Revista Viração - Edição 105 - Abril/2014

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Filipe Campos

quem faz a vira pelo brasil

Equipe da Viração Educomunicação durante planejamento institucional, de 7 a 9 de março, em São Paulo

Conheça os Virajovens em 20 Estados brasileiros e no Distrito Federal: Aracaju (SE) Belém (PA) Boa Vista (RR) Boituva (SP) Brasília (DF) Campo Grande (MS) Curitiba (PR) Fortaleza (CE) João Pessoa (PB) Lavras (MG) Lima Duarte (MG) Macapá (AP) Maceió (AL) Manaus (AM) Natal (RN) Picuí (PB) Pinheiros (ES) Porto Alegre (RS) Recife (PE) Rio Branco (AC) Rio de Janeiro (RJ) Salvador (BA) S. Gabriel da Cachoeira (AM) São Luís (MA) São Paulo (SP) Sud Mennucci (SP) Vitória (ES)

Auçuba Comunicação e Educomunicação – Recife (PE) • Avalanche Missões Urbanas Underground – Vitória (ES) • Buxé Fixe - Amadora (Portugal) • Casa Peque Davi – João Pessoa (PB) • Catavento Comunicação e Educação – Fortaleza (CE) • Cipó Comunicação Iterativa – Salvador (BA) • Ciranda – Central de Notícia dos Direitos da Infância e Adolescência – Curitiba (PR) • Coletivo Jovem – Movimento Nossa São Luís – São Luís (MA) • Gira Solidário – Campo Grande (MS) • Grupo Conectados de Comunicação Alternativa GCCA – Fortaleza (CE) • Grupo Makunaima Protagonismo Juvenil – Boa Vista (RR) • Instituto de Desenvolvimento, Educação e Cultura da Amazônia – Manaus (AM) • Instituto Universidade Popular – Belém (PA) • Mídia Periférica – Salvador (BA) • Instituto Candeia de Cidadania – Lima Duarte (MG) • Jornal O Cidadão – Rio de Janeiro (RJ) • Lunos – Boituva (SP) • Movimento de Intercâmbio de Adolescentes de Lavras – Lavras (MG) • Oi Kabum – Rio de Janeiro (RJ) • Projeto de Extensão Vir-a-Vila (UFRN) - Natal (RN) • Projeto Juventude, Educação e Comunicação Alternativa – Maceió (AL) • Rejupe • União da Juventude Socialista – Rio Branco (AC)


Copie sem moderação! Você pode: • Copiar e distribuir • Criar obras derivadas Basta dar o crédito para a Vira!

editorial quem somos

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Mais do que divertimento

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ogar faz parte da cultura humana e das formas de interagir com outras pessoas e com o meio ambiente. Presentes no mundo físico e virtual, os jogos atraem por seus formatos criativos e inovadores e, ao contrário do que alguns especialistas mais conservadores afirmam, os jogos, sejam eles de tabuleiro ou os videogames, são importantes instrumentos de socialização e aprendizado, pois estimulam a criatividade e simulam situações-problemas, auxiliando na formação de crianças, adolescentes e (por que não?) de adultos. É sobre o universo lúdico dos jogos que trata a reportagem de capa desta edição. Com a leitura do texto, você vai perceber que os jogos são mais do que um passatempo e abrem diversos horizontes, inclusive profissionais. Nesta edição, você também confere uma matéria sobre um coletivo de jovens poetas de Natal e fica sabendo como crianças e adolescentes se apropriam da tecnologia de modo empreendedor. Boa leitura!

Viração é uma organização não governamental (ONG) de educomunicação, sem fins lucrativos, criada em março de 2003. Recebe apoio institucional do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), do Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo e da ANDI - Comunicação e Direitos. Além de produzir a revista, oferece cursos e oficinas em comunicação popular feita para jovens, por jovens e com jovens em escolas, grupos e comunidades em todo o Brasil. Para a produção da revista impressa e eletrônica, contamos com a participação dos conselhos editoriais jovens de 20 Estados, que reúnem representantes de escolas públicas e particulares, projetos e movimentos sociais. Entre os prêmios conquistados nesses dez anos, estão Prêmio Don Mario Pasini Comunicatore, em Roma (Itália), o Prêmio Cidadania Mundial, concedido pela Comunidade Bahá’í. E mais: no ranking da ANDI, a Viração é a primeira entre as revistas voltadas para jovens. Participe você também desse projeto. Paulo Pereira Lima Diretor Executivo da Viração – MTB 27.300

Apoio institucional

Asso

ciazione Jangada


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Mulheres na luta Virajovens de Natal, em celebração ao Dia da Mulher, conversam com uma jovem militante feminista sobre os desafios de lutar por direitos no século 21

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A praia dela Adolescente potiguar de 14 anos monta um coletivo de poesias que promove saraus, competições e intervenções culturais em Natal

Como se Faz Aprenda uma divertida dinâmica de apresentação que promove a interação de grupos em encontros, reuniões e oficinas

sempre na vira:

Manda Vê Imagens que Viram Vale 10 Quadrim No Escurinho

RG da Vira: Revista Viração - ISSN 2236-6806 Conselho Editorial

Eugênio Bucci, Ismar de Oliveira, Izabel Leão, Immaculada Lopez, João Pedro Baresi, Mara Luquet e Valdênia Paulino

06 14 16 29 30

Secretário Rafael Lira

Diretoria Executiva

Paulo Lima e Lilian Romão

Equipe

Conselho Fiscal

Conselho Pedagógico

Administração/Assinaturas

Alexsandro Santos, Aparecida Jurado, Isabel Santos, Leandro Nonato e Vera Lion

Presidenta

Susana Piñol Sarmiento

Vice-Presidenta Amanda Proetti

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Cadu Ferreira e Norma Cinara Lemos

Mobilizadores da Vira

Acre (Leonardo Nora), Alagoas (Alan Fagner Ferreira), Amapá (Alessandro Brandão), Amazonas (Jhony Abreu, Claudia Maria Ferraz e Sebastian Roa), Bahia (Emilae Sena e Mariana Sebastião),

Os jogos fazem parte da vida de pessoas de todas as idades. Especialistas e jogadores apontam os benefícios dos games e seu papel na formação do ser humano

Aprender educom Para a prática da educomunicação é importante conhecer conceitos e teorias. Cursos acadêmicos já oferecem repertório para o educomunicador

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Que Figura Sexo e Saúde Rango da Terrinha Parada Social Rap Dez

Bruno Ferreira, Elisangela Nunes, Filipe Campos Borges, Gutierrez de Jesus Silva, Irma D’Angelo, Manuela Ribeiro, Rafael Silva e Vânia Correia

Everaldo Oliveira, Renata Rosa e Rodrigo Bandeira

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Lúdico a vida toda

Criativos desde pequenos Crianças e adolescentes criam softwares em contextos educacionais e aprendem a ser empreendedores em cursos técnicos gratuitos

Catástrofe histórica A explosão da bomba de Hiroshima, um dos tristes episódios da 2ª Guerra Mundial, é retratada no álbum Gen Pés Descalços, comentada na coluna Quadrim

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Ceará (Alcindo Costa e Rones Maciel), Distrito Federal (Webert da Cruz), Espírito Santo (Jéssica Delcarro e Izabela Silva), Maranhão (Nikolas Martins e Maria do Socorro Costa), Mato Grosso do Sul (Fernanda Pereira), Minas Gerais (Emília Merlini, Reynaldo Gosmão e Silmara Aparecida dos Santos), Pará (Diego Souza Teofilo), Paraíba (José Carlos Santos e Manassés de Oliveira), Paraná (Juliana Cordeiro e Diego Henrique Silva), Pernambuco (Edneusa Lopes e Luiz Felipe Bessa), Rio de Janeiro (Gizele Martins), Rio Grande do Norte (Alessandro Muniz), Rio Grande do Sul (Evelin Haslinger e Joaquim Moura), Roraima (Graciele Oliveira dos Santos), Sergipe (Elvacir Luiz) e São Paulo (Igor Bueno e Luciano Frontelle).

Colaboradores

Antônio Martins, Fernanda Papa, Heloísa Sato, Mafoane Odara, Márcio Baraldi, Natália Forcat, Nobu Chinen, Novaes e Sérgio Rizzo.

Projeto Gráfico

Ana Paula Marques e Manuela Ribeiro

Revisão

Izabel Leão

Jornalista Responsável

Paulo Pereira Lima – MTb 27.300

Divulgação

Equipe Viração

E-mail Redação

redacao@viracao.org


diga lá!

O que é Educomunicação?

Via e-mail Olá, Viração! Meu nome é Clara Wardi, tenho 18 anos e acabo de ingressar no curso de Comunicação Social. Gostaria de contribuir com análises críticas sobre acontecimentos vigentes e me interesso muito pela parte de cultura. Descobri a revista por acaso, na internet, e me encantou sua proposta social, a liberdade que os jovens têm de expor seus pensamentos e produzirem materiais bem feitos. Partindo disso, se houver algum espaço, seria um prazer colaborar. Grata, Clara

Resposta: Clara, será um imenso prazer contar com a sua colaboração! Vamos marcar uma conversa para que, em breve, faça sua primeira matéria para a Vira!

Perdeu alguma edição da vira? não esquenta!

@viracao

É comum, nas edições da Vira, encontrar a palavra “educomunicação” ou o termo “educomunicativo”. A educomunicação é um campo de intervenção que surge da inter-relação comunicação/educação para a transformação social. Dizemos que um projeto ou prática é educomunicativa quando adota em seus processos, especialmente do jovem, o caráter comunicacional, como o diálogo, a horizontalidade de relações e o incentivo à participação, fazendo com que os sujeitos exerçam plenamente o direito humano à expressão e à comunicação, em diferentes âmbitos e contextos. A Viração promove ações educomunicativas por meio da produção midiática, incentivando que adolescentes e jovens produzam reportagens coletivas em diferentes linguagens.

Como virar um virajovem? Virajovens são os integrantes dos conselhos editoriais jovens da Viração, que produzem conteúdos mensais em suas cidades. O conselho pode ser um coletivo autônomo de jovens ou um grupo ligado a uma entidade, organização, movimento social, escola pública ou privada, que dará apoio para que os virajovens produzam conteúdos. A parceria entre a Vira e entidade é oficializada com um termo de compromisso e com a publicação do logotipo da organização na revista Quer saber mais? Entre em contato com a gente: redacao@viracao.org.

Agência Jovem de Notícias

Você pode acessar, de graça, as edições anteriores da revista na internet: www.issuu.com/viracao

Para garantir a igualdade entre os gêneros na linguagem da Vira, onde se lê “o jovem” ou “os jovens”, leiase também “a jovem” ou “as jovens”, assim como outros substantivos com variação de masculino e feminino.

Mande seus comentários sobre a Vira, dizendo o que achou de nossas reportagens e seções. Suas sugestões são bem-vindas! Escreva para Rua Augusta, 1239 - Conj. 11 - Consolação - 01305-100 - São Paulo (SP) ou para o e-mail: redacao@viracao.org - Aguardamos sua colaboração!

Parceiros de Conteúdo


manda vê

Evelin Haslinger e Mônica Oliveira, do Virajovem, Porto Alegre (RS); Ingridy Almeida, do Virajovem Lima Duarte (MG); e Bruno Ferreira, da Redação

O Brasil não é só o País do futebol, é o paraíso da indústria da beleza, que fatura tanto aqui quanto nos países mais desenvolvidos. Esse cenário mostra o quanto a preocupação com a aparência vem tomando espaço na rotina de homens e mulheres: do consumo de cosméticos até a procura por cirurgias plásticas. A grande variedade de etnias, biotipos, cabelos e outras características fazem do Brasil um território marcado pela diversidade. No entanto, a questão é polêmica: a indústria e a mídia investem pesado em publicidade para incentivar um “padrão de beleza”. Enquanto há os que perseguem esse “padrão” a qualquer preço, há também quem pouco se importa com a questão. E você? Vai com frequência ao salão de beleza? Malha para ter um corpo escultural? Ou pensa em uma cirurgia plástica para mudar alguma parte do corpo que não agrada? Diz aí:

Cuidar da aparência é futilidade? Jéssica Moreira

Carl Marx

20 anos | Porto Alegre (RS)

23 anos | Porto Alegre (RS)

“Para mim, não há futilidade alguma em se preocupar com a aparência. Na verdade, essa questão faz parte do meu bem estar. Quando eu estou bem comigo mesma e com a minha aparência, consequentemente, eu me sinto bem espiritualmente.”

“Cuidar vai muito além de se enquadrar em um padrão estético contemporâneo. Vocês acham que é fácil fazer aquele moicano gigante de um punk? Cuidar da aparência acaba sendo mais um modo de se expressar.”

Filipe Augusto

20 anos | Juiz de fora (MG) “Preocupação com a aparência não se trata de futilidade. É algo importante, em especial para a autoestima. Ocorre que muitas vezes há uma inversão de valores ou uma radicalização. É preciso saber valorizar cada coisa e não perder de vista que a saúde integra a boa aparência.”

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Camila Alves

19 anos | Rio de Janeiro (RJ) “Preocupar-se com a sua aparência é saudável e mostra que você está bem consigo mesmo. Mas vai além disso, uma boa aparência é essencial para uma melhor desenvoltura no trabalho e na vida social.”


Veridiane Dalcin Mello

20 anos | Santo Ângelo (RS) “Acho que aparência tem a ver com a autoestima da mulher. Eu gosto de me cuidar, e é uma coisa que eu invisto. Pra mim é fundamental ter uma boa aparência, não acho que é futilidade.”

André Mietto

26 anos | São Paulo (SP) “Não é futilidade, porque dependendo do local de trabalho, é necessidade! No meu emprego tem que ter um cuidado maior com a aparência.”

Bianca Graziani Caroline Shimoda 19 anos | São Paulo (SP)

“Depende da prioridade que você dá pra isso, e se isso ultrapassa outros aspectos da vida da pessoa. Ter um cuidado com a aparência, desde que não seja algo excessivo, pra mim é normal e, às vezes, até necessário.”

24 anos | São Paulo (SP) “Não! Cuidar da aparência é fundamental para a autoestima. Se nós mesmos não nos cuidarmos, quem vai cuidar? Ame primeiro a si mesmo, goste de você mesmo, cuide de você mesmo!”

Não é de hoje! No Brasil, o fenômeno do culto ao corpo surge com força na década de 1920, com a chegada do cinema e, com ele, um modelo de beleza fundamentalmente estadunidense, que persiste até hoje.

FAZ PARTE Os meios de comunicação têm grande responsabilidade na disseminação do “padrão de beleza” vigente. Assume um papel de dona da verdade ao dizer o que é bonito, feio, o que está na moda ou não está. Já parou para pensar nisso?

*Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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galera repórter

Poder político não é suficiente em 8 de março, mulheres saem às ruas, No último Dia Internacional da Mulher, gar gritam ao mundo que, em ano de copa e de eleição, elas não vão dialo

Paolla Menchetti, do Virajovem Natal (RN)*

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onquistamos o direito ao voto, as calças cumpridas, as sais curtas, o divorcio, as pílulas anticoncepcionais, mas ainda não usufruímos de todas essas vitórias e queremos muito mais. Muitas violações de direitos continuam ainda hoje. A cada duas horas, uma mulher é assassinada. Ocorre, hoje, um estupro a cada 11 minutos no Brasil. Em cidades como Rio de Janeiro, há mais de 16 estupros por dia, segundo dados do 7º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. O Brasil ocupava, em 2012, o primeiro lugar na América Latina e o segundo no mundo de acordo com o relatório de exploração sexual infanto-juvenil elaborado pelas Nações Unidas. No entanto, em vez investimentos públicos que poderiam amenizar essa realidade, encontramos apenas o descaso e o abandono da pauta sobre os problemas enfrentados pelas mulheres. Não basta ter mulheres ocupando cargos de governança. O principal é ter muita garra para resistir e lutar por todas nós. E sobre essa luta, entrevistamos a adolescente Ingrid Lopes, de 17 anos, estudante de

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Relações Públicas e militante do Coletivo Nacional Construção e da frente feminista da PUC, que acredita nesta luta e deixa sua marca por onde passa. O que te levou a militar na causa feminista? A princípio, comecei a questionar os padrões de beleza e o comportamento que a mídia e a sociedade impõem para as mulheres. Eu queria me vestir, falar e agir como bem entendesse. Depois de um tempo, fui amadurecendo meus pensamentos e percebendo que a discussão está muito além do feminismo comportamental, que muitas mulheres sofrem fisicamente com o machismo, que isso é uma questão de gênero, cor e classe. Então, decidi me organizar e lutar contra essas opressões que nos afligem diariamente. Quais os desafios da luta das mulheres no século 21? Entre os maiores desafios estão a deficiência das ações de combate à violência contra a mulher, falta de agilidade e funcionamento da lei Maria da Penha,


considerando que o Brasil possui 5.570 municípios com 400 delegacias especializadas, segundo dados da Secretaria Especial de política para as Mulheres. Tem ainda o medo das mulheres agredidas em denunciar o agressor que, na maioria das vezes, está no convívio familiar da mulher. A auto-organização das mulheres em coletivos ainda é um desafio, pois se vende uma sociedade em que as mulheres, hipoteticamente, têm mais direitos, o que gera abstrações sobre a real situação da mulher trabalhadora no Brasil. A mulher moderna também é “vendida” como mercadoria? A mulher que a sociedade constrói não passa de um brinquedo/propriedade que o capital criou para os homens. As mulheres são criadas para satisfazê-los, dar filhos a eles, fazê-los sentir como se fossem seus donos, sem que essa lógica nunca possa ser questionada. Como se realmente fossemos um objeto. Isso atinge mulheres de todas as classes, com certeza em escalas diferentes, mas sem dúvida todas as mulheres sofrem com o patriarcado. Logo, a ideia de que mulheres em pleno século 21 são livres é contraditória, quando se tem uma lei que proíbe o aborto legal para mulheres pobres e pretas. Feminismo: o que é, para quem é e contra quem atua? Feminismo é a busca de igualdade de gênero, para seremos iguais em direitos, nenhum gênero será superior ou inferior. O feminismo é para todo mundo, mulheres e homens que acreditam e reivindicam essa igualdade. Feminismo é a luta totalmente contra essa sociedade machista, que nos trata como servas minimamente originadas de uma costela doada, contra violência doméstica, estupros, agressões verbais e físicas, diferenças salariais e tantas outras coisas que nos maltratam há muitos anos. O que é o machismo para você? Machismo é a ideia de que os homens têm poder sobre as mulheres, que podem usufruir de todos os espaços e a mulher não, como a política e a academia. O machismo legitima a violência doméstica e as agressões sexuais, estereotipam as mulheres, faz com que nos tornemos objetos à disposição dos homens.

Adeptas e adeptos ao movimento feminista ocupam as ruas de Natal no último dia 8 de março

“A mulher que a sociedade constrói não passa de um brinquedo/propriedade que o capital criou para os homens.” Violência, Copa, criminalização... O que isso tudo tem a ver com o dia 8 de março? Quem vive próximo às cidades-sede da Copa sabe muito bem que a situação das mulheres se agrava, com a violência que megaeventos produzem, como, por exemplo, a mercantilização do corpo da mulher, via turismo sexual. A situação foi parecida em outros países que já sediaram a Copa. Na Alemanha, a prostituição foi regulamentada às vésperas da Copa. Com isso, o aliciamento e o tráfico de mulheres foi legalizado pelo Estado e 40 mil mulheres foram levadas para bordéis instalados em cidades como Berlim, para servirem aos turistas. Em junho do ano passado, o Brasil todo estava em luta nas ruas. As pesquisas apontam que 60% de quem estava na rua eram mulheres, que foram agredidas e reprimidas pela força policial, criminalizadas pela sociedade machista que as quer dentro de casa, e esse 8 de março se coloca como um momento histórico, mais um capitulo da luta pela emancipação das mulheres que resistem a toda atrocidade do capital.

*Uma das virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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Expressão em versos Poesia inspira jovens leitores potiguares

Danilo Bezerra, Virajovem de Natal (RN)*

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Pedro Bardini

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paixão pela poesia nasce em situações adversas. coletivos culturais fortes. No Rio Grande do Norte, alguns Seja pelo fim de um relacionamento, pela desses grupos têm suas atividades ativas, mas as ações descoberta de um autor ou quando encontramos, são poucas durante o ano. Quando criado, Regina viu-se em meio a caixas e estantes, aquele antigo livro de poesia num dilema: como e quando realizar as intervenções do que nossos pais leram. Mas nem sempre as histórias são Iapois? “Busquei ajuda, conversei com amigos, como o iguais, às vezes seu curso é o inverso do que pensamos. Daniel Minchoni (poeta potiguar), e decidimos que nosso Em tempos de chats pela rede, escrever ficou restrito primeiro encontro seria no Parque das Dunas. Reunimos a pequenas frases para muitos jovens. Mas em Natal (RN), entre 25 e 30 pessoas. Gente que nem eu conhecia.” um grupo cultural vem quebrando essa regra. Com muita Entre falhas e acertos, o Iapois foi crescendo e inspiração na cabeça, força na voz e talento ao escrever, realizando seus encontros pela cidade. Cafés, livrarias, o Iapois Poesia vem conquistando jovens natalenses ao shoppings, parques e casas: livros e poesias viraram promover saraus, competições e intervenções culturais rotina dos participantes do grupo. Algumas editoras, pela cidade, incentivando o gosto pela literatura e dando como a Jovens Escribas, começaram a apoiar a ideia, fôlego aos coletivos literários potiguares. enviando livros para serem sorteados ou oferecidos aos Tudo começou em novembro de 2012, quando Regina participantes. Os eventos, que eram trimestrais, passaram Azevedo, de 14 anos, junto com seus colegas de escola, a ser cada vez mais frequentes. decidiram criar um evento em que todos pudessem O grupo de poesia chegou a participar do Circuito ler ou interpretar poemas de acordo com Ribeira, programação cultural de Natal seus gostos, inspirados nos poetry slam, competição de poesia falada, e em saraus paulistanos que Regina acompanhava pela internet. “Eu via as pessoas lendo poesias e ficava entusiasmada, tanto pela forma que eles se expressavam, como pela reação da plateia. Fiquei apaixonada”, comentou Regina ao falar da criação do Iapois Poesia. Iapois é um jargão que Daniel Minchoni, escritor e amigo de Regina, usava na época em que ela o conheceu, e ainda usa. Segundo ela: “Curti o nome e tudo bateu: como eu queria criar um grupo de poesia e ele falava muito esse nome pelo facebook, quis pegar pra mim. Falei com ele e ele adorou a ideia” Em relação ao eixo Rio-São Paulo, a Entre árvores e plantas, brotava a leitura Região Nordeste não dispõe de muitos nos primeiros encontros do Iapois


Pedro Bardini

ra Rayane Maina

que durante um dia reúne todos os grupos artísticos da cidade, com intervenções na Casa da Ribeira, palco de lançamento de livros e encontros literários. Durante o circuito, o Iapois Poesia realizou grafitagens, leituras e slams, sempre muito disputados por leitores de todas as idades. No entanto, o envolvimento de Regina com a poesia não ficaria apenas entre encontros e competições, iria além, sendo materializado e imortalizado pela escrita. Com 13 anos de idade, ela escreveu e lançou seu primeiro livro Das vezes que morri em você, pela editora Jovens Escribas. O livro reúne várias poesias da jovem escritora, que em sua maioria são “carnomarginais”, expressão usada pela autora para nomear poesias que falam do corpo humano e se enquadram numa literatura marginal. Regina Azevedo nasceu em 11 de janeiro de 2000 e, aos 12 anos, já dava indícios de seu envolvimento com a escrita. Ironia ou não, o fato que é seu nascimento para a literatura, ou seja, seu primeiro livro, surge com a morte no título. Apesar da pouca idade, a poetisa apresenta maturidade de gente grande para escrever. Cartas de amor, paixões e contradições da idade dão espaço a uma poesia que toca em temas como amor, em sua forma envolvente, no sexo, como um ato sublime, e demonstra, em meio a tantos poemas, seu lado mais humanista e emotivo, mostrando que sua idade se faz presente na intensidade de sua escrita. Fugindo das tradicionais métricas que a poesia dita, Das vezes que morri em você é ousado nas construções dos poemas, usando rimas quebradas, com jogos de palavras ou fazendo arte sem rima alguma, apenas com a livre interpretação de seus escritos. A autora não revela claramente a escolha do nome de seu livro, mas ela explica indiretamente a elaboração do título Das vezes que morri em você em seus versos. Para esse ano, tanto Iapois como Regina estão com projetos novos. O grupo literário realizará eventos maiores em parceria com a editora Jovens Escribas. A poetisa lançou o fanzine Carne viva o amor estanca, com ilustrações da estudante de publicidade Luiza de Souza. Dividido em duas partes, o fanzine traz poemas que falam de amor, dor e saudade. “Poemas dolorosos, mas há certa esperança neles”, explica Regina ao definir sua obra.

“Há uma certa esperança em meus poemas”, Regina Azevedo

Observo as pequenas flores que se escondem no teu leite. Tateio o chão na infinita busca de um porta- retrato. Todos vieram para a festa. A selvageria prossegue: minha carne se rasgando ao meio enquanto apostadores dão a vida pra ver quanto tempo eu aguento sem gritar, apenas gemendo e rezando baixo. Me cortam, lambem com os dentes e urram com seus prêmios em punho. Me penduram toda mole num varal pra secar carne de segunda. De repente, não sou mais lady riscam meus peitos com o preço e logo estou na vitrine, molhada. Agora nem gemer consigo. Em cima do palco, olhos pulam e penetram os seus. Que horas a peça acaba?

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Você pode me ouvir?

Me afundo. Dizem: Apenas o afogamento em ALTA PROFUNDIDADE é considerado afogamento, então somente assim os humanos me salvam. Eles até que tentam. Enfiam os dedos na minha garganta e tudo começa de novo.

Divulgação

Faço sexo com um animal de outra espécie. O gosto do gozo do pássaro não sai da minha boca.

Ensaboam cada espaço do meu corpo. Cada espaço entre os dedos. Arrancam minhas unhas. Menos coisa pra se sujar. Com carne viva é mais fácil de se lidar. O gosto do gozo não sai da minha boca. A água torna a escorrer. Os melhores gostos não saem nunca, são gostos da vida, que ficam cravados como garras tatuagens ferraduras em nossa pele.

Das vezes que morri por você: temas de gente grande

Pedro Bardini

Meu pássaro australiano de penas laranjas sempre volta pra casa.

Grupo do Iapois deixa suas poesias pelas esquinas de Natal *Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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como se faz!

Dinâmica de integração Para quebrar o gelo, antes de uma reunião, que tal promover a interação do grupo?

Luiz Felipe Bessa, do Virajovem Recife (PE)

Passo a passo

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2. Aleatoriamente, escolha um integrante do círculo e entregue

ão é de hoje que dinâmicas de grupo promovem a interação e descontração em equipes diversas. Seja no trabalho, na escola ou na comunidade, a importância da dinâmica em grupo é trazer aos coletivos desenvoltura, participação, valores coletivos e individuais, confiança mútua, integração grupal e iniciativa. Tudo isso de modo lúdico e divertido. Nesta edição, procuramos apresentar uma dinâmica interessante para quem deseja iniciar uma conversa sobre comunicação, participação social, importância de trabalhar em grupo e valorização de equipe. Observe o passo a passo de como desenvolver a dinâmica da Teia. Para realizá-la, você vai precisar apenas de um rolo de barbante. Confira!

1. Convide os participantes a ficarem de pé, formando um círculo. a ele o novelo.

3. O participante escolhido deve dizer um meio de

comunicação com o qual se identifica e porque a comunicação é importante, em sua opinião.

4. Após a sua exposição, ele deve amarrar a ponta do barbante

no dedo e arremessar o rolo para outro colega, aleatoriamente, que também deverá expressar outro meio e falar sobre a importância da comunicação, amarrando, posteriormente, a linha no dedo e passando o novelo adiante.

5. Depois que todos se apresentarem, você pode pedir ao grupo para desfazer, ordenadamente, a teia criada com o barbante. Os integrantes da roda devem conversar para desfazê-la sem nós. Se preferir, você pode sugerir que o último participante jogue de volta o barbante à pessoa que lhe jogou, repetindo ao menos o meio de comunicação dito por ela, e assim sucessivamente até que retorne ao primeiro participante.

6. Ao final do processo, o facilitador da dinâmica solicita aos presentes que comentem o que os colegas disseram – se prestaram atenção, se lembram do que foi dito, ou só se preocuparam com a própria apresentação – e que mensagem os participantes tiraram da brincadeira.

Fique atento! Você, como facilitador da dinâmica, deve reforçar, ao final da atividade, a mensagem da proposta, a partir da fala dos participantes. Estimule o grupo a refletir sobre seu nível de atenção com relação ao outro. Lembre-se também que essa metodologia pode ser adaptada a outras situações. Em vez de pedir que os participantes falem sobre comunicação, podem apenas se apresentar, dizendo seus nomes, gostos e habilidades, ou abordarem outros temas em suas apresentações.


Arte que modifica a realidade

Texto da Redação Imagens: Jota Zeroff, colaborador da Vira em Petrolina (PE)

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oje em dia, trabalhos de intervenção urbana ainda são pouco conhecidos, mas já chamam bastante a atenção. Recentemente, circulou pelas redes sociais fotografias de grafites que ganham sentido quando interagem com elementos da realidade em que está inserido. Essas fotos foram amplamente compartilhadas no Facebook, por exemplo. O artista grafiteiro e interventor urbano Jota Zeroff, natural de Petrolina (PE), realiza trabalhos assim. Pernambucano e autodidata, o artista já colaborou anteriormente com a Viração. Em sua página oficial no Facebook, você encontra fotos de artes acabadas e em processo de elaboração: www.facebook.com/Zer0ff. Confira algumas de suas intervenções!

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Mudar o mundo não é fácil, mas pode ser divertido! Mafoane Odara*

* Psicóloga e Mestre em Psicologia Social pela Universidade de São Paulo. Especialista em empreendedorismo social; diversidade de gênero e raça; seleção e gestão de pessoas; e, avaliação de projetos e negócios sociais. Atualmente coordena a Plataforma de Inovações para Juventude da Ashoka Brasil.

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A partir daí nossa parceria não parou mais. Juntos passamos a conhecer e divulgar histórias de adolescentes e jovens que estão mudando o mundo usando a comunicação como instrumento de transformação social. Hoje a Viração e a Ashoka apoiam milhares de jovens agentes de transformação dispostos e dispostas a arregaçar as mangas para melhorar a própria vida e a vida de outras pessoas.

Natália Forcat

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magine que diferença faria na força e criatividade da sociedade, se a maioria dos adultos tivesse desenvolvido firmemente sua autoconfiança e sua capacidade de servir como geradores de mudança durante a adolescência! Imagine ainda um país em que jovens frequentam escolas de qualidade e, se quiserem, podem escolher um trabalho digno para ganhar a vida. Por lá, jovens podem sair para se divertir e fazer cultura, com a garantia de que vão voltar bem para casa. Mais ainda, imagina se um(a) jovem ao chegar num posto de saúde desse país imaginário, tem gente que escuta o que ele fala e fala o que ele entende. Um país em que jovens podem pensar no futuro como um projeto que pode ser concretizado, e não como uma fantasia ou um pesadelo. Será que é sonhar demais? Para a Viração e para a Ashoka não! E foi com esse sonho coletivo que as histórias da Ashoka e da Viração se cruzaram. Tudo começou com a vontade coletiva de desafiar as percepções tradicionais a respeito dos jovens, transformar pressupostos de passividade e incompetência em iniciativa e capacidade e criar um movimento global com o propósito de oferecer às crianças, adolescentes e jovens a oportunidade de atuar para transformar a realidade que as rodeia. Lembro-me de cerimônia no Memorial da América Latina, em 2007, que reconheceu publicamente o valor da comunicação alternativa e da luta para melhorar o mundo empreendido por Paulo Lima, criador da Viração. Ao ouvir a incrível história do Paulo me dei conta de que acreditávamos nas mesmas ideias, de que iniciativas que apostavam na energia e no potencial que há em cada adolescente e jovem poderia contagiar todos a sua volta. E, tendo em mãos materiais e métodos eficazes, é possível atuar em larga escala e promover uma transformação significativa e com profundos impactos no futuro, garantindo maior cidadania e enfrentando injustiças sociais.



capa

PRESS START: onde a aventura começa ra que ele Mergulhe no mundo dos games e descub pode ser bem maior do que você imagina! Juliana Cordeiro e Paula Nishizima, do Virajovem Curitiba (PR)*

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euses enraivecidos, criaturas mitológicas, assassinos profissionais ou a fauna e a flora de uma ilha desconhecida. Os desafios a serem enfrentados podem ser os mais diversos quando se busca alcançar um objetivo. Mas não se preocupe, você não está sozinho: outras criaturas e seres poderosos estão dispostos a ajudá-lo, sem contar o apoio dos amigos mais próximos. Ainda assim, a jornada será longa. Aquele que ingressar deve estar pronto para enfrentar seus medos mais profundos e abrir mão de itens valiosos em prol de um bem maior. As recompensas, por outro lado, serão o reconhecimento pelo trabalho e (por que não?) riquezas inestimáveis. Que atire a primeira pedra quem nunca, ao menos uma vez,

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se deixou levar por enredos e conflitos como esse. Se você sabe do que estamos falando, meus parabéns: você está, definitivamente, no universo dos games!

Fazendo novos amigos Se você acha que os games mobilizam esforços apenas no mundo virtual, pense duas vezes. Inúmeros eventos são organizados e preparados por empresas do ramo, fã-clubes ou até mesmo grupos de amigos apaixonados por um game ou gênero específico, sem contar que na própria rede é possível fazer contato com pessoas dos mais diferentes cantos do mundo. Se, por outro lado, você é do tipo que prefere uma boa interação cara a


Silva us Fotos: Gutierrez de Jes

cara, os RPGs (Role-playing game) de mesa vão cair como uma luva. “Jogar games eletrônicos é uma coisa mais individual. É um jogo que se joga sozinho. RPG, por sua vez, é um jogo de contar histórias: você senta com seus amigos ao redor de uma mesa e conta histórias. E a graça do jogo é ver essa história seguir em frente”, defende o game designer Guilherme Korn. A estudante de ensino médio do Colégio Sepam, de Ponta Grossa (PR), Mariana Macedo, de 16 anos, viu no RPG uma forma de aguçar sua criatividade. “Eu até tinha interesse em jogos eletrônicos, mas nunca consegui me adaptar. Acho que o melhor do RPG de mesa é poder imaginar. Por isso, prefiro ele ao game de computador”, explica. Não é a toa que os RPGs vêm sendo usados, inclusive, em experiências na área de educação. O professor de Física da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Ricardo Roberto do Amaral, desenvolve há nove anos iniciativas com esse tipo de jogo com adolescentes do ensino fundamental e médio. Ele salienta que os RPGs são jogos cooperativos, além de auxiliarem no desenvolvimento do raciocínio lógico e na aplicação prática de ciências como Física, Química e Biologia. “É incrível como é perceptível uma mudança de atitudes nos alunos após uma experiência com o RPG. Eles interagem mais uns com os outros, aqueles mais tímidos vão perdendo o medo de falar diante de todos, os laços de amizade se fortalecem e toda a turma cresce em experiência”, conta Ricardo Amaral. O professor também é responsável pelo lançamento do livro RPG na Escola: aventuras pedagógicas, em que orienta outros professores sobre como utilizar a ferramenta em sala de aula, além de apresentar cinco aventuras prontas para serem executadas. Por outro lado, é visível a dificuldade de inserção desse tipo de metodologia na área educacional, como explica o próprio Ricardo: “Há que se pensar num roteiro, em situações-problemas que envolvam os conteúdos que

A expansão do mercado dos games amplia as possibilidades de atuação de profissionais de diferentes áreas

se quer abordar, criar personagens e cenários e conseguir passar toda a riqueza de detalhes apenas pela narração. Realmente não é fácil e não podemos esperar que um professor que tenha uma carga horária sufocante possa ter motivação para criar tudo isso”. O estudante de jogos digitais do Centro Tecnológico Positivo, Marcelo de Carvalho, decidiu desenvolver jogos educativos porque também percebeu uma necessidade de mudança na área. “O modelo educacional brasileiro precisa de uma reforma urgente e isso é algo muito amplo, envolve muita gente. O papel dos jogos está atrelado a isso. É um sonho poder ver os rostos de crianças se iluminarem enquanto jogam e aprendem ao mesmo tempo”, comenta. Marcelo foi vencedor na categoria educacional da 7ª edição do Prêmio Ozires Silva de Empreendedorismo Sustentável com o jogo As Aventuras de Bomberix, que possui foco no tema da preservação ambiental e é voltado para crianças de 6 a 12 anos.

Vamos falar de negócios? De acordo com uma pesquisa feita em 2013 pela empresa de pesquisa Newzoo, existem 48,8 milhões de gamers no Brasil, sendo que 61% deles costumam gastar dinheiro com jogos eletrônicos ou produtos relacionados a eles. Revista Viração • Ano 12 • Edição 105

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Ela aponta que entre 2011 e 2013 o mercado de games ganhou 13,8 milhões de novos adeptos. Agora, imagine os impactos do crescimento dessa indústria no País: novas oportunidades de emprego para designers, programadores, publicitários, jornalistas (trabalhar fazendo reviews de jogos até que não é nada mal, hein?), maior variedade e número de jogos em português e por aí vai. No Brasil, a agenda dos apaixonados por jogos tem data e hora marcadas. Anualmente, eles comparecem ao Brasil Game Show, maior evento de jogos eletrônicos da América Latina. Em 2014, acontecerá entre 8 e 12 de outubro, em São Paulo. Em sua sétima edição, a feira terá novas áreas a fim de comportar o público que vem crescendo a cada ano. Espaço para deixar qualquer um de queixo caído. “Stands com decorações incríveis, cosplayers [pessoas que se caracterizam como um personagem de histórias de ficção] com fantasias mais que perfeitas, vários novos lançamentos e aquela multidão de gamers dispostos a ficar horas em filas para poder experimentar um pouco de tudo”, relata empolgado o Oficial de Chancelaria do Ministério das Relações Exteriores e blogueiro da página Omninérdia, Welton Luiz Costa Rocha Filho, de 29 anos. Se alguém da sua família já soltou a frase: “Menino, larga disso! Vai arranjar trabalho que isso não dá futuro!”, rebata com este argumento: atualmente, o Brasil movimenta um mercado de games com consumidores receptivos maior que o da Rússia, que possui 56% de seus 46,4 milhões de gamers dispostos a pagar para jogar, enquanto esses números no cenário chinês, por exemplo, correspondem a 65% de 173,4 milhões de jogadores. Mas nem tudo são flores: quem tem a área de games como campo de atuação profissional precisa lidar com outros obstáculos, como a invisibilidade e o preconceito. “O ser humano, por instinto, tem medo do que não entende, do diferente. Como disse Caetano Veloso: ‘Narciso acha feio o que não é espelho’. Para a sociedade, videogames, assim como o RPG e outros hobbies considerados de nerds ou CDFs são coisas muito novas, ainda incompreendidas pela maioria”, declara Welton.

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Durante uma conversa, Welton Rocha Filho e mais dois amigos constataram que, apesar de haver muito conteúdo nerd na internet, quase não havia produção local. Nasceu então o www. omninerdia.com.br! “Brasília era uma cidade pouco privilegiada, com pouco conteúdo para oferecer para o expressivo público nerd daqui. A Omninerdia tenta falar um pouco sobre tudo o que é nerd, e o universo gamer é parte importante”, explica Welton.

RPG é coisa séria Guilherme Korn é game designer e atualmente trabalha no Voo da Fênix, grupo criativo que mantém o blog www.voodafenix.com. Em quase dois anos de trabalho, o grupo já desenvolveu cerca de cinco jogos de papel, em versões print and play (“imprima e jogue”, em tradução livre). Com base em sua experiência no mercado, Guilherme fala um pouco sobre as características e o atual cenário do RPG. Na sua percepção, quais os principais desafios para os desenvolvedores de jogos, tanto os analógicos (de tabuleiro), quanto os digitais? O principal é se estabelecer no mercado. Se você tem um jogo digital nacional, é difícil. Se você tem um jogo de papel, é ainda mais difícil! Além de serem tipicamente considerados infantis no caso de boardgames (já vi gente dizer que jogos de tabuleiro são só Jogo da Vida, Banco Imobiliário e Detetive), ou jogos de maluco/do demônio, no caso de cardgames [jogos de cartas] como Magic the Gathering ou o nacional Contágio e de RPGs (Dungeons and Dragons, Vampiro, Abismo Infinito) e outros tantos que eu


poderia citar, inclusive trabalhos do meu blog. Estamos lutando cada vez mais para conseguir alguma visibilidade e mostrar que não só existem jogos analógicos, como eles podem ser bons, e que existe toda uma cena ao redor disso. Os jogos digitais são uma febre, mas os jogos mais jogados são de empresas grandes, como Ubisoft e EA Games. Já os menores pouco são vistos. O que anda mudando isso, muito lentamente, é que agora existem jogos no Facebook e nos celulares, e empresas como Steam e Sony dão espaço para produtores independentes. Com jogos de papel é ainda mais complicado. Na sua opinião, o que contribui para essa cultura de as pessoas acharem que jogos analógicos são “coisa de criança”? E o que ajudaria a reverter isso? Acho que as pessoas precisam, primeiramente, vencer o preconceito. Para isso, elas precisam de informação. Ou seja, nós, produtores de jogos precisamos de visibilidade e de incentivo. E elas não acham só que são infantis: acham bobos porque não tem gráficos extremos. Mas que gráfico é maior do que a sua própria imaginação? Acham que é “coisa do demônio”, porque são jovens sentados ao redor de uma mesa falando sobre uma história. A mídia já se colocou contra nós por causa disso. Hoje, nós já temos um espaço próprio. Criamos uma comunidade, que não se renova. Vendemos nossos jogos para amigos, enquanto compramos os jogos deles. Poderíamos fazer muito mais com incentivo público! Game designer também paga conta. E lançar um jogo custa dinheiro.

O universo em equilíbrio? Jogar não é só um passatempo. Mesmo com diferentes enredos, os games absorvem desafios e necessidades que são inerentes ao nosso cotidiano, tais como conseguir alimento, derrotar adversários ou ajudar amigos em apuros. Do contrário, jogos como Pacman e Mario Bros, não seriam considerados clássicos. “Hoje as coisas mudaram, um jogo tem muito mais a oferecer do que apenas diversão. Alguns oferecem exercícios físicos; outros, um enredo maravilhoso. Os videogames são semi-computadores, com redes sociais, interação, conexão com a internet e outros recursos”, defende o auxiliar administrativo Vinícius Rodrigues Marcili, de 18 anos. Assim como do lado de fora da tela, somos impelidos a interagir com outros personagens, enfrentar problemas e criar estratégias para alcançar nossos objetivos. Com o tempo, aprendemos o que funciona e o que não dá certo e nos sentimos motivados (ou não) a continuar. Mas há que se encontrar o ponto de equilíbrio para que os games não sejam encarados de forma inocente, tampouco considerados completamente nocivos (quem está cansado de ver matérias na TV acusando um game de ter “formado” um assassino, levante a mão!). Se necessário, nossa postura com relação ao jogo deve ser repensada: games foram feitos para corresponder à necessidade humana de contar histórias, trocar ideias, trabalhar em equipe e não devem tirar o gosto pelo “mundo real”, nem servir de meio para você ser grosseiro ou trapacear sem passar pelas consequências disso. Os jogos proporcionam a vivência de situações e a aquisição de valores aplicáveis na realidade

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Player Killer Mode: a Violência e os games Não são raros os casos em que crimes hediondos cometidos por crianças e adolescentes são justificados pelo fato de seus videogames favoritos serem classificados para a faixa etária de maiores de 18 anos. Para citar alguns exemplos, a morte de 12 crianças e adolescentes pelas mãos do atirador Wellington Menezes de Oliveira, no bairro Realengo (Rio de Janeiro), em abril de 2011 e o assassinato de 12 estudantes e um professor por Eric Harris e Dylan Klebold, na escola de Columbine (Colorado), em 1999, chamaram a atenção da sociedade e da mídia. As especulações giravam em torno dos games Counter Strike e GTA - Grand Theft Auto, no caso da escola de Realengo, e Doom, pelos estudantes de Columbine. Em sua tese, publicada em 2004, a doutora em educação Lynn Alves afirma serem reducionistas as conclusões que apontam os jogos como causadores da violência. “A violência se constitui em um fenômeno complexo que envolve, ao mesmo tempo, questões sociais, econômicas, culturais, políticas e afetivas”, escreve. Influenciado por uma série de fatores e acontecimentos, o ser humano é capaz de cometer atos de violência embasados em ideologias, religiões e visões políticas. “Mark Chapman, o ‘fã’ que matou o John Lennon, disse ter se inspirado no livro O Apanhador do Campo de Centeio para cometer o crime e ninguém fez campanha para que as pessoas parassem de ler o livro (ainda bem!), nem mesmo para que não o imprimissem mais, ou para deixar de seguir algumas religiões (ainda bem, também!). Pessoas violentas encontram inspiração para cometer os seus atos nos mais variados elementos da nossa cultura, mas o problema são essas pessoas, e não os elementos que eles elegem como seus ‘inspiradores’”, afirma o oficial de chancelaria do Ministério das Relações Exteriores, Welton Rocha Filho.

*Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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tá na mão Essa é para quem se empolgou com tantas possibilidades educativas ofertados pelos jogos e quer ficar por dentro desse universo: acessando o site www.rpgnaescola. com.br você pode saber mais sobre RPG, formas de aplicá-lo em sala de aula e até acessar alguns jogos prontos. O material foi elaborado pelo professor de Física da UFPE Ricardo Roberto do Amaral. Confira os links sugeridos pelos QR Codes!


Por que financiar a faculdade dos brasileiros é bom pra todos?

Porque, oferecendo o Fies* do Governo Federal, democratizamos o ensino superior e transformamos a vida de milhões de brasileiros. Isso é bom pra todos.

Mariana Barbosa Cliente do Banco do Brasil de São Paulo (SP)

@bancodobrasil

/bancodobrasil

bb.com.br

Central de Atendimento BB Atendimento 24 horas, sete dias por semana 4004 0001 ou 0800 729 0001 (saldos, extratos, pagamentos, resgates, transferências, demais transações, informações e dúvidas) Serviço de Atendimento ao Consumidor – SAC Atendimento 24 horas, sete dias por semana 0800 729 0722 (reclamações, cancelamentos, informações e dúvidas gerais) Deficiente Auditivo ou de Fala Atendimento 24 horas, sete dias por semana 0800 729 0088 Ouvidoria BB Atendimento em dias úteis, das 8 às 18 horas 0800 729 5678 (reclamações não solucionadas nos canais habituais – agência, SAC e demais pontos) ou acesse bb.com.br * Fundo de Financiamento Estudantil


Preparar para educomunicar Embora a formação específica ainda não seja uma exigência do mercado, a academia oferece uma bagagem importante para o educomunicador Da Redação

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campo de atuação para o educomunicador amplia-se cada vez mais, apesar de a profissão ainda não ser regulamentada, a exemplo de outras mais conhecidas. No entanto, editais de vagas de emprego em empresas e no terceiro setor já se destinam a “educomunicadores”, o que demonstra a procura e a necessidade de um profissional específico, que atue na interface comunicação/educação. O presidente da Associação Brasileira de Pesquisadores e Profissionais da Educomunicação (ABPEducom), professor Ismar de Oliveira Soares, afirma que a maior parte dos profissionais de educomunicação são jornalistas de formação, comprometidos com os direitos humanos e causas sociais. “Não se trata, contudo, de um trabalhador moldado segundo o figurino clássico do homem ou da mulher da redação. Ao contrário, trata-se de um comunicador ágil, antenado nas complexas relações que se produzem na sociedade e aberto à prestação de serviços na linha da informação e da comunicação, visando o conjunto dos grupos sociais e não apenas os detentores da grande mídia”, afirma. Também há muitos educadores de formação que buscam práticas profissionais em que são explorados produtos e processos comunicacionais, em especial os midiáticos, porque o atual contexto social exige cada vez mais esse perfil de educador, que pelo mesmo motivo, busca a formação em educomunicação. Há uma crescente procura por educomunicadores por parte de organizações do terceiro setor para atuarem em projetos de intervenção social, que vêm recebendo

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investimentos de fundações e empresas, por meio de seus programas de responsabilidade social. Outro campo de oportunidades de trabalho para educomunicadores advém de políticas públicas, como é o caso do programa do governo federal Mais Educação, que estimula ações de comunicação e usos da mídia, tendo a educomunicação como referencial teórico. Percebendo esse emergente campo de atuação profissional, a academia tem colaborado para a formação de profissionais que já atuam ou que desejam atuar na área. A Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP) oferece, desde 2012, um curso de especialização em Educomunicação (pós-graduação lato sensu) a graduados em qualquer área do conhecimento. O professor de ensino infantil, Marcelo Santos, que atua em escolas municipais de São Paulo, foi estudante da primeira turma da especialização. Ele afirma que, com o curso, obteve novas oportunidades de trabalho. “Eu me tornei coordenador de educação em um CEU [Centro Educacional Unificado]. Também recebi convite para trabalhar em uma ótima escola particular de São Paulo e tive a experiência de dar formação em educomunicação para os professores. Com certeza, a especialização me ajudou”, afirma. Para o jornalista Delcimar Bessa Ferreira, a bagagem teórica do curso dá mais condições para compreender e atuar na interface comunicação/educação. No entanto, ainda não conseguiu atuar especificamente como educomunicador após a conclusão da especialização, porque acredita que a profissão precisa ser regulamentada para que o profissional tenha mais oportunidades de trabalho, inclusive no setor público.


Arquivo pessoal de Marcelo Santos

“Percebi que o mercado de trabalho ainda não está familiarizado com o quê o educomunicador pode oferecer. Muitas vezes, quando tentei me inscrever para um processo seletivo, a vaga era para educador social ou jornalista comunitário. Poucos são aqueles que procuram por educomunicadores. Isso porque não sabem o que é e o que faz um educomunicador. Por isso, este debate é tão importante”, diz Delcimar. Já para o presidente da ABPEducom, há um percurso a ser realizado antes da regulamentação. “Precisamos do envolvimento dos profissionais do campo; do envolvimento dos empregadores, no setor público e setor privado; e do reconhecimento ou legitimação pública das universidades, dos demais sindicatos ou

O educador Marcelo Santos, ao se especializar em Educomunicação, tornou-se coordenador em um Centro Educaional Unificado

associações, da própria mídia etc. Se o tema existe, necessita passar a ser debatido nos encontros sobre educomunicação pelo País, para criar volume de demandas em torno da questão”, argumenta Ismar. Ele ainda afirma que, apesar de crescente, o mercado para educomunicadores não diferencia o educomunicador especializado na academia daquele que possui experiência como tal. “O certo é que os bons educomunicadores, estabelecidos em suas funções, jamais serão substituídos por um graduado. Continuarão a serem mestres dos graduados. Em educomunicação, a experiência e a coerência das ações contam mais que certificados acadêmicos. Preterido será aquele que, com diploma ou sem ele, não dominar teórica e praticamente o conceito da educomunicação”, afirma.

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ELES APRENDEM EMPREENDENDO Empreendedorismo pode ajudar no desenvolvimento de crianças e adolescentes Yuri Kiddo, do Promenino com Cidade Escola Aprendiz*

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interesse por tecnologia leva milhares de crianças e adolescentes, em todo o mundo, a desenvolverem, cada vez mais cedo, seus próprios aplicativos, softwares e até mesmo robôs, por meio da programação. Antes mesmo de terminarem o colégio, esses garotos e garotas já administram suas próprias empresas, vendem seus produtos para grandes marcas e alguns deles já fizeram o primeiro milhão de dólares. Enxergar a oportunidade de negócio e acreditar são os principais fatores em comum nessas histórias. Porém, até que ponto o empreendedorismo precoce pode ser saudável no desenvolvimento da criança e do adolescente? “Se uma criança cria um software, por exemplo, é porque está desenvolvendo o raciocínio e o conhecimento que aprendeu. Mas se ela passa a só fazer isso, deixando de lado o relacionamento com amigos e familiares e apresentando defasagem no estudo, então isso está atrapalhando e fazendo mal a essa criança”, explica o professor de computação tecnológica e robótica, José Reginaldo Pereira, do Colégio Eduardo Gomes, em São Caetano do Sul (SP). Para ele, deve haver equilíbrio para que as crianças e adolescentes cresçam de maneira adequada. Assim, a família e a escola devem oferecer condições para que as novas gerações se desenvolvam, sem esquecer de que elas são crianças. “Temos que fazer a diferença e trabalhar para que haja sempre a garantia de desenvolvimento pleno para as crianças. Dessa forma, no futuro elas irão perceber o impacto positivo que esse conhecimento oferece na vida delas e também na sociedade.” Questionado se o desenvolvimento de aplicativos e programas pode levar a uma situação de trabalho infantil, Pereira descarta a possibilidade. “O trabalho infantil retira diversos direitos e coisas positivas que essa criança poderia viver. Além de ser um sacrifício, é uma relação de exploração na qual ela só perde”, afirma.

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“O mais importante é a criança se divertir e fazer o que gosta. Com os direitos garantidos, o próprio ambiente não permite essa relação de trabalho.”

Educação com novos elementos Atento aos novos interesses e necessidades dos jovens assim como às demandas do mercado, o Ministério da Educação (MEC) criou, em 2013, o programa Pronatec Empreendedor, que inclui a disciplina de empreendedorismo em 15 cursos da rede pública de ensino técnico.


Imagens: Sesi-SP

Ainda na infância, o interesse por tecnologia favorece o desenvolvimento do espírito empreendedor

Para o MEC, a escola é o espaço adequado para despertar as atitudes empreendedoras dos estudantes. “O ambiente de sala de aula deverá favorecer a disseminação da cultura empreendedora em toda a comunidade escolar, para que uma proposta pedagógica, com foco no desenvolvimento do protagonismo infantojuvenil, mediante o empreendedorismo, possa favorecer o empoderamento dos estudantes”, define o Ministério no documento Educação Econômica e Empreendedorismo na Educação Pública: Promovendo o Protagonismo Infanto-Juvenil. “A questão da aprendizagem é enorme. Há uma proposta pedagógica por trás da aula de robótica. Os alunos estudam e colocam bastante em prática o que aprendem em sala de aula. Além disso, todos tratam os demais com educação, respeito e igualdade”, explica o professor Pereira, que além das aulas de robótica regulares, também ministra uma turma especializada de oito alunos de 10 a 15 anos. “Trabalho com crianças e adolescentes que vão levar, como valores dessas aulas, a organização, concentração e, principalmente, o trabalho em grupo. Então estamos trabalhando muito além da robótica.” A capacidade individual de empreender em soluções inovadoras; o processo de iniciar e gerir empreendimentos com enfoque no saber; a promoção de cidadania como direito e dever; e a preparação dos participantes para lidar com conflitos e desafios são alguns dos princípios sugeridos pelo MEC na educação empreendedora. “Estamos falando, portanto, da promoção de uma cultura participativa, solidária, agregadora, inventiva e geradora de riquezas a serem socializadas entre todos os membros de uma comunidade”, aponta o documento.

Na prática Com apenas 13 anos, o jovem Jorge Tinoco foi um dos palestrantes na última edição da Campus Party 2014, ocorrida no final de janeiro. Lá ele compartilhou sua experiência como programador, atividade que começou a interessá-lo aos nove anos de idade por pura curiosidade. Depois de começar a frequentar um clube de robótica em sua cidade natal, Salvador (BA), o garoto conheceu a programação e, sozinho, passou a pesquisar sobre o tema. Outro exemplo surgiu em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte. A equipe Eagles & Owls, de estudantes do Sesi Benjamim Guimarães, criou um robô para ajudar no resgate de vítimas Revista Viração • Ano 12 • Edição 105

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q de soterramento. O robô usa um termômetro para captar a temperatura da terra e, se o equipamento acusar uma temperatura entre 20 e 40ºC, existe a possibilidade de ter alguém soterrado. Nesse caso, um alarme seria acionado. O grupo está disputando o Torneio de Robótica First Lego League, campeonato internacional que reúne milhares de estudantes de escolas públicas e particulares de todo o Brasil, para disputar com projetos de outros países. Com o tema Fúria da Natureza, o Torneio de Robótica estimula os estudantes a montar e programar robôs buscando soluções para desastres naturais, como deslizamentos de terra, enchentes, tsunamis e tempestades. São mais de 60 equipes premiadas no País, todas elas formadas por até dez alunos, com idades entre nove e 15 anos, de escolas públicas e particulares, tendo um mentor ou técnico como líder. O professor de computação tecnológica e robótica, José Reginaldo Pereira, do Colégio Eduardo Gomes, em São Caetano do Sul, é um desses líderes. “Já fizemos um aplicativo para celular e tablet que avisa idosos sobre a quantidade de cálcio nos ossos para alertar sobre a osteoporose. Para o torneio deste ano, a equipe desenvolveu um projeto para controlar melhor as inundações da cidade.”

Robô é criado com o objetivo de auxiliar no resgate de vítimas de soterramento

*Publicada originalmente no site Promenino, uma iniciativa da Fundação Telefônica: www.promenino.org.org.

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quadrim

O menino e a bomba Nobu Chinen, crítico de quadrinhos

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s mangás, quadrinhos típicos japoneses, quase sempre são associados a histórias de muita ação, com personagens de olhos grandes e cabelos espetados. Na verdade, a produção nipônica se caracteriza por sua imensa variedade de estilos e gêneros narrativos, indo do infantil e humorístico ao terror explícito, passando pelas novelas femininas cheias de cenas açucaradas. Entre os milhares de títulos existentes, Gen Pés Descalços, de Keiji Nakazawa, se destaca por abordar um tema grave de forma pouco usual: a explosão da bomba nuclear na cidade de Hiroshima e seus efeitos sobre a população local. Trata-se do relato de um garoto japonês de seis anos sobre a sua vida e a de seus familiares em meados de 1945, em plena Segunda Guerra Mundial. A história começa mostrando como as pessoas, contrárias à guerra, como o pai de Gen, eram discriminadas e perseguidas e o ambiente hostil a todos que tinham o potencial de ser um inimigo, mesmo que fosse um pacato senhor da vizinhança. A parte mais dramática, porém, é a que retrata os fatos acontecidos imediatamente após a explosão da bomba atômica, em 6 de agosto de 1945. Corpos espalhados pelas ruas, paisagens inteiras devastadas e pessoas totalmente desfiguradas, vagando entre os escombros. Gen assistiu a tudo aquilo impotente, sem saber como agir e ainda sofreu os efeitos da contaminação pela radiação. A partir daí, tem início sua jornada pela sobrevivência: a busca pelos familiares e a luta por abrigo e alimentos. Mesmo desenhada de forma estilizada, a trama é inteiramente baseada em fatos reais. Nakazawa realizou uma obra autobiográfica, mostrando o desespero, a agonia e todo o sofrimento que testemunhou. Ele manteve todos os detalhes do que ele presenciou, trocando apenas os nomes dos envolvidos. A história é longa e costuma ser publicada em vários volumes, mas é uma leitura imperdível, uma narrativa emocionante para quem quer tentar entender um pouco mais sobre um episódio vergonhoso na história da humanidade.

Por que é legal ler? Embora não tenha o ritmo dinâmico dos mangás de aventura, a história é empolgante ao retratar a luta pela sobrevivência de um garoto e sua família em meio ao caos. Uma história real, dramática e comovente.

Por que é importante ler? Gen Pés Descalços é um testemunho vivo, um alerta ou manifesto do autor para a humanidade sobre uma catástrofe que deixou cicatrizes profundas que até hoje não foram apagadas.

Para ler e refletir! Guerras só trazem sofrimento, destruição e morte. São perdas inúteis, sem reparação e sem sentido. E mesmo assim, a humanidade ainda não aprendeu a lição.

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no escurinho

Inverno sem fim

Sérgio Rizzo*

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dupla missão – durante a qual recebe diversas ajudas, entre elas a de um homem da montanha e sua rena – de salvar o reino e também a irmã. Para as crianças menores, principalmente as meninas, Animações como Frozen garantem é um drama à indústria cinematográfica recordes romântico de arrecadação em bilheteria encantador. Para os mais velhos, outro exemplo de animação que pode oferecer recompensas superiores ao de boa parte dos dramas convencionais com atores. Por coincidência, a história de A Rainha da Neve inspirou recentemente outro filme de animação: a produção russa O Reino Gelado (2012), também já disponível em DVD no Brasil. Ler o livro e depois assistir aos dois filmes é um bom exercício para entender que cada um de nós tira de uma história o que mais nos interessa. Os russos de O Reino Gelado fizeram uma animação que lembra mais o que Andersen escreveu. O filme é sombrio, com um casal de irmãos órfãos que não sabem quem eles são.

Divulgação

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ma das principais batalhas da indústria do entretenimento no século 21 envolve a animação, com seu enorme potencial para agradar a crianças e também a adultos. Prova disso, em números que os estúdios norte-americanos de cinema adoram contemplar, é a marca de um bilhão de dólares em bilheteria global superada por Frozen, que saiu da cerimônia de entrega do Oscar, em março, com os prêmios de melhor longa de animação e de canção original (o sucesso internacional Let It Go). Desempenho muito superior, por exemplo, ao do badalado drama adulto Trapaça, que ficou sem nenhuma estatueta (e que arrecadou, em todo o mundo, apenas 250 milhões de dólares). O sucesso de Frozen representou uma festejada volta por cima para a área de animação do império Disney, que havia sido ameaçada de esvaziamento (e até mesmo de fechamento) desde a incorporação da produtora Pixar ao gigante do entretenimento fundado por Walt Disney (1901-1966). Talvez, não por acaso, a matéria-prima veio da literatura clássica, a exemplo de outros grandes êxitos do estúdio: o livro A Rainha da Neve, do dinamarquês Hans Christian Andersen (1805-1875), publicada pela primeira vez em 1845. A história original trata de uma maldição: tudo em que uma princesa toca vira gelo, e esse poder duvidoso atira o mundo todo em um inverno aparentemente sem fim. Como se poderia supor para uma produção Disney, Frozen adapta esse ponto de partida em chave mais leve, musical e bem-humorada. O filme conta a história de duas irmãs, herdeiras do trono de Arendelle. Elsa, a mais velha, é a que congela tudo o que toca. Infeliz com o que provoca, mas sem poder controlar o próprio dom, ela decide fugir. Anna, a caçula, vai atrás de Elsa, com a

*www.sergiorizzo.com.br


que figura!

Uma quase mulher O ator e bailarino Jorge Lafond popularizou-se pelas polêmicas envolvendo sua sexualidade e pela personagem travesti Vera Verão

Bruno Ferreira, da Redação Muitos são os episódios da carreira artística do carioca Jorge Luís Sousa Lima, que desde a infância tinha consciência de sua sexualidade, e como diziam que ser gay era algo inaceitável, procurava disfarçar para que seus pais não percebessem qualquer característica que os levassem a crer que tinham um filho homossexual. Talentoso, Jorge estudou balé clássico e dança afro no Rio de Janeiro e, aos 20 anos, iniciou carreira na Europa e nos Estados Unidos. No Brasil, destacou-se a partir de sua atuação no corpo de bailarinos do Programa Fantástico, da TV Globo, o que abriu portas para que o artista atuasse em novelas e programas da emissora, especialmente em Os Trapalhões. Ao longo de sua carreira, o artista protagonizou muitas polêmicas. Uma delas diz respeito a uma relação amorosa que teve com um jogador de futebol. A imprensa, na época, ficava no pé do artista para que ele revelasse quem era o seu amor secreto. E, talvez um dos mais tristes – e derradeiros – episódios que o envolveu foi o preconceito que sofreu por parte da produção de um programa dominical do SBT, que o convidou para participar da atração, mas discretamente o retirou do palco, em razão da presença do Padre Marcelo Rossi. O religioso, após falecimento do ator, disse à imprensa que nunca discriminou Lafond. Para muitas pessoas próximas a Jorge Lafond, no entanto, esse episódio, ocorrido em 2002, desencadeou um processo depressivo, culminando em um infarto seguido de falência múltipla dos órgãos que o levou à morte, em janeiro de 2003, quando tinha 50 anos. Mas na memória dos fãs, permanece a bem humorada frase da intempestiva Vera Verão: “Êeeepa, bicha não! Eu sou uma quase mulher!” Novaes

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le não militou na causa LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e travestis), mas conquistou visibilidade na grande mídia por ser negro, homossexual e humorista que interpretou travestis em programas de TV nas décadas de 1980 e 1990. O ator Jorge Lafond ficou nacionalmente conhecido pela personagem Vera Verão, interpretada por dez anos no programa A Praça É Nossa, no SBT. Por mais que suas atuações tenham reforçado o estereótipo acerca do homossexual, pode-se dizer que foi ousado e pioneiro por interpretar uma travesti negra e conquistar a simpatia de setores mais conservadores da sociedade.

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sexo e saúde

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a edição de janeiro deste ano, abordamos a necessidade de realizar, em locais públicos e especializados, testes para descobrir se temos alguma doença sexualmente transmissível ou algum tipo de hepatite viral. Nos Centros de Testagem e Acolhimento, existentes em todo o País, é possível ficar sabendo disso, por meio de um rápido exame de sangue. Para realizar o teste, no entanto, é necessário que a pessoa que transou sem camisinha procure um CTA depois de passados 30 dias da relação sexual de risco. É o que os especialistas chamam de janela imunológica, tempo mínimo possível para identificar no organismo anticorpos para o vírus HIV. Para continuar a conversa que iniciamos na edição de janeiro, a coordenadora do Programa DST/aids do município de Andradina (SP) volta a responder questões sobre vulnerabilidade na prática sexual. Confira!

Alcebino Silva, Virajovem de Sud Mennuci (SP)*

Qual a janela imunológica para o vírus HIV? Há discordâncias sobre isso no meio científico? O período de janela imunológica é de 30 a 60 dias, variando até 180 dias conforme o caso, mas há notas de acompanhamento de até seis meses conforme a necessidade. Desconheço discordâncias. Que estratégias podem ser viabilizadas para reduzir a infecção entre gays, especialmente jovens de 18 a 24 anos? A estratégia existente é a oferta dos insumos, como preservativos e gel lubrificante nas unidades de saúde, além de oficinas sobre sexo seguro, campanhas de conscientização e adesão ao tratamento. Muito importante e que deveria ser realizada pelos governos são as campanhas na grande mídia. Faltam políticas públicas para o enfrentamento da epidemia do vírus HIV. Como deveriam ser as campanhas nacionais? Reforçadas, com atualização de dados, mostrando que não somente os jovens homossexuais estão expostos aos riscos e sim toda a população desprevenida e desatualizada sobre o assunto HIV/ aids. A informação ainda é a melhor prevenção.

Mande suas dúvidas sobre Sexo e Saúde, que a galera da Vira vai buscar as respostas para você! O e-mail é redacao@viracao.org

*Virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

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Revista Viração • Ano 12 • Edição 105


Delícia do Pampa Gaúcho Feito com charque ou carne seca, o arroz carreteiro pode utilizar sobras de churrasco em seu preparo Evelin Haslinger e Mônica Oliveira, do Virajovem, Porto Alegre (RS)*

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gaúcho tem suas preferências: além do chimarrão e do churrasco, adora um arroz carreteiro. Para conhecer a origem desse prato, originalmente feito com arroz e charque (típica carne salgada e seca ao sol), é preciso mergulhar na história da formação do Rio Grande do Sul, já que ele é presença marcante desde a época do povoamento. Conta a história que, a partir do século 18, os tropeiros e carreteiros percorreram o Estado conduzindo tropas de cavalos ou gados e alimentos entre a região de produção e o centro de consumidores. A alimentação desses viajantes era simples e fácil de preparar no meio da viagem. Contava com feijão preto, toucinho, café e o arroz com charque, que recebeu o nome de arroz carreteiro. Os anos passaram e o arroz se espalhou por diversas regiões do País ganhando outros temperos e versões. Hoje, é muito comum a família se reunir para preparar o tradicional arroz carreteiro com charque, aproveitando até mesmo as sobras de churrasco ou outro tipo de carne. Bom apetite, guris e gurias! Esperamos que gostem da receita!

Ingredientes Óleo ou azeite de oliva; 400 gramas de charque (ou carne de sol). Pode-se também aproveitar a carne que sobrou de um churrasco do dia anterior; 1 cebola; Salsa e tempero verde; Sal a gosto; Extrato ou molho de tomate; 2 tomates; 1 xícara de arroz; Água.

Modo de preparo

Em uma panela, coloque a cebola picada com sal, tempero verde e salsa. Pode acrescentar outros temperos de sua preferência e da sua região.

*Uma das virajovens presentes em 20 Estados do País e no Distrito Federal

Frite-os e acrescente o tomate e extrato ou molho de tomate. Misture bem e junte o arroz. Nesse momento, adicione água até dobrar o volume da panela. Quando ferver, coloque a carne cortada em tiras.


parada social

Conquistando as Nações Unidas

A associação Bué Fixe é mencionada em relatório das Nações Unidas pelo trabalho desenvolvido na área da prevenção e sensibilização sobre HIV/aids Ajala Carvalho e Dynka Amorim, do Virajovem Amadora, Portugal onde ganhou grandes dimensões e atinge não só o continente africano, mas deixa rastro também pela Europa. A Bué Fixe tem como objetivo principal promover a participação ativa e crítica dos jovens em todas as instâncias responsáveis pela definição de políticas ou iniciativas que, direta ou indiretamente, os afetam. Por intermédio desse programa, em 2012, a associação recebeu a indicação da Fundação Mundo Digital (Itália) para a indicação conjunta da Bué Fixe com os Cidadãos do Mundo, para o prêmio internacional Global Júnior Challenge, na categoria de “uso de novas tecnologias de informação e comunicação para a inclusão de imigrantes e refugiados”. As ações desse programa têm sido apoiadas pela Fundação MTV Staying Alive, MTV Linked pela Solidariedade, Cidadãos do Mundo, Câmara Municipal de Amadora, Junta de Freguesia da Falagueira, Coordenação Nacional para a Infeção HIV/ aids e Fundação Portugal-África.

Ação de sensibilização sobre aids numa universidade de Lisboa, Portugal

Arquivo Bué Fixe

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programa Mídia Jovem, Nossa Resposta ao HIV/aids, iniciativa da associação afroportuguesa Bué Fixe, foi distinguido como boa prática no Relatório Mundial da Juventude das Nações Unidas. A iniciativa propõe o uso de ferramentas de informação e comunicação para promover o direito à comunicação e serviços de sensibilização sobre doenças sexualmente transmissíveis desde 2009, em Portugal. No ano 2013, o tema do documento foi migração jovem e desenvolvimento, oferecendo uma perspectiva multidimensional das experiências de vida dos jovens migrantes e dos jovens afetados pela migração. Para isso, aborda a questão sob um ponto de vista jovem, incluindo suas perspectivas e preocupações sobre migração, com base nas suas próprias experiências e testemunhos. A Bué Fixe é uma associação de jovens com origens nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa, formalizada juridicamente em agosto de 2010. A associação nasceu em São Tomé e Príncipe, em setembro de 2003, por um grupo informal de jovens, que criou também uma mídia impressa com o nome Revista Bué Fixe. Mais tarde, o projeto foi trazido para Portugal,


Arquivo Bué Fixe


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