Por que Murhabazi é NoMeado?
TexTo: ANDRe AS LÖNN FoTo: Bo ÖHLÉN
Murhabazi Namegabe é nomeado ao Prêmio das Crianças do Mundo 2011 por sua longa e perigosa luta de mais de 20 anos em prol das crianças da República Democrática do Congo, país devastado pela guerra. Desde 1989, Murhabazi, através de sua organização BVES, libertou mais de 4.000 soldados-criança e mais de 4.500 meninas abusadas sexualmente por grupos armados, e cuidaram de 4.600 crianças refugiadas abandonadas. Seus 35 lares e escolas oferecem comida, roupas, um lar, cuidados médicos, terapia, oportunidade de ir à escola, segurança e amor a crianças que estão entre as mais vulneráveis do mundo. A maioria das crianças é reunida às suas famílias. Graças a Murhabazi, 60.000 já passaram pelos diferentes centros do BVES e conquistaram uma vida melhor. Murhabazi e o BVES representam as crianças da República Democrática do Congo ao exigirem constantemente que o governo, todos os grupos armados, organizações e todos os demais membros da sociedade cuidem das crianças do país. Muitos são contra a luta de Murhabazi. Ele já foi preso, espancado e recebe ameaças de morte constantes. Sete de seus companheiros de trabalho já foram mortos.
NOME ADO • Páginas 106–125
Murhabazi Namegabe “Você vai morrer esta noite. Faça sua última refeição!” Murhabazi leu a curta mensagem em seu celular. Ele estava no meio de uma reunião importante da ONU sobre crianças forçadas a se tornarem soldados na República Democrática do Congo. Olhou cuidadosamente à sua volta. Teria alguém ali enviado aquela ameaça de morte? A luta de Murhabazi pelas dezenas de milhares de crianças exploradas e torturadas na guerra da República Democrática do Congo lhe rendeu muitos inimigos. “Aqui, a luta pelos direitos da criança é uma questão de vida ou morte. E eu estou preparado para morrer nesta luta, todos os dias”, diz Murhabazi Namegabe.
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urhabazi nem era nascido quando enfrentou sua primeira ameaça de morte. Em 1964, a guerra sangrenta assolava Bukavu, na região oriental da República Democrática do Congo, e sua mãe, Julienne, grávida, fugiu correndo pelas ruas estreitas para escapar da guerra. Ela só notou o posto de controle dos soldados quando já era tarde demais. Um dos soldados apontou o cano do rifle contra sua barriga, mas justo quando ele ia atirar, um dos líderes gritou: “Não a mate!Deixe-a ir!” Duas semanas depois,
Julienne deu à luz seu filho. Ela o chamou de Murhabazi, que no idioma Mashi significa tanto ‘aquele que nasceu na guerra’, como ‘aquele que ajuda os outros’. “Minha mãe sempre diz que nós sobrevivemos, porque havia uma razão para eu nascer. E que eu estava predestinado a dedicar minha vida para proteger os mais vulneráveis”. Todos devem ter comida!
Murhabazi cresceu em um dos bairros mais pobres de Bukavu. Porém, como seu pai tinha emprego, a família sem-
pre teve o que comer e as crianças podiam ir à escola. Depois que faziam o dever de casa, eles podiam brincar com os amigos. Logo no primeiro ano da escola, Murhabazi percebeu que nem todos tinham a mesma sorte que a dele. “Muitos dos meus amigos estavam sempre com fome, e não tinham condições de ir à escola. Eu achava aquilo injusto. Todos os dias, crianças famintas se amontoavam em frente à nossa casa na hora das refeições. Minha mãe colocava pequenos punhados de comida diretamente em
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Protegido pela ONU Murhabazi conversa com um soldado-criança em frente a um jipe da ONU. Apesar da batalha pelos direitos da criança na República Democrática do Congo ser difícil, algumas coisas tornaram-se mais fáceis para ele. “No início, tínhamos que ir a pé, e eu geralmente fazia as missões de resgate dos soldados-criança sozinho. Hoje, conto com a proteção da ONU quando viajo até os acampamentos de grupos armados. Na realidade, eu nem tenho permissão para viajar sozinho atualmente!”, ri Murhabazi.
É difícil resgatar crianças “Toda vez que um soldadocriança é libertado, é uma grande vitória. Mas é difícil negociar com os grupos armados. Eles ameaçam nos matar, quando lhes pedimos para libertar as crianças. Depois é difícil lidar com as crianças, pois elas já foram tão abusadas, maltratadas por adultos. E, muitas vezes, é complicado conseguir que suas famílias, vizinhos, vilarejos e escolas as aceitem de volta”, diz Murhabazi.
suas mãos, antes de mandálas embora. Eu achava que aquelas crianças deveriam se sentar à mesa e comer conosco até ficarem satisfeitas. Eu disse à minha mãe que me recusava a comer sua comida enquanto não fizéssemos assim!” Murhabazi conversou com alguns amigos da escola e jun-
tos começaram a promover uma campanha para que nenhuma criança do bairro passasse fome. Todas as tardes eles saíam cantando canções sobre como os adultos deveriam cuidar de todas as crianças. As crianças explicaram às suas mães que entrariam em greve de fome, enquanto as crianças mais pobres não fossem bem-vindas para partilhar as refeições. “No início, éramos apenas eu e mais uns poucos, mas logo havia mais de setenta crianças se reunindo todos os dias após a escola! “Afinal, os adultos decidiram que as crianças famintas eram responsabilidade de todos, e que elas podiam jantar com as famílias que tinham comida suficiente!” Convenção dos Direitos da Criança
Murhabazi e as outras crianças continuaram a protestar, desta vez para que pais e professores deixassem de bater nas crianças, e para que todas as crianças pudessem ir à escola. Conforme Murhabazi crescia, mais ele percebia os problemas das crianças na República Democrática do
Congo. Ele sentia que as crianças precisavam de que lutassem por elas e que ele precisaria de mais conhecimento se realmente quisesse ajudá-las. Por isso, ele estudou Desenvolvimento e Saúde da Criança na universidade. Após se formar, ele continuou como professor. Em 20 de Novembro de 1989, ele escutou o noticiário pelo rádio, como costumava fazer depois do trabalho. Naquele dia em particular, o locutor anunciou que a ONU havia decidido adotar o que chamou de Convenção dos Direitos da Criança. A Convenção dizia que todas as crianças, no mundo todo, tinham direito a uma vida digna. O locutor também disse que todo país que ratificasse aquela Convenção, deveria considerar o que era melhor para as crianças em todas as suas decisões. “Fiquei radiante e organizei uma reunião na minha casa com um grupo de professores, alunos e juristas, e contei a eles aquela notícia fantástica. Decidimos fazer tudo que pudéssemos para conseguir que o governo da República Democrática do Congo ratifi-
casse a Convenção dos Direitos da Criança”. BVES como organização
O grupo de Murhabazi se autodenominou BVES (sigla em francês para – Instituto de Serviço Voluntário para a Criança e a Saúde). Eles começaram a examinar a real situação em que as crianças da República Democrática do Congo se encontravam. Os resultados seriam então apresentados ao governo, com foco naquilo que o país precisava fazer para cumprir a Convenção dos Direitos da Criança.
Programa de rádio pelos direitos da criança Murhabazi fala no rádio sobre os direitos da criança, uma vez por semana, há mais de 20 anos.
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Ensina aos soldados sobre os direitos da criança Quando Murhabazi visita um grupo armado, ele ensina aos soldados sobre os direitos da criança e negocia com eles para libertarem as crianças.
“Não tínhamos dinheiro nem meio de transporte, então muitas vezes caminhávamos pela floresta vários dias para chegar a vilarejos distantes. À noite, tínhamos que dormir em árvores para não sermos atacados por leopardos ou outros animais selvagens. Algumas vezes nos ofereciam comida nas vilas, outras comíamos frutas silvestres, mas geralmente ficávamos com fome”.
Murhabazi e o BVES não desistiram, e reuniram dados sobre a situação das crianças nos vilarejos da República Democrática do Congo. Informações terríveis. “Quando mostramos os resultados ao governo, eles não gostaram nada. Naquela época, a RD Congo era uma ditadura. Se alguém dissesse algo ruim sobre o país, como as crianças que estavam sofrendo, era interpretado
como um ataque ao governo. Recebemos um alerta. Se não parássemos, iríamos para a prisão”. Crianças de rua
Murhabazi e o BVES não pararam. Eles começaram a falar toda semana no rádio, para que todos conhecessem a Convenção dos Direitos da Criança e fossem informados sobre a situação em que as crianças da República
Democrática do Congo viviam. Toda vez, Murhabazi exigia que o governo ratificasse a Convenção. E, toda vez, o governo ameaçava prendê-lo por semear a discórdia pelo país com seu discurso. Apesar das ameaças contra Murhabazi, o país ratificou a Convenção em 1990, mas sem nenhum esforço real do governo para cumpri-la. “As ruas de Bukavu estavam lotadas de crianças que
Celulares e videogames promovem a guerra Há muitas riquezas no Congo. Por exemplo, ouro, diamantes, tungstênio e coltan (columbita-tantalita). Esses minérios são usados para fabricar celulares, computadores, videogames e MP3 players em todo o mundo. “Hoje a guerra é para saber quem controlará todas as minas e riquezas naturais da República Democrática do Congo. Eu fui obrigada pelo meu comandante a garimpar ouro e diamantes”, diz Isaya, 15 anos, uma exsoldada-criança resgatada por Murhabazi. O conflito atual começou após o genocídio no país vizinho, Ruanda, em 1994, onde quase um milhão de pessoas do grupo étnico Tutsi foram
assassinadas. Milhares de perpetradores fugiram para as florestas da República Democrática do Congo, onde permanecem até hoje. A desconfiança e a disputa pelo poder se instalaram entre Ruanda e a República Democrática do Congo, e logo havia sete países envolvidos em uma das guerras mais brutais da história da humanidade. Por volta de 2001, a ONU acusou Ruanda, Uganda e Zimbábue de encorajar a guerra apenas para conseguir o maior número de riquezas possível. Em 2008, a ONU acusou novamente Ruanda de perpetuar a guerra. Em 2009, a organização Global Witness revelou que a guerra na RD Congo era agora liderada por
empresas europeias e asiáticas que fabricam celulares, computadores, videogames e MP3 players. Empresas da Bélgica, Reino Unido, Rússia, Malásia, China e Índia foram apontadas como compradoras de minérios de vários grupos que violavam brutalmente os direitos da criança. As empresas financiavam a guerra através da compra de minério desses grupos. O fato de que políticos, empresários e soldados na África, Ásia e Ocidente ganham muito dinheiro com a guerra na República Democrática do Congo, dificulta o processo para acabar com a guerra.
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Crianças na guerra têm os mesmos direitos “Nossas crianças, que vivem em meio à guerra, também têm o direito à vida, a uma família, a cuidados médicos, à educação e de brincar. Elas também têm o direito de se desenvolver e de serem ouvidas e respeitadas”, diz Murhabazi.
não tinham quem cuidasse delas. Seus pais eram muito pobres ou tinham morrido de AIDS. Todas aquelas crianças famintas e sujas tentavam sobreviver sozinhas. Muitas pessoas se referiam a elas como “cães”, mas nós dizíamos que elas precisavam de proteção e amor como qualquer outra criança”. Em 1994, o BVES abriu seu primeiro lar para crianças de rua e 260 crianças foram morar lá. Após alguns meses, muitas delas haviam voltado para suas casas. Mas sempre apareciam novos moradores. Soldados-criança
“Acreditávamos ter visto o pior durante nosso trabalho com crianças abandonadas, mas então veio a guerra e a vida de todas as crianças se tornou um verdadeiro inferno aqui”, conta Murhabazi. Em 1996, Bukavu foi invadida por diversos exércitos rebeldes congoleses com apoio de Ruanda. Na guerra que se seguiu, as crianças foram diretamente atingidas. “Nós cuidávamos de crianças refugiadas, que pertenciam a grupos étnicos considerados pelos guerrilheiros como inimigos. Por isso, eles destruíram nossos três lares
para crianças refugiadas. Por sorte, consegui esconder as crianças a tempo, então todas sobreviveram. Porém, meu amigo e primeiro colega de trabalho foi morto”. Todos os grupos que lutavam, inclusive o exército da República Democrática do Congo, sequestravam meninos e os obrigavam a se tornarem soldados e capturavam meninas para usar como escravas sexuais. Crianças eram forçadas a abandonar a escola e fugir e geralmente acabavam sozinhas nas ruas de Bukavu ou outras cidades. “É claro que eu tinha experiência com garotos ‘durões’, que tinham vivido nas ruas, mas os soldados-criança eram
diferentes. Meninos muito jovens, com cerca de dez anos de idade, eram drogados, usavam uniformes e carregavam armamentos pesados. Eles haviam sido completamente destruídos pelos adultos. Eu queria fazer o máximo possível para salvar quantos eu pudesse”, conta Murhabazi. Primeira missão de resgate
“Um dia, encontrei um grupo de mães em total desespero. Elas me contaram que 67 crianças tinham sido raptadas em seu vilarejo”. Murhabazi embrulhou um cacho de bananas e livros sobre os direitos da criança e saiu. Sozinho. “Tomei um mototáxi sem
dizer exatamente para onde íamos. Se eu dissesse, nunca me levariam!” Quando Murhabazi chegou ao acampamento do exército rebelde na floresta, ele foi capturado. Mais de cem soldados armados o rodearam. Os guardas levaram Murhabazi ao líder, que perguntou o que ele queria ali. “Eu disse que, em nossa cultura, os adultos sempre cuidam das crianças, mas que eu tinha ouvido que esse grupo havia raptado crianças e as forçava a lutar, em vez de irem para a escola. Falei que estava lá para levar as crianças de volta para seus pais. O líder ficou furioso! Ele pensou que eu era um inimigo que queria enfraquecer seu exército levando seus soldados-criança. Ele ordenou que seus soldados rasgassem meus livros sobre os direitos da criança. E então começou o espancamento”. Libertou as crianças
Murhabazi foi coberto de coronhadas. Quando ele estava gravemente ferido, o prenderam. Eles explicaram que ele tinha que escolher: tornar-se soldado de seu exército ou ser executado. Na manhã seguinte, um dos líderes
Queimaremos os uniformes Murhabazi com meninos que foram soldados resgatados por ele. Na foto,eles podem estar com uniformes trocados, para evitar que se identifique a qual grupo armado cada um pertencia. Agora eles queimarão os uniformes juntos.
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Combatentes pelos direitos da criança “Estou convencido de que teremos sucesso no final. Um dia, todos os soldados-criança do Congo serão libertados. Todo dia minhas energias se renovam quando vejo ex-soldadoscriança lutando pelos direitos da criança dentro de suas casas, escolas e vilarejos!”
impediu que o matassem. No dia anterior, o líder estava muito bêbado para reconhecer Murhabazi. Então ele disse: “Ele não é soldado inimigo. Eu sei que esse homem ajuda crianças de rua em Bukavu”. Quando as crianças sequestradas ouviram aquilo, o caos se instalou. “As crianças choravam e gritavam que eu também deveria salvá-las, assim como fazia com as crianças de rua. Elas queriam ir para casa! Eu disse aos soldados que eles tinham que soltar as crianças. Falei que era uma péssima idéia usar crianças como soldados se eles realmente desejavam derrubar o governo para criar um país melhor. As crianças deveriam voltar para a escola! Quem construiria esse país novo e melhor que eles queriam, se todos os jovens fossem soldados drogados ao invés de receberem uma boa educação?” Houve uma discussão calorosa entre os líderes. Alguns concordavam com Murhabazi, outros não. Porém, Murhabazi afinal conseguiu persuadi-los. Os soldados permitiram que as crianças deixassem a floresta. Os primeiros 67 soldadoscriança correram para a liberdade! Preparado para morrer
Isso foi há treze anos. Murhabazi já libertou 4.000 soldados-criança. Sessenta mil crianças vítimas da guerra – meninas abusadas sexualmente, crianças órfãs refugiadas, soldados-criança e crianças de rua – receberam uma vida melhor graças aMurhabazi e ao BVES. Atualmente,
há 209 pessoas trabalhando no BVES, que administra 35 casas e escolas e oferece às crianças um lar, cuidados médicos, terapia, oportunidade de ir à escola, segurança e amor. A maioria das crianças volta para suas famílias. Murhabazi conquistou muitos inimigos. Ele recebe ameaças por telefone e mensagem, e raramente dorme no mesmo lugar por duas noites seguidas. Sete de seus companheiros de trabalho foram mortos por lutar pelos direitos da criança, e ele já foi espancado e preso. “Há muitos militares, políticos e empresários, tanto na República Democrática do Congo como em outros países, que ganham muito dinheiro com a guerra. Quanto mais conflitos houver no país, mais barato eles conseguem nossas riquezas naturais, como ouro e diamantes. Na busca pelas riquezas, todos os grupos armados, até mesmo os exércitos de outros países, usam soldados-criança e todos estupram meninas. Ao lutar contra isso, eu conquisto muitos inimigos poderosos, pois atrapalho seus negócios. Eles também têm
medo de ser denunciados ao Tribunal Criminal Internacional (ICC) da ONU em Haia”. Apesar de um acordo de paz ter sido firmado em 2003, as batalhas e a violência contra as crianças na República Democrática do Congo continuam. Murhabazi não vai parar de lutar pelos direitos das crianças. “Precisamos continuar. Enquanto eu souber que existem crianças fazendo parte de grupos armados, nada irá me impedir. Nem ameaças de morte, nem acidentes.
Quando souberam que foram soldados que enviaram a mensagem durante a reunião na ONU, todos queriam que eu parasse e deixasse o país. A ONU e a Anistia Internacional concordaram que estava muito perigoso eu ficar aqui. Eles estão certos. Mas como eu poderia partir? Eu tenho uma responsabilidade com todas as crianças vulneráveis de quem eu e o BVES cuidamos. As crianças confiam em mim. Não posso desapontá-las. Todos os dias eu estou preparado para morrer por elas”.
Murhabazi ajuda os meninos a tirarem os uniformes vestidos para uma cerimônia onde estes serão queimados. Eles podem estar usando uniformes diferentes, para que ninguém identifique a qual grupo pertenciam.
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Crianças devem brincar! “Meus pais sempre me deixaram brincar bastante quando eu era criança. Contanto que eu tivesse feito meu dever de casa, eu podia sair para jogar futebol e brincar com meus amigos. Isso exerceu uma grande influência sobre a forma como eu vejo a infância. Crianças devem brincar! É de extrema importância que todas as meninas e meninos que estão aqui conosco no BVES possam brincar o máximo possível”, diz Murhabazi. Aqui, os amigos Kasereka e Mupenzi Dame brincam no lar de Murhabazi para exsoldados-criança.
Uma das piores guerras da história
A organização de Murhabazi funciona assim: • Visita grupos armados para informálos sobre os direitos da criança, para que todos os envolvidos na guerra saibam como as crianças devem ser tratadas, de acordo com a Convenção dos Direitos da Criança da ONU e com as leis congolesas. Por exemplo, é proibido recrutar crianças como soldados. • Durante as visitas, liberta soldadoscriança e meninas exploradas como escravas sexuais pelos grupos armados. • Visita campos de refugiados e cuida das crianças refugiadas abandonadas e das crianças de rua. • Oferece aos soldados-criança e às meninas abusadas que são libertados, assim como às crianças refugiadas e de rua: proteção, um lar, comida, roupas, cuidados médicos, ajuda psicológica e a oportunidade de voltarem à escola, além de oficinas de costura e carpintaria. • Localiza as famílias das crianças e as ajuda a retornarem para casa. Eles sempre preparam as famílias das
crianças, assim como os vizinhos, políticos, líderes religiosos e professores dos vilarejos antes do retorno, para que as crianças sejam acolhidas e aceitas de forma adequada. Caso não seja possível voltar para a família, o BVES tenta encontrar uma família adotiva. A criança nunca deixa o lar de Murhabazi até que se tenha certeza de que ela estará em um ambiente seguro. • Geralmente oferece suporte financeiro às famílias, para que tenham condições de permitir que as crianças voltem à escola e tenham boa alimentação. Eles podem ajudar um dos pais ou um irmão mais velho a conseguir emprego para ajudar a sustentar a família. • Geralmente ajuda as crianças libertadas com as taxas escolares e uniformes mesmo por um bom tempo após terem saído do lar Murhabazi, algumas vezes esse apoio continua até a universidade. • Informa toda a sociedade sobre os direitos da criança. Uma das formas que Murhabazi usa para fazê-lo é através de um programa de rádio regular.
• A guerra na República Democrática do Congo é uma das maiores e mais brutais da história da humanidade. Ela perdura desde 1998. Um acordo de paz foi firmado em 2003, mas a luta ainda continua na região oriental do país, onde vivem as crianças sobre as quais você lê na revista The Globe (O Globo). • Aproximadamente 5,4 milhões de pessoas morreram, tanto nas batalhas como devido à fome e às doenças que são resultado direto da guerra. • Na pior das hipóteses, estimase que houve 30.000 soldados-criança servindo no país. Milhares deles ainda precisam retornar para suas famílias. A ONU informou que 848 crianças foram forçadas a se tornarem soldados em 2009. Cerca de 200.000 estupros de meninas e mulheres foram denunciados desde que a guerra começou, mas acreditase que um número muito maior tenha ocorrido. Em 2009, metade das vítimas foram crianças. • Mais de 1,5 milhão de pessoas na República Democrática do Congo são refugiadas. • Mais de 5 milhões de crianças na República Democrática do Congo não vão à escola.
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TEXTO: ANDRE AS LÖNN FOTO: BO ÖHLÉN
Faida foi soldada Faida, 15 ADORA: Paz. Este é o primeiro ano em muito tempo que eu não estou envolvida em guerras. DETESTA: Guerra e morte. PIOR COISA QUE LHE ACONTECEU:
Ter sido sequestrada e usada como escrava sexual e soldada. MELHOR COISA QUE LHE ACONTECEU:
Quando Murhabazi me resgatou e eu voltei para a escola. ADMIRA: Murhabazi, claro! Ele salvou minha vida. QUER SER: Alguém que luta para assegurar que as crianças tenham uma boa vida. SONHO: Que todas as crianças do mundo vivam em paz e sejam amadas.
Quando Faida tinha onze anos de idade, ela foi sequestrada por um dos muitos grupos armados que atuam na República Democrática do Congo. Foi o início de um pesadelo que durou quatro anos, durante os quais ela foi forçada a ser escrava sexual e soldada. “Não acho que teria sobrevivido se Murhabazi não tivesse me resgatado. Ele arriscou sua própria vida por mim. Ele é como um pai para mim”, diz Faida.
A
coronha do rifle atingiu o rosto de Faida com violência. Ela tentou escapar, mas caiu de costas no mato alto e ficou presa. Um soldado segurou seus braços e outro suas pernas. Então seis soldados se revezaram para estuprá-la. Faida podia ouvir os gritos de suas amigas
próximo dali. Elas estavam tendo o mesmo destino. Os gritos de suas amigas pareciam vir de muito longe, como num sonho. Mas não era um sonho. Faida e suas amigas haviam trabalhado nas plantações de mandioca de suas famílias, como sem-
pre faziam nos feriados escolares. Ninguém notou os soldados até que fosse tarde demais. Agora duas das amigas de Faida estavam mortas. Quando um dos soldados ergueu o facão para matar Faida, o comandante gritou:
Meus direitos “No Congo, as crianças sempre têm que obedecer aos adultos. Quando os adultos nos tratam de certa maneira, você pensa que é assim que as coisas realmente devem ser, mesmo que não pareça certo. É muito fácil ser explorado quando você não conhece seus direitos. Antes de conhecer Murhabazi, eu sequer sabia que as crianças tinham direitos. Agora sei que tudo o que passei na guerra estava errado e que meus direitos foram violados”, explica Faida.
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da e escrava “Não a mate! Ela será minha esposa!” Soldados armados vigiaram enquanto Faida e sua amiga Aciza caminhavam completamente nuas pelo campo. “Tínhamos dificuldade para andar porque estávamos feridas, mas eles nos obrigaram”. Finalmente, chegaram à estrada onde o caminhão dos soldados estava estacionado. As meninas foram colocadas na caçamba, onde havia mais sessenta soldados sentados esperando. “Eu estava aterrorizada, seria estuprada novamente”, diz Faida.
Murhabazi nos ajuda
Minha Família! “O dia em que me chamaram no BVES para ver se uma menina que estava lá era a minha Faida, foi o dia mais feliz da minha vida! Hoje ela é minha filha e pertence à minha família”, conta a irmã mais velha de Faida, Donia.
“Murhabazi me ajudou a abrir uma tenda no mercado. Às vezes, ele nos ajuda com dinheiro para comprarmos roupas e comida. Se alguém na família adoece, ele se certifica que tenhamos ajuda médica. Não sei como lidaríamos com tudo isso sem a ajuda dele, pois meu pai morreu na guerra e minha mãe se recusa a se envolver com qualquer coisa relacionada a Faida”, lamenta Donia, enquanto as irmãs lavam roupas juntas.
Vizinhos com medo são desagradáveis A foto grande mostra onde Faida vive com sua irmã, Donia. “Nem sempre é fácil para mim aqui. Muitos vizinhos ficam com medo e gritam coisas para mim: ‘Você é soldada! Volte para a floresta, que lá é o seu lugar! ‘Não queremos você aqui! Prostituta!’ e coisas do tipo. Isso machuca. Mas nem todo mundo faz isso. Minha melhor amiga se chama Neema, e ela me aceita do jeito que eu sou”, diz Faida.
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Minha amiga Neema “Nós fazemos tranças nos cabelos uma da outra, Neema e eu”, conta Faida. “Eu geralmente cobro 3 dólares americanos para trançar o cabelo das pessoas”, diz Neema. “Mas Faida nunca precisa pagar, nós somos amigas! Nos encontramos todos os dias e podemos conversar sobre tudo, até mesmo segredos, porque confiamos uma na outra”.
Escrava de todos
As meninas foram deixadas em paz no longo trajeto até o acampamento dos soldados. Mas então tudo começou novamente. “O comandante me arrastou para dentro de sua casa. Ele abusou de mim a noite inteira, embora eu estivesse gravemente ferida”. No dia seguinte, o comandante saiu com alguns soldados para saquear. “Assim que ele saiu, os soldados que ficaram começaram a abusar de mim. Havia mais de vinte meninas e mulheres no campo, mas ninguém podia me ajudar, pois estavam na mesma situação que eu, e havia guardas armados nos vigiando o tempo todo”. Quando o comandante retornava, Faida era somente dele. Porém, assim que ele saia para lutar ou saquear, ela era abusada por todos. Dia após dia. Dia e noite. Na vila, a família de Faida ficava cada
vez mais preocupada. Por que ela não voltava pra casa? Eles foram de vila em vila perguntando se alguém a havia visto. Todavia, como ninguém na vila nunca havia sido sequestrado por soldados antes, não se cogitou essa possibilidade. Após um mês, todos estavam convencidos de que Faida havia sido morta na guerra. Eles disseram adeus a Faida com um período de luto e um culto memorial, como quando alguém morria. Vida de soldada
Depois de seis meses com os soldados, Faida se sentia terrível. “Eu estava enlouquecendo. Não aguentava mais ser escrava, apesar das drogas que me forçavam a usar”. Algumas das garotas do campo eram soldadas, e Faida havia percebido que elas nunca eram estupradas. Um dia, ela perguntou ao comandante se podia tornar-se soldada tam-
bém. “Ele concordou e, após dois meses de treinamento sobre como usar armas de fogo, facas e arco e flecha, passei a integrar seu exército”. Os estupros terminaram, mas a violência não. Certa manhã, chegou o momento de Faida ir para sua primeira batalha. “Eu estava apavorada, mas nos deram drogas antes de deixarmos a base. Todos os meus medos desapareceram e fiquei muito agressiva. Os soldados disseram que as drogas nos tornavam invisíveis”. Trinta soldados adultos e setenta soldados-criança escalaram as montanhas cobertas de árvores, carregando suas pesadas armas. As crianças eram obrigadas a andar na frente. Após algumas horas de caminhada, eles avistaram o campo do inimigo na clareira da floresta. Era um
campo exatamente como o deles, com soldados, mulheres e crianças. “Meu grupo começou a atirar e se instalou o caos completo. Pessoas gritavam e
Tarefas domésticas Faida cozinha um tipo de mingau de milho chamado ugali para a família. Ugali é o prato mais comum na região oriental da República Democrática doCongo.
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Faida e Neema ajudam-se mutuamente em muitas coisas, como buscar água. “Eu seria muito solitária se não tivesse uma amiga como Faida”, confessa Neema, 16.
Amada irmã “É terrível que nossa mãe se recuse a receber Faida. Ela ficou tão triste quando Faida desapareceu! E como os vizinhos podem gritar coisas tão horríveis para minha irmã tão amada? Todas as crianças que foram exploradas na guerra são tratadas de forma pavorosa. Temos que dar a elas muito amor. Faida frequentemente tem pesadelos e fica depressiva, eu tento confortá-la. Eu daria minha vida para protegêla”, afirma a irmã mais velha, Donia.
balas voavam por todos os lados. Uma saraivada de balas chovia sobre nós, com estilhaços de balas e lascas de árvores voando por toda parte. De repente, minha amiga Aciza, que estava mais próxima de mim, foi baleada nas costas. Ela morreu”. Quando a batalha terminou, Faida e as outras crianças foram enviadas ao campo do inimigo. “Devíamos revistar os corpos, recolhendo dinheiro, celulares e armas entre eles. Foi uma sensação estranha, pois era a primeira vez que eu fazia aquilo”. Houve muitas outras batalhas para Faida. Murhabazi
Faida sentia tantas saudades de sua família que chegava a doer. Ela pensava constante-
mente em fugir, mas não era possível. “Um garotinho tentou escapar uma vez. Atiraram nele imediatamente. Depois disso, eu não ousei tentar. Também estava envergonhada. Quem iria querer cuidar de mim, depois de tudo que passei? Quem poderia me amar? Ninguém”. Mas havia alguém que queria cuidar de Faida. Alguém que fez tudo o que estava ao seu alcance para salvá-la e às outras crianças. Era Murhabazi. “Da primeira vez que ele foi ao acampamento, eu estava acabando de lavar roupa. Alguns jipes entraram no acampamento. Um homem desarmado pulou do jipe com os braços para cima e disse: ‘Amani Leo!’, ‘Paz agora!’. Era Murhabazi. Ele podia facilmente ser morto, mas não estava com medo”, lembra Faida. Murhabazi foi até o comandante e disse que estava lá para levar as crianças para casa. Ele disse que crianças não deviam ser soldados. Que deveriam estudar. “Quando os soldados ouviram isso, eles rapidamente nos esconderam. Eu tentei
gritar socorro, mas eles me jogaram dentro de uma das casas”. O comandante se recusou a liberar as crianças, então Murhabazi foi embora de mãos vazias. Mas ele não desistiu. Alguns anos depois ele voltou, mas o desfecho foi igual ao de sua primeira tentativa. Sorte na terceira vez
Quando Faida já estava no acampamento há quatro anos, Murhabazi voltou. E desta vez foi diferente. “Não pude acreditar quando Murhabazi me abraçou e disse: ‘Esta é a sua chance! Tudo ficará bem!’” No início, tudo correu bem. No lar de Murhabazi para meninas vulneráveis, Faida pode voltar para a escola. Havia muitas crianças com quem brincar e conversar. E adultos nos quais ela podia confiar e que estavam sempre por perto. Ela sentiu-se segura. As coisas foram tão bem para Faida na escola do BVES, que ela logo ingressou em uma escola regular. Lá tudo também funcionou bem no começo. Porém, Faida tinha problemas de concentração e mudanças repentinas 115
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de humor. “Eu ficava furiosa com meus colegas de classe quando achava que eles não me entendiam”. Ela acabou não conseguindo mais lidar com aquilo, e abandonou a escola. Nessa mesma época, Murhabazi conseguiu encontrar a mãe de Faida. Faida ficou radiante, mas, assim como na escola, as coisas não foram como ela esperava. “Minha mãe nem olhou para mim. Ela estava com medo e não quis saber de mim. Como se tudo que aconteceu fosse culpa minha. Nem consigo explicar o quanto aquilo doeu”. Por sorte, Murhabazi também havia localizado a irmã mais velha de Faida, Donia, que a recebeu de braços abertos. Faida agora é parte da família dela. “E ainda tenho Murhabazi. Mesmo que as coisas não estejam fáceis agora, eu sei que tudo ficará bem, porque ele faz parte da minha vida. Ele é como um pai para mim. Mesmo arriscando a própria vida, ele tentou me salvar não uma, mas TRÊS vezes! Ele é completamente diferente do comandante e dos outros adultos que conheci, que apenas usam as crianças. Murhabazi está do nosso lado. Sempre!”
Escola ou curso de costura? “Murhabazi quer que eu aprenda a costurar até eu me recuperar um pouco e poder voltar à escola. Assim, posso aprender um ofício e ocupar minha mente, a fim de não pensar mais nas coisas terríveis pelas quais passei. E também estarei perto dele e dos psicólogos do BVES. Mas não tenho certeza. Seria melhor se eu conseguisse ir para uma escola regular. Uma boa educação te dá mais oportunidades na vida. E eu sei que posso ter sucesso, sei que sou inteligente!”
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Guerra contra as meninas Meninas e mulheres geralmente são quem mais sofrem na guerra. Cerca de 200.000 estupros foram registrados em 2009, mas acredita-se que um número muito maior de mulheres e meninas sofreram abusos. Em 2009, metade das vítimas era criança. Aquelas que sobrevivem aos estupros frequentemente encontram dificuldades na sociedade, que as consideram “impuras”. A solidariedade e o amor estão destruídos nas famílias e nas vilas. Muitas das vítimas estão com AIDS. “Murhabazi logo me levou ao hospital para que eu fizesse o exame de HIV. Tive muita sorte, pois não fui infectada enquanto estava com os soldados. Mas muitas meninas do lar são HIV positivas”, lembra Faida. No momento, 13 das 68 garotas que vivem no lar de Murhabazi, em Bukavu, para meninas abusadas são HIV positivas. Desde 2002, 176 meninas que receberam ajuda do BVES morreram de AIDS. “Tentamos oferecer às garotas que são HIV positivas toda a ajuda que podemos, e garantimos que elas recebam medicamentos gratuitamente”, diz Murhabazi.
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Mutiya queima seu uniforme No abrigo de Murhabazi em Bukavu para meninos que foram soldados-crianças, um grupo de garotos se prepara para voltar para suas famílias e começar uma nova vida. Mas primeiro eles irão queimar seus antigos uniformes de soldados. “Será simplesmente fantástico trocar o uniforme de soldado pelo uniforme escolar novamente”, diz Mutiya, 15 anos.
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que precisávamos continuar na escola, mas eles riram e disseram: “O que tem de tão especial na escola? Não importa, vocês vêm conosco agora mesmo!”. Depois, arrancaram nossos uniformes escolares, os rasgaram e jogaram na lama. Pegaram nossas mochilas e rasgaram nossos livros. Após três dias sendo espancados em uma de suas prisões, recebemos uniformes de soldados. Poucos dias depois, fui mandado para a batalha pela primeira vez. Servi por dois anos. Eu sobrevivi, mas cinco de meus amigos foram mortos. Vi muitas mortes e sangue.
Naquela época, eu nunca poderia imaginar que trocaria o uniforme de soldado por um uniforme escolar novamente. Eu havia perdido as esperanças quando Murhabazi me resgatou. Ele foi ao acampamento militar e disse às crianças que haviam sido forçadas a tornarem-se soldados: “Vocês não deveriam estar aqui. Vocês vão voltar para a escola. Venham comigo”. Parecia mentira, mas Murhabazi honrou sua palavra! Voltei a estudar aqui no BVES. Agora voltarei para casa, para meus irmãos mais velhos e minha escola na vila. Nem tenho palavras para expressar minha felicidade!
Sim ao uniforme escolar! Antes de queimar os uniformes, os garotos os vestem. Mutiya escreve: “Sim ao uniforme escolar” no seu.
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Murhabazi reúne os garotos antes de irem juntos para o pátio onde será realizada a cerimônia de queima dos uniformes. Eles usam uniformes diferentes, pois todas as guerrilhas do Congo usam soldadoscrianças. Os meninos do abrigo pertenciam a diferentes grupos armados. Porém, nessas fotos – para a própria segurança dos garotos – eles NÃO estão necessariamente vestindo o uniforme que usavam quando eram soldados. Eles podem estar vestindo o uniforme de uma guerrilha diferente daquela à qual cada um pertenceu.
Porém, antes de partir, vamos queimar nossos uniformes de soldados. O uniforme só me faz lembrar de coisas ruins: morte, sangue, guerra, pilhagem... Será uma ótima sensação queimar esse lixo, finalmente me sentirei livre. Quando eu voltar para a vila, vou colocar meu uniforme escolar. No futuro, quero salvar crianças dos grupos armados, assim como Murhabazi me salvou”. Mutiya, 15 anos, foi soldadocriança por 2 anos
TEXTO: ANDRE AS LÖNN FOTO: BO ÖHLÉN
ossa última aula acabava de terminar numa sexta-feira. Meu amigo Mweusi e eu estávamos a caminho de casa. Contávamos histórias enquanto caminhávamos. De repente, três soldados pararam na nossa frente e apontaram suas armas para nós. Eles disseram: “Vocês não podem passar! Se tentarem correr, não hesitaremos em atirar!”. Meus pais foram mortos por soldados, então tive muito medo. Começamos a chorar e meu amigo molhou as calças. Imploramos que nos deixassem ir, e argumentamos
Uniformes diferentes
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Uniforme de soldado nunca mais! “Agora, olhem atentamente para a placa. Ela diz: “Uniforme de soldado nunca mais”. Vocês nunca mais usarão uniformes de soldado, vocês terão uniformes escolares, nunca se esqueçam disso! Vamos queimar os uniformes!”, conclama Murhabazi. Entre aplausos e muita vibração, Mutiya e os outros meninos tiram as roupas militares e as colocam numa pilha no pátio.
! a s a c a r a p s Vamo Chegou o grande dia. Murhabazi e o BVES conseguiram localizar as famílias de Mutiya e de mais quinze meninos. Agora, eles finalmente vão para casa, depois de anos na guerra. “Estou tão feliz pelos garotos. É por isso que lutamos o tempo todo. Toda vez que uma criança é salva e pode voltar a ter uma boa vida, é uma grande vitória para nós”, diz Murhabazi, rindo.
Boa sorte! “Mutiya, você quer voltar a estudar e começar uma nova vida. Sei que você está bem preparado e te desejo toda felicidade no futuro!”, Murhabazi diz, e abraça Mutiya. “Obrigado pai, obrigado! Vou rezar por você, para que tenha forças para continuar lutando”, responde Mutiya.
A bolsa de Murhabazi Todas as crianças que passam por um dos abrigos de Murhabazi ganham uma bolsa com itens que tornarão sua vida mais fácil ao retornarem para suas famílias. A bolsa contém: Sabonete Escova de dente
Cobertor
Um par de sapatos
Roupas novas Rádio
O rádio é importante “Estou dando estes rádios para que vocês saibam o que acontece em nosso país e no mundo. Isso é importante. Ouçam estações que têm noticiários e que falem sobre os direitos da criança. Caso sintonizem estações que pregam o ódio, a violência e a guerra, mudem a frequência! O rádio funciona com energia solar para que vocês não precisem comprar pilhas”.
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Toalha
Creme dental
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Novos sonhos “Eu havia perdido a esperança. Mas no BVES tive a chance de voltar para a escola. Fiquei muito feliz, mas não parava de pensar em todo o tempo que havia perdido. Dois anos! Imagine o quanto eu poderia ter aprendido enquanto eu era soldado. Agora vou começar a estudar na vila e, quando crescer, quero ser como Murhabazi!”
Uniformes viram fumaça Mutiya e seus amigos cantam e celebram enquanto os uniformes são destruídos pelo fogo.
Tchau! Vamos para casa!
Adeus, amigo! Os garotos se despedem uns dos outros e de Murhabazi. Eles se tornaram bons amigos e se ajudaram nos momentos difíceis. Portanto, apesar de estarem ansiosos para ir para casa, não é fácil se separar.
Bolas no lugar de bombas! “Este é um momento de muita alegria! Minha única preocupação é que novas batalhas se iniciem nas áreas para onde os garotos estão voltando, e que eles sejam forçados a ser soldados de novo. Isso acontece, e me deixa louco da vida. É extremamente difícil, mas recomeçamos toda vez que isso ocorre. Um menino foi pego três vezes, por três grupos armados diferentes. Nós o libertamos todas as vezes. Nunca abandonaremos as crianças, e não desistiremos até que todas estejam livres”, afirma Murhabazi.
TEXTO: ANDRE AS LÖNN FOTO: BO ÖHLÉN
“Os soldados pegaram os uniformes escolares dos meninos e lhes deram uniformes militares. E armas no lugar de canetas. Bombas no lugar de bolas. Mas nós damos bolas de futebol para os meninos levarem para casa. Aqueles que moram perto uns dos outros podem montar um time de futebol e continuar se encontrando e se apoiando mutuamente. Porém, o mais importante é que eles se divirtam!”, diz Murhabazi.
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Vamos para c asa!
“Sinto muita falta de meus amigos lá em casa. Não nos vemos há mais de quatro anos, e realmente espero que eles se lembrem de mim. Também espero que eles não tenham medo de mim porque fui soldado. Estou meio preocupado com isso. Porque eu realmente senti falta de meus amigos. Só quero poder conversar, jogar futebol e brincar. Não havia espaço para risadas e brincadeiras quando eu era soldado.
Sonhava com a escola
TEXTO: ANDRE AS LÖNN FOTO: BO ÖHLÉN
“O que eu mais sentia falta era da escola. Quando eu era soldado, sentia o tempo todo que estava no lugar errado, que deveria estar na escola, e não ali. Agora Murhabazi vai me ajudar a voltar para a escola quando eu chegar em casa, e isso é incrivelmente
Sentia falta de paz
Tem saudade da mãe
“Quando eu era soldado, havia guerra todos os dias. Nunca paz. Exceto por minha mãe e meu pai, o que eu mais sentia falta era de paz. Eu sofri todo o tempo. Foi terrível. Estou feliz por finalmente ir para casa. Espero que minha vida seja boa. Que eu possa ir à escola e fazer muitos amigos. Porém, meus pais estão velhos e meio doentes. Temo o que acontecerá comigo quando eles morrerem. Quando isso acontecer, entrarei em contato com Murhabazi, pois sei que ele me dará bons conselhos. Eu o amo, ele salvou minha vida. Sentirei saudades dele”. Amani, 15 anos, foi soldadocriança por 2 anos
“Tenho muitas saudades de minha mãe! Durante a guerra, eu pensava nela o tempo todo. Antes de me obrigarem a ser soldado, eu a ajudava no campo e buscava água. Como meu pai morreu quando eu era pequeno, me preocupava se ela conseguiria se virar sozinha enquanto eu estava fora. Eu converso muito com minha mãe e a amo. Sinto-me seguro e calmo quando estou com ela. Agora só quero ir para casa e ficar perto dela novamente. O que me preocupa é deixar meus amigos aqui. Pudemos conversar uns com os outros sobre nossas terríveis experiências, e isso foi ótimo. Em casa não será assim. Os garotos da vila que nunca foram soldados, nunca poderão entender o que eu passei”. Obedi, 15 anos, foi soldadocriança por 2 anos
Uniforme militar, nunca mais!
bom. Eu adoro estudar! Adoro a escola! A escola é importante. Quem vai à escola tem muitas oportunidades na vida. Eu gostaria de ser presidente quando crescer. A primeira coisa que faria seria libertar todas as crianças que são forçadas a ser soldados. Eu as ajudaria a reencontrar suas famílias e deixaria que voltassem para a escola. Meu maior medo agora é ser pego por soldados e forçado a lutar novamente. Eu ficaria devastado se isso acontecesse”. Assumani, 15 anos, foi soldado-criança por 2 anos
Quer rir e brincar
Estou feliz por poder ir para casa. Não importa o que aconteça, se meus amigos tiverem medo de mim ou algo assim, nada mais me assusta. Nada pode ser pior do que aquilo que vivenciei como soldado. Nada.” Aksanti, 15 anos, foi soldadocriança por 4 anos
Escola – sim! Acampamento militar – NUNCA MAIS!
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Murhabazi não desampara ninguém A ideia é que as crianças resgatadas por Murhabazi permaneçam no abrigo por três meses. Porém, às vezes leva mais tempo para localizar suas famílias e ajudar as crianças a começarem uma nova vida. Foi assim com Bahati.
Sonha com boas pedras “O grupo armado que me pegou me forçava a procurar ouro, diamantes e outros minerais. Eu era obrigado a entregar todas as pedras que encontrava a meus líderes. Eu era escravo deles. Nós que procurávamos tentávamos esconder um pouco, bem pouquinho, mas era difícil. Quem era pego apanhava muito. Podia até ser morto. Quando nosso grupo não estava garimpando, saqueava outros que trabalhavam nas minas. Não sei quantas pessoas morreram. Eles usavam o ouro e outros minérios para comprar armas dos ricos contrabandistas de armas que apareciam na floresta. Acho que, no fim das contas, a guerra se tratava de grupos diferentes, tanto congoleses como estrangeiros, que lutavam pelo controle das minas do Congo. Se não tivéssemos esses minérios, haveria paz há muito tempo. Talvez nunca tivesse havido guerra. Agora, todas as riquezas naturais são ruins para nós. Mas, na verdade, elas deveriam ser boas. Se o governo do Congo pudesse vender os minérios de forma apropriada, poderíamos construir escolas, estradas e hospitais. Tudo o que as pessoas precisam. Eu sonho com esse dia. Também sonho em me tornar alfaiate e ter um boa vida. E acredito que isso seja possível, porque Murhabazi e o BVES estão comigo.” Isaya, 15 anos, foi soldado-criança por 4 anos
“Embora Murhabazi não tenha encontrado meus pais após três meses, ele não me mandou para fora do abrigo. Ele cuidou de mim por mais de um ano, como se eu fosse seu próprio filho. Eu ainda o vejo como um pai. Após frequentar a escola do BVES, ele me ajudou a ingressar em uma escola regular. Ele pagou as taxas escolares e tudo mais que precisei. Eu contei a Murhabazi sobre o meu sonho de ser jornalista. Então ele me ajudou e tive a chance de fazer um teste para um curso de jornalismo para jovens na organização Search for Commom Ground (Em Busca de um Denominador Comum). Eu passei no teste e concluí o curso, e hoje sou um jovem repórter em seu programa de rádio ‘Sisi Watoto – Nós Crianças’! É, provavelmente, o melhor programa do mundo, pois tratamos do assunto mais importante que existe, os direitos da criança. Muitas crianças nos telefonam, e a intenção do programa é dar voz às crianças do Congo. Algo incomum por aqui. Os adultos daqui quase nunca escutam as crianças. No futuro, espero poder ajudar o BVES a salvar mais crianças, exatamente como Murhabazi fez comigo. Ele salvou minha vida.” Bahati, 17 anos, foi soldadocriança por 3 anos “Todo sábado e domingo às 17h30 eu falo sobre os direitos da criança no rádio, principalmente sobre a violência com que as garotas são exploradas na guerra do Congo”, finaliza Bahati.
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“Murhabazi é como um pai para mim!” “Num domingo, há um ano, minhas duas irmãs e eu estávamos na igreja quando nossa vila tornou-se um campo de batalha entre dois grupos militares. Os soldados disparavam suas metralhadoras e jogavam bombas na direção da igreja, portanto não conseguíamos sair. Meu corpo inteiro tremia de medo. O que eu não sabia é que, naquele momento, nossos pais fugiam para a floresta para tentar se salvar. Alguns dias depois, quando o tiroteio cessou, a Cruz Vermelha e a ONU vieram à igreja e nos levaram para um campo de refugiados. Morei lá por cinco meses. Foi difícil. A comida era diluída e os colchonetes ficavam no chão. Nós não podíamos ir à escola. Um dia, Murhabazi veio e perguntou se eu queria morar em seu lar para meninas. Fiquei imensamente feliz, pois havia ouvido muitas coisas boas a seu respeito. Fomos com ele, 29 crianças ao todo. Estou feliz por estar aqui, agora sinto como se estivesse em casa. Murhabazi cuida de mim como um pai. Porém, todas as noites, sonho que mamãe e papai estão vivos e que posso voltar para casa. Murhabazi continua procurando meus pais. Valentina, 12 anos
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O dia de Valentina no la O lar de Murhabazi para meninas vulneráveis fica numa das colinas da cidade de Bukavu. Muitas das garotas foram capturadas por diferentes grupos armados. 47 das 68 garotas que vivem lá sofreram abusos sexuais. “Estou feliz por estar aqui, agora sinto como se estivesse em casa. Murhabazi tornou-se um pai para mim”, diz Valentina, 12.
6h00 Hora de Levantar
7h00 Café da manhã
“Escovamos os dentes e tomamos banho. Aqui nos dão sabonete, creme dental, óleo para o corpo e para o cabelo. Eu perdi minha escova de dente e ainda não deu tempo de arrumar outra, por isso estou usando o dedo. Na verdade, funciona muito bem!”, brinca Valentina, rindo.
8h00 Aulas “Eu não ia para a escola quando morava no campo de refugiados. Sei que ter a chance de frequentar a escola é direito de toda criança, mesmo nós que vivemos na guerra e somos refugiadas. De repente, eu não podia mais ir à escola e isso me fazia sentir mal. Como se eu estivesse perdendo tempo de aprender coisas importantes. Fiquei tão feliz no primeiro dia em que fui à escola aqui na casa de Murhabazi! É preciso ir à escola se você quer aprender as coisas e, assim, ser capaz de tomar boas decisões na vida e conseguir um bom emprego para sustentar sua família”. “Quando for mais velha, quero aprender a costurar aqui no BVES e ser costureira. Mas o que eu mais quero é ser professora. Minha professora, Ndamuso, não é apenas professora, ela é muito carinhosa e cuida de mim. Ela me aconselha, como uma mãe. Quero ser como ela quando eu crescer. As meninas muito novas para ir à escola vão para a creche”.
O café da manhã é um tipo de mingau de milho, Buyi.
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12h00 Almoço Hoje temos arroz e feijão.
13h30
Descanso
“É bom descansar um pouco no período mais quente do dia”. A garota que divide a cama com Valentina se chama Noella e tem 10 anos de idade. “Geralmente, muitas crianças dividem a cama. Às vezes fica um pouco apertado. Ao mesmo tempo, é bom não ficar sozinha”, comenta Valentina
o lar de Murhabazi para meninas 15h30 Lavar a roupa Valentina divide uma bacia com Donatella.
14h30 Brincar “Adoro brincar com minhas amigas. Você se sente feliz e espanta os maus pensamentos. Além disso, você se movimenta, desenvolve seus músculos e fica em forma! Nós brincamos de salto à distância, criamos brincadeiras com canto e dança e diversos tipos de jogos de bola.
16h30 Dever de casa “Geralmente fazemos nosso dever de casa juntas, assim podemos ajudar umas às outras”, conta Valentina.
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O guarda-roupa de Valentina
18h00 Jantar Arroz e feijão também.
“Todas as minhas roupas estão em uma mala, no quarto.” “Este lindo vestido branco eu uso para ir à igreja, todo domingo.”
“O colar com a Virgem Maria é o acessório mais bonito que tenho. Sintome segura quando o uso. Como se eu estivesse protegida.”
19h00 Reunião noturna
“Essa blusa amarela macia é minha favorita!”
“Todas as noites sentamos e conversamos sobre nosso dia. Cantamos e contamos histórias. As reuniões são muito importantes para mim, pois ajudam a me acalmar. Por alguns momentos, me esqueço da minha constante preocupação sobre o paradeiro de meus pais. Durante as reuniões, parece que somos uma família de verdade. Cuidamos umas das outras, e as mais velhas cuidam das mais novas. Os adultos daqui realmente se importam conosco. Sempre tenho alguém para me ouvir quando não estou me sentindo bem. Nesses momentos, converso com Murhabazi, minha professora, a enfermeira ou com a psicóloga. É assim que deveria ser em todas as famílias.
20h00 Hora de dormir Depois de escovarem os dentes, as garotas vão para a cama, ficam bem juntinhas nas camas e adormecem.
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“Eu consegui trazer minhas roupas comigo, quando fui para um campo de refugiados. Isso me deixa muito feliz, pois foi minha mãe quem me deu as roupas. Adoro minhas roupas. Elas são lindas e me fazem lembrar a mamãe.”
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Quem é Murhabazi?
Três garotas do lar para meninas vulneráveis descrevem Murhabazi assim:
Ele protege as meninas “Eu fui prisioneira dos soldados e Murhabazi salvou minha vida. É ele que cuida para que possamos viver em segurança, sãs e salvas aqui. Ele nos dá tudo. A situação das mulheres e meninas em nosso país é terrível. Nós sofremos. Muitas são abusadas e estupradas por soldados e outros homens. Murhabazi cuida de nós como se fôssemos suas próprias filhas ou irmãs. Se não fosse por Murhabazi, as vidas de muitas garotas na República Democrática do Congo seriam muito piores. Ele nos protege” Donatella, 13 anos
Eu o amo! Ele é meu pai! “Murhabazi cuida de mim. Ele me proporciona um lugar para dormir, sabonete para o banho, comida para me alimentar e a oportunidade de ir à escola. Se eu adoeço, ele me leva ao médico. Murhabazi é como todo pai e mãe deveriam ser. Ele é como meu pai! Sem ele, minha vida seria difícil demais. Eu o amo!” Josepha, 10 anos
“Minha família se dividiu durante a guerra, pois nos separamos ao fugir. Murhabazi e a Cruz Vermelha ainda estão procurando meus pais. Eu não sei nem se eles ainda estão vivos. Mas por enquanto, Murhabazi é meu pai. Eu o amo e sei que ele me ama, porque ele me ajuda em tudo. Eu penso na minha mamãe, no meu pai e nos meus irmãos e irmãs o tempo todo. Coisas horríveis aconteceram. Apesar de tudo, a vida está um pouco mais fácil agora que Murhabazi toma conta de mim.” Vestine, 15 anos
Crianças nos lares e escolas de Murhabazi
As irmãs Benon, Vestine e Valentina vivem juntas em um dos lares de Murhabazi.
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Há 68 garotas morando no lar de Murhabazi para meninas vulneráveis em Bukavu. Durante o dia, mais 297 garotas vêm ao lar para ir à escola do BVES. Elas já viveram no lar, mas agora retornaram para suas famílias. “As famílias geralmente são tão pobres, que não têm condições de mandar seus filhos para escolas regulares. Nossa escola é gratuita, e as crianças podem permanecer o tempo que precisarem”, diz Murhabazi. Atualmente, 71 meninos moram no lar de Murhabazi em Bukavu para meninos que foram soldados-criança. Murhabazi tem 35 lares e escolas por toda a República Democrática do Congo. Atualmente, há um total de 15.284 crianças que recebem algum tipo de apoio do BVES. Por exemplo, 8.138 crianças recebem auxílio para frequentar escolas regulares e 37 jovens têm apoio para cursar uma universidade.
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