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o
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tzara
(3)-1 a
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delalande WAF BOOKS
1 colossal brancura de Tzara na gordura do monóculo paisagem de leprosos com missionárias a abanar o leque sentadas em cima da dura bagagem
Jesuitas talvez com batinas e terços
constelação de aves no céu que nos senhoreia os mapas estão cansados de guerras 1917 quiçá 18 sal sobre o algodão a tenebrosa consciência devora coisas brandas ah a impermanência belicosa e budista
a
respira a estrela com teus pulmões incandescentes as vidas diletantes cientes de perigos vindouros sempre
pulgas a pesarem-se suspensas nos saltos
que a coisa está de ananases coça coça antes da feroz mordidela do mosquito micróbios pensam-se balanceiam na sua embriaguez de prosperarem e os músculos das palmeiras dizem: olá! tens um cigarro? queres ser bafejado por uma morte tabaqueira? ouviste falar de crimes sem autor?
u
tzantzantzara gangolamanga bouzukidouki Zdoucazeduc nfoùnfa-lha mbiraah mbiraah nfoùnfa-lha
irmão macrocéfalo perfeccionista profissional periferia que abraça o cirurgião errante de palhota em palhota e o código deontológico com as garras barcos barcos aulos ao longe cicatriz limpa e húmida preguiça de luzes brilhantes barcos mais barcos
nfoùnfa-lha nfoùnfa-lha nfoùnfa-lha empurro os cotonetes pelos ouvidos ah a celeste cerose gangàfa-lhe hélice aliciante penso adicional caso a lancetar e o boxer a barbear-se na varanda do hotel tropical esperando o espião para fazer um remix do rosto o escorpião ahumidade dilacerante chamas chamas baobás como arbustos irónicos capangas que treinam no mato bichos de gravata e fato as chamas são cinematográficas e batem nganga escalas em ascensão gang sanguinário a pontapear um puto até à morte samambaias nas estepes na minha linha de lã no meu fato janota
A
boy a bater a bota encharcado nas cascatas o curandeiro é porreiro esponja nos bancos lesão nos bancos caem os brancos bicharada venenosa wancanca aha bzdouc tesoura tesoura tesoura e sombras laminadas tesouram os navios tesouram as nuvens o olhar no termômetro gmbabàba ultra-vermelho Berthe, que é feito da tua educação espanhola da minha mãe incendiária e da minha cauda de canguru? é o frio monocromático? mfou elogiou os cogumelos laranjas e os sons purulentos para além da família a estibordo
b
centras-te na tetrarkis atrás da árvore titânica dos antepassados e dos viajantes remeniscentes
meu cérebro avança em hipérboles o caulim enche o teu crânio com inúteis pedidos de ajuda
B
dali boudoir amok ambiguo tombo tombo
e a tua barriga é uma bateria chegou o grande tambor e as claques do ronco e do rugido porque há chumbo na caneca e no seu peito e rrrrrrrrrrrrrr abanam o leitor e começam a rugir e ele começa a gritar começa a gritar então não é que o grito dos pífaros se está a multiplicar: no coral sem quintas paralelas o leitor quer morrer ou talvez dançar e desata a espernear é idiota é sujo é finório não entende os meus versos
ele grita cegamente chateia-se com os impasses do poeta profissional a garantida impossibilidade de fazer poesia é fecunda há ziguezagues nos sons ao longe e muitos rrrrrrr na base a partir nóses para algozes subaquáticos na comédia que ocorrerá enre ouro e algas hozondrac trac nfoùnda nbabàba nfoùnda tata nbabàba
c
2 movimento de gárgulas vibrar vibrar vibrar vibrar na altura da garganta de metal a tua alma esverdeja-nos é o tempo do Imperador das Plantas e os meus ouvidos estão como tochas a ouvir ouvir ouvir mbampou e a engolir a tua boa vontade
C
e revezam-se dançando na margem da madeira apenas se ouve ouhou ouhou ouhou Falcão Falcão amargas as tuas próprias imagens o mel do meu amigo levanta-me pela manhã no Panamá eu sou um deus sem importância ou um beija-flor um feto ou o servo do meu atraso ou a explosão de cores vislumbradas pela lontra
um vestido cascata cabeluda carta circular informação interna burocrática que recebemos no hospital longa carta muito longa quando tu penteias teu cabelo com cuidado dentro do teu intestino tão querido há versos que são lugares comuns do meio poético vocês são insignificantes para mim como um passaporte falso limpadores de chaminés dos sons do meio-dia cerúleos latidos que coam na geografia última luz no abismo das drogas pois ficou verde o meu guarda-chuva minha querida teus olhos estão fechados como os pulmões repuxam é o significado a fazer chichi é o limpa-chaminés a deixar a cozinha cheia de fuligem
d
3 a grande queixa da minha obscuridade esburacada fez um zigzag um turbilhão de sangue gelado
estou numa cascata desalmada sem amigos ou talentos senhor porque nos abandalhaste
D
eu não recebo cartas regulares da minha mãe que está a passar pelas estepes pelos fiordes a atravessar o canal da Mancha as mães estão sempre de viagem memórias em espiral vermelha queimam o cérebro nos degraus do anfiteatro é como a luz de um anúncio a minha psique surge a partir da área de desastre (a tal invocada) a girar à roda do azul com formigas férteis brancas e há um halo de dor que agudiza a seca
chega perto de mim com uma oração não me incomodes desce para o pântano como a ternura que nos inventa o dano de seguida há um sal ferrugento e escuro muda-se o vinho acampa-se na ressaca é a simplicidade do nosso relâmpejar cuidado com as plantas cuidado com o pára-raios quem janta com as aranhas?
e eu tomo a coroa de Safo crucifixo enorme que forma países sem arco voltaico no recanto arcaico cansadas da neve as águias irão alimentar a rocha onde se dá a mudança profunda da argila em leite e o leite à noite vai perturbar o anel e as cordas que armadilham o mundo chuva compostas de cadeias pesada possante forma no espaço dos raios da roda a haste entre os ramos
e
velhas tapeçarias que enredam a irrisão jornais de um paralítico colecções de selos inúteis roda de formigas férteis azul egípcio em forma de cobra senhor de ouro dedo que enegrece em Horus a tigela àspera do hipócrita leitor esfingeria em saldos por meia leca por estrangular por após o estouro o relâmpago a manha persa a marcha militar despontará tubo de ferro na boca do abutre a arrancar a língua desespero com reflexos de estanho mas porquê porquê? bem sempre nos amamos como é hábito o caminho arrefece-nos o caldo sexual ha um estranho a nascer em nós deve ser da chuva ou do narcisismo o meu circuito de metal escuro a minha farmácia homeopática a minha mergulhadora nua Maio molhado Maio linha do Tua
E
4 tu és a principal queixa destas várias obscuridades olha para o teu cabelo cresceu devorante gorgónico com caspa as molas do cérebro são lagartos amarelos que podem liquefazer o enforcado do Tarot o buraco da depressão a árvore que enxuga das metáforas da floresta o soldado do bailado modernista em áreas lamacentas onde os pardais devoram cavaleiros que teimaram adolescer e as tapeçarias desbotam e o ácido não queima as panteras nas jaulas
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o repuxo escapa e vai para outras colónias a cores sentes o tremor a minha neta sofre de nada e de azul distante a minha cabeça está vazia
o gabinete acomodou-se numa pensão diz-me o peixe humilde depois de lentamente agitar e romper
g
quando é que queres ir-te embora com o passaporte e o desejo e a terceira ponte para quebrar a resistência
F
o espaço a polícia o presidente emproado o pesado a articulação coxo-femural como lâmpada de gabinete que inventaste para a tua alma de papel de gases de um setembro memorável na sobre-impressão de derrotas eu amo-vos frutas que apodrecem sobre o gelo entre nós minha mãe minhas veias ao longo da lamúria
está à espera na neve empilhando ambições elétricas para mim com fabulosa disciplina africana as folhas são agrupados em edifícios alados encontramos descanso numa ilha ou numa filha e aumentamos à medida que a ordem dos arcanjos espera nos semáforos estragados
6 através do vidro pacífico há linhas de alegria com vento em volta da tua fornalha de alentos rápida fumarada geografia de seda bordada em esponjas flor colonizando a música cristalizada num vaso com orquideas maquiavélicas vibração do escuro da tua carne apetitosa sangue na tua inteligência e sabedoria noctívaga um olho azul enrugado num vidro cheio de bolhas repugnas-me e adoro-te na baixeza da verticalidade do meu cansaço que me ilumina ainda mais meu coração ficou embrulhado num jornal velho podes mordê-lo: apita o princípio ajusta o insulto com nuvens de febre armazenadas
G
mas oficiais
pontes rasgando teu dócil corpo é óptimo ver essas tesouras com que cortamos a Via Láctea: forma verde de memória sempre na direção da mesma direção sempre a ampliar a ampliar a irrelevância garantida da poesia
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7 na farmácia-consciência a lâmpada de um lírio nascido príncipe é tão luminosa que os regadores de jacto de água irão expandir plantações e a sanguessuga transformar-se-á em doença-árvore busco a raiz ainda senhor senhor dos Imóveis porque, então sim, vais aprender a espiral das choradeiras desnecessárias e o sabor assassino das lexívias um papagaio a babar-se e um cacto litigioso incham entre os chifres da vaca preta o papagaio santo é o dono da oca torre de marfim
H
no coração há um energúmeno: uma lâmpada o médico disse que não vai durar nem sequer uma noite então ela vai para as linhas de auxílio e doi-lhe o silicone: é a formação aguda do silêncio quando o lobo perseguido se senta no branco a caça escolhe os seus atalhos mostrando a flora depois da morte
que fará com que o cardeal esteja maduro e nacionalista e apareça em três lilázes com uma clareza fulgurante e elétrica ao longo do rio de tinta seca sinóloga ou das cartas pintadas sobre o peixe que mudava a cor na fábula recorrente a paisagem gigante do leproso pára entre duas cidades há correntes de estética que classificam isto a partir das colinas e das tartarugas sinólogas porque vão acumular pesadas inocências a areia cospe e amassa carnes causas laníferas seus pulmões esclarecem a gloriosa alma formada em Rilke e o rouxinol no seu turbulento riso de girassol ele quer reunir a beleza porcina porque o coração é uma estrela de origami
i
o meu cromatismo arcano
Missouri Índias Ocidentais Brasil
j
se te achas feliz torna-te um jogador de futebol rico sendo secundário passas o piassaba no cérebro e essa é a transparência pois não haverá outra transparência mais distante e distante quando certo animal habitar esta nova e azulada transparência
8 o que aposenta as crianças rapidamente aradas são os albergues de putas e o piar das cotovias nas moitas comentas sobre pastéis de açafrão e pirâmides é 5 de Outubro o gato de Lezama está de luto esse gato é salvo à entrada da mastaba a miar miasmas pelo sedutor enforcado torna-se vermelho brilhante a clamar versículos lentamente para dentro do buraco a polir hieróglifos mãos gretadas esfregando-se nas árvores ele em posições na brancura em direção ao papagaio a lamentar e tu desatas noutro pranto e deslizas a mão para as minhas nádegas tu usas as tuas cicatrizes e citas provérbios esquimós
J
para me manipulares concerteza a Lua caminha desfocada e aceleras o teu diafragma com um líquido viscoso e negro vibrações subreptícias animais pesados fugindo em círculos tangentes calor muscular esquinas a dobrar e a surfar intestinos que azedaram
9 divino treino maritimo com árvores junto à costa e descemos a paisagem rochosa de postal pálido sépia de mãos dadas embeiçados e argutos
k
lembro-me da multiplicação àspera das guitarradas em anamnéses clandestinas cubismo coimbrão e o cheiro a cânfora melosas palhaçadas uma ágil besta engrinaldada codex catita na engrenagem da paisagismo e Wordsworth porque não? o fadista é liquefeito em droga e dissonâncias escalam o relâmpago as acalmadas aves e os vasos são panteras celestes decantando a anamnése de Holderlin sugando os sons todos os sons e os rumores ambíguos de Eurípedes os sons imperceptíveis coagulantes meu querido tens um som tenebroso queres encharcar-te em comprimidos já?
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concentração dentro das palavras que estalam estalam Euménides na explosão das descargas elétricas como enguias cascatas de lamúrias cochichos chacotas quando os cavalos atravessam o lago e desatam numa fúria fodedora e todos os armários estalam é a guerra que o bebé que se transforma numa pedra de granito numa sinalização da mortalidade que se torna muito difícil e pesada demais custa custa a transportar à sua querida mãe cheia de de diminutivos sentidos e canta a pedra litográfica de Picasso esmagando a bexiga materna e empurrando para lá o feto os malmequeres e os jornais floresce o silêncio de Medeia o silêncio tifóide
L e é lá
e o coração com micróbios é areia relógio mandrágora e há o vento que aperta a tocha de mercúrio e que indica um norte ambíguo e voraz cheio de neve focas canoas arpões
l
lagartos na relva podre mal-cheirosa: o meu sono apanha moscas como um camaleão astronomico o meu sono de anilina e de Livro de Zoologia apito que poderia cortar a cabeça das belas cores uma vez que os produtos químicos colocadas no jardim à noite reproduzem as manias da mulher do embaixador verde claro arrumado a circular nos ícones russos que custaram uma pechincha no antiquário quando caminhas sobre os peixes na água turva eles rodam em torno de teus pés como flores insones e carnívoras que fugiram à terra
a luz solar entrega o coração à oniromante Boreal a vela grande tem frutas e ovos nos poços e ginastas a cair nas nossas esparrelas em torno da lampada do engate do clima gelatinoso de alguém sinistro que nos acaricia o pescoço
10 março é o mês da dança súbita e dos equívocos quebra o gelo nas relações amolecidas: vazamento de gritaria a fugir dos pulmões e dentadas impressas enquanto se desmazela a estrela de Jesus é uma túnica florindo para monarcas Magos e faz o proxeneta entediado consultar o relógio no hall alcatifado está de bater os dentes no coração eu estou sozinho e eu sei que eu estou sozinho a dançar para ninguém e é tão tarde e estou bêbado e estafado o senhor sabe que eu amo o imaturo mais fino porque amo com grandes rodas de moagem sou um chique duro daqueles que sempre congela no momento crítico andando nas pontas dos meus pés achei os olhos vazados de Édipo e mordi a estrela de David coloquei-a entre os dentes perante assobios nacionalistas assobios de gente inconformada e faminta araras pálidas na Sibéria
M
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11 há um sábio entre nós dois e nenhum de nós o é
claro que fui despedida novamente trocada entre dois tangos no nevoeiro de imprevistos
arco voltaico imovível aparafusando acasos amores ora sarapintasos ora felinos corredores com costas de casas fumo de gretas de filmes estrangeiros e gradação de imprecações à porta do Museu ninharias estendidas na roupa cuecas sujas do amante derradeiro a caixa de rapé tem uma casca de laranja já com bolor e a gaveta tem truques para abrir
N
o válvula esvazia a minha alma relacionando-a com o pescoço arrepiante de Valpançon e com o frasco de cianeto junto ao lavagante os comboios são silenciosos e subitamente uma bela centopeia na almofada diz-nos olá
12 pilâmide ae ou o ou o ie youyouyou youyouyou drrrrrdrrrrdrrrrgrrrrgrrrrrgrrrrrrrr pedaços de varejeiras mortas no meu quarto A E O I iea i i ii ii a barriga no centro mostra que eu quero tomar algo de ambar o farelo do farelo e regressar ao centro do quarto beng beng bong um estrondo onde estás a ir iiiiiiiiupft corta o percoço à galinha
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oceano com pirogas e cruzeiros agosto masoquista com gente a suicidar-se outra vez om bhur bhuva svaha iou ath agosto agosto wa om om om o lança-chamas está entre nós nas nossas entranhas em direções imprecisas o terapeuta aguentou enquanto pôde o caso tem as direções da bússola na mesa de cabeceira já que a concentração da cor enlouquece mas não faz obrigatóriamente foder as pacientes
a revista da avózinha desenrola uma falsa remeniscência e a ocarina de barro partiu-se compra aspirinas na farmácia mais tarde Pélagoscopicos sericiculturam edifícios horizontais ninhadas selvagens de bobos da aldeia servem a corte real o hospital tornou-se caro e o caro tornou-se viral ainda mais viral que o amor não há navios para partir para a América e no aeroporto a filha do presidente assassinado está entre os emigrantes ricas para a Austrália
13 a principal queixa da minha terceira obscuridade é o estado deplorável da casa com o jardim onde traduzias Tagore e os relógios de cuco irritantes e as penas leves que cumpriste por posse da droga do teu primo que era um cabrão cerca-nos a clareza a contragosto nesta manhã que cheira a feno e a canícula é dos diabos as vacas tão próximas tão irmãs lambem os lírios meu filho meu filho estás sempre da cor do mundo pareces mais azul do que o meloso metro e a astronomia que nos sidera vesperal estamos muito finos não temos boca de gente grande as nossas pernas estão flácidas e colidem os nossos rostos não são moldadas como as estrelas são evanescentes pontos de uma geometria afectiva há é certo a força opulenta da basílica em ruinas o incêndio que deu cabo da vinha dos bisavós o louco da aldeia enredado em fitas e nós os ziguezagues estaladiços
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o telefone a que tinhamos que acudir o chiar da corda do poço que puxavas todas as manhãs para regar hortênsias rosadas azuladas com poalha de ferro acho a reacção estudada do poeta melancólico às chacinas que nos chegam pelas notícias vindas do altíssimo oriente com sangue de safira e crianças mortas na fotografia em toda a parte pelo seu fruto duas vezes mais cru que a carne e o sangue sêco pelo fogo e pela fome
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14 no amarelo faz frio e vai nublando entre Esquimós a embelezar a recuperação dos nossos pensamentos botânicos no crepúsculo com liquens nas poças na claque fútil e entusiasta drogada esverdeada vibrante fomos banidos da nossa comunidade e dos antigos amigos do peito
p
coloquei minhas promessas na loja de confecção hipotequei o teu hotel Andrómeda está na final a remoção tem um lugar tão frio e cortante e passa uma carripana chuvosa junto ao cão enlameado farrusco encanzelado olha a adolescente voluptuosamente canora pedestres febris e podres no dia deprimido são bordados quebrados e reparados na oficina com pin-ups a contar os meses a reparação ficou muito acima da estimativa
Q
pensei em algo deveras escabroso: em cada árvore há residos pandémicos que irão acastanhar os corpos e eu amo a mortalidade de cada instante azul azul e o verso perfumado sobe à terra estranha sobe ao colo de outros astrónomos e tu precisas tanto de colinho e de uma pipa de massa
15 o domador de leões lembra-se e olha para mim e é da cor do entardecer a angustia de que me desfiz mas o pior é que não sou crepuscular nem melancólico sou um cabrão de um genésico um porreiraço com sorriso enxertado nas beiças as tuas gargalhadas são pastadas num sol horroroso de Julho queres lebres? queres camaleões? há emissões do meu corpo entre duas linhas que separam tudo
q
mais amplo do que a fome é o sono leve sono pois vês que são pesados os pensamentos que frigorificam a glória das coisas e sentes as pedras e o antílope da orelha azul em explendidas fronteiras sempre erradas os mapas foram decedidos por imbecis insolentes e a fala fria da velho pescador não vale um chavelho e as meninas novas sabem como se usam preservativos na escola
e o fio-de-prumo sente a tua gravidade e o açúcar mata a longo prazo (não é Adília e Barthes?) as garrafas são grandes e os guarda-sóis brancos ouve-se o vermelho que rola rola nas colónias de férias, nas barraquinhas de praia às riscas cheiro de limpeza etílico próprio da farmácia fatal da nossa idade cavalo cavalinho à sombra do milho verde golpeiam com chifres os búfalos o pastor apalpa os buracos da flauta e tu tens surpresas na bagagem obscura que falta
R
pois vi que foste mordida pela visão de mais um apocalipse moral
16 a primavera coloca a criança untada de manteiga rançosa na parte inferior da meia-noite e a mancha manhosa num compasso do encantamento com dedos e belas unhas pintadas a primor no cabeleireiro da vila brilho de trovão nas pernas depiladas a ver o fluxo de água de má qualidade e a escutar uma versão merdosa da Garota de Ipanema sofreste uma baixa desde que encontraste restos de sémen do teu pai nas vacas? a sede do fel do pavão é o êxtase na gaiola o rei no exílio pede clareza ao poço mas vai sendo lentamente mumificado
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na horta gafanhotos semeiam corações quebrados formigas plantam luzes de nevoeiro e a lagartixa puxa a cauda ao céu a passeata com pirilampos é bíblica
pequenos pedaรงos de vidro na barriga do cervo na corrida pontos sobre os curtos ramos negros coisas que sempre se lamentam
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Revolução Astronómica by night: deste-me o papel do conhecimento meu amigo e a arquitetura displicente, sprezzatura do caneco botinhas de camurça enlameadas na entrada da casa da quinta quere-se limpeza e dadaísmo com boa pinta
paz sim mas não a qualquer preço limites de tempo construídos colunas de mulheres transportando oferendas a serpentes música de lanternas e coelhos gongóricos na Cidade do México as nuvens abatem-se sobre o planalto inchado a minha amada tem um anel que não lhe dei (foi outro) e as montanhas são amarelas amarelas amarelas amarelas a serpente que adoram alimenta-se de almas e estrofes o professor de linguas mortas assobiou com suor tubo amarelo de turíbulo a irmã do espelho é uma fenda onde depositas memórias de ténebra e amor
tubos aumentam a poluição chocalhos penduram-se atrás das portas nos subúrbios explodem as vítimas do costume o narcotraficante foi à bienal de arte o murro do gajo deixou-te K.O. profundo vermelho escuro é difícil aguentar outro divórcio? os abutres não têm dó cercar a existência de água pesada e de esqueletos do amor? em direção à ala com o penduricalho de ébano o iluminado és tu pai ou mão poeta persa de pena murcha? cruzamento inóspito de coisas falsamente fortes
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rei origem tagarela o meu pensamento dirige-se a… dá pasto aos ovinos para lá da linha do horizonte é bela?
onde as ondas acolhem um navio cheio de gente rude colares pesados de luz afogou-se a filha do feiticeiro e ainda nĂŁo chegou Ă s notĂcias reais achas que o canto ilude o medo? falta-te o dinheiro pois
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18 tens que ordenhar as tetas do sol a meio da noite porque na obscuridade não queimam o rei da industria cujo nome submerge a tribo reapareceu no mar aos peixes circula entre preces no corpo do tubarão a guarda marítima já o tentara alvejar não falhou não brota a festa na voracidade aberta aos guinchos das adolescentes os miúdos levam lanças para a floresta até que a onça os venha procurar aí vem a minha irmã aquela que nos ralha sempre deixa toda a gente em fretes e stresses porque durante muito tempo eu vi o cadáver da puta que o meu pai protegia de todos e era linda de morrer
U
turistas com guarda-sóis brancos na mira de um caçador gordo e boche
e desenhei a ilha com esmero coleccionei cromos de futebolistas a vaca deu à luz uma grande dor os morangos encontraram as papoilas e os pimentos perto da lagoa onde há estátuas com mãos cortadas por invasores jacobinos
u
a virgem entregou o seu corpo a deus e morreu no deserto depressa antes houve o incêndio inesquecível que me devorou a infância o oráculo frutificou no orixá depois da seca o teu filho ficará curado pá já podes mergulhar com o relógio à prova de àgua desejo-te desejo-te com uma imensa vergonha e quando passo perto de ti sorrio baixo os olhos e coro porque te amo estupidamente tanto tanto
19 toca-me a mim toca-me só a mim ó tu que fumas cachimbo na noite amarga meus dentes são mais brancos que a branca morte constelação de movimentos inseguros rapidamente a roubar o âmbar meu irmão antropófago a frequentar ginásios e maçonarias tu arranjas tubos tubos de escape nunca gostei de velocidade da virilidade do futuro do ruído drrrrr rrrrrrrr nem de insultar o perigo bares flamejando luz com caras que entristecem gente conflito de anamnéses penetrantes raios de diásporas encontramos o caminho para fugir à cidade as nossas raízes são pontas de cigarro acesas tenhos macaquinhos no sotão e um barco de pescadores abandonado na ria tu não podes dormir ao meu lado eu vou para a Conchinchina de autocarro para frente e para trás do amor com especturação na garganta e a fome fatal dos grandes felinos
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os meus pulsos estão cobertas de pulseiras a imitar coisas étnicas mordidas pelo meu cão literário de estimação almofadas onde me posso recostar e deprimir
v
o escuro inflama o gozo está gasto a ironia encardida vivo em melancolia de escabeche com justificações intiligentes a justififar a descrição metodológica do mal tens que me mostrar o caminho do Samadhi sem gurús imediatamente pois a última vez que me libertei foi há muito mais tempo
20 doença a florescer e a retroceder corpos a pedincharem que alguém acenda um fósforo para aquecer para alimentar tu disseste que nunca irias comer o que eu faço não aguentas ajudas de ninguém de mais ninguém o caracol sobe o dorso do búfalo a dama beija o leão a tua beleza engana-me constantemente que sim que sim quero por vezes basta um gesto de coragem um protesto tzacatzac mantém-te debaixo do guarda-sol e evita o ar condicionado fazes vista de graça grossa minha senhora de adjectivos deliciosos entretanto escreves-me cartas de amor e molhas a pena numa noz cheia de tinta-da-china
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21 países a ver brancos passar com armamento mochilas e mapas em Lubango ainda se fala de escravatura às 10 horas da noite o ouro saiu da retorta a perfeição é a morte do artista a insurreição é precedida de uma ceia torta
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arquitectura de argila com lacraus dourados meu bem separa as boas águas da má cepa procurei o meu amor em todas as ruas e praças mas não o achei (não era fácil) antes de adormecer olhei longamente o aquário com os olhos avermelhados de tanto chorar
cozinhei o caldo a sopa da pedra foquei o insecto de olhos metálicos eu sou o caso estúpido de candura errante batimento cardíaco do estreante amor para dar vender e estourar maquilhar o novo com um slogan já velho? queremos reconstruir o sumptuoso som verde da China na chicara da madame
na chicara da madame no iogui dormindo sobre um crânio no reciclar a ideia peregrina e perseguir os homenzinhos em suas vogais os que são peritos na batucada e dormem nas vielas o comboio passa e eles imitam os ritos modernos dos brancos emplumados afagam o anel da seita e espumam possessos sentem o bafo faminto do cão que irá ser sacrificado e o que é isso de perseguir homenzinhos em suas vogais? o fogo refulge na taça refulge na taça eles hão-de perseguir os homenzinhos em suas vogais perseguir pequeníssimos homenzinhos em suas vogais
y
22 para refrescar o novo temos que nos tornar velhos pregar um prego mais acima das possibilidades caminhar com muletas na floresta sem bichos lastro romântico à falta de ovações ou deuses desvio-me da tradução original só para não ter problemas tendo a apagar com uma borracha o sofrimento a meu lado ampliar os meus hábitos de evasão nem sequer é arte ou poesia é um hábito que inverte o covil crinas de cavalos de gente nórdica jóias do saque que levas para a tua mulher
Y
que queres? chorar? lamber o caminho que desenrola a serpente? Moshé fez de nós cumplices enrolou o cigarrinho enquanto IHVH trovejava os profetas cresceram no circo e eu continuo maravilhado com esta vida sou um sortudo de merda vejo a nesga do rio com os seus brilhos que piscam os olhos à facilidade do encantamento e não preciso de fórmulas para ser feliz
23 numa pequena cidade na Sibéria uma luz azul e deprimente mantém todos os planos do tecto visíveis e como sempre a Rússia é minha amiga tem um rótulo fraterno colado nas portas do inferno
abres o frasco e enches uma colher de remédio meloso a casa é tranquila o meu amigo freme e lê depois toca tambor invoca bichos e mortos e então o ambiente denso e pesado fornece antepassados saltando as horas encardidas
o colar das máquinas realça a presença das lâmpadas por vezes partidas por gente bera que nos desincha da modernidade e é possessa por criaturas invisíveis que arrepiam depressa
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chamo-te a beber em silêncio o vodka milagroso brilham os telhados e a caixa de arenques sou um gajo decente e já vi muitas coisas esta malta tem casas baixas mais baixo cada vez mais baixo
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ou mais alto que eu quero galopar as renas a mão a condensar todas as atitudes a hospitalidade ritual e esfrega-a com força contra a mesa arrepiam-se as migalhas de pão oh yeah se pudéssemos apanhar o próximo comboio e ir para o sul… não importa o quão bonito é o bezerro no jornal há notícias que se seguem está frio olho para acima voltam a falar de renas corações e olhos rolam na minha boca movimentos de caça e crianças pequenas [no sangue? serão demónios? logo digo quando chegarem] correm ainda mais depressa para todos os lugares que ficam para lá das obscuras janelas
24 na estação quebram-se galhos há bifanas do baile os que vieram para o casamento esperam na sombra a carne está demolhada no alguidar sob o banco nervos silênciosos e moscas: cortes no crime do casório ler em silêncio transforma o jornal vê lá quem vem lá e se a noiva está linda ou é má? eu não sei se estou sozinho para sempre mas de que lado está a felicidade? os meus amigos vão caçar pássaros com pressão-de-ar e eu afugento-os mais pássaros hoje matarão que serão um pitéu ao jantar a porta do albergue para os mendigos é a mesma o edificio conheceu as chamas e foi restaurado
a a
custa mais sermos os sentimentais sobre outrora cuspimos os quais dei minha alma precisa e sábia à pedra branca ao corrimão ao deus dará sem pretensão o fim de uma amizade é uma grande tristeza dizem que dor é fogo mas encharca (ó beleza) babas e molhados lenços o a à o
rosto recusa os espelhos autobiografia é severa noite os gatos são pardos elefante espera
JJ
bailam que bailam os convivas vou caír de borracho no meu leito de plantas junto ao rio há cães latindo e coaxar de rãs acho plumas pulseiras pedras crânio alongado no regaço
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vai vai meu irmão atirar-te do terraço abaixo ou não corações de plantas farmácias os beras massam sendo sardinhas assa-as
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TT
irmão nota a insistência instantânea nada nada (não abuses!) nem por sombras monta para baixo sem movimento lateral ele sobe (o deus antropófago) nada se move em todo o Egipto nem ser nem não-ser nem ideia nem prisioneiro acorrentado ou eléctrificado ele nada ouve além de si mesmo nada entende além do ranger das cadeiras e das gotas de água fria da tortura a pedra atirada ao filósofo em êxtase foi em cheio — resistiu mal ao material duro nunca mais cuspas alhos na rua sucedâneo do último atentado suicidário olá derradeiro em nome do profeta ele rasga a tua língua: clama perfurado por um clarão tranquilizante até cair morto avermelhado entre folhas secas de palmeira reabsorve a fé negando os planos económicos e a dissoluta estação de outros hemisférios na tal existência secundária com unhas e cabelo a crescer no comício plenário
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HH
repleta de comentários a estranha mulher com dupla identidade e nacionalidade duvidosa mostra a máscara branca de Deusa encurva-se numa dança chega junto a mim e abraça-me e nem sequer estou de acordo contigo querida Ariana certos membros e opiniões sem significado especial são de ébano de sangue azul claro e grande pontaria escondi o teu desejo de mim mesmo enfrentei a morte das oito às vinte se eu pudesse começar a tal noite esta manhã começaria já
dez euricos: esta é o custo mais que modesto a minha alma quer calma languidez luxúria entusiasmo para eutanásia ainda é cedo tu não hoje à noite não o refinamento último da minha masculinidade sempre em causa digna de gozo grande sacana
há muito tempo superaste a indústria enganosa onde penduraste o teu dom de seres de novo pútrido
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e eu gasto do que tu gastas como mãe de crianças cada vez mais rápido em fingir prazer verdadeiro e um de cada vez ou todos juntos a procurar o ouro nos ovários chulo tímido da eternidade que desaparece no tilintar sensível de uma Parteira Rainha chungalhona e que é de um puro desinteresse meu caro Tzara
para ti Rita Taborda Duarte mui dadaísticamente assolapado
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Este livro foi feito selváticamente a partir dos vinte cinco e um poemas de Tristan Tzara não aspira à glória é um puro divertimento desconcertante nem sequer sei porque é que o fiz
Pierre Delalande
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Escrito, ilustrado e paginado em 6 e 7 de Maio de 2017 para os Waf Books
Waf Books