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10 ano 8, volume 1, nĂşmero 10, julho 2007 1


Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro de Educação e Humanidades Instituto de Artes Reitor Nival Nunes de Almeida Vice-Reitor Ronaldo Martins Lauria Sub-Reitor de Graduação José Ricardo Campelo Arruda Sub-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Albanita Viana de Oliveira Sub-Reitor de Extensão e Cultura João Regazzi Gerk Diretora do Centro de Educação e Humanidades Maricélia Bispo Diretora do Instituto de Artes Maria Lúcia Galvão Vice-Diretor do Instituto de Artes Roberto Conduru Coordenador de Graduação Marcelo Campos Coordenadora de Pós-Graduação e Pesquisa Vera Beatriz Siqueira Coordenador de Extensão e Cultura Alexandre Vogler Concinnitas Revista do Instituto de Artes da UERJ Editora Sheila Cabo Geraldo ART-UERJ Co-editores Luiz Felipe Ferreira ART-UERJ Roberto Conduru ART-UERJ Equipe de Produção Gabriella de Amorim Gen Bolsista Estágio Interno Complementar UERJ Henrique Ferreira Bolsista Estágio Interno Complementar UERJ Lygia Santiago Bolsista Proatec UERJ Conselho Editorial Alberto Cipiniuk ART-UERJ / PUC-RJ Arlindo Machado USP / PUC-SP Carlos Zilio UFRJ Christine Mello SENAC-SP Cristina Salgado ART-UERJ / PUC-RJ Eduardo Kac Art Institute of Chicago Evandro Salles Artista plástico e crítico de arte Gilles Tiberghien Paris I Gustavo Bonfim PUC-RJ Hélio Fervenza UFRGS Hugo Segawa USP Isabela Nascimento Frade ART-UERJ Jorge Luiz Cruz ART-UERJ José Thomaz Brum PUC-RJ Kátia Maciel UFRJ Lorenzo Mammi USP Luciano Migliaccio USP Luis Andrade ART-UERJ 2

Manuel Salgado UFRJ Márcia Gonçalves IFCH-UERJ Maria Beatriz de Medeiros UnB Maria de Cáscia Frade FAV-RJ Maria Luiza Saboia Saddi Artista plástica Mario Ramiro USP Michael Asbury Camberwell College of Art Milton Machado UFRJ Nanci de Freitas ART-UERJ Nuno Santos Pinheiro Fac. de Arq. de Lisboa Paulo Sergio Duarte UCAM Rafael Cardoso Denis PUC-RJ Ricardo Basbaum ART-UERJ Rodrigo Naves CEBRAP Rogério Luz UFRJ Sonia Gomes Pereira UFRJ Vera Beatriz Siqueira ART-UERJ Vitor Hugo Adler Pereira IL-UERJ


Sumário 5

Apresentação Dossiê arte e política

6 20 34 47 57 65 78 86 96

Josu Larrañaga Altuna Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento José Miguel G. Cortés Identidad, género y espacio urbano Juan Vicente Aliaga Polifonías discordantes: sobre la significación de las micropolíticas en las prácticas artísticas y culturales Aurora Fernández Polanco Resonancias: arte y vida. Una lectura de Jacques Rancière Javier Hernando Carrasco Activismo ecologico y arte medioambiental: el caso de César Manrique Yayo Aznar Almazán y María Iñigo Clavo Arte, política y activismo Carmen Navarrete Todo arte es político. Representaciones de lo político y políticas de la representación. Notas sobre feminismo y globalización Dária Jaremtchuck Ações políticas na arte contemporânea brasileira Sheila Cabo Geraldo Qual política: microagências artístico-historiográficas

Artigos 108 118

Jaime Vindel Claves teóricas para la comprensión del arte conceptual y del conceptualismo argentino Lidice Matos Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a crítica institucional

Ensaio de artista 133

Alexandre Vogler Fé em Deus / Fé em Diabo

Resenhas 143 145 148

Loreto Alonso Ganarse la vida Daniela Labra Zexe.net – Canal motoboy Cristina Ribas Invenção de multidão

155 158 159

Abstracts Sobre Concinnitas Normas para publicação 3


Revisão Maria Helena Torres Traduções Jason Campelo Bárbara Oliveira Santos Projeto Gráfico Eliane Bettocchi Designer Responsável Lygia Santiago Capa Alexandre Vogler. Fé em Deus / Fé em Diabo, 2006

Catalogação na fonte UERJ/REDE SIRIUS/PROTEC C744

Concinnitas: arte, cultura e pensamento / Jorge Luiz Cruz, ed. - Vol. 0, n. 0 (nov. 1997)- . Rio de Janeiro: UERJ, DEART, 1997v. Assumiu a editoria a partir do vol.4 n.1 Sheila Cabo Geraldo. Semestral ISSN 1415-2681 1. Arte - Periódicos. 2. Cultura - Periódicos. I. Cruz, Jorge Luiz. II. Geraldo, Sheila Cabo. III. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Artes. CDU 007

2007 Concinnitas é uma publicação semestral do Instituto de Artes/ART, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Arte. Este volume recebeu apoio do Proyecto de Investigación – Arte y Política: Argentina, Brasil, Chile y España 1989-2004 (HUM-03465). Universidad Complutense de Madrid, Facultad de Bellas Artes, Investigador principal: Josu Larrañaga Altuna. Plan Nacional de I+D, Ministerio de Educación y Ciencia, España.

Os artigos são de responsabilidade dos autores e não refletem a opinião do conselho editorial.

Concinnitas 4

[http://www.concinnitas.uerj.br/abertura.html]


Apresentação

O dossiê da edição que agora trazemos a público trata da relação entre Arte e Política, uma relação implícita no processo de modernidade artística, mas que se vem colocando no foco dos debates mais acirrados das últimas décadas, sobretudo quando as definições, tanto de arte como de política, passam a sofrer necessário processo de redefinição na chamada sociedade do conhecimento. Os textos que compõem este debate foram apresentados no seminário Lo político desde el arte, que aconteceu em maio de 2006, na cidade de Madri, coordenado pelo artista, professor e pesquisador Josu Larrañaga Altuna, como parte do projeto de pesquisa Arte y política – Argentina, Brasil, Chile y España, 1989-2004, e foram gentilmente cedidos por seus autores, a quem agradecemos. Convidamos para compor este número o artista Alexandre Vogler, que preparou a capa e o ensaio “Tridente de Nova Iguaçu”. O trabalho aqui publicado é o desdobramento da intervenção realizada em agosto de 2006, no município de Nova Iguaçu, que podemos considerar uma espécie de reverberação das ações desenvolvidas no grupo Atrocidades Maravilhosas, de que participou em 2000/2001, deflagrando intervenções com cartazes lambe-lambe na cidade do Rio de Janeiro e em São Paulo, e provocando reações e conflitos, o que também aconteceu no caso de 2006. Os cartazes colados em São Paulo, Fé em Deus / Fé em Diabo, compõem a capa desta edição. Acreditamos que sua inserção possa ser mais uma contribuição para o debate que o dossiê apresenta, já que a relação entre Arte e Religião constitui-se parte da discussão que envolve Arte e Política. Publicamos, também, neste número o artigo que recebemos de Jaime Vindel, assim como o de Lidice Matos, que certamente ampliam o tema do debate, mostrando outras leituras sobre arte contemporânea na Argentina e no Brasil. Como coroamento da publicação, apresentamos as resenhas solicitadas especialmente para este número a Loreto Alonso, Daniela Labra e Cristina Ribas, que as prepararam em tempo recorde. Ficamos muito gratos por isso. Sheila Cabo Geraldo

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Josu LarraĂąaga Altuna

Julia Scher. Sammler unter Beobachtung, Internetprojekt:technischen Kaufhaus Brinkmann, TV-Abteilung, SpitalerstraĂ&#x;e 10, 2000

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Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento

Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento Josu Larrañaga Altuna* Se trata de analizar algunos de los elementos fundamentales que caracterizan la relación arte/política en los últimos 20 años, a partir de la identificación de las particulares condiciones de generación de valor de la fase cultural o cognitiva en que nos encontramos. La nueva ubicación del arte, las concordancias metodológicas del sistema del arte y el sistema económico, la nueva comprensión de lo político y la condición política de lo artístico en la sociedad globalizada. Economía del conocimiento, disenso, política del arte

Estamos inmersos en un intenso y complejo proceso de transición en el interior del capitalismo; un proceso que afecta a la propia naturaleza del valor, a las formas de acumulación y a las relaciones de producción, y que está dando como resultado una alteración del sistema al que se reconoce ahora con el nombre de capitalismo cultural o del conocimiento. Un proceso que se desarrolla en una sociedad caracterizada por su progresiva espectacularización y virtualización. A finales de los 80 se hacía visible esta profunda transformación en el ámbito económico (Big Ban de Londres en 1987), en el político (caída del muro de Berlín, en 1989), en el científico y el ético (puesta en marcha del Proyecto Genoma Humano, en 1989), en el tecnológico (puesta en funcionamiento de la web en 1990). La nueva ubicación de la producción cultural en el sistema económico ha recolocado a su vez el conjunto de gestos, acciones, producciones, objetos... que llamamos “arte”, y ha puesto de manifiesto movimientos * Josu Larrañaga Altuna es artista plástico y profesor titular de pintura en la Facultad de Bellas Artes de la Universidad Complutense de Madrid. Entre sus obras recientes cabe destacar: De memoria (Canteras de S’Hostal, Ciutadella de Menorca, 2002), Ejercicio de entendimiento (Fac. Filosofía León, 2005), Dispositivo de seguridad (Pensar de pintura, Jardín Botánico UCM, 2006). Y entre sus publicaciones: Instalaciones (Hondarríbia, Ed. Nerea, 2000), Objeto representado-objeto presentado (Madrid, Ed. Complutense 2002), Entre nubes de polvo: Poéticas del presente (Cuenca, UIMP y D. Provincial, 2005). ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

y desplazamientos de la idea de lo “político” que, en consecuencia, han afectado profundamente a la relación arte-política, a la dimensión política de cualquier práctica artística, a la función asignada a las propuestas artísticas desde el ámbito de la acción política y a la manera compleja y paradójica en que lo político se percibe desde el propio arte.

Sobre la nueva ubicación del arte “1980-2005. En pocos campos, como en las relaciones entre cultura y sociedad, el mundo cambió tanto en este período. Se ha dicho que una manera de verlo es enumerar las palabras que no existían 7


Josu Larrañaga Altuna

hace dos décadas: disquete, escáner, neoeconomía, teletienda, weblogs. Si se modificó el lugar de la cultura en la sociedad es porque, como revela este nuevo vocabulario, la industrialización de la producción cultural entrelaza a los bienes simbólicos con las innovaciones tecnológicas y con algunas de las zonas más dinámicas de la economía y las finanzas.” Néstor García Canclini1 Como se advierte desde muy diferentes ámbitos de reflexión, nos encontramos en un período de grandes modificaciones en la configuración económica del sistema. La incorporación de la agricultura intensiva y los controles a su comercialización han desestructurado el mapa mundial de la producción de alimentos. La fabricación de productos y objetos de consumo que requieren el empleo intensivo de mano de obra, han sido desplazados a países de bajos costes de producción. La actividad económica que hasta hace bien poco tiempo se consideraba básica, ha dado paso a una nueva economía de la mediación primero, y del ingenio y la circulación después.2 Las extraordinarias modificaciones operadas desde los años 70 en la estructura productiva del capitalismo, han supuesto a su vez profundas alteraciones en la idea del mercado, de la producción, de la distribución y la acumulación, y del trabajo, de su organización y su ubicación en un sistema globalizado, desde luego, pero también de su propia comprensión, lo que ha permitido hablar de una crisis generalizada del fordismo.3 Un trabajo que se vuelve inmaterial (según el término empleado por Mauricio Lazzarato4), intelectualizado y “vivo”, en la medida en que pierde su relación productiva de carácter industrial, destinada a las transformaciones de la naturaleza y de los bienes materiales; un trabajo que se vuelve actividad abstracta ligada a la subjetividad. Se trata por lo tanto de una alteración que afecta incluso a la propia comprensión del desarrollo del capitalismo, tal y como se ha concebido históricamente. El centro de la actividad ha dejado de estar vinculado a la fabricación material de los productos y ha pasado a articularse alrededor de la producción de conocimiento.5 Lo que, por otro lado, venía larvándose desde que se analizara el desarrollo de las sociedades capitalistas hacia lo que Guy Debord denominó “espectáculo integrado”, que no es sino el dominio y la extensión indiscriminada de lo espectacular en la sociedad.6 En los últimos años, esta nueva configuración ha sido identificada y analizada desde diferentes posiciones. Daniel Bell, hablaba ya a finales de los 70 de sociedad post-industrial, y llamaba la atención sobre la apertura de una transición hacia un modelo económico basado en la información, el conocimiento, la educación y el capital humano,7 que 8

1 “La nueva escena sociocultural” en: N.G. Canclini y E. Piedras Feria, Las industrias culturales y el desarrollo de México, Madrid, Siglo XXI editores, 2006. 2 Los datos más recientes de los países desarrollados parecen definitivos en este sentido: Si a mediados de los años 70, alrededor del 15% de la mano de obra se encontraba en la agricultura y más del 40% trabajaba en la industria y la manufactura, en la actualidad, de un 2 a un 3% trabajan en la agricultura, y entre un 10 y un 15% en la producción industrial. Mientras que más del 80% de la mano de obra trabaja en la actualidad en los sectores de los servicios y de la producción de conocimientos. En China, país que en el año 2000 empleaba al 73% de su mano de obra en labores de agricultura (50%) e industria (23%), lo que suponía un porcentaje en el PIB del 67%, se ha experimentado en los últimos seis años un espectacular incremento del peso económico del sector servicios que ha pasado de suponer un 33% del PIB, a un 41%. En los últimos datos disponibles del Eclac (Statistical Yearbook for Latin America and the Caribbean 2004) y la Cepal (Anuario estadístico de América Latina y el Caribe, 2004), cerca de un 80% de la población ocupada en Argentina, el 60% en Brasil y el 63% en Chile, trabajan en los servicios, y tan solo un 20%, un 21% y un 24% de los respectivos países lo hacen en la industria. En lo referente a Europa, el estudio de la Consultora Kea European Affairs, realizado a mediados del 2006 para la Dirección General de Educación y Cultura de la Comisión Europea, aporta datos bastante esclarecedores en relación a la capacidad económica directa del sector cultural, que empleaba cerca de seis millones de trabajadores y facturó 654.000 millones de euros en 2003, mientras las empresas de tecnologías de información y comunicación (TIC) facturaron en el mismo período 541.000 millones, lejos ambos de sectores como el del automóvil, que llegaba a los 271.000 millones en 2001. 3 Como se sabe, el “fordismo” proviene de las nuevas aportaciones planteadas por Henry Ford a comienzos del siglo XX en la industria del automóvil, que suponen una importantísima revisión de las formas de organización industrial de la teoría económica del taylorismo. Son una nueva manera de pensar y organizar la producción industrial en serie, y no solo de potenciar, sino también de crear nuevos mercados. 4 Mauricio Lazzarato, Trabajo inmaterial. Formas de vida y producción de subjetividad, Río de Janeiro, DP&A editora, 2001. 5 En este sentido, conviene llamar la atención, por un lado, sobre la particular aplicación del término “conocimiento” en este ámbito de la sociología o la economía política, vinculado a su uso más general, es decir, entendido como concinnitas


Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento

nos situaría ante una nueva confrontación dialéctica, asentada entonces, precisamente, en la jerarquización del conocimiento. Infocapitalismo global llamó Manuel Castells a este nuevo sistema; una economía de redes (de conexiones desiguales) con una gran capacidad de ajuste de inversión y comercio que afecta al conjunto de la sociedad globalizada, pero cuyas ventajas no son compartidas globalmente.8 Jeremy Rifkin hablaba, por su parte, del capitalismo cultural basado en una economía de la experiencia9 en la que el elemento fundamental del sistema no sería ya la propiedad de las cosas, sino su uso, su experimentación, lo que nos llevaría a una mercantilización del tiempo y de la experiencia. información, creación, imaginación... y alejado de su interpretación (“fuerte”, podríamos decir) epistemológica, vinculada a una idea de la objetividad y del saber. Y por otro, en lo referente a su preeminencia en la producción de valor, que no quiere decir exclusividad, porque como es lógico, su condición sobresaliente en la sociedad del espectáculo, no elimina el resto de formas de producción de valor, sino que las reordena o incluso las supedita a esta forma principal. 6 Guy Debord, Comentarios a la Sociedad del Espectáculo, Barcelona, Anagrama, 1998. 7 Daniel Bell, El advenimiento de la sociedad postindustrial, Madrid, Alianza editorial, 1976. 8 Manuel Castells, La era de la información. Economía, sociedad y cultura I,II,III, Madrid, Alianza, 1996, 1997, 1998. 9 Jeremy Rifkin, La era del acceso. La revolución de la nueva economía, Barcelona, Paidós, 2000. 10 Este grupo de colaboradores está formado entre otros por: Bernard Valliser, Yann Moulier Boutang, Enzo Rullani y Luca Romano, Antonella Corsani, Philippe Moatti y Mouhoud El Mouhoud.... La revista Multitudes publicada en París por la editorial Exils desde 2000, es heredera de Futur Antérieur, editada ésta por Toni Negri y Jean Marie Vincent desde 1985 hasta 1999. 11 Yann MOULIER BOUTANG, Riqueza, propiedad, libertad y renta en el capitalismo cognitivo, revista Multitudes, nº 5, mayo 2001. 12 Yann Moulier Boutang, Nouvelles frontieres de l’economie politique du capitalisme cognitif, en Textualités & nouvelles tecnologies, spécial Colloque Montreal, 2005. 13 En este sentido, Néstor García Canclini, en La globalización imaginada, Barcelona, Paidós, 1999, hablaba de la globalización como “un conjunto de procesos de homogeneización y, a la vez, de fraccionamiento articulado del mundo, que reordena las diferencias y las desigualdades sin suprimirlas”. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Y el grupo de colaboradores de la revista Multitudes10 han acuñado el término “capitalismo cognitivo” para identificar una “mutación profunda del capitalismo (... en la que) la propia naturaleza del valor, su forma, el lugar y las modalidades de su extracción son remodeladas de arriba abajo. Se trata de situar la transformación (....) en algún lugar entre un cambio de régimen de la acumulación capitalista (escuela de regulación) y un cambio de las relaciones de producción propiamente dichas; es decir, el esbozo de una transición en el interior del capitalismo”.11 Esta “transición” indica la emergencia de una economía que “engloba las tecnologías, pero también los usos y prácticas del conocimiento (...) donde el valor proviene de la producción de conocimiento y de innovación (...) un régimen de acumulación en el que el objeto de la acumulación está constituido principalmente por el conocimiento, que deviene el recurso principal del valor y que se convierte en el lugar principal del proceso de valorización (...) donde el capital se vuelve más abstracto, menos dependiente de los contratos materiales de la localización y del control”.12 Indica la emergencia de dicha economía, en la medida en que su generalización (globalización) parece confirmada, pero no garantiza su distribución equitativa, desde el momento en que tanto la producción inmaterial como los recursos que reclama residen o se distribuyen desde los países privilegiados, que son quienes disponen de una estructura económica suficientemente desarrollada para acceder masivamente a la nueva situación. Los cálculos más optimistas estiman que, en el mejor de los casos, aproximadamente un 20% de la población de las economías emergentes podrán beneficiarse del nuevo sistema económico, lo que nos anuncia un escenario social parcelado y profundamente desigual.13 Este nuevo régimen de acumulación reclama una posición económica preponderante para la imaginación, la indagación, la investigación, la innovación, los sistemas de comunicación, la educación y la información... 9


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los colectivos y los entornos inteligentes. En este sentido, se puede afirmar que tanto la economía como la producción cultural y social, se han apropiado en buena medida de la metodología y los usos estéticos, reclamando para sí un funcionamiento “inteligente”, “creativo”, “interactivo”, “participativo”... En el talante creador, en la interconexión y el cruce de conocimientos se encuentra el futuro del desarrollo económico. Por lo tanto, parece lógico que desde muy diferentes esferas se reclame los métodos y comportamientos artísticos, y la actitud indagadora, creativa y aventurada que socialmente se deduce de ellos, como el modelo ejemplar de la generación de valor en la economía que se va conformando.14 En el arte contemporáneo se reconoce un espacio de libertad creativa, de hibridación tecnológica y de dinamicidad extraordinario, en el que se manifiesta el enorme potencial de la imaginación y el impulso constante por la renovación y la originalidad. Desde luego, y al margen de la opinión que nos pueda merecer esta interpretación estereotipada de lo artístico, no hay duda, por un lado, de que la posición del entramado del arte se ha modificado en los últimos tiempos de forma considerable, y por otro, que aunque solo sea desde el punto de vista de que el arte siempre fue una forma privilegiada de intercambio cultural, los movimientos económicos referidos lo han resituado en el centro mismo de la creación de valor. Quizás sea este uno de los parámetros fundamentales a tener en cuenta en un acercamiento riguroso a la relación arte-política desde finales de los años 80: en la medida en que en la sociedad de la virtualidad y el espectáculo las relaciones económicas y sociales se apropian de las metodologías estéticas, el arte ocupa una posición central en el régimen económico del capitalismo cultural, en la producción de valor, tanto en su propia economía de intercambio virtual, como en su papel referencial del modelo que se preconiza.

Sobre algunas concordancias metodológicas Desde la perspectiva actual, podríamos establecer una cierta relación entre los tres grandes movimientos del capitalismo en el último siglo (aquellos en que, para facilitar el discurso, hemos resumido sus desplazamientos, que son el industrial, el financiero y el cultural), y el desarrollo de la comprensión de lo artístico en el mismo período. Una relación entendida en tanto descubrimiento de ciertas similitudes, incluso de algunas correspondencias, una relación de carácter básico, si se quiere, pero clarificador en la medida en que nos pueda servir para reconocer algunas afinidades entre ambos procesos. 10

14 El artículo de Vicente Verdú, El porvenir será de los artistas, en el diario El País de 06.04.2006, es en este sentido representativo de esta ejemplificación en el arte, del actor productivo demandado por la economía del conocimiento. En él se identifica al arte contemporáneo con la conexión de los tres factores clave del crecimiento – Tecnología, Talento y Tolerancia, según la enunciación de Richard Florida – con el “talante creador”, con la “conexión y conectividad social” y la consecución de “síntesis insólitas”, lo que lleva el autor a afirmar que “solo los artistas encontrarán garantizado el porvenir”. concinnitas


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En este sentido, reconocemos una cierta correspondencia entre el capitalismo industrial, la economía financiera y la del conocimiento, por un lado, y el arte de las vanguardias, el arte conceptual y el arte actual, por otro. Como se sabe, en buena parte de las obras de estos períodos, es fácilmente reconocible una iconicidad específica, incluso, que manifiesta esta relación con lo industrial, especulativo, o cultural, según los contextos en cada caso. Pero no es este aspecto el que parece relevante ahora, sino más bien la sincronía que se manifiesta en su articulación, en su configuración, en su expresión. Porque, si lo que caracteriza el capitalismo industrial es la acumulación del capital físico adherido al producto, lo que caracteriza el arte de las vanguardias es su condición gestáltica y estructural adherida al objeto. Si lo que caracteriza al capitalismo financiero es la acumulación de capital inmaterial producido por el intercambio especulativo, lo que caracteriza al arte conceptual es su condición lingüística y crítica producida por la interacción en un contexto. Si lo que caracteriza el capitalismo cultural o cognitivo es la acumulación de capital informatizado vehiculado por la producción de conocimiento e innovación, lo que caracteriza el arte actual es su virtualización y su inclusión en el núcleo vertebrador del sistema cognitivo. En la primera mitad del siglo XX, la relación modernidad/objetualidad del arte poseía una interconexión, una trabazón, extraordinarias: el arte es objeto de objetos, collage de collages, rueda dentada engarzada a otra rueda dentada. No es extraño que, mediado el siglo, la gran eclosión del objeto artístico descanse en dos latas de cerveza (Jasper Johns, Painted Bronze [ale cans], 1960) y unas cajas de detergente (Andy Warhol, Brilllo Boxes, 1964). Una saturación que adquiere toda su intensidad en la conjunción objeto/deseo inaugurada por el fordismo, en la que el capitalismo hacía notar su verdadera capacidad seductora. Tampoco puede extrañar, desde esta perspectiva, el que los inicios del llamado arte conceptual instaran a la desaparición objetual primero (bien es verdad que como estrategia provisional, según algunos de sus más conocidos impulsores) y a la liberación del arte de su condición de “obra” después, haciendo hincapié en su posibilidad de constituirse en dispositivo, ámbito de activación o espacio de intercambio. Si la modernidad de las vanguardias hablaba de producción artística, en correspondencia obvia con la economía productiva y de acumulación (y mientras, por otro lado, se iba desechando la idea de “creación” artística, en cualquiera de sus acepciones), la posmodernidad irá construyendo una práctica del arte vehículada por elementos de conformación, adecuación, activación o, finalmente, instalación. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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Es precisamente esta concepción del arte como instalación – entendido en su acepción más general, es decir, como coordinación de elementos puestos a disposición de ser activados por un espectador – lo que conduce a las prácticas artísticas recientes (postconceptuales, culturales, resistentes, virtuales, etc...). El artista cultural plantea procesos, metodologías, procedimientos, dispositivos... de carácter virtual o inobjetual (no por carecer de objeto, sino porque éste se deriva como resto del hacer artístico). En este desvanecimiento del objeto arte, y en su reconversión en objeto de conocimiento o en estructura de sustentación de pensamiento, reconocemos ahora una curiosa concordancia con los procesos de virtualización del valor en la estructura económica, incluso descubrimos una coherencia insospechada en cada uno de sus desplazamientos productivos.15 El lugar de trabajo del artista moderno era el taller. Como su propio nombre indica, se trata de una ubicación del espacio de cada uno en el más general, en el de la conexión con la vida, en el de la factoría del arte (explicitado finalmente por Warhol). El proceso productivo del objeto arte se desarrolla en este espacio, estructurado como ámbito específico de experimentación de lo abstracto, como modelo anticipatorio; el nuevo taller como espacio ejemplar de la utopía social, como prefiguración del devenir. El sistema productivo tiene sus leyes espaciales y sus conductos económicos. El espacio de exposición del arte moderno bascula entre tres lugares privilegiados del intercambio simbólico; la galería, frigorífico en el que se previene la descomposición de los objetos estéticos, que no es sino el comercio especializado de lo artístico; la revista de arte, entendida como soporte publicitario y espacio de intercambio, es decir, como catálogo de venta a domicilio; y el denostado pero universal y profusamente empleado museo, que no es sino el banco de depósito de los objetos sensibles revalorizables. El lugar de trabajo del artista conceptual es sin embargo el estudio, el archivo o el laboratorio. Allí se piensa, se proyecta y se administran los elementos que conforman la instalación. El lugar de su muestra, que es donde aparece como obra, donde toma cuerpo, se hace visible y, en su caso, visitable, son las bienales y las ferias de arte; su correspondencia socio-económica está en la bolsa, lugar de intercambio de capital especulativo, donde el valor se hace visible como acción, poder o participación (que no son sino los documentos que reclaman la existencia de un capital representado). De forma similar a como el arte se presenta en (y como) idea, proyecto o documentación que se 12

15 Concordancia o coherencia, que no significa necesariamente anticipación o prefiguración del arte en relación a lo que se ha venido en llamar “movimiento global de lo humano”, lo que sería objeto de otro tipo de reflexión, alejada de este texto. concinnitas


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intercambia y actúa “en nombre” de la obra que pre/supone. En ambos casos, es su propio movimiento, producido por los intercambios entre especialistas, quien puede generar nuevo valor. Por su parte, el lugar del artista cultural está en la conexión, en los espacios de cruce e intercambio. Se trata de lugares sin ubicación singular, espacios apropiados para su reasignación significativa, que están aquí y allá, en la calle, en los colectivos sociales, el espacio informativo e informatizado, los ámbitos culturales, los media, las vías y enlaces, los flujos y migraciones, las articulaciones, los tejidos... Sus propuestas, sus interferencias, sus acciones, sus impugnaciones, se muestran en cualquier medio de interconexión (en la vía pública, en los soportes publicitarios, en la web,16 los mensajes de móvil, los books, las fotocopias, los fancines...). Sus metáforas remiten a los nuevos espacios de la virtualidad informática (la era de la informatización planetaria, según la expresión de Felix Guattari), hacen referencia a la instalación, el acceso o portal, al tono y a la circulación, a la red, el servidor, la dirección.... el archivo, la carpeta, el programa... en su engarce, en su articulación se encuentran los flujos de ideas que pueden dar lugar a espaciamientos, a aperturas, a nuevos acontecimientos con sentido.

Sobre la comprensión de lo político Lo político, en términos generales y entendido como aquello que concierne a la polis y a los asuntos de la relación que se dan en ella, es la condición ineludible de todo lo perteneciente a lo común en el espacio de lo social. De esta acepción general surge la consideración de lo político como manifestación de la condición grupal de lo humano, que requiere la necesidad de encontrar fundamentos, valores, razones o voluntades, que permitan un espacio común; lo que en la antigua Grecia se denominaba politeia. Y por otro, la técnica que se ocupa de los resultados, del conjunto de convenciones, de imposiciones o de acuerdos necesarios para la aplicación de dichas propuestas en base a una cierta acción contractual entre los ciudadanos, lo que se llamaba la politiké. Como se sabe, en la modernidad vanguardista el arte se relacionaba con lo político, no solo por su pertenencia a la polis, sino por su consideración como motor de lo social, como actividad central en la posibilidad misma de una política capaz de acabar con las formas de 16 Como se sabe, la web es una colección de documentos localizables a través de Internet que se puso en funcionamiento en 1990, un año después de la caída del muro de Berlín y cuatro del Big Ban de Londres. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

dominación, de un sueño de progreso en el que las prácticas impositivas se verían arrastradas al desván de la historia, como lugar de experimentación, entonces, de modelos sociales liberadores, como anticipación de la posibilidad de dicha sociedad, como ámbito de pruebas 13


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en el que lo poético, lo imaginario y lo simbólico concebían y daban cuerpo a la posibilidad misma de una política emancipatoria. El arte hacía pensable esta posibilidad e incluso le daba forma, le ponía figura, le facilitaba una imagen. El arte moderno poseía una conceptualización política, pero ésta solo era entendible en función de la asignación de una cierta tarea en relación al objetivo común de lo político, que no era otro que el de facilitar y acelerar el advenimiento de una sociedad mejor. Pero esta misma tarea, que se traducía en actividad funcional de diverso signo, mostraba precisamente la exterioridad del arte en relación al núcleo central de lo político: el arte participaba en lo político, acompañaba la exigencia histórica de un cambio social, anunciaba una nueva sociedad, pero siempre al servicio del “verdadero” agente transformador: el proletariado, la clase obrera, los trabajadores, los ciudadanos... (según el referente de cada proposición). El papel de la cultura – los intelectuales, en la terminología política de la época, y a los que se consideraba “tejido vivo de la sociedad”– se entendía hasta finales de los años 60 como determinante contribución al nuevo orden social, pero siempre bajo la consideración de forma supeditada al verdadero agente transformador, la clase que al fin y al cabo estaba destinada a constituirse en fuerza hegemónica en dicho orden social. Las manifestaciones y habilidades culturales de los individuos se consideraban escindidas de su actividad productiva y por lo tanto se encontraban supeditadas a la división del trabajo. No es hasta los años 70, cuando las que por entonces habían pasado a ser denominadas fuerzas de la cultura, comienzan a aparecer como agentes de la transformación social, en compañía (en alianza) pero aún no en igualdad de condiciones con las llamadas ahora fuerzas del trabajo. Este movimiento abre un nuevo período caracterizado por la participación de la cultura en la nueva asignación política de responsabilidades cuyo fin es la consecución de una nueva sociedad, pero a su vez, no es sino la constatación de los profundos cambios acaecidos en el propio sistema, o lo que es lo mismo, la reconsideración de una estrategia en la que el llamado sujeto de la revolución, tal como había sido descrito, y las propias relaciones de producción se encontraban en un evidente proceso de cambio, especialmente en lo referente a la división tradicional entre el trabajo físico e intelectual, y su capacidad generativa de valor. Desde la perspectiva actual, el confuso período de confrontaciones políticas, incorporaciones tecnológicas, reconsideraciones científicas y alteraciones sociales, que se producen entre la segunda mitad de los 60 y finales de los 80, no parecen sino la compleja transición de ambos 14

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Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento

modos de acumulación, el camino hacia lo que se ha venido en llamar post-fordismo. En este sentido, los contradictorios comportamientos artísticos de este período, en un ámbito en el que conviven las manifestaciones postconceptuales, las proyecciones lingüísticas, los desarrollos de prácticas críticas y de resistencia, y las vinculaciones con las políticas identitarias o el activismo social no serían sino los primeros ensayos de la nueva comprensión de lo cultural y lo estético en lo político que se hace evidente, precisamente, desde finales de los 80. Desde este punto de vista, el posterior período de “desvanecimiento de lo político” y el espacio de desconcierto que se abre a partir de las sucesivas crisis y reconsideraciones en la relación arte/política, no serían sino la manifestación de una alteración fundamental en las condiciones éticas, sociales, relacionales, productivas..., de la propia comprensión de lo político, y la nueva ubicación (quizás condición) de lo artístico que se deriva de estos movimientos y de la centralidad de la cultura en la nueva comprensión del valor. El famoso estado desvaneciente de lo político en los últimos años del pasado siglo debe ser entendido entonces más bien como el desvanecimiento de una idea de lo político, de una comprensión de su posibilidad. En la modernidad la política se entendía como ejercicio de poder y, por lo tanto, se ejercía mediante la acumulación de fuerzas de diverso signo. Esta acumulación era posible en la medida en que la opción política se subjetivara mediante un proceso al que se denominaba “toma de conciencia”. El papel asignado a los intelectuales, escritores, científicos, artistas... era precisamente la colaboración en esta toma de conciencia. En la sociedad del conocimiento, la idea de lo político y la política han sufrido una importante reconsideración. Su relación con lo que llamamos arte, también. Desde luego que persisten las formas institucionales y partidarias, o las opciones ideológicas que mantienen una determinada comprensión cotidiana de la actividad pública, y también las opciones o implicaciones de los artistas en los asuntos de todos, aunque con un carácter bastante diferente, pero a su vez aparecen 17 Que parte del concepto de partición de lo sensible, que es aquello que caracteriza el serjuntos propio de lo humano, porque “antes de ser un conflicto de clases o de partidos, la política es un conflicto sobre la configuración del mundo sensible”: Jacques Rancière, Aux bord du politique, París, Gallimard, 2004. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

nuevas implicaciones de lo artístico y lo común en una interrelación que se presenta extremadamente compleja. Jacques Rancière ha reconsiderado recientemente la idea moderna de la política, tratando de recuperar su condición de “asunto de sujetos, o más bien de modos de subjetivación”.17 En este sentido señala que dentro de lo que entendemos por política se encuentran, por un lado, el 15


Josu Larrañaga Altuna

conjunto de “procesos mediante los cuales se efectúan los arreglos y los consentimientos de las colectividades, la organización de los poderes, la distribución de los lugares y funciones y los sistemas de legitimación de esta distribución” a los que propone llamar ahora lo policial para distinguirlos de la política como “modalidad específica de la acción”, es decir, como “ruptura específica en la lógica del arkhé (del principio unificador de las cosas), dado que no presupone simplemente la ruptura de la distribución «normal» de las posiciones entre quien ejercita el poder y quien lo sufre, sino también una ruptura en la idea de las disposiciones que hacen a las personas «adecuadas» a estas posiciones”.18 Esta nueva comprensión de la política, se encuentra inmediatamente con la estética, en la medida en que entendamos ésta como “un sistema de formas a priori que determinan lo que se da en la sensación”,19 y por lo tanto como aquello que permite el funcionamiento de lo político. Y teniendo en cuenta que la estética no es sino ese lugar en el que “se construye una idea específica del pensamiento” que identificamos como “arte”, parece evidente que, por un lado, el arte encuentra y manifiesta su sentido estético, precisamente, en esta reubicación central en lo comunitario, en sus formas de interrogación, y por otro que en la sociedad del conocimiento, el arte, como elemento integrante y privilegiado de lo cultural y de lo estético, como agente productor de información, de contenidos, de sensibilidades, de conocimientos, se encuentra ahora en el centro de lo político. No se trata solo de que se encuentre afectado por lo político o implicado en esta o aquella opción de lo político, sino más bien que lo activa, que lo habita, que ocupa un lugar privilegiado en el trabajo de conferir vitalidad a su propia existencia, que como arte no puede ser otra cosa que político. El arte está en lo político, se encuentra en el centro de su actividad y le provee de pautas y modos de hacer. El arte participa y alimenta lo político, en una u otra dirección. No hay “arte” y “arte político” porque no hay un afuera de lo político en relación al arte, o una distancia del arte en relación a lo político. Mirar lo político desde el arte, no es, en este sentido, sino tomar una posición. La cuestión sería, entonces, identificar de qué manera se entiende esta pertenencia, cuáles son sus condiciones relacionales, la modalidad o singularidad con que el arte trabaja en la actualidad en lo político (y viceversa). Lo que corresponde preguntar al arte es en qué medida es consciente de esta participación, de qué manera participa en el disenso propio de lo político, qué estrategia de ruptura desarrolla, y qué suplemento plantea a la situación actual, es decir, que sentido indica o aporta a nuestra situación en el mundo. Si el valor del arte en la economía de la cultura está sujeto a su 16

18 “la política es específicamente antagónica de lo policial (...) lo policial es una distribución de lo visible cuyo principio es la ausencia del vacío y el suplemento”: Jacques Rancière, La Mésentente, París, Galilèe, 1995. 19 Jacques Rancière, Le partage du sensible. Esthétique et politique, París, La Fabrique, 2000. El texto dice “ce qui se donne à ressentir”, lo que puede traducirse como “lo que se da en la sensación”, o también “lo que se da en la experimentación, o en la afirmación o confirmación de la sensación”. concinnitas


Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento

participación en el engranaje de intercambios y transmisiones de inteligencia, información y conocimiento, el valor del arte en el ámbito de lo político entendido este como consciencia, disenso, ruptura y suplemento, no es otra cosa que su sentido, y que el sentido de su sentido. Si todavía podemos hablar de arte, en un ámbito cultural en el que “la producción y la reproducción de las relaciones sociales se apropian del método de las prácticas estéticas”, como expresa con claridad Lazzarato, es porque aún es instrumento imprescindible para la interrupción del orden simbólico, es decir, para su propia emergencia,20 y como desarrolla Jean-Luc Nancy “el fragmento, o el arte, es lo simbólico mismo en el lugar y en el instante de su interrupción. Es el secretoplacer y/o dolor que interrumpe la simbolización de lo simbólico, y que libera así ese plus-de-sentido, ese infinitamente-plus-de-sentido a través del cual la existencia se refiere y se expone a ella misma”.21

Sobre la condición política de lo artístico Si afirmamos que el arte es político, no lo hacemos por lo tanto por su compromiso con una u otra propuesta, es decir, por su supeditación a una determinada opción política (su empleo como forma de estetización de lo político), ni por el compromiso ético que el artista pueda asumir 20 “De manera paradojal, es cuando el orden simbólico queda interrumpido que entonces también toca a su propia esencia. El symbolon es quebradura tanto como reunión: es quiebrepara-la-reunión, tiene su verdad en su serdividido. Nunca hay un solo symbolon. Como el síngulus, no existe más que en plural – y los singuli siempre son otros tantos symbola (....) El fragmento simbólico afirma que su fractura todavía se encuentra ella misma en otra parte, de otro modo”: Jean-Luc Nancy, El sentido del mundo, Buenos Aires, la marca editora, 2003, pp.198. 21 “...Fragmento: el placer y el dolor en los cuales el ser goza y padece de existir. Así el arte es fragmento: no es la presentación del ser, y por ello no se refiere a la verdad en el sentido en el que la filosofía lo hubiese querido (....) Este gozar-y-padecer es venida en presencia, presentación sin presentidad: de esto no hay verdad de – a propósito de – el ser. Mas bien la presentación es ella misma verdad. Pero no verdad a propósito de: es verdad que es, o existencia en acto. Si el arte es presentación de la presentación y no del ser, es en este sentido que tiene relación con la verdad: en cuanto su sentido en acto. En cuanto la verdad toca y no puede más que tocar.” Ibídem, pp.200- 201. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

como sujeto incluido en una determinada colectividad (implicación en una forma de administración de lo común), o por la manera en que su comprensión de las formas culturales en la sociedad actual puedan afectar a su práctica profesional (politización de lo artístico), sino más bien por su implicación política como disenso, por un lado, y por su papel en la posible apertura de sentido, por otro. Tanto si nos referimos al plano macropolítico de las estrategias públicas, las propuestas sociales y estructurales, o los ámbitos institucionales, como en aquello que desde Foucault, Deleuze y Guattari ha venido en llamarse lo micropolítico, es decir, el espacio de las subjetividades, los territorios existenciales, las sensibilidades y los deseos. En el primer caso, el arte adopta una posición pública, un compromiso social y una implicación ideológica, que hacen obvia su pertenencia a lo político entendido como impugnación directa de las condiciones de interrelación, de conversación, de identidad o de habitabilidad... que constituyen el entramado político dominante. En el segundo, el arte trabaja en los mecanismos que ordenan y alimentan el interior de la vida social. Como se sabe, una de las características principales del llamado capitalismo del conocimiento es el papel relevante asignado a los 17


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mecanismos de seducción como medio de identificación subjetiva con el sistema, en lo que Suely Rolnik ha llamado la geopolítica del chuleo.22 Este mecanismo de apropiación de las energías creadoras, existenciales y afectivas, y de las formas de relación con los otros, ha reactualizado primero e incorporado después a la reflexión artística, el concepto de biopolítica (acompañado por los de biopoder y biocapitalismo) tanto porque facilitan la reconsideración de la distinción entre individuo viviente y sujeto político, como porque identifican la transformación de los sistemas disciplinarios y de control en la nueva sociedad del conocimiento. Un concepto recuperado para la reflexión contemporánea por Michel Foucault en El nacimiento de la medicina social, (conferencia impartida en la Universidad de Río de Janeiro en 1974) 23 y que se ha mostrado especialmente activo posteriormente para pensar lo político como sistema de gobierno de la voluntad y el comportamiento de las personas en nuestra sociedad global.24 Los asuntos relacionados con los afectos, deseos, identidades, necesidades... con lo más cercano, lo cotidiano, lo banal... entendidos abiertamente como asuntos políticos, pueblan el arte de los últimos 20 años. A estas alturas parece evidente que el arte encuentra en estos ámbitos de lo cercano y pequeño un enorme espacio de actuación y proposición. La política, como el arte, se ocupa de esta configuración de lo sensible, y lo hace de acuerdo a estrategias estéticas. No es extraño, por lo tanto, que las prácticas artísticas y políticas confluyan, en ocasiones hasta hacerlas indiscernibles, especialmente cuando el objeto sensible que motivan, el objeto de su hacer artístico, tiene que ver con la incidencia en lo cotidiano. Por otra parte, las nuevas tecnologías de la globalidad han permitido, desde luego, la apertura de espacios de enunciación y circulación conceptual e imaginaria, pero a su vez, han abierto nuevos ámbitos y nuevas experiencias de lo afectivo y lo sensible, espacios que el arte ha incorporado a su específica producción de pensamiento y posibilidad, de nuevo desde la convicción de actuar en lo político. Porque no parece que ninguna de estas prácticas artísticas de los últimos años haya ignorado su condición política, y (también) su situación paradójica, en la medida en que la metodología de lo artístico habita y alimenta el cuerpo central de la economía del conocimiento, y sin embargo lo propiamente artístico es aquello que se ausenta constantemente de su usurpación para el espectáculo, el simulacro y la banalización, que no son sino las coordenadas en las que se activa el propio funcionamiento del sistema, o si se quiere, los elementos característicos de lo policial 18

22 “En el caso específico del neoliberalismo, la estrategia de subjetivación, de relación con el otro y de creación cultural adquiere una importancia esencial (...) política de deseo propia de la rufianización (del chuleo) de las fuerzas subjetivas y de creación – un tipo de relación de poder que se da básicamente por medio del hechizo de la seducción”: Suely Rolnik, “Geopolítica del chuleo” en, Las imágenes del arte, todavía, Cuenca, Dip. Provincial, 2006. 23 Michel Foucault, El nacimiento de la clínica, Madrid, Siglo XXI editores, 2003. 24 Roberto Esposito, Bios, biopolítica e filosofía, Torino, Einaudi, 2004. concinnitas


Acerca de la condición política de lo artístico en la sociedad del conocimiento

Grupo de Arte callejero (Buenos Aires). Cartografía del control, collage presentado en la Bienal de Venecia de 2003

en la sociedad actual. En esta tensión podemos encontrar, seguramente, algunos de los rasgos más característicos y de mayor interés de la comprensión de lo artístico hoy. Como paradójica es, también, la manera en que esta condición central de lo cultural en el sistema, y por lo tanto de las actuaciones artísticas, se manifiesta en los diversos niveles económicos y territoriales de la sociedad globalizada. Y naturalmente la especial dimensión que adquiere el capitalismo cultural en los países en los que coincide la eclosión de las nuevas formas económicas con la salida de los regímenes dictatoriales en los que se desarrollaban las anteriores, y la especificidad de las prácticas artísticas en este contexto. Así que tratar de la relación arte-política en los últimos 20 años, en el marco de lo que se ha venido en llamar la sociedad del conocimiento, y en países que sufrieron y se liberaron de una prolongada y dramática experiencia de autoritarismo y represión, como pueden ser Argentina, Brasil, Chile o España (cada uno con su especificidad y su ubicación en el sistema globalizado), no sería sino hablar de arte; de las tensiones, implicaciones e interrelaciones que las diversas prácticas artísticas han ido construyendo como entramado de consciencia, disenso, ruptura y suplemento.

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José Miguel G. Cortés

Fotografía de Carmela García, Sin título, 2001

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Identidad, género y espacio urbano

Identidad, género y espacio urbano José Miguel G. Cortés* En este texto se habla de las complejas relaciones entre edificios y cuerpos, estructuras y géneros, entornos y relaciones que han caracterizado algunos de los intentos por desestabilizar las convenciones de la arquitectura más tradicional. Es una aportación a las polémicas y discusiones que ha surgido en estas últimas décadas y que tratan de poner en duda el sentido hegemónico del espacio urbano y la configuración de las ciudades, entendidas estas como un cúmulo de usos, percepciones, sistemas simbólicos y de representación, cuya relevancia se modifica en relación con el tiempo, la cultura, los grupos sociales, las relaciones sexuales o los comportamientos de género. Ciudad, sexualidad, control social

Las concepciones arquitectónicas y urbanísticas más tradicionales han confiado en el levantamiento de un sistema inmunológico que consiste en basar todas sus opciones en pretendidos planteamientos profesionales de carácter técnico (de contenido geométrico o espacial), con tal de evitar abordar el problema de la diferencia, sea ésta de tipo social, sexual o de género, y que ella “contamine” su práctica y su teoría. Sin embargo, generalmente, otros puntos de vista más contemporáneos y más comprometidos con el entorno socio-cultural entienden la ciudad como un territorio, un lugar ocupado por los sectores mayoritarios y un lugar de tránsito para las minorías. Así, lo que en un principio se presenta como decisiones puramente económicas o pragmáticas, revelan conceptos bastante tradicionales acerca de la naturaleza de los seres humanos y de las relaciones sociales. De este modo, a la ciudad planificada por determinados arquitectos y urbanistas vinculados al poder, se les opone la ciudad practicada por aquellos y aquellas que la usan día a día y la * José Miguel G. Cortés es profesor de Teoría del Arte de la Facultad de Bellas Artes de Valencia. Ha sido director del Espai d´art Contemporani de Castelló. Ha escrito libros como: Políticas del espacio. Arquitectura, Género y Control Social, 2006; Hombres de Mármol. Códigos de representación y estrategias de poder de la masculinidad, 2004; Orden y Caos. Una historia cultural sobre lo monstruoso en el Arte, 1997; El Rostro Velado. Travestismo e identidad en el arte, 1997; El Cuerpo Mutilado o la angustia de muerte en el arte, 1996. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

dotan de contenido con sus actos cotidianos, ya que cada grupo social necesita encontrar espacios y lugares, signos y señales con los que poder identificarse y reforzar su identidad. La existencia y el reconocimiento de cada minoría de las que componen la ciudad no se contraponen a la integración global en la misma, sino que la facilitan al contribuir a la cohesión interna de los colectivos sociales y a su visibilidad en el magma urbano. No hay que olvidar que la ciudad (tal y como explico en mi último libro Políticas del Espacio. Arquitectura, género y control social), con su 21


José Miguel G. Cortés

particular disposición geográfica, proporciona el orden y la organización de la convivencia; es el medio por el cual la corporeidad es social, sexual y discursivamente producida. El espacio se limita, se jerarquiza, se valora, se cambia, y las formas que se utilicen para ello afectan a la manera en que se experimenta el medio urbano y a cómo el sujeto ve a los “otros”. El espacio no es un mero escenario en el que de vez en cuando ocurren cosas, sino el resultado conjunto de la acción y del discurso de los diferentes sectores sociales. El espacio, por ello, no es algo inerte, sino un lugar significativo en la construcción de la identidad. Tanto las personas como los espacios tienen un género, y las relaciones sociales y las espaciales se generan mutuamente. La forma y la estructura de la ciudad orientan y ayudan a organizar las relaciones familiares, sexuales y sociales, co-producen el contexto en el cual las reglas y las expectativas sociales se interiorizan en hábitos para asegurar la conformidad social. La ciudad es un conjunto de identidades que se suman, se confrontan o viven de forma más o menos aislada unas de otras. En cambio, la cultura arquitectónica tradicional ha mantenido reprimida la sexualidad del espacio, ha conservado el espacio esterilizado como una economía técnica bajo el control del mito de la arquitectura proyectista. Por esta razón, una de las tareas pendientes en la ciudad contemporánea es la reinvención del erotismo en sus calles y relaciones, convertirla en un lugar de transparencia y sentido, pero también de misterio y trasgresión. De este modo, podemos entender el cuerpo como un elemento fundamental de la arquitectura y la memoria del lugar. El cuerpo es algo más que aquello que se observa externamente, es el espejo y la forma que adquieren muchas de las aspiraciones personales, es la parte visible del deseo de perfección humana. Es considerado el símbolo personal y social de la identidad, la cual es una estrategia que usamos para dar sentido o negarnos a nosotros mismos, un elemento básico mediante el cual es construido. Por tanto, el cuerpo no es simplemente, o tan sólo, un organismo, sino también un vehículo metafórico lleno de significados. Así, existe una estrecha ligazón entre el cuerpo físico y el social, una relación que únicamente puede ser entendida en el contexto de la construcción social de la realidad. En este sentido, el cuerpo debe ser visto como el primer lugar de la experiencia social, el lugar donde la vida social se convierte en una experiencia vivida. Para entender el cuerpo necesitamos saber quién lo controla, cómo se mueve a través de los espacios y el tiempo de la vida diaria, quién conoce sus placeres, sus sensualidades, sus comportamientos en la esfera pública y privada… 22

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Identidad, género y espacio urbano

La representación del cuerpo (una particular y reconocible forma) significa una especie de código que debe ser leído o entendido como un intento de responder a la búsqueda de identidad. La necesidad de conformar el cuerpo a los valores que prevalecen en cada sistema social es un fenómeno universal que genera una gran ansiedad, y ninguna sociedad, desde la más arcaica a la más sofisticada, está exenta de un código de representación social de este cuerpo. La manipulación, conformación y decoración del cuerpo se refiere básicamente a la percepción, por parte de los otros, de nuestra persona como un ser con un lugar reconocible en el sistema cultural. En este sentido, hay que ser muy consciente de que uno de los signos más claros de la identidad personal es el cuerpo humano y, por tanto, debe ser entendido como una metáfora fundamental en el contexto de la construcción social de la realidad en el cual esa identidad es analizada. Más allá de un mero organismo físico y/o material, el cuerpo necesita ser comprendido como una especie de código para situarnos en el mundo y entender quiénes somos. De hecho, en la sociedad occidental la configuración de nuestro propio cuerpo influye de forma harto evidente en nuestra existencia social y cultural. Así, en una época basada en la juventud, la salud, y la belleza física, el cuerpo se presenta como un símbolo que llega a generar una gran ansiedad emocional. En un mundo donde la apariencia y la “imagen” han llegado a convertirse en los valores supremos, el cuerpo no sólo trasmite mensajes a la sociedad en la que vivimos, sino que se convierte él mismo en el contenido de los mensajes y refleja hasta qué punto se han asimilado las normas reconocidas socialmente. Por tanto, el cuerpo funciona como un signo económico, espacial y cultural, es un vehículo que ayuda a fijar el vocabulario de los roles de los géneros. El cuerpo no es sólo creado social y culturalmente, sino también psíquicamente; en este sentido, más que un punto de partida, o una fuente de reconocimiento, la imagen del cuerpo es el efecto, el resultado, la construcción que se produce a través de la subjetivización de las estructuras que preceden nuestra entrada en el mundo. Así, el ideal para el cuerpo del hombre, incluso en su ausencia, ha sido siempre la acción (demostrada o implícita), y por esta razón uno de los mayores miedos masculinos es el de la pasividad y lo que ello conlleva en cuanto a la pérdida de privilegios y el devenir como una mujer. La fantasía metonímica requiere un ideal de acción por el cual el hombre debe constantemente medir su sexualidad o estar en peligro de perderla. El ideal activo protege al hombre de deslizarse dentro del rol social subordinado reservado para la mujer. Existe la idea básica de que si el hombre no domina y controla la situación, ésta puede controlarle hasta ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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hacerle perder su masculinidad y caer en posturas femeninas. Por eso la representación del cuerpo del hombre no es una imagen como otra cualquiera, sino que posee un estatus especial que conecta con los conceptos de poder y moralidad social y que la convierte en una especie de medida de las costumbres culturales de un momento histórico (el sentido de identidad es ampliamente dependiente de la habilidad para representarse a sí mismo en el mundo). La figura del cuerpo masculino está siempre mediatizada por las representaciones de las imágenes corporales construidas ideológicamente, las cuales tienen el poder de modelar los ideales sociales (nuestra mirada está absolutamente condicionada por un sistema patriarcal en el que el hombre ostenta el papel de creador, propietario y espectador). No existe el cuerpo natural y sin condicionamientos, sino más bien un código representacional dotado de significados específicos en cada época y emplazamiento. El cuerpo es el lugar donde se localiza al individuo, aquello que establece una frontera entre el yo y el otro, tanto en el sentido personal como en el físico, algo fundamental para la construcción del espacio social. Pero sabemos que el espacio no es algo dotado de propiedades meramente formales, que no es algo preexistente ni vacío de significado. Es el cuerpo (pero no un cuerpo genérico, sino uno definido y concreto), con sus capacidades de acción y sus energías, el que crea y produce el espacio, al tiempo que es producido por él en un marco histórico y temporal específico que en cada momento establece las pautas de comportamiento, pues no deberíamos olvidar que, como escribe Linda McDowell, los espacios surgen de las relaciones de poder, las relaciones de poder establecen las normas; y las normas definen los límites, que son tanto sociales como espaciales, porque determinan quién pertenece a un lugar y quién queda excluido. Por esa razón, la configuración de la ciudad revela, a todo aquel que esté atento, que el espacio (tal como explica Henri Lefebvre) se califica, en función del cuerpo, mediante un conjunto de pistas, trazos y huellas que hablan de acontecimientos políticos, sociales y culturales que ayudan a conformarlo. De este modo, en su estructura arquitectónica se refleja el pasado y cristalizan las proyecciones de la sociedad. Es por ello por lo que numerosos arquitectos y artistas, que se interesan por la ciudad y se interrogan por conocer cómo la arquitectura ocupa y define el espacio social, están interesados en plantear visiones que tratan de desterrar los lenguajes universalistas. Lenguajes y códigos que, bajo una pretendida neutralidad técnica y descriptiva, contribuyen a la perpetuación de las discriminaciones y se convierten en la expresión de una geometría autoritaria que sustenta el pensamiento hegemónico, reproduce la subordinación de lo femenino, 24

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agudiza las diferencias sociales y niega la existencia espacial de las minorías. Tal y como explica, el crítico y arquitecto, Aaron Betsky, en una cultura dominada por la masculinidad la imaginería del cuerpo masculino está en cualquier lugar, desde la construcción fálica de los rascacielos a las construcciones ‘musculares’ de nuestros edificios cívicos. Los roles del hombre y su poder se hacen reales a través de la arquitectura. Especialmente cuando el hombre masculino controla y vigila el espacio urbano, hace pasar sus intereses por los intereses globales de la sociedad y, para ello, no tiene problema en presentarlo como un espacio descorporeizado, indeterminado, como si no poseyera ningún carácter específico, es decir, neutral. Pero, eso sí, a todos los sectores que no participan de su manera de entender la sexualidad o los géneros se les niega el derecho a ser vistos, identificados, representados, se les quiere hacer invisibles y silenciosos. Y, a menudo, lo consigue. De todos modos, es cierto que entre la arquitectura y los géneros se establece una difícil y compleja interdependencia, ya que ambos son producciones culturales y como tal son consecuencia de una época histórica determinada y, por tanto, susceptibles de modificación. En el mundo occidental la subordinación cultural de lo femenino por parte de la masculinidad hegemónica se define, en el caso específico de la construcción del espacio social, más por todo aquello que se niega que por aquello que se dice. Y, sin embargo, el espacio urbano establece – en su distribución, utilización, transferencia y simbolización – jerarquías y prioridades que favorecen determinados valores y anulan otros. Así, mientras el trabajo y las actividades masculinas (y sus necesidades y prioridades) son los que organizan mayoritariamente la casa y la ciudad, ambos se adaptan a los movimientos, tiempos y deseos de la masculinidad; del mismo modo que se omiten las experiencias diferentes o disidentes a la misma. De esta forma, el hombre masculino se apropia, controla y vigila el entorno urbano y consigue dos aspectos fundamentales: el primero trata de dotar al espacio de características pretendidamente femeninas, tales como la pasividad, la inercia o el mutismo, con el fin de presentarlo como algo neutro; el segundo, hacer invisibles, encerrar otras posibilidades sexuales y de género con el propósito de descorporeizar y desexualizar el terreno de la ciudad. De esta manera, parece que sólo existe un cuerpo, una sexualidad y un género, el mayoritario que se quiere hacer pasar como el único, con lo cual la ideología masculina dominante es reproducida constantemente en el espacio. Con estos objetivos, el diseño arquitectónico (a través del establecimiento de códigos ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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y convenciones) crea el espacio donde la subjetividad humana es erigida y activada; la organización espacial ayuda a construir una representación de las relaciones de género que presentan los privilegios y la autoridad de la masculinidad como algo natural; es decir, no es que el espacio contenga las identidades de género, sino que éste es un elemento constitutivo de las mismas. Por esa razón creo que es importante comprender la construcción de los géneros en relación a la conformación del espacio. Así, y al igual que el cuerpo es el primer lugar del individuo, entiendo que la comprensión de los diversos géneros debe ser inscrito en una compleja y discursiva categoría que no puede ser analizada independientemente de otros diversos componentes de eso que se puede llegar a entender como identidad. Los individuos no nacen como seres humanos totalmente acabados. Lo que llegan a ser es el resultado (siempre provisional) de un proceso continuo de absorción de estructuras culturales y espaciales a partir de la base de una serie de impulsos y potencialidades, sujetos a deseos y pulsiones conflictivas. En consecuencia, las personas no son un producto definido por imperativos biológicos, ni tampoco el resultado simple de las relaciones sociales. Existe un ámbito psíquico, con sus propias normas e historia, en el que las posibilidades biológicas del organismo adquieren su significado. Por ello, lo que denominamos identidad es un logro siempre precario que se ve constantemente socavado por los deseos reprimidos que constituyen el inconsciente. La complejidad de la construcción de la masculinidad y la feminidad queda evidenciada cuando nos damos cuenta de la multitud de factores que intervienen en ese proceso; así, y según asegura Jeffrey Weeks, las masculinidades, como las feminidades, son prácticas sociales y no verdades eternas, y se forman en la interacción entre lo biológico, lo social y lo psicológico. La ‘masculinidad’ es por tanto, y en la medida en que podemos definirla con claridad, a la vez un lugar de relaciones de género, el conjunto de prácticas a través de las cuales los hombres y las mujeres se sitúan a sí mismos en relación con el género, y los efectos de dichas prácticas en las experiencias corporales, en la personalidad y la cultura. Las relaciones de género se organizan en la intersección entre el poder, la producción y la emoción, dando lugar a una multitud de masculinidades – hegemónicas, subordinadas, marginadas y oposicionales – que coexisten e interactúan simultáneamente y que se configuran, todas ellas, en circunstancias históricas específicas. Dentro de la estructura ideológica de la cultura occidental, patriarcal y heterosexista, la masculinidad ha sido tradicionalmente estructurada 26

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Fotografía de Felix Gonzalez Torres, Sin título, 1991

como el género normativo. Sin embargo, los estudios feministas y gays han desafiado, en las últimas décadas, la impermeabilidad de ese planteamiento para enfatizar la multiplicidad de la identidad y subrayar cómo el género es articulado a través de una gran variedad de estructuras lingüísticas, institucionales, espaciales y culturales, así como por un conjunto de influencias, algunas de las cuales somos capaces de controlar y otras no. Todo ello, para concluir que la identidad del género no es algo neutral ni mucho menos accidental, sino que actúa como un ideal coercitivo que tiene la misión fundamental de proteger la norma hegemónica del heterosexismo y la misoginia. Las diversas reflexiones provenientes de los movimientos feministas y gays han demostrado en sus múltiples análisis cómo el género es un constructo social, conformado por circunstancias históricas y discursos sociales y no por circunstancias biológicas, fundamentalmente azarosas. Y es en este sentido donde el concepto de género, más que permanecer estático y reactivo, es inevitablemente performativo, continuamente desplegado como una compleja puesta en escena de auto-representación y auto-definición. Por esa razón nunca el género, algo complejo y resbaladizo de definir, se puede entender en su totalidad en un momento histórico determinado.

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Creo que podemos asegurar que no existen (en sentido biológico) rasgos, actitudes, temperamentos o aspectos propios e intrínsecos de un sexo, sino unos modelos sociales de comportamiento seleccionados y fijados culturalmente en función de la evolución histórica de cada sociedad. Los trabajos de Judith Butler han sido fundamentales para tener esta visión histórica y antropológica que entiende el género como una relación entre sujetos socialmente constituidos en contextos específicos. Para la autora norteamericana, el género no es un sustantivo, ni tampoco una serie de atributos vagos, el género resulta ser performativo, es decir, que constituye la identidad que se supone que es, el género siempre es un hacer, aunque no un hacer por parte de un sujeto que se puede considerar preexistente a la acción, no hay una identidad de género detrás de las expresiones de género; esa identidad se constituye performativamente por las mismas ‘expresiones’ que, según se dice, son resultado de ésta. Creo que podemos concluir, según lo que dice Judith Butler, que el hacer lo es todo y que no se “es” nada más allá del producto del devenir permanente y continuo. Si, parafraseando a Simone de Beauvoir, y siguiendo las bases metodológicas de la escritora americana, no se nace hombre ni mujer, sino que se llega a serlo, entonces existe la posibilidad de intervenir en esa práctica discursiva que se está constantemente conformando y dotarla de nuevos significados. Por tanto, podemos afirmar que no existe la masculinidad ni la feminidad en sí misma. La masculinidad, al igual que la feminidad, se va adquiriendo en un proceso de aprendizaje, a veces muy duro, en el cual una es producto de la otra, ya que ambas se construyen y se definen una en relación (negación) a la otra. Los géneros aparecen socialmente como modelos de comportamiento que se imponen a las personas en función de su sexo, intentando crear una vinculación directa hombre = masculino, mujer = femenina. Sin embargo, que lo femenino no es algo exclusivo de las mujeres, ni lo masculino de los hombres, parece algo evidente. De todos modos, ese razonamiento todavía se utiliza ideológicamente para desvalorizar todo aquello que se puede entender o clasificar bajo el término de femenino, ya lo desarrollen los hombres o las mujeres. La feminidad está continuamente interrogada, en la tentación de dejarla fijada de una vez por todas, mientras que la masculinidad permanece incuestionada. Así, la mujer es presentada como lo extraño, lo desconocido, lo indefinido. Por contraste, lo masculino participa de todas las cualidades de lo sólido: es claro, límpido, bien delimitado, firme y, sobre todo, natural. Con estos planteamientos se consigue dotar a cada género de un código claro y conciso que enuncia cómo debe comportarse y actuar cada uno 28

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dependiendo de su sexo-género, al tiempo que se crea un sistema de jerarquías donde lo masculino no es únicamente diferente de lo femenino, sino que además es ofrecido como superior. Esta concepción misógina y homófoba del papel de los géneros se basa en la idea central del rechazo de la pasividad (una actitud entendida como absolutamente femenina). Si un hombre no domina y controla la situación, será controlado por ella y perderá su masculinidad, es decir, el poder y sus privilegios. La identidad de género (masculino o femenino) señala la forma en que satisfacemos nuestras necesidades, los medios de que nos valemos para obtenerlas y los modos en que nos relacionamos con otras personas. La existencia de diferencias tan marcadas entre los géneros es el producto de una desigual distribución de responsabilidades en la producción social de la existencia que beneficia claramente a la masculinidad. Los valores de género son un producto del entorno social (de la educación más que de la naturaleza) y un factor decisivo en la comunicación que trasmitimos a través del lenguaje y la apariencia (aspectos tales como los movimientos, los gestos, las expresiones, el tono de voz, los lugares que ocupamos o el tipo de ropa que usamos), o la que leemos en los otros, es decir, cómo percibimos, interpretamos, etiquetamos y usamos la información que nos llega de otros individuos. Y en estos elementos de interacción con los demás que nos sirven para definir la identidad, tienen una destacada importancia los referidos a las divisiones espaciales, las cuales han sido trazadas históricamente siguiendo unas oposiciones binarias en función del género: lo público enfrentado a lo privado, el fuera al dentro, el trabajo exterior al interior, la producción al consumo…; todo ello forma parte de un sistema de demarcación social compuesto de una intrincada red de símbolos. Son códigos no neutrales (a los que asignamos significados y nos trasmiten significados) que nos sirven para hablar de los valores que conforman la existencia. Es decir, construimos imágenes de nosotros mismos y las proyectamos a través de nuestras apariencias, apariencias que ejemplifican la sumisión o el cuestionamiento de los roles sociales asignados y el posicionamiento, o no, dentro de la jerarquía establecida. Por estas razones, podemos decir que la masculinidad no se tiene, sino que se ejerce, y el poder es el eje central de su constitución y ejercicio. La identidad masculina nunca viene dada, por el contrario, se tiene que ir consiguiendo, afianzando y definiendo, siempre, en relación con los “otros”. Más que una realidad inalterable y fija, la masculinidad es un efecto de la cultura, una construcción, una performance, una mascarada. Así, para que la masculinidad pueda mantenerse es necesario ubicar a esos otros en una posición que, subjetivamente, tenga valor de ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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femenina. La masculinidad no es una esencia ni universal ni natural ni constante, sino un ensamblaje fluido y cambiante de significados, actitudes y comportamientos que varían significativamente según los contextos (de edad, raza, clase social, religión, opción sexual…) en los que se desarrolla y que se refiere a relaciones de dominio, marginación y complicidad entre las personas. A mi modo de ver, no existen diferentes tipos de masculinidad, ya que la masculinidad no es ni más ni menos que una ideología, un constructo cultural destinado a justificar la dominación masculina. Creo que podemos llegar a decir que tan sólo existe una manera de entender la masculinidad: aquella que se basa en el ejercicio del poder como sinónimo del comportamiento del hombre. Ya no pienso que existan masculinidades dudosas, y cuando parece que las hay, cuando se empieza a poner en duda lo que organiza y estructura la masculinidad, cuando se adquieren otras formas de relacionarse y se transgreden las normativas, son gradaciones de actitudes que se van alejando de la masculinidad y ésta empieza a desaparecer, empieza a convertirse en otra cosa, al tiempo que se inicia un proceso de convergencia, de relación rica, fluida y plural con otros comportamientos que nos permiten acercarnos a territorios más ambiguos que comparten espacio con la feminidad. El principio masculino hegemónico se instituye como el parámetro a través del cual se mide todo lo demás: relaciones sociales, comportamientos afectivos y sexuales, utilización del espacio, actitudes físicas, formas corporales… Se ha conseguido imponer una forma de ser particular como la única posible y natural, y se ha impuesto su estructura, sin que lo parezca, a esos otros sectores (fundamentalmente mujeres y gays) para que la tomen como propia y, si no lo consiguen, que se sientan culpables, minusvalorados e inferiores por no estar a la altura del ideal necesario para ser considerado un ser (hombre) normal. El orden masculino ha conseguido impregnar el inconsciente colectivo de unos esquemas estructurales, tanto éticos como sociales y simbólicos, que vienen a acreditar el orden masculino no sólo como el único posible, sino como un orden neutro al servicio del conjunto de la sociedad y sobre el cual no se puede discutir, pues es inevitable. La interiorización de la dominación en el ánimo del dominado es lo que garantiza su sumisión al orden social y a sus jerarquías. Como ha escrito Pierre Bourdieu, la fuerza del orden masculino se ve en que no le hace falta justificarse en discursos que tienen por objetivo legitimarlo. El orden social funciona como una inmensa máquina simbólica que tiende a ratificar la dominación masculina en la que se ha fundado. Un sujeto es siempre producido por el orden social que organiza las experiencias de los individuos 30

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Fotografía de Alicia Framis, Wellmatchedhouse, 2001

en un momento determinado de la historia, es el producto de la subordinación a un conjunto de reglas, de normas y de leyes que estructuran sus vivencias, de manera que es imposible hablar de la dominación masculina si no se tienen en cuenta las instituciones que se afanan en perpetuar el orden sexual establecido; cualquier análisis de género debe conllevar, por tanto, un análisis del poder que lo hace posible. Y es en este sentido que se debe entender la segregación espacial como uno de los mecanismos por los que el grupo con más poder perpetúa su ventaja, ya que a través del espacio se controla el acceso al conocimiento y a los mecanismos de decisión y prestigio. A partir de ahí, y en tanto en cuanto la ciudad puede ser considerada como el espacio más inmediato y concreto para la producción y circulación del poder, es necesario plantear un concepto urbanístico que tenga en cuenta el contexto sociocultural y la participación de los sectores marginados, para que no quede ninguna realidad sin representación y no existan más cuerpos ausentes, para ir más allá de una concepción de la ciudad meramente formal que perpetúe los intereses de una minoría privilegiada. Por ello, cuando el punto de vista sobre la ciudad se disfraza de neutralidad, lo que realmente se está defendiendo es un espacio que reproduce la subordinación de los discursos feministas y niega las diferencias sociales y sexuales, alentando los lenguajes universalistas que contribuyen a la perpetuación de las discriminaciones en contra de la diversidad y la pluralidad.

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En este sentido, otro aspecto fundamental de esta división de género es la que se establece a través de la organización de los espectadores dentro del mismo espacio. La masculinidad se alza con la autoridad visual, mientras que la feminidad es relegada a lugares sin poder; así, la distribución espacial de la mirada subraya los privilegios culturales del hombre por acceder a la visión. Es decir, el carácter de género del espacio debería ser entendido como una composición coreográfica en la que los distintos sectores se relacionan en un espacio que es construido y representado a través de las implicaciones sociales producidas por la mirada y el movimiento, tales como: sujeto/objeto, activo/pasivo, espectador/espectáculo, masculino/femenino…, configuraciones binarias que la mirada establece y que por tanto pueden ser cuestionadas y desestabilizadas. Los espacios no contienen significados inherentes a ellos mismos, más bien estos les vienen dados a través de las diferentes actividades que en ellos llevan a cabo los diferentes actores sociales. La jerarquización de dichos espacios se mide tanto por las relaciones que en ellos se establecen como por la elaboración de las referencias simbólicas que se utilizan o por las personas que los ocupan. La arquitectura, la construcción de entornos urbanos, es una forma de representación que se compone de imágenes y textos; son creaciones culturales, ya que tanto el proceso de construcción como las formas planteadas expresan valores ideológicos y conllevan normas de comportamiento y relación que dotan de contenido muy específico a la realidad urbana. Un contenido que mayoritariamente suele responder a la subjetividad de los hombres blancos, misóginos y heterosexistas, que además poseen un cierto poder económico, tienen vehículo propio, son independientes, no envejecen ni necesitan ayuda… Es decir, un arquetipo de habitante bastante minoritario y que es estático, no evoluciona. Una apuesta ideológica que consigue hacer invisibles a las mujeres y a los diversos sectores sociales minoritarios y que, en cambio, se quiere interpretar como una propuesta “neutral” y óptima para el conjunto de la sociedad. Sin embargo, cuanto más minoritario o menos productivo seas (en paro, sin papeles) mucho más discriminado, apartado y ausente te sentirás de este proyecto para “todos” que tan sólo cuenta con unos pocos. Por estas razones, es necesario reinterpretar y reestructurar el espacio construido, y más que de ciudad, hay que empezar a hablar de las diferentes ciudades que existen en cada una de ellas, diferentes según las diferencias sociales, culturales, sexuales… de las personas que las habitan. Es importante hacer visibles a esos sectores desposeídos, entender los espacios públicos como una oportunidad para crear áreas 32

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de relación y plantearlos como espacios de mezcla multifacética de la realidad ciudadana, pues las ciudades son cristalizaciones de procesos políticos, históricos y culturales donde la gente y su hábitat son producidos y se producen mutuamente. Evidentemente, la ciudad es lo construido, aquello más objetivo y visible, pero también es lo constituido por los usos sociales, las normas y las instituciones. Los distintos espacios tienen distintos significados y representan distintas relaciones de poder que varían con el tiempo, de manera que podemos favorecer y propiciar la creación de espacios excluyentes o convivenciales, alentar la complicidad entre las diferentes realidades que conviven o generar aislamiento y exclusión. Por ejemplo, la casa puede ser un lugar seguro, un espacio donde esconderse o una trampa; las calles y los parques son para algunos espacios de liberación y descubrimiento (los gays), en cambio para otros pueden resultar lugares inaccesibles o peligrosos (las mujeres). Por eso, deberíamos ser conscientes de que no se vive el espacio doméstico del mismo modo ni habitan el mismo Madrid, París o Londres, un joven sin empleo que un aposentado empresario, un hombre que una mujer, un europeo que un inmigrante, un matrimonio con hijos que un gay o una lesbiana, cada uno/a lleva consigo un conjunto de aspectos que condicionan sus vivencias. Es, por tanto, la suma y la pugna entre todas esas posibles ciudades las que conforman la “ciudad” en la que vivimos. De este modo, hay que intentar deconstruir esa visión de la ciudad como un espacio neutro, y sin historia, en la que subyace una concepción atemporal y deslocalizada y que tiene la pretensión de crear categorías universales de validación, lo cual conlleva una falta de percepción de las distintas identidades y de las diferencias entre ellas, al tiempo que es una apuesta decidida por la globalidad y la universalidad como valores profundamente masculinos.

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Polifonías discordantes: sobre la significación de las micropolíticas en las prácticas artísticas y culturales

Polifonías discordantes: sobre la significación de las micropolíticas en las prácticas artísticas y culturales Juan Vicente Aliaga* El concepto de micropolítica surge y se desarrolla en los años 60. Los textos de Foucault, Guattari y de Certeau entre otros, junto al impacto del feminismo y de los movimientos homosexuales y anticoloniales contribuyen a mirar la vida cotidiana desde una perspectiva política marcada por distintas concepciones del poder. Las prácticas artísticas recogen y amplifican la importancia de lo cotidiano y de las experiencias personales percibidas como heterodoxas. Micropolíticas, feminismo, sujeto

Empiezo con un título que remite directamente a la obra de Felix Guattari. Como se verá después la reflexión del autor de Chaosmose (1992), su último libro, se refiere a la aparición de un sinfín de problemáticas sociales que difieren de las formaciones políticas clásicas, estatales o de partido (que él conoció en carne propia), y que atienden a preocupaciones parciales, sectoriales (las de las luchas carcelarias, las de los colectivos homosexuales, las de las organizaciones de prostitutas…) en sintonía con la fragmentación de realidades diferenciadas del planeta. La contribución de Guattari, en consonancia con las teorías foucaultianas me siguen pareciendo apropiadas como herramienta de disección de la compleja red de situaciones del capitalismo global pues inciden en la subjetividad liberadora desde el conocimiento del componente psíquico heterodoxo. Guattari se implicó políticamente en los sucesos de mayo de 19 8 y en la crítica a la guerra colonialista de Argelia y Vietnam, sin por Hélio Oiticica. Homenagem a cara de cavalo, 1965 * Juan Vicente Aliaga es profesor de la Facultad de Bellas Artes, Universidad Politécnica de Valencia. Autor de Bajo vientre. Repre-sentaciones de la sexualidad en la cultura y el arte contemporáneos (1997) y de Arte y cuestiones de género (2004). Comisario de exposiciones: Claude Cahun (Ivam, Valencia, 2001), Pepe Espaliu (MNCARS, Madrid, 2003), Hannah Höch (MNCARS, Madrid, 2004), Valie Export (Camden Arts Centre, Londres, 2004). Corresponsal de Artforum. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

ello renunciar a explorar el magma mental cuestionador de la normalidad y de la cotidianidad adocenadas. En gran parte el texto que sigue es deudor de las valiosas aportaciones de Guattari cuyas cavilaciones sobre la micropolítica, junto a las de otros/as autores/as, trataré de aplicar en el campo de las prácticas y de la creatividad artística. En 1963 en un periodo en que Guattari formaba parte del grupo trotskista Voie Comuniste, Pinot-Gallizio, integrante del situacionismo, concibió y produjo un óleo sorprendente. En vez de realizar una pintura tachista o informal, en boga en aquellos años, garabateó sobre el lienzo como si de una pintada o consigna se tratara el texto “Abolition du travail aliéné”. Con esta demanda utópica, que semejaba un manifiesto, 35


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pretendía transmitir con contundencia, expresada mediante el empleo de una disciplina clásica y tradicional, un hastío existencial y sin duda también de orden político. Estamos ante un manifiesto contestatario cuyas ideas pocos años después serían recogidas en los planteamientos de Raoul Vaneigem plasmados en Traité de savoir-vivre à l’usage des jeunes générations, 1967, y en los de Henri Lefebvre, La vie quotidienne dans le monde moderne, 1968. Trabajos y propuestas como la citada constituirían la antesala de un conjunto de manifestaciones sociales y culturales que se materializaron tanto en Europa como en Estados Unidos y también, de distinta manera, en América Latina. El ideal utópico que albergaban gritos y consignas como “Sous les pavés, la plage” (Bajo los adoquines, la playa) y otros traducían aunque fuese de modo incipiente un profundo descontento y un anhelo por quebrar el modelo autoritario que se había asentado en los estamentos sociales, en los gobiernos, inclusive en aquellos que se denominaban democráticos (el caso alemán es paradigmático) y que hacían mella en las actitudes y en los comportamientos personales. Así, pese a algunos signos elitistas, la universidad fue el epicentro de las protestas de los jóvenes metropolitanos que surcaron las calles de Italia, las de Alemania, Holanda y Francia, y también las de México. En este caso brutalmente reprimidas en la matanza de Tlatelolco. La violación de la autonomía universitaria que congregó a muchos estudiantes en la plaza de las Tres Culturas acabó con más de 400 muertos. El libro de Elena Poniatowska, La noche de Tlatelolco (1971) da buena fe de ello. Todavía hoy no se han depurado satisfactoriamente las responsabilidades políticas. Toda una generación, savia nueva, harta del poder patriarcal, de los dogmas y del asfixiante ámbito familiar, amén del rechazo de la jerarquía de las estructuras universitarias, buscaba una sociedad más abierta y una revolución en las costumbres, en los hábitos cotidianos, es decir, se hacía hincapié en un rimero de reivindicaciones, algunas coherentes, otras más intuitivas, que abundaban en el día a día, en el vivir de lo personal y cotidiano. Esto es lo que han denominado a grandes rasgos micropolítica autores como Felix Guattari y Michel de Certeau y que está presente en los escritos de Michel Foucault, Gilles Deleuze y Guy Debord. Una micropolítica que no presuponía ignorar o excluir las luchas sociales de alcance global como la protesta contra la guerra de Vietnam. Era éste probablemente uno de los significados de la consigna “Pidamos lo imposible” que anegó las calles de París en mayo de 1968. Un imposible que era a la postre realizable, pues se saldó con la derrota de las tropas de la primera 36

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potencia mundial lo que generó una crisis de conciencia en amplios segmentos de la población estadounidense. Y que suscitó la producción de representaciones críticas en el ámbito artístico (verbigracia en la serie de fotomontajes Bringing the War Home, de Martha Rosler, 1967-1972). En ésta, concretamente, la artista norteamericana abordaba el cuestionamiento de la guerra desde un prisma feminista, en particular llamando la atención sobre el lujo desmedido de algunas casas y residencias fotografiadas y reproducidas en revistas de la época. Las amas de casa y asistentas que trabajan en las mismas eran aparentemente ajenas al conflicto, de ahí que Rosler introdujera en ese espacio sosegado y pudiente la violencia de la tortura y la muerte. El concepto de micropolítica tal y como lo argumentó Michel de Certeau en L´invention du quotidien (1980) trataba de dar importancia a las actividades lúdicas o de otro tipo que las personas llevan a cabo diariamente, conscientes de que tal ristra de actividades, conductas o comportamientos en el ámbito doméstico o en el espacio laboral o incluso en el tiempo vacacional están dotadas de sentido hasta el punto de que los valores éticos o su falta no sólo están presentes en dichas acciones sino que son de capital importancia. Enlazando con lo anterior se puede afirmar que la exigencia de lo imposible equivalía asimismo a un abierto rechazo al autoritarismo patriarcal, y a las constricciones familiares, especialmente en el caso de las mujeres, y a una crítica al poder con mayúsculas, aunque la idea de Poder en su sentido jerárquico fue desmantelada por Foucault. No puede olvidarse que el espíritu del 68 tuvo consecuencias prácticas como la aprobación de la Ley de interrupción del embarazo en Francia, impulsada por Simone Weil en 1974 en un gobierno de derechas, por sorprendente que esto pudiera parecer. Por otro lado, los valores imperantes del consumismo y la consiguiente alienación que ello producía, tan ácidamente desafiadas por Pier Paolo Pasolini, estaban en el punto de mira de una serie deshilachada de peticiones y reivindicaciones, demasiado dispersas entonces para hacer mella en la actitud reaccionaria de los gobiernos occidentales. Conviene ser consciente de que la creciente tendencia a la uniformización en la sociedad capitalista occidental invisibiliza a la postre cualquier tentativa de un modo de vida diferente al hegemónico. Todo ello fomentado por el individualismo y el mercado mediante la puesta en circulación de productos y bienes de consumo, a veces innecesarios, y, lo que es más significativo, su influencia en conductas y comportamientos humanos estabulados. De estas cuestiones, y centrándose en la juventud italiana, trató Pasolini en sus artículos ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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periodísticos publicados con el nombre de Scritti corsari y Lettere luterane. El combate pasoliniano contra la homologación absoluta y la falta de diversidad iba acompañado de una crítica del adocenamiento de la vida pública y privada y de la corrupción de la clase política en el poder en clara connivencia con la mafia y la conocida logia P2. Aunque sea todavía motivo de especulación, pues la investigación sobre su asesinato por parte de la justicia fue harto chapucera, creo que se puede afirmar sin ambages que su honradez intelectual le costó la vida. Uno de los objetivos de los dardos pasolinianos y de los lanzados por otros autores (verbigracia David Cooper en La muerte de la familia, 1971) apuntaba al sistema de la familia tradicional (otra apenas si era concebible entonces, aunque surgieron en ese momento las llamadas comunas) en la que, impuesta la jerarquía masculinista, ejerce el padre el poder merced al dominio físico, psicológico, económico, incluso espacial, sobre la madre y los hijos. La marginación de lo diferente impedía que cualquier atisbo de discrepancia produjese un conato de conflicto en la sacrosanta familia bendecida sin fisuras desde la Iglesia. Las añejas normas patriarcales resultaban rígidas y a la postre ineficaces para un tejido social en el que tras la implantación de la píldora se empezaba a separar matrimonio, amor heterosexual y sexo. La publicación del texto de la feminista Anne Koedt, The Myth of Vaginal Orgasm, 1970 supuso asimismo una furibunda y merecida crítica al pensamiento freudiano que concebía la sexualidad para beneficio masculino. Los varones tienen orgasmos básicamente al frotarse con la vagina no en la zona clitoridiana que es externa y no es estimulada con la simple penetración. Las mujeres han sido definidas sexualmente en términos de lo que gusta a los hombres. Nuestra propia biología no ha sido analizada adecuadamente. Al contrario se nos alimenta con mitos sobre la mujer liberada y el orgasmo vaginal, un orgasmo que de hecho no existe. Quien crea que estas palabras se limitan a describir una geografía del cuerpo de la mujer (que no sería en sí misma poca cosa) se equivocan pues acarrean importantes consecuencias. Por un lado, rompen el mito de que la sexualidad heterosexual en las mujeres es interna, lo que justificaría la preeminencia del coito, y por otro, da a entender la autonomía sexual de la mujer quien no necesita de la penetración para gozar de su cuerpo pues se satisface mediante la estimulación clitoridiana. Basta con ver el corto de Valie Export, Mann& Frau& Animal (1970-73), en la que la artista se masturba en la bañera con un chorro de agua. Esta pieza levantó ronchas en su momento en Austria entre mojigatos y pudibundos y resulta significativa en lo que tiene de síntoma para 38

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comprender la trascendencia de la reivindicación de la autonomía sexual de la mujer que pasa por los placeres clitoridianos. Los textos de Guattari y Deleuze, incluidos en el Antiedipo, 1972, supusieron y generaron también algunos cuestionamientos respecto del ortodoxo pensamiento psicoanalítico clásico. Por otro lado, y fruto de la sociedad consumista y del proceso de industrialización capitalista, en esos años se había afianzado el culto a la productividad y a la rentabilidad, procedentes del pensamiento lógicocéntrico que ya cuestionase Georges Bataille en sus escritos sobre el concepto de dépense (gasto). Visto con el tiempo y la distancia algunos aspectos de su obra pueden ser revisables e incluso criticables pero en su momento suscitó defensas apasionadas en quienes buscaban en cierta sexualidad extrema una experiencia de los límites, sobre todo en lo tocante a Histoire de l´oeil. No es extraño, por tanto que Bataille y también Antonin Artaud estuviesen en boca de algunos teóricos de la época en los 70 (Philippe Sollers, Pierre Guyotat, Julia Kristeva), que contribuyeron a fraguar nuevas formas de pensar y de sentir. En este orden de cosas la propia experiencia vital de Artaud es capital por huir en su comportamiento de los rigores de la lógica científica al ser considerado por parte del estamento médico como loco y esquizofrénico. Artaud se vio perseguido por la policía, la familia y la clase médica que quiso hacer de su cuerpo un espacio sometido a pruebas y controles, incluidos los electrochoques, como los que padeció en la clínica de Rodez, y que mandó aplicar sin mayores escrúpulos, Gaston Ferdière. Los dibujos torturados de Artaud traduce el dolor físico y el desgarro psicológico por los que pasó el autor de Pour en finir avec le jugement de Dieu. En los 60 y 70 surgen nuevos modos, en los que se incluían los de la antipsiquiatría que pedía la plena inserción social del enfermo mental mediante la destrucción del manicomio y el cambio en la cultura que establece divisorias entre lo considerado normal y lo patológico. Entre los nuevos brotes de pensamiento se contaba también en el campo de la antipsiquiatría con la obra de David Cooper, autor de La muerte de la familia (1971) quien lanzó sus pullas contra la pareja monógama y el autoritarismo patriarcal, y la de Franco Basaglia (precursor del movimiento de reforma psiquiátrica llamado Psiquiatría Democrática), que postulaba una interpretación radical de la locura. La plena inserción del enfermo mental en la sociedad era la meta de la antipsiquiatría, una forma tal vez demasiado idealizada de un mundo feliz, de una wirkende utopie. En este orden de cosas conviene mencionar la importancia de un estudio pionero de Georges Canguilhem, Le normal et le pathologique, ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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1966, en el que señala a la cultura como estructura mental y social que establece la separación entre lo considerado normal y lo tildado de enfermo. Conocedor de este texto, Michel Foucault, elaboró otras formas de reflexión, sin privarse de apuntar a la responsabilidad social del orden institucional: la fábrica, la cárcel, la escuela, el asilo, el cuartel, el hospital. Todos ellos estamentos que de forma distinta simbolizaban de algún modo el autoritarismo combatido por el segmento juvenil más contestatario, que vio parcialmente algunas de sus reivindicaciones en las experiencias docentes de la Université de Vincennes (1969-1980) en las que participaron Deleuze, Lyotard, entre otros. El autor de Surveiller et punir (Vigilar y castigar) desempeñaría un papel capital en la definición práctica, en la concreción social de las micropolíticas. Tras años de erudición libresca como investigador, Foucault se zambulló en el estudio de las realidades sectoriales, locales, parciales, haciendo de lo minoritario la fuente de una nueva concepción de la existencia ajena a las normas reglamentadas. El suyo era un objetivo filosófico, inmanente y contingente en el que lo pequeño y lo cotidiano no quedara sepultado bajo la política en mayúsculas y las razones de estado. Sin duda lo pudo materializar con la creación del Groupe d´Information sur les prisons (GIP) en 1971. Un colectivo o fraguado en París en colaboración con J.M. Domenach y Pierre Vidal-Naquet y que surgió a raíz de las huelgas de hambre que protagonizó un colectivo de estudiantes izquierdistas encarcelados. Así, en su praxis de la micropolítica no había contradicción alguna en dar su apoyo a la causa palestina, una de las problemáticas irresueltas de mayor impacto y transcendencia mundial todavía hoy, o en estudiar las normas que oprimen a los llamados anormales (desequilibrados, desviados sexuales, asociales). Los anormales que interesaron a Foucault y sobre los que disertó en sus cursos del Collège de France ( en particular en 1974-1975) constituyen una gran familia: el monstruo humano, figura jurídico-médica, que combina lo imposible y lo interdicto, es decir, el ser contra-natura. En segundo lugar, está el incorregible que no se deja someter por los castigos y escarmientos, y finalmente, la figura del onanista, es decir el sujeto que goza del sexo por sí mismo sin afán reproductor y que derrama la preciada semilla en función del puro goce. Viene a cuento de lo que precede el happening orquestado en París por Jean-Jacques Lebel en 1966, 120 minutes sur le divin Marquis, que posibilitó, entre otras transgresiones, que se hablase de temas tabú como el hermafroditismo y la transexualidad gracias a la participación de una mujer trans llamada Cynthia en este happening. 40

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Los ámbitos que abrazan y cruzan el pensamiento y la práctica política de Foucault no son incompatibles. De la misma manera tampoco puede extrañar que tanto él como Deleuze y Guattari fueran algunos de los firmantes de la publicación francesa Recherches no 12 con el título de Trois milliards de pervers. Grande Encyclopédie des Homosexualités (Tres mil millones de perversos) que causó furor en 1973 y que incluía audaces textos sobre la pedofilia, impensables ahora. Pienso en Émile perverti (1974) de René Scherer y en Le bon sexe illustré (1974), Tony Duvert. Los dos últimos textos resultan impensables en un contexto socio-político como el actual, en 2006, que ha hecho desde hace años de la pedofilia un asunto abominable. De ese modo, trabajar en distintos frentes podría ayudar a moldear una nueva conciencia y propiciar un nuevo sujeto, y para ello era preciso no cerrar los ojos a todo tipo de realidades antaño consideradas sórdidas o marginales, con toda la carga moralista que ello conlleva. De esas realidades habló Felix Guattari en términos de polifonía discordante: Todo lo que eran formaciones políticas y sociales y sindicales en la época de Sartre se han desmoronado. Él partía de esas coordenadas sociales y de ahí sus implicaciones con el partido comunista. En la época de Michel Foucault lo que aparece de pronto son problemáticas en todos los niveles de lo social: en el plano de la educación, en las cárceles, en la psiquiatría, acerca de la homosexualidad, de la prostitución. Esta problemática es irreversible a pesar de la capa de plomo, a pesar de los años invernales por los que pasamos. Pero notamos que hay una micropolítica, un nivel microsocial que es el lugar en el que operan y se reinician las prácticas sociales (…) Todo ello no significa que no existan las formaciones de poder, las formaciones estatales en el seno de las que se debate. Estamos presos en una especie de polifonía discordante entre líneas muy contradictorias.1 Tanto Guattari como Foucault podrían sintonizar sobre el papel con la tradición francesa del republicanismo universalista, pese a las múltiples rupturas que sus respectivos pensamientos suponen frente a la ortodoxia. En particular por defender la micropolítica, aunque nunca lo hicieron desde un sesgo identitario o cerrado. Con ello intento decir que detrás de la filosofía republicana y laica, con todas sus virtudes, se escondía asimismo un centralismo piramidal, jerárquico que descansaba sobre la base de un país con una sola lengua que ha hecho lo indecible por eclipsar cualquier conato de autonomía lingüística y que había abogado 1 Felix Guattari, La philosophie est essentielle à l´existence humaine. Entretien avec Antoine Spire, París. Éditions de l´aube, 2001, p. 30. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

por la centralización y la uniformidad. Con dichas premisas las reivindicaciones de las minorías no se dejaban apenas sentir y ello a 41


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pesar de que en suelo francés convivían sectores procedentes de la colonización gala de zonas tan distintas como la Martinica (véase Le discours antillais, de Edouard Glissant, 1981), o Argelia (este país se independizó en 1962) como bien supieron ver los intelectuales (Robert Antelme, Maurice Blanchot, Marguerite Duras, Alain Resnais, Natalie Sarraute…), que firmaron el Manifeste des 121 alentando la insumisión en la guerra de Argelia. La mal resuelta relación con las antiguas colonias, y el poco acomodo o integración de las nuevas generaciones de franceses de origen magrebí o subsahariano, sin papeles en muchos casos, ha generado con el tiempo la aparición de movimientos políticos racistas de extrema derecha. Y, entre otros fenómenos los disturbios de las banlieues, en 2005, consecuencia en parte al alejamiento del centro de poblaciones de inmigrantes a la desvalida periferia parisina, una política segregadora y de limpieza étnica iniciada por Giscard y Chirac. Los textos de Frantz Fanon (Piel negra, máscaras blancas, 1952, y Los condenados de la tierra, 1961, año de su muerte) son harto elocuentes al respecto por lo que tienen de premonitorios de una materia espinosa: las secuelas del colonialismo. La ley republicana reza lo siguiente: toda persona, todo individuo es igual ante la ley. Hasta aquí nada que objetar si no fuese porque la realidad no encaja bien con los ideales de las leyes y su cumplimiento deja bastante que desear. De hecho en su aplicación no es lo mismo ser francés blanco de souche que pied-noir o argelino con pasaporte francés, y menos todavía lo era en los años 70. El supuesto universalismo igualitario al que apela el republicanismo galo podría parecer envidiable de no ser por que ha podido servir para aherrojar a la ciudadanía de un país que en la práctica ya no es monolítico en una unifomización o corsé pensado en realidad para el varón blanco, heterosexual y sus costumbres, reglas y hábitos de vida. Francia es hoy un territorio plural en el que conviven, en ocasiones con dificultad, etnias distintas, concepciones religiosas diferentes (judíos, musulmanes, católicos, protestantes…), formas de ver el mundo heteróclitas que a veces enarbolan la bandera identitaria o comunitaria, aunque no siempre con los mismos postulados. El concepto de identidad ha servido en distintos periodos de la historia para proteger a los miembros de una comunidad que se sentía en desventaja o que era arrastrada a la ignominia y a la exclusión. Bien es cierto que el fortalecimiento de lo identitario que existe contra lo hegemónico ha podido generar cerrazones mentales y cierto espíritu de gueto o autosegregación pero no debe olvidarse que si las prácticas discriminatorias de las mayorías (sean sexuales, de etnia, de poder 42

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económico) no se manifestasen como opresoras, que lo son, probablemente los comportamientos percibidos como hostiles de algunas comunidades minoritarias se desactivarían a favor de una mayor porosidad y mestizaje. Dicho esto es comprensible el aparato teórico desplegado por Guattari y Foucault, aunque en discursos paralelos y por separado, que enuncian que cada vez que uno se fija como objetivo una identidad, se pierde algo esencial que es el devenir. De alguna manera se desprende que es el cambio el motor del proceso de subjetivización y que en todo comportamiento humano hay cierta provisionalidad. Así, centrándose en el ámbito de la sexualidad afirma Foucault: Si la identidad sólo es un juego, si sólo es un procedimiento para favorecer relaciones, relaciones sociales y relaciones de placer sexual que crearán nuevas amistades, entonces es útil. Pero si la identidad se convierte en el problema mayor de la existencia sexual, si la gente piensa que debe “desvelar” su “identidad propia” y que esta identidad debe convertirse en la ley, en el principio, en el código de su existencia; si la pregunta que se plantea continuamente es: ¿esto es conforme a mi identidad?, entonces creo que se trataría de un retorno a una suerte de ética próxima de la virilidad heterosexual tradicional.2 Paradójicamente estas reflexiones del último Foucault, que vincula heterosexualidad con ley simbólica inamovible, se produjeron en unos años en los que la homofobia creció hasta niveles insospechados en Estados Unidos y en el mundo occidental en general. En esos años se culpó a la población gay del contagio del SIDA, lo que supuso – y ello es un buen ejemplo de resistencia política – un afianzamiento de las comunidades de gays y lesbianas constantemente agredidas por la derecha cristiana. La cuestión estriba en si se puede renunciar a un concepto de la identidad esencial y apostar en cambio por puntuales identidades provisionales en función de metas, estrategias o intereses a resolver, que se disolverían una vez logradas como es el caso de las luchas sectoriales, micropolíticas que defendía el autor de El nacimiento de la clínica. Dicho esto, y por abundar en paradojas, no deja de resultar curioso que sea en plena movilización de los derechos de las minorías raciales, los movimientos feministas y los de liberación gay (Deleuze decía admirar la heterodoxia vivencial del Front Homosexuel d´Action Révolutionnaire, FHAR), es decir, en las décadas de los 60 y 70, que requirieron una carga identitaria de relieve, cuando brotan las teorías de Guattari y Foucault. ¿Previeron estos pensadores los errores y el dogmatismo en 2 Michel Foucault, The Advocate, 1984. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

que incurrió la lucha social de los mencionados sectores en años 43


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posteriores? ¿Es posible enlazar sus teorías con las aportaciones de la teoría queer avanzada por Judith Butler en Gender Trouble. Feminism and the Subversion of Identity, 1990? Hay indudablemente puntos en común. Algunos tienen como nexo el estudio de la constitución del sujeto erizado de problemas, conflictos y dificultades. Uno de los pioneros de la queer theory, Michael Warner lo plantea en los siguientes términos: Ser plenamente normal es, estrictamente hablando, imposible. Cada uno se desvía de la norma de alguna manera. Incluso si uno pertenece a una mayoría estadística en razón de un grupo de edad, raza, altura, peso, frecuencia de orgasmos, sexo, contactos sexuales y nivel de ingresos, simplemente debido a esta combinación improbable de normalidades el perfil de cada uno se separa de la norma.3 Tras la exposición de algunos de los aspectos que configuran el panorama político, social y teórico en que emerge el concepto de lo micropolítico me centraré a continuación en algunas vicisitudes del proyecto que con el título de Micropolíticas. Arte y cotidianida tuvo lugar en el Espai d´Art Contemporani de Castelló (España) en 2003. Se trata de una exposición que se orquestó en torno a un solo concepto pero que por razones prácticas se dividió en tres segmentos (el primero abarcaba 2001-1989; el segundo 1989-1980; y el último 1980-1968). En realidad se trataba de un mismo flujo de ideas con una base integradora en la que se abraza un lapso de tiempo que empieza en 2001 y concluye en 1968 como fechas faro, a sabiendas de que el corte temporal pueda ser tal vez demasiado drástico. Nos movía a los comisarios4 el propósito de empezar por manifestaciones más recientes y próximas en el tiempo y la necesidad imperiosa de ir hacia atrás en pos de las genealogías y las raíces que permitieran reconocer la vigencia del concepto de micropolítica. Si bien las fechas son aproximativas, y en algunas casos se pueden encontrar propuestas artísticas que sobrepasan o exceden los añosmojón, no son en absoluto gratuitas, pues están revestidas de carga semántica y simbólica. 2001 pasará seguramente a la historia por una fecha fatídica, el 11 de septiembre y los ataques terroristas de Al Qaeda a las torres gemelas de Nueva York. Asimismo, es también una fecha clave que señala el reforzamiento perfectamente constatable hoy, pues no faltan pruebas, de lo que se ha denominado la dérive sécuritaire, es decir, la obsesión desmedida de los estados y gobiernos y demás administraciones por el control y la vigilancia a gran escala, y la subsiguiente pérdida de libertad del ciudadano, siempre sospechoso de delito. De ello hemos visto nefastas 44

3 Michael Warner, The Trouble with Normal. Sex, Politics, and the Ethics of Queer Life, Nueva York, The Free Press, 1999. 4 Además de quien esto firma, María de Corral y José Miguel G. Cortés. concinnitas


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consecuencias en Guantánamo, en Abu Ghraib, en Bagram. En ese orden de cosas, se ha podido comprobar que la interesada confusión acerca del terrorismo ha avalado la política bélica del gobierno de Estados Unidos y sus aliados (Blair, Aznar) en Irak, con el consiguiente desastre en víctimas y en la destrucción del país. Además de avivar el odio entre comunidades y países. 1989 alude obviamente a la caída del muro de Berlín que separaba dos partes de una ciudad dividida por formas de vida y por barreras psicológicas y políticas. Es también, símbolo de los cambios que introdujo la perestroika y la glassnot en la Unión Soviética. Si bien al principio la pérdida de poder y control de este país gigantesco generará la independencia de las repúblicas bálticas y de algunas regiones asiáticas que se acercarán a la órbita de influencia norteamericana, los años traerán una política autoritaria bajo el mando de Yeltsin y de Putin (especialmente virulento en su caso), y asimismo el recrudecimiento represivo de las tropas rusas contra los independentistas chechenos. 1980 es el año en que sube al poder el republicano Ronald Reagan, fallecido en 2004 y bendecido ahora en su país incluso por los demócratas en sus exequias. ¿Paradojas incomprensibles de la falta de memoria o amnesia interesada? Un año antes Margaret Thatcher obtiene la mayoría en las elecciones y comienza una política beligerante, autoritaria y reaccionaria. Bajos ambos mandatos se produce la crisis del Sida y se empieza a construir la arquitectura del odio, es decir, la demonización de la libertad sexual agudizada por la galopante homofobia de Juan Pablo II que prosigue hoy bajo el mandato de Benedicto XVI. Son años de retraimiento y de miedo generados por la demonización de las prostitutas, de la población gay, del colectivo negro, y de todo/a aquel y aquella cuyo estilo de vida incumpliese la moral férrea e hipócrita de la mayoría religiosa basada en la familia convencional, que algunos consideran ya obsoleta. Por último, 1968. Se trata de una fecha probablemente demasiado ensalzada y mitificada, sin embargo sirve para concentrar en torno a la misma el cuestionamiento del autoritarismo y de la figura del patriarca y el policía, entre otros símbolos represivos. Es el año en que es asesinado Martín Luther King, símbolo de la igualdad racial. Además, en fechas previas y sucesivas empieza a cobrar cuerpo el movimiento feminista especialmente en Estados Unidos pero también en Europa planteando la necesaria politización del ámbito personal, de la privacidad, de la cotidianeidad. Así, y como plantearon las artistas que realizaron performances feministas en la Womanhouse de Los Ángeles en 1972, a iniciativa de Myriam Shapiro y Judy Chicago, fregar platos, barrer, limpiar, cuidar de los niños no son actos ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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naturales que desempeñan las mujeres sino actividades que están sujetas a una determinada concepción de género que aherroja al colectivo femenino. Lo personal es político, no hay duda. Como proponía Kate Millet, autora del influyente Política sexual (1970): “El sexo reviste un carácter político que, las más de las veces, suele pasar desapercibido”. 5 Hay que recordar que la revista Time, para desprestigiar y ensuciar al feminismo sacó a relucir la bisexualidad de Kate Millett como si se quisiera afirmar que la malignidad del discurso feminista estribaba en lo que Time consideraba una prueba de desviación sexual. ¿Era esto una respuesta machista y heterosexista al hecho de que Millett hubiese arremetido contra los prejuicios viriles de autores como los gurús de la literatura oficial que respondían al nombre de Henry Miller, Norman Mailer, D.H Lawrence? La reacción de la familia de K. Millet no se hizo esperar haciéndola recluir en un sanatorio psiquiátrico. El orden reglamentado volvía a imponerse en el núcleo familiar. En ese sentido, y con la distancia que ofrece el paso de los años, se acrecienta la relevancia capital del feminismo y su discurso igualitario, lo cual no conlleva obviar posibles críticas a algunas políticas feministas concretas. Feminismos hay muchos y variados y no siempre coinciden en la praxis. Las prácticas artísticas que se incluyeron en Micropolíticas trataban de bucear en esa línea tenue que va de la proclamación de determinados valores sociales a su plasmación en la intimidad y la privacidad cotidianas, y en los consiguientes lazos que establecemos con los demás. Lo vemos, verbigracia, en el nomadismo creativo como estilo de vida opuesto al sedentarismo estancado (Andrea Zittel, Atelier van Lieshout), en las relaciones a salto de mata, sin ataduras ni contratos matrimoniales (Nan Goldin, Yayoi Kusama), en la búsqueda de otras formas de comunicación distintas a las que marca el mercado y el consumo (Hélio Oiticica), en la experimentación de drogas y sus distintas consecuencias (Larry Clark, Hélio Oiticica) en las nuevas configuraciones o hábitats de lo cotidiano (Isidoro Valcárcel Medina), en el cuestionamiento del control social, disciplinario, vigilante (Ann-Sofi Sidén), en la libre creación de acontecimientos, en la supuesta ilógica del discurrir del sujeto (Eija-Liisa Ahtila). La micropolítica se infiltra tanto en los meandros de la psique (Gina Pane) como en las constricciones sociales de determinadas imágenes sexistas de la mujer (Cindy Sherman), sin dejar de lado el grito reivindicativo de lo personal hecho público (activismo feminista de las Guerrilla Girls, activismo sobre el Sida de Pepe Espaliú y del colectivo Gran Fury). Y ello sin desatender, como es debido, al influyente entorno social, macropolítico en que resuenan también las realidades humanas como polifonías discordantes. 46

5 Kate Millett, Sexual Politics, 1970. Traducido como Política sexual, Madrid, Cátedra, 1995. concinnitas


Resonancias: arte y vida. Una lectura de Jacques Rancière

Resonancias: arte y vida. Una lectura de Jacques Rancière1 Aurora Fernández Polanco* Al iniciar el trabajo con el grupo de investigación “Arte y Política: Argentina, Brasil, Chile y España, 19892004” creía necesario redefinir las relaciones entre arteestética y política de manera que – en el contexto de mis preocupaciones con la imagen-testimonio – la relación del arte con la vida quedara asegurada y además solucionado el tan desgastado asunto de la “eficacia”. Para ello he acudido a algunos aspectos del pensamiento del filósofo francés Jacques Rancière. Arte y política, memoria, representación

13 de Marzo de 2001: los dos Budas gigantes de Bamiyán, esculpidos en arenisca durante los siglos III y IV, y situados a unos 130 kilómetros de Kabul, la capital de Afganistán, fueron destruidos utilizando para ello poderosos explosivos. Me sorprendí enormemente al darme cuenta de que una imagen que solo había visto en los medios, aislada y considerada – ¡en aquellos tiempos de iconofobia! – como el icono-arte por excelencia Buda, Afeganistão

* Aurora Fernández Polanco es profesora titular de Teoría e Historia del Arte Contemporáneo en la Universidad Complutense de Madrid (España), ha publicado numerosos libros y catálogos y comisariado exposiciones. 1 Este texto es una revisión de la ponencia “La resonancia de lo político: Entre el arte, la teoría,la vida”, presentada en “Lo político desde el arte”, primer seminario de investigación del Proyecto de investigación (I+D): “Arte y Política: Argentina, Brasil, Chile y España, 1989-2004” celebrado en Madrid, La casa encendida, en 18, 19 de mayo del 2006. 2 Esto me hace pensar en el patrimonio de la humanidad como un parnaso de héroes, en el sentido del héroe que comenta Roland Barthes que habla “un lenguaje intemporal, cuya “transparencia” y neutralidad se supone que casan con la universalidad psicológica del alma humana”. R. Barthes: “La división de los lenguajes” en El susurro del lenguaje, Barcelona, Paidós, 1987, p. 121. 3 Como miembro del I+D “Imágenes de la violencia y el mal en el arte y la cultura contemporánea” (2002-2004). Dir: Valeriano Bozal. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

y que (¿quizá por ello?) pertenecía al Patrimonio de la Humanidad,2 estaba ubicada en un pueblo. Fue al ver un documental en el que la periodista regresa a su Kabul de infancia. El desasosiego que le produce el saqueo llevado a cabo por el régimen talibán en el museo de Kabul se acrecienta ante los huecos de las impresionantes moles de los budas. Al llegar el coche que le conduce a Bamiyán puedo ver por primera vez el contexto de vida que rodea a los Budas. La interjección en inglés – Jesus! – está matizada por el murmullo de fondo de un partido de fútbol que los chicos del pueblo están jugando a los pies de los desaparecidos budas. El hecho de que los medios hubieran evitado la vida que rodeaba al icono por excelencia del arte fue para mí una “imagen” que cristalizaba las consideraciones que aún tiene la sociedad de la obra autónoma y de su presumible fracaso, su agotamiento al menos. Me refiero a las obras que se exponen en un contexto de arte que “supuestamente” las aísla del de la vida. Trabajaba entonces3 con imágenes que inevitablemente debían “hablar” de la vida; me preocupaba por el estatuto de la imagen-testimonio y su relación con los acontecimientos traumáticos, su credibilidad o incredibilidad, su capacidad o incapacidad para “hacernos ver” el sufrimiento, para hacernos pensar; la idoneidad de la imagen (ficción o documento) para construir la historia y la memoria. Una imagen 47


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políticamente eficaz en este sentido.4 Coincidía todo ello con la época post-torres gemelas y la imagen-testimonio, que había tenido una importancia fundamental en torno a la guerra del Vietnam, parecía caer en descrédito. En realidad el debate estaba abierto desde la primera guerra del golfo y su carácter de evento “construído” por los medios.5 Del efecto heredero del “ça a été” barthesiano se pasaba ahora a la crisis del referente.6 “No has visto nada en Hiroshima, nada en Sarajevo, decía Godard en sus Historie(s) du Cinema. No vimos nada tampoco respecto a los sucesos del 11 S: ”Veíamos siempre la misma cosa, mejor dicho, no vimos nada” (...) Todo lo que estaba más allá o más acá de la ficción, todo aquello que no fuera demostrar el carácter increíble del acontecimiento, había sido suprimido”.7 La pregunta sigue siendo qué puede significar “ver” en este contexto en el que lo incluye Godard, tan cercano al monologo inicial de la película Hiroshima mon amour. Mis preocupaciones estético-políticas se encontraban muy lejos de la “estética de lo irrepresentable” defendida por el Lyotard que se aproxima a la teoría de lo sublime (más burkeano que kantiano) y que toma como disculpa la obra de Barnett Newman. De este modo me acercaba a los iconodulos e intentaba comprender sus propuestas, especialmente al discurso de “ver algo” que defendió en sus momento Georges Didi-Huberman en torno a aquellas imágenes que en sus palabras “tocaban lo real”. Sabía a qué imágenes se refería Didi-Huberman en su libro Imágenes pese a todo, donde su teoría de la imagen abarcaba otros ámbitos también. En cuanto al debate Godard-Lanzmann no solo hablaban de cine, sino de la política de la verdad en torno a las imágenes “documentales”. Lo que ahora me interesa repensar – y por qué – es qué imágenes me interesaban a mí, con qué imágenes había dedicido trabajar cuando hablaba de la “representabilidad del horror”. Sentía (en su doble acepción de percepción y “lamento”) que mi interés se alejaba de “las obras de arte” concebidas para ser expuestas en museos y en aquellos espacios de arte según el formato “expositivo”, para centrarme, casi exclusivamente, en las fotografías, películas o documentales que trabajaban en la dialéctica realidad/ficción (entendida en el sentido de referente/significante) y, de este modo, implicarlas en la construcción de la historia y el trabajo de memoria. Como si sólo desde estas prácticas se pudiera de alguna manera “tocar lo real”. Mientras trabajaba sobre las películas Hiroshima mon amour, Shoah, Noche y niebla, dejaba de lado aquellos trabajos artísticos que recoge, por ejemplo, la exposición “Mirroring Evil: Nazi Imagery/Recent Art”, que se acababa de celebrar en el Jewish Museum de Nueva York ¿Por qué ese-inconsciente-rechazo? 48

4 El trabajo partía de la polémica que entonces tenía lugar en Francia en torno a la representación de la Shoah. Ver a este respecto Fernández Polanco, A: “Shoah y el debate Lanzman (Moisés) /Godard (San Pablo) Lanzmann (Moisés)” en Er, Revista de Filosofía, no 33, Barcelona, 2004. Vengo manteniendo la investigación en mi curso de doctorado Experiencia y memoria: sobre el estatuto de la imagen-testimonio en el siglo XX. Intentamos escapar de alguna manera al “eurocentrismo” y son los alumnos los que proponen cada vez trabajos más “expandidos”. En este sentido quiero destacar la tesis doctoral que está llevando a cabo la doctoranda Lara García Reyne en torno a los trabajos de Alfredo Jaar y el genocidio de Ruanda. En la página web del proyecto de I+D http://www.ucm.es/info/ artepltk/, se puede ver su paper “De gorilas en la niebla a los ojos de Gutete Emerita. Mi trabajo se centra especialmente en el estatuto de la imagen-testimonio a lo largo del siglo. Soy consciente del desarrollo que actualmente tienen lugar en el ámbito anglosajón los denominados “trauma studies” pero, pese a nutrirnos de algunas lecturas fundamentales, no es éste nuestro ámbito de trabajo. 5 Estoy de acuerdo con el debate, no con las soluciones fáciles defendidas por Baudrillard sobre la guerra “como imagen”, o la más peligrosa aún de su “inexistencia”. 6 “Exactamente eso es lo que fue la cautivadora imagen del hundimiento de las Torres Gemelas: una imagen, una apariencia, un “efecto” que, al mismo tiempo, expresaba “la cosa en sí”. Ese “efecto de lo Real” no es el mismo que, allá por los años 60, Roland Barthes llamaba ’effet du réel”: es más bien todo lo contrario,’l’effet du irréel. Dicho de otro modo, en contraste con el barthesiano effet du réel, en el que el texto nos lleva a aceptar como “real” su producto ficticio, aquí, lo Real mismo, con el fin de sustentarse, ha de percibirse como un espectro irreal y pesadillesco”. Slavoj •i•ek: Fotografía, documento, realidad: una ficción más real que la realidad misma. (es.geocities.com/ zizekencastellano/conffotograf.htm) 7 Libération 06/04/2002. Mientras que en la guerra civil de Ruanda o en otras regiones del mundo, Kosovo, o Bosnia por ejemplo, las imágenes del horror eran difundidas sin vergüenza alguna en el mundo entero. Thierry Jousse: “New York,11 septembre,l’envers du spectacle” en Cahiers du cinéma, octubre,2001, p. 11. Es importante también el hecho de que a la ralentización y la repetición del desplome de las torres en tiempo real se añadiera la privación de sonido, lo que producía un desarraigo de la imagen. En el mismo artículo se ensalza sin embargo el documental de apenas 15 minutos filmado tres días después del anteado por concinnitas


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Me encontraba entonces involucrada en reflexiones cercanas al pensamiento frankfurtiano y su critica a la fantasmagoría y el espectáculo; su denuncia de aquellas imágenes (bien del “arte afirmativo” o de la “industria cultural”) que actuaban como velo y cubrían – disimulaban – la contradicción y el dolor; su defensa, por ello, de un arte cuyo cometido fuera rasgar ese velo fantasmagórico. Mi concepción del arte y la experiencia que provoca, se basaba en términos de “resistencia” a esta fantasmagoría.8 Los filósofos de la escuela de Frankfurt todavía imaginaban un exterior desde donde resistir o, más bien, un “verdadero mundo de experiencia” cubierto por la fantasmagoría. Recientemente, las teorías de Negri y Hardt nos hablan de configuraciones de poder que crean una trama “imperial” a la que no se puede resistir desde ningún sitio. La palabra “resistencia” nos acerca inevitablemente a la vía foucaultiana que recaba en el “biopoder” (cuando el poder toma la vida como objeto de su ejercicio) y se interesa fundamentalmente en aquellas prácticas que se le resisten desde la propia vida y, al resistírsele, tengan la capacidad de crear formas de subjetivación y formas de vida que escapen precisamente a los biopoderes. De manera que en este nuevo estado de cosas resultaba inevitable aproximarse a nuevos presupuestos estéticopolíticos. Hemos comprendido muy bien – y aplaudido – especialmente en los últimos 20 años, todas las prácticas de micro-resistencia, las micropolíticas, las micro-situaciones que se engloban unas y otras en un discurso sin fin. Como herederos de las propuestas del entorno del 68 próximas a Marcuse (arte=vida), estuvimos dispuestos a emprender una defensa del “activismo” como única estrategia artístico-política “eficaz” y a dejar prácticamente a un lado la obra que se pretende del lado de la inmersión contemplativa y ello para pasar al campo fenomenológico de la experiencia de la mano de una reivindicación del cuerpo y de las relaciones interpersonales. Laurence Häim. El documental, de sobrios comentarios, que nos permitía deambular por un Nueva York deshecho:...”durante 15 minutos nos ha parecido creer que veíamos lo que ocurría en Nueva York”(El subrayado es mío). 8 Este es un punto en el que actualmente estoy trabajando a la luz también de las nuevas consideraciones de Susan Buck-Morss, frankfurtiana durante tanto tiempo, y que ahora (“Estudios visuales e imaginación global” en Estudios visuales (Ed. Jose Luis Brea), Madrid, Akal, 2005) defiende “nuestro capital de imágenes” que es lo que en última instancia nos constituye como comunidad: “somos nuestras imágenes”. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Todo ello, el hecho de tomar en consideración positiva las estrategias políticas del cine (ficción, documental…) y el denominado “activismo”, me hizo re-pensar la situación actual de las “obras de arte/políticas” realizadas para ser contempladas bajo el “formato exposición”. Piezas que pueden englobar todo el amplio campo semántico del “arte para ver” tal y como lo entendemos, desde la pintura a las instalaciones, videos y videoinstalaciones; obra que, en general, ha sido realizada para ser expuesta y contemplada (el lugar no es pertinente, da lo mismo estar viendo algo en un museo que un una vieja fabrica de tabaco o en el patio de un colegio semiderruido, la cuestión está en “ir a ver” algo 49


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que se ha “adecuado” para esta mirada). El “formato exposición” parece estar cada vez más cuestionado pues no solamente está perdiendo potencial poético, sino también “eficacia” política. Si esto ocurre de forma general, su insuficiencia se acusa en mayor manera si se trata de asuntos relacionados con el sufrimiento humano (pobreza, hambre, exclusión, guerras, violencia de género). Y esto tiene lugar precisamente en momentos en los que, especialmente para determinados asuntos de “micropolítica”, se pide la eficacia que conlleva el hecho de “dar visibilidad”.9 Por todo lo expuesto, al iniciar este nuevo trabajo con el grupo de investigación “Arte y Política: Argentina, Brasil, Chile y España, 19892004” creía necesario redefinir las relaciones entre arte-estética y política de manera que – en el contexto de mis preocupaciones con la imagentestimonio – la relación del arte con la vida quedara asegurada y además solucionado el tan desgastado asunto de la “eficacia”. A Jacques Rancière le agradezco haberme hecho detener de nuevo ante otra estatua, la Juno-Ludovisi de la que habla Schiller en sus “Cartas sobre la educación estética del hombre” publicadas en 1795. Digo inesperadamente por lo inhabitual de “ésta” referencia a Schiller. En las últimas décadas siempre que nos hemos referido a él ha sido de la mano de Marcuse y el libre juego para desembocar, inevitablemente, en la ecuación arte=vida. Pero ahora Rancière me introducía de lleno en el reino de la “apariencia libre”. Para hacernos comprender la paradoja que “liga la politicidad del arte a su autonomía misma”, Rancière parte de la carta XV de Schiller donde se nos invita a considerar la estatua de la Juno Ludovisi, una creación perfectamente cerrada, dado que la “forma plena” (Rancière traduce por “apariencia libre”) descansa y habita en sí misma. Ante ella, dice Schiller, “nace esa maravillosa emoción para la que el entendimiento carece de conceptos y el lenguaje de palabras”. Ante la diosa, por estar ella liberada de toda atadura, de toda finalidad, de todo deber, de toda preocupación, quien la mira siente en sí – por encontrarse en un estado de “libre juego – esa promesa de que el ocio y la despreocupación de la condición divina pasaría un día a la humana”. Rancière descarta toda vinculación con la obra autónoma, cerrada sobre sí misma greenberiana; no le interesa “la autonomía del hacer artístico”. De Schiller rescata el impulso de juego y la apariencia libre de la Juno, pero sobre todo que a partir de este momento de la modernidad en el que se puede hablar de un régimen estético de las artes,10 el ejemplo ante Juno nos introduce en la autonomía “de una forma de experiencia sensible” de un “sensorium” específico, una cierta 50

9 En marzo de 1996 comisariaba la exposición “La visón impura. Fondos del MNCARS”. La forma de ordenar fondos de la colección de un museo presentando una tesis teórica (cuestionar la opticalidad pura imperante en la gran andadura del formalismo) me hizo reconsiderar la “eficacia” del formato exposición para considerarlo en cuanto “evento visual” que, en palabras de Mieke Bal, “pretende llamar nuestra atención sobre la situación concreta en la que un objeto visual se muestra y en la que el espectador lo contempla, lo absorbe y lo redefine. El término pone de relieve la negativa a ver las obras de arte como objetos autónomos que viajan a través del tiempo y el espacio con una identidad inalterable”. M.Bal: “El dolor de las imágenes” en Cuerpo y mirada: huellas del siglo XX, (Ed. Aurora Fernández Polanco), Madrid, MNCARS (En prensa). Este texto da cuenta precisamente de una exposición que Mieke Bal considera “filosófica” Beautiful Suffering: Photography and the Traffic in Pain 28.1-30.4. 2006. Williams College Museum of Art, MA, USA. En el texto insiste en el hecho de que tales eventos visuales “se dirigen a un público y dialogan con él; son potencialmente formas de pensamiento”. No es este el lugar, pero aquí se iniciaría toda un diálogo que quizá me haría cuestionar el por qué de no haber tenido en cuenta el formato expositivo en asuntos directamente implicados con la “representabilidad del horror”. 10 Donde las palabras y las formas, lo decible y lo visible, lo visible y lo invisible se relacionan los unos con los otros según procedimientos nuevos (...) la imagen ya no tiene la expresión codificada de un pensamiento o un sentimiento) es una manera en la que las cosas mismas hablan y se callan. Viene a alojarse de alguna manera en el corazón de las cosas como su palabra muda. Jacques Rancière: Le Destin des images, París, La Fabrique, 2003, p. 9) concinnitas


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forma de aprehensión sensible, una dimensión que esté separada del mundo de la “manipulación práctica de objetos útiles”. La estatua de Juno es arte porque pertenece a un sensorium específico El arte autónomo (“el de la forma rebelde”) en el que peligra la sustitución de la “vida” por el arte y el arte que atraviesa en diagonal y cortocircuita los espacios de la vida hasta confundirse con ella (la herencia del devenir vida del arte), conviven perfectamente en el régimen estético. Una de las tesis centrales del pensamiento de Rancière es que el régimen estético del arte ha vivido siempre de la tensión de los opuestos. En él, se pueden admitir todas aquellas “formas sensibles heterogéneas por contraposición a las formas ordinarias de la experiencia sensible”. La especificidad del arte define las cosas del arte en función de su pertenencia a “un sensorium diferente del de la dominación”.11 De manera que en este orden de cosas y fundado sobre este sensorium específico, según Rancière, en el régimen estético de las artes pueden convivir la Juno Ludovisi con Spelling U-T-O-P-I-A (2003) de Michael Elmgreen & Ingar Dragset, con una deriva situacionista o una performance. Y la

Michael Elmgreen & Ingar Dragset. Spelling Utopia. Instalação, Estação Utopia, Bienal de Veneza, 2003

eficacia de todas estas obras ya no era la del modelo pedagógico sino la del “disenso”. Durante su intervención en el seminario “Las imágenes del arte. Todavía”,12 Jaques Rancière proyectó una obra de Esther Shalev-Gerz, una artista de origen lituano y nacionalidad israelí que había trabajado sobre los objetos de los presos que pertenecen al memorial de Buchenwald. “Me interesa particularmente”, decía, “la elección de un material y de un tratamiento ‘ficcionales’ que elude el dilema habitual de saber si es necesario o no representar el horror de los campos de concentración. Esther Shalev-Gerz fotografió una serie de objetos que pertenecieron a los presos de Buchenwald, en concreto aquellos objetos que ellos mismos transformaron, desviados del uso que les era asignado por la administración del campo para adaptarlos a un uso ‘estético’: como por ejemplo un peine recortado en una regla de medir utilizada por los trabajadores de la construcción, un espejo, un anillo o un broche hecho con materiales de recuperación.”13 En lo que a mis preocupaciones

11 J.Rancière: Sobre políticas estéticas, Barcelona, Macba/UAB, 2005, p. 25. 12 Cuenca. Uimp. Dirigido por José Larrañaga y por mí en septiembre de 2006. Actualmente está en prensa el libro que recoge las ponencias de Jose Luis Brea, Valeria Graciano, Jacques Rancière, Suely Rolnik y las nuestras propias. 13 Jacques Rancière: “Estética y política: las paradojas del arte político” en Las imágenes del arte (todavía), (Ed. Aurora Fdez Polanco y Josu Larrañaga, Uimp, Cuenca, 2007, (en prensa). ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

sobre el estatuto de la imagen-testimonio se refiere, me parecía que la potencia de “las imágenes del arte”, su potencial poético (es decir, político), su eficacia, se hallaba en el modo intersticial que tienen de operar en un discurso. Un discurso hecho precisamente de imágenes que montamos en nuestra cabeza (o en nuestro Power point). Me daba cuenta al ver las imágenes que Rancière proyectaba de las obras de Esther Shalev-Gerz o de las fotografías de la serie WB realizada por la fotógrafa francesa Sophie Ristelhueber en la orilla occidental del Jordán. 51


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Aquellas imágenes nos hablaban – en su discurso – en la pantalla y en nuestra imaginación hasta el punto de vernos obligados a repensar esa “imaginación global” que ocupa el citado artículo de Susan Buck-Morss. Claro que la exposición como evento visual en los términos en los que la plantea Mieke Bal, no es sino otra forma de “montaje”. Pensar y sentir la doble acepción de esta palabra quizá ayudaría a muchos proyectos curatoriales. Lo rescatable de Rancière, no es tanto que nos libere de una separación entre arte autónomo (“la forma rebelde”, la de la heterogeneidad radical) y aquél que se confunde con la vida, sino que nos aconseje la estrategia de no hacerlos rivales y así saber cual de los dos es político. Los dos, respondería: porque el régimen estético permite pensar en la comunidad de esencia que liga al arte y a la política, porque “los dos construyen ficciones, es decir reagenciamientos materiales de signos y de imágenes, relaciones entre lo que vemos y lo que decimos, entre lo que hacemos y lo que podemos hacer”. Y este es a mi modo de ver el punto más impactante de su doctrina que resumo a continuación: la política consiste en la reconfiguración de la división de lo sensible. Cuando las prácticas y las formas de visibilidad del arte intervienen en la división de lo sensible y en su reconfiguración, entonces nos situamos en medio de la relación entre estética y política. Así, hablamos de estética de la política cuando nos referimos al proceso de creación de disensos y de política (o las políticas) del arte cuando hablamos de interrumpir las coordenadas normales de la experiencia sensorial, como una forma de sensorium especial capaz de resistir al consenso. Como una forma de disenso también. El consenso y las prácticas de consenso equivalen a la univocidad del sentido y se emparentan con la unificación de la circulación mediática. Con todo ello, dice Rancière, arte y política son dos formas de división de lo sensible y las dos dependen “de un régimen específico de identificación: no siempre hay política, a pesar de que siempre hay formas de poder. Del mismo modo no siempre hay arte, a pesar de que siempre hay poesía, pintura, escultura, música, teatro, danza”.14 Aquí es cuando, manipulando un poco el sentido de la frase, me atrevería a puntualizar: el arte, como la política, es un espacio de heterogeneidad, pero no siempre hay arte pensamos nosotros muchas veces ante obras “sin sentido” por mucho que pertenezcan por derecho propio al régimen estético, y, justamente por ello, pertenezcan a ese espacio de heterogeneidad. Y no estoy hablando de “la disolución ética de la heterogeneidad estética”, aspecto que tanto disgusta a Rancière ¿Qué hacer entonces? Comienza a ser necesario un honesto ejercicio crítico 52

14 J.Rancière: Sobre políticas estéticas, Barcelona, Macba/UAB, 2005, p. 20. concinnitas


Resonancias: arte y vida. Una lectura de Jacques Rancière

(para reconocer al arte crítico), una crítica que al menos se aproxime o aventure a “razonar” de alguna manera cuándo no hay arte en el sentido de que aquello que se nos presenta a consideración no abre para nosotros un espacio de heterogeneidad, sino que se asimila al “consenso”, al comportamiento homogeneizador de las visibilidades al que parece hermanarse. Si hago este comentario que puede acercarse a postulados “modernos”, es porque quería comprender el acercamiento de Rancière a las tesis que Nicolas Bourriaud expone tanto en su Estética Relacional como en su libro Postproducción. Del arte relacional destaca el hecho de que no se proponga crear objetos sino situaciones y encuentros. La llamada “estética relacional” es necesaria – dice Ranciére – cuando la política ha fracasado precisamente en la tarea de crear convivialidad: “mediante pequeños servicios el artista corrige los fallos del vinculo social”.15 No comprendo muy bien que prácticamente se inaugure con ella el milenio (el libro de Bourriaud es de 1998) y que su último trabajo Postproducción elimine radicalmente toda genealogía y toda “hermandad” con algo que está en el mundo del arte desde finales de los 60. Lo dicho y más aún, que se reclame como un arte que se proponga “crear ya no objetos, sino situaciones y encuentros”. Recordemos el manifiesto del Arte Povera que resume un “estado de ánimo” epocal: “ni cuadros, ni esculturas, sino acciones y situaciones”. A no ser que todo esto sea nuevo porque ha de hacerse específicamente en los museos y los grandes espacios “lujosos” – que dirían en los 70 – del arte... Porque ya nos habían dado las pautas: la obra entendida como generadora de actividades y comportamientos, la obra en tanto “soporte de experiencias”, el arte que de este modo “nos restituye el mundo en tanto experiencia por vivir”. Lo hemos visto en la generación de los Pistoletto arrastrando su bola de periódicos por Turín o las derivas de los situacionistas; Lygia Clark con sus objetos sensoriales, en fin, nuestros artistas de Lavapiés (Madrid) con sus “Casas y calles” o las prácticas del colectivo SDF al teñir de rojo en plena guerra de Irak las fuentes de Madrid. Rirkrit Tiravanija, el mayor exponente de esta “estética relacional” que cocina sopas Taiwandesas en los mejores museos, siempre habla de Marcel Broodthaers, ¿por qué será? La falta de alusiones a la historia como si todo estuviera transcurriendo en un presente puro me desconcierta (negativamente). La historia encarnada en las artes visuales lo hace como espacio-tiempo y va negociando el peso de cada uno de los términos dependiendo de las situaciones. No 15 N.Bourriaud: Esthétique relationnelle, París, Les Presses du Réel, 1998, p. 37. Citado por J.Rancière: Sobre políticas estéticas, op. cit., p. 50. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

tanto un tiempo, como un espacio antropológico (así lo propuso Aby Warburg) donde las cosas resuenan. 53


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Hay que reconocer que el propio Rancière considera que este “intersticio social” esta invención de “modos de estar juntos”,16 que tiene todo mi apoyo cuando no están detrás las grandes instituciones, es poco ambicioso: “no son únicamente formas de civilidad lo que habríamos perdido, sino el sentido mismo de la co-presencia de las personas y de las cosas que es lo que conforma un mundo”.17 Porque hay política cuando se perturba el acuerdo el consenso que habita en el corazón de la policy (en cuanto organización del Estado, en cuanto la que se encarga de repartir la palabra) y ello se hace “mediante operaciones disensuales, montajes de consignas y acciones que vuelven visible lo que no se veía, muestran como objetos comunes cosas que eran vistas como de dominio privado...”.18 Las dos, estética y política, decíamos antes, construyen ficciones “reagenciamientos materiales de signos e imágenes” y, para ello, necesitan de la imaginación como facultad política y de la metáfora “que desquicia el orden lingüístico” y provoca desplazamientos de lugar. Las metáforas nos abren un mundo nuevo, nos hacen vivir la virtualidad de lo posible, por ello, dice Brian Holmes, “son los jeroglíficos de un lenguaje desconocido, la exigencia de una comunidad inaudita”.19 Vemos funcionar estas metáforas de modo repentino y comunitario, en gestos de “micropolítica”: cuando el grupo Ne pas plier, en colaboración con la asociación de personas sin empleo Apeis (Asociación para el empleo, información y solidaridad), elevó retratos de rostros anónimos realizados por Marc Pataut por encima de la multitud en 1994 – rostros individuales sobre un mar de seres humanos manifestándose. Y tantas otras ocasiones que muchos de vosotros y vosotras habéis protagonizado... 20 Pero ¿y lo que se muestra en “formato exposición”? ¿Cómo pensarlo para no traicionar su capacidad de disenso? Debemos cuidarlo si el espacio expositivo o el museo, como dice Rancière, está implicado en “sorprender las expectativas de quienes lo visitan y contribuir con el choque de la experiencia a formar un sensorium diferente. El sensorium del arte (que) es siempre un “sentido común” paradójico, un sentido común disensual, hecho de acercamiento y de distancia”. Así y sólo así la relación con la obra en el museo generará un choque emotivo, formal y conceptual; como (todavía) ocurre con la poesía escrita y Schiller quería para la experiencia de su Juno Ludovisi, un sensorium especial que no tenga que ver con las formas ordinarias de la experiencia sensible y nazca “esa maravillosa emoción para la que el entendimiento carece de conceptos y el lenguaje de palabras”.21 Sólo así podrá derivarse de aquello que vemos, del entorno en que paseamos un potencial poético, 54

16 Vid: Valeria A. Graziano: “Intersecciones del Arte, la Cultura y el Poder: Arte y Teoría en el semiocapitalismo”, en Estudios Visuales (Ed.Jose Luis Brea), Madrid, Akal, 2005. M.Ball, en el artículo citado, se refiere a Jill Bennett y su concepto de “estética de la relación”. Y dice: El término “estética relacional” circula actualmente en una versión más o menos alusiva a este tema en Bourriaud. Aunque Bourriaud, comisario, ofrece una descripción útil de los problemas relacionados con el tráfico del arte, el enfoque de Bennett es mucho más analítico y profundo. Vid Jill Bennett: Empathic Vision: Affect, Trauma, and Contemporary Art (Cultural Memory in the Present). Stanford, CA: Stanford University Press, 2005. 17 J.Rancière, Sobre políticas…, op. cit., p. 51. 18 Ibidem, p. 56. 19 Holmes, Brian. “Jacques Rancière y la estética de la igualdad”. Brumaria (no 1), pp. 137 y ss. Esta frase la he tomado citada en el interesante artículo de Carlos Jiménez Estética y antiglobalización, Lápiz. Revista Internacional de Arte no 206, octubre 2004. 20 Quiero dejar aquí esta frase fruto de un discurso hablado para que permanezca viva la memoria de nuestro auditorio habitual: artistas jóvenes, entusiastas, en acción. Ver en nuestra página Web del proyecto, anteriormente citada el paper de Loreto Alonso: “En contra del Vuelveté como yo y respetaré tu diferencia. Alineación y alienación en la producción distraída.” 21 F.Schiller: Kallias. Cartas sobre la educación estética del hombre, Barcelona, Anthropos, 1990, p. 243. concinnitas


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político, en última instancia. Porque ¿no es para Rancière la potencia de la invención poética la que abre al mismo tiempo que un espacio artístico uno político? ¿No es la imaginación poética la que abre espacios de comunidad y es en la construcción de la imagen que hace posible una determinada experiencia sensible donde se abre al mismo tiempo un nuevo espacio político?22 Apariencia, juego, trabajo, son categorías de la división de lo sensible. Me interesa volver a rescatar el concepto de apariencia libre. Podemos ponerla en relación con otro orden de cosas. Cuando Rancière se refiere en La Mesentente a la democracia “verdadera” frente a la formal, dice que “la democracia es el tipo de comunidad definido por la existencia por una esfera de apariencia específica del pueblo (…) la apariencia no es ilusión que se opone a lo real. Es la introducción en el campo de la experiencia de un visible que modifica el régimen de lo visible. No se opone a la realidad, la divide y la refigura como doble. De manera que la apariencia es necesaria para impedir el régimen del “todo visible”, gracias a ella se pueden producir efectos de doblamiento y división. Porque la apariencia “no es la que esconde la realidad sino la que la dobla, es la que introduce objetos de litigio, objetos cuyo modo de presencia no es homogéneo al mundo de la existencia ordinaria de los objetos que son identificados”.23 Creo que esa “apariencia libre” que nadie ya se atrevería a llamarla así, tiene que ver con una determinada forma (forma significa en este Juno Ludovisi. Palazzo Altemps, Museo Nacionale Romano

sentido “encuadre”, señalamiento, trabajo empeñado en “dar a ver”); una formalización, podemos concluir, propuesta por alguien que tiene algo que decir. Algo que decir como sinónimo de “sentido”. ¿Por qué tanto miedo a que “alguien” tenga algo que decir? ¿Nos confundieron aquellos textos de finales de los 60 en los que fundamentamos unos festivos funerales por “la muerte del autor”? El arte piensa,24 el arte conserva (Deleuze) alguien se encarga de todo ello discretamente entre bambalinas. Alguien quiere – tiene irremediablemente la necesidad;

22 Sobre la “eficacia” remito al texto de Rancière en el citado seminario de Cuenca “Estética y política: las paradojas del arte político” en Las imágenes del arte. Todavía, op. cit., (en prensa). 23 J. Rancière: La Mesentente, París, Galilée, 1995, p. 89. Recojo la cita del artículo de JeanClaude Lévêque: “Estética y política en Jacques Rancière” en Escritura e imagen, no 1, 2005, pp. 179-197. 24 Ver en este sentido Van Alphen: Art in mind: How Contemporary images shape thought Chicago,The University of Chicago Press, 2005. 25 G.Deleuze y F. Guattari: Qué es la filosofía?, Barcelona, Anagrama, 1993, p. 164. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Deleuze una vez más – de decir algo “en un bloque de perceptos y de afectos”.25 Y precisamente a eso es a lo que me refiero cuando le doy tanta importancia a la “formalización”. Alguien, en algún momento, tiene algo que decir, siempre desde un contexto dado (olvidémonos de esencialismos). El otro, las otras, alguien que está a la escucha y dispuesto a participar en la empresa, se vería, qué duda cabe, desamparado sin emisor y sin mensaje. Y ahí encontramos la denuncia necesaria de una obra sin sentido. Tampoco quiero que esto suene a algo autoritario. Tener algo que decir no significa imponerlo, ni dar órdenes. Incluso puede que alguien no quiera decir nada, sino propiciar 55


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que otros intercambien sus pareceres; o que se rían, que disfruten de la fiesta ¿qué anfitrión verdadero está al margen de la forma/décor y de las preocupaciones de sus invitados (Marcel Broodthaers lo sabía muy bien, por eso era todo más creíble). Ahí tenemos, por tanto, en el decir, y en el propiciar el decir, un primer reconocimiento de lo político desde el arte. Ahora bien, con tener algo que decir no se trata únicamente de “emitir un discurso” o “transmitir un concepto”, “comunicar algo a alguien”. Tener algo que decir es tener la necesidad de hablar y no precisamente por hablar.26 “Todo arte es político pues se configura en un espacio de resonancia de distintas voces que quieren ejercer su derecho a hablar, a decir, dice Rancière. Con él, seguro, volvemos a Deleuze, y recordamos la importancia de hablar o decir en un sentido inverso a la invitación de los medios: El último año yo hablaba de esos llamados que eran el único lado despreciable de 1968: exprésate, exprésate, toma la palabra. Mientras que no nos damos cuenta, una vez más, que las fuerzas más diabólicas, son las fuerzas que incitan, que nos incitan a expresarnos. Esas son fuerzas peligrosas. Consideren la tele, no nos dice: ¡cállate!, nos dice continuamente: cual es su punto de vista, cual es vuestro punto de vista, cual es vuestro punto de vista sobre esto, cual es tu punto de vista sobre la inmortalidad del alma, sobre el genio de Pívot, sobre la popularidad de Maurois, etc… entonces es necesario expresarse. Se ordenará su barrio, se tendrá un cuaderno de cargos, todo eso. Digo que es un peligro, un inmenso peligro. Es necesario resistir a esas fuerzas que nos fuerzan a hablar cuando no tenemos nada que decir”. 27 (El subrayado es mío) Aquí es donde nada aparentemente cambia y todo se vuelve anacrónico. No se puede culpar a ninguna postmodernidad ni a los excesos de ésta. Quiero finalizar con una cita “moderna”, un fragmento de Bertold Brech sobre la radio. De repente se tuvo la posibilidad de decirlo todo a todos, pero, bien mirado, no se tenía nada que decir. Y ¿quiénes eran todos? Al principio se las arreglaban sin pensar en ello. Miraban a su alrededor buscando dónde se dijera algo a alguien, e intentaban colarse dentro con la simple competencia, y decir cualquier cosa a cualquiera. Esto fue la radiodifusión en su primera fase en calidad de sustituto. Sustituto del teatro, de la ópera, del concierto, de las conferencias, del café concierto, de la prensa local, etc.28

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26 Decir o cantar. De alguna manera todos sabemos qué significa y en qué términos la importancia de ese decir. Quiero recomendar por ello un hermoso texto de Suely Rolnik: Deleuze esquizoanalista… (www.campogrupal.com/deleuze.html) 27 Deleuze / image mouvement image temps El plan – 02/11/1983(www.webdeleuze.com) 28 Bertold Brecht, Teoría de la radio (19271932) en El compromiso en la literatura y el arte, Barcelona, Península, 1973, p. 88. concinnitas


Activismo ecologico y arte medioambiental: el caso de César Manrique

Activismo ecologico y arte medioambiental: el caso de César Manrique Javier Hernando Carrasco* La personalidad de César Manrique adquiere una particular actualidad en nuestros días, habida cuenta del hostigamiento a que está siendo sometido el medio ambiente. Uno de los factores de mayor incidencia es el crecimiento urbanístico desaforado, al haberse convertido de uno de los objetivos de especulación preferentes. El artista canario desarrolló desde su Lanzarote natal una verdadera actividad en defensa del medio ambiente, tanto a través de una práctica artística que con toda legitimidad puede calificarse de medio ambiental, como mediante un activismo muy activo que tuvo a la palabra como uno de sus soportes principales. Todo ello le sitúa como un preculsor del activismo ecológico ligado a la creación artística. Especulación urbanística, arte medio ambiental, activismo

España inició tras la crisis petrolífera provocada por la Guerra del Golfo, en 1992, un crecimiento económico ininterrumpido hasta nuestros días. Sin embargo una parte substancial de dicho crecimiento ha sido de orden especulativo, mayoritariamente centrado en la inversión inmobiliaria. Así lo expresa el número creciente de viviendas construidas anualmente que, en el año 2005, alcanzó las 800.000, superior a las levantadas en Francia, Gran Bretaña e Alemania juntas, con una población que cuadriplica a la española. Además de una corrupción generalizada a lo largo y ancho del estado español que precisamente en este año 2006 está comenzando a ser puesta en evidencia por la justicia, este * Javier Hernando Carrasco es catedrático de Historia del Arte en la Universidad de León, crítico de arte y comisario de exposiciones. Ha publicado diversos libros sobre Teoría del Arte, Arquitectura y Arte contemporáneo; los últimos Modernidad y tradición en la arquitectura del siglo XX (Editorial Planeta, 2006) y Daniel Buren (Cendeac, 2006). Ha comisariado más de 30 exposiciones; la más reciente Daniel Verbis (MUSAC, 2006). Es crítico de arte de El Cultural de El Mundo y miembro del Comité Asesor del MUSAC. 1 Ramón Fernández Durán, El tsunami urbanizador español y mundial, Barcelona, Virus Editorial, 2006. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

“tsunami urbanizador español”1 está provocando una destrucción masiva del territorio con una desconsideración absoluta hacia la condición del lugar: desde fértiles vegas hortícolas hasta espacios protegidos por sus particulares condiciones medioambientales, los ayuntamientos, con el visto bueno de las comunidades autónomas correspondientes, llevan a cabo continuas “recalificaciones”, es decir, cambio de uso del suelo mediante la conversión en urbanizables de aquellos terrenos que no lo eran. Además de las periferias urbanas, la explosión de la fiebre de la segunda residencia, preferentemente en la costa, así como de los complejos turísticos: estaciones de esquí y puertos deportivos, están destruyendo de forma irreversible enormes áreas del territorio español. 57


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A los inversores especulativos nacionales y compradores de la segunda vivienda hay que sumar la presencia de los ciudadanos comunitarios que también las adquieren como segunda o tercera residencia, y para instalarse de forma permanente tras la jubilación, sin olvidar “la entrada masiva de capitales internacionales hacia el sector inmobiliario español (fondos de pensiones, de inversión e inmobiliarios, y también, cómo no, grandes cantidades de “dinero negro” de particulares y mafias internacionales”. 2 Aunque como he señalado este fenómeno se ha extendido como una mancha de aceite en el territorio español, la costa y las islas vienen sufriéndolo con particular intensidad al ser espacios de especial atractivo tanto por sus playas como por su climatología. Las Islas Canarias constituyen desde los años 60 un destino turístico de primer orden. Tenerife y Gran Canaria son por dimensiones y topografía las que acogen un mayor número de visitantes y por tanto las que han sufrido las transformaciones más prematuras e intensas como consecuencia de la creación de las infraestructuras turísticas. El resto: Fuerteventura, La Palma, Hierro, La Gomera y Lanzarote permanecieron hasta los años 90 casi al margen del desarrollo turístico, en buena medida por sus difíciles orografías y también por la escasez y calidad de sus playas, muy inferiores a las de las dos islas principales. Sin embargo, la belleza paisajística de esas cuatro islas volcánicas, ha hecho que cada vez con mayor intensidad se estén convirtiendo también en lugares de creciente demanda turística, con el consiguiente deterioro progresivo de su medio ambiente. La figura de César Manrique adquiere en este contexto una particular actualidad, ya que previó la deriva invasora de la construcción inmobiliaria, la expansión de las infraestructuras y por tanto la destrucción del territorio que acabaría afectando con el tiempo a su isla natal: Lanzarote. Será un preculsor del activismo ecológico, y una parte fundamental de su propia actividad artística estará condicionada por aquél, lo que permite calificarla como arte medioambiental. César Manrique fue un artista plástico, nacido en 1919, que estudió en la Academia de Bellas Artes de San Fernando en Madrid entre los años 1945 y 1950. Tras una primera etapa caracterizada por una figuración muy colorista con ciertos tonos regionalistas, sobre todo por su iconografía rural, a finales de los 50 penetró de lleno en el informalismo, una tendencia que tenía en Madrid, donde continuó residiendo hasta 1964, uno de los principales focos de difusión nacional. Practicará un informalismo matérico en el que plasmará genéricamente la orografía volcánica de Lanzarote, de manera que así conjugaba la plástica de vanguardia con su interés por la naturaleza. Así pues abandona los ribetes regionalistas que estaban presentes en 58

2 Idem, ibidem, p. 26. concinnitas


Activismo ecologico y arte medioambiental: el caso de César Manrique

su primera producción, condicionada sin duda por una formación académica, sustituyéndola por una abstracción que, formando parte del más puro informalismo matérico europeo del momento, le permite continuar hablando de la naturaleza de su isla natal. Lo hace de un modo más genérico, al sustituir los elementos figurativos propios de aquel territorio, por la representación de los valores consubtanciales al mismo: la rugosidad, la austeridad y expresividad matéricas, el peculiar cromatismo. Así de la misma manera que algunos artistas de ese foco madrileño reflejaron en sus obras el paisaje castellano, lo que dio lugar a la expresión de “informalismo mesetario”, bien podría decirse que César Manrique practicó un “informalismo volcánico”, paralelo al que en César Manrique. Jameos del Agua

el orden escultórico llevó a cabo su paisano Tony Gallardo. Entre 1964 y 1966 vivió en Nueva York. En aquella estancia quedará impregnado por el Pop Art, si bien dicha influencia se manifestará en sus obras escultóricas y en el design, más que en su pintura que se mantendrá fiel al espíritu informalista. Los colores planos del Pop y la recurrencia a los objetos de uso cotidiano tendrán su reflejo en los murales – género que él ya había desarrollado con anterioridad- en las obras cinéticas y en los objetos apropiados que convertirá en piezas escultóricas. De modo que César Manrique simultaneará desde entonces informalismo, arte cinético y objetual de ribetes pop, junto al arte medioambiental. A su regreso de Nueva York decide instalarse en Lanzarote en lugar de volver a Madrid, ciudad en la que además de formarse académicamente se había consolidado como artista. Sin duda tras aquella decisión se hallaba ya su voluntad decidida de trabajar en el rescate y protección de los elementos naturales y culturales de la Isla, más allá del simple retiro a un espacio alejado por entonces del bullicio turístico que ya empezaba a ser considerable en otras islas del Archipiélago. De hecho algunas de las intervenciones más significativas de César Manrique, como los Jameos del Agua, comenzaron a planificarse a comienzos de los años 60, es decir, antes de la marcha del artista a Nueva York. Decisiva fue a este respecto su amistad con José Ramírez Cerdá, presidente del Cabildo de Lanzarote, con quien siempre compartió un afán conservacionista. La recuperación de La Cueva de los Verdes y los Jameos del Agua, dos cuevas próximas entre sí que son el resultado del discurrir de la lava volcánica que en su proceso de enfriamiento generaron estructuras abovedadas: tubos volcánicos, que con el tiempo sufrirían derrumbes y así propiciarían la colonización vegetal y también el acceso, fueron ideadas en 1960 por ambos, y aunque las obras no concluirían hasta 1987, ya en 1964 se iniciaron los trabajos de acondicionamiento.

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César Manrique, durante su estancia en Nueva York, transmitía instrucciones para el desarrollo de los mismos a través de la correspondencia con José Ramírez, así como durante sus visitas estivales a la Isla.3 Cuando se instale de forma definitiva en Lanzarote aumentará su implicación en este y otros proyectos que desarrollará ininterrumpidamente hasta su fallecimiento.4 César Manrique se muestra como verdadero preculsor en su condición de artista comprometido con el medio ambiente, de artista activista. En este sentido podría situarse al lado de algunos otros que asimismo desde los años 60 hicieron gala de la misma actitud: los alemanes Hans Haacke y Joseph Beuys, o el norteamericano Alan Sonfist, entre otros. Curiosamente su punto de partida es clásico: la exaltación de la belleza. Sin embargo el artista considera que quien tiene sensibilidad para percibir la belleza no puede soslayar la realidad y por tanto la denuncia de todo aquello que perjudique el desarrollo humano se convierte en un deber moral. “Creo y siento profundamente”, dice “que todos los artistas contemporáneos que sentimos la armonía y la belleza como un estado superior de cultura instintiva, tenemos el deber moral y ético de salvar por todos los medios lo que nos rodea y denunciar todo lo negativo referente a la vida y su propio desarrollo. Creo que esta es la misión más importante de un artista de hoy”.5 De manera que el artista aplica su idea de belleza a las intervenciones en la naturaleza. Durante años simultaneó la producción de objetos plásticos autónomos: pinturas y esculturas, con la intervención en los espacios naturales, si bien durante los años 70 su dedicación intensiva a los diversos proyectos que estaba realizando en la Isla: Jameos del Agua, Montañas de Fuego, Mirador del Río… hizo que abandonara transitoriamente la pintura. Se trata de proyectos que persiguen la integración en el marco natural, que tienen como ha señalado Javier Maderuelo “una voluntad artística y un sentido 6

paisajista muy profundos”. Proyectos que han sido considerados por este mismo autor, particularmente Los Jameos del Agua, “como la primera de las obras que abriría este género (Earthworks y Land Art)”,7 aunque sus intervenciones se hallan más cerca de las “poéticas de la restitución”8 características de los artistas europeos que de la imposición sobre el territorio propio del Land Art norteamericano: exalta la acción contemplativa del paisaje mediante la construcción de miradores, recupera espacios a través de la máxima adecuación a los mismos, es decir, evitando introducir estructuras que violenten el lugar, configura jardines que se adaptan a la atmósfera geológica y vegetal donde se ubican. De manera que el artista traslada su sensibilidad artística a los espacios naturales. Aquella belleza volcánica que se metamorfoseaba 60

3 Sobre el proceso y carácter de esta obra véase Javier Maderuelo, Jameos del Agua, Fundación César Manrique, Taro de Tahíche, Teguise, Lanzarote, 2006. 4 Sobre estos proyectos véase Lázaro Santana, Timanfaya, Fundación César Manrique, 1997; Juan Ramírez de Lucas, Jardín del Cactus, Fundación César Manrique, 2000; Franciso Galante, Mirador del Río, Fundación César Manrique, 2000. 5 Tomado de César Manrique, La palabra encendida, Selección de textos e introducción de Fernando Gómez Aguilera, Universidad de León, 2005, p. 12. 6 Javier Maderuelo, op. cit. p. 91. 7 Ibidem. 8 José Albelda y José Saborit, La construcción de la naturaleza, Generalitat valenciana, Valencia, 1997, p. 160. concinnitas


Activismo ecologico y arte medioambiental: el caso de César Manrique

en sus lienzos informalistas, retorna a su lugar de origen, desvelándose en las coladas de lava solidificadas sobre las que el artista interviene. Para él la creación artística es también una cuestión antropológica. Sus proyectos buscan el diálogo íntimo con la geología, de forma que el resultado produzca un nuevo concepto estético, “una ampliación de las fronteras del arte, integrándolo en todas sus facetas en una simbiosis totalizadora que se define como VIDA-HOMBRE-ARTE”.9 La idea de César Manrique es similar al binomio ARTE-VIDA, VIDA-ARTE que enunciara el artista alemán Wolf Vostell, en su caso ligado a una aproximación de la acción artística al comportamiento cotidiano. Se podría decir que César Manrique disuelve su obra en la naturaleza, pone toda su capacidad creadora al servicio de unos lugares que, tras sus respetuosas intervenciones, quedarán consolidadas. Es el medio natural el que marca las directrices del proyecto, el que fija las normas, el que tiene absoluta prioridad en el propio diseño. Y en este sentido no parece arriesgado César Manrique. Mirador del Rio

tildar sus propuestas de arte medioambiental. Así una de las características reiteradas de sus proyectos es la ocultación; desde su propia casa, hoy sede la Fundación que lleva su nombre, hasta el restaurante levantado en el Parque Nacional de Timanfaya, pasando por el Jardín de Cactus, un botánico que ocupa el hueco de una cantera abandonada, convertido en un anfiteatro vegetal, ofrecen un grado de integración absoluto, un auténtico camuflaje en el terreno. La conciencia ecológica de César Manrique queda evidenciada no sólo en sus intervenciones conservacionistas sino también en los numerosos textos publicados en libros y en la prensa diaria; una parte considerable de ellos han permanecido inéditos y hoy forman parte del Archivo de la Fundación que lleva su nombre. El artista habla en ellos de la naturaleza “desde una aproximación intuitiva y visual, desprovista de fundamento científico o filosófico”,10 y desde luego evidencia una intensa preocupación por un devenir que siente amenazado. Ya en 1967 su diagnóstico no era muy optimista: “Lanzarote es una isla afortunada”, dice, “aunque aparentemente haya estado postergada y desacreditada durante largo tiempo, y que se tenía la idea de que su paisaje era horrible e inhabitable. Hoy se está empezando a conocer por gente sensible y buenos catadores de lo que realmente es el paisaje… Debido

9 “Arte-Medio ambiente” (c. 1985), en César Manrique, Escrito en el fuego (Edición de Lázaro Santana), Las Palmas de Gran Canaria, Edirca, 1988, pp. 48-51. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., p. 64. 10 Fernando Gómez Aguilera, op. cit., p. 16. 11 “Arquitectura inédita en Lanzarote”, El Eco de Canarias, 25.8.1967, tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., p. 26. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

a ello tenemos que colaborar urgentemente, ya que empiezan grandes zonas de Lanzarote a estar completamente profanadas”.11 A partir de esa percepción el artista se autoimpone el compromiso de luchar por todos los medios a su alcance para frenar el previsible desarrollo insostenible que, en efecto, ha terminado afectando a Lanzarote. Para lograr ese objetivo César Manrique articuló implícitamente una doble 61


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estrategia: la creación de una conciencia colectiva sobre el medio ambiente y la planificación de las infraestructuras turísticas. Por lo que respecta a la primera, el artista aprovechó legítimamente el prestigio que enseguida adquirió en la Isla para lograr que la conciencia ecológica fuera empapando a la sociedad lanzaroteña, convencido de que era el único modo de frenar un crecimiento agresivo para el medio ambiente. Pero el sentido proteccionista de César Manrique es de carácter integral, ya que no sólo afecta al medio natural sino también a las construcciones tradicionales. Porque, en efecto, la presencia secular del hombre en esa tierra inhóspita ha ido modelándola – por ejemplo articulando un sistema de conos para la plantación y protección de las viñas – y erigiendo una arquitectura adaptada a dicho entorno; una arquitectura integrada completamente en el mismo. El artista captó desde joven la sabiduría de aquellas construcciones, y supo calibrar su valor tanto arquitectónico como antropológico. En sus recorridos a lo largo y ancho de la Isla César Manrique la documentó exhaustivamente. Ya en 1967 publicó varios artículos en El Eco de Canarias, aunque su intención final era la edición de un libro que finalmente vería la luz en 1974: Lanzarote. Arquitectura inédita. De ese modo el artista llevaba a cabo en relación a Lanzarote el mismo trabajo que Fernando García Mercadal hiciera en 1930 a nivel nacional. En aquella ocasión el resultado fue La casa popular en España,12 de la que sin embargo se hallaban ausentes los dos archipiélagos. Mercadal fue uno de los primeros arquitectos españoles en asumir los presupuestos de la arquitectura racionalista, y como el resto de aquella primera generación, encontró en la arquitectura tradicional valores coincidentes con los de la vanguardia; por ejemplo la racionalidad, funcionalidad y verdad constructivas; valores que la nueva arquitectura plasmaría de otra manera gracias a los avances que la revolución tecnológica ponía a su servicio. Los proyectos arquitectónico-paisajísticos de César Manrique integrarán asimismo aquellos valores, incluso los materiales de la arquitectura tradicional lanzaroteña, buscando de ese modo no sólo la identificación de aquéllos con el medio natural sino también con esa herencia arquitectónica. Su labor de difusión de los valores paisajísticos y antropológicos de la Isla a través de sus escritos y de sus propias intervenciones, se complementó con una presencia constante en las acciones y manifestaciones públicas; es decir, con su papel de activista ecológico. Por ejemplo en 1988 encabezó la oposición a la edificación en la Plaza de los Pocitos. Pero toda esta labor es sólo el complemento de una verdadera estrategia que el artista desarrolló hasta su fallecimiento en 62

12 Reeditado en edición facsímil con prólogo de Antonio Bonet Correa, Ed. Gustavo Gili, Barcelona, 1981. concinnitas


Activismo ecologico y arte medioambiental: el caso de César Manrique

1992 y que consistió, como he señalado con anterioridad, en planificar, de manera implícita, el crecimiento urbanístico. Consciente de que sería imposible evitar la conversión de Lanzarote en un espacio de recepción turística y aprovechando sus relaciones de amistad con algunos responsable públicos de la Isla, César Manrique trazó de facto una verdadera política de ordenación del territorio, consistente en el establecimiento de unos puntos de atracción turística: Tindaya, El Mirador del Río, Los Jameos del Agua… modelados por él mismo, y en la limitación del número de camas hoteleras, lo que implicaba la contención de la expansión constructiva y por tanto la protección del territorio. Y, en efecto, hasta bien entrados los años 90, la conciencia amenazadora de César Manrique. Jardin del Cactus

César Manrique parece que logró contener, si no completamente, sí de forma considerable, la expansión urbanística. Esa mirada vigilante caló sin duda en amplísimos sectores de la población que de ese modo se convirtieron en cómplices activos de la posición defendida por el artista. Sin embargo enseguida comenzó a dar muestras de pesimismo. Así en 1979 afirma: “No he parado de luchar por la limpieza y el orden la Isla, pero a pesar de todo y de tener pocas personas que hayan entendido todo esto, ahora, últimamente, me encuentro bastante solo, al no ver efectividad positiva en ninguna dirección”.13 Esta evidencia no restó potencia a su reto; seguramente porque como dijera Antonio Gramsci de sí mismo, César Manrique era un pesimista de espíritu pero un optimista de voluntad. A través de sus escritos va dejando constancia de los males instalados en la sociedad e instituciones, que son responsables de la permanente degradación de la Isla. Así apunta hacia una legislación obsoleta: “La legislación existente para frenar la destrucción sistemática de la isla es

13 “Grito de socorro por las islas”(1979), en César Manrique, Escrito en el fuego (Edición de Lázaro Santana), Las Palmas de Gran Canaria, Edirca, 1988, pp. 110-122. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., pp. 53. 14 “Arte-Medio ambiente” (c. 1985), en César Manrique, Escrito en el fuego (Edición de Lázaro Santana), Las Palmas de Gran Canaria, Edirca, 1988, pp.58-51. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., p. 64. 15 “Optimismo utópico” (1985), en César Manrique, Escrito en el fuego (Edición de Lázaro Santana), Las Palmas de Gran Canaria, Edirca, 1988, pp.38-42. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., pp. 103-106. 16 “Fauna atlántica” (1985), en César Manrique, Escrito en el fuego (Edición de Lázaro Santana), Las Palmas de Gran Canaria, Edirca, 1988, pp. 137-138. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., pp. 73-76. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

caduca y reaccionaria”;14 la dejación de los poder públicos: “En el caso ocurrido en la isla de Lanzarote hay un ejemplo claro y palpable de visión de futuro y de presente, ya que el gobierno no ha intervenido para nada en frenar el desbordamiento masificado de la isla que podría haber sido la de mayor prestigio y belleza del mundo, como patrimonio de la humanidad. Lo único que interesa es llenarse los bolsillos al más corto plazo y después esperar a que venga el diluvio”;15 la falta de conciencia: “Tristemente no han comprendido el verdadero significado de esta afanosa tarea. Se ha tolerado la especulación, se han cometido barbaridades irreversibles que poco a poco van arruinando la isla… lo único que deseo apasionadamente es que se tenga una conciencia clara de la enorme responsabilidad que se contrae con la tolerancia de la especulación”.16 Hay una clara deriva hacia el pesimismo en el artista, como consecuencia de la impotencia que siente ante la degradación creciente del territorio que sus esfuerzos no han podido 63


Javier Hernando Carrasco

evitar. En 1985, y tras recibir el Premio Europa Nostra – una organización que reconoce la labor en la defensa de la arquitectura y medio ambiente – escribe un nuevo texto en el que se lamenta del modo en que algunos individuos están anulando los esfuerzos de tantos otros por consolidar la conservación de la Isla. Y concluye con una exclamación que es al mismo tiempo un manifiesto: “Momento de parar”;17 un manifiesto que en nuestros días ha incrementado su vigencia. La evidencia del rearme constructor a partir de la aprobación de planes urbanísticos que lo legitiman se hace realidad en los últimos años de la vida del artista. No es de extrañar por tanto que prenda el desánimo en él: “El peligro que se está sintiendo por minutos en Lanzarote es verdaderamente alarmante… El desprestigio y la caída de Lanzarote se están planificando con el sólo propósito de la explotación sin reparos y de la manera más urgente, para forrarse de millones a costa del prestigio que tanto trabajo y amor ha costado… pero lo más peligroso ha sido la enorme urgencia de licencias antes de la aprobación del Plan Insular, dando facilidades, en donde ha habido miles de permisos para construir a toda prisa…”.18 Poco antes de morir el artista graba un vídeo en el que hace un llamamiento dramático a la paralización del avance constructivo. Lo hace en un cementerio de coches, convirtiendo la informe masa de vehículos que le envuelven, en una metáfora del devenir de la Isla. Pese a todo en sus últimos días apela, en un discurso preparado para ser pronunciado el Día mundial del turismo en septiembre de 1992, a la responsabilidad colectiva: “No debemos desfallecer, hay que seguir adelante, estar vigilantes y mantener viva la conciencia crítica, pues el futuro nunca está conseguido”.19 La doctrina y la acción de César Manrique han sido continuadas por la Fundación que lleva su nombre, convirtiéndose por tanto no sólo en los herederos físicos de su patrimonio sino también de su filosofía activista. A los casi 15 años de su fallecimiento el deterioro medioambiental de Lanzarote se ha incrementado de forma considerable. También esta hermosa Isla ha sido objeto de la codicia especulativa, y con ello vuelvo al principio, que está asolando el territorio español en los últimos años. Todos los males que acosan y destruyen otras costas españolas, peninsulares e insulares, y tantos espacios del interior, están teniendo también allí su reflejo. La palabra y la obra de César Manrique parecen estar cada vez más sumergidas ante la ferocidad destructiva de promotores y constructores, arropados implícita o explícitamente por los poderes públicos, y el silencio de los habitantes. En efecto el futuro nunca está conseguido, como dijera el artista, o por decirlo de otra manera, siempre está amenazado. 64

17 “Alcanzar la meta de la utopía…” (1985). En Escrito en el fuego (Edición de Lázaro Santana), Las Palmas de Gran Canaria, 1988, pp. 123-124. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., pp, 68-69. 18 “Sexo y supervivencia” (c.1990), Archivo César Manrique, Fundación César Manrique. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., pp. 121-122. 19 S/T (Discurso preparado para ser pronunciado el Día mundial del turismo, en septiembre de 1992). Archivo César Manrique. Tomado de César Manrique, La palabra encendida, op. cit., p. 133. concinnitas


Arte, política y activismo

Arte, política y activismo Yayo Aznar Almazán y María Iñigo Clavo* El texto analiza dos posiciones esenciales en la relación arte política. Por una parte la actividad del artista que interviene con su obra en un espacio público con fines políticos, y por otra la actividad de artistas que trabajan en el seno de grupos activistas comprometiéndose con determinados colectivos sociales y alejándose de las entendidas como tradicionales fronteras del arte. Activismo, arte-política, esfera pública

El discurso sobre el arte público hace tiempo que ha desbordado las viejas preocupaciones del mundo del arte. El arte público, forzosamente político, como ya se han preocupado de argumentar diferentes teóricos,1 * Yayo Aznar Almazán es profesora titular de Universidad en el Departamento de Historia del Arte de la Uned. Entre sus publicaciones se pueden destacar los libros titulados El arte de acción (Fuenterrabía, Nerea, 2000), La memoria compartida. España y Argentina en la formación de un imaginario cultural (Buenos Aires, Paidós, 2004) y El Guernica (Madrid, Edilupa, 2004). * María Iñigo Clavo es artista plástica e investigadora en la Sección Departamental de Historia del Arte III (Contemporáneo) con la tesis La poscolonialidad en el arte en Brasil durante en AI-5 (1968-1979). Ha publicado en varias revista y seminarios especializados en arte contemporáneo. Entre sus publicaciones destacan “A finales de los 60 y principios de los 70 en Latinoamérica…” en el libro La memoria pública (Madrid, 2003), Ana Mendieta en la revista Espacio, tiempo y forma (Madrid, 2002). 1 Deutsche, Rosalyn, Agorafobia, en Blanco, Carrillo, Claramonte y Expósito, Modos de hacer. Arte crítico, esfera pública y acción directa, Salamanca, Universidad de Salamanca, 2001, pp. 289 y ss. 2 Buck-Morss, Susan, Estética y anestésica. Una revisión del ensayo de Walter benjamín sobre la obra de arte, Madrid, La Balsa de la Medusa, 25, 1993, p. 57. 3 En este sentido no hay más que ver, por ejemplo, como en el libro de Blanco, Carrillo, Claramente y Expósito, op. cit., 2001, están radicalmente separados los discursos teóricos de los textos escritos por artistas como Martha Rosler o por diferentes colectivos como Ne pas plier. Los discursos teóricos influyen y afectan el pensamiento de los artistas en una relación que en absoluto es recíproca. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

puede ser un medio razonablemente efectivo de contribuir al crecimiento de la cultura democrática sobre todo si rescatamos el término “público” de las despolitizaciones conservadoras definiendo el espacio público, la llamada “esfera pública”, como una arena de actividad política y redefiniendo el arte que en él se hace como un arte que participa en o crea por sí mismo un espacio político, es decir, un espacio en el que asumimos identidades y compromisos. Porque tal vez, como ha desarrollado escuetamente Buck-Morss,2 si pudiéramos politizar por fin el arte del modo radical que Benjamín sugería, éste dejaría de ser arte tal y como lo entendemos. Quedaría por fin definitivamente contaminado. Y es que de lo que estamos hablando es de una historia llena de problemas. En la esfera pública se puede actuar de muchas maneras pero, por ahora, nos interesa analizar dos esenciales: por una parte, la actividad del artista que interviene con su obra en un espacio público con fines más o menos democráticos, y, por otra, la actividad de artistas que trabajan en el seno de grupos activistas comprometiéndose (la mayoría de las veces temporalmente) con determinados colectivos sociales y alejándose, en ocasiones de un modo radical, de las entendidas como tradicionales fronteras del arte. Al abordar un tema así somos conscientes de que los discursos teóricos que por el momento se han ocupado del tema, apenas han incluido en su argumentación obras3 (lo que evidentemente es un problema a la hora de analizar producciones concretas), y entendemos que ambas posiciones son legítimas y que indiscutiblemente ambas se pueden entender como actividades artísticas, pero también entendemos que ninguna de las dos está exenta de peligros. 65


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Hal Foster, muy consciente de los riesgos del arte político, ya se planteaba dos posturas contrapuestas.4 Según la primera, lo cultural sería un lugar de contestación, tanto dentro de las instituciones culturales como frente a ellas, en que tienen cabida todos los grupos sociales; lo cultural sería pues un lugar de conflicto y la estrategia a seguir sería una resistencia de interferencia (aquí y ahora) al código hegemónico de las representaciones culturales y los regímenes sociales. La segunda posición es más radical, aunque Foster cree que también es más débil, y entiende que nos enfrentamos a un sistema total en el cual la resistencia es más complicada, ya que no sólo está “comodificado” lo cultural, sino que lo económico se ha convertido en el lugar principal de la producción simbólica. El capital, pues, ha penetrado incluso en el interior del signo hasta el punto de que la resistencia al código a través del código es estructuralmente imposible. El arte político, tal como lo vemos hoy, y sin quitarle un ápice de valor, tanto dentro como fuera de los conocidos espacios tradicionales del mundo de arte, puede correr el peligro de ser un sujeto excesivamente familiar para el capital, con códigos perfectamente asumidos y, por lo tanto, desactivados; puede ser, en fin, un sujeto demasiado cercano que, en el fondo, como diría Martha Rosler, hace exactamente lo que se espera de él. Ya veremos los problemas que plantea esto en algunas obras de Wodizcko. Previsiblemente Foster se mantiene dentro de los límites conocidos del arte y, aunque es muy consiente de los peligros que entraña, defiende como única posible la primera posición y prefiere ver la sociedad no como un “sistema total”, sino como un conjunto de prácticas, muchas de ellas contrapuestas, en el que lo cultural es una arena en que es posible la contestación dentro de los códigos establecidos y en un sistema tan desestructurado en el que es difícil construir una respuesta democrática mínimamente mayoritaria. Pero quizás el artista, como sujeto social, político y democrático, esté capacitado para algo más que para contestar a determinados problemas concretos. Quizás el artista pueda producir algo que no sea simplemente una contestación, un análisis o una sesuda deconstrucción. Quizás el arte sea capaz de producir espacio público y, por lo tanto, político. El propio Foster sabía que había fisuras, ya que ningún orden, capitalista o no capitalista, puede controlar todas las fuerzas que libera. Más bien, como Marx y Foucault sugieren de varias maneras, un régimen de poder prepara también su resistencia, demanda su existencia, en formas que no siempre pueden ser recapturadas.5 Entendemos por arte activista una forma de arte político que se mueve en un territorio intermedio entre el activismo político y social, la 66

4 Foster, Hal. Remodificaciones: hacia una noción de lo político en el arte contemporáneo, en Blanco, Carrillo, Claramente y Expósito, op. cit., 2001, pp. 96 y ss. 5 Foster, Hal. op. cit., p. 229. concinnitas


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organización comunitaria y el arte. El activismo social, basado en la famosa idea de Nancy Fraser de que existe aún mucho que objetar a nuestra democracia realmente existente,6 ha emergido como una fuerza democrática compensatoria inspirada por la idea de los derechos. Con el objetivo, como ha señalado Rosalyn Deutsche, 7 de conseguir reconocimiento para las particularidades colectivas marginadas, estos nuevos movimientos defienden y extienden derechos adquiridos, pero Reclaim the Streets! Acción en la M11, Londres, 1996

también propagan la exigencia de nuevos derechos basados en necesidades diferenciadas y contingentes. A diferencia de las libertades puramente abstractas no eluden tomar en consideración las condiciones sociales de existencia de quienes los reclaman. Y lo que es más, tales nuevos movimientos, al tiempo que cuestionan el ejercicio del poder gubernamental y corporativo en las democracias liberales, se desvían de los principios que han informado los proyectos políticos tradicionales de la izquierda porque se distancian de las soluciones globalizadoras y rechazan ser dirigidos por unos partidos políticos que se proclaman representantes de los intereses sociales del pueblo. Desde hace tiempo estos territorios (el del activismo político y el de arte) se han venido contaminando mutuamente porque por necesidad todos se han visto estrechamente relacionados con la creación de imágenes, con la autorrepresentación y con actividades que siempre debían ser legibles y efectivas. Con esto, evidentemente, el arte activista se sitúa de un modo parcial fuera de las confusas fronteras del mundo del arte (lejos, por tanto, del dictamen de los mandarines) y obliga de nuevo a replantearlas. Los artistas (aunque no sólo ellos) se convierten en catalizadores para el cambio, posicionándose como ciudadanos activistas. La campaña en 1996 contra la construcción de la M11 en Londres fue una performance continua protagonizada, entre otros colectivos, por Reclaim The Streets! Frente a los gestos valientes pero discutiblemente eficaces de artistas de acción que han utilizado sus cuerpos en actos políticos que implicaban un cierto peligro (Chris Burden, los accionistas vieneses, Gina Pane, etc…), este tipo de acción es a la vez, en palabras de John Jordan,8 poética y pragmática, profundamente

6 Fraser, Nancy. Rethinking the Puclic Sphere: A contribution to the Critique of Actually Existing Democracy, en Craig Calhoum (ed.), Habermas and the Public Sphere, Cambridge, Massachusetts, The MIT Press, 1992. 7 Deutsche, Rosalyn. Op. cit., p. 293. 8 Jordan, John, El arte de la necesidad: la imaginación subversiva del movimiento de oposición a las carreteras y Reclaim The Streets, en Blanco, Carrillo, Claramonte y Expósito, op. cit., p. 371. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

teatral y fundamentalmente política. Es imposible entender de otro modo una acción que coloca un buzón y una dirección en un viejo castaño convirtiéndolo así en domicilio legal con el fin de que sus habitantes puedan exigir derechos de residencia. En cualquier caso, para Reclaim The Streets!, la función política pragmática consistió en paralizar las obras de la M11, con las consiguientes pérdidas económicas, mientras que la función representacional fue la producción de nuevas imágenes vistas por la mayor cantidad posible de público y que podían conseguir 67


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que la problemática concreta se proyectase sobre una gran cantidad de personas. Los activistas no se contentan simplemente con limitarse a realizar preguntas, por muy pertinentes que sean, sino que se comprometen en un proceso activo de representación, intentando al menos “dotar” a individuos y comunidades, potenciar el espacio público y finalmente estimular el cambio social aunque sea a largo plazo. Por supuesto, entendemos por “dotar a una comunidad o grupo social” como la creación de métodos y herramientas de trabajo efectivas que puedan ser continuadas por la propia comunidad. Por eso el resultado es a largo plazo y el artista es un agente catalizador que investiga y pone en funcionamiento junto con toda la comunidad una serie de modos y mecanismos de relación dirigidos a reforzar los poderes de la misma. En un excelente texto Suzanne Lazy9 hace un análisis de los posibles papeles llevados a cabo por los artistas y los estructura en cuatro categorías: el experimentador, el informador, el analista y el activista. Evidentemente la mayoría de las veces los límites no están tan claros y nosotras preferimos entender el camino hacia el arte activista a partir de una lectura cronológica, aún a riesgo de que ésta se pueda entender como interesadamente legitimadora. Estaríamos, desde luego, en la línea genealógica que Paloma Blanco ha denominado “línea caliente”,10 la que nos remitiría a una historia del arte crítico que arrancaría directamente de las prácticas relacionadas con el arte politizado de los 60 y los 70. Sus orígenes inmediatos se situarían en el activismo de los 60 y en el legado de cierto arte conceptual entendiendo, desde luego, que el arte conceptual no acabó de adoptar de un modo completo los métodos y las formas de la filosofía democrática que le inspiraba, de manera que nunca llegó a considerar las cuestiones sociales y políticas como un objetivo realmente viable, excepto, quizás, en los países en que esto era más evidentemente urgente como podían ser los latinoamericanos bajo las diferentes dictaduras militares. Pero incluso en ellos la ruptura era muy sensible. En este sentido, un ejemplo que puede resultar paradigmático fue la acción/exposición Tucumán arde, enfrentada desde el principio a la política cultural del Instituto Di Tella. Según cuenta Fernando Farina,11 el 3 de noviembre de 1968, en el momento más duro del presidente Juan Carlos Onganía, en el local de la Confederación General del Trabajo de los Argentinos de Rosario, un grupo de artistas expuso películas, fotografías, carteles y grabaciones en una clara denuncia de la situación que se vivía en la provincia de Tucumán. La exposición era el resultado de un largo proceso con dos finalidades básicas: por un lado, separarse del “vanguardista” Instituto 68

9 Lazy, Suzanne. Debated Teritory: Toward a Critical Language for Public Art, en Mapping the Terrain. New Genre Public Art, Seattle, Washington, Bay Press, 1995, pp. 171-185. 10 Blanco, Paloma. Explorando el terreno, en Blanco, Carrillo, Claramente y Expósito, op. cit., 2001, pp. 23 y ss. 11 http://www.rosiarte.com.ar/notas/002/. concinnitas


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Di Tella, que a su vez estaba haciendo denuncias claramente políticas pero dentro siempre del marco institucional,12 pero, por otro, y mucho más importante, tomar conciencia de la situación económica y política argentina, marcada por un gobierno militar que había impulsado dos años antes el llamado Operativo Tucumán. El primer paso fue la acumulación y el estudio de datos sobre la realidad social de la provincia de Tucumán, un trabajo en el que participaron sociólogos, artistas plásticos, cineastas y fotógrafos. Posteriormente el grupo viajó a Tucumán para hacer entrevistas, grabaciones y filmaciones, al mismo tiempo que empezaron a pegar carteles por todas partes en los que aparecía simplemente la palabra Tucumán. Durante la exposición se mostraron fotografías, diapositivas, películas y grabaciones con los testimonios de los trabajadores. Para entrar en ella había que pisar los nombres de los dueños de los “ingenios azucareros”, unas instalaciones, de clara herencia colonial y continuistas del viejo sistema esclavista, que incluían desde el cultivo hasta el procesado de la caña de azúcar. Así pues, como podía estar pasando en el Instituto Di Tella, aunque las ambiciones y estrategias del conceptual fueran democráticas, sus trabajos siguieron cristalizando, con honrosas excepciones, en formas de arte esencialmente exclusivas y fuera del alcance de cualquiera que no perteneciera a dicho mundo. A pesar de ello, las implicaciones derivadas del conceptual tuvieron un gran alcance, ayudando a crear un clima en el mundo del arte que propició que los artistas que llegaron después se decidieran a completar la revolución que el conceptual (y algunos pocos activistas) habían puesto en marcha. El camino lo continuó el importante papel jugado por el performance y las prácticas feministas de los 70, sin olvidar el trabajo de artistas latinoamericanos que, como Arthur Barrio, Cildo Meireles o Hélio Oiticica, trabajaban bajo las dictaduras militares latinoamericanas de un modo evidentemente menos visible pero no menos fructífero. Y todo ello desembocó en los múltiples desarrollos alcanzados por este tipo de prácticas a partir de los años 80 favorecidas, una vez más, por la situación política, y situadas irremediablemente frente a las fuerzas conservadoras que volvían a dominar tanto el mundo político como el artístico. Nina Felshin lo ha explicado muy bien:13 La erosión de la democracia, debido tanto al desmantelamiento de los programas sociales como a la promoción de iniciativas que favorecían a los ricos durante la administración Reagan12 En este sentido ver Rizzo, Patricia y otros, Instituto Di Tella.Experiencias’68, Buenos Aires, Fundación PROA, 1998. 13 Felshin, Nina. ¿Pero esto es arte? El espíritu del arte como activismo, en Blanco, Carrillo, Claramente y Expósito, op. cit., 2001, pp.87. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Busch, condujo a una polarización creciente entre ricos y pobres, entre los poderosos y los que carecían de poder, entre la izquierda y la derecha. Los activistas de izquierdas se movilizaron en torno a temas mucho más diversos que antaño (la crisis nuclear, la intervención de los Estados Unidos en 69


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Latinoamérica, la amenaza del derecho al aborto, las personas sin hogar, la inmigración, el SIDA, etc…) (…) y con ellos, un número creciente de artistas comenzaron a trabajar en torno a la esfera de lo político. Entre ellos, desde luego, los artistas activistas para los que ya no se trataba simplemente de adoptar un conjunto de estrategias artísticas más inclusivas o democráticas, o de abordar los problemas sociales o políticos bajo la forma de una crítica de la representación dentro de los confines del mundo del arte [como podía estar haciendo el posmodernismo crítico]. En su lugar, los artistas activistas han creado una forma cultural que adapta y activa elementos de cada una de estas prácticas estéticas críticas, unificándolas orgánicamente con elementos del activismo y de los movimientos sociales.14 El arte activista tiene, entonces, un carácter radical y urgente, siempre procesual en el sentido de que en lugar de estar orientado hacia el objeto o el producto, cobra significado a través de su proceso de realización y recepción. De hecho, se contextualiza en situaciones concretas locales, nacionales o globales y significa siempre también una creación en tiempo real. El arte activista es un arte de naturaleza pública y colectiva. Es decir, por un lado está empeñado en producir “esfera pública” y, por otro, en activar en ella una “construcción de consensos” sin la cual la esfera pública carecería de sentido y de eficacia política porque no se construiría en ella una comunidad. La esfera pública es, en definición de Alexander Kluge y Oskar Negt,15 lo que podríamos llamar la fábrica de lo político: el lugar donde se produce. Pero este espacio donde las políticas son posibles y comunicables aparentemente tiende a desaparecer (al menos en su definición tradicional) y la gente se ve privada de él. En principio no podemos dudarlo: para estos grupos sociales activistas la esfera pública es el producto político más fundamental que existe porque en términos de comunidad, de lo que tengo en común con otras personas, se trata de la base de los procesos de cambio social. Lo que, en palabras de Kluge y Negt, significa que ya puedo olvidarme de cualquier tipo de política si rechazo producir esfera pública. El arte activista no sólo produce en la esfera pública, sino, sobre todo, quiere producir esfera pública y es allí donde activa la construcción de consensos lo que lleva consigo, una vez más, la necesidad de desarrollar un conjunto de capacidades que normalmente no se asocian a la práctica del arte. Los artistas activistas cuestionan la primacía de la “separación” como una postura artística, y en consecuencia al artista/autor, acometiendo la producción de significados consensuados por el público, lo que tiene unas consecuencias políticas que pueden ser de largo alcance. 70

14 Felshin, N., op. cit., pp. 89-90. 15 Kluge, A., Y negt, o., Public Sphere and experience. Toward an Analysis of the Bourgeois and Proletarian Public Sphere, Minneapolis, University of Minnesota Press, 1993. Hay una selección muy acertada de textos de este libro llevada a cabo por Marcelo Expósito en Blanco, Carrillo, Claramonte y Expósito, op. cit., 2001, pp. 227 y ss. concinnitas


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Para los realizadores la participación se convierte en un proceso de autoexpresión, y muchas veces de autorrepresentación, protagonizado y asumido por toda la comunidad. Martha Rosler16 ya trató explícitamente la polémica sobre la representación afirmando la posibilidad de una “representación participativa” frente a las formas de representación dominantes que enmascaran la explotación simbólica y material de la miseria del sujeto subalterno. Por su parte Brian Holmes, de la asociación Ne pas plier,17 también se refiere al trabajo de realización de imágenes políticas mediante un modo de producción basado en principios colaborativos con quienes son protagonistas. Se trata, evidentemente, de activar la autorrepresentación de una comunidad y dinamizarla en la esfera pública. En el contexto del proyecto Sub-Burgos, en mayo de 2003, el colectivo Espacio Tangente llevó a cabo la intervención titulada El Encuentro. Elige participar.18 El Encuentro es un conjunto de barracones prefabricados a las afueras de Burgos que el Ayuntamiento había cedido por cinco años a una comunidad gitana en lo que se llamó un “proceso de integración”. Esta comunidad llevaba ya 10 años en ellos escondida en un barranco entre un polígono industrial y debajo de una perrera esperando una solución. El colectivo fue al poblado e hizo una asamblea para presentar lo que habían pensado como intervención. La finalidad era, fundamentalmente, dar visibilidad a su problema, de manera que hicieron fotografías de las personas del poblado (tal como ellos habían decidido que querían aparecer) y luego las pusieron en una valla publicitaria claramente visible desde la autopista. El impacto político real del arte activista puede ser, pues, a largo plazo, aunque en un principio se origine en una situación de urgencia. Es evidente que no puede cambiar de manera inmediata sustancialmente las cosas, pero a la larga creemos que sí puede ayudar algunas veces a dotar a una comunidad o grupo social de un 16 Rosler, Martha, If you lived here. The City in Art, Theory and Social Activism. A Project by Martha Rosler, en Wallis, Brian (ed.), Fragments of a Metropolitan Viewpoint, Seatle y Nueva York, Bay Press y Dia Art Foundation, 1991, pp. 1545. Traducción en Blanco, Carrillo, Claramonte y Expósito, op. cit., 2001, pp. 173 y ss. 17 Ne pas plier en Blanco, Carrillo, Claramonte y Expósito, op. cit., 2001, pp. 273 y ss. 18 http://www.espaciotangente.net/images/ SubBurgos1/pages/elencuentro.html. 19 Rosler, Martha, Hot Potatoes: Art and Politics in 1980, en Block, no 4, 1981, p. 17. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

sistema efectivo de autorrepresentación y autoexpresión en el espacio público. Para Martha Rosler19 está claro cuando afirma en 1981 que cualquier tipo nuevo de práctica artística tendrá que tener lugar al menos parcialmente fuera del mundo del arte. Y aunque resulte difícil establecerse en el mundo del arte, los territorios menos circunscritos son los más cargados de peligros. Fuera, la mayoría de los artistas no son ni bien recibidos ni efectivos, pero dentro hay una cápsula sofocante en la que se engaña a los artistas haciéndoles sentirse importantes por hacer sólo lo que se esperaba de ellos. Seguimos hablando de “formas 71


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nuevas” porque lo nuevo ha sido el fetiche fertilizador de la vanguardia desde que se separó de la infantería. Pero quizás estas nuevas formas sólo puedan ser encontradas en las energías sociales no reconocidas aún como arte. Por eso en las tres exposiciones que organizó para el ciclo titulado Si vivieras aquí… cambió radicalmente su actitud de artista política en artista activista. Aunque la carencia de hogar era el tema central de todo el ciclo, sólo una de las exposiciones estaba dedicada enteramente a ella. La primera muestra, El frente de la vivienda, se concibió como un conjunto de representaciones de barrios en disputa. El título frente a la vivienda alude a una zona de guerra, siendo la pérdida de hogar una de las consecuencias de tal conflicto por lo que preparaba el escenario para abordar la falta de hogar en la segunda muestra: Homeless: la calle y otros lugares. Lo importante en esta exposición era no reproducir las dicotomías de las que parten la mayoría de los debates sobre la falta de hogar: “nosotros frente a ellos”, y por eso se invitó a diversos grupos (de vagabundos, vecinos, agentes sociales, etc…) a participar, tanto en los debates como en la muestra, y se hicieron talleres, exposiciones y gabinetes de ayuda. La tercera exposición, La ciudad: visiones y revisiones intentaba avanzar hacia la solución de los problemas urbanos: desde nuevos diseños de vivienda a viviendas para enfermos de SIDA y para mujeres y niños sin hogar, hasta incluso visiones utópicas de la ciudad. Pero ya hemos dicho que estamos hablando de una historia de problemas y las premisas de las que parten muchos de estos grupos activistas también pueden plantearlos. A partir de la antología de textos publicados editados por Bruce Robbins y titulada La esfera pública fantasma se ponen en cuestión muchos de los conceptos manejados como ciertos por los activistas políticos. De entrada, Robbins va a utilizar la idea de lo público como fantasma a fin de poner en duda la existencia de un público homogéneo, no para renunciar al mismo, sino, como muy bien ha visto Rosalyn Deutsche,20 para desafiar el ideal habermasiano (fundamental para estos grupos) de una única esfera pública que, supuestamente, habría entrado en decadencia. Recordemos que para Habermas, en su libro Historia y crítica de la opinión pública,21 la esfera pública irrumpe en el advenimiento de la sociedad burguesa que inauguró la división estricta entre los ámbitos privado y político (público), siendo la esfera pública el lugar donde las personas emergen de su privacidad y dejan a un lado sus intereses privados para implicarse en asuntos de interés público. En el mismo libro de Robbins, el teórico Thomas Keenan aborda la cuestión del espacio público de un modo diferente retomando la 72

20 Deutsche, Rosalyn. Agorafobia, en Blanco, Carrillo, Claramonte y Expósito, op. cit., 2001, p. 346. 21 Habermas, Jurgen. Historia y crítica de la opinión pública, Barcelona, Gustavo Pili, 1994. concinnitas


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idea de la esfera pública como fantasma en su ensayo Windows: of Vulnerability. La luz que penetra a través de la ventana que menciona en el título puede identificarse con la idea de esfera pública que él ha reelaborado a partir de un modelo lingüístico. La esfera pública no sería, para él, el espacio exterior al que accedemos como individuos privados con el fin de utilizar el lenguaje de un modo imparcial, sino que está ella misma estructurada como un lenguaje. Con ello, Keenan problematiza la posibilidad de establecer una división clara entre los ámbitos público y privado. En Madrid, Casas y Calles22 consistió en un acontecimiento público en el que varias personas coordinadas se ponían de acuerdo para abrir sus casas durante unas horas en un día concreto. En ellas tenían total libertad para hacer lo que quisieran, desde exposiciones de arte hasta obras de teatro, juegos, comidas, etc. Al mismo tiempo la calle podía ser intervenida por quien quisiera. El compromiso de la coordinación era más bien crear un panel informativo para que todos supieran de todos y tratar de implicar al mayor número de personas posible,23 se trataba de propiciar que 22 Se realizó por primera vez en mayo de 2002 y se abrieron cinco casas, y por segunda en febrero de 2004 con 11 espacios. Durante unas horas del 30 de mayo de 2002 abrieron su casa: Loreto Alonso, Luis Elorriaga, Manuel Gil, María Iñigo Clavo, Gema Pastor e Yves Sadurny. El 16 de enero de 2004 abrieron sus espacios: Loreto Alonso, Alberto Baraya, Analía Beltrán Janés, Luis Elorriaga, Helena Fernández Cavada, Patricia Fesser y Julián Charlon, Eduardo García Nieto e Ignacio Cabrera, Manuel Gil y María Iñigo, Marta Rodríguez y Guillermo Espinosa, y Paula Rubio Infante. En la calle participaron activamente el Comité de la Internacional del Ruido (C.I.R.), Láltra banda, la llave inglesa, Daniel Lupión, Grego Matos, Rafa Palacios, Ana Pol, Carlos Rodríguez Méndez, sdf (sin domicilio fijo), Sara Trigueros, Luis von Ángel, y muchos otros que junto con los que intervinieron en las casas hacen una larga lista, siempre incompleta. 23 Este fue uno de los factores más importantes del evento. La no selección o control de lo que ocurría en cada casa, la falta de selección y normativa, así como la libertad dada a sus anfitriones ayudaba a que se animara la gente. Por otra parte, si en cada casa había 15 personas realizando una intervención (como media), esos 15 luego podían asistir al evento acompañados de una media de unas tres personas. Después se multiplicaba eso por las 11 casas del segundo año, y se sumaban los que pasaban por allí, los que hicieron cosas en la calle, etc… Calculando por lo bajo, podía encontrarse fácilmente con una asistencia de 500 personas que andaban de un lado a otro durante esas horas. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

ocurrieran cosas inesperadas y no programadas, que se impusiera un ambiente lúdico y de tolerancia, que quien decidiera sumergirse en el evento se viera saturado por pequeños acontecimientos que ocurrían y que presenciaba por pura casualidad. Desde las casas a la calle y viceversa, convirtiendo lo público en privado y lo privado en público se creaba una continuidad entre los diversos espacios, se transformaban y se confundían entre ellos por unas horas. Aunque cada participante manejara un concepto distinto de arte e incluso de cultura, Casas y Calles fue construyendo un lenguaje común sobre la esfera pública desde la primera reunión, desde el primer intento de coordinación y diálogo. El arte fue la mejor excusa de todas. Una vez más un espacio bisagra en el que es posible articular muchos otros espacios, otros lenguajes también públicos. En otras palabras, es el lenguaje el que nos hace presentes como sujetos dividiéndonos y abriéndonos al exterior por lo que el espacio público no sólo está ahí como tal (podría ser un fantasma) sino que también está en el lenguaje y va constantemente de lo privado a lo social. De hecho, Keenan sostiene que esta peculiaridad de lo público (el no estar aquí) no sólo no es incompatible con la democracia, sino que es una condición de su existencia, aunque su cualidad fantasmática no debe entenderse como espejismo, engaño o falsedad de las apariencias. Al parecer, el fantasma de la esfera pública es incomprensible para aquellos puntos de vista activistas que limitan la realidad social 73


Yayo Aznar y María Iñigo

a los contenidos que llenan el espacio social e ignoran los principios que generan dicho espacio. O no, porque según para qué artistas también es posible la acción en o a partir de un lugar fantasma. Rara vez las obras se acoplan impecablemente a la teoría. El artista palestino Steve Sabella está planteando en la actualidad un proyecto 24 en la red que también tiene que ver con imágenes fantasmas, en este caso con recuerdos. La idea es hacer una llamada a los palestinos que están desperdigados por el mundo y a los que se impide volver a su tierra, sobre todo a Jerusalén, el centro del conflicto palestino/ israelí. Bajo el título Jerusalén en el exilio – imágenes tangibles Sabella les pide que envíen una imagen o un texto escrito con el recuerdo que ellos tienen de Jerusalén, para con todos ellos acabar haciendo un libro y una exposición. Un recuerdo, como todos, subjetivo, sublimado, casi fantasma. El recuerdo de los que ya no están para reconstruir la imagen de una ciudad que los palestinos temen que acabe perdiendo su identidad árabe, el lenguaje de los que ya no están para poder reconstruir una comunidad. Dos proyectos (el de Rosler y el de Sabella), desde luego, atractivos y cargados de promesas de actuación real, de utilidad real. Dos proyectos que pueden hacer parecer la intervención de Wodizcko como un simple juego inútil de artistas. En la ciudad de Nueva York, el artista de origen polaco Wodizcko ponía en marcha en 1986 su proyecto La proyección sin hogar: propuesta para la ciudad de Nueva York, por el que se proyectaba, sobre las estatuas de prohombres de la patria que adornaban Union Square, imágenes de los mendigos que habían habitado la plaza hasta que habían sido víctimas, una vez más, de un proceso salvaje de especulación y desplazamiento poblacional ocurrido en los alrededores durante los años 80 bajo el higiénico signo de la “rehabilitación” y la

Christian Wodizko. Proyección sin hogar, Nueva York, 1986

“reutilización”. Sería, de hecho, muy fácil contraponer estos proyectos para criticar abiertamente el de Wodizcko. Podríamos pensar, de entrada, que si la política trata de la constitución de la comunidad política y esto es algo al parecer impensable sin el consenso y la participación que exigen en la esfera pública los artistas activistas, entonces decidir por uno mismo qué es legítimo y qué es ilegítimo en el seno del espacio público no deja de ser un ejercicio de poder prácticamente individual, aunque desde luego esté en su derecho como ciudadano democrático. Lo primero que nos llama la atención en la obra es la forzada estetización de todas las imágenes. La estética, antes de convertirse 74

24 http:/www.jerusalem-in-exile.com/ concinnitas


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Bijari. Moviliario Urbano, Salao de maio, Salvador, Bahia, 2003

en esa parte de la filosofía que se ocupa de la belleza, tamizada por el intelecto y condicionada una y otra vez por las genealogías históricas, se definía durante la época griega como la experiencia sensorial de la percepción, y en ella estaban involucrados todos los sentidos. Por ello su ámbito no era el del arte sino el de la realidad. Susan Buck-Morss25 se ha ocupado de la transformación de la estética en su texto Estética y anestésica. En él explica el proceso histórico por el cual el uso de nuestros sentidos poco a poco fue entumecido por el raciocinio encargado de no ser afectado por los constantes shocks de la vida moderna. Pero, por supuesto, los ojos aún ven. Bombardeados con impresiones fragmentarias ven demasiado… y no registran nada. De este modo, la simultaneidad de “sobreestimulación” y entumecimiento es característica de la nueva organización sinestésica entendida como anestésica. La inversión dialéctica por la cual la estética cambia de un modo de ver cognitivo “en contacto” con la realidad a un modo de bloquear la realidad, destruye el poder del organismo humano de responder políticamente, aún cuando lo que está en juego es la autopreservación.26 ¿Por qué levantar la voz si lo que se cuenta es interesante en sí mismo? No hay más que ver lo diferentes que son las imágenes de Wodizcko de las de Bijari aceptando, por supuesto, que el vagabundo

25 Buck-Morss, Susan. Estética y anestésica. Una revisión del ensayo de Walter Benjamín sobre la obra de arte, en Madrid, La Balsa de la Medusa, 25, 1993. 26 Buck-Morss, op. cit., 1993, p. 72. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

fotografiado de Bijari en una pared publicitaria también es una representación pero, al menos, sin grandilocuencia. De hecho, la obra de Bijari podría estar presentando de manera voluntaria al homeless exactamente como nosotros le vemos en la calle, cuestionando nuestra mirada, nuestra percepción anestésica, o como 75


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mínimo presentándolo como pura representación, imagen plana, si ninguna profundidad. La estetización otorga a las imágenes de Wodizcko, sin duda, un efecto de grandilocuencia no deseado y lo cierto es que siempre un pequeño o grande coeficiente de caricatura está unido a la grandilocuencia. Pero el asunto es todavía más perverso. Como se ha preocupado de señalar Clement Rosset, 27 el paso del modelo a su reducción implica un hurto del modelo, que desaparece en beneficio de la representación (…) Lo que es decisivo aquí es la relación entre la imagen propuesta y el modelo, o más exactamente, el hecho de saber si la imagen conserva o no alguna referencia a la realidad (…). Lo que es decisivo aquí es todo lo que no sabemos sobre estos homeless, aparte de su pequeño secreto confesado a voces: son vagabundos sin hogar. La grandilocuencia amortigua el rumor de lo real con el ruido de las palabras.28 Una vez más se ha elegido la representación en detrimento de lo representado y una vez más reaparece la mirada negligente. Podemos incluso pensar que Wodizcko está utilizando la política en beneficio propio porque el artista está registrando su presencia en una obra de arte clara y única que es a la vez protesta política y victoria subjetiva. La obra es así expresión de un artista preexistente y autónomo que habla a un sujeto espectador en cierto modo forzado a identificarse con su discurso. Wodizcko está utilizando para su uso una imagen prácticamente arquetípica de los Homeless que no ha consensuado con ellos. De hecho, es su imagen social, es lo que vemos, lo que cualquier espectador puede reconocer sin sorprenderse… y no cambia ni un ápice nuestra opinión sobre ellos. En el fondo, fantasmagoriza a los vagabundos y evita que sean reales. Únicamente puede ayudar a incluirlos en un discurso peligrosamente cercano al de la caridad religiosa, un discurso benevolente. Y mucho más cuando la representación teatralizada de los vagabundos está en ocasiones excesivamente cercana a la conocida imaginería religiosa. En cualquier caso da igual, porque ya no están ahí. El espectador puede compadecerlos tranquilamente a través de su imagen, de su fantasma sin necesidad de implicarse. Luego, puede hablar sobre el tema con un amigo y sentirse reconfortado, más humano, más comprensivo, más comprometido. Lo que no podrá nunca es sentir que forma parte de un proceso democrático radical de solución. Digamos que Wodiczko trata de apelar a nuestra emotividad “caritativa” a través de la dramatización de las imágenes de los homeless, mientras que Bijari compromete nuestro modo de mirar una realidad que se reconoce como ajena. 76

27 Rosset, Clement, Lo real. Tratado sobre la idiotez, Valencia, Pre-Textos, 2003, pp. 126127. 28 Rosset, Clement, op. cit., 2003, p. 130. concinnitas


Arte, política y activismo

Es innegable que éste es un peligro inherente a cualquier obra de arte política en el espacio público. Pero aún hay más: de alguna manera Wodizcko promete al espectador una visión imparcial del problema y esto es, cuando menos, peligroso. La posición de un sujeto capaz de realizar operaciones intelectuales que le facilitan información sobre el mundo social, pero que no debe nada a su inmersión en lo social, es el signo de un deseo de objetivar la sociedad. La visión imparcial sólo es posible en presencia de un objeto… y a veces ni eso. Si encima ese objeto es la “sociedad” o el “espacio social” entonces se convierte en la base de un análisis racional y en la garantía de que los conflictos sociales pueden resolverse objetivamente. Una idea perversa hasta el aburrimiento porque perpetúa los conflictos permitiendo que se hable constantemente de ellos y produciendo soluciones (consuelos) temporales, siempre sin cesiones. Todo esto, evidentemente, asegura una posición estable para el “yo” porque el sujeto se sitúa en un punto exterior al mundo social pudiendo hipotéticamente descubrir las leyes y conflictos que lo gobiernan. Demasiados problemas en todas las obras, es cierto, pero, en cualquier caso, deberíamos dar la bienvenida a ambas formas de intervención en el espacio público porque ambas profundizan y amplían nuestro espectro de lo político y de lo público, intentando evitar así su transformación en propiedad privada.

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Todo arte es político. Representaciones de lo político y políticas de la representación. Notas sobre feminismo y globalización

Todo arte es político. Representaciones de lo político y políticas de la representación. Notas sobre feminismo y globalización Carmen Navarrete* En este artículo se plantea la manera en que el mercado de la estética en el marco de la globalización, y de un Nuevo Internacionalismo cultural, sigue relegando e invisibilizando la praxis artística y políticas feministas. Arte y política, feminismo, transculturalidad

El estado de alza del arte intervencionista, y la multiplicación de exposiciones dedicadas a temas sociopolíticos y a campañas activistas son prueba suficiente de que algo político está en juego en el campo del arte. Después de muchos años de resistencia parece que plantearse las relaciones entre Arte y Política ya no resulta tan anormal ni produce reacciones tan airadas. Hasta el punto que se ha codificado cierto arte político como un nuevo estilo, tendencia, o género artístico, sin producir ningún tipo de discontinuidad dentro de las instituciones artísticas. Mientras se producen exposiciones de arte-político en espacios cada vez más notorios e internacionales, los artistas, comisarios y críticos compiten en radicalidad, relevancia, eficacia y contenido. Hoy en día la implicación política está de moda en el mundo del arte, y hay buenas razones para ello. Durante años, deberíamos decir décadas, el debate se sitúo en si el arte debía ocuparse de las realidades políticas o sociales o si debía mantenerse en una esfera incontaminada y autónoma, lo que llevo a Lenora de Barros. Poema, fotografia, 1979. Fotos: Fabiana de Barros

una inoperante oposición entre arte político / no político. Pues sabemos que todo arte es político, es decir todo trabajo artístico se construye

* Carmen Navarrete es artista y profesora en la Facultad de Bellas Artes de Valencia. Ha publicado diversos artículos, generalmente en torno al feminismo y las artes visuales, entre sus últimos: “Identidades en crisis, expandidas, situadas y deslocalizadas”, en Fugas Subversivas. Reflexiones híbridas sobres las identidades (2005), Universitat de València; “Trastornos para devenir: entre artes y políticas feministas y queer en el Estado español” (2005), en Desacuerdos, Arteleku, Macba y Unia. Como artista, sus últimos proyectos en: Para todos los públicos (2006), Sala Rekalde, Bilbao; Cárcel de amor. Relatos culturales sobre la violencia de género (2005), MNCARS, Madrid; Fugas Subversivas. Reflexiones híbridas sobre las identidades (2005), Universitat de Valencia.

desde una ideología, con sus cuerpos teóricos, sus representaciones, sus defensores, sus ocultamientos, sus intereses y sus agendas, aunque

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ello no sea explícito. Pues entre otras cosas obvia algo fundamental: el arte es político por su modo de difusión. Es en este sentido y no solo cuando sus temas y contenidos lo son, cuando el arte es explícitamente político, pues fabricar imágenes socialmente comprometidas no es complejo, lo que es complejo es aprender a usarlas, devolviéndolas a la esfera de lo público. En los años 60 y 70 los artistas iniciaron ciertos experimentos que en los 90 se han clasificado como un Nuevo Género de Arte Público, que hoy empieza a tenerse en cuenta en nuestro país, sobre todo porque en 79


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otras latitudes ha desarrollado un lucrativo mercado. Es absurdo mantenerse en estas estériles confrontaciones, más cuando observamos que las prácticas de la esfera pública de oposición no han traspasado los muros de la institución arte, y por lo tanto pocas transformaciones han operado en su interior. Lo que nos preocupa a ciertos y ciertas artistas es no si el arte debe tratar de asuntos políticos-sociales, sino si podemos politizar la práctica del arte, con la intención de generar un cambio en el orden simbólico. Bourdieu afirmaba que el orden simbólico establecido “(…) con sus relaciones de dominación, sus derechos y sus atropellos, sus privilegios y sus injusticias, se perpetua (…), con tanta facilidad, (…) y haciendo que las condiciones de existencia más intolerables puedan aparecer tan a menudo como aceptables por no decir naturales” y continua diciendo “Y siempre he visto en la dominación masculina y en la manera como se ha impuesto y soportado, el mejor ejemplo de aquella sumisión paradójica, consecuencia de lo que llamo la violencia simbólica, violencia amortiguada, insensible, e invisible para sus propias víctimas, que se ejerce esencialmente a través de los caminos puramente simbólicos de la comunicación y del conocimiento” La imagen de la política de los excluidos bien vale su inclusión en el mundo del arte contemporáneo, no sólo para los artistas, sino también para las corporaciones transnacionales. Cuando Pierre Bourdieu desarrolló su teoría de los campos sociales semi-autónomos, cada uno con sus propias reglas internas, primero tuvo que preguntarse del porqué de la participación de la gente. Apuntó hacia diferentes formas de interés. Los individuos pueden tener un interés monetario en participar en un campo determinado: lo hacen para adquirir un capital económico. También pueden tener un interés en relacionarse con gente poderosa: en este caso, juegan para adquirir un capital social. Pero, más que en otros campos, en el siempre tan profesional mundo del arte el capital social se adquiere, por lo menos en parte, a través de la acumulación de capital cultural, que se puede entender como la capacidad de producir y exhibir los signos, imágenes y gestos que son los más valorados dentro de un campo y un período dados. La acumulación del capital cultural implica tener al alcance complejos fetiches de significación que han sido construidos y transformados con el paso del tiempo con la creencia de que éstos son realmente valiosos al tiempo que ocultan otras realidades. ¿Quién define la categoría de Arte y Política? ¿Quién categoriza nuestras prácticas? ¿Quién y cómo se escribe la Historia del Arte Político? ¿Cómo nos posicionamos en la discusión? ¿Hacia donde están dirigidas estas prácticas? 80

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Todo arte es político. Representaciones de lo político y políticas de la representación. Notas sobre feminismo y globalización

En un período histórico como el nuestro, en el que la relación con la política se convierte en un argumento que legitima la misma existencia del arte político, sin dejar de ser por ello una realidad. Y ésta, como la mayoría de las realidades de nuestra era democrática, está directamente relacionada con cuestiones de representación. El feminismo artístico analiza como los procesos de representación tienen consecuencias reales en la opresión de las mujeres y del conjunto de los Otros. Para el feminismo ha sido fundamental plantearse el papel que la representación cumple en la construcción de la subjetividad humana, la historia, la sociedad y la ideología y demostrar que para generar un cambio del orden simbólico es necesaria la politización de la subjetividad. Esto ha permitido llegar a nuevas posibilidades de praxis política. Una práctica política idónea debe tomar la representación como terreno propio y esforzarse por desafiar sus estructuras opresoras. El orden simbólico hegemónico se perpetua entre otras cosas a través de las imágenes que construyen y reproducen lo social, y el papel que en este sentido cumplen los media, la cultura, el cine y otros productos de la industria cultural, en la perpetuación de las dominaciones de género, de raza y de clase. No interesa tanto explorar los significados de las imágenes en sí, sino sobre todo los mecanismos que las producen y/o las sustentan. Para ello es necesario demostrar como las representaciones no son síntomas de causas externas a ellas mismas (sexismo, patriarcado, capitalismo, racismo, imperialismo, clasismo) y aprender a comprender el papel activo que desempeñan en la producción de estas categorías. De Althusser, aprendimos como todas las formas institucionalizadas de representación certifican las correspondientes instituciones del poder. Este poder es codificado por los aparatos ideológicos del Estado: la familia, la religión, la ley, la cultura y la nación, a través de las representaciones culturales: (arte, fotografía, publicidad, cine, ficción popular, comics, televisión, ...) portando mensajes ideológicos cargados. Así la representación entendida socialmente atiende a los intereses del poder, por lo tanto cumplen una función ideológica al determinar la producción de sentido. Las teorías feministas han contribuido decisivamente al análisis de la función social e ideológica de las representaciones, demostrando como la representación es producto de la organización patriarcal e imperialista. Es fundamental que el activismo feminista acceda a los aparatos de producción de imágenes, insistiendo constantemente en la crítica al propio sistema, desestabilizando y desnaturalizando lo considerado como natural. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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Las políticas de la globalización, han podido triunfar gracias al desarrollo de las redes informacionales, sin estas redes la globalización no hubiera sido posible. El capitalismo vio las enormes posibilidades que estas redes ofrecían para una extensión veloz y sin cortapisas, ni controles financieros para el libre mercado global, desmaterializando y digitalizando las economías, se pueden hacer negocios millonarios a más de 10.000km, en tiempo real. En el nuevo contexto de la globalización, el capitalismo se ha impuesto ya no única y exclusivamente como un modelo económico y político sino, que también implica modos de producción de las subjetividades. Y necesita de productos de las tecnologías de la visualidad para transmitir ideología y potenciar el consumo. En este marco político las condiciones para las mujeres y los grupos sociales más vulnerables, sobre todo en los países en proceso de desarrollo, han involucionado significativamente. Los brotes de racismo, misoginia, homofobia, lesbofobia, etc. encuentran un caldo de cultivo fundamental para extenderse y perpetuarse. Estas violencias de género, sexuales y étnicas, están sistemáticamente siendo desplazadas o instrumentalizadas en las agendas políticas y en las prácticas gubernamentales de los países desarrollados. En este sentido, en el cruce de discursos del imperialismo, el patriarcado y la globalización están surgiendo nuevas violencias de clase, de raza y por supuesto de género, que exigen la construcción de nuevos sujetos políticos, de nuevas subjetividades. Los Nuevos Movimientos Sociales y sus estrategias activistas y las nuevas prácticas culturales proponen alternativas a este modelo de sociedad, no categóricas, no estables, que son comparables a ciertas formas de política feminista actual. Podemos afirmar que existen claras relaciones entre globalización de los mercados, libertad de movimientos de bienes financieros y mercancías, restricción de los movimientos de las personas y el abandono de las políticas de protección de los sujetos socialmente más vulnerables, con un constante olvido de los más básicos derechos humanos. Todo esto se refuerza con las ideologías patriarcales e imperialistas sobre género – sexo, raza y clase. Durante la última década, los estudios sobre la globalización han expuesto de manera clara la reorganización global de la producción pero se ha dicho poco acerca de su “otra parte”: la reorganización global de la reproducción. En este “lado femenino de la globalización” las mujeres de color del sur global cada vez trabajan más como trabajadoras reproductivas para familias en el norte. Con esta división del trabajo reproductivo del hogar basada en el género y la raza, la globalización ha moldeado un “nuevo orden doméstico mundial”: 82

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Lo que esta en juego es la elección de una civilización asentada en el repudio del sexismo y del racismo y en la aceptación de las diferencias, no sólo en términos de normas legales, formales sino también en el reconocimiento más profundo de que únicamente la multiplicidad, la complejidad y la diversidad pueden proporcionarnos la fuerza y la inspiración para enfrentar los desafíos de nuestro mundo. (Braidoti, 2004) Del repertorio de problemas que plantea la inserción del arte de las periferias al proceso de globalización, la lucha por una circulación cultural más equitativa sigue manteniendo un campo de batalla bastante activo, que obliga a los diferentes actores de esta red de intercambios a definir, de entrada, su postura en relación con tópicos como contexto, especificidad, territorio, etc. Aún en una circunstancia histórica que, en la forma, aboga por el desdibujamiento de las fronteras a las que de algún modo refieren, estos tópicos han mostrado una resistencia obstinada a abandonar la escena, y dada la forma en que, una y otra vez, afloran en las valoraciones, ponen en evidencia que el peso de un locus periférico desterritorializado como vector cultural, no logra desplazar a ciertas condiciones de existencia irrenunciables cuando se trata de ser y tener nombre en los mapas y en los discursos. En una entrevista a Geta Kapur a propósito de la vocación totalizadora y universalista de Documenta X, la intelectual hindú valoró con insistencia la importancia de los desarrollos regionales para una recuperación real de la imagen conflictiva e irreductible de la cultura contemporánea. Recalca insistentemente que trabajar circunscritos a la producción artística de un país o de una región específicos, tiene validez porque existe un contexto que es fundamental y único que debe ser considerado y rescatado para entender las complejidades y riquezas de su producción artística. Una suerte de regionalismo crítico, modelado por un programa en el que las expectativas de desarrollo se fijan a partir de condiciones propias; y aquellas a su vez, tienen como motivación el afán de remover lastres de una institución cultural conservadora e incapacitada para asumir los retos de la cultura contemporánea. El análisis de las prácticas artísticas en los marcos institucionales inscritas en un contexto preciso, postula una axiología que aclara cómo un medio administra sus necesidades y cómo a partir de éstas, arma su propia agenda. El método es en esencia crítico con relación a cualquier compromiso con viejos esquemas y apunta a descubrir articulaciones entre lo local y lo global, de manera que lo que es significativo en un sentido, pueda ser coherente y productivo en el otro. Este método enfoca la superación de las limitaciones que afrontan muchos contextos para ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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consolidar una escena de arte contemporáneo, ya que concede prioridad a la construcción de discursos críticos, un ámbito discursivo que reflexiona entorno a los efectos que produce lo transcultural. Es evidente que el arte comprometido-social de nuevo cuño trata de recuperar su lugar en la esfera pública, abordando problemas de la agencia social con lenguajes que interpelan de manera más eficiente a la conciencia colectiva. Éstos representan procesos que podrían servir de punto de partida para una caracterización de las relaciones entre los nuevos sentidos del arte que se van estabilizando en la producción emergente y las operaciones conceptuales que han ganado presencia y representan la voluntad de diálogo en sintonía con la cultura artística internacional/global. Sería interesante analizar este fenómeno en el marco del concepto de toma de conciencia de “membresía” por parte de nuevos sectores de la población, en los términos que lo analiza Saskia Sassen en sus teorías sobre la globalización; una membresía que significa presencia pero no necesariamente implica poder. Sin embargo es preciso investigar las verdaderas raíces en las consecuencias de los movimientos feministas, vividos en variados grados de intensidad y digeridos de una manera particular debido a las estructuras sociales y políticas que han regido cada país. En efecto, se vuelve casi inevitable referirse a asuntos de género al estudiar los fenómenos asociados a las nuevas condiciones económicas y sociales globales, las modificaciones en la población laboral activa, y la masiva migración de personas, entre ellos, latinoamericanos y latinoamericanas hacia Estados Unidos o Europa. Los cambios recientes han producido el surgimiento de nuevos y dinámicos actores no oficiales, que funcionan al margen del discurso único, hegemónico y por supuesto masculino que desde ciertos sectores aun tratan de imponer. Es en este sentido, la constatación de cómo los grupos de mujeres y sus temáticas, siguen siendo invisibilizadas, poco investigadas y desplazadas, y por supuesto también en las agendas artísticas, y aún menos expuestas y promocionadas a un lado y otro del Atlántico. Esto es así pues certificamos que en las grandes exposiciones recientes que se han realizado sobre arte político, el número de personas o grupos que traten cuestiones de géneros es prácticamente nulo. Pudimos verlo en Desacuerdos, en el Macba-Barcelona, un proyecto que analizaba las prácticas artístico políticas desde la transición hasta nuestros días, y pretendía construir una contrahistoria del arte oficial, rescatando otros modos de trabajo que no hubiesen sido legitimados por la crítica hegemónica. La cuestión es que algunos fueron rescatados y 84

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contextualizados, y también algunas de las investigaciones han servido de acicate para comenzar a realizar un trabajo mas serio de la historiografía, pero en relación a lo que es exponible o museable, muchos de los contenidos y temas que las investigaciones aportaban y cuestionaban no fueron tratados. Lo mismo, aunque en otro orden, esta ocurriendo con las exposiciones internacionales de arte político, también latinoamericano, que vienen realizándose, como las sucesivas Documentas del 97 y del 2002, o las Bienales de Venecia o Berlín, que parecen justificar una nueva “moda” del arte político, o la exposición que con el título de Ex-Argentina se realizó en el Museo Ludwig de Colonia en 2004, o la mas reciente Creatividad Colectiva, en el Museo Fridericianum de Kassel en 2005. Todas estas muestras toman partido de la discusión arte-política-militancia que aparentemente inunda la institución artística internacional de forma renovada. Aunque esta visibilidad no es fruto de de una concesión del sistema del arte por fin democratizado sino porque nos encontramos con un reflejo en el campo artístico de una presencia de proyectos que transcurren en paralelo a las nuevas formas de militancia autónoma, de nuevos sujetos políticos. Como se comenta en la revista Brumaria, que en su no 5 titulado “Arte: la imaginación política radical”, aporta un gran número de investigaciones sobre el tema y cuestiona cómo al hablar de una mayor visibilidad de una diversidad de formas de lo político no puede hacerse sin constatar que tal presencia en el circuito del arte oficial oscila entre la marginalidad y un tipo de centralidad supeditada que sirve contradictoriamente a la renovación del sistema del arte globalizado. Al revisar estas exposiciones, diversas todas ellas, nos damos cuenta de la inexistencia de trabajos de mujeres en grupo o individualmente que son expuestos, y también de la ausencia de sus contenidos, temas y estrategias artísticas. No podemos dejar de pensar que de nuevo el trabajo de las mujeres no es tomado en serio, y por supuesto queda relegado a un segundo orden, frente a los grandes temas que el arte político pone sobre el tapete. No por ello dejan de existir personas y grupos de un lado y otro que llevan trabajando muy seriamente en torno a ello. Pero en verdad son mas visibles las carencias, la casi total inexistencia de crítica y de libros sobre mujeres artistas, y aún mas desde una perspectiva feminista. Y por supuesto también, la ausencia de materias que traten desde una perspectiva de género los temas del arte en los centros de enseñanza e investigación.

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Dรกria Jaremtchuk

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Ações políticas na arte contemporânea brasileira

Ações políticas na arte contemporânea brasileira Dária Jaremtchuk* O artigo tem como objetivo discutir possíveis relações entre arte e política a partir de trabalhos de Rosângela Rennó, Rosana Paulino e do coletivo Cine Falcatrua. O binômio arte-política, quase sempre pensado como uma forma de ação, pode aparecer sob múltiplas formas, imbricado nos filamentos de redes de poder. Refazer, pelo avesso, a memória nacional, rever relações estanques de gênero e raça, ou discutir as forças econômicas que regem a circulação de signos são atuações possíveis em uma arena na qual as formas de poder e dominação se multiplicam. Arte contemporânea brasileira, arte e memória, arte e história

Iniciar uma reflexão sobre ações políticas na arte contemporânea brasileira é, primeiro, delimitar as condições de produção e exibição dos trabalhos. Em sua grande maioria, circulam dentro da moldura tradicional, em espaços beneficiados por Leis de Incentivos Fiscais, como museus, a Bienal de São Paulo, salões e mostras em centros culturais. Com políticas culturais descontínuas e pouco claras, essas instituições realizam a maior parte das exposições temporárias e das retrospectivas de arte, bem como publicam significativos catálogos. O crescente papel das galerias nas últimas décadas e o aquecimento do mercado para arte contemporânea completam o quadro do ainda incipiente sistema de arte brasileiro. Mas, além dessas preponderantes macrodemarcações, deve-se considerar a força dos coletivos artísticos que operam em outras dimensões, abrem novas fronteiras e dão à arte novos desdobramentos. Dentro dessas condições, selecionamos os trabalhos de Rosângela Rosângela Rennó. Atentado ao poder (via crucis) / Imemorial , 1992 / 1994 * Dária Jaremtchuk é professora de Arte, Literatura e Cultura do Brasil da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP). Autora do livro Anna Bella Geiger: passagens conceituais (C/Arte e EDUSP, no prelo). Entre os artigos publicados está “Desconstruções alegóricas de Anna Bella Geiger” no livro A fotografia nos processos artísticos contemporâneos. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Rennó, Rosana Paulino e do coletivo Cine Falcatrua para melhor compreendermos as relações possíveis entre arte e política. A análise específica das obras poderá remeter-nos a conflitos e contradições sociais restituídos e nos permitem identificar o espaço da arte, sobretudo, como prática de resistência ou de interferência. Iniciamos nossa análise com o trabalho Imemorial, de Rosângela Rennó. Realizado em 1994, compõe-se de reproduções de originais fotográficos dos operários que construíram Brasília, a capital do país. Retirados do Arquivo Público do Distrito Federal originalmente estavam 87


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anexados às fichas funcionais da Novacap.1 Compõe-se de 50 retratos, dos quais 40 são de operários e funcionários mortos2 e 10 de crianças, não necessariamente mortas, que trabalharam na construção3. As imagens dos candangos4, originalmente retratos 3x4, foram ampliadas e dispostas na vertical (paredes) e na horizontal (chão). Essa organização promove um campo de intersecções e articulações em que a instabilidade e a precariedade se evidenciam. A apresentação não se resume ao espelhamento das imagens do arquivo, haja vista que foram manipuladas pela artista. Tal como lápides, os retratos do chão receberam depois da revelação uma camada de tinta preta que contrasta com a prata do filme e resulta numa pulsação luminosa. Já as imagens da parede, permanecem similares às originais, envelhecidas e com as marcas da passagem dos anos. Com essa integração entre verticalidade e horizontalidade, branco e negro, espaços vazios e espaços preenchidos, a artista criou uma nova relação temporal, só que agora envolvendo o porvir. Os lugares vazios no chão parecem reservados àqueles que permanecem nas paredes e ainda vão tombar. Imemorial possibilita uma operação de anamnese, uma busca de vestígios dos ausentes da história nos registros oficiais de um dos mitos da história brasileira. É importante lembrar que após a Segunda Guerra Mundial, sobretudo na década de 1950, havia um otimismo contagiante que fazia crer que o Brasil superaria seu atraso industrial e econômico. A criação de Brasília simbolizava essa nova era.5 Segundo o antropólogo americano James Holston, a criação da nova cidade significava uma ruptura com o passado e o alinhamento com um futuro glorioso. Era um “apelo simbólico do modernismo de Brasília. É a estética do apagamento e da reinscrição, da possibilidade apontada pela arquitetura e pelo planejamento modernistas de apagar a velha ordem e reinscrever uma nova”.6 Aqui se faz necessário abrir um parêntesis com alguns dados sobre a história da construção da cidade. Com isso, se compreenderá melhor a dimensão social do trabalho de Rennó. Como afirma Jacques Rancière, “Passar dos grandes acontecimentos e personagens à vida dos anônimos, identificar os sintomas de uma época, sociedade ou civilização nos detalhes ínfimos da vida ordinária, explicar a superfície pelas camadas subterrâneas e reconstituir mundos a partir de seus vestígios, é um programa literário [e poderíamos acrescentar artístico], antes de ser científico”.7 A edificação de Brasília durou cerca de três anos. O governo utilizouse de larga e efusiva campanha para atrair os operários necessários para a obra. Sob rígida e exaustiva jornada de trabalho, o local recebeu 88

1 Os documentos estão agora no Arquivo Público do Distrito Federal. Todos os trabalhadores possuíam inscrição na Novacap, o que significa que para se estabelecer como operário da nova capital era necessário apresentar ao órgão carteira de trabalho e fazer exame médico para receber uma cédula de identidade do Departamento de Segurança da Novacap. Somente após este processo podia-se procurar emprego nas listas das empresas privadas. As zonas de ocupação eram controladas, pois se temia que os trabalhadores pudessem se estabelecer na cidade que crescia. Por isso, os acampamentos eram constantemente vigiados pela segurança. Já os empregadores tinham direitos, privilégios e poderes. 2 Ocorreu um massacre realizado pela Guarda Especial de Brasília dentro de um alojamento de uma das construtoras. O fato foi abafado na época para não dar publicidade negativa à construção da cidade. Depoimento da artista enviado por e-mail para a pesquisadora no dia 30/04/2006. 3 Como declarou a artista, a escolha das imagens baseou-se no critério estético, mas houve limitação, pois muitas fichas eram destituídas de fotografias. Depoimento da artista enviado por e-mail para a pesquisadora no dia 30/04/ 2006. 4 Primeiramente, o termo candango foi utilizado pelos africanos para designar os portugueses. Passou a designar os operários das grandes obras da construção de Brasília que, em sua maioria, eram nordestinos. Também por um período, denominava os primeiros habitantes de Brasília. Mas, como aponta James Holston, depois da inauguração da cidade, candango voltou a ser um termo pejorativo, sinônimo de pessoa não aceitável socialmente e oposto ao termo brasiliense. Ver: Holston, James. A cidade modernista: uma crítica de Brasília e sua utopia. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 215. 5 Em 19 de setembro de 1956 foi sancionada a Lei n o 2.874, que criou a Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap). O edital do concurso para a escolha do projeto urbanístico de Brasília foi marcado para março de 1957, e a inauguração ocorreu em 21 de abril de 1960. 6 Holston, op. cit., p. 208. 7 Rancière, Jacques. A partilha do sensível. Estética e política. São Paulo: EXO experimental org.; Ed. 34, 2005, p. 49. concinnitas


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um contingente inimaginável de homens que chegavam a cumprir 90 horas por semana. Pouco qualificados e sem treinamento adequado, eram subjugados às empresas de construção, que tampouco cumpriam as leis trabalhistas, interpretadas como obstáculo para o prazo de entrega da nova cidade. Diante desse cenário com pouca segurança e garantias, houve inúmeros acidentes e mortes. Os candangos que aderiram à campanha governamental foram transformados em heróis nacionais durante a construção, mas foram excluídos do plano político e administrativo da nova cidade, como também do plano simbólico. Estudando a cidade, James Holston concluiu que, diferentemente do Leste Europeu onde, após a Segunda Guerra, se levantaram representações monumentais para os operários da construção, em Brasília não há nenhuma obra entre os 25 monumentos oficiais da cidade. Para o antropólogo americano, a justificativa “para esta ausência simbólica é óbvia (...): em seu conjunto, os pioneiros nunca tiveram um lugar que lhes fosse reservado na cidade do futuro e assim não poderiam ser glorificados lá”.8 Portanto, Imemorial resgata as personagens subterrâneas apagadas das páginas da história oficial. O monumento fotográfico, além de discutir o papel do coletivo como agente da história, rende homenagem ao homem comum anônimo, lhe restitui um lugar e lhe dá visibilidade. A obra contrasta, por exemplo, com o grande Memorial JK (Juscelino Kubitschek) erigido em Brasília em 1981. Aqui, a figura singular do ex-presidente é exaltada como ser soberbo e único sobre o espaço da cidade. Também para o trabalho Cicatriz foram utilizadas fotografias de arquivo, agora do Museu Penitenciário Paulista. Realizadas nas primeiras décadas do século XX, eram utilizadas em pesquisas médicas. As imagens de sinais físicos peculiares, como redemoinhos, cicatrizes e tatuagens eram observadas pelos médicos como marcas de identificação e possíveis conexões com características psíquicas dos detentos.9 Rennó soube da existência do acervo dos negativos em vidro na Academia Penitenciária do Estado e verificou que estavam condenados ao lixo e ao esquecimento por falta de preservação e de conservação. Para que subsistissem, seria necessário um trabalho especial com o material. A artista realizou então um projeto com a ajuda de algumas entidades,10 e instalou 8 Holston, op. cit., p. 216. 9 As imagens eram, em sua maior parte, de rosto de frente e perfil, nus de corpo inteiro, frente, perfil e costas; havia também umas 3.000 fotos de tatuagens, marcas e cicatrizes, algumas fotos de doenças e anomalias, e 30 fotos de cabeças de costas. 10 A Funarte, a USP e a Associação de Arquivistas Brasileiros estão entre elas. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

um estúdio nas dependências da penitenciária para restaurar e catalogar os negativos, muitos já perdidos. Foi um trabalho, portanto, de intervenção política direta no arquivo que possibilitou o seu salvamento. Dessa forma, a recuperação do material e a visibilidade que as imagens receberam no campo estético (Vulgo series) chamaram a atenção para ausência de políticas públicas com a memória do sistema penitenciário e revelaram também a 89


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prática por parte do Estado de uma medicina herdeira dos princípios lombrosianos. Esse trabalho, em última análise, nos remete às teses de Foucault sobre os sistemas penitenciários, nas quais o pensador francês demonstra a centralidade do corpo humano nas estruturações de controle social.11 Inúmeros artistas contemporâneos exploram o tema arquivo. No caso de Rennó, os trabalhos possuem um forte matiz político, pois são realizados em um país em que a elite política e econômica, que tem o poder de construir o passado, tem pouco cuidado com o patrimômio arquivístico e histórico-cultural. A precariedade material no armazenamento e na manutenção de documentos sob a tutela do Estado acarreta constantes danos e perdas. Tampouco há preocupação quanto ao acesso às informações. Arquivos referentes à ditadura militar, por exemplo, permanecem inacessíveis ou com consultas restritas. Além disso, nos últimos anos a pouca segurança nas instituições contribuiu para uma onda de roubos de peças valiosas, sem que fossem tomadas medidas condizentes, mesmo que a posteriori. Enfim, há um contínuo apagamento de fragmentos de memórias que favorece a amnésia no país. E as obras de Rennó contribuem para demonstrar a existência e a gravidade desse processo. Da mesma forma, Atentado ao Poder revela o jogo ideológico nas representações. Realizado em 1992, constitui-se de apropriações de fotografias de jornais do Rio de Janeiro, publicadas entre os dias 2 e 14 de junho de 1992. Nessas datas, realizou-se o Fórum Global – Rio 92. O governo carioca recepcionou as personalidades vindas de diferentes países com um forte esquema de segurança e alterou o fluxo e a rotina de parte da cidade para a realização do evento. Mendigos e moradores de rua foram removidos, numa verdadeira operação de maquiagem. O constante policiamento na área próxima ao evento inibiu assaltos e furtos e naqueles dias os índices de criminalidade mostraram uma cidade menos violenta. Assim, igualmente em Atentado ao Poder reaparece o binômio lembrar-esquecer tratado como operação intencional em que personagens incômodos e indesejados são escondidos e permanecem imemoriais nas topologias oficiais. Mas eles insistem em reaparecer, mesmo que na arte. Também como parte das atividades oficiais, foram convidados artistas para produzir obras relacionadas ao evento. Rennó estava entre eles e selecionou 15 fotografias de pessoas assassinadas publicadas nos jornais A Notícia e O Povo na Rua durante os dias do Fórum Global. Se os jornais da classe média tiveram a conferência internacional como foco de suas notícias, os jornais populares seguiram sua rotina exibindo a vida e a morte em suas facetas mais violentas. Assim, as 15 imagens de mortos que foram publicadas originalmente no sentido horizontal nos jornais, 90

11 Foucault, Michel. Vigiar e Punir. História da Violência nas Prisões. 20 ed. Petrópolis: Vozes, 1999. concinnitas


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Rosângela Rennó. Vulgo & Anonimato, 1998-1999

foram invertidas pela artista em Atentado ao Poder. Com a ampliação, a verticalização das fotografias, a crueldade e o grau de violência acentuamse, além de provocar vertigem e estranhamento nessa nova leitura. Como afirma Paulo Herkenhoff, o “gesto da artista altera o caráter estático dos cadáveres, conferindo-lhes tensão, como forma de burla de seu rigor mortis. Parecem estar desafiando a lei da gravidade”.12 Da mesma forma, a apresentação daqueles cadáveres que se encontram não na cúpula sobre a terra, como anuncia o título do trabalho, mas embaixo dela, contrasta com a imagem oficial criada em torno da Cidade Maravilhosa, o Rio de Janeiro. O halo verde proveniente da aplicação de luz atrás dos corpos relaciona-os diretamente ao tema do evento internacional, ecologia, de modo incômodo. Igualmente trabalhando com resignificações de códigos, estão os trabalhos da paulista Rosana Paulino. São freqüentes em suas produções rememorações ativas de sentidos reprimidos, recalcados ou ausentes dos códigos visuais tradicionais. Suas narrativas entrelaçam questões raciais, de classe social e também de gênero. Em Parede da memória, por exemplo, composto a partir de fotografias de seu próprio álbum de família, ela articulou passado e presente, biografia e condição históricosocial. A partir da elaboração desse quadro genealógico de pertencimento a um grupo marginalizado na sociedade brasileira, revela a continuidade e a permanência de conflitos. As condições sociais e históricas que se repetem podem ser inferidas pela multiplicação dos rostos desgastados

12 Herkenhoff, Paulo. “Rennó ou a beleza e o dulçor do presente”. In: Rosângela Rennó. São Paulo: Edusp, 1998, p. 149. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

e desbotados sugerindo a continuidade de papéis subalternos no panteão dos heróis da história oficial e pelo escasso e tímido crochê que envolve, articula e fixa as personagens negras no universo do trabalho manual. 91


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Já na obra Bastidores, a exclusão e a subjugação do negro são mostradas de maneira crua. A linha aparente e o bordado rude transformam os retratos em exemplares da condição dos afrodescendentes, reverberando sua difícil condição social. Os bordados afastam-se das qualidades e delicadezas que lhes são próprios e se aproximam de operações de estancamento ou de impedimento. As costuras e suturas mal feitas parecem agir sobre cortes profundos. Se os negros eram amarrados, amordaçados e silenciados quando escravos, suas imagens na série Bastidores trazem à tona resquícios daquela condição. Emolduradas em bastidores, instrumento típico do trabalho manual que serve para prender o tecido para o bordado, os retratos apresentam-se como identidades alinhavadas, transitórias e precárias. Assim, a costura de Paulino se transforma em escritura e intervenção críticas porque exibe formalmente um sentido camuflado no âmbito social. Da mesma forma, possibilita questionar lugares preestabelecidos para as diferenças sociais que incansavelmente são apresentadas como “o outro” nos códigos hegemônicos e ideológicos da cultura. É importante lembrar que o Brasil foi o último país do Ocidente a abolir a escravidão. Como afirma Foucault, “e se designar os focos, denunciá-los, falar deles publicamente é uma luta, não é porque ninguém ainda tinha tido consciência disto, mas porque falar a esse respeito – forçar a rede de informações institucional, nomear, dizer quem fez, o que fez, designar o alvo – é uma primeira inversão de poder, é um primeiro passo para outras lutas contra o poder”.13 E a obra de Paulino parece realizar essa tarefa, pois ultrapassa o âmbito estético e propõe o envolvimento da arte com questões estruturais da sociedade brasileira. Assim, embates camuflados e recalcados que resistem ao esquecimento, como o racismo, o patriarcado e o poder do branco do sexo masculino, vêm à tona. O debate em torno dos diversos poderes na sociedade levou várias artistas a abordar a questão de gênero. A partir das décadas de 1960 e 1970, Anna Bella Geiger, Ana Maria Maiolino e Iole de Freitas dedicaramse ao tema. Rosana Paulino faz parte de uma geração mais jovem que levanta questões acerca do papel da mulher. Em sua série Models, por exemplo, explora o protótipo de beleza na formação do ideário feminino durante a infância. Partindo da imagem de uma de suas bonecas, Paulino redesenha corpos de mulheres. Nos traços agudos de seus trabalhos é possível reconhecer a permanência das medidas dos padrões esquálidos de seu brinquedo de outrora. Porém, as alterações tornaram-se mais significativas e proeminentes: sob a imagem padrão, a artista marcou os atributos sexuais do corpo feminino. Partes genitais, seios e as nádegas foram acentuadas e exageradas. O padrão de beleza perfeita e 92

13 Foucault, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979, pp. 75-76. concinnitas


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idealizada da boneca branca de olhos claros confronta-se com o real corpo feminino e suas múltiplas condições: sofrimento, violência, fertilidade, procriação e prazer. Nas palavras da artista: Desenhar como exercício de observação. Fazer com que a linha disseque a perversidade de um modelo de beleza. Boneca fria, modelo vazio. Um modelo de beleza que nunca poderá ser atingido. Um modelo que é a antítese da própria essência da feminilidade, terra assolada onde nada cresce, os corpos deformados por um padrão de beleza doentio, onde seios fartos convivem com um corpo que não corresponde em peso ao seu tamanho. Em suas obras recentes, o tema da identidade da mulher continua sendo explorado. Porém, o interesse recai agora sobre o universo arquetípico, e o sexo feminino aparece representado na figura da tecelã, aquela que constrói teias, reata e desata os fios da vida. O fio como condição de ligação, de condução e de transferência, é um elemento constante em seus trabalhos. O tema possui vínculo também com seu entorno particular: as mulheres bordadeiras com as quais Paulino conviveu em seu bairro. E para finalizar este breve percurso, é necessário mencionar a importância dos coletivos para novos contornos e possibilidades do campo artístico. Responsáveis por práticas que ultrapassam os espaços institucionais tradicionais, têm atuado em variadas frentes, realizando de intervenções urbanas até atividades junto aos movimentos sociais. Utilizam a internet como meio privilegiado de comunicação e veiculação de idéias. Ademais, muitos deles expandiram o circuito cultural para fora de limites tradicionais, formando uma teia. Destacaremos aqui o Cine Falcatrua radicado em Vitória, cidade distante dos núcleos que concentram o maior número da produção cultural no país, o Rio de Janeiro e São Paulo. O grupo ganhou projeção por colocar em pauta a discussão sobre o poder e o controle da produção audiovisual. Surgiu em 2004 como projeto de extensão na Universidade Federal do Espírito Santo. Formado por alunos de diferentes cursos, desenvolveu formas alternativas de distribuição e exibição cinematográfica. Criou um programa que engloba cineclube móvel com exibições em locais públicos variados, elaboração de material didático e oficinas para produção e exibição de vídeo. Com equipamento digital, o coletivo começou exibindo no campus da universidade sessões gratuitas de filmes baixados pela internet. As programações incluíam desde seriados de tevê, raridades, curtas e filmes ausentes do circuito convencional da cidade. Utilizando tecnologias digitais ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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caseiras, propõe maior democratização e acesso à cultura com uma nova configuração de mídia mais acessível. Com isso, a distribuição e a exibição audiovisual calcadas no sistema de propriedade intelectual e direito autoral se transformam. Em essência, as ações colocam em xeque o controle da produção audiovisual e o entrave à circulação de informações na sociedade e questionam a exclusividade e a lucratividade da indústria cinematográfica. As atividades tornaram-se conhecidas e concorridas no campus da universidade. Houve sessões gratuitas os filmes Kill Bill (parte 2), de Quentin Tarantino, e Farenheit 11 de setembro, de Michael Moore, antes mesmo de suas estréias no circuito comercial brasileiro. O fato acabou chamando a atenção da mídia, e o jornal Folha de S. Paulo noticiou o episódio. Após a publicação da matéria, o Cine Falcatrua passou a ter problemas legais. As distribuidoras Lumière (Kill Bill) e Europa (Fahrenheit 11 de setembro) entraram com uma ação judicial acusando a universidade de “concorrência desleal”. O caso ainda está em tramitação, e os integrantes do coletivo ainda prestam depoimentos na justiça sobre o caso. Com a repercussão do episódio, houve protestos de diversos setores da sociedade. Nas palavras do coletivo: “claro que depois também veio uma onda de moções de apoio: o movimento cineclubista nacional e internacional, cineastas, produtores, festivais, jornalistas, intelectuais – enfim, uma galera se manifestou pela continuidade do videoclube, e botou lenha no debate sobre os cruzamentos entre cinema e internet. Foi aí também que muitos realizadores começaram a enviar filmes espontaneamente para o Falcatrua”. Assim, após esse ocorrido, as projeções são na maioria de filmes independentes e ligados ao Creative Commons e copyleft. Para Falcatrua, o Creative Commons é “uma forma de conformar o direito constituído à economia inevitável da rede. Por enquanto, é a saída mais viável para quem quer aproveitar determinados potenciais de difusão e criação propiciados pelas novas tecnologias e virar as costas de forma limpa a uma economia que perde cada vez mais o sentido. Daí buscamos difundir as vantagens desse tipo de licenciamento para quem está envolvido com o trabalho realmente criativo (...) como uma forma de compartilhar conhecimento livremente e construir subjetividades coletivamente. Uma forma de aproximar a produção cultural da cultura real”. Também no início de 2006, realizaram o Festival CortaCurtas para a exposição Paradoxos Brasil.14 Divulgaram um edital para inscrição de filmes, garantindo aos inscritos que não haveria pré-seleção e que todo material enviado seria exibido na mostra do Instituto Cultural 94

14 A exposição é fruto do projeto Rumos, promovido pelo Instituto Cultural Itaú de São Paulo. O objetivo é mapear a produção emergente em todo o Brasil em diversas áreas: artes visuais, música, dança, cinema e vídeo. concinnitas


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Itaú. Porém, advertiam que as apresentações não seriam na íntegra. Receberam 265 trabalhos que variaram de vídeoarte a festas de aniversário. O que o coletivo propunha era a apropriação dos trabalhos enviados e um novo formato de exibição para eles. O objetivo era criar uma nova relação calcada no binômio projecionista-público. Declararam que “o controle das exibições não estará nas mãos de quem paga ou de quem planeja, mas de quem opera as máquinas. Como na época do primeiro cinema, é o projecionista que decidirá o que passar e como passar”. Ou seja, a idéia era transformar o operador das máquinas em ser ativo e não cumpridor de instruções predeterminadas. Surgiria então uma espécie de DJ visual com autonomia e interatividade com o público, fazendo cortes e junções arbitrárias durante as projeções, ou seja, haveria mutilação criativa. No entanto, alguns inscritos não entenderam a proposta do Falcatrua e solicitaram a devolução de seus trabalhos, pois desejavam que suas obras fossem vistas na íntegra e sob o formato em que foram pensadas. Enfim, o Cine Falcatrua atua nos interstícios, entre os espaços institucionais e as novas redes, onde os coletivos são sua melhor expressão. Criando espaços alternativos e estratégias diversificadas, esses grupos demonstram que a atualidade se caracteriza pela descentralização e pela existência de círculos variados que se conectam formando um território fora das tradicionais fronteiras modernas. Se a noção de autonomia artística, direitos autorais, propriedade intelectual, ainda estrutura o sistema de arte, essa nova geração promete, ao menos, acaloradas discussões e questionamentos instigantes sobre essas velhas questões. Com estes exemplos – Rennó, Paulino e o Cine Falcatrua – intencionalmente díspares, podemos retornar às questões iniciais. O binômio arte-política, quase sempre pensado como uma forma de ação, pode aparecer sob múltiplas formas, imbricado nos filamentos de redes de poder. Refazer, pelo avesso, a memória nacional, rever relações estanques de gênero e raça ou discutir as forças econômicas que regem a circulação de signos são atuações possíveis em uma arena na qual as formas de poder e dominação se multiplicam. Também múltiplas devem ser as maneiras de repensar as estratégias artísticas.

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Sheila Cabo Geraldo

Jarbas Lopes. Troca-troca, Rio de Janeiro/ Curitiba, 2002/2004

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Qual política: microagências artístico-historiográficas

* Sheila Cabo Geraldo é doutora em História pela UFF, onde defendeu a tese Arte e Modernidade Germânica, em 2001. É professora de História da Arte no Instituto de Artes e no programa de Pós-Graduação em Artes da Uerj. Pesquisadora Procientista da Uerj desde novembro de 2006, participa também do grupo de pesquisa Arte e Política: Argentina, Brasil, Chile e Espanha 1989-2004. É editora responsável da revista Concinnitas, do Instituto de Artes da Uerj. 1 Foucault, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005, p. 18. 2 Foucault, Michel. “Theatrum Philosophicum”. In Ditos e Escritos. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000, p. 140. 3 Seria importante esclarecer que estaremos falando de campo no mesmo sentido que Deleuze e Guattari definem o mapa, ou seja, como fazendo parte do rizoma e, portanto, “aberto, conectável em todas as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente.” Cf. Deleuze, Gilles; Guattari, Felix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol 1, Rio de Janeiro: Editora 34, 1995. 4 Esse foi um pensamento recorrente nos anos 80 e 90, quando da propalada “volta à pintura” e da disseminação do “fim da utopia”, que considerou as duas décadas anteriores marcadas por uma proximidade, naquele momento impossível, entre arte e política. Cf. Goto, Newton. Sentidos (E Circuitos) Políticos da Arte: afeto, crítica, heterogeneidade e autogestão entre tramas produtivas da cultura. 5 O final dos anos 60 é marcado no Brasil pela intensa discussão desencadeada pelas mostras Opinião 65 e Opinião 66, mas sobretudo pela mostra Nova Objetividade, de 1967, que apontou para a antiarte e para uma declarada tomada de posição em relação aos problemas políticos. Hélio Oiticica, que escreveu um verdadeiro manifesto na apresentação da mostra de 67, refere-se a um “estado típico da arte brasileira de vanguarda atual”, enumerando os itens do que poderíamos chamar de “programa” dos artistas: 1. vontade construtiva geral; 2. tendência para o objeto, ao ser negado e superado o quadro de cavalete; 3. participação do espectador (corporal, tátil, visual, semântica, etc.); 4. abordagem e tomada de posição em relação a problemas políticos, sociais e éticos; 5. tendência para proposições coletivas e conseqüente abolição dos “ismos” característicos da primeira metade do século na arte de hoje (tendência essa que pode ser incluída no conceito de “arte pós-moderna” de Mário Pedrosa); 6. ressurgimento e novas formulações do conceito de antiarte. Nova Objetividade Brasileira. Rio de Janeiro: Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, 6 a 30 de abril de 1967, catálogo. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Qual política: microagências artísticohistoriográficas Sheila Cabo Geraldo* Identificando a ação de artistas e coletivos de artistas no Brasil contemporâneo, o texto tem como questão principal o desafio da escrita da história e da crítica de arte, concentrando-se na discussão sobre a memória histórica e a atuação política. Considerando o debate sobre a hegemonia cultural, assim como o das fronteiras na definição da arte, da teoria histórica e da atividade crítica, a discussão historiográfica desenvolve-se a partir das noções de exterioridade, resistência, agenciamento e micropolítica. Microagenciamento, contemporâneo, resistência

O solo sobre o qual repousa é o que ela descobriu. Michel Foucault 1 Gostaria de começar citando uma frase que Foucault escreveu ao resenhar os livros Lógica do sentido e Diferença e repetição, de Gilles Deleuze – que ele considerou o grande pensador do século 20. Ei-la: “O pensamento tem que pensar aquilo que o forma e se forma do que pensa”.2 É dessa maneira que considero fundamental pensar a ação dos artistas e dos grupos que serão mostrados aqui, no sentido de reconhecê-los como formadores do pensamento contemporâneo em arte-política, assim como considero minha ação historiográfica incluída na formação desse pensamento. Entretanto, antes de passar às ações que acredito constituírem esse campo 3 conceitual, e de acordo com o tema deste encontro, vou fazer uma breve introdução sobre o que entendo como arte política na contemporaneidade. Ao contrário do que mais facilmente se poderia supor, sobretudo se se fala em América Latina, a arte política não está aqui entendida como arte de protesto e engajamento na luta contra os regimes políticos autoritários, como foi contra a ditadura a arte dos anos 60 e 70 no Brasil.4 Não podendo desconsiderar a potência política dos trabalhos de Hélio Oiticica,5 Cildo Meireles, Artur Barrio, Luis Alphonsus, Carlos Zilio, Antônio Dias e Antônio Manuel – cujas transgressões experimentais os fizeram, no final dos anos 60, serem chamados de subversivos –, o sentido do que estaremos tratando aqui como aproximação entre arte e política é outro. 97


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Evidentemente alguns desses artistas, além das experimentações na linguagem, já vinham tratando a arte como uma estratégia de inserção e contextualização nas tramas sociais, agindo por meio de mensagens explícitas, metáforas e analogias. O caso mais notório parece ser o da série Inserções em circuitos ideológicos, de Cildo Meireles. Entretanto, o que se percebe hoje como sentido político da arte parece ser uma espécie de recriação dessas inserções, agora especialmente marcadas pelo crescente deslocamento do campo específico da linguagem e do meio para o ambiente ampliado das relações culturais, que conectam distâncias e negociam significados. 6 Mostram-se, assim, políticas as ações artísticas enquanto mapeamento e apropriação de códigos culturais, enquanto trânsito entre diferentes referências de cultura e etnia, enquanto mediação entre a alta e a baixa cultura, assim como as ações que quebram os paradigmas vinculados às noções de centro e periferia. São políticas também as ações artísticas enquanto críticas da indústria cultural e, ainda, o que se identifica como as ações de transbordamento dos espaços institucionais, assim como as ações de ocupação dos espaços não institucionais da arte. Entrariam aí, também, como afirmativa política, as experiências de autogestão individual ou coletiva em circulação e mercado. Mas política também é a ação artística que hoje, reconhecendo a impossibilidade de definição da arte pelos meios, insiste na crítica dos meios, que, diante do inexpugnável avanço da tecnologia, investe na crítica dos aparatos técnicos, que, diante da perda inadiável da memória, mobiliza reconstituições de memórias coletivas, assim como busca alternativas de discurso histórico que fujam às determinações filosóficas e à historia centrada no sujeito transcendental.7 Como minha intenção inicial era discutir a história da arte na relação arte/política, pareceu-me que perguntar ‘em qual história’ estaria no mesmo registro que perguntar em qual arte política estaríamos pensando aqui. Dessa maneira é que cheguei na primeira ação artística enquanto manifestação de arte política, que chamei de a arte, a história e a política como fotografia. No texto Pequena história da fotografia,8 de 1931, Walter Benjamin anuncia que naquele momento o debate moderno não poderia ser mais em torno da “fotografia como arte”, mas deveria dar-se, necessariamente, a partir do reconhecimento da “arte como fotografia”, um desígnio de seu tempo. É a partir dessa afirmação que Rosalind Krauss vai pensar não só sobre a arte na modernidade, mas sobre outra possibilidade de história da arte, que pudesse dar conta da arte no mundo contemporâneo. 98

6 Seguimos aqui a demarcação que Hans Belting identificou entre a modernidade – caracterizada pela discussão que a arte empreendia nas estruturas do fazer, do exibir e do interpretar – e a contemporaneidade, caracterizada pelo que o historiador alemão enumerou como: a perda da hegemonia norte-americana conquistada no póssegunda-guerra; a globalização cultural, que desafia a definição ocidental de arte; e a revisão da participação das chamadas minorias na história da arte. Belting, Hans. Art History after Modernism. Chicago: The University of Chicago Press, 2003. 7 Foucault, M. A arqueologia do saber. Op. cit. 8 Benjamin, Walter. Pequena História da Fotografia. In Benjamin, Walter. Obras Escolhidas, São Paulo: Editora Brasiliense, 1985. concinnitas


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Hubert Damisch, no prefácio que escreve para o livro O Fotográfico, 9 identifica Krauss fazendo ali um deslocamento epistemológico no que diz respeito ao estudo histórico da fotografia, que acaba se mostrando determinante para a história da arte como um todo. Partindo da fotografia para fazer história, a autora estaria recusando a história da fotografia, que tem a história da arte moderna como modelo, ou seja, estaria recusando uma certa história que, tratando de objetos artísticos, se constrói por estilos, e cujos parâmetros formais e essencialistas levariam para o estudo de uma fotografia que, tal qual a pintura, apontaria para o plano e para a forma. Como escreveu Damisch, “a fotografia é sempre do outro, do outro discurso que não o estritamente artístico.10 Ela opera no discurso da viagem, do arquivo, da ciência”. Assim é que anuncia a história da arte na contemporaneidade, já que não trata dos fatos, mas daquilo que, sendo-lhes exterioridades, os explicitam nas transversalidades. Constitui, portanto, uma outra história, num registro que recusa11 os limites constituídos pela crítica moderna, sobretudo a greenberguiana, e acaba, como escreveu Stéphane Huchet,12 por ser um discurso político no fazer histórico, pois submete a Historia da Arte tradicional a uma implosão. O trabalho do historiador, então, na aproximação dos trabalhos do artista e do filósofo, faz da História uma teoria que acorda do sono positivista. Para falar, portanto, neste registro histórico-teórico da arte realizada no Brasil após 1989, no que essa história se revela um empreendimento político, tanto no sentido da opção por uma determinada epistemologia histórica quanto pela escolha dos acontecimentos (objetos e proposições artísticas),13 que vão constituir a História da Arte a ser aqui desenvolvida, impõe-se, como dito ini9 Krauss, Rosalind. O Fotográfico. Barcelona: Editorial Gustavo Gili, 2002. Prefácio de Hubert Damisch. 10 Damisch, H. Prefácio. In Krauss, Rosalind, op.cit., p. 11. 11 Danto, Arthur C. After the End of Art: contemporary art and the pale of history. Princeton: Princeton University Press, 1997. 12 Huchet, Stéphane. Passos e caminhos de uma teoria da arte: prefácio à edição brasileira.In Didi-Huberman, George. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: Editora 34, 1998. 13 Foucault, Michel. A arqueologia do saber, op. cit. 14 Dubois, Philippe. “A arte é fotográfica”. In O Ato fotográfico, Campinas: Papirus, 1993. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

cialmente, a produção da arte que identificamos contemporaneamente como fotográfica,14 em especial a que reconhecemos no trabalho de Paula Trope. Se nos anos 60 e 70 a fotografia aparece no circuito brasileiro de arte como rastro de ações e proposições artísticas ou, ainda, como apropriação, a partir dos anos 80, no bojo da discussão sobre a globalização, fim da arte e da história da arte, Paula, a exemplo do que Damisch escreveu, insiste em sua exterioridade enquanto discurso simbólico. A iconicidade desfocada e indefinida de suas fotografias, resultante de uma opção pelo precário em aparato fotográfico – a câmera pinhole –, remete para o que está na fronteira entre o visível e o invisível, entre a objetividade e a subjetividade, resguardando espaço para a negociação de significados. 99


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Na série de trabalhos denominada Os Meninos, Paula faz aparecer o que ela chamou de um sujeito da linguagem resultante da

Paula Trope. Futebol. Rocinha, Rio de Janeiro, 1997

contaminação entre o discurso artístico e o que seria seu objeto. 15 Mais do que isso, a série, desenvolvida na década de 1990 e que se constituía de fotografias de meninos de rua do Rio de Janeiro que, ao se deixarem fotografar, poderiam fotografar o que desejassem imediatamente depois, acaba por abrir a discussão sobre o artista como co-produtor de significados em um mundo de subjetividades que, muitas vezes espetacularizadas, são freqüentemente recolhidas ou encurtadas pela violência da cidade. Abre também, em arte, o debate sobre a ação dos excluídos, da mão do outro, do não-artista. As fotos, assinadas em colaboração com os meninos-fotografadosfotografantes, acabam constituindo um trânsito entre a fotografia e as circunstâncias do mundo contemporâneo, sobretudo o brasileiro. 16 Na série Contos de passagem, mediante depoimentos de crianças e jovens que vivem e trabalham nas ruas, a artista realizou, em uma experiência em vídeo, um mapeamento da cidade do Rio de Janeiro na passagem de 2000 para 2001. A série é constituída como uma espécie de geografia, em que se contaminam a documentação e a ficção, o público e o privado. Produzida, como Os Meninos, com 100

15 Trope, Paula. “Tempo, corpo, alteridade”. In Concinnitas: Revista do Instituto de Artes da Uerj. Rio de Janeiro, 2004, n. 7. 16 Formada em cinema e voltando-se também para o vídeo, a artista desenvolve experiências que trazem ainda outra questão na fotografia, quando uma certa narrativa, própria do vídeo, em suspensão, passa a concentrar a temporalidade como duração e a inscrever-se na imagem, apresentando-se, como escreve Paula, citando Deleuze, enquanto “tempo em estado puro”. Trope, Paula, op. cit. concinnitas


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opção por uma tecnologia de imagem precária, agora desenvolvida com “câmera sem lente”, substituindo-a, como a própria autora relata, por “buraquinhos”,17 resulta ainda em imagens híbridas, em que é impossível distinguir o atual do virtual, o real do imaginário. A consolidação do campo das ações artísticas híbridas, implícita na impossibilidade contemporânea de definir o campo da arte pelos meios e materiais, vem-se revelando desde as práticas das vanguardas dadaístas e surrealistas, sobretudo com Marcel Duchamp, quando o artista agrega enunciados aos objetos visuais. De acordo com Ricardo Basbaum,18 a prática híbrida de enunciados discursivos e visualidade remeteria mesmo a Baudelaire, para quem a arte se faz do encontro dos objetos que se pretendem puramente visíveis com os textos críticos, ou seja, com o campo enunciativo. Ampliando tal campo, na constituição da arte na contemporaneidade, caberiam, então, as relações com a crítica, mas também com a literatura, com o discurso histórico, com os textos teóricos, com as biografias, os manifestos e os ensaios. Se inúmeros artistas das chamadas vanguardas históricas do século 20 adotaram o texto-manifesto como modalidade discursiva, em um processo de soma às obras visuais, sem com elas se confundir, Duchamp, ao abrigar como agregado o enunciado, teria rompido com a máxima segundo a qual no centro da obra haveria uma matéria inerte que permanece intocável, como o inefável da arte. Na relação híbrida de texto e imagem, entretanto, os significados originam-se nas experiências relacionais, anulando a noção de interioridade fixa. A produção artística que desde os anos 60, sobretudo com Joseph Kosuth, vem agregando definitivamente as palavras como parte da materialidade do objeto, admitindo-as como um elemento na relação com os estímulos visuais, admite-as, portanto, em sua tessitura contextual e acaba desencadeando novas relações, que podem levar à narrativa, à ficção e à memória. No trabalho Persisto, de Rosana Ricalde, o texto escrito e tautologicamente repetido, podendo tomar o sentido de resistência ao logos do discurso, revela, ainda, a iminência da polaridade lembrança/memória, já que a escritura como repetição seria sinônimo do processo associado ao ato de forçar a lembrança, mas pode também estar associada à memória involuntária, dado o automatismo da 17 Idem. 18 Basbaum, Ricardo. Migração das palavras para a imagem. In Gávea. Rio de Janeiro, PUC-Rio, n.13, 1995. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

repetição e o desencadeamento dos processos inconscientes, como foi para os surrealistas. No caso de Rosana, persistir é o verbo que quer levá-la, enquanto lembrança, a não esquecer, mas que, também, é capaz de levá-la aos processos simbólicos implícitos no 101


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automatismo, como o da rememoração. Simbólica é também a inserção que a artista faz no prédio do Memorial da América Latina, na cidade de São Paulo, quando os verbos sofrem a interferência dos prefixos ‘des’ e ‘re’, apontando para uma rede de significados possíveis em suas combinações, assim como na memória que trazem à tona. A relação entre arte e memória está impressa, ainda, no trabalho que Leila Danziger denominou Para Irineu Funes. Como relata a artista,19 Irineu Funes é o personagem do conto Funes, o memorioso, de Jorge Luís Borges,20 cuja memória extraordinária ele alcança ao sofrer um acidente e perder os movimentos do corpo. São trabalhos com jornais ordenados em superposição, que têm a densidade das camadas da sedimentação do vivido, que se transformam em experiência e memória, mas têm também as falhas, que o tempo impõe na lembrança, corroendo-a como esquecimento. Entretanto, os jornais acumulados deixam aparecer resquícios de palavras, sombras de frases, de imagens e, acima de tudo, de cores. Nessa série, como diz a artista, “Trata-se de materializar a operação seletiva da leitura, que repele todo o texto informativo, transformando os jornais em um murmúrio de associações cromáticas”. Para além do entendimento da língua em sistema, o mais fundo que o vermelho “é em mim”, 21 o mais longínquo do verde que se faz agora. Uma presentificação da cor que, qual as imagens fotográficas para Barthes, pode desencadear o que chamou de punctum, “esse acaso que, nela, me punge”. 22 Na série Diários públicos, de maneira mais intensa, com os jornais apagados, aparece o processo que se dá como enumeração de dispersos. Espectadora do exato que há nas imagens cotidianas que

Leila Danziger. Diários públicos, 2004

acompanham as reportagens da imprensa escrita, a artista, na ação de catalogar essas imagens como lembrança, que necessariamente se tornam esquecimento, como o texto que ela propositalmente apaga, fazendo sobrarem as imagens fotográficas, está todo tempo nos fazendo lembrar que esquecemos os contextos, mas também nos está incitando às relações. Nessa série parece ressurgir o que Ernst Bloch vê em Rua de Mão Única, de Walter Benjamin: fragmentos que se relacionam, iluminando-se reciprocamente. Cada imagem, deslocada do mundano, agregada a outro texto, como uma frase, um verso de poema, um pensamento ou a própria memória do que foi o texto jornalístico, resistente nas manchas amarelas, que constituem outras imagens, abre o espaço de significação, de sentido. Acontece ali, talvez, o mesmo que Foucault vê acontecer em Borges, especialmente quando, no prefácio de As Palavras e as Coisas,23 se 102

19 Danziger, Leila. Entrevista concedida ao projeto. 20 Borges, Jorge Luís. Funes, o memorioso. In Ficções. São Paulo: Globo, 2001. 21 Barthes, Roland. A câmara clara. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984 22 Barthes, op. cit, p. 46. 23 Foucault, Michel. As palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 2002. concinnitas


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refere ao conto no qual uma certa enciclopédia chinesa classifica seus verbetes de tal maneira que haveria uma contaminação entre o real e o imaginário, desencadeando uma possibilidade de sonhar. Willi Bolle24 refere-se ao texto das Passagens, de Walter Benjamin, como um “canteiro de obras inacabadas”, aberto e fragmentário, resultante de uma intenção de “salvar despedaçando”, já que o autor, ao perceber a impossibilidade de terminar o estudo, o desconstrói, mantendo o tema, que é o da modernidade. A imagem de um “canteiro de obras inacabadas” parece bastante adequada para este ensaio que aqui apresento, mas também para se falar de mais uma presença artístico-política na contemporaneidade. Assim é como se identificam os grupos ou coletivos de artistas que aparecem em várias cidades do Brasil no final dos anos 90 e cuja ação, pulverizada, no sentido do pensamento descentralizado em história e filosofia de Michel Foucault, Gille Deleuze e Felix Guattari, nos leva ao desafio de encontrar, na fragmentação, proposições artísticas, enquanto pensamento e ação efetiva. Desses grupos, citamos o Atrocidades Maravilhosas,25 do Rio de Janeiro, que, antes de ser um grupo, foi um evento em cujos desdobramentos acabou configurando um coletivo. Durou pouco, mas deixou rastros que uma aproximação histórico-teórica da arte realizada no Rio de Janeiro nos últimos anos não pode ignorar. No Atrocidades Maravilhosas as questões eram tão variadas quanto os artistas que compunham o grupo, mas, de alguma forma, giravam em torno da relação do homem contemporâneo com a cidade, no que ele se 24 Bolle, Willi. Fisiognomia da Metrópole Moderna. São Paulo: Fapesp/Edusp, 1994. 25 Aparecem também os grupos Vaca Amarela (2001), Pipoca Rosa (2000), Empreza (Goiânia), Urucum (Macapá), Imaginário Periférico (RJ), Chelpa Ferro (RJ), Rradial (RJ), Projeto Tapume (RJ), Esquina (RJ), Hapax (RJ), Laranjas (Porto Alegre), Grupo Camelo (Recife), Clube da Lata (Porto Alegre), Açúcar Invertido (RJ), entre outros. Além desses coletivos, cabe citar, também, a criação, em várias cidades brasileiras, de organizações de artistas: Agora/Capacete (RJ), Alpendre (CE), Torreão (RS), Linha Imaginária (SP), Espaço Experimental Rés do Chão (RJ), que buscam ampliar os canais de circulação para o trabalho de arte. 26 Benjamin, Walter. “Paris, capital do século XIX”. In Walter Benjamin. São Paulo: Ed. Ática, 1985. Org. Flávio R. Kothe. 27 Idem. 28 Jameson, Frederic. Pós-modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. São Paulo: Ed. Ática, 1997. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

percebe envolvido por uma paisagem modificada não mais pela arquitetura urbana moderna, mas pelo que essa arquitetura absorve das imagens pós-midiáticas. Se as galerias mudam Paris no século 19,26 definindo a cidade, que se moderniza nas passagens, como verdadeiros “centros comerciais de mercadoria e luxo”,27 contemporaneamente, para além do urbanismo moderno ordenado em função da arquitetura funcionalista, são as relações simbólicas que acabam conformando a cidade na medida dos grandes cartazes e outdoors, imagens de informação comercial e formação do imaginário como imagemproduto, sobretudo nas cidades em que o poder regulador do Estado está submetido aos interesses econômicos do setor privado, como escreve Frederic Jameson.28 Ao passar por esses milhares de paredes cobertas com propaganda comercial, como diz Alexandre Vogler – o artista que, de alguma forma, centralizou as ações do grupo –, há que pensar que se a paisagem urbana moderna foi traçada pelo 103


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planejamento racional de convívio, como Brasília, no caso do Rio de Janeiro, uma cidade histórica que se moderniza na medida da

Rosana Ricalde. Atrocidades Maravilhosas, Rio de Janeiro, 2000.

voracidade econômica, a condição de modernidade, mas, sobretudo, de contemporaneidade, recairia na determinação da imagem comercial, ou seja, a paisagem urbana do Rio, para além dos estereótipos turísticos, seria a que a propaganda impõe ao meio urbano. Esse foi o problema que deflagrou a intervenção na cidade com cartazes que pervertiam a lógica do econômico, pela lógica do simbólico que a imagem da arte visual carrega, enquanto imagem densa. Funcionando como “ruído” ou um “vírus”, os cartazes lambelambe do Atrocidades descarregam provocação e conflito, mas são, ao mesmo tempo, vontade de “emancipação do cidadão”. 29 Trabalhos como Coca-coca, do artista Ducha, ou O que o sabão faz com as mãos da mulher, de Alexandre Vogler, ou ainda Público e privado, de João Ferraz, assim como o de Felipe Barbosa ou, ainda, o de Rosana Ricalde, configuram o que, mais precisamente, o nome do evento suscitava. Aproveitando o slogan da prefeitura ‘Rio, Cidade Maravilhosa’, os trabalhos assumem a ação-intervenção enquanto afrontamento do poder instituído, revelando, assim, o maior problema do Rio de Janeiro: cidade corroída e empobrecida pela ganância dos grandes capitais – entre outros, de empreiteiras e construtoras –, que a fazem crescer e se modernizar em um processo de exclusão e alienação, que se demonstra uma verdadeira atrocidade. O grupo desmembrou-se depois no Projeto Tapume, no Zona Franca e, podemos dizer, nos grupos Rradial, Hapax e Imaginário Periféricos. O Zona Franca foi um evento criado em 2001, coordenado por artistas, que funcionou como autogestão por 52 semanas ininterruptas em uma 104

29 Vogler, Alexandre. “Atrocidades maravilhosas: ação independente de arte no contexto público”. In Arte&Ensaios, Rio de Janeiro: UFRJ, 2001, n. 8. concinnitas


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sala, até então desocupada, da Fundição Progresso, quando, como escreve Vogler, “artistas, não-artistas e artistas-não-artistas” procuravam uma estrutura mais aberta de circuito. A participação era espontânea, os artistas eram “curadores” de suas próprias ações, e o clima era de anarquia, reforçado pela banda de bit-industrial “Hapax” O Zona Franca significou uma afirmação de circuito independente, anárquico e transversal na produção e circulação de arte. Nesse registro seria ainda importante citar o grupo Rradial, que realizou, durante o Colóquio Resistências,30 o Fumacê do Descarrego e que, também aberto, conta com a participação de Luis Andrade e Ronald Duarte. Ronald também é o artista que centraliza o grupo Imaginário Periférico, criado em 2002 e integrado inicialmente por Deneir Martins, Jorge Duarte, Roberto Tavares e Jarbas Lopes, da Baixada Fluminense – uma região periférica ao Rio de Janeiro –, mas que, atualmente, promove acontecimentos de adesão livre e incentivada como forma de relação transcultural.31 Ainda como uma microorganização artística seria relevante citar o Espaço Experimental Rés do Chão, coordenado pelo artista Edson Barrus, que havia participado do Atrocidades com o trabalho Cãomulato, uma alegórica referência ao homem, como ao cão, brasileiro comum. O Rés é um organismo catalisador de propostas de caráter independente e funciona como uma espécie de laboratório. Começou com a experiência Açúcar Invertido, entre maio e junho de 2002, na Fundação Nacional de Arte, quando o artista foi convidado para organizar uma exposição e propôs uma “quarentena de artistas para manifestar sintomas da arte contemporânea”. A convivência proposta por Barrus como exercício artístico foi uma ocupação polêmica, sobretudo com a dos artistas do grupo Urucum, do Amapá, no Norte do país, que transportou para o espaço da Fundação seis troncos de árvores retiradas das margens do Rio Amazonas e as destruiu com motosserras ao longo do evento. Desde então, o Rés do Chão passou a funcionar como organismo sem vínculos, tendo promovido o Açúcar Invertido 2, em Nova York (2003/2004); o Açúcar Invertido 3, em 30 Colóquio Transdisciplinar Resistências. 22 a 28 de novembro de 2002. Rio de Janeiro. Organização geral de Tatiana Roque. 31 Andrade, Luis. “Rio 40º Fahrenheit” In Concinnitas: Revista do Instituto de Artes da Uerj. Rio de Janeiro, n. 5, dez. de 2003. 32 Barrus, Edson. Nós Contemporâneos. Paris: Barrus [?] Má impressão editora, 2005, n. 27. 33 Benjamin, Walter. “O autor como produtor”. In Walter Benjamin, op. cit. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Macapá (2005); e o Açúcar Invertido 4, na Semana do Brasil na França (2005).32 A pergunta que alavancou este texto volta com força imponderável quando se pensa nas ações individuais ou coletivas desses artistas. A questão “qual política”, se é uma pergunta associada à relação arte/política, nos leva, necessariamente, àquela que Walter Benjamin fez no texto O autor como produtor,33 escrito para a conferência de 1934 no Instituto para o Estudo do Fascismo, em Paris. Nesse texto, 105


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refutando a pergunta sobre como a obra de arte se vincula às relações sociais de produção de uma época (que implicam relações políticas), pergunta recorrente da crítica literária de então, Benjamin diz que a questão não seria “como se vincula”, mas “como ela se situa dentro dessas relações”,34 ou seja, qual a sua “tendência”, melhor dizendo, qual a “função exercida pela obra no interior das relações literárias d e p r o d u ç ã o d e u m a é p o c a ” , 35 q u e B e n j a m i n a s s o c i a à s experimentações técnicas e que nós, ampliando, chamaríamos de experimentações de linguagem. A partir dessas considerações é que Hal Foster36 vai discutir a produção contemporânea, tendo em vista a mudança fundamental na arte após o alto modernismo, considerando que, desde o pós-Segunda Guerra, sobretudo com a Pop Art norteamericana, para além de considerar a relação de produção, é preciso considerar a relação cultural. Passando a arte do embate com a esfera moderna de produção para a relação com a esfera da cultura, na contemporaneidade o artista, se quer salvar a arte de sua propalada morte, a exemplo do que Benjamin percebeu na Rússia revolucionária, haveria de promover uma invasão da vida pela arte, ou uma “articização” da vida, sobretudo, da produção diferenciada dos povos, enquanto cultura, que fez Foster chamar os artistas de etnógrafos, como uma espécie de mapeadores das ações culturais, sejam elas do nível material, lingüístico, simbólico ou mítico. Dessa maneira é que se pode perceber a ação de um artista como Jarbas Lopes, em especial aquela que se pode ver no vídeo que resultou da viagem em 2002 de três “fuscas” pintados de azul, vermelho e amarelo, cujas partes foram trocadas. Os carros, de um modelo popular da Volkswagen, foram os protagonistas de uma viagem que, saindo do Rio de Janeiro, na Região Sudeste, a mais desenvolvida economicamente, chega à cidade de Curitiba, na Região Sul, mais especificamente ao Museu de Arte Contemporânea da cidade, hoje chamado Museu Oscar Niemeyer, que estava sendo inaugurado. O grupo de artistas e músicos que levava os carros faz um verdadeiro mapeamento da região, passando por cidades como São Paulo, mas também por algumas que poderíamos chamar de “esquecidas” no processo civilizacional, mas que fazem efetivamente parte da cultura ocidental contemporânea, pela absorção, sobretudo através da mídia televisiva, dos modos de vida, da linguagem e dos mitos pósmidiáticos. Aqui seria importante entender, com Didi-Huberman, 37 o que ele percebeu em Carl Einstein no início do século 20, quando o historiador alemão escreveu sobre a relação da arte negra com o cubismo, e 106

34 Id., ibid., p. 122. 35 Idem. 36 Foster, Hal. O artista como etnógrafo. In Arte & Ensaios. Rio de Janeiro: EBA, UFRJ, ano 12, n. 12, 2005. 37 Didi-Huberman, George. O anacronismo fabrica a história: sobre a inatualidade de Carl Einstein. In Fronteiras: arte, crítica e outros ensaios. Mônica Zielinsky (org. e Introdução). Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2003. concinnitas


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Jarbas Lopes. Troca-troca, Rio de Janeiro/ Curitiba, 2002/2004

que Huberman diz remontar a Benjamin. O que Carl Einstein desvela é a relação anacrônica, propulsora do que Benjamin chamou de “imagem dialética”. Aqui, com Jarbas Lopes, podemos identificar o ponto em que o formal e o antropológico se chocam, criando o que Benjamin denominou “um relâmpago para formar uma constelação” e assim, como um agora benjaminiano, denso na contenção dialética da forma e cultura, é que se pode perceber os carros do trabalho Trocatroca: três carros quase mondrianescos, cuja pintura demonstra preocupação formal e apurado envolvimento com a cor; três carros cujo modelo remonta ao pós-Segunda Guerra e que, mesmo no Brasil, está fora de linha, mas é muito usado na periferia, sobretudo por pessoas de baixa renda; um deslocamento ao longo de cidades “perdidas”; o documentário da viagem; a chegada à confirmação institucional dessa empreitada como manifestação no campo da arte, ou seja, a chegada à institucionalização, num arranjo de inteligência artística que só podemos chamar de político.

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Claves teóricas para la comprensión del arte conceptual y del conceptualismo argentino Jaime Vindel* La historia del arte conceptual ha sido generalmente trazada desde ejes teóricos de gran rigidez, que tendían a simplificar una etapa del arte contemporáneo caracterizada por su pluralidad de matices y manifestaciones, que abarcan desde la tautología a la disolución del arte en la praxis social. El artículo aborda ese amplio abanico de prácticas desde el análisis y la crítica de nociones clásicas como la idea de “desmaterialización” del objeto artístico, común a diversos contextos y planteamientos artísticos. Todas estas cuestiones son pensadas con la intención de situar el debate en la encrucijada de las analogías y diferencias que se dan dentro del conceptualismo argentino si lo comparamos con las corrientes internacionales del movimiento conceptual. Arte conceptual, desmaterialización, activismo argentino

Más allá de la inclusión del lenguaje oral o escrito en las obras, según rezaban los preconizadores textos de Henry Flynt, uno de sus primeros defensores,1 el arte conceptual debe su nombre a la oposición que se estableció desde el discurso teórico y artístico con el arte objetual. Así, el arte de concepto quedó vinculado desde la segunda mitad de los 60 a la idea ya clásica de “desmaterialización” de la obra u objeto Óscar Bony, La familia obrera, 1968 * Jaime Vindel es becario de investigación y colaborador docente de Historia del Arte en la Universidad de León. Crítico de arte y editor adjunto de la Sección de Libros de la revista internacional de arte art.es. Becario colaborador del Proyecto de Investigación I+D del Ministerio de Educación y Ciencia “Arte y política en Argentina, Brasil, Chile y España, 1989-2004”. 1 En 1961 Flynt afirmaba: “Los conceptos son al Arte Concepto lo que el sonido es a la música, un material de base. Puesto que los conceptos están muy ligados al lenguaje, el Arte Concepto es una forma de arte que tiene por material de base el lenguaje” (H. Flynt, “Concept Art”, publicado por primera vez en An Anthology. Ediciones La Monte Young, 1963. Recogido en Art conceptuel, formes conceptuelles. París, Galerie 1900-2000 / Galerie de Poche, 1990, s. p.).

artístico. Si bien la formulación de tal noción se adscribe habitualmente a Lucy R. Lippard y John Chandler y, más concretamente, a su famoso artículo “The Dematerialization of Art”, aparecido en Art International en febrero de 1968, podemos encontrar alusiones anteriores tanto en la crítica europea como en los escritos teóricos y declaraciones de algunos artistas argentinos. En el ámbito francés, Jean Clay abordaba la cuestión de la desmaterialización en su artículo “La peinture est finie”, publicado en el número 1 de la combativa revista Robho, en junio de 1967. Clay citaba como precursores de la evanescencia conceptual a Malévitch, que ya en 1919 manifestó su deseo de transmitir directamente sus composiciones por teléfono, y a Moholí Nagy, quien tres años después concretaría los deseos del creador suprematista. Por lo que respecta al arte argentino, talvez el ejemplo más relevante sea el del artista y teórico Óscar Masotta, quien pronunció el 21 de julio de 1967 en el


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Instituto Di Tella de Buenos Aires la conferencia “Después del pop, nosotros desmaterializamos”;2 por su parte, el rosarino Eduardo Favario, en relación con uno de sus Objetos Pequeños No Identificados, abogaba ese mismo año por llevar “la desmaterialización de la obra de arte a su extremo”. 3 En todos estos casos, la desmaterialización trataba de esbozar un panorama general que abarcara diversas tendencias confluentes durante la segunda mitad de los 60 y la primera de los 70, que iban desde las proposiciones conceptuales tautológicas a la eclosión de la estética vivencial del happening. La versatilidad de la noción explica su aparición en contextos donde, como en el caso argentino, el conceptualismo adquirió connotaciones dispares respecto de los centros norteamericanos o europeos. Desde este punto de vista, la desmaterialización es ante todo un instrumento útil para entender el progresivo carácter contextual y abiertamente político que la obra adquirió con el arte conceptual y que constituyó lo que denominaré, por mantener los términos al uso, la postmodernidad artística, caracterizada, según señalara en los años 80 Hal Foster, por su dimensión sociocultural.4 Las mayores críticas a la idea de desmaterialización procedieron de los artistas y/o teóricos vinculados a la corriente más analítica del arte conceptual. Fue el caso de Terry Atkinson, Michael Baldwin, Mel Bochner, Ian Burn o Mel Ramsden, cuya actividad giró en torno al grupo anglosajón Art & Language y que consideraban que análisis como los de Lippard pecaban de superficiales.5 Con la intención de conciliar ambas posturas algunos autores han diferenciado entre arte conceptual y “conceptualismo” o entre arte conceptual en sentido restringido y amplio. Para Francisca Pérez Carreño, el primero tendría como objeto la reflexión en torno al concepto de arte y a su condición lingüística; aspecto que lo distanciaría de la percepción estética. Por su parte, el conceptual en sentido amplio trataría de complementar o ampliar ese análisis hacia la consideración del lugar y el carácter social intrínseco a toda obra de arte.6 Según esta clasificación, el arte argentino se situó más cercano a un sentido amplio del arte conceptual, pues era su deseo explicitar ese carácter social de la obra de arte como medio de acción política en un contexto histórico cuya precariedad de libertades alentaba, como en el caso español, la capacidad comunicativa de las propuestas. La crítica y teoría argentinas de los últimos años, que suelen adoptar una postura distanciada de la facción “restringida” del arte conceptual, han coincidido con aquellos autores que estiman que es en la concepción amplia donde verdaderamente aparece un rasgo que de manera habitual se relaciona con el arte conceptual: su voluntad de superar el formalismo modernista. 110

2 El texto puede consultarse en http:// www.fundacionstart.org/ home/anunciantes/ interferencia/masotta/htm (consultado el 30/ 01/2006). 3 Véase Inverted utopias: avant-garde in Latin America. Yale University Press New Haven and London / Houston, The Museum of Fine Arts, 2004, p. 533. 4 «En este caso, el contexto histórico artístico no basta para dar sentido a la obra, pues la posmodernidad no se define en función de los medios utilizados, sino en relación a términos culturales» (H. Foster, «Asunto: Post», en: B. Wallis (ed.), Arte después de la modernidad. Nuevos planteamientos en torno a la representación. Madrid, Akal, 2001, p. 191). 5 Véase, por ejemplo, I. Burn y M. Ramsden, «Il grammatico», en: Arte concettuale: Terry Atkinson, David Bainbridge, Michael Baldwin, Harold Hurrell, Victor Burgin, Ian Burn, Joseph Kosuth, Mel Rmsden, Bernar Venet. Milán, Daniel Templon, 1971, s. p. 6 F. Pérez Carreño, «Teoría y experiencia estética en el arte conceptual», La Balsa de la Medusa, 58 (1998), pp. 131-132. concinnitas


Claves teóricas para la comprensión del arte conceptual y del conceptualismo argentino

En realidad, muchos de los artistas argentinos no se preocuparon por su posible adscripción a un discurso artístico hermético, sino que se apropiaron de aquellas estrategias conceptuales que les permitieron afrontar de manera pragmática lo que podríamos denominar, en palabras de Jorge Glusberg, una problemática concreta.7 De hecho, la adscripción al arte conceptual de diversas prácticas artísticas latinoamericanas se produjo con posterioridad a la aparición de esas manifestaciones, lo que no supone negar el influjo del conceptualismo en los artistas argentinos. Mari Carmen Ramírez, reflexionando en torno a esta cuestión

Tucumán Arde. Pintura callejera correspondiente a la experiencia colectiva, 1968

historiográfica, ha afirmado que en muchos casos los términos “conceptual” y “conceptualismo” no fueron empleados en los escritos de los artistas o en la crítica literaria de sus trabajos hasta mediados de los años 70.8 Ello se debió, por otra parte, a que muchos artistas temían ser absorbidos “por la corriente principal o proveer a los censores estatales de una etiqueta fácilmente identificable”.9 En el caso argentino, las reticencias se debieron más bien al encorsetamiento que toda neutralización historiográfica – ligada al concepto de estilo – pudiera ejercer sobre unas prácticas definidas por aspiraciones revolucionarias. Así, por ejemplo, Roberto Jacoby, Juan Pablo Renzi o León Ferrari se resistieron durante años a considerar Tucumán Arde como una experiencia exclusivamente conceptual. De cualquier modo, con independencia de estas consideraciones y de la duda acerca de la posibilidad de hablar con propiedad de un “movimiento conceptual”, no sería exacto realizar afirmaciones categóricas respecto a la adscripción de artistas o producciones nacionales a uno de los dos sentidos enunciados. Tal es, en parte, el propósito de esta comunicación.

7 Véase Cayc Group at the Museum of Rio de Janeiro, Brazil: Jacques Bedel, Luis Benedit, Jorge Glusberg. Buenos Aires, Cayc, 1978, s. p. 8 Véase M. C. Ramírez, “Tactics for Thriving on Adversity: Conceptualism in Latin America”, en: Global conceptualism: Points of Origin, 1950s1980s. Nueva York, Queens Museum of Art, 1999, pp. 53 y 69. 9 Id., ibid, p. 69; la traducción es mía. 10 Véase G. Bachelard, La formación del espíritu científico. Madrid, Fondo de Cultura Económica, 1974 (1942), p. 282. En el marco argentino, Jorge Glusberg reflexionó en torno al pensamiento de Bachelard y la ruptura epistemológica aplicada a las ciencias humanas en: «Lo contemporáneo en el arte: el caso latinoamericano», en: 21 artistas argentinos en el Museo Universitario de Ciencias y Arte Ciudad Universitaria México D. F. Buenos Aires, Cayc, 1977, s. p. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Si nos centramos, en primer lugar, en la relevancia que adquirió dentro del arte conceptual la influencia de la filosofía analítica, ésta se reflejó en la acentuación del carácter epistemológico de la actividad artística, inclinada hacia una faceta intelectual o mental que, identificando en ocasiones práctica y teoría, proponía la superación de la estética sensible. En este sentido el arte seguía un proceso paralelo al experimentado por la ciencia en su transición desde el pensamiento precientífico a uno propiamente científico, según lo describiera Gaston Bachelard en La formación del espíritu científico (1942): Hay que aceptar, pues, una verdadera ruptura entre el conocimiento sensible y el conocimiento científico (...) La adhesión inmediata a un objeto concreto, captado como un bien, utilizado como un valor, ata demasiado fuertemente al ser sensible; es la satisfacción íntima; no es la evidencia racional.10 111


Mediante este racionalismo el artista conceptual trataba de suscitar

Joseph Kosuth. Una y tres sillas, 1965

en el receptor un abandono del subjetivismo emotivo de la contemplación en favor del desarrollo de una lectura objetiva de la obra, alejada de toda intuición idealista. En ocasiones, ese anhelo condujo a artistas como Bernar Venet 11 a rozar un positivismo cientificista que identificaba el arte con la precisión de las “ciencias exactas” – matemáticas y física. Tal deriva afectó también a aquellos artistas que, como el norteamericano Joseph Kosuth, afirmaron el carácter tautológico de las proposiciones artísticas. Kosuth, pese a rechazar cualquier asimilación entre arte y matemáticas,12 redujo en alguna de sus propuestas la implicación del espectador al hallazgo de una incógnita, como en la Quinta Investigación,13 compuesta de una serie de acertijos. Aunque la influencia de la filosofía analítica no es en modo alguno reducible a la tautología, algunos de los artistas habitualmente relacionados con el núcleo duro del arte conceptual (generalmente asociado a la edición de la revista Art & Language), deudores de creadores como Ad Reinhardt o Frank Stella, recurrieron a ella con el deseo de depurar el contenido significativo del lenguaje. Aspiraban así a eludir todo posible equívoco en la naturaleza de las proposiciones, reproduciendo una pretensión germinal del empirismo lógico del Círculo de Viena y los inicios de la filosofía analítica.14 El caso de Joseph Kosuth talvez sea el más significativo pero existieron otros artistas en los que la cuestión comunicativa se resolvió en un violento ostracismo autorreferencial: la famosa Obra de única cualidad “Pure Beauty” (196768), de John Baldessari, consistente en esas dos últimas palabras dispuestas en negro sobre fondo blanco, se planteaba, en palabras del

11 Véase la revisión que realiza este artista del arte conceptual en B. Venet, «L´art conceptuel à 10 ans», Art Press International, 16 (1978), pp. 30-31. 12 “Muchos artistas que trabajan actualmente, de una manera u otra, hacen un uso abusivo de las matemáticas. Es lamentable (...) La matemática es un útil (...) La matemática es o no es matemática, pero sea lo que sea, no es arte” (se trata de una de las declaraciones realizadas por el artista entre junio de 1966 y febrero de 1967, recogidas en Art conceptuel, formes conceptuelles. Op. cit. pp. 11 y ss., la traducción es mía). 13 Véase Konzeption/Conception. Leverkusen, Herausgegeben vom Städtischen Museum, 1969, s. p. 14 Cuya principal aspiración residía en la creencia según la cual un lenguaje desprendido de todo elemento aleatorio o accesorio y que establece las reglas de su sintaxis alcanza rango universal.


artista, como una versión escrita del axioma visual de Stella “lo que se ve es lo que se ve”. Baldessari afirmaba sobre este particular: al menos la gente no podía llegar y decir: “no lo entiendo”, porque de hecho lo leía. Podían decir “no entiendo lo que piensas”, pero al menos podían leer. Se trataría de un lenguaje común.15 Para estos y otros artistas conceptuales, en la línea de lo que insinuaba Pérez Carreño, resultó fundamental la reflexión en torno al concepto de arte, considerando que la labor del artista residía precisamente en redefinir la naturaleza de dicho concepto (Kosuth). Es esta una pretensión que también encontramos en el conceptualismo argentino, aunque en este caso el referente no es la evolución del concepto de arte, sino la propia contemporaneidad histórica, según se desprende de las siguientes palabras de Óscar Bony: Cada artista asume con su disciplina una responsabilidad: la de redefinir cada vez la naturaleza del arte teniendo en cuenta su propio tiempo.16 Pese a ello, algunas de las proposiciones kosuthianas encuentran su correlato en el arte argentino, donde ciertos artistas reflexionaron en torno a una posible deconstrucción del objeto a través de sus sucesivas y diversas formas de representación. En Una y tres sillas (1965), Kosuth presentaba la idea platónica de “silla” en sus traslaciones formales: la forma real (una silla), visual (una fotografía de dicha silla) y su definición extraída del diccionario. Domingo Hernández Sánchez ha desvinculado esta obra de las tautologías que marcan el inicio de la obra de Kosuth para relacionarla con el concepto hegeliano del “mundo invertido”, un tercer momento del espíritu que conciliaría los dos primeros, esto es, la idea platónica y la pluralidad de sus manifestaciones.17 En mi opinión, hay que hacer notar que, en todo caso, la asepsia característica de dichas manifestaciones evidencia que éstas se encuentran subyugadas por el dominio de la idea. Un concepto 15 Citado en la guía de la Exposición John Baldessari, Nueva York, Whitney Museum of American Art, 1991, recogido en F. Pérez Carreño, “Teoría y experiencia estética en el arte conceptual”, Art. cit. p. 148 – el subrayado es mío. 16 Citado en: J. López Anaya, Historia del arte argentino. Buenos Aires, Emecé, 1997, p. 325, – el subrayado es mío. 17 D. Hernández Sánchez, “Arte conceptual y mundo invertido”, Taula, quaderns de pensament, 33-34 (2000), p. 258 y ss. 18 Véase A. Longoni y M. Mestman, Del Di Tella a “Tucumán Arde». Vanguardia artística y política en el 68 argentino”. Buenos Aires, El Cielo por Asalto, 2000, p. 6.

similar al kosuthiano se encuentra tras la obra que Ricardo Carreira presentó al Premio Ver y Estimar de 1966, titulada Muestrario y objeto señalado, que Ana Longoni y Mariano Mestman consideran como la primera aparición de planteamientos conceptuales en el arte argentino.18 En ella, el artista jugaba con las diferentes posibilidades de presentación y representación de una soga. A la presencia real de la soga, tanto como guía hacia el lugar destinado a la exposición de la obra del artista – elemento que añadía una dimensión temporal – como en la porción de la misma que se encontraba expuesta, se sumaban fotocopias en las que aparecía su imagen junto a diversos elementos textuales. Un sentido similar subyacía a 60m2 y su información, propuesta que Óscar Bony presentó a las Experiencias Visuales 1967 del Instituto Di


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Tella de Buenos Aires. En esta obra, la transitoriedad de la representación se basaba tanto en la disposición de la obra – 60m2 de alambre tejido a lo largo de un pasillo – como en la proyección simultánea en cinematógrafo de un fragmento de dicho alambre, la cual invitaba al espectador a establecer una percepción relacional entre los distintos elementos.19 Según señalara María José Herrera, Bony incidió en esa temática en la primera de las propuestas – finalmente sustituida por La familia obrera, en la que dispuso a un matricero, a su esposa y a su hijo sobre una tarima a modo de podium – que presentó a la siguiente edición de las Experiencias. Me refiero a la obra Espacio de silencio (1968), que Herrera relacionaba con el concepto de “discontinuidad” tal y como fue enunciado por Roland Barthes y reinterpretado por el artista y teórico argentino Óscar Masotta. En ella, un magnetófono recogía los ruidos producidos por el público al ingresar en la sala, para emitirlos posteriormente con un retardo de dos minutos, generando en el espectador una sensación primero de extrañeza y después de reconocimiento.20 Los teóricos más críticos con la vertiente tautológica del arte conceptual han afirmado que la tautología supuso una nueva sublimación autorreferencial que reafirmaba el paradigma modernista, negando cualquier apertura social en la difusión de la obra e imposibilitando la participación del espectador en la definición de la misma.21 Para muchos de ellos la tautología kosuthiana representaba el final del proceso de purificación esencialista que con Manet dio origen a la modernidad.22 El deseo de revertir ésta, siguiendo, al menos formalmente, la senda del arte pop, es la razón de que sean proporcionalmente más numerosas aquellas propuestas que intentaron hallar la universalidad de sus proposiciones no en un solipsismo de corte autorreferencial sino en el recurso a un modelo de infinita reproductibilidad de la obra que evitara toda especulación aurática23 con el objetivo de atestiguar su dimensión pública de manera más explícita. En estas obras, características de los utópicos albores del conceptual, el arte se identificaba con la idea, cuya entidad era independiente de que su realización fuera o no llevada a cabo por el espectador que se apropiara de ella.24 En realidad, dejando de lado las obras argentinas ligadas al concepto de discontinuidad, que introducían un componente temporal ajeno a la propuesta kosuthiana, la atomización de la idea en sus diversas manifestaciones se encuentra próxima a este “modelo de infinita reproductibilidad de la obra”, ya que la silla kosuthiana, en tanto que idea, podría reproducirse tantas veces como fuera deseado en los posibles contextos: infinitas sillas con infinitas fotografías de sus instalaciones correspondientes. 114

19 Un planteamiento similar caracterizaba la obra que Alfredo Rodríguez Arias presentó a esas Experiencias del año 67, donde una serie de fotografías registraban diversas salas del Instituto Di Tella – en un blanco y negro que, como las definiciones de diccionario kosuthianas, trataba de mantener un tono expositivo neutral –, estableciendo un diálogo entre esos lugares y su representación (Véase J. Romero Brest, El arte en la Argentina. Últimas décadas. Buenos Aires, Paidós, 1969, p. 93). 20 M. J. Herrera, “Arte y realidad: La familia obrera como ready-made”, en: VV.AA., Arte y poder. Buenos Aires, Centro Argentino de Investigadores de Arte (Caia), 1993, pp. 174-182. 21 Es el caso de Andrea Giunta en el Catálogo de la I Bienal de Artes Visuales del Mercosur. Porto Alegre, 1997, p. 521. Citado en: A. Longoni y M. Mestman, Del Di Tella a “Tucumán Arde”. Vanguardia artística y política en el 68 argeentino, op. cit. p. 172. 22 Véase D. Ottinger, “Courants, vagues, flux et reflux”, en: VV.AA., L´art contemporain en question. Paris, Galerie National du Jeu de Paume, 1994, pp. 44-45. Hay quien, como Hans Belting, ha discrepado de esta lectura, un tanto simplista, de la obra de Kosuth al señalar que ya encontramos en sus proposiciones el giro lingüístico que, siguiendo a Richard Rorty, caracteriza el paradigma cultural de la postmodernidad (véase H. Belting, Le chef-d´oeuvre invisible. Nîmes, Jacqueline Chambon, 2003, p. 519). 23 “Un punto de vista conceptualista doctrinario diría que las dos características relevantes de la “obra conceptual ideal” serían: que tuviese un correlativo exacto, es decir, que pudiera describirse y experimentarse en su descripción, y que fuera infinitamente repetible. Debe carecer absolutamente de “aura”, o condición única que se le parezca”; en Bochner, Mel: “Mel Bochner on Malevich, An Interview” (con John Coplans), Artforum, junio de 1974, p. 62. Citado en R. Smith, “Arte conceptual”, en: N. Stangos (ed.), Conceptos de arte moderno. Madrid, Alianza, 1986, p. 214. 24 Así lo expresaba Sol LeWitt en la décima de sus “Sentencias sobre arte conceptual” (1969): “Sólo las ideas pueden ser obras de arte; están dentro de una cadena evolutiva que, al cabo, puede encontrar alguna forma. No todas las ideas tienen por qué materializarse” (vèase L. R. Lippard, Seis años: la desmaterialización del objeto artístico de 1966 a 1972. Op. cit. p. 125). También Lawrence Weiner incidía en este aspecto en la tercera de sus famosas aserciones: «La obra no necesita ser construida» (Ibid. p. 21). concinnitas


Claves teóricas para la comprensión del arte conceptual y del conceptualismo argentino

Diversos artistas incidieron, por otra parte, en el carácter serial y repetitivo de las producciones. El momento de la elaboración “material” de la obra adquiría en algunos casos un carácter subsidiario, puramente mecánico, respecto a la primacía de la idea.25 En otros, especialmente entre aquellos procedentes del minimalismo, se replanteó la naturaleza de la actividad artística a través de una reflexión conceptual de carácter metalingüístico que subrayaba el proceso de producción intelectual o material de la obra, aspecto que condujo a teóricos como Marchán Fiz a considerar el arte conceptual como la culminación de la estética procesual.26 Talvez el ejemplo más plausible de esta última tendencia sea el trabajo del norteamericano Robert Morris. Morris, que reflexionaba acerca de cómo la action painting de Jackson Pollock había contribuido a esclarecer la dimensión procesual de la actividad artística,27 adoptó tempranamente una “estética” cercana a lo conceptual en Box with the sound of its own making (1961), un cubo de madera de 30cm de arista que contenía en su interior una grabación del ruido de su propia fabricación. Sin embargo, fue en Card File (1962) donde introdujo de manera decidida el lenguaje como testigo de la acción y el trabajo intelectual del artista. Esta obra consistía en una serie de fichas clasificadas por orden alfabético a modo de registro de los acontecimientos y elecciones posibles desde el momento en que el artista decidía iniciar una obra cuya finalidad desconocía hasta aquel otro en que aceptaba la infinitud de tal proceso. Esta auténtica “memoria del 25 Baste recordar la famosa sentencia de Sol LeWitt: “la idea es una máquina de producir arte”. 26 Véase S. Marchán Fiz, Del arte objetual al arte de concepto, 1960-1974. Madrid, Akal, 2001 (8.ª ed.), p. 249. 27 Véase R. Morris, “Some Notes on the Phenomenology of Making”, Artforum, abril de 1970. 28 Para una descripción completa de la misma véase Art Conceptuel I. Capc Musée d´art contemporain de Bordeaux, 1988, p. 25. En todo caso, el énfasis en lo procesual también caracterizaba algunas propuestas de artistas tradicionalmente adscritos a la vertiente tautológica del arte conceptual. Es el caso de la Cuarta Investigación de Joseph Kosuth, consistente en fichas con informaciones, apuntes sobre acciones a realizar, libros por leer, etc (véase Joseph Kosuth: Art Investigations & ´problematics‘ since 1965. (5 fascículos), Luzern, Kunstmuseum, 1973, s. p.) 29 Véase V. Burgin, “The Absence of Presence, Conceptualism and Postmodernism”, en: The End of Art Theory. Criticism and Postmodernity. Londres, MacMillan, 1986, p. 35. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

tiempo” desvelaba al espectador todos los hitos creativos en la concepción de la obra.28 Una de las principales ambiciones del modelo de infinita reproductibilidad fue el intento de desligar la obra de su carácter mercantil y la consiguiente asignación de un valor de cambio. Su democratización trataba de cuestionar, por otra parte, tanto la condición genial del artista romántico – y con ello la noción misma de autoría – como la pasividad del consumidor de arte, impelido a involucrarse en el proceso creativo. Según señalaba Victor Burgin, ya no era posible apreciar en la obra una diferencia de calidad, pericia o ingenio, por así decirlo, una plusvalía de la originalidad.29 El aspecto más relevante de todo ello fue que la idea, a partir de ese momento, pudo ser poseída por el receptor. El siguiente paso consistió en dotar a éste de soberanía sobre la forma final que la idea hubiera de adquirir: este jalón se debe, entre otros, a artistas como el estadounidense Lawrence Weiner o el argentino Edgardo Antonio Vigo. El primero de ellos lo explicitaba en la apostilla a sus tres famosas consignas, aparecida por primera vez en otoño de 1968 (Art News) y publicada posteriormente en el catálogo de la 115


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exposición January 5-31, 1969.30 La introducción de la voluntad del receptor propuesta por Weiner supondría, según Benjamin Buchloh, el tránsito de la “abstracción reductivista” característica de la modernidad a la “estética sintagmática y contextual” de la postmodernidad.31 Por su parte, Edgardo Vigo escribía en 1969 De la poesía/proceso a la poesía para y/o armar,32 donde redefinía el rol del artista al considerarlo un mero “programador”33 cuya presencia se diluía finalmente en la relevancia cobrada por el receptor. La “activación profunda” de éste como individuo le hacía abandonar su condición de consumidor para devenir creador de un “poema a realizar”.34 Según Buchloh, estos artistas propiciaron una superación real de la autorreferencialidad modernista y de ciertas interpretaciones del readymade duchampiano35 basándose en una decidida “voluntad de destronar el paradigma fundador del modernismo, esto es, la visualidad específica de las artes plásticas”.36 El conceptual, retomando el legado del cubismo analítico – hay que señalar la preeeminencia del collage en las propuestas de artistas como León Ferrari –, cuestionaba el principio retiniano, fundamento de la estética greenbergiana, con la intención de formular los fundamentos de una estética postmoderna caracterizada por el cuestionamiento de los límites institucionales y discursivos del arte. Esta marginalidad caracterizaba la actividad de artistas como Robert Barry o de aquellos vinculados al land art o al arte ecológico, como el argentino Nicolás Uriburu. Barry, además de sus obras con gases, energía y otras sustancias invisibles, recurrió a la inclusión de palabras invertidas o situadas en los bordes de sus lienzos con la intención de ampliar los límites de lo artístico: Lo que se implica en [estas obras] – argumentaba Barry – es que su significado se extiende más allá de sus límites arbitrarios, que son parte de algo más amplio y no sólo objetos aislados; son parte de la situación, e incluso de la cultura, en la que se encuentran y sobre la que tienen influencia.37 La orientación expansiva condujo, según sugiere Barry, a que el arte virara su atención hacia los aspectos comunicativos, culturales y políticos de las sociedades coetáneas, tratando de evitar así cualquier lectura historicista de las obras. Si bien esta tendencia hacia la ampliación de los límites del arte se hallaba implícita en la semilla del arte minimalista y, más concretamente en la teatralidad que tanto exasperaba a Michael Fried, fue con el arte conceptual o, por ser más exactos, con el conceptualismo, cuando se desplegó de manera explícita, asentando los fundamentos de lo que, en términos de Paul Ardenne, podríamos definir como un “arte contextual”. Este proceso, que afectó a la evolución de artistas como el 116

30 Estas se resumen del siguiente modo: 1. El artista puede construir la obra. 2. La obra puede ser fabricada. 3. La obra no necesita ser construida. Siendo estas tres opciones idénticas y consecuentes con la intención del artista, la decisión sobre la condición de la obra corresponde al receptor en el momento que la recibe. Citado, entre otros, en L. R. Lippard, Seis años: la desmaterialización del objeto artístico de 1966 a 1972. Op. cit. p. 21. 31 Véase B. Buchloh, “Lawrence Weiner”, en: Art Conceptuel I. Op. cit. pp.118-121. 32 Recogido R. Cippolini (ed.), Manifiestos argentinos. Políticas de lo visual 1900-2000. Buenos Aires, Adriana Hidalgo, 2003, pp. 390-99. 33 Vigo, al igual que Burgin, identificaba al artista moderno con el concepto de obra única (véase Ibid. p. 396). 34 Véase Ibid. p. 397. 35 En alusión implícita a Joseph Kosuth. Véase, al respecto, la polémica mantenida entre el teórico y el artista a propósito de la publicación por aquel de “From the Aesthetic of Administration to Institutional Critique”, en L´art conceptuel, une perspective. París, Musée d´Art Moderne de la Ville, 1989, pp. 25-54. Buchloh tendió a establecer – al igual que haría posteriormente en debates como el que giraría en torno a la validez de la pintura – una dicotomía reductivista en la clasificación de las experiencias conceptuales: “Una vez que el lenguaje se toma como el medio de expresión dominante – sino exclusivo – de la entidad artística, sus usos serán definidos bien sea en relación a una concepción tautológica autorreferencial (cf. Kosuth), bien en relación a una concepción del lenguaje como sistema de signos que hacen referencia al mundo exterior, e instrumentalizado por las necesidades de la comunidad activa (cf. Haacke)”, en B. Buchloh, “Introduction”, en: VV.AA., Langage et modernité. Villeurbanne, Nouveau Musée, 1991, pp. 15-16; la traducción es mía. 36 Véase Ibid. p. 9; la traducción es mía. 37 En “La vuelta de Arthur R. Rose”, serie de entrevistas cuyas preguntas fueron formuladas por los propios artistas supuestamente entrevistados – Robert Barry, Douglas Huebler, Joseph Kosuth y Lawrence Weiner – por ese periodista ficticio. Fueron publicadas originalmente en Arts Magazine 63, 6 (febrero de 1989), conmemorando el vigésimo aniversario de las entrevistas realizadas por el supuesto crítico en la misma revista a estos cuatro artistas en 1969. Recogido en R. C. Morgan, Del arte a la idea. Ensayos sobre arte conceptual. Madrid, Akal, 2003, p. 38. concinnitas


Claves teóricas para la comprensión del arte conceptual y del conceptualismo argentino

argentino Óscar Bony, explica que fuera con posterioridad al minimalismo – conocido en Argentina como “estructuras primarias” y que contó con figuras tan relevantes como Alejandro Puente – cuando se produjeron las mayores divergencias entre las tendencias norteamericanas y europeas y las latinoamericanas, pues éstas tendieron a recurrir a las estrategias conceptuales con la intención de responder a las exigencias de su contexto histórico específico. En el caso argentino, dicha asimilación cuestionó los cimientos culturales de la sociedad y en último término los conceptos de arte y cultura como legado postcolonial detentado por la burguesía nacional. Ese momento de inflexión puede situarse en 1967, año del apogeo minimalista en Argentina y antesala del conceptualismo político más comprometido, en el que el Premio Internacional del Instituto Di Tella fue atribuido a una obra de Robert Morris. Durante los años álgidos del conceptualismo militante en Argentina (1966-1968), las estrategias conceptuales fueron, ante todo, un instrumento útil en la progresiva disolución del arte en la política y en el cuestionamiento de la emergente industria cultural. En ese contexto, la claridad expositiva de las obras venía justificada por la relevancia que cobró la inmediatez en la transmisión de los mensajes: la nitidez, el recurso a los textos de información, la ausencia de mediación, la premura y la reflexión en torno al uso mediático del lenguaje fueron notas fundamentales en prácticas como el arte de los medios argentino (Happening para un jabalí difunto, El mensaje fantasma). En este sentido – y para concluir –, pienso que podríamos leer el arte conceptual como un intento de incorporar semánticamente, neutralizar o apropiarse del contexto en que el arte se desarrollaba. Si esa apropiación se caracterizó, en el ámbito anglosajón, por un replanteamiento de los modos de comprensión del arte en el ámbito institucional (de ahí la importancia de la documentación, como en Art & Language), en el argentino se vinculó a la pretensión de los artistas de alterar el devenir histórico del país. Ello propició que el arte se instalara físicamente en ciertos lugares alternativos (es el caso de Tucumán Arde, exposición colectiva que tuvo lugar en el local sindical de la CGT de los argentinos) con la intención de escapar al carácter meramente subjetivo que las instituciones internacionalistas habían proyectado sobre las experiencias de vanguardia.

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Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a crítica institucional

Arte é este comunicado agora1 – Paulo Bruscky e a crítica institucional Lidice Matos* Partindo da relação de mútua implicação entre arte e instituição, e do conceito de arte como sistema, este texto olha o trabalho de Paulo Bruscky como uma forma peculiar de pensar a crítica institucional. Bruscky, desde os anos 60, enfrenta o paradoxo de levar adiante o legado das vanguardas modernas, de luta contra a lógica do objeto de arte reificado pelo sistema social, enquanto carrega a consciência duchampiana e nada ingênua de que o próprio artista é uma instituição, é simultaneamente produtor e produto. Da mesma forma a arte é ação política e poética, criação e artifício. Arte, crítica, instituição

Arte e vida – sentidos em fluxo Arte e instituição: como perceber entre intricadas e mútuas implicações as forças instauradoras e de resistência de cada uma? Com propósitos e sentidos diversos, essas forças estão enredadas no sistema social. A consciência das condições institucionais de formulação e recepção da arte é fundamental na produção contemporânea em geral, mas aqui interessa destacar uma parte dessa produção que se volta para uma crítica explícita ao sistema da arte. Entretanto, não há no Brasil artistas cujas obras estejam centradas na crítica institucional. Embora esta questão atravesse obras de artistas como Hélio Oiticica, Lygia Pape, Barrio e Nelson Leirner, ela não constitui um campo único de investigação. Além de razões históricas e econômicas que resultam na fragilidade das Paulo Bruscky. S/ título, 2004 (Lata de tinta de parede tornada obra no momento da remontagem da cozinha) Foto: Tom Cabral * Lidice Matos é mestre em História e Crítica da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Formada em Arquitetura e Urbanismo e pós-graduada em Planejamento Urbano. Freqüentou cursos teóricos e oficinas de arte na Escola de Artes Visuais do Parque Lage - EAV. Tem atuado como educadora no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro e como professora na EAV. 1 Entrevista de Paulo Bruscky à autora, janeiro/ 2007, Recife. As citações foram retiradas da entrevista. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

instituições, talvez seja possível enxergar uma tendência de confiança na força instauradora da arte, um pensamento (des)construtivo que se sobrepõe a um modo eminentemente contestatório ou meramente negativo, típico da maioria dos trabalhos que são correntemente denominados crítica institucional. O trabalho de Paulo Bruscky apresenta características excepcionais para confirmar esta hipótese, e grande parte de sua produção pode ser compreendida como uma forma singular de crítica institucional. Bruscky, desde os anos 60, enfrenta o paradoxo de levar adiante o legado das vanguardas modernas: a luta contra a lógica do objeto de arte reificado pelo sistema social; e a consciência duchampiana de que o artista é uma instituição – ele é simultaneamente produtor e produto e a arte é ação política e poética, criação e artifício. 119


Lidice Matos

Paulo Bruscky pensa o outro como um outro de si e arte e vida como indissociáveis. Observando seu trabalho é possível ver o mundo como um museu, como viu Robert Smithson, e que o museu é o mundo, como afirmou Hélio Oiticica.2 “Não separo arte e vida.” A obra de Bruscky, portanto, é muito mais rica e complexa do que uma obra centrada na crítica institucional, e escapa de classificações e definições fechadas. Despreocupado com teorizações que compreendam sua obra em um corpo facilmente identificável, expõe a fluidez e abertura do seu pensamento e produção, dialogando diariamente com tudo que a vida e a arte possam trocar com ele. Extremamente variada em meios, técnicas e questões tratadas, sua obra abrange desenho, gravura, objeto, arte correio, videoarte, xerografia, xerox filme, fax arte, outdoor, livro, poesia, fotografia, performance, intervenção, instalação, arte digital, com muito humor e ironia, mas sem cinismo ou ceticismo. Bruscky acredita no poder crítico e poético do seu trabalho para abrir novos territórios e relações no campo da arte. Ao contrário da crença no poder de transformação social que tinham as vanguardas modernas, há hoje uma crença em constante autoquestionamento, o que provoca uma reflexão sobre o significado e alcance destas ações poético-políticas. Ações que hoje seriam entendidas como micropolíticas, relacionadas à própria experiência prática cotidiana, em que o ecletismo de meios e propostas corresponde à perda da noção de verdades absolutas e universais. Como disse Jacques Rancière,3 a arte não é primordialmente política pelas mensagens ou estruturas sociais que representa com seus conflitos e afirmações de identidade social, étnica ou sexual. Existe uma dimensão estética na política e uma dimensão política na estética, que seriam configurações da experiência que provocam novos modos de sentir e perceber o mundo. O entendimento da estética aqui segue o pensamento de Rancière: “um regime específico de identificação e de pensamento da arte”, um modo de articulação entre sentidos e experiências de vida. Não há separação entre estética e política, o que torna falsa a dualidade estética e política. Ajudei as pessoas a refletirem, especialmente através de ações de rua. Sendo artista você quebra convenções e introduz coisas novas. Infelizmente, os artistas têm que continuar ensinando ver a vida toda, mas se as pessoas começassem a saber ver o mundo seria bastante diferente. Paulo Bruscky expande e tensiona os limites do conceito de arte e propõe novos modos para a sua produção e recepção. O conceito de 120

2 Smithson, a propósito de land-art e dos nonsites, disse “For me the world is a museum”, e Hélio Oiticica , em 1966, disse: “Museu é o mundo, é a experiência cotidiana”. 3 Rancière, Jacques. Política da Arte. Seminário no Sesc Belenzinho, São Paulo em abril 2005. concinnitas


Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a crítica institucional

“saber ver” não está vinculado unicamente à visualidade, mas a uma inteligência visual que é manifestação da união do sensível ao conhecimento intelectual. Segundo o conceito de Rancière, a estética de Bruscky não resulta de uma teoria do gosto ou sensibilidade, mas de um modo de ser da arte que está identificado com um regime específico do sensível ou de formas de visibilidade. Os objetos singulares da arte não têm regra, hierarquia, compromisso com temas, meios e técnicas, e sua singularidade não depende de que sejam destacados, como objetos autônomos, no sentido da autonomia como pensado na modernidade de forma paradigmática por Greenberg. O regime estético das artes (...) implode a barreira mimética que distinguia as maneiras de fazer arte das outras maneiras de fazer e separava suas regras da ordem das ocupações sociais. Ele afirma a absoluta singularidade da arte e destrói ao mesmo tempo todo critério pragmático dessa singularidade. Funda, a uma só vez, a autonomia da arte com a identidade de suas formas com as formas pelas quais a vida se forma a si mesma. 4 Os trabalhos de Bruscky parecem estar sempre no limite entre o comum e o singular, entre a intenção e o acaso, entre arte e antiarte. Objetos não-objetos, documentos-obras, obras a vir a ser, jamais completadas ou sequer “criadas”. É o risco de viver no limite entre a dúvida e a convicção, ser e não ser, e seguir rindo da vida e da Paulo Bruscky. O que é arte? Para que serve? Registro de performance realizada em Recife, 1978

incompreensão dos que dizem que ele é um “artista que não tem obra”. Ao criar sistemas paralelos ao circuito (arte correio, ateliê arquivo, ações públicas) questiona as estratégias e modos dos sistemas vigentes, consciente de que os discursos e ações só são capazes de transformar qualquer sistema quando adquirem visibilidade neste mesmo sistema. Com isso escapa das classificações institucionais e desestabiliza conceitos e critérios de julgamento de valor. Como categorizar o seu trabalho? Passei a não mais separar o trabalho do meu dia-a-dia. Eu penso diariamente, trabalho diariamente, está tudo incorporado, não consigo fazer outra coisa. Bruscky desestabiliza conceitos e confunde também conteúdo e continente. O seu ateliê é local de trabalho e de exposição, arquivo e oficina, público e privado, memória e processo, e existe como fluxo. Não por acaso guarda em seu ateliê uma das maiores coleções do grupo

4 Rancière, Jacques. A partilha do sensível. São Paulo, Ed 34, 2005, p. 33-34. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

Fluxus, grupo do qual participou especialmente através da arte correio e cujas propostas estão presentes em muitos dos seus trabalhos e postura de vida. 121


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Arte em rede E-mail art: hoje a arte é este comunicado, ou seja, a arte do meu tempo: tenho pressa. A arte correio foi um meio importante nos anos 60 e 70, e Bruscky foi um dos pioneiros nesse meio, como em vários outros: filme (super8 e vídeo), xerografia, fotolinguagem, eletrografia, poesia visual, livros de artista e poesia sonora. Na arte correio, a correspondência constituía simultaneamente o trabalho de arte e meio de comunicação e circulação independente do circuito convencional de arte. No Brasil, e em vários países latino-americanos onde houve ditaduras militares, foi uma forma ativa de contestação política e constituição de alternativa ao circuito oficial. Os artistas (...) burlavam a censura, multiplicando sua obra através desses meios. Um dos trabalhos de arte-correio realizados por Bruscky, que revelam sua natureza de fluxo, comunicação e insubmissão ao controle dos dispositivos de poder, foi o projeto Sem Destino, que consistia em carimbar “sem destino” no local do destinatário. No lugar do remetente estava o nome e endereço de Bruscky. Dessa forma, os envelopes postados em diversos países retornavam, muitos abertos. O conteúdo eram frases irônicas com a questão da censura e com o próprio conceito de arte (como o postal carimbado: “Confirmado, é arte”). Bruscky preserva a memória da arte correio. O movimento foi relegado pelo meio da arte, ignorado pelas instituições. O aspecto positivo desse desprezo foi a criação de um outro circuito, um “circuito ideológico” para usar a expressão de Cildo Meirelles,5 independente do circuito formal de arte, o que instaurou um novo conceito de arte, vinculado à idéia de rede, precedendo a rede virtual de hoje. Foi bom porque nós criamos espaço, éramos uma rede dentro da rede. A gente já era uma internet antes da internet. Hoje, essa documentação, que eu não chamo obra, essa troca de idéias, está na mão desses artistas. O grupo Fluxus utilizou muito a arte correio, que se encaixava nos seus princípios de arte coletiva e em fluxo. A diluição da autoria é evidente nessa prática, em que as idéias de processo e circulação se sobrepunham à materialidade do objeto. No entanto, os envios eram feitos entre artistas ou entre artistas e destinatários anônimos, construindo uma trama de relações legitimadas como arte pelo próprio meio. Só a instituição “arte” poderia ver arte correio como arte e não como mera correspondência. 122

5 Os trabalhos de Cildo Meirelles, Inserções em Circuitos Ideológicos, o Projeto Coca-Cola (1970) em que inseria frases em garrafas de Coca-Cola retornáveis, e o Projeto Cédula (1975) em que frases eram carimbadas em cédulas de dinheiro.

concinnitas


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Hoje, quando vivemos a chamada era da comunicação, a arte virtual revela a importância social e política das redes de informação. Toda nova tecnologia termina por provocar transformações no meio ambiente e nos modos do pensamento. Mais do que obras acabadas, a ênfase na experimentação, no processo e na interação muda a noção de arte e o sentido da sua existência, como possibilidade de participação social, com novos modos de relação e integração entre indivíduos e comunidades. E havia alguns artistas com quem você trocava correspondência, sobre conceitos de arte, filosofia de vida, conceitos de país, a diferença de vida entre países. Paulo Bruscky percebeu essas características ainda nos anos 60 e 70 com a arte correio, que, como ele disse, era arte em rede antes da internet. Outra proposta neste campo foi a tentativa de Bruscky de conexão on-line com os visitantes do seu ateliê transportado para a Bienal de São Paulo em 2004. Mas, para mim o mais curioso nessa experiência foi retornar e viver o ateliê vazio. Foi uma experiência inusitada para mim e seria para todo artista. Eu inclusive fiz uma proposta ao Hug, que seria de ficar em tempo real me comunicando com os visitantes pela internet. Manter um diálogo; eu diria qual seria a minha sensação naquele momento. Cada dia, cada momento você tem uma sensação diferente, e duas vezes por semana eu viria para o ateliê vazio e relataria minha experiência. Haveria a possibilidade de interação com o público, mas a ênfase estava na comunicação de uma experiência vivida por Bruscky: ficar no ateliê vazio. Aqui vale destacar o sentido de estranhamento provocado pela maioria dos seus trabalhos. Além do insólito da própria exposição, a presença de Bruscky no lugar e a proposta de sua presença virtual em tempo real e mantendo um diálogo a partir da experiência do vazio, por si só, continham e provocavam estranhamento.

O ateliê / arquivo, espaço em obra A exposição do ateliê na Bienal de São Paulo era algo bastante insólito: não se aplicava a palavra exposição no sentido convencional de mostra de objetos de arte. Como ver numa exposição a transposição de um ateliê do jeito que era utilizado por Bruscky: uma mistura de ateliê de trabalho, casa, biblioteca e arquivo? Ver as reações das pessoas e poder mostrar para elas o processo de criação foi gostoso. Não [houve contradição], porque foi feito tudo como foi discutido e funcionou. Me interessava mostrar como é a vida ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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de um artista. Não me trouxe nenhum tipo de questionamento em relação a isso. É como se fosse um “múltiplo” do ateliê. Num primeiro momento, a concepção de arte e vida de Bruscky como fluxo parece se contradizer com o transporte do ateliê para a Bienal. Tudo foi levado,6 e a arquitetura foi reproduzida em São Paulo, incluindo até a paisagem de Recife por trás das janelas em backlights. Como uma réplica 7 fechada ao público manteria sua autenticidade, seu sentido de fluxo? O fechamento ao público atendeu apenas a preceitos museológicos visando à proteção dos objetos e documentos, mas Bruscky procurou contornar esse bloqueio com a proposta do trabalho em rede e que não foi aceita. A experiência de retornar ao vazio foi vivida como uma experiência estética. Como disse Heráclito, para quem tudo fluía e a verdade estaria no devir e não no ser, “não nos banhamos duas vezes no mesmo rio”. O rio foi para São Paulo, e mesmo parcialmente congelado, mostrava seu fluxo de vida. Arte como ação política, na rua, no museu, no arquivo, na rede. O ateliê como arquivo seria fundamentalmente um lugar de guarda, preservação e organização de documentos. O arquivo está no ateliê e abriga cinco mil livros e cerca de 70 mil itens de arte (obras e documentos). Uma das maiores coleções internacionais do grupo Fluxus que tem cerca de 300 originais, e 100 do grupo Gutai. O acervo conta ainda com mais de mil livros de artistas, um dos maiores do mundo. A arte correio foi uma das origens da constituição do arquivo e uma das responsáveis por lhe atribuir uma identidade especial. Os trabalhos de arte correio são, ao mesmo tempo, obra e documento, que simbolicamente se confundem e substituem o museu. “Na Arte Correspondência, o museu cede lugar aos arquivos e as caixas postais”8 assumindo a sua indefinição como lugar simbólico da arte e a impossibilidade de definição da própria arte. O arquivo é compreendido de forma aberta e expandida, como um lugar que recebe e emite sentidos. Mesmo que Bruscky não o considere obra, o ateliê torna-se singular diante de seu hibridismo e complexidade: é ao mesmo tempo documento e lugar de trabalho, está parcialmente aberto ao publico em dias determinados para pesquisa, troca de idéias e exibição de novos trabalhos. Em constante processo, não se enquadra em nenhuma definição: é pensamento e obra. Aponta para um dos caminhos desejáveis para um museu contemporâneo de arte, misturando e criando relações entre memória, presente e devir. O artista-curador-arquivista deste “museu” gosta de “olhar para o que não serve para nada”. 124

6 O ateliê foi transportado em 300 caixas, com mais de cinco mil livros, objetos, móveis, documentos, projetos e trabalhos de Bruscky. Integrou uma das oito Salas Especiais da XXVI Bienal de São Paulo. 7 Apesar de os objetos serem os verdadeiros, a arquitetura era uma cópia. O ateliê remontado pode ser visto como réplica, na medida em que está fora do seu lugar e da sua função. 8 Bruscky, Paulo. Arte Correio e a grande rede: hoje a arte é este comunicado. In: Ferreira, Glória, Escritos de Artistas. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., p. 379. concinnitas


Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a crítica institucional

Detalhe do Ateliê de Paulo Bruscky remontado na Bienal de São Paulo

O lugar não parece “arrumado”, e Bruscky opõe esse (des)arranjo à ordem asséptica de “ateliês que parecem consultório médico ou escritório de advogado”. Desafia todos os métodos classificatórios museológicos ou de arquivos. “Nele [no arquivo], tudo se toca e não raro fronteiras que apartam técnicas, períodos, autorias e nacionalidades se desmancham e se confundem”.9 A idéia de arquivo está muito presente na arte contemporânea e certamente está ligada à liberdade de voltar ao passado distante ou recente (o presente transformando-se em passado e vice-versa) misturar e confrontar significados diversos, numa recolagem de episódios. A reflexão se dá como metalinguagem, como reflexão sobre o próprio ato de arquivar, como questionamento das leis de classificação e legitimação, das suas supostas verdades.

Trabalhos de crítica institucional e muitos outros A obra de Paulo Bruscky, por sua multiplicidade e diversidade, escapa às classificações e tipologias relacionadas a trabalhos de crítica institucional. No entanto, muitos dos seus trabalhos podem ser vistos como parte dessa vertente. Sem desconsiderar a singularidade de trabalhos específicos, o conjunto da sua obra revela um pensamento e postura de vida eminentemente críticos em relação à arte, às suas instituições e à sociedade.

9 Anjos, Moacir dos. O ateliê como arquivo. In: Catálogo da XXVI Bienal de São Paulo, 2004. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

A indistinção entre obra e vida, no seu caso, não tem nada a ver com a mistura entre sujeito e obra. Bruscky não age como personagem e não vê tudo, incluída a arte ironicamente como farsa ou simulacro. 125


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Para ele a vida é irônica em suas contradições e imponderabilidade e sua obra fala disso com humor, mas com sinceridade e não como paródia. A citação de uma frase do artista Robert Rehfeldt revela a idéia de um mundo sem lógica, no qual as verdades são relativas. Engraçado, Bruscky, a arte correio é tão forte, é como se a gente se conhecesse já há muito tempo, desde a adolescência. Você foi preso no seu país por ser comunista, e eu fui preso no meu país por ser democrata e, no entanto, nós pensamos mais ou menos igual. Essa visão de mundo não impede, no entanto, a crença na possibilidade de um mundo melhor, como se Duchamp e seu ceticismo irônico e Beyus no seu idealismo político pudessem se reconciliar não em uma síntese dialética, mas assumindo mesmo a convivência entre pólos diferentes e complementares. As idéias de Duchamp e Beyus foram essencialmente antimíticas, no sentido de desconstruir verdades até então intocadas da arte, não mais como criação individual e sim como representação do sistema da arte. Essas posições, como todas, tornaram-se elas mesmas mitológicas. Barthes mostrou como “o mito organiza um mundo sem contradições, porque não tem profundidade, um mundo escancarado e que se chafurda no evidente, ele estabelece uma clareza bem-aventurada: as coisas parecem significar algo por si mesmas”.10 Lyotard 11 ajuda a esclarecer esse conceito de uma “não-dialética”. Segundo ele, ou o sistema é um todo funcional e homogêneo, ou tem uma “dualidade intrínseca” dividida, algo que contém em si elementos de contestação. Esse tipo de crítica não seria apenas contestatória, mas uma forma de orientar ou transformar a sociedade. Ajudei as pessoas a refletirem, especialmente através de ações de rua. Fiz muita intervenção urbana, muita coisa anônima. Bruscky faz conviver o mito das vanguardas com a “dualidade intrínseca” de seu pensamento e prática. A sua ambivalência em relação à crença na própria arte está presente em vários trabalhos, como os postais irônicos Está confirmado: é arte; ou Arte por Correspondência, em que há uma figura de um frasco de spray com o rótulo “arte”; a performance O que é a arte? Para que serve?, em que ficava em vitrines com um cartaz pendurado no corpo com a pergunta; ou ainda de objetos como Pintura a óleo, feita com latas de óleo de cozinha coladas em um suporte de madeira. Os jogos de linguagem são fundamentais em todos os trabalhos mencionados. (...) trabalho muito com a palavra, com jogo de palavras. E com uma ou poucas obras não é possível conhecer meu processo, 126

10 Barthes, Roland. Image-Music-Text, trad. Stephen Heath, Nova York, 1977. 11 Lyotard, Jean-François. A condição pósmoderna. Rio de Janeiro, José Olympio, 1998. concinnitas


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entender minha obra. E eu trabalho com vários processos simultâneos. Para mim a dúvida é fundamental. É este questionamento que me faz produzir. O jogo entre essas “dualidades intrínsecas” acontece também na convivência e mistura entre objetos comuns e objetos de arte em um mesmo lugar, seu ateliê, em que a proximidade os faz embaralhar a noção mesma de objeto de arte. O exemplo das garrafas arrumadas na bancada da pia da cozinha ilustra bem esse aspecto. O que são? Bruscky sorri, dizendo que apenas as colocou ali. Um grupo de garrafas azuis vazias enfileiradas ao fundo junto com outro conjunto de garrafas de refrigerante cujos rótulos são sutilmente diferentes (“saíram do padrão de qualidade da fábrica”), arrumados transversalmente às primeiras, misturam-se com garrafas com bebidas para consumo. Objetos comuns podem transformar-se em arte a qualquer momento, como o trabalho sem título, que Bruscky apresentou como “lata tornada obra quando colocada na parede no momento de remontagem da cozinha”. Esta lata com sobra de tinta de parede estava em um canto qualquer quando Bruscky resolveu colocá-la na parede. A cada dia vou incorporando coisas novas. Readymades que estão e não estão deslocados do seu contexto. Seria diferente em um museu? Após Duchamp e as Brillo Boxes, de Andy Warhol, não há mais dúvida de que a exposição em um espaço institucional da arte legitima o objeto (pelo menos por algum tempo). Mas num ateliê, que é tão híbrido quanto os seus objetos? O meio da arte que reconhece a autoridade do artista Bruscky procura saídas para o desconforto. Uma frase de Moacir dos Anjos12 parece justificar poéticamente o que seria um “desajuste”: Por seu conteúdo abrangente e arrumação instável, o ateliê de Paulo Bruscky espelha (e duplica, portanto) a natureza fluida de sua obra, a qual não se acomoda ou ajusta a lugar simbólico algum, definindo-se como processo e liberta de um único fim. Entretanto Bruscky sabe que sua obra, em constante processo, só tem lugar no meio simbólico da arte. O ateliê evidentemente é um deles e foi criado por Bruscky, entre outros motivos, como uma forma de resposta à falta de lugar para sua obra nas instituições. A questão da autoridade do artista na constituição de um objeto 12 Anjos, Moacir dos. O ateliê como arquivo. In: Catálogo da XXVI Bienal de São Paulo, 2004. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

como arte foi desenvolvida por De Duve, a partir da idéia do readymade. A relação de um artista com sua obra seria da ordem da maternidade, 127


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mas não no caso do readymade, que, por não ter sido gerada pelo artista, seria da ordem da paternidade. Um readymade visto assim seria como uma criança escolhida e adotada a quem o artista dá o seu nome. Como disse De Duve, “diante de um readymade não há diferença entre fazer e julgar arte”.13 De Duve sustenta que o próprio nome “arte” tem o poder de atribuir valor de arte a um objeto. A frase ‘isto é arte” na verdade é dita como “você é arte”. Bruscky não tem dúvida de que sua autoridade de artista lhe concede o direito e o poder de se apropriar e atribuir valor de arte a qualquer coisa. Bruscky cerca-se dessas coisas, que são parcialmente readymades, porque não estão “prontas” nem necessariamente foram feitas industrialmente. Gosto de olhar para coisas que não servem para nada, desde cedo incorporei esta coisa da idéia. Se é boa ou se é ruim, se vai ter alguma utilidade 14 não interessa. E a idéia não necessariamente precisa ser realizada. (...) Eu desvinculo a utilidade da idéia da minha criação. Os objetos precários e instáveis de Bruscky parecem provocar sempre uma cisão entre dois pólos da sua existência, entre memória e vir a ser, entre a recusa da aura, como fetiche do objeto, ou da estética fácil do belo, e a busca da imagem poética. Esse aparente paradoxo talvez seja a força maior da sua potência. Ao contrário de Nicolau Sevcenko,15 que viu no trabalho de Bruscky no Panorama de 2001 “imagens cruas, sem aura e sem alma”, vejo imagens cruas, sim, mas cheias de alma e, portanto, com aura, nesse caso não como transcendência ou fetiche, mas como Didi-Huberman a viu: não um sentido metafísico, mas como “umas das fontes mesmas da poesia”, a origem do reconhecimento do sentir e pensar a arte.16 Uma carta, um papel datilografado, um funil amassado invertido sobre uma pedra, um ímã de geladeira, uma torre de 30m de blocos de gelo valem a mesma coisa no mundo do consumo em que tudo é mercadoria – nada. Mas no campo da arte, esta condição, a da inutilidade, é princípio e premissa para a reversão do valor de troca para o valor simbólico de um bem cultural. O MAM tem registros fotográficos que estão guardados no museu junto com a proposta. Não pensei em refazer, para mim o trabalho já existia como proposta. Eles quiseram comprar, para mim não precisa nem devolver! Bruscky sabe que arte é conceito, é convenção e não tem ilusões de que as quatro condições imprescindíveis para a existência da arte, como disse De Duve, são a existência de um objeto (mesmo como imagem ou 128

13 De Duve, Thierry. Reinterpretar a Modernidade. Entrevista a Gloria Ferreira. Rio de Janeiro, Arte&Ensaios, EBA-UFRJ, ano V, no 5, 1998, p. 119. 14 Bruscky usa o termo no sentido amplo, mas principalmente como qualidade de mercadoria. 15 Sevcenko, Nicolau. Um Panorama e algumas estratégias, In: Catálogo do panorama 2001, São Paulo, 2001. 16 Didi-Huberman, Georges. O que nos olha o que nos vê. São Paulo, Ed. 34, 1998. concinnitas


Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a crítica institucional

idéia), de um autor, de público e de uma instituição, que reunirá as três primeiras condições.17 No entanto a convenção para ele não mata a arte, desde que reconhecida e constantemente desafiada, como em um jogo de desconstrução feito de intenção e acaso. Sim [arte é conceito]. E é preciso saber ver, educar o olhar, inclusive para coisas que não tem nenhuma função e utilidade. Você vai estimulando sua criação na medida em que vai aprofundando a sua visão, a percepção. O acaso que está presente na idéia de jogo está também subjacente na formação de uma coleção e na construção de um arquivo que não tem fim. O sentido de construção e sua relação com o seu lugar de inserção, cuja origem histórica vem claramente do movimento construtivo russo, seguiram diferentes caminhos, como, por exemplo, nos trabalhos de Kurt Schwitters nos anos 20 e de Hélio Oiticica nos anos 60 e 70. Para Schwitters, a idéia de obra como construção e sua relação com o lugar fundamentou o conceito da sua Merzbau.18 Para Oiticica, esse sentido não distingue arte e política e com ele procura uma relação estreita com a vida, base do seu “Programa Ambiental”. A afinidade entre Bruscky e Oiticica, além do desejo de aproximação entre arte e vida, também pode ser percebida na postura afirmativa, apesar da crítica irônica em relação à própria arte. Por isso, ambos não seriam artistas que se enquadrariam apenas na vertente “crítica institucional”. Totalmente diferente de Marcel Broodthaers, ou Andréa Fraser, para citar dois exemplos paradigmáticos de artistas cujos trabalhos se constituíram basicamente como crítica ao museu e às instituições da arte. Paródias podem ser críticas eficazes, mas, concordando com De Duve, não saem da circularidade do sistema (e para ele, nos dois casos, não são arte de modo algum). O que haveria em comum, além da idéia geral de crítica institucional? Quando Broodthaers escreveu nas etiquetas dos objetos do Museu de Arte Moderna, Seção das Águias, “isto não é um objeto de arte”, estava dizendo que aqueles objetos estavam de fato representando a arte. Da mesma forma, os trabalhos de Bruscky como Fax arte e Está confirmado, isto é arte, estão afirmando “Isto é uma representação de arte”, mas também dizem com humor: “isto é 17 De Duve, op.cit., p. 111-115. 18 Kurt Schitters dedicou-se por anos à construção de sua Merzbau, um misto de escultura e arquitetura que primeiro ocupou um quarto da sua casa (em Hanover nos anos 20), e expandiu-se à medida que acrescentava todo tipo de objetos. Um dos primeiros artistas a explorar a relação entre obra e seu lugar. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

arte, porque assim penso, faço e digo”.

Fluxo no museu? Vejo a mudança dos museus como gratificante, embora uma grande parte fique só na teoria. Na prática só estão interessados em exposições que dêem retorno. Mas a tentativa que está sendo 129


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feita na arte-educação é fundamental porque está aliada aos artistas. Serve à instituição, mas está aliada aos artistas, na medida em que ajuda na discussão sobre a obra do artista. A potência transgressora da obra de Bruscky não investe contra o museu ou outra instituição da arte, mas contra seu poder autoritário e reducionista. Bruscky se investe da autoridade do artista para apresentar saídas e entradas. Provoca a capacidade crítica das instituições com trabalhos que testam padrões vigentes e limites físicos e simbólicos. Mas Bruscky sabe “que tudo acaba em museu” e talvez, a instabilidade e fluidez da sua obra seja uma maneira eficaz de escapar de todo determinismo, não ser capturado por um sistema mercantilista (“o supermercado da arte”) e baseado em valores burgueses. Ele denuncia a acusação de ser um “artista que não tem obra”, já que “obra”, segundo tais valores, é objeto que serve para finalidade decorativa. Desde 1969, quando iniciou suas pesquisas, segue caminhos independentes e alternativos aos sistemas de poder. Mais do que contestação política sua forma de atuação política institui modos de ser da arte na vida. A sua participação e contribuição na arte correio e a criação do ateliê/arquivo/obra são os maiores feitos nesse sentido, mas toda a diversidade e instabilidade da sua obra, a precariedade de seus objetos, a transitoriedade de suas ações são também responsáveis pela natureza rebelde e transgressora da sua obra. A ambigüidade da instituição é acompanhada pela ambigüidade das relações com o artista (e também com a arte e o público). Apesar do reconhecimento do meio da arte, Bruscky tem permanecido excluído das instituições e do mercado. Não me preocupo com ninguém, com museu, com crítica. E por isso sempre fui muito criticado. Aqui eu fui muito acusado, como um artista que não tem obra (...). Mas nunca procurei galeria ou um crítico. Essa situação parece estar começando a se modificar,19 mas é muito significativo que o próprio museu de arte moderna de sua cidade – o MAMAM, nunca tenha adquirido uma única obra sua e nem mesmo o tenha convidado a realizar exposição individual. Sabe-se que os “museus brasileiros vivem à mingua”, como já declarou Agnaldo Farias, mas não cabe aqui e nem há como avaliar essa situação. Como Bruscky conta, só em 2006 um museu adquiriu uma obra sua (o MAM de São Paulo comprou Expediente). A partir do reconhecimento da fragilidade das instituições brasileiras os museus talvez pudessem não seguir modelos americanos e europeus 130

19 O convite para levar seu ateliê para a Bienal de 2004 representou certamente um marco importante no reconhecimento da importância do porte histórico de Paulo Bruscky. A “legitimação” pela instituição do MAC- USP na pessoa de Cristina Freire, ao pesquisar o trabalho do artista e escrever um livro sobre ele valoriza justamente um artista que tem vivido praticamente à margem do circuito e das instituições da arte. concinnitas


Arte é este comunicado agora – Paulo Bruscky e a crítica institucional

Paulo Bruskcy. Confirmado, é arte, 1977 (carimbo e decalque s/ cartão postal)

e procurassem se espelhar na vitalidade e singularidade da arte contemporânea brasileira. Como seria expor a obra de Bruscky em um museu, sem cristalizar momentos, sem compartimentar idéias que se misturam, ser perder o fluxo? Sendo artista você quebra convenções e introduz coisas novas. (...) Tem um trabalho meu de 71, que eu botei uns prospectos no museu perguntando: Na sua opinião qual seria a opinião dos quadros sobre os expectadores? As pessoas responderam, e eu também. Eu inverti, porque as pessoas chegam e podem ter uma opinião sobre a obra e a obra não pode responder nada. Apareceram coisas extraordinárias. Bruscky sabe que é preciso desnaturalizar o circuito de arte, não tomá-lo como única possibilidade, propor relações e alternativas que pressionem novas situações em relação ao sistema estabelecido. Nesse sentido, a arte correio, ainda nos anos 60 e 70, e a constituição do seu ateliê-arquivo em processo foram as principais destas propostas, mas toda a variedade de ações e meios utilizados pelo artista aponta modos de resistência e instauração de ações político-artístico afirmativas. Não tenho definido a obra acabada, não tenho ciúme da obra, para mim uma obra pode virar outra a qualquer momento. Como o museu pode dar conta de uma arte que se apresenta de forma tão híbrida e instável? As instituições da arte – a crítica, a história, a universidade, o museu – só existem sobre e para a arte. Elas supõem a existência e um conceito de arte, supõem critérios e valores, códigos de linguagem e um sistema de signos. Como na fita de Moebius, que não tem começo e nem fim, e se desdobra a cada escolha de um caminho, voltamos ao fato de que o

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reconhecimento da autonomia do processo estético conflui para a sua existência enquanto parte de uma estrutura – um sistema social, seu contexto, enfim. O dilema persiste instaurando seus sentidos como as “dualidades intrínsecas” referidas por Lyotard. Paulo Bruscky ao responder à questão da antinomia entre arte como conceito (valor culturalmente determinado que demandaria conhecimento anterior) e arte como potência estética (valor intrínseco à própria obra) afirmou: As duas vertentes são corretas – e fazem parte desta diversificação do pensamento das pessoas. (...) Isso vai muito pelo repertório cultural de cada um e da comunidade. Não tem uma única definição, é uma coisa muito complexa para definir o caminho se é este ou aquele. Depende muito do tipo de obra e do contexto cultural onde a obra é exibida e do próprio público. (...) O artista não tem que se preocupar se a arte fala ou não por si. Ela fala, mas tem códigos. A compreensão da arte como parte de um sistema de signos e a sua despreocupação com a recepção do seu trabalho, revelam a complexidade do pensamento de um artista ao mesmo tempo desprendido e ligado no contexto do seu tempo e do seu lugar. Arte como idéia que nem precisa ser realizada, que existe fundamentalmente como projeto de vida, para construção de uma vida melhor.

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Ganarse la vida Loreto Alonso Centro de Creación Contemporánea Intermediae. Matadero de Madrid “Ganarse la vida” es un proyecto del colectivo C.A.S.I.T.A que en esta ocasión componen Diego del Pozo, Eduardo Galvani, Kamen Nevdev y Loreto Alonso, un grupo difuso que lleva activo desde 2004 cambiando de personas, de contenidos y también de nombre, pues estas siglas responden a diferentes palabras en cada proyecto, en el caso de “Ganarse la vida” las siglas C.A.S.I.T.A. quieren decir “¿Cómo articular situaciones ilusionantes entre arte y trabajo?” Esta propuesta propone una reflexión artística de las formas de trabajo en la actualidad abordando algunas “preguntas terribles” que Casita en obrador

se nos presentan a la hora de definir tanto los procesos que configuran nuestras subjetividades como el uso que hacemos del tiempo y del espacio. La idea de lo “ilusionante” no se presenta sin embargo, desproblematizada, y las posibles soluciones, se acercan más a una conciencia de lo que todavía nos queda que a una feliz utopía. El colectivo presenta en el espacio del antiguo Matadero de Madrid, varias formas de participación pública que parten de diferentes experiencias, desde entrevistas a relatos fantásticos, desde el diálogo con otros colectivos a la exposición pública, desde el dibujo a la fiesta. El proyecto se entiende, tanto por el tema como por la esencia del grupo como una forma de comunicarse con otros particulares o colectivos por lo que genera varias formas de invitación. Una invitación a investigar a través de la construcción de una Biblioteca y una Mediateca que recogen títulos fundamentales para establecer un marco conceptual respecto a las transformaciones de la producción en los últimos años y un dispositivo interactivo que plantea un espacio panóptico por el que en un paseo relacionarnos con ciertos personajes y conceptos.

virtual podemos

Una invitación al diálogo en varias asambleas públicas que se desarrollan sobre la instalación del llamado Ente Transparente y en el que se encuentran antiguos y nuevos trabajadores del Matadero, futuros adultos, personas con discursos teóricos y personas que quieran contar sus prácticas laborales o vitales… Y también una invitación a la imaginación a través de elementos plásticos, narraciones audiovisuales y dibujos como son los personajes de la Necesidad Programada, La Abundancia Espontánea, la Rentabilidad, ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

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Loreto Alonso

la Renta Básica, el Distraído Desenfocado o el Pulpo-Malabarista-Cabeza peonza.

El espacio de trabajo, el Obrador, se encuentra abierto al público que encontrará en él un decálogo donde se sitúan diez puntos de referencia sobre el tema: Los espacios de la producción (1) y los tiempos de la producción (2), se presentan en una cinta de Moebius en movimiento continuo en torno a la sustancia volátil del deseo, este movimiento se sostiene gracias a la flexibilidad (3) que exige el régimen de trabajo, que implica no sólo la actividad asalariada sino también, como forma de producción de valor, la comunicación, el consumo y las relaciones personales (4), un sistema total lleno de problemáticas entre las que se destacan varias precariedades (5) materiales, inmateriales, laborales, vitales… que más allá del escepticismo o del sentimiento de fracaso pueden dar pie a algunas propuestas y tomas de conciencia como la de acordar de forma colectiva cómo y cuándo trabajamos (6) teniendo en cuenta la división del trabajo y del consumo a escala global o las posibilidades emancipatorias que siguen manteniendo nuestras relaciones y nuestros afectos (7). El Ente Transparente (10) representa todas estas reflexiones más la posibilidad de encontrar un tiempo o un espacio de no-trabajo (8 y 9). En conjunto, este proyecto muestra un carácter experiencial y experimental que esperemos sea capaz de contactar con un público amplio en este nuevo emplazamiento para la cultura contemporánea en Madrid.

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Zexe.net – Canal motoboy Daniela Labra* O projeto multimídia do artista catalão Antoni Abad é obra estruturalmente complexa de conceito simples, que dá voz a pessoas comuns, transformando-as em cronistas do cotidiano e permitindo-lhes que versem sobre as agruras e delícias do coletivo social que integram. Teve início em 2004 e, primeiramente, focou o universo dos taxistas da Cidade do México, grupo de profissionais que carrega o estigma de seqüestradores e bandidos. A obra funciona do seguinte modo: Abad convida integrantes de coletivos que não têm presença ativa nos meios de comunicação preponderantes para construir canais de informação na internet, por onde circula apenas o que lhes diz respeito. Munidos de telefones celulares, os indivíduos coletam mensagens de áudio, vídeo, foto, texto e conversas telefônicas, captados em espaços públicos e privados da cidade e coordenam a publicação em tempo real, on-line, de fóruns e páginas previamente acordados entre eles em reuniões periódicas. Nesses encontros eles também analisam a evolução desses canais, decidem sobre a criação de novas páginas e se associam em grupos dedicados a cuidar de cada canal predeterminado. Após desenvolver o projeto com grupos díspares, cujo cotidiano só é manchete em caso de tragédia, como o das prostitutas de Madrid, dos imigrantes nicaragüenses da Costa Rica, dos ciganos de León e Lleida (Espanha) e dos deficientes físicos de Barcelona, agora o Zexe.net está desenvolvendo as atividades descritas com os motoboys de São Paulo. Note-se que todos os países envolvidos são ibero-americanos, um acaso, * Daniela Labra é curadora independente graduada em Teoria do Teatro pela Uni-Rio, especializada em Comunicação e Arte pela Universidade Complutense de Madrid e mestre em Artes pela Unicamp. Desde 2003 realiza projetos com arte contemporânea, tendo desenvolvido curadorias e oferecido palestras na Holanda, Inglaterra, Alemanha e Finlândia, sobre a produção de arte atual. Coordena com a Galeria Vermelho (SP) o festival Verbo, dedicado à performance arte. Sua curadoria mais recente é Fabulosas Desordens (2007), na Caixa Cultural (RJ). Pertence ao conselho editorial da revista Número desde 2003 e tem publicado em revistas especializadas e catálogos de exposições. É professora substituta do Departamento de Teoria e História da Arte do Instituto de Artes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Mantém o site www.artesquema.com ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

segundo o artista. O Projeto Motoboys, ainda que seja o mais recente, foi o primeiro a ser planejado e estava previsto para acontecer em 2004. O início de tudo deu-se numa visita de Antoni Abad a São Paulo, quando conheceu o universo dos motoqueiros profissionais: um contingente de quase 160 mil indivíduos amaldiçoados por motoristas e transeuntes, mas indispensáveis para o bom funcionamento dos serviços burocráticos metropolitanos. Percebendo a presença ostensiva dos motoboys pelas vias, sua realidade arriscada e a indiferença com que são tratados pela população, o artista começou a se dedicar à viabilização de Zexe.net. Após esbarrar em muitos entraves práticos e financeiros brasileiros, o Projeto Motoboys finalmente deslanchou em abril e maio de 2007, desenvolvido por um núcleo de trabalho interdisciplinar montado no Centro Cultural São Paulo. 145


Daniela Labra

O Canal Motoboy é acessível na web www.zexe.net e é elaborado por uma equipe formada por Antoni Abad – mentor e diretor –, o sociólogo e antropólogo Augusto Stiel Neto, um programador e 12 motoboys, que trabalham remotamente nas ruas e também numa espécie de base fixa do Canal, composta por uma mesa circular e quatro computadores ligados à internet. Reuniões periódicas mantêm o grupo coeso, num processo que dura ao todo cerca de dois meses. Os participantes recebem treinamento técnico, enquanto são estimulados a refletir sobre seu dia-a-dia. Longe ou perto da base de trabalho, circulam pela cidade 12 aparelhos celulares nas mãos dos motoqueiros, que transmitem dados ao longo do dia para a internet, postando no site as coisas cotidianas que singularizam seu universo. Como anunciado no site: 12 motoboys percorrem espaços públicos e privados da cidade de São Paulo. Munidos de celulares com câmera integrada, fotografam, filmam e publicam em tempo real na internet suas experiências, transformando-se em cronistas de sua própria realidade.1 Como diferença dos outros canais, o Canal Motoboy apresenta uma ferramenta inédita, uma palavra-chave sugerida e postada pelo motoqueiro em sua página, que serve como linha temática para o agrupamento dos dados audiovisuais. Outra diferença é com relação a depoimentos em primeira pessoa dos participantes, que nessa versão do projeto são acompanhados de entrevistas a terceiros, feitas por eles próprios. O lançamento oficial do Canal Motoboy ocorreu em 12 de maio de 2007, com o oferecimento de um coquetel no Centro Cultural São Paulo e a liberação da mesa-base de reuniões do grupo para o público navegar pelo Canal. Uma vez terminados os trabalhos, o projeto é encerrado, e a vida dos indivíduos retorna à rotina normal, ainda que o encerramento não se de forma abrupta. Como a ajuda de custo oferecida é cortada aos participantes, permanecer atualizando o site vai-se complicando, até que o processo seja finalizado. Entretanto, no caso dos taxistas mexicanos o projeto rendeu uma associação latino-americana de taxistas, que continua a crescer sem qualquer intervenção de Antoni Abad. Refletindo sobre o seu trabalho de organizar esses canais de comunicação e a circulação de seus conteúdos, Antoni declara: Eu já me perguntei se isso poderia ser uma ONG. Mas me parece mais ágil poder acessar o trabalho a partir do mundo da arte, continuar funcionando no mundo da arte, usar a infra-estrutura e desviar os recursos do mundo da arte para um campo sociocultural, que é o que acredito estar fazendo. Isso é mais fácil do que organizar uma estrutura de ONG, que acredito dever ser uma loucura de burocracia. É uma estrutura muito complexa.2 146

1 Ver http://www.zexe.net/SAOPAULO/intro concinnitas


Zexe.net – Canal motoboy

Mesa de trabalho do Projeto Motoboy no Centro Cultural São Paulo, 2007. Foto: Daniela Labra

Ao assumir o pontecial social de seu projeto e encarar a agilidade provida pelo meio de arte com tal franqueza, Abad consegue fugir de paternalismos artísticos que muitas vezes surgem em obras que pretendem denunciar ou ilustrar necessidades de minorias em imagens poéticas para espaços artísticos e que refutam o evidente apelo social como se isso diminuísse o valor estético. Entretanto, por não se tratar de uma ONG, o projeto Zexe.net finda após um certo tempo. E é neste término do processo que está seu aspecto mais interessante. Ao apresentar um vasto material audiovisual sobre realidades pouco comentadas na mídia, o site torna-se uma espécie de arquivo de um determinado espaço e tempo onde podemos conhecer os hábitos e sentimentos de indivíduos improváveis, acompanhar seus passos já percorridos e lugares freqüentados, além de perceber como cada um deles manipulou as ferramentas de comunicação disponíveis na época. A série de retratos de coletivos de Zexe.net está acessível a qualquer pessoa durante um tempo indeterminado, e daqui a décadas seu valor

2 Antoni Abad. Entrevista, São Paulo, abril de 2007. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

como documentação sociocultural estará mais potente. Como contém qualidade estética e poética, esse projeto já é uma obra atemporal, por ser, justamente, uma obra datada. 147


Cristina lar Ribas

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Invenção de multidão

Invenção de multidão Cristina Ribas* Multitudes, revista quadrimestral, Paris, França, Edição de Association Multitudes e Exils. O poder da invenção extravasa as elites, as classes, os vanguardistas, as massas, o povo – tal como o poder contemporâneo se pensa e se efetua bem longe da soberania.1

A revista Multitudes é publicada na França desde 2000, e seu título, assim como todo o projeto editorial, é um desdobramento do conceito “multitudes” atualizado e desenvolvido do vocabulário do direito político por Antonio Negri e Michel Hardt. Aplicado inicialmente por Machiavel (no sentido da insurgência rebelde), depois desenvolvido por Espinosa (que o potencializou a partir dos corpos), o conceito é apresentado pelos autores contemporâneos no livro Império (2000). Quatro anos depois os autores publicam Multitudes, o livro, lançado no Brasil em 2005. Uma tradução direta do termo para o português é o próprio termo “multidão”, que procuro aqui aproximar ao máximo do sentido amplificado proposto pelos autores. Começamos pelo conceito porque é ele mesmo que vai abrir as possibilidades da revista e de suas diversas manifestações. A multidão não é o povo nem se identifica com a classe operária ou com a consciência de classe. Surge de uma interpretação subversiva do conceito espinosista, e é formado primeiramente por corpos que lhe dão essa carne – substância viva comum na qual o corpo e o intelecto coincidem e são indiferenciados. O comum é formado por emergências de singularidades, igualmente constitutivas da multidão – porque, se a multidão não é o povo nem quer representar (o todo da sociedade ou a qualquer Fotos realizadas no acervo da Biblioteca Marina São Paulo de Vasconcellos do IFCS, Rio de Janeiro. Foto: Cristina Ribas * Cristina Ribas é artista visual, mestranda no Programa de Pós-Graduação em Artes do Instituto de Artes da Uerj, onde disserta sobre o projeto “Arquivo de emergência: documentação de eventos de ruptura”. Faz parte do grupo Laranjas, e da multidão. 1 Conforme notas editoriais na página da internet da revista em: http://multitudes.samizdat.net/ Consulta em 05/05/2007. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

grupo), só pode ser que seja feita de singularidades que se relacionam sem o objetivo da identificação ou da unificação. Identificação e unificação seriam derivativos das atitudes do poder de governo (atuando por meio do direito e da polícia), intentando definir ou criar representações para os grupos de corpos, contendo-os. Hardt e Negri percebem uma alternativa a essas imagens, mas não querem totalizar sua teorização no mundo. A multidão coloca-se contra qualquer constituição de soberania, porque ela surge como manifestação contrária aos movimentos que arregimentam a sociedade. A multidão insurge dentro do próprio Império e daí mesmo o redefine. O Império é como uma máquina, uma engrenagem de funcionamento vazio, que vive da repetida empreitada de conter as 149


Cristina lar Ribas

manifestações e tentar moldar os indivíduos nas formas de subjetivação possíveis que agencia. Contra esse agenciamento das produções, a multidão insurrecional – autônoma em suas emergências e diferente da forma maquinal – é também feita das produções dessa multidão: é como práxis coletiva que se constitui. Com isso, “um novo sentido de ser é imposto na constituição do Império pelo movimento criador da multidão, ou está continuamente presente nesse processo como paradigma alternativo”.2 A revista Multitudes insere-se na própria carne da multidão anunciando sua forma de agenciamento. Faz parte de um projeto maior, chamado de Coletivo Multitudes que abarca a revista, a página na internet, grupos de discussão via e-mail, uma coleção de livros, encontros e seminários periódicos e outros eventos. Não sabemos, contudo, se é possível que existam métodos na e para a multidão! E a revista certamente “entra” no próprio conceito para instaurá-lo, trabalhando nas suas variações possíveis, nas suas efetuações mundanas. A revista em si é parte dessa multidão que se manifesta autonomamente, organizada por um coletivo de intelectuais e ativistas na maioria franceses, cuja pretensão é mostrar 150

2 Hardt, Michel e Negri, Antonio. Império. Rio de Janeiro: Record, 2001, p. 81. concinnitas


Invenção de multidão

que o saber não está de forma aprofundada apenas na academia, assim como a política excede os espaços institucionais que a ela se dedicam. Esta revista “política, artística e filosófica” propõe experimentar novas condições políticas de agenciamentos teóricos para problemáticas contemporâneas dando voz a diversos autores que debatem inquirindo muitas vezes criticamente a discussão aberta por Negri e Hardt. O editorial da revista apresenta um dos objetivos: “re-interrogar” a produção de uma série de autores da filosofia francesa clássica e contemporânea (entre eles Michel Foucault, Gilles Deleuze, Felix Guattari,...) e também do operaísmo italiano. Preocupa-se em dar espaço a autores contemporâneos e propor diálogo a partir de temáticas específicas da atualidade: aos estudos subalternos, aos estudos sobre minorias, estudos sobre gênero e homossexualidade; explora novas hipóteses sobre as transformações do capitalismo, sobre as subjetividades em movimento e as novas formas possíveis de cidadania (a partir de problemáticas da migração), sobre a ecologia do imaterial ou sobre a cidade e a metrópole como novos territórios produtivos, e também pretende contribuir com a emergência de uma filosofia política da diferença porque se interessa por analisar todas as formas de dominação. Por duas “entradas” possíveis no index de Multitudes pretendo dar continuidade a esta resenha. Uma, o fato de que os editores colocamse na escuta de movimentos sociais (também para aportar “conceitualizações inovadoras”), especialmente aproximando-se dos saberes subalternos e movimentos como o precariado e a intermitência,3 e de seus novos espaços de criação, de liberdade e de transformação. E outra, a indexação especial que dá à produção artística e/ou à discussão sobre estética e política no capítulo Multitudes-Ícones, publicado a cada edição da revista.4 Começamos pelo segundo index. Percebemos a constante da “criação” e da “resistência” como elementos operativos da multidão. Segundo os pensadores contemporâneos a criação – assim como a invenção – não é um privilégio da arte nem dos artistas, mas deve estar também nestes para que se efetuem as políticas da diferença. Uma série de autores 3 Como exemplo, cito os Intermitentes do Espetáculo (Intermittents du spetacle) da França, coletivo de profissionais da cultura cuja característica do trabalho é a alternância entre emprego e desemprego, ou contratação temporária. 4 Organizado por Eric Aillez, Multitudes planeja também uma página na internet especial para a Documenta 12 (exposição que acontece a cada cinco anos em Kassel, na Alemanha), que suportará projetos de artistas criados para a página. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

não cansa em manifestar que não é longe da estética que são praticadas novas políticas (cito Jacques Rancière como exemplo). Não pretendo aqui igualar criação e estética, mas abrir campos de abordagem aos termos sem os prefigurar em campos do conhecimento que os tornariam “próprios”. E é nesse campo de relações possíveis entre termos e suas efetuações que percebo o enlace que Multitudes estabelece com a arte contemporânea. Em todos os números publicados e com nota o no 15, 151


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dedicado especialmente à arte contemporânea, há ensaios de artistas cuja linguagem e possíveis temáticas abordadas possam dialogar com os objetivos da revista e, eventualmente, textos que se referem diretamente aos trabalhos apresentados. Já foram publicados ensaios dos artistas Antonio Muntadas, Jean-Luc Moulène, Alejandra Riera e Fulvia Carnevale, Peter Weibel, grupo Atlas e outros. Em alguns casos são produzidos formatos especiais de impressos e distribuídos com cada edição (como parte do Trabalho em Greve de Riera e Carnevale). Há outros projetos que se adaptam melhor ao formato revista (pelas dimensões e pela forma da impressão). A maioria dos ensaios é de levantamentos fotográficos e de “documentos” a partir de outros registros reais (jornais, bancos de imagens, etc.), trabalhos gráficos, ensaios fotográficos, propostas discursivas, por exemplo. Mesmo que aparentemente a produção de arte contemporânea que estabelece um diálogo com os pensadores sobre a estética-política (ou que lhes interesse) seja apenas aquela que lida com “fatos reais”, no sentido documental que a arte possa provocar, um olhar mais atento vai mostrar que algumas produções colocam em questão a possível positivação da proposta documental como certeza do real. O diálogo entre as produções e os pensadores se estabelece como pensamento crítico da atuação dessas produções em defesa de uma realidade social específica ou da tentativa de serem criadas reproduções destas realidades pelo modo não crítico da etnografia. Em parte precisamos desmitificar, o fato de que há “perdas” possíveis para a arte na relação com esse tipo de trabalho, precisamos enxergar a possibilidade real de grupos de artistas e seus agenciamentos de dialogar com comunidades (já que não há sociedade como um todo) e de criar a partir dessas relações o pensamento sobre a própria representação social, o que toca o imaginário, a sensibilidade, a criação. Esse pensamento em ação será também a ruptura das linguagens no próprio campo circunscrito da arte. O grupo Atlas (do Líbano) publicou na revista no 15 o trabalho “Carnet volume 38: Already been in a Lake of Fire”: uma série de colagens-desenho com recortes de imagens de carros de passeio e descrições sobre local, hora, quantidade de mortos, bomba utilizada e etc. por aqueles “carrosbomba” no Líbano entre 1975 e 1996. Os artistas do grupo apresentam não diretamente, mas através dessa espécie de ficção uma realidade compartilhada e ainda em convulsão. Do texto a seis mãos escrito por Eric Aillez, Brian Holmes e Maurizio Lazzarato, extraímos: “A arte se afirma como uma potência construtivista e uma força de intervenção ativa, repleta de ritmos íntimos. Do saber híbrido e do encontro com os corpos intensivos”.5 152

5 “Construction vitale: quand l’art excede ses gestionnaires”. Em: revista Multitudes. França: Exils e Association Multitudes, no 15, p. 7. concinnitas


Invenção de multidão

O saber híbrido conecta os saberes subalternos. Para os editores da revista Multitudes pode ser aquele saber produzido pela escuta dos movimentos sociais e dos movimentos multitudes (precariado e intermitência, e a própria arte entre outros). Por aqui abrimos, seguindo o caminho contrário, o primeiro index enumerado para discutir a revista: a possibilidade da incorporação do saber híbrido e não privado nem encerrado dentro de instituições que os delimitem em campos de disciplina (a ciência possivelmente); mas dos saberes produzidos autonomamente (e mesmo em caminho de inventariar essa forma), ou seja, incorporação das próprias manifestações do movimento que produz a multidão como saber. Mas se “não há fora”, não há nesse sentido “incorporação”, o que faz de tal saber o elemento criativo próprio da multidão, que não precisa ser legitimado por instituições “reconhecidas socialmente” ou por autores reconhecidos (economicamente!). O saber, como parte do poder dos corpos é inerente ao 6 Negri, Antonio. “O que fazer de “o que fazer?”, hoje – ou seja: o corpo do General Intellect.” In: Cinco lições sobre Império. Rio de Janeiro: DP&A, 2003, p. 209-240. ano 8, volume 1, número 10, julho 2007

ser, é uma forma de General Intellect renovado e subversivo.6 (Podemos pensar nas cartas do comandante Marcos, lançadas aos quatro cantos do mundo, pelo Exército de Libertação Zapatista Nacional como exemplo.) 153


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Percebemos que é necessário inventar, nas dobras e nos devires da criação que este movimento dos movimentos produz, os meios de inscrever o pensamento crítico e as fendas para o sensível na sociedade dissociados de interesses políticos forjados por grupos econômicos (já penetrados nas diferentes esferas da vida ou do lazer, na imprensa ou na habitação). Se o capitalismo é tido hoje por alguns teóricos como “cognitivo”, ou seja, ele se apropria das ferramentas possíveis da difusão dos saberes (torna público, mas não comum, porque reserva a propriedade como um direito consumível), é imprescindível dar lugar à produção artística ‘não própria para consumo’ que poderá ter lugar na produção ou invenção dos meios (na forma da publicação se assim for), e poderá fazer refletir sobre o comportamento cooperativo entre produtores culturais, artistas, seus referenciais e os debatedores dessas mesmas proposições. A cooperação é a natureza operativa da multidão, mas deve ser praticada para que a segunda se efetue. A constituição dos trânsitos subjetivos e do fomento ao tráfico dos saberes não possui métodos, assim como a multidão não dispõe de um. Igualmente é necessário perceber a sutileza das relações propostas entre a estética e a política a cada evento, para que não se tornem enunciados casados repetidamente sem um plano de fundo real. Dessas possíveis lições a partir da leitura de Multitudes, considero, por fim, que as publicações são um meio consistente de multiplicação do conhecimento e de potencialização da prática do saber, pois atravessam o território geográfico distribuindo aos interessados e aos interpelados as informações que contém. A publicação digital da revista na internet é também uma forma de efetuar isso. A circulação de Multitudes possibilita, tal como num tráfico, a transcendência do espaço das cidades contemporâneas que, capitalizadas, separam os corpos em espaços de legitimação vazia, o que me parece que ocorre mesmo que o grupo editorial reserve o aporte teórico como proposição. Sampleiam-se com isso territórios francófonos e tantos outros hibridizados, e deixa-se a apropriação dos saberes para a lógica de cada manifestação. Como publicação multitude a revista parece apostar nos agenciamentos carnavalescos dos corpos para a ressignificação e potencialização dos espaços comuns.

Informações adicionais Multitudes é publicada na França a cada quatro meses. A última edição, n. 28, foi lançada em março de 2007. Os artigos impressos nas revistas são publicados um ano depois na página da internet http://multitudes.samizdat.net/, onde também é disponibilizada uma versão “longa” da revista (há versões traduzidas de alguns artigos, artigos adicionais não impressos, artigos inteiros que foram cortados, entre outros). 154

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