RÚSSIA РОССИЯ
Revista de Viagens Produzida por Edson Walker
LAGO BAIKAL
TRANSIBERIANA MOSCOU KAZAN E ALGUMAS DOSES DE VODKA
edição, diagramação fotos e textos edson walker revisão ortográfica tânia ottoni maio 2013 publicação:
Eis que surge a quarta edição da Walker Travels Magazine. A segunda feita totalmente on the road. Esta é uma revista de viagens independente patrocinada por diversos assinantes que acreditam também que o mundo ainda é cheio de maravilhas a serem descobertas. Você tem medo da Rússia? Talvez já tenha escutado histórias que o façam pensar “como é corajoso esse Walker”. Mas, nesta edição, você vai ver que muito do que sabemos é apenas uma interpretação da mídia ocidental. Há muito a descobrir nesse país tão rico em cultura, história e hospitalidade. Cara feia nem sempre é sinal de antipatia. O capitalismo também reina por aqui, mas algumas coisas boas da época do socialismo ainda permanecem nos corações russos. Conheci muita gente interessante, aprendi um pouco de russo, conheci o trabalho do artista Nicholas Roerich, tomei umas doses de vodka, vi muitas árvores e vilas pela janela do trem e descobri que o mundo é grande pra caralho! Assine também a revista e ganhe mensalmente um postal exclusivo feito por mim. Apenas R$ 30,00 mensais.
Muita coisa mudou desde que o Czar Ivan IV mandou construir a catedral entre os anos de 1555 e 1561. Hoje sua desconcertante arquitetura é refletida em luxuosas vitrines que vendem tudo que o dinheiro pode comprar. É como nenhum outro edifício russo. Nada semelhante pode ser encontrado no milênio inteiro da tradição bizantina, do século V ao XV. É uma obra que surpreende pela sua imprevisibilidade, complexidade e beleza.
catedral de são basílio
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catedral de são basílio - vista praça vermelha
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cidade de reflexos
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“Pa Rusky nie panimayo?” Se você, assim como eu, “nie panimayo”, “niet probliema” porque vamos juntos aprender um pouco nas próximas páginas dessa revista. Sim, estou na Rússia! Sentindo ainda aquela típica sensação viciante, mistura de encantamento com adrenalina. Cheguei ontem da Geórgia, onde passei os últimos 3 dias em uma vila chamada Kazbegui, um vale cercado por altas montanhas, onde o tempo anda bem mais devagar. Fiquei hospedado na pousada de uma família tão maravilhosa quanto a região. Pessoas que vivem em regiões montanhosas possuem sempre essa mesma energia. O isolamento faz com que sejam ainda mais hospitaleiros com os viajantes. Lia, a proprietária, com sua cara rechonchuda, me fazia sorrir toda vez que olhava para ela. Como uma mãe, preparava todas as refeições, incluídas no valor da diária, com tanto carinho e alegria que fazia parecer injusto o valor que eu estava pagando. São pessoas ainda tão puras, das que recebem o dinheiro dos hóspedes com um certo constrangimento porque, em sua cultura, deveriam hospedar gratuitamente as pes-
a cozinha da lia soas que passam pelo local. Mas, a vida é difícil nessa região tão isolada e o turismo acabou sendo uma importante fonte de renda para várias famílias dessa vila, onde as vacas pastam livremente pelos campos e voltam sozinhas ao entardecer para serem ordenhadas. Cada uma sabe exatamente onde fica sua casa e esperam impacientes em frente até que seus donos as deixem entrar nos estábulos anexados às casas.
Na fronteira, encontrei um nômade inesperado. Um suíço viajando sozinho com um caminhão antigo e um trailer que mais parecia uma carroça cigana. Em cima do caminhão, imaginem, uma fêmea de camelo adulta, 3 carneiros e 8 cães, 5 deles ainda filhotes. Agora vem a parte mais interessante: ele está levando a “camela” para cruzar com um macho na cidade de Astrakhan, perto do Mar Cáspio. Cruzar a fronteira da Geórgia com a Rússia é apenas possível dentro de um carro, e um policial georgiano me ajudou a encontrar um táxi com mais 2 russos que estavam indo também para a primeira cidade depois da fronteira, Vladikavkaz, capital da província da Ossétia do Norte. No caminho, vales floridos e estradas secundárias com barricadas e tanques militares controlando o acesso a regiões em conflito, como a Chechênia e a Ossétia do Sul. “Ochi probliema” nessa parte do Cáucaso.
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kazbegui cáucaso geórgia
O taxista me deixou na estação de trem que possui também um albergue. Por apenas R$ 20,00 você pode ter uma experiência única dividindo um quarto com mais 2 georgianos e um senhor do Daguestão, outra região em conflito na fronteira entre a Geórgia e o Azerbaidjão. Ninguém fala uma palavra de inglês e mesmo assim a gente se entende. Como é bom ser brasileiro nessas horas. É sempre um grande começo para a confiança e a amizade. Começam a preparar algo para comer no quarto. Surge um grande pedaço de bacon, pão, saladas, frutas e... Oh não! Uma garrafa de vodka! A garrafa é pequena, mas o sentimento de amizade é grande. Você pensa que tudo vai acabar depois de alguns brindes, mas, não sei por que, eu ainda acredito nisso. Tem sempre um mercado perto que pode vender mais. Vou junto com um deles, compramos batatas fritas, chocolate, suco e uma garrafa maior do que a primeira. Aqui é assim: “Se não aguenta, por que veio?!” Mas, aos poucos vou pegando a técnica. É preciso aprender como beber para evitar os efeitos colaterais no dia seguinte. Se as doses forem acompanhadas de comida, frutas e sucos, dá para sobreviver aqui na Rússia. E passamos várias
vida é a possibilidade do encontro horas bebendo, comendo e ouvindo música. Até Elis Regina tocou no meu computador, o que quase me fez chorar. Na TV, um programa estúpido semelhante ao do Ratinho. O apresentador metrossexual com um paletó branco e lenço colorido no bolso, intermediava a baixaria entre um cara, sua namorada e a ex que chegou ao palco esbofeteando a rival. Enquanto isso, quatro desconhecidos celebravam a amizade num quarto de hotel barato: um católico, dois ortodoxos, e até mesmo o muçulmano do Daguestão bebeu algumas doses e comeu da carne de
porco. Aprendi uma nova palavra em russo: “Mir”, que em português significa paz. Agora, no dia seguinte, daqui da janela do albergue onde estou escrevendo, vejo os trens parados ali embaixo. Logo depois da estação há uma chaminé de fábrica lançando sua fumaça negra que se mistura lentamente com as nuvens baixas do céu cinzento. Parece até que elas são fabricadas ali, naquela cinzenta fábrica de nuvens. Mas Vladikavkaz não é uma cidade cinzenta como eu estava esperando, muito pelo contrário. As casas são coloridas, e nas ruas e parques da cidade já se pode ver muito verde e diversas flores. As pessoas usam mais cores do que o preto constantemente visto na Geórgia. Até os guarda-chuvas, segurados por “babuskas” de cara sofrida ou lindíssimas mulheres, são coloridos. Ah, sim, a fama da beleza da mulher russa é verdadeira. E você talvez não tenha a noção do quanto!
vladikavkaz ossétia do norte rússia
janelas russas
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A coisa pode até estar “russa” no Brasil, mas por aqui não está não. Apesar de tudo à minha volta ainda parecer “russo”, é fácil perceber a velocidade do avanço econômico do país. As ruas estão cheias de pessoas elegantemente vestidas, que andam em carros modernos e fazem compras em shopping centers cuja beleza é difícil de comparar. E, além de tudo, a primavera acabou de chegar! Mas, antes de falar de Moscou, tenho que contar, primeiro, outras histórias que aconteceram no caminho até chegar aqui. Tenho que voltar para lembrar a última noite que passei naquele quartinho de hotel na estação de trem da semana passada. Tarde da noite, eu e mais um senhor georgiano assistíamos TV e pensávamos que seria uma calma noite de sono. Mas, eis que surge o próximo hóspede! Ele entra com sua sacola de supermercado e cumprimenta: “stratsvitzie”! É um senhor de cerca de 70 anos cujos dentes foram se perdendo pelo caminho. Ele caminha até sua cama e, pesadamente, senta nela. Fala alto um monte de coisas que para mim parece russo e tira os sapatos. O cheiro contamina imediatamente o quarto
a rússia capitalista fechado, pois faz frio lá fora. É tão forte que sinto até ânsia de vômito e abro discretamente a janela. Em meu pensamento, dou risada da minha sorte. O senhor está visivelmente bêbado e minha experiência de viajante não se engana: esse cara ronca! Minha visão do inferno é que lá tem milhões de pessoas que roncam ao seu redor e você não consegue mais dormir por toda a sua eternidade. Ele deita e imediatamente começa a roncar. É um ronco desritmado,
com uma respiração pesada, que o faz acordar inúmeras vezes. Nem ele mesmo suporta o próprio ronco. Um tempo depois, entra o terceiro elemento para completar a sinfonia: um senhor armênio. Os 3 passam a se revezar, a roncar em disritmia por toda a noite. Desisto de dormir e passo a assistir filmes no computador. Às 4 da madrugada, já não aguento mais ficar acordado. Saio para dar uma volta pelo hotel e volto mais tarde para o quarto. O cheiro continua insuportável, mas, não tendo alternativa, me deito com um lenço cheiroso sobre o meu nariz, fecho os olhos e penso: “Quando eu escrever isso, ninguém vai acreditar”. Horas depois começa a tranquila viagem de 36 horas de trem rumo a Moscou. O trem é limpo e moderno. As camas são confortáveis e cada passageiro tem direito a um jogo de cama branco e cheiroso. Os passageiros estão relaxados, tiram seus sapatos e usam sandálias. Alguns comem, outros dormem. Fico na janela pensando enquanto vejo passar vilas, cidades, estações de trem e campos sendo preparados para a próxima plantação.
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Meus colegas ao lado começam a beber e insistem para que eu os acompanhe. Eles me servem uma gigantesca dose de uma bebida horrível chamada “arraka”. Bebo minha porção e sinto subir o estranho sabor pela minha garganta. Para evitá-lo, faço como eles e tomo um copo de suco de maçã. “De jeito nenhum eu vou continuar bebendo isso”, penso e vou logo buscando uma desculpa para fugir da situação. “Spaciba”, agradeço e faço o sinal internacional de que estou cansado e vou dormir. Meia hora depois, chegam dois policiais e começam a falar com eles. Cheiram os copos e os levam para conversar no final do vagão. E eu lá, na minha cama, quietinho me fazendo de morto. Logo depois eles voltam, parece que conseguiram resolver a questão. Feliz a hora em que eu parei de beber. Mesmo agora, escrevendo sobre isso, sinto claramente o gosto da “arraka”. Nunca mais quero provar disso na minha vida. Chegando a Moscou, numa gigantesca estação de trem, às 6h30 da manhã, meu amigo russo estava lá me esperando. Fomos para um café para contar as últimas novidades desde o tempo em que nos conhecemos, no ano passado, no Egito. O dia estava lindo e já me surpreendia ver todos
vodka niet!!! aqueles prédios lindos ao redor da estação. Mais tarde, fomos até seu apartamento e fiquei lá tentando dormir um pouco para me recuperar da longa viagem. Mas, estava tão empolgado que resolvi sair depois do almoço para caminhar e fotografar a cidade. A famosa catedral de São Basílio (construída no século XVI) e o Kremlin são como ímãs na cidade e acabei indo até lá, pois estava ansioso para ver finalmente esses dois ícones que tanto mexem com a ima-
ginação dos viajantes. A primeira impressão diante da catedral foi de total surpresa. As cores e formas são desconcertantes. Não há nada igual, nem na Rússia, nem no mundo inteiro. É uma mistura tão audaz de diferentes estilos que a obra inteira parece mesmo um cenário de contos de fadas. O Kremlin e a Praça Vermelha também são majestosos. Com uma arquitetura mais convencional do que a da catedral, mesmo assim impressionam por suas extensão e cores. Milhares de pessoas passeiam em volta dos parques. É tarde de sábado e faz sol. Até mesmo um sósia do presidente Putin apareceu por lá para ridicularizá-lo. Na multidão, além das centenas de mulheres maravilhosas, o que chama a atenção é também a grande quantidade de pessoas com fisionomias mongóis, das províncias orientais da Rússia, que se mudaram para a capital. A maioria deles, pelo que percebo, trabalha nos empregos com os mais baixos salários.
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mĂşsica nas ruas
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À minha frente, sentam-se agora duas simpáticas senhoras. Infelizmente, tenho que usar aquela frase de sempre: “Pa Rusky, niet panimayo” pois elas simplesmente começam a falar em russo comigo como se eu fosse um local. Ao meu redor, já são 7 mulheres, e a minha nova amiga apresenta o “brasiliansky” para as outras. Estou no Mc Donalds da cidade de Vladimir (fazer o quê?! Internet de graça pelo preço de um café de R$8,00). Se você pensa que na Rússia não tem Mc Donalds nem pessoas simpáticas, é engano seu. Confesso que entrei na Rússia ainda com alguns preconceitos. Nos primeiros dias, tirava fotos morrendo de medo de ser pego por algum agente da “KGB” e ter que ficar por horas respondendo a perguntas numa salinha fria e escura. Achava também que teria que acostumar meu fígado com extensas sessões de vodka, mas até agora está super tranquilo. As pessoas geralmente são muito atenciosas com quem não fala russo e
a rússia ortodoxa procuram sempre te ajudar da melhor forma possível. As cidades parecem muito seguras, restauradas e, quase sempre, limpas. Aos poucos, o viajante vai ganhando mais coragem. Até carona já peguei, e a única coisa que o motorista pediu em troca foi se eu tinha alguma moeda do Brasil para lhe dar. Saí de Moscou na segunda pela manhã, em um ônibus caindo aos pedaços. Meu destino era a cidade de Vladimir, mas queria ir primeiro para Suzdal, que fica um pouco depois. Ao chegar a Vladimir, o motorista parou o ônibus na entrada da cidade e apontou a rua que eu deveria seguir. Nesse momento, vi a placa de Suzdal e apontei para ela. De
alguma forma eu entendi que eles estavam indo na verdade para lá e felizmente eles também entenderam que era para lá que eu queria ir primeiro. Botamos a mochila de volta e eu entrei novamente no ônibus. Seria esse mais um dos meus dias de sorte? Ao chegar à pequena cidade de Suzdal, já comecei a ver a imensa quantidade de torres de igrejas. Coloquei a mochila nas costas e, como de costume, não tinha nem ideia de onde iria dormir naquela noite. Teria que caminhar pelas ruas e ver se algo aconteceria. Depois de algumas horas caminhando com a pesada mochila, visitando alguns lugares turísticos, vi finalmente uma pequena placa com a palavra que estava procurando: “komnata”, casas que alugam alguns dos quartos para turistas. Sem dúvida, a opção mais confortável e barata que você pode encontrar aqui na Rússia. Tudo bem, aquele seria sim o meu dia de sorte. O simpático dono falava até um pouco
suzdal rússia de inglês e havia voltado no mês passado de uma viagem de cruzeiro pelas Américas onde, claro, visitou também o Brasil (Fortaleza, Salvador e Rio de Janeiro). Ele me mostrou o quarto e fez ainda pela metade do preço inicial que, mesmo assim, era meio caro (R$ 32,00). Em matéria de hospedagem, quase sempre dá para barganhar em qualquer lugar do mundo. O quarto tinha cama de casal, estantes com livros e fotos dos netos na parede. Era quente e silencioso. Meu dia de sorte.
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a rússia ortodoxa Durante o jantar, abriu algumas conservas de pepinos e tomates que vieram da sua própria horta no verão passado. E, todo orgulhoso, me presenteou com uma garrafa maravilhosa de licor de cerejas que ele mesmo fez. Qualquer um poderia enriquecer vendendo mais daquilo! No final, como se a hospitalidade ainda fosse pouca, vendo que eu iria preparar um café Pelé importado do Brasil, energicamente me impediu e foi me mostrar o seu tesouro escondido no porão da casa. Abriu sua mochila e começou a me mostrar as dezenas de pacotes de café que comprou na última viagem. Tinha café de quase todos os 15 países da América Central e do Sul que
visitou. Do Brasil, tinha apenas um decepcionante café Pilão, mas provamos mesmo um da Costa Rica, que já estava aberto. Ele vai tomar ainda muito café bom durante este ano. A cidade de Suzdal é como se fosse um museu de igrejas a céu aberto. Ao todo são 60, além de uns 6 mosteiros de padres e freiras. Mesmo se você não gostar de igrejas, vai se surpreender com a imensa variedade de estilos arquitetônicos entre elas. Muitas delas parecem-se mais com fortalezas. Era lá que os moradores das cidades iam buscar refúgio e proteção contra ataques de invasores. Algumas foram construídas no século XII
suzdal rússia e destruídas pelos mongóis de Gengis Khan. Aliás, esses caras destruíram um monte de coisas belas na época, com o simples objetivo de pilhar as cidades. A Geórgia também pagou seu preço por estar no caminho deles. A temperatura agora está muito boa, mas ontem fez apenas 3ºC. Nada mal para uma região que chega “facinho” aos -30ºC durante o inverno. Pode não ser frio para os russos, mas para mim é. Alexander, o proprietário da hospedaria, me disse que tiveram cerca de 3 metros de neve neste ano e que, em Kamchatka, extremo leste da Rússia (a uns 9.000 km de Moscou!), a altura chegou a 12 metros. Parece até história “Pra
Lá de Kamchatka”, mas, mesmo parecendo absurdo, melhor dormir ao lado de uma pá, caso venha a ser verdade.
Originalmente, a Mesquita de Qolsarif foi construída no século XVI e destruída logo após, em 1552, pelas forças russas lideradas pelo Czar Ivan, o Terrível. Ela fica na cidade de Kazan, capital da República Tártara, cuja maioria dos habitantes é muçulmana. Segundo alguns historiadores tártaros, a Catedral de São Basílio, construída em Moscou em 1561 para comemorar a queda de Kazan, possui alguns elementos, como a cúpula central e 8 minaretes, inspirados na arquitetura dessa mesquita.
a rússia muçulmana Qolsarif foi reinaugurada em 2005, durante as celebrações do milênio de Kazan. É uma das mais belas mesquitas que eu já vi em minhas viagens.
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paisagens na transiberiana Da janela do meu escritório de hoje vejo paisagens que se movimentam lentamente. Viajei tanto de trem nas últimas 2 semanas que não me surpreende estar escrevendo agora dentro de um deles. Assim não corro o mesmo risco da semana passada de não conseguir entregar a tempo o texto para o jornal. Faltam ainda algumas horas, a viagem vai tranquila e a diferença de fuso horário me dá 12 horas de vantagem. Sim, os relógios de Irkutsk, no leste siberiano, marcam 12 horas de diferença com o Brasil, 5 a mais do que em Moscou. Lá fora, só para você ter uma ideia do que é o inverno russo, o chão amanhece todo coberto de geada. Pois é, já estamos na metade da primavera,
não tem mais neve, mas mesmo assim, quando passa o vento da Sibéria, até mesmo a alma diminui de tamanho. E... os russos apenas dão risada quando você fala do frio. Sim, pode piorar muito e chegar até -40ºC ou até -65ºC, no norte do país. E você lá, encolhido, reclamando de 4 graus positivos. Minha viagem pela Rússia não seria a mesma sem o meu amigo Alexander. Na Rússia, todos os Alexanders acabam virando Sachas entre os conhecidos. Depois de ter me hospedado por 1 semana em Moscou, ele foi logo organizando o resto da minha viagem. Fez contatos com a família e amigos e deixou tudo previamente agendado. Era só eu avisar alguns dias antes a hora em que iria chegar
suzdal rússia à estação de trem. Os primeiros que visitei foram seus pais, que moram em Chelyabinsk. Receberam-me tão bem em seu apartamento e, aos poucos, relembrando o inglês que aprenderam, me perguntaram logo o que eu queria fazer primeiro. Estava tão cansado que a única coisa que pensava era em tomar um bom banho quente e demorado. Me sentindo já um pouco mais humano, quando saí do banho a mesa já estava pronta com o almoço. Cenya, engenheiro e Ludmila, pediatra, tinham muita coisa para falar e aprendi muito sobre a Rússia com eles. Uma das histórias de que me lembro é de como as batatas chegaram às mesas russas nos dias de hoje. O czar Pedro II, o visionário
que fundou São Petersburgo, voltou das suas viagens pela Europa fascinado pela novidade que provou por lá. Só que não foi fácil inserir a nova cultura no hábito alimentar russo da época, cujo prato principal era o nabo. Ninguém queria cultivar ou consumir a novidade. Então, o czar teve que usar a malandragem russa e colocar guardas para proteger as plantações durante o dia. Logo eles começaram a pensar: “Hum, é tão valiosa assim essa tal de ‘kartoska’?” E, à noite, quando os guardas se retiravam, iam lá e roubavam para comer ou replantar. Mais uma das histórias da Rússia. Esse czar tem várias delas. Foi ele também que voltou da Europa com a ideia fixa de que todos os
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homens russos deveriam começar a fumar. Era chique e moderno na época. Como as coisas mudam com o passar do tempo! Continuando a viagem, parei na casa da Ekaterina, irmã do Sacha, ou Alexander, casada com o Alexiei. Estavam me esperando na estação de trem e esse foi um encontro muito importante para mim. Aprendi muito com os dois. Apenas a Ekaterina falava inglês, mas do Alexiei vinha uma simpatia tão grande que me fazia sentir amigo dele sem mesmo poder me comunicar. Ela trabalha em um museu dedicado a um grande artista que, por sua visão tão humanista, deixa até de ser apenas russo para ser de toda a humanidade. Seu nome é Nicholas Roerich. Ele dedicou sua vida à cultura do homem e deixou o impressionante número de 7.000 pinturas espalhadas por museus e galerias do mundo inteiro. É preciso quase 20 anos pintando um quadro por dia para
hospitalidade: “isso é normal na rússia” atingir esse número. Ele foi um artista incansável, muito importante para a humanidade, pois deixou também vários trabalhos sobre religião e cultura de diferentes povos. Viajar faz com que você muitas vezes perceba que há muito mais para se aprender do que tudo aquilo que você imaginava aprender um dia. Roerich dizia em um de seus textos: “A luz das artes ilumina os corações com um novo tipo de amor. No início, esse sentimento vem inconscientemente, mas depois ele purifica toda a consciência humana. E quantos jovens corações estão procurando por algo novo e belo, então, dê isso a eles. Dê arte ao povo que é a ele que ela pertence. Não apenas museus precisam ser enfeitados,
mas também teatros, escolas, bibliotecas e estações de trem. Prisões também precisam ser belas, assim elas deixarão de ser prisões.” Mas, uma das frases de que mais gosto é essa: “Cultura é a adoração da luz”. Na última noite em que fiquei com eles, o Alexiei começou a me mostrar em alguns dos seus livros teorias sobre o dilúvio e a era do gelo. Ele me mostrou que um meteoro teria atingido a região entre as Filipinas e o Sudeste Asiático e que o impacto foi tão grande que mudou o eixo de rotação da Terra em 15º fazendo os polos mudarem de posição. O antigo polo norte ficava onde hoje é a Groenlândia e isso fez com que uma antiga civilização que morava no norte da Rússia tivesse que migrar para o sul em busca de terras menos frias. Esse povo seria o Ariano, que se dividiu em duas correntes migratórias: uma foi para a Europa e outra para a Índia. O impacto do meteoro foi tão
novosibirsk rússia forte que criou um tsunami tão gigantesco no Oceano Pacífico que teria ultrapassado até a Cordilheira dos Andes e destruído uma civilização muito avançada que existia lá muito antes dos Incas e dos Maias. Bom, teorias malucas são o que não falta por aí, mas eu fiquei impressionado com a ideia de que poderia ter existido uma civilização talvez até tão evoluída quanto a nossa milhares de anos atrás. Eu não duvido de mais nada. Agora é ver como vai ser a minha estada na casa da família da irmã do Alexiei, esposo da Ekaterina, irmã do Alexander. E ninguém fala inglês por lá. Na Rússia você aprende a confiar de que tudo vai dar certo no final.
“cultura é a adoração da luz” nicholas roerich
“A luz das artes ilumina os corações com um novo tipo de amor. No início, esse sentimento vem inconscientemente, mas depois ele purifica toda a consciência humana. E quantos jovens corações estão procurando por algo novo e belo, então, dê isso a eles. Dê arte ao povo que é a ele que ela pertence. Não apenas museus precisam ser enfeitados, mas também teatros, escolas, bibliotecas e estações de trem. Prisões também precisam ser belas, assim elas deixarão de ser prisões.” Nicholas Roerich
painel eletr么nico de mentirinha
irkutsk rĂşssia
9 de maio: dia da vit贸ria
novosibirsk rĂşssia
9 de maio: dia da vitória O Dia da Vitória, comemorado em 9 de maio, marca a assinatura do documento de capitulação da Alemanha Nazista para a União Soviética na Segunda Guerra Mundial, conhecida na Rússia como a Grande Guerra Patriótica. É dia para celebrar a paz e também relembrar os cerca de 22 milhões de russos mortos durante o conflito.
irkutsk rĂşssia
25% da รกgua potรกvel do mundo
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1637 metros de profundidade
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criaturas das profundezas
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porto e seus moradores
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paisagem em slow motion vista do trem
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camadas de gelo de atĂŠ 2m de profundidade
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gelo empurrado pelo vento
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primavera nas margens do lago
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direito Ă neve no final do passeio
lago baikal rĂşssia
região perto da fronteira com a mongólia O despertador toca na pequena, porém confortável, cabine de trem. Ainda meio dormindo, abro levemente a cortina e lá fora vejo passar imensas pradarias com montanhas ao fundo. A paisagem é marrom. A luz ainda bem suave, antes do nascer do sol. E o trem continua com seu som ritmado, praticamente o mesmo que ouvi por mais de 145 horas no último mês. Coloco a cortina novamente em seu lugar e volto a fechar os olhos. Estávamos já perto de Ulaanbaatar, capital da Mongólia. Meu colega de cabine, um jovem holandês, também continuava dormindo na cama ao lado. Eu queria apenas desfrutar daqueles últimos momentos da viagem de cerca de 31 horas desde a cidade de Irkustk, na Rússia. Queria ouvir o som do trem passando lentamente nos trilhos. Fiquei na cama ainda por alguns minutos pensando em
como que poderia descrever aquela manhã. Abro a porta da cabine para ir até o banheiro. Pelas janelas do corredor vejo algumas vilas espalhadas pela vasta região ainda sem muito verde. Apenas uma imensidão com grama morta pelo rigoroso inverno da Mongólia. Vejo casas com cercados de madeira. Vejo também vários yurts (ou gers, na língua mongol), barracas brancas e circulares que servem como casas para as famílias nômades da Mongólia. Muitos deles, já nem mais tão nômades assim, mesmo morando em cidades, têm parte da cultura ainda preservada. Escovo os dentes vendo a paisagem pela janela. Penso: “Uau, Mongólia!!!” Sim, em poucos minutos chegaria finalmente à capital e lá encontraria o sempre sorridente e esbelto Levi, meu grande amigo ameri-
rússia cano, companheiro de muitas aventuras pelos EUA, Angola, África do Sul e nordeste brasileiro. Não o via desde 2005 e estava muito ansioso para encontrá-lo. “Destination!” grita no corredor a mulher mais mal humorada do mundo, a atendente do nosso vagão. Lá fora estava Levi, agora um respeitável professor de inglês em uma escola particular da cidade.
vam na estação de trem me esperando. Eles não falam inglês. Eu não falo russo. Comunicação, você acaba descobrindo que não depende apenas de duas pessoas falando o mesmo idioma. Mesmo assim, muitas vezes ninguém se entende. Depende muito mais de boa vontade e interesse. Para isso, vale desenhar, escrever, apontar para o relógio, cacarejar, imitar apito de trem e sambar.
Mas, seria injusto não falar sobre a última semana na Rússia. Mais injusto ainda não falar da hospitalidade que tive a sorte de provar na casa de Tânia e Aliek, na cidade de Irkutsk. Sei que escrevo muitas vezes sobre isso, mas acredito que tenho a obrigação de mostrar aos que leem minha coluna que nossos preconceitos com povos que não conhecemos desaparecem quando conhecemos pessoas assim como esse casal. Esta-
Depois do tão esperado banho com água quente, a mesa já estava pronta com o café da manhã. Muito animados e sorridentes, eles falando em russo e, fazendo sinais, fizemos a primeira refeição do dia, que consistia em panquecas recheadas com purê de batata, creme de leite, chá ou café. Depois, Tânia me entregou várias páginas impressas com informações traduzidas em inglês sobre a cidade, pontos turísticos e mapas. Ela já
minha família russa havia preparado tudo para mim. No caminho para o trabalho, me deixaram num desses pontos e fiquei a tarde inteira andando e tirando fotos. À noite, quando voltei, já estavam me esperando com o jantar pronto: uma sopa com vários legumes e carne. Essa sopa é chamada de “borch”, em russo, e a beterraba, um dos principais ingredientes, dá uma cor avermelhada que se torna rosa depois de adicionado o creme de leite, mais cremoso do que conhecemos no Brasil. No outro dia, era feriado na Rússia. O famoso 9 de maio, dia da vitória no qual comemoram o final da segunda guerra mundial e lembram os milhões de soldados e civis mortos durante o conflito. Cada cidade na Rússia faz uma parada militar nas principais praças e ruas, onde soldados marcham e desfilam com praticamente todos os armamentos que
possuem. Para nós, talvez seja difícil entender o motivo desses desfiles ainda acontecerem, mas o Brasil também celebra o dia da nossa independência quase do mesmo jeito. E isso sem que tenhamos tido que lutar contra um inimigo para garantir a nossa liberdade. Os russos perderam entre 22 a 30 milhões de vidas durante aqueles anos. Depois do desfile, me levaram para conhecer o famoso lago Baikal, que mais parece um mar. É o lago mais profundo da terra, com exatos 1.637 metros de profundidade. No museu ao lado é possível ver vários peixes e criaturas estranhas que vivem nessas profundezas. Muitos deles possuem luz própria e outros, lindíssimos desenhos fosforescentes. Depois de provar um pouco do gelo do lago de águas transparentes, provamos a especialidade do local:
irkutsk rússia “ohmul”, um peixe defumado por várias pessoas ao redor de mesas de piquenique. Por causa do feriado, acabei tendo que ficar mais tempo em Irkutsk, para retirar o visto da Mongólia. Mas essa foi uma das melhores coisas dessa viagem, pois assim pude conhecer melhor essa família que me hospedou tão bem por quase 6 dias. Nos divertimos muito com seu gato “Tosha” e os filhos Sacha (Alexander) e Macha (Maria). Enquanto tentava fazê-los entender que eu literalmente não tinha palavras para lhes agradecer, eles só falavam algo que eu entendia como: “Na Rússia isso é normal.” E, quando dizia que sua casa era melhor que um hotel 5 estrelas, eles apenas riam. Foi a família mais generosa e engraçada que eu já conheci nas minhas viagens. Na estação de trem, na hora da despedida, Tânia me entregou um texto
que ela traduziu para o inglês pedindo para eu voltar assim que pudesse para conhecer as atrações da região durante o verão e o inverno. Pude notar, na hora em que o trem começou a partir, que ela enxugava discretamente uma lágrima em seu rosto. Essa foi a Rússia que conheci. Não deixe de fazer também a lendária Transiberiana e conhecer um pouco mais desse país tão rico em história, paisagens e cultura.
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essa revista é patrocinada por pessoas maravilhosas! obrigado pelo carinho e apoio de todos vocês!
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obrigado à Cequinel Seguros de Curitiba pelo carinho e apoio com o seguro de viagens ao Rodrigo Turra da Redirect por mais uma vez acreditar nos meus projetos à Tânia Ottoni pela correção ortográfica ao Jornal Expressão pela publicação das minhas colunas semanais
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