Welcome Tomorrow Mag - Edição #01

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1ª EDIÇÃO | ABRIL DE 2020

LISBOA OLHA PARA FRENTE

Como a capital portuguesa está unindo esforços para transformar a mobilidade e trazer mais qualidade de vida à população. pag. 50




4 - ÍNDICE

SMART

MOBI

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Descubra as ocupações e habilidades requeridas pela Revolução 4.0 e o que os estudiosos pensam sobre o assunto.

Estudo realizado pela Kantar apresenta dados sobre meios de deslocamento com objetivo de orientar cidades, indústrias automotivas e novas tecnologias na definição do cenário da mobilidade de amanhã.

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UM NOVO JEITO DE FAZER E CONSUMIR PRODUTOS

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MERITOCRACIA: ENTRE A COMPETÊNCIA E O PRIVILÉGIO

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MATÉRIA DE CAPA LISBOA OLHA PARA FRENTE

Alternativas à proteína animal são uma realidade; no Brasil, avançam as pesquisas com carnes provenientes de plantas e do desenvolvimento celular.

VOCÊ ESTÁ VIVENDO OU SOBREVIVENDO? No Brasil, 33 milhões de pessoas sofrem com a Síndrome de Burnout; iniciativas em prol da saúde mental nas empresas podem contribuir para diminuir essa estatística.

Como a capital portuguesa está unindo esforços para transformar a mobilidade e trazer mais qualidade de vida à população.

Em um país como o Brasil, com extrema desigualdade social, barreiras ocultas fazem parte do mercado de trabalho.

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O FUTURO DA ALIMENTAÇÃO

NOMADISMO DIGITAL: UM NOVO SIGNIFICADO À VIDA E AO TRABALHO Como é a rotina daqueles que escolheram ter liberdade para trabalhar de onde quiser e viver uma vida multilocal.

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Conheça a economia circular, modelo de negócio que começa a ser encarado como prioridade em empresas do mundo inteiro.

O QUE ESPERAR DA MOBILIDADE?

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OS ROBÔS VÃO ROUBAR SEU EMPREGO?

LIFE

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TEMPO X ENTREGA A dualidade que tem se apresentado como um dos grandes desafios para profissionais que querem atingir resultados e ao mesmo tempo ter uma vida mais equilibrada.

GOVTECHS TRANSFORMAM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

EXPEDIENT E

Inovação e tecnologia são os pilares da revolução digital provocada pela parceria entre governos e startups.

A WTW Mag é uma publicação da Welcome Tomorrow, veiculada por distribuição direta e disponível online na versão digital. Jornalista Responsável: Karina Constancio – karina@wtwconference.com.br Colaboração: Beatriz Pozzobon, Guilherme Popolin e Loraine Santos Publicidade: atendimento@wtwconference.com.br Projeto Gráfico e Diagramação: Rodrigo Saber Bitar


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IMAGINATION TOMORROW

TALK

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VEM AÍ: WELCOME TOMORROW 2020 Mobilidade, tecnologia e futuro estarão em debate, em São Paulo, durante três dias de conteúdo, network e experiências.

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Saiba quando o uso se torna um problema e os cuidados na formação de crianças na era da tecnologia.

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A EDUCAÇÃO DO FUTURO

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O FASCÍNIO DOS BRASILEIROS PELAS REDES SOCIAIS

Por Flavio Tavares, fundador da Welcome Tomorrow.

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Conheça as lacunas do cenário brasileiro e as iniciativas que propõem uma metodologia diferente e inovadora.

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CAOS URBANO: O QUE ESTÁ HAVENDO COM AS GRANDES CIDADES?

CONVERSA COM ROBÔS Na era dos assistentes virtuais, a tecnologia pode transformar relações pessoais e corporativas e já incita debates relacionados a questões de gênero.

O MUNDO EM COMUNIDADE De uma roda de conversa despretensiosa nos intervalos da WTW19, passando por workshops pós-evento e terminando em uma plataforma de IA: a comunidade WTW está crescendo e tem planos inovadores para um futuro próximo.

2020

A MOBILIDADE DO FUTURO Por Johannes Roscheck, CEO e Presidente da Audi do Brasil.


6 - EDITORIAL

O NOSSO COMEÇO >>> Karina Constancio Head de Conteúdo da Welcome Tomorrow

U

ma das coisas mais bonitas da vida são os começos. O primeiro dia de aula na universidade que tanto lutou para entrar, o primeiro encontro quando conhece alguém especial, a primeira vez que consegue fazer algo que estava aprendendo já há um tempo, o primeiro dia em um emprego novo, os primeiros passos de uma criança ou a primeira vez que fazemos qualquer coisa depois que decidimos mudar a rota das nossas vidas. Não é a toa que temos o costume de lembrar e guardar a data desses começos. Os começos são importantes. São eles que abrem as portas para um novo mundo de possibilidades, de oportunidades, mas também de incertezas. Caminhar pelo novo é caminhar pelo desconhecido, depois da primeira vez, do primeiro dia, do primeiro encontro, depois do primeiro passo, a gente nunca sabe muito bem o que vai encontrar. Mas essa é a graça da vida. Uma série de surpresas, escolhas e acontecimentos que vão moldando quem a gente é e a nossa trajetória.

Os começos são as portas para o futuro. Na Welcome Tomorrow, eu venho escrevendo, lendo e pesquisando sobre o futuro já há um bom tempo, tentando trazer reflexões relevantes sobre o que vai ser o amanhã. No meio dessas discussões, uma coisa ficou bem clara: não é a gente que espera o futuro é ele que nos espera. Então, a grande questão é o que vamos fazer, hoje, que vai transformar e surpreender o futuro? O amanhã é consequência do que fazemos agora, no presente. Em tempos tão delicados e imprevisíveis como que estamos vivendo agora, com a pandemia de coronavírus, encarar a realidade dessa forma se torna ainda mais necessário. Precisamos construir, hoje, o futuro que vamos querer encontrar depois que essa crise passar. Porque, acredite, mesmo em acontecimentos como esses, que pegou todo mundo de surpresa, há algo que podemos fazer e que vai ser determinante para o amanhã que vai chegar. Nem os maiores especialistas do mundo conseguem fazer previsões, isso é verdade, mas alguns ca-

minhos estão se apontando. O anywhere office nunca foi tão praticado, a linha divisória entre o profissional e o pessoal agora é quase invisível, a necessidade de ser mais humano nunca esteve tão latente. A proibição de estar fora nos obriga a olhar para dentro. Temas estes que já estamos discutindo desde o início da Welcome Tomorrow e que, agora, mais do que nunca, ganham ainda mais relevância. A primeira edição da WTW Mag é para te ajudar a definir esses novos caminhos. Trouxemos histórias sobre iniciativas, empresas e pessoas que estão se movimentando para construir o futuro e o legado que elas querem deixar para o mundo. Levantamos reflexões sobre os cenários que podemos mudar e análises sobre previsões de futuro que muitas vezes podem nos assustar. Destacamos novos modelos de viver, de pensar, de inovar e de aprender. Este é o nosso começo. Espero que você também comece com a gente e que as próximas páginas te inspirem a percorrer os seus novos começos. Boa leitura!



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IMAGINATION - O FASCÍNIO DOS BRASILEIROS PELAS REDES SOCIAIS

OS ROBÔS VÃO ROUBAR SEU EMPREGO? Descubra as ocupações e habilidades requeridas pela Revolução 4.0 e o que os estudiosos pensam sobre o assunto >>> Beatriz Pozzobon


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Os

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avanços tecnológicos já desenham uma nova configuração para o mundo do trabalho. A diminuição da fronteira entre as tarefas executadas por humanos e máquinas é um dos grandes motores da Quarta Revolução Industrial, o que deve afetar a realidade de milhões de trabalhadores e empresas do mundo todo. Diante disso, especialistas convergem em um ponto: é preciso estar preparado para este novo cenário. Durante o Fórum Econômico Mundial (WEF), evento que acontece em Davos, na Suíça, lideranças econômicas do mundo inteiro organizaram um relatório intitulado “O futuro do trabalho”, para auxiliar empresas, governos e trabalhadores na tomada de decisões. Lançado em 2018, o documento fornece uma visão para os cinco anos seguintes, portanto, até 2022. Segundo o relatório, esta nova configuração do universo do trabalho pode gerar grandes oportunidades inerentes ao progresso econômico e prosperidade individual. Desde que haja proatividade e cooperação entre governos, empresas e trabalhadores. Caso contrário, o futuro reserva um cenário de perdas indesejáveis, com escassez de talentos, desemprego em massa e aumento da desigualdade. Um estudo da consultoria IDados revelou que 58,1% dos empregos brasileiros estão ameaçados pelas novas tecnologias, no prazo de dez a vinte anos. Denominado “Automação e desemprego: o caso brasileiro”, o estudo foi realizado em 2019 pelos pesquisadores Bruno Ottoni, Paulo Rocha

Oliveira, Lucas Estrela e Tiago Barreira. Segundo o economista Bruno Ottoni, pesquisador da consultoria IDados, da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e também professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), a substituição técnica das ocupações afetará 52 milhões de brasileiros; do outro lado da moeda, 22,81% dos postos de trabalho, o que representa 20,5 milhões de pessoas, o risco de substituição é baixo. E, para 19,1% dos trabalhadores a possibilidade é média. Diante desse cenário, o economista defende a necessidade de preparação do trabalhador e fala sobre a responsabilidade de empresas e governos. Segundo ele, é preciso qualificar a mão de obra, além de criar, ampliar e melhorar as instituições formadoras do nosso país. “Esse debate, de que a automação vai roubar os empregos, não é novo. Vem desde os idos da Primeira Revolução Industrial”, pondera o pesquisador. “Muitos empregos serão destruídos, mas eu também acredito que muitos outros serão criados; é o que tem acontecido ao longo da história da humanidade”, completa. De qualquer forma, o pesquisador reafirma que a chegada das novas tecnologias irá produzir efeitos colaterais e é preciso estar preparado para elas. “Se o Brasil não se preparar, não vamos conseguir lidar com as consequências da perda de alguns empregos, o que pode levar ao aumento do desemprego, das subocupações e, com isso, uma piora generalizada da qualidade de vida dos brasileiros.” É por isso que ele defende uma postura mais proativa das empresas e governos, além de pesquisas e estudos sobre o tema. “Quanto mais estudarmos e pensarmos formas de lidar com esse futuro, melhor e mais bem preparados estaremos para evitar uma calamidade”, finaliza.


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IMAGINATION - O FASCÍNIO DOS BRASILEIROS PELAS REDES SOCIAIS

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“AINDA ESTAMOS ENGATINHANDO” Co-fundador da Stilingue, empresa brasileira especializada em Inteligência Artificial, Rodrigo Helcer avalia que o Brasil “ainda está engatinhando” quando o assunto é automação e que há pouco incentivo na área, o que pode se tornar um problema futuramente. “Empresas como a Stilingue, e não estamos sozinhos nessa, têm nadado contra a maré para incluir o Brasil no que é de mais avançado em I.A. Temos contado com recursos próprios e investimentos externos”, destaca Helcer. “Se tivéssemos mais incentivos, todos nós navegaríamos nessa maré muito mais rápido”, acrescenta. Pra fugir dos Estados Unidos e da China, as duas maiores potências de I.A no mundo, Helcer cita o Canadá como exemplo de país que apoia profissionais no campo da tecnologia, com subsídios, facilitação de vistos, programas internacionais, visitas consulares e incentivos à academia e às pesquisas científicas. O empresário diz ainda que se preocupa com a lacuna educacional existente no Brasil. Segundo ele, a área da tecnologia oferece bons empregos, mas falta educação e treinamento para preenchimento das vagas.

“Se tivéssemos mais incentivos, todos nós navegaríamos nessa maré muito mais rápido”

RODRIGO HELCER Co-fundador da Stilingue

SOBRE O PENSAR GLOBAL Em entrevista ao programa Roda Viva, em novembro do ano passado, o professor israelense Yuval Noah Harari, autor de “Sapiens: Uma breve história da humanidade” e “21 lições para o século XXI”, aborda a necessidade de “retreinamento” da mão de obra para a nova organização do trabalho. Harari pontua, entretanto, que os países ricos têm recursos para essa qualificação, o que pode não ocorrer nos países pobres ou em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. “Se não criarmos uma rede de segurança global, veremos que a revolução da automação criará uma riqueza imensa em países como China e Estados Unidos, que lideram essa revolução, e arruinará completamente as economias de países em desenvolvimento, que não podem retreinar sua força trabalho com a rapidez necessária”. É nesse sentido que Harari, um dos escritores mais lidos do mundo, aponta a necessidade de “pensar globalmente”, porque a automação será sentida de forma diferente entre os países. “O colapso dos países mais fracos desestabilizará o mundo todo. No momento em precisamos de uma maior cooperação global, o que estamos vendo são tensões maiores e que alguns dos países mais poderosos do mundo, como os Estados Unidos, ao invés de assumirem responsabilidades, são, exatamente, os que estão desestabilizando o sistema global”, critica.


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Por outro lado, ocupações que não envolvam o uso dessas habilidades são as mais ameaçadas de serem substituídas pelas máquinas e, em alguns casos, esse processo já aparece. É o caso de garçons, atendentes de caixa e cobradores de ônibus. Indo mais além, o desenvolvimento do carro autônomo deve afetar a vida de motoristas de aplicativos, taxistas e caminhoneiros. De qualquer forma, Ottoni faz questão de deixar claro que essa é uma visão que se limita à capacidade técnica da máquina. E para saber se as substituições irão ocorrer de fato é preciso levar em con-

OCUPAÇÕES SEGURAS E AMEAÇADAS O relatório “O futuro do trabalho” indica que as quatro tecnologias que devem dominar os avanços da automação, neste primeiro momento, são internet móvel onipresente de alta velocidade; Inteligência Artificial; big data, ou o grande volume de dados; e computação na nuvem. Dessa forma, o que se espera é que a tecnologia crie tarefas totalmente novas, ao mesmo tempo em que se reduz o número de trabalhadores em outras funções. O documento aponta que, entre as funções emergentes para os próximos anos, estão: analista de dados e cientistas; desenvolvedores de softwares e aplicativos; especialistas em comércio eletrônico e mídias sociais; especialistas em I.A e machine learning; especialistas em big data; analistas de segurança da informação, entre outras. Com relação às funções que serão, ou não, substituídas por robôs, o pesquisador Bruno Ottoni afirma que, pelo menos no período de vinte anos, ocupações que envolvam criatividade e originalidade; habilidades socioemocionais; e habilidades motoras finas estão seguras.

sideração, também, fatores econômicos e políticos, como o preço de implantação da máquina e leis de proteção a determinadas categorias de trabalho, como frentistas, cobradores de ônibus e caixas de supermercado. “Existe uma tentação muito grande por parte dos governos brasileiros de tentar impedir o processo de automação. Na prática, o que isso faz é manter empregos artificiais e, com isso, os produtos ficam mais caros e o país menos competitivo”, pontua Ottoni.

“Em um mundo cada vez mais tecnológico, as habilidades humanas se tornarão ainda mais importantes”

HABILIDADES HUMANAS Para o pesquisador Bruno Ottoni, em um mundo cada vez mais tecnológico, as habilidades humanas se tornarão ainda mais importantes. “Estamos tão preocupados que nossos filhos entendam mais do mundo virtual, que esquecemos da importância das habilidades socioemocionais”, afirma.

BRUNO OTTONI Pesquisador

Ottoni destaca que, neste sentido, é fundamental que as crianças brinquem com outras crianças, saibam se comunicar e lidar com frustrações e conflitos de forma saudável. “As pessoas já estão perdendo essas habilidades, e são justamente as habilidades que as máquinas não conseguem reproduzir, pelo menos, nos próximos anos”.

A MUDANÇA É A ÚNICA CONSTANTE Outra reflexão importante é a do professor Yuval Harari sobre a necessidade de aprendizagem constante. “A única coisa que temos certeza agora é que as pessoas vão precisar continuar aprendendo e se reinventando por toda a vida. Não é mais questão de aprender uma profissão aos 20 anos e trabalhar naquilo pelo resto da vida. Portanto, o mais importante é ensinar às pessoas essa flexibilidade, ensinar que elas devem continuar aprendendo e mudando por toda a vida”, pontua. “Você não deve se concentrar em uma habilidade em particular, como saber programar, ou falar chinês, por exemplo, precisamos ensinar às pessoas a serem mentalmente flexíveis”, completa Harari, considerado um dos maiores pensadores do século XXI.


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LIFE - O FUTURO DA ALIMENTAÇÃO

O FUTURO DA ALIMENTAÇÃO Alternativas à proteína animal são uma realidade; no Brasil, avançam as pesquisas com carnes provenientes de plantas e do desenvolvimento celular >>> Guilherme Popolin


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No

século da quarta revolução industrial, especialistas apontam uma transformação radical no modo como produzimos, trabalhamos e consumimos. A convergência entre tecnologias digitais, físicas e biológicas modifica o mundo como conhecemos, impactando também em nossos hábitos alimentares. Novas tendências de consumo provocam uma revolução na indústria de alimentos, aponta o professor de química e ciência alimentar da Universidade de Barcelona Pere Castells, no livro “La Cocina del Futuro” (A Cozinha do Futuro, em tradução literal). Diferentes combinações de ingredientes e processos, alimentos nutritivos produzidos em impressoras 3D, ampliação do uso de insetos e novas texturas caracterizam os novos tempos na cozinha, adaptando-se às crescentes necessidades alimentares em um mundo com recursos naturais limitados. O Brasil possui um grande potencial para o desenvolvimento de pesquisas na área da engenharia de alimentos e para a criação de novas estruturas sociais e econômicas. O The Good Food Institute Brasil oferece suporte estratégico a cientistas, investidores e empreendedores para ampliação da produção de carne limpa e de alternativas vegetais aos produtos de origem animal. A carne limpa é criada por meio do cultivo da carne fora de um animal, a partir de uma pequena amostra de células, eliminando a necessidade da pecuária industrial e abatedouros. Outra opção é a carne produzida a partir da proteína vegetal. “A opção vegetal já está nos mercados das principais capitais do país”, conta Alexandre Cabral, consultor para políticas públicas do The Good Food Institute, sobre a nova possibilidade que há algum tempo já é uma realidade nos EUA, Europa e Ásia. “Esse produto vem de uma combinação de novos ingredientes e novas técnicas, uma evolução da biotecnologia. São produtos análogos à carne. Não é mais um hambúrguer de soja, é um hambúrguer feito a partir de vegetais com um sabor igual

ao da carne”, explica. A popularização da carne a partir da proteína vegetal significa uma nova oportunidade de negócios não apenas para os produtores, mas também para as redes de restaurantes. É o caso do Burger King Brasil, fast-food que possui em seu cardápio opções como o Veggie Burger e o Rebel Whopper, feito 100% de plantas. De acordo com o Vice-Presidente de Marketing do Burger King Brasil, Ariel Grunkraut, o hambúrguer é grelhado como churrasco assim como em todos os sanduíches da marca. A receita do Rebel Whopper foi desenvolvida pela Marfrig exclusivamente para o Brasil, e o hambúrguer de planta não é o mesmo em todo o mundo, uma vez que “buscamos trabalhar com parceiros locais para poder atender a demanda do consumidor da melhor maneira”, explica Grunkraut. Uma pesquisa do Ibope, encomendada pela Sociedade Vegetariana Brasileira, em 2018, mostra que 30 milhões de brasileiros – 14% da população – são adeptos da dieta vegetariana. Os números mostram que mais da metade dos entrevistados (55%) consumiria mais produtos veganos se eles estivessem melhor indicados na embalagem. Já 60% afirmaram que consumiriam mais produtos veganos caso eles tivessem o mesmo preço dos alimentos que estão acostumados a consumir. “Por sermos uma marca global, conseguimos acompanhar não apenas as tendências no Brasil, mas também de todos os mais de 50 países onde a marca opera, antecipando tendências que ainda não chegaram aqui, porém, com uma grande probabilidade de chegar”, destaca Ariel Grunkraut sobre a importância de ouvir o consumidor. O Vice-Presidente de Marketing do Burger King Brasil acredita na tendência do consumidor em preferir alimentos sem ingredientes artificiais por conta da preocupação com o meio ambiente e da saudabilidade. “Por isso, ainda este ano, iremos remover 100% dos ingredientes artificiais – corante, conservantes, aromas ou aditivos químicos – de nossos sanduíches”, conta.

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ALEXANDRE CABRAL Consultor para políticas públicas do The Good Food Institute

ARIEL GRUNKRAUT Vice-Presidente de Marketing do Burger King Brasil


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LIFE - O FUTURO DA ALIMENTAÇÃO

O FUTURO NO BRASIL

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vermelho da carne. Hoje, além do Futuro Burger, a carne moída e a almôndega estão disponíveis, “tudo sem glúten, sem transgênicos e, claro, sem boi”, garante Leta. Em abril, chega ao mercado a Linguiça do Futuro, com gosto e textura de pernil, com alga marinha usada como revestimento.

Da década de 1960 até hoje, a população mundial passou de 3 bilhões para 7,7 bilhões de habitantes. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), a previsão é chegarmos a 9,7 bilhões em 2050, ou seja, a demanda global por alimentos deve crescer. Ainda segundo a ONU, o consumo de produtos de origem animal tende a aumentar nos próximos anos, agravando os problemas que envolvem a expansão territorial para atividades pecuárias e para a plantação de grãos que alimentam os animais. Só no Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de cabeças de gado (218 milhões) é superior ao número de pessoas (209 milhões). “A agricultura animal continua se expandindo e ignorando o aquecimento global, enormes problemas de desmatamento e até mesmo a vida das pessoas”, explica Marcos Leta, fundador da Fazenda Futuro, primeira foodtech brasileira a criar carne de plantas e atender o consumidor que busca uma alimentação equilibrada, mas sem abdicar do que ama comer. “A Fazenda Futuro não está no mercado vegetariano ou vegano, mas no de carnes. Uma empresa como a nossa chegou para disruptar a maneira como relacionamos sabor e sustentabilidade”, observa Leta. Os ingredientes dos produtos da Fazenda Futuro são processados da mesma maneira que aqueles oriundos da carne animal, procedimento pioneiro no Brasil em escala para distribuição e que conta com o apoio de novas tecnologias – como o maquinário de frigorífico importado da Alemanha. “Por trás do desenvolvimento do produto há todo um cuidado para reproduzir uma versão com valor nutricional muito próximo ao da carne vermelha, com a mesma quantidade de proteína, mas com a diferença de ter uma quantidade mais baixa de gordura”, conta Leta ao lembrar que o Futuro Burger, primeiro produto a ser desenvolvido e lançado em 2019, só foi ficar pronto após dois anos de pesquisa e nove versões. A base de ingredientes é formada pela proteína de ervilha, proteína isolada de soja e de grão de bico, já a beterraba é utilizada para reproduzir o

“A agricultura animal continua se expandindo e ignorando o aquecimento global, enormes problemas de desmatamento e até mesmo a vida das pessoas”

O FUTURO COMO OPORTUNIDADE O que pode parecer uma ameaça ao mercado tradicional da pecuária deve ser visto como uma oportunidade, pontua Alexandre Cabral do The Good Food Institute Brasil, pois “enquanto houver alguém querendo comprar um produto, haverá alguém querendo vender”. Segundo Cabral, o governo brasileiro tem sido um parceiro fundamental para que o debate avance no legislativo, já que do ponto de vista regulatório, o marco legal de produtos à base de planta é defasado. Para a carne limpa - desenvolvida por crescimento celular - o debate deve se estender por mais tempo, visto que nenhum lugar no mundo regulou formalmente o produto. Em diálogo com Cabral, Leta acredita que “precisamos de mais empresas adotando novos modelos de produção. A redução de impostos seria interessante para que possamos igualar o preço de plantas ao preço de carne e, assim, gerar mais experimentação”, finaliza.

MARCOS LETA Fundador da Fazenda Futuro



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TALK - CAOS URBANO: O QUE ESTÁ HAVENDO COM AS GRANDES CIDADES?

CAOS URBANO: O QUE ESTÁ HAVENDO COM AS GRANDES CIDADES?

Os

acontecimentos trágicos causados pela chuva no Brasil têm sido recorrentes no início de todos os anos. Por que isso ainda acontece? Por que não estamos evoluindo em nossa infraestrutura para que notícias como essas não ocorram? Primeiro, vale lembrar que o poder público tem uma parcela significativa de responsabilidade, principalmente, pelo descaso na preparação das grandes cidades para chuvas como as que vimos. Mas são diversos fatores que contribuem para isso, como lixo jogado nas ruas, aumento das vias nas grandes cidades, diminuição de espaços de escoamento de água. E eu ainda tenho uma notícia não muito boa para você. A tendência é só piorar, segundo relatório da ONU, há uma projeção de aumento populacional na ordem de 2,5 bilhões de pessoas nos grandes centros do mundo. Além disso, todos os meses, muitas pessoas saem de cidades pequenas ou da zona rural e se mudam para as capitais do Brasil em busca de oportunidades. Esse tema é tão preocupante que o Pentágono projeta um caos urbano a partir de 2030 e produziu um vídeo para orientar os soldados americanos sobre como lidar com esse cenário. Há alguns anos, quando tinha o período de férias, era possível perceber uma sensível melhora no trânsito de São Paulo, mas, nos últimos dois anos, não dá mais para perceber que tem férias. O trânsito piorou significativamente e não conseguiremos alargar ruas. Para não ser um texto desanimador, vou te dar alguns caminhos que acredito que precisamos rever agora: A primeira é: valorize as pequenas cidades. Há uma grande tendência no mundo de os pequenos centros se potencializarem e gerarem muito valor e riqueza. Se você mora em um, se esforce para criar um ecossistema aí para que não precise ir para uma grande cidade. Agora, se você já mora em um grande centro, chegou a hora de vivermos a teoria que temos tanto falado nos últimos anos. Chegou a hora de rever nossos conceitos, sobre onde moramos, como trabalhamos, sobre o compartilhar de fato, sobre não só como você se move, mas porque você se move. O Waze lançou, já há mais de um ano no Brasil, o Carpool que é a solução para compartilhamento de caronas, e talvez essa seja umas das soluções que mais funcionem para melhorar o caos no trânsito. Veja, é só você oferecer ou pegar carona. O número de pessoas por carro em São Paulo é de 1,4 e estima-se que chegarmos a 1,7 pessoas por carro, teríamos, todos os dias, o trânsito de domingo nos dias de semana em uma cidade como a de SP. Não preciso nem falar sobre o lixo, não é? Chegou a hora de evoluirmos como sociedade e isso só acontecerá com cada um fazendo o seu papel. Fala-se muito sobre a Sociedade 5.0, que nada mais é do que o centro não ser o produto ou a indústria e sim as pessoas, e, para esse movimento acontecer, teremos que parar de achar que a responsabilidade é sempre do outro e começarmos a nos auto responsabilizar para fazermos nossa parte. Posso te garantir uma coisa: pode ser que não consigamos grandes mudanças, mas só de inspirar nossos filhos a fazer o que é certo, já valerá tudo a pena.


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FLAVIO TAVARES Fundador da Welcome Tomorrow


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MOBI- O QUE ESPERAR DA MOBILIDADE?

O QUE ESPERAR DA MOBILIDADE? Estudo realizado pela Kantar apresenta dados sobre meios de deslocamento com objetivo de orientar cidades, indústrias automotivas e novas tecnologias na definição do cenário da mobilidade de amanhã.

Ao >>> Loraine Santos

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contrário do que se imagina, a escolha por qual meio de transporte utilizar para ir de um ponto a outro vai muito além da praticidade e pode sim ser por motivos emocionais como, por exemplo, escolher uma opção que traz alegria para o deslocamento ou que contribui para um estilo de vida diferente. É o que revela a pesquisa Mobility Futures (Futuros da Mobilidade), realizada pela Kantar, empresa com sede no Reino Unido especializada em pesquisas de mercado, insights e consultorias, publicada no final de 2019. O estudo foi realizado nas 31 maiores cidades do mundo e baseado em mais de 20.000 entrevistas com usuários de diferentes meios de transporte e viajantes frequentes. O objetivo foi entender o cenário atual do transporte urbano e identificar oportunidades para o futuro. Considerar um motivo emocional pode parecer uma conclusão curiosa, mas compreensível se levarmos em conta o tempo que as pessoas perdem no trânsito todos os dias. O paulistano, por exemplo, gasta diariamente em média 2 horas e 43 minutos para se deslocar, segundo dados do Ibope Inteligência. “Quando se trata de deslocamento a curtas distâncias, acredito que o fator emocional pode ser um elemento de decisão quanto ao modal de transporte escolhido, como ir a pé ou de bicicleta para se exercitar e para contribuir com o meio ambiente. Mas quando se tratam de médias ou longas distâncias, penso que os fatores que mais impactam na decisão do modal ainda são a segurança, o custo, a praticidade e o menor tempo de deslocamento”, comenta a PhD em gestão urbana, Janaina Lofhagen. Falar sobre a escolha do modal está diretamente ligado à eficiência dos mesmos e, infelizmente, o Brasil não apresenta um cenário positivo. O estudo da Kantar mostrou um ranking de cidades com maior índice de mobilidade urbana, que leva em conta a eficiência dos deslocamentos de acordo com a disponibilidade


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MOBI- O QUE ESPERAR DA MOBILIDADE?

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e acessibilidade dos meios de transportes disponíveis. Enquanto Berlim (Alemanha), Auckland (Nova Zelândia) e Moscou (Rússia) lideram a lista, São Paulo aparece em penúltimo lugar, à frente apenas de Nairóbi, capital do Quênia. De acordo com o estudo, São Paulo é uma das cidades mais congestionadas da América do Sul, com um sistema de transporte superlotado, atrasado e com poucas conexões. Para a PhD, “quando as pessoas são questionadas sobre substituir o uso do carro por um transporte público, a maioria afirma que o faria se houvesse mais segurança, mais informação sobre o tempo de chegada e partida dos ônibus e menores tarifas”. Janaína ainda alerta sobre a necessidade de implantar tecnologias que ofereçam mais informações aos usuários para que eles se sintam mais seguros e satisfeitos na hora de se deslocarem. “Outro papel importante do governo é quanto ao uso de tecnologias de informação e comunicação (TICs) no transporte público, informando em tempo real as condições de trânsito, horário de chegada e partida, tempo de deslocamento, monitoramento da segurança, etc”. A pesquisa Mobility Futures revela ainda que, mesmo nas cidades onde existe a maior concentração de carros, as pessoas demonstraram o interesse em mudar a maneira como se deslocam, 37% dos motoristas deixariam, com prazer, seus carros em casa e 42% das pessoas que usam o transporte público estão ansiosos por um transporte alternativo. “O governo tem vários desafios a serem enfrentados nos próximos anos com o aumento na demanda pelo transporte público, principalmente relacionados à implantação de políticas públicas adequadas e planos eficientes de mobilidade urbana, à diminuição no valor

CARRO EM CASA

37% dos motoristas deixariam, com prazer, seus carros em casa

TRANSPORTE ALTERNATIVO

42%

das pessoas que usam o transporte público estão ansiosos por um transporte alternativo

das passagens e consequente aumento nos subsídios. Vale reforçar que o uso de aplicativos tem estimulado cada vez mais as pessoas a substituírem seus veículos ou transporte público, já que o custo muitas vezes chega a ser menor do que essas duas opções”, explica Janaína. Falando em aplicativos e novas tecnologias, a capital paulista ocupou a oitava posição no ranking de número de apps usados para mobilidade urbana, que engloba serviços de navegação e rotas, compartilhamento de carros e bikes, e provedores de transporte público local. O estudo apontou que cada usuário de São Paulo usa em média 4 aplicativos. “Com o surgimento de aplicativos de mobilidade, fomentou-se um novo nicho que acabou por estimular a substituição do uso de carros próprios, principalmente pelo menor custo e mais praticidade. Se colocarmos na ponta do lápis os custos de ter um automóvel ao longo de um ano (manutenção, impostos, combustível, estacionamento, etc), muitas vezes o uso de aplicativos tem um valor bem mais atrativo”, detalha a especialista em gestão urbana. Menos carros significa mais gente utilizando bicicletas e se deslocando a pé. A pesquisa da Kantar prevê um aumento de 18% no uso de bikes até 2030 e de 15% nas caminhadas. “A implantação de ciclovias em algumas cidades têm estimulado o uso de bikes para curtas e médias distâncias, o que reduz a quantidade de carros nas ruas e a emissão de CO2 na atmosfera”, explica Janaína. E conclui: “Se não for atrativo, as pessoas continuarão utilizando seus carros ou carros de aplicativos, o que não reduzirá o congestionamento ou a poluição”. A pesquisa completa está disponível no site da Kantar.


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IMAGINATION - O FASCÍNIO DOS BRASILEIROS PELAS REDES SOCIAIS

O FASCÍNIO DOS BRASILEIROS PELAS REDES SOCIAIS

Pesquisas apontam que somos o segundo país que mais consome redes sociais no mundo inteiro; saiba quando o uso se torna um problema e os cuidados na formação de crianças na era da tecnologia >>> Beatriz Pozzobon


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“Os brasileiros gostam de conversar, de falar, de se comunicar, e as redes sociais só evidenciam isso”

ANDRÉA JOTTA Psicóloga e pesquisadora

Andréa cita também que muitos planos de smartphones não cobram uso de dados para acessar às redes, com isso, para muitos brasileiros a internet virou sinônimo de redes sociais. A psicóloga lembra ainda da extensão territorial do nosso país e o fato de que muitas pessoas migraram de suas cidades natais – conversar pela internet se torna, então, a forma mais fácil e barata de manter contato e encurtar distâncias. “O brasileiro usa muito a tecnologia também porque, de certa forma, a nossa rotina é pesada. São oito horas de trabalho, mais o tempo de deslocamento, nada disso é agradável”, acrescenta. “A rede social é mais fácil. Utilizamos as redes sociais para fugir do que não é agradável, para viver outras vidas que não a nossa”, completa a psicóloga. E a tendência é que o número de usuários de redes sociais no Brasil siga em crescimento. Em 2019, por exemplo, foram dez milhões de novos usuários, um aumento de 8% em relação ao período anterior, segundo relatório Digital in 2019, do site We Are Social. Outra pesquisa, esta da Cuponation, estima que, até o final de 2023, aumente em até 20% o número de brasileiros usuários de redes sociais – o que totaliza, 114,5 milhões de pessoas conectadas no Brasil. Para a psicóloga, o Brasil não está preparado para o impacto, cada vez maior, das redes sociais nas nossas vidas. “Outros países olham essa questão com mais seriedade. Aqui no Brasil, ao que me parece, vamos continuar seguindo a tendência de esperar o problema acontecer, para depois tomar uma atitude”, critica Andréa, que defende a adoção de políticas públicas para o uso consciente das redes.

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omunicativos, sociáveis e engraçados, os brasileiros se encontraram nas redes sociais. Tanto que somos o segundo país que mais utiliza as redes no mundo inteiro, atrás somente das Filipinas. Foi o que revelou pesquisa recente da GlobalWebIndex, que analisou os 45 maiores mercados do mundo. Em 2019, os brasileiros passaram, em média, 3 horas e 45 minutos do dia navegando nas redes sociais. Os filipinos, que lideram o ranking, chegam a passar mais de quatro horas nas redes por dia. Nos Estados Unidos, a média é de 117 minutos – pouco menos de duas horas – e, no Japão, são apenas 45 minutos. A pesquisa também mostrou que o brasileiro passou mais tempo nas redes sociais de um ano para o outro. Em 2018, gastamos cerca de 3 horas e 39 minutos acessando, principalmente, YouTube, Facebook, WhatsApp, Instagram e Twitter e, portanto, seis minutos a menos que no ano passado. Para a psicóloga Andréa Jotta, pesquisadora do Laboratório de Estudos de Psicologia e Tecnologias da Informação e Comunicação da PUC-SP, o fascínio dos brasileiros pelas redes sociais pode ser explicado por alguns fatores principais. O primeiro deles diz respeito ao fato de que somos, em suma, um povo social. “Os brasileiros gostam de conversar, de falar, de se comunicar, e as redes sociais só evidenciam isso”, pontua a psicóloga. Além disso, segundo ela, a internet brasileira é “muito divertida”. Somos uma fábrica de produzir memes, os vídeos, imagens e textos relacionados ao humor que se espalham rapidamente pela internet.


24 -

IMAGINATION - O FASCÍNIO DOS BRASILEIROS PELAS REDES SOCIAIS

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AFINAL, QUAL O IMPACTO DISSO?

Se o brasileiro gasta cada vez mais tempo nas redes sociais, é claro que essa exposição toda vai afetar a forma como ele interage com o mundo dentro e fora da internet. O publicitário Hugo Rodrigues, CEO da WMcCann e estudioso do consumo e comportamento do consumidor, defende que o virtual e o real são já complementares e que essa interação tem se mostrado “poderosa” para nos dar mais tempo e liberdade. “Hoje, é possível fazer uma videoconferência. Se uma pessoa tem um imprevisto em casa, ela pode fazer home office. Se ela precisa de um ingrediente para a receita do almoço, pode pedir por um app. O real e o virtual estão coexistindo e isso é muito poderoso”, exemplifica. No entanto, o CEO reconhece que as redes sociais podem alterar a nossa percepção da realidade. “A pessoa pode criar uma falsa sensação de ter muitos amigos, quando ela nem conhece algum pessoalmente, ou mesmo não tem certeza se ele existe, pois pode ser fake”, pontua Rodrigues. “O mesmo vale para as fake news. A partir de uma notícia que chegou por um grupo de WhatsApp, as pessoas podem mudar hábitos, opiniões e criar uma realidade paralela, em que aquela informação é a verdade”, acrescenta. Para a psicóloga Andréa Jotta, pesquisadora da PUC-SP, as pessoas precisam usar o bom senso também na internet. “Tecnologia não tem bom senso, bom senso é uma característica humana”, afirma. Segundo ela, a tecnologia passa a fazer mal a partir do momento em que o usuário começa a perder elementos da vida “face a face” em questão de trabalho, produtividade, relacionamentos e segurança. Quando a pessoa deixa de agir com bom senso perante às redes sociais, os primeiros toques costumam vir de quem se tem mais convívio. É o que acontece, por exemplo, quando um amigo solicita que você olhe e converse com ele quando estão juntos, ao invés de deslizar o dedo pela tela do celular. “As pessoas não fazem isso porque são chatas, mas porque estão sentindo a nossa falta”, pontua Andréa. Ela cita também casos de usuários que perdem produtividade no trabalho, deixam de cumprir prazos e solucionar demandas. “Tudo isso é indício que você está fazendo um uso não saudável da tecnologia”, completa.

PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES, O CUIDADO DEVE SER REDOBRADO

HUGO RODRIGUES CEO da WMcCann

“O real e o virtual estão coexistindo e isso é muito poderoso”

O acesso às redes sociais por crianças e adolescentes deve, em um primeiro momento, ser monitorado pelos pais, até que eles se sintam seguros para deixar os filhos utilizarem a internet sozinhos. É o que defende a psicóloga Andréa Jotta, pesquisadora do Laboratório de Estudos de Psicologia e Tecnologias da Informação e Comunicação da PUC-SP. Para Andréa, não existe uma idade específica para que a criança comece a utilizar as redes. A questão precisa ser avaliada com bom senso dentro de cada família, que deve estar atenta à classificação etária de jogos e vídeos no YouTube, e acompanhar o que é acessado pelos filhos. A psicóloga ressalta que crianças e adolescentes são seres em formação, que precisam de repertório de comportamento, amigos, diversão e descanso para que se tornem adultos com maiores probabilidades de resolverem conflitos e serem felizes em seus relacionamentos e na vida profissional. “Quando só se oferece tecnologia para a criança, é muito provável que ela se torne uma pessoa intolerante, porque pode haver uma falha na formação integral deste ser humano”, esclarece Andréa. “É por isso que é tão importante que as crianças saibam que ir ao parque e brincar com outras crianças também é divertido, mas, para que isso aconteça, é preciso que os pais propiciem experiências fora do mundo virtual para seus filhos”, finaliza a psicóloga.


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26 - TOMORROW

- VEM AÍ: WELCOME TOMORROW 2020

VEM AÍ: WELCOME TOMORROW 2020 Mobilidade, tecnologia e futuro estarão em debate, em São Paulo, durante três dias de conteúdo, network e experiências

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Welcome Tomorrow, o maior evento de mobilidade, tecnologia e futuro da América Latina, reuniu mais de 500 executivos de marketing e publicidade, em fevereiro, para o lançamento oficial da sua oitava edição, que será realizada de 12 a 14 de novembro, no São Paulo Expo. Neste ano, a expectativa é reunir mais de 25 mil pessoas e 300 palestrantes em 30 mil metros quadrados de área, conhecida como a Cidade do Futuro, que vai apresentar as principais inovações e experiências proporcionadas pelos mais de 200 patrocinadores que estarão no evento. Durante o lançamento, além de uma agenda de conteúdo que contou com grandes nomes, como Lucas Di Grassi, piloto de Fórmula E; Luis Justo, CEO do Rock In Rio; Hugo Rodrigues, CEO da WMcCann; Thiago Pereira, medalhista olímpico na natação; Eduardo Ribeiro, Presidente da CBMM; Damien Timperio, CEO da GL Events Brasil, Luiza Demoro, diretora da BloombergNEF; Johannes Roscheck, CEO da Audi do Brasil; e Reynaldo Gama, CEO da HSM, os organizadores revelaram algumas novidades em primeira mão. Uma delas é o conceito de plataforma, onde o evento expande suas barreiras físicas e traz uma série de ações e projetos que movimentam o ecossistema o ano todo. O fundador da WTW, Flavio Tavares, aproveitou a ocasião para explicar porque a Welcome Tomorrow é mais do que um evento e apresentou quatro pilares de atuação: conteúdo, educação, conexão e comunidade. Dentro dos projetos de conteúdo estão a produção de vídeos, podcasts, revista digital e impressa, transmissões ao vivo, tudo isso em uma plataforma multimídia que incentiva a interação e formação de comunidades.


300

PALESTRANTES

200

PATROCINADORES E STARTUPS

25.000 PESSOAS NO EVENTO

6

PALCOS SIMULTÂNEOS

Bem-vindo à Cidade do Futuro Em uma cidade cenográfica de 30 mil metros quadrados e dividida em quatro bairros temáticos, os participantes da WTW20 terão a oportunidade de conhecer e experimentar as principais tecnologias que vão transformar a saúde, a educação, a moradia, o trabalho, a mobilidade, a gestão de frotas e as cidades. Conheça as Villages:

LIFE VILLAGE O espaço que coloca em destaque o primeiro e mais antigo meio de transporte que conhecemos: o nosso corpo. Porque mobilidade também é qualidade de vida. Tecnologia que conecta médicos a pacientes sem depender de qualquer tipo de deslocamento. Plataforma que apresenta as academias mais próximas e permite que a prática de exercícios físicos possa fazer parte da rotina das pessoas com mais facilidade. Startups e empresas que querem democratizar o acesso à saúde. O bem-es-

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Na área de educação, a WTW apresenta o primeiro curso de mobilidade corporativa e futuro do trabalho do Brasil, o WTW Mobi. Em conexão, o destaque fica para o Hub, projeto que vai conectar empresas a startups disruptivas e incentivar o potencial de inovação que existe dentro das próprias corporações. Já dentro de comunidade, as novidades ficam entorno do WTW Community, comunidades que estão sendo criadas em diversos pontos do Brasil para potencializar as discussões que envolvem a Welcome Tomorrow, o WTWork, projeto feito em parceria com a Regus para possibilitar a experimentação dos ambientes de trabalho colaborativo para todos que comprarem o ingresso do evento. No lançamento, também foi anunciada a parceria com o Zero Summit, o primeiro evento da América Latina focado exclusivamente em tecnologias e ideias para um futuro com zero carbono. A primeira edição do Summit, idealizado pelo piloto Lucas Di Grassi e por Rodrigo Pedroso, CEO do Grupo Pacto Energia, será realizada dentro da Welcome Tomorrow 2020. Os novos projetos têm o intuito de expandir as discussões acerca da mobilidade do futuro, o que, para a WTW, está muito mais ligada ao conceito de tempo e de vida do que ao como você se desloca do ponto A ao ponto B. Para mais informações, basta baixar o aplicativo WTW, disponível nas plataformas Apple Store e Google Play, e seguir o evento no Instagram (@wtwconf).

12-----14 // NOV // SÃO PAULO EXPO

1ª EDIÇÃO | ABRIL DE 2020 - 27


28 - TOMORROW

- VEM AÍ: WELCOME TOMORROW 2020

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tar emocional em meio à avalanche de informações e transformações. A Village que vai reunir: Academias; Hospitais; Planos de Saúde; Laboratórios; Tecnologias para a saúde; HealthTechs; Fitness e bem-estar; Indústria farmacêutica; Mindfullness; Foodtechs; Wellness; Indústria de alimentos; Beleza e higiene; Telemedicina.

SMART CITY VILLAGE O movimento das cidades para se tornarem cada vez mais inteligentes, conectadas e integradas. As tecnologias que têm revolucionado a moradia e o trabalho nos centros urbanos. Como empresas, startups e poder público podem trabalhar juntos para construir as cidades do futuro. A sustentabilidade e a importância de transformar empresas e espaços urbanos em locais mais humanos, inovadores, digitais e inclusivos. Um espaço para discutir a vida urbana e o trabalho no futuro. A Village que vai reunir: Governos; Instituições públicas; GovTechs; Construtoras; Escritórios de arquitetura; Coworkings; Imobiliárias digitais; Hotéis; Plataforma de segurança pública; Empresas de sustentabilidade; Fintechs; Tecnologia de trabalho remoto; Plataformas de moradia on-demand; ConstruTechs; Ferramentas para gestão de pessoas; Inovação para o RH; Projetos de economia criativa.

MOBILITY VILLAGE A mobilidade em sua raiz. Os modais, a gestão de frotas e os meios inovadores para os deslocamentos nas cidades. Como a tecnologia vai impactar o movimento das corporações e nas vias urbanas? A crescente automatização, a inteligência artificial, o compartilhamento, a eletrificação, a ausência do motorista. O mundo multimodal das bikes, dos patinetes, do automóvel, do metrô, do ônibus, da aviação, do drone e até do carro voador. O que é real e o que é ficção científica? A tecnologia que coloca todas as opções de mobilidade à distância de poucos cliques e inaugura uma nova era para a gestão de frotas. A Village que vai reunir: Montadoras; Seguradoras; Locadoras; Empresas de carsharing e bikesharing; Aplicativos de mobilidade; Empresas de micromobilidade; AutoTechs; Empresas de transporte público; Plataformas de gestão de frotas; Fornecedores do setor automotivo; Telemetria; Apps de delivery; Drones; Empresas de energia; Aviação; Mobilidade sobre trilhos; Ridesharing.


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IMAGINATION VILLAGE A nossa mente é o modal capaz de nos levar para qualquer lugar, sem limite de tempo ou de espaço. O único meio que consegue nos deslocar até o amanhã em questão de segundos. Para realizar, primeiro é preciso imaginar. Como a nossa criatividade pode nos transportar para outra realidade e motivar transformações. O mundo do entretenimento, da educação, da realidade virtual, da inteligência artificial, dos games e dos sonhos. Um espaço lúdico e cheio de propósito para reunir cases transformadores e de impacto social. Congestionamento? Só se for de ideias e de conhecimento. A Village que vai reunir: Universidades; Instituições de Ensino; EdTechs; Escolas Criativas; Projetos de impacto social; Empresas de entretenimento; Plataformas de educação à distância; Tecnologias aplicadas ao ensino; Games e e-Sports; Realidade virtual; Projetos culturais; Soluções de Inteligência artificial; Agências; Empresas de comunicação.

COMO COMPRAR O INGRESSO Para adquirir seu ingresso para a Welcome Tomorrow 2020, basta acessar o site welcometomorrow.com. br, escolher a categoria que mais se encaixa no seu objetivo dentro do evento e efetuar a compra. Os ingressos vão de R$ 50,00 a R$ 2.900,00.


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MOBI- NOMADISMO DIGITAL: UM NOVO SIGNIFICADO À VIDA E AO TRABALHO

NOMADISMO DIGITAL: UM NOVO SIGNIFICADO À VIDA E AO TRABALHO Como é a rotina daqueles que escolheram ter liberdade para trabalhar de onde quiser e viver uma vida multilocal >>> Loraine Santos

O

que é mais importante para você: trabalhar bastante enquanto ainda é jovem para ter uma velhice confortável? Ou trabalhar o mínimo possível para usufruir dos benefícios o quanto antes? O educador Sidnei Oliveira, autor de vários best-sellers da série Geração Y e Z, apresenta um estudo interessante sobre esse paradoxo, em que chamou de “curva de aproveitamento” o momento em que o ser humano passa a investir seu tempo e seu dinheiro em realizações pessoais, e acumular riquezas subjetivas. Em seu curso “Mentoria e conflito de gerações”, ele explica que, em razão de uma expectativa de vida mais alta e da ânsia por adquirir cada vez mais bens materiais e intelectuais, o adulto dos anos 2000 empurrou sua curva de aproveitamento para depois dos 50, idade que ele começa a querer migrar seus pensamentos e investimentos às coisas que lhe darão, finalmente, sentimentos de prazer e satisfação. O grande conflito das curvas propostas por Sidnei Oliveira acontece na famosa Geração Z (formada por pessoas nascidas de 1990 até 2010), quando a curva do aproveitamento é empurrada para casa dos 22 ou 23 anos. “Os adultos de hoje têm um forte sentimento de oferecer com exclusividade aos seus filhos tudo aquilo que eles próprios tiveram que dividir durante a infância”, explica Oliveira. Essa espécie de conforto resultou em jovens com uma alta tendência em priorizar o aproveitamento à vida em detrimento à preocupação com as consequências dessa forma de viver. O mentor ainda reforça: “os jovens estão vivendo uma fantasia achando que primeiro eles precisam aproveitar, para só depois pagar a conta. E isso não existe, alguém está pagando a conta por ele, e isso é muito confortável”.

RAFAEL E LÍDIA Autores do blog Mala Viajante

RENATO RIBEIRO Nômade Digital


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OS NÔMADES DIGITAIS

Quem concorda é o casal Rafael e Lídia, autores do blog Mala Viajante, que compartilha informações importantes e detalhadas sobre várias cidades ao redor do mundo. Eles bateram o recorde como o primeiro casal na história do planeta a conhecer mais de 200 países e todos os continentes, incluindo Antártida, antes dos 30 anos de idade. “Identificamos que era possível produzir conteúdos de qualidade para que pessoas pudessem ser transformadas”, explica o casal. A renda vem por meio das mídias sociais e suas inúmeras possibilidades de monetização, como parcerias e patrocínios no Instagram, programa de afiliados do Blog, além de palestras e projetos específicos para empresas. “O ideal é se ter várias fontes de renda, pois em momentos como este que estamos vivendo com COVID-19 temos de onde puxar”, alertam.

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Diante desse cenário, surge um novo perfil de pessoas que, embora seja mais incomum entre os mais velhos, não é estabelecido por gerações e sim por um estilo de vida. Ainda sem definição no dicionário, mas bastante conhecido no ambiente corporativo, o nomadismo digital consiste em uma condição de trabalho que possibilita o indivíduo aproveitar a tecnologia para realizar as tarefas de sua profissão de maneira remota. Os nômades digitais são, ainda, profissionais que encontraram um equilíbrio entre trabalhar bastante enquanto aproveitam os benefícios de uma rotina sem amarras. Não há um registro oficial de quando o termo surgiu, mas ele ganhou popularidade depois da publicação do livro Digital Nomad, de Tsugio Makimoto e David Manners. É um modelo de trabalho disruptivo quando comparado ao tradicional, em que é preciso bater o famoso ponto, lidar com

reuniões diárias e ter horário fixo para chegar, almoçar e ir embora. “Eu acho que esse modelo tradicional está totalmente fadado ao fracasso. Grande parte das pessoas não suporta esse modelo de horários para entrar e sair, chefe chato e colegas que fazem picuinhas e joguinhos por orgulho e vaidade. No entanto, entendo que faço parte de uma minoria privilegiada. Esse modelo tradicional continuará existindo no curto e no médio prazo. Até porque muitas áreas precisam dessa rigidez. Além disso, a maioria das pessoas ainda não está preparada para um modelo de trabalho com liberdade e flexibilidade de horário. Não é algo simples ou fácil. No nomadismo há liberdade sim, mas ela vem com muita responsabilidade”, enfatiza o nômade digital Renato Ribeiro, especialista em marketing de conteúdo que atende marcas como Sebrae, Rock Content e BeerOrCoffee.


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MOBI- NOMADISMO DIGITAL: UM NOVO SIGNIFICADO À VIDA E AO TRABALHO

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Não é só sobre viajar…

É importante destacar que a nomenclatura ‘Nômade Digital’ não se refere a ‘mochileiros’ ou pessoas que vivem de empregos tradicionais no exterior, mas sim, àqueles que utilizam a internet como plataforma fundamental de suas atividades de trabalho e base de gerenciamento de seus negócios. Para Rafael e Lídia, o nomadismo exige alguns cuidados. “O segredo é ter rotina, acordar cedo, saber o horário de produzir conteúdo e o horário de aproveitar, se você não delimita isso bem acaba se perdendo muito nos afazeres e entregas”. Trabalhar viajando - ou viajar trabalhando - transformou a vida do casal, que já faz planos para um futuro breve. “O melhor é saber que o mundo tem distâncias mais curtas do que podíamos imaginar e é muito maior e glorioso do que podíamos sonhar. E a viagem ainda não acabou. Queremos bater o recorde mundial com 210 países, 193 da ONU e 17 não reconhecidos, e visitar a estratosfera”, concluem.

...e, às vezes, nem é sobre viajar. Embora a história de Rafael e Lídia seja um exemplo sólido de nomadismo digital, nem sempre é uma condição de trabalho que está associado às viagens. “O nômade digital é aquele profissional que está em busca de abraçar seus sonhos e levar uma vida na qual consiga fazer com que a vida pessoal e profissional coexistam de maneira pacífica. Mais que viajar e rentabilizar, o nômade digital é um estilo de vida. É um profissional que quer se jogar, quer se conhecer, quer fazer a diferença e deixar um legado no mundo”, explica Renato Ribeiro. A história do especialista como nômade digital começou sem planejar e hoje ele é um exemplo de como é possível aliar um trabalho CLT com o desejo de ser autor da própria rotina. “Há três anos atrás, morando em BH, estava com depressão e resolvi comprar uma passagem apenas de ida para Maceió. Com alguns meses, o dinheiro foi acabando e aí eu comecei a fazer trabalhos freelancers a distância. Quando dei por mim, estava inserido no universo do nomadismo digital. Hoje, embora eu esteja como CLT, continuo como nômade, pois a empresa que trabalho é remota e eu posso estar em qualquer lugar. Basta meu computador e uma boa internet”, conta ele. Trabalhar sem horário pré-estabelecido por um terceiro requer muita disciplina e dedicação. Porém, de acordo com uma pesquisa do Instituto PARAR com a Mindminers, publicada em 2018, 44% dos entrevistados afirmaram que topariam ganhar 20% menos se pudessem gerenciar o próprio tempo. Esse desejo latente tem feito com que as empresas sejam mais flexíveis com horários e adeptas às práticas de trabalho a distância. “Vemos cada vez mais empresas se abrindo para o home office e o trabalho remoto. Inclusive alguns órgãos públicos, que são tão tradicionais e burocráticos, estão implementando algumas políticas de trabalho à distância. Afinal, são muitas vantagens de colocar isso na prática”, comenta Ribeiro.

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DICAS BÁSICAS E PRÁTICAS PARA QUEM QUER TRILHAR UM CAMINHO DE NÔMADE DIGITAL >>> Renato Ribeiro

#partiu? Entre as características pessoais e as ferramentas básicas para se tornar um nômade digital, Ribeiro afirma que não há uma receita de bolo. “No entanto, há uns pré-requisitos básicos, claro. Como o nômade vai trabalhar na internet, ele precisa de montar um negócio online. Portanto, precisa de ter uma habilidade e fazer com que essa habilidade se torne um produto. Eu, por exemplo, sou um profissional de marketing de conteúdo. Então, posso vender cursos online e livros, por exemplo, ensinando as pessoas a como trabalhar o marketing de conteúdo para suas carreiras e suas empresas. Em relação a ferramentas, o nômade precisa ter os equipamentos necessários (como celular e computador) e uma internet boa. Além disso, precisa de algumas ferramentas particulares desse universo para se comunicar com seu público. Como um App para chamadas de vídeos, uma rede social, um blog, um e-mail, uma newsletter etc”. Outro ponto importante é a dedicação. O universo digital é dinâmico e as novas tecnologias estão em constante mutação. Portanto, é preciso estar aberto para as novidades e disposto a estudá-las. “Não existe atalho, tampouco fórmula mágica. É, basicamente, o velho CHA: absorver conhecimentos, desenvolver novas e aperfeiçoar antigas habilidades e ter atitudes, isto é, colocar a mão na massa”, conclui o especialista.

1) Busque conhecimento do universo e se aproxime de pessoas que já são nômades. Profissionais da área têm muito conteúdo gratuito sobre o tema. Além disso, os nômades geralmente são muito abertos a trocar ideias e ajudar as pessoas. 2) Tenha uma reserva financeira para viver por no mínimo 6 meses. Porque aí, se der alguma coisa errada, você tem um tempo para segurar as pontas. 3) Comece. A forma mais fácil é por meio de serviços freelancers. E isso dá pra conciliar com um emprego tradicional tranquilamente. Aos poucos você vai montando uma carteira de clientes, vai ganhando experiência e logo poderá assumir a condição de nômade digital. Mas não espere estar 100% preparado. Isso nunca vai acontecer. Medos e dúvidas sempre existirão.



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TALK - A MOBILIDADE DO FUTURO

A MOBILIDADE DO FUTURO JOHANNES ROSCHECK CEO e Presidente da Audi do Brasil

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ma coisa é certa: a indústria automobilística passa por uma transformação tão grande que, depois dela, nada será como antes. É até difícil prever como será esse futuro da mobilidade no longo prazo, mas no curto prazo, os próximos passos estão bem visíveis. O principal desses passos já está entre nós e responde pelo nome de sustentabilidade. Já há alguns anos o aquecimento global é pauta no mundo todo e alguns eventos tiveram destaque na linha do tempo desse debate, como a Eco-92, realizada no Rio de Janeiro. Mas foi após o Acordo de Paris de 2015 que o assunto ganhou ainda mais força. Depois dele, medidas mais concretas começaram a ser tomadas pelos governos, com alguns, inclusive, iniciando discussões sobre o fim da produção e comercialização de automóveis movidos a combustíveis fósseis. Para chegar lá, haverá uma transição com a melhoria da eficiência energética dos veículos e a redução das emissões locais nas grandes cidades, que passa necessariamente pela eletrificação dos veículos. Esse é um dos passos mais claros dentro

das revoluções automotivas: o futuro do automóvel será elétrico, resta saber como a energia será levada ao motor. Pode ser por meio de baterias carregadas pela rede elétrica, célula de combustível alimentada por hidrogênio ou etanol ou mesmo outra solução que ainda não foi descoberta. Mas hoje em dia não basta um fabricante de automóveis apenas produzir um carro elétrico se não olhar para todos os elos que participam do setor, desde a produção até a comercialização da energia elétrica. Mais do que isso: é preciso olhar para seus próprios valores e atitudes internas. Isso ocorre porque a sociedade, hoje, questiona cada vez mais não apenas o produto final, mas o propósito da marca. Dentro desse contexto eu acredito mui-

to e cito alguns exemplos de ações da Audi no Brasil. Um deles é a instalação de 264 painéis fotovoltaicos para gerar energia 100% limpa para o nosso Centro Técnico, local que concentra todas as atividades de engenharia, treinamento e atendimento técnico para a América Latina. Outro exemplo é a chegada do personagem principal dessa história da sustentabilidade no País: o e-tron, primeiro SUV totalmente elétrico da marca, que desembarca por aqui em abril. O objetivo por trás dessas ações é o compromisso global da Audi de se tornar uma empresa 100% neutra em carbono até 2050. Lá fora existem mais exemplos interessantes. A fábrica da Audi em Bruxelas, na Bélgica, local que produz o e-tron, já neutraliza toda sua emissão de carbono. Ou-

Audi e-tron, primeiro SUV 100% elétrico da marca que será lançado em abril de 2020 no Brasil.


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tra planta, localizada em Gyor, na Hungria, deve inaugurar ainda este ano o maior sistema de painel solar da Europa instalado em uma cobertura, capaz de gerar anualmente 9,5 gWh. E o mais recente lançamento internacional da Audi, a próxima geração do A3 Sportback, agora utiliza plástico reciclado de garrafas PET no revestimento dos bancos. Há muito ainda a ser feito, mas iniciativas nesse sentido são muito mais frequentes. Outro desses próximos passos no curto prazo envolve a oferta cada vez maior de soluções de mobilidade. Mas o que é mobilidade? É o ato de se deslocar de um lugar ao outro. E se há alguns anos as opções se resumiam a ônibus, metrô, carro, moto e bicicleta (mas sem ciclovias), hoje existem os aplicativos de transporte, patinetes, bicicletas e mesmo carros compartilhados, em que você paga pela utilização. Só que não existe apenas uma solução ideal que atenda a todas as pessoas. Por essa razão, a mobilidade é individual, ou seja, cada indivíduo decide qual a melhor opção de transporte ou qual conjunto de opções melhor se encaixa no seu dia a dia. E como a indústria automobilística se encaixa nesse panorama da mobilidade? Sabendo que o carro continuará sendo uma das opções de mobilidade, ele precisa

evoluir para se adequar às demandas, por exemplo, de conectividade. A vida hoje é conectada e as tecnologias à bordo de um veículo devem integrar entretenimento, música, navegação, comandos de voz, sempre com o conforto e segurança necessários. Nessas cidades do futuro o carro elétrico terá um grande papel, pois ele entrega sustentabilidade e silêncio, ao mesmo tempo que é conectado, seguro e extremamente divertido de dirigir. Em um momento um pouco mais adiante, teremos os veículos autônomos também. O desenvolvimento dessa tecnologia continua acelerado, mas não só o veículo como também as regulamentações precisam evoluir para que esteja presente no nosso cotidiano. Parte do caminho tem evoluído bem: a Audi já possui em algumas cidades, como

Carregadores de veículos elétricos: Audi investirá R$10 milhões para instalar 200 estações em todo o país.

em Dusseldorf, na Alemanha, uma tecnologia que conversa com os semáforos e avisa ao motorista quando deve reduzir ou acelerar para pegar o sinal aberto, o que contribui para o meio ambiente e também para uma maior fluidez do trânsito. Por aqui, anunciamos dois projetos de infraestrutura de recarga. Um é o investimento de R$ 10 milhões para instalar 200 pontos de carregamento da Audi em todo o País. Outro é um projeto conjunto entre Audi, Porsche, Volkswagen e EDP para a instalação de 30 estações de recarga ultrarrápida em rodovias – nelas, é possível recarregar até 80% da bateria do e-tron em apenas 30 minutos. O Brasil tem tudo para ser protagonista desse futuro. Hoje já é referência por utilizar biocombustíveis, como o etanol. Quando os elétricos chegarem de vez, teremos uma ótima oportunidade de manter esse papel por termos uma matriz energética bastante limpa. Temos profissionais extremamente criativos, capazes de criar tecnologias e soluções inovadoras. Resta colocar todo esse potencial em prática agora para usufruir lá na frente.

>>> Johannes Roscheck CEO e Presidente da Audi do Brasil


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SMART - UM NOVO JEITO DE FAZER E CONSUMIR PRODUTOS

UM NOVO JEITO DE FAZER E CONSUMIR PRODUTOS Conheรงa a economia circular, modelo de negรณcio que comeรงa a ser encarado como prioridade em empresas do mundo inteiro >>> Beatriz Pozzobon


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os americanos chamam de ‘product as a service’”. Ainda segundo o CEO, uma furadeira vai ser utilizada, em média, somente três minutos em toda sua vida em nossas residências. Isso para ilustrar que, talvez não haja necessidade de ter a posse de uma furadeira, a necessidade real é ter um furo na parede. Ou seja, troca-se a venda do produto pelo fornecimento do serviço, passando a se produzir produtos cada vez mais duráveis.

GUILHERME BRAMMER Fundador e CEO da Boomera

EMPRESAS BRASILEIRAS Um levantamento da CNI, realizado no ano passado, revelou que 76% das empresas brasileiras desenvolvem alguma iniciativa de economia circular. Porém, a maior parte (70%) não sabe que as práticas se enquadram nesse conceito e diz nunca ter ouvido falar dele antes da pesquisa. O gerente executivo de meio ambiente e sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo, aponta que muitos empresários ainda entendem a economia circular como reciclagem. “A economia circular vai muito além da reciclagem, é repensar todo um modelo de negócio, desde a concepção do produto, e que o resíduo seja encarado como insumo”, explica Bomtempo. Fundada em 2011, a Boomera tem, atualmente, 400 clientes ativos. Entre eles, nomes de peso como O Boticário, Nestlé, Unilever, BRF, Tang, Natura e Adidas. A Boomera criou e trabalha com uma metodologia chamada de “CircularPack”, seis passos que auxiliam as empresas a implementarem a economia circular. Entre as vantagens da implementação deste modelo econômico está a redução de custos, através do melhor uso dos recursos natu-

rais, otimização na fabricação de produtos e redução das perdas produtivas. Além disso, pode-se criar novas fontes de receita, por exemplo, com estímulo à inserção de matéria-prima secundária nos processos produtivos e fomento ao mercado de troca de resíduos. Para o CEO da Boomera, Gui Brammer, a economia circular favorece ainda a imagem das empresas. “Pesquisas recentes** mostram que o consumidor está muito mais antenado com a questão da sustentabilidade. As pessoas já sabem que o problema existe e que nós somos os responsáveis, e querem ver quais as empresas terão protagonismo nisso”, destaca. “Os maiores fundos de investimento do mundo já declararam que só investem, daqui para frente, em empresas com impacto social e ambiental pequenos. Assim, a empresa que adotar a economia circular como estratégia protagonista terá mais chances de acesso à capital, clientes e novas tecnologias do que aquelas que queiram continuar na velha economia”, acrescenta Brammer.

Davi Bomtempo Gerente executivo de meio ambiente e sustentabilidade da CNI

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Na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.” A célebre frase do químico francês Antoine Lavoisier, de 1777, ilustra um conceito que repensa o atual modelo de desenvolvimento. Economia circular é uma nova maneira de encarar a origem e o destino do que é produzido, e também do que é descartado. Um modelo de negócio que veio para ficar e começa a ser encarado como prioridade em empresas do mundo inteiro. No Brasil, a Confederação Nacional das Indústrias (CNI) coordena a Comissão de Estudo Especial de Economia Circular da ABNT*. O objetivo é definir os posicionamentos do nosso país na elaboração de uma norma internacional que vai regulamentar a questão em todo o mundo. “A nossa estimativa é que a norma seja publicada até 2023, para que haja amplo entendimento do que é, de fato, economia circular e quais os caminhos as empresas devem seguir para fazer a transição do modelo de economia linear para o modelo circular”, afirma Davi Bomtempo, gerente executivo de meio ambiente e sustentabilidade da CNI. O modelo de economia circular surge, exatamente, como um contraponto ao modelo linear, de extração de matéria-prima, transformação, uso e descarte de resíduos. De acordo com Gui Brammer, fundador e CEO da Boomera, empresa brasileira focada em implementar a economia circular dentro de outras empresas, na economia linear, o produto é pensando para uma única vida, cada vez mais curta. É a chamada obsolescência programada, quando a indústria diminui a vida útil do produto, justamente, para ele durar menos e ela vender mais. Por outro lado, a economia circular estende a vida útil dos produtos, aposta em novas formas de consumo e amplia a reciclagem. O que, hoje, é considerado resíduo passa a ser recurso. Brammer destaca que a economia circular veio, também, para nos questionarmos sobre a tarefa que aquele produto deve cumprir na sociedade. “Será que é possível que esse produto se transforme em um serviço? O Uber, por exemplo, transformou o carro em serviço. É uma tendência mundial que


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SMART - UM NOVO JEITO DE FAZER E CONSUMIR PRODUTOS

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DESAFIOS

Segundo Bomtempo, como se trata de uma agenda global, as empresas brasileiras compreenderam que a economia circular veio para ficar e já estão implementando os princípios desse novo modelo de negócio, além de outros conceitos ligados à sustentabilidade, que irão refletir no sucesso dentro e fora do país. No entanto, para o gerente executivo de meio ambiente e sustentabilidade da CNI, faltam, ainda, incentivos econômicos para que essa agenda seja desenvolvida com mais rapidez no Brasil.

Ele afirma que a transição para a economia circular demanda melhorias na infraestrutura nacional e em políticas públicas, além de adequar o sistema tributário brasileiro para estimular o melhor uso dos recursos naturais. Hoje, por exemplo, muitas vezes, paga-se mais caro para consumir um produto reciclável ou desenvolvido a partir de princípios ambientalmente corretos. Por fim, Bomtempo fala também sobre a importância de uma educação de melhor qualidade, tanto para conscientizar o público consumidor, como para formar profissionais capacitados.

*Associação Brasileira de Normas Técnicas ** Pesquisa da CNI revelou que 38% dos entrevistados sempre verificam ou verificam às vezes se os produtos foram produzidos de forma ambientalmente correta. Além disso, conforme o levantamento, o número de pessoas que separa o lixo para a reciclagem cresceu de 47%, em 2013, para 55%, em 2019.



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IMAGINATION - A EDUCAÇÃO DO FUTURO

A EDUCAÇÃO DO FUTURO Conheça as lacunas do cenário brasileiro e as iniciativas que propõem uma metodologia diferente e inovadora >>> Loraine Santos

or um lado, carteiras enfileiradas, professores ditando conteúdos programados nas apostilas e alunos focados em marcar a resposta correta na prova, independente de qual seja a pergunta. Do outro lado, ambientes menos formais, professores estimulando conteúdos interativos e alunos aprendendo lidar com o erro como parte do processo de aprendizagem. Dois mundos antagônicos mas que coexistem no universo atual da educação. É inquestionável o papel do MEC (Ministério da Educação) na regulamentação do ensino em um país com mais de 184,1 mil escolas, de acordo com dados atualizados


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Desenvolver habilidades sociais e emocionais na escola, além das matérias tradicionais, torna-se fundamental na busca pela nova educação. “Já está provado pela neurociência que tomamos decisões com base nas nossas emoções, elas se aplicam também e completamente ao aprendizado. E o aprendizado precisa servir também à tomada de decisões, ao desenvolvimento da confiança criativa, da empatia, da resiliência e da colaboração. O mundo está mais complexo e precisamos de novas habilidades, competências e atitudes para lidar e atuar nesse novo mundo”, comenta a mestre em educação.

escolher o seu caminho ao mesmo tempo que é guiado durante o processo, a interação, trocas e estímulo a colaboração entre os colegas, uma abertura maior às possibilidades de aulas ao ar livre e ambientes mais alegres, leves e livres, aulas interativas mescladas com tecnologia e natureza, apoio e incentivo ao erro como parte do processo, compartilhamento celebração dos aprendizados pelos alunos”.

O PAPEL DO PROFESSOR Caroline Bucker Mestre em educação e fundadora da Idealiza

É SOBRE APRENDER, MAS TAMBÉM É SOBRE SENTIR Para Caroline Bucker, o primeiro passo para se abrir ao novo é reconhecer que o desafio existe e buscar soluções de forma criativa e colaborativa que aceleram o processo de transição. “O papel do professor na nova educação é de ser um líder inspirador que estimule os alunos a serem curiosos, a pesquisarem e construírem soluções e que faça com que os alunos se conectem emocionalmente com o aprendizado. Só através daquilo que faz sentido para nós, nos engajamos para aprender algo, seja o que for. A emoção precisa estar presente no papel do novo professor que quiser atuar na nova educação”, explica.

O FUTURO É HÍBRIDO

“Precisamos de novas habilidades, competências e atitudes para lidar e atuar nesse novo mundo”

Não tem como falar sobre inovação sem entender o papel da tecnologia na aprendizagem. Tudo indica que, no futuro breve, as escolas terão formatos híbridos: vão usar plataformas online e ter espaços para as interações sociais. Nesse cenário, acredita-se que o professor será um tutor, deixará de ser a fonte do conteúdo para ajudar o aluno a alcançar o conhecimento sozinho. “A evolução tecnológica acontece de forma muito rápida e as ferramentas como celulares, computadores e programas online se atualizam a todo momento. Os jovens se identificam instantaneamente com esses novos recursos, não tem como fugir. Se o professor não busca acompanhar essa evolução tecnológica, vai ficar para trás”, opina Luciana. Carolina concorda e completa “a tecnologia traz a necessidade do professor interagir em ambientes ainda desconhecidos e até desconfortáveis para ele. Precisamos reconhecer que o desafio existe, aceitá-lo e a partir disso construir soluções de forma criativa e colaborativa para acelerarmos o processo de inovação e de transição”.

EDUCAÇÃO FOCADA NO MERCADO DE TRABALHO Outra metodologia questionada por muitos refere-se às salas de aulas de ensino superior e pós-graduação. Muito teórico e pouco prático, os cursos precisam se reinventar para atrair a atenção de quem busca aprender e se especializar. A escola de negócios Conquer nasceu em 2016 a partir de uma insatisfação com o ensino tradicional que, segundo

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do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Porém, há um movimento entre alunos e educadores que visa abandonar velhas práticas e propor uma metodologia diferente e inovadora. “Em alguns casos, os métodos tradicionais se mantêm eficientes, mas somente quando está fortemente conectado à cultura que o cerca. Nos demais casos, têm se mostrado ineficiente e incapaz de gerar engajamento ou estimular a motivação para o aprendizado”, explica Caroline Bucker, mestre em educação e fundadora da Idealiza, empresa que utiliza metodologias criativas para criar projetos para diversos segmentos. O desejo por mudança parte também dos alunos. Uma pesquisa recente promovida pelo Porvir, em parceria com a Rede Conhecimento Social, em que foram ouvidos 258.680 estudantes de 11 a 21 anos de todo o Brasil, traz dados sobre as percepções e demandas dos jovens em relação à escola. De acordo com o relatório, 51% dos jovens acreditam que a aprendizagem seria mais efetiva se a sala fosse composta por móveis variados, como puffs, bancadas, almofadas, sofás, e se eles pudessem aproveitar ambientes internos e externos durante a aula. Caroline lembra que o ambiente de aprendizagem é apenas uma das lacunas do ensino no Brasil. Segundo ela, a nova pedagogia diz respeito a “professores como estimuladores de descobertas e de interações entre os alunos, conexão do conteúdo com a vida, construção de trilhas de aprendizagem onde o aluno pode

Inovar é um desafio. Portanto, algumas atitudes podem ser inseridas em sala a fim de mesclar o modelo tradicional com novas possibilidades de ensino. A psicopedagoga Luciana Massoni, especialista em metodologia do Ensino Superior, explica: “antes, a metodologia trazia ao aluno uma capacidade decorativa muito grande, imensa, era a base da aprendizagem. Aos poucos, esse cenário foi mudando. Não podemos dizer que o método tradicional não é bom, mas ele precisa ser adaptado”. A nova educação propõe professores mais dinâmicos e dispostos a aplicar metodologias que vão além da teoria expostas nos livros e apostilas. Para tanto, é preciso estabelecer uma conexão construtiva em sala. “A relação do professor com seus alunos é de fundamental importância porque é a partir da forma de agir do professor que o aprendiz se sente mais seguro e mais receptivo a receber o conteúdo. O professor tem que estar aberto às novas experiências, aos sentimentos e aos problemas que os alunos trazem”, comenta a psicopedagoga.


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IMAGINATION - A EDUCAÇÃO DO FUTURO

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seu co-fundador, Hendel Favarin, erra ao valorizar conteúdos técnicos e teóricos, deixando de lado habilidades essenciais valorizadas pelo mercado de trabalho. “A gente nasceu da insatisfação em três grandes pilares: conteúdo, metodologia e professores. Conteúdo porque no ensino tradicional ele é muito desvinculado com a realidade de mercado, pouco prático e que não faz diferença no dia a dia. Metodologia porque ela é muito chata, quadrada, é preciso tomar muito café para conseguir assistir uma aula. Professores porque são muito teóricos e sem experiência de mercado”, detalha. Não diferente do que acontece no ensino básico, fundamental e médio, o ensino superior também precisa mesclar a meto-

dologia tradicional com a nova educação. “É um desafio inovar, mas é possível, são pequenas coisas que o ensino tradicional poderia fazer. Um dos pilares da inovação, por exemplo, é o customer centric, que é ter o cliente no centro. Isso significa ouvir seu cliente, construir um produto com ele, e não para ele”, sugere Favarin. Ainda segundo ele, há um comodismo por parte das universidades em não ouvir dos alunos o que eles precisam e seguir apenas o que está pré-determinado na grade. “Esse é um dos problemas do ensino tradicional, essa falta de vontade e necessidade de inovar. Mas eles poderiam sim se aproximar do aluno, entender as dores, as dificuldades, melhorar os conteúdos, os professores, as metodologias. Falta muita vontade e iniciativa”.

Mudar requer esforço e nem sempre é fácil começar. Mas os resultados valem a pena. A mestre em educação, Caroline Bucker, conclui: “vejo que a educação do futuro será mais colaborativa, necessariamente mais criativa e também mais humana, além de estar apoiada na tecnologia para que seja de alto valor”.

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HENDEL FAVARIN Fundador da Conquer

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LIFE - VOCÊ ESTÁ VIVENDO OU SOBREVIVENDO?

VOCÊ ESTÁ VIVENDO OU SOBREVIVENDO? No Brasil, 33 milhões de pessoas sofrem com a Síndrome de Burnout; iniciativas em prol da saúde mental nas empresas podem contribuir para diminuir essa estatística

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>>> Guilherme Popolin

ueimar por completo”. Essa é a tradução literal de Burnout, síndrome do esgotamento profissional, uma patologia que atinge a saúde de trabalhadores que enfrentam um estado de tensão emocional e estresse no ambiente corporativo. O termo, criado em 1974 pelo psicanalista germano-americano Herbert Freudenberger, define os fenômenos no contexto ocupacional que desgastam a saúde mental. O Burnout foi popularizado, nos anos 1980, pela pesquisadora norte-americana Christina Maslach, quem aferiu os grupos mais vulneráveis à síndrome: médicos, enfermeiros, professores e policiais – profissionais expostos cotidianamente à pressão. Décadas depois, em 2019, a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu o Burnout na 11ª Revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID-11), e, a partir de janeiro de 2022, passa a vigorar como um fenômeno ocupacional – não como doença. No Brasil, segundo a Internacional Stress Management Association (Isma), 33 milhões de pessoas sofrem com a Síndrome de Burnout, ou seja, cerca de 30% dos profissionais brasileiros – deixando o país à frente da China (24%) e dos EUA (20%), atrás apenas do Japão (70%). De acordo com a OMS, o Brasil também tem uma das populações mais estressadas do mundo – dados de 2019 apontam que 18,6 milhões de brasileiros são afetados pelo transtorno de ansiedade. Contudo, o debate sobre saúde mental, especialmente dentro das empresas, ainda é cercado por tabus. Em agosto de 2018, a jornalista Izabella Camargo sofreu um “apagão” enquanto transmitia a

IZABELLA CAMARGO Jornalista

previsão do tempo durante o jornal “Em Ponto”, da GloboNews. Após o episódio, veio o diagnóstico do Burnout, afastando a profissional das atividades por 15 dias e depois por mais dois meses para o tratamento. Quando voltou ao trabalho foi demitida, porém, reintegrada ao quadro de funcionários da Rede Globo após uma determinação judicial, resultado de uma ação trabalhista movida pela jornalista contra a emissora. Hoje, Izabella reivindica para si a missão de “comunicar aquilo que ninguém comunica ou não acredita que possa acontecer”, em referência ao fenômeno ocupacional e à Lei 8.213/1991 que garante a estabilidade de emprego por 12 meses ao trabalhador afastado das atividades por doença laboral.


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ATENÇÃO AOS SINAIS

folga. Tudo isso interfere para chegarmos a um colapso”, conta Izabella. A jornalista lança, ainda no primeiro semestre de 2020, o livro “Dá um tempo” – também nome do seu canal no YouTube. A ideia inicial era propor uma reflexão para evitar o adoecimento, a partir de 150 entrevistas realizadas com pessoas como Fernanda Montenegro e Maurício de Souza. Durante a escrita do livro, Izabella foi diagnosticada com “a doença dos novos tempos” e também contribui com suas próprias experiências. “Mesmo tendo ouvido cantores, padres, médicos reclamando da exaustão profissional, eu não reconheci em mim, porque cada um vai ter uma consciência dos seus limites. Cada um vai ter uma ideia equivocada de ser um super-homem ou uma super-mulher”, sintetiza.

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A partir da própria experiência e dos mais de quatro mil relatos que ouviu ao longo de sua trajetória, Izabella conta que o corpo emite sinais de alerta, no entanto, a tendência é não procurar ajuda. No caso do Burnout, entre vários sintomas iniciais, os mais comuns são enxaqueca, tremor nos olhos, sudorese, falta de ar, problemas gastrointestinais e cardiovasculares constantes. “No início, eu não fazia ideia do que aquilo poderia me dizer. Achei que não era nada, fui tratando com vários especialistas, todos de forma isolada. Apenas o último psiquiatra falou que eu estava com um colapso profissional, sob risco de convulsão. Poderia ter morrido porque demorei para ter esse alerta máximo. Eu demorei dois anos e meio, mas cada um vai ter o seu processo, já que depende do horário de trabalho, do que se faz no trabalho, de quantas horas trabalha, se existe um período de

“No início, eu não fazia ideia do que aquilo poderia me dizer. Achei que não era nada, fui tratando com vários especialistas, todos de forma isolada. Apenas o último psiquiatra falou que eu estava com um colapso profissional, sob risco de convulsão.”


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LIFE - VOCÊ ESTÁ VIVENDO OU SOBREVIVENDO?

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APELAÇÃO NÃO É RESILIÊNCIA Hoje, de acordo com Izabella, as pessoas apelam para continuar em um modelo de trabalho que é, de fato, destrutivo. Mas o que isso significa? “Muitos gestores pedem aos funcionários que sejam mais resilientes, mas existe um grande equívoco no uso da palavra resiliência. Eu tomava remédios para dormir e acordar, tratando vários problemas individuais. Isso é apelação. Tudo o que eu fazia era para voltar a trabalhar. Não era para viver, era para sobreviver”, explica a profissional ao questionar “estou sendo resiliente ou estou apelando para dar conta de um modelo que já sei que não faz bem?” Quem nunca ouviu alguém se vangloriar do tempo que não tira férias? Ou, então, dizer que está na correria e não tem tempo para nada? Dessa maneira, Izabella considera que o Burnout é também uma consequência da culpa que as pessoas sentem ao vivenciarem momentos de ócio, uma vez que é comum não valorizarem a pausa e o lazer.

“Levamos o aforismo tempo é dinheiro ao pé da letra. Achamos que se ficarmos sem fazer nada estamos perdendo tempo, logo, dinheiro”, e completa que a dificuldade em perceber a síndrome está na “armadilha da competência” e no “amor ao que faz”. Portanto, é preciso ficar em alerta quando um chefe parabeniza um funcionário pelo desempenho atribuindo mais trabalho àquela pessoa, pois, assim, trabalhadores responsáveis e que amam o que fazem começam a acumular tarefas. Aprender a dizer não é fundamental para evitar a tristeza, o choque, a culpa e a vergonha presentes – durante e depois – do Burnout. “O exame de cortisol, um medidor que não está incluído no hemograma completo, é importante, já que se ficar alto por muito tempo significa que o corpo não está produzindo uma série de outros hormônios. O cortisol, hormônio do estresse, impede o sistema imunológico de trabalhar. Por isso, se está na dúvida do Burnout, começa pelo exame de cortisol”, orienta Izabella, quem também

TATIANA PIMENTA CEO e Fundadora da Vittude


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za a conexão entre pacientes e psicólogos. A média de crescimento de 20% ao mês desde janeiro de 2018 indica uma preocupação maior da sociedade em investigar e tratar os problemas vinculados à saúde mental. Entretanto, Tatiana aponta que muitas empresas não conhecem suas realidades, uma vez que “boa parte das organizações não sabe como está o estado de saúde dos colaboradores. O primeiro passo seria fazer um mapeamento, um tipo de diagnóstico, para conseguir desenvolver um plano de ação efetivo para cuidar dessas pessoas”, recomenda. Mesmo com a depressão, resultado do término de um relacionamento conturbado, Tatiana não se afastou do trabalho. “Foi graças à empresa ter um olhar bastante cuidadoso comigo que fiz acompanhamento e não me afastei nenhum dia do trabalho mesmo estando com depressão”, experiência que aparenta ser uma exceção no mercado de trabalho. A conexão permanente às

“Boa parte das organizações não sabe como aconselha que o mais apropriado para quem sente os sintomas do Burnout é procurar um especialista – psicólogo ou psiquiatra – e se conscientizar que nem sempre o primeiro profissional será o mais adequado.

PACIENTES E PSICÓLOGOS CONECTADOS Tatiana Pimenta, CEO e Fundadora da Vittude, após buscar tratamento para a depressão, em 2012, criou uma plataforma para melhorar a experiência de pessoas que precisam encontrar um psicólogo. “Foram três experiências frustrantes até que decidi pedir indicações a amigos. Meu primeiro psicólogo, de fato, oriundo de uma indicação, tinha seu consultório cerca de 10 km distante da minha casa. Tinha encontrado o profissional ideal, mas minha terapia, que deveria levar 50 minutos na semana, consumia três horas – duas horas no trânsito para ir e voltar”, conta. Hoje, com mais de três mil psicólogos cadastrados, em 220 cidades, a Vittude otimi-

está o estado de saúde dos colaboradores.”

ferramentas digitais, comparações, metas irreais e a falta de tato das companhias com a saúde mental impactam negativamente a economia mundial. Segundo a London School of Economics and Political Science, a depressão custa às empresas brasileiras mais de R$ 300 bilhões em perda de produtividade. Já o Fórum Econômico Mundial aponta que transtornos mentais modernos custaram US$ 2,5 trilhões ao mundo, por conta da queda de produtividade, aposentadoria precoce, diagnósticos e tratamentos. Há, no Brasil, um movimento das empresas rumo a um cuidado efetivo da saúde mental dos colaboradores, mas ainda é tímido. Um estudo da Mercer Marsh Benefícios, MetLife e Willis Towers Watson aponta que a promoção da saúde metal é uma das prioridades de 30% das empresas brasileiras em 2020. O acesso a serviços de saúde mental foi o foco de 49% das empresas nos últimos três anos, e deve ser de 78% delas nos próximos três. Como pontua Izabella Camargo, “há um movimento bacana das empresas, pelo menos estão pensando no assunto. Contudo, ainda há muita coisa equivocada. Não adianta colocar poltrona colorida e mesa de pingue-pongue, não é isso que vai fazer o sujeito se cuidar. O RH, por exemplo, tem informações valiosas, mas tem que querer usá-las. Não adianta deixar para depois porque pode ser tarde”, finaliza.


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MOBI- LISBOA OLHA PARA FRENTE

LISBOA OLHA PARA FRENTE Como a capital portuguesa está unindo esforços para transformar a mobilidade e trazer mais qualidade de vida à população >>> Karina Constancio

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magina um futuro com menos carros e mais transportes coletivos e compartilhados. Um futuro de uma cidade construída para as pessoas, com áreas de convivência e segurança para os que querem andar, passear ou pedalar nas vias urbanas. Menos poluente, ambientalmente responsável e com transporte público de qualidade. Um futuro com uma mobilidade mais eficiente e humana. Parece utópico que a gente consiga chegar nesse cenário pelo menos em um futuro próximo, mas esse é o objetivo de Lisboa, em Portugal. Primeiro, é importante ressaltar que quando falamos em mobilidade não podemos levar em consideração apenas à capital, mas também a região que a envolve, conhecida como Área Metropolitana de Lisboa (AML), composta por 18 municípios e 2,9 milhões de habitantes. Isso porque parte dessa população precisa se deslocar diariamente para trabalhar na capital portuguesa. Estima-se, por exemplo, que, em 2019, os deslocamentos casa-trabalho-casa foram responsáveis pela entrada diária de 370 mil veículos em Lisboa, o que praticamente duplicou o número de carros que circulam na cidade. Os esforços de Lisboa para mudar o cenário de mobilidade têm uma motivação central: diminuir a


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Lisboa, localizada no centro da cidade. Desde junho de 2019, somente os veículos de moradores e lojistas podem circular. Essa iniciativa faz parte da estratégia adotada após o compromisso de redução de 60% nas emissões de CO2 até 2030 e da neutralidade de carbono até 2050. A tendência de mobilidade “verde”, observada em diversos outros países, também está dando passos consideráveis na capital portuguesa. “Um exemplo concreto disso é a renovação da frota de ônibus da cidade como parte da transição para a utilização de combustíveis menos poluentes, o que verificou-se nos últimos anos com a introdução dos veículos movidos a gás e, mais recentemente, movidos a energia elétrica. Isso fortalece a alteração de um modelo de consumo de combustíveis fósseis para um modelo com fontes renováveis”, explica Tomas Donadio,

pesquisador da Universidade de Lisboa e especialista em cidades inteligentes e desenvolvimento sustentável. Além disso, a mobilidade compartilhada também está crescendo na região. O aumento da consciência da mobilidade como um serviço (MaaS) está se alastrando junto com o crescimento acelerado de modais compartilhados como os patinetes, as bicicletas, as motos e os carros. Dentro do novo modelo, deixamos de ser proprietários e passamos a ser usuários. Não sendo de ninguém, os meios de transporte são para todos, e com uma boa dose de tecnologia conseguem ser acessíveis com poucos cliques. “Do ponto de vista do mercado, esses serviços já estão todos de certa forma maduros por aqui, mas vale ressaltar que ainda há muito trabalho a ser feito nas áreas regulatórias. Nos patinetes, por exemplo, há risco de acidentes mortais e

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dependência do automóvel. No sentido contrário ao que vem acontecendo em outras cidades europeias, um estudo, divulgado em 2018, revelou que o uso do carro próprio cresceu 35% na AML. Para conter esse avanço, algumas iniciativas que incentivam a utilização do transporte público saíram do papel. Uma delas foi a criação do passe mensal e unificado de transporte público, implementado em 2019, que garantiu preços mais acessíveis para a população, expansão da área de cobertura e integração entre ônibus, metrô e trem. Os resultados já indicam que houve aumento do uso dessa opção de transporte. Somente em maio do ano passado foram vendidos 750 mil títulos de transporte, o que representa um aumento de 31% se comparado ao mesmo mês de 2018. Outra iniciativa foi limitar o acesso de veículos particulares à zona da Baixa de


“A mobilidade é um tema extremamente relevante para a vida nas cidades.”

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as pessoas continuam utilizando inadequadamente, seja com dois passageiros, sem proteção adequada (capacetes) ou se arriscando entre os carros. Já nos serviços como o Uber, por exemplo, uma questão que tem sido discutida por aqui é sobre as condições de trabalho dos motoristas, que não têm garantias, têm baixos salários e excesso de horas de trabalho”, destaca Donadio. Em meio a essas medidas de mobilidade, os ciclistas começam a aparecer. Só a Gira, o serviço de bicicletas compartilhadas de Lisboa, administrada pela empresa municipal EMEL, registrou mais de um milhão de viagens em dois anos. A Jump, empresa de bikes compartilhadas do Uber, chegou à Lisboa no ano passado com 750 bicicletas. Hoje, já passam de 2000 e 1,5 milhões de quilômetros percorridos. É como se, por dia, fossem percorridos 4110 quilômetros, distância que permitiria sair da capital e chegar a Istambul, na Turquia. Do ponto de vista do padrão de utilização, a empresa revelou que 70% dos deslocamentos são realizados no trajeto casa-trabalho-casa.

Na última década, a rede cicloviária de Lisboa cresceu de 10 km para cerca de 90 km, e a expectativa é que esses percursos cheguem, em 2021, aos 200 km, integrados com a rede de transportes públicos e outros meios disponíveis na região. Mesmo assim, a cidade ainda está longe de um cenário ideal quando se fala em mobilidade ativa. De acordo com Donadio, as ciclovias são escassas, há poucas ligações enTomas Donadio tre elas e estão conPesquisador da Universidade centradas nas áreas de Lisboa mais turísticas e centrais da cidade. “Os caminhos para pedestres também são pouco convidativos e mal conservados, as calçadas são estreitas e têm muitos buracos e desníveis, além de haver percursos onde não há calçada e o pedestre é obrigado a andar literalmente no meio da rua, correndo grande risco de

ser atropelado por um veículo. Isto é um problema ainda mais grave para os grupos mais sensíveis a essas questões como as pessoas com mobilidade condicionada, idosos, cegos, com carrinho de bebê ou com alguma deficiência motora”, revela.

MOBILIDADE EM ESCALA HUMANA Cidades inteligentes são cidades construídas para as pessoas e por isso a mobilidade ativa tem papel central nessas discussões. Mas o que vimos nas últimas décadas, não só em Lisboa, mas nas principais capitais do mundo, é um trânsito pensado para os meios de transporte e não para as pessoas. Agora, os centros urbanos estão sendo forçados a quebrar esse padrão e repensar a mobilidade como um todo. A principal premissa é que não dá mais para olhar a mobilidade de forma isolada. Ela é um sistema complexo que traz consequências para a qualidade de vida, para o meio ambiente e para vida urbana como um todo. “A mobilidade é um tema extremamente relevante para a vida


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nas cidades. Nesse sentido, as políticas públicas e as regulamentações urbanas podem alterar significativamente não apenas as condições de vida humana, mas também os impactos ambientais. Porém, é importante ressaltar que o conceito de mobilidade como é discutido atualmente deve ser expandido, ou seja, há uma concentração muito forte em questões relacionadas aos tipos de combustível e modos de transporte, deixando de lado as pessoas, principalmente as mais vulneráveis. Por esse ponto de vista, penso que podemos (re)construir as cidades de forma mais inclusiva de forma a garantir uma mobilidade de qualidade para todos”, pontua Donadio. Já para Nuno Marques da Costa, docente do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa, a mobilidade é resultado de um conjunto de alternativas de localização, onde a necessidade de nos deslocarmos tem a ver diretamente com a forma como organizamos o nosso espaço. Isso quer dizer, basicamente, que precisamos nos movimentar para realizar nossas atividades diárias e a


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localização desses lugares e serviços serão determinantes no tempo e no meio de transporte escolhido para o deslocamento. Quanto mais longe morarmos do trabalho, por exemplo, de mais mobilidade vamos precisar para chegar até a empresa e para voltar para casa depois. Alguns especialistas falam na organização das cidades compactas, onde as pessoas poderiam resolver tudo o que precisam em uma determinada região e evitariam deslocamentos longos e desnecessários. Isso porque quando as funções estão mais perto, a acessibilidade melhora. Cabem às cidades oferecem essas alternativas e às pessoas deixarem velhos hábitos de lado e adquirirem também um olhar mais amplo em relação à mobilidade que vai muito além do automóvel. Mas esse é um caminho que deve ser trilhado em conjunto. “Por um lado, a educação e a conscientização da população sobre assuntos como esse podem gerar resultados positivos. Entretanto, por outro lado, temos que tomar bastante cuidado, pois muitas vezes há parcelas da população que não têm escolha, e nesses casos não se trata de uma questão de mudança de comportamento, mas sim de mudanças estruturais”, alerta Tomas Donadio. Quando se fala em futuro, Donadio citou dois caminhos possíveis para Lisboa, um mais provável e outro mais utópico. “O mais provável, a meu ver, é a continuidade das tendências que observamos

atualmente na cidade. Ou seja, o crescimento da mobilidade como serviço, a “uberização”, a transição moderada para a mobilidade “verde” e algumas iniciativas para incentivar a utilização do transporte público, como as que citei acima. O outro caminho indica uma visão mais utópica onde a cidade seria mais acessível, inclusiva e democrática. Para isso se realizar, acredito que além das tendências observadas deve-se ter mais atenção aos interesses de grupos mais vulneráveis. Devem ser priorizadas as iniciativas como a promoção de processos verdadeiramente participativos e a priorização de projetos realmente relevantes para a vida dos cidadãos”, projeta. Como afirmou o arquiteto Jan Gehl, autor do livro “Cidades para Pessoas” e um dos maiores responsáveis por mudar a cara de Copenhague (Dinamarca), precisamos recuperar a capacidade de criar bairros onde seja um prazer crescer e envelhecer. Cidades onde o cenário de ficar três horas preso dentro de um carro seja uma realidade cada vez mais distante e onde as pessoas possam andar, ter momentos de lazer, praticar esportes ou ir de bicicleta ao trabalho. Dessa forma, conseguiremos viver em espaços mais humanos, acessíveis e inclusivos.


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- O MUNDO EM COMUNIDADE

O MUNDO EM COMUNIDADE De uma roda de conversa despretensiosa nos intervalos da WTW19, passando por workshops pós-evento e terminando em uma plataforma de IA: a comunidade WTW está crescendo e tem planos inovadores para um futuro próximo. >>> Loraine Santos

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ão é de hoje que a união de pessoas tem se mostrado uma arma importante na luta contra o desconhecido e em prol da evolução. Se resgatarmos a história, é possível ver que o ser humano nasceu para cooperar: na caça em grupo para buscar alimento, no cultivo coletivo da terra e na prática do escambo, por exemplo. Com o advento da tecnologia e com as incertezas de um futuro onde homens e máquinas brigam pelo mesmo espaço de trabalho, o compartilhamento de informações e as relações interpessoais estão se reinventando de forma dinâmica e atraente. Quem concorda é Junior Valverde, fundador da Seven Join e idealizador de um projeto em parceria com a Welcome Tomorrow que visa conectar pessoas e projetos em uma plataforma colaborativa e, assim, promover encontros e soluções para enfrentar os reflexos da tecnologia no mundo dos negócios. “Sabemos que a tecnologia acaba com muitos empregos mas também gera outras tantas oportunidades e o propósito da plataforma é que pessoas com diferentes habilidades se conectem e possam empreender e inovar”, explica Valverde.

WTW FEELINGS Tudo começou em 2018, quando o empreendedor participou da sexta edição da Welcome Tomorrow a convite de Walter Longo e ficou encantado com o alto nível das discussões e com a quantidade de ideias que estavam sendo fomentadas no evento. “Em 2019, fui convidado para palestrar sobre o poder da economia colaborativa e levei comigo 10 alunos”, conta Valverde. Ao final do primeiro dia de WTW19,

ele e os alunos se reuniram em um dos espaços comuns da Cidade do Futuro para debater sobre o que haviam ouvido nas palestras e trocar experiências vivenciadas no evento. “As pessoas que passavam por nós foram se aproximando e a quantidade de gente em nossas rodas de conversas foi aumentando organicamente. Ao saber da nossa iniciativa, a organização do evento logo providenciou um espaço próprio para isso, microfone e caixa de som”, conta.


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Flavio Tavares, idealizador da Welcome Tomorrow, além de disponibilizar instantaneamente o aplicativo do evento para divulgar as rodas de conversas e incluir os encontros no cronograma oficial, se prontificou a participar e enriquecer ainda mais os debates. “As comunidades da Welcome Tomorrow nasceram espontaneamente dentro do evento e, hoje, temos registros de encontros sendo realizados em várias capitais do Brasil. O app ajudou muito nessa conexão mais regionalizada dos participantes”, comenta Tavares. Para Valverde, receber o apoio da WTW e contar com a presença do idealizador em uma das rodas de conversas durante o evento foram momentos marcantes. “Quando vimos, mais de 100 pessoas estavam na roda para participar do bate-papo ouvindo o Flavio e colaborando ativamente com perguntas e comentários”.

MAIS DO QUE UM EVENTO, UM MOVIMENTO

NOVOS NEGÓCIOS SURGINDO “Fazer parte da comunidade WTW é simplesmente incrível”, conta Camila de Marco, designer gráfico e multimídia, que esteve no evento em 2019 e participou das rodas de conversas que aconteceram na Cidade do Futuro. Assim como Flavio Tavares, ela acredita que os encontros são diferentes e inovadores porque os conteúdos acontecem “de uma forma colaborativa, criativa, prática e divertida, sempre agregando valor e buscando tornar nosso dia a dia mais completo e humano”. Um dos propósitos da comunidade é promover trocas entre profissionais de diferentes áreas. Para Stefano Andrade, especialista em tecnologia que também conheceu o grupo durante a WTW19 e hoje participa dos workshops promovidos pós-evento, a relevância está em conhecer pessoas que compartilham dos mesmos sonhos e dificuldades. “Tive experiências inexplicáveis e ainda consegui acesso a oportunidades que não teria em encontros comuns, sou grato a todos que ajudam esse movimento crescer em um país que precisa muito de empreendedorismo para se desenvolver”, conta ele.

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Passada a Welcome Tomorrow, o que se viu foi um grande número de pessoas unidas pelo mesmo propósito de estar mais preparado para o futuro. Por isso, Valverde quis dar continuidade às rodas de conversas e promoveu novos encontros em São Paulo. “Já fizemos 3 edições para reunir a comunidade WTW. Nas ocasiões, organizamos workshops, das 9h às 17h, em que dividimos o pessoal em grupos e promovemos dinâmicas para que cada um utilizasse suas habilidades para solucionar

problemas”, explica o líder da comunidade. “Cada vez mais é possível perceber o quanto a gente precisa tratar um ao outro como comunidade para pensar no futuro e criar produtos e serviços, sejam eles simples ou complexos, para atender as demandas que estão por vir”. De acordo com Flavio Tavares, “os workshops têm uma característica muito diferenciada porque eles têm uma metodologia clara, baseada na plataforma Seven Join, em que são estimuladas ideias para resolver problemas específicos e são formados grupos que aderem às ideias e começam a trabalhar para colocar essa ideia de pé”. Além dos workshops formais em São Paulo, Valverde conta que pessoas de outros estados, que também estiveram na WTW, se encontraram em suas cidades para tomar café e fomentar novas ideias de negócios. E tudo com o apoio da organização do evento. “Seguindo o modelo da comunidade de São Paulo, esperamos estimular, até o final de 2021, a presença em mais de 100 cidades no Brasil das comunidades”, comenta Tavares.


58 - TOMORROW

- O MUNDO EM COMUNIDADE

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O FUTURO ESTÁ LOGO AQUI

De uma roda com 10 alunos, passando para um bate-papo com mais de 100 pessoas e terminando em encontros periódicos para falar sobre o futuro dos negócios, a comunidade WTW está crescendo. Porém, usar o verbo “terminar” pode ser equivocado. A Welcome Tomorrow e a Seven Join, empresa fundada por Junior Valverde e especializada em desenvolvimento de software de gestão de inovação e integração de pessoas, vão se unir para dar vida a uma plataforma de conexões. “Estamos em 2020 e a tecnologia nos permite identificar necessidades e gerar oportunidades de desenvolvimento econômico através de conexões. A ideia da plataforma é conectar as mais de 25 mil pessoas que fazem parte do universo Welcome Tomorrow, dar oportunidade delas compartilharem experiências e habilidades e, por meio da Inteligência Artificial, entregar conexões e gerar negócios”, conta em primeira mão o fundador da Seven Join. O projeto ainda está em fase de desenvolvimento. Enquanto isso, há grandes planos acontecendo paralelamente ao evento de 2020, marcado para 12, 13 e 14 de novembro, no São Paulo Expo. “Estamos com um projeto incrível para fortalecer a comunidade. Vamos chamar 3 grandes patrocinadores do evento para propor necessidades e desafios para que nossa comunidade solucione. As ideias serão entregues para uma curadoria da Welcome

“Estamos em 2020 e a tecnologia nos permite identificar necessidades e gerar oportunidades de desenvolvimento econômico através de conexões.” JUNIOR VALVERDE Fundador da Seven Join

Tomorrow e os melhores projetos serão apresentados aos patrocinadores nos palcos do evento, com grandes chances de serem desenvolvidos por eles”, explica Valverde. Para Flavio Tavares, todas as iniciativas que surgiram a partir da comunidade WTW têm tudo a ver com o propósito da Welcome Tomorrow. “A WTW é o lugar onde podemos resgatar sonhos, onde voltamos a nos tornar donos do nosso próprio tempo e da nossa jornada. Encontro com nossos valores, com o que gera significado dentro de nós. E aí o maior encontro de todos é ver cada um desabrochar para um novo e lindo propósito”. E finaliza: “o futuro dos eventos são as comunidades, a importância de se transformar uma discussão global em ações mais práticas, locais, isso só é possível através dos pequenos grupos”. Para fazer parte da comunidade WTW, é só mandar um e-mail para valverde@ sevenjoin.com.



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SMART - CONVERSA COM ROBÔS

CONVERSA COM ROBÔS Na era dos assistentes virtuais, a tecnologia pode transformar relações pessoais e corporativas e já incita debates relacionados a questões de gênero >>> Beatriz Pozzobon

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té pouco tempo atrás, não nos imaginávamos conversando com robôs e sendo respondidos em tempo real. Mas, o que parecia se materializar somente em um futuro distante, está cada vez mais presente no nosso dia a dia. Chamados de assistentes virtuais, os bots respondem a comandos de voz ou texto e executam tarefas propostas pelo usuário. Uma tecnologia que, assim como aconteceu com as redes sociais, pode transformar nossas relações pessoais e corporativas. Uma pesquisa da agência de marketing digital IProspect, divulgada no ano passado, revelou que 49% dos brasileiros que têm smartphones já usam assistentes de voz. De acordo com o levantamento, feito com base em mais de quatro mil entrevistas, os consumidores usam os recursos de voz porque são mais rápidos e mais fáceis do que digitar. Para além do uso pessoal pelos smartphones, os assistentes virtuais já são realidade nas residências e no atendimento ao cliente. Ainda pouco difundida no Brasil, a tecnologia nos domicílios pode ser utilizada para solicitar o trancamento de portas, controle da luz e a operação de aparelhos eletrônicos, por exemplo. Já as empresas utilizam-se, cada vez mais, de bots para interagir com os clientes, o que contribui com a redução

dos custos operacionais, além de fornecer atendimento full time. Nesses casos, por meio de inteligência artificial, os robôs aprendem e aperfeiçoam o repertório a cada interação com as pessoas. Para a psicóloga Maitê Hammoud, especialista em Psicanálise pelo Instituto Sedes Sapientiae, o uso, cada vez mais intenso, dessas tecnologias pode impactar na saúde física e emocional das pessoas, principalmente quando relacionado à dependência. “Na medida em que as funções de tais aplicativos e assistentes evoluem ofertando cada vez mais controle em diversos aspectos de sua vida, sejam eles domésticos ou profissionais, o usuário tende a permanecer conectado cada vez mais, agravando seu quadro de dependência e tornando-se refém dessa tecnologia”, afirma. Nesse sentido, a psicóloga pontua, en-


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tre outros prejuízos, a perda gradativa da habilidade de realizar tarefas de rotina; empobrecimento da capacidade para resolução de problemas simples ou complexos; e enfraquecimento da memória. “Esse é o primeiro aspecto que somos afetados diante da oferta de serviços das assistentes virtuais, a facilidade no acesso de informações contribui para que nosso cérebro deixe de desenvolver sinapses que favorecem a qualidade de nossas funções cognitivas.” Ainda segundo Hammoud, a praticidade e o conforto proporcionados pelos assistentes virMAITÊ HAMMOUND tuais, somados ao uso excessivo Especialista em Psicanálise da tecnologia, podem contribuir para o isolamento social e a perda de habilidade na comunicação e interação com outras pessoas, sejam elas do núcleo familiar, social ou profissional, o que também favorece o desenvolvimento de quadros de ansiedade, insônia e depressão. Diante desse cenário, a recomendação da psicóloga é não tornar a tecnologia indispensável no nosso cotidiano e utilizar a ferramenta de maneira benéfica, de forma que não atrapalhe, por exemplo, as relações interpessoais e atividades que exigem maior concentração.

INAIARA FLORÊNCIO Diretora de social media da SunsetDDB

Para assistentes, voz e nome de mulher A Siri é a assistente virtual da Apple; a Alexa, da Amazon, e a Cortana é a voz robotizada de uma mulher que responde pela Microsoft. Aqui no Brasil, Bia, Nat, Lu são os nomes que Banco do Brasil, Natura e Magazine Luiza batizaram suas assistentes virtuais. Apesar de empresas de segmentos e porte diferentes, as assistentes virtuais, via de regra, ganham vozes e nomes femininos. Segundo a psicóloga Maitê Hammoud, pesquisas de mercado apontam que a voz feminina tende a ser compreendida pelo usuário com afetividade e prestatividade, enquanto a masculina é associada, geralmente, ao autoritarismo. “Esse cenário é decorrente de questões culturais que perpetuaram ao longo de décadas no que se refere ao machismo”, destaca. Um estudo da UNESCO, divulgado no ano passado, apontou que as assistentes virtuais sofrem altos índices de preconceito de gênero e quando são verbalmente assediadas, suas respostas são tolerantes, subservientes e passivas. O nome do relatório, inclusive, “I’d Blush If I Could” (Eu ficaria corada se pudesse) faz alusão a uma típica resposta da Siri quando recebe elogios ou insultos sexistas dos usuários. Para a UNESCO, a utilização de nomes e vozes femininas em assistentes virtuais reforça estereótipos de gênero e fortalece o sexismo. O estudo também constatou que as assistentes virtuais são programadas basicamente por homens – que representam 90% da força de trabalho na criação de I.A). De olho nesse cenário, a UNESCO, em parceria com a agência SunsetDDB, lançou, em janeiro, o movimento “Hey, Update My Voice”, que conta com o apoio de grandes empresas e reúne participações espontâneas do público. O objetivo é chamar a atenção sobre a educação cibernética e o respeito às assistentes virtuais. “A educação cibernética precisa ser abordada com urgência pela mídia, pelas empresas e, principalmente, pelas pessoas”, defende Inaiara Florêncio, diretora de social media da SunsetDDB. “É essencial enxergamos que esse tipo de assédio cibernético é apenas o reflexo do que acontece com as mulheres reais e vítimas desse tipo de violência”, completa. Para Hammoud, a inserção da voz masculina pode favorecer a desconstrução dos estereótipos de gênero. “Dessa forma, a longo prazo, a sensação de afetividade, prestatividade e atenção possa ser relacionada a qualquer tom de voz, independente do gênero”, finaliza.

*Mais em: www.heyupdatemyvoice.org


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SMART - MERITOCRACIA: ENTRE A COMPETÊNCIA E O PRIVILÉGIO

MERITOCRACIA: ENTRE A COMPETÊNCIA E O PRIVILÉGIO Em um país como o Brasil, com extrema desigualdade social, barreiras ocultas fazem parte do mercado de trabalho >>> Guilherme Popolin

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o latim meritu (mérito) e cracia (poder), a meritocracia divide opiniões. Por um lado, o modelo é visto como democrático e não-arbitrário em processos de seleção e promoção dentro das empresas, mas, por outro é um mito cuja função é reforçar privilégios e naturalizar desigualdades. O estudo O Elevador Social Está Quebrado? Como Promover a Mobilidade Social, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mostra que duzentos e vinte e cinco anos – até nove gerações – é o tempo que uma família brasileira pode levar para deixar a faixa dos 10% mais pobres e chegar à de renda média do país – R$ 1.370. Dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) mostram que o Brasil é o sétimo país mais desigual do mundo. Diante desse quadro, é possível falar em meritocracia no mercado de trabalho? No livro “Success and luck: good fortune and the myth of meritocracy” (Sucesso e sorte: A boa sorte e o mito da meritocracia), o economista norte-america-


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WESCLEY XAVIER Professor e doutor em administração

volvimento do embrião e para o formação neural do bebê. Já durante a gravidez, passou a usar polivitamínico para o desenvolvimento celular e dos ossos. Além disso, contávamos com um bom plano de saúde, amplo acesso a informações, além de uma boa alimentação. O custo disso tudo é altíssimo, algo inacessível a parte significativa da população brasileira”, conta. Dessa forma Xavier explica que as condições que colocam as pessoas em posições desiguais no mercado de trabalho são anteriores à concepção, permanecem durante a gestação e se acentuam ao longo da vida. “Como posso falar em meritocracia se minha filha for aprovada em um vestibular futuro, quando a ela foram dadas todas as condições materiais? Ela vai ter mérito, que diz respeito a um resultado fixo no tempo. Meritocracia diz respeito a um processo mais amplo, e quando a tomamos como algo relativo a um, dois ou mais alguns poucos casos, aniquilamos todas as condições históricas, materiais e sociais que a cercam”, explica. As barreiras de oportunidade enfrentadas por pobres, mulheres, negros e LGBTIs são particulares a cada grupo social. De acordo com Marta Bergamin, socióloga e professora na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), tais barreiras não são evidentes. Nas contratações e promoções, as barreiras invisíveis do mercado de trabalho seguem ocultas, todavia, é possível lançar luz sobre essa conjuntura por meio de dados, como os aferidos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cujas análises mostram que no último trimestre de 2019 as mulheres ganhavam 22% menos que os homens. A diferença torna-se mais aguda ao considerar apenas os trabalhadores com ensino superior – nesse caso a disparidade de remuneração chega a 38%. Já em cargos de liderança, os homens recebem R$ 40 por hora trabalhada, enquanto as mulheres recebem R$ 29. A

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no Robert H. Frank enfatiza a importância das oportunidades na vida de cada um. Para o autor, a sorte é um fator fundamental para o sucesso, ao lado do talento e do esforço. Por sorte, entende-se os fatores que não são possíveis controlar, como os privilégios – prerrogativas cujos efeitos garantem maiores chances de se alcançar o sucesso. Wescley Xavier, professor adjunto do Departamento de Administração e Contabilidade da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e doutor em administração pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), diz ser cético em relação às transformações sociais necessárias para que as barreiras ocultas do mercado de trabalho sejam superadas no Brasil. De acordo com Xavier, os laços sociais ainda fazem a diferença na sociedade brasileira, uma vez que “nossa sociedade é extremamente classista, pouquíssimo dada à perda de privilégios. As relações de classe existentes no Brasil representam uma forte barreira na quebra desse mito, sobretudo porque a ideia de meritocracia é muito interessante às classes mais privilegiadas”, diz. Xavier conta que nasceu em uma cidade pobre e sempre morou em bairros periféricos, cujas perspectivas dos jovens eram a formação profissionalizante e o ingresso como mão-de-obra em empresas. Mesmo com condições materiais limitadas, na época, foi o único do bairro aprovado no vestibular, porque “aquilo sequer ocupava o imaginário da maioria dos jovens que lá moravam”. Na universidade, a meritocracia foi tema de sua primeira orientação no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Administração da UFV. O professor e a ex-orientanda Bruna Moreira estudaram os impactos da política de cotas na UFV, desmistificando aspectos contrários às ações afirmativas, como o menor rendimento do estudante cotista ou as cotas como causa da evasão estudantil. Xavier conta que há cinco anos teve sua primeira filha. “Quando minha mulher e eu decidimos que era o momento de tentarmos engravidar, ela passou a tomar ácido fólico, fundamental para o desen-


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SMART - MERITOCRACIA: ENTRE A COMPETÊNCIA E O PRIVILÉGIO

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mesma pesquisa aponta que a diferença salarial entre brancos e negros é de 45%. Já em relação à população LGBTI+, segundo levantamento conjunto da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Grupo Gay da Bahia (GGB) e Agenda Bahia do Trabalho Decente/Setre, de 2019, mais de 30% das empresas evitaram a contratação de LGBTIs (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgêneros e Intersexuais). A pesquisa mostra que 70% dos trabalhadores já presenciaram situações de discriminação pela orientação ou identidade sexual no ambiente de trabalho. “Não temos oportunidades iguais no mercado de trabalho. Há muita dificuldade em conseguir superar essa condição primeira”, afirma a socióloga. Para Marta, as cotas representam uma experiência positiva para a inserção de grupos marginalizados no mercado profissional. “Elas são importantes porque mostram que o ambiente de trabalho com mais diversidade tem uma produtividade maior. Por meio delas, algumas questões silenciadas na sociedade passam a ser debatidas no mundo corporativo. A diversidade aparece e permanece no mercado de trabalho”, reflete. De acordo com um estudo da McKinsey & Company, as companhias preocupadas com a diversidade de gênero são até 21% mais lucrativas, ao mesmo tempo que a diversidade étnica pode aumentar os lucros em até 33%.

O GÊNERO COMO BARREIRA A partir de sua experiência no mercado de trabalho, Silaine Stüpp, fundadora e CEO da HerForce, criou uma plataforma para que mulheres possam trocar informações sobre o ambiente de trabalho e encontrar empregos. A empreendedora foi modelo internacional, e mesmo após se formar em marketing percebia que as empresas estavam mais interessadas em sua vida pessoal que em suas habilidades profissionais quando procurava emprego – preocupações em relação a uma possível gravidez ou sobre a permissão do marido para ela trabalhar fora eram recorrentes. Sendo assim, “falando de diversidade de gênero, é muito difícil vermos meritocracia no mercado de trabalho. Historicamente falando, a participação das mulheres ainda é muito recente. Como

nossa sociedade espera que a criação dos filhos seja de responsabilidade das mulheres, cria-se uma barreira velada - ou muitas vezes escancarada mesmo - que já começa nos processos seletivos, atrasando ou muitas vezes impedindo a evolução profissional das mulheres”, alerta. De acordo com Silaine, esse cenário pode mudar a partir do momento em que as pessoas em cargos de liderança se preocuparem em formar equipes com todos os recortes de diversidade. “Enquanto a sociedade continuar atribuindo a criação do filhos exclusivamente às mulheres, a mudança virá lenta e dolorosa. É preciso que haja a divisão igualitária de responsabilidades parentais e domésticas, entre homens e mulheres, para que possamos eliminar parte do preconceito que existe em contratar mulheres para grandes cargos. Não é à toa que um estudo da Fundação Getúlio Vargas aponta que 48% das mulheres que voltam da licença maternidade são demitidas. Se existe um mito que precisamos acabar é o de que mulher não quer ou não “dá conta” de grandes desafios”.

SILAINE STÜPP Diretora fundadora e CEO da HerForce


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MARTA BERGAMIN Socióloga

A socióloga Marta Bergamin explica que alguns jogos permitem exemplificar a discrepância de oportunidades entre pessoas e grupos sociais. Na dinâmica “Caminhada do Privilégio” os participantes são posicionados lado a lado e cada um deve dar um passo para frente ou para trás, de acordo com as afirmações pertinentes a vantagens ou desvantagens sociais. Fica perceptível, ao final, que durante o percurso da vida as linhas de largada são diferentes. Dessa maneira, é possível observar que o ponto de partida não é o mesmo para todos e há, no meio do caminho, várias barreiras. “Não conseguimos falar em meritocracia porque algumas pessoas estão largando muito atrás. Esses jogos são interessantes para mostrar as barreiras e contra barreiras do mercado, quem tem mais dificuldade de ser empregado ou mais dificuldade de conseguir promoções. Quem é de uma família em uma situação mais precária ou de uma família com mãe solo também enfrenta dificuldade maiores”. Em um país com um abismo social como o Brasil, a reprodução das desigualdades sociais, raciais e de gênero pode ser observada nas escolas, na permanência no mercado de trabalho, nas famílias, nas oportunidades das mães, dos pais e das gerações anteriores. “Quem não concordaria que alguém que estudou mais, se esforçou mais, deva estar em um lugar melhor, ganhando um salário melhor? Só que esse tipo de fala silencia completamente, ou esquece, que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo, e que essa desigualdade está presente no mercado de trabalho”.


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SMART - GOVTECHS TRANSFORMAM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

GOVTECHS TRANSFORMAM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Inovação e tecnologia são os pilares da revolução digital provocada pela parceria entre governos e startups >>> Guilherme Popolin

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avanço da tecnologia promove transformações sociais cada vez mais velozes. A comunicação, o consumo, a informação e a prestação de serviços são constantemente impactados por novas soluções. À vista disso, a administração pública tem sua eficiência ampliada por conta das GovTechs - startups que levam inovação aos serviços públicos. É o caso da Gove, empresa de impacto social, cujo objetivo é transformar o setor público por meio de tecnologias que simplificam o dia a dia dos gestores e melhoram o processo de tomada de decisão. Líderes municipais utilizam a plataforma para aumentar a eficiência das administrações públicas e melhorar a qualidade dos serviços oferecidos ao cidadão. “Percebemos que cidades pequenas e médias no Brasil estavam enfrentando diversas dificuldades financeiras, e poucas eram as soluções acessíveis e de qualidade para auxiliá-las no entendimento dos problemas e na busca de soluções”, explica Rodolfo Fiori, cofundador da Gove ao lado do sócio Ricardo Ramos. Há alguns anos atrás, um município que precisasse de ajuda para lidar com problemas precisava contratar soluções caras ou de baixa qualidade. De acordo com Fiori, entre várias deficiências, a Gove entende que há um grande problema de ineficiência fiscal dos municípios, o qual pode ser solucionado “de forma bem escalável, usando tecnologia, com

custo acessível e com qualidade”. A Gove funciona como um software as a service, ou seja, os sistemas operados pelas prefeituras são integrados à plataforma da startup para aferição das informações que depois são analisadas em um banco de dados da startup. “Mostramos para o município onde tem potencial para melhorar a arrecadação ou os gastos. A partir do momento que o problema é identificado, auxiliamos também na resolução”, diz. O processo de contratação das startups pelas prefeituras é feito via licitação. O novo marco legal das concessões e das parcerias público-privadas (PPPs) está em discussão no Congresso Nacional, e após mudanças no texto do PL 7.063, houve aceitação da nova Lei

RODOLFO FIORI, cofundador da Gove ao lado do sócio RICARDO RAMOS


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Geral de Concessões pelo Planalto que concordou em revogar duas leis com jurisprudência consolidada - a 8.987/95 (que trata de concessões) e a 11.079/04 (sobre PPPs). Para Igor Guadalupe, diretor executivo do GESUAS, software para gestão do Sistema Único de Assistência Social, o modelo de contratação público-privado dificulta e onera o processo. “É muito difícil pautarmos contratação de inovações com uma Lei de 1993 (8.666/93) que não previa isso. Foi feita para serviços comuns, e, agora, pauta a contratação de empresas nascentes e inovadoras. Acredito que estamos evoluindo, é importante cada vez mais levantarmos a pauta das GovTechs como um importante parceiro do governo”. O GESUAS, instalado na Cientec Aceleradora e participante do ecossistema de inovação mineiro Viçosatec, oferece soluções para melhorar a eficiência e a qualidade

IGOR GUADALUPE Diretor executivo do GESUAS

no atendimento do SUAS – Sistema Único de Assistência Social. Presente em 95 municípios brasileiros e em 14 estados, possui mais de 1 milhão de famílias cadastradas, com mais de 2,5 milhões de pessoas sendo atendidas. “Faltava padronização e integração entre os equipamentos das unidades, uma uniformidade e um cadastro único de famílias que permitissem um monitoramento, uma gestão baseada em dados”, explica Guadalupe. As prefeituras, em parceria com o GESUAS, podem conhecer melhor as demandas e as vulnerabilidades das pessoas assistidas pela assistência social, inclusive de acordo com a região geográfica. Dessa forma, os gestores definem ações e políticas públicas a fim de resolver os problemas observados. Guadalupe destaca o case de Saltinho (SC), município que em parceria com o GESUAS digitalizou os dados gerados pela assistência social, já que antes os prontuários eram feitos em papel. A startup contribuiu com a implantação de um sistema, de equipamentos da rede socioassistencial, treinamento da equipe e prestação de suporte. Mesmo sem um CREAS instalado, hoje, a Secretaria Municipal de Assistência Social é capaz de atender as demandas de Proteção Social Especial, já que ao registrar, virtualmente pelo GESUAS, as situações de violência e violação de direitos identificadas nos atendimentos, deu-se visibilidade ao número e tipo de demandas, culminando na necessidade de implantação de uma equipe que atenda estes casos específicos. Com o tempo, foi possível gerar mapas, relatórios e estatísticas, e ao detectar padrões, realizar um diagnóstico socioterritorial - importante subsídio para a Vigilância Socioassistencial. Em 2019, dois anos depois no início da parceria, o secretário de Assistência Social de Saltinho (SC), Mateus Kuhn, recebeu o prêmio pelo Projeto Software para CRAS e CREAS do I Fórum de Cidades Digitais do Oeste Catarinense. No ano passado, o GESUAS também recebeu o prêmio de melhor solução para a gestão pública do Brasil, ofertado pelo BrazilLAB na 3ª edição do Programa de Aceleração do BrazilLAB, programa de aceleração que apoia empreendedores que desenvolvem soluções tecnológicas para os problemas do Poder Público brasileiro. Segundo Guadalupe, as startups são poderosas quando se trata de ação, e compara a administração pública a um navio, que por ser grande possui movimentos lentos para mudar de direção. “A startup seria como um barco que com movimentos mais objetivos consegue mudar o rumo e seguir no desenvolvimento dos seus objetivos. A parceria entre startup e Poder Público consegue agilizar a resolução de problemas. Esse é o ponto chave, principalmente por conta dos preços competitivos. As startups normalmente têm estruturas enxutas, eficientes, e conseguem ofertar soluções com grande qualidade a preços bastante acessíveis”. A parceria com as startups, geralmente ligadas a setores com alto valor agregado, com especialistas, engenheiros e cientistas nos times, “permite que o Poder Público inove, se desenvolva e se modernize”, conclui.


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LIFE - TEMPO X ENTREGA

TEMPO X ENTREGA A dualidade que tem se apresentado como um dos grandes desafios para profissionais que querem atingir resultados e ao mesmo tempo ter uma vida mais equilibrada >>> Karina Constancio

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eja produtivo”. Talvez esse seja um dos imperativos mais reforçados dentro do mercado de trabalho. A exigência por produzir mais em menos tempo sempre foi a lógica que moveu o capitalismo. Porém, em tempos de revolução digital e indústria 4.0, as expectativas aumentaram. Com uma série de facilidades proporcionadas pela tecnologia, o tempo para finalizar uma atividade diminuiu consideravelmente. Um dado recente, divulgado pelo Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomercio-SP, revelou que o trabalhador brasileiro leva uma hora para fazer o mesmo produto ou serviço que um norte-americano consegue realizar em 15 minutos. Isso quer dizer que nossa produtividade é baixa, mas gera uma intensa discussão sobre o que, de fato, afeta esses resultados. Será que somos mais preguiçosos ou displicentes? Não há dados suficientes para afirmar isso, alguns especialistas colocam na balança atrasos na formação profissional e na infraestrutura das empresas. Mas o que é ser produtivo e como podemos nos organizar para ter um melhor desempenho no trabalho e em nossas atividades diárias? É sobre isso que conversamos com a especialista em gestão de tempo e atual gerente de projetos de inovação da Grendene, Bianca Dallegrave. Para ela, a produtividade está relacionada a quatro pontos principais: prioridade; autonomia; gestão do tempo; e segurança psicológica. Confira a entrevista concedida com exclusividade para a WTW Mag.


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WTW: O mundo hiperconectado e a possibilidade de trabalhar de qualquer lugar a qualquer momento, ao mesmo tempo que facilitam diversas tarefas diárias, também podem ser um gerador de distração e de ansiedade. Como você enxerga a relação gestão de tempo x produtividade nesse cenário? BIANCA DALLEGRAVE: Realmente é bem complexo e acredito que quando não temos claro qual o planejamento da semana e do dia com as definições de prioridades, a produtividade tende a cair muito, pois com tantas possibilidades de conexões e informações, estamos alertas o tempo todo e a quantidade de afazeres tendem a aumentar ao longo do dia e com isso será inevitável não ficar ansioso. Cada vez mais eu exercito esse método de planejamento e priorização e ajuda muito a não estimular a sensação de atraso ou dívida.

WTW: Há uma espécie de mito fortalecido pelo relógio-ponto em que só se é produtivo se o profissional está dentro do escritório, cumprindo suas horas obrigatórias de trabalho. Mas a crescente onda do anytime e anywhere está começando a questionar esse paradigma e reforçando que o profissional produtivo é produtivo onde ele estiver. Você acredita nisso? BD: Acredito muito neste modelo, mas acho que é preciso que alguns combinados fiquem bem claros e que toda a cultura da empresa também esteja voltada para construção dessa realidade, senão tende a não dar certo. Eu inclusive trabalhei para a Box1824 por quase dois anos em um formato remoto e com liberdade total de horário. Para mim, era muito tranquilo entender que se eu estava em um compromisso pessoal pela manhã, possivelmente teria que compensar na parte da noite. Com o tempo fui exercitando o bom senso e a maturidade para compreender sobre a minha autogestão do tempo e como apresentar resultados efetivos para a empresa que também estava apostando nesse novo formato. No atual momento, estou trabalhando para o laboratório de inovações da Grendene e meu formato de trabalho prevê um escopo de 6 horas com total flexibilidade de horários, então, vai ser um novo desafio, porém, acredito muito que conseguimos dar conta de tudo que temos para fazer em menos tempo quando temos bem claro qual o foco do nosso trabalho.


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LIFE - TEMPO X ENTREGA

WTW: Você ministrava um workshop chamado “Mãe” para trabalhar a gestão de tempo tendo como referência a maternidade. Como essa relação se aplica na prática? BD: Muitas dos desafios que vivo hoje como mãe também são desafios que são muito próximos ao ambiente de trabalho, por isso fui convidada pela Sputinik para formatar esse workshop sobre a Cultura da Produtividade. Assim como temos que planejar nossa semana e nosso dia de acordo com os alinhamentos centrais da empresa, isso deve também ocorrer na nossa vida pessoal, mas a questão é que quem deve dar a diretriz somos nós mesmos, ou seja, temos que compreender quais são nossas prioridades na vida pessoal e entender que algumas coisas vamos ter que abrir mão e está tudo bem. Temos que assumir o comando das nossas próprias vidas e saber que se estamos com um bebê pequeno em casa talvez não seja possível fazer academia, uma pós-graduação e também encontrar com as amigas uma vez por semana. Não adianta ficarmos sofrendo pelo o que não conseguimos fazer, temos que valorizar o que estamos fazendo e quando entendemos que nossa prioridade são nossos filhos, principalmente quando eles são pequenos, tem que estar claro que estamos dedicando nosso tempo para construir um vínculo que vai ser fundamental para a vida toda. Além disso, se formos analisar tudo que está relacionado com produtividade (priorização, autonomia, gestão do tempo e segurança psicológica) também são fatores fundamentais em um ambiente pessoal. Vejo muitas mães se sentindo em dívida, seja com os filhos, no trabalho, com sua relação íntima, com a família, consigo mesma ou com os amigos...realmente é um desafio essa fase da vida, mas eu mesma já passei por isso, e às vezes ainda passo, mas tento sempre analisar com serenidade o que estou construindo e se está de acordo com as minhas prioridades. Isso tem a ver com priorização e gestão do tempo. Dar a diretriz e confiar nossos filhos quando solicitamos suporte para nossa rede de apoio tem a ver com dar autonomia. Eu não posso pedir ajuda e depois ficar julgando se a avó fez certo ou errado o tempo todo, cada um tem seu jeito e tem seu tempo e isso tem a ver com autonomia e também segurança psicológica. Dessa forma, busquei esses aprendizados e cruzei com minha vida profissional para elaborar um conteúdo sobre produtividade com uma visão mais humana e sensível.

WTW: Do ponto de vista da gestão de tempo, conseguir se organizar para ter um tempo livre também é importante. Além de ser mais assertivo em nossas atividades, ter um momento para relaxar e até fugir um pouco da rotina pode ser um fator positivo para a produtividade? BD: Acredito muito no ócio criativo e me vejo em muitos momentos tendo insights de um desafio a ser resolvido quando estou no banho, cozinhando ou até mesmo brincando com meus filhos. Eu gosto muito de um conceito que o Da-

vid Allen apresenta no método GTD que fala que “não é sobre arrumar tempo, é sobre arrumar espaço”, pois temos tanta coisa na cabeça para guardar e depois lembrar de fazer que a melhor maneira para conseguirmos criar esse espaço é através das listas. Anote tudo em um único lugar e fique tranquilo que tudo vai estar lá depois, assim evitamos ficar em estado de “diarreia mental”, quando não paramos de pensar nas mil coisas que temos que fazer, ao invés de aquietarmos a mente e deixarmos as ideias fluírem.

Como ser mais produtivo: 1. Tenha claro quais são as prioridades na sua vida pessoal e quais prioridades para sua empresa. 2. Planeje sua semana de acordo com essas prioridades - nesse momento tente exercitar com muita clareza o tempo que você tem e o tempo necessário para cada coisa planejada, pois a frustração às vezes está aí, quando elencamos muitas coisas e não conseguimos dar conta. 3. Faça um review diário com todas as suas tarefas e tente resolver primeiro sempre o que for mais rápido e depois o que for mais complexo, porém, mais importante para ser resolvido naquele dia. 4. Utilize ferramentas online para fazer suas listas e organizar seus documentos, assim você poderá acessá-los de qualquer lugar. 5. Informe-se sobre modelos mentais que tratam sobre agilidade, abundância e mindset de aprendizagem. 6. Tire alguns minutos do dia para se concentrar em você e na sua respiração, preste atenção em como você está se sentindo antes de uma reunião ou antes de começar ou finalizar seu dia. O melhor jeito de conseguir encontrar um método adequado a você é buscando se autoconhecer.




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