O MITO DO COLESTEROL
POR QUE A DIMINUIÇÃO DO SEU COLESTEROL NÃO REDUZIRÁ O RISCO DE DOENÇAS CARDÍACAS
JONNY BOWDEN E STEPHEN SINATRA Tradução JEFERSON LUIS CAMARGO WALDÉA BARCELLOS
SÃO PAULO 2016
“Nunca subestime as convicções do convencional, particularmente na medicina.” – WILLIAM DAVIS, M.D.
SUMÁRIO
Prefácio Capítulo 1
XI Por que você deve ser cético a respeito do colesterol como um indicador de doenças do coração
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Capítulo 2
“O colesterol é inofensivo!”
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Capítulo 3
Inflamação: A verdadeira causa das doenças cardíacas
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Capítulo 4
Açúcar: O verdadeiro vilão da alimentação
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Capítulo 5
A verdade sobre a gordura: não é o que você pensa
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Capítulo 6
O embuste da estatina
117
Capítulo 7
Ajude seu coração com esses suplementos
165
Capítulo 8
Estresse: O assassino silencioso
195
Capítulo 9
Juntando tudo: Um programa simples e fácil para um coração e uma vida saudáveis!
231
GlossĂĄrio
271
Notas
283
Sobre os autores
307
Agradecimentos
309
Ă?ndice remissivo
313
CA PÍ TU L O 1
POR QUE VOCÊ DEVE SER CÉTICO A RESPEITO DO COLESTEROL COMO UM INDICADOR DE DOENÇAS DO CORAÇÃO NÓS DOIS RESOLVEMOS ESCREVER ESTE LIVRO por acreditarmos que você tem sido enganado, mal informado e, em alguns casos, ouvido mentiras explícitas sobre o colesterol. Acreditamos que estranhas misturas de informações equivocadas, estudos cientificamente questionáveis, ganância corporativa e propaganda enganosa conspiraram para criar um dos mitos mais indestrutíveis e nocivos da história médica: aquele segundo o qual o colesterol é a causa das doenças cardíacas. Os milhões de dólares gastos em incontáveis campanhas de marketing destinadas a perpetuar esse mito tiveram sucesso em nos manter focados em um personagem relativamente secundário na história das doenças do coração, criando um mercado para os medicamentos redutores de colesterol que anualmente consome mais de 30 bilhões de dólares. A verdadeira tragédia é que, ao voltar toda a nossa atenção para o colesterol, praticamente ignoramos as verdadeiras causas das doenças cardíacas: a inflamação, a oxidação, o açúcar e o estresse. Na verdade, como este livro vai lhe ensinar, os números relativos ao colesterol são indicadores muito frágeis dessas doenças; mais da metade das pessoas hospitalizadas por ataque cardíaco têm níveis perfeitamente normais de colesterol, e cerca de metade das pessoas com altos níveis de colesterol têm corações normais e saudáveis. | 1 |
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Muitas das diretrizes dietéticas gerais aceitas e promovidas pelo governo e por grandes organizações de saúde, como a American Heart Association [Associação Norte-Americana do Coração], estão direta ou indiretamente relacionadas com a fobia do colesterol. Essas diretrizes-padrão nos advertem a restringir a quantidade de colesterol que ingerimos, apesar do fato de que, para pelo menos 95% da população, o colesterol na alimentação praticamente não exerce nenhum efeito sobre o colesterol no sangue. Essas diretrizes nos advertem sobre os perigos das gorduras saturadas, apesar do fato de que a relação entre gordura saturada na alimentação e doenças cardíacas nunca ter sido convincentemente demonstrada, e apesar do fato de a pesquisa mostrar que a substituição da gordura saturada por carboidrato na alimentação na verdade aumenta o risco de doenças do coração. Nós dois nos tornamos céticos sobre a teoria do colesterol em momentos diferentes de nossas carreiras, percorrendo caminhos distintos até chegar à mesma conclusão: o colesterol não causa doenças cardíacas. Também acreditamos que, ao contrário das gorduras trans, por exemplo, as gorduras saturadas não são o equivalente dietético das ovas de Satã (e mostraremos por quê). Finalmente, mais importante é o fato de acreditarmos piamente que acabamos pagando um alto preço por nossa obsessão nacional por reduzir os níveis de colesterol. A colesterolmania levou-nos a concentrar toda nossa energia em uma molécula bastante inócua, que tem uma relação periférica com as doenças cardíacas, e, ao mesmo tempo, ignorar as verdadeiras causas dessas doenças.
O QUE VOCÊ PRECISA SABER • O colesterol tem um papel secundário nas doenças cardíacas. • Os níveis de colesterol são apenas um modesto previsor dos ataques cardíacos. • Metade das pessoas com doenças do coração tem colesterol normal. • Metade das pessoas com colesterol alto tem corações saudáveis. • A diminuição do colesterol tem benefícios extremamente limitados.
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Explicaremos ao leitor, cada um a seu modo, como nos tornamos céticos em relação ao papel desempenhado pelo colesterol e por que acreditamos fervorosamente que a informação contida neste livro pode salvar sua vida. DR. JONNY Antes de me tornar nutricionista e, posteriormente, escritor, fui personal trainer. Trabalhava nos clubes Equinox para condicionamento físico em Nova York, e a grande maioria dos meus clientes só queria uma coisa: perder peso. Estávamos na década de 1990, quando as gorduras eram consideradas a inimiga alimentar número um, e as gorduras saturadas eram consideradas particularmente nocivas porque todos “sabíamos” que elas entupiam as artérias, aumentavam os níveis de colesterol e provocavam doenças cardíacas. Portanto, como a maioria dos meus colegas de profissão, eu submetia meus clientes a dietas baixas em gorduras e os estimulava a fazer toneladas de exercícios aeróbicos e um pouco de exercícios com pesos. E isso funcionava. Às vezes. Quase sempre, a estratégia não dava bons resultados. Vejamos o caso de Al, por exemplo, um empresário incrivelmente bem-sucedido e poderoso, com sessenta e poucos anos de idade e uma barriga enorme da qual não conseguia se livrar. Al vinha fazendo uma dieta muito baixa em gorduras, infindáveis exercícios aeróbicos na esteira de sua casa e, ainda assim, quase não perdia peso. Se tudo que me haviam ensinado em minha formação de personal trainer estivesse certo, aquilo não devia estar acontecendo. Mas estava. Então Al decidiu-se por algo que eu não aprovava. Começou a fazer a Dieta Atkins. Não se esqueça de que aqueles eram os tempos em que nos ensinavam que as gorduras, em particular as saturadas, eram o que havia de pior. Tínhamos aprendido que “precisávamos” de carboidratos para ter energia e sobreviver (isso não é verdade, mas essa é uma discussão que pode ficar para outro livro). Também haviam nos ensinado
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que as dietas com altos teores de proteínas, como a de Atkins, eram perigosas e prejudiciais, em grande parte porque todas aquelas gorduras saturadas iriam entupir nossas artérias, aumentar nosso colesterol e provocar um infarto. Não havia dúvida, portanto, de que Al estava à beira de um desastre. A questão é que ele não estava. Ele não só começou a perder peso e aquela grande “barriga em forma de maçã”, como também passou a ter mais energia e a sentir-se tão bem como não se sentia há décadas. De minha parte, eu estava impressionado com os resultados obtidos por Al, mas convencido de que ele teria um alto preço a pagar e que, quando os resultados de seus exames de sangue anuais chegassem, eu poderia cantar vitória. Mas não foi o que aconteceu. Os níveis de triglicérides de Al – um tipo de gorduras encontradas na corrente sanguínea e em outras partes do corpo – haviam diminuído, sua pressão arterial estava ótima e o colesterol havia aumentado um pouco, mas seu colesterol “bom” (HDL) havia aumentado mais do que seu colesterol “ruim” (LDL), de modo que, em termos gerais, seu médico estava muito satisfeito. Bem naquela época, um bioquímico chamado Barry Sears veio a Nova York para fazer uma série de seminários nos clubes Equinox, dos quais participei sem pestanejar. Sears, cujos livros sobre a Dieta da Zona tinham vendido milhões de exemplares, trazia uma nova abordagem que podemos resumir em quatro palavras: coma gorduras, perca peso. Se Sears não fosse um bioquímico com formação no MIT, é bem provável que teria sido alvo de risadas e zombarias. Contudo, suas credenciais e seu extraordinário conhecimento do corpo humano tornavam muito difícil não levá-lo a sério. Sears não foi o primeiro a introduzir as gorduras e proteínas na dieta e a recomendar que comêssemos menos carboidratos. Atkins, cuja dieta original tinha sido aquela adotada por Al com resultados tão salutares, vinha dizendo coisas parecidas desde 1972. Porém, toda a contestação às ideias de Atkins centrava-se no fato de que, por ser rica em gorduras saturadas, sua dieta poderia resultar em doenças do co-
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ração. Portanto, ainda que muitas pessoas admitissem, sem muita convicção, que quem seguisse esse programa conseguiria perder peso facilmente, todas (inclusive eu) acreditavam que o preço a pagar incluiria um risco muito maior de vir a ter alguma doença cardíaca. Entretanto, meus olhos me contavam uma história bem diferente, e não somente devido ao que se passara com Al. Os mesmos resultados vinham sendo obtidos por outros clientes. Cansados de não obter resultados com as dietas pobres em gorduras e ricas em carboidratos, eles decidiram mandar as precauções às favas e adotar a Dieta de Atkins, a Protein Power Diet [Dieta das Proteínas], e outras, igualmente caracterizadas pela presença de altos teores de proteínas e gorduras. Estavam ingerindo mais gorduras – inclusive mais gorduras saturadas –, mas não estavam tendo nenhum problema, a menos que considerássemos problemático o fato de alguém se sentir melhor e emagrecer. E isso me fez pensar. Por que não estávamos tendo bons resultados com nossos clientes que seguiam fielmente dietas com baixos teores de gorduras e faziam um monte de exercícios aeróbicos? Por outro lado, por que nossos pacientes que vinham fazendo dietas baixas em carboidratos estavam tendo resultados excelentes em seus exames de sangue e, com isso, deixando seus médicos extremamente surpresos? E se tudo que nos haviam ensinado sobre o perigo das gorduras saturadas não fosse tão correto quanto havíamos imaginado? E se o que nos haviam ensinado sobre as gorduras saturadas estivesse parcialmente errado, qual seria a relação entre gorduras e colesterol? Seria tudo tão simples como me haviam ensinado? Depois de tudo, mesmo voltando aos anos 1990, quando só se falava em colesterol “bom” e colesterol “ruim”, ainda era evidente que, acima de tudo, a gordura saturada havia exercido um efeito positivo tanto sobre o colesterol de Al quanto sobre o de muitos de meus outros clientes. As gorduras saturadas haviam aumentado seus níveis do colesterol HDL muito mais do que os do colesterol LDL. Será que toda essa questão do colesterol não seria um pouco mais complicada do que eu e todos os demais tínhamos acreditado?
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Por fim, contrariando o pensamento dominante, perguntei a mim mesmo: “E se toda a teoria de que o colesterol causa doenças cardíacas não fosse nada além de um equívoco?” Se assim fosse, o efeito das gorduras saturadas sobre o colesterol seria bem irrelevante, não? E foi então que comecei a ler os estudos que tratavam do assunto. O Lyon Diet Heart Study1 [Estudo de Lyon sobre Dieta do Coração] descobriu que certas mudanças dietéticas e de estilo de vida conseguiam diminuir as mortes em cerca de 70%, além de diminuir as mortes por problemas cardiovasculares em impressionantes 76%, tudo sem praticamente alterar os níveis de colesterol. O Nurses’ Health Study2 [Estudo da Saúde das Enfermeiras] descobriu que 82% das doenças coronarianas podiam ser atribuídos a cinco fatores, nenhum dos quais tinha a ver com a diminuição do colesterol. E isso era só a ponta de um iceberg que não parava de crescer. Ao contrário do que todos pensavam, estudo após estudo sobre dietas ricas em proteínas e pobres em carboidratos, incluindo as dietas ricas em gorduras saturadas, mostravam que os exames de sangue das pessoas que as faziam eram semelhantes aos de Al. A saúde delas realmente melhorava com essas dietas. Os níveis de triglicérides baixavam. Outros indicadores de risco de doenças do coração também melhoravam. Na metade da década de 1990, retomei o curso de nutrição para obter meu certificado de nutricionista. Posteriormente, doutorei-me em nutrição holística e obtive o título de especialista em nutrição pela Certification Board for Nutrition Specialists [Conselho de Certificação para Especialistas em Nutrição], uma instituição associada à American College of Nutrition [Faculdade Americana de Nutrição]. Durante meus estudos, aprendi que eu não era o único a questionar a relação entre gorduras saturadas, colesterol e doenças do coração. Conversei com muitos outros profissionais de saúde que compartilhavam minhas dúvidas, até mesmo com uma das maiores especialistas do país em bioquímica de lipídios, a dra. Mary Enig, cuja carreira acadêmica foi totalmente dedicada ao estudo das gorduras e que acredita não existir absolutamente nada que nos leve a temer as gorduras saturadas. (A propósito, Enig fez algumas das primeiras pesquisas sobre gorduras trans, que para ela são as verdadeiras vilãs da dieta norte-america-
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na, e não as gorduras saturadas, opinião com a qual estou totalmente de acordo.) Enig não está sozinha ao pensar que sofremos uma lavagem cerebral coletiva sobre o tema das gorduras saturadas e do colesterol. Ela afirmou que, quando os norte-americanos consumiam produtos naturais, com níveis elevados de gorduras, como cremes, manteiga, carnes de animais alimentados em regime de pastoreio, leite integral e outros alimentos tradicionais, o índice de doenças cardíacas era apenas uma fração do que é hoje. Como tantos de nós, ela começou a se perguntar insistentemente se seria apenas uma coincidência que as duas pandemias globais – obesidade e diabetes – começaram a ocorrer mais ou menos na época em que abolimos coletivamente esses alimentos devido à fobia ao colesterol e às gorduras saturadas na dieta, e começamos a substituí-los por óleos vegetais, carboidratos processados e, por último, pelas gorduras trans. Enig era muito ativa em um grupo pelo qual passei a ter grande respeito: A Weston A. Price Foundation, que leva o nome de um pesquisador pioneiro nos campos da dieta e da saúde. Essa fundação defende abertamente os alimentos “tradicionais” não processados, o que inclui a manteiga, o leite integral, a carne de animais alimentados em regime de pastoreio e outros alimentos que foram demonizados pelo poder e influência então vigentes sobre o colesterol, por seu conteúdo relativamente alto de gorduras saturadas. A fundação também prestou o grande serviço de chamar a atenção para o fato de que, quando os norte-americanos ingeriam esses alimentos regularmente – por exemplo, nos primórdios do século XX –, as doenças cardíacas eram muito menos comuns do que hoje. Ao longo de minha carreira, analisei as estratégias que pareciam funcionar para as pessoas mais saudáveis e longevas do mundo e descobri que a redução do colesterol não tem quase nada a ver com a diminuição das doenças cardíacas e, em definitivo, nada a ver com a longevidade. Estudo após estudo, como o de Lyon mencionado anteriormente, têm demonstrado que a redução do risco de ter doenças do coração não tem absolutamente nada a ver com a redução dos níveis de colesterol.