar surgia como “a garantia, a todos, de acesso a alimentos básicos de qualidade, em quantidade suficiente, de modo permanente e sem comprometer o acesso a outras necessidades básicas, com base em práticas alimentares que possibilitem a saudável reprodução do organismo humano, contribuindo, assim, para uma existência digna”. O conceito foi consolidado na I Conferência Nacional de Segurança Alimentar, em 1994. A partir de então, as dimensões da alimentação e da nutrição passaram a estar bem definidas. A questão alimentar estaria relacionada aos processos de disponibilidade (produção, comercialização e acesso ao alimento) e a nutricional diria respeito à escolha, ao preparo e consumo alimentar e à sua relação com a saúde e com a utilização biológica do alimento. Com o preparatório para a Cúpula Mundial de Alimentação, em 1996, e a criação do Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional (FBSAN), em 1998, o termo “segurança alimentar e nutricional” ganha maior impulso. Com a realização da II Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em 2004, é consolidado o atual conceito que rege nossas ações na luta pelas desigualdades sociais, econômicas e outras questões em torno do tema. Portanto, a SAN é “a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômico e ambientalmente sustentáveis”. Após aquele momento, a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan) é aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República em 15

Comida na escola: um histórico Com a Constituição Federal de 1988, é assegurado o direito à alimentação escolar. Em 1994, dá-se início à descentralização por meio de convênios com estados e municípios e, então, inicia-se o controle através dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAEs), que são órgãos de deliberação, fiscalização e de assessoramento para a execução do programa. Em 1998, a Fundação de Assistência ao Estudante (FAE) é extinta, e o Pnae passa a ser gerido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Em 2000, a composição dos CAEs passa por reformulação. Princípios e diretrizes do PNAE - a eqüidade; - respeito aos hábitos alimentares; - emprego da alimentação saudável e adequado; - universalidade no atendimento; - descentralização das ações; - participação da comunidade no controle social; - apoio ao desenvolvimento local sustentável; - a educação alimentar e nutricional num processo de ensino-aprendizagem. de setembro de 2006. Tal instrumento possibilitaria a promoção e garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA). Com a Losan sancionada, conquistas começaram a concretizar-se. A partir do conceito do DHAA, a alimentação é mais do que assegurada como um direito humano, com intersetorialidade para que a SAN possa interagir, em sistema de colaboração com demais políticas públicas existentes e espaços de participação, formulação e controle social das políticas por intermédio das conferências e conselhos. O programa de alimentação escolar do Brasil é considerado um dos maiores na área de alimentação escolar do mundo e o único com atendimento universalizado. Tem início como campanha na década de 1940, quando o Instituto de Nutrição propôs ao governo federal que oferecesse alimentação escolar. Na década de 1950, o Plano Nacional de Alimentação e Nutrição abre precedentes para o programa que então se concretiza em âmbito nacional e sob responsabilidade pública. Em 1979, passou a denominar-se Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), um dos programas de

políticas públicas prioritários para a SAN. Tem como objetivo o suprimento mínimo de 15% das necessidades nutricionais durante o período de permanência do aluno na escola, possibilitando hábitos alimentares saudáveis e favorecendo a aprendizagem e o rendimento escolar. O programa de alimentação escolar deixa de ser, ao longo dos seus anos de criação, um programa meramente assistencialista com repasse de recurso para o cumprimento do direito inerente ao ser humano que é o direito à alimentação, sendo acompanhado pelos meios de controle social. Passa a ser compreendido como uma forma de favorecimento do desenvolvimento local através do fornecimento de alimentos pela agricultura familiar, fortalecendo-a, a partir destes ao programa. As políticas de SAN devem ser vistas como um recurso fundamental de inclusão social, pois estão além do acesso à renda. Para tanto, o Pnae, como política de Segurança Alimentar e Nutricional, deve favorecer o desenvolvimento social e possibilitar um aprendizado de exercício da cidadania.

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GESTÃO ESCOLAR

Administrar: função de professor? Banco de Imagens

Marco Antônio Ferraz*

“Não é por acaso que Drucker advoga que a escola terá de sofrer uma mudança radical nos métodos e processos de aprendizagem e nos conteúdos que ensina. Acrescento que não é possível desvincular currículo e pedagogia de políticas e administração. Por isso, para mudar a escola, direi que também é preciso mudar a sua organização e o modo como ela é pensada e gerida.” (Isabel Alacão – “Escola Reflexiva e Nova Racionalidade”) Faz pouco tempo que conceitos como gestão, governança e liderança passaram a povoar o universo da administração escolar. Isso se deve ao fato de escola, hoje, precisar de mudanças, e a atuação dos seus dirigentes não atender às novas demandas das instituições. Foi-se, então, buscar na administração de empresas novos conceitos que trouxessem modelos, experiência e resultados para aquelas atuações. Até aí nada ruim, não fosse a resistência que nós educadores temos de outras profissões. Mesmo assim, a invasão foi feita. Agora, por que a qualidade da gestão passou a ser fundamental para a escola? Recentemente, um estudo do professor Naércio Menezes Filho (USP e Ibmec) ajuda a esclarecer essa questão: o que explica o fato de os alunos terem tido o mesmo desempenho, apesar da expressiva diferença no volume de recursos destinados ao setor educacional entre os municípios por ele analisados com base nos números do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e da Prova Brasil? A resposta, segundo Menezes, está na qualidade da gestão escolar. Por ter uma gestão eficiente, muitos municípios, mesmo com pouco gasto, obtiveram mais retorno em seus investimentos no setor educacional do que municípios que gastam mais, mas têm escolas mal

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GESTÃO ESCOLAR

geridas. A conclusão do estudo é que o desempenho escolar não é determinado apenas pelo orçamento, mas, principalmente, pela eficiência na administração da rede escolar. Segundo Menezes, “é claro que dinheiro é importante, mas diferenças na forma de alocá-lo são fundamentais para explicar melhores resultados do que a simples quantidade de recursos”. “A partir de outros relatórios tínhamos esse indicativo de que o gasto não influenciava diretamente o desempenho. O que esse cruzamento agora faz é reforçar o conceito de que um dos grandes problemas da educação é a falta de gestão”, relata. A mesma opinião é compartilhada por vários pesquisadores da educação. Segundo eles, enquanto não houver uma definitiva profissionalização na gestão escolar, o País não conseguirá promover a revolução educacional . Aqui se encontra o primeiro nó górdio: a profissionalização da profissão de gestor escolar, nas suas diversas modalidades. Vale ressaltar, então, que a gestão não é um cargo na carreira do magistério escolar, mas uma profissão que exige formação e desenvolvimento de competência: “saber fazer bem o dever”. “Nas dimensões técnica (conteúdos conceituais, comportamentais e atitudinais); estética (sensibilidade e orientação criadora); política (participação na construção coletiva e exercício de direitos e deveres); e ética (orientação da ação, fundamentada no respeito e na solidariedade, para o bem comum)” . Será que um bom professor é um bom Gestor? Nem sempre. Aliás, não existe condição de causa e efeito entre essas duas funções. O que existe é uma condição de pressupostos relacionais. Ser educador é condição necessária para o exercício da gestão escolar, mas certamente essa condição não é suficiente para ser Gestor. Falta-nos ferramental técnico, como gestores, para que possamos

exercer essa função com a qualidade que nos realize como trabalhadores na educação e que colabore com a transformação que a sociedade exige na escola. É comum debitar-se ao professor, em sala de aula, todo o ônus da transformação escolar – esquecendo ou omitindo a responsabilidade do Gestor que, como administrador, tem obrigação de planejar, organizar, executar, controlar e avaliar, com projetos e planos, a administração da escola. Afinal, administrar é “a realização de uma função sob o comando de outra pessoa” ou, ainda, a “administração é a utilização de recursos humanos e materiais, de maneira racional para a realização de determinados fins” . A mudança que vem da sala de aula para os demais ambientes escolares é uma “revolução”. A mudança irradiada da sala da direção para a sala de aula é uma “transformação”. A qualidade da gestão exige o conhecimento, opção e fixação de metas e objetivos claros a serem atingidos por todos e todas na escola: formação de uma equipe competente e compromissada com aquelas metas e objetivos; criação, desenvolvimento e implantação de métodos, processos e obtenção de recursos que viabilizem o que foi pretendido; articulação política e liderança; e criação de um ambiente que mobilize o conjunto da escola. Tudo isso é papel do Gestor. E a qualidade dos processos educativos? Esta é aquela prevista e descrita no projeto da escola, cujo guardião maior também é o gestor. Como afirma a proposta do MEC sobre Qualidade na Escola: “quem pode definir bem e dar vida às orientações gerais sobre qualidade na escola, de acordo com os contextos socioculturais locais, é a própria comunidade escolar. Não existe um padrão ou uma receita única para uma escola de qualidade. Qualidade é um conceito dinâ-

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* Marco Antônio Ferraz, educador, é palestrante e assessor de escolas e redes públicas (marco@prof.com.br).

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mico, reconstruído constantemente. Cada escola tem autonomia para refletir, propor e agir na busca da qualidade da educação” . Agora, será o gestor de escola pública diferente em formação, competência profissional e atuação daquele da escola privada? Claro que não. Assim como o médico de um hospital público deve ter os mesmos compromissos dos de um médico de um hospital particular. A tarefa da escola é a humanização através do ensino. Além disso, seu papel social é, através do encontro de gerações e do cuidado, propiciar intencional e sistematicamente a aprendizagem crítica, criativa, significativa e duradoura dos elementos essenciais da cultura . Desta forma, poderá favorecer o desenvolvimento humano pleno de todos, não só de seus alunos, mas também professores, equipe escolar, pais, comunidade. Nesta medida, todo ensino deve ser público, seja a mantenedora pública ou privada, articulando este projeto maior com práticas curriculares libertadoras . Finalmente, só teremos uma gestão escolar de qualidade se abandonarmos vícios, confortos, ranços, temores e preconceitos, partindo para um debate amplo, uma análise profunda e uma vontade política determinados a encontrar uma nova formação e papel do gestor educador. AÇÃO EDUCATIVA; UNICEF; PNUD; INEP; e MEC (coord.). Indicadores da qualidade na educação. São Paulo: Ação Educativa, 2007, 3. ed. ampl. ALARCÃO, Isabel (org.). Escola Reflexiva e Nova Racionalidade. Rio Grande do Sul: Artmed, 2001. RIOS, Terezinha Azerêdo. Compreender e Ensinar: por uma docência da melhor qualidade. São Paulo: Cortez Editora, 2001. FILHO, Geraldo Francisco. A administração escolar analisada no processo histórico. São Paulo: Editora Alínea, 2006. VASCONCELLOS, Celso. Projeto político Pedagógico e Proposta Curricular. In: Revista Aprendizagem, ano 2, n. 5, 2008. Bimestral.

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EDUCOMUNICAÇÃO

Rádio-escola Uma proposta dialógica de ensino Alessandra Oliveira Araújo*

O desenvolvimento de espaços comunicativos que permitam uma maior participação dos estudantes com o objetivo de formar cidadãos críticos aparece como uma das soluções apontadas para alguns problemas educacionais por professores e pesquisadores de educomunicação. As relações entre os vários tipos de saberes que se fundem na educação e na comunicação constituem os principais objetivos da educomunicação, que se caracteriza não pelo interesse em respostas supostamente definitivas para os problemas que diariamente se nos apresentam, mas pelo aguçamento das contradições. Uma proposta baseada nesse princípio vem sendo construída em várias instituições de educação formal e não formal no Ceará: a instalação de rádios-escola por meio do projeto “Segura essa Onda: Rádio-escola na Gestão Sóciocultural da Aprendizagem”, desenvolvido pela ONG Catavento Comunicação e Educação

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Divulgação

EDUCOMUNICAÇÃO

Adolescentes gravam uma enquete sobre suas expectativas para a nova fase do projeto em abril de 2008

Os espaços educativos poderiam constituir ambientes privilegiados de troca de saberes e construção de reflexões e práticas transformadoras, mas, em muitos desses espaços, principalmente os de educação formal, a palavra ainda é privilégio dos educadores. Os estudantes, muitas vezes, não encontram um ambiente dialógico em que possam comunicar suas idéias e participar do ato de aprender e ensinar, mutuamente.

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Um dos problemas mais debatidos, quando se fala em escola, é o distanciamento entre os conteúdos escolares e o cotidiano dos educandos, o que acarreta, como uma das conseqüências, o desinteresse pelos processos educacionais desenvolvidos nessas instituições. Acreditamos que um dos principais motivos desse distanciamento é a falta de espaços comunicativos, que permitiriam uma maior participação dos educandos.

Entendemos que a sala de aula não é o único espaço de aprendizagem dos sujeitos e que os meios de comunicação de massa vêm tomando uma dimensão fundamental na formação de crianças, adolescentes e jovens. É importante que a escola esteja aberta para as transformações da sociedade e comece um diálogo com os meios de comunicação de massa, já que eles fazem parte da vida dos estudantes, mas a utilização da tecnologia nem sempre está relacionada com uma concepção de ensino dialógica. Por isso, é importante que exista uma reflexão sobre as práticas que estão sendo desenvolvidas e que sejam apontados caminhos para uma utilização dos meios de comunicação na escola que venham, realmente, a estabelecer um diálogo entre a educação e a comunicação, que permita a inserção do cotidiano, para que sejam criados ambientes comunicativos de troca e construção de visões de mundo. Uma proposta que vem sendo desenvolvida em várias instituições de ensino escolar e não-escolar, em Fortaleza e outras localidades do semi-árido cearense, é a implantação de rádios em circuito interno, por meio do projeto “Segura essa Onda: Rádio-escola na Gestão Sócio-cultural da Aprendizagem”, desenvolvido pela ONG Catavento Comunicação e Educação. Durante o projeto, são realizadas oficinas de rádio-escola com conteúdos como as técnicas radiofônicas, a comunicação como direito e necessidade humana e a leitura crítica dos meios de comunicação de massa. Logo no início da formação, é instalada uma rádio em circuito interno – com caixas de som espalhadas pelo pátio, corredores e salas, microfones, aparelho de som com CD e duplo-deck e um amplificador – que veicula os programas produzidos pelos participantes durante as oficinas.

(1) SOARES, Donizete. Educomunicação: o que é isto? Disponível em: <http://www.portalgens.com.br/>. Acesso em: 12 jun. 2008.

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Paulo Freire falava que toda reflexão crítica gera uma ação crítica. Dessa forma, ao perceber seu contexto, os sujeitos estão construindo uma nova forma de atuação na escola. Os meios de comunicação nas escolas podem potencializar uma concepção de educação pautada pela construção de um conhecimento problematizado pelo mundo, mas é necessário que educandos e educadores estejam abertos para essa transformação. Uma educação contextualizada e problematizadora vai gerar uma demanda por participação para acolher a instituição de ensino precisaria estar preparada. Ou seja, a compreensão de que somos livres para construir nossas experiências, mesmo que condicio-

nados pelo meio em que estamos inseridos, gera uma responsabilidade de não mais agir como espectador. A participação aqui é encarada como processo de escolha, mas também como um desafio em que fica difícil negar a transformação. Referências FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido, 13. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983. __________. Extensão ou comunicação? São Paulo: Paz e Terra, 1992. GOHN, Maria da Glória. O Protagonismo da Sociedade Civil: movimentos sociais, ONGs e redes solidárias. São Paulo: Cortez, 2005. MARTÍN-BARBERO, Jesus. La Educación desde de la Comunicación. Buenos Aires: Grupo Editorial Norma, 2002. SOARES, Magda. Linguagem e Escola: uma perspectiva social. 2. ed. São Paulo: Ática, 1986. Divulgação

A experiência de rádio-escola tem como princípios a construção de conhecimentos a partir do contexto e a democratização da comunicação como uma ruptura dos silêncios nas instituições de ensino. Mas a transformação da concepção de ensino precisa passar por todo processo educacional. É necessário construir uma educação dialógica, significativa e baseada no contexto dos educandos, tanto na rádioescola, como nos outros ambientes de aprendizagem. A rádio-escola pode potencializar essa transformação, tornar o processo de aprendizagem mais dialógico. A própria produção dos programas exige uma abertura dos educadores e núcleo gestor que poderá ser questionado pelos educandos ao produzirem programas sobre a escola e o ensino. Como os assuntos que motivam as produções geralmente são pautados pelo contexto, os problemas dos ambientes educacionais; a relação educador/educando; e sugestões de mudanças nesses ambientes são possíveis temáticas a serem debatidas durante a programação. As temáticas escolhidas possuem uma relação com suas vidas, com seus contextos, e o reconhecimento de sua realidade é o primeiro passo para a sua reconstrução. É a partir de uma leitura crítica de seu próprio contexto que se torna possível refletir sobre o mundo, fazendo paralelos e percebendo as semelhanças e diferenças entre seu contexto e os outros. Questões como a qualidade da merenda, os brinquedos quebrados, a indisciplina de alguns colegas e, também, a necessidade de espaços de participação são abordadas em diversos programas. O que demonstra o interesse em participar, em serem ouvidos. Ao reconhecer sua realidade, os sujeitos têm a possibilidade de perceber seu contexto criticamente, podendo, assim, transformá-lo.

Gutembergue e Joseane gravam o programa Na Boca do Trombone, sobre os problemas da instituição de ensino que participam, em 2006

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EDUCAÇÃO EM NOTÍCIAS

Representantes das secretarias, dos conselhos estaduais e municipais de educação, de universidades, do Ministério Público e do Ministério da Educação encontraram-se, nos dias 4 e 5 de junho, em Aracaju (SE), para discutir a aplicação da Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que incluiu a temática étnico-histórica no currículo da educação básica. O evento encerrou a série de seis diálogos regionais promovida pela Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do MEC (Secad) para coletar informações dos sistemas de ensino e da sociedade sobre a aplicação da lei. Agora, o MEC vai reunir um grupo de trabalho interministerial para apresentar os dados colhidos nos seis diálogos regionais e produzir um documento, que será a base do encontro nacional sobre a aplicação da lei, programado para o começo de julho, em Brasília (DF). Autoridades federais encontramse com os 250 delegados escolhidos durante os diálogos. Do encontro nacional, sai um plano de ampliação da implementação da lei, que deve vigorar até 2015. Para saber mais sobre o tema, confira, nesta edição, um artigo do professor doutor Henrique Cunha Jr., da Universidade Federal do Ceará (UFC).

do DF. Segundo ele, em 2008, a agenda do conselho nacional prevê discussões também com a Secretaria de Educação Básica do MEC, que é responsável pelas políticas da área, e com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), instituição gestora dos recursos. Criado em 2008, o Conselho Nacional de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb foi empossado em abril. É composto por 14 membros, que representam pais, alunos, instituições ligadas à educação e o governo federal. O controle social dos recursos do Fundeb é feito por conselhos municipais, estaduais e pelo nacional. A fiscalização da correta aplicação das verbas é de responsabilidade do Ministério Público e dos tribunais de contas.

Programas recebem recursos de R$ 183 milhões

Estados e municípios já podem dispor dos recursos de R$ 183 milhões referentes aos programas de Alimentação Escolar (Pnae), Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e de Apoio ao Transporte Escolar (Pnate). A liberação, referente a maio e junho, foi feita pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE/MEC). Para o Pnae foram R$ 151,7 milhões, destinados ao atendimento a alunos matriculados em creches, pré-escolas e ensino fundamenta e a estudantes residentes em áreas remanescentes de quilombos e aldeias indígenas. De acordo com o MEC, 36 milhões de alunos da rede pública são beneficiados. Teotonio Roque (Zoon)

Conteúdo étnico-histórico é tema de encontros regionais

Encontro debate controle social do Fundeb

O Conselho Nacional de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) realiza, no início do segundo semestre, um encontro com os conselhos dos 26 estados e do Distrito Federal para discutir formas de colaboração entre as duas instâncias. O Ministério Público e os tribunais de contas de todas as unidades da Federação também serão convidados. De acordo com o presidente do conselho, Antônio César Callegari, a reunião pretende iniciar a construção de um regime de colaboração entre o conselho nacional e os conselhos dos estados e

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O Pnae conta, este ano, com orçamento de R$ 1,6 bilhão, a ser transferido em dez parcelas, até novembro. Desse valor, já foram repassados R$ 578,1 milhões, referentes a quatro parcelas. Quanto ao Pnate, o FNDE transferiu a prefeituras e secretarias estaduais de Educação R$ 28,9 milhões, correspondentes à terceira de nove parcelas. O programa dispõe de R$ 401 milhões para atender 3,4 milhões de estudantes da rede pública do ensino fundamental em 5.505 municípios. O FNDE dispõe de R$ 944,9 milhões para o PDDE atender 131.710 escolas (27,6 milhões de estudantes). Os recursos podem ser destinados, por exemplo, à implementação do Plano de Desenvolvimento da Escola (PDE-Escola), ao programa Escola Aberta e à promoção da educação integral.

MEC autoriza adaptações em livros didáticos

Livros didáticos distribuídos às escolas públicas em 2009 já vão poder estar adaptados às novas regras ortográficas previstas em acordo entre o Brasil e outros países de língua portuguesa. A reforma prevê, por exemplo, a extinção do trema e de acentos em palavras como “vôo”, “herói”, “idéia” e “assembléia”. A permissão foi autorizada no início do mês de maio, de acordo com uma resolução publicada pelo Ministério da Educação no Diário Oficial da União. O MEC também começou a discutir um calendário para a implantação das novas regras. O cronograma deve ser definido até julho. Segundo o MEC,a adaptação à nova ortografia já em 2009 não é obrigatória; a resolução apenas dá essa possibilidade às editoras.

Pesquisa diz que 45% não são leitores

No último mês de maio, foi apresentada a segunda edição da pesquisa Retratos da Leitura do Brasil, durante um seminário realizado em Brasília (DF). A pesquisa constatou que 55% da população são leitores, enquanto 45% podem ser classificados como não-leitores. Os dados apontaram também que o brasileiro lê, em média, 4,7 livros por ano.

O método adotado para definir o leitor ou não-leitor foi a declaração do entrevistado de ter lido pelo menos um livro nos últimos três meses. O estudo foi aplicado em 5.012 pessoas em 311 municípios de todo o país de 29 de novembro a 14 de dezembro de 2007. A pesquisa foi encomendada pelo Instituto Pró-Livro e executada pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (Ibope), com a coordenação do Observatório do Livro e da Leitura (OLL). A primeira edição da pesquisa foi produzida entre 2000 e 2001 em 44 municípios brasileiros. Na época, o estudo constatou que 49% da população eram consideradas leitores.

de 30 estudantes), intenção que, segundo ele, já teria recursos garantidos por compromisso do presidente Lula. A troca das metas de universalização que estabeleceu para as operadoras de telefonia fixa a obrigação de conectar as escolas (em vez de instalar os Postos de Serviços Telefônicos) toda a rede pública urbana deve ter banda larga até 2010. O Gesac-Governo Eletrônico, Serviços de Apoio ao Cidadão, do Ministério das Comunicações, vai atender mais 7 mil escolas. Com isso, afirma o secretário, espera-se que o Brasil chegue a 2010 com pelo menos 82% dos alunos da rede pública podendo estudar com acesso à internet.

Educação do campo será debatido em Brasília

Escolas indígenas recebem livros

A educação do campo será tema de debates na Universidade de Brasília (UnB), de 6 a 8 de agosto, durante o 2º Encontro Nacional de Pesquisa em Educação do Campo e o 2º Seminário sobre Educação Superior e as Políticas para o Desenvolvimento do Campo Brasileiro. Um dos objetivos é estimular a articulação entre pesquisadores e criar grupos de estudos e linhas de pesquisa em apoio à produção e à socialização de conhecimentos sobre a educação e demais questões relativas ao campo. Os dois eventos vão abordar cinco círculos de produção do conhecimento (CPC) - educação do campo e desenvolvimento; formação e trabalho docente nas escolas do campo; políticas de educação superior no campo; educação do campo, movimentos sociais e políticas públicas; políticas de educação profissional no campo.

Rede pública deve ter banda larga até 2010

O Proinfo conta, atualmente, com 20 mil laboratórios de informática instalados (todas as 14 mil escolas de ensino médio, mais algumas de 5ª a 8ª série); e a intenção é encerrar 2008 com 52 mil. Segundo Carlos Bielchowsky, secretário de Ensino à Distância do MEC, a meta é chegar a 2010 com 135 mil laboratórios (total que cobre todas as 55 mil escolas urbanas, mais todas as rurais com mais

“Ter dentes bons para cantar e tocar flautas. Ter saúde para dançar. Ter saúde para estudar...” Este é um trecho do Livro de Saúde Bucal criado por professores ticunas, habitantes das aldeias do Alto Solimões, no Amazonas, para ensinar os alunos como e por que cuidar dos dentes. A obra integra uma série de 42 livros produzidos por professores nos cursos de formação, que serão distribuídos pelo MEC nas escolas. A primeira remessa tem 17 livros que serão entregues em junho e julho em escolas públicas dos povos Calapalo, Nahukua, Matipu, Mebengocre, Panará, Cuicuro (aldeias de Mato Grosso), Ianomâmi, Baré, Ticuna (Amazonas), Uajapi (Amapá), Trucá (Pernambuco) e Caapor (Maranhão). As outras obras estão em fase de produção com entrega prevista para o segundo semestre. Os livros - em línguas maternas, português ou bilíngüe - abordam diferentes temas, entre eles, mitologia, lendas, histórias, meio ambiente, literatura, matemática, atividade econômica, modelos de construção de casa, calendários. De acordo com a coordenadora da Comissão Nacional de Apoio à Produção de Material Didático Indígena (Capema), Márcia Blanck, os livros valorizam a cultura, a identidade e as línguas indígenas, conforme o determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).

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SOCIEDADE CIVIL

Uma rede pelo direito à educação Divulgação

Idevaldo Bodião*

Precursora no acompanhamento de políticas públicas, a Comissão de Defesa do Direito à Educação é um fórum de setores organizados da sociedade que há dez anos se propõe a realizar o controle social da política pública de educação em Fortaleza (CE). Constituída por diversos setores sociais, a comissão reivindica a universalização do acesso à escola, a igualdade de condições para permanência e qualidade do ensino, promovendo melhor aprendizagem, auto-estima, socialização e perspectivas para crianças e adolescentes. Foram experiências como essa que fomentaram a constituição da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, lançada em 1999 por um grupo de organizações da sociedade civil com o desafio de so-

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mar diferentes forças políticas pela efetivação dos direitos educacionais garantidos por lei. A campanha é uma rede social que articula mais de 200 entidades de todo o Brasil, incluindo sindicatos, movimentos sociais, ONGs, universidades e grupos diversos em defesa de uma educação pública de qualidade. É a articulação mais plural e ampla no campo da Educação Básica no país. Com este artigo, de um professor universitário com forte atuação nos movimentos ligados à educação, a revista Vida e Educação dá início ao imprescindível debate sobre a participação popular organizada visando ao controle social das políticas públicas. Inicialmente, o pensamento é articular pensamentos em torno de um “Observatório da Educação”.

Parece correto afirmar que as primeiras sementes, que iriam gerar a Comissão de Defesa do Direito à Educação, foram lançadas pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (CedecaCeará), através do programa “Educação faça valer esse direito”. Em meados da década de 1990, o Cedeca, utilizando estratégias de mobilização social, fazia o levantamento das crianças em idade escolar e acompanhava os processos de matrículas, como forma de lhes garantir o acesso às escolas públicas. Tais movimentações fundamentavam-se, juridicamente, tanto na Constituição Federal (artigos 205 e 208) quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente (artigos 53 e 54), que reconhecem a educação como direito, ao mesmo tempo em que instituem o ensino fundamental como um “direito público subjetivo”. Em 1998, durante a realização do seminário “Educação no Município de Fortaleza: Desafios e Perspectivas”, uma iniciativa da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (FacedUFC), que envolveu executivo, legislativo e setores organizados da sociedade civil. Nesse momento, evidenciaram-se a pertinência e a relevância de se formalizar uma articulação de instituições que pudesse fiscalizar encaminhamentos das políticas públicas de educação. Nascia, assim, a Comissão Interinstitucional de Acompanhamento da Matrícula Única, composta pela Comissão de Educação da Câmara Municipal de Fortaleza, pelo Cedeca e pelo Ministério Público Estadual, através do Centro de Apoio Operacional às Promotorias da Infância e Juventude. Ao núcleo inicial, foram-se juntando sindicatos, mandatos de parlamentares, instituições de governo e organizações não-governamentais; as ações davam-se, principalmente, durante os procedimentos das matrículas escolares. Desde os seus primeiros movimentos, as ações da comissão estiveram

* Idevaldo da Silva Bodião tem doutorado em Educação (Didática) pela Universidade de São Paulo (USP). É professor titular da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará (UFC) e, em 2005, esteve à frente da Secretária Municipal de Educação e Assistência Social de Fortaleza (Sedas).

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estruturadas em torno de quatro estratégias: a mobilização social, a articulação institucional, a intervenção na mídia e a defesa jurídica. Procurava-se, dessa forma, garantir capilaridade na constituição de uma rede de acolhimento de denúncias quanto ao descumprimento dos preceitos constitucionais, apoios institucionais que pudessem fortalecer os diálogos com os gestores, divulgações amplas das denúncias recebidas e seus respectivos encaminhamentos e uma forma jurídico-legal de garantir a devida aplicação da lei. A presença constante dos integrantes da comissão nas escolas permitiulhes constatar um quadro de instalações precárias, de falta de materiais pedagógicos e de instáveis relações profissionais, o que lhes possibilitava identificar, in loco, algumas das possíveis causas dos resultados, recorrentemente ruins, de avaliações oficiais, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e o Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica (Spaece), por exemplo. Começava a tomar corpo a compreensão de que as crianças iam à escola, mas não aprendiam; tal percepção se cristalizou nas atividades do planejamento anual de 2001, com a conclusão que se estava garantindo, às crianças e adolescentes, o acesso às escolas, que havia um conjunto de medidas educacionais e organizacionais que favorecia suas permanências nos estabelecimentos escolares, mas, mesmo assim, estes não eram capazes de ler e produzir textos básicos em Língua Portuguesa, e apresentavam enormes dificuldades ao realizar operações matemáticas elementares. Essa compreensão levou a uma ampliação do seu leque de atuações, o que foi acompanhado por uma nova forma de se identificar: Comissão Interinstitucional de Defesa do Direito à Educação de Qualidade Social. A partir de então, além de manter o acompanhamento dos processos de matrículas, a “Comissão”, com nova identidade, passou a fazer o monitoramento da qualidade das instalações, bem como das condições de funcionamento dos estabelecimentos públicos de educação, editando relatórios anuais, que eram encaminhados às autoridades pertinentes e aos órgãos de imprensa.

Uma decorrência imediata desses trabalhos foi um parecer 046/2002, do Conselho de Educação do Ceará (CEC), que, reconhecendo a pertinência das denuncias apresentadas no relatório encaminhado em abril de 2001, propôs parâmetros para a transformação dos “anexos ” em escolas dignas. A divulgação regular desses relatórios, bem como sua repercussão na mídia local, constituíram-se em forte elemento de pressão social que permitiram uma redução substantiva da precariedade desses estabelecimentos, que chegaram à surpreendente marca de 270 unidades, em 2002. Novos horizontes nas conjunturas nacional e local, levaram a “Comissão”, a partir de 2005, a concentrar suas ações nas reivindicações pela garantia dos direitos de crianças de 1 a 3 anos de idade e de alunos portadores de necessidades especiais; pleiteavam-se acolhimentos nas escolas regulares, para estes, e atendimentos em creches públicas, para aqueles. Durante o processo de construção do Plano Municipal de Educação de Fortaleza (2006/2007), a Comissão de Defesa do Direito à Educação desempenhou importante papel, tendo sido eleita para compor o colegiado que presidiu a sua elaboração. Preparando sua participação nesses trabalhos, a “Comissão” incorporou mais uma frente de atuação, criando mecanismos de qualificação tanto dos seus quadros específicos, quanto de participantes oriundos dos movimentos sociais, através das “Jornadas pela Educação”, uma intervenção em parceria com a Faculdade de Educação da UFC, que foi estendida para seis pontos distintos da cidade. Neste primeiro semestre de 2008, iniciaram-se rodadas de conversas com a Secretaria Municipal de Educação de Fortaleza e a Secretaria de Educação Básica do Ceará, tendo em vista a discussão do financiamento da educação na cidade, o que deve questionar o processo de municipalização das escolas de ensino fundamental, como a estratégia mais adequada, dentro do regime de colaboração, para o atendimento dos direitos das crianças e adolescentes matriculadas nas escolas públicas; na pauta, uma definição mais justa das responsabilidades

(1) Transformar as escolas “comunitárias” e de “co-gestão” em “anexos às escolas patrimoniais” foi a forma encontrada pelos gestores de então para garantir-lhes a contabilidade dessas matrículas na divisão dos recursos do Fundef.

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de municípios, estados e do governo federal, no que diz respeito aos gastos com educação básica. Em Fortaleza, raríssimas são as intervenções em favor da educação de qualidade que não tiveram a participação importante da Comissão de Defesa do Direito à Educação, um fato louvável em 10 anos de história. Com firmeza e, ao mesmo tempo, com bastante sensibilidade, a comissão soube se manter na linha de frente das lutas pela efetivação do direito à educação, desde os primeiros embates pela garantia das matrículas. A atuação evoluiu com o monitoramento da qualidade dos equipamentos públicos e das suas condições de funcionamento, ampliando-os nas participações na elaboração do Plano Municipal de Educação e nas discussões do modelo de financiamento da escola pública. Fiel aos seus princípios, mesmo em momentos, como os atuais, em que composições de largo espectro têm gerado homogêneas unanimidades que asfixiam a vitalidade dos movimentos sociais, a “Comissão” conseguiu, sempre, atualizar demandas que, ampliando-se ao longo do tempo, têm ajudado a majorar a compreensão dos patamares de exigibilidade da educação, como um direito. Ainda que boa parte das conquistas educacionais, na cidade, nesta última década, tenham-se dado em função de pressões e intervenções da Comissão de Defesa do Direito à Educação, ela continua se constituindo em exemplo único no Ceará. Por isso, parece-me oportuno estimular setores organizados da sociedade civil a se articularem em importantes cidades cearenses, como, por exemplo, Maracanaú e Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza, além de Juazeiro do Norte e Crato (região Sul do Ceará), e de Quixadá (Sertão Central), Iguatu (Centro-sul) e Sobral (Norte). Essa seria uma forma de potencializar as reivindicações pela efetivação do direito à educação. Não se trata de imaginar que possam repetir os passos que aqui foram dados, mas de reconhecer que a constituição de redes de atuações, ao mesmo tempo em que minimiza as responsabilidades de cada componente individualmente, empresta substantivo vigor à intervenção coletiva.

(2) A partir de 2002, comissão passou a ser identificada dessa forma.

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OPINIÃO

O papel da educação na erradicação do trabalho infantil A Organização Internacional do Trabalho escolheu a educação como tema da campanha mundial de erradicação do trabalho infantil deste ano. No Brasil, o tema ensejou importantes debates nas escolas e universidades, como parte das atividades alusivas ao dia mundial e nacional de combate ao trabalho infantil. No Ceará, mais de cem municípios participaram das atividades, debatendo as causas e conseqüências desse grave problema social em sala de aula. Com isso, professores e alunos deram um importante passo para a erradicação do trabalho infantil. Este engajamento é de suma importância, pois os educadores são os profissionais que possuem as melhores condições de identificar os casos de trabalho infantil: na maioria das vezes o trabalho precoce é a principal causa do baixo rendimento ou do abandono escolar, principalmente entre os adolescentes. Todos os anos, milhares de adolescentes buscam uma oportunidade de trabalho, principalmente nos meses de novembro e dezembro, quando surgem muitas vagas no mercado. Crentes de que arranjaram o tão sonhado emprego, muitos deixam de freqüentar a escola antes mesmo das provas finais. Na maioria das vezes, o emprego é temporário e exige jornada incompatível com a freqüência escolar. Em janeiro, junto com o desemprego, vem o arrependimento por ter perdido o ano letivo. Alguns ainda retornam à escola e conseguem recuperar o tempo perdido, porém, outros ficam desmotivados e abandonam de vez os estudos. Prejuízo certo para a vida profissio-

Antonio de Oliveira Lima é procurador do Trabalho, coordenador regional e vice-coordenador nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente.

nal: as pesquisam mostram que quanto mais precoce é a entrada no mercado de trabalho, menor é a renda média obtida ao longo da vida adulta. Devemos lutar para que as crianças nunca abandonem a escola e que os adolescentes possam conciliar o trabalho com os estudos, como determina a lei, seja como aprendiz, a partir do quatorze

anos, ou como empregado, a partir dos 16 anos, nas atividades permitidas. Quanto aos que abandonaram a escola, o desafio será ainda maior: fazer com que retornem, preenchendo, o mais rápido possível, as cadeiras vazias das salas de aula. Para essa importante missão, esperamos contar com a valorosa colaboração dos profissionais da educação.

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