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Peru +51 destino urbano-gastronĂ´mico
Cinco cidades, cinquenta e uma experiĂŞncias para viver Arequipa Cusco Iquitos Lima Trujillo
desfrutar percorrer descobrir compartilhar olhar rir
Peru +51 destino urbano-gastronômico Uma publicação da Comissão de Promoção do Peru para a Exportação e o Turismo (PROMPERÚ) Rua Uno Oeste nº 50, 14º andar, Urb. Córpac, San Isidro, Lima - Peru Telefone: (+51-1) 616-7300 www.promperu.gob.pe © PROMPERÚ. Todos os direitos reservados. Distribuição gratuita. Feito o Depósito Legal na Biblioteca Nacional do Peru N° 2019-XXXXX Impressão: XXXXXXX Lima - Dezembro de 2019 Edição Geral: Manolo Bonilla Design: Icono Comunicadores Correção de estilo: Milagros Bustamante Coordenação: Katherine Castañón / Cecilia Soto / Sofía Kato Por PROMPERÚ: Subdireção de Promoção do Turismo Receptivo, Departamento iPerú e Departamento de Produção Gráfica e Audiovisual da Subdireção de Produção
-Os artigos e recomendações contidos nesta publicação refletem a opinião de seus autores.-
O Peru +51, como o código internacional, contém 51 dados sobre cinco cidades do Peru: Lima, Arequipa, Cusco, Trujillo e Iquitos. Esta primeira seleção reúne o melhor que elas têm para oferecer em história, gastronomia, cultura viva, design e arte. Esta maneira de narrar as cidades não teria sido possível sem os dateros (autores especializados). São personagens que vivem (ou que definiram sua obra e trabalho) nessas mesmas cidades. São artistas, designers, arquitetos, músicos, empresários, historiadores, escritores. Cada um viveu e conheceu a cidade à sua maneira: íntima, intensa, profunda. Pedimos a eles informações sobre suas respectivas cidades e agora compartilhamos essas resenhas, lembranças, saudades e recomendações com os leitores.
É certo. O que a Wikipédia diz não é exato, não alcança, não consegue compreender o que contém mais de um milhão de quilômetros de extensão e muitos outros séculos de cultura pré-hispânica. O poeta grego Constantine Cavafis, sempre citado para falar sobre nostalgia e cidades, não poderia estar mais certo como desta vez. Bem, esse verso se encaixa perfeitamente nas cinco cidades desta publicação. Ele diz algo assim: “Não encontrarás outra terra nem outro mar. A cidade irá sempre contigo. Voltarás às mesmas ruas”. Como definir um país? Os almanaques mundiais nos levaram a pensa-los como uma soma de números, estatísticas e porcentagens. No entanto, essa é a superfície: um número não comunica emoções nem sentimentos. Os viajantes de hoje procuram histórias, certezas e descobertas. Bem, os passeios que eles fazem em uma cidade estrangeira são passeios originais, onde a surpresa espera em cada esquina, em cada restaurante, em cada museu, em cada galeria de arte.
GUIA DE LEITURA Durante a década de 1990, uma saga de romances e relatos épicos seduziu toda uma geração de leitores que não tinham seguidores nem likes nas redes sociais. A trama poderia ocorrer em um reino medieval, em uma estação espacial ou nas ruínas de uma civilização perdida. Isso não importava muito. A coisa realmente cativante era o livre arbítrio. Depois de ler um capítulo, o leitor podia decidir as ações imediatas do protagonista: entrar na caverna recém-descoberta ou retornar ao barco para avisar ao restante da tripulação. Existiam finais distintos que se desprendiam daquelas encruzilhadas. A leitura dependia de um e saltava de um lado para o outro ao longo do livro. Essa dose de nostalgia hoje é chamada de hiperlink. Mas, no Peru +51, apenas ao voltar à página, gostaríamos de manter
essa dinâmica de leitura “noventista”. Você pode navegar pela gastronomia nikkei em Lima e logo entender as possibilidades dos peixes de rio sobre uma churrasqueira em Iquitos. Você pode aprender sobre as fibras de alpaca em Arequipa e, minutos depois, ler sobre escolas de navegação em Trujillo. Você pode descobrir que também existem Picanterías em Cusco e descobrir a arquitetura de azulejos em Iquitos durante a era da borracha. Você decide a aventura.
Manolo Bonilla
+51 Editor
Arequipa_ Cusco_ Iquitos_ Lima_ Trujillo_
1._ +51 Arequipa 2._ +51 Cusco 3._ +51 Iquitos 4._+51 Lima 5._ +51 Trujillo D1._A continuidade da cultura D2._Cores da Colônia D3._Saúde com Pisco D4._Do alto D5._Pensando Lima D6._Direto do mar D7._Bendita seja a arquitetura D8._Huacas para a eternidade D9._Chimú em seu labirinto D10._ Modernidade nos Moches D11._De bike D12._Cinema com vista para o mar D13._ Paredes que falam D14._Selva ilustrada D15._De noite em Iquitos D16._Evolução nikkei D17._Balcões magníficos D18._Um cafézinho? D19._ O mundo no umbigo D20._Grãos, aroma e café D21._A chicha e o batán D22._Histórias e rincões de Arequipa D23._ A cozinha amazônica hoje D24._Peixes de rio em brasas D25._Azulejos em Iquitos D26._Design, corte e concepção D27._ Fibras de luxo D28._Onde eu compro? D29._Bairros Arty D30._O rio oculto de Trujillo D31._Um homem e sua cidade D32._Rico Norte D33._Entre mosteiros D34._Conversas com a história D35._Ascendência vulcânica D36._Vargas Llosa da raiz D37._Barroco andino D38._Entardeceres na praça D39._Dos Wemblers a Juaneco D40._Encontros com a natureza D41._Só em Cusco D42._ Movida Cusqueña D43._Casas revitalizadas D44._Lenços brancos D45._Cavalos de terra e mar D46._Picanterías no império D47._ Ande e religião D48._Qual o som de uma cidade? D49._Fazer o mercado D50._Feiras e festivais na cidade D51._Coma e ponto.
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NOSSOS DATEROS
Um dado é a unidade mínima de informação especializada. Um datero (autor especializado) possui, pelo menos, um dado. Esses personagens têm mais de um. Pedro Pablo Alayza Historiador de arte, curador e atual diretor do Museu Pedro de Osma. Foi gerente de cultura da Prefeitura de Lima e é autor de diversas publicações sobre história, arte e ilustração arqueológica.
Isabel Álvarez
Socióloga e chef. Além de ser a dona do restaurante El Señorío de Sulco, foi a diretora de pesquisa para o livro “Picanterías e chicherías do Peru”.
Susana Baca Cantora, vencedora de dois Grammy Latinos. Além disso, é pesquisadora da tradição musical afro-peruana no Peru. Lançou 13 álbuns como solista.
Gonzalo Benavente
Cineasta peruano. É diretor do filme “Rocanrol 68”, que participou da 17ª edição do Festival de Cinema de Lima em 2013.
Jorge Eduardo Benavides Escritor de Arequipa, vencedor de vários prêmios literários, incluindo o Prêmio Fernando Quiñones de Novela 2018. Este ano, publicou “O colar dos Balbases”, romance histórico com viés policial.
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Christian Bendayán
Pintor de Iquitos. Criador do projeto de pesquisa, gestão e promoção de arte amazônica Bufeo. Amazônia+Arte. Foi o artista de “Índios Antropófagos”, instalação que abriu no pavilhão peruano da Bienal de Veneza 2019.
Manolo Bonilla
Jornalista e editor. Publicou na antologia de ativistas do continente, “América Latina se move”, publicado pela Hivos. Há quatro anos, escreve perfis de chefs e personagens vinculados à gastronomia.
Santiago Bullard
Jornalista e viajante. Apaixonado pela vida selvagem e o meio ambiente. Trabalhou em projetos audiovisuais e educacionais em várias comunidades nativas e rurais do Peru.
Gerardo Chávez
Artista plástico de Trujillo, criador da primeira bienal de arte de sua cidade. Além disso, é o fundador do Museu do Brinquedo e do Museu de Arte Moderna de Trujillo.
Víctor Corcuera Cueva
Arqueólogo de Trujillo. É autor de diversas publicações sobre arqueologia e turismo, e
também trabalha como guia no complexo arqueológico de Chan Chan.
Alonso Cueto Escritor e membro da Academia Peruana da Língua. Em 2019, publicou “La Perricholi. Rainha de Lima”, romance histórico baseado na vida da cantora e atriz Micaela Villegas.
Sonia Cunliffe Artista plástica e diretora do projeto Fugaz - Callao Monumental. Entre suas mostras recentes se destacam “Documentos Extraviados: crianças de Chernobyl em Cuba” e “Fotografia Indelével: o imaginário de Teodoro Bullón Salazar”.
Sofía Dávila
Bailarina de Trujillo. No 58º Concurso Nacional de Marinera, realizado na cidade de Trujillo, em 2018, ficou com o título de Campeã Nacional de Marinera.
Manuel De Rivero Arquiteto e urbanista pela Universidade Ricardo Palma. É fundador do coletivo Supersudaca Holanda e 51-1 Arquitetos. Ganhou o primeiro prêmio no concurso para o design do Museu de Arte Moderna de Medellín (2015).
Ángela Delgado
Gestora cultural. Atualmente, se dedica como diretora do “Hay Festival no Peru”, com sede na cidade de Arequipa.
Adriana Doig
Gestora cultural. Foi diretora de diversos projetos vinculados ao patrimônio e às artes na cidade de Trujillo. Foi diretora do Centro Cultural do Ministério da Cultura.
Dayanna Farfán Mãe de gêmeas, engenheira de sistemas e fotógrafa amadora. Administra a comunidade do @igerscusco desde o ano 2012. Encontrou uma maneira de mostrar Cusco ao mundo.
Mónica Huerta
Picantera arequipeña. Atualmente, é a dona de La Nueva Palomino, Picantería tradicional localizada na cidade de Arequipa.
Israel Laura Cozinheiro peruano com 18 anos de experiência em diversas cozinhas da Catalunha, País Basco e Lima. Chef de Kañete e condutor do programa “Com sabor a Perú”.
Talía Lostaunau Estudou engenharia florestal na Universidade Nacional Agrária La Molina. Sua tese foi um plano interpretativo para uma Área de Conservação Privada no norte do Peru. Desde então, tem trabalhado em projetos participativos relacionados com a conservação, o ecoturismo, a silvicultura e a agricultura.
Ricardo Mares
Esportista e publicitário. Além de ser um grande fã de voos de parapente, ganhou o Gold & Grand Prix no Festival Cannes Lions 2014.
Adriana Scaletti Arquiteta e historiadora da arte, com estudos especializados em restauração de monumentos e gestão cultural. Atualmente, é professora da Pontifícia Universidade Católica do Peru.
Rafo Ráez
Músico e antropólogo. Desde 2013, fez parte do projeto “Huacas, borbulhas e rock’n’roll”, cujo objetivo foi dar um novo valor a esses espaços arqueológicos a partir de uma sensibilidade moderna.
Chiara Macchiavello
Sergio Rebaza
Juan Ricardo Maraví
Gustavo Rodríguez
Artista, designer de moda e empresária. É a criadora da Escudo, marca de roupas que trabalha em associação com artesãos de diversas regiões do Peru.
Atual diretor do selo musical peruano Infopesa, fundado por seu pai Alberto, em 1971. Desde 2011, resgata gravações musicais nacionais de cumbia, bolero, balada e salsa em formato de vinil, CD e plataformas digitais.
Paola Miglio Jornalista especializada em temas de gastronomia. Crítica de restaurantes. Coeditora do livro “Peru, o prazer é nosso”.
Gustavo Montestruque
Estudou na Le Cordon Bleu Peru. Trabalhou em restaurantes em Lima e Punta del Este. Fez um estágio no El Celler de Can Roca. Há dois anos, trabalha com Gastón Acurio no La Mar Cebichería, em Lima e Buenos Aires.
Pepe Moquillaza “Narrador de histórias líquidas” nascido em Ica. É criador de Pisco de uvas quebranta e dono de MiMo Wines, junto com o argentino Matías Michelini. Desde 2016, é embaixador da Marca Perú para o Pisco.
Mirella Moschella Documentarista de arte urbana e gestora cultural. Busca criar um registro das manifestações artísticas que se desenvolvem no espaço público. Gerenciou quatro festivais de arte urbana em Lima.
Claudia Otero
Geógrafa e empresária. Limeña de sangue Loretana porque viaja constantemente entre Iquitos e Lima. Seu pai fundou o restaurante Fitzcarraldo no ano 2000.
Diego Pereira
Jornalista de Trujillo. Foi redator em vários veículos nacionais, entre eles Espacio 360, Perú 21 e Revista 15 Minutos.
Boris Pretell
Arquiteto. Desenvolve junto com Martín Reátegui uma pesquisa sobre os monumentos arquitetônicos da época da borracha em Iquitos, cuja primeira etapa se encontra no aplicativo Iquitos Monumental.
Jornalista e ciclista. É diretor do LIMAP, uma coleção de mapas e guias que propõem formas alternativas para conhecer e descobrir a capital peruana.
Escritor de Trujillo. Finalista do Prêmio Planeta 2009. Seu romance mais recente, “Madrugada”, foi publicado em 2018.
Pedro Miguel Schiaffino Cozinheiro, pesquisador e promotor da Amazônia. Estudou no Culinary Institute of America, em Nova York, e no Italian Culinary Institute for Foreigners. Abriu os restaurantes Malabar (2004) e Ámaz (2012).
David Torres
Filósofo e empresário. É o criador de Arábica Espresso Bar, e um dos pioneiros no aprimoramento do café peruano para o consumo local, sobretudo em Lima.
Mitsuharu Tsumura Depois de estudar Artes Culinárias e Administração de Alimentos e Bebidas em Rhode Island, viajou a Osaka para especialize-se em cozinha japonesa. Abriu o restaurante Maido, em 2009, em seu regresso a Lima, publicou o livro “Nikkei es Perú” e chegou ao topo da lista dos 50 Melhores Restaurantes da América Latina, em 2017.
Giuliana Vidarte Historiadora da arte, curadora e pesquisadora. Participou do International Curator Course da Bienal de Gwangju (Coreia do Sul), em agosto de 2014. Atualmente, é chefe de Curadoria e Exposições do MAC Lima e assistente curatorial do pavilhão peruano na 58ª Bienal de Veneza 2019.
María Alejandra Vizcarra
Gerente Comercial da KUNA, marca de moda especializada na elaboração de peças de vestuário a partir das fibras dos camelídeos andinos.
Luis Eduardo Wuffarden
Historiador e crítico de arte. É membro do Instituto Riva-Agüero, do Comitê Cultural do Museu de Arte de Lima e membro honorário do Instituto de Pesquisas Museológicas e Artísticas da Universidade Ricardo Palma.
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Mosteiro de Santa Catalina © Enrique Castro-Mendívil / PROMPERÚ
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AREQUIPA
À primeira vista, pode-se pensar que Arequipa emergiu da própria terra. Talvez seja por causa da forma, tão peculiar, como suas construções se complementam com a paisagem que a rodeia. Trata-se, afinal, de uma cidade de caráter vulcânico, construída em grande parte com a pedra branca de sillar e cercada por três vulcões. Os pampas que a cercam continuam sendo o lar de vicunhas e alpacas, camelídeos dos quais é extraída uma das fibras de origem animal mais finas do mundo, e estão limitados por cânions profundos e montanhas imponentes. Essa solidez é a que se encontra, também, no caráter da cidade. Vemos Arequipa com suas construções monumentais, nas igrejas e mosteiros que, graças ao seu design antissísmico, permanecem como um testemunho concreto de seu passado colonial. Esse patrimônio, cuja síntese é expressa em seu centro histórico, a levou a ser considerada como Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO. Além disso, vemos isso em sua gastronomia, nas raízes firmes das tradições saboreadas nas Picanterías, nas receitas herdadas de geração em geração. Manifestações de cultura viva que possuem os guardiões mais rigorosos da Sociedade Picantera de Arequipa.
Lima
Arequipa
E, apesar de tudo, Arequipa não sobrevive como um anacronismo, uma vez que em suas ruas também se respira a inconfundível brisa da modernidade, que convive com a herança de seu passado histórico. Isso é o que vemos em sua vida cultural ativa, na proposta de alguns de seus museus, na presença de um evento literário tão importante quanto o “Hay Festival”, sediado aqui no Peru. Uma cidade andina que explode em sua própria calma, a mesma que se expressa em seus campos tranquilos. Como o topo nevado do que, no fundo, é um vulcão.
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CUSCO
A antiga capital dos incas hoje é uma cidade andina cosmopolita. Por acaso, o destino mais visitado por milhares de viajantes de todo o mundo seja, ao mesmo tempo, emocionalmente vibrante. Referimo-nos ao movimento e às vibrações de suas tradições e costumes, tão latentes que cativam. São técnicas milenares que ainda se aplicam aos seus têxteis (como os teares andinos e a estética inca incorporada em peças contemporâneas), aos seus artesanatos (um passeio pelo bairro de San Blas oferece um bom panorama de trabalhos manuais em pintura e cerâmica) e suas receitas culinárias (a Pachamanca, essa cozinha ao calor de pedras ardentes no subsolo ou suas Picanterías imortais). Sua conexão com a natureza ainda é vigente: se durante o tempo dos incas, havia homenagem à Pachamama, ou Mãe Terra, como doadora dos alimentos; agora, os novos empreendimentos se baseiam em pesquisas que respeitam o meio ambiente: de cafeterias até restaurantes na cidade, que aproveitam o melhor da despensa andina.
Cusco
Lima
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Cusco é, além disso, sincretismo cultural, o resultado de um encontro entre duas maneiras de ver a espiritualidade: ocidental e andina. Essa colisão iluminou manifestações que enriqueceram sua identidade: as construções coloniais e os conventos religiosos no centro histórico são, hoje, ocupados por pousadas boutique e redes de hotéis de prestígio. Cusco, conhecido como o Umbigo do Mundo na cosmovisão inca, também é, obviamente, monumental por conta das emblemáticas construções arqueológicas que lhe proporcionaram ser Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, em 1983.
Igreja da Companhia de Jesus na Praça de Armas de Cusco © Miguel Mejía / PROMPERÚ
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Praça de Armas de Iquitos © Juan Puelles / PROMPERÚ
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IQUITOS
Do céu, quando o avião está prestes a pousar, a capital de Loreto parece cercada por uma cobra longa, de corpo ondulado e sinuoso. São os rios da Amazônia suas verdadeiras fronteiras naturais e, ao mesmo tempo, as vias pelos quais comunicam sua cultura: da cidade para suas comunidades e vice-versa, no tráfego contínuo de alimentos, cosmovisões, frutas, estéticas, arte. Os tripulantes a bordo das embarcações que chegaram aos seus portos por mais de um século, sejam grandes navios ou pequenos barcos de madeira (que chamam “pequepeque”), foram abraçados e surpreendidos por sua exuberância natural. Os viajantes sempre foram seduzidos por essa imensidão verde: de biólogos e cientistas do século XIX a escritores românticos do início do século passado, de cineastas modernos como Werner Herzog a músicos lendários como Mick Jagger.
Iquitos
Lima
Seu clima tropical e sua inacessibilidade do resto do país (só se chega de avião ou através de uma longa viagem rio acima) lhes deram essa atmosfera de selva para ser explorada. No entanto, Iquitos não só possui essa frondosidade e essa longa extensão de seus rios (que hoje é aproveitada no percurso de imponentes cruzeiros de luxo), como também as construções de azulejos são testemunhas de um período de prosperidade no início do século XX e também de fragilidade devido à ganância da borracha. Porque Iquitos também são seus artistas e músicos, que souberam retratar esse imaginário de sua época: de visões naturistas, psicodélicas, explosivas, ancestrais, históricas e sensuais. Parte dessa herança cultural foi exposta e interpretada pelo artista iquiteño Christian Bendayán, quando inaugurou o pavilhão peruano na Bienal de Arte de Veneza 2019. Uma selva que palpita e nos fala sobre a importância de sua conservação como despensa da biodiversidade da humanidade.
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Peru
+51 LIMA
Há muitas Limas dentro de Lima. Cada cidadão e visitante tem a sua. A capital que olha para o mar. A patrimonial, a histórica, a milenar. A do malecón (calçadão sobre as falésias), a das huacas (lugares sagrados). A dos murais e a de suas cozinhas. Descubra a sua.
Lima
Já foi dito que Lima é a capital gastronômica da América Latina; que seus restaurantes conquistam foodies e encabeçam as listas internacionais; que há muito tempo, no início da Colônia, foi a Cidade dos Reis; que seu centro histórico, designado como Patrimônio Mundial pela Unesco, tem uma concentração intensa de igrejas coloniais e edifícios republicanos que emocionam por sua arquitetura; que é uma cidade de contrastes em cada esquina; que tem um passado milenar, evidente nas huacas espalhadas pela cidade que, além disso, recordam no meio de tanto cimento e edifícios altíssimos, que é uma capital com memória; que se come deliciosamente em mercados, huariques ou em espaços de alta cozinha; que os oito quilômetros de malecón (calçadão sobre as falésias) de Miraflores, entre parques e jardins, são o epicentro de vida saudável ao ar livre para centenas de pessoas; que seus cidadãos podem descer até as praias da Costa Verde depois do almoço, ou voar de parapente de cima do penhasco, como quem foge das rotinas urbanas, porque seu clima é indecifrável como amável; que seus artistas, os que estão e os que não estão, fizeram dela sua em museus, galerias e em murais; que admiram seus cozinheiros da mesma forma que estrelas do futebol; que seus escritores conspiraram avenidas, paisagens e espaços em páginas imortais. Animada, movimentada, divertida, aproveitável, ancestral, gastronômica, multicultural. Essa é a Lima de hoje, respeitosa de sua tradição, ciumenta com sua história. Sejam todos bem vindos.
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Chafariz da Praça de Armas de Lima © Gihan Tubbeh/PROMPERÚ
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Palácio Municipal de Trujillo na Praça de Armas da Cidade © Renzo Tasso / PROMPERÚ
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TRUJILLO
A vida cultural, e até certo ponto também a vida urbana, é definida por sua própria história. A própria identidade desta cidade é herdeira de múltiplas tradições. Alguns delas são de origem pré-colombiana: as culturas Moche e Chimú, cujo legado tangível se encontra em sítios arqueológicos como as Huacas del Sol e de la Luna ou Chan Chan, assim como nos caballitos de totora embarcações feitas de junco usadas por alguns pescadores para entrar em alto mar. Outras, no entanto, vêm dos tempos da colônia. Trujillo foi uma das primeiras cidades que os espanhóis fundaram no Peru e, na verdade, leva o nome da cidade que viu nascer o conquistador Francisco Pizarro. Os casarões imponentes que moldam seu centro histórico são um lembrete desse importante capítulo de sua história. O resultado de tudo isso é uma cidade, chamada de eterna primavera pelos benefícios de seu clima, que tem feito do sincretismo em uma bandeira, da fusão de culturas uma característica de sua personalidade. Prova viva disso é a Marinera Norteña, onde danças e músicas de origem espanhola se abraçam com as culturas locais, a vida do campo e os ritmos afro-peruanos. Ou o cavalo de passo peruano, descendentes dos cavalos que chegaram da Europa muitos séculos atrás, e cujo cavalgar característico é o resultado de uma adaptação aos terrenos duros do deserto, aos seixos e às montanhas.
Trujillo
Lima
E a lista continua, traçando linhas que vão da iconografia dos Moches às obras de seus artistas contemporâneos, das origens marinhas e campestres de sua gastronomia ao ritual de lanches em suas casas de chá, entre o fértil vale do rio Moche e o mar que banha as margens de seus balneários.
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LIMA Curadoria de museus em Lima graças à artista e diretora do projeto Fugaz, Sonia Cunliffe
A CONTINUIDADE DA CULTURA Arte e arqueologia em cinco museus imperdíveis
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Museu Larco
Museu de Arte de Lima (MALI)
www.museolarco.org
www.mali.pe
O mais impactante talvez seja o seu arquivo, aberto ao público, onde está guardada uma enorme coleção de peças arqueológicas. Ao entrar nesse espaço, é possível compreender a magnitude da produção dessas culturas pré-colombianas, enquanto se caminha entre as 30 mil peças que se encontram armazenadas ali. Sem contar que foi o primeiro museu na América Latina a publicar seu catálogo on-line, para que possa ser revisado por pesquisadores de todo o mundo. Vale, também, fazer uma parada na Sala Erótica, onde estão expostas peças que representam diferentes expressões, símbolos e práticas sexuais. Chama a atenção o espaço dedicado ao corpo feminino e a maternidade: uma coleção de huacos e cerâmicas que refletem a forma pela qual algumas culturas pré-colombianas (como Moche, Nasca ou Lambayeque) se relacionaram com a concepção de uma nova vida e a criação de seus filhos nos primeiros meses de vida.
Este museu guarda uma parte importante das expressões culturais e artísticas do Peru, ao largo de três mil anos de história. Suas diversas salas estão dedicadas a exibir tanto peças arqueológicas como obras de arte, em uma abrangência que começa antes da fundação do país e chega até os trabalhos de importantes artistas atuais. Das instalações de Juan Javier Salazar (“El último cuartucho”, 2005), pinturas emblemáticas da Escola Cusqueña (“La Trinidad Entreonizada como tres figuras iguales”, 1720-1740), até a monumental obra de Luis Montero (“Los funerales de Atahualpa”, 1867), em harmonia com mantos com desenhos bordados da cultura Paracas (100 a.C. a 100 d.C.). Nas Salas de Exposição Permanente são exibidas quase 1.200 peças. No MALI, além disso, são realizadas importantes mostras temporárias como “Eguren, fotógrafo”, do poeta peruano José María Eguren. Ou a peça audiovisual “Atlas”, do artista mexicano Pablo Vargas Lugo. Faça um tour pela Sala de Fotografia, no segundo andar, que oferece desde os daguerreótipos de Maximiliano Danti até as imagens do fotógrafo nascido em Puno, Martín Chambi, pioneiro em retratos no Peru.
Endereço: Avenida Bolívar 1515, Pueblo Libre. Horário: de segunda a domingo, das 9h às 22h
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Museu de Arte Contemporânea © Musuk Nolte / PROMPERÚ
Endereço: Paseo Colón 125, Parque de la Exposición, Centro de Lima. Horário: terça a domingo, das 10h às 19h; e sábados, até às 17h.
3 Museu de Arte Contemporânea (MAC) www.maclima.pe Este é um museu de ares marcadamente modernos, que enfatiza a importância de interação com as pessoas para a transformação da arte e da sociedade, sobretudo através de suas oficinas educativas inestimáveis. Conta com uma interessante coleção de arte contemporânea nacional, com obras de artistas peruanos como Fernando de Szyszlo, José Tola ou Enrique Polanco. No MAC também são realizadas importantes exposições temporárias, e é uma grande plataforma para apreciar o trabalho de vários artistas internacionais através de diferentes suportes (ver item 3). No terraço com vista para o seu enorme jardim há uma cafeteria, La Bodega Verde, ideal para se despedir do dia com uma infusão de ervas andinas, quando terminar a visita. Endereço: Horário:
Avenida Grau 1511, Barranco. terça a quinta, sábado e domingo, das 10h às 18h Sexta-feira, das 10h às 20h Museu MATE © Leslie Searles / PROMPERÚ
4 Museu Amano www.museoamano.org Desde a sua fundação, há 52 anos, tem difundido uma das coleções mais completo de tecidos pré-hispânicos. Tem uma grande coleção de peças, provenientes de várias culturas pré-colombianas, como Chavín, Nasca, Moche ou Inca. Também conta com uma Sala de Matérias Primas e Ferramentas Têxteis que permitem ter uma ideia de como trabalhavam os artesãos dessas civilizações e como se relacionavam com os diversos símbolos de suas sociedades. Endereço: Rua Retiro, 160, Miraflores. Horário: segunda a domingo, das 10h às 17h
Museu de Arte de Lima © Musuk Nolte / PROMPERÚ
5 Museu Mario Testino (MATE) www.mate.pe É um olhar particular sobre a fotografia de Mario Testino. De sua coleção, vale destacar a sala dedicada à princesa Diana, da Inglaterra, bem como as fotografias com vestimentas típicas cusqueñas, realizada sobre fundos inspirados por esse outro grande fotógrafo peruano Martín Chambi. Também é possível visitar a vinícola MATE, uma loja conceitual cujos produtos combinam arte e design: de roupas e tecidos de Escudo (Peru) aos de Yasuzi (Venezuela), de inspiração nativa amazônica, bem como acessórios de designers nacionais, como Meche Correa, e joias da colombiana-paquistanesa Aysha Belgrami. Endereço: Avenida Pedro de Osma, 409, Barranco. Horário: terça a domingo, das 10h às 18h30
Totem de madeira no Museo Larco © Manuel Medir / PROMPERÚ
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LIMA Seleção do historiador de arte e diretor do Museu Pedro de Osma, Pedro Pablo Alayza
CORES DA COLÔNIA
Cinco quadros do Museu Pedro de Osma para se aproximar da arte colonial peruana
para os propósitos da evangelização, pois o uso de motivos que podiam ser facilmente reconhecidos pelos locais, como as penas, facilitava a compreensão dos ensinamentos religiosos.
3— Arcanjo Arcabucero
Virgem com criança (1594-1604) © Museo Pedro de Osma
1— Virgem com criança
Um bom ponto de partida: não apenas por seu estilo, influenciado pelo maneirismo, mas também por sua autoria ser atribuída ao sacerdote espanhol Bernardo Bitti, membro da ordem jesuíta. Ele chegou ao Peru no século XVI e instalou sua oficina em Cusco, onde se tornou um dos mais influentes mestres europeus que chegaram a esta cidade. É considerado um dos fundadores da escola de pintura cusqueña.
Trata-se de uma iconografia estritamente local, que se difunde a partir de Cusco e do sul andino, e que, portanto, não está tomada por nenhum modelo estrangeiro. Mais uma vez, estamos diante de uma associação simbólica de elementos nativos e europeus. O arcabuz, por exemplo, usado pelos espanhóis na Conquista, é uma arma capaz de matar à distância e que emite um ruído tremendo. Por isso, está associado ao Illapa, uma divindade andina vinculada ao trovão e que anuncia as chuvas. Também o vemos, no caso das asas, semelhantes às dos pássaros que acompanham os guerreiros em muitas cenografias locais.
4— Retorno do Egito
Esta obra do século XVII está atribuída ao pintor indígena cusqueño Quispe Tito, que foi um dos autores mais famosos de sua época. Nela se pode apreciar, claramente, a
2— Virgem do Rosário de Pomapata
Esta pintura anônima, datada do século XVIII, mostra sinais claros de miscigenação. Este é um elemento central para entender a arte colonial como um produto em si, criado com base em princípios originários do Novo Continente, e não cair na armadilha de pensar que é apenas uma cópia ruim dos modelos europeus. O sincretismo foi uma ferramenta muito útil
Endereço: Avenida Pedro de Osma, 421, Barranco. Horário: de terça a domingo, das 10h às 18h Retorno do Egito (1679) © Museo Pedro de Osma
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influência da pintura holandesa, sobretudo em seus céus e paisagens, tipicamente flamencos. Deve-se notar também que, embora o colorido seja local, este autor usa como temas para esta e para muitas de suas outras pinturas, estampas e gravuras que vinham da Europa.
5— O casamento de Martín de Loyola com a ñusta Beatriz
Para captar a importância desta pintura, de autor anônimo, é necessário saber quem são seus protagonistas. Embora o quadro seja do século XVIII, nele se mostra a união de importantes personagens do século XVI, representantes tanto da nobreza inca como da elite jesuíta, que por sua vez simbolizam a aliança entre as tradições europeias e nativas. À esquerda, está Martín de Loyola, capitão do exército que derrotou os anfitriões de Túpac Amaru em Vilcabamba e sobrinho neto de San Ignacio de Loyola, o fundador dos jesuítas, casado com a princesa inca Beatriz. À direita, está Juan de Borja, neto de São Francisco de Borja, casado com a mestiça Lorenza. No centro, estão os dois santos jesuítas, e atrás é possível ver a nobreza inca e os poderes da Igreja.
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LIMA Paola Miglio Jornalista gastronômica. coeditora do livro “Peru, o prazer é nosso”
SAÚDE COM
PISCO
Nosso destilado de mosto fresco de uvas pisqueras inspirou a criação de coquetéis clássicos que brilham nos bares de Lima Era o século XVI, e de uma pequena enseada ao sul de Lima, partiam jarros de barro cozido carregando em seu interior um destilado requintado que seria batizado com o mesmo nome do pequeno porto onde ele era embarcado. Esse porto era Pisco. Nosso destilado tem Denominação de Origem (DO) e compreende as regiões de Lima, Ica, Arequipa, Moquegua e Tacna (especificamente nos vales de Locumba, Sama e Caplina). Para elaborar um de qualidade se necessitava de uva de boa qualidade, uma das oito pisqueras aromáticas e não aromáticas (quebranta, negra, criolla, mollar, uvina, Itália, moscatel, torontel e albilla). Para cada litro entram, aproximadamente, oito quilos de fruta. Existem piscos puros, acholados e mosto verde. Isso permite experimentar em mixologia e marcar acentos distintos em coquetéis elaborados com o destilado.
Chilcano no bar Curandero © Karina Mendoza/ PROMPERÚ
1— Pisco Sour
Este delicado coquetel deve ser preparado na hora de ser servido, em coqueteleira e de forma individual. Atualmente, cada bar define suas próprias medidas, mas a 3-1-1 é a mais utilizada: três doses de pisco, uma de xarope e outra de suco de limão. As variedades de uva podem mudar, mas a uva quebranta segue sendo a favorita. O segredo, asseguram os que sabem, é trabalhar com pisco de qualidade e limões espremidos na hora.
2—Capitán
Um clássico da coquetelaria, recentemente recuperado e valorizado em restaurantes da capital. Surgiu na década de 1920 e se inspira em uma combinação perfeita: vermute vermelho e pisco. Sua receita adiciona cubos de bom gelo e nada mais.
3—Chilcano
Fresco e mutante. Sua versatilidade tem possibilitado múltiplas versões: de macerados com frutas como maracujá e fisális, até o uso de folha de coca ou especiarias. O original leva gelo, pisco, ginger ale, limão e amargo de angostura. Lembre-se sempre de que o Chilcano não é uma limonada, não se deve abusar do suco de limão; a ideia é que o pisco possa se expressar. Por isso, o melhor é introduzir uma fatia cortada na hora e uma lâmina da casca que libere lentamente seu aroma cítrico.
4—Pisco Punch
Abacaxi em cubos pequenos, açúcar, suco de limão, pisco, gelo, casca de abacaxi e uma cereja marasquino são os ingredientes para prepará-lo. Sua origem teria sido no salão Bank Exchange da rua Montgomery (San Francisco, Califórnia) no final do século 19, onde o barman Duncan Nicol o fez famoso. No entanto, anotações recentes indicam que sua origem teria sido anterior à fama que Nicol lhe deu, pois existem registros de intercâmbios anteriores. José Antonio Schiaffino, em seu livro “El Pisco Punch”, detalha que é um “ponche frio preparado à base de aguardente ou brandy que chegava dos nossos vales distantes do sul em seus frascos de barro peculiares e que, está provado, tinha o abacaxi como base do sabor ”.
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LIMA Sobrevoo de Ricardo Mares, publicitário, esportista e vencedor do Gold & Grand Prix no Festival Cannes Lions 2014
Costa Verde, Bajada de Armendáriz e falésias © Ricardo Mares
DO ALTO
Vistas aéreas da cidade a partir de um parapente Do céu, a cidade é outra. As características dos ventos marinhos que sobem da Costa Verde oferecem todas as facilidades para um voo simples e seguro, com o auxílio de um guia de voo habilitado. Quando esta atividade chegou ao Peru, na década de 1990, os aficionados costumavam pegar de um parque em San Isidro, mas hoje o principal ponto de partida está no Malecón de Miraflores, justamente ao lado do Parque do Amor, onde há muitos guias que oferecem seus serviços. Do céu, podem-se apreciar as paisagens oferecidas pela Bajada Balta, quase ao lado do ponto de decolagem, ou a Bajada
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de Armendáriz, um pouco mais ao sul. No caminho até lá, tornou-se uma tradição entre muitos parapentistas tirar uma foto com o reflexo das janelas de um hotel conhecido, em frente ao Larcomar. Se os ventos ajudarem, pode-se continuar até chegar ao bairro de Barranco para apreciar as vistas oferecidas por suas falésias e praias, além da casa do artista plástico Víctor Delfín, autor da escultura do casal no Parque do Amor, que se encontra ao lado de um penhasco. Se você está procurando uma experiência mais complexa, pode contratar um guia de voo para levá-lo de parapente sobre as Lomas de
Lúcumo, em Pachacamac. As correntes de ar quente permitem um voo mais interessante e comovente. A época ideal para sobrevoar esta área é entre os meses de outubro e novembro, quando o sol se põe nas encostas rochosas ainda cobertas de vegetação. O que deve ser levado em consideração, seja qual for a localização, é que os horários estão nas mãos da força e das características do vento. Em geral, o preço médio é em torno de US$ 80,00 por pessoa, e as melhores horas para praticar voo de parapente começam a partir do meio-dia.
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LIMA Ideias do arquiteto Manuel de Rivero
PENSANDO LIMA Uma reflexão arquitetônica sobre a evolução da cidade
Lima é um dos poucos lugares do planeta que tem sido continuamente habitado por mais de cinco mil anos. Portanto, pode ser vista nela toda a evolução da “cidade”, entendida como a grande invenção da humanidade. Desde a irrigação do deserto e a construção de pirâmides sagradas que deram origem às primeiras cidades, passando pelo planejamento com quarteirões quadrados, as grandes avenidas com bulevares e grandes parques, as unidades habitacionais modernas e urbanizações baseadas em automóveis, os bairros informais e os centros financeiros e de lazer globais. Isso me ajuda a entender o território de Lima assim, um modelo urbano no qual foram sobrepostos diferentes modelos de cidades.
A Lima pré-colombiana
Por exemplo, Paraíso, na foz do rio Chillón, é uma pirâmide com mais de quatro mil anos de idade. Ou Pucllana, pirâmide da cultura Lima, à qual pertenceram os construtores de canais que irrigaram o deserto por dois mil anos. Também Pachacamac, o grande oráculo dos ichmas, ou Puruchuco, grande palácio de adobe de um governador durante a ocupação inca.
Plaza de Armas de Lima © Christian Vinces / PROMPERÚ
A Lima 1.0 colonial
Em 1535, quando o espanhol Francisco Pizarro fundou a “Cidade dos Reis” (também conhecida como Lima), estimam-se que havia mais de 180 mil habitantes locais em seus três vales. Se instalou ali um novo modelo urbano de quarteirões que deu luz ao centro histórico de Lima com suas igrejas e conventos (ver item 7), e casarões com varandas e pátios como Torre Tagle; mas também se expressou em outras áreas do território limeño e começou a crescer.
A Lima 2.0 da modernidade
A inauguração da Praça San Martín por conta do centenário da Independência, em 1921, marca o início de uma nova cidade, juntamente com a construção de grandes avenidas arborizadas como a Arequipa, a criação do Parque da Reserva, em 1929,
o crescimento de bairros residenciais em Santa Beatriz. O auge de Miraflores e seu Parque Central, além do surgimento da residencial San Felipe, entre 1964 e 1966, sobre o que foi o espaço do hipódromo.
A Lima 3.0 contemporânea
O fluxo migratório de todos os cantos do Peru até Lima, no final do século passado, deu lugar a uma nova cidade que recentemente começou a se definir. Do empório comercial têxtil de Gamarra, à transformação de La Balanza em Comas como epicentro cultural do cone norte. Isso, ao mesmo tempo em que a influência da globalização produz espaços como o Centro Financeiro de San Isidro ou lugares de entretenimento como o Larcomar, no Malecón de Miraflores.
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LIMA Seleção cebichera do chef do La Mar, Gustavo Montestruque
DIRETO DO MAR
Evolução do conceito cebiche: o equilíbrio entre ácido e picante
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O de laranja azeda
Aparece o limão
No momento de servir
O primeiro prato que poderíamos chamar de cebiche aparece no século XIX. Hoje é difícil conseguir aquelas laranjas, com as quais maceravam o peixe. A fruta era muito mais ácida e tinha adstringência. Era um insumo do litoral, do norte de Lima. Usavam-se peixes azuis como o bonito.
Uma sensível mudança ocorre no início de 1900, quando se começa a usar o limão, devido à escassez de seu primeiro insumo. Fui um prato de pescadores, para fazer na hora de comer. Nas casas, a proteína permanecia muito tempo mergulhada em limão, para que a carne estivesse cozida de verdade. O suco de limão e o peixe se tornam brancos, quase fervidos. Nos mercados, hoje a fonte que contém os sucos, se inclina para que o peixe não fique em contato com o limão o tempo todo.
Pedro Solari entra em cena e gera uma mudança que aposta no frescor do prato. Foi tão revolucionário quanto a primeira pessoa que provou fritar um ovo. Seu valor era quebrar um esquema: não era a única maneira de comer o cebiche. Agora, o limão é espremido levemente, sem extrair os ácidos que podem amargar o suco.
http://www.summum.pe/categorias/ carne-pescado-y-mariscos/ https://www.theworlds50best.com/ latinamerica/en/list/1-50
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1. Cebiche de linguado © Adrián Portugal / PROMPERÚ 2. Pejerreyes ao ají amarillo © La Mar 3. Tiradito de truta © La Mar 4. Prancha anticuchera de polvo e lula © La Mar
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Começa a massificação
Estouro popular
Mega diversificado
Durante a década de 1980, se manteve o frescor e se incorporaram novos insumos, como o gengibre e o salsão, junto com o limão. Nasce o leite de tigre, que é ensinado em todas as escolas de culinária atualmente: ter a base de peixe para aliviar o ácido, para que seu sabor se destaque e a carne seja menos maltratada.
Novos frutos do mar: lula gigante, ouriço, caracol. Todos picados, com cebola tipo salsa criolla. É popular, comida de rua, tudo cortado em quadradinhos, leite de tigre, mistura e pronto. Aparece o misto, com yuyo (algas marinhas), canchita (milho tostado) e zarandaja (ensopado do norte). Servido com chicharrón (torresmo) de lula ou polvo, depende do que determinar a pesca do dia.
O fã do picante: ají limo, rocoto, mochero, uma das pimentas mais aromáticas. O nikkei com corte tipo o de sashimi, soja, abacate e óleo de gergelim (ver item 16). Nosso cebiche de pesca do dia no La Mar é vermelho por conta do rocoto. De lagosta, de mero murike (tipo de peixe). O vegetariano, com cogumelos e alcachofras. O de pejerrey (tipo de peixe), o de ouriços, que valoriza o trabalho dos pescadores de San Juan de Marcona, ao sul de Ica. Gosto de mar, poderoso, como uma manteiga.
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LIMA Percurso a pé com a arquiteta e historiadora de arte, Adriana Scaletti
Igreja de San Pedro © Adrián Portugal / PROMPERÚ
Igreja de La Merced © Adrián Portugal / PROMPERÚ
ABENÇOADA SEJA A ARQUITECTURA Uma rota arquitetônica para conhecer igrejas coloniais no centro O ponto de partida é a Catedral de Lima, localizada em frente à Praça de Armas. É interessante pensar nela como um laboratório de técnicas arquitetônicas, pois foi reconstruída três vezes ao longo de sua história, devido a diferentes terremotos e, portanto, exibe uma curiosa mistura de técnicas. Os pilares e a abóboda, por exemplo, na realidade são ocos, e sua estrutura central é feita com uma mistura de madeira, bambu e gesso. Daqui, a rota continua pelo jirón (ruela) Carabaya até a Estação Desamparados, hoje convertida em Casa da Literatura Peruana, e depois pela via Áncash até chegar à Basílica de São Francisco. Em uma época, este foi o centro do “franciscanismo” na América, e tem características únicas. Sua fachada exibe um estilo que está a meio caminho entre o Renascimento e o Barroco limeños, e seu convento possui uma fonte, a qual definia parte da vida social no passado, quando poucos lugares na cidade contavam
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com acesso à água. Também se pode visitar as catacumbas, que em realmente não são tal coisa, são criptas, pois ali descansam os restos mortais de sacerdotes e religiosos, mas nunca serviram de refúgio aos cristãos durante alguma perseguição. Da Basílica de São Francisco, o caminho segue pelo Azángaro até o jirón Ucayali, e ali, na mesma esquina, fica a Igreja de San Pedro. Sua fachada é austera, mas entrar nela é impactante, principalmente porque conta com uma magnífica coleção de retábulos de estilo churrigueresco (rococó espanhol). Inspirada na casa matriz jesuíta de Roma, é a única em Lima com três portas de entrada. Após a visita, o ideal é continuar por Ucayali, parando no Palácio Torre Tagle, até o jirón da União, para visitar a Igreja de La Merced, cujo estilo barroco (manifestado na fachada de granito, de 1687) contrasta com o da fachada de San Pedro. A rota sobe depois pelo jirón Camaná até a Igreja de San
Agustín, cheia de contrastes. De um lado, conta com a única fachada renascentista que há em Lima, e sua porta principal, que fica na esquina, é barroca. O próximo passo é atravessar a Avenida Tacna pelo jirón Ica e avançar um quarteirão, até a pracinha onde fica a paróquia de San Sebastián. Embora seja relativamente pequena, esta é uma das primeiras igrejas da cidade, e no interior há um retábulo muito chamativo, que possui elementos decorativos muito pequenos e incomuns nesse tipo de estrutura. O percurso continua pelo jirón Chancay, vira à direita no Conde de Superunda e termina no convento de Santo Domingo, onde é possível admirar as representações dos santos dominicanos. Entre eles estão dois peruanos: Santa Rosa de Lima e San Martín de Porres. O fato de ambos os santos serem locais, dessa ordem e da era do vice-rei, tem um significado histórico muito profundo, no qual se juntam o religioso e o político.
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LIMA O músico Rafo Ráez fez parte do projeto “Huacas, Borbulhas e Rock & Roll”, para reavaliar esses espaços da sensibilidade contemporânea
HUACAS PARA A ETERNIDADE 1.
2.
Três encontros com o passado em Lima através de seus sítios arqueológicos mais antigos Séculos antes de Lima ser um ponto no mapa, as huacas já faziam parte da paisagem da região. Há mais de 50 desses sítios arqueológicos dentro dos limites da cidade, testemunho da complexa organização e disposição do espaço por parte das culturas pré-colombianas. Assim, por exemplo, a Huaca Pucllana, que convive com os edifícios de Miraflores, pode ser visitada de dia ou a noite. O restaurante, que recebe o mesmo nome, tem uma das vistas mais deslumbrantes de um de seus terraços com vista para a huaca. Uma curta caminhada a partir daí nos leva a Huallamarca, em San Isidro, que em diferentes épocas foi centro cerimonial, cemitério e, finalmente, edifício público. Ambos contam com museus muito completos. Sabemos que essas construções foram lugares nos quais se falavam de diversos temas: das lavouras à cura de doenças. Hoje, a huaca Mateo Salado nos dá uma ideia de quão grande pôde ser a população assentada neste lugar, pois estamos falando de um território que se estende sobre quase 17 hectares, e que preserva os traços de cinco pirâmides truncadas. Na saída de Lima, ao Sul, fica Pachacamac, mostra da fé dos peregrinos que caminharam até ali para participar de seus rituais. Também se pode visitar a huaca Santa Catalina: quando alguém para em seu ponto mais alto e observa o horizonte do bairro financeiro de San Isidro, se sente algo muito interessante e inspirador.
Huaca Pucllana Endereço: Rua General Borgoño quadra 8 s/n, Miraflores. Horário: Visitas diurnas, de quarta-feira a segundafeira, das 9h às 17h. Visitas noturnas, de quartafeira a domingo, das 19h às 22h. Web: huacapucllanamiraflores.pe
Huaca Huallamarca Endereço: Avenida Nicolás de Ribera 201, San Isidro. Horário: Terça-feira a domingo, das 9h às 17h. Web: museohuallamarca@cultura.gob.pe
Huaca Mateo Salado Endereço: Entre as avenidas Tingo María (Breña) e Mariano Cornejo (Pueblo Libre). Horário: Quinta-feira a domingo, das 9h às 16h. Web: mateosalado@cultura.gob.pe
Santuario arqueológico de Pachacamac Endereço: KM 31.5 da Antigua Panamericana Sur. Horário: Terça-feira a sábado, das 9h às 17h. Domingo, das 9h às 16h. Web: pachacamac.cultura.pe
Huaca Santa Catalina Endereço: Entrada pelo Parque Boy Scout, entre jirón Pascual Saco Oliveros e rua Miguel Checa, La Victoria. Horário: Segunda a sexta-feira, das 9h às 13h e das 14h às 17h. Web: munilavictoria.gob.pe
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1. Huaca Pucllana © Daniel Silva / PROMPERÚ 2. Pachacamac © Yayo López / PROMPERÚ 3. Mateo Salado © Walter Hupiu / PROMPERÚ
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Visita guiada com o arqueólogo trujillano Víctor Corcuera
A história de Chan Chan está ligada ao culto à figura de Tacaynamo, fundador mítico da cultura Chimú. Segundo a lenda, ele surgiu um dia entre as ondas, criou essa sociedade e, depois de governar durante muitos anos, tornou-se uma ave marinha e voltou, voando, para as águas. Por isso, o mar, para os Chimú, era o princípio e o final de tudo.
chanchan.gob.pe
Em outros tempos, Chan Chan foi a capital da cultura Chimú, uma sociedade de pescadores e agricultores que adoravam o mar e a lua. Não se tratou realmente de uma cidadela, pois as pessoas não viviam dentro de seus muros. Pelo contrário, o complexo murado que está aberto ao público, que recebe o nome de Nik An, era formado por templos, onde se realizaram rituais ligados à vida religiosa e administrativa.
Ídolo de madeira da Cidadela de Chan Chan © Heinz Plenge / PROMPERÚ
EM SEU LABIRINTO
Algumas chaves para entender o sítio arqueológico de Chan Chan
CHIMÚ
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TRUJILLO
Muros da Cidadela de Chan Chan © César Vallejos / PROMPERÚ
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Todos os anos, durante a homenagem que ofereciam a Tacaynamo, os grandes senhores se reuniam no Grande Pátio Cerimonial, onde se transportava em uma maca uma múmia que representava ao fundador. A evidência arqueológica sugere que essa múmia pertencia ao último governador dos Chimú, que não era enterrado até que o governador em exercício morresse e seu corpo mumificado substituísse ao anterior no rito. A existência desses rituais, nos quais se reuniam os representantes de muitos povos da cultura Chimú, também é uma chave para entender as diferentes imagens em alto relevo que cobrem as paredes de Chan Chan. As representações de aves marinhas são uma referência clara a Tacaynamo, mas também às ilhas próximas à costa, que eram lugares sagrados. Se pegar o corredor que sai do Grande Pátio Cerimonial a oeste, chegará a um pátio onde provavelmente se coletavam as oferendas dos visitantes. Esses muros são decorados com figuras geométricas que representam as redes de pesca, e que poderiam simbolizar a “pesca” de pessoas. Outra figura famosa é a que mostra um mamífero: até recentemente se acreditava que era uma lontra do mar, mas hoje sabemos que é um esquilo. Para os Chimú, esses animais estavam ligados ao armazenamento de alimentos e à previsão dos desastres naturais produzidos pelo fenômeno El Niño. Para as culturas pré-colombianas, a religião estava ligada à política, à administração pública e aos preparativos para a morte, que nada mais era do que a entrada em uma nova vida. Isso é reafirmado no huachaque (pântano artificial) localizado ao sul do setor administrativo, muito perto do espaço onde os mortos eram enterrados, e a única fonte de água dentro de Chan Chan. Para aqueles que estavam enterrados, a água devia ser uma fonte de vida. Ainda mais dentro de uma cultura que acreditava que tudo começou e terminou no mar.
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TRUJILLO Coordenadas de Adriana Doig, gestora cultural em Trujillo
MODERNIDADE NOS MOCHE Três lugares onde a Arqueologia se torna parte do presente
De uma maneira ou de outra, o Trujillo de nossos dias não pode ser separado da cultura Moche, que se desenvolveu nesta região entre os séculos II e VIII d.C.. Sua presença ainda faz parte da identidade da cidade, e em alguns lugares isso se torna especialmente notável. Friso da Cidadela Chan Chan © Fernando Criollo / PROMPERÚ
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Huacas del Sol e de La Luna
Jardim dos Sentidos
A máquina de argila
Esses sítios arqueológicos, que estão de frente um para o outro, já se tornaram destinos icônicos. A Huaca de la Luna conta com um tour aberto ao público, e nela foram descobertos muitos dos ícones, símbolos e deuses dos moches. O mais famoso deles é o Degollador, uma divindade de características humanas e felinas que eram associadas tanto à morte quanto à criação. Ao final do passeio, pode-se visitar o museu do sítio arqueológico para observar algumas das peças escavadas pelos arqueólogos no local, e admirar a Huaca del Sol à distância. Atletas e entusiastas de running também podem dar uma volta ao redor da colina tutelar, que se alcança não muito longe do sítio arqueológico. É uma rota preciosa, de areia e silêncio.
Nos arredores da cidade, não muito distante do Museu de Arte Moderna, fica o Jardim dos Sentidos. Este lugar é um exemplo claro de como a sensibilidade moderna pode absorver o legado das culturas pré-colombianas. Tratase, efetivamente, de um jardim, mas que foi concebido para ser descoberto através de todos os sentidos e, sobretudo, do olfato e do tato. Seu traçado é inspirado nas tradições e iconografia dos Moches. Isso também se aplica ao uso de várias rampas em vez de escadas durante seu percurso, seguindo os costumes antigos. A disposição das flores também é inspirada nesse modelo, bem como na sabedoria ancestral das tradições xamânicas.
Ao norte da cidade, passando o aeroporto e seguindo a rota que leva até Las Lomas, fica a máquina de argila. À primeira vista, pode-se pensar que é mais uma huaca, mas, na realidade, é uma escultura monumental, feita pelo artista plástico Emilio Rodríguez Larraín, entre 1987 e 1988. Trata-se de uma homenagem ao mundo pré-colombiano e, especialmente, às culturas Moche e Chimú. Seus muros de adobe erguem-se entre o mar e a estrada, como uma huaca moderna e concorrente. De fato, o artista a inventou para que fosse destruída com o passar do tempo e pela erosão dos elementos, mas tornou-se um símbolo da imortalidade e da atemporalidade das artes.
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LIMA Circuitos do jornalista Sergio Rebaza, director do LIMAP
DE BIKE
Três propostas em busca da história, cultura e paisagens da cidade, seguindo o impulso de suas pernas Se você tivesse que escolher a rota mais acessível de todas, a primeira opção seria definitivamente a rota do malecón. A vantagem é que você pode começar em qualquer ponto entre San Isidro e Barranco, com sua própria bicicleta ou alugada (inclusive a pé), em qualquer dia da semana. Trata-se de uma rota que liga La Pera del Amor, em San Isidro, e a Bajada de Baños, em Barranco, ao longo de nove
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quilômetros, paralela ao mar e, é claro, com uma das melhores vistas do continente sul-americano - especialmente no verão. No caminho existem várias opções, dependendo do espírito do ciclista: um piquenique no parque María Reiche, um salto para desopilar e voar de parapente, compras ou almoço no Larcomar, ou uma visita ao Museu de Arte Contemporânea (MAC) ou ao Museu Mario Testino (MATE). Os interessados em cultura ou história podem subir para o próximo nível. Pegue a ciclovia da Avenida Arequipa e faça paradas estratégicas em três pontos: a Huaca Pucllana (Miraflores), o bosque El Olivar (San Isidro)
LIMA Uma crítica cinéfila de Gonzalo Benavente, diretor do filme “Rock’n’Roll 68”
CINEMA COM VISTA PARA O MAR
Rock’n’Roll ‘68 © Gonzalo Benavente
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Parque Antonio Raimondi, em Miraflores © Leslie Searles / PROMPERÚ
Em uma das extremidades da paisagem da Costa Ver está localizado o Planetário de Lima, sobre as alturas do Morro Solar em Chorrillos. Ele apareceu em “El Limpiador“, de Adrián Saba (2012) e parou de funcionar temporariamente. Ao redor da construção, um grupo de ciclistas entusiastas o incluiu em suas rotas urbanas. Com direção até La Punta, aparece a sequência das praias. Recentemente, as vimos no nostálgico “Gen Hi8”, de Miguel Miyahira (2017), uma poderosa dose “noventista”. Para uma visão de como era a estrada nos anos 1980, recomendamos o curta-metragem “Taxi” (Rodolfo Pereira, 1984). E se quisermos voltar ainda mais, descobriremos as falésias com a cena de suicídio no primeiro filme de Armando Robles Godoy (“Na selva não há estrelas”, 1966). O malecón que serpenteia os bairros costeiros de Lima está repleto de espaços que o cinema conseguiu imortalizar em diversas épocas, desde o filme mudo
e o Parque de la Exposición, onde poderá visitar um dos museus mais bem montados da capital: o Museu de Arte de Lima (MALI). Finalmente, para fechar o triângulo de bicicleta San Isidro - Miraflores - Lima - San Isidro, tente a ciclovia da Avenida Salaverry, que parte do Parque La Pera del Amor e segue até o Campo de Marte. No passeio, três paradas: a residencial San Felipe, um marco na história da arquitetura de limeña - e muito agradável de pedalar, com certeza -, o Jardim Botânico de Plantas Medicinais, localizado no edifício do Ministério do Trabalho e, finalmente, o Campo de Marte, um dos pulmões da cidade.
“Eu perdi meu coração em Lima” (Alberto Santana, 1933), até o millenial “Microbus” (Alejandro Small, 2014), passando pelas tribulações cinzentas do final do século de “Cidade de M” (Felipe Degregori, 2000), as conversas de dois ex-namorados em “A Última Tarde” (Joel Calero, 2016) ou de dois hipsters no curta “Rumeits” (Gonzalo Ladines, 2010). Entrando em Callao, encontramos um grupo de filmes que, na última década, usaram suas praias e calçadões para ambientar distintas décadas de nossa história recente. A década de 1960 e a primeira cena de rock no Peru se materializam em “Rock’n’Roll ‘68” (Gonzalo Benavente, 2013), a década de 1980 e os toques de recolher aparecem em “Viagem a Tombuctú” (Rossana Díaz Costa, 2014 ) ou o presente a amizade de outono em “Velhos Amigos” (Fernando Villarán, 2014). Se você sair de Lima, poderá pegar um carro como os protagonistas de “Wi: k” (Moreno del Valle, 2016) e procurar uma praia secreta como as de “Climas” (Enrica Pérez, 2014), “O Elefante Desaparecido” (Javier Fuentes-León, 2014) e “La Teta Asustada” (Claudia Llosa, 2009); ou chegar a Ancón, seguindo os passos de Cayetana de “As Más Intenções” (Rosario García-Montero, 2011).
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LIMA Seleção e fotografias de Mirella Moschella, gestora cultural e criadora do projeto audiovisual “Mira a Mire”
Inkapendencia por Okuda en C.C. España © Mirella Moschella
PAREDES QUE FALAM Murais urbanos como galerias ao ar livre
Galatea (2016)
Sin Título (2019)
Face Series (2017)
El Parque de La India (2017)
Callao: Rua Libertad 343, Callao Monumental. Autores: Toofly (Nova Iorque) e Oz Montania (Paraguai). Técnica: pintura mural, acrílico acetinado e spray.
Callao: Rua Independencia, quadra 2. Autor: Bip (Estados Unidos) Técnica: spray.
Todas Las Sangres (2017)
Barranco: Bajada de Baños Autor: Entes. Técnica: acrílico acetinado e pintura em spray.
La Tapada Limeña (2018)
Miraflores: Pasaje Los Pinos 168. Autores: Pésimo & Lauren Ys (Estados Unidos). Técnica: pintura mural, acrílico acetinado e spray.
Surquillo: Pasaje Parque de La India 100. Autores: Meki e Nemo. Técnica: acrílico acetinado e spray.
Inkapendencia (2019)
Cercado de Lima: Jirón Natalio Sánchez 181. Autor: Okuda (Espanha). Técnica: pintura mural, acrílico acetinado e spray.
Miraflores: Esquina das ruas San Martín com Colón. Hotel Arawi. Autor: Alex Senna (Brasil) Técnica: pintura acrílica acetinada.
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IQUITOS Galeria iquiteña a cargo de Christian Bendayán, artista e criador do pavilhão peruano na Bienal de Veneza 2019 1.
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1. Porto de Iquitos © Otto Michael 2. Os Murais © César Calvo de Araujo 3. Cosmovisão Bora © Víctor Churay 4. O coração dos barões da borracha © Santiago Yahuarcani
SELVA ILUSTRADA 3.
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Porto de Iquitos (1898) de Otto Michael
Os murais (1963) de César Calvo de Araujo
Cosmovisão Bora (1998) de Víctor Churay
Durante uma de suas expedições ao Amazonas, este entomologista alemão deixou de lado seu trabalho de catalogar as variedades de borboletas da região, para iniciar a tradição da pintura amazônica moderna. Ele se estabeleceu em Iquitos em 1894, cidade em plena efervescência devido ao auge da borracha. Em suas aquarelas há contrastes: as luxuosas casas do malecón em frente às pequenas cabanas que são vistas nos extremos; bem como os poderosos barcos mercantes em frente ao pequepeque (pequeno bote) ribeirinho.
Nesse ano, ele fez dois murais para o Palácio Municipal de Maynas. Ambos se referem a episódios históricos importantes para o imaginário de Iquitos: o descobrimento do rio Amazonas por Francisco de Orellana, em 1542, e a chegada dos vapores enviados pelo presidente peruano Ramón Castilla, em 1864. Este último ano, data da criação do porto fluvial, coincide com a fundação de Iquitos.
Aparecem os três mundos da cosmovisão Bora, uma das etnias da Amazônia peruana: a terra da água, a terra em que vivemos e a terra das estrelas. Neste último plano, identifica-se um taabóóbé (curandeiro) que usa os poderes da ayahuasca para proteger sua comunidade dos espíritos malignos. O artista, nascido na comunidade nativa de Pucaurquillo, usa tintas naturais e acrílicos sobre uma casca vegetal chamada llanchama.
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IQUITOS Uma rota de Claudia Otero, geógrafa e empresária.
DE NOITE EM IQUITOS
Quadros para entender a evolução da arte amazônica atual
Vertigem noturna no malecón A noite em Iquitos começa no malecón de Tarapacá, a duas quadras da Praça de Armas. Durante muito tempo, o calçadão foi o bar Arandú. E o bar Arandú teve, durante muitos anos, quase 25, suas paredes com intervenções com as primeiras pinturas do artista Christian Bendayán e o refúgio musical para o rock. Ali, soava a psicodelia britânica do Pink Floyd junto com a psicodelia amazônica de Los Wemblers. Era uma peregrinação para a insônia e paradeiro inicial da vida noturna da cidade. Possui algumas mesas no terraço, com vista para o rio Itaya, que se estende sobre o malecón. Na esquina mais próxima do Arandú, o restaurante Fitzcarraldo também serve à noite e oferece coquetéis exclusivos e autorais, usando destilados e macerados da Amazônia. Nomeado assim em homenagem ao filme que o diretor alemão Werner Herzog gravou em Iquitos, por volta de 1982. Seus espaços com tetos altos e grandes janelas tornam-se parte da paisagem urbana do malecón Tarapacá. A dois metros de distância, aberto das seis da manhã às duas da madrugada, o Amazon Bistro remete aos bistrôs parisienses (oferecem croissants no café da manhã e profiteroles no lanche), mas sua culinária esconde surpresas do encontro de ambas as tradições: a técnica francesa e os insumos amazônicos: por exemplo, a donzela, um peixe de rio, com molho holandês.
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4 O coração dos barões da borracha (2012) de Santiago Yahuarcani Também nascido em Pucaurquillo, como Churay. Sua obra retrata o mundo milenar em sua interação viva com o presente. Esta peça é a mais documental, pois mostra o outro lado da moeda da febre da borracha.
© Arandú bar
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LIMA Lições de história culinária por Mitsuharu Tsumura, chef do Maido, primeiro restaurante da América Latina segundo os 50 Best Restaurants
EVOLUÇÃO NIKKEI
Um espelho do país na cozinha: porque não se trata mais apenas de descendentes de japoneses no Peru Entre o tacuchaufa nos primeiros anos do restaurante Maido e o dim sum de guisado de cabrito no jantar degustação “Peru + Espanha”, pelos 25 anos do Astrid & Gastón, há um longo caminho de aprendizagem. Sempre houve pratos icônicos, que representaram um ponto de aprendizado e um passo a mais na evolução do que entendemos por nikkei, uma história em construção.
1, 2, 3 Maido © Karina Mendoza / PROMPERÚ
A primeira onda
A segunda onda
Os chefs nikkei encontram a culinária criolla. Pensa-se que os primeiros que começaram a fazer a culinária nikkei faziam a culinária japonesa. Mas, no início, há 70 anos, os cozinheiros nikkei faziam cozinha criolla: cau cau, chanfainita e lomo saltado, por exemplo, em pequenas tabernas no centro de Lima e de Callao. Eles não estavam fazendo sushi. O criollo era interpretado à sua maneira, em seu paladar. Eu via uma mescla dessa comida em casa: comíamos carapulcra com arroz branco sem sal. Ou seja, como japonês. Meus amigos me diziam que meu arroz era sem gosto, sem sal ou alho. Inclusive o sashimi, comíamos com molho de soja e limão, quase um tiradito.
É o descobrimento do mar em um país que costumava comer frango e carne. Aparecem restaurantes como Costanera 700, de Humberto Sato; Rosita Yimura, em Callao; Otani, em La Victoria; La Buena Muerte perto de Paruro, no centro de Lima. As primeiras cebicherias em Lima tinham algo de nikkei, devido ao frescor e rigidez de seus cortes de peixe. Começaram a servir outro tipo de peixe (na capital, só conheciam linguado e robalo) e mariscos: nasceram o polvo ao azeite e o pão com chimbombo (escabeche de bonito, um peixe azul) em Callao. Ou os tacutacus recheados de mariscos. Os peixes inteiros ao vapor, com influências japonesas. Nesta onda, o nikkei não apenas fornece técnicas e sabores, mas também insumos.
Restaurante Maido © Ernésto Benavides / PROMPERÚ
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Restaurante Maido © Ernesto Benavides / PROMPERÚ
A terceira onda Quando várias empresas japonesas chegam ao Peru, surge a necessidade de abrir restaurantes japoneses, como sushi bares. Por exemplo, Matsuei, de Nobu Matsuhisa. Íamos com minha família e pedíamos sashimi, tempurás, oden e gyozas. Fazia-se culinária japonesa, embora não houvesse tudo. Tivemos que nos adaptar aos insumos peruanos. Talvez, o mais importante seja o limão. A acidez na culinária peruana é como o baixo da música: acompanhando tudo. Às vezes você sente outras nem tanto. Os melhores cebiches, então, eram comidos em sushi bares, como no restaurante de Toshiro Konishi (que havia chegado ao país pela primeira vez junto com Nobu para abrir Matsuei) ou o de Darío Matsufuji.
A quarta onda Os opostos se atraem e os sushis com sabores peruanos inundaram a cena no início do século XXI. Por exemplo, Edo, dos Matsufuji, pertencente à família fundadora do Matsuei, onde nasceu o maki acebichado. Não existe uma porcentagem genética para dizer quanto há de japonês e quanto de peruano.
1, 2, 3 Maido © Karina Mendoza / PROMPERÚ
Jorge Muñoz é um chef norteño que trabalhou no Pakta, um restaurante nikkei em Barcelona. Veja a mistura aí! É que a culinária japonesa se adapta ao mundo e o nikkei hoje é peruano.
A quinta onda Antes, quando trabalhava no hotel Sheraton, inventei o tacuchaufa (o tacutacu é uma tortilla de feijão com arroz e o chaufa é a expressão criolla da cozinha cantonesa feita no Peru), que me acompanhou por anos no cardápio quando abri o Maido. Fazemos cozinha de autor e nos arriscamos, porque entendemos que a cozinha nikkei, por seu perfil, e além do vínculo com o mar que compartilhamos com o Japão,
também pode se relacionar com a Amazônia. Queríamos levar o sushi para o mundo amazônico peruano: com cocona (tipo de tomate), fermentos de caju, com pupunha, usando caracóis do rio (churo). O primeiro nigiri que criamos foi “a lo pobre”: entraña (corte de carne parecido com a fraldinha), chalaquita (molho tipo vinagrete) e ovo de codorna. Isso abriu caminho para entender que o sushi não é apenas marinho: fizemos de papada de porco, moela, aspargo, cuy (porquinho da índia). E quando descrevemos a profundidade do Pacífico: então usamos lapas (um tipo de molusco do sul) em um cebiche com ají amarelo (pimenta) nitrogenado. Outro momento de influência foi Arequipa e suas técnicas ancestrais do “jaspeado” (marmorizado) para suas pimentas e mariscos. No restaurante, fiz uma versão de sibinche de camarão, de chupe e de rocoto (pimentão) recheado (ver item 21). O nikkei não deveria ser uma culinária japonesa, mas uma peruana com influência japonesa. Assim como o uso generalizado da wok e o molho de soja respira influência chinesa.
summum.pe/categorias/ cocina-japonesa-y-peruano-japonesa/
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LIMA Rota espiritual de Pepe Moquillaza, fabricante de pisco e vinhos naturais em Ica
BALCÕES MAGNÍFICOS
Pisco é Peru © Karina Mendoza / PROMPERÚ
Do Maury ao Carnaval: evolução da coquetelaria feita em Lima Preparação de coquetéis de pisco no bar Carnaval © Karina Mendoza / PROMPERÚ
1— Os de hotel
A mitologia começa no bar Maury, onde o pisco sour foi criado, epicentro da vida noturna em Lima no início do século XX. A receita é incontestável: três (ou quatro) doses de pisco, uma de limão e uma de clara de ovo. Mais tarde, os anais da história dizem que o diretor de cinema Orson Wells bebeu mais de uma dúzia no bar do hotel Bolívar, em frente à Praça San Martin. Durante anos, Roberto “El Capitán” Meléndez administrou o bar do Country Club em San Isidro. Ele também foi o promotor e difusor de outros coquetéis, como o chilcano (com ginger ale e um toque de limão) e o pisco punch (com xarope de abacaxi e um destilado de uvas aromáticas).
2—Bar Olé
Javier Carvallo, proprietário desta esquina sanisidrina com porta giratória na entrada, manteve uma tradição que seguiu uma via paralela à do pisco sour: el capitán. Nomeado assim por conta de um grito de guerra dos soldados dos quartéis e bares alto-andinos: “Dê-me um capitão de cavalaria”. Esse era o pedido de uma mistura potente capaz de aliviar o frio: duas doses de pisco e duas doses de vermute. Aqui eles servem em uma bandeja de prata e com uma pequena jarra para encher o copo.
3—Três de Pisco Sour
Há um que é “ambicioso”, que serve Sami, eterno barman, no La Calesa de San Isidro. O que soube capturar a variedade de frutas
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e possibilidades no coquetel de bandeira, usando um pisco correto, é o bar Huaringas. Há um, de tangerina e gengibre, que é ousado e interessante. Depois de sair do Country Club, Roberto Meléndez abriu seu próprio espaço em uma esquina de Miraflores, Capitán Meléndez (como chamavam ao seu pai, também barman), onde oferece apenas coquetéis com pisco. Sua versão do pisco sour é estonteante: adicione uma dose a mais à receita convencional.
4—Ámaz
Luis Flores usa Machín, um bitter amazônico, na coquetelaria do Ámaz. Além de contar com cítricos e frutas de suas viagens pela selva central e amazônica, ele também renova constantemente suas técnicas. Este ano, empregou a clarificação de coquetéis com leite. É uma técnica japonesa que permite condensar os sabores. Por exemplo, sentir a complexidade de botânicos e ervas em um líquido transparente. À vista, não revela nada, mas no nariz e na boca, você descobre todo o alcance dos ingredientes usados.
5—Os de cerveja
Barbarian e Nuevo Mundo são duas marcas de cervejas artesanais e, ao mesmo tempo, duas propostas jovens, que selecionam os lúpulos, a água que usam e a tipicidade de cada tipo de cerveja: IPA, pale ale, pilsener, entre outras. Eles também têm realizado colaborações com chefs que procuram um perfil diferente (destaque para o Loche,
por exemplo). Há dois anos, lançaram suas propostas de bares abertos em Miraflores, separadas apenas por alguns quarteirões, onde oferecem mais de 15 rótulos diferentes, servidos no barril. Há também outros empreendimentos interessantes, como Sierra Andina e Barranco Beer Company, que contam com locais em Miraflores e Barranco, onde oferecem vários de seus rótulos.
6—Carnaval
Aaron Díaz é o gestor da constelação de talentos por detrás do balcão. Abriu em dezembro de 2017 e, menos de um ano depois, foi incluído na lista dos 50 Melhores Bares do mundo. Sua filosofia é a coquetelaria conceitual, possui um espaço dedicado ao gelo (dirigido pelo ice chef Raúl Arcayo), utiliza louças especialmente desenhadas por artistas locais (um dragão que solta fumaça pela boca e um copo inclinado que faz com que o coquetel se mova) e possui mais de 300 rótulos diferentes, desde chartreuse, uísque japonês, sangani e, é claro, pisco.
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LIMA Um passeio expresso por David Torres, criador do Arábica Espresso Bar
UM CAFEZINHO? Cinco cafeterias especializadas em torrefação para saborear uma xícara de café de origem, com história própria, sem sair da capital
Das florestas do Amazonas e Cajamarca até as selvas que escalam a encosta leste dos Andes cusqueños, passando pelos vales tropicais do departamento de Junín, o café se converteu em um dos cultivos mais importantes do país. Hoje, os grãos de café peruano estão entre os melhores perfis do mundo, pela sua qualidade e variedade. Cada origem conta com uma história e um sabor próprios.
Neira Café © Ernesto Benavides / PROMPERÚ
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Tostaduría Bisetti
Neira Café Lab
Origen
Apu Café
Milimétrica
Av. Pedro de Osma 116, Barranco. Pioneira no setor de cafeterias de especialidade e de origem, graças a um trabalho que parte do compromisso com os agricultores quem os assessoram e compram o café. Os grãos com os quais as bebidas servidas em seu balcão são preparadas provêm de Curibamba e Mazamari (Junín), na selva alta central do Peru, bem como da fazenda San Francisco, em Jaén (Cajamarca), no norte do país.
Calle Enrique Palacios 1074, Miraflores. Os critérios com os quais o café é preparado em seu balcão são dignos de um alquimista: do controle minucioso da temperatura da água ao design de recipientes com formas específicas para dar um novo brilho a cada bebida. Os grãos com os quais trabalham aqui provêm de Villa Rica (Junín), na selva central, e dos campos quentes de Jaén.
Av. Bolívar 1199, Pueblo Libre. Dos diferentes grãos de café com que trabalham, os mais emblemáticos são os provenientes da fazenda Churupampa, na região de San Ignacio (Cajamarca), muito perto da fronteira com o Equador, assim como de Rodríguez de Mendoza (Amazonas), na selva alta do norte do país.
Jirón Risso 281, Lince. É a única em toda a cidade que é gerenciada por uma cooperativa de produtores de café, chamada Cenfrocafe. De fato, sua primeira loja está em Jaén, ao lado da Praça de Armas. Os grãos com os quais trabalham também provêm desta região. Um produto que busca melhorar continuamente, sobretudo através de projetos de pesquisa agrícola com várias universidades da região.
Av. La Paz 580, Miraflores. Para preparar o café, usam grãos provenientes de Alto Ihuamaca e La Coipa, em Jaén, e também de San Ignacio. Além disso, o local possui um conceito moderno, biker friendly. Em 2018, conquistou o primeiro lugar na categoria de Especialidade de “Experience Lima”, o primeiro concurso de cafeterias em Lima.
cafebisetti.com
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origentostado resdecafe.com
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Café das alturas
Vencedores de Melhor Cafeteria segundo a Câmara Peruana do Café 2019 Mama Quilla Av. Manuel Valle 1101, Pachacamac facebook.com/MamaQuillaTostaduria Café Aicasa Av. Luis José de Orbegoso 107, San Luis aicasaperu.com Caleta Dolsa Av. San Martín 223, Barranco facebook.com/caletadolsa/ VEJA MAIS CAFETERIAS PREMIADAS EM camcafeperu.com.pe
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Dulzura y creatividad © MAP Café / Cusco Restaurants
CUSCO
Peregrinação culinária em Cusco com o jornalista e editor Manolo Bonilla
O MUNDO NO UMBIGO Sabores internacionais no centro de Cusco A cidade mantém sua culinária e preserva a identidade de suas picanterías (ver item 47), mas também, como toda capital do turismo global, conseguiu se reinventar e oferecer outros conceitos de gastronomia que seduzem clientes de latitudes distantes. Essas propostas adaptaram a despensa andina a formatos que podem ser entendidos por muitos: desde refeições requintadas, interpretações da culinária francesa e italiana com vistas locais, até opções vegetarianas e manifestos de autor. Começamos com Pachapapa, localizado em um casarão em San Blas, que é a versão de uma picantería cusqueña adaptada aos tempos atuais, com cozidos (de porco, alpaca e porquinho da índia) controlados em seu forno de barro, onde também oferecem sopas da receita regional (como o chayro, com cordeiro e cereais). Com MAP Café, há duas coisas surpreendentes: sua localização no meio do pátio colonial do Museu de Arte PréColombiana e sua versatilidade no menu, onde certas técnicas de vanguarda são exibidas em casamento com insumos andinos. O Le Soleil é o melhor restaurante francês do Peru, talvez o mais clássico, sem fusão alguma (escargots e canard com toda tradição), e está localizado na Rua Palacio. O Incanto, por outro lado, é uma espécie de trattoria de espírito italiano com licenças cusqueñas: o queijo paria para a muçarela, a truta para o salmão, os nhoques com favas ou o ragu de cuy (porquinho-daíndia). Por outro lado, Kion é uma questão particular: trata-se de uma chifa, que já é uma expressão peruana e única da culinária cantonesa, com frutas e vegetais da região.
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O chef argentino Luis Alberto Sacilotto passou primeiro pelo La Gloria, em Lima, antes de desembarcar na cozinha do Cicciolina. Desde então, se posicionou como um dos espaços culinários mais sofisticados de Cusco: uma combinação de porções generosas, receitas mediterrâneas, proteínas locais (cordeiros e alpacas) e uma cava particularmente interessante. Também existem propostas para a culinária nikkei na capital: Limo executa receitas japonesas, que o aproximam de um sushi bar (nigiris, makis e gyozas), com outros da costa peruana (como tiraditos e cebiches) e algumas poucas dos Andes (como o chupe nikkei, que tem camarão, milhos de Urubamba, macarrão udon e cogumelos shiitake). Se a sua for cerveja artesanal e boas pizzas, você pode passar por La Bodega 138.
MAIS INFORMAÇÃO: Pachapapa Placinha San Blas 120 MAP Café Placinha Nazarenas 231 Le Soleil Rua San Agustín 275 Incanto Ruela Santa Catalina 135 Cicciolina Rua Triunfo 393, 2º andar Limo Portal de Carnes 236, 2º andar La Bodega 138 Rua Herrajes 138 Kion Rua Triunfo 370, 2º andar
summum.pe/regiones/ mejor-restaurante-de-cusco/
Fusão cantonesa - peruana © Kion / Cusco Restaurants
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CUSCO O barista cusqueño Diego Huillca e um tour pelas cafeterias de origem
Colheita de café no Fundo El Mangal – Maranura © Sandro Aguilar / PROMPERÚ
Compreender os números leva menos do que tomar um café expresso. O café é o primeiro produto agrícola tradicional de exportação e chega a mais de cinquenta mercados no mundo. Em 2018, o Peru ficou em 9º lugar entre os países produtores de café, de acordo com a International Coffee Organization (OIC). É o segundo produtor de café orgânico do mundo. No entanto, seu consumo atual no país alcança 650 gramas por pessoa por ano. Essa tendência está mudando graças ao aprimoramento de diferentes empreendimentos em torno do café. Agora, entender o que está por trás dessa xícara exige uma moagem mais lenta e mais algumas xícaras de café. Esse crescimento recente do consumo tem como um de seus protagonistas os próprios agricultores, pois são eles que realizam rigorosamente seu trabalho no campo (quase 425.400 hectares de café em todo o país). Na realidade, são famílias e gerações inteiras que se dedicam ao cultivo deste produto, graças às condições climáticas e à diversidade de nossa geografia. Este último favorece o cultivo de finos grãos de café, especialmente nas dez regiões produtoras mais importantes. Cusco é uma delas. Devido ao tipo de solo, que vão de territórios vulcânicos e arenosos até as alturas dos Andes que excedem os 2.300 metros acima do nível do mar, os grãos de café cusqueño caracterizam-se por expressar perfis florais intensos e bastante doces. Intenso e doce como a origem dessass cafeterias.
GRÃOS, AROMA E CAFÉ
Tudo o que contém uma xícara de café fumegante
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Em 2017, Yuri Jacinto se envolveu totalmente no mundo do café. Foi uma homenagem (ou um passo natural) às lições aprendidas com seu mentor, um barista polonês chamado Michael Borowski. Foi ele quem incutiu em Jacinto essa vontade de investigar e aprender mais sobre esse misterioso grão de café. Ele se associou aos produtores, percorreu áreas distantes de Cusco e testou diferentes perfis. Por sua proposta na cafeteria (que leva o acrônimo do nome de seu filho), ele escolheu um lote do vale de Lares, na província de Calca. Onde: Rua Plateros, 373, Centro Histórico
Nasce com a quarta geração de produtores do clã Rayme, sobrenome que há décadas se dedica ao cultivo sustentável de café de diferentes variedades. Esse espaço, concebido por Bil Clinton Rayme e inaugurado há um ano, é a maneira de valorizar esse esforço e dedicação no campo: mostrar o caminho da fazenda até a xícara. No El Cafetalito, ele usa os grãos que seu pai, Benigno Rayme, juntamente com sua família, colhem em sua fazenda localizada na comunidade de Huaynapata, distrito de Yanatile, província de Calca. Onde: Rua Carmen Alto, 189, San Blas
JG Beans Coffee Crew
El Cafetalito
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Museo del Café
Franz Trelles iniciou este projeto há quatro anos, com o objetivo de difundir a cultura do café, com base na história e na experiência sensorial. Para isso, criaram uma rota temática que mostra toda a cadeia de valor do café: dos processos de produção e de campo, passando pelo laboratório de transformação de grãos e seu culminar no café pela mão do barista no balcão. Oferece, no final da visita, uma degustação de cafés de origem. Onde: Rua Espaderos, 136, 2º andar, Centro Histórico
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AREQUIPA Segredos culinários de Mónica Huerta, picantera e dona do La Nueva Palomino
A CHICHA E O BATÁN Tradições da picantería arequipeña em cinco preparações 1.
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Adobo arequipeño
Chicha de quiñapo
Em Arequipa, é o prato de domingo. A carne deve ser marinada durante uma noite inteira com a concha da chicha madura, bem como pimentas, alhos e ervas moídas no batán (pedra de moer alimentos). Tradicionalmente é fervido de magrugada, a partir das três horas, para estar pronto às cinco da manhã.
É obtido a partir da fermentação dos grãos germinados do milho preto crioulo, que são coados com um pano chamado sixuna. Nas picanterías, serve não apenas como bebida, mas é um ingrediente fundamental na preparação de ensopados. De fato, as picanterías surgiram, historicamente, a partir das chicherías.
2 Chupe de camarões
O camarão do rio é o rei da comida arequipeña e o principal ingrediente (e cobiçado) dessa sopa. Você pode adicionar camarões pré-cozidos (selados) e depois secos em um forno a lenha.
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Onde experimentá-los? Desde 2012, as quase 40 picanterías de Arequipa se organizaram na Sociedade Picantera de Arequipa. É possível organizar um tour culinário em alguns desses: Las Nieves (Nicarágua, 303, atrás da delagia Hunter), La Lucila (Grau, 147, Sachaca), La Capitana (Los Arces, 208, Cayma), La Benita (Plaza Principal, 114, Characato), La Nueva Palomino (Passagem Leoncio Prado, 142, Yanahuara) e Los Geranios, a cerca de 20 minutos do centro (Avenida Arequipa, 239, Tiabaya).
sociedadpicanteradearequipa.pe
1. La Nueva Palomino © Inés Menacho / PROMPERÚ 2. Cozinha arequipeña © Red Frame / PROMPERÚ 3. Menu Picantería La Lucila © Red Frame / PROMPERÚ
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AREQUIPA Uma lembrança do escritor de Arequipa, Jorge Eduardo Benavides, autor de “O Enigma do Convento” e vencedor do Prêmio Fernando Quiñones de Novela 2018
HISTÓRIAS E RINCÕES DE AREQUIPA 2.
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Ocopa arequipeña
Timpo de rabos
A tradição determina que, para fazer este molho, você deve primeiro colocar o ají mirasol (tipo de pimenta), alho e cebola no rescoldillo (brasas da lenha) ou no próprio fogo, para que sejam précozidos (selados). Então, tudo isso é moído, junto com a erva huacatay, em um batán: duas pedras que servem uma como base e a outra (chamada “mão”) para a moagem.
Um prato poderoso feito com uma mistura de carne de boi e cordeiro, mas especialmente com rabos de boi. Para preparar o caldo também é usado o “mokuntuyo”: um osso do quadril do boi, que é quebrado com um machado e salgado por um mês. Uma vez desidratado, é usado para salgar e dar outro toque de sabor aos ensopados e chupes.
Arequipa, no sopé do vulcão Misti, se estende pelo vale onde fica, sem perder de vista seu centro histórico e, dentro dele, a cidadela – cerca de 20 mil metros quadrados – que constitui o Mosteiro de Santa Catalina, erguida apenas 40 anos depois que a cidade foi fundada, em 1540. Trata-se de uma pequena cidade dentro de outra, “cerrada a cal y canto” (muito fechada e protegida) contra ataque do tempo que, em seus melhores momentos, abrigou aproximadamente 800 mulheres, uma reprodução em escala de uma cidade dividida entre o fervor religioso e um liberalismo cheio de erudição e folia: em meados do século XVIII havia mais de três mil chicherías (espécies de tabernas nativas) na região, mas também, como dizia em seu Notícia de Arequipa o canário Pereyra e Ruiz, a cidade abrigava “mais médicos que Salamanca”, na Espanha. No século XIX, era famoso em todo o Peru seu seminário de San Jerónimo, que dava nomes como os do poeta e revolucionário Mariano Melgar ou o do jesuíta precursor da Independência, Juan Pablo Vizcardo Guzmán, que de Londres escreveu sua “Carta aos espanhóis americanos”. Não é de surpreender que esta cidade tenha uma arquitetura barroca mestiça, antissísmica desde 1582, após um terremoto devastar a cidade. Desse desastre surgiu o uso do sillar, que se acredita erroneamente ter lhe dado o apelido de “Cidade Branca”. Sempre que volto, gosto de passear calmamente por suas ruelas robustas e estreitas passarelas arejadas, contemplar sua catedral e sua Plaza de Armas, onde está a estatueta de um arauto teimoso de Mayta Capac – conhecido pelos vizinhos pelo eufônico nome de “Tuturutu” – é ele que determina se um arequipeño é costeiro ou serrano. Se vive do “Tuturutu para cima” ou do “Tuturutu para baixo”, se é uma coisa ou outra, assunto que deixa perplexos os forasteiros até que começam a entender a dinâmica social da cidade e o orgulho que os caracteriza: “Arequipeño não nasce, merece ser”, costumava ser dito em tempos passados.
Cidade e catedral de Arequipa © Yayo López / PROMPERÚ
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IQUITOS O chef e pesquisador Pedro Miguel Schiaffino responde a uma pergunta: desde quando usamos produtos amazônicos na culinária peruana?
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IQUITOS Seleção de Pedro Miguel Schiaffino, chef do Ámaz e Malabar
PEIXES DE RIO EM BRASAS
Além da Doncella (tipo de peixe amazônico), opções suculentas para sua próxima viagem a Iquitos Collar de paiche
Uma peça pode pesar um quilo. A bochecha e a barriga também são cortes sublimes.
Carachama Pescados a la parrilla y plátanos maduros en el mercado de Belén en Iquitos © Federico Romero / PROMPERÚ
Assado, inteiro. É como uma lagosta. Dentro, se escondem lombos sem espinhas.
Sábalo, Palometa e Gamitana Reis das churrasqueiras.
A COZINHA AMAZÔNICA HOJE
Uma abordagem à despensa mais diversa do país Setenta por cento da proteína que se come em Loreto são peixes. Nos mercados de sua capital, Iquitos, é oferecido muito peixe salgado de rio. Os motivos são óbvios: vêm de áreas remotas, a dois dias sulcando rios sinuosos da floresta e, portanto, são preservados com sal. Além disso, os peixes de rio têm mais espinhas que um de água salgada, mas têm um valor adicional: são excepcionais sobre as brasas. Nós trabalhamos, há quatro anos, com artesãs da comunidade de Pucaurquillo, a cinco horas a bordo de um barco a motor, partindo da doca de Nauta. Elas se encarregam de processar a mandioca amarga ou venenosa, de onde sai o ají negro (tucupí). É o suco da mandioca brava fermentada que funciona, na cozinha, como o missô ou o shoyo: é um incrível intensificador de sabor. Acredito que este produto amazônico possa ser usado na culinária mundial como um molho tailandês de peixe ou molho de soja. Inclusive, na gastronomia peruana, novos sabores e produtos da selva têm sido incluídos.
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No início de 2003, começamos a usar ají charapita, sachaculantro (uma variante selvagem do coentro), limão áspero, chonta e frutas como a cocona e o camu camu. Essa foi a primeira onda. Em 2010, outros ingredientes apareceram nas cozinhas como o açaí, a tapioca, o cupuaçu, o tucupí e os caracóis do rio (churos). Para mim, o ingrediente mais versátil é a mandioca. Eu acho que é o elemento transversal da alimentação centro e sul-americana. Das Guianas até Loreto, muitos povos amazônicos a consomem pela quantidade de amido. É dividido em três tipos: doce, boa ou venenoso. A primeira você pode comer como uma maçã. A boa é a mais difundida: tem mais de três mil variedades. E a amarga, por ter muito cianeto, tem que ser fermentada primeiro. Desta última se extrai o tucupí. Com a mandioca, você pode obter farinha, tapioca, floco, amido, tucupí, chicha, masato. Você pode comê-la cozida ou assada como bananas. Se fermentar mais uma vez, se obtem outro tipo de álcool. Não há ingrediente vegetal que tenha tanto valor agregado.
Maparate
A textura é oleosa e compacta como a de uma enguia, sem muita espinha.
Corvina de río
Corvina do mar que se adaptou ao rio.
Tucunaré
São difíceis de conseguir frescos. Bom tamanho, saem apenas na temporada. Doncella com chutney de carambola © Walter Wust / PROMPERÚ
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IQUITOS O arquiteto de Iquitos Boris Pretell projetou o Iquitos Monumental, um aplicativo que funciona como um catálogo dos casarões e azulejos da cidade.
Hotel Casa Morey em Iquitos © Juan Puelles / PROMPERÚ
1 Ex Hotel Palace (Casa Malecón Palace) Anos: 1908-1912
Endereço: Malecón Tarapacá 200-228 esq. Putumayo 107-129 Edifício de esquina com três andares e torre: o primeiro andar era ocupado por comércios; o segundo, por escritórios e embaixadas, e o último, pelo hotel. Foi projetado pelo arquiteto catalão Salvador Viñals e construído pelo arquiteto José Serra e pelo engenheiro Samuel Young Mas. Os materiais foram importados da França, Espanha e Alemanha. As vigas de ferro, portões, grades e trilhos vêm da Alemanha e os azulejos e mosaicos, de Barcelona. Fabricação: Escofet y Cía. – Barcelona, Espanha.
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AZULEJOS EM IQUITOS
Casa Wesche Anos: 1889 – 1910 (três fases)
Endereço: Malecon Tarapacá, 422-466 Casa de dois andares em estilo eclético. Foi sede da Wesche y Cía. fundada em 1882 pelo comerciante alemão Herman Wesche, que a adquiriu e construiu em três fases diferentes, por isso possui uma grande fachada. Em 1889, foi constrúda a primeira parte, que se torna a central. Em 1914, Wesche retornou à Alemanha e três anos depois transferiu a propriedade da empresa para Emil Strassberger. Origem: Fábrica desconhecida, Portugal.
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Casa Cohen Año: 1905
Inventário da arquitetura da borracha Conhecemos a Arquitetura da Borracha como o conjunto de casarões construídos durante o boom da borracha (1880-1920). Há 85 imóveis declarados Patrimônio Monumental da Nação desde 1986, quase um século após a chegada de La Casa de Fierro, localizada em frente à Plaza de Armas. Este período é caracterizado pela influência do ecletismo europeu da época. Por exemplo, o uso extensivo de um ornamento nas fachadas: o azulejo. Existem 45 imóveis assim, mas nem todas foram declarados monumento.
Endereço: Próspero 401-437 esquina com jirón Morona 181-199 Casa de esquina de um andar, cujo proprietário original foi Rubén Cohen. A fachada é composta por portas coroadas com arcos semicirculares que contêm barras de acabamento fino. Tem um estilo de azulejo alemão que, por sua vez, se diferencia em dois pelas cores e por sua localização. Fabricação: M.O & P.F vorm. C.T.M - Meissen, Alemanha.
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Casa Adolfo Morey Año: 1911
Endereço: Rua Ramírez Hurtado 702-718 Casa de esquina com dois andares. O primeiro proprietário foi Bartolomé Pino em 1909. Dois anos depois, foi sede de sua empresa de transporte marítimo Vogler & Rieckhof Co. Em 1917, Adolfo Leonardo Morey Arias adquiriu a propriedade. A fachada é caracterizada pelo uso de três azulejos diferentes. Dentro há uma coluna de ferro da fábrica McFarlane de Glasgow (Escócia). Procedência: Castellón de la Plana, Fábrica La Moderna (Valência).
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LIMA Seleção têxtil da design de moda Chiara Macchiavello
DESIGN, CORTE E CONCEPÇÃO
Moda e estética peruanas que combinam sustentabilidade, tradição e vanguarda
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Las Pallas
Höség
AYNI
www.hosegstore. com A especialidade desta marca é o design de casacos de alta qualidade, ideais para uma viagem às montanhas. Além disso, segue um modelo colaborativo de compra e doação: para cada jaqueta que vende, doe outra para as crianças das comunidades andinas.
Bee Versa Responsible Shopping
Escudo
Rua Cajamarca 212, Barranco Suas peças têxteis vêm de diferentes regiões do Peru e refletem as diferentes técnicas tradicionais dos mestres artesãos que as fabricam.
www.escudo.pe É inspirada na história précolombiana e em sua estética, tanto nos Andes como na Amazônia, para oferecer roupas contemporâneas, pelos artesãos e mestres fiandeiras de Cusco.
www.ayni.com.pe Esta marca desenha e produz roupas de malhas utilizando produtos peruanos de alta qualidade, como tecidos de baby alpaca e algodão pima, mas baseados em um modelo de sustentabilidade.
Shopping Center Jockey Plaza Avenida Javier Prado Este 4200, Sulco. Faz parte da Associação de Moda Sustentável. Sua especialidade é a curadoria de marcas, aplicando critérios muito claros e rigorosos de sustentabilidade ambiental e social na produção de tecidos.
© Bee Versa Responsible Shopping
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6 Pietá www.projectpieta. com O designer francês Thomas Jacob chegou a Lima e conheceu as prisões e presidiários da cidade. Visualizou ali as máquinas e o talento para um projeto revolucionário: que os próprios prisioneiros produzissem roupas de qualidade, com estéticas e mensagens poderosas, que por sua vez servissem como uma maneira de gerar empregos e gerar renda. Possui lojas pop-up no Real Plaza e no Jockey Plaza.
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AREQUIPA Um tratado emocional de um apaixonado pelas fibras de alpaca, María Alejandra Vizcarra
FIBRAS DE LUXO Os camelídeos andinos e seus tecidos
Algunas de las telas más finas del mundo se obtienen a partir del pelo que se esquila de las cuatro especies de camélidos que habitan el continente sudamericano, y Arequipa reúne a las principales marcas que se han especializado en su procesamiento y confección. Además, el Perú posee las mayores poblaciones de vicuña y alpaca en todo el mundo. Alguns dos tecidos mais finos do mundo são obtidos a partir dos pelos cortados das quatro espécies de camelídeos que habitam o continente sul-americano, e Arequipa reúne as principais marcas especializadas em seu processamento e confecção. Além disso, o Peru possui as maiores populações de vicunha e alpaca em todo o mundo. A fibra da vicunha, conhecida como o “ouro dos Andes” por seus tons dourados, é muito fina, delicada ao toque e apreciada desde a época de Tahuantinsuyo, quando o Inca era o único homem designado que podia usar roupas feitas com vicunha. Mas este é um animal selvagem, que nunca foi domesticado e que aparece no escudo do Peru para representar a biodiversidade animal. Hoje eles são cortados após um ritual ancestral chamado chaccu, que é mantido em algumas aldeias nas alturas de Ayacucho, Puno, Cusco e Arequipa. Trata-se de um sistema de captura destinado para tirar proveito da vicunha sem danificá-la ou comprometer seu estado rústico: consiste em formar uma grande cadeia humana ao redor dos animais para proceder ao cisalhamento e depois liberá-los. Sem nenhum sacrifício no meio ambiente, é garantida a gestão sustentável da população das vicunhas.
Más información: alpacadelperu.com.pe
Alpacas © Inés Menacho / PROMPERÚ
Fibras de alpaca © César Vallejos / PROMPERÚ
OUTRAS BOAS PRÁTICAS A empresa Michell & Cía nasceu em Arequipa e envolveu-se em todo o processo: da transformação da fibra em fios ao varejo de roupas finas. Sol Alpaca faz parte da rede de lojas do Grupo Michell. Eles também administram o Mundo Alpaca, um complexo de ecoturismo, onde é possível experimentar a “escolha” da fibra viva, onde a fibra é separada manualmente por origem, qualidade, cor e comprimento.
ONDE AS CONSIGO? KUNA - Santa Catalina Rua Santa Catalina 210, local 1-2 Sol Alpaca - Mundo Alpaca Alameda San Lázaro 101 Inca Tops Rua Francisco La Rosa, 120 Anntarah Rua São Francisco, 115, 133 Rua Santa Catalina, 302
Após décadas de regulamentos de conservação, hoje existem cerca de 350 mil indivíduos na América do Sul, dos quais 208 mil vivem no Peru. O Grupo Inca desenvolveu um trabalho conjunto com as comunidades andinas para preservar essa tradição. Um quilo de fibra é obtido a partir do cisalhamento de cinco vicunhas, que é vendido em seu estado mais rústico por 300 dólares. Grande parte dessa fibra acaba no mercado estrangeiro e é usada por marcas de prestígio, como a italiana Loro Piana. Por outro lado, 80% da população mundial de alpaca está no Peru e é domesticada há séculos. Existem duas raças: a huacaya, com pelos encaracolados e macios; e a suri, cujo cabelo longo e sedoso é usado para fazer tecidos luxuosos. No país, além disso, aprendemos a aproveitar ao máximo o potencial da fibra desses animais. A partir da seleção das filhas mais finas, obtém-se a chamada “Baby Alpaca”, mas hoje existem outros dois tecidos resultantes de um filtro adicional: a “Royal Alpaca” e a “Alpaca 16”. Inclusive o gado da alpaca tem a grande vantagem de ser muito amigável com o meio ambiente: suas patas recebem almofadas na base, para que não quebrem o chão ao caminhar ou subir as encostas, nem rasgam a grama quando eles comem, mas as cortam com os dentes, sem matar as plantas. Suas fibras, dentro de uma ampla gama de cores naturais, são geralmente usadas para fazer casacos, ponchos, blazers e lenços.
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Recomendações de Sonia Cunliffe, artista e diretora do projeto Fugaz em Callao Monumental
Para levar consigo um pouco da criatividade de Lima
ONDE EU COMPRO?
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LIMA
Lima possui várias lojas especializadas em design, ideais para comprar uma lembrança ou presente para levar consigo da cidade, alguma curiosidade excêntrica para casa ou até mesmo uma peça de mobiliário ou adereços que misturem design contemporâneo com obras de arte. No Tessor, você pode conseguir de um ralador de queijo projetado pelo arquiteto Zada Hadid a uma escultura do artista peruano José Tola. Muitas das peças são inspiradas nas linhas de design das décadas de 1950 e 1960. Se você gosta de objetos antigos, pode ir na Vernissage Arte & Antigüedades e verificar sua seleção de pôsteres e cartazes antigos; ou visitar a feira de antiguidades de San Miguel Arcángel, organizada todos os domingos pela Municipalidade de Miraflores. Também existem lojas dentro do projeto Callao Monumental. RIKA, uma delas, exibe objetos artísticos feitos com pneus reciclados: de carteiras e bolsas até mochilas, bonecas e assentos. Pertinho dali está a Shaniqua Art & Craft, loja que vende várias peças
decorativas, especialmente feitas com filigrana de papel. Um clássico da indústria, em Lima, é a Dédalo, uma loja que promove o artesanato peruano há muitos anos através de designs contemporâneos. Abrange muitos itens, incluindo utilitários, decorativos e jóias, mas é necessário destacar sua linha de brinquedos e histórias infantis. Puna, do artista Yerko Zlatar, se inspira tanto pela arte como pela natureza. Sua linha de produtos, feitas à mão por mestres artesãos, inclui móveis, tecidos e roupas, mas também sabonetes e óleos essenciais feitos a partir de produtos naturais, como muña (planta medicinal dos Andes), molle (árvore nativa peruana) e capim-limão. A natureza também é protagonista no Plantique, estúdio e butique especializado na venda de terrários, vasos feitos com diferentes materiais e acessórios decorativos. Se você procura peças de cerâmica, pode ir à Taller Dos Ríos, onde são feitas peças inspiradas em várias tradições de cerâmica do Peru, como Chulucanas (Piura) ou Huancas (Amazonas).
MAIS INFORMAÇÃO: Dédalo Jirón Sáenz Peña 295, Barranco. Feria San Miguel Arcángel Rua Alfonso Ugarte (quadras 1 a 3), Miraflores. Plantique Rua Coronel Inclán, 300, Miraflores. Puna Rua Colina, 128, Barranco. RIKA Jirón Constitución 250, interior 109, Callao. Shaniqua Art & Craft Rua Gálvez, 377, Callao Monumental. Taller Dos Ríos Rua Cajamarca, 237, Barranco. Tessor Rua Ernesto Plascencia, 350, San Isidro. Vernissage Arte & Antigüedades Avenida Los Conquistadores 325, San Isidro. Venda de Artesanatos © Gihan Tubben / PROMPERÚ
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CUSCO O jornalista Manolo Bonilla começou a caminhar por San Blas buscando arte e foi isso que encontrou
BAIRROS ARTY
Design e moda em San Blas e a Rua Palacio
San Blas, aquele bairro de ruazinhas estreitas e de pedras, casas pequenas e fachadas brancas, atrás da Plaza de Armas, apenas elevada por algumas escadas, sempre teve um encanto particular. Talvez por estar um pouco longe da agitação do centro, tenha sido o lar de estrangeiros apaixonados pela cidade que decidiram ficar. Também foi, por muitos anos, designado como o espaço para a boemia cusqueña, cheio de ateliês de artistas, cafeterias para paqueras e lojas de design independente. Por exemplo, Hilo, da artista irlandesa Eibhlin Cassidy, uma das primeiras apostas no bairro que oferece vestidos artesanais, cheios de acessórios, rendas e texturas naturais. Ou o espaço do ceramista cusqueño Tater Vera, cujo trabalho foi reconhecido pela Unesco em 2014 com o Prêmio Excelência Artesanal. Desde 1991, Tater, descendente de uma família de músicos e artistas, é responsável por manter a tradição e a técnica da cerâmica vidrada em cada uma de suas obras, sejam elas utilitárias ou decorativas: desde icônicos Toritos de Pucará até figuras de imagens coloniais religiosas. Também em San Blas podem-se encontras joias e trabalhos de filigranas em prata (o ourives Rómulo Collque trabalha na Sacred Silver), roupas de design mais contemporâneos, como camisas polo, bolsas e vestidos com motivos lúdicos (a concept store Lamaland) ou uma coleção de carteiras inspiradas nos teares andinos, que faz parte do projeto de moda sustentável da designer Ana Tafur (Saké Project). A Rua Palacio, que começa na pracinha Nazarenas e se estende por cinco quarteirões, tornou-se a artéria principal da oferta contemporânea de gastronomia, restauração e hotelaria (ver item 19). Ali estão localizados, quase em linha reta, os emblemáticos espaços que marcaram a identidade cosmopolita da cidade peruana que recebe mais turistas por
Galeria Tater Vera © Manolo Bonilla
MAIS INFORMAÇÃO: Choqe Chaka Rua Palacio, 110, Cusco Cocoliso Rua Palacio, 122, Cusco Hilo Carmen Alto 260, San Blas Lamaland Carmen Alto 246, San Blas Montse Badell Calle Palacio 118, Cusco Sacred Silver Calle Tandapata 680, San Blas Tater Vera Calle Tandapata 917, San Blas Galeria Tater Vera © Manolo Bonilla
ano. Montse Badell, designer catalã, tem um empreendimento nessa rua, onde oferece suas peças artesanais feitas a mão com fibra de alpaca, que sua família peruana produz em Puno. Por outro lado, a Cocoliso é uma marca local que interpreta a identidade cusqueña com um visual contemporâneo de design.
Seus acessórios buscam transmitir design, cultura, história e aprimoramento de técnicas ancestrais, como tecelagem e ourivesaria andinas. Por exemplo, seus chapéus são feitos com feltro natural e usam várias aplicações: de tecidos de Ocongate a tecidos vintage e moedas antigas do Peru.
Não há apenas moda na Palacio: Choqe Chaka é uma jovem editora de fanzines, publicações alternativas de fotografia e livros de arte de talentos peruanos. E as empresas continuam aparecendo na cidade. A mais recente é a Awai, uma marca de design ecológico.
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Casa Calonge © Antonio Escalante / PROMPERÚ
TRUJILLO O escritor Gustavo Rodríguez é autor de “A Fúria de Aquiles” e finalista do Prêmio Planeta 2009. Ele viveu até os 16 anos em Trujillo e aqui ele se recorda desse episódio de adolescência vital.
Píer do Balneário de Huanchaco © Antonio Escalante / PROMPERÚ
O RIO OCULTO DE TRUJILLO Uma noite, coloquei meu ouvido no chão na Plaza de Armas de Trujillo e prendi a respiração
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Era um adolescente e, junto com o álcool nas artérias, carregada a curiosidade de comprovar se era verdadeira essa história de que embaixo da praça corre um um rio subterrâneo. Para meu desencanto, não o escutei.
No entanto, nesses anos, esse rio emergio transparente à superfície e, a partir dessa praça, criou um canal que hoje me leva aos lugares que amava quando vivia lá. Um píer me recebe na quadra sete de Bolívar, em frente ao Teatro Municipal. Lá, meu pai teve uma farmácia e esse foi o primeiro teatro que visitei na minha vida. Não é necessário ir a um espetáculo: foi restaurado há alguns anos e seus acabamentos requintados valem a pena. Um meandro radical me conduz agora a uma rota de sánguches (sanduíches): os de sempre na lanchonete San Agustín, ao lado da igreja de mesmo nome, e a década de 1980 no Janos da Avenida Espanha. Já que estamos ali, que o rio nos dirija até as famosas Mollejitas de San Andrés, onde deve-se esperar a noite: as moelas ao shoyo e ao alho são a iguaria mais deliciosa que se pode
fazer com esse músculo difamado do frango. De lá, a corrente me leva até o Romano Criollo no Recreo, onde meus primos são os generosos anfitriões, e depois me leva até o Mococho do balnerário Huanchaco, onde não há vista, mas há uma cozinha nikkei que já impressionou a presidentes. Mar? O Big Ben está próximo. Uma sobremesa? El Chileno tem 80 anos fazendo os melhores sorvetes de lúcuma e chocolate. Ao anoitecer, a correnteza me deposita mansamente junto ao complexo de Mansiche, onde algumas gentis senhoras vendem picarones (rosquinhas) crocantes e cachangas (pastéis) retumbantes. Não é uma má idéia flutuar depois no bar do Museo del Juguete – como também não é nada mal visitar este museu de dia, nem tomar café da manhã frito no Buenos Aires de Pizarro depois de levantar a bandeira em um domingo na praça –, pois dessa forma o rio me devolve ao centro, onde se iniciou a travessia. Que o visível Moche tenha ciúmes dessas linhas, pouco importa: sua paisagem e as huacas de suas margens são mais charmosas, ainda, que minhas lembranças.
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TRUJILLO O artista plástico Gerardo Chávez resenha os dois projetos artísticos que desenhou em sua cidade natal
TRUJILLO A socióloga e chef Isabel Álvarez foi pesquisadora para o livro “Picanterías y Chicherías del Perú”.
UM HOMEM E SUA CIDADE
RICO NORTE
O desejo de fazer algo pela arte em Trujillo é algo que me acompanhou durante quase toda a minha vida. Não foi outra coisa que me levou a organizar as duas primeiras bienais de arte desta cidade, lá pela década de 1980. E foi esse mesmo desejo que me incentivou a abrir o Museo del Juguete, em 2001. Este é um lugar atípico, uma raridade, pois é um dos poucos museus dedicados a brinquedos que existem na América Latina. Para mim, no entanto, esse espaço guarda certa saudade da infância. Hoje, conta com uma coleção de mais de três mil brinquedos, desde apitos e estatuetas que pertenceram a culturas pré-colombianas como Virú ou Chimú, até trens elétricos da década de 1960, bonecas fabricadas na França e na Alemanha por volta de 1914, bem como soldadinhos de chumbo
A gastronomia de Trujillo tem sua origem nas picanterías tradicionais de La Libertad, hoje quase desaparecidas. Eram lugares onde se ia comer piqueos (petiscos), acompanhados de chicha de jora (cerveja de milho). Os principais ingredientes desses pratos são aqueles que vêm do mar (peixes e mariscos) e os ensopados. Outro ingrediente crucial é o ají (pimenta), que faz parte da estrutura das receitas, não tanto para ficar apimentadas, mas também por conta de seus sabores característicos.
O que move um artista a fundar dois museus na cidade onde nasceu?
Segredos da gastronomia de Trujillo
provenientes de Londres. No entanto, creio que o ponto culminante do espírito com o qual as bienais de Trujillo foram feitas veio com a inauguração do Museu de Arte Moderna, em 2006. Minha intenção, aqui, era coletar o testemunho da plástica moderna e aproximála da minha cidade. Na entrada do museu está guardada uma escultura minha, chamada El Guardián, que tem três metros de altura. Em seguida estão suas salas, que abrigam peças de artistas que vão dos peruanos Emilio Rodríguez Larraín, José Tola ou Venancio Shinki, latino-americanos como Rufino Tamayo ou Wilfredo Lam, e até obras de Paul Klee. Mas, para mim, tem um significado especial poder mostrar a obra de três grandes artistas de Trujillo: Alberto Dávila, Macedonio de la Torre e Ángel Chávez.
Endereço: a uma quadra do cruzamento da Avenida Federico Villarreal com a estrada Industrial para Laredo, Trujillo. Horário: segunda a sábado, das 10h às 17h. Domingo, das 10h às 13h.
É um prato servido tradicionalmente às segundas-feiras. É uma sopa grossa, feita de ensopados, cujo sabor característico vem da adição de pele de porco e um molho feito com ají panca, alho e cebola.
Cebiche
MAIS INFORMAÇÃO:
Museu de Arte Moderna
Shámbar
Museo del Juguete
Endereço: Jirón Independencia, 705, centro histórico de Trujillo. Horário: quarta a sábado e segunda-feira, das 10h às 18h. Domingo, das 10h às 13h.
Embora este prato esteja presente em toda a costa peruana, o cebiche trujillano tradicional se diferencia porque não se utiliza coentro em sua elaboração. Em vez disso, obtém seu sabor característico do uso de dois tipos de ají: o amarelo e o mochero.
Sudado de pescado
O sudado (ensopado) trujillano se caracteriza pelo uso de ingredientes de origem local, como cebola e ají amarelo, que se junta à chicha de jora, feita com milho azedo.
gerardochavez.pe/fundacion/
Tortilla de arraia
Uma especialidade do norte, que também se consome muito em Lambayeque. O segredo para preparar este prato é usar a carne da arraia seca, que deve ser deixada de molho de um dia para o outro.
Doces
Embora não venham da tradição picantera, doces como alfajores e kinkones se tornaram uma parte essencial da gastronomia trujillana os dias atuais.
summum.pe/regiones/ mejor-restaurante-de-la-libertad/ Museu de Arte Moderna de Trujillo © Daniel Silva / PROMPERÚ
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AREQUIPA Ángela Delgado é gestora cultural e diretora do Hay Festival en Perú, com sede em Arequipa. Aqui percorre o centro histórico da cidade resenhando a arquitetura de suas construções religiosas.
ENTRE MOSTEIROS Conventos coloniais emblemáticos Um passeio a pé pelo centro histórico de Arequipa, reconhecido pela UNESCO como Patrimônio Cultural da Humanidade no ano 2000, sempre é uma experiência memorável, pela imponente arquitetura da maioria de seus edifícios. Por exemplo, os conventos coloniais que ocupam um lugar especial, icônico, na paisagem da cidade. Um bom ponto de partida é o museu de Arte do Vice-Reinado de Santa Teresa, localizado na esquina das ruas Melgar e Peral, e uma das
construções religiosas mais emblemáticos de Arequipa. Foi construída no início do século XVIII e, desde a sua criação, está sob a administração da ordem das Carmelitas, mas foi somente em 2010 que começaram os projetos de restauração que permitem que hoje possamos apreciar o antigo claustro como um museu que conta em seu interior com várias salas de exibição de arte religiosa. Para quem aprecia as delícias da pastelaria, o mosteiro possui uma pequena
MAIS INFORMAÇÃO:
Museu de Arte do ViceReinado de Santa Teresa
www.museosantateresa.org
Mosteiro de Santa Catalina www.santacatalina.org.pe
loja de souvenirs, onde se vendem doces e empanadas, além de um perfumado sabonete de rosas feito pelas irmãs do claustro. O próximo destino é o mosteiro de Santa Catalina. O convento, que é como uma cidadela em seu interior, sintetiza as características mais notórias e memoráveis do centro histórico de Arequipa: beleza natural, arquitetura imponente, harmonia de design e, além disso, o mais inexplicável e evidente chamado espírito do lugar. Passear pelas ruas do mosteiro, dia ou noite (porque há visitas noturnas), é uma experiência que vale a pena dar a si mesmo sem se preocupar com o passar do tempo. Em sua loja de presentes, pode-se comprar várias coisas, mas as mais impressionantes são os sabonetes de salsa e o filme “Ana de los Ángeles”, dirigido pelo cineasta arequipeño Miguel Barreda, que trata da vida da irmã Ana de Los Angeles, hoje beata e aspirante a Santa. Além disso, a sala de exposições do convento costuma receber mostras de arte contemporânea de grande interesse. Embora não seja um convento, a Igreja da Companhia, no cruzamento das ruas General Morán e Álvarez Thomas, merece fazer parte dessa rota, devido à beleza arquitetônica presente tanto em sua fachada quanto em seu interior. É imperdível a antiga sacristia da igreja, agora conhecida como a Cúpula de San Ignacio. Suas paredes exibem magníficas figuras policromáticas e em alto relevo de diversos elementos, incluindo pássaros da selva, frutas e trepadeiras de flores exóticas. No mesmo complexo arquitetônico estão os claustros da Companhia, com várias lojas e um restaurante de comida típica da região.
Mosteiro de Santa Catalina © Renzo Tasso / PROMPERÚ
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AREQUIPA Depois de visitar os conventos da cidade, a gestora cultural Ángela Delgado passou pelos principais museus de Arequipa.
Arqueologia em museus de Arequipa
CONVERSAS COM A HISTÓRIA
Museu Histórico Municipal Guillermo Zegarra Meneses
Igreja da Companhia em Arequipa © Gihan Tubben / PROMPERÚ
Museu José María Morante Claustros da Companhia de Jesus © Enrique Castro-Mendívil / PROMPERÚ
Museo Santuarios Andinos
Localizado a apenas uma quadra da Plaza de Armas, este museu possui uma interessante coleção de peças arqueológicas. Além disso, é a que abriga a famosa múmia Juanita, uma garota mumificada pertencente à cultura inca, que surpreendeu a comunidade arqueológica global por quão bem ela foi preservada. Também é conhecida como “a garota dos gelos” ou “a dama de Ampato”, pois foi encontrada nas alturas do vulcão Ampato.
É voltado para a preservação de bens arqueológicos procedentes das pesquisas financiadas pela Universidade de San Agustín, à qual pertence o museu, e está localizado a um quarteirão do Santuarios Andinos. Possui aproximadamente 14 mil objetos, que vão de peças de cerâmica e têxteis pré-hispânicos a ossos e metais. Vale a pena dar uma olhada na coleção Yabar, composta por uma variedade de keros (antigos vasos de bebida Incas) ou vasos cerimoniais, bem como os diferentes objetos pertencentes ao período Churajón, originários da região. Após a visita, você pode caminhar até a Igreja da Companhia e voltar à Plaza de Armas da cidade.
Endereço: Rua La Merced, 110, centro histórico. Horário: de segunda a sábado, das 9h às 18h. Domingo, das 9h às 15h.
Endereço: Rua Álvarez Thomas, 200, centro histórico. Horário: segunda a sexta-feira, das 9h às 15h45.
facebook.com/MuseoSantuariosAndinos
museo@unsa.edu.pe
Algumas de suas salas são dedicadas a diferentes momentos da história da cidade, mas uma das mais impressionantes é a Sala dos Arequipeños Ilustres, na qual pode-se ver os retratos de vários intelectuais, políticos e até cientistas nascidos aqui. Outro espaço que merece uma visita dentro do museu é a Sala de Teodoro Núñez Ureta, Alejandro e Pablo Núñez Ureta. Os dois primeiros eram irmãos, e tios do terceiro, e todos eles foram grandes artistas plásticos. De fato, muitos especialistas consideram Teodoro como o mais importante muralista peruano, e podem-se ver dois murais emblemáticos dele nas instalações do antigo hotel Libertador, em Selva Alegre. Na saída do museu, vale a pena aproveitar a proximidade do Fundo El Fierro, onde são expostas e vendidas peças de artesanato popular. Além disso, a praça San Francisco e a igreja de mesmo nome, que compõem o complexo arquitetônico junto ao museu, são o cenário que destaca a paisagem urbana de Arequipa.
Endereço: Plaza San Francisco, 407, centro histórico. Horário: Segunda a Sexta-feira, das 8h às 15h.
facebook.com/museomunicipa
Museo Histórico Municipal Guillermo Zegarra © Marylin Vergel / PROMPERÚ
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Pedreira de Añashuayco © Miguel Mejía / PROMPERÚ
AREQUIPA Santiago Bullard, jornalista e viajante, nos leva pela rota do sillar e da arquitetura de Arequipa.
ASCENDÊNCIA VOLCÂNICA
O sillar: três vulcões, pedreiras e conventos O sillar, ao qual algumas das construções mais emblemáticas de Arequipa devem a sua cor branca, é um material obtido através do corte de uma pedra ígnea (isto é, formada pela solidificação do magma de um vulcão): o ignimbrite. Este mineral, resistente e poroso, ideal para construções com propriedades antissísmicas, está firmemente ligado à história desta cidade, que não à toa fica aos pés de três vulcões: o Misti, o Chachani e o Pichu Pichu.
NAS PEDREIRAS
A rota do sillar é uma rota turística que começa no distrito de Cerro Colorado, a 14 quilômetros da cidade, e atravessa as pedreiras de Añashuayco, Cortadores e Culebrillas, para ver de perto os trabalhos com sillar. A última, além disso, conta com falésias cobertas por pinturas rupestres.
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San Lázaro © Red Frame / PROMPERÚ
NA CIDADE Catedral de Arequipa
Casa Tristán del Pozo
É a maior construção religiosa e monumental da cidade. Ele passou por inúmeras reconstruções devido a terremotos, mas o edifício atual domina a paisagem da Plaza de Armas desde o século XVII. museocatedralarequipa.org.pe
Rua San Francisco, 115 Com seus altos tetos abobadados e seus pátios internos, este casarão do século XVIII é um grande expoente da arquitetura colonial. Sobretudo, chama a atenção a fachada do edifício, cujo centro destaca a representação de um arbusto com cinco ramos. fundacionbbva.pe/casonas-y-museos
Convento de San Francisco
Bairro de San Lázaro
Rua Zela, 103 Vale a pena entrar na igreja deste convento para admirar seu coro de sillar. Também são desse material os altos muros do edifício, que também conta com um museu dedicado à arte religiosa.
É o bairro mais antigo de Arequipa, localizado a apenas quatro quarteirões da Plaza de Armas. Suas casas de sillar fazem fronteira com um labirinto de ruas e becos estreitos. No centro, se encontra a praça Campo Redondo.
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AREQUIPA Alonso Cueto, escritor e miembro da Academia Peruana da Língua, repassa a obra de seu amigo e Nobel peruano em busca de referências à sua cidade natal, Arequipa
VARGAS LLOSA DA RAIZ Paradeiros em uma rota dedicada ao Nobel peruano em sua cidade natal: Arequipa Todas as histórias que hoje povoam e moldam o universo de Mario Vargas Llosa (Prêmio Nobel de Literatura 2010) têm sua origem em Arequipa. Seus romances podem ocorrer entre Piura e Paris, nas cantinas do centro de Lima ou entre as comunidades nativas de Madre de Dios, mas tudo na vida desse escritor nos remete às encostas do Misti, à Cidade Branca. E, mais especificamente, ao antigo bulevar Parra, onde está localizada a casa onde ele nasceu, em 1936. Hoje, o edifício foi convertido na Casa Museu Mario Vargas Llosa. O curioso desse museu é que ele conta com exposições virtuais: hologramas que reconstroem diferentes momentos da vida do escritor. Dois espaços que merecem uma menção a parte em seu interior são a reconstrução do quarto de sua mãe, onde Vargas Llosa veio ao mundo nas mãos de miss Pitcher, a parteira da cidade; e a sala que nos convida a imaginar o interior do bordel que serviu de modelo para o escritor quando ele escreveu seu romance “ A Casa Verde”, publicado em 1966.
cidade: o Vale do Colca, onde está localizado o famoso cânion de mesmo nome, e ao qual Vargas Llosa dedicou um texto intitulado “O Vale das Maravilhas” na década de 1980.
Atrás do museu fica o teatro Vargas Llosa, um espaço que conta com tecnologia de iluminação e som provenientes da Europa. A rota continua pela biblioteca regional Mario Vargas Llosa, que conta com importantes programas de leitura e educação, e ao lado fica a biblioteca Vargas Llosa. Esta última é composta por livros do próprio escritor, doados a esta instituição desde 2012, e conta com três salas de leitura. Mas teríamos que acrescentar, ainda, mais um ponto nessa rota, embora isso nos afaste um pouco da
Casa Museo Mario Vargas Llosa Endereço: Avenida Parra 101 Horário: Segunda a Sexta-feira, das 8h30 às 14h30
Bilbioteca Mario Vargas Llosa © Fernando López / PROMPERÚ
Biblioteca regional Mario Vargas Llosa Endereço: Rua San Francisco, 308 Horário: Segunda a Sábado, das 8h30 às 20h30
Facebook: Biblioteca regional Mario Vargas Llosa
Casa Museo Mario Vargas Llosa © Fernando López / PROMPERÚ
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Catedral de Cusco © Gihan Tubbeh / PROMPERÚ
CUSCO Uma explicação do historiador de arte Luis Eduardo Wuffarden
BARROCO ANDINO Quatro igrejas para entender essa tendência artística em Cusco
Igreja de Andahuaylillas © Víctor Manuel Chávez / PROMPERÚ
Igreja da Companhia de Jesus © Asociación Sempa
Durante os séculos XVII e XVIII, a arte barroca desenvolvida em Cusco e sua região compreendeu um amplo conjunto de manifestações próprias, claramente diferenciadas de seus pares europeus. Essa originalidade foi evidenciada após o grande terremoto de 1650, que deixaria em ruínas a cidade espanhola. Isso obrigaria uma reconstrução total, assimilando rapidamente as retóricas barrocas que chegavam com omusitada força do Velho Mundo. Houve então um complexo processo de seleção e adaptação, tanto no que diz respeito aos materiais disponíveis nos Andes quanto às necessidades expressivas da sociedade colonial emergente. Assim surgiram a catedral e o segundo templo da Companhia de Jesus, construídos a partir de suas fundações por arquitetos que respondiam à incipiente tradição local, lançando as bases de uma arquitetura singular. Esse esplendor urbano alcançou um primeiro boom durante o governo eclesiástico do bispo Manuel de Mollinedo y Angulo (1673-1699), prelado espanhol cujo patrocínio incessante expandiu o novo estilo em toda a sua extensa diocese. Vindo da corte de Madri, Mollinedo conhecia bem os usos políticos da imagem e os aplicava
para afirmar sua própria figura, exaltando ao mesmo tempo as grandes devoções hispânicas e a monarquia católica das Austrias. No entanto, essa última onda cosmopolita conseguiria interagir criativamente com arquitetos locais e com as preferências de uma população indígena e mestiça que contribuiu, finalmente, para criar seus próprios cânones estéticos. Logo, foi reconhecida a habilidade de arquitetos nativos como Diego Quispe Tito ou Juan Tomas Tuyru Túpac, cuja fama rapidamente converteria Cusco no centro artístico mais notável e influente do vice-reinado. Outro fator determinante foi o chamado “Renascimento Inca”, um movimento cultural de grandes repercussões que buscava evocar o passado imperial de Tahuantinsuyo em um contexto colonial. Assim, junto com os gêneros tradicionais de belas artes europeias, os nobres incas promoveram ativamente a elaboração e o uso de queros (vasos andinos), tapeçarias ou tupus de prata (talheres de prata) que apelavam para técnicas de origem pré-hispânica e eram destacados, em chave barroca, como orgulhosos sinais de identidade dentro do mundo cerimonial de seu tempo.
ONDE VER O BARROCO ANDINO? Embora seja uma jornada por quatro igrejas dos séculos XVII e XVIII, não é uma proposta exclusiva para os devotos. O eixo é o legado cultural que oferece peças de pintura e escultura excepcionais. O templo da Companhia de Jesus (Cusco), a capela da Virgem Purificada de Canincunca (Urcos), San Juan Bautista (Huaro) e a igreja de Andahuaylillas – conhecida como Capela Sistina da América pela beleza e detalhes de suas abóbadas e naves interiores. rutadelbarrocoandino.com
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CUSCO Dayanna Farfán vive em Cusco, é administradora de Igers Cusco e percorre a praça oito vezes ao dia
ENTARDECERES NA PRAÇA E outros cartões postais de Cusco para Instagram
Catedral de Cusco © Enrique Nordt / PROMPERÚ
É o epicentro de qualquer viajante, seja a da praça San Marcos, em Veneza, ou no Zócalo, na Cidade do México, ou na Plaza Mayor, em Lima. É a pedra de toque para qualquer referência, é o ponto de partida e ponto de encontro para mais rotas, e é o eixo do dinamismo de toda cidade. Cada praça tem suas particularidades e, geralmente, abriga os melhores negócios e edifícios da cidade (como a prefeitura, a catedral ou a casa dos governadores). No caso de Cusco, além disso, responde a um traço espanhol de design de cidades (que em Lima é mais evidente por quadrantes equidistantes), executado durante a Colônia. O sincretismo é evidente na localização das construções durante esse período. Ou seja, edifícios modernos sobre bases incas. Inclusive na eleição do centro, o mesmo que funcionava durante os tempos
dos incas: dali partiam os caminhos até os quatro cantos. Talvez o mais distintivo da Plaza de Armas de Cusco seja a presença de duas igrejas, de duas ordens diferentes, compartilhando a mesma paisagem: a catedral e a igreja da Companhia de Jesus.
© Igers Cusco
A primeira, além de sua arquitetura imponente, protege uma particularidade pictórica no interior: “A Última Ceia” (1748), de Marcos Zapata. Uma pintura que mantém os padrões da Escola Cusqueña e que encena aquela cena do cristianismo com um cuy (porquinho da índia) sobre a mesa. A segunda, começou a ser construída em 1576 sobre o que foi um templo inca, possui um dos maiores altares de madeira mais sofisticados e é uma das quatro igrejas que compõem a rota do barroco andino (ver item 37). Para a comunidade Igers Cusco, os entardeceres nesse espaço, quando o céu se torna mais nítido em sua paleta de cores, quando se desenham as silhuetas das montanhas ao redor, e quando aparecem as sombras nas igrejas, são o melhor cartão postal de uma viagem a Cusco.
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IQUITOS Tracklist do audiófilo e produtor musical Juan Ricardo Maraví
DOS WEMBLERS A JUANECO Sons originais da cumbia amazônica
Eles sempre estiveram lá, produzindo long plays e discos com empresas nacionais como a Infopesa, mas tiveram uma exibição internacional inesperada em 2007. Então, publicaram um disco intitulado “The Roots of Chicha”, sob o selo de Barbés Records, com sede no Brooklyn. Esta produção coletou diferentes sons e manifestações musicais do final dos anos 1960 e início dos anos 1970 no interior do país. Sobretudo, a cumbia, que adaptou certas territorialidades (e instrumentos) de acordo com a origem (e ousadia) de seus músicos: havia a do norte, a serrana e, claro, a amazônica. Da mescla desses ritmos, explorações e harmonias, se encontra a base dessa particular mistura que os peruanos chamam de música chicha. E também o encontro de guitarristas, influenciados pela guaracha (dança popular semelhante ao sapateado), o folclore, o rock e alguns toques psicodélicos.
Grupo Pax © Infopesa
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O grande cacique © Infopesa
Duas de suas canções foram incluídas em “The Roots of Chicha”: “Mujer Hilandera” e “Vacilando com Ayahuasca”.
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De Grupo Pax de Iquitos
Parte das recentes descobertas que encontram homenagens e tributos entre os sons das selvas do Peru e do Brasil. Uma de suas músicas, “Garota”, que faz parte de um álbum de 1985, foi incluída na trilha sonora da série da Netflix, “Green Frontier”.
Los Mirlos © Infopesa
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A dança do petroleiro. Dos Wemblers de Iquitos
Em 1968, na capital de Loreto, Salomón Sánchez formou uma banda que tocaria uma versão com arranjos elétricos da música popular então: pandilla (quadrilhas), carimbó e cumbia. Salomón alistou seus cinco filhos e nomeou a banda Los Wemblers. Havia se inspirado nas estações de rádio AM que conseguia gravar da Colômbia, Brasil e Venezuela. Graças a essa influência, eles escreveram os dois primeiros hinos do gênero: “Som Amazônico” e “A Dança do Petroleiro”.
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“Vacilando com Ayahuasca”. De Juaneco e seu combo
Quatro anos depois, apareceu José Wilindoro Cacique Flores e se converteu na mítica voz desse grupo, fundado por Juan Wong e Noe Fachín. Subiam aos palcos com roupas e desenhos que remetiam à estética e às cores das comunidades amazônicas.
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A dança do lourinho. De Los Mirlos
Eram de Moyobamba, no departamento de San Martín, chamados de “os charapas de ouro” e sua base estava localizada em Lima, mas a incluímos nesta lista porque se nutriram totalmente da influência de Los Wemblers (inclusive realizadam versões de suas músicas, acoplando o som de órgãos elétricos).
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Minha morena rebelde. De Eusebio e seu banjo
Eusebio Pérez Campojó surpreendeu a cena musical ao inovar com um instrumento que normalmente não era usado para esses ritmos: o banjo. Também foi importante a união de talentos de Eusebio e Enrique Delgado, para fundar o Los Destellos, um grupo de cumbia que ostentava o virtuosismo de seus guitarristas.
Cruzeiro Aria Amazon na Reserva Nacional Pacaya Samiria © Richard Mark Dobson / Aqua Expeditions
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IQUITOS ENTRAR NA SELVA EM TRÊS LODGES Un paseo de lujo por el Amazonas en los cruceros boutique.
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amazonriverexpeditions.com
Heliconia Amazon River Lodge Localizado a 80 quilômetros de Iquitos, quase uma hora e meia de navegação, na Reserva Comunal de Yanamono, distrito de Indiana. Oferece jornadas de observação de pássaros, expedições de caça esportiva (de julho a dezembro) no rio e excursões guiadas à Reserva Nacional Allpahuayo Mishana.
ENCONTROS COM A NATUREZA Estrelar expedições na selva sem abrir mão do conforto de um cruzeiro de luxo não é uma quimera. Você pode acordar com a vista panorâmica das paisagens exóticas da Reserva Nacional Pacaya Samiria, no conforto de um quarto cinco estrelas.
Em Iquitos, na ausência de estradas, há o Amazonas, o rio mais abundante do mundo.
Hoje, nas águas da selva misteriosa, navegam cruzeiros butique que se adentram nos recantos das florestas. Muitos deles contam com propostas sofisticadas de gastronomia, terraços privativos, jacuzzis, guias personalizados com grande conhecimento da vida natural e a oportunidade de visitar comunidades da selva.
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manitiexpeditions.com
Irapay Luxury Resort Após 30 minutos de navegação do porto de Nanay, chega-se a esse espaço, nas margens do rio Momón, perto da casa das comunidades Yaguas e Boras. Oferece visitas a uma fazenda de borboletas nas proximidades, Pilpintuwasi, e ao orfanato de animais amazônicos.
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amakperu.com/iquitos
Ämak Iquitos Localizado a uma hora do porto de Nanay, na confluência dos rios Yanayacu e Amazonas. Conta com cabanas que se assemelham à estética e forma das malocas, assim como espaços ao ar livre para praticar ioga e outra área no rio para praticar stand up paddle (SUP).
Cruzeiro Delfin © Janine Costa / PROMPERÚ
Em suas florestas, quando o céu está começando a ficar da cor laranja, as aves sobrevoam sobre o matagal. É um concerto de cantos dos pássaros, uma experiência sensorial: as cores exóticas, os gorjeios famintos dos filhotes, a busca por comida e galhos para reforçar os ninhos. A Amazônia é um dos melhores destinos para a observação de aves – muitas delas endêmicas – e existem diferentes opções com esse tipo de proposta. Aqua Expeditions www.aquaexpeditions.com
Jungle Experiences www.junglexperiences.com
Delfín Amazon Cruises www.delfinamazoncruises.com
Rivers & Forest Expeditions www.rfexpeditions.com
Ucamara Expedition www.ucamaraexpeditions.com
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CUSCO O jornalista Manolo Bonilla nos leva a experimentar novas atividades nos casarões coloniais de Cusco.
SÓ EM CUSCO
Jardins secretos, vistas de altura e jantar com ópera
Durante os últimos 10 anos, a paisagem de Cusco mudou. Desde então, e apenas nos últimos quatro anos, 41 projetos hoteleiros (de 3 a 5 estrelas) foram desenvolvidos, segundo um estudo da Sociedade de Hotéis do Peru, que identificou mais de três mil novos quartos em todo o país. Desses, 80% se dividiram entre Lima e Cusco. Então, chegaram redes de hotéis (empresas nacionais também foram ativadas) e ampliaram sua oferta turística para viajantes de todos os tipos. Aqui não vamos revisar os benefícios de seus quartos ou os menus especializados de seus restaurantes, mas selecionar quais são essas atividades que os tornam especiais para o patrimônio emocional da cidade.
1 O pioneiro
La Casona de Inkaterra foi o primeiro hotel boutique concebido em Cusco por volta do ano 2008. Conserva o traço original do palácio inca, quando foi habitado pelo espanhol Diego de Almagro durante a colônia, incluindo o pátio interno, e valoriza algumas valiosas peças de arte colonial. Pelas tardes, para contemplar o entardecer sobre a Praça Nazarenas, habitaram uma área no topo do edifício, para degustar coquetéis clássicos com um toque andino.
2 Ópera e hora do chá andino
Instalações Hotel Monasterio Cusco © Luis Gamero / PROMPERÚ
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Varandas Hotel Inkaterra La Casona Cusco © Inkaterra
A cadeia Belmond, que também possui hotéis no Vale Sagrado, tem dois espaços separados por metros, em frente à pracinha Nazarenas. No Hotel Monasterio, programam duas vezes por mês um jantar, com espetáculo de ópera incluído, no que foi a antiga capela do convento. E no Palácio Nazarenas, há a oferta, às tardes, de tomar um brunch nas mesas dispostas em seu jardim secreto, onde cultivam e extraem as ervas aromáticas para suas infusões.
Sala de jantar do Hotel Monasterio © Gihan Tubbeh / PROMPERÚ
3 Picantería com história
“La bodega de la chola”, na realidade, é uma picantería que faz antologia de preparos de receitas regionais (ver item 47). Está localizada dentro do hotel Casa Cartagena, uma proposta que combina decoração eclética sobre um casarão colonial, com colunas de pedra. Este foi o cenário de visitas ilustres como as do poeta chileno Pablo Neruda ou do guerrilheiro argentino Ernesto Guevara. Quadros nas paredes atestam esses encontros, quando Cusco tinha aquele magnetismo místico que cativava viajantes latino-americanos.
A rota de bares do jornalista gastronômico Sergio Rebaza
MOVIDA CUSQUEÑA
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CUSCO
Cai a noite na cidade imperial Cusco não descansa. O turbilhão do turismo e a vida parcelada dos mochileiros que chegam de todo o mundo transformaram-na em uma cidade com uma vida noturna frenética. Em suas ruas de paralelepípedos e íngremes, encontram-se bares que rendem culto à boemia e à cerveja, balcões com propostas gastronômicas de vanguarda, além de salões de dança para espalhar o espírito. Vá com calma, que a altura não perdoa.
Plaza de Armas © Victor Manuel Chávez / PROMPERÚ
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Localizado em um antigo casarão colonial, com um pátio muito aconchegante, este bar se tornou um dos favoritos para os amantes das cervejas artesanais e altos papos. Etiquetas de várias origens são oferecidas juntamente com uma seleção de pratos de bar. Ao entrar no casarão, não evite a posição do Three Monkeys Coffee, com os melhores grãos cusqueños e de outras origens, cem por cento peruanos, servidos por baristas premiados. + Calle Palacio 110
Com dois locais em Lima, um em Arequipa e um em Cusco, este bar presta homenagem à bebida bandeira do Peru: o pisco. Conta com dezenas de marcas, um cardápio de coquetéis muito bem feito e um serviço de bar impecável. Seu principal objetivo: educar e divulgar os benefícios do pisco, por meio de provas e degustações. Não deixe de experimentar El Capitán, um coquetel ícone da coquetelaria peruana que mistura em doses iguais de vermute e pisco. + Calle Santa Catalina Ancha 398
Cholos Craft Beers Cusco
facebook.com/CholosCraftBeersCusco
Museo del Pisco
museodelpisco.org
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Nuevo Mundo Bar
Qespi Restaurante e Bar
facebook.com/NuevoMundoBarCusco
facebook.com/Qespi
Localizado em um segundo andar, com vista para a Plaza de Armas, este bar é um templo das cervejas artesanais. O ambiente é propício à dança, principalmente às sextas e sábados, quando há música ao vivo. Eventualmente, são organizadas oficinas de fabricação de cerveja. Prove a degustação, que inclui uma seleção de cervejas em pequenas porções, ou encare um copo de chicha de jora de barril, a ancestral cerveja andina, semelhante a uma sour ale. + Portal Confituría 233-B
Localizado no hotel El Convento da cadeia Marriott, mas aberto a todo o público. Conta com um menu de culinária peruana, atualizado em um ambiente descontraído e casual. Experimente o tartar de alpaca com uma cerveja ao lado. + Calle Ruinas 432
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Palacio Iturregui © Alex Bryce / PROMPERÚ
TRUJILLO A gestora cultural Adriana Doig compartilha alguns projetos vinculados ao patrimônio de Trujillo
Interior do Palácio Iturregui © Alex Bryce / PROMPERÚ
CASAS REVITALIZADAS Algumas das casas coloniais mais emblemáticas do centro de Trujillo
O ideal é sair da Plaza de Armas pelo jirón Francisco Pizarro, uma rua de pedestres, e caminhar um quarteirão até chegar à Casa da Emancipação. É chamada assim porque nela foi proclamada a Independência do Peru, em 1820, sete meses antes de o mesmo ser feito em Lima, e hoje é a sede de um centro cultural, com uma seção dedicada à obra do poeta peruano César Vallejo. A casa oferece uma idéia de como se vivia na época. Por exemplo, se você comparar o primeiro pátio amplo, projetado para receber carruagens, com o pequeno pátio interno, mais parecido com um jardim no qual as mesmas plantas que foram cultivadas na época são preservadas. Seguindo pela calçada, pode-se parar meio quarteirão, na esquina, para admirar o Club Central, que já foi o Palácio Iturregui. Sua fachada é um dos melhores exemplos do estilo colonial clássico, com suas opulentas janelas de ferro forjado e pintada com cores que buscam contrastar com a aridez da região. A partir daqui, o ideal é ir pelo jirón Junín até Independencia e, ali
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na esquina, fazer uma parada no Museo Café Bar para tomar um copo de guindón (licor macerado com cerejas). O jirón Independencia leva de volta à praça, onde você ainda pode admirar algumas varandas coloniais de frente para a rua. Este caminho, além disso, passa em frente à paróquia El Sagrario e, na sequência, circula a Basílica Catedral de Trujillo. De volta à praça, pode-se aproximar para admirar a maravilhosa Casona Orbegoso, que já sediou grandes eventos culturais. Para finalizar a rota, o melhor é voltar a pegar o jirón Pizarro e seguí-lo até o final, onde fica a Plazuela del Recreo, que séculos atrás foi o ponto para onde os habitantes da cidade se dirigiam para coletar sua cota de água. Aqui, podese sentar para se despedir do dia em um banco, embaixo de um dos antigos ficus que lá se erguem, e admirar o chafariz que antes ocupava o centro da Plaza de Armas, e que também é de origem colonial. Palacio Iturregui © César Vallejos / PROMPERÚ
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Festival da Marinera © Daniel Silva / PROMPERÚ
TRUJILLO A campeã nacional de marinera Sofía Dávila e suas recomendações na cidade onde aprendeu a dançar
LENÇOS BRANCOS A marinera, no Peru, é tão variada quanto o território: de Piura a Ayacucho e de Lima a Puno. A música e a dança nunca são exatamente iguais. Mas em Trujillo a marinera é sempre a norteña: uma dança na qual o homem corteja a mulher, enquanto ela o ilude refugiando-se em provocações, flertes e um certo ar de mistério. Existem muitas versões da história desse gênero musical, mas quase todas concordam que é o resultado de uma miscigenação cultural,
com a participação de elementos espanhóis, indígenas e africanos. Entre esses últimos estão o uso de instrumentos de percussão, como el cajón, e a contribuição de danças como a zamacueca. Nesta dança, a mulher usa vestidos tradicionais, herdeiros da moda do século XIX, mas sempre dança descalça. O homem, por outro lado, geralmente se veste de chalán, com poncho e chapéu, e sapateando ao ritmo do contraponto. Ambos carregam um lenço branco nas mãos.
Hoje, existem muitas escolas e academias nas quais a tradição é perpetuada, como as academias Todas las Sangres, Trujillo Tradición e Sangre Norteña, ou dançarinos que se dedicam às aulas particulares. No entanto, os concursos ainda são os principais espaços em que essa dança é exibida, começando pelo nacional (que acontece todos os anos, no final de janeiro), e ao qual se somam os festivais e eventos de 7 de outubro, declardo Dia Nacional da Marinera.
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TRUJILLO Fuentes: Uma breve história do Cavalo Peruano de Paso, escrito pelo químico e aficionado Mirko Costa. Mar e ondas: rito e esporte, do historiador Enrique Amayo Zevallos, que trata das origens do cavalinho de totora.
CAVALOS DE TERRA E MAR Tradição e cultura dos cavalos peruanos de paso e de totora
A história do Cavalo Peruano de Paso tem mais de 500 anos de antiguidade. Nos tempos da colônia, os espanhóis trouxeram os chamados cavalos do país, resultado do cruzamento de cavalos castelhanos e andaluzes. Dos primeiros herdaram a força e resistência; dos segundos, a agilidade e a compostura. Características que, juntas, os tornavam os animais ideais para serem transportados pela dura geografia do Peru, rica em desertos e cadeias montanhosas. Com o tempo, a necessidade de se adaptar a esses terrenos e a criação seletiva deram forma ao andar inconfundível do cavalo peruano de paso: um movimento arrogante, com passadas poderosas, mas que oferece ao cavaleiro um firme centro de gravidade
Balneário de Huanchaco © Alex Bryce / PROMPERÚ
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e máximo conforto. Hoje, esses cavalos são protagonistas de canções populares e valsas criollas, e sua tradição tem raízes profundas em Trujillo e arredores. Para apreciá-los, você pode ir à Casa Campo Alcor, que apresenta shows diários. Além disso, o restaurante El Rincón de Vallejo tem a concessão das instalações da Associação de Criadores e Proprietários de Cavalos Peruanos de Paso de Trujillo, onde oferecem, apenas nos finais de semana, o espetáculo do cavalo peruano de paso, bem como a dança tradicional da região: a marinera norteña. E, precisamente, em Trujillo, há outro tipo de cavalo que exerce o mesmo fascínio para moradores e viajantes. Trata-se de um que anda no mar: o cavalinho de totora. Hoje, convertido em um dos emblemas da cidade, é uma das embarcações mais antigas registradas no Peru. Hoje são tecidos à mão com as fibras da totora (junco feito de uma planta aquática) preservando a maneira ancestral, pois sua história remonta desde aproximadamente 3.500 anos atrás. Esse patrimônio foi herdado pelos pescadores
Cavalinho de Totora em Huanchaco © Daniel Silva / PROMPERÚ
da cultura Moche, que deram a essa jangada o nome de tup. Inclusive há indícios de que uma primeira versão dos cavalinhos de totora poderia ter sido usada em Áspero, um pequeno porto pesqueiro que existiu na costa central do país, e que foi contemporâneo de algumas das civilizações mais antigas do continente, há uns cinco mil anos. Mas a tradição continua: em pleno século XXI, ainda há alguns pescadores de Trujillo que escalam as ondas, sentados como cavaleiros em seus cavalinhos de totora, sobretudo nas primeiras horas da manhã e no final da tarde. Para ver essas embarcaçõess, o melhor é ir balneário de Huanchaco, ao norte da cidade.
Marinera com cavalo de paso peruano © Fernando Criollo / PROMPERÚ
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CUSCO Seleção picantera da socióloga e chef Isabel Álvarez
PICANTERIAS NO IMPÉRIO 1 Maneiras próximas para conhecer o fogão cusqueño
Longe das propostas “novoandinas”, nas picanterías de Cusco, às vezes escondidas em suas ruas laterais ou dentro dos pátios coloniais, se come tradição. Ou seja, seus sabores encontram com a abundância, com as panelas de barro e os cozimentos lentos, com as técnicas e receitas de livros de receitas antigos. Houve um tempo em que existiam mais de 200 em Cusco. Portanto, em novembro de 2016, 13 picanterías se organizaram para formar a Sociedade Picantera de Cusco, da mesma forma que funcionava em Arequipa (ver item 21). Seu logotipo é uma chomba, um típico cântaro onde é fermentada a chicha de jora.
La Yoli
A especialidade é o adobo cusqueño, um ensopado feito com ají panca frita de porco e chicha de jora. Calle Teatro 352
2 Quinta Eulalia Aberto desde 1941, é um bom lugar para provar a sopa chairo (leva carne de cordeiro e de boi, favas, olluco [tubérculo andino], trigo e hortelã) ou o cuy chactado (porquinho-daíndia cozinho entre duas pedras). Calle Choqechaka 384
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Quinta Waly
Fundada em 1976 por Gualberta Ramos. Imperdível o capchi de cogumelos (ensopado com favas, cogumelos, batatas e leite) e o ensopado de rabo de boi. Avenida Alta 506
4 La Chomba
Adobo cusqueño © Alfonso Zavala / PROMPERÚ
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Criado em 1971 por Manuela Ochoa. É reconhecida por seu lendário chicharrón (torresmo), que sugere harmonização com um copo de “frutillada”, uma espécie de cerveja de milho com sabor de morango. As herdeiras da dona agora também administram outra picanteria, Las Manuelitas, na mesma rua. Avenida Tulumayo 339
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CUSCO Uma peregrinação da engenheira florestal Talía Lostaunau
ANDE E RELIGIÃO Celebrações com algo além de história A peregrinação ao santuário do Senhor de Qoyllurit’i começa 58 dias depois da celebração do domingo de Páscoa (Ressurreição), entre maio e junho, quando cerca de 90 mil pessoas de diferentes partes do Peru se encontram no povoado de Mahuayani , a 130 quilômetros de Cusco, para ir ao santuário localizado em um barrando do nevado Sinak’ara (4.600 metros acima do nível do mar). Pode parecer uma peregrinação católica, devido à presença de igrejas e cruzes, no entanto, abrange várias expressões culturais e religiosas. É um dos exemplos mais claros de sincretismo em nosso país.
Uma celebração católica
Um dos momentos mais importantes é o traslado das cruzes de madeira até o topo do nevado. Além da procissão das 24 horas, na qual os peregrinos carregam as imagens da Virgem Dolorosa e do Senhor de Tayancani. Após a procissão, um sacerdote os
acompanha em Intilloqsina, onde celebram o nascer dos primeiros raios de sol e, em seguida, celebram uma missa diante de milhares de pessoas que se reúnem na pequena igreja do povoado de Tayancani. Este ritual é associado pelos peregrinos à fertilidade da terra e ao culto aos Apus (montanhas), e é realizado no centro da área de influência do deus andino mais importante da região, o Apu Ausangate.
Algo de Aymara
Qoyllurit´i © Karina Mendoza
Cultural da Nação; e o Ollantay Raymi (29 de junho), é colocado em cena o drama de Ollantay, que conta a rebelião do general inca contra o império de Pachacutec. Estas são apenas algumas festividades nas quais as raízes incas e católicas são misturadas: o Inti Raymi (24 de junho de cada ano) como palco de uma homenagem inca durante o solstício de inverno; a Fiesta de las Cruces, todo 6 de janeiro; a festa da Virgen del Carmen em Paucartambo (15 a 18 de julho).
Durante os dias centrais de Qoyllurit’i, é organizado o mercado das alasitas, também conhecido como mercado das ilusões, inspirado em uma feira tradicional em La Paz e Puno. A palavra “alasita” significa “compreme” em aymara. Aqui pode-se adquirir objetos em miniatura: carros, edifícios ou televisores de todos os modelos e cores.
Outras celebrações
Cada primeiro de janeiro, os varayocs (prefeitos) e vereadores das comunidades de Ollantaytambo assumem seus cargos no meio de um ambiente de festa, comida e dança. Se chamam Sinkuy. Também em janeiro, mas na área de Yanaoca, a quatro horas de Cusco, se encena uma espécie de ritual de combate ancestral entre duas comunidades. É o Chiaraje. Em Ollantaytambo, há espaço para religião e teatralidade: a festa do Senhor de Choquekillka (durante as duas últimas semanas de maio) é considerada festa patronal no povoado e foi declarada Patrimônio
Qoyllurit´i © Karina Mendoza
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LIMA Trilha sonora da cantora e compositora Susana Baca Monumento a Chabuca Granda em Barranco © Adrián Portugal / PROMPERÚ
QUAL O SOM DE UMA CIDADE?
Paisajes sonoros de la Lima tradicional
Os bairros de Lima serviram de palco para muitas tradições musicais, desde marineras e valsas até ritmos afro-peruanos. Sons que, muitas vezes, se encontravam nas casas de compositores e músicos, e outras vezes em becos e cantinas. Aqui, três distritos nos quais ainda ecoa a música tradicional da cidade.
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Rímac
Este distrito foi um dos berços do vals criollo (valsa peruana) e da jarana. Durante anos, a Alameda de los Descalzos foi um ponto de encontro de compositores, músicos e cantores. No verão, foram comemoradas danças e bailes populares, com a participação de compositores como a dupla Montes e Manrique, Felipe Pinglo ou Alejandro Ayarza, mais conhecido como ‘Karamanduka’. Não muito longe dali, na atual Avenida Francisco Pizarro, ficava o bairro Malambo, onde havia uma importante presença afro-peruana e de
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sua música. Aqui também viviam os irmãos Ascues, grandes intérpretes da música criolla, bem como Braulio Sancho Dávila, que era irmão de Bartola Sancho Dávila, rainha da marinera limeña, que costumava dançar na Pampa de Amancaes. É assim que o compositor Luciano Huambachano lembra de Rímac em sua canção “Bairro Bajopontino”: “Viejo barrio de vergel, / de poetas y cantores, / de pintores al pastel / y de guapos bebedores”.
2 Breña
Hoje, alguns dos maiores expoentes da música tradicional limeña ainda estão no distrito de Breña. Aqui ainda existem clubes tradicionais e centros musicais que são verdadeiros santuários de ritmos populares e da memória. Um desses lugares é o La Catedral del Criollismo (Jiron Pariacoto, 1107), localizado na casa do guitarrista
Wendor Salgado, e onde se arma a jarana toda sexta-feira. Há também a Casa Musical Breña (jirón Olmedo, 452), um espaço que abriu suas portas há mais de 40 anos.
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Barranco
As tradições fazem parte de sua própria paisagem. Há a Ponte dos Suspiros, que serviu de inspiração para a compositora Chabuca Granda, a ponto de dedicar uma de suas canções mais famosas: “Es mi puente um poeta que me espera / con su quieta madera cada tarde, / y suspira y suspiro, me recibe y le dejo / solo sobre su herida, su quebrada”. Ela passeava por suas ruas diariamente e sonhava em ter uma casa de onde pudesse ver a ponte. Em Barranco, houve uma grande influência da música afro-peruana, que chegava sobretudo de Chorrillos, e que ainda é visto em alguns de seus clubes mais tradicionais: Don Porfirio (jirón Manuel Segura, 115) ou La Oficina (rua Enrique Barrón, 441).
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LIMA Das mãos do cozinheiro Israel Laura, apresentador do programa Con Sabor a Perú.
FAZER O MERCADO
Banca do mercado de Surquillo © Enrique Castro-Mendívil / PROMPERÚ
Mercados, tradicionais e espontâneos, para entender a despensa peruana de alimentos
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Biofeira de Miraflores
Feiras agropecuárias Quadra 32 de Brasil, Magdalena
Mercado 1 Quadra 53 do Paseo de la República, Surquillo
A tendência de procurar produtos orgânicos começou na biofeira de Miraflores, em 1998, ao lado do parque Reducto. Lá são encontrados de tomates silvestres, até quinoa, queijos artesanais de La Cabrita e café da selva central do país. Esse exemplo foi replicado em outros espaços em La Molina, Barranco e Surquillo.
Durante seis anos, a cada domingo, mais de 60 produtores de diferentes regiões do país se reúnem. Sua oferta se concentra principalmente na promoção de um produto endêmico de cada local. Por exemplo, as bananas de Mala, as azeitonas de Tacna, a castanha amazônica da selva de Madre de Dios e o aguaymanto (fisális) de Huánuco.
Aqui se encontram produtos usados em restaurantes de alta gastronomia (como carne seca de porco ou pequenas flores para decorar pratos) e insumos frescos, provenientes de todos os cantos do país: das folhas de bijao de Tarapoto, usadas em juanes e patarashca (pratos típicos da Amazônia peruana), até frutas exóticas da selva como pitahaya ou camu camu (ver dato 23). As pessoas também vão ao mercado tomar café da manhã (sucos e sanduíches) ou podem preferir um marinho no El Cevichano (banca 191), que vende peixe, mas também prepara cebiche fresco. Na bioferia de Surquillo, aberta desde 2012, nos arredores do mercado, no mesmo bairro, se encontram produtos artesanais como mel e iogurte natural de Vacas Felices, além de vegetais orgânicos.
Mercado de Surquillo © Enrique Castro-Mendívil / PROMPERÚ
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Museu de Arte Contemporanea © Musuk Nolte / PROMPERÚ
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LIMA Um passeio por Lima e seus eventos de arte, literatura e cinema com Santiago Bullard.
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FEIRAS E FESTIVAIS NA CIDADE
Artes
Abril é um mês dedicado às artes, com duas grandes feiras na capital. Durante 2019, ambas comemoraram sua sétima edição. A primeira foi Art Lima, que este ano homenageou os artistas peruanos Gloria Gómez-Sánchez (1921-2007) e Joaquín López Antay (1897-1981). Também destacaram o lançamento da marca Ayacucho e a presença de seis galerias peruanas (80m2, Crisis, Galería del Paseo, Ginsberg, Impakto e Revólver) e duas estrangeiras (a madrileña Espacio Valverde, e Henrique Faria, de Buenos Aires) que participaram este ano no ARCOmadrid. Além disso, foi realizada a feira Peru Arte Contemporânea (PArC), que entre os fundadores está o gestor cultural argentino Diego Costa Peuser (criador da Semana del Arte de Buenos Aires, da feira Buenos Aires Photo e da revista Arte al Día), na Casa Prado em Miraflores. Nesse mesmo espaço, em agosto, foi realizada mais uma edição do Lima Photo, evento que reúne os melhores expoentes da fotografia da região, organizado pelo Museu FoLa (Fototeca Latino-Americana), com sede em Buenos Aires e criado por Gastón Deleau, e o Centreo da Imagem em Lima.
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Literatura
Na capital, o evento principal é a Feira Internacional do Livro de Lima (FIL Lima), cujo alcance e importância crescem a cada nova edição (em 2018, reuniu mais de meio milhão de participantes). A deste ano, ao contrário dos anteriores, não teve um país convidado, mas o universo criado pelo escritor e ganhador do premio Nobel, Mario Vargas Llosa (ver item 36). Entre os mais de 80 autores convidados para o evento, destacamse o prêmio Nobel de Literatura de 2008, Jean-Marie Gustave Le Clézio, a nicaraguense Gioconda Belli e a espanhola Elena Guichot.
Feira Internacional do Livro de Lima © Marylin Vergell / PROMPERÚ
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Cinema
O Festival de Cinema de Lima, com suas mais de 20 edições, tornou-se uma importante amostra do cinema contemporâneo, tanto de ficção quanto documental, do Peru e de várias partes do mundo. Entre os filmes premiados neste festival, no decorrer do tempo, se incluem “Pantaleón y las Visitadoras” (do peruano Francisco Lombardi), no ano 2000, o argentino “Nove Rainhas”, em 2001, ou o colombiano “O Abraço da Serpente”, em 2015. Outro evento que reúne os amantes do cinema na cidade é o Festival Al Este, que celebra sua décima edição. É uma ocasião ideal para ficar em dia com a produção cinematográfica dos países da Europa Oriental, embora os filmes nacionais e sul-americanos também entrem em competição. Entre os principais expositores deste ano, podemos mencionar o cineasta francês F. J. Ossang, o líder da Killing Joke, Jaz Coleman, o ator e músico Henry Rollins e o diretor esloveno Igor Zupe.
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LIMA Paola Miglio Jornalista gastronômica, co-editora do livro “Perú, el gusto es nuestro” (“Peru, o prazer é nosso”)
COMA E PONTO
Pratos essenciais para entender a culinária de um país Lima é cheia de sabores do passado, de rua, de casa. No momento mais inesperado, algum perfumado ensopado de panela ou uma parrilla (churrasco) de rua fará você descobrir uma esquina que você não conhece. Esses sabores se entrelaçam em livros de receitas de quituteiras e donas de casa que se aperfeiçoaram, inteligentes, com o passar do tempo. Hoje deixamos seis pratos emblemáticos que, se passarem pela capital, não deixe de provar.
1— Cebiche
Indispensável. Com ou sem sol, o cebiche é uma das preparações mais emblemáticas da cidade. Sua turnê mundial foi tão grande que hoje ele está nos cardápios de restaurantes de rankings e com estrela. Para prepará-lo, só precisa de ingredientes frescos e boas mãos com o equilíbrio. O de Lima é servido com milho ou choclo (milho cozido ao dente), rodelas de batata-doce e canchita serrana (milho torrado). Às vezes é acompanhado de chicharrón de lula ou de pota (lula gigante). Atenção, que o pequeno círculo vermelho que adorna o topo do prato não é tomate, é rocoto ou alí limo, e ardem ferozmente.
3— Anticuchos
Uma espécie de espeto perfurado por fatias de coração de vaca. Podem ser finas e leves ou grossas e fortes, e são macerados por aproximadamente três horas em pimenta, cominho, alho, vinagre e ají panca. Em seguida, passadas na brasa ou grelhadas, para ser servido com batatas douradas e molho de ají ou de rocoto. O segredo é comêlos assim que estiverem prontos.
5— Escabeche
É uma forma de preservar peixes ou aves em vinagre, folhas de louro e especiarias. Em Lima, é feito de peixe. E nos bons tempos, de bonito frito. O processo leva tempo, o escabeche deve dormir uma noite, para acordar bem frio e com personalidade. Como dizia a cozinheira e ‘dona’ Josie Sison Porras De la Guerra no El Peru e suas iguarias, finalmente “coloca tudo bem montado em uma forma de porcelana, se decora com queijo fresco em tirinhas, azeitonas em lata, ovos cozidos cortados em quatro, batata-doce cozida e descascada, fatiadas. Ao redor, se decora com alface fresco”.
6— Arrozes
4— Picarones
2— Causa limeña
Outro prato frio com sua versão limeña: um purê de batata amarela que se amassa com limão e pasta de ají amarelo, e se recheia como se fosse um pastel, com frango ou atum e maionese. Essas são as versões mais caseiras, embora nos menus de hoje se encontrem de filé de caranguejo, lagostins, camarões e o que a imaginação puder. É acompanhado com ovo cozido, abacate e azeitona preta.
Uma espécie de bolinhos fritos, mas feitos com farinha de abóbora, batata doce e um toque de anis. Os cobertos com óleo fervente os recebem alegremente para dar-lhes aquela pele crocante que logo é esmagada com os dedos em um mel de chancaca perfumado com figos. E assim, o paraíso limeño está na rua, nessas quituteiras de esquina que começam às cinco com suas brasas para nos presentear a doce mordida do dia.
Lima se satisfaz com os arrozes e os toma para si. Desde o clássico arroz com frango que é preparado em casa a qualquer dia, passando pelo arroz coberto com ovo e banana frita, até os arrozes elaborados com carne de porco ou frutos do mar. Uma generosidade bem granulada, que também acompanha ensopados de panela e se torna o pretexto perfeito para não se desperdiçar nem uma gota de molho.
1. Cebiche de peixe © José Cáceres / PROMPERÚ 2. Anticuchos © Sandro Aguilar / PROMPERÚ 3. Picarones © Karina Mendoza / PROMPERÚ 4. Arroz com frango © Leslie Searles / PROMPERÚ
Peru +51~ p67
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